Revista Simone

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GABRIELA LEITE

Um papo com a dona da Daspu

VIOLÊCIA DOMÉSTICA

Existe vida após agressões

MARCHA DAS VADIAS

Pelo direito de ser o que quiser

VALESCA POPOZUDA

Mulher também fala de sexo.

ACEITE SEU CORPO

Fuja do padrão, aceite-se.

LIBERTE-SE



EXPEDIENTE Diretor de redação Nina Cristina Wyatt Editora-chefe Nina Cristina Wyatt Diretora de arte Nina Cristina Wyatt Repórtes Nina Cristina Wyatt Simone de Beauvoir Emma Goldman Kathleen Hanna Naomi Wolf Colaboradores Nayara Villas Boas Sara Goldchmit Lucas Massimo Fabio Silveira Revisão Sara Goldshmit Fabio Silveira

QUEM PRECISA DE FEMINISMO? Mas afinal, quem precisa de feminismo? A reposta é simples, todas as mulheres, ou melhor, todas as pessoas. Eu, você, sua mãe, sua avó, sua melhor amiga, seu namorado... Há mulheres que dizem que não gostam do feminismo, que são contra. Essas mesmas mulheres votam, trabalham, usam saia curta, tomam pílula anticoncepcional, transam antes do casamento, falam palavrão, tem amigos homens, praticam esportes, aceitam o corpo e a aparência mesmo estando “fora” do padrão, bebem e tocam a vida sem precisar de apoio de homem algum. Como assim, então, essas mulheres não são feministas? Ou melhor, elas sabem o que é feminismo? Você sabe o que é? Feminismo nada mais é que ideia radical de que mulheres são gente e devem ser tratadas como. Parece óbvio? É porque é, mas ao mesmo tempo, não é. Mesmo hoje, sofremos com todo tipo de preconceito. A mulher ganha em média 23% menos que o homem. Somos assediadas, desde bem novas, praticamente todos os dias de nossas vidas. Você provavelmente já levou muitas “cantadas” ofensivas na rua, já ouviu todo tipo de coisa em festas, bares e baladas. Isso é assédio, isso é fruto do pensamento machista de que a mulher é inferior. Muitas mulheres são vítimas de violência domésticas e permanecem caladas por medo, por vergonha, por machismo... A sociedade patriarcal e a cultura machista impõe certas coisas que é difícil de escapar, mesmo que inconscientemente temos certas atitudes machistas. Julgamos outra mulher pela forma que se veste e pelo seu comportamente sexual. Deixamos de lado nossas preferências para satisfazer a sociedade. E nos submetemos a qualquer coisa por um homem... Precisamos de feminismo para nos livrar do machismo que existe na sociedade, para nos desvincular de ideias retrógadas que ainda existem na nossa cabeça. Precisamos de feminismo porque graças a ele alcançamos muitas coisas e ainda temos muito pela frente. Cada mulher precisa de feminismo por um motivo único e pessoal, mas


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SUMÁRIO

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6 MURAL 10 DIREITOS IGUAIS 12 MARCHA DAS VADIAS 14 GABRIELA LEITE 18 VALESCA POPOZUDA 20 PADRÕES DE BELEZA 22 VIOLÊNCIA DOMÉSTICA 26 UMA BREVE REFLEXÃO


mural

novidades, dicas e muito mais para você se informar e ficar por dentro. por kathleen hanna

COM ARTE E COM GARRA Talvez você ainda não tenha ouvido falar na Panmela Castro, mas se mora no Rio de Janeiro, ou já esteve por lá, já teve ter visto alguns de seus grafitis. Com o “codinome de guerra” Anarkia Boladona assina os grafites que espalha desde 2006 pelos muros do Rio. Os desenhos são sua voz, estilo de vida e força de trabalho. Com eles trata de temas como sexualidade, condição feminina, igualdade e, especialmente, de violência doméstica. Através dos desenhos começou o “Grafite Contra a Violência Doméstica”, projeto de conscientização de comunidades carentes de sua cidade, que de lá foi levado para outras. Por causa dele foi escolhida este ano pelo Daily Beast, site do grupo da revista norte-americana Newsweek, umas das 150 mulheres que agitam o mundo. Quer saber mais? Acesso o site de Anarkia Boladona e conheça mais de sua arte. http://www.panmelacastro.com

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ruas na galeria Lent dolum qui apistintiur? Onsedi doluptis dia con corecer iaeste porero blaccaecum ut ad maio modit eniatios net que pro tet reribus et, sita saperepratem soluptassi omnihic iaecti tor sincit maximint ex exped ut est elia vit ut veroreicil isquid et et ratia nonsed eumet ut ra co Catintec aectemquias doluptat renem aut et, ut quo et volorpos num repres doles sa nus dipitaeprat arit, toreica epratum


MARINA ABRAMOVIC Ifecon vidiocu satordii publiis. me pliis, Patum o C. Edem ducota, ficulii tatia plius vidium dem tatimodiem us, es faucips, senirmihi, conos, pecris optiam pra, caequoste inati fatienatia ne ium, dem quidienatum ore acchuisquis ine cludam ia ium terferi, pecursu pienderio nenit er aper loctum tandam actatilin priberrares, est preto Catam nos hosultuus, utemperemus confes rei is Catala re, auc te ni prorunum den atro cae facto ut ant. Ignat. Si pliem tem, quodienterum moraturnum hil vis; numultor poptebe muscerfecere mulego crum oc rei in senamque puliam horuntiam ditatam is in Italici amquonius, pos et? Ubli, quam iam pos hum pre qua vivividea vero cotiam Ebatam pora? Quodient in pon sed ca; nero conulis vir quam iam terbenam diem, es, publinte ipti, qua con hoc fica; noti, eterist essimust di, perid ses adem ium tant, nondam in ta et quidem intilici prende inti, ad dit vis pra.

O GRANDE PASSO DO URUGUAI

SOLTANDO A VOZ Impore nam fuga. Et vel ideles escilig enihili busandere, quidit libus ea vitium hario. Voloribus ditias ent lat aligendicid et a sus. Icius ducid moluptios aces atis es doloribustis doluptibus rerrupictem eos dolentio doluptatur simaio ipient, corepudi cuscit autemoluptat volora dia in ratiam que quo excernatum int ut adis inusanti offic to to ese lab id quas porae vella delite rerunt. Omnistis ut por sin res doleces toreius, qui antiandit reperupis dolo derchilitium fuga. Ore, veliand aerorru ptatur, et facieni ducitet ut volupid uciumquiant por as ipidis aboris aspicipsunt vitia sum quo is am, quatiis illes exero tentionsed quo magnia sitat. Nist peria ipicius experum demporis poria cuptamus, estio. Parum nihillore ni sum aut alitatemquo dolupta tionsed utem. Udit modiasi tasinctem aut exceaque mosam, net apitate nobis sim fugia cor anihilibusa doluptias eiur.Ficitas ant iur autem volorro et essit eos rent labo. Sequatet molo blaborendi lorem demporis dolentio.

Vitória para as mulheres do Uruguai. No dia 17 de outubro o senado uruguaio aprovou o projeto de lei que descriminaliza o aborto no país. Com a decisão, o vizinho sul-americano se transforma no segundo país da América do Sul (depois da Guiana) a permitir o aborto por qualquer mulher que deseje fazê-lo, até a 12ª. semana de gestação. O projeto não legaliza o aborto, mas sim impede que a interrupção da gravidez por parte de cidadãs uruguaias seja tratada como crime. A decisão final pode ser tomada pela gestante depois de haver sido observado um processo obrigatório de consulta a três profissionais vinculados ao sistema de saúde local e desde que o aborto seja praticado por centros de saúde registrados. “Este é um primeiro passo de avanço. Entre 1934 e 1938, o aborto foi legal no Uruguai. E, desde a reabertura democrática (1985), todas as legislaturas apresentaram projetos a respeito. Sentimos que se trata de uma questão de direito, estamos convencidos de que se deve continuar com a luta pela autonomia da mulher”, disse à BBC Brasil a senadora Monica Xavier, presidente da Frente Ampla. Equat laboreptibea es as apienia ndelecat o kal.

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FILME

AS VIRGENS SUICIDAS As Virgens Suicidas (The Virgin Suicides, EUA, 2000) é o primeiro longa de Sofia Coppola e trata-se da adaptação do livro homônimo. Contendo uma trama mórbida e triste, o filme inova pelo seu olhar feminino, uma marca das obras de Sofia. A história é narrada por um grupo de garotos e gira em torno de 5 irmãs que vivem em uma sociedade extremamente conservadora e patriarcal. A trama lança um sensível olhar sobre a prisão sexual em que se encontram as jovens mulheres em sociedades de forte apelo religioso cristão. O filme possui também um dos mais fantásticos diálogos feministas já escritos sobre o que significa ser uma adolescente mulher que tem sua sexualidade reprimida e observa o mundo através de um criterioso olhar sobre de como estão estabelecidas as bases da desigualdade entre o ser mulher e ser homem.

Livro

PERSEPOLIS

Publicado entre os anos de 2000 e de 2003, no formato de Graphic Novel, Persepólis narra a história de Marjane, ama garotinha iraniana, em meio a uma revolução, Empoderada o suficiente para contar a sua própria história, é um tapa na cara do pensamento ocidental de que mulheres do oriente médio precisam ser salvas. Marjane Satrapi, autora e personagem principal, afirmou ter criado Persépolis para o público ocidental, seu objetivo foi mostrar a problemática do Irã de forma mais pessoal e a variedade de manifestações com mais nuances e profundidade do que estamos acostumados para desmistificar a idéia preconceituosa que temos em relação às mulheres daquela parte do mundo. Em 2007, Persepolis, ganhou uma versão animada para os cinemas. Assim como o como o livro, a versão do cinema é recomendada e imperdível.

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NOS cinemaS

LAURENCE ANYWAYS Poucas vezes na história do cinema a questão do gênero foi retratada de forma tão crua e bela como no último longa do diretor hype canadense, Xavier Dolan. Uma marco na carreira de Dolan, Laurence Anyways (Idem, Canadá/França, 2012), narra a história de Laurence Alia, um rapaz heterossexual que, na verdade, sente-se mulher. Ao contar sua verdadeira identidade a sua namorada, Frederique “Fred” Belair, Laurence percebe que não está só, ela passa a ajudá-lo em sua transformação e na busca de sua identidade, apoiando-o em tudo é

preciso. As idas e vindas do casal, o relacionamento de Laurence com sua mãe, a dificuldade e o preconceito enfrentado pelo personagem são narrados de forma artisticamente exagerada e simbólica, caracteristica principal dos filmes do jovem diretor. Laurence Anyways é um daqueles exemplos de filmes de arte, filmessentimento, obras que conseguem captar a alma ou a aura de um determinado grupo de pessoas. E que são inesquesíveis.


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Manifestação feminista da década de 1960. Mulheres vão às ruas pelos seus direitos.

direitos iguais

luta sem

gênero

A questão do gênero e os desafios de ser mulher dentro uma sociedade patriarcal e sexista. texto: simone de beauvoir foto: john olson (arquivo) Décadas de submissão e desigualdades, produziram uma espécie de empoderamento dos homens em relação às mulheres e junto com ele ideia nefasta de que a mulher “sendo sua” estaria sujeita aos seus comandos e a todo tipo de violência. Enquanto o sexo (masculino e feminino) aparece como um dado biológico, o gênero se apresenta como um aquisicão social. A sociedade define as crenças e os comportamentos característicos de cada sexo em um determinado período histórico e ao longo dos tempos, a concepção do mundo tem favorecido a subaltenização das mulheres, por conceder os papéis importantes, respeitados e valorizados, à custa da opressão das mulheres e supressão de seus direitos. De tais diferenças e desigualdades surgiu a ideia de superioridade dos homens em relação

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às mulheres, responsável pela dominação masculina, instituída socialmente, dando origem ao que chamamos hoje de violência de gênero, sofrida atualmente, tal como em todos os tempos, somente pelas mulheres, motivo pelo qual elas necessitam de legislação especial de proteção, como é caso, no Brasil, da Lei Maria da Penha. O gênero e o mercado de trabalho Ao longo do tempo, a sociedade deus aos homens papéis importantes e respeitados, restando à mulheres as tarefas domésticas e os cuidados aos filhos. No segundo momento, as mulheres passaram a exercer papeís menos significativos para a sociedade, tidos como a extensão do próprio lar, a secretária/ajudante de um empresário por exemplo, aliados à baixa remuneração e nenhum poder. Ainda hoje são poucas as mulheres que re-


almente chegam ao poder, sendo-lhes cobrado muito mais competência e dedicação que dos homens, sem falar que a maioria recebe salários inferiores do que são pagos aos homens, mesmo quando executam funções idênticas. Conforme estudos recentes, verifica-se, mesmo que tem tido uma inserção maior no mercado de trabalho. Constata-se, também, uma significativa melhora entre as diferenças salariais. . Apesar do avanço, muita coisa ainda tem que mudar. O prenconceito em relação ao “gênero” ainda existe e, sendo algo cultural, não irá acabar tão cedo. O importante é que, mesmo com todo preconceito existente na sociedade, cada vez as mulheres estão conseguindo quebrar as barreiras e ocupar cargos que antes eram dados exclusivamente aos homens.

Preconceito de gênero Ninguém pode negar a história de inferiorização feminina desde o início da civilização, sendo tal subordinação expressa reiteradas vezes na legislação vigente de vários países, inclusive no Brasil. Somente em 1932, a mulher conquistou o direito ao voto. AtÉ 1962 a mulher era considerada incapaz, no ponto de vista cívil. Até 1988 a mulher casada necessitava de autorização do marido para trabalhar Apenas em 2003 o Código Cívil deixou de mencionar que o defloramento da mulher permitia que o pai deserdasse a filha e que o marido pedisse a anulação do casamento. na esfera penal, em 2005, foram alterados diversos artigos do Código Penal, não se permitindo mais a extinção da punibilidade nos crimes contra os costumes, nos casos de casamento da vítima com o agressor.

O gênero não corresponde necerriamente ao sexo biológico do indíviduo. Um homem pode ser mulher e vice-versa. O gênero é o que cada um sente que é. É por isso que a idéia de preconceito de gênero é tão retrógada e deve ser quebrada.

leitura indicada: O segundo sexo, de Simone de beauvoir.

ENTENDA MELHOR Gênero não é binário. E na maioria dos casos ninguém é 100% uma coisa só. Somos um pouquinho disso e daquilo. Um simples gráfico não é capaz de definir todas as possibilidades que a sexualidade humana oferece. A melhor forma de definir alguém é perguntando como essa pessoa se sente. Identidade de gênero: É a maneira que você se enxerga, o gênero no qual você SENTE parte.

Orientação sexual: Indica pelo que você sente atração. Mostra o que lado sua sexualidade está “orientada”.

Sexo biológico: Indica seu sexo de nascença, suas características físicas, hormônios e cromossomos.

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contra o machismo

Garotas protestam contra o machismo na Ăşltima Marcha de Vadias de SĂŁo Paulo.

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marcha das

vadias O polêmico protesto contra o machismo e a cultura de estupro ganha cada vez mais força. texto: kathleen hanna foto: divulgação

A Marcha das Vadias, Slut Walk em inglês, surgiu em Toronto, no Canadá, em 2011, como uma forma de protesto contra a crença de que mulheres vítimas de estupro ou qualquer tipo de violência sexual pediram isso devido suas vestimentas. Depois de uma série de relatos de abuso sexual na Universidade de Toronto, um policial disse que nada teria acontecido se as meninas não vestissem igual a putas (sluts, no original). Isso desencadeu vários protestos no Canadá e também no mundo. Em junho de 2011, pouco depois da marcha em Toronto, acontece a primeira do Brasil, em São Paulo, cerca de 300 pessoas participaram. Neste mesmo ano, iniciou-se a manifestação em Recife, Belo Horizonte e Brasília. Esse ano, a marcha foi mais divulgada e teve uma atenção maior da mídia. Muitas outras cidades do Brasil também participaram.da Marcha. De acordo com a antropóloga Julia Zamboni, o movimento é feito por feministas que buscam a igualdade de gênero. “Ser chamada de vadia é uma condição machista. Os homens dizem que a gente é vadia quando dizemos sim para eles e também quando dizemos não”, afirmou. “A gente é vadia porque a gente é livre”, destacou. No Brasil, a marcha também chama atenção para o número de estupros ocorridos no país. Por ano, cerca de 15 mil mulheres são estupradas. Ao contrário do que a maioria pensa, a marcha das vadias não é sobre sexo, não é pelo direito de “ser vadia”. É sobre violência, igualdade e direitos.

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entrevista

defensora de carterinha

Gabriela Leite bate um papo com a gente e conta sobre sua vida e profissão. entrevista: virginia wolf foto: divulgação

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N

os anos 70, um ano depois de entrar na Faculdade de Sociologia da prestigiada Universidade de São Paulo, a estudante Gabriela Leite decidiu abandonar o curso e o conforto de sua família de classe média para se tornar prostituta. Passou anos lutando contra a exclusão social e os abusos físicos. Decidida a não viver segregada nem aceitar preconceitos, Gabriela fundou a Ong DAVIDA, que batalha pelos direitos das prostitutas. Gabriela também abriu a grife Daspu que vende roupas confeccionadas por profissionais do sexo. A grife caiu imediatamente no gosto dos descolados de todo o país. Mesmo afastada da família e discriminada pelas filhas, Gabriela não desiste da boemia, pois esta é a vida que ela sempre quis. Depois desta entrevista, quem ainda chamar prostituta de mulher de vida fácil já passou da hora de mudar seus conceitos, ou melhor, preconceitos.

Simone: Como resolveu a questão em família? Gabriela: Em se tratando de família, tudo é difícil. Principalmente quando se faz uma opção como a minha. Eu já tinha uma relação conflitante, queria a liberdade que minha mãe achava que não deveria ter. Então, foram muitos altos e baixos, mas hoje convivemos muito bem. Somos uma família de mulheres. Ela é uma mulher fortíssima, sempre quis o melhor para nós. Mas uma coisa eu digo: é difícil assumir a prostituição, por conta do estigma e do preconceito. Depois que você assume, as coisas se tornam mais fáceis. Duro é ter vida dupla.

Simone: Por favor, apresente-se para quem ainda não a conhece… Gabriela Leite: Bom, eu sou Gabriela Leite, moro no Rio de Janeiro e sou diretora de uma ONG que se chama Davida, que trabalha pelos direitos e organização das prostitutas.

Simone: Mas não se trata de atividade de alto risco? Gabriela: Viver é um risco, você sai na rua e já está se arriscando. Tem um pouco mais de risco do que outras profissões devido à escuridão e à marginalidade, por ser uma coisa escondida debaixo do tapete. Então, onde se proíbe algo, cria-se a máfia. Aí você tem a terra de ninguém, questão muito séria na prostituição. Principalmente na baixa prostituição. Os riscos são maiores. Mas a gente luta para mudar isso. Estou há quase 30 anos militando para mudar toda essa história.

Simone: Na década de 70, você decidiu abandonar o conforto de sua família de classe média e o curso de sociologia na Universidade de São Paulo para se tornar prostituta. Que motivos te levaram a uma mudança de vida tão radical? Gabriela: Bom, eu realmente tinha conforto material, mas não tinha conforto com a minha própria vida. Queria liberdade. Vivi o momento de passagem, em que as mulheres foram adquirindo a sua liberdade. Sou da geração da pílula anticoncepcional, que é a grande revolução das mulheres, no meu ponto de vista. No entanto, venho de uma família muito conservadora, foi difícil, mas resolvi mudar minha vida. Até hoje, aos 58 anos, sou uma mulher muito boêmia. Gosto de sair para beber, dançar e para me divertir com meus amigos.

Simone: O que leva uma pessoa à prostituição? Gabriela: O que leva a qualquer outro trabalho. Fui porque gosto da noite, gosto da vida boêmia. Como disse, sou da geração da virada, fiquei jovem em plena revolução sexual. Ficava ali, vendo as mulheres da Boate La Licorne, de São Paulo, chegando tarde da noite. Senti vontade de ter a mesma vida.

Simone: Qual é a principal violência sofrida pelas prostitutas? Gabriela:A policial, que é muito séria em algumas cidades. Mas já melhoramos muitíssimo. O fato mais importante é mostrar a cara e dizer: ‘Olha, nós existimos, não adianta tanta hipocrisia. Nós estamos aí’. Estamos fazendo o levantamento da violação dos direitos humanos da prostituta em 11 capitais do país. O que já vimos da pesquisapiloto, no Rio, é que a maior violência é a policial,


entrevista além, claro, da familiar, da marital e a da própria clientela. O problema da polícia é a corrupção A prostituição é algo tolerado, pois as casas são proibidas. Para poder funcionar, os donos de hotel pagam para a polícia. A prostituta que está ali, como não tem a quem reclamar de nada – trata-se de terra de ninguém –, acaba vítima de violência.

“Ficava ali, vendo as mulheres da Boate La Licorne, de São Paulo, chegando tarde da noite. Senti vontade de ter a mesma vida.” Simone: Ainda é muito grande a violação dos direitos das prostitutas no Brasil? Gabriela: Vou citar um caso que me deixou muito acabada. Há uns anos atrás, o Ministro da Saúde solicitou um mapeamento da prostituição em todo o estado do Amapá para o desenvolvimento de um projeto ligado à AIDS. Eu fui para Macapá, depois segui de carro até Oiapoque. Passamos por várias áreas de prostituição na antiga transamazônica. A primeira coisa que acabou comigo foi ver uma casa, cujo dono era um jovem paulistano, cheio de colares de ouro, que durante o dia prendia as mulheres com cadeado. Quando perguntamos “por que você faz um negócio deste?”, ele disse: “para elas não fugirem”. Isso é cárcere privado. Meninas lindas trabalhando na fronteira do Brasil e vivendo em cárcere privado. Depois, na volta, presenciamos de tudo. Mulheres presas, apanhando da polícia, tudo relatado ao governo brasileiro. Alguns casos nos levaram ao choro, como uma menina de 16 anos que estava na prostituição há cinco. As pessoas falam muito. “Ah, tem exploração

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sexual de crianças e adolescentes”, isso e aquilo, mas ninguém faz nada. Em uma sociedade que se diz democrática, não pode haver escravidão nem criança trabalhando. Porque o dever da criança é estudar e brincar. Simone: Fala-se muito da relação entre poder e prostituição. Volta e meia, vêm à tona escândalos envolvendo políticos e prostitutas. O que há de real nisso? Gabriela: As altas casas de prostituição são frequentadas por políticos e por poderosos. Às vezes, as mulheres são contratadas para ir a festas. Então, acaba-se sabendo de histórias como a da famosa agenda daquela cafetina de Brasília. Em Bauru, no interior de São Paulo, havia uma cafetina cuja casa era frequentada por Juscelino Kubitschek. Os caras frequentam a prostituição, mas, quando chegam ao Congresso, não querem legislar em favor das prostitutas. Para se ter uma ideia, o programa mais barato no Café Photo, em São Paulo, custa de R$ 1,5 mil a R$ 2 mil. Não é para qualquer um, concorda? Simone: Em 2009 você lançou um livro. Me fale um pouco mais sobre ele. Gabriela: É. Filha, Mãe, Avó e Puta, da editora Objetiva. É sobre minha vida, minha profissão, minha longa jornada...É bem cru e direto. Simone: Desses papéis sociais, quais deles a senhora representa com mais paixão? Gabriela: Gostei da sua pergunta. Eu gosto muito de ser avó, sabe. Mas eu também gosto muito de ser puta. Simone: Como surgiu a ideia de escrever esse livro? Gabriela: Eu sempre tive uma vontade de escrever um livro. Mas eu guardava isso na gavetinha da Davida. Aí um dia eu fui convidada por uma pessoa da (editora) Objetiva, que me chamou pra almoçar, e perguntou se eu tinha interesse em escrever o livro. Eu demorei três anos pra escrever o livro e agora estou lançando. Simone: Você ganhou notoriedade no Brasil com o escândalo envolvendo um empório de roupas de luxo, a loja Daslu, de São Paulo. Numa espé-


“Eu gosto muito de ser avó, sabe. Mas eu também gosto muito de ser puta.”

cie de paródia à Daslu, você fundou a Daspu, que vende roupas fabricadas, por prostitutas. A fábrica emplacou? Como vão os negócios da Daspu? Gabriela: Hoje mesmo, toda a nossa equipe está em Limeira, interior de São Paulo, para uma grande feira de lojistas. Eu sou paulistana e posso falar: o interior de São Paulo é extremamente conservador, no entanto, a nossa grife, que é de prostitutas, foi convidada para apresentar e vender suas peças aos lojistas. Isto me dá uma grande alegria, porque precisamos do dinheiro para desenvolver nossos projetos, mas existe um outro lado que é dar visibilidade às prostitutas. Nunca pensei que a Daspu fosse ser tão importante nesta questão da visibilidade. Simone: E a ideia de criar a grife Daspu, quando veio à cabeça? Gabriela: Eu sempre pensei em fazer alguma coisa, até que huns 5, 6 anos, estava com alguns amigos tomando umas cervejas, comemorando o aniversário do Davida, falamos em fazer uma grife, uma coisa assim. Então um amigo disse que já tinha uma ideia de nome: Daspu. Ele mesmo fez a logomar-

ca e nós passamos então a pensar o que seria essa nossa grife. Mas como a gente se reunia muito em botequim, acho que alguém um dia ouviu a nossa conversa e saiu uma notinha no Jornal O Globo, dizendo que a gente tava a fim de montar uma grife que se chamaria Daspu. Daí veio um monte de jornalistas atrás de nós, mas a gente só tinha o nome e a logomarca. Mas o negócio foi indo, avançando, até que a Daslu quis nos processar porque disse que nós estávamos usando um nome muito parecido com o deles. A gente entregou a notificação extrajudicial para a imprensa e daí fomos convidados pelo Fantástico (TV Globo) e por um monte de programas, uma mídia espontânea muito grande… E assim nasceu a Daspu, que nem nos meus melhores sonhos eu imaginava que se tornaria o que é hoje.. Simone: Você continua exercendo a profissão de prostituta? Gabriela: Não, me aposentei, mas hoje sou uma militante do movimento. Até porque se for batalhar agora ganharia o café, mais ou menos. É igual jogador de futebol, depois de certa idade não dá mais. Simone: E o que você falaria para as meninas que desejam seguir a mesma carreira que você? Gabriela: Tet dolo et autem. Cus ipsum, coneste ndandit abo. Xim con nonsequia corem rem. Itatqui aeperia cum fuga. Solesci moluptam, suntusa peliqui

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valesca popozuda

Valesca Popozuda simboliza o controle do pr贸prio corpo e da sexualidade.


abriu a gaiola Valesca Popozuda mais do que pensam. Por trás do bum bum gigante e das letras de baixo calão esconde uma mulher indepedente e de personalidade forte. texto: emma goldman foto: divulgação Dadaísta, pós-feminista e compositora multifacetada, Valesca Santos, mais conhecida sob a alcunha de Valesca Popozuda (devido aos seus 550 ml de silicone em cada nádega), formou o grupo de funk carioca Gaiola das Popozudas em meados dos anos 2000 e hoje é reconhecida como uma das artistas pop de maior prestígio nacional. Sempre polêmica, Valesca não tem medo de usar o seu próprio corpo e sua sexualidade e , muitos menos de cantar e falar o que pensa. Criticadas por muitos, principalmente pelos rapazes e pelas moças mais conservadoras, devido sua “falta de pudor”, Valesca é, na verdade, o retrato da mulher sexualmente livre, da mulher que rompeu as barreiras do patriarcado e do falso moralismo existente dentro da sociedade. Para a maioria, as músicas de Valesca falam apenas de sacanagem e putaria, mas muitas delas, como Agora Virei Puta, possuem uma mensagem contra o machismo e os padrões impostos pela sociedade de “boa mulher”. Só me dava porrada! E partia pra farra! Eu ficava sozinha,esperando você Eu gritava e chorava que nem uma maluca... Valeu muito obrigado mas agora virei puta! Valesca possa simbolizar, pra muita mulhe-

res, o controle de sua própria sexualidade. E isso é importante. A liberdade sexual da mulher é uma bandeira fundamental pro feminismo. O corpo de uma mulher é sempre, numa sociedade patriarcal, visto como um bem público (pra ser tocado e avaliado na rua), ou como propriedade privada de um homem (primeiro o pai, depois o marido). A total autonomia de uma mulher sobre seu corpo será sempre uma bandeira feminista.

Frases de Valesca “Só comecei a entender que minha música poderia ser usada como um discurso quando as próprias mulheres chegavam para mim e diziam que o que eu cantava dava força para elas fazerem o que queriam e que eu falava muitas

“Ninguém tem que ser julgado pelo jeito que exerce sua sexualidade.” coisas que elas tinham vontade de falar.” “Sonho com o dia que vão parar de rotular as mulheres de puta ou piranha por causa de sua postura de vida, por causa de um determinado trabalho, como é o meu caso. Ninguém tem que julgar ninguém por causa do seu corpo. Por que a mulher que beija dois é piranha e o cara que beija duas é garanhão?””

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padrões de beleza

QUEBRA DE

PADRÃO

Não importa que corpo você tenha, insistem em fazer com que você se sinta infeliz com ele. texto: naomi wolf foto: divulgação Mulheres de proporções “perfeitas” estão em todas as revistas, anúncios, catálogos, comerciais de TV: 90 de busto, 60 de cintura, 90 de quadril, todas vestindo o desejadíssimo manequim 38. Elas vendem saúde, o sorriso é branquíssimo, o bronzeado vive em dia, uma pele sem manchas, uma bunda durinha e curvas perfeitas. Elas são um sonho. Elas são o que você não é. Elas são, aliás, algo ainda pior: elas são o que você poderia ser. A mulher ideal. Porque o que elas fazem é deixar as garotas “reais”, nós, com água na boca, famintas por todos aqueles atributos estampados ou projetados na tela. Ah, como elas fazem a gente viver de mal com a gente, não é? Você não se sente assim? Um pouco? Muito?

Por que isso é tão comum? De acordo com um levantamento da antropóloga norte-americana Jean Kilbourne, que analisa a imagem do corpo feminino na publicidade há mais de duas décadas, somos bombardeadas a cada semana por cerca de 3 mil anúncios publicitários que trazem modelos (mulheres ou homens) extremamente manipulados por programas de edição de imagem. Gente sem uma ruga, cicatriz ou imperfeição – além de serem quase sempre pessoas brancas e extremamente magras, cujo biotipo “small” (pequeno) diz respeito geneticamente a apenas 5% da população. Depois disso, como é que os outros 95% vão se sentir normais? Eles não se sentem. Quando tinha 20 e poucos anos, a cantora paraense Gaby Amarantos, 33, vivia às turras com o espelho. “Só me vestia

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de preto”, diz. “Achava que menina gordinha devia usar preto porque fazia parecer mais magra.” Na época, teve depressão e desenvolveu bulimia. “Eu achava que não tinha nenhuma chance, que, para ser cantora, ter namorado e uma vida legal, uma mulher tinha que ser magra.”

De todas as formas Temos que levar em consideração que a ditadura da beleza é também uma condição machista. As mulheres tem como obrigação serem lindas e magras para agradar o homem e sempre são julgadas quando engordam, o que não acontece com o sexo masculino. Casos como o de Gaby Amarantos são importantes para mostrar que fama, talento e magreza não são equivalentes. E que é possível sim ser feliz sim ser ser magra. Além de Gaby, muitas outras mulheres da mídia são consideradas “gordas”. Recentemente, a norte-americana Christina Aguilera chamou atenção de todos por ter engordado. Christina, que antes tinha um maquenim invenjado por 9 em cada 10 mulheres, não ligou para os comentários e soltou, “Sou gorda, aceitem”.

“Perdi muito tempo da minha vida sendo infeliz e me aceitei completamente. As pessoas acham que se você não é magra você tem que ser infeliz”

GABY AMARANTOS


Satisfeira com o corpo e a aparência, Gaby abusa da maquiagem e dos adereços chamatimos


especial xxxxxx violência doméstica

Junto a professora, mulheres que sofreram violência doméstica no passado, preparam-se para mais uma dança,

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sem medo

uma luz no fim do túnel a todas as mulheres vítimas de violência doméstica e uma esperança de vida nova. matéria: nina cristina wyatt foto: nina cristina wyatt

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m grupo de mulheres usando lenços cheios de penduricalhos na cintura dança e ri. São mulheres de todos os tipos, de todas idades, de todas etnias, de todas classes sociais, mas com algo em comum, foram todas vítimas de violência doméstica e tentam, juntas, superarem a dor do passado. No Centro de Referência da Mulher Eliane de Grammont, localizado em São Paulo, essas mulheres tem a chance de ver a vida recomeçar. Além de psicológos e assistentes sociais, elas possuem várias atividades como dança e teatro. Mas o mais importante é companhia que uma tem da outra, o apoio de alguém que passou por algo semelhante. Entender a dor do outro é fundamental para curá-la. Eliane de Grammont O Centro de Referência da Mulher Eliane de Grammont foi fundando em 1990 e foi o primeiro centro de apoio às mulheres do Brasil. Seu nome faz referência a Eliane de Grammont, cantora de bar morta em 1981 pelo seu ex-marido enquanto cantava em um bar.

Sua criação foi feita por um grupo de feministas e partiu devido a crescente violência contra a mulher presente mo Brasil e da necessidade de um local que apoia-se as mesmas. O orgão pertence e é mantido pela Prefeitura de São Paulo. Hoje, é o principal centro de apoio mulheres de São Paulo e atende mulheres de todas as aréas de cidade. Qualquer mulher vítima de violência pode procurá-lo. Ao contrário dos que muito pensam, a violência doméstica também atinge as casas de classe mais elevadas. No Eliane de Grammont há mulheres pertecentes a todas as classes e também de todas as ideias e etnias. “A violência doméstica é democratica”, diz Marisa, uma das assistentes sociais do Eliane de Grammont. Outra observação iwmportante é que o centro também recebe mulheres homossexuais que sofreram algum tipo de agressão da parceira. Muitas mulheres costumam dividir os papeis quando vivem uma relação homoafetiva, logo, a mulher que coloca-se no papel do homem sente-se no direito de agredir a parceira que está no papel feminino. 23 SIMONE | NOV 2012


No Eliane de Grammont todas tem direito a rir e a ser feliz.

Tempo de recomeçar A violência contra mulher não machuca só o corpo como também a alma. Mais difícil que aguentar a dor física é superar a dor que fica na alma. Admitir que foi vítima é tão difícil quanto. O Centro Eliane de Grammont busca devolver a mulher a alto estima, o sorisso, a vida...E em muitos casos consegue. A felicidade é vísivel nos olhos delas. Enquanto dançam, elas riem e fazem piadas umas com as outras. Comentam da vida como se fossem amigas de longa data, muitas delas frequentam o Eliane de Grammont há tanto tempo que realmente são. “Aqui nós temos apoio e nunca estamos sozinhas”, diz uma das mulheres. O apoio mútuo é importantissímo na recuperação da auto estima. Uma mulher apoia a outra e assim, as poucos, uma consegue devolver o sorriso a outra. A violência no Brasil Estima-se que no Brasil a cada quinze segundos cerca de uma mulher é vítima da violência. Essa dado assustador é apenas mais um reflexo 24 SIMONE | NOV 2012

da sociedade machista em que estamos vivendo. As mulheres não são agredidas por serem fisicamente mais fracas que os homens, são agredidas porque os homens as vêm como mais fraca em todos os sentidos, a vêm como um objeto de posse no qual pode-se quebrar, devolver e fazer o que bem entender com ele. São agredidas por machismo refletidos em forma de ciúmes, por exemplo. A violência não precisa ser necessariamente física. Um homem que impede a mulher de trabalhar ou que a proibe dela usar uma roupa x ou andar com determinada pessoa também está praticando um tipo de violência. A violência psicologica é tão dolorosa quanto a física, muitos homens inferiorizam mulheres e as desreipetam o tempo todo. Esse tratamento leva uma queda da auto estima, a depressão, crises pânicos etc. Fora do ambiente doméstico, a violência também está presente. Assedíos no ambiente de trabalho, cantadas na rua, propagandas que exploram o corpo da mulher tratando-o como mercadoria...De tão comum que a violência fi-


z.

cou nem mesmo é notada, mas ela existe. Mulheres de todas as idades sofrem com todo tipo de violência e não se dão conta. Elas estão condicionadas a achar que violência é normal, que não existe de fato. Maria da Penha neles! Devido toda essa violência surge a necessidade de uma lei específica para combatê-la. Em 2006, a lei número 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha entra em vigor no Brasil. A lei alterou o Código Penal Brasileiro e possibilitou que agressores de mulheres no âmbito doméstico ou familiar sejam presos em flagrante ou tenham sua prisão preventiva decretada, estes agressores também não poderão mais ser punidos com penas alternativas, a legislação também aumenta o tempo máximo de detenção previsto de um para três anos, a lei ainda prevê medidas que vão desde a saída do agressor do domicílio e a proibição de sua aproximação da mulher agredida. O caso nº 12.051/OEA, de Maria da Penha Maia Fernandes, foi o caso homenagem à lei 11.340. Ela foi espancada de forma brutal e violenta diariamente pelo marido durante seis anos de casamento. Em 1983, por duas vezes, ele tentou assassiná-la, tamanho o ciúme doentio que ele sentia. Na primeira vez, com arma de fogo, deixando-a paraplégica, e na segunda, por eletrocussão e afogamento. Após essa tentativa de homicídio ela tomou coragem e o denunciou. Maria da Penha representa todas as mulheres vitímas de violência. A lei foi um grande marco na luta das mulheres. Infelizmente, ainda são poucas as mulheres que tem coragem de ir a justiça, muitas vivem uma relação violenta por anos e aguentam a dor sozinha. O medo de denunciar está ligado ao medo do abandono por parte do marido ou namorado e também por uma agressão ainda maior. Mulheres não gostam de apanhar de seus parceiros, mas também temem ficar sem eles, sozinhas e acham que o amor pode superar as agressões.

O Centro de Referência da Mulher Eliane de Grammont está localizado na Rua Dr. Bacelar, n.20, na Vila Mariana, em São Paulo. Caso tenha interesse ou sinta necessidade, entre em contato pelo telefone 11 5549-9339.

NO BRASIL, A cada 15 segundos, uma mulher É VITÍMA de ALGUM TIPO violÊNCIA. A violência doméstica em números 63 Seis em cada 10 brasileiros conhecem alguma mulher que foi vítima de violência doméstica. Desse total, 63% tomaram alguma atitude, o que demonstra a mobilização de grande parte da sociedade para enfrentar o problema.

27% das mulheres entrevistadas declararam já ter sido vítimas de violência doméstica – enquanto apenas 15% dos homens admitiram ter praticado esse crime.

62% que exista a violência psicológica.

94% dos brasileiros conhecem a Lei Maria da Pena, mas apenas 13% sabem o conteúdo

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reflexão

UMA LONGA JORNADA

texto: nina wyatt ilustração: graffiti deanarkia boladona

Não é fácil. Não é fácil defender um ideal contrário a uma ideia quase que coletiva. Não é fácil pensar diferente. Liberta-se do machismo intrínseco em nossa cabeça é ainda mais difícil. De uma forma ou de outra, somos criadas de forma machista e alimentadas com o pensamento machista presente em nossa sociedade. O machismo está presente em tudo, desde as histórias infantis às propagandas de cerveja e de carros. Não é exagero, é fato. Pense em todas que colocam a mulher no papel de objeto ou mesmo naquelas voltadas ao público feminino que transformam a mulher em um estereótipo. Pense em todas as revistas que tentam te enquadrar em um padrão quase que impossível de ser alcançado apenas para chamar atenção dos homens e causar inveja nas outras mulheres. Pense nas histórias que você ouvia quando criança, a princesa triste e solitária espera pelo príncipe para a fazer feliz e completar. Pense nas novelas que classificam mulheres como fáceis e difícis, sendo que a primeira é inferior a outra. Pense nas músicas que tocam na rádio. Pense em nossos comediantes. Pense em todas as piadas. Pense em como é todo dia ouvir o que não queremos de gente que não conhecemos. Pense e pense mais um pouco. Pense e liberte-se de tudo aquilo que ainda está preso em sua memória. É uma jornada longa e difícil, mas provavelmente bem mais fácil do que entrar em um manequim 36 ou encontrar o homem da sua vida. Quanto mais abrimos nossa mente e nos libertamos dessas ideias retrógadas, mais percebemos o quão importante e fundamental é a mudança.

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