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OUTUBRO DE 2012. ANO III. NÚMERO 14
DISTRIBUIÇÃO GRATUITA - VENDA PROIBIDA
Arrocha
JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL/JORNALISMO DA UFMA, CAMPUS DE IMPERATRIZ SUZAIRA BRUZI
Crianças e jovens: ensaios do futuro
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Arrocha TIRINHA
EDITORIAL - Adultos de amanhã Um simples passeio por Imperatriz permite perceber como a cidade está cheia de jovens e crianças. Brincando nas portas das casas, praticando atividades físicas nas praças ou namorando nas baladas, sem falar nas saídas de escolas. A força jovem deixa a cidade mais viva. Nesta edição os acadêmicos do curso de jornalismo decidiram olhar com mais atenção e ouvir aqueles que serão os adultos de Imperatriz daqui a pouco tempo. Quais são os seus sonhos, frustrações, esperanças? Perguntas muitas vezes de difícil resposta para quem vive a inocência da infância ou o período de indecisões da adolescência. Na página de entrevista (9) uma
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KELLY SARAIVA
psicóloga ajuda a trazer a luz do olhar especializado sobre várias das questões abordadas nas reportagens desta edição. Para tratar de assuntos como mudanças do corpo; profissão sonhada; os talentos juvenis; religião entre os jovens; brincadeiras de ontem e de hoje; abandono dos pais e outras tantas nuances, fomos ouvir as próprias crianças e adolescentes. O objetivo foi entender a cidade pela sua perspectiva especial, por meio da infância e da juventude. Boa leitura. Arrocha: É uma expressão típica da região tocantina e também é um ritmo musical do Nordeste. Significa algo próximo ao popular desembucha. Mas lembra também “a rocha”, algo inabalável como o propósito ético desta publicação.
Ensaio Fotográfico DANIEL SENA
MAYARA GABRIELLE
VICTOR AURELIO
DANIEL SENA
EXPEDIENTE
Jornal Arrocha. Ano III. Número 14. Outubro de 2012 Publicação laboratorial interdisciplinar do Curso de Comunicação Social/Jornalismo da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). As informações aqui contidas não representam a opinião da Universidade. Reitor - Prof. Dr. Natalino Salgado Filho | Diretor Prótempore do Campus de Imperatriz - Prof. Dr. Marcelo Soares | Coordenadora Pró-tempore do Curso de Jornalismo - Profa. M. Marcelli Alves.
Professores: M. Alexandre Maciel (Jornalismo Impresso), M. Marco Antônio Gehlen (Programação Visual), M. Li Chang Shuen Cristina (Fotojornalismo). R-evisão: Dr. Marcos Fábio Belo Matos. Reportagem: Cristina Costa, Dayane Silva, Edigeny Soares, Evanilde Miranda, Genyedi Soares, Guilherme Barros, Heliud Santos, Jéssika Ribeiro, Layane Ribeiro, Patrícia Araújo, Raimundo Cardoso, Ramon Cardoso Raphael Giannotti, Suzaira Bruzi.
ROSANA BARROS
Diagramação: Adriana Dias da Silva, Andre Ricardo Guimaraes Cadete, Andreza Vital da Silva Pinto, Angela Maria Laurindo da Silva, Aurikelly Renata Saraiva, Breno Rafael Alves Franco, Camila de Sousa Silva, Cicero Fernando Pereira Alves, Diego da Silva Carreiro, Dionnatha da Conceicao Silva, Erica Fernanda Silva Ferreira, Flavia Brito Silva, Flavia Luciana Magalhaes Novais, Francisca Sheila Rodrigues da Costa, Giovana Cordeiro Cardoso, Israel Shamir Mendes Chaves, Jhonatha Pereira dos Santos, Jorzennilio Alves Junior, Lanna Luiza Silva Bezerra, Luanda Vieira de Oliveira, Maria Rhemylla Oliveira, Marina Pereira Cardoso, Railson de Andrade Carvalho, Railson Silva Lima,
Samia Said Mulky, Samoel Pereira de Freitas, Sueda Marilia Silva Borges, Yanny Dorea Moscovits.
Fotografia: André Wallyson, Cristina Costa, Dayane Silva, Daniel Sena, Edigeny Soares, Evanilde Miranda, Fernando Costa, Heliud Santos, Jéssika Ribeiro, José Bispo De Sousa, Layane Ribeiro, Mayara Gabrielle, Patrícia Araújo, Paula de Társsia, Raimundo Cardoso, Ramon Cardoso, Rômulo Fernandes, Rosana Barros, Suzaira Bruzi, Victor Aurelio.
Acadêmicos: André Wallyson, Fernando Costa e Paula de Társsia. Tirinha: Kelly Saraiva
Contatos: Fan Page: www.facebook.com/JornalArrocha www.imperatriznoticias.com.br | Fone: (99) 3221-7625 Email: contato@imperatriznoticias.com.br
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TALENTOS Jovens de Imperatriz demonstram habilidades para a dança, teatro e música. Eles anseiam por novas conquistas e encontram nessas atividades meios de escape
Arte que encanta e impulsiona desejos RAMON CARDOSO
HELIUD SANTOS
Jorge Luiz em mais uma rotina exaustiva de ensaios, se prepara para o Miami City Ballet, umas das refereências na área
Francisco Lucas, que começou a tocar aos 7 anos de idade, mantém o hábito de treinos diários e estudos para o vestibular
HELIUD SANTOS
As mãos pairam no ar feito plumas em queda livre. Os braços, graciosamente esticados, buscam o equilíbrio a todo instante. As pernas estão pousadas em forma de ‘P’, sustentadas pela ponta do pé. Com um brilho de poucos, ele empina o rosto. Fita o seu próprio reflexo, no grande espelho à sua frente. Os olhos cor de mel parecem enxergar o infinito. Quem o vê logo percebe, ele quer mais, muito mais.
O garoto que vive a maior parte do tempo nas “alturas” é Jorge Luiz, de 13 anos. Ele descobriu bem cedo a sua verdadeira paixão. Aos sete, se interessou pelo balé na escola em que estudava e desde então, não parou mais. Descrito pelos amigos como hiperativo e extremamente carinhoso, o pequeno bailarino refaz incansavelmente o mesmo passo inúmeras vezes. Flávia Homobono, professora de Jorge, destaca que o garoto tem futuro na dança. “Ele nasceu com
Luzes, câmera, ação: cenas da vida de uma jovem atriz HELIUD SANTOS
Sincera, feliz, engraçada, extrovertida, fã de Paulo Autran. Essas são algumas das qualidades que definem a atriz e estudante Raylene Costa Souza. Suas caras, bocas e trejeitos no palco não deixam dúvidas: ela é um sucesso. Diz que ao compor seus tipos não se inspira em ninguém específico. “Cada personagem é um desafio. O diretor diz o perfil e a gente procura fazer um laboratório”. A jovem atriz relembra que começou encenando peças na igreja. Interessou-se por teatro na escola, quando foi convidada a recitar poesias. Sua maior experiência na área foi com a companhia de teatro Okazajo, entre os anos de 2006 e 2011. Esse grupo tem por marca principal o fenômeno de atrair uma plateia numerosa em suas apresentações no Teatro Ferreira Gullar. Seus espetáculos já se tornaram históricos em Imperatriz pela ironia
dos textos, que trazem comentários sarcásticos sobre vários costumes típicos da cidade. Hoje, Raylene Costa continua desempenhando papeis em outros projetos, como o grupo de dramatização de uma igreja católica no bairro Bacuri, onde frequenta. No princípio teve que enfrentar preconceitos e a desconfiança inicial da família. Todas essas dificuldades esvaíram-se na medida em que a nova escolha era tratada com seriedade e dedicação pela estudante. “Meus pais começaram a frequentar o teatro, assistir aos espetáculos e mudaram o conceito. Mas não me apoiaram quando resolvi fazer a inscrição do vestibular para artes cênicas”. O interesse foi passageiro. Hoje Raylene Costa cursa direito e faz teatro porque se sente bem. “O palco é onde eu alivio todas as tensões, sinto a energia do personagem”.
a habilidade motora nata, voltada para o balé clássico”. Talento esse, que foi comprovado internacionalmente. Jorge acabara de ganhar uma bolsa integral na companhia de Balé da cidade de Miami (Miami City Ballet), uma das referências mundiais nesse tipo de dança. O pequeno bailarino tem o sonho de seguir a carreira profissionalmente e declara: “Eu amo dançar”. Música - Os dedos ágeis dedilham precisamente as cordas do violão. Os acordes se unem, a me-
lodia vai sendo criada aos poucos. Logo a harmonia dos sons tocados por Francisco Lucas, de 18 anos, inunda os espaços onde ele está presente. Lucas é uma exceção, aprendeu a tocar instrumentos musicais aos sete anos de idade. Sozinho. “Eu lia as revistas de cifras da minha irmã e aprendia”, relembra. Começou com a flauta, depois o violão da irmã, que tocava escondido no quarto. Hoje ele toca guitarra, flauta, baixo, cavaquinho,
violino, gaita e teclado. E como todo bom músico, gosta de desafios: “Não gosto de tocar Metallica, é muito fácil, prefiro Angra ou Sepultura”, gaba-se. Fã do músico multi-instrumentista Kiko Loureiro, não suporta sertanejo e explica: “É muito chato, além dos acordes sem criatividade, os solos são pobres e as letras fracas”. Francisco já recebeu vários convites para tocar em bandas, mas recusou por causa da pouca idade. Por enquanto o estudo é a sua prioridade.
JOSÉ BISPO DE SOUSA
Raylene Costa fez parte da Companhia de Teatro Okazajo de 2006 a 2011. “O palco é onde eu alivio todas as tensões e sinto a energia do personagem”
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ADOLESCÊNCIA Ao mesmo tempo que relembra das experiências anteriores com as meninas, Rafael Costa diz que, no momento, está “repensando os seus objetivos”
Mudanças da puberdade geram dúvidas EVANILDE MIRANDA EVANILDE MIRANDA
Rafael Costa, 17 anos, afirma que antes “traçava” qualquer uma, não era muito de escolher. Ele anda muito indeciso se troca o “ficar” por uma namorada
Rafael Costa, 17 anos, 1.78 metro, cabelo moicano, líbero na Escolinha do Flamengo, descalço, de short e camisa do Manchester, confessa, desinibido: “Eu fiquei alegre foi quando nasceu meus pubianos”. Nas “brincadeiras” de escola ele é o tal. “Comigo traçava qualquer uma, eu não tava nem aí, nunca fui muito de escolher. Agora que eu tô querendo escolher, mas antes, beijava todo mundo”. E que experiência! “Foi o selinho, aí foi aumentando o nível, puxando os lábios, depois foi pro beijo de língua”. O namoro foi na mesma época, de 9 para 10 anos, durou um mês. Preferiu a liberdade e propôs apenas “ficar”. “Eu sei que tem outras meninas diferentes, mas minha experiência foi ruim. Ela queria controlar meus passos e eu não me submeto a isso”. Agora Rafael Costa está só “ficando”. Ele já tem uma consciência bem formada sobre a diferença entre cada tipo de relacionamento e as consequências que podem gerar. “O lado ruim é porque você nunca tem a pessoa fixa que vai tá com você toda hora. E o lado bom é que tem muitas opções, vai prum lado, vai pro outro. Mas num tem aquela pessoa pra dizer, é minha namorada, meu amor, pra tá abraçando toda hora”. A primeira relação sexual foi após ouvir as palavras solidárias do tio: “Vai se não tu vai dormir
lá na casa do cachorro hoje”. Com certo temor ele pensava: “Meu Deus, será que eu dou conta?” Pegou o preservativo e ficou conversando com a menina. “Entramos pro quarto, ficamos se beijando e tal. Mas tudo era só ela que falava, por incrível que pareça, eu não conseguia dizer quase nada”. Criado pela mãe, Rafael buscou referência paterna no avô, auxílio para as orientações sexuais da mãe e nas rodas de conversa dos amigos mais velhos. Questiono se tem vida sexual ativa. “Agora não estou na ativa, porque eu tô um bom tempo sem. Sei lá, tô repensando meus objetivos”. Aleguei que na ausência do sexo, geralmente muitos recorrem à masturbação. “Eu não. Já tive a experiência. Acho que dez, onze anos porque na escola ficavam falando só nisso. As crianças tão ficando muito precoce”. No time de futsal, tinha fama de bonzão. Quando alguém caía a culpa era dos hormônios. “Que nada, tá batendo muita punheta”. Não sabia o que era e só entendeu quando viu os garotos fazendo gestos com as mãos que indicavam os movimentos da masturbação. “Ah, vou experimentar porque num pode. Se disseram que fica morto por causa disso! Fui banhar 11 horas, aí pan, pan, pan, aí fiquei, 12 pra 13 anos, nada né? Os caras já eram mais velhos, 15, 17. Ai comecei, tam, tam, tam, e nada, eu não sentia nada. Meu Deus, pra que eu tô fazendo isso mesmo? Não, isso num dá pra mim não!”
Adolescência exige aprendizado sobre várias formas de se relacionar EVANILDE MIRANDA EVANILDE MIRANDA
Henrique Oliveira, um rapaz de voz mansa, fala tranquilamente como se o tempo parasse para ouvi-lo contar sua história. “Aos 9 anos eu já tinha arquitetado quase tudo na minha vida. Com quantos anos ia terminar os estudos, fazer alguns cursos, me empregar num emprego tal e por aí vai”. Mas as coisas mudaram de rumo. Saíram de Minas Gerais para o Maranhão, onde passaram muitas necessidades. “Aos 17, vou confessar, foi a fase psicológica, emocional, alimentar todas as áreas mais difíceis da minha vida”. A vontade de namorar veio aos 9 anos. O primeiro beijo, aos 12, com a garota com quem foi fazer um trabalho. A atitude partiu dela. “Quando entra nos 15 anos já é outra coisa. Aí é mais sério! Eu acho que comecei um pouco atrasado, tinha 14 anos quando começou nascer pelos nas axilas, nas partes íntimas e a desenvolver a questão da massa muscular. Ficava revoltado, com 15 anos eu parecia ter 12”. As mudanças não paravam. “Nos 16, namorar virou quase uma prioridade. Tenho que namorar, tenho que namorar! Começou a tensão na minha cabeça, olhando pras jovens, até
pra mulheres casadas”. Quando fez 18, começou a entender “que a gente não deve tá assim ansioso, deve primeiro buscar uma estrutura”. Perguntei sobre sua vida sexual. Ele rodeia com uma contra-pergunta. “Tu quer ouvir o que tu quer ou a verdade?” Em tréplica eu disse: “Quero ouvir o que de fato é! “Foi com 15 anos. Comecei a conversar com as meninas, uma entrou no assunto, aí foi! Foi até estranho. Fui um oportunista, se eu não fizesse passava por mole”. Perguntava muito. Aos 14, apanhou da mãe porque quis saber pra que servia absorvente. Aos 15, não perguntava mais. “A maioria das coisas eu aprendi experimentando”. Sem apoio financeiro, emocional e afetivo, era rejeitado pelo pai, que duvidava da própria paternidade. “O meu pai nunca me deu nada. Me deu uma cueca e não serviu pra mim. Ficou pra ele”. Os presentes que ele ganhava eram dos primos, que compravam para alguém, não serviam e eram repassados para ele. “Às vezes eu comprava roupa e ele rasgava. Comida, ele jogava fora. Na hora da briga eu não apanhava. Quando isso acontecia, minha mãe me batia”. Citou os defeitos da família. Garantiu não os possuir. Então qual seu defeito? Repetiu a indagação umas duas vezes dizendo ter gostado da
Henrique Oliveira repassa a sua vida com sinceridade, analisando seu aprendizado de relacionamento com a família e com as meninas
pergunta e entre risos declarou-se teimoso. “Eu sou teimoso porque as pessoas só querem me colocar pra baixo”. Depois de vários lugares, ago-
ra na casa de Luís Pires, que o chama de filho, Henrique tem outras perspectivas de vida. “Hoje eu tenho capacidade de realizar. Não sabia que
a gente poderia passar no Enem e fazer faculdade de graça”. Finalizou dizendo que sempre odiou jornalistas. “Eles perguntam demais”.
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INFÂNCIA Ana Caroline é vaidosa e tem muita imaginação. A garotinha adora assistir desenhos animados, pintar as unhas, pranchar o cabelo e brincar de salão
Com seis anos, Ana já sabe bem o que quer
SUZAIRA BRUZI
Com apenas seis anos, a menina precoce tem idade de criança e conversa de mulher. Casar com um homem rico, poderoso, cheio de “florzinha” e que fique sempre calado, faz parte dos planos da garotinha que não para SUZAIRA BRUZI
Pintar as unhas, fazer maquiagem, pranchar o cabelo, colocar pulseiras, usar vestido florido e calçar sandálias cor-de-rosa. “Assim eu vou arrasar”. Ana Caroline Cunha Mota mora com a avó, a mãe, os dois irmãos de 9 e 11 anos e uma prima adolescente, por quem é apaixonada. A casa é simples, mas nota-se ao longe que é cheia de afeto. É absurdamente louca por chocolate, adorava assistir aos dese-
nhos animados de Bob Esponja e da Barbie. Sua brincadeira predileta é a que está fazendo comigo agora, chama-se brincar de salão. Ela enche os cabelos de quem aparecer, com presilhas, grampos, tiaras, xuxinhas e ainda pinta, corta e prancha. Os meus já estão vermelhos. Ana Caroline além de vaidosa tem muita imaginação. Com apenas cinco anos, a precoce tem idade de criança e conversa de mulher. Seu maior desejo é se casar. “Eu vou arrumar namorado na feira. Vai ter uma mesa cheia de
bolinhas, e vai ter uma com meu nome e um namorado dentro”. Criativa, acrescenta que ele poderá ser feio, mas será rico, poderoso e cheio de “florzinha”, além de ficar sempre caladinho. Ela quer casar para sair de casa e comer todos os dias no Pica-Pau Lanches. Moreninha, magrinha, com cabelos cacheados na altura dos ombros, olhos grandes e enormes expressões. Tudo o que a espertinha e carinhosa quer é dormir com a prima e novamente se encher de chocolate, mas “a vovó não deixa”.
No entanto, quando crescer, Carol quer ser consultora Romanel “para usar aquelas jóias lindas”. Deseja muito dinheiro para comprar todo chocolate do mundo. Mas enquanto isso não acontece, ela frequenta uma creche, muito a contragosto. A menina faz garras com as mãos, ruge e range os dentes para contar que não gosta dos colegas. Bate neles sempre que possível. Tem temperamento forte e não gosta de ser contrariada. Se isso acontecer “eu vou te deixar no meio da rua e com frio, pro carro
passar por cima”. Ela não consegue dizer isso sem um riso meigo. Mas, ao ser questionada sobre o que a deixa feliz, ela muda completamente a expressão e responde: “Jesus. Ele me perdoa, agradece as crianças e agradece às mães”. Imediatamente, emenda uma oração: “Papai do céu, obrigada por esse dia maravilhoso e por tudo que eu faço”. No fundo, Carolzinha é doce como o chocolate que tanto ama e sobre o qual fala a cada dois minutos.
Adolescente não tem pressa para amadurecer. Estudo é a prioridade PATRÍCIA ARAÚJO PATRÍCIA ARAÚJO
Mudanças fazem parte do crescimento, é o que Guilherme dos Santos Anchieta, 12 anos, está descobrindo. “Antes eu era super carinhoso. Acho que é os hormônios que estão fazendo isso. Agora eu tô agressivo, esse ano tô muito agressivo por que tô entrando na puberdade”. Guilherme é um menino tímido, que está vivendo um período de transição entre a infância e a préadolescência. Em sua casa, sentados no chão da sala de estar, com a TV ligada para direcionar seu olhar, ele me conta que suas ideias chocam-se com as dos seus pais. Suas responsabilidades aumentaram e ainda tem a mudança de escola e as novas amizades que influenciam seu comportamento. Ele conta que seus novos amigos têm uma cabeça diferente da sua. Enquanto ele quer ir devagar com essas transformações e emoções, eles têm pressa. “Tenho uma colega de 13 anos que ela já namora, a mãe dela já liberou”. Pergunto o que ele pensa sobre isso, se está na hora dele
Guilherme quer acostumar-se com o mundo, seguindo o curso natural de seu crescimento com consiência,responsabilidade e tranquilidade
namorar? “Não, sou muito novo”. E ficar? Com um sorriso faceiro, responde: “Minha mãe já liberou ficar, mas namorar não pode”. Diz já ter
ficado com várias garotas, mas só isso, sem qualquer compromisso. Amadurecer - Seus amigos o chamam de meninão por causa da
mudança de voz e por não querer namorar. “Quero namorar com 14 anos, quando minha cabeça já estiver acostumada com o mundo”. E
explica que até 2010, não sabia o que era o mundo de verdade, sua mente ainda era de uma criança. Este pequeno adulto passou a se importar com coisa serias. Ele fala de um amigo da escola que está com câncer, os colegas se reuniram para escrever uma carta de apoio a este companheiro. “Se eu tivesse um amigo desse com câncer o ano passado, eu não daria importância. Agiria como se fosse uma gripe, por que eu não sabia dar importância de dar uma ajuda psicológica a alguém assim”. 2011 e 2012 foram anos de intensas transformações na vida do jovem Guilherme. A maturidade batendo à sua porta e com ela um mundo de emoções e mudanças difíceis de controlar. Ele diz não se assustar com tudo isso, está levando com naturalidade. Seus pais, Eliana Pereira dos Santos e Antônio Jardins Anchieta, conversam com ele sobre a vida e o orientam, afirma Guilherme. A puberdade do meninão trouxe-lhe mais que agressividade na sua bagagem. Com ela veio uma boa dose de maturidade.
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RELIGIÃO Encontros de catequese envolvem atividades dinâmicas em grupos e a linguagem é adaptada a cada faixa etária, privilegiando o estudo da Bíblia
Formação religiosa voltada aos jovens
ANDRÉ WALLYSON
Segundo dados do documento “A catequese do nosso tempo”, deixado pelo papa João Paulo II, esta prática é a educação da fé das crianças, dos jovens e dos adultos oferendo, de forma orgânica e sistemática, o ensino da doutrina cristã DAYANE SILVA
Domingo, 9 horas. Reunidos em sala, dez dos 22 alunos matriculados na turma de crisma. Todos sentados em círculo. Dois jovens direcionam o estudo. Aqui, o catequizar e o vestir possuem traços joviais. Atrativos da coordenação. Logo na chegada, percebo um ambiente acolhedor. Ao fundo, ainda ecoa uma música cristã, tocada por um grupo em ensaio. Na reunião, garotos e garotas em seus mais diversos estilos se atêm ao início da lição.
“Como podemos aproveitar a vida?”, indaga o catequista. “Acho que fazendo a vontade de Deus!”, responde a estudante. Perguntas feitas aleatoriamente. Respostas subjetivas. Alunos e professores interagem em mesmo código linguístico: a jovialidade. A oração do Pai-Nosso abre mais uma reunião, unindo as mãos ali presentes. O tema: “Quem sou eu?” é levantado logo no início. Mas, não há respostas do alunado. Explicações surgem com base em uma leitura bíblica. “Vós sois o sal da terra e a luz do mundo”, Mateus 5: 13.
Aos poucos a interatividade ganha espaço. “Perceberam que tem um papel colado na cadeira de vocês? Quem pode ler?”, questiona o catequista. Um “eu” entusiasmado rompe a timidez. Em seguida, Dalila Silva, 15, explica que só Deus conhece a nossa mente. Sua irmã, Maria Thaynara, 17, ressalta que as duas vêm à igreja por espontânea vontade. “Venho à igreja para aprender mais sobre a palavra de Deus, e passar adiante, por que não adianta nada, guardar para si”, afirma. Felipe de Moraes, 19, trabalha há quatro anos na área. Ora
como coordenador da catequese, ora catequista. Não há distinção de idade entre os professores de catequese. Um compromisso é aceito no início do ano. Para ele, “um bom catequista, é aquele que se preocupa com o encontro durante a semana”. Comunhão – Do grego Kat-ekhéo significa fazer ecoar a palavra de Deus a si e ao próximo. Atualmente, a catequese busca quebrar paradigmas como “dar catecismo” ou “preparar crianças, adolescentes e adultos para a primeira eucaristia e crisma. Os encontros envolvem atividades dinâmicas em grupos. A linguagem é
adaptada a cada faixa etária. No roteiro, o estudo da Bíblia e de uma apostila. Na aula, estudantes são co-participantes do processo de educação, que busca fortalecer a fé. Segundo dados do documento Catechesi Tradendae (CT) ou “A catequese do nosso tempo”, deixados pelo papa João Paulo II, “a catequese é uma educação da fé das crianças, dos jovens e dos adultos, a qual compreende especialmente um ensino da doutrina cristã, dado em geral de maneira orgânica e sistemática, com fim de os iniciar na plenitude da vida cristã”.
Adolescentes debatem experiências e desafios da vida cristã nos encontros da Escola Bíblica Dominical DAYANE SILVA
“Júnior, Júnior, uma fonte não pode jorrar dois tipos de água, doce e salgada”, relembra Ailton Júnior, 18, de um alerta feito por uma amiga da escola, quanto à postura do crente. Nesse episódio, ele cantara um trecho de uma música secular. Ailton “nasceu” no evangelho e é filho de pastor da igreja Assembleia de Deus. Mesmo com particularidades de um jovem, seu comportamento deve ser redobrado. Participa ativamente da Escola Bíblica Dominical aos domingos, na turma de jovens. No encontro, professor e alunos, experiências e desafios da vida cristã. “Irmã Elida, ouvi dizer que a gente deve tomar cuidado na oração, quando falar de nossas fraquezas, por que o inimigo pode usar isso contra a gente”, questiona um dos membros. “Sim, sim, isso é verdade, a Bíblia sagrada fala que mesmo antes de pedirmos algo a Deus, Ele já conhece o desejo do nosso coração. O inimigo não pode ler nossos pensamentos”, afirma a professora auxiliar.
DAYANE SILVA
Durante os encontros são discutidos as experiências e os desafios para aqueles que decidem seguir uma vida cristã, principalmente os jovens
Elida Santos, 30, mãe de dois filhos, com traços comunicativos, auxilia há quatro na escola. Hoje, traja saia nos joelhos e blusa de mangas. Antes, na sua mocidade, “adorava usar calças jeans” e “sair com as amigas”. Ela conta-nos como se reaproximou da igreja. Ano 2000, virada, fim do mundo? Sua família vai à igreja. Elida a um show em praça pública. Um temporal aproxima-se. Já no local, chuva forte e relâmpagos impedem a realização do evento. Pessoas correm. Ao fundo, um homem grita sarcasticamente, “É o fim do mundo”. Trovoada. Lembra-se da família, sente-se só. Desde então, tivera a certeza sobre a direção nova a ser seguida. “Eu não quero mais isso para mim”, ressalta irmã Elida. Mesmo em um grupo pequeno, há ajuda ao próximo. Thaís Sampaio, 18, conta que estava sem frequentar as aulas a algum tempo, mas o incentivo dos amigos a trouxe de volta. “Quero viver mais no caminho do Senhor”.
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LIÇÃO A jornada da superação tem muitas surpresas, e uma das mais agradáveis é Taynara. Contra todas as barreiras ela afirma o lugar dos especiais na sociedade
Moça especial é, antes de tudo, “uma forte” RAMON CARDOSO
RAMON CARDOSO
Muito carinhosa, Taynara faz questão de puxar a mãe para um longo e terno abraço. Após a morte do pai, mãe e filha ficaram bem mais próximas
“Eu não sou bebê, você é que me trata assim” RAMON CARDOSO
Hoje, Taynara é bem independente. Faz quase tudo sozinha. Só às vezes a mãe a ajuda para garantir que tudo corra bem e certo. A menina reclama: “Eu não sou bebê, você é que me trata assim”. Ela sempre preferiu ficar entre os adultos. Em vez de bonecas ou TV, prefere ouvir música ou dançar forró. Outra preferência é comer, “mas só se houver suco e salada”, ressalta a mãe. Na escola ela até tem um admirador, que ela diz ser só amigo, mas se diverte ao falarmos do assunto. -Suas irmãs vão casar e você vai ficar com a mamãe, tá?” - Nam! Eu também quero casar! A mãe tem receio da resposta dela, afinal, apesar de todas as suas superações, Taynara ainda tem uma deficiência mental. “É que tudo é complicado. Só quem sabe é quem está na pele. Às vezes a gente sente rejeição, as pessoas botam logo dificuldade quando vêem que é especial”, revela a mãe.
No entanto, Taynara consegue se superar mesmo com todos os obstáculos que a sua deficiência mental possa lhe impor graças à dedicação que recebe. Seja com a ajuda da escola, da família, da equoterapia no parque de exposições, ou dos cursos que fez na Casa dos Especiais quando o seu pai a levava. “Fotos?”, eu pergunto. Um sorriso se abre fácil, sem a timidez de antes e seus os olhos brilham para a vida. Empolgada, ela planeja poses, enquanto a irmã mais velha, recém-chegada no local, me julga com os olhos de quem protege ferozmente uma criança. Recebendo um abraço, a mãe comenta: “Ela é carinhosa, adora me abraçar”. Ao que Taynara, com certo complexo de adolescência, resmunga afiada: “Nam! Não gosto não”. E eu, claro, sorrio. Com certeza ali está alguém especial, carinhosa e envolvente, ou melhor, uma família especial. Mas é assim, por inteira, intensa mesmo, que parece se relacionar Taynara.
A mãe grita a angústia da demora. O médico só entra na sala na hora que o bebê está saindo. Com as mãos aparentemente apressadas, retira-o de forma bem rápida, entrega à ajudante, termina os procedimentos e vai embora. A enfermeira silencia-se, assim como a mãe. A própria sala parece calar-se. Assim, sem choro ou alarde, como que degustando o som da frieza médica, da angústia materna e do desafio de viver, nascia Taynara. Um dia todo especial, em suas condições e sentidos. “Ela não chorou quando nasceu, mas chora no dentista. Morre de medo, como muitos. Devido a essas condições, o odontólogo disse para irmos a um especialista. É sempre mais difícil para a gente”, desabafa a mãe, Edina Ribeiro. Taynara faz amizade fácil, aqui e acolá sai às lojas vizinhas a da mãe para falar com os conhecidos. Comigo nem tanto, a dicção atrapalha no início. A mãe diz que a leitura dela também ainda é difícil. Quando tocamos no assunto da morte do pai, ocorrida há dois anos, pego de surpresa por um câncer sem definição, um olhar furtivo se esgueira ao meu, simpático, mas também desconfiado. Taynara demonstra estar pouco à vontade, mas aciona um sorriso tímido. Para a mãe, ele era o maior apego da menina, e ela seu maior reflexo. Filha do meio de três irmãs, Taynara é aquela que o pai acompanhava em qualquer lugar, que mimava, que defendia. Certa vez, ele quase bate em um homem por este, ao vê-la chorar por um doce que o pai não quis comprar, ter dito bem alto: “essa doida!”. Dificuldades - Segundo a mãe, quando bebê, Taynara teve dificuldade para andar. Esse problema trouxe a necessidade de exames, e então surgiu a revelação: uma mancha escura
se apresentava na tomografia, em parte do cérebro da menina, provável consequência da forma que se deu o nascimento. A partir daí as coisas deixariam de ser as mesmas. Ou não, nem tanto. Por experiência, o médico não arriscava palpite, mas com fisioterapia ela andou com um ano e três meses e surpreendeu a todos. Taynara começava a mostrar então que especial, acima de tudo, era sua superação, e que com carinho se vai longe. Durante a infância, no colégio, ela se mostrou bastante agressiva e nos dois primeiros anos a mãe precisou fazer amizades para ela se matricular. “Eles não queriam, tinham receio. Não havia preparo em Imperatriz para cuidar dela. Ainda há pouco”. Foi muito emocionada que a mãe a colocou em uma escola que prometia melhorar tudo, mas que se tornou um engano, pois só piorou, já que lá havia crianças mais agressivas que Taynara. A saída aconteceu quando a mãe, durante um banho na criança, percebeu que o braço desta estava quebrado e a escola se eximiu da responsabilidade. “Ela não saía de casa só, todos a protegiam, e ainda a protegem. Descobri que o prometido não era cumprido”. Bastou tirá-la de lá e colocá-la na escola estadual Governador Archer para tudo mudar. Logo na primeira visita, a fonoaudióloga, atenciosa, desconfiou que a menina tinha sério problema de visão. A mãe foi apreensiva ao oftalmologista e confirmou as suspeitas. “Como nunca tinham percebido isso na outra escola que se dizia tão bem preparada?”, a mãe se indaga revoltada. “Ela foi além do que o esperado, mas ainda é preciso paciência. Ela ainda vai a alfabetização, isso porque o trabalho de desenvolvimento e de aprendizado de convivência deve ser constante”, diz a mãe. Contudo, foi só ali então, no novo colégio, que Taynara ficou de vez calma, pacífica e carinhosa.
RAMON CARDOSO
Concentrada, Taynara se diverte pintando desenhos. Hoje, mais independente, ela demonstra habilidade, tanto que é capaz de fazer quase tudo sozinha
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DECISÕES Jovem atleta luta para ser jogador profissional de futebol. Ele treina muito para ser percebido por olheiros, e assim, poder realizar o sonho de criança
Da brincadeira de criança ao profissional JÉSSIKA RIBEIRO
Debaixo do sol escaldante de Imperatriz, treinam os meninos da categoria de base do clube de futebol JV Lideral. Os garotos usam um uniforme vermelho e meião amarelo. O cabelo moicano é a preferência deles, e o apetrecho mais importante: a chuteira. Essa tem de todas as cores. Preta, verde cana, laranja florescente. Alguns até já adquiriram a moda “a la Neymar”, rosa e lilás. O dono da chuteira simples, branca (que já não é mais tão branca) com detalhe preto, é o filho de dona Maria Ieda e Josué Pereira Barbosa. Marcelo Jonas Barbosa é o nome da fera. Em meio a tantos moicanos, o jovem tímido, de 18 anos, cabelos lisos caindo sobre a testa e sorriso escondido se diferencia dos demais, dentro e fora de campo. Marcelo nasceu em Gonçalves Dias, mas logo pequeno veio à Imperatriz. Menino prodígio, jogava bola na rua desde criança, foi crescendo e se tornou o craque da escola. Hoje é considerado um jogador “rodado”, como dizem os meninos do time e os treinadores. São chamados assim aqueles que já jogaram em outros clubes. Marcelo e todos aqueles jovens têm um sonho em comum: Tornar-se um jogador de futebol profissional. Em 2009, com a ajuda de um olheiro, foi tentar a sorte no clube do Cruzeiro, em Minas Gerais. Mas retornou para casa três meses depois. “Ficar longe da família, dos amigos de infân-
cia, abrir mão de diversas coisas, não é nem um pouco fácil”, lembra Marcelo do quanto foi difícil suportar a saudade. Mas desistir não é da sua natureza. Em 2010, mais uma vez caminhou em busca do seu sonho. Foi jogar no clube do Paysandu, em Belém. Dessa vez ficou um ano longe de casa, disputou vários campeonatos, mas voltou para casa muito abalado após a perda na final do campeonato paraense contra o clube do Remo. “O nosso time era melhor, mas tem jogo que a bola não quer entrar”, constata Marcelo, ainda com tristeza no olhar. Em 2011 soube que o time JV Lideral estaria na disputa da Copa São Paulo de Futebol Junior, e para estes jovens que lutam por esse sonho esta é uma grande oportunidade de muitos olheiros verem o seu potencial. Seu dia-a-dia tem sido dedicado aos treinamentos para a “copinha”. Treinos pela manhã e a tarde. Pergunto se o futebol não atrapalha nos estudos, ele responde que sim. “Mas tem que conciliar os dois, o que não pode é ficar sem estudar”. Ele tem um plano B: se formar em educação física. “Se não der certo um, tem que dar o outro”. Solta pela primeira vez um riso, mas bem rápido e volta à expressão de menino acanhado, porém, decidido a enfrentar todos os desafios que o destino lhe propor. O pior deles: ver outros garotos da sua idade levando uma vida normal sem ter muitas responsabilidades, e não sendo obrigados a se tornarem adultos antes do tempo.
JÉSSIKA RIBEIRO
Marcelo Jonas Barbosa tenta conciliar o seu desejo de tornar-se jogador de futebol profissional com outros deveres, como de filho e estudante
Conflitos entre gerações: pais e filhos divergem sobre valores RÔMULO FERNANDES GENYEDI SOARES
Por melhor que seja a relação entre pais e filhos, em certas idades o relacionamento parece entrar sempre em conflito devido a vários fatores
“No meu tempo, as coisas não eram assim”. A famosa frase todos os pais têm na ponta da língua quando as normas da casa e autoridade deles são colocadas em cheque pelos filhos na temível fase da adolescência. No geral, é diante desta tensão que o medo inconsciente de ambos pelas mudanças que estão acontecendo vai tomando espaço dentro do lar. As divergências cada vez mais frequentes, e o confronto de ideias e valores são a dose exata para se instalar uma zona de isolamento entre eles. “Na verdade, é cada um com sua opinião, e ninguém conversa, debate, ou algo do tipo. Como aqui em casa cada um tem uma personalidade muito forte, opiniões e mentalidades diferentes, se chegar a acontecer certos comentários, é briga na certa”, comenta o estudante Diogo Augusto Miranda, 18 anos. “Por melhor que seja a relação entre pais e filhos, nesta idade o relacionamento parece sempre ficar um pouco a desejar. Eles assumem responsabilidades importantes que os inibem ou tiram o nosso tempo
de estar sempre junto deles. O contrário, quando são crianças, que procuram sempre estar perto da gente para se protegerem de tudo. É fácil saber o porquê destas mudanças: ambos enfrentam mundos diferentes!”, conclui Maria de Fátima Carvalho, 48 anos, mãe de três filhos em idade entre 16 e 23 anos. De fato, os mundos são bastante diferentes. É natural perceber que muitos dos filhos não conseguem compreender o excesso de zelo dos pais, assim como os progenitores não entendem e não se acostumam com as novas situações e mudanças. Marília Carvalho, 19 anos, estudante de direito, compreende bem isso. “As escolhas que nossos pais tinham antigamente como: profissão, casamento, enfim... refletiam a vontade dos seus pais. Diferente das nossas hoje, que são baseadas na nossa própria vontade, com pouca interferência deles (os pais). Acho que deve ser também essa nova era, a era do conhecimento, onde se descobre coisas e ideias novas a cada minuto. Vivemos num mundo totalmente diferente do deles, todos são mais individualistas”.
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ENTREVISTA Psicóloga Jaqueline Lopes Teixeira
“Cada fase da vida tem que ser vivida” Graduada em Psicologia há três anos pela Universidade Celso Lisboa, do Rio de Janeiro, Jaqueline Lopes Teixeira, 28 anos, atua hoje, em Imperatriz, na área da saúde
pública no Núcleo de Apoio à Saúde Pública (Nasf). Em entrevista ao Arrocha, a psicóloga fala a respeito das alterações comportamentais na mudança de fase de uma criança
para um adolescente, bem como as mesmas alterações ocorridas com os jovens. Jaqueline também alerta sobre o risco que crianças que trabalham na infância possam vir a ter
posteriormente quando forem jovens. A importância de se ter uma casa de acolhimento às crianças desamparadas foi outro dos temas debatidos. Em todos os casos, foi enfa-
tizada a importância da estrutura familiar para evitar muitos transtornos em relação às crianças, adolescentes e jovens. Confira abaixo a esses e outros assuntos.
FERNANDO COSTA RAPHAEL GIANNOTTI
Porque é importante que a criança tenha o momento de brincar? Cada fase da vida tem que ser vivida, se não a gente pula etapas e, quando chegar lá na frente, pode prejudicar. Cada brincadeira tem sua representação: a criança brinca para aprender, para desenvolver, para crescer. Temos que deixar as crianças brincarem para que isso não tenha um reflexo negativo em suas fases seguintes.
Quais as principais mudanças comportamentais de uma criança para um adolescente? É difícil para os pais, porque a criança chega nos 10, 12 anos e não é adulta, mas também não é mais criança. Então o pai dá uma ordem dizendo que ela não é mais criança ou que não é adulto. É um momento muito con- flituoso e paradoxal para uma pessoa que vive essa fase e ela acaba se questionando sobre coisas que lhe são cobradas por não serem crianças, e ou- tras por não serem adultos. Mas é no período da infância, até os sete anos de idade, que a criança tem a construção de sua identidade que, então, será posta em prática nos períodos da adolescência e juventude.
O que acontece com uma criança que precisa trabalhar durante a infância? Existe uma grande realidade em Imperatriz sobre o Trabalho Infantil Doméstico (TID). A criança é obrigada a varrer casa, a fazer comida, cuidar dos irmãos. Essa criança pula etapas, assume responsabilidades que não são dela. Uma menina de 15 anos que cuida do irmão desde os cinco não terá problema quando tiver seu filho, mas ela deixou de construir uma parte importante de sua vida, não terá expectativas de que ela será diferente da mãe dela. O TID é muito comum no Maranhão, porque os países acham comum o filho varrer, cozinhar, lavar. O certo seria os pais fazerem essas tarefas para ensinarem seus filhos a fazerem, e não obrigá-los a fazer.
Já para os adolescentes, o que marca, principalmente, essa mudança para a fase adulta? O adolescente tem a necessidade de viver em grupo, ele precisa pertencer a algum grupo. Uns vão fumar, outros beber, porque os amigos bebem e fumam. O adolescente usa a roupa dele igual a dos outros adolescentes: se as meninas usam All Star xadrez, todas as meninas também usarão. Eles precisam ter os comportamentos que lhes farão aceitáveis nos grupos. Além disso, essa pessoa viverá o que foi construído na sua infância e, na sua juventude, continuará a afirmar essa identidade. Mas a principal característica que marca essa transição é a inserção do jovem no mercado de trabalho, na vida profissional. Aí, então, essa fase determinará a saída da adolescência. Outra característica do jovem é de não necessariamente precisar ser aceito por grupos. As escolhas, gostos ficam mais nítidos nas suas práticas. Psicologicamente falando, o que leva um adolescente a se tornar um infrator? Família, classe social, educação, todos esses fatores influenciam no que seremos. Tudo isso nos constrói, nós somos construídos o tempo todo. O mais importante é o limite, a construção do limite. Os pais que são muito liberais podem ter certeza que terão problemas com seus filhos lá na frente. Só porque seu filho é neném, o pai vai deixar ele colocar o dedo na tomada? Tem que saber falar o não e esse não vai construir o limite, desde que seja feito a partir da infância. Isso fará com que o menor crie responsabilidade. Os pais têm que mostrar para o filho qual o caminho deve seguir. Se há ausência de limites, o menor irá fazer o que lhe convém, porque não será penalizado. Qual a importância de se ter um órgão responsável pelo acolhimento de crianças desamparadas como a Casa de Passagem? Se nós tivéssemos famílias estruturadas, não precisaríamos de Casa de Passagem. Eu tenho experiências de crianças em Casa de Passagem que foram péssimas, porque essa situação
caracteriza cada vez mais uma rejeição e a criança começa a pensar que seus pais não a querem mais. Entretanto, se você chega em uma Casa de Passagem e encontra acolhimento, carinho, amor e limites, então dá certo. Mas, se a criança chega e encontra o mesmo ambiente que via em casa, o processo de tratamento não surtirá efeito algum e essa casa será um mero dispositivo institucional e não lugar de acolhimento. Quais os riscos de um jovem talento lidar com a fama com pouca maturidade? Precisa-se ter, primeiramente, suporte familiar e, depois, bons orientadores para saber como gastar o dinheiro, para não deixar o jovem se deslumbrar. Nós vemos
“Esses jovens precisam de alguém que ensine a eles como administrar seu dinheiro e também não deixar que seu talento se perca. É importante lembrar que temos etapas na vida: temos que brincar, temos que estudar, fazer amizades...” muitos casos que a pessoa começou cedo e acabou se metendo com drogas, bebidas, farras, pros-
tituição, porque não lhe foi dada nenhuma orientação e suporte a respeito disso. Um exemplo disso é o ator Macaulay Culkin, que foi um jovem talento que se acabou com drogas. Outro exemplo em andamento é o jogador Neymar. Milionário, já fez um filho, bancou o rebelde, bastante jovem... Então esses jovens precisam de alguém que ensine a eles como administrar seu dinheiro e também não deixar que seu talento se perca. É importante lembrar que temos etapas na vida: temos que brincar, temos que estudar, fazer amizades... O jovem talento acaba não vivendo isso porque ele precisa trabalhar e dependendo da idade, isso pode ser caracterizado como trabalho infantil.
Porque os jovens se preocupam cada vez menos com os cuidados de saúde? É uma questão de consciência do amanhã. O jovem tem a sensação de que nada de ruim vai acontecer com ele e que será jovem sempre. Porque não usa a camisinha? Porque pensa que nada de ruim vai acontecer e quando vê, já está grávida e diz que foi acidente, mas não foi. Ele está ciente da consequência, mas tem a sensação de nunca vai acontecer com ele ou ela. Por outro lado, existem aqueles que prestam culto ao corpo. Só comem alimentos saudáveis, não tomam refrigerante, se comer batata frita vai ter que correr três horas para perder essas calorias. É comum você ver uma menina engravidando na adolescência, dificilmente uma menina de vinte e poucos anos irá engravidar, porque ela se cuida mais. Sabemos que a educação é de extrema importância, mas como a criança é prejudicada com a falta dela? Esse período é definitivo para o educador? O maior período de apreensão de conhecimento é na nossa infância, entrando na adolescência, quando saímos do ensino fundamental e entramos no médio. Essa é a fase que estamos mais disponíveis para aprender que, segundo Freud, é o período de latência. Nesse período é que vai ocorrer a ampliação do seu capital intelectual. Passado esse período, se torna mais difícil a aprendizagem e sem estudo, conhecimento e capacitação fica cada vez mais difícil entrar nesse funil que é o mercado de trabalho.
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AUXÍLIO Mesmo sendo um abrigo para crianças que fogem da violência e dos maus tratos, o Lar para Meninos mantém um clima de descontração e brincadeira
Chega de lágrimas, agora é hora de sorrir FERNANDO COSTA
FERNANDO COSTA
A Casa Lar do bairro Santa Rita abriga meninos e jovens na faixa etária de 9 a 17 anos e a brincadeira é uma terapia GUILHERME BARROS
Uma casinha de esquina do bairro Santa Rita. Para quem está do lado de cá do muro, nada além do costumeiro som do tempo passando. Após cruzar o portão, um misto de risos, gritos, choro e “ei tio, tio, tio, tio...” A Casa Lar para Meninos é um abrigo para rapazes na faixa etária de 9 a 17 anos que são retirados
da guarda dos pais devido à negligência, violência, abuso, violação dos direitos ou mesmo ao uso excessivo de substâncias ilícitas e abandono. Uma mudança ocorreu na estrutura da casa em maio deste ano, já que até então o local abrigava meninos e meninas com a idade de 0 a 17 anos. Agora as meninas ficam na casa de passagem localizada na rua 15 de Novembro,
Infância em confronto: passado a ser apagado e um futuro a ser escrito GUILHERME BARROS
Com cerca de 10 crianças, que moram na Casa de Passagem, frequentam a escola e recebem visitas, a instituição busca apagar lembranças negativas para que todos possam dar continuidade à sua vida após uma adoção ou até mesmo no retorno para o lar. Os pais “problemáticos” recebem acompanhamento de órgãos de reabilitação como o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS). A maioria dos casos está diretamente relacionado ao uso de drogas. Mesmo mantida pelo município, o auxílio da comunidade é o que movimenta a casa. São rou-
pas, comida, brinquedos e o melhor presente que as crianças recebem: visitas. Outubro, o mês da criança, foi recheado de surpresas dentro e fora do abrigo. Acadêmicos sempre elaboram projetos de extensão no local, seja lendo histórias, levando brinquedos e brincadeiras, ou simplesmente passando um tempo com a garotada. Mesmo com o sigilo dos nomes, a proibição das fotografias em que apareçam crianças e tudo mais, o clima na casa é de alegria e de cuidado. “Nós procuramos criar um âmbito familiar, com amor e carinho. Dor e sofrimento, essas crianças já tinham de onde vieram”, considera a coordenadora Maria do Socorro.
Fotos demonstram ambiente agradável no abrigo. Antes de chegar aos 18 anos meninos recebem acompanhamento de profissionais
que também acolhe meninos de 0 a 8 anos. Enquanto eu me dirigia à sala da coordenação da casa, crianças rolavam em colchonetes, outras duas se enroscaram na caixa das compras e estavam girando e dando gargalhadas. Ninguém diria que aquelas crianças sofreram algum tipo de violência. A equipe da casa é formada por 15 profissionais. Os servidores
que trabalham em regime de plantão são duas cozinheiras, duas auxiliares de serviços gerais, dois cuidadores e três vigias. A casa conta ainda, com uma equipe multidisciplinar: uma coordenadora, Maria do Socorro, uma auxiliar de coordenação, uma assistente social, uma psicóloga, uma nutricionista e uma pedagoga. Cristiane de Paula é cuidadora da casa há mais de um ano. Ela en-
trou como zeladora e nos últimos meses, passou a auxiliar no trabalho com as crianças e adolescentes. Receosa em ceder informações, devido à delicada situação dos moradores ela informa que eles têm toda uma programação e horário para acordar e dormir. Todos os abrigados são encaminhados para programas sociais, como o Mais Educação, ProJovem e Jovem Aprendiz. PAULA DE TÁRSSIA
Crianças que vivem na Casa Lar para Meninos contam com um ambiente de estímulo às brincadeiras como uma forma de superar passado difícil
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NAS RUAS Crianças de Imperatriz, seja no trabalho ou na marginalidade das ruas, ganham ou perdem a vida assumindo responsabilidades maiores que elas
“Mamãe disse que eu tinha que ajudar”
CRISTINA COSTA
Preocupação do garoto que todo dia sai com sua caixa de geladão embaixo do braço não é brincar depois da aula, mas, sim, quanto sua tarde vai render para auxiliar na compra do feijão e do arroz que irão alimentar a sua família CRISTINA COSTA
As mãos pequenas que deveriam estar com lápis e caderno seguram uma bolsinha, um caixa improvisado. As contas de adição são para saber o quanto todas aquelas moedas vão render no fim do dia. Carregando uma caixa de engraxate nas costas ou de isopor conservando os ovos de codorna. Assim crianças imperatrizenses por vários motivos trocam a brincadeira pela seriedade e o dever de casa pela contabilidade do dia. A maioria delas assume este papel quando o patriarca foge do seu dever ou a
quantidade de irmãos menores sobressai o salário da sua mãe solteira, exigindo um esforço do filho mais velho. M. tem a pele clara, olhos cor de mel, uma inquietude natural das crianças, 14 anos e um sorriso encantador. Seu isopor não guarda ovos e sim geladão. É só 75 centavos, tem de coco, leite condensado... “Desde que meu pai saiu de casa, mamãe disse que eu tinha que ajudar. Então ela faz o geladão e depois que saio da escola eu vou vender”. Tem dois irmãos pequenos e estuda o quinto ano pela segunda vez, mas agora garante que vai passar, já que
as suas notas melhoraram. Quando crescer deseja ser jogador de futebol. Ao terminar a aula, no período matutino, toma banho, almoça, coloca seu instrumento de trabalho nas costas e sai em direção às praças, escolas e aos lugares movimentados. Primeiro próximo de sua casa. Depois, caso não tenha vendido uma boa quantidade, parte rumo ao centro da cidade. Uma jornada que pode seguir até as 20 horas. Seu bairro é próximo e dá pra fazer esse percurso sem problemas mais graves. “Às vezes dá pra comprar arroz, RAIMUNDO CARDOSO
feijão e carne. Também fico com um pouco pra mim, vou mais é pro cyber, gosto de jogar”. E qual é a hora das brincadeiras com os coleguinhas? “Ah eu brinco muito. Quando chego da venda, a gente fica pela rua até tarde. E também no domingo, porque eu não trabalho não”. Em um cenário mais colorido, encontro R.. Outra criança muito simpática. É ele quem ajuda a arrumar o castelo e o pula-pula que tantas crianças vão insistir em brincar. Desempenha a tarefa com tanta alegria e dedicação que quase me esqueço que aquele é o seu trabalho. Observa o horário dos “clientes”, às
Infância sem rumo aguarda novas expectativas de vida medidas socioeducativas, oferecendo possibilidades da ressocialização de O garoto E.S.V., de 1,62 m, olhos acordo com os preceitos do ECA. claros, 17 anos, natural de uma cidaEm Imperatriz, a instituição atende de do sudeste do Pará, encontrava-se 18 jovens, sendo 17 do sexo masculino. internado na Fundação da Criança e A maior parte foi parar ali em função do Adolescente (Funac) há oito meses de pequenos furtos, assaltos e envolpor ocasião da entrevista, em 2011. Ele vimento com drogas. Cabe à fundacometeu uma infração que teve como ção oferecer condições para que estes penalidade a aplicajovens possam ser “Não faço ideia de ção do inciso I do ardevolvidos à societigo 122 do Estatuto dade com uma nova quando estarei em da Criança e do Adode vida e liberdade e nem de qual perspectiva lescente (ECA): tratade trabalho. “O espaserá o meu destino...” ço possui sete aloja-se de ato infracional cometido mediante mentos e os internos grave ameaça ou violência à vítima. recebem na Funac assistência social O menor infrator reconhece que e pedagógica, psicológica e jurídica”, errou. “Estou arrependido”. E quando afirma Claudina Cirqueira da Silva, peperguntado sobre o futuro, ele disse: dagoga da instituição. “Não faço idéia de quando estarei em No corredor onde ficam os alojaliberdade e nem de qual será o meu mentos, eles conversam entre si e com destino quando sair daqui”. funcionários. Alguns permanecem em A Funac foi criada pela Lei Esta- regime fechado, saindo para as refeidual nº 5.650, em 13 de abril de 1993. ções e atividades de socialização. E.S.V. É um órgão do Poder Executivo Esta- ganhou nos cursos oferecidos pela dual, vinculado à Secretaria de Estado instituição uma chance de construir de Desenvolvimento Social (Sedes) e um futuro diferente do seu passado, possui a missão de atender crianças embora viva no momento a incerteza e adolescentes em cumprimento de sobre quando finalmente estará livre. RAIMUNDO CARDOSO
Por trás dos muros da Funac, adolescentes infratores anseiam com grande expectativa por dias melhores, enquanto aguardam uma decisão judicial
vezes, amarra daqui, puxa dali. De terça-feira a domingo, das 16 horas a mais ou menos 22h, o menino de 11 anos permanece por lá. Mesmo repetindo o quarto ano e dizendo não gostar muito de estudar, tem sua rotina trabalhista baseada nas aulas e no período letivo e o horário termina mais cedo. Os avós os criam como se fossem filhos, aliás, é assim que R. os chama: pais. A responsabilidade adquirida parece não o incomodar. Um tanto tímido, mas muito educado, me diz que gosta de vir “trabalhar” e ficar com seus amigos e sua família.
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BRINCADEIRAS Na era digital as brincadeiras como “pega-pega” e “adedonha” perderam espaço, mas partidas de futebol e outros esportes continuam entretendo a criançada
Do futebol ao PS3: Distrações do século XXI LAYANE RIBEIRO
Yago Manrique e seus companheiros de “pelada”, moradores dos arredores do Frei Epifânio, se reunem durante a semana e pulam as grades do estádio em busca de diversão. “Basta ser da minha grossura e ter a cabeça que dê pra passar por aqui” LAYANE RIBEIRO
“Eu gosto mais de futebol. Brinco de peteca, de soltar pipa, do ‘se esconda’, de videogame, mas prefiro mesmo vir com os meninos pra cá jogar futebol”. Quatro horas da tarde, quinta-feira, o estádio Frei Epifânio fechado e Yago Marique Gomes Franco, 10 anos de idade, espera do lado de dentro, na companhia de mais dois amigos, o restante da garotada para mais um dia de jogo. Se o portão que separa a rua Rui Barbosa do estádio não estiver aberto, não é motivo para acabar com a festa. “Basta ser da minha grossura e ter a cabeça que dê pra
passar aqui. Olha como é fácil!”, explica Yago, pulando as grades com toda sua travessura de menino. Aos poucos vão chegando. Uns de bicicleta, outros a pé, passam com a mesma habilidade pelas grades e começam a se agregar em meio ao verde dos gramados. A “pelada” tem início. Bola pra lá, bola pra cá, sol rachante de Imperatriz e os moleques correm, driblam, se exibem para a lente da câmera fotográfica. É o momento deles. Saem de lá suados, exaustos, comentando os gols e os “vacilos” ocorridos durante a tarde. Amantes de futebol como brasileiros que são. Nessa era de controles, imagens 3D, internet, telemóveis, há também
os que paralisam diante de um computador, se divertindo com os mais variados games e interagindo em redes sociais. O estudo Segurança de Internet para Crianças & Famílias, feito em sete países pela empresa Trend Micro, aponta que as crianças brasileiras são as que entram mais cedo em redes sociais - com a idade média de nove anos - destacando dos demais países participantes do estudo, com uma média de 12 anos. Bem abaixo da Índia, onde o acesso a esse mundo virtual ocorre por volta dos 14 anos. Juscelino Amarante Junior, 10, morador de um bairro nobre da cidade, tem um play station em casa, um computador
Entre os diversos estilos, lugares, ritmos e atrações, eles só querem diversão EDIGENY SOARES
“Em Imperatriz, as opções não são tantas. Ou você sai pra comer, ou você sai pra beber”. É essa a afirmação que ouvimos constantemente, no que diz respeito à diversão noturna. Por todos os cantos da cidade há barzinhos, “espetinhos”, restaurantes e pizzarias, entre outros lugares, tais como Beira Rio e shoppings centers. Os jovens estão sempre presentes, seja em um encontro casual, entre amigos ou apenas em outra distração qualquer. O público também é variado. Há os lugares que atraem, na sua maioria, os universitários de cursos específicos, assim como aqueles frequentados por jovens e adolescentes de cursinhos pré-ves-
tibulares, cursos técnicos e escolas. Nesse meio, identificamos ainda, os mais variados estilos, que, dependendo do dia da semana ou da atração musical de algum evento, podem até se encontrar. É nessa faixa etária de jovens e adolescentes que percebemos a divisão das tribos, ou como diz a maioria: “galera” ou “grupo”. Há os “descoladinhos”, que quase sempre são os adolescentes, que costumam comparecer aos shoppings, cinema e lanchonetes. Como dito anteriormente, temos em nossa cidade os dias específicos, determinados pelos bares e restaurantes, em que os jovens costumam encontrar-se. São ritmos e atrações que animam a noite do público jovem. Sertanejo aqui, rock ali, forró lá no Bar da Tia, ou quem sabe até, pode-
mos ir ao reggae, que uma vez ou outra, está presente em alguns dos bares da cidade. Lembrando ainda, que temos as casas de shows, onde se tocam os mais variados ritmos, que fazem a alegria dos boêmios. “No domingo, caímos no pagode, ou se quisermos um lugar mais calmo, vamos pra um barzinho, pra uma pizzaria, ou uma lanchonete qualquer. A gente só quer sair mesmo, pra distrair um pouco e relaxar. Afinal, amanhã é segunda-feira, dia de trabalho”, conta Carla Bianca de Araújo, 20 anos. As noites podem ser longas e agradáveis em Imperatriz. Você só precisa descobrir o lugar certo para ir, independente do horário. Não importa se é cedo ou tarde, contanto que haja diversão, tudo é válido.
e muitos brinquedos que viraram objetos decorativos de seu quarto. “Tenho o Pro Evolution Soccer, Mortal Kombat 9, Socom 4 e o Heavy Rain, que são games do PS3, e adoro entrar e conversar com meus amigos no Facebook. Esses brinquedos aqui já não tem mais tanta graça”. Depois, acaba confessando que pratica os jogos de queimada e futebol, mas só nos dias de educação física na escola. Núbia Santos, empresária de 31 anos, mãe de uma criança e outra que está por vir, se perde nas lembranças quando perguntada sobre o que costumava fazer para se distrair na sua meninice. De família pobre, criada com mais
cinco irmãos, os pais não tinham condições de comprar bonecas. Usava a imaginação para montar o cenário de uma cozinha e seus personagens. “Nossas bonecas eram de caroço de manga. A gente botava pra secar, aí com aqueles fiapos a gente fazia as trancinhas. Depois pegava o pincel e desenhava o rosto. As panelas eram latas de óleo e manteiga”. Ela acredita também que as crianças de hoje não criam, não desenvolvem seus próprios brinquedos, tudo já vem pronto. E ressalta a importância de diversões que trabalhem o condicionamento físico e a imaginação da criança, como “pega-pega” e “adedonha”.
EDIGENY SOARES
Agitação, ritmos variados e paquera atraem o público jovem para a vida noturna na cidade