cinema nov.2022
Paloma, de Marcelo Gomes (Brasil, Portugal | 2021, 104’, DCP)
destaques de novembro 2022 No Mês da Consciência Negra, o Cinema do IMS enfoca a agência de pessoas negras acerca de seus corpos, afetos, amores e sonhos. Na estreia brasileira de duas cópias restauradas da diretora americana Ayoka Chenzira, Alma e Rainbow conta a história de três mulheres que buscam seus caminhos no Brooklyn dos anos 1990, e Sylvilla: eles dançam seus batuques retrata a pioneira artista da dança Sylvilla Fort. Somam-se a essa programação olhares originais para grandes nomes da música negra: a cantora Calypso Rose, de Trinidad e Tobago, o nigeriano Fela Kuti e o americano Miles Davis. Com a colaboração do povo indígena Coconuco, cooperativas locais e artistas colombianos, Nossa voz de terra, memória e futuro, de Marta Rodríguez e Jorge Silva, elabora a luta e a cosmovisão de um povo em busca da retomada de suas terras ancestrais. Já em Família nuclear, o casal de cineastas Erin e Travis Wilkerson, parte com seus filhos e seu cachorro em uma viagem pelos silos de mísseis erguidos sobre territórios que carregam a memória do massacre e da resistência dos povos nativos americanos. Duas investidas cinematográficas contra a violência colonial compõem a sessão Mutual Films. A modernidade colonial, com suas práticas destruidoras, é abordada também em uma seleção dos filmes-poemas da artista Ana Vaz, que o Cinema do IMS apresenta em exibições gratuitas, em parceria com a Pivô. Entre os lançamentos do mês, estão ainda a resistência da igreja católica em casar uma mulher trans e um homem cis no agreste pernambucano; o reencontro de duas amigas separadas por um oceano de distância; a cantora de forró que se torna assassina em série; e uma sequência de jantares deliciosos, porém fatais. [imagem da capa] Alma e Rainbow (Alma’s Rainbow) de Ayoka Chenzira (EUA | 1993, 86’, DCP) 1
Calypso Rose (Calypso Rose – The Lioness of the Jungle), de Pascale Obolo (França, Trinidad e Tobago | 2011, 85’, DCP)
Família nuclear (Nuclear Family), de Erin Wilkerson e Travis Wilkerson (EUA, Singapura | 2021, 96’, DCP)
Kevin, de Joana Oliveira (Brasil | 2021, 81’, DCP)
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46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
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Festival Nicho Novembro: Conversa com Claire Diao Kevin (81’)
Paloma (104’)
O clube dos anjos (102’) Kevin (81’) Paloma (104’)
Serial Kelly (80’) Paloma (104’) Serial Kelly (80’)
46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
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Festival Nicho Novembro: Show Me the Fund O clube dos anjos (102’) Sessão Mutual Films: Nossa voz de terra, memória e futuro (110’) Sessão apresentada por Aaron Cutler e Mariana Shellard
Paloma (104’)
Kevin (81’) O clube dos anjos (102’) Paloma (104’)
Serial Kelly (80’) Paloma (104’) Serial Kelly (80’)
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O clube dos anjos (102’) Kevin (81’) O clube dos anjos (102’)
Festival Nicho Novembro: Apresentação do Nicho Executiva Kevin (81’) Sessão Mutual Films: Família nuclear (96’) Sessão seguida de debate com Neusa Barbosa, Mariana Shellard e Aaron Cutler
O clube dos anjos (102’) Kevin (81’) Paloma (104’) Miles Davis, inventor do cool (115’)
Neste dia não haverá sessões de cinema
sexta 4
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O clube dos anjos (102’) Kevin (81’) O clube dos anjos (102’) Kevin (81’) Marte Um (115’)
Festival Nicho Novembro: Conversa com Maria Ângela Kevin (81’) Paloma (104’) O clube dos anjos (102’)
O clube dos anjos (102’) Paloma (104’) Kevin (81’) Paloma (104’) O clube dos anjos (102’)
Kevin (81’) Serial Kelly (80’) Paloma (104’) Serial Kelly (80’) Paloma (104’)
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Os filmes de Ana Vaz - Programa 1 A Idade da Pedra + Há terra! + Apiyemiyekî? (71’) Kevin (81’) O clube dos anjos (102’) Marte Um (115’) O clube dos anjos (102’) Os filmes de Ana Vaz - Programa 2 Amérika: baía das flechas + 13 Ways of Looking at a Blackbird + Olhe bem as montanhas (71’) Kevin (81’) Calypso Rose (85’) Paloma (104’) Kevin (81’) Os filmes de Ana Vaz - Programa 3 Amazing Fantasy + Occidente + Pseudosphynx + Sacris Pulso (41’) Meu amigo Fela (92’) Paloma (104’) O clube dos anjos (102’) Kevin (81’) Serial Kelly (80’) Alma e Rainbow + Syvilla: eles dançam seus batuques (111’) Serial Kelly (80’)
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O clube dos anjos (102’) Kevin (81’) O clube dos anjos (102’) Kevin (81’)
Nossa voz de terra, memória e futuro (110’) Família nuclear (96’)
Meu amigo Fela (92’) Calypso Rose (85’) Alma e Rainbow + Syvilla: eles dançam seus batuques (111’) Miles Davis, inventor do cool (115’)
Kevin (81’) Serial Kelly (80’) Paloma (104’) Serial Kelly (80’)
Programa sujeito a alterações. Eventuais mudanças serão informadas em ims.com.br. 3
Oriki Adurá, Mês da Consciência Negra IMS Viviana Santiago, coordenadora de Inclusão e Diversidade do IMS
Com o novembro negro, os movimentos negros brasileiros põem a história em seu devido lugar ao denunciar o intencional processo de subordinação e invisibilização que as práticas coloniais estabeleceram quando ensinaram e ensinam a história a partir do estereótipo de um povo negro passivo e derrotado. Em novembro, os leões contam a história da caçada e rugem a história de um povo altivo, ancestral que atuou, atua e não apenas reage. Beatriz Nascimento nos alertou para o fato de que um dos maiores impactos de uma historiografia europeia – que apresenta um continente africano como o locus do bizarro e do isolamento cuja história só foi despertada com a chegada dos europeus – é a maneira como essa informação marca a ruptura da identidade das pessoas negras com seu passado africano e com a trajetória nas diásporas. Dessa forma, o IMS assume uma atitude de desobediência epistemológica e decide se conectar à produção cultural e de resistência dos movimentos negros brasileiros que denuncia, anuncia 4
e celebra a presença negra no Brasil. Respondendo ao convite de Beatriz Nascimento em Orí, apresentamos uma programação que torna visível, ecoando assim sua reflexão que articula a importância de trazer a negritude para uma conexão pelo perceber e perceber-se, porque o rosto de um é o reflexo de todos os corpos. Em novembro, o IMS se faz espelho: reflete as produções negras que trazem essa história carregada de tintas, personagens, resistências, caras, corpos e vidas pretas que trazem em seu bojo a intenção de incidir para que a população negra brasileira e da diáspora possa se reconhecer e se reafirmar em sua humanidade. Nesse giro decolonial, é a população negra brasileira quem aparece aqui produzindo suas próprias imagens e narrativas, enfrentando os processos de apagamento e de construção de estereótipos que produzem epistemicídio e morte física. A programação de novembro do IMS é um convite para o exercício de uma vivência de uma criatividade decolonial,
aquilombadora, que renuncia a esse movimento de encobrimento dos povos negros e indígenas como são e que provoca para a vivência do antissublime decolonial numa geocorpopolítica outra. A programação de Novembro e Consciência Negra evoca a consciência das lutas por liberdade, por terra e pela ampliação de direitos que começaram em Palmares. No Novembro Negro, repercutimos a resistência negra que combina a luta contra o racismo com a luta por liberdade e por democracia para avançar na construção de uma sociedade justa e igualitária. Inspiradas, inspirades e inspirados por Beatriz Nascimento, em nossa programação saudamos Lima Barreto, recebemos Memórias Pretas em Movimento e o Festival Nicho Novembro, celebramos Höröyá Yaakaar – Brasil Senegal e a resistência das diásporas negras em sua atualização, construímos um tempo-espaço afrocentrado a partir da programação em parceria com a Feira Preta e, testemunhando a aliança de parentesco entre povos negros e indígenas,
contamos com a abertura da exposição Xingu: contatos. O Novembro Negro é um Ajeum. Reconhecemos e louvamos a resistência e reexistência nesse caminho, pedimos pela caminhada. Ibá Peabiru. Oriki Adurá.
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O Novembro Negro e o 2022 Márcia Vaz
No mês em que as populações negras no Brasil colocam seus punhos em riste em sinal de luta e resistência pelo Mês da Consciência Negra, a programação de cinema negro do IMS joga luz à agência de pessoas negras acerca de seus corpos, de seus afetos, de seus amores, de seus sonhos, de sua dança e de sua música, portanto, celebramos nossas existências. A partir do olhar delicado de Ayoka Chenzira, somos apresentados a uma certa década de 1990 quase nada explorada no imaginário coletivo brasileiro sobre a cultura americana. Sob a forte marca estética colorida do hip hop noventista, testemunhamos o evoluir da história de três mulheres negras tendo agência de seus corpos e suas vidas, na estreia brasileira do recém-restaurado Alma e Rainbow. Ainda, da mesma diretora, apresentamos Sylvilla: eles dançam seus batuques, um sensível documento acerca de uma das pioneiras dançarinas negras a ensinar e ter um estúdio de dança. Das poucas cuja performance moderna se desenvolveu sob a influência das culturas africanas, caribenhas e latino-americanas. 6
Tendo como sul a celebração da criação e da existência de nossas culturas pretas, não podíamos deixar de revisitar três grandes ícones da música universal em documentários históricos das apoteóticas
vidas de Calypso Rose, da franco-camaronesa Pascalle Obolo; Meu amigo Fela, do brasileiro Joel Zito Araújo; e Miles Davis, inventor do cool, do americano Stanley Nelson.
Figura e máscara: Nossa voz de terra, memória e futuro + Família nuclear Aaron Cutler e Mariana Shellard
O efeito produzido pela máscara é principalmente um efeito voltado para o exterior. Ela cria uma figura. A máscara é intocável e interpõe uma distância entre si própria e o observador. Ela pode – numa dança, talvez – chegar mais perto deste último. Mas ele, por si só, tem de permanecer onde está. A rigidez da forma transforma-se numa rigidez de distância também: o fato de ela não se modificar é o que lhe confere seu caráter proibitivo. E isso porque, logo atrás da máscara, começa o segredo. Trecho do livro Massa e poder (1960), de Elias Canetti1
Entre 1978 e 1981, o casal de cineastas Marta Rodríguez e Jorge Silva trabalhou em um filme que se tornou uma obra crucial do cinema colombiano. No documentário de longa-metragem Nossa voz de terra, memória e futuro (Nuestra voz de tierra, memoria y futuro, 1981), eles 1. Tradução de Sergio Tellaroli, publicada no Brasil pela Companhia das Letras em 1995 e Companhia de Bolso em 2019 (p. 473). 7
investigaram a história de opressão e luta indígena na região de Cauca, no sudoeste da Colômbia, a partir de depoimentos, casos e histórias que foram tanto encenados para o filme quanto documentados, criando uma voz coletiva e heterogênea da cultura local e das pessoas com as quais conviveram. Os próprios relatos dos indígenas inspiraram a criação de episódios com figuras teatralmente grotescas, representando o diabo e invasores estrangeiros, que espreitam as terras como antagonistas perpétuos da existência dos povos locais. No mesmo período, o cineasta norte-americano Travis Wilkerson era uma criança em Butte, no estado de Montana, filho de um pai militar e piloto (condecorado na Guerra de Vietnã) e uma mãe ativista obcecada com a guerra nuclear. Ela levava seus filhos em viagens para protestar diante dos silos nucleares presentes por todo o interior dos Estados Unidos, um hábito familiar que influenciou a obra de Travis, delineando um estilo de cinema ao mesmo tempo pessoal e político.
“A destruição da América nativa e a ameaça de destruição do mundo são dedos de duas mãos entrelaçadas”, o diretor declarou décadas depois, na narração de seu filme Família nuclear (Nuclear Family, 2021), um documentário feito em parceria com sua esposa, a ar tista e ativista Erin Wilkerson. O filme abre relembrando os episódios de infância como parte de pesadelos provocados pelas eleições recentes, e serve como uma espécie de tour guiado pelos silos nucleares ativos nos Estados Unidos, muitos deles em terras habitadas no passado por povos indígenas que foram brutalmente assassinados por colonos invasores. A ameaça da destruição nuclear em um filme ecoa a hostilidade de seres mascarados no outro. Ambos mostram, em momentos distintos, dois pares de cineastas recontando as histórias de seus países americanos e buscando compreender e transformar uma trajetória de violência em um vislumbre de um mundo viável.
Rodríguez (nascida em 1933) e Silva (1941-1987) se conheceram em 1965, no cineclube da Aliança Francesa em Bogotá. Ela já havia estudado antropologia e cinema na Colômbia e na França, inclusive com o etnólogo Jean Rouch, que articulou de forma inédita uma fusão das duas práticas. Interessou-se pelas condições de vida nos “chircales” – propriedades de produção artesanal de tijolos nos arredores de Bogotá cujos trabalhadores viviam em extrema pobreza dentro de um sistema feudal. Ao procurar colaboradores possíveis para o projeto, ela conheceu Silva, um fotógrafo, cinéfilo e autodidata, que topou registrar o cotidiano de uma das famílias. Eles trabalharam no média-metragem Chircales (1971) por seis anos e conceberam um método de criação que continuaria ao longo de suas colaborações. A produção foi escassa, com os codiretores assumindo todas as funções principais. O período de imersão foi longo e atencioso, para melhor conhecer as vidas de seus personagens. A forma final da obra intercalou momentos 8
tradicionalmente observacionais com outros mais poéticos, conduzidos pelos depoimentos e testemunhos das pessoas registradas. O impulso que direcionou os artistas foi político por natureza – o de expor a realidade de uma situação desumana e seu custo humano. Chircales teve uma boa repercussão internacional, e os prêmios que o filme ganhou em festivais ajudaram a financiar outras obras do casal. Eles logo embarcaram no que foi originalmente pensado como uma trilogia de documentários sobre a desigualdade social colombiana. Planas, testimonio de un etnocidio (1971) relata a longa história de ataques a indígenas, com foco no recente massacre do povo Guahíbo por motivos agrários, inclusive com denúncias de sobreviventes e da formação do Cric (Conselho Regional Indígena de Cauca) como um ato de resistência. Campesinos (1975) mostra a criação de ações sociais por grupos camponeses e indígenas contra donos de terra em Cauca, também trazendo uma contextualização histórica da luta contra a opressão, muitas vezes narrada pelos protagonistas.
O terceiro filme adotou uma forma diferente dos anteriores, principalmente porque Silva e Rodríguez perceberam que eles não estavam conseguindo alcançar seu principal público de interesse, os próprios indígenas. Nas palavras de Rodríguez: “Os indígenas possuem um Eu coletivo, eles tomam todas as decisões coletivamente. Quando viram cenas [em Campesinos] em que um único indígena falava ininterruptamente, eles simplesmente disseram: ‘Aquele índio é louco’. Também não gostaram que os líderes exercessem um papel tão importante no filme. [...] Os indígenas nos fizeram perceber que a narrativa de nossos filmes ia contra sua forma de ver a realidade.”2 2. De uma entrevista com os cineastas na revista Cuadernos de Cine Colombiano, publicada pela Cinemateca de Bogotá em outubro de 1982. O texto integral pode ser lido em espanhol no link idartesencasa.gov.co/artes-audiovisuales/ libros/cuadernos-de-cine-colombiano-primera-epoca-no-7-jorge-silva-y-marta.
Eles então trabalharam em parceria com cooperativas locais e montaram comissões de consultoria. O casal mergulhou por um ano no dia a dia da vida dos Coconucos e trabalhou no filme Nossa voz de terra, memória e futuro por quatro anos (inclusive com 9
uma pausa nas filmagens para fazer um curta-metragem, La voz de los sobrevivientes, 1980, em homenagem a um líder assassinado e a pedido do Cric). A obra resultante contou com elementos sobrenaturais teatralizados e relatos de naturezas distintas.
Em Nossa voz de terra, memória e futuro – o primeiro e único longa-metragem realizado por Rodríguez e Silva –, vemos figuras diabólicas se deslocarem de forma sinistra e assustadora, ao mesmo tempo que testemunhamos a força do coletivo na ocupação e no trabalho com a terra. São homens, mulheres e crianças que atravessam arames farpados, estudam uma nova língua e uma forma de organização social para reaver o que lhes pertence. Ao longo do filme, há uma dialética entre o nativo e o invasor, a percepção de mundo indígena e a imposição de uma cultura originalmente europeia, a melodia fluida das flautas andinas e o som dissonante do agressor. A fotografia em preto e branco mostra close-ups de rostos poderosos, cuja força autônoma é inextricavelmente ligada ao valor do coletivo. Nossa voz ganhou diversos prêmios (inclusive no Festival Internacional de Cinema de Berlim e no Primeiro Festival de Cinema de Povos Indígenas, no México) e gerou uma atenção inédita para o trabalho de Rodríguez e Silva.
Porém, foi o último filme que os cineastas concluíram juntos. Silva morreu subitamente, em decorrência de uma úlcera duodenal, durante as filmagens de Nacer de nuevo (1987), um filme-retrato de um casal de idosos vivendo em um assentamento, que Rodríguez finalizou junto a um outro projeto documental dos dois, Amor, mujeres y flores (1989), sobre o impacto de agrotóxicos na saúde de trabalhadoras em plantações de flores. Ela também deu continuidade ao projeto maior de denúncia da violência contra os povos indígenas colombianos e o meio-ambiente. Através da Fundación Cine Documental – produtora que ela e Silva fundaram na época de Chircales3 –, Rodríguez realizou uma longa série de documentários, em andamento, que retrata a turbulenta história recente da Colômbia, muitas vezes utilizando entrevistas com indígenas para mostrar a grandeza de um povo que batalha para preservar sua terra e cultura. 3. Mais informações sobre a Fundación podem ser encontradas no website martarodriguez. com.co/. 10
Vários desses filmes incorporam cenas de Nossa voz e outras obras realizadas com Silva, fazendo conexões entre imagens do passado e um contínuo trabalho de construção social. Um dos filmes mais recentes, La sinfónica de los Andes (2018), utiliza como condutor narrativo uma orquestra sinfônica de jovens indígenas de Cauca para relatar a complexidade da interminável guerra entre o governo, os paramilitares, as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e até movimentos militares indígenas organizados pelo Cric. Essa guerra civil foi em grande parte financiada pelos Estados Unidos, fazendo da Colômbia o país sul-americano que mais recebe ajuda militar norte-americana. A obra de Travis Wilkerson (nascido em 1969) é uma das mais políticas do cinema de autor atual de seu país. O cineasta lida com questões de origem, seja a história sangrenta dos Estados Unidos ou a participação de sua própria família nela, discutindo o éthos norte-americano e seu reflexo no mundo para desmascarar o enaltecimento ao poder em histórias de
desbravamento e conquista e mostrar as consequências nocivas atuais sobre uma sociedade que perece. Seu trabalho foi inspirado no Nuevo Cine Latinoamericano (inclusive com a realização de um filme-retrato em 1999 do documentarista cubano Santiago Álvarez), principalmente na busca de uma linguagem cinematográfica engajada, rigorosa e lírica, que tenha simultaneamente valor pedagógico e artístico. Diversos de seus filmes são estruturados como densas investigações de um passado enterrado, com o diretor atuando como narrador ou protagonista, e intercalando momentos didáticos com outros mais impressionistas. Por exemplo, An Injury to One (2002) combina paisagens atuais e registros históricos ao narrar o legado da opressão sobre movimentos trabalhistas de mineradores em Butte desde o século XIX até o presente e as consequências ambientais e econômicas para a região. Distinguished Flying Cross (2011) consiste majoritariamente em cenas de uma conversa entre ele, seu irmão mais jovem e seu pai sobre a realidade da Guerra do Vietnã. Você
já se perguntou quem atirou? (Did You Wonder Who Fired the Gun?, 2017) adota o tom de um thriller na busca pessoal para resolver o caso em aberto do assassinato de um homem negro pelo bisavô racista do diretor no estado do Alabama. Tanto Você já se perguntou e Família nuclear são road movies. Porém, enquanto a primeira viagem é feita pelo cineasta 11
sozinho, na segunda ele vem acompanhado de sua esposa e coautora, Erin Wilkerson (nascida em 1982). Erin é uma artista visual que expressa inquietações similares às de Travis por meio de mídias diversas, como instalações, performances, desenhos, pinturas e colagens. Seu olhar volta-se para a representação tradicional de paisagens naturais,
subvertendo imagens romantizadas de sociedades destruidoras. Duas séries de colagens digitais são representativas de seu trabalho, inclusive na forma em que remetem à sua estética cinematográfica: Em American Landscapes, pinturas de paisagens clássicas norte-americanas são invadidas por imagens midiáticas, mostrando a violência policial do Estado contra imigrantes. E, em Objective Decay, figuras humanas de pinturas europeias importantes são inseridas em fotografias de desastres ambientais.4 Em Família nuclear, Erin evidencia mais a discussão sobre o impacto humano na paisagem natural ao retratar a presença de espécimes estrangeiras de flores que podem ser devastadoras para o ecossistema local. Enquanto Travis explora velhos campos de batalha (inclusive 4. Estes e outros trabalhos de Erin Wilkerson, inclusive obras realizadas na preparação de Família nuclear, podem ser conferidos no site de Creative Agitation, a produtora que ela e Travis Wilkerson cofundaram em 2009: www. creativeagitation.com.
um que foi previamente filmado por ele, para um curta-metragem relembrando um massacre de indígenas Cheyenne e Arapaho no século XIX, no então território do Colorado),5 observamos Erin fotografar flores com uma máquina polaroide, e subsequentemente vemos as fotos na tela enquanto nos é dito se determinada espécie é nativa ou invasora. De maneiras distintas, os dois cineastas refletem sobre o impacto que eles exercem naquelas paisagens silenciosas e aparentemente imutáveis, que mascaram um rápido avanço da humanidade para a decadência. Outros momentos do filme trazem polaroides de cânions, mísseis e veículos militares transformados em monumentos para visita pública. Algumas das cenas mais perturbadoras de Família nuclear são justamente as das visitas feitas explicitamente em família às diversas locações do filme – o casal, com suas duas crianças 5. O curta-metragem For the 150th Anniversary of the Sand Creek Massacre (2014) pode ser visto no canal de Vimeo de Travis Wilkerson, no link vimeo.com/114665191. 12
pequenas e a filha adolescente de Travis. Eles encenam um teatro irônico no qual a imagem arquetípica de uma unidade feliz e estável (a família nuclear norte-americana) é contaminada por um perigo eminente. Travis, usando o gravador de som, parece às vezes estar segurando um detector de metais; as crianças com seus pais brincam de mortos, com um tom desconfortável dado pelo contexto atual. As imagens da família caminhando, mesmo em vastos campos com céus abertos, são embutidas de uma atmosfera de melancolia e pavor frente ao passado e ao futuro, estimulada pelos traços e pelas lembranças de violência que existem em todo lugar onde pisam. Os filmes dos Wilkersons e de Rodríguez e Silva oferecem ferramentas para uma tomada de consciência de seus espectadores diante da realidade que os circunda. Eles mostram algumas das complexidades na formação de grupos, que podem se proteger da violência ou perpetuá-la, às vezes em um mesmo gesto. Escolher um inimigo – nos filmes e historicamente – pode também ser
uma escolha das máscaras que serão vestidas. O escritor búlgaro Elias Canetti continua sua reflexão sobre a máscara: “Quanto mais nítida ela for, tanto mais obscuro será aquilo que está por trás. Ninguém sabe o que poderia surgir dali. A tensão entre a rigidez da máscara e o segredo que ela oculta pode atingir proporções gigantescas. Essa tensão é a verdadeira razão de seu caráter ameaçador. ‘Eu sou exatamente o que você está vendo’, diz a máscara, ‘e, por trás disso, tudo o que você teme’.”6 A Sessão Mutual Films de novembro de 2022 é dedicada às memórias dos cineastas independentes Luis Ospina (1949-2019) e William Klein (1926-2022).
6. Massa e poder, p. 474 da edição de Companhia de Bolso.
Em cartaz
Kevin
Joana Oliveira | Brasil | 2021, 81’, DCP (Embaúba Filmes) É a primeira vez que Joana, uma brasileira, visita sua amiga Kevin em Uganda. Elas se tornaram amigas há 20 anos, quando estudaram juntas na Alemanha, e faz muito tempo que não se veem. Uma conversa entre duas amigas: as histórias do passado, os desejos, os caminhos trilhados, os diferentes modos de encarar o tempo vivido. “Eu não tinha intenção nenhuma de dar conta de Uganda”, comenta a diretora e personagem Joana Oliveira em entrevista ao portal Papo de Cinema. “Eu nem conheço o Brasil inteiro, jamais entenderia, em algumas semanas, um país tão complexo quanto Uganda. Mas então pensei: como filmaria uma história de amizade na minha cidade, em Belo Horizonte? Não ficaria explicando a complexidade da cidade, não seria essa a intenção. Queria mostrar a vida dessas duas mulheres, e entender Uganda através do que a Kevin queria me mostrar. É claro que Uganda está presente nas várias línguas faladas, na minha cara de gringa, 13
na cena em que eu derrubo tudo numa loja, para demonstrar o meu desconforto. A gente fugiu de todas as formas de exotizar Uganda, ou dar conta de algo maior do que a relação dessas duas. Nem a relação entre elas é algo de que o filme pode dar conta por completo. A gente trata com elipses, claro. Algumas pessoas vieram me perguntar: ‘Mas vocês foram na boate?’, porque a Kevin fala, em certo momento do filme, que a gente precisava conhecer a boate local. O filme nunca vai agregar tudo, as pessoas nunca vão saber de tudo o que aconteceu. Mas fomos à boate, claro!” [Íntegra da entrevista em: bit.ly/kevinims] Ingressos: terça, quarta e quinta: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia); sexta, sábado, domingo e feriados: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia).
O clube dos anjos
Angelo Defanti | Brasil, Portugal | 2020, 102’, DCP (Vitrine Filmes) Ao longo dos anos, as reuniões mensais do Clube do Picadinho – confraria que há décadas reúne sete amigos de longa data – passaram de rituais de poder a melancólicas assembleias de fracassos. Um clube fadado ao fim. Até que a chegada de um cozinheiro, que passa a lhes servir magníficos banquetes, reúne novamente a todos. A gula como celebração da vida. No entanto, depois de cada jantar, um integrante da confraria amanhece morto. O clube dos anjos é baseado no livro homônimo de Luis Fernando Verissimo e tem em seu elenco os atores Otávio Müller, Matheus Nachtergaele, Paulo Miklos, Marco Ricca e André Abujamra. Ingressos: terça, quarta e quinta: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia); sexta, sábado, domingo e feriados: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia).
Paloma
Marcelo Gomes | Brasil, Portugal | 2021, 104’, DCP (Pandora Filmes) Paloma é uma mulher trans que vive com Zé, seu namorado, e sua filha. Ela trabalha como agricultora em uma plantação de mamão e está economizando para realizar seu maior sonho: um casamento tradicional, na igreja, seguida de festa. Mas a recusa do padre em aceitar seu pedido obrigará Paloma a enfrentar as normas do catolicismo e da sociedade rural. Em entrevista ao Jornal do Brasil, o diretor Marcelo Gomes conta do surgimento do projeto de filme: “Há mais de dez anos, li uma matéria no jornal de minha cidade, Recife, sobre uma mulher trans, agricultora no agreste de Pernambuco, que decide se casar na igreja de vestido branco, véu e grinalda, provocando, com isso, a ira de toda uma cidade. Me emocionei com aquela história. Existiam muitas camadas: falava de amor, preconceito, fé, conservadorismo, afeto. Tantos elementos tão díspares que senti que ali estava 14
uma história singular que deveria se transformar em um filme. Principalmente num país como o Brasil, um dos países que se observa a maior quantidade de casos de violência contra a população LGBTQIA+. Segundo dados da Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), foram 175 casos em 2020, 41% a mais do que no ano anterior. E os casos só aumentam de ano a ano. Paloma é uma experiência universal. Um filme romântico sobre alguém em uma jornada de autoafirmação.” “Sempre estive muito curiosa para conhecer a Paloma que inspirou o filme”, escreveu Kika Senna em depoimento ao portal Mulher no Cinema, “mas desapeguei dessa ideia quando percebi os riscos que já vinham me alertando sobre o lugar da imitação. Ao passo que eu ia me aproximando de Paloma, ia também percebendo o quanto ela era diferente de mim.” “Fazendo os recortes de raça, classe, gênero e escolaridade, encontrei a principal referência de Paloma em minha mãe: uma mulher preta, mãe, interiorana, semianalfabeta, nordestina e com muitos sonhos. Ainda assim, no início da criação da personagem, rejeitei o romantismo ou os delírios que motivavam Paloma a correr atrás dos seus sonhos, porque eu estava bastante intolerante ao padrão que a cisnormatividade impõe para nós que somos mulheres trans e travestis, bem como para os homens trans. Demorei a entender que, para Paloma, revolucionário era conquistar o que ela queria, que era o básico. Paloma apareceu como uma sonhadora! Quando eu escutei e acolhi as relevâncias de seus sonhos, percebi que os sonhos nos aproximavam.”
[A entrevista de Marcelo Gomes pode ser lida na íntegra em: bit.ly/palomamg O depoimento de Kika Senna está disponível em: bit.ly/palomaks] Ingressos: terça, quarta e quinta: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia); sexta, sábado, domingo e feriados: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia).
Serial Kelly
Marte Um
Enquanto cumpre uma agenda de shows em inferninhos pelo sertão, Kelly, uma cantora de forró eletrônico, também vai deixando um rastro de mortes pelo caminho. Em seu trajeto de consumo compulsivo e violência, ela atravessa um Nordeste novo, espiral de um desenvolvimento também apocalíptico. Quando passa a ser investigada pelos assassinatos de três homens, sua turnê se transforma em uma estratégia de fuga. De estrela ascendente, Kelly passa a uma heroína marginal, temida e procurada. A primeira serial killer mulher do Brasil.
Os Martins são sonhadores, otimistas e levam a vida às margens de uma grande cidade brasileira depois da decepção da eleição de um presidente de extrema direita. Uma família negra de classe média baixa, eles sentem a tensão da nova realidade. Tércia, a mãe, revê seu mundo depois de um encontro inesperado que faz com que ela suspeite ter sido amaldiçoada. Seu marido, Wellington, coloca todas suas esperanças em fazer do filho caçula um jogador de futebol. Deivinho acompanha relutante a ambição do pai, pois sonha em estudar astrofísica e colonizar Marte. Enquanto isso, Eunice, a filha mais velha, se apaixona por uma jovem de espírito livre, e se questiona se não está na hora de sair de casa. Marte Um é a estreia na direção solo de Gabriel Martins em longa-metragem e foi financiado pelo primeiro e, até agora, último edital afirmativo do Brasil, que, em 2016, contemplou três longas-metragens produzidos ou dirigidos por pessoas negras. O filme estreou na edição deste ano do Festival de Sundance, maior evento do cinema independente norte-americano e foi o filme indicado pelo Brasil para concorrer a uma vaga no Oscar. “Tudo começou com a imagem de um garoto olhando para o céu e segurando uma bola de futebol”, conta o diretor em entrevista ao portal Screen Daily. “Talvez tivesse algo a ver com o Brasil perdendo de 7 a 1 pra Alemanha nas semifinais da Copa do Mundo de 2014, em Belo Horizonte. Esse foi um grande momento, porque também estáva-
René Guerra | Brasil | 2022, 80’, DCP (Vitrine Filmes)
Ingressos: terça, quarta e quinta: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia); sexta, sábado, domingo e feriados: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia).
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Gabriel Martins | Brasil | 2022, 115’, DCP (Embaúba Filmes)
mos passando por muitas lutas no cenário político. O Brasil tem sido uma enorme bagunça desde então e antes também, então se trata de futebol, política e sonhos. Eu decidi fazer esse filme sobre o que significa para esse garoto sonhar com algo tão grande, algo tão distante dele.” “Filmamos em novembro, dezembro de 2018, então este filme é um retrato de como eu e acho que muitas pessoas estavam se sentindo em relação a raça, sonhos, política e decepção com tudo o que estava acontecendo no Brasil. [...] Tudo isso estava na minha mente, mas eu não poderia fazer um filme que fosse uma espécie de plano de vingança contra esta eleição, porque ele foi eleito de forma justa. Sim, houve fake news, como houve com Trump, mas as pessoas o elegeram democraticamente. Portanto, não há um problema apenas com Bolsonaro, mas com um país – quão polarizados nos tornamos, como não temos discussões maduras sobre política. Este é um filme sobre diferenças entre gerações também. Como o pai vai se relacionar com a filha? O jovem verá o mundo como seu pai o vê ou encontrará seu próprio caminho?” [A íntegra da entrevista, em inglês, está disponível em: bit.ly/imsmarteum] Ingressos: terça, quarta e quinta: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia); sexta, sábado, domingo e feriados: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia).
Os filmes de Ana Vaz O programa de filmes, em cartaz no Cinema do IMS, apresenta alguns dos filmes-poemas de Ana Vaz, uma das mais relevantes artistas e cineastas contemporâneas. Seu trabalho é marcado por um constante desafio experimental sobre as formas poéticas do cinema contemporâneo, ressaltando as profundas contradições do nosso tempo e questionando, sobretudo, as práticas destruidoras da modernidade colonial. Este programa é um desdobramento da exposição É noite na América, em cartaz no Pivô entre setembro e outubro de 2022. A exposição incluiu, além de outros trabalhos, uma instalação homônima, uma comissão e produção da Fondazione In Between Art Film, com coprodução de Ana Vaz, Spectre Productions e Pivô e apoio adicional do Jeu de Paume, Paris. É noite na América é um ecoterror, livremente inspirado pela leitura do livro A cosmopolítica dos animais, da filósofa brasileira Juliana Fausto, e que segue os percursos e desvios de animais selvagens, fugitivos da destruição do cerrado brasileiro em plena Brasília moderna Entrada gratuita. Os ingressos serão distribuídos uma hora antes das sessões. .
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Programa 1
A Idade da Pedra
Ana Vaz | Brasil, França | 2013, 29’, DCP (acervo da artista) Era tão artificial como deveria ter sido o mundo quando criado Clarice Lispector Uma viagem ao Centro-Oeste brasileiro nos conduz a uma estrutura monumental, petrificada no centro do cerrado. Inspirado pela epopeia da construção de Brasília, o filme parte desse momento histórico para recriá-lo em um tempo futuro ou passado. Seguindo os traços que nos conduzem a esse monumento, o filme descobre uma história de exploração, profecia e mito.
Há terra!
Ana Vaz | Brasil, França | 2016, 13’, DCP (acervo da artista) “Há terra! É um encontro, uma caça, um conto diacrônico do olhar e do devir. É um jogo, no qual, como numa busca, o filme procura personagem e terra, terra e personagem, predador e presa.” É assim que Ana Vaz descreve seu filme-poema filmado em 16 mm. Movimentos de câmera de dardos parecem perseguir uma jovem através da grama alta. A locução em tensão do presente parece fundir-se com o passado na miopia da lente de foco longo. O loop de som recorrente de um homem gritando “Há terra! Há terra!” evoca a memória distante do colonialismo. Mas a beleza desta colagem repousa na impossibilidade de o espectador deixar passar esse passado: logo o testemunho atual envolve um prefeito que assumiu por ameaça às terras do povo indígena. A jovem que está sendo caçada vem para personificar um território. Estamos no sertão do Brasil, onde o grito “há terra!” também pode ser ouvido como afirmando que não há razão para que os sem-terra
Programa 2 ou que não têm terra – cujo movimento organizado tem agora cerca de 40 anos – sejam privados de terra. Enigmático e febril, o filme vibra com referências do Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade (1928), outra fonte de inspiração para Ana Vaz: “Antropofagia. Absorção do inimigo sacro. Para transformá-lo em totem. A humana aventura. A terrena finalidade.” [Texto de apresentação por Charlotte Garson, para o festival Cinéma du Réel, na França, em 2016]
Apiyemiyekî?
Amérika: baía das flechas
Apiyemiyekî? é um retrato cinematográfico que parte do arquivo de Egydio Schwade, educador brasileiro e militante pelos direitos dos povos indígenas – Casa da Cultura de Urubuí, localizado na sua casa em Presidente Figueiredo (AM), onde atualmente são conservados mais de três mil desenhos feitos pelos Waimiri-Atroari, um povo nativo da Amazônia brasileira, durante a sua primeira experiência de alfabetização. Os desenhos compõem uma memória visual coletiva a partir da sua experiência de aprendizagem, perspectiva e território, ao passo que testemunham uma série de ataques violentos sofridos pelo povo Waimiri-Atroari durante a ditadura militar. Obra comissionada para a exposição Metaarquivo: 1964-1985 – Espaço de escuta e leitura de histórias da ditadura, no Sesc Belenzinho, em São Paulo.
Conta-se que no ano de 1492 o primeiro navio europeu, liderado por Cristóvão Colombo, desembarcou na costa de Samaná, atual República Dominicana, e foi recebido por uma chuva de flechas cuidadosamente lançadas pelo Caribe Taíno. Atualmente, um lago salino com o nome do chefe Taíno Enriquillo testemunha profundas mudanças ecossistêmicas que levam à migração de espécies, evacuação forçada e um deserto coral em expansão, que revelam o passado geológico do lago. Tomando a própria câmera como uma flecha, Amérika: baía das flechas procura maneiras de animar, despertar e fazer vibrar novamente esse gesto no presente – flechas contra uma perpétua “queda do céu”.
Ana Vaz | Brasil, França, Holanda, Portugal | 2019, 29’, DCP (acervo da artista)
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Ana Vaz | República Dominicana | 2016, 9’, DCP (acervo da artista)
os cientistas medindo os morcegos ao luar. Aqui, “olhar de perto” direciona o filme para os detalhes, para os materiais visuais e sonoros. No entanto, esses nunca estão desligados da política: um plano do céu feito do fundo de um barranco é suficiente para conjurar os fantasmas dos povos indígenas erradicados, cujas pinturas rupestres, no entanto, continuam a existir. [Texto de apresentação por Charlotte Garson, para o festival Cinéma du Réel, na França, em 2018]
13 Ways of Looking at a Blackbird
Olhe bem as montanhas
Tirando o título de um poema homónimo de Wallace Stevens, 13 Ways of Looking at a Blackbird é composto por uma série de experiências em torno de olhar e ser olhado. A partir de um convite das Galerias Municipais de Lisboa para a participação de Ana Vaz no projeto educativo Descola, o filme tornou-se um caleidoscópio das experiências, questões e deslumbramentos de dois alunos do ensino secundário durante um ano de encontros regulares com a cineasta, questionando o que pode ser o cinema. Aqui, a câmera torna-se um instrumento de investigação, um lápis, uma canção. Numa constelação de frases e desenhos coletivos elaborados durante um dos workshops, um aluno escreveu “O filme é uma música que se pode ver”. Um filme que explora uma ecologia nascente dos sentidos.
“Olhe bem para as montanhas”. A frase foi cunhada pelo artista Manfredo de Souzanetto durante os anos de ditadura do Brasil. As atividades de mineração estavam destruindo o meio ambiente no estado de Minas Gerais, no Sudeste do país. Através da edição, Ana Vaz traça paralelos entre essa região e a muito distante Nord-Pas-de-Calais, no norte da França, também marcada por mais de três séculos de mineração. De um lado, as montanhas erodidas afligem seus habitantes com deslizamentos de terra mortíferos. Ocas e evisceradas, essas montanhas se tornam os receptáculos de uma memória fantasmagórica. Por outro lado, na França, as pilhas de resíduos da mineração tornam-se montanhas e reservatórios de biodiversidade, onde a fronteira entre a natureza e a tecnologia é agora indiscernível. A cineasta nos surpreende a cada plano. A poesia tem precedência sobre qualquer discurso ativista ou ambiental – como na sequência que mostra
Ana Vaz, coelaborado com os estudantes Vera Amaral e Mário Neto | Portugal | 2020, 32’, DCP (acervo da artista)
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Ana Vaz | Brasil, França | 2018, 30’, DCP (acervo da artista)
Programa 3
Amazing Fantasy
Occidente
Desafiando a gravidade, um jogo de levitação torna-se imediatamente a possibilidade de magia; ou uma tradução de um desejo irreprimível de domínio.
Antiguidades tornam-se conjuntos de jantar reproduzíveis, aves exóticas tornam-se uma moeda de luxo, exploração torna-se turismo de esportes extremos, monumentos tornam-se dados terrestres. Um filme-poema de uma ecologia de signos traça uma história colonial que se repete: celebrações e relações de poder, objetos e fetiches, raízes e troncos, poder e classe numa busca para encontrar o seu lugar, o seu lugar ao redor da mesa.
Ana Vaz | França, Japão | 2018, 3’, cópia digital (acervo da artista)
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Ana Vaz | França, Portugal | 2014, 15’, DCP (acervo da artista)
Pseudosphynx
Ana Vaz | Brasil | 2020, 8’, DCP (acervo da artista) Pseudosphinx é o nome científico de lagartasde-fogo que em breve se tornarão mariposas, ou como vulgarmente (e felizmente) lhes chamamos: bruxas. As mariposas-bruxas estão associadas a diversas lendas, uma delas conta que durante a inquisição, na Idade Média, se acreditava que “as bruxas se transformavam em mariposas, numa espécie de transformismo dos seres vivos – reais ou imaginados”. Pseudosphynx é assim, ao mesmo tempo, esfinge, ou seja, monstruosidade ctônica sobre-humana que soletra charadas, e pseudo: artificial, insincera, deceptiva, irreal, ilusória, mimética. Pseudosphynx mantém o seu significado velado, como um segredo entre aquelxs que guardam na retina a impressão háptica do seu voo. Filme comissionado pelo programa IMS Convida, disponível na íntegra em: convida.ims. com.br/.
Sessão Mutual Films Figura e máscara: Nossa voz de terra, memória e futuro + Família nuclear
Sacris Pulso
Ana Vaz | Brasil, Austrália | 2007, 15’, DCP (acervo da artista) Sacris Pulso parte do desmembramento de outro filme, Brasiliários (1985), de Sérgio Basi e Zuleika Porto, adaptação fílmica da crônica “Brasília”, de Clarice Lispector, texto que olha para a capital inaugurada como uma ruína do futuro. Através da montagem de Brasiliários com um corpo de 8mm found footage retratando rituais de viagem e vida familiar na Austrália (onde a diretora Ana Vaz estudava cinema), Sacris Pulso assume a forma de uma viagem de memória e ficção, de passado e futuro, invocando o fantasma espectral de Brasília costurado pelos laços de uma ficção familiar.
A última Sessão Mutual Films de 2022 traz dois filmes políticos que retratam a história nas Américas da invasão europeia e do extermínio de povos indígenas, que resultaram na formação de sociedades bélicas e desiguais. Em Nossa voz de terra, memória e futuro (1981), uma obra-chave dos documentaristas colombianos Marta Rodríguez e Jorge Silva, acompanhamos de perto a luta indígena pela recuperação de suas terras ancestrais na região de Cauca, nos Andes colombianos. Ouvimos relatos e vemos encenações de presenças demoníacas que tomam a forma de donos de terras e estrangeiros ricos – os responsáveis pela perpetuação da opressão da população local. No filme-ensaio Família nuclear (2021), o longa-metragem mais recente dos norte-americanos Erin e Travis Wilkerson, testemunhamos a jornada inquietante da família dos cineastas pelos silos nucleares presentes em todo o território dos Estados Unidos, muitos dos quais coincidem com sítios despovoados de massacres indígenas históricos. Os filmes, realizados com uma distância de 40 anos entre si, se espelham ao utilizarem símbolos arquetípicos para expressar condições sociais de violência que assombram a vida geração após geração. Uma cópia recém-restaurada de Nossa voz vai ser exibida no IMS, enquanto Família nuclear terá sua estreia brasileira. Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
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Nossa voz de terra, memória e futuro
Nuestra voz de tierra, memoria y futuro Marta Rodríguez e Jorge Silva | Colômbia | 1981, 110’, DCP Ao longo da década de 1970, os cineastas colombianos Marta Rodríguez e Jorge Silva trabalharam de forma independente em documentários que mostram as injustiças sofridas por trabalhadores e povos indígenas em seu país. Após realizarem Campesinos (1975), sobre a história recente de movimentos trabalhistas colombianos, eles mergulharam na luta diária do povo Coconuco, na região andina de Cauca, para recuperar suas terras ancestrais. Rodríguez e Silva inicialmente seguiram o método didático materialista usado em Campesinos, mas logo perceberam que, para atingir o público desejado – os próprios indígenas –, eles precisariam mudar a abordagem do filme, descentralizando o pensamento ideológico moderno a favor da incorporação da mitologia
local. Para tal, pulverizaram as vozes, que antes se concentravam em lideranças indígenas, e abarcaram relatos fantasmagóricos sobre a influência do diabo no comportamento violento dos donos de terras e estrangeiros endinheirados. Os diretores entenderam que esses relatos eram uma forma de interpretação da opressão que viviam os povos desde o tempo da colonização e, portanto, para que o filme se tornasse uma ferramenta eficiente para a tomada de consciência indígena sobre seus direitos, era preciso incluir esse universo mágico na narrativa. Eles trabalharam durante quatro anos em Nossa voz de terra, memória e futuro, e contaram com a participação de comissões de cooperativas locais, que prestaram consultoria, inclusive na sala de edição. A realização do filme também envolveu artistas colombianos, como o compositor Jorge López e o grupo musical Yaki Kundra (para a trilha sonora) e o pintor Pedro Alcántara e o diretor de arte Ricardo Duque (responsáveis pela concepção da figura do diabo). O pacto do proprietário rico de terras com o diabo é teatralizado ao longo do filme, por meio de cenas surreais em que um monstro engravatado com um rosto anfíbio interage com uma espécie de Tio Sam a cavalo. Nossa voz narra ainda a história da luta indígena, mostrando as ações do recém-fundado Cric (Conselho Regional Indígena de Cauca), inclusive a reocupação de fazendas e o ensino de matemática, história e alfabetização. São contadas por seus integrantes as histórias de lideranças icônicas, como Juan Tama, no século XVII, Manuel Quintín Lame, nas primeiras décadas do século XX, e Justiniano Lame, um ativista assassinado em 1977, cuja vida é relembrada pela viúva, Gertrudis, 21
e serve como inspiração para lutas atuais. A mistura de diferentes vozes e formas narrativas no filme deu para os cineastas, nas palavras de Jorge Silva, “a oportunidade de fazer algo que nos interessava há muito tempo: tentar ir além do documentário tradicional, que geralmente ignora esses níveis de realidade – os esquece”. Em 1982, Nossa voz de terra, memória e futuro passou no Festival Internacional de Cinema de Berlim, na mostra Forum, organizada pelo Arsenal – Institut für Film und Videokunst e.V. Décadas depois, a mesma entidade restaurou digitalmente dois filmes de Rodríguez e Silva – Chircales (1971), em 2014, e Nossa voz, em 2019. O trabalho de restauração foi realizado em parceria com a Fundación Cine Documental (produtora de Rodríguez e Silva) e Hollywoodoo Films (produtora de seu filho e também cineasta, Lucas Silva), que providenciaram os negativos originais de imagem e som. [Parte da entrevista de Jorge Silva e Marta Rodríguez para o documentário New Cinema of Latin America, Part II: The Long Road (1981), dirigido por Michael Chanan, está disponível, em espanhol, no link: vimeo.com/362436707]
Família nuclear
Nuclear Family Erin Wilkerson e Travis Wilkerson | EUA, Singapura | 2021, 96’, DCP O filme-ensaio abre com a definição de “espécie invasora”: “Qualquer organismo vivo que não é nativo a um ecossistema e provoca mal”. Em seguida, o cineasta norte-americano Travis Wilkerson relata para o espectador que, durante sua infância nas décadas de 1970 e 1980, sua mãe – uma militante política obcecada com a guerra nuclear – levava a família em viagens de carro pelos silos armamentícios presentes em todo o território estadunidense. A premissa de Família nuclear, filmado em 2019, é retomar essa viagem, numa tentativa de exorcizar os pesadelos do cineasta causados pelas recentes eleições no país. Embarcam Travis, sua esposa, a também cineasta Erin Wilkerson, seus filhos e o cachorro. Acompanhamos a família em uma jornada que reflete sobre a relação entre a história de violência dos colonos americanos contra os povos indígenas e a construção de
Novembro Negro uma cultura estruturada no empoderamento bélico. Encontramos campos vastos e vazios, que parecem ser ocupados apenas pela família de turistas acidentais, enquanto ouvimos o patriarca descrever ora uma batalha histórica realizada em um local não marcado, ora dados e notícias sobre os silos, guardados por militares que vivem isolados e em condições precárias. Esporadicamente, a tela é preenchida por fotos polaroides de flores nativas e não nativas tiradas por Erin. A trilha sonora inclui as músicas que a família escutou durante a viagem, como “Nuclear War”, da The Sun Ra Arkestra, cujas letras alarmantes se transformam em um refrão melancólico. O casal Wilkerson criou o coletivo Creative Agitation [Agitação Criativa] em 2009 e, por meio dele, colaborou em diversos projetos, entre filmes, videoinstalações e uma revista eletrônica de arte política. Família nuclear marca a primeira colaboração dos dois artistas na autoria de um longa-metragem. Erin possui um extenso trabalho em artes visuais, com um olhar voltado para a arquitetura e para o impacto destruidor da intervenção humana sobre a paisagem. Travis possui uma longa filmografia, focada em eventos que subvertem a história ilibada dos Estados Unidos, seu conceito de liberdade e as consequências de um sistema capitalista nocivo – muitas vezes fazendo conexões com seus próprios antepassados. Quando a família visita um fosso na cidade de Butte, em Montana (onde Travis cresceu) – considerado o primeiro grande desastre ambiental do país, consequência da exploração indevida de uma empresa de mineração do início do século XX –, ouvimos que, ano após ano, 22
centenas de gansos morrem ao pousar nas águas superácidas do fosso. A família, ao mesmo tempo vítima e agressor, prenuncia o futuro de uma sociedade que caminha para sua autoextinção. Família nuclear teve sua estreia mundial em 2021 no Festival Internacional de Cinema de Mar del Plata, onde ganhou uma menção honrosa na mostra competitiva Estados Alterados. Desde então, ele tem passado em diversos festivais, como os de Jeonju e Yamagata, e na mostra Forum, no Festival Internacional de Cinema de Berlim. Ele terá sua estreia brasileira no IMS. A Sessão Mutual Films tem curadoria e produção de Aaron Cutler e Mariana Shellard.
Alma e Rainbow
Alma’s Rainbow Ayoka Chenzira | EUA | 1993, 86’, DCP (Milestone Films & Kino Lorber) Um misto entre comédia e drama em torno do amadurecimento de três mulheres negras que vivem no Brooklyn. O longa-metragem de Ayoka Chenzira explora a vida da adolescente Rainbow Gold, que está crescendo e navegando em conversas e experiências em torno de padrões de beleza, autoimagem e os direitos que as mulheres negras têm sobre seus corpos. Rainbow frequenta uma escola paroquial rigorosa, estuda dança e está começando a se envolver com os meninos. Ela vive sob a criação rígida de sua mãe, Alma Gold, que administra um salão de beleza dentro de casa. Quando Ruby, tia de Rainbow e irmã de Alma, retorna de Paris após uma ausência de dez anos, as irmãs entram em conflito sobre como deve ser a criação da jovem. Alma e Rainbow, que está sendo apresentado pela primeira vez no Brasil em versão restaurada em 4K, destaca um mundo de mulheres negras com
complexidade e profundidade, no qual as personagens vivem, amam e lutam sobre o que significa exercer sua agência. O filme foi escrito, dirigido e produzido pela artista e professora Ayoka Chenzira. Premiada e aclamada internacionalmente, Chenzira foi uma das primeiras mulheres afro-americanas a lecionar produção cinematográfica no ensino superior, além de ser apontada como a primeira artista da animação afro-americana. O título original, Alma’s Rainbow, foi uma sugestão da cineasta Julie Dash (Daughters of the Dust, 1991). Atualmente, Chenzira trabalha em uma adaptação audiovisual do romance Kindred – Laços de sangue, de Octavia E. Butler. “Partes do filme são autobiográficas”, comenta a diretora em depoimento disponibilizado no dossiê de imprensa do filme. “Minha mãe tinha um lindo salão de beleza aonde as mulheres vinham e contavam as histórias mais incríveis e davam suas opiniões sobre o mundo. Mas, principalmente, eu queria fazer Alma e Rainbow porque, já adulta, morando no Brooklyn, em Nova York, conhecia muitas meninas que estavam tendo dificuldades com as mães. As histórias eram todas iguais. As mães mantinham as filhas muito, muito perto, por medo de que se tornassem mães adolescentes. E as filhas estavam ficando muito inventivas em criar maneiras de escapar do olhar atento da mãe. Então, é no centro dessa dança que Alma e Rainbow se situa.” Esta nova restauração 4K foi realizada pela distribuidora Milestone Films, pelo Academy Film Archive e pela Film Foundation. Será exibida na mesma sessão de Sylvilla: eles dançam seus batuques. Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia). 23
Esta cópia foi restaurada pelo Academy Film Archive e financiada pela Film Foundation. Será exibida na mesma sessão de Alma e Rainbow. [Depoimento da diretora extraído do livro Reel Black Talk: A Sourcebook of 50 American Filmmakers, de Spencer Moon] Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Sylvilla: Eles dançam seus batuques
Sylvilla: They Dance to Her Drum Ayoka Chenzira | EUA | 1979, 25’, cópia digital (Milestone Films & Kino Lorber) Filmado em 16 mm e apresentado em um novo scan 4K, este curta documentário é um retrato da dançarina e coreógrafa Sylvilla Fort, uma artista negra pioneira que influenciou uma geração de dançarinas. “Esse é um trabalho extremamente pessoal sobre minha professora de dança”, comenta a diretora Ayoka Chenzira. “Ela morreu antes que estivesse terminado. É o único documentário feito sobre essa mulher, que é o elo entre [os bailarinos e coreógrafos] Katherine Dunham e Alvin Ailey. Ela morreu cinco dias após um incrível tributo a ela ser realizado na data do meu aniversário. Após sua morte, fiquei um bom tempo sem conseguir fazer filmes.”
Calypso Rose
Calypso Rose – The Lioness of the Jungle Pascale Obolo | França, Trinidad e Tobago | 2011, 85’, DCP (Arte Distribution) Embaixatriz da música caribenha, Calypso Rose é uma lenda viva. Para homenageá-la, a cineasta franco-camaronesa Pascale Obolo passou quatro anos com a diva da Calypso Music, em uma trajetória muito especial. “Juntas, refizemos os passos de sua vida passada e presente”, comenta a diretora Pascale Obolo. “Eu estava com ela quando ela gravou seu último álbum em Paris, visitamos Nova York, onde ela vive pelos últimos 20 anos, e viajamos para Tobago, a ilha onde ela nasceu e para onde retorna regularmente para se reconectar com suas raízes africanas e sua grande paixão pela pesca e sua espiritualidade, e depois para Trinidad, onde sua carreira internacional começou − e até para a África, para redescobrir suas raízes.” O documentário aborda não só a memória, o intercâmbio e a descoberta de diversas culturas do mundo, mas também a jornada de uma mulher 24
militante e autêntica. Cantora e compositora, feminista, espiritualista, celebridade e mulher negra consciente de sua origem. Nas palavras de Obolo, “na aurora da sua vida, acompanho uma grande senhora pela vereda da memória. Nessa busca, encontramos alguns cúmplices, companheiros de conflitos ou amigos de longa data. Avançando no fio que liga seu mundo privado ao exterior, somamos e subtraímos o resto de seus sonhos e suas decepções. Ela compartilha conosco o que a faz viver e o que nos faz viver. Porque a história dela também é a nossa.” [Depoimento de Pascale Obolo no portal AfricAvenir, em francês: bit.ly/calypsoims] Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Meu amigo Fela
Joel Zito Araújo | Brasil | 2019, 92’, DCP (O2 Play) Revolucionário, visionário, gênio, guerrilheiro, pan-africanista e pop star. São muitos adjetivos que podem ser aplicados a Olufela Olusegun Oludotun Ransome-Kuti, mais conhecido como Fela Kuti. Nascido na Nigéria em outubro de 1938, Fela estudou música em Londres e faleceu em agosto de 1997. O multi-instrumentista foi um dos pioneiros do gênero afrobeat, além de ter sido ativista político e defensor dos direitos humanos. Em Meu amigo Fela, o diretor brasileiro Joel Zito Araújo vai a Nova York entrevistar o cubano Carlos Moore, amigo íntimo e biógrafo oficial de Fela, com o objetivo de tentar entender o homem que viveu por trás do mito de “excêntrico ídolo pop africano do gueto”. Segundo o diretor, Carlos Moore não é o único amigo de Fela a que o título do filme faz referência. “Na realidade, o título Meu amigo Fela refere-se a todos os amigos de Fela Kuti que estão no filme, e indiretamente eu, um amigo mesmo que imaginário”, conta o realizador em entrevista à Revista
de Cinema. “O dispositivo fílmico para contar a história do Fela consistiu em buscar os relatos dos amigos íntimos desse grande e trágico artista. Lá, você verá o biógrafo, a amante norte-americana que fez a cabeça de Fela, o filho, uma das suas 27 esposas, os artistas gráficos, o baterista que ajudou a criar o afrobeat, e assim por diante. Eu queria, portanto, fazer um documentário que entrasse na intimidade de Fela, e esta foi a estratégia que inventei. Carlos Moore acabou tendo um papel discreto de condutor da memória coletiva. É importante também dizer que Fela foi a minha maneira de falar da África, da geração de pan-africanistas que sempre admirei e de minhas angústias com as tragédias que o continente viveu e vive. É, portanto, um filme que tem também o meu ponto de vista, nesse sentido.” [Íntegra da entrevista de Joel Zito Araújo em: bit. ly/felaims] Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
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Miles Davis, inventor do cool Miles Davis, Birth of the Cool Stanley Nelson | EUA | 2019, 115’, DCP
Miles Davis é um grande nome da música do século XX. Foi quem mudou os rumos do jazz inúmeras vezes, revelou nomes importantíssimos na história da música − como John Coltrane, Herbie Hancock, Chick Corea −, levou o jazz às massas na ilha Wright e foi o porta-voz de diferentes gerações. Este documentário mergulha em seis décadas de carreira de Davis: de seus dias como estudante da Juilliard ao desenvolvimento de seu som característico em gravações com seu famoso quinteto, de suas colaborações com Gil Evans às suas mudanças para novos paradigmas musicais nos anos 1970 e 1980. À medida que o filme acompanha os triunfos musicais de Davis, os meandros de sua complicada vida pessoal são contados com reflexões íntimas das pessoas mais próximas a ele. “Eu quis fazer um filme que se ocupasse apenas de música e de um músico, e eu amo jazz, e qual tema seria melhor do que Miles Davis, sabe?”,
comentou Stanley Nelson em uma fala de apresentação do filme para o American Film Institut em junho de 2021. “Ele era uma pessoa realmente complicada, e uma das questões que nos orientou enquanto fazíamos o filme era: como um cara que não era muito legal na maior parte do tempo podia fazer uma música tão bela? E não é apenas sua incrível música e seu incrível gosto musical que vão durar pra sempre − o álbum de jazz mais vendido de todos os tempos é Kind of Blue. Mas era também a forma como ele se vestia, os carros que ele dirigia. Ele dirigia Ferraris e Lamborghinis. Ele saía e se casava com mulheres incrivelmente belas e inteligentes. Ele era um ícone. Como alguém diz em algum momento do filme: para ser cool, bastava levar um disco do Miles Davis debaixo do braço. Mas eu acredito que Miles é sempre um farol para mim e muitas outras pessoas, porque ele estava em permanente mudança. Ele estava satisfeito com o que tinha feito, mas então resolvia fazer outra coisa, e mais outra e mais outra. E não apenas para ser diferente, mas porque era nisso que ele acreditava e era isso o que ele fazia.” Miles Davis, inventor do cool foi feito para a série de televisão American Masters, da rede americana PBS, e estreou no Festival de Cinema de Sundance em 2019. Em 2021, ganhou dois prêmios Emmy por Melhor Documentário de Arte e Cultura e Melhor Som. [Íntegra da fala de Stanley Nelson, em inglês: youtu.be/nqC5Ls4kTmY] Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia).
Festival Nicho Novembro Em sua quarta edição, o festival negro de cinema Nicho Novembro acontece na cidade de São Paulo de 4 a 13 de novembro. O evento é realizado pelo Instituto Nicho 54, organização fundada em 2019 com a missão de desenvolver carreiras de profissionais negros em posições de liderança no mercado audiovisual, buscando promover equidade racial e de gênero em toda cadeia do setor, e ao mesmo tempo contribuir para expandir o imaginário sobre sonhos e caminhos de vida para pessoas negras no Brasil. Nesta edição, o Festival Nicho Novembro realiza no Cinema do IMS seus painéis de mercado e o programa Show Me the Fund. Alinhada à perspectiva de compartilhamento de informações, conhecimentos e cases de sucesso, as conversas do painel de mercado são um ciclo de encontros com profissionais do cenário nacional e internacional de cinema e TV. Os encontros acontecerão no Cinema do IMS Paulista de 8 a 11 de novembro de 2022, das 15h às 16h30. Os interessados deverão se inscrever por meio da página do evento no Sympla. A participação é aberta ao público geral, sujeita à lotação da sala. Inscrições pelo link: sympla.com.br/produtor/ festivalnichonovembro2022.
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8/11, terça-feira, 15h Conversa com Claire Diao (participação por videoconferência) Mediação de Viviane Pistache
Claire Diao é uma crítica é distribuidora de cinema franco-burquina. Ela fundou o programa de curtas-metragens Quartiers Lointains em 2013, cofundou a revista crítica pan-africana de cinema Awotele em 2015 e é CEO da empresa de distribuição de filmes pan-africana Sudu Connexion desde 2016. Em 2018, integrou a comissão de seleção oficial da Quinzena dos Realizadores de Cannes e, em 2022, a comissão de seleção da Fespaco.
9/11, quarta-feira, 15h Show Me the Fund O programa Show Me the Fund, representado em nossa atividade por Josephine Bourgois, aproxima profissionais do audiovisual brasileiro com fundos internacionais para seus projetos. O Projeto Paradiso, um dos realizadores dessa iniciativa, trará para o Festival Nicho Novembro Jane Mote, consultora editorial do Whickers Film TV Funding Award, fundo internacional que financia documentários, para um bate-papo com a comunidade Nicho 54, com apresentação, regras do fundo e manual de boas práticas da aplicação. Apresentação de Josephine Bourgois e Fernanda Lomba + conversa com Jane Mote, que participa por videoconferência.
10/11, quinta-feira, 15h Apresentação do Nicho Executiva Com Fernanda Lomba e participantes do programa.
Apresentação do programa e compartilhamento de experiências, marcos e avaliações ao longo de 2022.
11/11, sexta-feira, 15h Conversa com Maria Ângela Mediação de Fernanda Lomba
Maria Ângela de Jesus é diretora sênior de produção de conteúdo da Paramount, responsável pela implementação das estratégias de produção, em todos os gêneros e formatos. Além disso, ela administra o relacionamento com produtoras e principais profissionais do mercado brasileiro.
coleção DVD | IMS
Criada em 2012 pelo então coordenador de cinema José Carlos Avellar (1936-2016), a coleção DVD | IMS já lançou diversos filmes, entre produções brasileiras e estrangeiras. Grey Gardens Albert Maysles, David Maysles, Ellen Hovde, Muffie Meyer | EUA | 1975, 94’ As Beales de Grey Gardens. Albert Maysles e David Maysles | EUA | 2006, 91’)
Em 1973, um escândalo tomou as manchetes dos jornais americanos. Alegando falta de condições sanitárias, as autoridades de East Hampton, um balneário de luxo a 160 quilômetros de Nova York, tentaram expulsar as duas moradoras de uma mansão à beira-mar. Elas viviam isoladas ali, em Grey Gardens, há mais de 20 anos, entre guaxinins, sujeira e mato. Notícia banal, não fossem elas Edith Bouvier Beale e sua filha de 56 anos, Edie, respectivamente, tia e prima de Jacqueline Kennedy Onassis. Dois anos depois, Big Edie e Little Edie abrirão as portas de Grey Gardens a Albert Maysles e David Maysles. Eles registrarão a personalidade e os conflitos de mãe e filha, mulheres inteligentes e excêntricas. Esta edição em DVD duplo inclui ainda As Beales de Grey Gardens, em que, passadas três décadas do lançamento de seu filme, os irmãos Maysles revisitam e apresentam parte das sobras de montagem. Extras: - Faixa comentada por Albert Maysles, Ellen Hovde, Muffie Meyer e Susan Froemke - Entrevista de Albert Maysles a João Moreira Salles (2006) - Livreto com depoimentos de Albert Maysles, Susan Froemke e Ellen Hovde
O futebol, de Sergio Oksman O botão de pérola e Nostalgia da luz, de Patricio Guzmán Photo: Os grandes movimentos fotográficos Homem comum, de Carlos Nader Vinicius de Moraes, um rapaz de família, de Susana Moraes Últimas conversas e Cabra marcado para morrer, de Eduardo Coutinho A viagem dos comediantes, de Theo Angelopoulos Imagens do inconsciente e São Bernardo, de Leon Hirszman Os dias com ele, de Maria Clara Escobar A tristeza e a piedade, de Marcel Ophüls Os três volumes da série Contatos: A grande tradição do fotojornalismo; A renovação da fotografia contemporânea; A fotografia conceitual La Luna, de Bernardo Bertolucci Cerimônia de casamento, de Robert Altman Conterrâneos velhos de guerra, de Vladimir Carvalho
Vidas secas e Memórias do cárcere, de Nelson Pereira dos Santos O emprego, de Ermanno Olmi Iracema, de Jorge Bodanzky e Orlando Senna Cerimônia secreta, de Joseph Losey As praias de Agnès, de Agnès Varda A pirâmide humana e Cocorico! Mr. Poulet, de Jean Rouch Diário 1973-1983 e Diário revisitado 1990-1999, de David Perlov Elena, de Petra Costa A batalha de Argel, de Gillo Pontecorvo Libertários, de Lauro Escorel, e Chapeleiros, de Adrian Cooper Seis lições de desenho com William Kentridge Sudoeste, de Eduardo Nunes Shoah, de Claude Lanzmann Memórias do subdesenvolvimento, de Tomás Gutiérrez Alea E três edições voltadas à poesia: Poema sujo, dedicado a Ferreira Gullar; Vida e verso e Consideração do poema, dedicados a Carlos Drummond de Andrade
Os DVDs podem ser adquiridos nas livrarias especializadas, nas lojas dos nossos centros culturais e na loja online do IMS: bit.ly/imsdvd. 27
Curadoria de cinema Kleber Mendonça Filho
Programadora de cinema Marcia Vaz
Programador adjunto de cinema Thiago Gallego Assistente de programação/ produção Lucas Gonçalves de Souza
Projeção Ana Clara Costa e Bruno Galindo Legendagem eletrônica Pilha Tradução Revista de Cinema IMS
Produção de textos e edição Thiago Gallego e Marcia Vaz
Os filmes de novembro
O programa do mês tem o apoio da 46ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, do Instituto Nicho 54, da APAN, do Festival Internacional do Audiovisual Negro do Brasil, do BR Lab, do +Mulheres Lideranças do Audiovisual Brasileiro, da ONU Mulheres, da Mutual Films, da Pivô, da Firelight Media, da Arte Distribution, Dynamo Production, da Fundación Cine Documental, da Creative Agitation e das distribuidoras Embaúba, Kino Lorber, Milestone Films, O2 Play, Pandora Filmes e Vitrine Filmes. Agradecemos a Viviana Santiago; Ana Vaz, Ana Roman, Carolina de Sá; Rafael Sampaio; Goretti Vidal; Nina Tedesco; Tobias Hering; Luís Felipe Flores/Cinecipó; ao Instituto Cultural da Dinamarca; ao Festival Ponte Nórdica e ao Institut für Film und Videokunst e.V., nas pessoas de Carsten Zimmer, Gesa Knolle e Markus Ruff/Arsenal. Parceria
Os filmes de Ana Vaz
Diagramação Marcela Souza e Taiane Brito Revisão Flávio Cintra do Amaral
Mostra de SP
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Festival Nicho Novembro
Venda de ingressos Ingressos à venda pelo site ingresso.com e na bilheteria do centro cultural, a partir das 12h, para sessões do mesmo dia. No ingresso.com, a venda é mensal, e os ingressos são liberados no primeiro dia do mês. Ingressos e senhas sujeitos à lotação da sala. Capacidade da sala: 145 lugares. Meia-entrada Com apresentação de documentos comprobatórios para professores da rede pública, estudantes, crianças de 3 a 12 anos, pessoas com deficiência, portadores de Identidade Jovem, maiores de 60 anos e titulares do cartão Itaú (crédito ou débito). Devolução de ingressos Em casos de cancelamento de sessões por problemas técnicos e por falta de energia elétrica, os ingressos serão devolvidos. A devolução de entradas adquiridas pelo ingresso.com será feita pelo site. Programa sujeito a alterações. Eventuais mudanças serão informadas em facebook. com/cinemaims e ims.com.br. Não é permitido o acesso com mochilas ou bolsas grandes, guarda-chuvas, bebidas ou alimentos. Use nosso guarda-volumes gratuito. Confira as classificações indicativas no site do IMS.
Apiyemiyekî?, deAna Vaz (Brasil, França, Holanda, Portugal 2019, 29’, cópia digital)
Nossa voz de terra, memória e futuro (Nuestra voz de tierra, memoria y futuro), de Marta Rodríguez e Jorge Silva Colômbia | 1981, 110’, DCP)
Terça a quinta, domingos e feriados sessões de cinema até as 20h; sextas e sábados, até as 22h.
Visitação, Biblioteca, Balaio IMS Café e Livraria da Travessa Terça a domingo, inclusive feriados das 10h às 20h.
Fechado às segundas.
Última admissão: 30 minutos antes do encerramento. Entrada gratuita.
Avenida Paulista 2424 CEP 01310-300 Bela Vista – São Paulo tel: (11) 2842-9120 imspaulista@ims.com.br
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