Ebook DIIP VOL 1

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Desenvolvimento

Infantil e Intervenção

Precoce: com ênfase no Modelo

Centrado na Família

VOLUME 1

Organização

Régis Nepomuceno Peixoto

Stéphani de Pol

Ariane Hidalgo

Organização

Régis Nepomuceno Peixoto, Stéphani de Pol e Ariane Hidalgo

Revisão

Alice Wilken de Pinho e Jéssica Rodriguez Lara

Projeto gráfico e diagramação

Débora Mathias

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

n a f a m í l i a : v o l u m e 1 / o r g a n i z a ç ã o R é g i s N e p o m u c e n o P e i x o t o , S t é p h a n i d e P o l ,

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A r i a n e

Índices para catálogo sistemático:

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Reservado todos os direitos de publicação por: Inclusão Eficiente Assessoria e Consultoria em Reabilitação e Inclusão LTDA.

Rua Brigadeiro Franco, 3323 - Rebouças, Curitiba/PR, 80220-100 contato@institutoinclusaoeficiente.com.br

SUMÁRIO

Apresentação

O Instituto Inclusão Eficiente nasceu do sonho de um mundo diferente, onde todos podem ter e receber oportunidades com equidade, sem preconceito com suas diferenças, um mundo onde a diversidade é contemplada e no qual todos podem usufruir dos seus direitos plenamente.

Há mais de 10 anos, em Chapecó/SC, nascemos como empresa, com a proposta de levar essa experiência de sucesso a outros locais. Hoje, estamos presentes nas regiões Nordeste, Sudeste, Centro Oeste e Sul do Brasil, com pólos em Recife/PE, São Paulo/ SP e Goiânia/GO. Também contamos com núcleos espalhados por todo Brasil, em parcerias com profissionais que compartilham dos mesmos ideais.

Primamos diariamente pela busca de processos inovadores e de máxima qualidade nas áreas de inclusão e reabilitação de pessoas com dificuldades ou deficiências, com temáticas permeadas pelas áreas da saúde e da educação.

Nosso motivo maior é oferecer cursos com profissionais renomados, tanto nacionais quanto internacionais, e levar o conhecimento para onde ele de fato precisa chegar: aos profissionais e familiares que são agentes diários de transformação, os quais através das mudanças de paradigmas e suporte oferecido, poderão ampliar a participação social de todos. Muito mais do que isso, poderão incentivar o protagonismo de todos nós, a partir das nossas histórias de vida.

Este livro é parte da nossa história, mas a tônica maior é poder fazer parte da história de cada profissional que esteve com a gente nos Cursos de Especialização Lato Sensu, em parceria

com a Faculdade IPPEO. Esta edição faz parte dos cursos de Pósgraduação Lato Sensu em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce, com ênfase no modelo centrado na família, coordenado pela Fisioterapeuta Mestra Stéphani de Pol.

Os leitores poderão encontrar, em cada capítulo, mais do que os trabalhos de conclusão de curso de cada aluno, um pouco da história de formação de cada um. E, assim, coletivamente caminhamos na direção da construção de uma clínica ampliada, na qual o fazer de cada um impacta a todos, na perspectiva da construção social da nossa missão inicial na qual a representatividade deva ser conquistada e a participação social seja uma garantia de direitos humanos.

Esperamos que a temática, tão valorizada pela equipe da Inclusão Eficiente e pelos alunos deste curso de especialização, possa lhe ser útil, trazendo reflexões e novos aprendizados.

Em tempo, ressaltamos nosso agradecimento a todos os colaboradores desta obra rica e cheia de significados.

Prefácio

A família desempenha um papel crucial no desenvolvimento infantil, sendo o primeiro e o mais importante ambiente de aprendizagem. Em um contexto familiar seguro e estimulante, as crianças têm a oportunidade de desenvolver habilidades emocionais, cognitivas e sociais essenciais para seu crescimento. Aqui, neste e-book, veremos como a presença e participação da família são preponderantes para que os desdobramentos do desenvolvimento infantil sejam alcançados em sua plenitude, levando à criança a desenvolver-se de maneira segura, plena e integral.

Embora nem todos os capítulos da obra abordem a participação familiar em suas pesquisas, é evidente que a temática é um grande destaque, já que na contemporaneidade sabe-se comprovadamente que a colaboração ativa entre a família e os profissionais de saúde e educação é fundamental para garantir a eficácia do desenvolvimento máximo da criança.

Esta publicação só foi possível graças ao empenho e à curiosidade de muitos, sobretudo dos nossos alunos e docentes que participaram ativamente do curso de Pós-Graduação Lato sensu em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família. Assim, esta obra ratifica o compromisso do Instituto Inclusão Eficiente em fazer com que a ciência chegue a todos os lugares, de maneira acessível, sempre em busca de disseminar fontes seguras que respeitam à academia e os saberes científicos.

Esperamos que a leitura desta obra seja uma ponte que promova a compreensão da relevância da participação familiar em todos os processos do desenvolvimento infantil, seja ele atípico ou não.

Mestra Ariane Hidalgo

Pedagoga do Departamento Educacional Instituto Inclusão Eficiente

INTRODUÇÃO ALIMENTAR EM CRIANÇAS DE 0 A 2 ANOS: UM

GUIA PARA CUIDADORES PAIS E PROFISSIONAIS

Juliana Anselmo Bassoli Gatto

Letícia Figueiredo Gazzinelli

Marcela Paula Conceição de Andrade Oliveira

INTRODUÇÃO

A saúde e o desenvolvimento integral da criança estão intimamente relacionados à alimentação até os 2 anos de vida. Por isso, essa é uma preocupação das famílias, dos profissionais que atendem às crianças e da sociedade como um todo. Busca-se sempre melhorar a alimentação da criança, principalmente, considerando que é na primeira infância que se constroem os principais hábitos alimentares (BRASIL, 2021).

No sentido de evitar baixo peso ao nascer, a ausência do aleitamento materno e introdução alimentar inadequada, fatores que podem resultar em obesidade infantil, ou eutróficos não-saudáveis. Além disso, podem surgir dificuldades alimentares como seletividade alimentar, por erro de interpretação de familiares e profissionais envolvidos e ocorrência de uma doença grave (física ou comportamental) que altera a ingesta de alimentos (FISBERG, 2022).

Os pais/cuidadores desempenham um papel fundamental na construção dos hábitos de alimentação saudável das crianças até os 2 anos. A orientação adequada aos responsáveis sobre alimentação infantil pode ser uma estratégia efetiva, visto que são os provedores da alimentação e influenciam as preferências nutricionais. Assim, a oferta com diversidade de elementos é necessária para a formação do repertório alimentar da criança. A alimentação diversificada respalda o desenvolvimento e crescimento infantil adequados, prevenindo doenças em curto e longo prazo (WEFFORT, 2022).

Para a orientação aos pais, diversos profissionais da saúde são chamados em busca de um enfoque holístico da situação da criança. O pediatra, o gastroenterologista, o neurologista, o nutricionista, o fonoaudiólogo e o terapeuta ocupacional, dentre outros, precisam trabalhar em conjunto para obter um resultado efetivo (FISBERG, 2022).

Nesta perspectiva, este capítulo tem por objetivo compilar informações que orientem os pais e profissionais sobre a introdução alimentar de crianças de 0 a 2 anos de idade por meio de um guia com foco na criança. Para isso, foi realizada uma pesquisa bibliográfica descrevendo, inicialmente, os marcos do desenvolvimento motor oral da criança de 0 a 2 anos, compreendendo que esses marcos são fundamentais para a introdução alimentar de forma adequada. Espera-se contribuir cientificamente na discussão da alimentação infantil e, principalmente, ajudar os pais a construírem hábitos alimentares mais saudáveis com as crianças, nessa faixa etária, além de dar suporte aos profissionais para a orientação parental.

A CRIANÇA DE 0 A 2 ANOS

O aleitamento materno é indicado, pelo menos, até os 6 meses de idade de forma integral. Esse é o período em que se estabelece o contato afetivo entre mãe e bebê, fundamental para o desenvolvimento emocional e físico da criança. Após os 6 meses, inicia-se uma alimentação complementar respeitando o apetite da criança e o tempo para se adaptar às novidades como utensílios, consistência

e o sabor dos alimentos (MÜLLER; MARIN; DONELLI, 2015).

A rejeição aos alimentos pela criança, entretanto, pode acontecer e é necessária a atenção dos pais, visto que pode estar relacionada à alergia alimentar ou alterações gastrointestinais, sintomas como dor e desconforto durante a alimentação, episódios de vômitos (BRUSCO et al., 2014) ou alteração da motricidade orofacial, a qual tem como possíveis causas prematuridade, alterações em estruturas orofaciais ou até a ausência de estímulos adequados. Os fonoaudiólogos, muitas vezes, são indicados para intervir com programas de tratamento da motricidade orofacial de crianças com o objetivo de “fazer a criança comer” (JUNQUEIRA et al., 2017).

O DESENVOLVIMENTO MOTOR E ORAL

A aquisição da autonomia em se alimentar, envolve o desenvolvimento, nos 2 primeiros anos de vida, de padrões progressivos de habilidades motoras grossas, finas e oro-motora. A maturação dessas habilidades são alcançadas, concomitantemente, ao desenvolvimento do Sistema Nervoso Central (SNC) relacionada à experiência de aprendizado. No desenvolvimento motor, cada etapa é consequência da precedente e necessária à posterior, evoluindo de forma organizada (TELLES; MACEDO, 2008).

Ao nascer, o bebê inicia sua primeira função vital: a respiração que depende do desenvolvimento adequado do crânio e da face. A alimentação inicia com a sucção que é uma função estomatognática com papel importante na regulação neurofisiológica,

no desenvolvimento craniofacial e proporciona equilíbrio entre os componentes muscular e ósseo. São os movimentos de sucção que permitirão o desenvolvimento da mandíbula e maior mobilidade da língua. Quando o leite chega à parte posterior da língua é desencadeada a deglutição, função reflexa constituída por sequências de contrações musculares coordenadas para transportar o alimento da cavidade oral até o estômago (FIGUEIRA, 2017).

Entre o 3º e o 9º mês, inicia-se a dissociação entre sucção e deglutição. Competências motoras orais e globais facilitam a introdução de utensílios para a alimentação complementar, essencial ao bebê, devido às suas necessidades nutricionais. O controle da cabeça e estabilidade do tronco fornece a base motora para a função motora fina das mãos e boca e os movimentos motores orais para alimentação (TELLES; MACEDO, 2008). Entre o 5º e 6º mês, surgem os primeiros dentes e há participação do lábio superior na retirada do alimento do utensílio. Inicia-se a integração do reflexo de morder na mastigação (MEDEIROS, 2002). Nesse período, deve-se introduzir a alimentação complementar com consistência pastosa e homogênea, passando, progressivamente, para os sólidos. Esse processo deve considerar o desenvolvimento das estruturas orofaciais da criança, além do seu desenvolvimento neuromotor e sensorial (FIGUEIRA, 2017).

Segundo o estudo de Delaney (2010), por volta do 12º mês, o bebê traz a cabeça para a frente para aceitar a colher e consegue remover alimentos de forma rápida e eficiente da colher, usando os lábios superior e inferior. Já há uma maior flexibilidade da língua, inclusive lateralmente. Aos 12 meses, aparece a lateralização da língua. Além disso, consegue comer alimentos com

pequeno caroço, sem engasgar, e pode beber em um copo com a ajuda do adulto. Telles e Macedo (2008) explicam que, nesta fase, a mandíbula apresenta características motoras mais elaboradas que língua e lábios por ser a estrutura oral mais próxima da cintura escapular e do tronco. As habilidades motoras globais elevam-se e o domínio da capacidade de sentar apresenta-se como pré-requisito para o desenvolvimento adequado do controle oral.

Ao completar um ano de vida, o bebê já apresenta todas as habilidades oro-motoras e sensitivas adequadas para a autoalimentação. Ele já tenta comer sozinho, com as mãos ou utensílios oferecidos, e mastiga bem alimentos que não são muito duros. No entanto, pode haver dificuldade na mistura de textura dos alimentos. A criança já tem dentes suficientes, postura de lábios adequada e tonicidade muscular para uma alimentação mais sólida (DELANEY, 2010)

Durante esse período, tem-se uma fase relevante para oferecer ao bebê um leque variado de alimentos considerando o patamar neuromotor em que se encontra. Permanecer em texturas pastosas pode alterar a musculatura orofacial e diminuir seu tônus, o que pode levar à alteração do padrão mastigatório e ao crescimento craniofacial (FIGUEIRA, 2017).

Finalmente, ao completar os 2 anos de vida há o aperfeiçoamento das capacidades oro-motoras da criança que já mastiga e ingere de forma independente e adequada. Essas habilidades individuais precisam ser associadas aos estímulos do meio ambiente para a alimentação saudável (DELANEY, 2010).

UM

Aspectos da recusa alimentar estão especialmente associados às práticas parentais dentro do ambiente domiciliar. A promoção de um ambiente familiar estruturado, com práticas orientadas, pode ser um ótimo aliado para o repertório alimentar mais saudável (FAVRETTO; AMESTOY; TOLENTINO-NETO, 2021).

Os pais precisam saber que o importante não é só o que a criança come, mas também como, quando, onde e quem a alimenta. Isso porque é extremamente relevante a interação entre o provedor da alimentação e a criança situação denominada alimentação responsiva: o cuidador tem a responsabilidade de estar sensível aos sinais da criança durante a refeição e aliviar tensões que possam ocorrer fazendo das refeições momentos agradáveis (CUNHA et al., 2018)

Segundo Scharf et al. (2016), o que esperar do seu bebê:

Aos 3 meses: já acompanha objetos com os olhos, tem controle de cabeça, traz a mão na boca e faz “puppy”.

Imagem 1: Bebê fazendo “puppy”

Aos 4/5 meses: leva brinquedos e objetos à boca, rola em bloco, começa a sentar com apoio (a partir dos 6 meses), interessa-se pelo que o adulto está comendo e faz “esfinge” (entre 4 e 5 meses).

Imagem 2: Bebê fazendo “esfinge”

Para que seu bebê atinja os marcos, descritos acima, é importante estimular seu desenvolvimento de maneira adequada em cada fase. Pensando na introdução alimentar, podemos orientar com as seguintes atividades e vivências (SCHARF et al., 2016):

• Faça “tummy time” (deixar o bebê de bruços ao longo do dia, quando acordado) desde o primeiro mês de vida;

• Lugar de bebê é no chão. Assim, crie um ambiente seguro para seu bebê se desenvolver com tatame ou tapetes;

• Até o 3º mês, estimule a visão do bebê com contraste. Após essa idade, podem ser usados brinquedos com diferentes cores;

• Permita e ofereça brinquedos com diferentes texturas, formatos, tamanhos, pesos, etc;

• Favoreça que o bebê tenha uma boa relação mão boca: permita que ele leve até a boca brinquedos que sejam adequados para a idade (não ofereça riscos de engolir);

• Aos 3 meses, estimule o brincar na linha média. Depois, vá direcionando o brincar para as laterais, desafiando o bebê a virar de um lado para outro;

• A partir dos 4 meses, com o bebê de bruços no chão, coloque objetos e brinquedos próximos ao corpo, desafiando-o a se deslocar à frente e para os lados;

• Em nenhum momento, utilize almofadas na parte posterior do corpo do bebê, como apoio para o sentar. Especialmente, entre o 3º e 6º mês.

Ao completar 6 meses, esperamos que o bebê apresente os sinais de prontidão alimentar, demonstrando que está pronto para a introdução alimentar. Nessa idade, esperamos que o bebê interesse-se pelo que as pessoas ao seu redor comem, sustente a cabeça, sente sem apoio ou com mínimo de apoio possível, leve mãos e objetos à boca e tenha reflexo de protrusão de língua diminuído (SCHARF et al., 2016).

De acordo com Pathways (2020), ao iniciar a introdução alimentar com 6 meses de vida deve-se:

• Colocar o bebê sentado à mesa junto com os adultos nos horários das refeições;

• Permitir que o bebê explore o alimento com as mãos;

• Disponibilizar um talher (garfo ou colher de plástico) para que se familiarize com o objeto;

• Se posicionar na mesma altura do bebê;

• Não fazer uso de distratores durante as refeições, como

TV, celular, joguinhos, etc;

• Observar e respeitar os sinais de fome e saciedade;

• Ser positivo - evite frases como: “ele não gostou de melão”, “esse menino é muito difícil para comer”, “come mal igual ao pai”, “ele é preguiçoso para comer”;

• Se a criança não aceitou aquele alimento, ofereça-o novamente em outro momento e outro formato/preparo. Oferecer de 8 a 10 vezes o alimento, em momentos e formas diferentes. Consideramos que a criança de fato não gosta de um alimento após a recusa, de 12 a 18 vezes, com formatos, preparos, temperos e momentos diferentes;

• Evoluir a consistência do alimento, mesmo com a criança sem dentes.

A comida da criança precisa ser igual à comida da família, preparada com pouco óleo vegetal, com temperos naturais e uma quantidade mínima de sal. O açúcar não deve ser oferecido à criança menor de 2 anos já que aumenta a chance de ganho excessivo de peso, além de outras doenças como diabetes, hipertensão e câncer (BRASIL, 2021).

Entre 1 e 2 anos, o leite materno deve continuar sendo oferecido e a criança já participa de todas as refeições diárias da família (café da manhã, lanche da manhã, almoço, lanche da tarde e jantar) (BRASIL, 2021). E lembre-se da alimentação responsiva: sua criança não vai comer fruta, se você comer pizza. Seja exemplo! Estilos parentais devem visar a criação dos hábitos necessários a uma alimentação saudável.

Esses estímulos são essenciais para que o bebê se desenvolva da maneira adequada. Se mesmo assim, você perceber que não está atingindo os marcos motores, é importante a avaliação por um especialista. Uma intervenção precoce pode fazer toda a diferença para evitar problemas futuros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A importância do apoio da família na vida das crianças é inquestionável em todas as áreas e, nesse capítulo, nos debruçamos sobre o âmbito da alimentação.

Quando chega a hora da introdução alimentar, muitos cuidadores ficam preocupados com o que se deve fazer e este guia pode auxiliar para que esse momento seja vivido com mais tranquilidade por todos os envolvidos no processo. Além disso, pequenas atitudes podem promover o desenvolvimento motor e oral adequado da criança para que ela atinja autonomia, além de evitar dificuldades alimentares no futuro.

Os estudos mostram como uma alimentação saudável impacta positivamente a vida da criança e isso começa desde a fase da introdução alimentar com o envolvimento da família em uma alimentação responsiva para o bebê. Esse envolvimento também é imprescindível para a intervenção precoce quando alguma dificuldade é evidenciada.

Os marcos de desenvolvimento e as sugestões de estímulos podem também ser usados por profissionais em conjunto com as famílias. O propósito final é que o bebê seja acompanhado durante

a fase da introdução alimentar até os 2 anos para que se desenvolva de forma adequada e adquira um repertório de alimentação saudável.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Guia Alimentar para crianças brasileiras menores de 2 anos. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2021, p. 2, 3, 58.

BRUSCO, T. R.; DELGADO, S. E. Caracterização do desenvolvimento da alimentação de crianças nascidas prétermo entre três e doze meses. Rev. CEFAC, [s.l.], v. 16, n. 3, p. 917-928, mai./jun. 2014

CUNHA, C. et al. O conhecimento dos pais sobre a importância de uma alimentação saudável na infância. Perspectiva, Erechim, v. 42, n. 157, p. 161-173, mar. 2018.

DELANEY, A. L. Oral-motor movement patterns in feeding development. Thesis, Marquette University, may, 2010. Disponível em: https://www.researchgate.net/ publication/236849815_Oral-motor_Movement_Patterns_in_ Feeding_Development. Acesso em: 02 dez. 2022.

FAVRETTO, L. M.; AMESTOY, M. B.; TOLENTINO-NETO, L. C. B. de. Educação Alimentar: fatores influenciadores na seletividade alimentar de crianças. Revista Exitus, [s.l.], v. 11, n. 1, p. 01-25, dez. 2021.

FIGUEIRA, O. dos S. Alimentação e funcionamento sensorial em crianças de cinco anos: possíveis elos de ligação. Portugal: Escola Superior de Saúde do Alcoitão, jun. 2017, p. 7, 20.

FISBERG, M. Alimentação passada e atual: a relação com a criança que não come. In: Guia de orientações - Dificuldades alimentares. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento Científico de Nutrologia. São Paulo: SBP, 2022, p.19-21

JUNQUEIRA, P. et al. O papel do fonoaudiólogo no Diagnóstico e Tratamento Multiprofissional da Criança com Dificuldade alimentar: Uma Nova Visão. Rev. CEFAC, São Paulo, v. 17, n. 13, p. 1004-1011, mai./ jun. 2015.

MEDEIROS, A. Contato das mãos com a região oral, protrusão de língua e movimentos de sucção em recém-nascidos humanos a partir de estimulação orogustativa. Revista de Psicologia. 2002. 24 f. São Paulo, s.n.,2002. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pusp/a/ CTHPKXSyH498YwrwY73X8NK/?lang=pt

MÜLLER, P. W.; MARIN, A. H.; DONELLI, T. M. S.

Olha o aviãozinho! A relação mãe e bebê com dificuldades alimentares. Aletheia, n. 46, p. 187-201, jan./abr. 2015.

PATHWAYS. Garanta o melhor desenvolvimento físico do bebê. Pathways.org. 2020. Disponível em: https:// pathways.org/wp-content/uploads/2020/03/AssureBrochure_ BrazilPortuguese_2020.pdf. Acesso em: 6 jul. de 2022.

SCHARF, R. J.; SCHARF, G. J.; STROUSTRUP, A.

Developmental Milestones. Pediatrics in Review, New York, v. 37, n. 1, p. 25-37, jan. 2016.

TELLES, M. S.; MACEDO. C. S. Relação entre desenvolvimento motor corporal e aquisição de habilidades orais. Pró-Fono Revista de Atualização Científica, São Paulo, v. 20, n. 2, p. 117-122, abr./ jun., 2008.

WEFFORT, V. R. S. Por que é importante uma nutrição adequada na infância? In: Guia de orientaçõesDificuldades alimentares. Sociedade Brasileira de Pediatria. Departamento Científico de Nutrologia. São Paulo: SBP, 2022, p. 22-25.

INFLUÊNCIA DA PARENTALIDADE E

DOS ASPECTOS CONTEXTUAIS

NO

DESENVOLVIMENTO INFANTIL: UM

ENFOQUE NA PRIMEIRA INFÂNCIA

Flaviana Alves Rodrigues

Natália Francielle de Assis Rodrigues

Yngrid Tuane Rocha

Natalie Pereira

INTRODUÇÃO

A infância é um período em que transformações biológicas e psicossociais impulsionam o desenvolvimento motor, cognitivo, afetivo, social e emocional (BLACK et al., 2017; NOBRE et al., 2021). Durante a primeira infância, período entre 0 e 6 anos (BRASIL, 2016; BRASIL, 2020), o desenvolvimento ocorre através da relação entre fatores intrínsecos da criança, influência do contexto e do ambiente, oportunidades de aprendizado, vivência de experiências e criação de vínculos (DAELMANS et al., 2016; NOBRE et al., 2021). É a fase de maior sensibilidade do cérebro, tida como primordial para a aquisição de habilidades que se aperfeiçoarão ao longo dos anos (PAPALIA; FELDMAN, 2013).

Atualmente, a promoção do desenvolvimento infantil, sobretudo na primeira infância, é uma prioridade mundial (CLARK et al., 2020; ALARCÃO et al., 2021). Estudos apontam que, globalmente, 250 milhões de crianças abaixo de 5 anos podem não atingir todo o seu potencial devido a fatores de risco (BLACK et al., 2017; CLARK et al., 2020; JENSEN et al., 2021). Diante deste quadro preocupante, viu-se a necessidade de construir uma agenda global de ações que promovam o desenvolvimento, a garantia de direitos e qualidade de vida às crianças. Em 2018, a Organização das Nações Unidas (ONU) publicou o documento The Nurturing Care Framework for Early Childhood Development [Diretrizes de Cuidados de Criação para o Desenvolvimento na Primeira Infância (tradução livre)], com o intuito de orientar o poder público, pais e cuidadores, setores de ensino e saúde e a própria ONU na elaboração de estratégias para que crianças de todo o mundo

possam se desenvolver plenamente (WHO et al., 2018).

Segundo os preceitos do Nurturing Care, para que crianças apresentem desenvolvimento cognitivo, motor e socioemocional, os cuidados de criação precisam abarcar: boa saúde, nutrição adequada, cuidados responsivos, oportunidades para aprendizagem precoce, segurança e proteção (WHO et al., 2018). Desta forma, as famílias desempenham um papel central durante a primeira infância, haja visto que desde a gestação até os 3 anos de idade, os pais e/ou cuidadores principais são as pessoas mais presentes na vida das crianças e os responsáveis por mantê-las seguras (WHO et al., 2018).

Segundo Sallés e Ger (2011), os pais ou cuidadores que exercem esse papel precisam dispor de competências e recursos a fim de atender as necessidades das crianças enquanto elas se desenvolvem. Realizar esta função é exercer a parentalidade, que pode ser entendida como práticas realizadas por pais e mães com o intuito de proteger e educar os filhos, enquanto promovem a sua socialização. As autoras apontam que a parentalidade “não depende da estrutura ou composição familiar, mas tem a ver com atitudes e a forma de interagir nas relações paterno/materno-filho” (SALLÉS; GER, 2011, p. 27).

A parentalidade ainda é um campo novo para muitos profissionais que atuam com a primeira infância, o que revela a necessidade de compreender sua influência no desenvolvimento infantil, para incorporá-la às práticas de forma a beneficiar a criança e a família (BRASIL, 2020). Ademais, faz-se necessário compreender também os fatores contextuais que permeiam as relações

familiares, para que a assistência a essas crianças seja ofertada de forma integral (BRASIL, 2020).

O contexto caracteriza-se por uma variedade de condições inter-relacionadas que influenciam e estão à volta do indivíduo, incluindo o âmbito cultural, pessoal, temporal e virtual (AOTA, 2015). Especificamente, o aspecto cultural refere-se aos costumes, crenças, expectativas e comportamentos aceitos pela sociedade na qual o sujeito está inserido, influenciando seu modo de vida e escolhas. O aspecto pessoal inclui idade, gênero, condição socioeconômica e nível educacional (AOTA, 2015). Portanto, a forma como estes fatores estão presentes na vida das crianças e de seus cuidadores pode sugestionar a forma como elas desenvolvem suas relações, crescem e compreendem o mundo (BRASIL, 2020).

Observa-se a importância da sociedade, do poder público e profissionais, que intervêm na primeira infância, enxergarem a unidade familiar como alvo das ações. Deste modo, neste capítulo buscou-se reunir e descrever práticas parentais e aspectos contextuais que influenciam no desenvolvimento infantil, com foco na primeira infância. Considerando o papel fundamental dos pais e cuidadores, entendendo que fatores contextuais, sobretudo culturais e pessoais, são dinâmicos, interligados e atravessam todo o desenvolvimento humano.

Para isso foi realizada uma revisão integrativa da literatura, a qual trata-se de uma metodologia de pesquisa que objetiva a realização de uma análise do conhecimento disponível sobre determinado tema e pode incluir estudos que adotam tanto metodologia experimental quanto não experimental (BOTELHO; CUNHA; MACEDO, 2011).

FATORES CONTEXTUAIS E A INFLUÊNCIA NO

DESENVOLVIMENTO INFANTIL

O desenvolvimento infantil é uma pauta global, podendo ser entendido como fator central para catalisação das transformações necessárias almejando um mundo melhor para todos os povos e nações (UNITED NATIONS, 2015; OPAS, 2021). Entretanto, algumas condições, tanto biológicas quanto contextuais ameaçam as potencialidades da primeira infância, podendo estar presentes antes mesmo da concepção.

Estima-se que cerca de 250 milhões de crianças menores de 5 anos em países de baixa e média renda têm o seu desenvolvimento afetado, devido à pobreza extrema e à desnutrição crônica (DAELMANS et al., 2016). Mas, há outras questões que influenciam a capacidade das famílias de proteger, apoiar e promover o desenvolvimento destes pequenos. Dentre elas, a nutrição materna; a prematuridade; as infecções na infância; a exposição ambiental à toxinas e poluição; a depressão, a baixa escolaridade e o estresse parental; maus-tratos; orfandade; ambiente familiar adverso e com poucas oportunidades de aprendizado; exposição à violência; falta de acesso a serviços sociais e de saúde (OPAS, 2021).

Os atrasos ficam evidentes, no primeiro ano de idade da criança, pioram até os 6 anos e continuam impactando todo o desenvolvimento ao longo da vida (BLACK et al., 2017). Estudos demonstram que a pobreza aumenta a probabilidade de exposição das crianças a múltiplas adversidades e está diretamente

associada a déficits de linguagem e cognição aos 3 anos, que por sua vez, se tornam mais acentuados aos 5 anos (FERNALD et al., 2011; RUBIO-CODINA et al., 2015; BLACK, 2017; SCHADY et al., 2015).

Há evidências de aumento de cortisol (envolvido no estresse) e alteração na substância branca do cérebro de crianças inseridas em ambiente escasso de oportunidades e vivências, (BICK et al., 2015). Também, a literatura descreve o impacto da restrição social no desenvolvimento de meninos e meninas que viviam em uma penitenciária com suas mães, identificando prevalência de excesso de peso e altas porcentagens de risco no desenvolvimento psicomotor, consideravelmente maiores do que na população em geral (DI IORIO et al., 2019).

Por outro lado, crianças expostas às condições desfavoráveis ao desenvolvimento, mas que recebem intervenções e são alvo de parentalidade positiva, apresentam melhoras a curto, médio e longo prazo, no desenvolvimento cognitivo e nos níveis de aprendizado (HANSON et al., 2015). Estudos longitudinais demonstram que se tornam adultos capazes de gerar impactos sociais (como redução de comportamentos violentos), os quais se estendem, inclusive, para gerações subsequentes. Tais constatações reforçam a importância dos investimentos na primeira infância (CAMPBELL et al., 2012; HECKMAN; KARAPAKULA, 2019).

É possível afirmar que a interação positiva dos cuidadores-criança, ambiente estável, acolhedor e enriquecido são necessários para potencializar o desenvolvimento das crianças (CLARK et al., 2020). Sabe-se que os cuidados são caracterizados, tanto

por um contexto familiar, quanto cultural em que estão envolvidos recursos pessoais e também comunitários. No que diz respeito aos recursos pessoais, por exemplo, vê-se a importância da saúde física e mental, sobretudo da figura materna, uma vez que deficiências nutricionais acarretam prejuízos na formação e amadurecimento do cérebro do bebê, além de que mães com sinais de depressão tendem a estimular menos seus filhos recém-nascidos (CAMPOS; RODRIGUES, 2015).

Melhores condições políticas, de saneamento, segurança e acesso a serviços fornecem as bases para que as famílias dêem a devida atenção e cuidado às crianças, ou seja, favorecem o exercício da parentalidade positiva (FMCSV, 2021). Também, é imprescindível envolver as crianças na formulação de políticas públicas e é essencial garantir-lhes o direito de brincar (BRASIL, 2016). Além disso, priorizar a qualificação de profissionais sobre as especificidades da primeira infância e estimular ações como ampliação da licença paternidade estão alinhadas com o bem-estar da criança e de toda a família (BRASIL, 2016; FMCSV, 2021).

CARACTERIZAÇÃO DOS PAPÉIS DOS CUIDADORES NAS DINÂMICAS FAMILIARES

A literatura aponta que cerca de 80% do cérebro de um bebê é formado justamente da gestação até os 3 anos de idade. Nesta fase, a criança está desenvolvendo habilidades cognitivas, motoras e socioemocionais, e é quando ela está mais suscetível às influências ambientais (PAPALIA; FELDMAN, 2013; WHO et al.,

2018; AMARAL et al., 2021).

Este é um período da vida em que a figura materna se faz muito presente, tendo em vista, principalmente, questões nutricionais e afetivas do bebê. Historicamente, no modelo de família nuclear (pai, mãe e filho), o papel de cuidadora principal, responsável pela criação dos filhos e realização das tarefas domésticas é atribuído à mulher (GOMES; RESENDE, 2004; BORSA; FEIL, 2008; BORSA; NUNES, 2011). Por outro lado, é conferido ao pai o papel de provedor, que não necessita envolver-se muito em questões domésticas e nos cuidados com o filho (GOMES; RESENDE, 2004; BORSA, NUNES, 2011).

Com a entrada da mulher no mercado de trabalho, as configurações familiares e as relações parentais sofreram modificações. Embora essas mudanças tenham aproximado a figura paterna da criação dos filhos, ainda existe, no imaginário social, marcas dessa estrutura tradicional (GOMES; RESENDE, 2004). Exemplos, desta afirmação, podem ser encontrados nos estudos de Hollowell e colaboradores (2020) e Peña-Ramos, Vera-Noriega e Santiz-López (2018), em que os papéis atribuídos à mulher e ao homem no núcleo familiar seguem o modelo tradicional e esta forma de organização é passada às próximas gerações.

A PARENTALIDADE DURANTE A INFÂNCIA

Diante do cenário das dinâmicas familiares contemporâneas, crenças e práticas de cuidado de cada família manifestam-se de formas variadas. As práticas parentais podem ser transgeracionais

e expressam também a aplicação do conhecimento dos pais no cotidiano da criança (PORTA; WOTTRICH; SIQUEIRA, 2021; MARIMON; ÁLVAREZ, 2021). Alguns autores assinalam que o comportamento dos filhos está relacionado aos estilos de criação dos pais, enquanto outros dizem que os estilos parentais são determinados pelo comportamento das crianças (ZHOU et al., 2002; RIVAS, 2008).

Martins et al. (2010) relatam sobre comportamento e cognição parental, diferenciando o que os pais fazem do que pensam. Um estudo revelou que as mães dão mais importância às práticas de estímulo do que aplicam-nas no cotidiano (CAMPOS; RODRIGUES, 2015). A rotina com ritmo acelerado, problemas socioeconômicos, desequilíbrio nos papéis parentais e aspectos inconscientes dos cuidadores podem aumentar o nível de estresse parental e, até mesmo, gerar métodos violentos de educação (NUNES, 2015; PORTA; WOTTRICH; SIQUEIRA, 2021).

Exercer a parentalidade é uma tarefa complexa, e mesmo trazendo muitas recompensas, pode gerar sobrecarga e estresse aos cuidadores (RODRIGUEZ-JENKINS; MARCENKO, 2014; BRITO; FARO, 2016). O estudo de Santos, Silva e Gandolfi (2018) associou o uso de disciplina severa ao contexto socioeconômico desfavorável, estresse e sobrecarga, e encontrou que as mães apresentaram maior tendência em utilizar práticas de disciplinas físicas e verbais moderadas do que os pais. Esses achados corroboram com os obtidos por Baluta e Moreira (2019) de que 82% das agressões a meninas, de 0 a 11 anos, partiram dos responsáveis, sendo que 42,4% partiram das mães.

Sendo assim, o estresse parental é visto como fator de risco para o desenvolvimento infantil, uma vez que afeta as práticas parentais positivas, a dinâmica familiar e a relação entre pais e filhos (THEULE et al., 2013; BRITO; FARO, 2016). Guisso, Bolze e Vieira (2019) identificaram que vários programas de treinamento para pais, na primeira infância, vêm sendo desenvolvidos, resultando na melhora da satisfação dos pais e no comportamento dos filhos. Portanto, considerando a influência das práticas parentais no desenvolvimento infantil, incluir os cuidadores em programas de treinamento parental é de grande importância.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os fatores contextuais, principalmente relacionados aos aspectos socioeconômicos, crenças parentais e estilos de criação, parecem influenciar substancialmente na forma como as crianças se desenvolvem e se relacionam com o mundo. E neste capítulo, foi possível reunir estudos que demonstram um movimento global de proteção e cuidado na primeira infância, visando auxiliar pais e cuidadores a identificarem fatores de risco e acessar recursos que possam auxiliar na saúde e bem-estar de seus filhos.

Vê-se que os primeiros anos de vida são cruciais para que as crianças alcancem todo o seu potencial. Investir no início do desenvolvimento, oportunizando vivências de parentalidade positiva é de extrema importância para que, no futuro, essas crianças se tornem adultos capazes de auxiliar na construção de uma sociedade mais igualitária e com índices de vida melhores para

toda a população.

Além disso, questões que interferem no desenvolvimento da criança vão para além de aspectos pessoais ou de saúde. Neste sentido, fortalecer as competências dos cuidadores primários e oferecer suporte às famílias mostra-se relevante por meio da estratégia de elaboração de programas para aquisição de habilidades para o cuidado eficiente. E o que torna isso possível é a sensibilização e a capacitação dos profissionais atuantes neste cenário.

Por fim, neste capítulo, buscou-se caracterizar os aspectos globais do contexto e da parentalidade e sua influência no desenvolvimento da criança pequena. Ressalta-se a importância de envolver toda a comunidade nas pautas da primeira infância, o que pode ser viabilizado por meio de eventos de conscientização popular sobre o valor da parentalidade, divulgação dos dados e ações existentes neste contexto.

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A ATUAÇÃO DO TERAPEUTA

OCUPACIONAL COM ESTRATÉGIAS

SENSORIAIS NO ACOMPANHAMENTO

DO BEBÊ NASCIDO PRÉ-TERMO

Bárbara Vicentini Petraglia

Luana Kelly Mendonça Faria

Regiane de Paula Vidal

INTRODUÇÃO

A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera prematuro o bebê nascido antes de completar 37 semanas de gestação. Os recém-nascidos pré-termo ainda podem ser subdivididos em prematuro extremo (com menos de 28 semanas de gestação), muito prematuro (28 a 32 semanas de gestação) ou prematuro tardio (32 a 37 semanas de gestação) (WHO, 2012).

Crianças nascidas pré-termo apresentam maior risco de atrasos no desenvolvimento. De acordo com Malina, Bouchard e Baror (2004), os movimentos ativos fetais, que ocorrem principalmente no último trimestre da gestação, são fundamentais para o desenvolvimento motor, sendo considerados como precursores do desenvolvimento locomotor e de controle de objetos na fase pós-natal. Dessa forma, uma vez que as crianças prematuras não passam por essa fase, em que há um maior vigor nos movimentos fetais, é possível esperar que o desenvolvimento motor infantil possa ser comprometido pela prematuridade.

A integração sensorial começa na vida intrauterina, quando o cérebro sente os movimentos maternos e se aperfeiçoa ao longo da infância e de acordo com os estímulos recebidos pela criança (KANDEL et al. 2014). O processamento sensorial é como o sistema nervoso central gerencia as informações recebidas dos órgãos sensoriais, ou seja, os estímulos visuais, auditivos, táteis, gustativos, olfativos, proprioceptivos e vestibulares (MACHADO et al., 2017). Assim, no desenvolvimento típico, o cérebro é capaz de receber, interpretar e responder a estímulos sensoriais.

Quando há uma dificuldade nesse processo, pode-se caracterizar o Transtorno do Processamento Sensorial (TPS).

Segundo Machado et al. (2017), crianças pré-termo são consideradas de risco para TPS, uma vez que há uma interrupção do desenvolvimento neurobiológico intrauterino, e devido às experiências sensoriais no ambiente da Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN).

As técnicas de intervenção Ayres Sensory Integration (ASI) são integradas no contexto da orientação dos pais e da atividade centrada na criança, para normalizar as respostas da criança às experiências sensoriais, modular a excitação e promover respostas adaptativas organizadas durante as brincadeiras e atividades cotidianas (LECUONA et al., 2017).

Terapeutas ocupacionais pediátricos são treinados para entender como os sistemas sensoriais podem impactar negativamente ou contribuir para a eficácia na participação em ocupações diárias. Ao utilizar as abordagens de processamento sensorial, os profissionais são capazes de considerar as necessidades da criança e adequar as demandas das atividades e contextos para apoiar ou interferir na participação em tarefas cotidianas (ALMOHALHA et al., 2020).

IMPACTOS DA PREMATURIDADE NO DESENVOLVIMENTO DO BEBÊ

Crianças que nascem prematuramente podem apresentar atraso no desenvolvimento neuropsicomotor, lesões no sistema

nervoso central devido a imaturidade e fragilidade do seu sistema nervoso. Além de alguns efeitos a longo prazo como: alterações visuais, auditivas, doença pulmonar crônica, maior frequência de internação, dislexia, déficit de atenção, ansiedade, depressão, entre outros (FERNANDES et al., 2017).

Segundo Chorna et al. (2014) os bebês prematuros frequentemente apresentam reatividade sensorial anormal, agravada pela imaturidade. Neles, as ramificações dendríticas e axonais, proliferação e diferenciação, sinaptogênese e mielinização estão incompletas, visto que é no último trimestre que o cérebro aumenta seu volume de quatro a cinco vezes. A figura, abaixo, mostra o desenvolvimento dos hemisférios cerebrais durante a gestação.

Figura 1: Desenvolvimento dos hemisférios cerebrais do bebê. Fonte: KOUTCHEROV et al., 2002.

Os cuidados com bebês prematuros incluem muitas intervenções dolorosas. Segundo Attarian et al. (2014) durante as duas primeiras semanas de internação na UTIN (Unidade de Terapia Intensiva Neonatal), os recém-nascidos experimentam uma média de 14 procedimentos dolorosos por dia, sendo que a maioria ocorre durante os primeiros dias de vida.

Estudos mostram que o manejo desse desconforto se tornou uma prioridade dentro da UTIN, entendendo que recém-nascidos demonstram respostas claras a estímulos nocivos no nível do reflexo espinhal e do tronco cerebral principalmente prematuros. Durante os processos de internação ocorrem a estimulação de algumas vias, dentre elas, as vias nociceptivas ((nociceptores são neurônios sensoriais que enviam sinais que causam a percepção de dores, através dos axônios em direção ao Sistema Nervoso Periférico (SNP), respondendo a um estímulo potencial ou de dano tecidual)).

Attarian et al. (2014) relatam que

A dor aguda pode precipitar uma resposta ao estresse com consequências fisiológicas adversas, como ventilação prejudicada, alterações na pressão intratorácica ou arterial e vasoconstrição de órgãos vitais. Tais alterações fisiológicas agudas podem contribuir para a patogênese da hemorragia intraventricular ou leucomalácia periventricular em lactentes de risco. Eventos dolorosos podem afetar respostas comportamentais complexas por até 24h após o evento; ciclos sono-vigília alterados, alimentação.

De acordo com Attarian et al. (2014) a alteração da responsividade neuronal pode explicar a exposição repetida a estímulos nocivos que tem potencial para alterar o desenvolvimento da percepção da dor, gerando hipersensibilidade e dor crônica. As vias nociceptivas se tornam efetivas, por volta de 24 e 28 semanas de gestação, sendo assim os sistemas moduladores da dor ainda permanecem imaturos, podendo gerar aumento da sensibilidade à dor em longo prazo.

Os recém-nascidos pré-termo, além de vulneráveis biologicamente, são privados das sensações naturais do ambiente intrauterino precocemente e precisam de períodos prolongados de internação na UTIN, onde a experiência sensorial está em conflito com as suas necessidades (MACHADO et al., 2017). Assim, pode-se dizer que bebês prematuros apresentam maior risco para TPS.

A Terapia ocupacional na UTIN atua tanto na avaliação sensório-motora e do desenvolvimento, nas orientações a equipe multiprofissional e cuidadores, nas intervenções com estímulos adequados, de acordo com a idade dos neonatos, como também na estimulação precoce para prevenção de atrasos e distúrbios (MORIMOTO; DOS SANTOS; LEITE, 2020).

INTERVENÇÃO EM INTEGRAÇÃO SENSORIAL NO BEBÊ PREMATURO

Segundo Ruas (2022), as sensações que organizam, maturam e promovem o desenvolvimento de todo o Sistema Nervoso Central, e a inadequada estimulação dessas sensações afetam a

integração de vários sistemas sensoriais responsáveis pelo desenvolvimento infantil.

A atuação do Terapeuta Ocupacional com bebês prematuros por meio da estimulação precoce dos sistemas sensoriais, seguindo suas idades cronológicas e corrigidas, favorece a autorregulação e desenvolvimento dos mesmos (MORIMOTO; DOS SANTOS; LEITE, 2020). Souza e Marino (2013) ressaltam que a atuação do Terapeuta Ocupacional pode ser benéfica e significativa, no sentido de maximizar o desempenho ocupacional satisfatório, contribuindo para melhora na qualidade de vida e desenvolvimento saudável do bebê prematuro.

Existem diversos padrões clássicos de dificuldades de integração sensorial que se apresentam de formas diferentes umas das outras (MAILLOUX et al., 2011). Baseado na avaliação clínica e intervenção em bebês, consolidamos esses padrões de dificuldades em quatro tipos principais: o bebê agitado que apresenta dificuldade em modular suas respostas à sensação, tanto dos exteroceptores quanto dos interoceptores, o bebê sonolento que apresenta percepção diminuída para uma ou mais sensações, o bebê desajeitado que apresenta prejuízos no sistema vestibular-proprioceptivo, essencial para o controle da cabeça, postural e controle motor bilateral e o bebê desorganizado que apresenta dificuldade em descobrir como fazer tarefas simples, a menos que alguém as mostre. Alguns bebês têm dificuldade em descobrir como planejar o uso de seus corpos para fazer coisas ou se mover em torno de obstáculos Esses padrões de integração sensorial e praxia identificados, estão relacionados a como esses bebês se

apresentam nos relatos dos pais, na avaliação e em observação clínica (ROLEY; SINGER; ROLEY, 2016).

Os prematuros passam muito tempo “lutando” pela própria sobrevivência e pelo seu equilíbrio fisiológico e clínico. São muitas as sensações, estímulos e situações vividas que o cérebro ainda, muito imaturo, não está preparado para enfrentar. Os sistemas sensoriais são afetados a todo instante, o sistema tátil, que tem os seus receptores em todo o corpo desde a cabeça aos pés, é responsável por captar as sensações de dor, temperatura, textura, consistência e forma. No ambiente da UTI neonatal, acontecem muitas manipulações excessivas de toda a equipe hospitalar, afetando o sistema tátil; as máquinas e ruídos afetam o sistema auditivo e as luzes fortes afetam diretamente o sistema visual (RUAS, 2022).

A correlação entre os fatores de risco neonatais e processamento sensorial de crianças prematuras com experiências médicas complicadas, após o nascimento, podem apresentar maior risco de padrões de processamento sensorial atípico (CHEN et al., 2021). A avaliação da disfunção de integração sensorial permite que se faça o diagnóstico precocemente, quanto mais cedo forem identificadas as dificuldades específicas, mais cedo se pode iniciar a intervenção, considerando que o cérebro do bebê tem maior plasticidade, permitindo que mudanças aconteçam mais rápido, tornando a intervenção mais efetiva e com maior probabilidade de sucesso (SERRANO, 2021). Os Terapeutas Ocupacionais que avaliam a integração sensorial e a práxis de bebês devem ter uma compreensão sólida do desenvolvimento típico e atípico, não apenas para marcos motores, sociais ou cognitivos, mas também

para as habilidades sensoriais regulatórias e perceptivas que são os blocos de construção do desenvolvimento (ROLEY; SINGER; ROLEY, 2016).

Como os bebês fazem parte de um sistema familiar, os terapeutas devem considerar o apego à sua unidade familiar quando avaliar e formular os programas de intervenção. O feedback do cuidador é fundamental durante a avaliação, intervenção e acompanhamento (ROLEY; SINGER; ROLEY, 2016).

Segundo Serrano (2021), viver com uma criança com disfunção de integração sensorial pode ser muito difícil. Por isso, entender e saber utilizar ferramentas para lidar com suas dificuldades ajuda a família a ter mais consensos sobre o cuidado do bebê. O diagnóstico precoce melhora a qualidade de vida da família, visto que pode evitar a culpa pelos problemas que o bebê apresenta, tornando também mais assertiva a forma como lidam com as críticas que lhe são dirigidas por outros.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os prematuros hospitalizados são repetidamente estimulados durante um período crítico do neurodesenvolvimento. Compreender os efeitos neurológicos de curto e longo prazo que esses estímulos dolorosos causam é fundamental para a intervenção oportuna. Da mesma forma, entender a história de vida desse bebê prematuro, o tempo de hospitalização, procedimentos invasivos realizados, recursos oferecidos, orientações e acolhimento para as famílias com os conceitos de desenvolvimento

sensório-motor, cognitivo afetivo social e processamento sensorial traz para o terapeuta ocupacional cada vez mais a compreensão e assertividade sobre a linha de raciocínio terapêutico a ser construído, oportunizando a intervenção em integração sensorial, de forma precoce e efetiva.

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WORLD HEALTH ORGANIZATION. Born too soon: the global action report on preterm birth, Geneva, p. 1-128, nov. 2012.

4.

CONTRIBUIÇÕES DA ABORDAGEM DE INTEGRAÇÃO SENSORIAL PARA A NEUROVISÃO

Aline Gomes do Nascimento

Ariela Del Vecchio da Fonseca Martins

Francine Dias de Souza Espinoza

Aline Perboni Zanotto

INTRODUÇÃO

O processamento de informações dos sistemas sensoriais (visual, tátil, auditivo, olfativo, gustativo, vestibular, proprioceptivo e interoceptivo) ocorre pela detecção do cérebro aos estímulos recebidos pelas vias sensoriais. A relação entre os sistemas sensoriais e o meio devem produzir feedbacks adequados, chamados de respostas adaptativas (SERRANO, 2016).

A Teoria de Integração Sensorial foi criada pela terapeuta ocupacional A. Jean Ayres que, a partir de 1960, iniciou o desenvolvimento de uma abordagem clínica para a identificação e tratamento de problemas, nessa área, em crianças com dificuldades de desenvolvimento e aprendizagem, distúrbio de atenção e dispraxia. Serrano (2016, p. 32) relata que a Dra. Ayres definiu a Integração Sensorial como o “[...] processo neurológico que organiza a sensação do próprio corpo e do ambiente, e torna possível usar o corpo eficientemente no meio”.

Devido à escassez de literatura a respeito da atuação da Terapia Ocupacional na neurovisão e de uma abordagem desta profissão que poderia favorecer crianças com diagnósticos neuroftalmológicos, este capítulo tem como objetivo compilar informações acerca deste tema, no que tange a atuação com o público infantil e Integração Sensorial. A partir disso, favorecer a reflexão acerca da atuação da Terapia Ocupacional na IS.

A NEUROVISÃO NO BRASIL E NO MUNDO

Ao definir neurovisão, Guimarães et al. (2009) elucidam que o principal objeto de estudo da oftalmologia são os olhos, com limitada atenção dedicada à visão, sendo a função visual reduzida a acuidade visual, e o diagnóstico à busca da necessidade de correções refracionais, ainda que a imagem seja o principal input no sistema neural. A neurovisão, então, refere-se ao sistema visual, sendo este composto por um sistema neural de processamento das imagens formadas pelo sistema óptico, a partir da retina.

No Brasil, existe desde 2009 o Laboratório de Pesquisa Aplicado à Neurovisão (LAPAM), localizado na capital do estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, que busca disseminar o conhecimento a respeito do assunto e dos distúrbios de aprendizagem relacionados à visão, assim como os seus tratamentos e impactos na vida acadêmica, social e laboral (LAPAM, 2020). O LAPAM possui um banco de dados próprio, que foi utilizado para seleção de artigos nacionais que abordassem sobre o tema.

Desde 2016, as publicações deste laboratório tratam sobre dislexia, estresse visual, síndrome de Irlen e a alfabetização de crianças com surdez, além da criação de protótipos e da validação de testes.

Na plataforma de dados mantida pela Biblioteca Nacional de Medicina (NLM) dos Estados Unidos, a PUBMED, encontram-se publicações relacionadas ao diagnóstico após lesões cerebrais adquiridas, porém tendo como público-alvo adultos. Também contém pesquisas que destacam o sistema visual e o processamento sensorial.

Entre os profissionais envolvidos, nestas pesquisas, apenas em publicações na PUBMED foram encontrados Terapeutas

Ocupacionais, ainda que especificamente na atuação com o público adulto e idoso. Burgess e Jewell (2018) identificaram perspectivas conflitantes sobre as técnicas utilizadas por Terapeutas Ocupacionais na neuroreabilitação em casos com diagnóstico de diplopia, uma disfunção oculomotora que causa visão dupla.

Apesar de existir material sobre a atuação destes profissionais no tratamento de comprometimento oculomotor, após traumatismo cranioencefálico, Aravich e Troxell (2021) ressaltam que, atualmente, existe falta de diretrizes sobre as melhores práticas para Terapeutas Ocupacionais no tratamento e avaliação da disfunção oculomotora após traumatismo cranioencefálico e que seria diferencial a colaboração entre Terapeutas Ocupacionais e optometristas durante a reabilitação do paciente.

Ainda, entre os estudos que abordaram sobre a prática de Terapeutas Ocupacionais, Yoo et al. (2020) identificaram que 55% dos profissionais entrevistados utilizam regularmente intervenções baseadas em evidências ao lidar com déficits de acuidade visual e campo visual, porém apenas 3% baseiam-se em evidências ao intervir com deficiências de função oculomotora e estresse visual.

NEUROVISÃO, DESENVOLVIMENTO E

APRENDIZAGEM

Guimarães (2009, p.49) expõe que a visão é um processo aprendido e este aprendizado começa já no primeiro dia de vida e se estenderá até o início da vida adulta. Até cerca de oito anos, existe um processo orgânico de desenvolvimento da visão junto com o desenvolvimento de habilidades visuais.” O desenvolvimento e a aprendizagem possuem aspectos intrinsecamente relacionados à neurovisão. Transtornos neurovisuais, assim como o transtorno específico de leitura (dislexia) são disfunções de base neuronal que afetam a aprendizagem da leitura, sendo que a “[...] dificuldade de leitura pode preceder a etapa de processamento neuronal da linguagem, tendo então como base o processamento visual” (GUIMARÃES et. al, 2017, p. 202).

Ao considerar os diagnósticos encontrados pela literatura sobre neurovisão e o público infantil, destaca-se que os fatores de risco para as dificuldades de aprendizagem são multifatoriais, e com exceção às causas não orgânicas, incluem a prematuridade, o baixo peso ao nascimento, complicações gestacionais ou no parto, exposição neonatal ao tabagismo e etilismo (LEÃO et al., 2021).

Dados populacionais indicam maior proporção do Estresse Visual/Síndrome de Irlen, que trata-se de distúrbio no processamento da informação visual que afeta a adaptação da pessoa à luz, em casos nos quais coexistem dificuldades de aprendizagem

e déficits no desenvolvimento neuropsicomotor (VILHENA et al., 2018).

Leão et al. (2021, p. 03) descreve que

A importância da identificação assertiva e precoce do estresse visual durante o desenvolvimento infantil reside no fato de que o aperfeiçoamento progressivo da visão depende da qualidade da informação captada pelos olhos e interpretada pelo encéfalo. Assim, se houver, nesse período, algum problema na aquisição e processamento visual, tudo o que posteriormente vier a se consolidar, em termos de funções cognitivas e motoras, estará comprometido.

Garcia et al. (2019) identificaram, em crianças com alteração do processamento temporal auditivo, chance três vezes maior de associação com alteração do processamento visual, devido ao sistema magnocelular compartilhado. Toffolo et al. (2017) avaliaram pessoas com surdez, entre 12 e 18 anos, e identificaram que a leitura pode ser beneficiada quando o sujeito possui um arcabouço de comunicação ampliado, supondo existir maior flexibilidade cognitiva ao processar a informação linguística de forma multissensorial, considerando o uso da leitura labial em associação à Língua Brasileira de Sinais, o que pode ser agente facilitador de aprendizagem da leitura.

Vilhena et al. (2018) destacam que é indispensável o reconhecimento de distúrbios neurovisuais pelos profissionais da área de saúde e da educação, para que ocorra o diagnóstico e intervenção precoce, bem como pontuam a necessidade da formação continuada.

TERAPIA OCUPACIONAL E INTEGRAÇÃO

SENSORIAL

A Terapia Ocupacional é uma profissão da área da saúde em que baseia e fundamenta sua atuação no fazer humano, nas funções físicas, sensoriais, perceptivas, cognitivas, emocionais e psíquicas inerentes de uma atividade em um contexto específico. Esse profissional deverá se ocupar, na sua prática clínica, dos treinamentos e adaptação para o ganho de autonomia e independência para o indivíduo, nos contextos sociais a que ele pertença (CAVALCANTI; GALVÃO, 2007).

O Terapeuta Ocupacional poderá ter diversas áreas de atuação com públicos distintos, dentre eles, o infantil. Dentro das abordagens utilizadas por este profissional, está de Integração Sensorial, embasada na teoria neurofuncional e hierárquica, que se baseia no conceito de neuroplasticidade para um trabalho mais específico com crianças que apresentam transtornos de desenvolvimento (CAVALCANTI; GALVÃO 2007).

Os sistemas sensoriais são classificados como: tátil, vestibular, proprioceptivo, gustativo, auditivo, olfativo, interoceptivo e visual (BEAR et al., 2008; AOTA, 2020), conforme descritos a seguir:

• O sistema tátil se localiza em toda extensão da pele, sendo captado por alguns tipos de receptores sensoriais, estímulos como do toque superficial, temperatura, pressão, dor, e controla a reação a tudo o que é tocado.

• O sistema vestibular tem os receptores no ouvido interno.

É estimulado pelos movimentos da cabeça, pescoço, olhos e do próprio corpo. Sua principal função é manter o equilíbrio e informar se o corpo está em movimento ou parado.

• O sistema proprioceptivo se refere à consciência do próprio corpo, seus receptores estão localizados nos músculos, articulações e ligamentos.

• No sistema gustativo, seus receptores se encontram na boca, especialmente na língua e permite a percepção dos sabores.

• O sistema auditivo tem os receptores no ouvido interno, no qual captam as ondas sonoras que irão para a via auditiva. O estímulo auditivo é integrado aos estímulos vestibulares, visual e proprioceptivo, na região do tronco cerebral e depois a outras partes do cérebro.

• O sistema olfativo integra a capacidade de sentir odores, e seus receptores estão localizados no nariz, mais especificamente no revestimento das cavidades nasais.

• O sistema interoceptivo, considerado o mais novo sistema sensorial, tem seus receptores nos órgãos internos, e por eles é possível ter as percepções internas do corpo. Por exemplo: sentir incômodos, vontade de urinar, a sensação de fome, sede, dentre outros.

• O sistema visual é um dos mais complexos, têm os receptores nos olhos, que captam as ondas de luz passando pela retina e o estímulo segue até o tronco cerebral, onde se integrará com outros estímulos sensoriais, para só assim, seguir para os hemisférios cerebrais.

Dentro da Teoria da Integração Sensorial, existem dois sistemas primitivos que irão, junto com o próprio sistema visual, gerar uma combinação de respostas adaptativas para manutenção do equilíbrio corporal, do rastreio visual e estabilização dos movimentos oculares necessários à atividade de leitura. São eles, o sistema proprioceptivo e sistema vestibular (SERRANO, 2016).

O sistema proprioceptivo está relacionado à percepção do posicionamento do corpo. A propriocepção é a sensação oriunda dos músculos e articulações. Essas sensações são capazes de informar quando e como os músculos estão se alongando e contraindo. O papel da propriocepção é fundamental para a manutenção do equilíbrio corporal (GUYTON, 2017).

A informação proprioceptiva mais importante, necessária à manutenção do equilíbrio, é a proveniente dos receptores articulares do pescoço, pois quando a cabeça é inclinada em determinada direção pelo movimento do pescoço, fazem com que o sistema vestibular dê ao indivíduo uma sensação de desequilíbrio, sendo o sistema proprioceptivo ativado, com os ajustes musculares (contrações e alongamentos) para as reações de proteção e ajustes corporais acontecerem, a fim de evitar quedas e manter o equilíbrio. Será através desse mecanismo que uma criança poderá se manter na postura sentada, na cadeira da escola, estendendo e flexionando a cabeça para fazer uma cópia do quadro sem cair (SERRANO, 2016).

O sistema vestibular ajuda a manter o equilíbrio e informa se o corpo está em movimento ou parado, além da velocidade e em que direção se move. Seus receptores estão localizados no ouvido

interno, que são estimulados pelos movimentos da cabeça, pescoço, olhos e movimentos verticais, horizontais e rotacionais do corpo e ambiente. Esse sistema responde a força de gravidade e registra a posição que o corpo está em relação à terra (BEAR et al., 2008).

A informação vestibular é processada em conjunto com a proprioceptiva para permitir que o movimento do corpo tenha acuidade e seja controlado no tempo. A informação da gravidade e movimento juntam-se à dos músculos, articulações e pele (sistema tátil). Em conjunto, completam a percepção do corpo como um todo. A função do sistema vestibular permite orientar o “mapa” corporal durante o movimento no espaço. O processamento vestibular adequado proporciona o uso bilateral do corpo, em todas as nossas atividades. O sistema vestibular também se conecta com o sistema visual, com a função de coordenar o movimento dos olhos com o da cabeça, assim é possível fixar o olhar mesmo quando se movimenta (SERRANO, 2016).

Pensando na integração proprioceptiva, vestibular e visual, cada um tem seu papel para a função final da aprendizagem, no caso, a identificação do que se enxerga ou a leitura. (SERRANO, 2016). O sistema proprioceptivo organiza o corpo e está sempre o ajustando para o preparar para um estado ótimo de atenção e posicionamento para a função. O sistema vestibular interage diretamente com o visual para a estabilização ocular e rastreio visual. Compreende-se assim, que esses sistemas sensoriais, o proprioceptivo e o vestibular, estão intimamente relacionados e darão base para um bom funcionamento ao sistema visual (SERRANO, 2016).

CONTRIBUIÇÕES DA INTEGRAÇÃO SENSORIAL

PARA A NEUROVISÃO

Segundo Ayres (1979), existem dois níveis principais de atividade cerebral nos quais o ser humano processa a entrada visual: o tronco cerebral e os hemisférios cerebrais (córtex). No tronco cerebral, a entrada vestibular, a percepção proveniente dos olhos, do pescoço e do corpo e a entrada visual se unificam em um processo sensorial composto. As sensações dos músculos do pescoço, que sustentam a cabeça erguida, são particularmente importantes para esse processo.

Ayres (1978) afirma ainda que as informações do sistema vestibular, proprioceptivo e visual se juntam no tronco cerebral e formam um "mapa" utilizado para se deslocar no ambiente, e sem ele podem aparecer prejuízos como para chutar uma bola adequadamente, bater em objetos enquanto está caminhando, escrever dentro da linha, dentre outros. Depois que essas informações se unem no tronco cerebral, vão ao córtex para o processamento especializado. Esse processo permite que os olhos se movam com fluidez possibilitando que a criança consiga ler, detectar detalhes de cada letra e direcionar o olhar para onde se quer ver.

Guimarães et al. (2009) destacam que não é só o córtex visual, mas o conjunto de áreas corticais que estão envolvidas no processamento sensorial que geram uma percepção visual integrada. Para Ayres (1979), o processamento visual é intimamente ligado aos sistemas vestibulares e proprioceptivos, e se essa integração sensorial não acontecer de maneira adequada, a criança poderá

ter prejuízos funcionais importantes. A mesma autora criou uma lista de nove itens de verificação de desordens de percepção visual em crianças, a se observar:

1. Quando pequeno, dificuldade de construção em blocos.

2. Dificuldade para montar quebra-cabeça.

3. Dificuldades para subir escada.

4. Dificuldade para ir de um a outro e se perder com facilidade.

5. Não gosta de estar em locais desconhecidos, porque tem medo de se perder.

6. Tem dificuldades para desenhar com giz de cera ou com lápis.

7. Tem dificuldades em reconhecer semelhanças e diferenças em desenhos.

8. Dificuldade em ver figura fundo.

9. Escrever fora da linha.

Ainda sobre a interação dos sistemas, a autora afirma que:

Se em uma área visual do córtex cerebral não tem uma boa comunicação com o sistema vestibular, proprioceptivo e tátil, então a discriminação visual será insuficiente. Logo, a criança que não recebe uma informação precisa de seu corpo também tem problemas de percepção visual. As crianças cujo maior problema vem do processamento da

entrada vestibular, normalmente, mas não sempre, tem baixas pontuações nos testes de percepção visual (Ayres, 1979).

Vilhena et al. (2021, p. 443) descrevem que “estudos com foco na integração sensorial demonstraram que crianças com transtornos do neurodesenvolvimento têm menos recursos atencionais disponíveis para realizar corretamente tarefas oculomotoras com alta carga atencional”. Sendo assim, fica evidente a contribuição da teoria de Integração Sensorial dentro dos processos relacionados à visão, tanto no entendimento de um sistema sensorial individual, como integrado aos demais, possuindo um papel fundamental para a aprendizagem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos dados compilados, observa-se que os déficits relacionados à neurovisão tem grande impacto para o desenvolvimento infantil e podem influenciar em diversos contextos, sendo considerado o diagnóstico tardio fator retardante para o início da intervenção adequada.

Entre a escassez de literatura e os estudos já publicados que apresentam incoerências do raciocínio clínico de Terapeutas Ocupacionais, perante os diagnósticos neurovisuais, fica evidente a lacuna com relação a divulgação desta temática para corroboração da importância da classe profissional dentro desta área de conhecimento, ao mesmo que se destaca a formação deste

profissional para identificação de prejuízos funcionais relacionados à neurovisão e as possibilidades de intervenção com uso de abordagens específicas, como a Integração Sensorial.

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O AMBIENTE E A FAMÍLIA NO

PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO

DA CRIANÇA COM PARALISIA CEREBRAL

Alyne Nayara de Melo Silva

Quézia Rodrigues

Aline Perboni Zanotto

INTRODUÇÃO

A paralisia cerebral (PC) é um grupo de desordens não progressivas do neurodesenvolvimento, podendo ser dividida em causas pré-natais, perinatais e pós-natais, considerado até os 2 anos de idade. A estimativa é de 2 a 3 casos por 1.000 nascimentos (LORD et al., 2018). Se manifesta com distúrbios do movimento e postura, sensoriais, de percepção, de comunicação e comportamento. Apresenta-se em diferentes configurações, por isso, é classificada de acordo com o nível funcional (BRASIL, 2013).

O diagnóstico está sendo realizado cada vez mais cedo devido ao avanço das tecnologias, da medicina e da área da saúde. Há evidências de que a PC pode ser diagnosticada antes dos 6 meses corrigidos por meio de neuroimagem e instrumentos padronizados, em conjunto com o raciocínio clínico profissional. O estudo de Novak et al. (2017) verificou que 86% dos pais suspeitam do diagnóstico antes dele ser finalizado, e reconhecem que apesar de ser difícil, preferem que seja feito o quanto antes para que se possa dar início aos estímulos que irão favorecer o desenvolvimento dos bebês. As autoras reforçam que a detecção precoce é importante para toda a família e auxilia no processo de aceitação, confiança e empoderamento dos pais.

A intervenção precoce segundo Ferreira et al. (2020), consiste em serviços prestados à criança de risco e às suas famílias. Serviços estes que tem como objetivo:

Promover a saúde e o bem-estar da criança, estimulando as competências emergentes, minimizar os atrasos no desenvolvimento, reduzir as incapacidades existentes, prevenir a perda da funcionalidade, contribuir para a estruturação do vínculo mãe-bebê e o acolhimento dessas crianças pela família, promover a parentalidade adaptativa e o funcionamento familiar global (FERREIRA et al., 2020).

Diante de um diagnóstico, a intervenção multidisciplinar/ transdisciplinar e o acompanhamento médico específico se faz necessário. Ferreira et al. (2020), aborda que a primeira infância é crucial para o desenvolvimento socioemocional e neuropsicomotor da criança, pois é um período crítico, no qual os circuitos neurais são formados e/ou estabelecidos por meio das interações com o ambiente.

Kalleson, Jahnsen e Østensjø (2021) descrevem a importância da mudança do modelo médico/diagnóstico para a intervenção dentro de um modelo bioecológico, trazendo para a reabilitação questões relacionadas ao ambiente real, a exploração da participação infantil em atividades familiares e recreativas, destacando interações recíprocas contínuas envolvendo a criança e outras pessoas, objetos e símbolos no ambiente. Estes contextos são importantes para aprendizagem, desenvolvimento e crescimento pessoal.

Atualmente, as práticas centradas na família são as que reconhecem a importância da família no processo de reabilitação, possibilitando o desenvolvimento da criança no ambiente real, a oferta de estímulos constantes e também apoiando a dinâmica familiar,

oferecendo apoio psicossocial e educação parental (PALOMOCARRIÓN et al., 2021; KALLESON; JAHNSEN; ØSTENSJØ, 2021; FERREIRA et al., 2020).

Dentro desta perspectiva, a família aparece como elemento central na intervenção e desenvolvimento de crianças com deficiência, entre estas, estão incluídas as crianças com PC. Diante do exposto, o objetivo deste capítulo é discorrer sobre como o ambiente e a família podem influenciar no desenvolvimento da criança com PC.

PERCEPÇÃO DOS PAIS SOBRE A INTERVENÇÃO TERAPÊUTICA

Há diversas abordagens e modelos que embasam a intervenção terapêutica e o profissional escolhe qual delas irá utilizar para proporcionar um melhor plano terapêutico individual. A prática centrada na família é uma delas e realiza a integração dos pais no processo terapêutico, reconhecendo a importância de incluir a família para priorizar os objetivos e sucessivamente elaborar o plano de intervenção. O profissional deve entender a importância de um apoio com ênfase no ambiente, confiança e tomada de decisão compartilhada com os pais (PALOMO-CARRIÓN et al., 2021).

Nos achados de Palomo-Carrión et al. (2021), as famílias relataram que a intervenção deve considerar seus medos, inseguranças, o bem-estar da família e da criança e promover uma interação entre ambos. Um ponto importante a destacar é que,

neste estudo, as famílias expressaram sentimento de angústia e ansiedade ao serem colocadas como espectadores no processo de intervenção de seus filhos, bem como, um sentimento de desacordo quando não eram questionadas sobre os seus objetivos e preocupações. Elas afirmam que têm o direito de se envolver na intervenção desde cedo, pois são elas que passam a maior parte do tempo com a criança e reconhecem suas necessidades.

Hulst (2022) descreve que os pais se incomodam com as abordagens focadas somente na criança e informam sobre a necessidade que os cuidados sejam centrados também na família. Os pais solicitaram maior apoio social para compreensão e reconhecimento do ambiente. As famílias, principalmente no momento de início de diagnóstico, necessitam de informações, assim como ter uma rede de apoio bem definida, estratégias de enfrentamento e capacitação que podem facilitar o processo de empoderamento parental (LORD, 2018). Dessa forma, é possível descrever que a abordagem utilizada pelo profissional pode ser uma barreira no tratamento, tal qual, o ambiente em que a criança está inserida (HUST et al., 2022). Prestar orientações e acolher a família podem ser facilitadores para o enfrentamento de problemas parentais (LORD, 2018).

As barreiras e facilitadores são termos utilizados na Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF) e abrangem vários aspectos como: atividade e participação, funções do corpo, estruturas do corpo e fatores ambientais (OMS, 2003). Zampieri et al. (2016) abordaram sobre a necessidade dos pais terem conhecimento das barreiras que influenciam na participação da criança e que elas podem estar relacionadas ao transporte público,

equipamentos de mobilidade e de profissionais de saúde, através disso os pais podem conseguir melhorias nos serviços públicos de saúde e reabilitação da criança.

O papel do profissional de saúde se mostra de extrema importância, neste momento, visando estabelecer relações de confiança com os pais, ajudar a fortalecer o vínculo dos pais com os filhos e nutrir o sentimento de autoeficácia. Isso ocorre quando os profissionais de saúde se mostram acessíveis tanto para os pais quanto para as crianças (LORD et al., 2018).

Kallesnon et al. (2021) mostram que o sistema de atendimento ainda não consegue se adaptar aos contextos mais relevantes para a família. Os autores colocam isso como uma barreira, pois não foi possível mensurar o potencial de colaboração entre família e serviço de saúde.

Palomo-Carrión et al. (2021) descrevem os relatos das famílias de não quererem tomar todas as decisões sozinhas, mas contar com a ajuda dos profissionais nas tomadas de decisão sobre a melhor abordagem, objetivos e sobre o melhor local para intervenção (casa ou clínica). O estudo de Hulst et al. (2022) demonstra que a família quer uma atitude diferente dos profissionais, como, uma investigação mais robusta sobre a rotina deles. Reconhecem ainda que o auxílio dos profissionais, por meio de orientação e compreensão sem julgamentos, pode ser um fator determinante para o sucesso do processo de intervenção.

Um interessante estudo realizado com crianças maiores, descreveu que as mesmas conseguiram identificar barreiras e facilitadores em relação ao serviço de saúde. Como barreira, apontaram

o tempo excessivo de terapia ao longo dos anos e que este tempo impacta na realização de outras atividades de interesse. E como facilitador, que o serviço de saúde foi benéfico quando houve acompanhamento de forma integral no processo de reabilitação (LONGO et al., 2020).

A INFLUÊNCIA DO ENFRENTAMENTO

PARENTAL NA ROTINA E NO

DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA

O suporte familiar é importante para auxiliar no entendimento do papel parental, pois a exposição a situações estressantes podem influenciar de forma negativa no cotidiano (PALOMOCARRIÓN et al., 2021). O sono pode ser um fator que impacta na rotina, visto que os pais podem ser expostos à solicitação de atenção da criança durante a noite e ter poucas horas de sono por ficarem alertas a sons, vídeos e monitorar a criança (HULST et al., 2022).

Hulst et al. (2022) também abordam que devido aos cuidados noturnos os pais podem ter aumento no estresse e exaustão psicológica, sendo que a depressão materna chega a 40% em mães que apresentam baixa qualidade no sono. Dessa forma, entende-se que:

Atender às necessidades de informação das famílias, apoio emocional e físico e acesso à intervenção precoce reduziria seus níveis de estresse e direcionaria suas perspectivas

para seus próprios objetivos, que devem ser incluídos na perspectiva de famílias como facilitadoras (PALOMOCARRIÓN, et al., 2021).

Dentro do processo de descoberta e aceitação do diagnóstico, pode haver diversas estratégias para o enfrentamento, a depender do estágio em que a família se encontra nesse processo. Lord (2018) conclui que com o passar do tempo os pais conseguem organizar sua rotina e suas demandas diárias. Ainda, relata que a informação correta de acordo com que conseguem aceitar em cada fase, a empatia e o apoio são fatores determinantes para o enfrentamento do diagnóstico.

Sendo assim, a educação parental é um caminho que visa aumentar o sentimento de autoeficácia dos pais, podendo melhorar as respostas de interação entre criança e família, levando a um ambiente positivo e que auxilia no desenvolvimento infantil.

Ferreira et al. (2020) constataram que a intervenção com o foco nos programas familiares contribuiu para o desenvolvimento motor e cognitivo, corroborando com a ideia de que utilizar estratégias que auxiliem o enfrentamento parental, pode impactar de forma positiva na qualidade de vida das famílias e das crianças.

PARTICIPAÇÃO DA CRIANÇA NO AMBIENTE

A participação pode ser definida, de acordo com Alencar (2010), como: “o reflexo de práticas sociais que a depender do contexto onde são aplicadas poderão ter significados distintos”. Pode ser

coletiva e individual, mas quem realiza a tomada de decisão de qual fator é importante, seja nos aspectos sociais, políticos, culturais ou econômicos é o próprio sujeito (ALVES, 2013).

Kalleson, Jahnsen E Østensjø 2021 compilaram dados referentes à participação da criança com PC e a sua influência por fatores ambientais internos e externos e pela família. Os autores pontuam o lar como principal contexto de aprendizagem, interações com pessoas e objetos. O ambiente familiar é visto como fator importante para que as crianças consigam adquirir conhecimento e habilidades que lhes permitem participar em atividades mais complexas e variadas.

Longo et al. (2020) relatam, na perspectiva das crianças, o que são barreiras e facilitadores. O único fator ambiental considerado como facilitador, por todas elas, foi o núcleo familiar próximo.

A família é vista por elas como apoio, por meio do amor e atitudes positivas, ou seja, é a base para a sua construção emocional.

Fatores ambientais como serviço de saúde, produtos e tecnologia, ambientes físicos, atitudinais e sociais despreparados, ou seja, falta de acesso à saúde específica e a tecnologia assistiva, barreiras arquitetônicas, atitudes preconceituosas, falta de informação, dentre outros, contribuem para a não participação desta criança, a qual pode também ser impactada pelo desconhecimento dos pais sobre as atividades recreativas e de lazer oferecidas pela comunidade (GHAFFARI et al., 2020; LONGO et al., 2020).

Existem ainda fatores que podem impactar indiretamente na estrutura familiar e consequentemente na função emocional e comportamental da criança. Kalleson et al. (2021) relataram que

a participação na comunidade e a interação com outras pessoas, demandam habilidades comportamentais e emocionais adaptativas e que isso pode representar um desafio, tornando uma barreira para o desejo da criança de participar.

A forma com que as adaptações ambientais e dispositivos de tecnologia assistiva (para aquelas crianças que se beneficiam do uso) são implementados no contexto de vida real, também pode indicar diferenças no nível de participação, principalmente, em relação ao brincar no ambiente externo. Indicando que um ambiente inclusivo torna possível a participação independentemente da classificação motora do indivíduo com PC (KALLESON et al., 2021).

Com relação a visão da família sobre a participação no ambiente de intervenção, as mesmas acham importante que o ambiente seja adequado à idade da criança, deficiência cognitiva/ física, características individuais e níveis funcionais (LORD, 2018). Ainda, apontam que um ambiente ideal para o desenvolvimento de seu filho é aquele onde exista um espaço lúdico em que a motivação esteja presente, promovendo a participação ativa da criança e proporcionando à família se envolver neste processo (PALOMO-CARRIÓN, et al., 2021).

Assim, oportunizar a participação e promover a capacidade de adaptação em diversos ambientes e de socialização podem contribuir para o desenvolvimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este capítulo buscou apresentar como o ambiente e a família impactam no desenvolvimento da criança com PC. Os achados revelam que a família, quando participante ativa do processo de intervenção, pode contribuir para o desenvolvimento da criança, pois consegue realizar as estimulações dentro da própria rotina, fazendo com que a criança se desenvolva como parte integrante da família. Dentro desta perspectiva, a intervenção precoce e a prática centrada na família se apresentam como estratégias positivas dentro da intervenção de crianças com PC.

O ambiente pode influenciar de forma negativa e positiva no desenvolvimento. Um ambiente com mais oportunidades de participação e estímulos se torna benéfico. O ambiente externo despreparado em atender as necessidades da pessoa com PC, políticas públicas não inclusivas e a falta de planejamento arquitetônico dificultam ou até mesmo inviabilizam o processo de desenvolvimento.

Os profissionais de saúde têm o papel fundamental de integrar família-criança-ambiente (interno e externo) e serviços de saúde, promovendo estratégias assertivas no âmbito da intervenção que melhor atende as necessidades e demandas do paciente. Cabe salientar que foram encontrados poucos estudos na literatura científica e nenhum deles em português, gerando a limitação de retratar a realidade vivenciada no Brasil, sendo assim, são necessárias pesquisas futuras para melhor elucidar como o ambiente e a família podem influenciar no desenvolvimento da criança com PC.

REFERÊNCIAS

ALENCAR, H. F. de. Participação social e estima de lugar: caminhos traçados por jovens estudantes moradores de bairros da regional III da cidade de Fortaleza pelos mapas afetivos. 2010. 239 f. Tese (Doutorado) - Curso de Psicologia, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2010.

ALVES, J. C. M. A participação social a partir do Programa Federal Territórios da Cidadania: o caso do território do Cariri/CE. Dissertação (mestrado), Universidade Federal do Ceará. Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional Sustentável. Juazeiro do norte, 2013.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas.

Diretrizes de atenção à pessoa com paralisia cerebral. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. Disponível em: https:// bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_atencao_ paralisia_cerebral.pdf

FERREIRA, R. C. et al. Effects of early interventions focused on the family in the development of children born preterm and/or at social risk: a meta-analysis. Jornal de Pediatria, Rio de Janeiro, v. 96, n. 1, p. 20-38. jan. 2020.

GHAFFARI, S. et al. Predictors of Leisure Participation in 6 to 14-Year-Old Children with Cerebral Palsy: Structural Equation Modeling. Iran J Child Neurol.: Iran J Child Neurol. Irã, p. 41-57. 2020.

HUST, R.Y. Parental perspectives on care for sleep in children with cerebral palsy: a wake-up call. Disability and Rehabilitation, [S.L.], v. 44, n. 3, p. 458–467, 2022.

KALLESON, R.; JAHNSEN, R.; ØSTENSJØ, S. Exploring participation in family and recreational activities among children with cerebral palsy during early childhood: how does it relate to motor function and parental empowerment? Disability And Rehabilitation, [S.L.], v. 44, n. 9, p. 15601570, mar. 2021.

LONGO, E. et al. I Want to Play: children with cerebral palsy talk about their experiences on barriers and facilitators to participation in leisure activities. Pediatric Physical Therapy, [S.L.], v. 32, n. 3, p. 190-200, jul. 2020.

LORD, C. et al. Determinants of parent-delivered therapy interventions in children with cerebral palsy: a qualitative synthesis and checklist. Child: Care, Health and Development, [S.L.], v. 44, n. 5, p. 659-669, 23 jul. 2018.

NOVAK, I. et al. Early, Accurate Diagnosis and Early Intervention in Cerebral Palsy. Jama Pediatrics, [S.L.], v. 171, n. 9, p. 897, set. 2017.

Organização Panamericana da Saúde/Organização Mundial da Saúde - OPAS/OMS. Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF). Centro Colaborador da Organização Mundial da Saúde para a Família de Classificações Internacionais em Português (org.); Cássia Maria Buchalla (trad.). 1. ed., 1. reimpre. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2003.

PALOMO-CARRIÓN, R. et al. Early Intervention in Unilateral Cerebral Palsy: lets listen to the families! What are their desires and perspectives? A preliminary familyresearcher co-design study. Children, [S.L.], v. 8, n. 9, p. 750, ago. 2021.

ZAMPIERI, L. M. et al. Discriminant validity of social and functional performance protocol to children with cerebral palsy. Acta Fisiátrica, Universidade de São Paulo, v. 23, p. 66-72. jun. 2016.

6.

INTERVENÇÃO PRECOCE NO

DESENVOLVIMENTO INFANTIL E A PARTICIPAÇÃO FAMILIAR

Renata Tomaz de Oliveira

Renata de Cássia Silva Ribeiro Botelho

Vanessa Cristina Alves dos Santos Machado

INTRODUÇÃO

O ser humano é único, é um todo indivisível. Por meio de experiências significativas, nos âmbitos social, afetivo, cognitivo e adaptativo, busca explorar suas possibilidades, se constrói nas interações que estabelece com o outro, com os objetos e com o mundo que o cerca. De acordo com Perin (2010) as estruturas mentais serão construídas pelas crianças por meio das interações, ação sobre o meio e pela qualidade de solicitação do ambiente.

Toda criança necessita de estímulos para que seu potencial se desenvolva efetivamente. Quando o organismo infantil não apresenta distúrbios ou qualquer deficiência, a figura materna intervém e estimula a criança naturalmente, valendo-se dos laços afetivos estabelecidos, dando significado às suas sensações. Quando acontece uma lesão ou empecilho, dessa função sensorial, o mundo da criança fica restrito, reduzindo suas possibilidades de trocas com o meio, o que ocasiona rotineiramente, transtornos em seu desenvolvimento (FLORES; SMELHA, 2013).

Os métodos e recursos aplicados na prática da intervenção precoce baseiam-se na intervenção e integração dos sentidos remanescentes da criança. Considerando os atrasos e dificuldades expressas por determinadas crianças, este capítulo tem como finalidade refletir sobre o modo pelo qual a intervenção precoce pode colaborar para o desenvolvimento da criança com a participação familiar.

INTERVENÇÃO PRECOCE

No período sensório-motor (0 a 2 anos), encontra-se o alicerce de todo o desenvolvimento humano. A interação com pessoas, objetos, a compreensão dos acontecimentos e a construção do sistema de significação permite que a criança tome consciência de si, do outro e do mundo ao seu redor (BOLSANELLO, 2013).

Rodrigues (2012) concebe o termo “intervenção precoce” como o “conjunto dinâmico de atividades e de recursos humanos e ambientais incentivadores que são destinados a proporcionar à criança, nos seus primeiros anos de vida, experiências significativas para alcançar pleno desenvolvimento no seu processo evolutivo”.

A intervenção tem como objetivo desenvolver e potencializar as funções do cérebro do bebê, por meio de jogos, exercícios, técnicas, atividades e de outros recursos, utilizando-se do mecanismo da neuroplasticidade, a qual faz unir a adaptabilidade do cérebro a capacidade de aprendizagem (APOLÓNIO; FRANCO; MIRANDA, 2010).

Para a criança com desenvolvimento atípico o diagnóstico precoce, a orientação médica e educacional adequada, são essenciais visto que, no primeiro ano de vida, as funções vitais básicas se estabelecem. A intervenção precoce é um processo interativo que tem por objetivo o desenvolvimento global mediante a interação dos demais sentidos, que visa à adaptação social, a prevenção de déficits, motivando a independência e a autonomia da criança com deficiência (FERREIRA; SADOYAMA, 2015).

Toda criança, assim como o bebê com desenvolvimento atípico, precisa de um ambiente familiar harmonioso, com intervenção educativa. As crianças com deficiência dispõem de sistemas alternativos para interagir com os adultos, desde que estes saibam interpretar as vias alternativas que a criança dispõe para conhecê-los e comunicar-se com eles (FLORES; SMELHA, 2013).

Ela necessita receber afeto e atenção para sentir-se segura. A mãe desempenha importante papel na interpretação do mundo, dando segurança para a criança explorar e fazer as primeiras descobertas (FERREIRA; SADOYAMA, 2015). É importante salientar que a criança com deficiência carece de um tempo maior de adaptação do que as crianças com desenvolvimento típico, porque as funções básicas cumprem uma função primordial para o conhecimento, controle e conformação com o meio (BOLSANELLO, 2013).

Segundo Franco (2016), a aprendizagem depende, portanto, da capacidade do sujeito de acomodar o objeto do conhecimento e assimilá-lo, isto é, eternizá-lo, torná-lo parte de si. O trabalho de intervenção precoce tem um cunho lúdico. É preciso que a criança sinta prazer ao ser trabalhada. Só assim ela se motivará a repetir e aperfeiçoar suas ações. Deve ficar claro que o lúdico prevê objetivos bem definidos e estabelecidos por parte do profissional, porém, este deve estar ciente da flexibilidade que o programa prevê, aproveitando todas as situações que surgirem, muitas vezes inesperadas, para intervir junto a criança (FERREIRA; SADOYAMA, 2015).

Os brinquedos e os jogos são largamente utilizados no processo de intervenção. O brincar é tão importante para a criança quanto o trabalhar é para o adulto. É preciso que os pais reconheçam esta realidade e valorizem as atividades lúdicas como ponto de partida para o desenvolvimento. Torna-se fundamental que a criança seja produtora da ação, atuando de forma ativa na interação com o meio (BOLSANELLO, 2013).

A criança com deficiência precisa descobrir o prazer do movimento e descobrir como se movimentar no espaço de diferentes formas. Quando aprende a usar o corpo e se sente segura do seu uso, torna-se autoconfiante, independente e mais feliz.

Franco (2016, p. 58) descreve que

As ações precisam ser repetidas até que a criança perceba como realizá-las sozinha. A visão é contínua; porém, o tato é analítico e, portanto, pobre para dar a noção de conjunto e movimento. As ações lúdicas propostas para as crianças com deficiência devem vir acompanhadas de explicações, sons ou cantigas, de acordo com a situação. O primeiro “brinquedo” da criança é seu próprio corpo. É necessário que perceba o prazer em descobri-lo, se diferenciando do mundo que a cerca, para, mais tarde, descobrir os outros e os objetos.

Para a criança com desenvolvimento atípico o brincar é uma atividade fundamental, que previne e impede o auto confinamento. O mundo da criança no útero materno é cheio de sensações agradáveis, de conforto, calor e movimento. Ao nascer, necessita

se adaptar às novas situações: reage à luzes fortes, ruídos intensos, manipulações precipitadas, que ocasionam sentimento de angústia e desamparo. Depende de cuidados fundamentais que assegurem sua subsistência, os quais incidem, não só em alimentação, higiene, como também, carinho e proteção, que colaboram, de modo significativo, para o seu desenvolvimento emocional (MARTINEZ et al., 2007).

A qualidade do cuidado define as possibilidades de um desenvolvimento emocional e global satisfatório. A criança precisa se sentir acolhida e amada para que tenha segurança em arriscar-se, nos principais movimentos, rumo à independência. As primeiras relações sociais que sustenta, normalmente, são com sua mãe e sua família. Um clima familiar saudável proporciona um adequado desenvolvimento afetivo, intelectual, físico e motor. Um ambiente agressivo interfere negativamente no processo evolutivo e na formação da personalidade (FRANCO; APOLÓNIO, 2008).

A comunicação que se constitui, nos primeiros dias de vida, é pelo contato corporal. A criança sente prazer em ser tocada, alimentada, banhada e acarinhada. A comunicação pelo contato colabora, de modo significativo, para o fortalecimento desta relação, assim como ouvir a voz tranquilizadora de sua mãe que a acalma e conforta (FERREIRA; SADOYAMA, 2015).

A criança com deficiência tem as necessidades básicas de movimento, toque, proteção, afeto e cuidados com a alimentação e higiene, do mesmo modo que a criança típica. Ela precisa de tudo isso para seu desenvolvimento físico e emocional (FLORES; SMEHA, 2013).

A falta do contato adequado, nos primeiros dias, inibe a comunicação e interação mãe-filho, que precisa ser realizada a partir dos outros canais sensoriais. Circunstâncias que despertam agrado e desagrado são relevantes, pois motivam a criança a agir sobre o meio que a cerca. Seu tônus muscular se decompõe, fornecendo o fundamento para o desenvolvimento motor (BOLSANELLO, 2013). Nas manipulações naturais que demandam seus cuidados, a criança aprenderá a movimentar-se de modo adequado e a agir sobre os elementos que a cercam, de forma natural (FERREIRA; SADOYAMA, 2015).

No decorrer da alimentação e da higiene, a troca de roupas e as brincadeiras, são despertadas na criança estímulos sensoriais que operam sobre o sistema nervoso. Estas atividades geram tanto sensações proprioceptivas – através do movimento, como percepções exteroceptivas – captadas pelos elementos visuais, táteis e sonoros (MARTINEZ et al., 2007).

Franco (2016) afirma que a intervenção requer não somente uma comunicação constante, atenta e efetiva com o bebê, ao longo do seu desenvolvimento, como ainda um ambiente rico em estímulos perceptivos, que apresente contato com cores, sons e texturas variadas. Demanda ainda materiais que propiciem o desenvolvimento das habilidades motoras do bebê, abrangendo o desenvolvimento das musculaturas envolvidas na coordenação motora grossa e fina, para que possa vencer com êxito e, no seu próprio compasso, as etapas do processo evolutivo.

A comunicação desempenha importante papel na aquisição da linguagem falada e na formação dos conceitos que ela representa.

O papel da família é fundamental como facilitador das aquisições dos padrões de postura e do movimento, na educação, no desenvolvimento da inteligência e na organização da personalidade, em todas as fases do processo evolutivo da criança com desenvolvimento típico. Assim, maior é a importância da atuação dos pais no desenvolvimento de uma criança com deficiências sensoriais (FRANCO; APOLÓNIO, 2008).

Quando nasce uma criança com desenvolvimento atípico todo o “mundo de fantasia” criado pelos pais desmorona. Surgem, então, vários sentimentos que, muitas vezes, não são bem definidos ou se misturam: decepção, revolta, angústia, culpa, rejeição, superproteção, entre outros (MARTINEZ et al., 2007). O “choque” e a frustração influenciam profundamente a interação com a criança, atrapalhando a construção de um vínculo afetivo saudável. Os pais, sem saber como lidar com seu filho “tão diferente”, tendem a deixá-lo por muito tempo no berço, sem a atenção e o carinho necessários. A criança ociosa “brinca” com seu próprio corpo podendo desenvolver comportamentos atípicos e estereotipados.

Os pais, muitas vezes, imbuídos do sentimento de vergonha, evitam o convívio social, o que dificulta o relacionamento da criança com outros indivíduos, principalmente, na mesma faixa etária. O preconceito social é um fato. Muitas vezes, os pais são abordados na rua com um “sem fim de perguntas” sobre a problemática da criança e uma infinidade de sugestões infundadas. E, neste cenário, torna-se necessário apoio à família por profissionais especializados (FLORES; SMEHA, 2013).

Acredita-se que uma das formas de favorecer a relação entre pais e bebês é disponibilizar orientações de manuseio e cuidados. Neste processo, o mais importante a se considerar é a individualidade de cada bebê, capacitando os pais a identificar as potencialidades da sua criança. É preciso que se utilizem recursos que subsidiem a orientação dos pais para o acompanhamento e intervenção no desenvolvimento do bebê (MARTINEZ et al., 2007).

A orientação aos pais deve fazer parte do programa de intervenção precoce, sendo fundamental a continuidade dos procedimentos nas atividades da vida diária da criança, em sua própria casa. Manipulações inadequadas podem interferir no tratamento, de maneira indesejável. A pouca experiência sensório-motora vivenciada pela criança com deficiência pode levá-la à rejeição de estímulos táteis, contribuindo para o desenvolvimento de alterações desta sensibilidade. É necessário que, desde cedo, tenha contato com uma variedade de materiais, para que não desenvolva futuramente rejeição ao toque, comportamento muito comum nestas crianças (KREUTZ; BOSA, 2019).

Para Graça et al. (2010), intervir é brincar, um sinônimo de exploração e experimentação, é uma coisa séria para a criança. Segundo ela, brincar também pode ser relaxante, quando são trabalhadas as emoções, a realidade é imitada nas brincadeiras de imaginação e consegue-se promover o desenvolvimento da personalidade da criança.

De acordo com Kreutz e Bosa (2019), para as crianças com atraso no desenvolvimento neuropsicomotor, a aprendizagem de habilidades é multifacetada e apresenta uma série de pré-requisitos, incluindo:

• Aceitação da natureza complementar dos processos neurofisiológicos e da biomecânica na aquisição de habilidades;

• Natureza interativa de todos os aspectos do controle motor: motor, sensorial, cognitivo, perceptivo, comportamental, biomecânico;

• Importância do meio;

• Oportunidade para experiências;

• Prática variada: repetição sem repetição;

• Meta coerente: o prazer do movimento pode ser o próprio objetivo, assim como alcançar um brinquedo ou comunicar-se;

• Percepção e processamento sensorial adequados à aprendizagem e adaptação das atuais condutas a uma nova habilidade.

A intervenção precoce para essa criança tem importância fundamental para o seu desenvolvimento, por isso, quanto mais rápido ela for trabalhada, melhor o progresso aproveitando a janela de maior neuroplasticidade cerebral (APOLÓNIO; FRANCO; MIRANDA, 2010; FRANCO, 2016).

A intervenção requer não somente uma comunicação constante dos pais, mas também um ambiente rico em estímulos perceptivos para a criança, no sentido de estimular o desenvolvimento global (TARTUCI; CANUTO; XIMENIS, 2015).

RELAÇÃO DA FAMÍLIA COM A INTERVENÇÃO

PRECOCE

Na última década, os pesquisadores envolvidos na ciência do desenvolvimento têm se dedicado a compreender os fatores ambientais ou experiências que influenciam diretamente o desenvolvimento de uma criança atípica. As evidências sugerem que os aspectos que influenciam crianças com desenvolvimento típico, se aplicam às crianças com pequenos atrasos, apesar da extensa heterogeneidade. É fundamental para qualquer abordagem de intervenção precoce, otimizar essas influências na forma de padrões familiares de interação considerando as particularidades de cada criança e fazendo os ajustes apropriados. Isso constitui uma forte estrutura para examinar os caminhos de influência em crianças com deficiência (FRANCO, 2016).

A maior parte das pesquisas atuais, da ciência do desenvolvimento envolvendo crianças com deficiência, se concentrou nas associações das várias formas de interações entre pais e filhos e os resultados na criança. Especificamente, as avaliações da sensibilidade dos pais aos seus filhos em uma variedade de configurações, usando esquemas de codificação, revelaram consistentemente fortes associações entre grupos dessas medidas (por exemplo, resposta contingente, calor afetivo, seguir a liderança da criança, manter uma conexão com um conjunto equilibrado de trocas) e os resultados na criança (PERIN, 2016).

É importante notar que muitas dessas medidas de responsividade sensível buscam estabelecer e manter um alto nível de

discurso entre pais e filhos (ou seja, estabelecer uma estrutura de discurso incluindo expandir e interpretar as tentativas de comunicação das crianças), com medidas de resultados da criança focadas na linguagem (RODRIGUES, 2012).

As associações entre a capacidade de resposta sensível aos pais e os resultados da criança também são evidentes em interações do tipo instrucional, mesmo aquelas que surgem em um contexto de brincadeira. Por exemplo, foram encontradas associações com maior persistência infantil e motivação de domínio. Aspectos importantes do brincar de crianças com deficiência, habilidades sociais e a segurança do apego estão associados a uma responsividade sensível de maior qualidade (comportamento de apoio) envolvendo tanto suas mães quanto seus pais (KREUTZ; BOSA, 2019).

Da mesma forma, existe na literatura fortes associações entre experiências de aprendizagem orquestradas pelos pais para seus filhos e uma série de resultados da criança. Devidamente organizadas, amplas oportunidades para experiências críticas de aprendizagem para a criança são encontradas, nessas interações diárias, em diversos ambientes e atividades. A capacidade dos pais e os esforços ativos para garantir a saúde e a segurança de seus filhos são componentes dos padrões familiares de interação que provavelmente influenciam, direta ou indiretamente, vários aspectos do desenvolvimento de uma criança (TARTUCI; CANUTO; XIMENIS, 2015).

Tendo em vista a extensa heterogeneidade de crianças com deficiência e a ampla gama de qualidade dos padrões de interações

familiares, os esforços de intervenção precoce direcionados àqueles que exibem responsividade sensível, de qualidade inferior, podem melhorar os resultados da criança. A identificação confiável de subgrupos que exibem padrões familiares de interação, de qualidade inferior, pode constituir uma tarefa fundamental para trabalhos futuros em intervenção precoce.

A ciência da intervenção tem sido realizada, principalmente, para aumentar a capacidade de resposta sensível aos pais como meio de promover o desenvolvimento das crianças; buscando aumentar o suporte para a influência desta via de desenvolvimento em crianças com atrasos. Grande parte desse esforço, no entanto, tem se concentrado em estudos de menor escala destinados a melhorar a linguagem e a comunicação.

Ao fazê-lo, como muitas vezes ocorre, no contexto de esforços sistemáticos para alterar as trajetórias de desenvolvimento, tornou-se evidente que ainda não conciliamos com sucesso o papel da estrutura de intervenção, abordagens didáticas de intervenção e estratégias de intervenção mais naturalistas. Além disso, são necessários mais trabalhos sobre conceituação e avaliação adequada das relações que emergem em contextos que incluem níveis variados de responsividade sensível (FRANCO; MELO; APOLÓNIO, 2012).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste capítulo, foram apresentados e discutidos aspectos relacionados às vias múltiplas e recíprocas de influência no

desenvolvimento de crianças atípicas que podem orientar a prática de intervenção precoce. A fusão de iniciativas políticas com o conhecimento dos processos de desenvolvimento pode ser um potencial acelerador do progresso de elaboração de sistemas abrangentes de intervenção precoce.

E, pesquisas relevantes para melhorar as relações no discurso, contextos instrucionais e socioemocionais serão especialmente valiosas. A ciência do desenvolvimento sugere que essas são as chaves para promover as habilidades independentes de resolução de problemas das crianças, ou seja, iniciar metas e construir competências sociais e cognitivas, aprimorando vários aspectos dos recursos de desenvolvimento e processos organizacionais.

REFERÊNCIAS

APOLÓNIO, A.; FRANCO, V.; MIRANDA, M. C. A rede de intervenção precoce no desenvolvimento infantil na região do Alentejo. INFAD – International Journal of Developmental and Educational Psychology, [S.L.], v. XXII, n. 1, p. 121-134, 2010.

BOLSANELLO, M. A. Concepções sobre os procedimentos de intervenção e avaliação de profissionais em estimulação precoce. Revista Educar, Curitiba, n. 22, p. 343-355, 2013.

FERREIRA, J. B.; SADOYAMA, A. S. P. Educação a distância uma alternativa para a educação profissionalizante, inclusiva e formação continuada: Um estudo bibliométrico. Enciclopédia Biosfera, Goiânia, v. 11, n. 20, p. 347, 2015.

FRANCO, V. Tornar-se pai/mãe de uma criança com transtornos graves do desenvolvimento. Educar em revista, Curitiba, n. 59, p. 35-48, 2016.

FRANCO, V.; APOLÓNIO, A. M. Avaliação do impacto da Intervenção Precoce no Alentejo: criança, família e comunidade. Évora: ARS, 2008.

FRANCO, V.; MELO, M.; APOLÓNIO, A. Problemas do desenvolvimento infantil e intervenção precoce. Educar em revista, Curitiba, n.43, p. 49-64, 2012.

FLORES, M. R.; SMEHA, L. Bebês com risco de autismo: o não-olhar do médico. Revista Ágora, Rio de Janeiro, v. 16, número especial, p. 141-157, 2013.

GRAÇA, P. R. M. et al. O momento da avaliação na intervenção precoce: o envolvimento da família estudo das qualidades psicométricas do asq-2 dos 30 aos 60 meses.

Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v.16, n. 2, p. 177-196, 2010.

KREUTZ, C. M.; BOSA, C. A. Intervenção precoce na comunicação pais-bebê com deficiência visual. Estudos de Psicologia, Campinas, v. 26, p. 537-544, 2009.

MARTINEZ, C. M. S. et al. Suporte informacional como elemento para orientação de pais de pré-termo: um guia para o serviço de acompanhamento do desenvolvimento no primeiro ano de vida, [S.L.], Brazilian Journal of Physical Therapy, v. 11, n. 1, p. 73-81, fev. 2007.

PERIN, A. E. Estimulação Precoce: sinais de alerta e benefícios para o desenvolvimento. Revista de Educação do Ideau, Rio Grande do Sul, v. 5, n. 12, p. 1-13, jul./dez. 2010.

RODRIGUES, O. M. P. R. Escalas de desenvolvimento infantil e o uso com bebês. Educar em revista, Curitiba, n. 43, p.81-100, jan./mar. 2012.

TARTUCI, D.;

CANUTO,

M.; XIMENIS, P.

Estimulação precoce e o atendimento de crianças na educação

infantil. APOSTILA. Catalão, GO: UFG/AEE, 2015.

7.

INTERVENÇÃO PRECOCE E OS

DESAFIOS NA PARTICIPAÇÃO DAS FAMÍLIAS

Julia Oliveira Lima

Priscilla Oliveira Lima

Vanessa Silva

Marcela P. C. de Andrade Oliveira

INTRODUÇÃO

Os primeiros anos de vida da criança correspondem a um período de maturação neurológica e aquisição de habilidades afetivas, sociais, cognitivas e motoras, que repercutem ao longo da vida adulta. Assim, quando o desenvolvimento não ocorre de forma adequada, é necessário um acompanhamento especializado.

A Intervenção Precoce (IP), neste contexto, é indispensável para prevenir, identificar e antecipar intervenções visando o desenvolvimento neuropsicomotor pleno (COSSIO et al., 2018).

Nessa perspectiva, IP pode ser considerada uma lógica de prestação de serviços, que tem como objetivo contribuir para a qualidade de vida e o fortalecimento das famílias (COSSIO et al, 2018). Atualmente, há crescente discussão sobre a importância dos modelos de IP apresentarem, como ponto central, a abordagem centrada na família, suas relações e as intervenções voltadas para as necessidades e capacidades da criança e sua família, destacando o protagonismo dos cuidadores (BEDNARZ et al., 2020).

Nesse contexto, a família também tem a responsabilidade de proporcionar um ambiente estimulante e saudável para a criança, gerando condições favoráveis para que desenvolva todo o seu potencial. A literatura científica aponta que uma família participativa e profissionais que atuam em conjunto, podem proporcionar um tratamento de qualidade, baseado em evidências científicas e de acordo com as reais necessidades da criança e da família (COSTA et al., 2019).

No entanto, sabe-se que muitas vezes a participação da família nos programas de IP é limitada por diversos fatores, o que pode dificultar o ganho de habilidades e o pleno desenvolvimento das potencialidades da criança (FERREIRA, et al., 2019). Ante o exposto, este capítulo tem por objetivo apresentar os desafios para a participação das famílias nos serviços de IP e apontar possíveis estratégias para viabilizar essa participação.

DESAFIOS NA PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA

A primeira infância compreende o período da gestação até os seis anos e constitui etapa determinante no desenvolvimento do ser humano. Durante esse período, são consolidadas as bases para as aprendizagens futuras e as experiências de interação com o ambiente que permitem a aprendizagem e o desenvolvimento de habilidades sociais, emocionais, cognitivas, motoras e sensoriais (MEIRELES et al., 2017).

Nesse contexto, o ambiente em que a criança se desenvolve, em seus primeiros anos de vida, pode ter profunda influência na arquitetura do cérebro. Circuitos de baixo nível cuja estrutura foi moldada por experiências saudáveis, no início da vida, fornecem circuitos de alto nível com informações precisas e de alta qualidade. Assim, o aprendizado precoce estabelece as bases para o aprendizado posterior e é essencial (embora não suficiente) para o desenvolvimento de uma arquitetura cerebral otimizada (FOX; NELSON, 2010).

A família constitui o primeiro espaço de dependência e socialização da criança. É ela que define os hábitos, a alimentação, os cuidados de saúde, a educação e seleciona os contextos, aos quais as crianças são expostas. As experiências da criança com a família, especialmente na primeira infância, influenciam o presente e o futuro delas (PLUCIENNIK; LAZZARI; CHICARO, 2015).

Quando se refere aos fatores ambientais que influenciam sobremaneira o desenvolvimento infantil, questões como o espaço físico em que a criança vive, escolaridade dos pais, dinâmica familiar, condição econômica da família e relações familiares podem aumentar a probabilidade de condições de risco. Dessa forma, autores chamam atenção para que programas de acompanhamento do desenvolvimento tenham como foco aspectos do ambiente em que a criança está inserida (SOUZA; MAGALHÃES, 2012).

Inúmeros estudos referem a importância da IP, sobretudo, os que evidenciam os benefícios da abordagem centrada na família. As intervenções implementadas, com enfoque na família, são sinônimo de influência positiva no que concerne à corresponsabilização, coesão familiar e ao bem-estar dos cuidadores (FERNANDES, 2018).

Quando a família participa ativamente do processo de intervenção, torna-se possível compreender, de maneira mais efetiva, os problemas/dificuldades da criança, além de impactar de forma positiva o relacionamento dos cuidadores e obter melhores percepções sobre diversas questões da vida (FERREIRA, et al., 2019).

Apesar de todo esse potencial destacado nos estudos, muitos são os desafios encontrados pelas famílias para legítima participação na IP. As barreiras encontradas perpassam o desejo de que esta participação ocorra, indo desde dificuldades individuais de cada membro da família até o envolvimento de outros contextos familiares, como os educacionais e socioeconômicos (FERREIRA, et al., 2019)

Um grande desafio para a participação da família é, sem dúvida, a não aceitação do diagnóstico da criança. Muitas famílias passam por processos de luto que, frequentemente, não recebem a devida atenção. Culpabilização e negação podem surgir e ocorrer de forma imperceptível pela própria família (SILVA; ALVES, 2021; GERMANO et al., 2021).

O nascimento de uma criança com deficiência é uma experiência inesperada que pode trazer à tona diversas questões, como, o impacto emocional frente ao diagnóstico e a necessidade de adaptação e aceitação para que seja possível o desenvolvimento da criança. Assim, é crucial a comunicação humanizada com a família sobre o diagnóstico (SILVA; ALVES, 2021).

Germano e colaboradores (2021) acrescentam que após o diagnóstico são relatadas alterações no convívio social, devido à necessidade de cuidado constante. Existem relatos de que o enfrentamento acontece diferentemente de indivíduo para indivíduo, pois varia de acordo com o modo como a pessoa distingue e enfrenta a realidade, seja na não aceitação ou negação do diagnóstico.

Meireles e colaboradores (2017) realizaram um estudo com cuidadores de crianças, de zero a três anos, atendidas em um

serviço reabilitação nas áreas de deficiência física, intelectual, visual e auditiva e observaram que as maiores dificuldades das famílias eram as condições socioeconômicas e, consequentemente, o acesso aos serviços de saúde que realizam os atendimentos. O mesmo estudo aponta que a maioria das crianças com alterações no desenvolvimento encontram-se em famílias com renda menor que um salário-mínimo.

A condição socioeconômica é, comumente, agravada pelo fato de que na maior parte das famílias, o familiar responsável pelos cuidados da criança (normalmente a mãe), precisa abdicar do trabalho fora de casa para conseguir cuidar da criança e acompanhá-la nas terapias, e, como consequência, a renda da família é afetada (MEIRELES et al., 2017).

Além disso, frequentemente, a família apresenta nível de escolaridade que dificulta a compreensão das atividades propostas e isso se torna um grande desafio para sua participação efetiva na intervenção. Isso ocorre, por exemplo, quando o profissional utiliza muitos termos técnicos ao conversar com a família, sem se atentar para sua real compreensão ou quando a família aparenta entender as orientações, mas pelas dificuldades de compreensão, acabam por não investirem nos estímulos (FERREIRA et al.,2019).

Ferreira e colaboradores (2019) analisaram o relato de diferentes profissionais sobre a participação da família em serviços de IP. Dentre as dificuldades apontadas, que impactaram a continuidade da IP, no ambiente familiar, o nível de escolaridade que dificultava a compreensão das atividades propostas foi a resposta

mais prevalente no estudo (54%), seguida da não aceitação das dificuldades apresentadas pela criança (30%).

Vale destacar o papel da mãe como principal cuidadora da criança na intervenção. Geralmente, são elas que se dedicam de forma exclusiva, abandonando suas atividades de estudo ou trabalho e, consequentemente, gerando sobrecarga para esse membro da família (MEIRELES et al., 2017). Esta sobrecarga materna não é apenas física, pelas demandas de cuidados e das atividades domésticas, mas também emocional com sentimento de insegurança, impotência, culpa e desamparo, prejudicando ainda mais sua participação nos serviços de IP (FRANCO, 2016).

Muitos dos desafios perpassam as condições individuais de cada família e se retratam em contextos maiores, como, o modelo de assistência à saúde adotado pelos profissionais. Pérez (2013) refere que, historicamente, os programas de IP tinham enfoque, essencialmente, na criança, colocando de lado a família e os contextos de vida subjacentes, imperando, assim, o modelo médico hegemônico, no qual os profissionais são considerados os experts, exercendo domínio sobre as informações, decisões e recursos para as crianças com deficiências, sendo as orientações transmitidas às famílias em um formato hierárquico.

É este o modelo que prevaleceu por muitos anos e que ainda se faz presente, no diagnóstico e tratamento dos déficits do desenvolvimento, com um olhar voltado para a criança, não considerando o seu contexto familiar. Programas de intervenção com este enfoque destacam os profissionais como detentores de todo o conhecimento sobre a criança, muito mais que os próprios pais.

Enquanto os profissionais estiverem no centro do cuidado, as práticas não poderão ser consideradas centralizadas na família (MARINI et al., 2017).

E mesmo nos programas de IP voltados para a família, ainda recente em nosso país, destacam-se dois tipos de modelos: “aliado à família” e “focado na família”. No primeiro, os pais são vistos como instrumentos para os profissionais, funcionando como coterapeutas, implementando as intervenções prescritas e, no segundo, as famílias são consideradas consumidoras, em que as opções de intervenções são apresentadas e elas escolhem as mais adequadas (MARINI et al., 2017).

Desta forma, torna-se indispensável direcionar atenção aos desafios que limitam a participação da família na IP, mas, sobretudo, pensar em estratégias que auxiliem essas famílias a ampliarem sua participação. A seguir, discutiremos alguns dos possíveis caminhos para fortalecer essa participação familiar na IP.

ESTRATÉGIAS EFICAZES PARA MAIOR

PARTICIPAÇÃO DAS FAMÍLIAS NA INTERVENÇÃO PRECOCE

A família, como uma constante na vida da criança, encontra-se na melhor posição para identificar suas necessidades e promover o seu bem-estar. É importante compreender que a criança é amparada quando a sua família também recebe ajuda e que os serviços de apoio devem ser prestados com base nas decisões e escolhas da família, enfatizando os seus pontos fortes e promovendo

as parcerias e colaborações entre todos os envolvidos (COSSIO et al., 2018).

Dessa forma, diante da relutância da família em aceitar as dificuldades da criança, uma estratégia para ampliar sua participação na IP é investir no preparo dos profissionais para a comunicação do diagnóstico de atraso ou deficiência. A maneira como o diagnóstico é informado pode influenciar significativamente nas reações da família, na vinculação, aceitação ou rejeição da criança, bem como no prognóstico. A comunicação pode ser mais adequada à medida em que o profissional dispõe de um conhecimento apropriado sobre o diagnóstico, apresente uma linguagem acessível à família e, principalmente, apresente uma postura empática e compreensiva (SILVA et al., 2021).

Diante da sobrecarga materna que dificulta uma maior participação nos serviços de IP, compreende-se a importância de auxiliar as famílias em sua organização. De acordo com Valverde e colaboradores (2020), uma estrutura familiar organizada contribui para melhor engajamento nos atendimentos, bem como, no enfrentamento das dificuldades encontradas nesse caminho, e consequentemente uma participação mais eficaz na IP de suas crianças.

Além disso, Macedo e colaboradores (2015) acrescentam a necessidade de políticas públicas de atenção específica às cuidadoras, identificando os fatores de risco para sua saúde e para a qualidade de vida deste grupo. Esse estudo ainda destaca a importância de considerar nas avaliações interdisciplinares, as condições e qualidade do sono das mães, orientando-as sobre a

importância do descanso para a manutenção da qualidade do cuidado domiciliar de seus filhos, incentivar os seus pontos fortes promovendo encontros de grupos de mães, enfatizando o senso de empoderamento para o alívio dos sentimentos de autoeficácia prejudicada e consequente sobrecarga.

Com relação ao modelo de saúde adotado pelos profissionais que atuam nos serviços de IP, percebe-se um início de mudança, de um modelo centrado no profissional e nas necessidades da criança para um modelo que respeita e considera a opinião e participação direta da família (MARINI; DELLA BARBA, 2021). É um percurso que ainda está sendo trilhado para que seja um modelo adotado por todos os profissionais.

Com o avanço dos estudos sobre a importância da IP, houve uma série de transformações e as intervenções se tornaram mais amplas, multidisciplinares e a família e comunidade passaram a ter protagonismo. O processo passou a levar em consideração os contextos naturais da criança para oportunizar sua aprendizagem e progresso (FERNANDES, 2018).

Cada vez mais, observa-se a necessidade de mudança na postura dos profissionais de saúde que assistem a criança e sua família. A relação entre profissionais e família precisa ser menos hierárquica e mais colaborativa. Estudos recentes apontam a necessidade desta mudança, uma vez que mesmo que os pais tenham pouco tempo, por dia, para estarem com seus filhos, eles continuam sendo as pessoas com maiores oportunidades para influenciar o desenvolvimento da criança (CARVALHO et al., 2016).

Outro fator destacado, é que quando uma criança é inserida em um programa de IP percebe-se que o caminho percorrido pelas famílias nos serviços de saúde e de educação é de pouca articulação em rede, principalmente, no que trata de encaminhamentos para profissionais especializados, o que acaba por atrasar esse início de intervenção e/ou torna-se incompleto, faltando por vezes a avaliação de algum profissional ou realização de exames diagnósticos. Essa situação aponta a necessidade de novas formas de articulação em rede, nas quais o caminho para essas famílias seja único e integrado para que não saiam com encaminhamentos e se percam por falta de orientações precisas, deixando assim a criança sem acesso a devida assistência (VALVERDE et al., 2020).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É notório o quanto se torna indispensável a participação das famílias em programas de IP, com grande impacto no desenvolvimento da criança. E nesse sentido, cada vez mais profissionais têm buscado compreender os meios em que as crianças estão inseridas e as formas de tornar mais efetiva a participação familiar.

As famílias representam o maior contexto de potencialização dos estímulos que são necessários e são elas quem mais conhecem suas crianças. No entanto, conforme discutido neste capítulo, muitos são os entraves para esta efetiva participação, para além do desejo de participar. Diante disso, ressalta-se a necessidade de fomentar estudos na área, a fim de compreender melhor as dificuldades das famílias na participação das intervenções e assim propor soluções.

REFERÊNCIAS

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VALVERDE, B. et al. Análise das Relações entre Intervenção Precoce e Qualidade de Vida Familiar. Revista Brasileira Educação Especial, Bauru, v. 26, n. 2, p. 283-298, abr./jun. 2020.

O USO DO BRINCAR COMO RECURSO

TERAPÊUTICO NA PRÁTICA CLÍNICA

INFANTIL

Anny Flávia Almeida Silva

Bruna Stefanny Nascimento e Silva

Évellin Joice de Oliveira Fernandes Barros

Gabriela Aragão Muniz

Jéssica Lorena Chaves Ribeiro Gomes

Bibiana da Silveira Santos

INTRODUÇÃO

Entende-se que o brincar é uma atividade livre, espontânea e organizada, que oferece satisfação, diversão e alegria (FERLAND, 2006; PARHAM; FAZIO, 1997). Atrelado ao brincar, o lúdico é um recurso valioso na prática clínica pediátrica, como facilitador do processo terapêutico, que pode ser utilizado para distrair ou manter a atenção da criança, para trabalhar com os componentes motores, sensoriais, cognitivos, mentais e sociais, além de proporcionar um atendimento humanizado e promover maior adesão ao tratamento (FONSECA et al., 2021; SILVA; PONTES, 2013; ZAGUINI et al., 2011).

O desenvolvimento infantil é definido como um processo multidimensional que se inicia na concepção e engloba o crescimento físico, a maturação neurológica, aspectos comportamentais, sensoriais, cognitivos, linguagem e relações sócioafetivas (ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE, 2005). Neste sentido, para identificar alterações e doenças relacionadas ao desenvolvimento é essencial compreender suas fases e características típicas em cada faixa etária (ILLINGWORTH, 2013).

A família constitui o primeiro meio de relações sociais da criança. A presença e a assistência positiva no núcleo familiar são relevantes para se ter uma plena evolução do desenvolvimento (HOLLERWEGER; CATARINA, 2014). No ambiente familiar, acontecem os primeiros encontros com outros indivíduos e através destas oportunidades a criança se constitui como integrante de um mundo social com significados. Do ponto de vista psicanalítico a família desempenha uma função essencial para o progresso

das crianças, na contenção da parte imatura da personalidade e da hostilidade (MAINARDI; OKAMOTO, 2017).

Os recursos lúdicos são utilizados em diversos contextos, dentre eles, no âmbito hospitalar. Em 2017, foi realizada uma pesquisa em um Hospital público no município de Curitiba com pais de crianças hospitalizadas no setor de emergência pediátrica. Na percepção dos pais, o brincar auxilia no enfrentamento do processo de hospitalização, melhora o comportamento, proporcionando menos estresse a criança ao passar por procedimentos invasivos, melhora na interação entre paciente, pais e profissionais da saúde (BERTÉ et al., 2017).

Sabe-se que a família é o primeiro grupo social e exerce papel fundamental em proporcionar um ambiente voltado para a aprendizagem da criança no início da vida. O principal integrante familiar que convive com o infante é determinante para seu desenvolvimento. Este papel corriqueiramente é da mãe pelo fato de, na maioria das vezes, exercer a função de amamentação. Os parentes são, também, um dos principais influentes na socialização e no comportamento da criança, destacando atitudes que julgam adequadas por meio de reforços positivos e punições para aquelas que julgam inadequadas (OLIVEIRA; ALMEIDA; VALENTINI, 2012).

BRINCAR TERAPÊUTICO

Há muitos anos o brincar terapêutico vem sendo estudado como ferramenta para o diagnóstico de doenças e caracterização

de dificuldades da criança. Na terapia ocupacional, comumente utiliza-se o brinquedo como recurso para atender a criança, chamar sua atenção, distraí-la ou motivá-la. Muitos componentes de desempenho podem ser trabalhados, nesta situação, como postura, concentração, coordenação motora, entre outros (REZENDE, 2008, p. 25).

Durante o brincar acontecem os primeiros processos de criação, nos quais as crianças constroem a história, o contexto e sujeitos que compõem sua narrativa. Nessa construção, podem acrescentar novas vivências imaginativas, idealizando uma nova realidade. Sendo assim, para o infante a partir de 2 anos de idade, as atividades lúdicas serão mais que uma recreação, será fonte de desenvolvimento (SANTANA et al., 2022). É importante a escolha de brinquedos que respeitem a faixa etária, as condições de saúde e as capacidades funcionais da criança. (SILVA et al., 2017).

A brincadeira é um dos aspectos mais relevantes da vida de uma criança e pode ser um dos instrumentos efetivos para controlar o estresse. Além disso, nesse momento, as crianças estimulam os sentidos, exercitam os músculos, coordenam a visão com o movimento, obtém domínio sobre os seus corpos, tomam decisões e, aos poucos, por meio de novos desafios vão adquirindo novas habilidades e refinando outras já adquiridas (WHALEY; WONG, 2003). A maturação motora é a transformação sucessiva do comportamento motor adquirido no decorrer da vida e influenciada pelas requisições da tarefa motora, pelas condições biológicas e contexto ambiental (GALLAHUE; OZMUN, 2005).

DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA E O BRINCAR

O brincar é essencial para a evolução e aprendizagem da criança, visto que proporciona novas possibilidades, expressões, comunicação e relacionamento com o ambiente sociocultural, fazendo com que a criança se aproprie do seu corpo, relacionando-se cada vez melhor com o mundo e constituindo o seu existir. No decorrer do desenvolvimento, as crianças formam novas e diferentes competências, em contexto de rotinas sociais, que vão permiti-la entender e atuar de forma ampla no mundo (QUEIROZ; MACIEL; BRANCO, 2006).

Os estímulos dos brinquedos e brincadeiras desempenham uma função importante no desenvolvimento psicomotor. Ao identificar e processar as informações do mundo externo ocorre conhecimento corporal, exercita e refina as habilidades de preensão, coordenação óculo-manual, coordenação motora global e noções espaço-temporais (EMMEL; FIGUEREDO, 2011).

O brincar possibilita à criança uma aprendizagem mais prazerosa de forma natural e um momento de comunicação consigo mesma por meio da sua realidade e imaginação. Durante as brincadeiras, pode-se utilizar a imaginação, criar fantasias, personagens, desenhos, gerando assim sua interação. (CAROLINE, 2021).

Crianças que brincam atestam ter uma boa saúde emocional, desenvolvem a criatividade, controle de impulsos, da expressão de vontades e medos. Sendo, portanto, a brincadeira um meio natural de manifestação dos sentimentos e fantasias. O simbólico é usado como forma de representação do mundo interno e

inconsciente, por essa experiência, vão se obter o equilíbrio entre o mundo da fantasia e a realidade, possibilitando à criança fazer uma correlação entre o que é real e o que é brincadeira (SANTOS, 2017). E por meio do brincar a criança simula os papéis ocupacionais que serão assumidos na vida adulta (ELIAS, 2013).

FAMÍLIA E BRINCAR

PARTICIPAÇÃO E PERCEPÇÕES DA FAMÍLIA SOBRE

O BRINCAR

O ato lúdico é uma ferramenta importante para estimular o desenvolvimento e aprendizado infantil, é um recurso valioso na clínica pediátrica, entretanto, há barreiras que comprometem a efetivação do brincar. Algumas crianças são pouco estimuladas, principalmente pela falta de conhecimento dos pais, que apresentam compreensão limitada em relação à importância do brincar livre (SANTOS et al., 2010; DELLA BARBA; SILVA; SANTANA et al., 2017).

Souza, Figueiredo e Silva (2017) buscaram compreender a percepção sobre a contribuição do brincar no desenvolvimento infantil, dos pais de crianças com deficiência física entre 0 e 12 anos, acompanhadas no serviço de terapia ocupacional, na Clínica Escola de Terapia Ocupacional da Universidade Federal da Paraíba. Para os genitores entrevistados o ato lúdico proporciona benefícios para os filhos, auxilia no ganho de habilidades e otimizam os resultados durante o tratamento, no entanto, as

atividades lúdicas são limitadas devido às dificuldades sensoriais, motoras, cognitivas e ambientais da criança.

Na pesquisa realizada em 2012, em uma unidade de internação pediátrica do Hospital Universitário do Rio Grande do Sul, foram evidenciadas as percepções dos pais de crianças que se encontram hospitalizadas, sobre o uso dos recursos lúdicos no processo de hospitalização. Segundo os relatos, o brincar possibilita que o infante crie seu próprio mundo de fantasia, assume o papel de médicos, enfermeiros e reproduza os procedimentos dolorosos. Tal fato, permite a expressão dos sentimentos e o diálogo com os adultos, proporcionando que o período de internação se torne menos desagradável (ROCKEMBACH et al., 2017).

Além de se configurar como base, a família tem papel fundamental como promotora na vinculação da criança com o ambiente, tendo como objetivo a estimulação de maneira orgânica. No cotidiano de um ambiente familiar existem inúmeras possibilidades para instigar o pensamento das crianças e para torná-las confiantes. Um adulto disposto a dividir suas vivências de maneira amigável, dando atenção e demonstrando interesse no que é abordado pela criança é capaz de elevar o seu autoconceito (SCALHA et al., 2010).

Na literatura científica, existem instrumentos que mensuram a qualidade da relação entre pais e filhos. Dentre eles destaca-se o PICCOLO (Parenting Interactions with Children: Checklist of Observations Linked to Outcomes), que identifica comportamentos parentais que apoiam o desenvolvimento na primeira infância. Essa medida observacional avalia 3 principais áreas, que

são a linguagem, o social e o cognitivo. É formado por 29 itens, abrangendo 4 categorias: o afeto, a responsividade, o incentivo e o ensino (VILASECA et al., 2019).

Além disso, a avaliação do ambiente e das oportunidades disponíveis para auxiliar no desenvolvimento motor pode ser realizada com a AHEMD (Affordances in the Home Environment for Motor Development – Infant Scale). Essa escala constitui-se por uma parte inicial sobre a criança e a família e outros 3 componentes: espaço físico do domicílio, variedades de estimulação e brinquedos (CAÇOLA et al., 2015).

IMPORTÂNCIA DA PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA NO BRINCAR PARA

O DESENVOLVIMENTO

INFANTIL

Incontestavelmente, a família é o primeiro vínculo de socialização da criança, em que a mesma receberá o fundamento do que concerne a vida social, quer seja em um núcleo moderno de acordo com a sociedade ou constituída de demais possibilidades, como a escola, local de trabalho dos pais, clube, igreja, comunidade, dentre outros (SILVA et al., 2008; MARTINS; SZYMANSKI, 2006).

A transmissão de conhecimento que ocorre nas relações interpessoais, passadas entre as gerações, constitui o que pode ser nomeado de práticas educativas. Essas práticas estimuladoras, fornecidas pela família, resultam na brincadeira, nos jogos e nos diversos brinquedos que podem ajudar os adultos na educação da criança (MARTINS; SZYMANSKI, 2006).

O livre brincar proporciona aprendizagem e desenvolvimento, sendo o ato lúdico explorado como recurso educativo, direcionado não somente às crianças, mas também aos familiares. Intensifica-se a necessidade de propiciar ao infante experiências de construção, baseadas no brincar, sendo a família parte importante para que a brincadeira se desenvolva de modo natural na criança, nas atividades corriqueiras, como nas tarefas de banhar-se, alimentar-se e nas atividades domésticas (FREITAS; NUNES; MACHADO, 2019).

BARREIRAS DAS FAMÍLIAS EM PARTICIPAR DO BRINCAR

O brincar é um elemento fundamental para o desenvolvimento infantil, contudo, são múltiplas as barreiras que comprometem e inviabilizam o ato lúdico. As limitações no brincar não são consequências apenas dos problemas físicos, mas também dos recursos ambientais, do acesso aos brinquedos, dificuldades no manuseio, na relação interpessoal empobrecida e do tipo de estimulação oferecida às crianças (SANTOS et al., 2010; ZAGUINI et al., 2011).

O impacto do ambiente físico, psíquico e social tem suma importância sobre o desenvolvimento da criança. O amadurecimento emocional infantil é afetado pela falta de afeto de seus genitores, já a maturação motora pode sofrer danos ou atrasos em decorrência de um ambiente inóspito, assim como, o desenvolvimento cognitivo, o psíquico e o social podem ser prejudicados pela indevida estimulação motora. (SCALHA et al., 2010).

A privação do brincar livre e espontâneo restringe a criança de vivenciar experiências sensoriais, motoras e sociais, comprometendo seu desenvolvimento. As experiências lúdicas são comprometidas quando os familiares não dispõem de tempo para brincar, banalizam as atividades lúdicas, não toleram barulhos e movimentos desordenados durante as brincadeiras ou priorizam apenas a educação formal e deixam as atividades lúdicas em segundo plano (FERLAND, 2006; SOUZA; FIGUEIREDO; SILVA, 2017).

No decorrer dos anos, ocorreram mudanças arquitetônicas, sociais e culturais que ocasionaram diminuição do espaço físico dos lares, as brincadeiras se tornam solitárias, houve um aumento de elementos lúdicos disponibilizados pelos cuidadores e as telas começaram a fazer parte da rotina da família, disseminando valores, culminando em transformações da estrutura familiar e alterações no brincar. Os brinquedos e brincadeiras tradicionais, já não correspondem ao interesse da infância moderna, a tecnologia tomou espaço e se tornou referência em várias áreas do cotidiano, inclusive na recreação (CORDAZZO; VIEIRA, 2007; FREITAS; NUNES; MACHADO, 2019).

O uso desregrado dos recursos tecnológicos causa o embotamento afetivo, despersonalização infantil, ansiedade e depressão, impedindo o pleno desenvolvimento e amadurecimento afetivo, físico, cognitivo e social, prejudicando o desenvolvimento das experiências sinestésicas (audição, visão, paladar, olfato e tato), as quais as crianças vivenciam ao brincar no mundo real (DE PAIVA; COSTA, 2015). O uso intenso das mídias pelos infantes também está associado a déficits na linguagem, fala, alterações

comportamentais, dificuldades na autorregulação, sedentarismo e obesidade (ALMEIDA et al., 2022).

A vinculação do brincar com o consumismo motiva conflitos entre familiares, principalmente quando os pais não possuem condições financeiras para adquirir o brinquedo desejado. O baixo nível socioeconômico é fator de risco que frequentemente pode culminar em déficits para a resolução de problemas, linguagem, memória e socialização. A privação do brincar é justificada em algumas situações pela falta de brinquedo, devido às condições financeiras precárias (FREITAS, NUNES; MACHADO, 2019; SCALHA et al., 2010).

É fundamental que o ato lúdico seja estimulado pelos pais, professores e profissionais de saúde, contudo, ainda existem diversas barreiras que dificultam sua efetivação, portanto, é importante desenvolver programas ou estratégias que instruam os pais e cuidadores a estimularem as atividades lúdicas no ambiente domiciliar, no intuito de ampliar o repertório do brincar de seus filhos para promover o seu desenvolvimento, autonomia e a participação social (SOUZA; FIGUEIREDO; SILVA, 2017; SANTOS et al., 2010).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na busca literária encontramos estudos que abordam o tema do brincar correlacionados ao desenvolvimento infantil, a percepção dos pais de crianças com transtornos ou em ambiente hospitalar, mas são escassos os estudos que capacitam os profissionais

e pais a promoverem o brincar e compreenderem os tipos de brinquedos adequados para cada faixa etária.

Além disso, os pais compreendem o brincar como benéfico para as crianças e consideram positivo o brincar terapêutico. Entretanto, há pais que desconhecem os benefícios do brincar e os associam apenas ao entretenimento infantil. Visto que a família tem um papel importante na promoção do brincar, se faz necessário desenvolver programas ou estratégias que empoderem os pais sobre a importância do ato lúdico e os instrua a promovê-lo no ambiente domiciliar.

Por isso, é essencial que os terapeutas estejam atentos a orientar as famílias sobre a importância do brincar para o desenvolvimento global, enfatizando o lúdico como grande potencializador também da criação de vínculo e afeto entre criança e família.

REFERÊNCIAS

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A ABORDAGEM CENTRADA NA

FAMÍLIA NO CONTEXTO DA INFÂNCIA

Caroline Rodrigues da Silva

Joyce Nogueira Santana

Aline Perboni Zanotto

INTRODUÇÃO

Há algumas décadas uma mudança teórica vem sendo consolidada nos cuidados terapêuticos da criança, na qual a família é reconhecida como central na intervenção, bem como, a criança é vista no seu contexto familiar, além de ser oferecido amparo aos membros da família para o melhor desempenho no seu papel de cuidadores. Tal fundamentação teórica é descrita na literatura como “Cuidado Centrado na Família" (CCF) (ROSENBAUM et al., 1998).

Os riscos para o desenvolvimento são divididos entre riscos biológicos e ambientais. Fatores que causam danos ao organismo da criança são denominados de riscos biológicos, e em geral podem ser causados por eventos pré, peri e pós-natais (LEJARRAGA, 2002). Já os fatores de riscos ambientais são definidos como aqueles resultantes principalmente das vivências familiares, ambientais e da sociedade na qual a criança está incluída (GRAMINHA, 2013).

É dentro da família que a maioria das crianças vivenciam as primeiras situações de aprendizagem, assimilação de comportamentos, normas e valores. Portanto, é perceptível que o funcionamento da família interfere diretamente no fundamento das interações da criança com o mundo, ou seja, se a família não for funcional, tal relação muito provavelmente será prejudicada (COLNAGO, 1991). Deste modo, a família é contemplada como o primeiro sistema social, no qual é estabelecido um padrão de atividades, papéis e relações interpessoais vivenciadas pela criança e pelo adolescente (SIGOLO, 2004).

Tendo em vista a influência do contexto familiar para o desenvolvimento infantil, este capítulo tem por objetivo descrever a abordagem centrada na família no contexto da infância. Para isso, iremos apresentar o modelo e a participação da família, assim como, as condições dos aspectos ambientais e raciocínio clínico neste modelo.

O MODELO CENTRADO NA FAMÍLIA

Historicamente, a construção da conduta centrada na família surgiu em ambiente hospitalar pediátrico de instituições americanas, no final da década de 60, direcionada para a Intervenção Precoce (IP). Com o aprimoramento dos estudos sobre IP e com base nos programas do modelo transacional de Sameroff e do modelo ecológico de Bronfenbrenner foram se consolidando as práticas do CCF com a filosofia do cuidado na tríade: sujeito, ambiente e contexto familiar (PINTO et al., 2010).

A CCF baseia-se no modelo humanizado, com objetivo de envolver e capacitar famílias para a autonomia no cuidado. Considerando que os pais conhecem e sabem das necessidades da criança, estes participam de forma ativa durante o tratamento, definindo as prioridades e objetivos junto com os profissionais. Os pilares da prática envolvem a escuta ativa, empatia e respeito, permitindo práticas participativas da família ao considerar todo o contexto de rotina, composição e organização familiar (IFF, 2020).

A importância da influência dos pais no processo de desenvolvimento se justifica pelo fato do vínculo estabelecer uma relação de afeto, o que enriquece o processo do desenvolvimento, proporcionando e fortalecendo conexões neurais importantes para o aprendizado, que está diretamente relacionado às situações do dia a dia em que a criança participa ativamente. Mesmo que a família tenha um tempo limitado, devido às atividades laborais, ainda possuem oportunidades de oferecer estímulos. Desta forma, os profissionais atuam, nos contextos biopsicossocial da criança, apoiando e ajudando os pais no desenvolvimento de seus filhos a partir da sua realidade (FRANCO et al., 2016).

Sendo o núcleo familiar (biológico ou adotivo) de extrema importância, é essencial a participação dos pais no desenvolvimento da criança típica ou atípica, estimulando o funcionamento motor, sensorial, cognitivo e afetivo, no sentido de proporcionar experiências emocionais, inserção no meio e na própria percepção da criança no mundo. Compreender a importância da participação familiar, é ainda mais necessário quando se envolve um diagnóstico de transtorno do desenvolvimento, pois no modelo médico, compreende-se que, um diagnóstico necessita de tratamento e por consequência terá uma cura, o que resulta em um risco de exclusão desta criança, pois assim, subentende que somente os cuidados ofertados nas terapias são eficientes, delegando todas as funções do cuidado aos profissionais (FRANCO, 2016).

Em um Modelo CCF, além de acolher e orientar a extensão do diagnóstico que necessitará de terapias constantes nas diversas áreas da vida, cabe ao profissional proporcionar além do conhecimento científico, o acesso dessas famílias, de modo que possam

se sentir acolhidas e motivadas para a participação no tratamento, construindo junto com a equipe em uma intervenção ativa e baseada nos pontos fortes da família e da criança. Desta forma, como promotora do desenvolvimento, a família deverá receber da equipe as informações necessárias sobre a condição clínica da criança, recursos e estratégias para o cuidado, orientação e treinos envolvendo materiais, equipamentos e apoio emocional. Isto compreende a rede de apoio social, com foco no fortalecimento e capacitação dos pais (PIMENTEL, 2005).

CONTEXTO AMBIENTAL NO DESENVOLVIMENTO

O vínculo afetivo familiar e o ambiente que a criança está inserida, segundo a abordagem epigenética, pode influenciar na modificação da expressão dos genes das crianças pelas experiências na infância, alterando as respostas comportamentais (CECHETTO et al., 2021). Nesta perspectiva, as vivências nos primeiros anos de vida são de extrema importância para desenvolvimento. Passos (2019, p. 31 apud Malik, 2013), considera que “o desenvolvimento infantil inclui dimensões interdependentes que abrangem o social, o emocional, o cognitivo, o psicomotor e padrões de comportamento e nutrição”.

As experiências na primeira infância se baseiam no contexto ambiental e familiar em que a criança está inserida: região, bairro e moradia, assim como, os contextos culturais e de acessos da família, também são importantes nos primeiros anos. Estudos mostram que a prematuridade, estresse na gestação e

vulnerabilidade social afetam diretamente o desenvolvimento de uma criança, ocasionando problemas de saúde e sociais (SANTOS, 2020).

Desta forma, quando a criança está em contato com o ambiente, vivencia experiências únicas e desafiadoras, que irão exigir respostas e ajustes. Em função disso, a oferta de um ambiente natural, rico em estímulos motores e sensoriais ampliam o repertório da criança, sendo ela típica ou com algum tipo de transtorno do desenvolvimento (GRAMINHA, 2013).

As crianças com déficits necessitam, na intervenção precoce, de ambientes com mais oportunidades - affordances, para o seu desenvolvimento. Ao pensar em ambiente, deve-se considerar o ambiente natural, na intervenção que inclui o contexto da casa e comunidade em que a criança participa diariamente. A intervenção realizada por profissionais, neste contexto, envolve a utilização dos recursos disponíveis e participação dos responsáveis (SILVA; BRAGA, 2021).

Affordances refere-se às oportunidades oferecidas no ambiente, como a casa e recursos que contemplam a variedade de brinquedos, que estimulam o aprendizado e as habilidades da criança ao ser exposta para explorar o meio e que pode ser um facilitador ou barreira no desenvolvimento. Assim, é um termo utilizado para compreender a importância do ambiente no desenvolvimento infantil (SILVA; BRAGA. 2021).

Para analisar esses conceitos, devem ser utilizados testes e avaliações direcionados para a família e o ambiente, no qual a criança se desenvolve (casa, escola, lazer) e a forma que a criança

explora e usa as funções motoras e cognitivas de acordo com a faixa etária. Desta forma, o profissional poderá compreender os obstáculos no desenvolvimento a partir de uma visão ampla, favorecendo a oferta de recursos e estratégias adequadas na intervenção (GRAMINHA, 2013).

POR QUE USAR O MODELO DE INTERVENÇÃO CENTRADO NA FAMÍLIA?

Os serviços voltados para a família são constituídos por uma estrutura a qual está fundamentada na visão holística do ser humano, ou seja, que leva em consideração as suas necessidades em corpo, mente e espírito e as suas interações com o mundo, visando promover a saúde e o bem-estar das famílias (MANALO et al., 2000).

Garantir o bem-estar de todos na família é um elemento fundamental para o desenvolvimento saudável da criança (MANALO et al., 2000). É imprescindível que os pais tenham acesso às informações que possibilitem o desenvolvimento de habilidades que os tornem capazes de administrar as suas vidas com a presença de crianças na sua rotina (KING et al., 2002; KING et al., 2006). Para isto, a proposta de saúde oferecida pelo modelo centrado na família visa compreender que a saúde dos pais é um componente fundamental para o desenvolvimento da criança (BREHAUT et al., 2011).

Desta forma, os serviços de assistência às famílias auxiliam

na diminuição da carga parental, possibilitando que os pais tenham uma melhor capacidade de cuidar, de se relacionar e de se envolver nas atividades que seus filhos participam. Tal comportamento irá proporcionar consequentemente melhores resultados na saúde tanto das crianças, quanto dos pais e demais membros da família. Logo, os serviços de apoio às famílias devem ser equipados com ferramentas adequadas e pessoas capacitadas, as quais auxiliam os pais no desenvolvimento de suas competências parentais, ajudando-os no apoio e na educação de seus filhos (MANALO et al., 2000).

Além disso, os serviços que fornecem auxílio para as famílias, possuem um caráter preventivo para a saúde dos pais e cuidadores, uma vez que estão expostos a níveis elevados de estresse, inerentes aos cuidados de uma criança típica ou atípica, o que por consequência pode resultar em efeitos negativos na saúde (RAINA et al., 2004).

Estes aspectos evidenciam a importância do modelo de intervenção centrado na família, visto que fornece intervenções funcionais, com estratégias eficientes que permitem aprimorar as capacidades dos pais em obter recursos e conhecimento a respeito da condição dos seus filhos, bem como esclarecer os direitos de acesso a saúde e educação, além de desenvolver resiliência ao lidar com as diferentes situações as quais podem ser expostos (TRIVETTE et al., 2005).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O modelo centrado na família é uma abordagem que leva em consideração o bem-estar e as necessidades de cada membro da família, a carga parental, as atividades de vida diária da família, a participação e o envolvimento da criança em cada momento no núcleo familiar e no meio social em que está inserida.

Além disso, este modelo preza pelo estabelecimento de um vínculo de confiança e cooperação entre a equipe terapêutica, criança e demais membros da família. Promove o empoderamento parental por permitir a autonomia da família nas tomadas de decisões dentro do plano terapêutico, bem como na divisão das responsabilidades entre profissionais e membros da família.

Com base no que foi exposto, é possível observar que, por considerar amplamente os fatores mencionados, o modelo centrado na família é uma abordagem completa que beneficia todos os envolvidos, não só os membros da família, como também a equipe multiprofissional. Impacta positivamente o núcleo familiar, podendo levar à redução do estresse, ansiedade e de quadros depressivos. Além disso, pode produzir um aumento da satisfação em realizar o cuidado, uma vez que, permite que os pais/cuidadores tenham conhecimento sobre a situação de saúde da criança, melhorando assim os manejos necessários para exercerem o cuidado.

Para os profissionais da saúde, o modelo gera maior satisfação e autoconfiança no desempenho do seu trabalho. Isso porque esta abordagem intensifica o trabalho do profissional feito diretamente com a criança, as propostas terapêuticas são continuadas dentro de casa, o que potencializa o desenvolvimento e a permanência de habilidades importantes para o desenvolvimento

criança.

Apesar de o modelo centrado na família ser uma proposta de saúde que está em ascendência, ainda existem poucos estudos e ensaios clínicos randomizados que investigaram diretamente o tema, explorando a eficiência deste modelo nas rotinas das famílias, no bem-estar dos responsáveis e da crianças com desenvolvimento psicomotor atípico que estão inseridas nestas famílias.

Além disso, acredita-se que o modelo centrado na família apesar de não ser uma estratégia nova, ainda é pouco explorado nas intervenções clínicas dentro das instituições, dificultando a implementação completa, desta abordagem, nos serviços de saúde, sejam em instituições privadas ou mesmo públicas.

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AUTORES

Aline Gomes do Nascimento - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção

Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Aline Perboni Zanotto - Terapeuta Ocupacional, Orientadora do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção

Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Alyne Nayara de Melo Silva - Terapeuta ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção

Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Anny Flávia Almeida Silva - Fisioterapeuta, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Ariane Hidalgo - Pedagoga, Mestra, organizadora e prefaciadora da obra.

Ariela Del Vecchio da Fonseca Martins - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em

Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Bárbara Vicentini Petraglia - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento infantil e intervenção precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Bibiana da Silveira Santos - Fisioterapeuta, orientadora do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção

Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Bruna Stefanny Nascimento e Silva - Fisioterapeuta, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção

Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Caroline Rodrigues da Silva - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em nível de Especialização em

Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Évellin Joice de Oliveira Fernandes Barros - Terapeuta

Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em

Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Flaviana Alves Rodrigues - Terapeuta ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção

Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Francine Dias de Souza Espinoza - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Gabriela Aragão Muniz - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção

Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Jéssica Lorena Chaves Ribeiro Gomes - Terapeuta

Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em

Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Joyce Nogueira Santana - Fisioterapeuta, aluna do curso de Pós-graduação em nível de Especialização em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Julia Oliveira Lima - Terapeuta ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Juliana Anselmo Bassoli Gatto - Fonoaudióloga, especialista em Linguagem, aluna do curso de Pós-graduação Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Letícia Figueiredo Gazzinelli - Terapeuta ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Luana Kelly Mendonça Faria - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento infantil e intervenção precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Marcela P. C. de Andrade Oliveira - Terapeuta ocupacional, Doutora em Saúde da Criança e do Adolescente, orientadora do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Natália Francielle de Assis Rodrigues - Terapeuta ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Natalie Pereira - Fonoaudióloga, orientadora do curso de Pósgraduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Priscilla Oliveira Lima - Fisioterapeuta, aluna do curso de Pósgraduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Quézia Rodrigues - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Regiane de Paula Vidal - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento infantil e intervenção precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Régis Nepomuceno Peixoto - Terapeuta Ocupacional, Mestre, organizador da obra.

Renata de Cássia Silva Ribeiro Botelho - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento infantil e intervenção precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Renata Tomaz de Oliveira - Terapeuta Ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento infantil e intervenção precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Stéphani de Pol - Fisioterapeuta, Mestra, organizadora da obra.

Vanessa Cristina Alves dos Santos Machado - Psicóloga, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento infantil e intervenção precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Vanessa Silva - Fisioterapeuta, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

Yngrid Tuane Rocha - Terapeuta ocupacional, aluna do curso de Pós-graduação em Desenvolvimento Infantil e Intervenção Precoce: com ênfase no modelo centrado na família.

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