Revista Educação Integral Número 2

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Apoio:

Volume 1 • Número 2

Setembro 2017 ISSN 2525-4294


Em breve Licenciatura em Artes Visuais e Tecnologia em RH

- PEDAGOGIA - ADMINISTRAÇÃO - TECNOLOGIA EM LOGÍSTICA - TECNOLOGIA EM RECURSOS HUMANOS (RH) - TECNOLOGIA EM MARKETING - TECNOLOGIA EM GESTÃO FINANCEIRA - TECNOLOGIA EM COMÉRCIO EXTERIOR - TECNOLOGIA EM REDES DE COMPUTADORES - TECNOLOGIA EM SISTEMAS PARA INTERNET


Setembro 2017 ISSN 2525-4294

Volume 1 • Número 2

Educação Integral: Reflexões sobre educação na perspectiva da integralidade humana INEQ / FAEP Volume 1 – Número 2 ( Setembro de 2017) Apoio:

Periodicidade: Trimestral

CARTA AO LEITOR Ao longo dos últimos anos, o INEQ – Instituto Nacional de Educação e Qualificação Profissional – vem consolidando-se como uma instituição precursora do incentivo à educação no Brasil. Não somente na área da edu-

Os conceitos contidos nesta revista são de inteira reponsabilidade dos autores. É proibida a reprodução total ou parcial desta obra sem prévia autorização dos autores.

cação, mas agora atuante em áreas como tecnologia, saúde e no setor corporativo, o INEQ mostra sua capacidade de levar conhecimento a diversos públicos interessados no aprendizado como um todo. Comemoramos 10 anos de existência como muito louvor, orgulho e perspectivas de crescimento e inovação. Com parcerias com diversas outras instituições de

CONSELHO EDITORIAL Profº Dr. Claudinei Aparecido da Costa; Profº Ms. Clemente Ramos dos Santos;

ensino superior, levamos cursos de Pós-graduação e se-

Profº Dra. Vania Aparecida da Costa

gunda licenciatura a diversos polos na grande São Paulo.

Profª Ms. Ana Maria Gentil.

Mas para mostrar nossa dedicação com o saber, podemos apresentar os resultados da FAEP – Faculdade de Educação Paulistana – com o curso de licenciatura em Pedagogia e com o curso de licenciatura em Artes Visuais aprovado pelo MEC – Ministério da Educação – aguardando apenas publicação no Diário Oficial da União (D.O.U.).

EDITOR CHEFE Profº Dr. Claudinei Aparecido da Costa; REVISÃO E NORMATIZAÇÃO DE TEXTOS

Além disso, temos também a FACITEP – Faculda-

Anderson Silva Costa

de de Ciências e Tecnologia Paulistana – com os cursos de

Marina Pereira Borges

Administração e Tecnologia em Logística já com turmas em andamento, e com o curso de Tecnologia em Recursos Humanos também aguardando apenas publicação no D.O.U. Recentemente, juntando-se ao grupo, a Faculdade de Tecnologia Alpha Channel chega para agregar conheci-

Dayane Tavares Galego de Oliveira CAPA E PROJETO GRÁFICO Francisco de Assis Vasconcelos Miranda

mento e versatilidade aos nossos alunos na diversificação por cursos que abrangem a área tecnológica com graduação em Design Gráfico, Técnico em Computação Gráfica, além de outros cursos de Pós-graduação e cursos específicos e direcionados ao mercado de trabalho. Esta edição da revista Educação Integral mostra

Fotografia: Natália Rodrigues INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO e QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL – INEQ

nossa força na publicação de artigos acadêmicos e na va-

Rua Santa Ângela, 252, Vila Palmeiras,

lorização de nosso corpo docente e discente na elabora-

Freguesia do Ó, São Paulo – SP - Cep: 02727-000

ção de estudos e pesquisas educacionais. Agradecemos

Tel.: (11) 3218-0088

a participação de todos os envolvidos nessa nova publicação e temos certeza de que muitas outras virão para enriquecer a educação em São Paulo e no Brasil.

e-mail: educacaointegral@ineq.com.br ISSN 2525-4294

Prof. Dr. Claudinei Aparecido da Costa Diretor-geral INEQ - Educação integral

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APRESENTAÇÃO

EDUCAÇÃO INTEGRAL

Em muitas escolas, colégios e universidades, perdeu-se a dedicação pelo estudo pedagógico e pelo aperfeiçoamento profissional e acadêmico dos assuntos realmente discutidos em sala de aula. É nesse sentido que o grupo INEQ – Instituto Nacional de Educação e Qualificação Profissional – busca resgatar esses conceitos e ideais, na fomentação pelo conhecimento e pela pesquisa. A banalização dos assuntos corriqueiros e cotidianos sobrepõem-se a respeito dos assuntos educacionais, que outrora eram mais conceituais no meio acadêmico. O tempo é um fator crucial na divisão das tarefas institucionais, mas com tantas informações e tarefas, a simples discussão pedagógica secundariza-se diante de assuntos administrativos e até mesmo pessoais. Nesse sentido, pretendemos resgatar essa discussão com os artigos publicados nesta edição da revista Educação Integral, para que um artigo acadêmico não fique apenas no papel ou fazendo volume em uma pasta de arquivo no computador ou smartphone. Uma discussão no âmbito educacional não pode ficar restrita a apenas uma publicação ou a ideias de professores e acadêmicos. As publicação brasileiras em

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INEQ - Educação integral

revistas científicas ainda estão longe das menções feitas em países europeus, por exemplo. Somente redefinindo essa cultura que conseguiremos fazer com que a nação brasileira possa sobressair-se e destacar-se na educação, melhorando, consequentemente, nosso índice na UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – que, infelizmente, está entre os mais baixos no mundo. Não basta apenas a leitura de livros ou publicações afins. Para que a Educação possa progredir e avançar, é preciso uma discussão ampla e racional dos temas abordados nas instituições de ensino superior em geral. O próprio conceito de “universidade”, remete-se às antigas menções gregas que significavam “espaço para debates”. O registro é apenas uma mera formalidade daquilo que se discute em sala de aula e se aplica, na prática, nas realizações pedagógicas e educacionais como um todo. O apreço dos artigos aqui publicados vão além de sua simples leitura. A reflexão e a discussão pedagógica é que, de fato, enriquecerão os temas abordados. O grupo INEQ apoia essas iniciativas e incentiva, não somente por intermédio da revista Educação Integral, mas também pelos conteúdos apresentados nas salas de aula dos diversos cursos que proporcionamos, fazendo com que nossos alunos sejam críticos, observadores e reflexivos quanto aos diferentes temas que surgem na Educação ao longo do tempo. Conselho Editorial


SUMÁRIO

06 14

A DISLEXIA NA ESCOLA: PROMOVENDO UMA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA – Cíntia Aparecida da Dalto Souza

AS CONTRIBUIÇÕES DE VYGOTSKY ACERCA DO DESENVOLVIMENTO DA LINGUAGEM DAS CRIANÇAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL – Cristina Antunes Tavares Ferreira

26

EDUCAÇÃO INCLUSIVA: DIFÍCIL, MAS POSSÍVEL!

32

UMA REFLEXÃO SOBRE O PERCURSO PARA A RESSIGNIFICAÇÃO: O CURRÍCULO ESCOLAR BRASILEIRO

35

A IMPORTÂNCIA DE TRABALHAR AS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

43

A PERCEPÇÃO DA PRÁTICA AVALIATIVA NO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO

48

ARTE E MATEMÁTICA NO ENSINO FUNDAMENTAL: UMA INTER-RELAÇÃO POSSÍVEL E NECESSÁRIA

59

– Izabel Cristina Ferreira dos Santos Alves

– Katia Regina Vinhas de Morais

– Marlene Anastácio Sales

– Professor: Vagnum Dias da Silva

– Esther Maria Freixedelo Martins

1º FESTIVAL DE TEATRO DO COLUNI/UFF: EXPERIÊNCIAS PEDAGÓGICAS AO ENCONTRO DA CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO INTEGRAL. – NASCIMENTO, Caio Cesar Silva

INEQ - Educação integral

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A dislexia na escola: promovendo uma aprendizagem significativa

Cíntia Aparecida da Dalto Souza 1

RESUMO

cial aspects that involve the notion of failure and

school success in society current.

A presente pesquisa discorre sobre a ques-

tão da dislexia, que é conhecida por se tratar de

The main objective of this work is the contribu-

um problema na linguagem, de ordem orgânica e

tion that school attributes the dyslexia once this

que predispõe dificuldades na vivência social, no

process causes consequences that they reflect in

comportamento e nas emoções, interferindo no

the marginalization of the dyslexic pupil. However,

fracasso e sucesso escolar..

the pedagogical strategies that are made for the

O principal objetivo deste trabalho é discutir o peso

accompaniment of the dyslexic one in school need

e a interferência da dislexia em âmbito escolar,

to be improved, not only aiming at the shelter of

uma vez que esse processo acarreta consequên-

the dyslexic one for school, but mainly its cogniti-

cias que refletem na marginalização do aluno dis-

ve and partner-affective development.

léxico. Entretanto, as estratégias pedagógicas que são utilizadas para o acompanhamento do aluno

WORD-KEY: Dyslexia. Development. Professor.

disléxico na escola precisam ser aprimoradas, vi-

School.

sando não só o acolhimento do mesmo pela escola, mas, principalmente, seu desenvolvimento

1. INTRODUÇÃO

cognitivo e socioafetivo.

Como identificar os alunos que apresen-

tam dislexia nas séries iniciais do Ensino FundaPALAVRAS-CHAVE: Dislexia. Desenvolvimento.

mental? Esta foi a pergunta que a pesquisa procu-

Professor. Escola

rou responder. Questão esta que teve sua origem no se deparar com um aluno que demora em co-

6

ABSTRACT

piar as palavras da lousa, troca as letras na hora de

The present research discourses on the

escrever, não memoriza informações que acabou

question of the dyslexia. The Dyslexia is one bewil-

de ouvir e, nas redações apresenta um vocabulário

ders of language with organic basis, being able to

pobre, normalmente se distrai com facilidade, seu

preset to the carrier diverse problems of social,

desempenho nas avaliações é sempre abaixo do

behavioural and emotional order, in view of the so-

esperado, seus cadernos e trabalhos estão sem-

1 - Graduada em Pedagogia pelo Centro Universitário Sant’ Anna, pós-graduada em Letramento e Gestão Escolar pela Faculdade Campos Elísios. Diretora de escola na Prefeitura Municipal de São Paulo. Email: cintia_dalto@hotmail.com

INEQ - Educação integral


pre desorganizados. Para qualquer Professor este

fazer um encaminhamento clínico da criança e

aluno seria estigmatizado como desinteressado

uma vez feito o diagnóstico do quadro, é necessá-

ou preguiçoso, no entanto nada tem a ver com pre-

rio dedicação total ao aluno em sala de aula e no

guiça ou relaxo, mas sim, como é rotina, este dis-

decorrer do tratamento, o qual envolve em partes

cente apresenta alguns sintomas característicos

iguais a escola, a família e profissionais da saúde.

de dislexia.

Quanto antes a criança disléxica for devidamente

Já na pré-escola, a criança começa de-

alfabetizada e acompanhada (médica e pedagogi-

monstrar suas dificuldades. Para a criança disléxi-

camente), mais cedo aprenderá a lidar com suas

ca é muito difícil decorar músicas infantis, realizar

“limitações” e, assim, terá sucesso em seus estu-

a amarração dos cadarços, tirar e colocar sapatos,

dos e, por conseguinte, em sua vida.

vestir roupa e abotoá-las, algo simples tornar-se

uma tarefa muito complexa.

diagnóstico e tratamento precoces podem trans-

Também são demonstrados alguns proble-

formar um disléxico num profissional brilhante na

mas de memória. Outro problema agravante é a

fase adulta. Afinal, a dislexia é uma dificuldade que

dimensão temporal, pois o disléxico confunde fre-

pode ser vencida com tratamento. O diagnóstico

quentemente o hoje e oamanhã; o mesmo se ob-

de dislexia não é simples de ser realizado, exige

serva em relação à lateralidade porque esquerda,

competência médica e pedagógica, dedicação ,

direita, para cima e para baixo também são obje-

estudo e paciência.

A intenção deste trabalho foi mostrar que

tos de confusão. Também apresenta dificuldades com situações sequenciais, pois parece nunca

2. DEFININDO A DISLEXIA

saber em qual dia, mês ou ano está. Além disso,

ao falar é hesitante, muitas vezes se perde no

ma, a definição do mesmo para que se possa fazer

discurso, enrola-se e não consegue se expressar

uma abordagem de maneira mais profunda. Assim,

claramente. Desta forma, o trabalho se justifica ao

a resolução tornar-se-á mais fácil. Segue abaixo as

buscar em renomados pesquisadores, uma forma

definições mais aceitavam e que se comprovam

de explicitar tais comportamentos, bem como in-

com a práxis. Entretanto, antes das definições é

tervir de maneira adequada no cotidiano escolar.

interessante conhecer a etimologia da palavra dis-

Saber reconhecer que um aluno(a) apre-

lexia: DIS = distúrbio ou dificuldade; LEXIA = do la-

senta este distúrbio, facilita o trabalho do Profes-

tim “leitura” e/ou do grego “linguagem”. Assim, DIS-

sor, podendo este ajudá-lo de forma adequada e,

LEXIA = distúrbio de linguagem (LANHEZ e NICO,

assim, integrá-lo ao grupo de aprendizagem. Desta

2002).

forma, o objetivo que a pesquisa buscou alcançar

foi o de compreender quais as dificuldades que

do distúrbio feito aqui é somente para facilitar a

uma criança com dislexia apresenta. Este trabalho

identificação do mesmoafim de que o auxílio aos

também dará importância no diagnóstico da disle-

disléxicos possa ocorrer de maneira mais adequa-

xia em sala de aula,visando integrar o discente ao

da possível. Também é importante enfatizar que

restante da turma, pois a criança com esse distúr-

existe dois tipos de dislexia: a de evolução e a ad-

bio tende a sentir-se inferior aos outros e com isso

quirida; a primeira, congênita e hereditária; segun-

procurar o isolamento.

da, advém como consequência de traumatismo

craniano, acidente vascular, derrame etc.

Os professores que se mantêm atentos e

espreitando os sintomas, desde o início podem

Primeiro, é necessário conhecer o proble-

É importante destacar que a conceituação

Para dislexia encontram-se várias definições, poINEQ - Educação integral

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rém a mais usada na atualidade é a da

Atualmente, as dificuldades de aprendiza-

Internacional Dyslexia Association – IDA, que diz:

gem encaminham à acepção de “crianças com

Dislexia é um dos muitos distúrbios de

deficiência”. Neste grupo estão inseridas crian-

aprendizagem. É trata-se especificamente

ças com distúrbio mental e/ou físico, bem como

da linguagem, de ordem legítima, formaliza-

crianças com dislexia. Em relação, a dislexia, a de-

do pela dificuldade de decodificação das

ficiência está centrada na educação, embora não

palavras basilares. Detecta um déficit no de-

se possam descartar as questões emocionais de-

senvolvimento fonológico. Estes obstáculos

correntes de um transtorno que permeie a vida so-

de decifrar palavras simples não são atin-

ciocultural do portador de dislexia, antes ou após

gidas em similitude a idade. Ainda que for

seu ingresso na vida escolar.

subjugado ao estudo tradicional, apropriada a cognição, ensejo sociocultural e não con-

3. PROGNÓSTICOS DA DISLEXIA.

ceber distúrbios de aprendizagem e sensoriais elementares, a criança fracassa no

Como em qualquer outro distúrbio, há na

desenvolvimento da linguagem. A dislexia é

dislexia uma combinação de sintomas, os quais

caracterizada por uma gama de dificuldade

podem variar de pessoa para pessoa, consideran-

com as distintas formas de linguagem, in-

do o ambiente e a idade nos quais a pessoa se

cluídas, com frequência, nos problemas de

encontra. É essencial respeitar o ritmo de apren-

leitura, e na habilidade para escrever e sole-

dizagem de cada um, principalmente porque se

trar. (BORBA e BRAGGIO, 2016, p.1).

tratando do discente disléxico, este pode se tornar um pouco tardio.

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No final do século XIX, na perspectiva da

O disléxico possui uma grande dificuldade

medicina, foram relatados os primeiros casos de

para associar a letra e o som. Em geral, tudo o

dislexia (FAGUNDES, 2002). Alguns profissionais

que se relaciona com a leitura é um sensível e mais

começaram a refletir o motivo de certas pessoas

difícil ao portador de dislexia. As letras podem ser

terem habilidades em diferentes atividades, com

escritas de maneira invertida, semelhante ao efeito

inteligência normal ou mesmo superiores e com

espelho. A supressão de algumas letras, a troca de

evolução gradativa em situações do seu cotidiano,

outras, de maneira confusa também são comuns.

não obtinham desenvolvimento normal quando

Acarretando vocabulário pobre e conhecimentos

iniciavam o processo de alfabetização.

prévios escassos para a idade/série no qual o es-

tudante se encontra.

É importante a compreensão de que as

crianças com dislexia acabam retardando a escri-

ta, a leitura, a lateralidade e do processo de apren-

ficuldades de aprendizagem como sintomas ou

dizagem. Seu empenho deve ser maior que dos

“fraturas” na metodologia de aprendizagem, ao

seus colegas para alcançar os mesmos resulta-

qual necessariamente estão em questão quatro

dos. É comum que a criança com dislexia demore

níveis: o organismo, o corpo, a inteligência e o de-

mais que a maioria das outras crianças para termi-

sejo. Para a autora, a gênese das dificuldades ou

nar sua lição. Uma tarefa simples como procurar

distúrbios de aprendizagem não está relacionado

um número na agenda de telefones, pode se tornar

somente a condição individual da criança, mas

complexa para uma criança ou adulto com disle-

também à estrutura familiar cuja a criança está in-

xia.

serida. As dificuldades de aprendizagem estariam

INEQ - Educação integral

Fernández (1991) também concebe as di-


relacionadas às seguintes causas:

aprendizagem, visando às necessidades individu-

1. Causas externas à estrutura familiar e indi-

ais e sociais de seus educandos. Desta forma, não

vidual: originariam o problema de aprendiza-

cabe ao Professor/Escola dispor todo o peso do

gem reativo, o qual afeta o aprender, mas não

fracasso escolar sobre os ombros dos chamados

aprisiona a inteligência e, geralmente, surge

alunos-‘problema’.

do confronto entre o aluno e a instituição;

2. Causas internas à estrutura familiar e in-

derando a organização do seu trabalho pedagógi-

dividual: originariam o problema considerado

co, ainda está longe de propiciar sucesso escolar

como sintoma e inibição, afetando a dinâmi-

e atingir os fins educacionais assegurados pela

ca de articulações necessárias entre organis-

Constituição Nacional, Lei de Diretrizes e Bases

mo, corpo, inteligência e desejo, causando o

(LDB) o Estatuto da Criança e do Adolescente

desejo inconsciente de não conhecer e, por-

(ECA), os quais apontam o direito à educação com

tanto, de não aprender;

igualdade e de qualidade para todos os alunos da

3. Modalidades de pensamento derivadas de

rede escolar, independente de suas capacidades

uma estrutura psicótica, as quais ocorrem

para a aprendizagem. Assim sendo, temos que:

Não obstante, a escola brasileira, consi-

em menor número de casos;

A escola não tem conseguido garantir a

4. Fatores de deficiência orgânica: em casos

apropriação significativa, crítica, criativa e

mais raros. (FERNÁNDEZ, 1991 p.67)

duradoura, por parte dos educandos, do conhecimento fundamental acumulado pela

Há de se notar que um diagnóstico com-

humanidade de tal forma que se pudesse

pleto da dislexia não envolve apenas a dificuldade

servir como instrumento de construção da

escolar, é necessário considerar fatores genéticos,

cidadania e de transformação da realidade

psicológicos e hereditários. Como também orgâni-

(VASCONCELLOS, 2000, p.11).

cos e ambientais. Uma boa estrutura familiar também colabora e muito para o bom desenvolvimen-

Ademais, há alguns grupos de estudantes

to do educando disléxico.

que são classificados como alunos ‘problema’, que segundo Elvira Souza Lima (2002, p. 158), “são

4. O PAPEL DA ESCOLA

aqueles que não se adaptam às regras e modelos infringidos pela educação formalizada, não conse-

A escola é um dos espaços mais multicul-

guem compreender seus paradigmas e transfor-

turais que existe. Nele as pessoas possuem fun-

má-los em novos conhecimentos”, sendo impeli-

ções e características distintas. Segundo La Rosa

dos a uma sucessão de fracassos que os afastam

(1998) o meio escolar deve promover oportuni-

do conhecimento. A grande maioria destes alunos

dades definidas para facilitar o desenvolvimento,

pertence ao contingente da população escolar

sem danos na convivência com o meio social ex-

mais desfavorecida economicamente, até então

trínseco. O maior objetivo da escola é a transmis-

“comprometidos” com o descaso e acomodação

são do saber,sendo que a aprendizagem deve ser

governamental em relação à falta de solução a es-

ativa e estimulante ( p. 32).

sas pendências do ensino (fracasso escolar, inclu-

Além disso, o êxito ou fracasso desta meto-

são efetiva dos alunos disléxicos etc.), resultando

dologia educativa dependerá da complementação

em índices alarmantes de repetências e evasão

do objetivo principal do educador, que é propiciar a

em nossas escolas.

INEQ - Educação integral

9


Atualmente a escola, tanto pública quanto

A sociedade desprezou tanto o trabalho do-

privada, encontra-se com elevada taxa de fracasso

cente, que infelizmente muitos passaram a

de aprendizagens, dispondo, muitas vezes, apenas

acreditar nisto e por consequência acabam

o estudante como único culpado de tal situação.

discriminado seus alunos-problema na mes-

Situação esta, principalmente, fruto de uma pro-

ma proporção e violência em que se sentem

posta de ensino/aprendizagem baseada exclusi-

discriminados

vamente na transmissão de conhecimentos, não

2000, p. 65)

socialmente.

(CAPOVILLA,

existindo preocupação com a verdadeira aprendizagem global da criança/adolescente e quase

sempre descolada da realidade existencial (social,

ser esclarecido pela maneira como os conteúdos

cultural e econômica) do discente.

e metodologias de ensino estão sendo aplicadas

no interior da sala de aula. São metodologias para

A cerca do fracasso escolar, segue as pala-

vras abaixo:

se aplicar conteúdos, que privilegia os métodos

Um país em que a distribuição do conheci-

receptivos e de transmissão do conhecimento

mento como fonte de poder social é feita

por meio do emprego de técnicas do ensino e que

privilegiando alguns e discriminando outros.

valorizam somente atividades de memorização e

Precisamos buscar soluções para que a es-

repetição. Tal processo deixa de lado situações

cola seja eficaz no sentido de promover o

específicas, como é o caso das crianças com dis-

conhecimento e, assim, vencer problemas

lexia, que precisam de atenção diferenciada, prin-

cruciais e crônicos de nosso sistema educa-

cipalmente quando tais casos (estudante com

cional: evasão escolar, aumento crescente

necessidades especiais) não possuem condição

de alunos com problemas de aprendizagem,

financeira satisfatória para buscar apoio de uma

formação precaríssima dos que conseguem

aprendizagem específica e de qualidade extraes-

concluir o ensino fundamental, desinteresse

colar. Estas características induzem ao fracasso

geral pelo trabalho escolar. (BOSSA, 2001, p.

escolar com consecutivas repetências e evasão

19).

escolar.

Esse fracasso escolar repercute no pro-

Urge a formação de docentes que pos-

cesso etéreo, pois se consolida na exclusão, na

suam conhecimento sobre como se determina a

desigualdade e na desqualificação do saber que o

aquisição da leitura e escrita na criança com ne-

educando traz para a classe. Supõe-se, então, um

cessidades diferenciadas, como é o caso dos dis-

indivíduo marginalizado, destituído de possibilida-

léxicos. Que para Vitor da Fonseca é quando:

des materiais e culturais confrontados pelo conhe-

A criança percebe que, ao mudar a posição

cimento escolar.

de cada letra ou pares de letras, consegue

Desta forma, nas escolas brasileiras o lap-

significados diferentes, ela apreende o princí-

so na aprendizagem acarreta certa ruína na for-

pio da combinatória, uma das aquisições que

mação teórica e prática dos docentes, na neces-

caracteriza o período das operações formais.

sidade de base emocional para se trabalhar com

Trata- se da relação entre o todo e as partes

os alunos e nas condições salariais que remetem

que o constituem: função de cada elemen-

ao sentimento de desvalorização do trabalho do

to gráfico determina o significado. ( 1995, p.

Pprofessor, fazendo pouco para transformar este

171)

contexto. Sendo que:

10

Este papel seletivo da escola também pode

INEQ - Educação integral


Dessa forma, dá-se ênfase que a Dislexia

É importante conscientizar a criança de

ocasiona um problema de linguagem e não uma

que a fala e a escrita são expressões diferentes da

deficiência cognitiva, costumando apresentar-

linguagem. A principal indicação atual para o tra-

-se em pessoas de nível intelectual normal e ser

tamento de crianças com dificuldades de lingua-

mais frequente em indivíduos de nível intelectual

gem escrita é intervir diretamente nas habilidades

superior, acarretando um problema de nível social

de leitura, associada a atividades relacionadas

como já referido.

ao processamento fonológico da linguagem. No

No entanto, a escola e os educadores

passado, as metodologias buscavam o estímulo

da classe devem estar preparados quanto à sua

de habilidades consideradas pré-requisitos para

importantíssima incumbência na educação e al-

aprender a ler, como percepção visual e de espaço,

fabetização do disléxico, bem como de outros

além de habilidades psicomotoras (PAIN, 1994).

educandos, tendo sempre uma práxis reflexiva de

ensino-aprendizagem para que não seja corres-

ção com crianças que não assimilam o conteúdo

ponsável pelos resultados obtidos na avaliação

dentro do tempo considerado suficiente para que

escolar deste educando.

as informações sejam organizadas de maneira

É fundamental a realização de avaliações

correta? As dificuldades encontradas na dislexia

diagnóstica, sempre que possível, para melhor

são muitas vezes imprevisiveis, em especial quan-

conhecer os discentes e suas dificuldades/capa-

do se considera a categoria de outras capacidades

cidades. A consequência desta avaliação deve-

de aprendizagem e a existência de um ensino ade-

rá ser sempre de verificação dos conhecimentos,

quado.

propiciando não só a troca de ideias e a constru-

ção de novos saberes entre educador e educando

um aspecto crítico para a compreensão do cará-

(FRANK, 2003); como também o modo do ajuste e

ter das dificuldades de leitura observadas. Muitas

o relacionar deste aluno com o ambiente escolar,

crianças correm o risco de fracassar na leitura de

pois este poderá desenvolver distúrbios de com-

acordo com as desvantagens ao nível da educa-

portamento como timidez, rebeldia, sentimento de

ção na primeira infância e das experiências na pré-

inferioridade e altamente destrutivo, já que é sem-

-escola. Assim, passam frequentar a escola sem a

pre responsabilizado por não conseguir aprender

aquisição de muitas capacidades linguísticas e de

como os demais da classe.

“pré-leitura” basilares, fundamentais para um de-

E de que forma podemos fazer a interven-

O relato de ensinamento do educando é

senvolvimento normal da leitura. Se o ensino não 5. PROMOVENDO UMA APRENDIZAGEM SIGNI-

for ajustado às competências que a criança não

FICATIVA

domina, ocorrerá falha na leitura.

A partir do momento que o professor se

São princípios básicos do trabalho em

depara com o diagnóstico de dislexia, o primeiro

linguagem e escrita com a criança: estimular a

passo é preparar aulas motivadoras e flexíveis. Al-

descoberta e a utilização da lógica para construir

guns métodos encontrados na obra de LANHEZ e

palavras e textos e representar fonemas; oferecer

NICO (2002) foram observados e depois selecio-

oportunidades para a escrita e leitura espontâne-

nados especialmente para este trabalho. É sobre

as; explorar constantemente as diversas funções

eles que passaremos a discorrer agora:

da escrita e explicitar as diferenças entre língua fa-

Conversa particular – é essencial que o Pprofes-

lada e língua escrita.

sor, no primeiro dia de aula, demonstre ao aluno

INEQ - Educação integral

11


especial sua vontade de manter contato individu-

fundir os sinais matemáticos, o aluno com dislexia

al com ele (o discente), proporcionando, assim,

não consegue resolver problemas. A repetição é

maior aproximação e interação entre Professor

essencial neste caso.

e aluno, deixando o mesmo mais à vontade para

Utilize avaliações orais: Estas avaliações presti-

participar das aulas

giam as melhores habilidades do disléxico, uma

Plano de aula – Preparar uma aula que predispo-

vez que muitos apresentam dificuldades em sole-

nha o aluno a se organizar mentalmente e fornecer

trar e escrever.

uma estratégia que introduz e finaliza a atividade,

Valorizar o erro: isso fará com que ela (a criança

sempre retomando e enfocando os pontos-chave.

com dislexia) se sinta mais livre para se expressar

Diversidade de recursos em sala de aula – como

e mantenha interesse na correção do erro. Evite

a dificuldade se baseia em ler e interpretar textos,

comentar a falha do discente disléxico, pois todo

os conteúdos serão mais bem aprendidos se apre-

deslize excessivamente apontado faz com que a

sentados de forma a estimular os sentidos de tato,

autoconfiança de qualquer pessoa diminua. Ao

paladar, visão e sensação. Portanto, além dos li-

contrário, use o erro de forma construtiva ajudan-

vros, é essencial trabalhar também com apresen-

do no processo de aprendizagem.

tação de slides, filmes educativos e outros re-

Estender prazos: já que a criança disléxica tem fa-

cursos multimídia.

Não espere que uma criança

lhas na memória sequencial, é compreensível que

com dificuldades de leitura obtenha toda informa-

ela tenha dificuldade em organizar seu tempo. Por

ção por meio de textos.

isso, dê um prazo para que ela possa trabalhar no

Lançar mão de recursos como ditados: mesmo

seu próprio ritmo e conforme seus interesses e ha-

que as crianças se lembrem das palavras oralmen-

bilidades.

te, provavelmente as esquecerá em curto espaço

Evitar leitura em voz alta para a turma: este re-

de tempo e terá muita dificuldade em escrevê-las.

curso só deve ser utilizado se houver o consenti-

Portanto, é importante praticar a escrita.

mento do aluno, pois ele possui uma dificuldade

Afastar o uso de explicações orais e escritas si-

frequente em pronunciar algumas palavras.

multaneamente: este método de informar/ expli-

Evite os termos, preguiçoso ou desleixado: a

car o conteúdo pode confundir a cabeça do aluno.

criança disléxica realmente apresenta dificuldades

Ele ficará segmentado entre a escuta e a cópia.

em organizar-se. Entretanto, e esta conduta por

Estimular a análise das palavras: permitir que a

ser fruto de fracasso que a mesma já tenha vi-

criança observe detalhadamente cada letra que

vido. É fundamental observar tal comportamento.

forma uma palavra, mas utilizar poucas letras de

12

cada vez. Uma dica é a utilização do jogo da me-

mória, quando possível, para estimular a observa-

problemas da criança com dislexia e atuecom os

ção cuidadosa e a lembrança precisa.

demais colegas são fatores essenciais para uma

Ofertar revisão: normalmente o aluno disléxico se

criança com tal disfunção. Não podemos esque-

intimida diante dos colegas e não tem coragem de

cer que o Professor não atua só, assim o mesmo

dizer que não entendeu a matéria. Assim, prepare

deve recorrer a ajuda de profissionais da área, para

aulas que façam retomadas do que já foi visto em

que receba as devidas orientações. .

sala para que esse aluno possa tirar suas dúvidas.

Estimular a utilização da tabuada e calculadoras

processo de ensino/aprendizagem, principalmen-

simples: por não memorizarem a tabuada e con-

te para estudantes com dislexia, por isso é ponto

INEQ - Educação integral

Ter um Professor que compreenda os

Todo avanço é importante ao longo do


central que o professor considere os pequenos

quer natureza.

avanços que o aluno demonstrar, estabelecendo e

firmando a autoconfiança do discente.

por intermédio de um plano integrado entre a ges-

Em suma, incluir em suas aulas atividades

tão e as intervenções da orientação pedagógica e

que envolvam jogos e brincadeiras são artifícios

educacional oportuniza desdobramentos que fa-

que estimulam e motivam as crianças na fase de

vorecem a escola como um todo e contribui para a

alfabetização.

melhoria da qualidade do trabalho pedagógico. De-

O acompanhamento dos alunos disléxicos

vemos nos preocupar em dar oportunidades para CONSIDERAÇÕES FINAIS

os disléxicos externarem seus dons, resultando em benefícios para todos. Há muito para aprender

A dislexia não é apenas um problema cog-

e fazer. Nossas certezas são temporárias. Cada

nitivo, e sim de ordem que envolve as competên-

aluno disléxico é único e cada experiência traz

cias leitoras e escritoras. Para além da criação de

nova demanda.

um programa de reabilitação, com vista a minimi-

zar as dificuldades do aluno na escola, para que

extenso caminho a ser atingido em relação à cons-

este obtenha o sucesso escolar, é necessário tam-

tatação de estudos sobre a dislexia, mas precisa-

bém e, sobretudo, cultivar a sua autoestima. Para

mos nos conscientizar que a observação sempre é

um disléxico é importante saber que sua mente

o melhor caminho, dar atenção, parar para escutar,

funciona de modo completamente normal, apesar

às vezes faz toda a diferença em nossas vidas e

da dislexia.

principalmente nas vidas de nossos pequenos, se-

jam eles disléxicos ou não.

Na perspectiva das instituições de ensinos,

É primordial reconhecer que há ainda um

narrações de professores, entre outros, ocorrem registros de situações em que crianças, aparentemente brilhantes e muito inteligentes, não podem ler, escrever e nem tem boa ortografia para a idade. Nos exames vestibulares, as comissões executivas descrevem casos extravagantes em que candidatos apresentam baixo nível de compreensão leitora ou onde a ortografia ainda é fonética e inconstante.

A crítica e a reflexão em prol das meto-

dologias significativas devem levar o Professor a mudar o cotidiano da escola como um todo, gerando mudanças vantajosas para todos os alunos. Com o estudo e o conhecimento, toda a comunidade educativa sai vencedora, pois aprendemos a refletir sobre a dislexia, tentando compreender suas dificuldades, posicionando- nos em relação a mesma e garantindo-lhe direitos e espaço, isto deve ser um exercício de cidadania para beneficiar todos os alunos sem ou com dificuldades de qual-

REFERÊNCIAS

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13


As contribuições de Vygotsky acerca do desenvolvimento da linguagem das crianças na educação infantil Cristina Antunes Tavares Ferreira1

RESUMO

view on language development, especially in autis-

O presente trabalho teve como intenção

tic children, highlighting the importance of school

ampliar a visão sobre o desenvolvimento da lin-

education in the development of such individuals.

guagem, especialmente em crianças autistas,

Therefore, we as a theoretical reference to histori-

destacando a importância do ensino escolar no

cal-cultural approach that has as one of its main

desenvolvimento de tais indivíduos. Para tanto,

representatives Lev Semenovich Vygotsky, russian

tomamos como referência teórica a abordagem

author, who broke new ground with its theoretical

histórico-cultural que tem como um dos seus prin-

propositions the relationship between thought and

cipais representantes Lev Semenovich Vygotsky,

language, the nature of the child’s development

autor russo, que inovou com suas proposições

and the role of learning in development. The pro-

teóricas a relação entre pensamento e linguagem,

posal to address different views and theories is to

a natureza do processo de desenvolvimento da

bring out responsibilities and commitments in rela-

criança e o papel da aprendizagem no desenvolvi-

tion to mediation, which will provide children con-

mento.

ditions and opportunities to learn and develop their A proposta de abordar diferentes visões

language in a clear, correct and understandable,

e teorias é a de trazer à tona responsabilidades e

and provide mediators clarity their role and impor-

comprometimentos em relação à mediação, que

tance in this development.

proporcionará às crianças condições e oportunida-

Key words: Vygotsky, Oral Language, Child Develo-

des para aprender e desenvolver sua linguagem de

pment, Learning.

forma clara, correta e compreensível, bem como fornecer aos mediadores a clareza de seu papel e

INTRODUÇÃO

importância nesse desenvolvimento.

Palavras-chave: Vygotsky, Linguagem Oral, De-

um importante marco no desenvolvimento infantil.

senvolvimento Infantil, Aprendizagem.

Com a apropriação da linguagem oral, a criança

A aquisição da linguagem se constitui em

pode ampliar sua capacidade comunicativa, pois

14

ABSTRACT

passa a utilizar esse instrumento para mediar as

The aim of the present study was to expand the

relações com os seus pares.

1 - Ms. Profª. CRISTINA ANTUNES TAVARES FERREIRA. Docente Universitária / Coordenadora Pedagógica PMSP. Mestre em Educação/ Psicanalista Clínica e Didata / Pedagoga / Especialista em Educação Especial-Deficiência. Auditiva / Psicomotricista / Especialista em Docência no Ensino Superior.

INEQ - Educação integral


Antes de abordar a aquisição da linguagem,

nais e sociais (FELD, 2008).

é preciso definir o que se entende por linguagem.

Os aspectos sociais, que permeiam as rela-

Para tanto, utiliza-se as contribuições de Viana

ções entre os indivíduos, exercem papel fundamen-

(2000), que sugere que a concepção de linguagem

tal no desenvolvimento da linguagem. Na relação

hoje adotada nos meios acadêmicos e científicos

com seus pares, a primeira forma de linguagem

compreende o fator linguístico, o cognitivo e o in-

que a criança utiliza é a corporal, inicialmente com

teracional.

a finalidade de manifestar suas necessidades bio-

O fator linguístico se refere à organização

lógicas. Em um processo intensamente comuni-

do discurso, às regras e esse aspecto possibilita

cativo, o bebê emite sinais corporais, que são in-

que o código seja compartilhado. O fator cognitivo

terpretados e significados por seu cuidador (FELD,

se refere ao conhecimento e é proveniente das ex-

2008).

periências e vivências, que definem os modelos de

cada falante. E o fator interacional se refere à ma-

tras manifestações do bebê, se dá um processo

neira individual de interpretar e se relacionar com

que envolve além da satisfação de necessidades

mundo (VIANA, 2000, p. 35).

biológicas, mas também aspectos afetivos e co-

As linguagens humanas possuem produti-

municativos. Com isso, se o desenvolvimento

vidade infinita e regras para utilização. O que quer

estiver transcorrendo dentro do esperado, no ter-

dizer que, independente das linguagens possuírem

ceiro mês de vida, a criança já poderá ser capaz

uma quantia finita de palavras, estas podem se

de discriminar algumas palavras (ROTTA, 2006).

combinar, constituindo uma infinidade de discur-

O cuidador reage aos sinais emitidos pelo bebê e,

sos significativos. Brunner (1983), ao analisar a

por sua vez, esses sinais são transformados em

aquisição da linguagem não se deteve na análise

outros códigos. Sendo assim, o choro, meio de

da emissão de sons pela criança, mas exaltou a

comunicação mais utilizado no início da vida do

predisposição humana para estabelecer relações

bebê, abre espaço para outros recursos vocálicos

sociais e comunicativas. Esse autor defende a

e gestuais, que são a base da comunicação prelin-

ideia de que as capacidades cognitivas pré linguís-

guística.

ticas se manifestam precocemente na criança e

servem de suporte para que esta possa adquirir a

sobre a infância considerava-se as crianças como

linguagem.

seres incompletos, incompetentes, em posição

Para Brunner (1983), quando se fala que

passiva de aprendizagem. Essa incompletude fica-

uma criança adquiriu a linguagem, significa que

va ainda mais evidente em se tratando de bebês,

passou por um processo complexo, que compre-

que não eram reconhecidos em suas habilidades

ende três aspectos principais: essa criança é ca-

e competências sociais e comunicativas (CARVA-

paz de produzir enunciações, o que se refere ao

LHO; BERALDO, 1989).

aspecto léxico; consegue significar a linguagem,

que se trata do aspecto semântico, e possui uma

de desenvolvimento e ainda tenham um longo ca-

intenção comunicativa, que se refere à pragmáti-

minho a trilhar para que desenvolvam habilidades

ca da linguagem. Para que uma criança aprenda a

que lhe permitirão autonomia e maior interação

falar, precisa percorrer um caminho árduo, lento e

com o mundo ao seu redor, considerar apenas as

gradual e esse processo envolve o desenvolvimen-

carências, os colocava em uma posição de sub-

to de mecanismos anatômicos-estruturais, funcio-

missão e inferioridade.

Quando o cuidador atende o choro ou ou-

Durante décadas a maioria das pesquisas

Embora os bebês estejam em fase inicial

INEQ - Educação integral

15


Atualmente a ciência reconhece as crian-

gem sob a perspectiva da interação do sujeito com

ças pequenas como sujeitos sociais, capazes de

o meio. E, com isso, destaca-se a importância do

realizar interações desde o nascimento e que pos-

aspecto social nos processos psíquicos e questio-

suem uma história prévia, que inicia no momento

na-se as concepções naturalistas e mecanicistas

da concepção. Sob essa perspectiva, as relações

relacionados com esta aquisição.

se dão de maneira ativa, histórica e social, permea-

das por processos comunicativos que antecedem

histórico-social e o papel da linguagem no desen-

a aquisição da linguagem oral (PESSÔA;SEIDL-DE-

volvimento do indivíduo, enfatiza que existe uma

-MOURA; OLIVEIRA, 2008).

questão central, que é a aquisição de conhecimen-

Os avanços da medicina e da neurociência

tos pela interação do sujeito com o meio. Para

apontam a fascinante evolução que a mente hu-

Vygotsky (1998) a linguagem influencia a história

mana percorre nos primeiros anos de vida e des-

social, a organização de estruturas mentais mais

tacam a plasticidade cerebral como a base para o

complexas e a formação das características psico-

desenvolvimento dessa primeira etapa (GAT, 2000;

lógicas humanas. Nesse sentido, sem linguagem

FELD, 2008).

não há função psicológica superior e, portanto,

Fazendo parte deste processo de desenvol-

não há humanidade. A partir do contato entre os

vimento, está a aquisição da linguagem, enquanto

sujeitos e destes com os objetos, o indivíduo ad-

instrumento para a comunicação, articulação de

quire conhecimentos e estabelece relações. Essa

ideias e transmissão cultural. Essas característi-

perspectiva é pautada em uma concepção de ser

cas comunicativas possibilitam que a criança pos-

humano ativo, que transforma na mesma medida

sa estreitar ainda mais a sua interação social, e por

em que é transformado pelo meio (VYGOTSKY, LU-

sua importância, a aquisição da linguagem tem

RIA e LEONTIEV: 1988, p. 25).

sido objeto de estudo de pesquisadores (VIANA,

2000; ZORZI, 2003; SICURO, 2017; SCARPA, 2001).

entre os sujeitos e permite que os significados se-

Saber qual o caminho trilhado para que

jam compartilhados. E, dessa forma, permeia um

uma criança se torne usuária de sua língua ma-

processo cognitivo complexo, que se dá a partir da

terna é uma inquietação que vem despertando a

percepção até a interpretação da mediação com

atenção do homem ao longo do tempo e tem sido

objetos e acontecimentos. Para que uma criança

objeto de estudo dos profissionais das diferentes

desenvolva a linguagem, dois elementos são es-

áreas, sejam médicos, psicólogos, pedagogos, an-

senciais: o aparato biológico em pleno funciona-

tropólogos, entre outros. Cada qual, com seu mé-

mento e o contato com o ambiente cultural, que

todo e olhar apurado para determinado aspecto,

favoreça os estímulos necessários para que a

mas todos fascinados pelo potencial comunicati-

criança desenvolva as suas potencialidades (VY-

vo propiciado pela linguagem.

GOSTSKY; LURIA; LEONTIEV, 1988).

Vygotsky, em sua teoria sobre o processo

A linguagem possibilita a comunicação

Para apoiar as discussões acerca do de-

senvolvimento da linguagem, o presente estudo

1. ORIGENS DO PENSAMENTO E DA LÍNGUA DE

se fundamenta em Vygotsky (1998), uma vez que

ACORDO COM VYGOTSKY

prioriza a infância e enfatiza a linguagem como

A comunicação por meio de movimentos ex-

elemento simbólico essencial para o desenvolvi-

pressivos, observada principalmente entre

mento humano. Analisa-se a aquisição da lingua-

animais, é mais uma efusão afetiva do que comunicação. (Lev Vygotsky2)

16

2 - No livro “A Construção do Pensamento e da Linguagem”.

INEQ - Educação integral


O homem ganha o status de animal racio-

De acordo com Vygotsky, todas as ativi-

nal quando passa a dominar a linguagem. Animais

dades cognitivas básicas do indivíduo ocorrem

se expressam por meio de gestos e sons, o que,

de acordo com sua história social e acabam se

para Vygotsky, não é exatamente comunicação,

constituindo no produto do desenvolvimento his-

já que não existe a intenção explícita de se comu-

tórico-social de sua comunidade (LURIA, 1976).

nicar. A linguagem surge pela necessidade do ser

Portanto, as habilidades cognitivas e as formas de

humano de se comunicar com o outro para forta-

estruturar o pensamento do indivíduo não são de-

lecer o grupo e organizar o trabalho.

terminadas por fatores congênitos. São, isto sim,

Um dos grandes saltos evolutivos do

resultado das atividades praticadas de acordo

homem em relação aos outros animais se deu

com os hábitos sociais da cultura em que o indiví-

quando ele adquiriu a linguagem, ou seja, quando

duo se desenvolve.

aprendeu a verbalizar seus pensamentos. É por

meio das palavras que o ser humano pensa. A ge-

de na qual a criança se desenvolve e a história pes-

neralização e a abstração só se dão pela lingua-

soal desta criança, são fatores cruciais, que vão

gem e, com base nelas, melhor compreendemos e

determinar sua forma de pensar. Neste processo

organizamos o mundo à nossa volta.

de desenvolvimento cognitivo, a linguagem tem

Assim como no reino animal, para o ser hu-

papel crucial na determinação de como a criança

mano, pensamento e linguagem têm origens dife-

vai aprender a pensar, uma vez que formas avan-

rentes. Inicialmente o pensamento não é verbal e a

çadas de pensamento são transmitidas à criança

linguagem não é intelectual. Suas trajetórias de de-

através de palavras.

senvolvimento, entretanto, não são paralelas; elas

cruzam-se. Em dado momento, há cerca de dois

relações entre pensamento e língua é necessário

anos de idade, as curvas de desenvolvimento do

para que se entenda o processo de desenvolvi-

pensamento e da linguagem, até então separadas,

mento intelectual. Linguagem não é apenas uma

encontram-se para, a partir daí, dar início a uma

expressão do conhecimento adquirido pela crian-

nova forma de comportamento. É a partir deste

ça. Existe uma inter-relação fundamental entre

ponto que o pensamento começa a se tornar ver-

pensamento e linguagem, um proporcionando re-

bal e a linguagem racional.

cursos ao outro. Desta forma a linguagem tem um

papel essencial na formação do pensamento e do

Inicialmente a criança aparenta usar lin-

Consequentemente, a história da socieda-

Para Vygotsky, um claro entendimento das

guagem apenas para interação superficial em seu

caráter do indivíduo.

convívio, mas, a partir de certo ponto, esta lingua-

gem penetra no subconsciente, para se constituir

compreender as relações entre o pensamento e a

na estrutura do pensamento da criança. A partir

linguagem e esse foi um dos maiores acertos de

do momento que a criança descobre que tudo tem

seu trabalho. Até então, os estudos sobre o tema

um nome, cada novo objeto que surge, representa

buscavam dissecar os dois conceitos isoladamen-

um problema, que a criança resolve atribuindo-lhe

te. Vygotsky reconhecia a independência dos ele-

um nome. Quando lhe falta a palavra para nomear

mentos, mas afirmava que o caminho era compre-

este novo objeto, a criança recorre ao adulto. Esses

ender como um se comporta em relação ao outro,

significados básicos de palavras assim adquiridos,

como eles interagem em suas fases iniciais.

funcionarão como embriões, para a formação de

novos e mais complexos conceitos.

sky buscou analisar o desenvolvimento da crian-

Vygotsky dedicou anos de estudo para

Para compreender essas relações, Vygot-

INEQ - Educação integral

17


18

ça. De acordo com ele, mesmo antes de dominar

divíduos, ao processo de internalização e ao papel

a linguagem, ela demonstra capacidade de resol-

da escola na transmissão de conhecimento, que

ver problemas práticos, de utilizar instrumentos e

é de natureza diferente daqueles aprendidos na

meios para atingir objetivos. É o que o pesquisador

vida cotidiana. Propõe uma visão de formação das

chamou de fase pré-verbal do pensamento. Ela é

funções psíquicas superiores como internalização

capaz, por exemplo, de dar a volta no sofá para pe-

mediada pela cultura.

gar um brinquedo que caiu atrás dele e que não

está à vista. Esse conhecimento prático indepen-

organiza o pensamento. Ele atribui importância a

de da linguagem e é considerado uma inteligência

linguagem pois, além da função comunicativa, ela

primária, também encontrada em primatas como

é essencial no processo de transição do interpes-

o macaco-prego, que usa varetas para cutucar ár-

soal em intramental; na formação do pensamento

vores à procura de mel e larvas de insetos.

e da consciência; na organização e planejamento

Embora não domine a linguagem como

da ação; na regulação do comportamento e, em

um sistema simbólico, os pequenos também utili-

todas as demais funções psíquicas superiores do

zam manifestações verbais. O choro e o riso têm a

sujeito, como vontade, memória e atenção. A inte-

função de alívio emocional, mas também servem

ração e a linguagem têm um importante destaque

como meio de contato social e de comunicação.

no pensamento de Vygotsky, uma vez que contri-

É o que Vygotsky chamou de fase pré intelectual

buirão no desenvolvimento dos processos psico-

da linguagem. É a fase na qual a criança depende

lógicos, através da ação. Para ele, o pensamento e

de sentidos como a visão para atuar no mundo e

a linguagem são processos diferentes e se tornam

se manifesta exclusivamente por meio de sons e

interdependentes em expressão do meio.

gestos, ligados à inteligência prática.

Por volta dos dois anos de idade, o percurso

creve desde os seus primeiros dias num sistema

do pensamento encontra-se com o da linguagem e

de comportamento social em que suas atividades

o cérebro começa a funcionar de uma nova forma.

adquirem significado. Sua relação com o ambien-

A fala torna-se intelectual, com função simbólica,

te se dá por meio da relação com outras pessoas,

generalizante, e o pensamento torna-se verbal, me-

situação em que é oferecido a ela um conjunto de

diado por conceitos relacionados à linguagem.

acepções, já culturalmente enraizado no grupo em

Para Vygotsky a aquisição da linguagem

que ela foi inserida. Os significados, por sua vez,

pela criança modifica suas funções mentais supe-

são interiorizados ao longo de seu processo de de-

riores: ela dá uma forma definida ao pensamento,

senvolvimento, culminando com o aparecimento

possibilita o aparecimento da imaginação, o uso

do pensamento verbal.

da memória e o planejamento da ação. Neste sen-

tido, a linguagem sistematiza a experiência direta

tese entre a atividade prática e a fala, é uma for-

dos sujeitos e, por isso, adquire uma função cen-

ma de comportamento que se circunscreve num

tral no desenvolvimento cognitivo, reorganizando

processo histórico-cultural e suas características

os processos que nele estão em andamento. As

e propriedades não podem ser vislumbradas nas

concepções de Vygotsky sobre o processo de for-

formas naturais da fala e do pensamento.

mação de conceitos remetem às relações entre

pensamento e linguagem, à questão cultural no

criança não se separa da percepção. Com o avanço

processo de construção de significados pelos in-

na percepção, a ação motora da criança torna-se

INEQ - Educação integral

Segundo Vygotsky, a linguagem é quem

Portanto, para Vygotsky, a criança se ins-

Assim, o pensamento verbal, que é a sín-

Ainda para Vygotsky, a ação motora da


mais intencional, ou mais controlável. Percebe-se

neamente e conjuntamente com o processo

então, o caráter fundamental do signo mediador

de maturação orgânica e posto que seu por-

no progresso das ações infantis, ampliando-lhe o

tador é o organismo infantil em transforma-

poder de escolha, ou seja, o controle do comporta-

ção em vias de crescimento e maturação. O

mento, mediado pela fala, dá origem ao comporta-

desenvolvimento da linguagem infantil pode

mento de escolha da criança. Em consequência de

servir de exemplo afortunado dessa fusão

tais avanços, também com auxílio da fala, a crian-

dos dois planos do desenvolvimento: o natu-

ça aperfeiçoa a atenção e torna-se capaz de orga-

ral e o cultural. (VYGOTSKY, 2000, p. 36)

nizar e criar mentalmente um campo temporal que lhe permite controlar os fatos passados, presentes

Dessa forma, nada substitui o desenvolvi-

e as intenções futuras.

mento denominado por Vygotsky como desenvolvimento cultural, que é exatamente a fusão entre a

1.1 Desenvolvimento e aparição da linguagem na

maturidade infantil (orgânico) e desenvolvimento

vida da criança

adquirido em seu meio (cultura). Essa junção proporcionará o aparecimento e o desenvolvimento

Nos primeiros meses de vida a criança já

da linguagem infantil, através do desenvolvimento

utiliza algumas formas de comunicação, porém

psicológico e fisiológico.

suas primeiras palavras surgem aproximadamen-

te ao término do primeiro ano de vida, que não é a

cialmente a história da formação de uma ou mais

reprodução da fala dos pais, mas uma sequência

funções do comportamento cultural da criança,

de sons que servem para nomear objetos e pes-

que está na base do acúmulo de experiências cul-

soas ao seu redor. Aos poucos, a criança vai ad-

turais, onde

O desenvolvimento da linguagem é essen-

quirindo novas palavras e, por volta do décimo oi-

[…] as primeiras fases do desenvolvimento da

tavo mês, sua fala ainda é bastante limitada, mas

linguagem são realizadas exatamente como

apesar dessa limitação, a criança já consegue dar

indicado pela teoria dos reflexos condiciona-

sinais de compreensão da fala do adulto, deixan-

dos, que se referem ao desenvolvimento de

do evidente que seu domínio vocabular é maior do

um novo tipo de comportamento. (VYGOT-

que sua produção verbal.

SKY, 1931 p.167)

Entre o décimo oitavo e vigésimo mês é

que ocorre uma revolução na fala da criança, mas

Em primeiro lugar, a língua da criança é

somente com o passar dos anos é que a conso-

baseada na reação inata de reflexão hereditária,

lidação das habilidades linguísticas ocorrerá de

chamada reflexo incondicionado, o qual é funda-

modo regular e gradual, e a cada etapa a criança

do sobre o desenvolvimento de todas as reações

mostrará progressos, que demonstram que ela é

condicionadas, que servem como base para os fu-

construtora da sua própria fala; sendo assim, a

turos vínculos condicionados. A reflexão do grito

criança é ativa no desenvolvimento de sua própria

e a reação vocal da criança é um reflexo incondi-

linguagem (SABINI, 1993).

cionado, bem como a base hereditária em que a

Ao mesmo tempo, o desenvolvimento cultu-

língua é construída em adultos. Já no recém-nas-

ral adquire um caráter muito peculiar que não

cido, o estado atual do conhecimento dos reflexos

pode se comparar com nenhum outro tipo de

condicionados é de difícil determinação, o número

desenvolvimento, já que se produz simulta-

de reações inatas que compõem o choro provoca INEQ - Educação integral

19


dúvidas de que em suas reações vocais não há re-

cado do sinal.

flexo incondicionado apenas, mas talvez uma série

deles, intimamente ligados (VYGOTSKY, 1931).

provável que uma criança de um ano e meio ou

Existe uma singularidade do papel de re-

dois, descubra algo que exija tamanha tensão inte-

ação vocal nos seis primeiros meses de vida da

lectual ou possua uma experiência psicológica tão

criança. Fisiologistas e psicólogos concordam que

complexa que a permita compreender a relação

funções que têm uma clara base fisiológica es-

entre o signo e significado. Surge daí a posição

tão atribuídas à reação vocal do bebê. Uma delas

de Stern, que diz que a criança “inventa” algo. No

é considerada reação incondicionada instintiva,

entanto, Vygotsky diz que é improvável que isso

que são os movimentos ou estados externos do

ocorra, pois, todos os experimentos realizados

corpo emocional, ou seja, quando a criança sente

com crianças sobre memorização de suas primei-

dor, obtém um reflexo de gritar, quando é infeliz, as

ras expressões de linguagem mostraram o quanto

reações não são as mesmas. Ao longo do primei-

é impossível confiar nessa descoberta tão cedo.

ro ano de vida, o idioma da criança baseia-se in-

teiramente no sistema de reação incondicionada,

gotsky (1931), ele afirma que a criança inicia o des-

de preferência instintiva emocional e sobre o qual,

cobrimento do significado das palavras e domina

por meio de diferenciação, a reação vocal é feita

a estrutura externa, assimilando que cada objeto

sob influência, porém independente. Graças a isso,

corresponde a sua própria palavra, dominando a

ela também modifica a própria função da reação;

estrutura que pode unir a palavra e o objeto, onde a

se antes essa função era parte da reação geral or-

palavra que identifica o objeto passa a ser proprie-

gânica e emocional expressa pela criança, agora

dade do objeto em si, a descoberta do significado,

começa a cumprir a função de contato social. No

isto é, da estrutura semântica interna da palavra,

entanto, as reações vocais da criança ainda não se

ocorrerá depois no desenvolvimento da criança.

tornaram seu idioma, porém se aproximam mais

do aparecimento da linguagem articulada, o que

inata de reflexão hereditária, chamada reflexo in-

torna difícil o entendimento correto da linguagem,

condicionado, o qual é fundado sobre o desenvol-

do desenvolvimento infantil e do desenvolvimento

vimento de todas as reações condicionadas, que

da cultura (VYGOTSKY, 1931).

servem como base para os futuros vínculos con-

Segundo Stern, citado em Vygotsky (1931),

dicionados. A reflexão do grito e a reação vocal da

a criança se comporta como se entendesse que

criança é um reflexo incondicionado, bem como a

os objetos possuem nomes, o seu comporta-

base hereditária em que a língua é construída em

mento em relação a sua própria língua é de difícil

adultos. Já no recém-nascido, o estado atual do

compreensão, portanto, ao ver um novo objeto, ela

conhecimento dos reflexos condicionados é de

questionará se é um nome que ela já conhece, ou

difícil determinação; o número de reações inatas

então perguntará o que é, pois ainda desconhece

que compõem o choro provoca dúvidas de que em

seu nome. Para Stern a descoberta se relaciona

suas reações vocais não há reflexo incondicionado

com o desenvolvimento do pensamento das crian-

apenas, mas talvez uma série deles, intimamente

ças, afirmando que acontece algo com ela, que

ligados (VYGOTSKY, 1931).

Vygotsky (1931) aponta que seja pouco

Descartada essa hipótese de Stern por Vy-

A língua da criança é baseada na reação

não é apenas um reflexo condicionado. A criança torna-se consciente da conexão e da relação entre o sinal e seu significado e ainda descobre o signifi-

20

INEQ - Educação integral

1.2 - Conexão entre pensamento e linguagem


Vygotsky (2009) aponta que existe uma

cumpre a função de transmitir conhecimentos e

relação entre pensamento e linguagem, a qual ele

ensinar, delimitando fronteiras entre as inúmeras

nomeia de conexão, que se modifica no processo

instituições socializadoras e a escola. Assim, deve

de desenvolvimento, tanto no sentido quantitativo

existir uma reflexão acerca da natureza das ações

quanto qualitativo. Sendo assim, o desenvolvimen-

realizadas junto às crianças quando iniciam na

to da linguagem e do pensamento realiza-se de

escola, considerando em que medida e como os

forma não paralela e desigual.

conhecimentos científicos se tornam presentes

Vygotsky percebia essa conexão entre pen-

no trabalho que se desenvolve junto às crianças

samento e linguagem como originária do desen-

nessa fase inicial da aprendizagem. Para isso, há

volvimento, evoluindo em um processo dinâmico

a necessidade de se dispor de conhecimentos que

e, ao longo dele, considerou que pensamento e lin-

interfiram de modo indireto ou direto no desen-

guagem têm na filogênese e na ontogênese, raízes

volvimento da criança, pois essa diretividade diz

genéticas diferentes, mas que se sintetizam diale-

respeito aos conhecimentos que medeiam a ativi-

ticamente no desenvolvimento. A criança possui a

dade docente e não à atividade propriamente dita,

função social da fala desde os primeiros meses de

o que interferirá diretamente de forma positiva ou

vida, onde o pensamento evolui sem a linguagem,

negativa no desenvolvimento da criança.

assim sendo, os primeiros balbucios se formam

sem o pensamento e têm como objetivo atrair a

pensamento, existem algumas implicações funda-

atenção dos adultos ao seu redor. No desenvolvi-

mentais e decisivas, pois a linguagem está ligada

mento da fala da criança, estabelece-se uma lin-

a ele, ambos se elaboram juntos no trabalho e por

guagem pré-intelectual e no desenvolvimento do

meio dele, sendo assim, “a linguagem só reflete o

seu pensamento, um pensamento pré-linguístico.

que é produzido no contexto de relações sociais”

Aos dois anos de idade ocorre um encontro e uma

(p.54). Segundo a autora, a linguagem não existe

junção entre os dois, pensamento pré linguístico e

sem pensamento e nem o pensamento sem a lin-

linguagem pré intelectual, dando lugar a um novo

guagem, “a primeira dá forma objetiva à existência

tipo de organização denominada linguístico cog-

do segundo, e mesmo quando o pensamento não

nitivo; esse encontro torna o pensamento verbal

se corporifica diretamente pela linguagem e sim

e a linguagem racional. Cabe ainda ressaltar que,

com base em imagens, estas estão sempre acom-

no desenvolvimento da linguagem, é a reação da

panhadas de sentido e de significados” (p. 55).

criança que desenvolve a fala, no início de forma

completamente independente do pensamento

rem um conjunto de riquezas produzidas pelo seu

(VYGOTSKY, 2009).

meio, dentre essas riquezas está a consciência,

Quando a criança aprende o que lhe foi en-

que se constitui em um “poderoso instrumento na

sinado por mediadores, essa aprendizagem passa

leitura de mundo e de si mesmo”, como também

a ser uma característica dela, e seu desenvolvi-

na aquisição da leitura e da escrita, que são utiliza-

mento se deve a essa aprendizagem. Sendo as-

das pelo homem na mediação com o conhecimen-

sim, os fatores sociais e culturais são aqueles que

to (AZEVEDO, 2003, p. 55).

Segundo Azevedo (2003), em relação ao

Através da linguagem, as pessoas adqui-

proporcionam o desenvolvimento do pensamento (PIAGET, apud MONTOYA, 2006).

1.3 - A influência dos adultos no desenvolvimen-

to da linguagem infantil

Segundo Martins (2012), independen-

temente da faixa etária que a escola atenda, ela INEQ - Educação integral

21


A primeira forma de linguagem da criança

criança em interação com seus pais, ou seja, os

é a linguagem do adulto. A criança individualiza

adultos falantes, os quais convivem com ela.

a linguagem social, ou seja, internaliza a lingua-

gem externa. Então, a quantidade e a qualidade de

terísticas, os conteúdos simbólicos, os domínios e

enunciados no ambiente social da criança influen-

habilidades próprias a alguém não se estruturam

ciam diretamente seu desenvolvimento psicológi-

nele a partir de si mesmo. No entanto, o desenvol-

co, bem como sua socialização, pois durante as

vimento só se produz por meio de aprendizagens e

atividades realizadas com os pais e/ou educado-

esse é o pressuposto vygotskiano segundo o qual,

res, a criança interage através de instruções ver-

o bom ensino, presente em processos interpes-

bais, de brincadeiras e histórias que proporcionam

soais, deve se antecipar ao desenvolvimento para

tal socialização.

poder conduzi-lo. Portanto, o desenvolvimento não

é responsável pelo ensino, o ensino é que propor-

Borges e Salomão (2003) abordam a ques-

Para Martins (2012), aponta que as carac-

tão de que os valores culturais do contexto em que

ciona o desenvolvimento do indivíduo.

a criança está inserida, geralmente, estão contidos

nessas interações. Essa socialização através da

que o desenvolvimento cultural da criança está li-

linguagem pode ocorrer também de forma implí-

gado ao social porque ela aprende com o externo,

cita, por meio de participação em interações ver-

fala-se diretamente das funções mentais superio-

bais que têm marcações sutis de papéis e status.

res exteriores, pois a criança aprende com o social,

Sendo assim, através da linguagem a criança vai

portanto, com o externo. Quanto à função interna,

se familiarizando com a fala, valores, crenças e re-

só ocorre a aprendizagem, quando a criança já

gras existentes naquele contexto, antes mesmo de

aprendeu o que lhe foi ensinado, portanto, inter-

aprender a falar, adquirindo os conhecimentos de

nalizou, ou seja, aprendeu através da mediação,

sua cultura. Sendo assim os autores apontam que:

proporcionada pelo outro. Diante disso Vygotsky

À medida que a criança se desenvolve, seu

Segundo Vygotsky (1931), quando se diz

aponta que:

sistema sensorial incluindo a visão e audi-

Para a criança, a palavra deve ter um sentido,

ção, se tornam mais refinados e ela alcança

deve haver uma ligação objetiva entre a pala-

um nível linguístico e cognitivo mais elevado,

vra e o que ela significa. Sem essa ligação, a

enquanto seu campo de socialização se es-

palavra não pode ser desenvolvida, esta liga-

tende, principalmente quando ela entra para

ção objetiva entre a palavra e o objeto deve

a escola e tem maior oportunidade de intera-

ser utilizada por adultos funcionalmente

gir com outras pessoas. (p. 327)

como um meio de comunicação com a criança. (p. 149)

22

Ainda segundo Borges e Salomão (2003),

a participação do adulto como interlocutor lin-

guisticamente mais habilitado exerce o papel de

própria criança, pois seu significado já faz senti-

mostrar-se sensível às intenções comunicativas

do também para o adulto; são as formas funda-

da criança, aproximando-se ao nível linguístico do

mentais da comunicação verbal do adulto com a

adulto em si. A constatação de que as crianças

criança que mais tarde se tornarão em funções

apresentam intenções comunicativas desde seus

psíquicas. O desenvolvimento cultural se dá de

primeiros meses de vida influenciou os estudiosos

forma que a criança aprende do externo para o in-

da linguagem a pesquisarem a fala espontânea da

terno, sendo assim, todas as funções superiores

INEQ - Educação integral

Dessa forma, a palavra terá sentido para a


e suas relações, estão interligadas com relações

sociais, suas propriedades físicas mais evidentes

geneticamente sociais e autênticas. “Portanto, o

(tamanho, cor, textura, forma, etc).

principal resultado da história do desenvolvimento

cultural da criança poderia ser chamado de socio-

caminho pelo qual a criança aprenderá a descrimi-

gênese das formas superiores de comportamen-

nar, analisar e diferenciar os objetos e fenômenos

to” (VYGOTSKY, 1931, p. 149).

em suas propriedades mais importantes.

Dessa forma, o adulto proporcionará um

A palavra “social”, para Vygotsky (1931), é

Esta mediação diretiva desempenhada pelo

considerada muito importante, pois em um senti-

adulto é determinante também, do exercício

do mais amplo, significa que todo cultural é social,

da atenção do bebê que, sendo involuntária

sendo assim, apenas a cultura é um produto da

e muito inconstante, dependerá da natureza

vida social e da atividade social dos seres huma-

dos estímulos apresentados. A possibilidade

nos, por isso, é a própria abordagem para o pro-

de manejar as coisas amplia seu círculo de

blema do desenvolvimento cultural de comporta-

atenção, permitindo o treino de focalização e

mento que acaba levando diretamente para o nível

fixação a uma vasta gama de estímulos vi-

social do desenvolvimento. Diante disso, Vygotsky

suais, auditivos, táteis, etc. (MARTINS, 2012,

afirma que:

p. 11)

Todas as funções mentais superiores são internalizadas nas relações sociais, são a base

Diante disso, Azevedo (2003) descreve que

da estrutura social da personalidade. Sua

pais e escola devem possibilitar diversas intera-

composição, estrutura genética e modo de

ções entre parceiros, bem como situações de ex-

ação, em uma palavra, toda a natureza é so-

periências essenciais para a formação e constru-

cial, portanto, o homem mantém as funções

ção do indivíduo como pessoa. O papel social que

de comunicação com ele mesmo. (p. 150)

esses dois contextos possuem é de compreensão ao filho/aluno no âmbito de sua dimensão huma-

Ao se falar de mediação, é necessário res-

na, conhecendo o modo de funcionamento das

saltar que todas as pessoas pertencentes ao meio

emoções para aprender lidar de uma forma mais

da criança são mediadores. No entanto, cabe à

adequada possível com as suas expressões, per-

escola também esta função de socializar e de me-

mitindo que o filho/aluno exprima suas emoções e

diar a aprendizagem, organizando ações educati-

as canalizem para seu desenvolvimento integral.

vas mediadoras, nas quais a criança se relacionará

com seu entorno físico e social, tendo em vista ex-

internalização propicia o desenvolvimento da pró-

plorar as suas máximas possibilidades e potencia-

pria linguagem, bem como de todas as funções

lidades de desenvolvimento, desde o início (MAR-

psicológicas superiores. E é nesse contexto que a

TINS, 2012).

linguagem oral se torna importante para Vygotsky,

Assim, cabe ao adulto realizar ações que

por constituir-se um tipo de atividade simbólica de

incentivem a observação dirigida de objetos e a

primeiro nível que se relaciona aos processos fun-

atuação, por meio da comunicação verbal com a

damentais na aprendizagem e no desenvolvimento

criança, comunicando-se com a criança através de

humano. A partir dessas considerações, a impor-

uma linguagem correta, sem infantilizações, e dan-

tância da interação social em Vygotsky mostra-se

do nomes aos objetos que as rodeiam, denomi-

além do que a simples necessidade de a criança

nando-os, considerando seus significados e usos

relacionar-se com o outro. No que se refere à edu-

A linguagem propicia a internalização, e a

INEQ - Educação integral

23


cação infantil, fase em que se reconhece a impor-

e que as primeiras fases do desenvolvimento da

tância de diversos aspectos do desenvolvimento,

linguagem resumem-se à formação de reflexos

o desenvolvimento da linguagem oral através da

condicionados. Dessa forma, o ambiente torna-se

interação social, mostra-se tanto veículo (função)

fator determinante para que esse processo ocorra.

para o desenvolvimento, quanto objeto (forma).

O domínio da linguagem proporciona novas condi-

Assim, através do domínio da linguagem oral, a

ções de desenvolvimento psíquico, no entanto, o

criança amplia suas vivências, resignificando-as e

desenvolvimento cultural, a formação de reflexos

ampliando suas capacidades humanas.

condicionados não consegue elucidar. Para Vygotsky essa conexão nada mais é que uma relação

CONSIDERAÇÕES FINAIS

que se modifica constantemente no processo de desenvolvimento, evoluindo gradativamente em

um processo dinâmico.

cial influencia na aprendizagem e desenvolvimento

da linguagem, fornecendo condições de interação

evolui sem a linguagem, mas em um determina-

social entre adultos e crianças falantes. A lingua-

do momento de seu desenvolvimento os dois se

gem desenvolver-se-á através de estímulos forne-

cruzam e o pensamento começa a ser verbalizado.

cidos pelo ambiente que a cercam, e esse ambien-

Sendo assim, alguns autores citados no decorrer

te influenciará, não só na qualidade, mas também

do trabalho destacam a influência que o ambien-

na quantidade da fala dessa criança. Essa intera-

te proporciona ao desenvolvimento da linguagem

ção que ocorre entre os indivíduos proporciona a

infantil e o quanto essa interação entre adultos e

aquisição de conhecimentos através da relação

crianças medeia o processo de socialização pelo

interpessoal, que mediará todo o conhecimento

qual a criança passará no decorrer do seu desen-

entre eles, de forma que o ensino proporcionará

volvimento.

o desenvolvimento e não o contrário. Conclui-se,

também, que o desenvolvimento fisiológico se as-

ção ocorrerá em todos os contextos vivenciados

semelha proporcionalmente ao psicológico, onde

pela criança, quer seja ele escolar ou familiar,

as fases iniciais do desenvolvimento seguirão

ambos exercem papel fundamental no processo

rumo ao desenvolvimento adequado/esperado ou

de desenvolvimento e aprendizagem. O caráter

não. Na hipótese de ocorrer esse desenvolvimento

mediador não se aplica somente a aprendizagem

adequado, o qual a fonoaudiologia cita como “de-

da linguagem, mas em todo desenvolvimento da

senvolvimento normal da linguagem”, observa-se

criança, porém este trabalho embasou-se teorica-

que esse desenvolvimento ocorre de forma con-

mente na importância da mediação apenas no de-

junta com a psicologia, distinguindo-se apenas

senvolvimento da linguagem.

quando abordadas as questões de processamen-

to dessa linguagem, ou quando encontradas varia-

pessoas pertencentes ao meio da criança são me-

ções individuais que correspondem à maturação

diadoras. No entanto, cabe à escola também esta

infantil.

função de socializar e de mediar a aprendizagem,

Nas crianças pequenas, o pensamento

Cabe finalmente ressaltar, que a media-

De acordo com Martins (2012), todas as

Vygotsky (1931), em Obras Escolhidas,

organizando ações educativas mediadoras, nas

ressalta a importância do desenvolvimento da lin-

quais a criança se relacionará com seu entorno

guagem, destacando que todo aprendizado está

físico e social, tendo em vista explorar as suas má-

na base do acúmulo de experiências culturais,

ximas possibilidades e potencialidades de desen-

24

Pode-se constatar o quanto o ambiente so-

INEQ - Educação integral


volvimento, desde o início.

Sendo assim, cabe, portanto, ao adulto re-

alizar ações que incentivem a observação dirigida de objetos e a atuação, por meio da comunicação verbal com a criança, comunicando-se com a criança através de uma linguagem correta, sem infantilizações, e dando nomes aos objetos que as rodeiam, denominando-os, considerando seus significados e usos sociais, suas propriedades físicas mais evidentes (tamanho, cor, textura, forma, etc.). Dessa forma, o adulto proporcionará um caminho pelo qual a criança aprenderá a descriminar, analisar e diferenciar os objetos e fenômenos em suas propriedades mais importantes. REFERÊNCIAS AZEVEDO, C. As emoções no processo de alfabetização e a atuação docente. 1. ed. São Paulo: Vetor Editora, 2003. 254 p. BORGES, L.C.; SALOMÃO, N. R. Aquisição da linguagem: considerações da perspectiva da interação social. Psicologia: Reflexão e Crítica, v.16, n. 2, p. 327-336, 2003. BRUNER, J. Child´s Talk, Learning to Use Language. Tradução: CHAVES, Joana. Como as Crianças Aprendem a Falar. Horizontes Pedagógicos: 1983. CARVALHO, A. M. A.; BERALDO, K. E. A. Interação criança- criança: ressurgimento de uma área de pesquisa e suas perspectivas. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, n. 71, p. 55-61, novembro 1989. FELD, V. et al. Lenguas y language en la educación infantil: las formas tempranas de comunicación. Buenos Aires: Centro de Publicações Educativas y Material Didático, 2008. GAT. GRUPO DE ATENCÌON TEMPRANA. Libro Blanco de La Atenciòn Temprana. Doc. 55/2000. Madrid: Real Patronato de Prevenciòn y de Atenciòn a Personas com Minusvalìa. Ministerio de Trabajo y Assuntos Sociales. LURIA, A. R. Cognitive development: its cultural and social foundations (M. Lopez-Morillas & L. Solotoroff, Trad.s). Cambridge: Harvard University, 1976 (Original publicado em 1974). MARTINS, L. M. O ensino e o desenvolvimento da criança de zero a três anos. In A. Arce & L. M. Martins (Orgs.). Ensinando aos pequenos de zero a três anos (2a. ed.), Campinas: Alínea, 2012.

MONTOYA, A. O. D. Pensamento e linguagem: percurso piagetiano de investigação. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 11, n.1, p.119-127, jan./abr. 2006. OLIVEIRA – FORMOSINHO, J.; KISHIMOTO, M. T. Org. Formação em Contexto: uma Estratégia de integração. São Paulo: Pioneira Thompson Learning, 2002. PESSÔA, L. F.; SEIDEL-DE-MOURA, M. L.; OLIVEIRA, A. D. A análise da fala materna dirigida a bebês em duas etapas do desenvolvimento. Psicologia em Revista, Rio de Janeiro, UFRJ, n.2, p.74-86, julho-dezembro 2008. ______. L. F.; SEIDEL-DE-MOURA, M. L. Aquisição de Linguagem e o Papel do Outro: a questão do input linguístico materno. In: MALUF, M. R.; GUIMARÃES, S. R. K. Org. Desenvolvimento da Linguagem Oral e Escrita. Curitiba: Editora UFPR, 2008. ROTTA, N. T. et. al. Transtornos da Aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 2006. SABINI, M. A. C. Psicologia do desenvolvimento. 1. ed. São Paulo: Editora Ática S.A, 1993. 168 p. SANTROCK, J. W. Psicologia Educacional. Tradução DURANTE, M.; ROSEMBERG, T. S. M. G. São Paulo: Mc Graw Hill, 2009. SCARPA, M, E. Aquisição da linguagem. In. MUSSALIN, F; BENTES, A.S. Introdução à linguística: domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001. SICURO, Letícia M. Corrêa. O quê, afinal, a criança adquire ao adquirir uma língua? Revista Letras de Hoje, vol. 52, nº 1, PUCRS, 2017. VIANA, M. O papel da família no processo de aquisição da linguagem. Revista Symposium, Ano 4, número especial, UCP, dezembro 2000. VYGOTSKY, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. (1988) Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. Tradução de Maria da Penha Villalobos, São Paulo: Ícone, 2006- 10ª edição. ______, L.S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1989. ______. A Construção do Pensamento e da Linguagem. Tradução: Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2000- 1ª edição. ______. (1931) História del desarrolo de las funciones psíquicas superiores. IN Obras Escogidas, Tomo III. Madri: Visor e MEC, 1995. p. 11-340. educacionais. Porto Alegre, ArtMed, 2003. ZORZI, J.L. Aprendizagem e distúrbios da linguagem escrita: questões clínicas e educacionais. Porto Alegre, ArtMed, 2003. INEQ - Educação integral

25


Educação Inclusiva: Difícil, mas possível!1. Izabel Cristina Ferreira dos Santos Alves

Resumo:

Palavras – chave: Inclusão. Integração. Desafio. Transformação. Conscientização

Este artigo tem o objetivo de mostrar que

mesmo demandando esforço e dedicação de to-

Introdução:

dos os profissionais envolvidos, dos familiares e da comunidade, mesmo se constituindo em um

O mecanismo social que exclui e a um só

grande desafio, o processo de educação inclu-

momento pretende integrar o deficiente traz para

siva é necessário e é possível de ser construído.

ele e para todos nós uma confusão muito grande

Portanto, além de discutir a temática em relação

de pensamentos. O nosso raciocínio não entende

à integração/inclusão das pessoas com deficiên-

por que se fala tanto em integração e mesmo as-

cias nas classes comuns do ensino regular, este

sim o deficiente é marginalizado, visto que toda

trabalho almeja se constituir em um instrumento

pessoa deficiente ou não, que submetida à engre-

de reflexão para outros educadores. Atualmen-

nagem da estrutura sociocultural, não se encontra

te, a proposta de educação inclusiva tem gerado

em seu próprio mundo tende a se desligar dele e

polêmicas discussões entre os que adotam uma

como única alternativa tenta procurar outro mun-

posição integracionista, os que defendem a escola

do em que seja reconhecida. (RIBAS, 1989, p. 20).

inclusiva ou ainda aqueles que sentem a importância de uma educação especializada para o aluno

As crianças com deficiências sejam nas suas

com necessidades educacionais especiais. Ao

dimensões físicas, mentais ou sensoriais, têm sido

discutir sobre as possibilidades de uma educação

excluídas do convívio social. Atitude esta que trou-

inclusiva, uma educação para todas as crianças,

xe como consequência o desconhecimento e uma

visa-se o caminho para construção de uma socie-

grande resistência à participação dessas pessoas

dade menos injusta. Contudo, tem-se consciência

na vida social. Aprendemos a esquecer de que es-

de que no longo caminho a ser percorrido muitas

sas crianças existem e nos convencemos de que,

são as dificuldades a serem enfrentadas, princi-

para elas, o viver em sociedade não passava de

palmente as que dizem respeito às barreiras físi-

uma exposição desnecessária, já que elas seriam

cas e atitudinais, estas constituídas dos estigmas,

olhadas e tratadas como diferentes, inferiores e,

preconceitos e estereótipos presentes em nossos

por muitas vezes, não teriam condições sequer de

pensamentos, palavras e ações.

defender a si mesmas e aos seus direitos.

1- Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado no ano de 2005 à Faculdade Morumbi Sul da cidade de São Paulo, SP como requisito para graduação em Pedagogia. Professora de Educação Infantil na Prefeitura de São Paulo desde 2007, com Pós-graduação nas áreas de Gestão Educacional e Artes Visuais.

26

INEQ - Educação integral


A abordagem metodológica que mais se

estas pessoas, enquanto vistas como enviadas

adequou aos objetivos deste trabalho foi a de re-

divinas, eram pessoas especiais que deviam ser

latos orais uma vez que, ao favorecer a comuni-

protegidas e abrigadas, mas quando vistas como

cação de uma experiência, exigiu tanto a discus-

força maligna, deveriam ser exorcizadas, sacri-

são teórica do significado do processo de inclusão

ficadas. Em ambos os casos, eles justificavam a

educacional, como também a reflexão da prática

exclusão. Desta época constam relatos de tortura

em sala de aula.

e promiscuidade, da crueldade da inquisição, da

qual muitas pessoas diferentes do considerado Atitudes frente às pessoas com deficiências: Um

normal foram vítimas por conta de concepções

Breve Histórico

mitológicas, tendenciosas e fanáticas.

A história do atendimento às pessoas com

Na Idade Moderna, houve uma maior valo-

deficiências2 conta com pequena e esparsa do-

rização do ser humano pelo predomínio de filoso-

cumentação disponível. De acordo com Casarin

fias humanistas. Nesta época, iniciaram-se inves-

(1997), no universo greco-romano as pessoas com

tigações sobre as pessoas com deficiências do

deficiências eram eliminadas ou abandonadas

ponto de vista da medicina. Cresceram os estudos

para morrer (prática eufemisticamente denomina-

e experiências sobre a problemática das deficiên-

da como exposição). Crianças com deformidades

cias atreladas à hereditariedade, aspectos orgâni-

refletiam a ira divina, constituíam uma ameaça

cos, biotipologia e consequentemente, a atenção

ao rei ou à comunidade e com a exposição, tor-

se volta para a etiologia, a caracterização de qua-

navam-se purificadoras das faltas da comunidade

dros típicos, as distorções anatômicas, etc.

ou bodes expiatórios. Se sobrevivessem se transformavam em seres benéficos, redentores para

Por um lado, o avanço da ciência traz uma

sociedade. Pode-se então dizer que a exposição

melhor compreensão da condição orgânica e uma

visava à exclusão de seres maléficos

posição de ação diante da deficiência e não só de acomodação diante de forças sobrenaturais. Por

Segundo Ribeiro (2003), sob a influência do

outro, o conhecimento científico determinou uma

Cristianismo, as pessoas com deficiências passa-

visão patológica da pessoa com deficiência, tra-

ram a ser conhecidas como: “criaturas de Deus” e

zendo, como consequência, a manutenção da sua

por isso, não podiam mais ser abandonadas. Co-

segregação, a justificativa de sua institucionaliza-

meçou então, haver uma maior tolerância e uma

ção e o menosprezo da sociedade capitalista que

aceitação caritativa (que não deixa de ser uma

tem como modelo Ideal os seres humanos perfei-

forma de exclusão) traduzidas na prática por pre-

tos, produtivos, competentes e competitivos.

ocupações tais como: asilo, proteção e bem-estar. Mas não havia ainda preocupação com o desen-

É interessante observar que as atitudes

volvimento e com a educação das mesmas.

acima descritas – aproximação e afastamento, aceitação e rejeição – ainda se fazem presentes

Para a autora, a Idade Média podia ser ca-

nos dias de hoje com diferentes e sutis roupagens.

racterizada como o reinado da ambivalência. Pois 2 - Inicialmente falava-se em excepcionais, depois em deficientes, mais adiante em portadores de deficiência ou, ainda, em portadores de necessidades especiais, chegando-se hoje, com a Política Nacional de Educação Especial (1993), a portadores de necessidades educativas especiais. A tendência atual aponta para o termo pessoa com deficiência.

INEQ - Educação integral

27


De acordo com Palhares e Marins (2002),

mia e independência.

desde o século XVI, a história da educação inclusiva começou a ser traçada, por médicos pedago-

Desta Forma, Segundo (PALHARES E

gos, que desafiando os conceitos vigentes até o

MARINS,2002), a partir da década de 70, mu-

momento, passaram a acreditar na possibilidade

dou-se a filosofia em relação à educação es-

de educar crianças até então consideradas inedu-

pecial realizada em instituições especializadas.

cáveis. É importante ressaltar que como a educa-

Fundamentada no princípio de normalização,

ção formal era um direito de poucos, o trabalho

começa-se a discutir a idéia de educação inte-

deles corria paralelo a este; não havia um quadro

grada isto é, a possibilidade das crianças com

teórico ou prático de prestação de serviços, que

deficiências serem aceitas em escolas comuns,

pudesse servir de apoio, por isso tiveram liberdade

com base na crença de que pessoas diferen-

para realizar as primeiras experiências educacio-

tes têm o direito de conviver socialmente com

nais. O acesso à educação por parte dos portado-

as demais. Porém só eram passiveis de inclu-

res de deficiência foi sendo conquistado lentamen-

são aqueles estudantes que conseguissem se

te e somente no século XVIII deu-se inicio a uma

adaptar à classe comum; portanto sem modifi-

ampliação de oportunidades educacionais para

cações no sistema escolar. Já aqueles que por

a população geral, incluindo as pessoas com de-

diferentes razões não conseguissem se adaptar

ficiências. Contudo, deve-se deixar claro que este

ou acompanharem os demais alunos estariam

atendimento era realizado em instituições espe-

excluídos.

cializadas e, portanto, com marcas segregatórias.

Finalmente na segunda metade da dé-

A partir do meio do século XX, se forma-

cada de 80, surge a fase da educação inclusiva,

ram algumas propostas metodológicas de ensi-

cuja idéia central era que seria necessário rees-

no e uma organização de serviços educacionais;

truturar a sociedade para que ela possibilitasse a

na década de 50 nos países mais desenvolvidos,

convivência dos diferentes. Quanto à educação,

criou-se a filosofia de “normalização, integração”,

passa-se a defender um sistema educacional de

decorrente dos movimentos dos pais de crianças

qualidade, único, para todos os alunos com ou

a quem eram negados o ingresso em escolas co-

sem deficiência. A inclusão é um processo de-

muns, ficando assim o sistema educacional com

morado, pois envolve além do acesso, a perma-

dois subsistemas, o regular e o especial.

nência e o sucesso na escola. Não se trata de

uma mera mudança de endereço: tirar da escola

Surge com esse princípio o conceito de

que a pessoa com deficiência é uma pessoa com

especial e colocar na classe comum da escola regular. (PALHARES; MARINS, 2002. p.68).

direitos e deveres como qualquer outro ser humano. Contudo, o princípio da normalização deman-

Os autores acima acreditam que é im-

da grandes mudanças na educação especial, uma

portante ousar em direção à construção de uma

vez que ela precisa trabalhar com modalidades

proposta de educação inclusiva, que seja: racio-

mais integradoras. A escola deve abrir-se para

nal, responsável, responsiva em todos os níveis,

atender o aluno com deficiência, tendo como prin-

das instâncias de gerenciamento à sala de aula.

cípio o respeito aos seus interesses e às suas reais necessidades, de forma a lhe proporcionar autono-

28

INEQ - Educação integral

Pensar em um processo de educação inclusiva,


com todos os recursos necessários, para todos

O ponto de partida para uma possível su-

e em curto prazo, diante da realidade atual não

peração é compreendermos que critérios são uti-

será possível, mas podemos pensar em um proje-

lizados para caracterizar o ser diferente. Segundo

to consciente a ser construído dentro das nossas

Amaral (1998) o ser/estar diferente pressupõe

possibilidades.

a eleição de parâmetros, sejam eles estatísticos (moda e média), de caráter estrutural/funcional

Para que ocorra plenamente, a integração

(integridade de forma/funcionamento), ou de

deve ser considerada em seu aspecto social, ins-

cunho psicossocial, ou seja, “o tipo ideal”. O critério

trucional e temporal e supõe o envolvimento de

estatístico tem duas vertentes. A “média” – variá-

médicos, paramédicos, toda a equipe da escola,

vel matematicamente alcançada pelo cociente da

a família, a comunidade bem como apoio legal e

soma de n valores por n – e a “moda” – variável

ações governamentais. Visto que a presença de

que corresponde a um máximo de frequência em

preconceitos e a decorrente discriminação são vi-

uma curva de distribuição.

vidas, ainda com mais intensidade, pelos significativamente diferentes impedindo-os, muitas vezes,

No critério estrutural/funcional, tanto a

de vivenciar não só os seus direitos de cidadãos,

integridade da forma quanto a competência da

mas de vivenciar plenamente sua própria infância.

funcionalidade definem a diferença. Sabe-se que

(AMARAL, 1998, p. 12).

a espécie humana apresenta determinadas características que se correlacionam a órgãos específi-

Preconceito: Uma Possível Superação

cos, com estrutura e funções próprias, localizados de uma única forma. Qualquer alteração mais sig-

O preconceito configura-se como o grande

nificativa caracteriza o diferente/deficiente.

inimigo da integração/inclusão das pessoas com deficiências. Historicamente, tais atitudes foram

E por último, o ideológico ou “o tipo ideal” –

marcadas pela eliminação, segregação, discrimi-

construído e mantido pelo grupo dominante – cor-

nação. Ou seja, a sociedade resolveu a questão

responde à comparação entre uma determinada

da diferença evitando o confronto. Mas, como são

pessoa ou um determinado grupo.

criadas e mantidas as atitudes preconceituosas? Em que medida impedem o exercício da cidada-

De acordo com a autora, sabemos (mas

nia?

não confessamos) que existe em nosso contexto social esse tipo ideal e que perseguimos (consSão inúmeras as questões levantadas e

ciente ou inconscientemente) uma aproximação

dificilmente estamos aptos para reponde-las, mas

com essa idealização, uma vez que o afastamento

podemos reconhecer essa complexidade no con-

dela caracteriza “o ser diferente”.

texto e nas relações humanas, onde são estabelecidas as características do que é diferente. E por

A questão é que embora nem sempre cor-

acaso, não é exatamente o rotulado como “diferen-

respondendo a esse protótipo ideologicamente

te” o alvo de nossos preconceitos, justamente por

construído, é ele que utilizamos em nosso cotidia-

ser desconhecido, por nos causarem certo estra-

no para a categorização ou validação do outro. Ou

nhamento?

seja, com este preconceito já incutido, discriminamos, rejeitamos ou julgamos alguém pela sua INEQ - Educação integral

29


aparência física e, a partir daí, nos aproximamos

e portanto, adotando o princípio da inclusão, isto

ou não dessa pessoa.

é: “o ensino seja ministrado a todas as crianças, jovens e adultos com necessidades educativas es-

O Desafio de Uma Escola Inclusiva: Movimentos

peciais preferencialmente no sistema comum de

Precusores

educação” (RIBEIRO, 2003, p. 47).

Como sempre ocorre com tudo que é novo,

Atualmente, a Educação Inclusiva vem sen-

a proposta de uma educação inclusiva assusta,

do entendida como um processo em construção,

gera polêmica. Isso porque a maioria dos educa-

que deve estar presente nos diferentes níveis de

dores ainda não se deu conta de que para receber

educação escolar, isto é, abrangendo da Educação

em sala de aula uma criança com necessidades

Infantil ao ensino médio e superior, bem como as

especiais, o professor não necessariamente, deva

demais modalidades da educação escolar, como a

ser um especialista na área. É importante ter boa

educação de jovens e adultos e a educação profis-

vontade e determinação, estar preparado psicoló-

sional.

gico e emocionalmente para enfrentar este desafio, procurar ter cautela e bom senso na hora de

Diante desta realidade há hoje a necessi-

estabelecer os objetivos e não criar muitas expec-

dade da escola se preparar para inclusão desde a

tativas para que se evitem as frustrações; enfim,

implantação do seu Projeto Político Pedagógico

manter os pés no chão, encontrar um equilíbrio,

(PPP), comprometendo-se, assim, com uma edu-

não antecipar sofrimento e procurar resolver os

cação de qualidade para todos os seus alunos.

problemas na proporção que eles forem surgindo.

Com isso o aluno não precisará se amoldar à escola, mas a escola consciente do seu papel se co-

Portanto, pode-se dizer que a educação in-

locará à disposição do aluno, tornando inclusiva

clusiva implica em um processo, planejado, grada-

a sua prática diária. Para que a inclusão torne-se

tivo e contínuo de melhoria da escola, com o fim

realidade mais do que decreto, precisamos que as

de utilizar todos os recursos disponíveis visando à

escolas avaliem suas reais condições, possibilitan-

participação e a aprendizagem de todos os alunos

do assim uma inclusão planejada, gradativa e con-

lá inseridos.

tínua, de alunos com necessidades educacionais

especiais.

A Declaração de Salamanca sustenta que

as escolas regulares com uma orientação inclusi-

No âmbito político, os sistemas escolares

va são as mais eficazes de combater atitudes dis-

garantem a matrícula de todo e qualquer aluno,

criminatórias, de edificar uma sociedade inclusiva

inclusive os com necessidades educacionais es-

e de conseguir educação para todos.

peciais. Segundo Ribeiro e Baumel (2003), para que se avance nessa direção, é essencial que os

Em 1996, a nova Lei de Diretrizes e Bases

sistemas de ensino busquem a demanda real de

da Educação Nacional (Lei 9.394/96) traz o com-

atendimento a estes alunos especiais, mediante

promisso de uma ação educativa para o exercício

criação de sistemas de informações, que além do

da cidadania. Neste contexto, a Educação Especial

conhecimento da demanda possibilitem a iden-

passa a ser entendida como modalidade de edu-

tificação, análise, divulgação e intercâmbio de

cação escolar, parte integrante da educação geral

experiências educacionais inclusivas, buscando

30

INEQ - Educação integral


apoio nos órgãos governamentais responsáveis

REFERÊNCIAS

pelo censo escolar e pelo censo demográfico, para atender a todas as variáveis implícitas à qualidade do processo formativo desses alunos.

AMARAL, Lígia Assumpção. Sobre crocodilos e avestruzes: falando de diferenças físicas, preconceitos e sua superação. In: AQUINO, Júlio Groppa (Org.).

Diferenças e

Conclusão:

preconceito na escola: alternativas teóricas e práticas. São

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabele-

É perfeitamente compreensível que tama-

nha mudança não ocorra da noite para o dia. Sabemos que não se pode mudar toda uma estrutura educacional de maneira tão radical, de uma hora

Paulo: Summus, 1998. p.12

ce as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf>. Acesso em: 20 abr. 2005.

para outra. Entretanto, podemos nos alegrar por

CASARIN, Sonia. Reflexões sobre a integração social da pes-

chegarmos a essa conclusão, pois a partir dela

soa deficiente. In: MANTOAN, Maria Teresa Eglér. A integração

poderemos caminhar rumo à inclusão de maneira firme e determinada. A confiança e a fé é o que nos move e o que hoje parece apenas uma gota no oceano no futuro fará toda diferença. Acreditamos na integração como processo e na inclusão como resultado. E é justamente por ser processo que a integração social deve ser estabelecida nos níveis físico, funcional e interpessoal, ou seja a criança deve ser recebida, tratada como igual, ter as mesmas obrigações que os demais e ser respeitada na sua diferença e na sua integridade. Segundo Paulo Freire, (1993 p.27) Quanto mais respeitarmos os alunos e alunas independentemente de sua cor, sexo, classe social, quanto mais testemunhos dermos de respeito em nossa vida diária, na escola, em nossas relações com os colegas, com zela-

das pessoas com deficiências: contribuições para uma reflexão sobre o tema. São Paulo: Memnon Editora SENAC, 1997. p. 215-219. ITANI, Alice. Vivendo o preconceito em sala de aula. In: AQUINO, Júlio Groppa (Org.). Diferenças e preconceito na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, 1998. p.119-134. PALAHARES, Marina Silveira; MARINS, Simone. Escola inclusiva. São Carlos: Edufscar, 2002. 286 p. RIBAS, João Batista Cintra. O que são pessoas deficientes. São Paulo: Brasiliense, 1989. 20 p. (Coleção Primeiros Passos) RIBEIRO, Maria Luisa Sprovieri. Perspectivas da escola inclusiva: algumas reflexões.

dores, cozinheiros, vigias, pais e mães de alunos,

In: RIBEIRO, Maria Luisa Sprovieri; BAUMEL, Roseli Cecília Ro-

quanto mais diminuirmos a distância entre o que

cha de Carvalho (Org.). Educação especial: do querer ao fazer.

dizemos e o que fazemos, tanto mais estaremos

São Paulo: Avercamp, 2003. p. 41-50, 191.

contribuindo para o fortalecimento de experi-

UNESCO.

ências democráticas. Estaremos desafiando-nos

sobre necessidades educativas

a nós próprios a mais lutar em favor da cidadania e de sua ampliação. Estaremos forjando em nós a indispensável disciplina intelectual sem a qual obstaculizamos nossa formação bem como, a não menos necessária disciplina política, indispensável à luta para a invenção da cidadania.

Declaração de Salamanca e linha de ação:

especiais. Brasília: CORDE, 1994. 54 p. FREIRE, Paulo. Professora sim tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho D´água, 1993. 127 p. ______. Inclusão escolar: o que é? por quê? como fazer? São Paulo: Moderna, 2003.

INEQ - Educação integral

31


Uma reflexão sobre o percurso para a ressignificação: o currículo escolar brasileiro Katia Regina Vinhas de Morais1

RESUMO

ção de 1988, mais tarde com a LDB2 em dezembro de 1996, além da publicação de diferentes leis

O artigo procura refletir sobre as mudan-

e diretrizes, contribuíram para redimensionar a

ças na concepção de currículo que vêm compondo

organização escolar brasileira. Pode-se dizer que

estudos e documentações brasileiras nas últimas

muitos avanços têm sido conquistados no sentido

décadas. Gradativamente estamos nos afastando

de pensar a escola como espaço democrático de

de uma escola excludente e classificatória e enten-

construção de saberes e transformação social.

dendo a importância e a grandeza social da Educa-

Como ponto de partida, podemos trazer a ideia da

ção Democrática.

“escola para todos”, que procurou romper com a

PALAVRAS – CHAVE: Currículo, Escola Pública;

concepção tecnicista, bem como trazer o entendi-

Educação Democrática.

mento de um currículo em constante transformação. A possibilidade de as escolas e diferentes sis-

ABSTRACT

temas educacionais terem autonomia para gerir recursos e realizar a construção de seu Projeto Po-

The article discuss to reflect on the changes in cur-

lítico Pedagógico também podem ser vistos como

riculum design that have been composing Brazi-

pontos de grande avanço das últimas décadas.

lian studies and documentation in recent decades. Gradually we are moving away from an exclusio-

Corazza (2008), ao fazer uma contextuali-

nary and classification school and understanding

zação histórica acerca da concepção de currículo

the importance and social greatness of Democra-

aponta para o momento de politização da escola

tic Education.

e, ao se pensar a escola. Um momento onde as

KEYWORDS: Curriculum, Public School; Democra-

ideias iluministas e o olhar mercadológico capita-

tic Education.

lista voltado à educação passam a ser fortemente contestados.

1. INTRODUÇÃO

Os referenciais e diretrizes procuram trazer

A concepção acerca do currículo escolar

a organização curricular destacando a importân-

passou por grandes alterações a partir da década

cia e a necessidade de serem incluídos os temas

de 90 no Brasil. Com a promulgação da constitui-

transversais, inclusão, a temática dos direitos de

1 - Coordenadora Pedagógica na PMSP, especialista em Psicopedagogia pela Universidade Paulista-Unip; Pedagoga pela Universidade Paulista-Unip; kativinhas@hotmail.com 2 - LDB: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira.

32

INEQ - Educação integral


todos, da diversidade (gênero, etnia e culturais)

Outro aspecto que tem sido bastante dis-

etc. Muito há de importante e até pertinente nos

cutido e observado é o do currículo oculto, ou seja,

documentos como, inclusive, o destaque à neces-

tudo aquilo que permeia as relações e os fazerem

sidade de uma melhor formação inicial e contínua

das escolas e que está carregado das mais dife-

dos educadores. Porém na realidade, o que preva-

rentes concepções, ideologias e incorporadas de

lece, ainda hoje, em nossas escolas é a pedagogia

maneira “silenciosa” e velada. Desta forma as rela-

livresca e dominada pelos conteúdos a serem re-

ções de poder continuam a permear as atitudes da

passados aos estudantes. (BARRETO, 2006)

e na escola. As diferentes concepções sociais, as dominações, preconceitos etc. têm grande influ-

Outro destaque é a concepção de Gestão

ência nos fazeres escolares. Como aponta Apple:

Democrática que visa aproximar os atores das co-

“[...] o currículo oculto pode ter uma série de danos

munidades educativas, possibilitando diferentes

como todos sabemos [...] tem múltiplas mensa-

discussões, olhares e organização dos fazeres

gens...” (2012, p. 05).

da escola que sejam significativos e atendam às necessidades locais. A formação dos Conselhos

Portanto devemos trazer à luz dos debates

Escolares, grêmios e demais associações con-

escolares as relações de dominação e exclusão

tribuem muito para a tomada de decisões e pro-

ainda presentes nas sociedades. Pensar no cur-

postas referentes à utilização dos recursos finan-

rículo das diversidades e minorias, das relações

ceiros, Projeto Político Pedagógico, eventos, entre

pacíficas e respeitosas entre todos. Deve haver no

outros.

currículo a transcendência dos conteúdos, o rompimento dos ainda existentes muros escolares e A mudança na concepção de avaliação

muito disso só será possível com a formação con-

também vem passando por grandes mudanças.

tínua e a valorização dos profissionais da educa-

O olhar excludente, seletivo dá lugar à avaliação

ção. (CORAZZA, 2008)

diagnóstica e formativa, instrumento que oferece ao professor a oportunidade de reorganizar seus

No Brasil tivemos no início dos anos 2000

planejamentos e ações. A ideia de ciclos de apren-

leis que, ao alterar a LDB, tornam obrigatórios nas

dizagem também oportuniza grande diferenciação

escolas o trabalho com a temática dos negros,

ao então currículo seriado, pois possibilitou a per-

história da África e dos indígenas3. As leis foram

manência na escola daquela camada da popula-

garantidas através de muitas lutas sociais que de-

ção, que devido ao grande número de repetências

vem continuar a fim de trazermos à tona. Ao cen-

abandonavam precocemente os estudos (BARRE-

tro da escola e consequentemente da sociedade,

TO, 2006). Porém, ainda segundo Barretto: “Não

o lugar de direito de todos os cidadãos, sejam eles

bastam apenas decretos ou regulamentos para

negros, indígenas, homens, mulheres, homossexu-

instituir os ciclos, uma vez que eles são apenas

ais, deficientes, imigrantes, velhos e crianças.

orientações bem gerais que dependem da construção coletiva de um novo modelo de escola que

faça frente as dificuldades seculares que assolam

participando de momentos de grande importância

o ensino brasileiro”. (BARRETTO, 2006, p.11)

para rompermos com práticas seculares de edu-

Desta forma, entendemos que estamos

3 - Leis: 10.639/03; 11.645/2008. INEQ - Educação integral

33


cação autoritária e caminhando para garantir a escola

infantil: realidade e utopia projetadas na es-

pública e de qualidade no Brasil.

cola “brincar e ser criança”. In: Educação em Revista. Marília, v. 9, no. 1, p. 61-76 jan-jun,

REFERÊNCIAS

2008. Disponível em: http://www2.marilia. unesp.br/revistas/index.php/educacaoemre-

BARRETO, E.S de Sá. Tendências Recentes do Currículo

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na Escola Básica. In: Fundação Carlos Chagas: Difusão

08/04/2016.

de Ideias. 2006. Disponível em: http://www.cfge.ufscar.

SILVA, M. V, MARQUES, M.R. A, GANDIN, L.A.

br/file.php/460/Material_didatico/tendencias_recen-

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de_sa_barreto.pdf Acesso em: 07/04/2016.

râneas - Entrevista com Michael Apple. In:

BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Edu-

Currículo sem Fronteiras, v.12, n.1, pp.175-

cação Infantil. Brasília: MEC/SEB, 2010. Disponível em:

184, 2012. Disponível em: http://www.cfge.

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_do-

ufscar.br/file.php/460/Material_didatico/

cman&task=doc_download&gid=9769&Itemid= Acesso

contradicoes_e_ambiguidades_do_curricu-

em: 08/04/2016.

lo_e_das_politicas_educacionais_contem-

_______. Presidência da República. Lei nº 10.639/2003

poraneas_entrevista_com_michael_apple_

de 09 de janeiro de 2003 altera a Lei nº 9.394, de 20 de

maria_vieira_silva_mara_rubia_alves_mar-

dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases

ques_luis_armando_gandin.pdf Acesso em:

da educação nacional, para incluir no currículo oficial

23/03/2016.

da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências. _______. Presidência da República. Lei nº 11.645/2008, de 10 de março de 2008, altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. _______. Constituição (1998). Constituição da República Federativa Do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. _______. Senado Federal. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: nº 9394/96. Brasília: 1996. CORAZZA, S. M. Currículo na contemporaneidade. Brusque, Blumenau. 2008. Disponívelem: http://www. cfge.ufscar.br/file.php/460/Material_didatico/curriculo_na_contemporaneidade_sandra_mara_corazza.pdf Acesso em: 07/04/2016. LOPES, Rosemar P. Aspectos estruturais, organizacionais, pedagógicos e humanos da escola de educação

34

INEQ - Educação integral


A importância de trabalhar as questões étnico-raciais na educação infantil Marlene Anastácio Sales1

RESUMO

ve the contribution to the construction of practices in the infantile education, practices that have the

É citado em muitas reuniões pedagógicas

purpose to promote the racial equality, providing

e até mesmo em cursos de aperfeiçoamento que

through this reading a reflection on the pedago-

a discriminação e o preconceito não fazem parte

gical practices in classroom, in which the educa-

do cotidiano da educação infantil, bem como não

tors are instigated to promote practices capable of

há conflitos entre as crianças, por conta dos seus

valuing social equality.

pertencimentos raciais. Neste artigo temos como

KEYWORDS: Early Childhood Education; Toys; Eth-

principal objetivo contribuir para a construção de

nic Racial.

práticas na educação infantil, práticas as quais possuam a finalidade de promover a igualdade

INTRODUÇÃO

racial, proporcionando por meio desta leitura uma reflexão sobre as práticas pedagógicas em sala

O espaço de educação infantil é um espa-

de aula, na qual os educadores sejam instigados a

ço privilegiado para o estabelecimento de inúme-

promover práticas capazes de valorizar a igualda-

ras relações sociais, nas quais cada aprendizagem

de social.

pode torne-se significativas para as crianças. Este artigo busca mostrar a importância das múlti-

PALAVRAS – CHAVE: Educação Infantil; Brinque-

plas linguagens na educação infantil e como estas

dos; Étnico Racial.

podem favorecer para o desenvolvimento da criança, em especial na fase em que frequentam a edu-

ABSTRACT

cação infantil. As brincadeiras são muito utilizadas como recurso pedagógico e é de excelência para

It is said in many pedagogical meetings

efetivar propostas de aprendizagem relacionadas

and even in courses of improvement that discrimi-

a cooperar, a socializar valores, respeitar o outro,

nation and prejudice are not part of the daily routi-

superar as diferenças e aceitar a si mesmo.

ne of children’s education, as well as there are no conflicts between children, because of their racial

Diante disso, buscaremos objetivar o quão

belongings. In this article we treat as main objecti-

importante é o trabalho com as questões étnico ra-

1 - Formada pela Faculdade da Aldeia de Carapicuíba. Desde 1981, atua como Professora de Educação Infantil, atualmente é Professora no CEU CEI Vila Atlântica.

INEQ - Educação integral

35


ciais na educação infantil e o quanto a valorização

ças quanto a questões tão relevantes para a sua

das diferenças pode ser importante para múltiplas

formação pessoal e social, a fim de que saibam

questões, tais como a autoestima, o respeito, a va-

intervir e construir a sua própria história de vida.

lorização do outro, dentre tantas outras questões que podem ser abordadas com o trabalho étnico – racial.

1. A LEI N. 10639/03 NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Justificamos esse artigo, levando em con-

É durante a educação infantil que as crian-

ta o quão importante é fazer um trabalho peda-

ças começam a conhecer seu corpo, bem como

gógico na sala de aula com base na diversidade

as diferenças e semelhanças entre os colegas de

cultural, especialmente as diferenças étnicas, pois

seu grupo; fazem suas escolhas sobre com quem

desde cedo é preciso que as crianças reconheçam

brincar e se relacionar na escola e, além disso, co-

as diferenças que existem entre elas e o outro, e

meçam a ter as suas preferências por alguns brin-

isso só é possível mediante da apresentação de

quedos, sendo assim, são necessário que o edu-

materiais, vídeos, brinquedos, brincadeiras e so-

cador trabalhe em sua sala de aula as questões

bretudo por intermédio de muito respeito a si e ao

sobre as diferenças e, em especial, aquelas que

outro.

estão relacionadas ao pertencimento racial, não só com as crianças, mas também com as famílias

A criança aprende por intermédio das brin-

e com a comunidade. (CEERT, 2011).

cadeiras. Desta forma, todos os conteúdos podem e devem ser ensinados por meio de jogos e brinca-

A educação infantil é o primeiro recinto ins-

deiras, em atividades que sejam de predominância

titucionalizado o qual a criança tem acesso.Isto

lúdica, pois não existe nada que a criança preci-

significa que é com base na educação infantil que

se saber que não possa ser ensinado brincando

ela passa a conviver com a coletividade e, por isso,

(LIMA, 1987, p. 33).

precisa ter oportunidades para aprender regras de convivência, regras as quais devem ser pautadas

A brincadeira é fundamental para a forma-

no respeito por si e pelo outro.

ção social da criança, que, por meio dela cria situações, integra-se com a sociedade e transforma o

seu mundo, relacionando-se com as demais pes-

Educação Infantil ressaltam:

soas a sua volta.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para Art. 7°. Na observância dessas Diretrizes, a proposta pedagógica das instituições de

As relações étnico-raciais não acontecem

Educação Infantil deve garantir que elas cum-

somente quando somos “grandes”, acontecem em

pram plenamente sua função sociopolítica e

toda a história de nossas vidas. Devemos auxiliar

pedagógica:

os pequenos cidadãos a valorizar suas diferentes características étnicas e culturais desde a educa-

I – Oferecendo condições e recursos para

ção infantil. Por intermédio deste trabalho, quere-

que as crianças usufruam seus direitos civis,

mos reafirmar a afirmação de Freire (1987): “todo

humanos e sociais;

o futuro é a criação que se faz pela transformação do presente”. É preciso orientar as nossas crian-

36

INEQ - Educação integral

II – Assumindo a responsabilidade de com-


partilhar e complementar a educação e cui-

por civilizações, histórias, grupos sociais e étnicos.

dado das crianças com as famílias;

As crianças na educação infantil podem ser reeducadas a lidar com os preconceitos aprendidos

III – Possibilitando tanto a convivência entre

no ambiente familiar e nas relações sociais mais

as crianças e entre adultos e crianças quanto

amplas. Educar para a igualdade étnica é tarefa

à ampliação de saberes e conhecimentos de

urgente e imprescindível para a construção da so-

diferentes naturezas;

ciedade de amanhã.

IV – Promovendo a igualdade de oportuni-

Na Lei nº. 8069 de 13 de Julho de 1990 (ECA) dis-

dades educacionais entre as crianças de di-

põe:

ferentes classes sociais no que se refere ao

A criança e o adolescente tem direito a liber-

acesso a bens culturais e às possibilidades

dade, ao respeito e a dignidade como pesso-

de vivência da infância;

as humanas em processo de desenvolvimento e como sujeito de direitos civis, humanos e sociais garantidos na constituição e nas leis:

V – Construindo novas formas de sociabilidade e de subjetividade comprometidas com a ludicidade, a democracia, a sustentabilida-

Art. 16 – O direito a liberdade compreende

de do planeta e com o rompimento de rela-

dentre os aspetos: II – Opinião e expressão e

ções de dominação etária, socioeconômica,

III – Crença e culto religioso;

étnico – racial, de gênero, regional, linguística

Art. 17 – O direito ao respeito consiste na in-

e religiosa.

violabilidade de integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da autonomia,

dos valores, ideais e crenças, dos espaços e

De acordo com a Lei nº. 10. 639/2003, a

objetos pessoais;

educação infantil tem um papel muito significativo para o desenvolvimento humano, a formação da personalidade, a construção da inteligência e

Art. 18 – É dever de todos velar pela digni-

a aprendizagem. O espaço escolar nos primeiros

dade da criança e do adolescente, colocando

anos de vida tem o privilegio de promover a elimi-

– os a salva de qualquer tratamento desuma-

nação de qualquer forma de preconceito, racismo

no, violento, aterrorizante, vexatório ou cons-

e discriminação, fazendo com que as crianças,

trangedor.

desde bem pequenas consigam compreender e se envolver em ações que valorizem a importância dos diferentes grupos étnicos raciais para história

Assim sendo, as crianças precisam ser e

e cultura brasileira (Brasil-MEC, 2003).

sentir-se respeitadas, acolhidas e independentemente de crença, etnia e religião, precisam apren-

Desde muito cedo é possível conhecer e

der a conviver com a diversidade, não somente no

aprender sobre diferentes realidades e compre-

ambiente escolar, mas também em seu ambiente

ender que as experiências sociais do mundo são

familiar e, claro, em qualquer outro que seja fre-

muito maiores do que a nossa experiência local, e

quentado por ela.

que esse mesmo mundo é constituído e formado INEQ - Educação integral

37


É necessárias que as Professoras (Profes-

ação, acabam (o que é muito triste) deixando de

sores), estejam preparadas(os) para lidar com as

lado o devido valor a si mesmos e aos seus grupos

questões das diferenças, em especial as diferen-

de pertencimento.

ças de cunho étnico. Desta maneira, é necessário que estejam aptos a explicar para as crianças as

Para o Professor de educação infantil, o

diferenças culturais e sociais nas estas fazem. Ou

fato de a criança “não querer brincar com a boneca

seja, é necessário mostrar para criança que a hu-

negra”, ignorando-a nas brincadeiras, ou até mes-

manidade não é um todo uniforme, mas sim um

mo não querer dar a mão para uma criança negra

mosaico rico e diversificado.

na hora de uma brincadeira de roda ou em outra brincadeira qualquer, pode ser considerado abso-

De acordo com Trinidad (2011), para traba-

lutamente normal (no caso do docente que está

lhar a diversidade étnica com as crianças, a par-

desatento à questão étnica), não havendo nenhum

ticipação da família é primordial. Os pais e fami-

tipo de interferência e não se dando conta que não

liares devem estar informados sobre as atividades

fazer as intervenções nos momentos certos pode

que acontecem na escola e quais seus objetivos e,

estar potencializando e reforçando a discrimina-

especialmente, serem informados sobre a impor-

ção e o preconceito com relação às crianças ne-

tância da sua participação, trazendo informações

gras.

sobre a cultura que a criança tem em casa, a formação e os hábitos familiares, suas atividades aos

Desde muito pequenas, as crianças con-

finais de semana, seus rituais religiosos etc. Todas

seguem perceber as diferenças nas relações, po-

as informações sobre a família são extremamente

dendo assim associá-las ao pertencimento socio-

ricas para serem consideradas na prática pedagó-

cultural. Muitas vezes dentro da sala de aula, as

gica junto a à criança.

crianças negras não recebem as mesmas atenções que a criança branca recebe. Infelizmente, não há como negar que o preconceito e discri-

2. RELAÇÕES RACIAIS E O SILÊNCIO NO ESPAÇO

minação constituem um problema que afeta em

ESCOLAR

maior grau a criança negra, visto que ela sofre em seu cotidiano, maus-tratos, agressões e injustiças,

De acordo com Eliane Cavalleiro (2003),

o silêncio que vem atravessando os conflitos ét-

que afetam diretamente sua infância e comprometem seu desenvolvimento.

nicos na sociedade é o mesmo que vem dando

38

sustentação ao preconceito e a discriminação no

interior das escolas. É no silêncio que ocorrem si-

tuações, o despreparo dos educadores em se re-

tuações diversas no espaço escolar e que podem

lacionar com os alunos negros, evidenciando tam-

ter influência direta na socialização das crianças,

bémo desinteresse em inclui-los positivamente na

mostrando-lhes diferentes lugares para pessoas

vida escolar. O fato dos profissionais da educação

brancas e negras. Esse silêncio é o alimentador de

interagirem com as crianças negras diariamente

desigualdades que são impostas pela sociedade

não significa que se preocupem em conhecer as

e que contribuem para que alunos afrodescenden-

suas especificidades e necessidades.

tes se sintam impossibilitados de lutar com seus

Vejamos o que diz as Diretrizes Curriculares Nacio-

instrumentos culturais, pois sofrendo com tal situ-

nais para Educação das Relações Étnicos-raciais e

INEQ - Educação integral

É muito comum encontrarmos, nessas si-


para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira

o Brasil, um país miscigenado e com a maior parte

e Africana (03/2004) a respeito do racismo e ao

de sua população sendo mestiça.

combate a este:

De acordo com as Diretrizes Curriculares

Valorização da oralidade, da corporeidade e

Nacionais para a Educação Infantil (2009), em seu

da arte, por exemplo, como a dança, marcas

artigo 9º e incisos VII e XI, vemos que as práticas

da cultura de raiz africana, ao lado da escrita

pedagógicas que compõem a proposta curricular

e da leitura; educação patrimonial, aprendiza-

da educação infantil devem ter como eixos norte-

do com base no patrimônio cultural Afro-bra-

adores as interações e a brincadeira, garantindo

sileiro, destinadas a preservá-lo e a difundi-lo;

experiências que possibilitem vivências étnicas e

cada família e suas crianças são portadoras

estéticas com outras crianças e grupos culturais,

de um vasto repertório que se constituí em

ampliando, assim, seus padrões de referência e de

material rico e farto para o exercício do dia-

identidade no dialogo e reconhecimento da diversi-

logo aprendizagem com a diferença, a não

dade, proporcionando a interação e o conhecimen-

discriminação e as atitudes não preconceitu-

to por parte das crianças em relação às manifesta-

osas.

ções e tradições culturais brasileiras.

Partindo do pressuposto acima, ao cala-

De acordo com Munanga (2005), alguns

rem-se, os docentes acabam contribuindo para

Professores, seja por sua falta de preparo ou por

que aconteçam cada vez mais práticas discrimi-

preconceitos já introjetados, não conseguem

natórias, colaborando, assim, para que as crianças

lançar mão das situações de discriminação no

negras cresçam tímidas, temerosas e envergo-

espaço escolar e na sala, momento pedagógico

nhadas de si mesmas, e, por outro lado, a esco-

privilegiado para discutir a diversidade e a riqueza

la passe a ser vista por estas crianças como um

que ela traz a nossa cultura e a nossa identidade

ambiente que não a acolhe, que não valoriza a sua

nacional. Na maioria dos casos, praticam a políti-

história e cultura e não a protege contra a violência

ca de avestruz ou sentem pena dos “coitadinhos”

e a discriminação étnico-racial. Além disto, o silên-

em vez de uma atitude responsável que consistiria

cio durante as cenas de preconceito no interior da

em mostrar que a diversidade constitui um fator

escola, faz com que as crianças brancas cresçam

de complementaridade e de enriquecimento da

acreditando em sua superioridade, fato que não

humanidade , ajudando o aluno discriminado, e os

é verídico, pois todas as crianças são detentoras

demais estudantes, a assumir, com orgulho e dig-

das mesmas condições naturais e dos mesmos

nidade, os atributos de sua diferença, aprendendo,

direitos, sendo o principal deles a igualdade.

por fim, que tal diferenciação é apenas uma construção social que distorce a real natureza humana.

Para Cavalleiro (2003), o acesso à educa-

.

ção é um direito de todos os cidadãos, independente de sua etnia, credo ou condição social, por-

3. A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DE EDUCA-

tanto, é completamente contraditório o espaço

ÇÃO INFANTIL

escolar não estar apto a receber crianças negras nas mesmas condições de respeito e igualdade,

A formação do professor deve estar articu-

especialmente quando falamos de um país como

lada a renovação do Projeto Politico Pedagógico INEQ - Educação integral

39


da instituição e ter como objetivo principal apro-

gras com cabelos para serem penteados, resgates

ximar, de forma significativa, o universo das crian-

de brincadeiras africanas, ou seja, tudo aquilo que

ças, o universo da sala de aula, com as pesquisas

possa reforçar a identidade das crianças afrodes-

em educação e os conhecimentos produzidos pelo

cendentes.

Professor com base em análises e reflexões. De acordo com Gomes, 2005:

Desde pequenas, as crianças conseguem

construir conceitos do que é bom e do que é ruim, e na maioria das vezes veem seus educadores

Para que a escola consiga avançar na rela-

como seus maiores exemplos, assim qualquer

ção entre saberes escolares, realidade social,

conceito que seja passado pelos educadores de

diversidade étnico cultural, é preciso que os

forma errada, pode ser visto como um padrão de

educadores compreendam que o processo

comportamento.

educacional também é formado por dimensões como a ética, as diferentes identidades,

A mídia também é grande propagadora de

a diversidade, a sexualidade, a cultura, as re-

padrões de beleza, seja de forma intencional ou

lações raciais, entre outras. E trabalhar com

não, portanto é preciso que seja apresentado para

essas dimensões não significa transformá-

as crianças as igualdades, mesmo que buscar a

-las em conteúdos escolares ou temas trans-

igualdade não pressuponha deixar com que todos

versais, mas ter a sensibilidade para perceber

sejam iguais dentro de uma cultura, afinal a igual-

como esses processos constituintes da nos-

dade não elimina as diferenças. O que não pode-

sa formação humana se manifesta na nossa

mos deixar que aconteça é a ideia de igualdade ser

vida e no próprio cotidiano escolar.

utilizada, de forma distorcida, para mascarar o pre-

Dessa maneira, poderemos construir coleti-

conceito e a discriminação que existe ainda hoje.

vamente novas formas de convivência e de respeito entre professores, alunos e comunidade. É preciso que a escola se conscientize

4. OS AMBIENTES E A APRENDIZAGEM

cada vez mais que ela existe para atender a sociedade na qual está inserida e não aos

Os ambientes para igualdade racial du-

órgãos governamentais ou aos desejos dos

rante a aprendizagem devem estar abertos a ex-

educadores. (, 2005).

periências infantis e possibilitar que as crianças expressem seu potencial, suas habilidades, curiosidades e possam construir uma autoimagem po-

Os Professores devem estar atentos a pro-

sitiva. Educar para igualdade étnico-racial na edu-

porcionar mudanças que estimulem formas posi-

cação infantil significa ter cuidado não somente

tivas de interação além de estimular perspectivas

na escolha de livros, brinquedos, mas também de

entre as crianças, isso pode ocorrer de diversas

cuidar dos aspectos estéticos, como a eleição de

formas como, por exemplo, na realização da lei-

materiais gráficos de comunicação que valorizem

tura de história na qual surjam heróis e princesas

a diversidade racial.

negras, a fim de mostrar que pessoas negras têm

40

papéis de destaque positivos; ter brinquedos que

representem a cultura negra, como bonecas ne-

deixar com que crianças sofram diariamente com

INEQ - Educação integral

Não podemos continuar com o silêncio e


situações que as empurram e as mantêm em per-

A contação de histórias merece lugar de

manente estado de exclusão da vida social. É im-

destaque na sala de aula. Ela é o veículo com o

prescindível, neste sentido, que seja elaborado um

qual as crianças podem entrar em contato com

trabalho que seja capaz de promover o respeito,

um universo de lendas e mitos e enriquecer o re-

reconhecimento da diferença, possibilidade de se

pertório. Textos e imagens que valorizam o res-

falar sobre elas sem receio e sem preconceito.

peito às diferenças são sempre muito bem-vindos.

Sendo assim, a utilização de músicas e

danças que fazem partes das diferentes manifes-

Apresentação de bonecos negros, nas

tações culturais deve ser a base do trabalho so-

quais as crianças criam laços com esses brin-

cializador das crianças, fazendo parte do cotidiano

quedos e se reconhecem também é ponto essen-

das unidades escolares e do trabalho do Professor

cial na construção e valorização de suas identi-

de educação infantil. Temos diversas heranças

dades. É interessante associar esses bonecos ao

culturais dos povos africanos, como a capoeira,

cotidiano da escola e das próprias crianças, que

maculelê, jongo, samba, umbigada etc.; e mere-

podem se revezar para levá-los para casa. A pre-

cem ser enfatizados junto a às crianças. As can-

sença de bonecos negros é sinal de que a escola

tigas, músicas infantis, fazem parte da educação

reconhece a diversidade da sociedade brasilei-

infantil, mas é preciso ter uma diversidade nesse

ra. Caso não encontre bonecos industrializados,

repertório, apresentado às crianças a diversidade,

uma boa saída é confeccioná-los com a ajuda de

mostrando a elas que existe um vasto universo

familiares. Mexer nos cabelos e trocar pequenos

cultural que as rodeia.

carinhos é uma forma de cuidar das crianças e romper possíveis barreiras de preconceitos. O

Muitas de nossas crianças não se sentem

trabalho com o cabelo abre caminho para estu-

representadas nas figuras dos materiais didáticos

dar tamanho, textura, cor e permite aprender que

e nos livros infantis, nos brinquedos, nos filmes e

não existe cabelo ruim, só estilos diferentes.

nas imagens que compõem murais das escolas, é preciso ir além, pesquisar, buscar materiais que

Pesquisar a história de alimentos de ori-

façam as crianças negras serem incluídas na so-

gem africana é um ótima forma de valorizar a

ciedade.

cultura dos afrodescendentes. Melhor ainda se houver degustação, com o apoio da comunidade.

Reunir as crianças em uma roda, abre es-

As aulas de culinária são momentos ricos para

paço para conhecê-las melhor. Para entender as

enfocar as heranças culturais dos vários grupos

relações de preconceito e identidade, vale a pena

que compõem a sociedade brasileira. A música

apresentar revistas, jornais e livros para que as

desenvolve o senso crítico e prepara as crianças

crianças se reconheçam (ou não) no material ex-

para outras atividades. Conhecer músicas em di-

posto. A roda é o lugar de propor projetos, discutir

ferentes línguas, e de diferentes origens, é

problemas e encontrar soluções. Também é o me-

bom caminho para estimular o respeito pelos di-

lhor espaço para debater os conflitos gerados por

versos grupos humanos. E isso se aplica a todas

preconceitos quando eles ocorrerem. Nessa hora,

as formas de Arte.

um

não tema a conversa franca e o diálogo aberto.

INEQ - Educação integral

41


CONSIDERAÇÕES FINAIS

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96. Brasília, MEC, 1996.

Diante da realidade escolar brasileira e de

sua dinâmica, é inevitável percebermos os ves-

. Ministério da Educação. Secretaria Espe-

tígios de racismo que ainda vigora em nossa so-

cial de Políticas de Promoção

ciedade brasileira, mesmo após tantas lutas e

cial. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Edu-

esclarecimentos. Ainda falta muita informação,

cação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino

especialmente para os educadores de forma a er-

de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Bra-

radicação de todo o preconceito que ainda veicula

sília, 2004.

da Igualdade Ra-

pelas unidades escolares. CAVALHEIRO, Eliane. Do silêncio do lar ao silêncio Precisamos formar mais educadores pre-

escolar: Educação e Poder; racismo, preconceito

parados para lidar com as diversidades culturais

e discriminação na Educação Infantil. São Paulo,

existentes em sala de aula, mas que especialmen-

Summus, 2000.

te estejam dispostos a recriar seu currículo e suas práticas com as crianças. É preciso que o educa-

CURITIBA, História e Cultura afro-brasileira e afri-

dor de educação infantil tenha em mente que sua

cana: educando para as relações étnico-raciais/

função não é apenas preparar as crianças para as

Paraná. Secretaria de Estado da Educação. Supe-

séries iniciais do ensino fundamental, mas tam-

rintendência da Educação. Departamento de Ensi-

bém para o resto da vida, pois é na primeira infân-

no Fundamental. SEED-PR, 2006. – p.110 - (Cader-

cia em que as crianças têm seus alicerces forma-

nos Temáticos).

dos para as aprendizagens futuras. FREIRE, Paulo. A Importância do ato de Ler. São

Não falamos aqui para educar a todos de

Paulo: Cortez, 1987.

formas iguais, mas sim educar para as diferenças e para as suas especificidades. Não tratamos ape-

, Paulo. Educação como Prática de Liberda-

nas de respeitar a consciência negra, mas também

de. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.

de respeitar todas as outras etnias, retirando assim todo o preconceito existente.

MOURA, Glória. O Direito a Diferença. IN Superando o Racismo na escola. 2º edição revisada.

Para que se tenha êxito ao praticar a Lei

10.369/2003, a Escola e os Professores não po-

WINNICOTT, D. W. O Brincar e a realidade. Rio de

dem viver no improviso, é necessário possuir es-

Janeiro: Imago, 1975.

clarecimento sobre as suas práticas, pois somente assim, poderemos acabar com as desigualdades ainda existentes em nosso país, muitas delas derivadas do preconceito étnico-racial.

REFERÊNCIAS

42

INEQ - Educação integral


A Percepção da Prática Avaliativa no Processo de Escolarização Professor: Vagnum Dias da Silva1 Resumo

studies and research, etc. But for the most part, the

O presente artigo tem por objetivo tecer al-

evaluators today use various references from the

gumas reflexões de como o professor adquire sua

time they were students in basic education and hi-

concepção de avaliação. Para isso serão analisa-

gher education

das referências de avaliações da educação básica

Key Words: Evaluation Design; Education; School

ao ensino superior. A avaliação em educação é um

Daily

tema bastante delicado e controverso, porém, sua discussão é imprescindível para se pensar uma

INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA

educação verdadeiramente democrática e emancipadora. Adquirimos a concepção de avaliação

O presente artigo tem por objetivo fazer

por diversos meios, leituras especializadas, estu-

uma reflexão sobre a avaliação no cotidiano esco-

dos, pesquisas, etc. Mas, na maioria das vezes, os

lar, será considerada para isso minha experiência

avaliadores hoje utilizam diversos referenciais da

adquirida como aluno da educação básica e supe-

época em que eram alunos da educação básica e

rior, experiência essa vivida sendo avaliado e tam-

do ensino superior.

bém avaliando a forma de ser avaliado. E, ao longo

Palavras-chave: Concepção de Avaliação; Educa-

de alguns anos ministrando aulas de Geografia no

ção; Cotidiano Escolar

ensino fundamental e médio, um período como CP (Coordenador Pedagógico) da Prefeitura Municipal

Abstract

de São Paulo e atualmente como Diretor de Escola,

The present article aims to provide some

que permite fazer algumas reflexões e indagações

reflections on how the teacher acquires his con-

sobre uma questão tão delicada, ao mesmo tempo

ception of evaluation. For this will be analyzed

tão necessária, que é o ato de avaliar. Além disso,

references of evaluations of education to higher education. Evaluation in education is a very delica-

Ninguém caminha sem aprender a caminhar, sem

te and controversial subject, but its discussion is

Aprender a fazer o caminho caminhando,

essential to think of a truly democratic and eman-

refazendo e retocando o sonho pelo qual se pôs a

cipatory education. We acquired the conception of

caminhar

evaluation by various means, specialized readings,

Paulo Freire

1 - Atualmente é aluno de Mestrado em Educação pela UFSCAR - Universidade Federal de São Carlos. Concluindo uma outra Graduação, Pedagogia na Universidade de São Paulo - USP. Atua profissionalmente como Diretor de Escola na Prefeitura de São Paulo. É um dos idealizadores e fundadores do CPPU (Cursinho Popular Pimentas Unifesp), que tem por objetivo preparar alunos da rede pública de ensino para prestar o Enem e outros processos seletivos como vestibulares em geral, trabalhando numa perspectiva de transformação social através da educação. Hoje é Coordenador Geral do Projeto. Integra grupo de pesquisa coordenado pelo Prof. Dr. Luiz Carlos Novaes, da Universidade Federal de São Paulo, que discute os impactos das políticas educacionais nas escolas públicas estaduais paulista. Tem interesse pessoal por pesquisas e estudos na área da Gestão Escolar.

INEQ - Educação integral

43


o presente trabalho conta com a colaboração de

divididos por 3 resultariam na média 7, simples as-

textos consagrados estudados ao longo dos anos

sim.

que discutem a questão da avaliação.

Essa prática de avaliar é muito comum,

O cotidiano escolar é um lugar privilegiado

além de ser muito antiga, e vem se perpetuando

para análise de como se dá o processo de constru-

ao longo da história da educação, cristalizada, che-

ção de novos conhecimentos pelos educandos e

gando a ser considerada normal, não tem como

como essa construção é observada e avaliada pe-

ponto principal promover a aprendizagem, sen-

los docentes. A todo momento dentro da unidade

do apenas uma forma de mensurar ao aluno um

escolar ocorrem aprendizagens, visto que, todas

conceito. Considera-se um fim em sim mesma,

as ações possuem um viés pedagógico e devem

ou seja, a avaliação é apenas o fim do processo,

constar dentro de um planejamento articulado e

primeiramente acontece todo processo de ensi-

organizado com toda a equipe de profissionais da

no, logo após se verifica se houve uma aprendiza-

educação. Esse foi um dos grandes motivos para a

gem. Por meio da nota final constata-se se o aluno

escolha do tema desse artigo, nenhum outro espa-

aprendeu ou não.

ço ou lugar é tão rico e cheio de nuances como o dinamismo do dia a dia da escola para pensarmos

Essa prática docente de avaliar em grande

o peso e a conseqüência da avaliação em seu sen-

parte vem de experiências passadas como aluno,

tido mais estrito.

ou seja, há uma repetição de avaliações sofrida ao longo dos anos através de trabalhos que foram

Em primeiro momento serão feitas algu-

pedidos, e notas que foram atribuídas, provas que

mas considerações do significado da avaliação

foram cobradas, e notas que foram aferidas, ha-

percebida como aluno da educação básica; no se-

vendo relação meramente matemática, somando

gundo momento a questão sendo sentida e vivida

tudo e depois dividindo. Obtendo assim uma nota,

como aluno da educação superior e o que isso im-

dentro de uma escala, onde essa nota pode ser

plicou na prática como docente; no terceiro e últi-

considerada boa ou ruim.

mo momento do texto será exposto o que mudou na concepção de avaliação vivida com um apro-

Outra questão que não podemos deixar de

fundamento de questões que envolvem a avalia-

considerar é que os docentes que praticam esse

ção a luz de teorias.

tipo de avaliação possuem uma concepção de função social da escola, uma concepção acerca

Parece ser natural depois de nove anos de

Ensino Fundamental e três de ensino médio pen-

da utilidade da educação escolar. Permeando essa reflexão, Vieira (2001) ressalta que:

sar que avaliação é a média de um conjunto de

44

atividades, obtendo uma menção final. Exemplo:

Mas, por certo, não é apenas para a convivên-

pode ser cobrado um trabalho valendo de 0 à 10,

cia social e para a socialização que existe a

o caderno valendo de 0 à 10, e uma prova valendo

escola. Ela surge da necessidade que se tem

de 0 à 10 também. Vamos imaginar que um de-

de transmitir de forma sistematizada o saber

terminado aluno tire as seguintes notas 5, 7 e 9

acumulado pela humanidade. Na chamada

sendo: trabalho, caderno e prova respectivamente.

sociedade do conhecimento este papel tende

A soma das três notas resulta em 21 pontos que

a assumir uma importância sem preceden-

INEQ - Educação integral

tes. Outro aspecto a assinalar é que a escola


é uma instituição datada historicamente. Ou

do saber sistematizado, cabe para isso dentro des-

seja, cada sociedade, cada tempo forja um

sa concepção avaliar se os alunos aprenderam ou

modelo que lhe é próprio. (VIEIRA, 2001, p.

não os conteúdos, isso sempre ao final do proces-

130)

so.

Essa contribuição da autora reforça a con-

Tendo em vista o exposto, essa maneira de

cepção de que esses docentes ao praticarem este

conceber avaliação conviveu e convive com outras

tipo de avaliação, que podemos chamar de soma-

formas, pois, as tendências pedagógicas não dei-

tiva e classificatória, pois, também funciona para

xavam de existir logo após o aparecimento de uma

estereotipar o aluno de acordo com a nota que lhe

outra forma de se conceber a educação, ou seja,

foi atribuída em bom ou ruim, é reflexo também de

uma nova tendência. Assim ainda segundo Vieira

práticas pedagógicas concebidas num dado perío-

(2001)

do histórico. Ainda segundo Vieira (2001) Embora as tipologias sejam necessárias à orBoa parte das reflexões sobre a função so-

ganização do pensamento, é necessário ob-

cial da escola no Brasil foram canalizadas

servar que no concreto estas não existem em

em torno do debate acerca das tendências

estado puro. Numa sociedade, tempo e lugar

pedagógicas. Assim, tomando como mote as

várias tendências podem conviver. (VIEIRA,

incursões de Libâneo, foi possível identificar

2001, p. 132)

papéis propostos para a instituição escolar nas diferentes pedagogias. (VIEIRA, 2001, p.

Apesar dessa tradição em avaliar, vamos

130)

encontrar formas transformadoras, emancipadoras e formativas, onde a avaliação não é o fim do

Em vista disto, podemos questionar: mas

processo, apuração da aprendizagem. Mas, aquela

afinal se esse tipo de avaliação que chamamos

que serve para promover a aprendizagem pela sua

aqui de somativa foi prática de um dado período

prática. Assim segundo as reflexões de Hoffmann

da história da educação no Brasil, qual seria o mo-

(2001)

tivo que na sociedade do conhecimento na qual vivemos ainda está tão presente essa forma de se

Os alicerces da avaliação são os valores

conceber a avaliação?

construídos por uma escola: que educação pretendemos? Que sujeito pretendemos for-

Para ajudar a refletir tal questão temos as

mar? O que significa aprender, nesse tempo,

tendências pedagógicas, entendemos aqui como

para os alunos que acolhemos, para o grupo

tendência pedagógica a incursão de Libâneo

de docentes que constituem? Qual a nature-

(1995) sendo grosso modo: Pedagogia Liberal,

za ética política de nossas decisões? É por aí

Pedagogia Tecnicista e Pedagogia Progressista.

que a reflexão sempre deveria iniciar. (HOF-

Assim no contexto de uma Pedagogia Liberal (ten-

FMANN, 2001, p. 59 e 60)

dência liberal tradicional), podemos refletir acerca de possíveis respostas para essa delicada questão.

Nessa reflexão cabe salientar que por mais

Na qual, a escola é tida como aquela encarregada

que o exposto seja referente à educação básica, no

da transmissão dos conhecimentos, da cultura e

ensino fundamental e médio os profissionais que INEQ - Educação integral

45


atuam nas escolas de nível básico foram forma-

mos nos aproximar de uma conceituação de ava-

dos na educação superior. Compete agora fazer

liação mais libertária. Primeiro, temos que o ato de

algumas considerações a respeito dos institutos

avaliar não é neutro, pois, possui uma intencionali-

formadores.

dade. Por isso, requer um planejamento.

As práticas de avaliação na educação su-

Segundo, a avaliação tem que estar con-

perior não são muitos diferentes daquelas da edu-

tida dentro de um projeto político pedagógico da

cação básica, afinal os profissionais que atuam no

unidade escolar. Nessa direção, um convite à refle-

ensino fundamental e médio possuem uma refe-

xão nos faz Veiga:

rência, quer dizer, eles reproduzem as práticas de seus formadores. Assim, os professores do ensino

O projeto pedagógico exige profunda reflexão

básico possuem alguns paradigmas em comum.

sobre as finalidades da escola, assim como

A esse respeito Hoffmann (2009) indaga:

a explicitação de seu papel social e a clara definição de caminhos, formas operacionais

O que se percebe atualmente é que o corpo

e ações a serem empreendidas por todos os

docente do Ensino Médio e Superior se revela

envolvidos com o projeto educativo. (VEIGA,

muito mais impermeável a discussão da prá-

2004, p. 35)

tica tradicional do que os professores do Ensino Fundamental. Nos encontros e seminá-

Tendo em vista estes pressupostos pode-

rios manifestam um sério descrédito quanto

mos pensar numa avaliação formativa a favor ver-

à possibilidade de a avaliação descaracteri-

dadeiramente da aprendizagem de nossos alunos,

za-se, um dia, da feição classificatória que a

pois, não existe ensino sem aprendizagem. Para

reveste. (HOFFMANN, 2009, p. 109 e 110)

Zabala:

Sem dúvida as práticas tradicionais de

O conhecimento de como cada aluno

avaliação são reproduzidas num ciclo vicioso, que

aprende ao longo do processo ensino/apren-

vai da escola à universidade, e da universidade à

dizagem, para se adaptar às novas neces-

escola. Ainda nessa perspectiva Hoffmann (2009)

sidades que se colocam, é o que podemos

aponta:

denominar avaliação reguladora. Alguns

educadores, e o próprio vocabulário de Refor Esse passa a ser um fator muito sério, por-

ma, utilizam o termo de avaliação formativa.

que a avaliação, nesses cursos, é um fenô-

Pessoalmente, para designar este processo

meno com características seriamente repro-

prefiro o termo avaliação reguladora, já que

dutivistas. Ou seja, o modelo que se instala

explica melhor as características de adapta-

em cursos de formação é o que vem a ser

ção e adequação. (ZABALA, 1998, p. 200)

seguido pelos professores que exercem o magistério nas escolas e universidades. (HO-

Essa avaliação denominada por Antoni

FFMANN, 2009, p. 110)

Zabala reguladora é a que se aproxima, e muito, daquela que defendemos como trabalhadores e

Após essas reflexões acerca da avaliação

defensores de uma educação de qualidade para

na educação básica e no ensino superior, pode-

todos. Que serve para “regular” as aprendizagens

46

INEQ - Educação integral


não os alunos. Entendido regular no sentido de

ajustar e ajudar o aluno na construção de cada vez

ato de avaliar no cotidiano escolar está permeado

mais conhecimentos. Desse modo, os conteúdos

por múltiplos condicionantes que ultrapassam os

ensinados e aprendidos, tenham como objetivo

muros da escola, está ligado a uma concepção de

o desenvolvimento de todas as capacidades da

função social da escola, a formação docente em

pessoa. Dessa forma, devemos levar em conside-

todo seu percurso como aluno de educação bási-

ração os conteúdos conceituais, procedimentais e

ca e superior, concepção do que é avaliação, etc.

atitudinais para o desenvolvimento de cada aluno,

Enfim, um tema tão delicado que é avaliação es-

ainda segundo Zabala (1998, p. 197) “O objetivo do

colar tendo como foco o cotidiano escolar não se

ensino não centra sua atenção em certos parâme-

esgota nas reflexões expostas nesse texto, muito

tros finalistas, mas nas possibilidades pessoais de

há de se pensar e fazer para criar uma cultura de

cada um dos alunos”.

avaliação verdadeiramente emancipadora.

Para finalizar é interessante observar em

Tendo em vista o exposto temos que o

O passo foi dado, as certezas, bem (...)

nossa Lei de Diretrizes e Bases da Educação Na-

essas transformaram - se em mais indagações

cional em seu artigo 24 inciso V diz:

e vontade de trilhar novos e fecundos caminhos nesse mar de possibilidade e desafios, que quan-

A verificação do rendimento escolar observa-

to mais bebemos mais estamos com sede. Fica o

rá os seguintes critérios: alínea a: avaliação

convite a todos que beberam ou que querem beber

continua e cumulativa do desempenho do

dessa água.

aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais”. (LDB – 9394/96)

Essa conceituação de avaliação na lei de-

nota o avanço das discussões sobre a temática, visto que, as leis remontam o que se pensa, o que se sabe e que se espera de fundamental sobre o Estado em determinado período histórico. Na obra de Werner Jaeger – Paidéia, citando Platão, ele diz: Para Platão, contudo, o seu conteúdo representava algo de fundamental, pois era constituído por profundíssimas reflexões sobre o Estado e as Leis, os costumes e a cultura. E tudo isto o autor subordina ao ponto de vista geral da Paidéia. (JAEGER, 2010, p. 1296). CONCLUSÃO

Referências BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LDB 9.394, de 20 de dezembro de 1996. HOFFMANN, Jussara. Avaliar para promover: as setas do caminho. Porto Alegre: Mediação, 2001. ___________.Avaliação Mediadora: Uma prática em construção da pré-escola à universidade. Porto Alegre: Mediação, 2009. LIBÂNEO, José Carlos. “Tendências Pedagógicas na prática escolar”. Democratização da escola Pública. São Paulo, Loyola, 1986. LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da Aprendizagem Escolar. São Paulo: Cortez, 1995. VEIGA. Ilma Passos de Alencastro. Educação Básica e Educação Superior: projeto político pedagógico. Campinas, SP: Papirus, 2004. VIEIRA, Sofia Lerche. Escola – Função Social, Gestão e Política Educacional. In: FERREIRA, N. S. C. e AGUIAR, M. A. da S. Gestão da Educação: impasses: perspectivas e compromissos. São Paulo: Cortez, 2001. WERNER, Jaeger. Paidéia – A formação do homem grego. São Paulo: Martins Fontes, 2010. ZABALA, Antoni. A prática Educativa: Como ensinar. Porto Alegre: Artmed, 2008. INEQ - Educação integral

47


Arte e Matemática no Ensino Fundamental: uma inter-relação possível e necessária. Esther Maria Freixedelo Martins1 martinsesther@terra.com.br Resumo:

veloped concomitantly and in a complementary way throughout Humanity History. In this way, they

O presente artigo se propõe a demonstrar

have much more points of convergence than com-

que a Arte e a Matemática são conteúdos inter-re-

mon sense supposes, which tends to place these

lacionados, imbricados um no outro, que se de-

two areas of knowledge in totally different and se-

senvolveram concomitantemente e de forma com-

parate places of knowledge. Through the bibliogra-

plementar, ao longo da História da Humanidade.

phical research, it is tried to overcome this dicho-

Dessa forma, possuem muito mais pontos de con-

tomy and to prove that the interdisciplinary study

vergência do que supõe o senso comum, que cos-

of these disciplines, from Elementary School, can

tuma situar essas duas áreas do saber em lugares

contribute to the acquisition of conceptual, proce-

do conhecimento totalmente distintos e separa-

dural and attitudinal contents, besides favoring the

dos. Por meio de pesquisa bibliográfica, busca-se

development of skills and competences, essential

superar essa dicotomia e comprovar que o estudo

to Integral formation of the human being and the

interdisciplinar dessas disciplinas, desde o Ensino

exercise of citizenship.

Fundamental até o Ensino Superior, pode contribuir para a aquisição de conteúdos conceituais,

Keywords: Elementary School; Teaching of Art; Te-

procedimentais e atitudinais, além de favorecer o

aching of Mathematics; Interdisciplinarity.

desenvolvimento de habilidades e competências, essenciais à formação integral do ser humano e

Introdução

ao exercício da cidadania.

Em nosso dia-a-dia, é comum ouvirmos

Palavras-chave: Ensino Fundamental; Ensino da

afirmações que, de forma explícita ou implícita, si-

Arte; Ensino da Matemática; Interdisciplinaridade.

tuam a Arte e a Matemática em lugares opostos do conhecimento, totalmente distintos e separa-

48

Abstract:

dos. Como exemplos, podemos citar: a Arte é sub-

The present article aims to demonstrate

jetiva, a Matemática é exata; a Arte é arbitrária e

that Art and Mathematics are interrelated con-

impulsiva, a Matemática é metódica e planejada; a

tents, intertwined with each other, that have de-

Arte é sensível, a Matemática é racional. Por enfa-

1 - Pós-graduação em Educação Matemática pela Universidade Cruzeiro do Sul (2016), graduação em Pedagogia pela FE-USP. Professora na Rede Municipal de Ensino da Cidade de São Paulo, desde 2008.

INEQ - Educação integral


tizarem apenas os aspectos que, aparentemente,

Nas cavernas, onde se encontram as pinturas ru-

separam essas duas disciplinas, sem reconhecer

pestres do Período Pré-Histórico anterior ao de-

aqueles que as aproximam; tornam-se crenças

senvolvimento da escrita (cerca de 3.500 anos

que reforçam, ainda mais, a dicotomia entre a Arte

a.C.), há também formas de registro de contagens,

e a Matemática.

mostrando uma conexão entre as duas áreas do

Esse artigo tem por objetivo desconstruir essas

conhecimento desde os primórdios da civilização

crenças, comprovando que a Arte e a Matemáti-

humana. Segundo Antoniazzi, “o pensamento ma-

ca são conhecimentos intimamente relacionados,

temático expressava-se na escolha da caverna, na

essenciais à formação integral do ser humano, im-

proporcionalidade entre o espaço disponível e o

bricados um no outro, como duas faces de uma

número de habitantes do grupo, que intuitivamen-

mesma moeda.

te era levado em consideração”. (ANTONIAZZI,

Para isso, será apresentado, inicialmente, um his-

2005, p. 4)

tórico do desenvolvimento da Arte e da Matemáti-

Além disso, as pinturas rupestres demonstram

ca, desde a pré-história até os dias atuais. Depois,

a íntima relação existente entre a Arte e a Mate-

serão definidas as características gerais e espe-

mática, naquilo que o ser humano possui de mais

cíficas das duas disciplinas, a partir da análise

específico: sua capacidade de abstrair, de criar

dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs),

símbolos e articulá-los, construindo diferentes lin-

buscando compreender de que maneira a Arte e

guagens.

a Matemática se identificam, em seus aspectos epistemológicos e cognitivos. Por último, iremos

2. Antiguidade

refletir sobre as contribuições de uma abordagem interdisciplinar, desde os primeiros anos do Ensino

Na Antiguidade, a conexão entre Arte e Ma-

Fundamental até o Ensino Superior.

temática está presente em todas as civilizações. Percebe-se a preocupação do homem com o belo

Arte e Matemática ao longo da História

e com a harmonia das formas, aliado a um profun-

1. Pré-história

do conhecimento matemático para a realização de suas obras.

Aparentemente antagônicas, a Arte (desenho, pintura, escultura, arquitetura, teatro, dança, músi-

2.1 Os Egípcios

ca, poesia, literatura...) e a Matemática (contagens, representações, medidas, formas, relações espa-

A Arte Egípcia surgiu há cerca de 3 000

ciais, simetrias...) são áreas que se desenvolveram

anos a.C. e procurava glorificar os deuses e fara-

de forma simultânea e complementar.

ós. Por essa razão, na pintura e na escultura, estes eram grandiosos e imponentes, enquanto o povo era representado em escala menor.

Por possuírem conhecimentos matemáti-

cos avançados, os egípcios conseguiram erguer templos, palácios e pirâmides que sobrevivem até os dias de hoje. As grandes pirâmides de Gizé impressionam, não apenas pelo seu tamanho, mas também pela precisão dos cálculos matemáticos Fig. 1 – Pintura rupestre, Piauí, Brasil.

realizados para sua construção. Nessas pirâmides INEQ - Educação integral

49


de base quadrangular, as faces estão orientadas

é a busca por formas simétricas e harmoniosas, de

para os quatro pontos cardeais e possuem a

proporções perfeitas e absolutas, apoiadas em rela-

mesma inclinação em relação ao plano horizon-

ções ou modelos matemáticos, como o número de

tal. Constituem-se num exemplo prático da inter-

ouro ou a razão áurea.

-relação entre a Arte e a Matemática, na antiga

civilização egípcia.

arquitetura grega é o Parthenon, templo construído

Um exemplo da aplicação da razão áurea na

em Atenas, no ano de 447 a.C.; em que o número de ouro é usado diversas vezes, para dar harmonia e beleza à construção.

Fig. 2 - Pirâmides de Gizé, Egito.

2.2 Os Gregos

A Arte, a Matemática e a Filosofia gregas

Fig. 3 – O Parthenon e a Proporção Áurea.

surgiram e se desenvolveram ao mesmo tempo, há cerca de 600 a 500 anos a.C. e exerceram

2.3 Os Romanos

enorme influência na cultura ocidental.

50

A Arte Grega foi uma arte preocupada em

No século I a.C., os romanos chegaram à

apresentar o corpo humano e suas ações com

Grécia antiga. Suas obras arquitetônicas procuraram

riqueza de detalhes. Para isso, os escultores e

refletir a riqueza e as conquistas do Império Romano,

pintores gregos observavam as formas do corpo

através de obras suntuosas, de enormes dimensões.

humano, estudavam sua anatomia e elaboravam

Seus templos, basílicas, anfiteatros, aquedutos, pon-

regras em que estabeleciam as proporções entre

tes, termas e outros tinham como principal caracte-

as diversas partes do corpo. Além disso, procu-

rística a presença de formas circulares ou elípticas e

ravam retratar as figuras humanas de todos os

a utilização de arcos ou abóbodas, o que comprova

ângulos, ao invés de apenas no plano frontal.

um enorme conhecimento matemático aliado à pre-

A relação mútua entre a Arte Grega e a

ocupação estética e à valorização do belo e, também,

Matemática, também se manifesta em sua ar-

exemplificam a inter-relação entre a Arte Romana e a

quitetura, que é impregnada de conceitos ma-

Matemática.

temáticos e geométricos. Como exemplo, po-

demos citar os teatros ao ar livre, constituídos

Coliseu, principal anfiteatro romano, construído entre

por várias fileiras de bancos de pedra, esculpidos

70 e 90 d.C., onde mais de 40 000 pessoas podiam

nas rochas, em forma de semicírculo, verdadei-

assistir, de todos os ângulos, às lutas dos gladiado-

ras conchas acústicas.

res e a outros espetáculos, devido ao formato elíptico

Outra característica da Arte Grega desse período

da construção.

INEQ - Educação integral

Uma das principais obras desse período é o


truções arquitetônicas e pelos vitrais. 3.1 O currículo medieval

As escolas da Idade Média eram dirigidas

por um cônego, os professores eram clérigos e lecionavam as chamadas “sete artes liberais” ou “artes próprias dos homens livres”, em oposição às artes serviles. Nesse contexto, as disciplinas Fig. 4 – Vista aérea do Coliseu, Roma.

curriculares eram denominadas “artes” e tinham igual importância, sendo consideradas essen-

2.4 Os Árabes

ciais à formação integral do ser humano.

As “sete artes liberais” compreendiam

Os árabes se destacaram na Arte por meio de

dois ciclos de estudo: o trivium e o quadrivium,

mosaicos e desenhos realizados em tapetes, feitos a

que incluíam estudos de gramática, retórica, ló-

partir de complexos padrões geométricos e simetrias.

gica, aritmética, geografia, astronomia e música;

No campo da Matemática, tinham profundo

onde, não havia uma separação entre as artes

conhecimento em astronomia, trigonometria e álge-

matemáticas ou exatas e as artes expressivas

bra e foram os principais divulgadores dos números

ou subjetivas.

indo-arábicos. 3.2 A Arte Românica 3. A Idade Média

Com o termo “românico” são definidas as

A Idade Média foi um período turbulento, mar-

manifestações artísticas produzidas na Europa,

cado pelas Cruzadas, pela Peste Negra, pela Inquisi-

nos séculos XI e XII, sendo a arquitetura a for-

ção e pelas invasões bárbaras, na Europa. Compreen-

ma artística dominante, apresentando constru-

de um período de cerca de mil anos, entre os séculos

ções sólidas, de paredes grossas, com poucas

V e XV d.C, que se iniciou com a queda do Império

janelas e um único portal central; que chamam

Romano.

a atenção devido ao seu tamanho e por se as-

Nela, a produção cultural da humanidade ficou

semelharem a verdadeiras fortalezas. Também

restrita aos mosteiros e às suas escolas. Por essa ra-

são utilizados arcos arredondados ou abóbadas.

zão, muito do que foi produzido na Antiguidade, acabou sendo destruído.

No entanto, ao contrário do que muitos ima-

ginam, a Idade Média não foi uma “idade das trevas”. Foi um período de intensas transformações sociais, culturais e científicas, que lançariam as bases para o Renascimento.

A inter-relação entre a Arte e a Matemática,

nesse período, também foi bastante intensa e pode ser percebida pelo currículo medieval, por suas cons-

Fig. 5 – Igreja de Outeiro Seco, Portugal. INEQ - Educação integral

51


3.3 A Arte Gótica

Iniciou-se um período extremamente fértil

para todas as áreas do saber, conhecido como HuO estilo gótico desenvolveu-se, na Europa,

manismo Renascentista, em que as inter-relações

entre meados do século XIII e início do século XVI,

entre a Arte e a Matemática se estreitaram ainda

como uma resposta à austeridade do estilo româ-

mais.

nico, realizando uma arquitetura vertical, onde tudo

se projeta para o alto, através de arcos ogivais ou

temente agrícola, foi substituído por um novo modo

de abóbodas de nervuras, invenções técnicas fun-

de vida, com o desenvolvimento das cidades e a ex-

damentadas em princípios matemáticos, que per-

pansão do comércio. Segundo Braga, a Revolução

mitiram a construção de igrejas muito altas, como

Comercial, fez com que o pensamento abstrato, as

as Catedrais de Ulm e de Colônia, na Alemanha.

representações, “a quantificação e a Matemática se

Outra característica da Arquitetura Gótica é a si-

tornassem peças-chave na organização social eu-

metria das formas, elemento básico desse estilo

ropeia”, pois, o uso do dinheiro gerou a necessidade

arquitetônico, que tem como fachada típica um

de se criar símbolos para substituir objetos concre-

portal triplo, com decoração de esculturas; uma

tos e de se realizar cálculos, por todas as pessoas.

grande rosácea central e duas torres laterais.

(Braga, 2004, p.33)

O sistema de produção feudal, predominan-

Ocorreram as Grandes Navegações e novas

terras foram conquistadas, Gutenberg inventou os tipos móveis e a Revolução Científica, ocorrida no final do século XVII, impulsionou o espírito investigativo, a observação e a experimentação. Outro saber que passou a ser valorizado, nesse peFig. 6 – Catedral de Notre Dame, França, e rosácea central.

ríodo, foi o conhecimento geométrico, necessário principalmente aos comerciantes, engenheiros e ar-

As rosáceas, por sua vez, são vitrais em

forma de flor, que costumam ficar na parte mais

tesãos, que em seus “ateliês [...] mesclavam ciência, técnica e arte num mesmo trabalho”. (idem, p. 9)

central e elevada da catedral gótica. São uma demonstração de como os arquitetos góticos

4.1 Novas formas de representação do espaço

aplicavam, na prática, seus conhecimentos matemáticos, utilizando a divisão do círculo em partes

Dentre tantas inovações, ocorridas na Idade

iguais, a simetria e a rotação de um elemento co-

Moderna, “existe uma que marcou definitivamente

mum.

a história da ciência, da técnica e da arte: a invenção da perspectiva plana”, que alterou por completo

4. A Idade Moderna

as formas de representação do espaço e que serve de exemplo da inter-relação entre Tecnologia, Mate-

52

Ao longo dos séculos XV, XVI e XVII, a Euro-

mática e Arte; nesse período. (ibid, p. 38)

pa atravessou um período de intensa transforma-

ção em suas estruturas políticas, religiosas e de

conter um quadriculado, numa geometrização que

produção; o que impulsionou seu desenvolvimento

dava profundidade ao espaço. Mais tarde, os pinto-

na área técnico-científica e no campo das artes.

res passaram a empregar novas técnicas, utilizan-

INEQ - Educação integral

Primeiramente, as pinturas passaram a


do o chamado ponto de fuga e criando regras de

A Idade Contemporânea compreende o

proporcionalidade para o tamanho do que era ob-

espaço de tempo que vai da Revolução France-

servado.

sa (ocorrida em 1789) até os dias atuais. É uma fase marcada por uma série de mudanças políticas, sociais e econômicas e por inúmeros fatos que mudaram a história do homem, dentre eles as inovações técnicas e científicas, as duas Guerras Mundiais, a chegada do homem à Lua, a universalização da internet, os atentados de 11 de setembro...

Fig. 7 – “A Última Ceia” de Leonardo da Vinci.

A inter-relação entre Arte e Matemática

também aparece de forma muito intensa, com Esses artifícios eram empregados tanto

ideias e conceitos matemáticos sendo utilizados

nos trabalhos artísticos como nos técnicos, pois,

ou negados, intencionalmente, por diversos artis-

“os mesmos homens que projetavam e constru-

tas, para expressar suas ideias e concepções de

íam máquinas [...] também pintavam ou escul-

mundo.

piam”. (idib, p. 36)

Outras características da Pintura Renas-

centista foram o realismo e o naturalismo, em que

5.1 O Impressionismo e a ausência de contornos e formas definidas

se buscava representar, com perfeição, as formas do corpo humano; a partir de modelos matemáti-

cos essencialmente geométricos, como o retângu-

tístico que surgiu na França, no século XIX, e que

lo de ouro, como já havia sido feito pelos gregos. .

durou de 1874 a 1886; tendo como principais re-

presentantes Monet, Degas e Renoir.

No “Homem Vitruviano”, a representação

O Impressionismo foi um movimento ar-

humana mantém as proporções do número de

Caracteriza-se pela ausência de contornos

ouro, além de estar inscrita em um pentágono es-

nítidos ou de formas definidas em suas figuras,

trelado desenhado na circunferência, o que revela

rompendo-se com a necessidade de criar imagens

a profundidade dos conhecimentos matemáticos

com volume e solidez, próprias da pintura tradicio-

de Da Vinci.

nal. 5.2 O Neoimpressionismo

Diversos artistas, que iniciaram como im-

pressionistas, a partir de 1886, desenvolveram novas formas de pintar, estilos e tendências. Por essa razão, foram denominados neoimpressionistas.

Dentre eles, podemos citar Seurat e Sig-

Fig. 8 – Obras de Leonardo da Vinci e suas relações matemá-

nat, também chamados pintores pontilhistas, pois,

ticas.

usavam pontos de cores puras, que eram colocados lado a lado na tela, para criar um efeito visual

5. A Idade Contemporânea

interessante, em que os pontos de cor pareciam INEQ - Educação integral

53


“tremer” com a luz.

Paul Cézanne, por sua vez, estudava as for-

nismo, cuja principal característica é utilizar, em

mas geométricas e procurava criar composições

suas composições, formas geométricas básicas,

em que os elementos da natureza e as figuras hu-

como quadrados, retângulos, círculos, semicírcu-

manas quase se reduziam a cubos, cilindros, esfe-

los, triângulos e retângulos, além de outros elemen-

ras e cones.

tos geométricos como ângulos, linhas retas e cur-

Vários são os representantes do abstracio-

vas, num exemplo nítido da inter-relação entre Arte e Matemática. Dentre eles, podemos citar: Paul Klee, Kazimir Malevich, Wassily Kandinsky, Robert Delaunay e Piet Mondrian.

Fig. 9 – “A Montanha de Santa Vitória” – Cèzane.

Juntamente com Van Gogh, que manteve

em seus quadros várias características da pintura impressionista, como as pinceladas soltas e a inexistência de linhas, esses pintores também exem-

Fig. 10 – “Composição VIII” – Kandinsky.

plificam a inter-relação entre a Arte e a Matemática em suas obras.

5.5 O Cubismo e o descompromisso com a imagem real das coisas

5.3 O Expressionismo e o exagero das formas O Cubismo, assim como o Expressionismo, foi um

No início do século XX, surge o movimento

movimento nascido na Europa, no início do século

expressionista, na Alemanha, cujo principal obje-

XX, como uma resposta ao Movimento Impressio-

tivo é a expressão da subjetividade do artista em

nista, que teve como principais representantes Ge-

oposição à simples reprodução da realidade. Suas

orges Braque e Pablo Picasso.

principais características são o uso de traços e

Teve curta duração, de 1907 a 1914, mas, é consi-

cores fortes e a distorção ou exagero das formas,

derado por muitos uma revolução estética e técni-

com a intenção de provocar um impacto emocio-

ca; pois, recusou, definitivamente, a noção de arte

nal.

como imitação ou réplica da natureza. Utilizavam-

No Brasil, o movimento expressionista

-se da geometrização e desfiguração das formas,

também teve sua representação através de artis-

decompondo as várias partes da figura num mes-

tas como Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, Cândi-

mo plano.

do Portinari e Oswald de Andrade.

No Brasil, o início do Cubismo aconteceu depois da Semana de Arte Moderna, de 1922. Tarsila do Ama-

54

5.4 O Abstracionismo e a prevalência das formas

ral se destaca, com seus quadros que apresenta-

geométricas

vam tanto elementos bidimensionais como formas

INEQ - Educação integral


tridimensionais.

que se destacam as formas geométricas chapadas, sem utilização da perspectiva e profundidade.

5.6 A Arte Contemporânea

Considera-se Arte Contemporânea as ex-

pressões artísticas produzidas desde a Segunda Guerra Mundial até os dias atuais.

Nela, assim

como nas épocas anteriores, a inter-relação entre Arte e Matemática também se faz presente, através de vários artistas.

Escher, sem dúvida, é o que mais se des-

taca, por sua formação em arquitetura e pela execução de transformações geométricas, chamadas

Fig. 12 – “Fachada” – Volpi

isometrias em suas obras. Para isso, o artista desenhava figuras sobre diver-

sos tipos de malhas (quadriculadas, retangulares,

cica, com suas obras tridimensionais e com seus

triangulares e hexagonais) e, por meio de rotações,

metaesquemas, quadros em que o artista explora

translações e reflexões dessas figuras, sem alterar

as relações entre cor, linha, estrutura e plano; atra-

a área do polígono original, elaborava complexos

vés de rigorosos cálculos matemáticos, utilizando-

mosaicos.

-se de retângulos e outras figuras geométricas de

diferentes tamanhos, cores, contornos, preenchi-

Escher também explorava representações

do espaço tridimensional, em um plano bidimen-

Outro nome importante é o de Hélio Oiti-

mentos e disposições no papel.

sional, criando imagens impossíveis de existir no mundo real. Suas obras demonstram a maestria da sua arte, alicerçada na utilização de conhecimentos matemáticos sobre medidas, ângulos e formas geométricas.

Fig. 13 – “Metaesquema” – Oiticica

Fig.11 – “Ar e Água I” e “Relatividade” – Escher

Dentre os artistas brasileiros contemporâ-

neos, Alfredo Volpi também merece ser lembrado como pintor abstracionista geométrico, por sua série de bandeiras e mastros de festas juninas e pelas representações de fachadas de casas; em

Romero Britto também não pode faltar

como exemplo da articulação entre a Arte Contemporânea e a Matemática, através de seus quadros multicoloridos, de composições ousadas, que algumas vezes nos remetem aos pintores cubistas, por suas linhas de contorno, que dividem e fragmentam as figuras e pela assimetria das formas. INEQ - Educação integral

55


Desse modo, no currículo do Ensino Fun-

damental, os estudos de Língua Portuguesa, Matemática e Arte são obrigatórios, para favorecer o desenvolvimento de diversas práticas de linguagem: falar, escutar, ler e escrever, cantar, desenhar, representar e outras.

Como formas de linguagem, tanto a Arte

como a Matemática, demonstram a função simbólica do ser humano, ou seja, sua capacidade de abstrair e de criar símbolos para representar a realidade. Fig. 14 – “Cavalo” – Romero Britto

Estes são, portanto, os pontos de conver-

gência dessas duas áreas: Além dos artistas citados, há ainda inúme-

- Arte e Matemática são saberes que se desenvol-

ros outros, o que comprova que a Arte desse perío-

veram de forma simultânea e complementar, des-

do histórico, assim como a de períodos anteriores,

de os primórdios da humanidade até nossos dias.

também se articula com a Matemática, em suas

Antes do Renascimento não eram separadas e

concepções e na composição de suas obras.

não havia distinção entre artistas e matemáticos.

- Arte e Matemática são conhecimentos tipicaA Inter-relação entre a Arte e a Matemática

mente humanos, pois, em todas as sociedades foram realizadas produções artísticas e, em todas

Muitos aspectos aproximam a Arte e a Ma-

elas, também se construíram conhecimentos ma-

temática, contrariando o senso comum, que situa

temáticos.

essas duas áreas em lugares diferentes, completa-

- Arte e a Matemática são formas de linguagem,

mente distintos e intocáveis. A partir de uma aná-

com códigos específicos, que demonstram a ca-

lise superficial, a Arte ficaria situada no plano da

pacidade de abstração do ser humano, de diferen-

emoção e da subjetividade, enquanto a Matemáti-

tes épocas e lugares, o que sugere uma nova inter-

ca pertenceria ao plano da razão e da objetividade.

face a ser explorada: a interdisciplinaridade entre

Arte, Matemática, História e Geografia.

No entanto, a partir de uma análise mais

aprofundada de suas características, percebe-se

- No que se refere à origem de seus conhe-

que há vários pontos de inter-relação e de conver-

cimentos, tanto a Arte como a Matemática são

gência entre essas duas áreas do conhecimento.

saberes que partem da observação minuciosa da natureza, da imaginação e da intuição, para criar

Os pontos de convergência

suas representações.

De acordo com Barth, “artistas e matemá-

De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases

ticos são privilegiados leitores da natureza” (2010,

da Educação (LDB n° 9.394/96), uma das finalida-

p.1) e se utilizam dessa característica para realizar

des da escola é promover o acesso de todos ao

descobertas, criar modelos, padrões, generaliza-

patrimônio cultural humano, ou seja, aos conheci-

ções e composições artísticas.

mentos acumulados socialmente e historicamente.

56

INEQ - Educação integral

Criatividade, beleza, universalidade, simetria,


dinamismo, são qualidades que frequente-

dos, em processo contínuo de transformação.

mente usamos quando nos referimos quer

Nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), a

à Arte quer à Matemática. Beleza e rigor

integração entre Matemática e Arte está subenten-

são comuns a ambas. [...] O matemático, tal

dida, quando se faz referência ao uso da História

como o pintor ou o poeta, é um criador de

da Matemática como recurso ao ensino, pois, as

padrões. Um pintor faz padrões com formas

obras de arte, também, são formas de demonstrar

e cores, um poeta com palavras e o mate-

as necessidades e preocupações de uma determi-

mático com ideias. Todos os padrões devem

nada cultura, época e lugar.

ser belos. As ideias, tal como as cores, as palavras ou os sons, devem ajustar-se de

A História da Matemática, [...] juntamen-

forma perfeita e harmoniosa. (http://cmup.

te com outros recursos didáticos e meto-

fc.up.pt/cmup/arte/)

dológicos, pode oferecer uma importante contribuição ao processo de ensino e

- A Arte e a Matemática também se as-

aprendizagem em Matemática. Ao revelar a

semelham nas habilidades e competências que

Matemática como uma criação humana, ao

desenvolvem, dentre elas, o espírito de investiga-

mostrar necessidades e preocupações de

ção, a percepção de regularidades, o pensamento

diferentes culturas, em diferentes momen-

divergente, a sensibilidade e a criatividade; inte-

tos históricos, ao estabelecer comparações

grando cognição e afeto, razão e emoção. Sendo

entre os conceitos e processos matemáti-

assim, não se pode afirmar, como propõe o senso

cos do passado e do presente, o professor

comum, que a Arte é apenas subjetiva e sensível,

tem a possibilidade de desenvolver atitudes

enquanto a Matemática é apenas racional e metó-

e valores mais favoráveis do aluno diante do

dica; pois, ambas apresentam aspectos afetivos e

conhecimento matemático. Além disso, con-

cognitivos. O estudo interdisciplinar da Arte e da

ceitos abordados em conexão com sua his-

Matemática, portanto, favorece a potencialização

tória constituem-se veículos de informação

tanto da razão quanto da emoção, superando essa

cultural, sociológica e antropológica de gran-

dicotomia.

de valor formativo. (http://portal.mec.gov.br/

- A Arte necessita da Matemática, pois, inúmeros

seb/arquivos/pdf/livro03.pdf) – p.34.

artistas conceberam e produziram suas obras a partir de conceitos e ideias matemáticas: formas

Além disso, uma abordagem interdisciplinar des-

geométricas, ângulos, simetrias, padrões, núme-

sas duas disciplinas pode contribuir para superar

ros áureos... Atualmente, através do uso da com-

dificuldades de aprendizagem e para facilitar o

putação e da evolução tecnológica, surgem ainda

desenvolvimento de habilidades, pois, os alunos

inúmeras outras possibilidades a serem explora-

aprendem por múltiplos caminhos.

das.

- A Matemática também necessita da Arte, não

mação integral do ser humano.

apenas para demonstrar a utilização de seus con-

ceitos na vida real, mas, principalmente, para pos-

cífica do ensino de Arte é a promoção do desen-

sibilitar uma aprendizagem significativa de seus

volvimento cultural dos alunos; levando-os a com-

conteúdos, aproximando os alunos do que a esco-

preender e a respeitar outras formas de cultura,

la quer lhe ensinar e criando uma rede de significa-

diferentes das de sua vivência cultural.

- A Arte e a Matemática fazem parte da forDe acordo com os PCNs, a função espe-

INEQ - Educação integral

57


A finalidade específica da Matemática, por

des do mundo atual, em constante transformação.

sua vez, é o desenvolvimento do raciocínio, a re-

Afinal, já não basta aos profissionais do século

solução de situações-problema e a elaboração de

XXI, apenas o domínio de conhecimentos técnicos

generalizações.

e específicos; também se exigem múltiplos talen-

tos, competências e habilidades.

Dessa forma, o ensino de Arte integrado à

Matemática torna-se essencial em uma proposta

Esse é o grande desafio, ao qual me proponho e ao

educativa que vise à formação integral do ser hu-

qual convido vocês...

mano, pois, contribui para a constituição de valores e a formação da cidadania, além de promover

Referências

o respeito à diversidade, a criticidade e a fundamentação lógica.

ANTONIAZZI, H. M. Matemática e Arte: uma associação possível. Disponível: <http://miltonborba.

Considerações Finais

org/CD/Interdisciplinaridade/Encontro_Gaucho_ Ed_Matem/cientificos/CC49.pdf> Acesso em 02

Como se pode comprovar através do presente ar-

de jan. 2017.

tigo, o ensino da Arte integrado ao ensino da Matemática é extremamente importante e necessário

BARTH, G. M. P.; Arte e Matemática: da imagem ao

ao desenvolvimento afetivo e cognitivo do ser hu-

conceito, por meio das obras de M. C. Escher. Dis-

mano.

ponível:

Desconstruir as crenças que concebem essas

<http://www.pucpr.br/eventos/educere/educe-

duas áreas como saberes opostos e não relacio-

re2007/anaisEvento/arquivos/PO-372-14.pdf >

nados é urgente, possível e necessário; desde os

Acesso em 02 de jan. 2017.

anos iniciais do Ensino Fundamental até o Ensino Superior.

BRAGA, M.; GUERRA, A.; REIS, J.C. Breve história

Para isso, é preciso que se valorize tanto o ensino

da Ciência Moderna, volume 2: das máquinas do

da Arte como o da Matemática, enquanto conhe-

universo ao universo-máquina. Rio de Janeiro, Jor-

cimentos pertencentes ao acervo cultural da hu-

ge Zahar Ed., 2004

manidade, através de projetos que integrem essas duas disciplinas, favorecendo a aquisição de con-

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da

teúdos conceituais, procedimentais e atitudinais

Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares

e o desenvolvimento de diferentes habilidades e

Nacionais: Arte – 1º e 2º ciclos. Brasília, DF, 1997.

competências. Sabemos que, tanto a Arte quanto a Matemática,

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da

instigam o educando a “ver o mundo” ao seu redor:

Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares

observando, descobrindo, contemplando, exami-

Nacionais: Matemática – 1º e 2º ciclos. Brasília,

nando, reconhecendo e representando esse mun-

DF, 1997.

do; através de diferentes linguagens e símbolos. Desse modo, através deste artigo, o que se propõe

TOLEDO, M. Didática de matemática: como dois

é a “educação do olhar”, para a construção de um

e dois: a construção da matemática – São Paulo:

novo sistema de ensino que favoreça as aprendi-

FTD, 1997.

zagens significativas e que atenda às necessida-

58

INEQ - Educação integral


1º FESTIVAL DE TEATRO DO COLUNI/UFF: experiências pedagógicas ao encontro da concepção de educação integral. NASCIMENTO, Caio Cesar Silva1

Resumo:

dade Federal Fluminense (COLUNI/UFF). The Co-

Esse artigo pretende apresentar as experi-

luni/UFF is a space of comprehensive education,

ências educativas promovidas por intermédio da

covering educational projects targeted the areas

criação e da realização do 1º Festival de Teatro

of integral human formation. In this sense, these

(FESTUNI) do Colégio Universitário Geraldo Reis

include the arts. Through the Festival, proposed for

da Universidade Federal Fluminense (COLUNI/

the high School students joined teachers, students

UFF). O Coluni/UFF é um espaço de educação

and trainees interested in the Arts. The process of

integral, contemplando projetos educativos dire-

creation for the theatrical scenes of the FESTUNI

cionados as áreas de formação humana integral.

happened during the lessons of discipline of the

Nesse sentido, abarcam-se as artes. Por meio Fes-

Arts. The Festival had as its principle the interdis-

tival, proposto para os alunos do Ensino Médio, in-

ciplinarity of knowledge, and in its conception the

tegraram-se professores, alunos e estagiários inte-

leading role of youth in the creative process for the

ressados as Artes. O processo de criação para as

theatrical presentations and the organization of

cenas teatrais do FESTUNI aconteceu durante as

the event.

aulas da disciplina de Artes. O Festival teve como princípio a interdisciplinaridade dos conhecimen-

Key Words: Art Education, Theater and Youth Pro-

tos, e em sua concepção o protagonismo juvenil

tagonism.

no processo criativo para as apresentações teatrais e para a organização do evento.

O COLÉGIO UNIVERSITÁRIO.

Palavras-chave: Arte Educação, Teatro e Protago-

nismo Juvenil.

experiências pedagógicas promovidas pelo 1º

Para iniciar o texto e discursar acerca das

Festival de Teatro do Colégio Universitário, faz-se Resume:

necessário introduzir e apresentar o Colégio Uni-

versitário Geraldo Reis (COLUNI) da Universidade

This article intends to present the educatio-

nal experiences promoted through the creation and

Federal Fluminense (UFF).

realization of the 1st Theatre Festival (FESTUNI) of the University College Geraldo Reis of the Universi-

O Coluni nasceu por meio de parceria da

1 - 1 Doutorando em Políticas Públicas e Formação Humana pela UERJ, mestre em Educação Tecnológica pelo CEFET-MG. Professor convidado no INEQ e professor substituto na UFF, lotado no Coluni.

INEQ - Educação integral

59


UFF com o Governo do Estado do Rio de Janeiro.

abarcam em suas atividades as aulas regulares,

O Estado garantiu a permanência de alguns profis-

as oficinas temáticas e a Escola de Cinema do Co-

sionais, entre professores e técnicos da educação,

légio Universitário. Vale ressaltar que a UFF possui

e a UFF complementou o quadro com docentes

o curso de licenciatura em Cinema e Audiovisual, e

efetivos, temporários ou substitutos, e bolsistas

grande parte dos alunos desta graduação atuam

da Universidade.

no COLUNI por intermédio das oficinas promovidas pela Escola de Cinema do Colégio Universitá-

O Coluni é uma unidade acadêmica vincu-

rio. Essas ações dão suporte artístico e cultural

lada à Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD), e

para as demais atividades do Colégio. Há, porém,

direciona-se ao atendimento da Educação Infantil

falta de entendimento e de conhecimento por par-

e Básica na UFF. Por ser uma unidade acadêmi-

te de alunos e docentes da UFF de que trata-se do

ca, possibilita aos licenciandos da universidade

Colégio da Universidade. Seja pelo Coluni estar fisi-

a prática de ensino (estágio supervisionado), os

camente fora do Campus do Gragoatá, ou por sua

projetos de Iniciação à Docência, e a participação

arquitetura ser pertencente ao modelo dos Cen-

de alunos (Ensino Médio e Graduação) em editais

tros Integrados de Educação Pública2. É recorren-

fomentados pela UFF, por meio de propostas de

te, como presenciei inúmeras vezes, os docentes

seus docentes.

direcionarem-se à UFF em suas falas, como um

espaço fora do COLUNI, como se não pertences

O ingressos dos educandos, desde 2006,

sem ao corpo docente da universidade.

realiza-se por sorteio público. Nesse sentido, o Colégio propicia o diálogo entre crianças e jovens de

diversas e distintas classes sociais.

são: o comprometimento do corpo docente e ad-

Algumas das características do COLUNI

ministrativo para a realização de atividades educa

A motivação para desenvolvimento deste

tivas que propiciem reflexões e ações transforma-

trabalho surgiu através de minha vivência no FES-

doras na vida dos educandos, prover por meio da

TUNI. Sou professor substituto de artes da UFF,

escola em tempo integral a educação por projetos

lotado no COLUNI. Muitas das ideias contidas são

e a interdisciplinaridade com atividades que permi-

pessoais, portanto, não houve preocupação siste-

tam pensamento crítico sobre a sociedade e, pro-

mática com a objetividade, havendo tendências de

mover no cotidiano entre seus educandos e seus

julgar os fatos se deixando influenciar por senti-

funcionários, um ambiente pautado pelo respeito

mentos e emoções. Entretanto, isso não exclui o

e pela afetividade. Grande parte de seu alunado in-

teor científico e a preocupação em chamar aten-

gressa no Ensino Fundamental I e permanece até

ção ao assunto central, às propostas artísticas na

a conclusão do Ensino Médio no Colégio.

educação básica. Nesse caso, especificamente as experiências pedagógicas promovidas por in-

termédio do Festival de Teatro em um Colégio de

luni faz-se por meio do comprometimento de seus

educação integral.

atores em repensar a educação e a realidade esco-

O trabalho pedagógico proposto para o Co-

lar. A educação pressupõe ações coletivas. Como

60

A força da área Artes dentro do Coluni

trouxe Freire a escola é o lugar de gente:

2 - Criados pelo arquiteto Oscar Niemeyer, os Centros Integrados de Educação Pública (Cieps), projeto educacional do antropólogo Darcy Ribeiro, foram implantados no Rio de Janeiro ao longo dos dois governos de Leonel Brizola (1983-1987 e 1991-1994).

INEQ - Educação integral


Lugar onde se faz amigos, [...]gente que tra-

que tivemos que aprender de forma diferen-

balha, que estuda, que se alegra, se conhe-

te as habilidades técnicas que adquirimos

ce, se estima. [...] e a escola será cada vez

para podermos alcançar nossa capacidade

melhor na medida em que cada um se com-

atual. Certamente tem sorte aquele que não

porte como colega, amigo, irmão.[..] nada de

precisou desapender o que aprendeu na es-

ser como o tijolo que forma a parede, indife-

cola para progredir profissional e intelectual-

rente, frio, só. [...] numa escola assim vai ser

mente (DEWEY, 2011, p. 49).

fácil estudar, trabalhar, crescer, fazer amigos, educar-se, ser feliz. É essa escola que dese-

jamos construir, uma escola humana, capaz

força com a expansão das escolas técnicas di-

de compreender os desafios de seu tempo,

recionadas ao ensino técnico integrado, com os

e na luta pelo melhor viver, reconhecer fatos,

programas de escola em tempo integral e, com o

gestos, unir conhecimentos, recordar. 3

novo ensino médio sancionado pela lei n. 13.415

Atualmente a educação integral ganhou

de 16/02/2017 4. Contraditoriamente, essas polí

Por tratar-se de um espaço coletivo con-

ticas e iniciativas que discursam sobre formação

cebido por indívíduos que atuam na educação

humana e integral são oriundas de demandas do

integral, as disciplinas vão além da base comum

empresariado e associam o contraturno escolar à

nacional com atividades e projetos voltados às

formação para o trabalho. Existem, porém, espa-

Artes e Cultura, Educação Ambiental, Esportes e

ços de educação integral como o Coluni, na con-

Movimento, Música, Horário de Estudos, Sala de

tramão da concepção que forma exclusivamente

Leitura, Laboratório de Matemática e Línguas Es-

para postos de trabalho.

trangeiras.

As correntes pedagógicas que na atuali-

Entre as bases da concepção de educação

dade trabalham com o conceito de educação in-

integral está a de perceber os educandos como

tegral buscam romper com a dicotomia entre vida

indivíduos multidimensionais. A educação inte-

e educação escolar. Tentando relacionar a institui-

gral tem como destaque o pressuposto teórico do

ção escolar a realidade em que vivemos. Faz-se

autor John Dewey, que compreende a educação

necessário, nesse sentido, desconstruir com cer-

como reconstrução da experiência. Dewey aborda

tas amarras da vivência escolar, tais como a gra-

no tocante a experiência e educação, as materias

de curricular e a fragmentação dos saberes e dos

escolares que são ensinadas isoladamente e não

conteúdos e ainda, repensar o espaço educativo

relacionam-se com o mundo:

para além dos muros da escola.

O ensino isolado não prepara os alunos para

No ano de 2017, após discussões nos Con-

as experiências do mundo real. Quase todos

selhos de Classe e nos Colegiados do ano anterior,

nós já tivemos a oportunidade de recordar

o corpo docente implementou atividades diferen-

os dias de escola e de nos perguntar o que

ciadas. Nessa nova estrutura, pela manhã os alu-

foi feito do conhecimento que deveríamos

nos são contemplados pelas disciplinas comuns

ter acumulado durante aquele tempo e por

(português, literatura, matemática, física, química,

3 - Poesia do educador Paulo Freire, disponível no site do Instituto Paulo Freire (www.paulofreire.org). 4 - Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13415.htm

INEQ - Educação integral

61


biologia, inglês, espanhol, artes, geografia, sociolo-

O protagonismo juvenil parte do pressupos-

gia e filosofia), exceto educação física que ocorre

to de que o que os adolescentes pensam, di-

no período da tarde e os alunos escolhem qual es-

zem e fazem podem transcender os limites

porte/modalidade desejam cursar e mudam esta

do seu entorno pessoal e familiar e influírem

atividade trimestralmente.

no curso dos acontecimentos da vida comunitária e social mais ampla. Em outras pala-

No período da tarde acontecem as ativida-

vras, o protagonismo juvenil é uma forma de

des que o Colégio nomeia como disciplinas eleti-

reconhecer que a participação dos adoles-

vas. Os docentes criam aulas que possuam domí-

centes pode gerar mudanças decisivas na

nio de conteúdos e bases

discussões,

realidade social, ambiental, cultural e política

e que diferenciem-se das disciplinas obrigatórias

onde estão inseridos. Nesse sentido, parti-

citadas anteriormente. Para se ter uma ideia, apre-

cipar para o adolescente é envolver-se em

sentam-se alguns títulos das disciplinas eletivas e

processos de discussão, decisão, desenho e

seus objetivos centrais; Não aceite o segundo lu-

execução de ações, visando, através do seu

gar baby (discute o feminismo por meio da música

envolvimento a solução de problemas reais,

pop dos anos 80 e 90), Ciências na Cozinha (prá-

desenvolver o seu potencial criativo e a sua

tica de receitas culinárias com entendimento da

força transformadora. Assim, o protagonis-

ciência nos alimentos e nos processos culinários),

mo juvenil, tanto um direito e quanto um de-

As 10 estratégicas de manipulação da mídia cor-

ver dos adolescentes. (COSTA, 1996, p. 65).

para

porativa (discute a manipulação do corporativismo pautado pela expansão do capitalismo), Arte

Vale ressaltar que esta concepção corro-

e Trabalho (discute as concepções de trabalho por

bora com a ideia educativa de aprender como se

meio de obras de arte), Capoeira (além da prática,

aprende, onde os próprios educandos descobrem

trabalha questões históricas de seu surgimento),

maneiras que podem compreender e selecionar

Fotografia (técnicas, mídias sociais e empodera-

os conteúdos para desenvolverem novos saberes.

mento), Cinema (técnicas e propostas documen-

Cabendo aos docentes e os educandos o constan-

tais), Canto Coral, entre outras.

te diálogo sobre expectativas, anseios e possibilidades de novos conhecimentos e de construções

As disciplinas eletivas são ofertadas tri-

mestralmente, ou seja, a cada três meses os alu-

culturais por intermédio da estrutura curricular eleita pelos alunos.

nos elegem novas disciplinas. Esse processo de leitura das ementas, de escolha, de prática e de

As limitações dessa proposta pedagógica

troca des disciplinas permite aos educandos au-

– disciplina obrigatórias e eletivas - do Coluni es-

tonomia, auto disciplina e o protagonismo juventil

barram geralmente nas questões levantadas pelos

por meio da construção dos conteúdos que estão

alunos do último ano do Ensino Médio, pautados

interessados.

na preparação para o vestibular, consequentemente, na entrada ao ensino superior. Há, portanto, a

Para respaldar o afirmado sobre protago-

nismo juvenil e educação integral, ainda para compreensão do processo educativo para além dos muros da escola, cita-se Costa (1996, p.65):

62

INEQ - Educação integral

necessidade de abordar com frequência a concepção de educação proposta no Coluni.


AS ARTES NO COLUNI.

atral/cênica.

A organização das atividades artísticas,

As turmas dos três anos do Ensino Médio

consequentemente da disciplina Artes no Coluni

foram responsáveis pelo processo criativo de uma

também é diferenciada do comum nas escolas pú-

cena teatral. Cada turma foi dividida em 4 núcleos,

blicas. As turmas vivenciam a cada trimestre (são

a saber; (i) atuação, (ii) cenografia, (iii) figurino e

três trimestres por ano) uma das linguagem artís-

maquiagem e, (iv) sonoplastia. Cada núcleo pes-

ticas. Um semestre com artes visuais, um semes-

quisou as referências para a criação do produto

tre com música e um semestre com artes cênicas,

cênico da turma e o executou, ou seja, o núcleo

não necessariamente nesta ordem. Importante

de figurino desenvolveu os figurinos das persona-

ressaltar que todas estas linguagens abordam a

gens, o de cenografia criou a proposta de cenário,

história da arte, a arte como política, a fruição ar-

o de sonoplastia pesquisou, organizou e executou

tística e a arte em interface com as transforma-

a trilha sonora e as sonoplastias e, o núcleo de

ções societárias. Corrobora Barbosa sobre meto-

atuação compôs as personagens e ensaiou para a

dologia no ensino das artes (1991):

apresentação da cena. Enquanto professor de Artes, dirigi as quatro cenas e escrevi três das quatro

A metodologia deve ser de escolha do pro-

cenas.

fessor e do fruidor, o importante é que obras de artes sejam analisadas para que

Faz-se importante trazer para este texto, as

se aprender a ler a imagem e avaliá-la; esta

impressões e aprendizagens dos alunos sobre o

leitura é enriquecida pela informação acerca

processo de criação coletivo para o Festival. Se-

do contexto histórico, social e antropológico

gundo N. A., aluna do primeiro ano do Ensino Mé-

(BARBOSA, 1991, p. 39)

dio/Coluni:

Nesse caminho, todas as turmas viven-

No processo de desenvolvimento do Festi-

ciam as linguagens artísticas, exceto a dança, esta

val, até mesmo na escolha de qual seria a

linguagem é contemplada pelas atividades de edu-

nossa peça, a coisa já estava ficando inte-

cação física nas oficinas voltadas ao ritmos, ginás-

ressante. No Coluni, o teatro nunca esteve

ticas e composições coreográficas.

tão presente, a não ser um projeto extra cur-

ricular que teve há anos, e isso, para mim, As contextualizações sobre o Colégio Uni-

foi muito bom. Tivemos contato com outro

versitário, a organização curricular e a disciplina

lado da arte, que não a plástica e audiovisu-

de Artes serviram de base para a compreensão do

al. O mais interessante é que entramos de

que veio a ser o 1º Festival de Teatro do Coluni/

cabeça no projeto e os alunos, principalmen-

UFF (FESTUNI).

te os atores, queriam dar tudo de si para que

saísse perfeito. Ai que eu diria que as difiO FESTUNI.

culdades se encontraram, porque tínhamos pouco tempo de ensaio e os mesmo foram

O FESTUNI foi executado durante as aulas

se encaixando em outros horários, que não o

da disciplina de Artes, especificamente com os

da aula de artes. Apesar de todos os peque-

alunos do Ensino Médio utilizando a linguagem te-

nos erros e dificuldades, conseguimos pegar

INEQ - Educação integral

63


a essência da coisa, o friozinho na barriga

sendo revelados, as homenagens sendo fei-

na hora da apresentação, na frente de um

tas, e logo depois, esses mesmos trabalhos

público considerado grande e ainda tivemos

sendo premiados, inclusive o meu! Muito

um ator revelação, que foi o Patrick. Nunca vi

obrigada pelo evento maravilhoso e que ve-

essa pessoa tão dedicada a fazer algo quan-

nham mais Festuni’s! (L.R., aluna do Ensino

to essa peça e que atuou incrivelmente bem.

Médio/Coluni, 2017)

Foi sensacional toda a experiência. Só tenho a agradecer você, Caio, por nos proporcio-

O depoimento do aluno L. V. também do

nar momentos tão marcantes na história do

segundo ano do Ensino Médio que fez participa-

Coluni. (N.A., aluna do Ensino Médio/Coluni,

ção como ator em uma das cenas, elucida o pro-

2017)

cesso criativo desde o planejamento até o dia do evento:

Já a aluna do segundo ano do Ensino Mé-

dio, L. R. abordou em seu depoimento questões

O processo de criação das cenas foi livre e

relacionadas a criação do cenário e os aspectos

exercido tanto pelo professor como pelos

técnicos do Festival:

alunos que atuavam, cenografavam ou cuidavam da sonoplastia e figurino. Os roteiros

64

Participar do primeiro Festuni foi uma ex-

sempre estavam abertos para mudanças e

periência única para mim, pois fiz parte de

cada área da criação ajudava a outra. As difi-

um evento grande e que nunca tinha acon-

culdades não foram tão marcantes durante o

tecido no Coluni. Na sala de aula, quando o

processo, o pessoal da cenografia teve ajuda

professor Caio nos contou que o festival iria

para conseguir o possível para os cenários,

acontecer e que cada um teria que participar

quem ficou responsável pelos figurinos teve

de alguma forma, eu logo escolhi a cenogra-

apoio de grande parte da comunidade esco-

fia, pois era o que eu mais me identificava e

lar, e os sonoplastas, partindo da experiência

achava que seria interessante contribuir. Re-

própria, escolheram as músicas que deram

almente foi interessante, mas deu bastante

ritmo ao espetáculo. A questão da atuação

trabalho. E, quando eu soube que seria em

é um pouco mais pessoal. Eu, por exemplo,

um auditório de teatro grande, a minha res-

nunca tendo atuado, tive que enfrentar a ti-

ponsabilidade e a do grupo aumentou e eu

midez, fiquei nervoso durante toda a prepa-

fiquei mais assustada e nervosa do que o

ração, mas quando subi no palco, olhei pra

normal, já que seria um evento muito maior

cada um e vi que todos estavam curtindo o

e aberto ao público fora do ambiente esco-

momento, com um sorriso estampado no

lar. A partir disso, tive que me dedicar mais,

rosto, me acalmei. Talvez a maior dificuldade

junto com meu grupo, para que todo cenário

tenha sido o fato de nunca termos realizado

ficasse bem feito e pronto a tempo para as

um festival como aquele. O momento mais

três cenas da minha turma. No dia, foi muita

interessante foi a manhã do dia das apre-

correria antes e durante as peças, mas de-

sentações. Foi muito proveitoso observar a

pois foi muito gratificante ver que, apesar

comunidade escolar toda mobilizada com o

de tudo, deu realmente certo. Foi lindo todo

evento. Ver cada aluno, entrando e saindo do

o trabalho dos alunos, os grandes talentos

auditório, indo e voltando à escola para bus-

INEQ - Educação integral


car algo, carregando cenário pra lá e pra cá,

rins com madeiras e materiais para a confecção

maquiando, se vestindo, passando fala, en-

dos cenários encontrados no almoxarifado do Co-

saiando... Todo o processo passou um sen-

légio.

timento de união e comprometimento. (L.V., aluno do Ensino Médio/Coluni, 2017)

Outro fato interessante relacionado à for-

mação de docentes – um dos objetivos do ColéO processo explicitado na citação anterior,

gio Universitário - foi a presença de estagiários e

entre a escolha do texto dramático, das persona-

bolsistas licenciandos da UFF na organização do

gens, da divisão dos núcleos, das pesquisas e dos

Festival. Alunos do curso de Licenciatura em Cine-

ensaios, durou 2 meses. O tempo foi fator de entra-

ma e Audiovisual fotografaram o evento, e alunos

ve para maior aprofundamento das cenas, já que

das demais licenciaturas autorizados pelos pro-

cada turma tem duas aulas semanais e cada aula

fessores regentes das disciplinas, auxiliaram nos

com 50 minutos. Caso houvesse tempo maior po-

últimos ensaios com as turmas e no dia do evento.

deriam ter sido realizadas discussões sobre pro-

Nesse sentido, os professores de outras discipli-

cessos teatrais mais amplas que apenas a prática

nas contribuíram para a realização 1º Festival de

de ensaios e pesquisas direcionadas à cena eleita

Teatro do Coluni e propagaram o teatro com o viés

pela turma.

pedagógico.

O Coluni não possui teatro, somente um

As professoras e os professores dos seg-

auditório voltado à palestras e reuniões, sem co-

mentos das artes e da educação física auxiliaram

xias, sem iluminação e sem recursos cênicos. Para

durante todo o processo do Festival, em especial,

tanto, foi-se solicitado o pedido de empréstimo do

a professora Gabriela que ministra música no Co-

auditório da Faculdade de Economia da UFF. O

légio, que dedicou-se em diversos momentos da

pedido foi aceito, e o FESTUNI foi realizado no dia

organização do FESTUNI. Vale ressaltar que ações

25/05 às 19h no Auditório da Faculdade de Econo-

pedagógicas como essa, resultam do trabalho co-

mia UFF- Gragoatá.

letivo como princípio educativo, dialogando com o currículo e com a gestão democrática.

O auditório emprestado para o FESTUNI,

ainda que em melhores condições para receber

CONSIDERAÇÕES FINAIS - A ESTREIA.

apresentações teatrais – com palco e aproximadamente 230 poltronas confortáveis - não tem ilumi-

O evento aconteceu no dia 25 de maio de

nação cênica, coxias ou camarins. Diante dessas

2017, e o Colégio cedeu a quinta-feira (data do FES-

dificuldades, entretanto, foram articulados com o

TUNI) para ensaios e para a montagem do espaço

Colégio de Aplicação da Universidade Federal do

das apresentações. Esse dia, especificamente, foi

Rio de Janeiro o empréstimo de tecidos pretos

importante para os alunos do Ensino Médio pelos

para o fundo do palco e de refletores para ilumina-

seguintes fatores, a saber; (i) os alunos sentiram-

ção dos atores e do cenário.

-se pertencentes à UFF já que passaram todo o dia no auditório da Faculdade de Economia, (ii) a ex-

Os profissionais da área administrativa do

celente organização das turmas com respeito aos

Coluni também contribuíram bastante para a rea-

horários de ensaio e de montagem dos cenários,

lização do Festival, visto que improvisaram cama-

(iii) a vivência de um ensaio geral, (iv) o nervosismo

INEQ - Educação integral

65


enxergado em alunos que sempre mostraram-se seguros e independentes, o teatro é exercício cole-

Não foi objetivo central da proposta desco-

tivo e necessita do outro e, (v) a plateia estava lo-

brir grandes atores, atrizes ou técnicos e técnicas

tada, inclusive muitas pessoas tiveram que sentar

das artes do espetáculo. O foco era o de possibili-

nos chãos dos corredores do auditório.

tar com que todos pudessem experienciar o teatro na disciplina de Artes. Não houve exigência para

A noite as três turmas apresentaram suas

que nenhum aluno ou aluna atuasse, todos pude-

cenas. Entre as atrações também foram apresen-

ram escolher seu núcleo de trabalho, possibilitan-

tadas uma cena teatral dos alunos do Ensino Fun-

do o desenvolvimento de habilidades individuais

damental I, uma cena teatral da disciplina eletiva

com objetivo de:

Arte e Trabalho e uma apresentação musical da encorajar os seus alunos (...) a resolver pro-

disciplina eletiva de Canto e Coral.

blemas e efetuar tarefas que estejam relaO público era variado, entre familiares, es-

cionadas com a vida na comunidade a que

tudantes da graduação, professores e os próprios

pertençam, e que favoreçam o desenvolvi-

alunos do Coluni. Ainda que visivelmente era uma

mento de combinações intelectuais individu-

grande improvisação diante das possibilidades,

ais a partir da avaliação regular do potencial

era como se o encanto do teatro chegasse naque-

de cada um. (GAMA,p.4)

le auditório.

Foram presentes no dia 25 de maio os

Foram diversos conteúdos, conhecimen-

abraços, os olhares, os medos e o trabalho cole-

tos e saberes desenvolvidos durante o processo e

tivo vivenciado no palco por todos alunos artistas.

as apresentações do Festuni. Conhecimentos da

Foram assistidas as produções dos núcleos técni-

vida real, tais como: trabalhar com a ansiedade,

cos de cenário, figurino e maquiagem e, sonoplas-

controlar o nervosismo, falar com apropriação e

tia. Árduo trabalho para educadores e educandos,

estudo do ponto de vista da personagem, a leitura,

porém, significativo, memorável e pedagógico.

a interpretação, a vivência vocal e corporal exposta para uma público de mais de 200 pessoas, o sentido do trabalho coletivo, o olhar nos olhos, a noção de tempo e de espaço, e principalmente, o respeito às artes cênicas na formação escolar. Segundo Cavassin o teatro e a educação tem relações concretas (2008): O teatro como conhecimento busca respostas para os questionamentos sobre o que é o mundo, o homem, a relação do homem com o mundo e com outros homens nas teorias contemporâneas do conhecimento que propõem novos paradigmas para a ciência. (CAVASSIN, 2008, p.42).

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INEQ - Educação integral

REFERÊNCIAS BARBOSA, A. M. T. de B. A Imagem no Ensino da Arte. São Paulo: Editora Perspectiva, 1991. CAVASSIN, J. Perspectivas para o teatro na educação como conhecimento e prática pedagógica. Revista científica/FAP, Curitiba, v.3, pp.39-52 , jan./dez. 2008. COSTA, A. C. G da; VIEIRA, M. A. Protagonismo Juvenil: adolescência, educação e participação democrática. São Paulo: FTD, 2006. DEWEY, J. Experiência e educação. São Paulo: Editora Vozes, 2011. FREIRE, P. Pedagogia da esperança. 13ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006. GAMA, M. C. S. S. A Teoria das Inteligências Múltiplas e suas implicações para Educação, 2008. Disponível Em:<http://www.homemdemello.com.br/psicologia/intelmult.html.> Acesso em 18 jul. 2017.


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