Informe C3 - Edição 05

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Onde estรก a moda?


Foto: Anderson de Souza


ano 01 - Edição 05 - Julho/2009

www.processoc3.com

Capa: Bianca Schmidt Bonato Foto: Anderson de Souza Local: Canoas/RS/Brasil

Informe C3: Porto Alegre/Canoas/São Leopoldo/RS. Distribuição: Gratuita e ilimitada pelo território da internet. Direção e organização: Wagner Ferraz Pesquisa e organização: Processo C3 Pesquisadores: Anderson de Souza, Francine Pressi e Wagner Ferraz Projeto gráfico e execução: Anderson de Souza e Wagner Ferraz Contato: Wagner Ferraz 55-51-9306-0982 wag_ferraz@hotmail.com www.processoc3.com

Colaboradores:

- Paulo Duarte - Coimbra/Portugal - Rodrigo Monteiro - Porto Alegre/RS/Brasil www.teatropoa.blogspot.com - T. Angel - Frrrk Guys - São Paulo/Brasil www.frrrkguys.com - prisciladavanzo - São Paulo/Brasil - Luciane Moreau Coccaro - Porto Alegre/Rio de Janeiro - Kássia Gasrcia - São Paulo/Brasil - Marta Peres - Rio de Janeiro/Brasil - Nízia Villaça - Rio de Janeiro/Brasil - Mário Gordilho - Espírito Santo/Brasil - Daiane Oliveira da Silva - Canoas/Brasil - Sayonara Pereira - Campinas/Brasil


Bibliografia SOUZA, Anderson de; PRESSI, Francine; FERRAZ, Wagner (orgs.). “Informe C3: Onde está a moda? Regra/Formatividade/Estilo de Vida/Consumo”. Canoas, RS: S/E, julho de 2008. Obs.: - S/E - Sem Editora. - Apenas em formato digital.

Disponível em: http://www.processoc3.com/informe_c3/edicao05/processoc3_edicao05.pdf


Agradecimentos Agradecemos também a todos que de forma direta ou indireta colaboraram com o Processo C3 Grupo de Pesquisa e com o Informe C3.

Terpsí Teatro de Dança

Porto Alegre/RS/Brasil www.terpsiteatrodedanca.blogspot.com

T. Angel - Frrrk Guys São Paulo/Brasil www.frrrkguys.com

Paulo Duarte

Coimbra/Portugal

Rodrigo Monteiro

Porto Alegre/RS/Brasil www.teatropoa.blogspot.com

Priscila Davanzo São Paulo/Brasil

Níza Villaça

Rio de Janeiro/Brasil

Kássia Garcia São Paulo/Brasil

Marta Peres

Rio de Janeiro/Brasil

Daiane Oliveira da Silva Canoas/RS/Brasil

Luciane Moreau Coccaro Rio de Janeiro/RJ/Brasil

Antonio Carlos Cardoso Porto Alegre/RS/Brasil

Marcos Grabowski Florianópolis/RS/Brasil

Juliana Moascofian Montenegro/RS/Brasil

Glória Kalil

São Paulo/Brasil

Sayonara Pereira Campinas/Brasil

Didio - Fotógrafo São Paulo/Brasil

Beatriz Caillaux - CCBB Rio de Janeiro/Brasil

Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro/Brasil

Victor Rabelo Goiás/Brasil

Mário Gordilho

Espírito Santo/Brasil

Ivana Debertolis - Grão Imagem São Paulo/Brasil

Queli Giuriati - Revista Versatille Porto Alegre/RS/Brasil

SENAC Moda e Beleza Canoas/RS/Brasil

Bianca Schmidt Bonato Canoas/RS/Brasil


Apresentação Onde está a moda?

A moda apresentada nesta edição está inserida num contexto de modaS, onde muitas possibilidades de tudo que tende a estar em evidência é reconhecido como moda. A partir disso, diferentes pesquisadores apresentam suas visões ou observações de formas distintas, porém que se ligam em alguns momentos. Pois são evidenciadas algumas faces da moda que apontam para os territórios onde essas modas se manifestam e/ou se constroem. Mas que mais interessa é despertar a visão dos leitores para observar onde a moda está e pontuar alguns grupos, indivíduos e territórios que se destacam quando esse assunto é abordado. A partir dessa edição temos a Antropóloga Luciane Moreau Coccaro, professora na UFRJ confirmando sua “presença” como colaboradora fixa. Para o Processo C3 é um imenso prazer, foi através das aulas de Prof. Luciane Coccaro na Graduação em Dança na Universidade Luterana do Brasil que nasceu o Processo C3 Grupo de Pesquisa e a Revista Virtual Informe C3. Hoje todas as adições elaboradas surgem das lembranças dessas aulas que nos marcaram tanto. Também está conosco colaborando a pesquisadora Nízia Villaça, escritora de vários livros, prof. da UFRJ, sempre muito atenciosa... Nízia é uma das pesquisadoras que mais nos fornece fontes de pesquisa através de suas obras, tê-la colaborando nesta edição é uma honra. Obrigado Nízia.

Marta Peres, também prof da UFRJ que de forma muito gentil se colocou a disposição para colaborar sempre com este projeto. Para nós será de grande importância tê-la por perto e inserida em nossas propostas, colaborando com seus textos que serve também para nos orientar. Kássia Garcia se aproximou através da indicação de nossa colaboradora de outras edições Priscilla Davanzo. Kássia é uma profissional da área da moda, pesquisadora e cursa o mestrado em moda do SENAC. Priscilla sempre enriquece todas as edições com suas propostas sobre arte. Mário Gordilho nos permitir aprecia sua poética e Paulo Duarte sempre desmistificando as relações entre Corpo e Religião contribuindo com seu admirável conhecimento filosófico. Não podendo esquecer o importante trabalho de T. Angel que representa a cultura das modificações corporais e da body art contribuindo com seu trabalho que marca a história nesse seguimento através de seu site www.frrrkguys.com. E colaborando com questões técnicas como organização de materiais e transcrição de entrevista está conosco Daiane de Oliveira da Silva, aluno do Curso Técnico em Moda do SENAC, dedicado a tudo o que faz e de grande responsabilidade, se demonstrou atenta, interessada e disponível para colaborar. Finalizo agradecendo a todos que colaboraram e a todos que colaboraram sempre com este projeto, além de salientar a importância e dificuldade que eu, Anderson de Souza e Francine Pressi enfrentamos para desenvolver cada edição. Obrigado pela paciência...

Um abraço Wagner Ferraz

O “Processo C3 Grupo de Pesquisa” busca investigar os processos de construção do Corpo em diferentes contextos Culturais, relacionando com os discursos e práticas da Contemporaneidade. Tendo as artes, Moda e questões socioculturais como focos para tentar esclarecer e fortalecer interrogações.


Índice Ensaio 01 - Onde está a moda? Wagner Ferraz

16

Ensaio 02 - Moda, fetiche e produção de sentido Luciane Moreau Coccaro

20

Ensaio 03 - O corpo da moda - ProAna Jejum como estilo de vida ou só lipofobia mesmo? Luciane Moreau Coccaro

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Exposição - Viagens Extraordinárias Yves Saint Laurent

32

Leituras Indicadas

77

Entrevista 01 - Glória Kalil

68

Ensaio 04 - Traços da filmografia de Almodóvarvnas costuras de Martins Paulo Anderson de Souza

70

Crítica Teatral Rodrigo Monteiro

76

Banco de Dados Terpsí: Terpsí “Esperto e desperto”

Wagner Ferraz 78

Ensaio 05 - A moda no contexto Hip Hop Francine Pressi

80


Ensaio 06 - Pina Bausch: Inesquecível criadora de momentos de poesia Sayonara Pereira

84

Entrevista 02: Marcos Grabowski

86

Ensaio 07: Home - a moda e a sustentabilidade fora de uma perspectiva histórica priscilladavanzo

94

Ensaio 08: Religião - “a la carte”? Paulo Duarte

100

Ensaio 09: Uma breve passagem pela história da moda e a luta de classe Kássia Garcia

104

Ensaio 10 - Beautification T. Angel

107

Ensaio 11 - Identidade à deriva Marta Peres

110

Poema: O sexo Mário Gordilho

113

Quem é quem? Currículos Processo C3

118

Quem é quem? Currículos colaboradores

120

Foto: Anderson de Souza - Fashion Rio Edição Primavera/Verão 2009/2010.


Onde está a moda? Regra/Formatividade/Estilo de Vida/Consumo O que tem sido reconhecido como moda na sociedade contemporânea? Os diferentes estilos de vida apresentam possibilidades para criadores de diferentes áreas concretizarem suas idéias e disponibilizá-las para consumo? O outro diz quem é ou acredita ser para que possa se produzir para ele e para todos tantos outros? Seria por uma questão de pertencimento? Ou se produz para que os sujeitos se construam com base no que está a sua disposição? Seria uma manipulação? Seria um jogo, uma troca? O que é e como é a moda dentro em diferentes contextos? O corpo da moda, a dança da moda, as palavras da moda, a música da moda, as pessoas da moda...



Poluir ĂŠ moda?

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Cenas como esta ainda est達o na moda? 14 - Informe C3



Ensaio 01 Wagner Ferraz

Este ensaio faz parte de um apesquisa em processo.

Onde está a moda? O local, o espaço ou o território físico, virtual ou simbólico onde se pode encontrar a moda, pode ser nomeado e numerado com grande diversidade construída e legitimada pela contemporaneidade. No senso comum a moda está na moda, nas vitrines e nas passarelas. Não deixa de ser uma realidade reconhecida como verdade para alguns contextos. Porem a moda pode ser encontrada, vista, percebida e acessada em outros espaços. Recentemente o programa “Fantástico” da rede Globo de Televisão iniciou um quadro apresentado por Regina Case, intitulada “Vem Com Tudo”. Durante alguns domingos o “Vem Com Tudo” tem apresentado “tudo” o que tem estado em evidencia em alguns grupos sociais no Brasil. Isto é, todas as tendências, tudo o que está em alta, tudo o que tem sido considerado moda. “o diferente precisa ser colocado fora das fronteiras: negros, estrangeiros, animais, classes inferiores e mulheres”. VILLAÇA(2007) Nessas tendências, nessas modas, pois nesse caso é possível falar de moda no plural, tem sido destacado, tanto diferentes elementos para comercialização, para o consumo, como movimentos culturais. Trata-se de uma investigação de campo que busca ir nos meios onde estas diferentes modas se encontram. Automaticamente além de trazer reflexões sobre o que tem sido valorizado neste momento em diferentes locais, também indica onde estas modas estão ou podem ser encontradas. Se partirmos deste ponto de vista, é possível observar que de acordo com a necessidade, com os desejos, com os ideais e valores de cada grupo social, algo é evidenciado e muitas vezes se espalha se for conveniente para tantos outros que possa ter acesso ou o poder de manipular e fortalecer as direções que estas tendências possam seguir. No mês de junho deste ano o astro pop Michael Jackson faleceu. Apesar de ser reconhecido como um mito e admirados por muitos, o astro não deixou de cair no contexto de uma determinada moda após sua morte. Para muitos evidenciar Michael Jackson é uma forma de homenagem, para outros lembra-lo de diversas formas é um modo de dizer o quanto estão sofrendo, e para mui-

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Michael Jackson em pouco tempo após sua morte se tornou objeto de consumo, sempre foi, mas agora tende a fortalecer mais a venda de alguns elementos em alguns seguimentos. Tende a ser mais comum e adequado ter sua imagem em uma camiseta ou ouvir suas músicas em qualquer ocasião. Os Emos, os Punks, os elementos indianos, as Gothic Lolitas, os concursos de moda adaptada para pessoas com deiscências e o que Gisele Bündchen estiver usando, falando e comendo pode e provavelmente será uma tendência, uma moda. Assim como grifes que nascem a cada dia indicando onde está a moda como no caso da Daslu, Daspu e agora Dasdoida. “A loja Daslu, da elite paulistana, ao ser invadida pela polícia, ocupa as paginas policiais com seu escândalo e dá lugar à criação, no Rio, da Daspu, marca que a ONG (Organização Não Governamental) DAVIDA passou a usar para os desfiles das prostitutas sob sua proteção. Tal dinâmica é viabilizada claramente pelo espaço midiático. Os espaços da cidade são ressemantizados, as pessoas mobilizadas, e fala-se em Rio, “top model”, ao mesmo tempo que surge o sugestivo programa da TV Globo, intitulado “Central da Periferia” que diz repensar a complexidade dos territórios de forma não maquineísta. Uma saída para as versões simplistas da repartição do bem e do mal?” A moda está em todos os lugares onde os indivíduos busquem apresentar possibilidades de diferenciação, lançando idéias que apresentem certos valores que sirvam de elementos de identificação para que através destes outros possam se construir.

Referência: VILLAÇA, Nízia. Moda e Periferia: Negociações Midiáticas. in: OLIVEIRA, Ana Claudia de & CASTILHO, Káthia (Orgs.). Corpo e Moda: Por uma Compreensão do Contemporâneo. Barueri, SP: Estação das Letras e Cores Editora, 2008. VILLAÇA, Nízia. A edição do corpo: tecnociência, artes e moda. Barueri, SP: Estação das Letras e Cores Editora, 2007.


Material de divulgação do 1º concursao de Moda Inclusiva que ocorreu em junho do presente ano.

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Última Tendência

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Ensaio 02

Nízia Villaça

MODA, FETICHE E PRODUÇÃO DE SENTIDO “Observe também nossa capacidade de transformar nossos objetos em fetiche a lhes atribuir poderes mágicos ou religiosos, valores simbólicos e comemorativos, virtudes afrodisíacas”. Peter Gabriel (1) A epígrafe, retirada do livro Extraordinários objetos, nos serve de mote para pequeno roteiro interpretativo da relação entre cultura, moda/corpo e fetichismo em seus diferentes contextos (marxiano, antropológico e freudiano), buscando uma ampliação da noção de fetiche que nas versões acima referidas continham a idéia de substituição enganosa determinada pela má fé (fetichismo da mercadoria na produção capitalista), a idéia de crendice e ingenuidade (implícita na transcendência dos fetiches em sociedades primitivas) e a substituição de cunho perverso (fruto de fantasias sexuais na versão freudiana). Seguiremos algumas etapas visando redefinir a dinâmica cultural no contemporâneo e refletir sobre a dinâmica corpo/moda e os processos de subjetivação nos contextos de alta visibilidade. Inicialmente é preciso ver a cultura não como um produto que se transmite, com signos estratificados, cujos valores seriam produzidos hegemonicamente, implicando assim na reificação ou fetichização no viés restritivo e negativo. Como teorizou Marx, se apagariam, desta forma, os rastros das relações sociais que a produziram. Preferimos ao contrário abrir espaço para um jogo de significação/interpretação que implica, na disputa de sentidos entre indivíduos e grupos sociais que tentam impor suas posições, procuram fazer valer suas vozes, seus direitos. Como bem lembrou Foucault as lutas por significados não se resolvem no terreno epistemológico, mas no terreno político das relações de poder. A relação corpo/moda será por nós considerada dentro do subsistema da cultura corporal que vem sendo ativamente discutido, sobretudo devido aos horizontes abertos pelas novas tecnologias da comunicação e os contextos de alta visibilidade em que a aparência é fator determinante da produção de sentidos. A moda, como outros processos culturais produz significados, constrói posições de sujeito, identidades individuais e grupais, cria códigos que guerreiam entre si. É este processo que buscaremos percorrer refletindo sobre as estratégias que a moda oferece ao corpo para sua expressão/liberação e por outro lado os mecanismos de controle do corpo embutidos nas imagens do mundo “fashion”.

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Foto: Anderson de Souza - Fashion Rio Edição Primavera/Verão 2009/2010.

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Convém fazer distinção entre dois níveis do que se pode chamar moda/fetiche tendo em vista a versão freudiana(2). Num primeiro nível, já há muito valorizado, o uso de espartilhos, botas, couros etc., faz parte de uma valorização do corpo, ou pelo menos mantém com ele uma relação. A adoração e fixação do pé de certa forma facilitava ao acesso ao corpo como um todo. Tal não acontece quando o pé é substituído pelo sapato. Valerie Steele (3) dá pistas para processar a relação moda, corpo e fetiche, neste primeiro viés. Especialista em moda, a autora reconhece a semelhança entre o submundo sadô e a moda contemporânea. “Griffes” como Azzedine Alaïa, Dolce & Gabbana, John Galliano, Jean-Paul Gautier, Thierry Mugler, Gianni Versace, Vivienne Westwood e outros, há algum tempo, copiam o estilo e o espírito do fetichismo como recurso de sedução e resultado da liberação sexual dos anos 60 e 70 e seus investimentos simbólicos. Num segundo nível de fetichismo, parece ocorrer o extermínio do corpo, sua substituição por objeto fetiche, o que, é considerado propriamente perverso. O fetiche não mais valoriza partes do corpo com o corpete, o salto agulha, a lingerie, mas o substitui. A evolução do pensamento de Baudrillard ilumina o desenvolvimento do imaginário da moda e a passagem deste imaginário à forma negativa do fetiche. Em L’échange symbolique et la mort (4), ele discute, inicialmente, a moda e sua relação com o corpo, numa perspectiva marxista, procurando desmascarar a economia política do signo e suas estratégias. Como bem assinalou Douglas Kellner (5), Baudrillard interpretou a moda como impeditiva da expressão do desejo, contrariamente às opiniões da grande maioria dos estudiosos. Interpretou o “design” como controle corporal: o corpo era desenhado, a sexualidade era desenhada, bem como as relações políticas e sociais. Numa fase ainda mais radical, o autor denuncia o fim da problemática do corpo, da sexualidade, da reprodução, da psicologia e da psicanálise, com o controle das tecnologias “softs” e do “software” genético e mental, ultrapassando a idéia de controle e manipulação. De certa forma, tal concepção do extermínio do corpo no mundo “fashion” é confirmada em numerosas matérias em revistas e jornais, onde o corpo vira literalmente vítima da moda no trabalho agressivo realizado por fotógrafos e estilistas. “O corpo sumiu” afirma Heloísa Marra no jornal O Globo (6) e Hugo Denizard (7), na mesma matéria comenta: “a moda sempre viu o corpo como impecilho para a experimentação”. Secretamente sempre lhe desejou a morte. Antes de entrar propriamente na nossa hipótese de uma amplificação da questão do fetiche na cultura contemporânea que não seja negativa, mas possa propiciar sentidos culturais plurais, fazemos um breve comentário a propósito do fetiche como instrumento ritualístico dos cerimoniais libertinos do século XVIII e o esvaziamento do fetiche em algum marketing contemporâneo.

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A Sacher-Masoch (8) desagradava ver seu romance A Vênus das peles integrando um quadro de sexualidade patológica, justamente porque, conforme ressaltou Deleuze, sua obra discutia a possibilidade de transcender o humano, sua contingência, por meio do desvelamento artístico, compreendido aí o papel desempenhado pelo objeto fetiche. O processo compreendia lentidão, silêncio, concentração, características comuns à arte e ao erotismo, sem esquecer a intensa crítica a sociedade da época. Passando ao segundo pólo do paralelo, ou seja, o “marketing” de moda nacional, assistimos a um esvaziamento de sentido que provém basicamente do lado mercadoria da cultura e se liga, portanto, ao fetiche na sua versão negativa decantada por Marx. Matéria no jornal O Globo (9) afirma que uma linha de “lingerie”, meias, pirulitos, máscaras, tamancos e cadernos está sendo lançada no mercado com a chancela da estrela do Programa H. Tiazinha, diz o jornalista, empresta seu fetiche a produtos que devem movimentar cerca de 30 milhões de reais em 1999. O corpo de Tiazinha é todo ele um fetiche, uma mercadoria usada para venda de outras. É a fetichização como mercantilização geral. Tiazinha, “a delicada sadomasoquista”, no início dos anos 2000, ocupava um lugar no imaginário de nove entre dez adolescentes, sendo reproduzida nos objetos infantis os mais diversos. Comentava Luís Fernando Veríssimo: “o Brasil conseguiu outra façanha inédita no mundo: inventou o sadomasoquismo sem maldade (10)”. Aludia Veríssimo a traço da cultura brasileira que separa o símbolo ou talvez, melhor, o signo de seu referente, sugerindo uma tendência fetichista de nossa cultura, ou seja, fazer circular significantes vazios de forma sacralizada. O fetichismo descrito por Freud introduz um dado de ambigüidade que nos interessa para reinterpretar o fetiche como elemento positivo de criatividade. O fetichista de Freud se divide entre o saber que a mãe é castrada e a fantasia de negar o fato. É esta dinâmica freudiana de crença e denegação simultâneas, sublinhada por Tomaz Tadeu da Silva (11) que utilizaremos para positivar a multiplicação dos fetiches no contemporâneo como gesto positivo de criação de sentidos num momento em que a representação perde sua transcendência ou referência fixa. De certa forma, a produção de fetiche como acentua ainda Peter Gabriel, pode contar a história do passado, o mesmo podendo acontecer com relação a uma arqueologia do futuro. Objetos inanimados tornam-se objetos de culto, objetos de desejo, objetos de medo, alimento terrestre de nossas paixões e obsessões.

Nos anos 90 a sofisticação da publicidade e do “marketing” faz da informação e da invenção de “estilos de vida” fetiches/narrativas através dos quais os indivíduos buscam se subjetivar. De alguma forma, assistimos a uma desmaterialização/pluralização do fetiche. No que se refere especificamente à moda e sua relação com o


corpo, não podemos apenas afirmar como Baudrillard que o corpo biológico é desvalorizado em prol do corpo mercadoria. Não nos esqueçamos que o corpo é uma unidade bio-psico-sociológico e, portanto, não desaparece apenas porque a ênfase não está na corporeidade propriamente dita, mas passa por fantasias imagéticas que priorizam o psico-sociológico. É sugestivo o texto de Regina Guerreiro sobre Helmut Lang na Revista Caras. O texto todo aponta para o fetiche da subjetivação contemporânea via estratégias da moda. Acompanhamos o texto: “de repente, alças e zíperes passaram a ser magistralmente bem “orquestrados” pelo dono de cada roupa, que se ajusta ou se libera legal, numa simples descolada de velcro ou sob a atração fatal de uma pastilha de ímã”. Esta tendência narrativa e criativa da publicidade, e das artes em geral que dramatizam o momento atual podem abrir espaço para a disputa de novos imaginários, para o aparecimento de novos interlocutores com seus objetos mágicos. A campanha da Fórum é um exemplo.

Recente matéria de Tales A. M. Ab’Sáber (12) sobre o erotismo contemporâneo, nos remete à possibilidade de diferentes dimensões da mercadoria e de seu fetiche. Diz ele que, mesmo na cultura de massa, deparamos com bons objetos sobre a natureza de nossa vida erótica e exemplifica com a reflexão auto-irônica de um O pecado mora ao lado, de Billy Wilder, já plenamente instalada no campo da expressão erótica da mercadoria e do seu fetiche, “podemos observar nitidamente como a relação entre desejo, objeto do desejo e constituição de experiência de si é um jogo dos mais ricos na ordem do conhecimento”. Por outro lado, em numerosas obras da cultura contemporânea, tudo parece querer dar acesso direto a coisa sexual confundida com a experiência do consumo. “As coisas se dariam como se as imagens tão comuns de lindos modelos simulando um contato erótico ocupassem e respondessem ao trabalho que o sexual costuma dar ao humano, agora tornado coisa entre coisas, para a excitação geral do fetichismo das mercadorias”.

Fotos: Grão Imagem - Colcci - SPFW Edição Primavera/ Verão 2009/2010.

Cabe aqui um parêntese lembrando Roland Barthes em seu livro Mitologias, onde o autor faz exatamente em 1957, uma crítica divertida das pequenas crenças e fetiches da classe média: o mundo das revistas femininas, os anúncios de detergentes, os espetáculos de luta livre, os filmes de Marlon Brando etc. É como se em cada parágrafo, afirma Marcelo Coelho (13) na descrição de um filé de fritas, de um copo de vinho, de um campeonato de ciclismo, o autor quisesse valorizar a inesgotável e deliciosa “realidade” que existe nas coisas em confronto com o significado da percepção rotineira da classe média que torna filé com fritas emblema nacional em vez de apreciálo gulosamente. É o percurso das simplificações dos mitos ou fetiches pequenos burgueses que motiva o autor.

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Perguntamo-nos se numa sociedade em que os sistemas de comunicação mobilizam novos interlocutores não poderemos ver a cultura como uma disputa de emblemas substitutivos de imaginários diversos, novos investimentos simbólicos. O fetiche pode não ser negativo, deixando de ser a mera emblematização banal e final do mundo onde o objeto perde a sua aura, mas, seguindo as linhas já sublinhadas, o fetiche pode conter efetivamente elementos da dinâmica do desejo e da dinâmica cultural, transformando-se em objeto mágico. Passamos por uma transmutação do corpo e de seu estatuto e todo o novo imaginário das tecnologias biológicas comunicacionais despertam a nossa fantasia para criar bens materiais e simbólicos que fazem parte da produção de uma nova antropologia.

Sem concordar com a versão negativista de Subirats perguntamo-nos se os caminhos da arte, a crise da representação, não nos levam a uma visão mais positiva do fetiche, numa democrática pluralização dos mesmos como exercício de desejo e de produção de sentidos diferenciados? A cultura como fetiche não seria finalmente uma desfetichização?


7 - Denizard, Hugo. In: O Globo, Caderno Ela, 21 de novembro de 1998. p. 5. 8 - Deleuze, Gilles. Apresentação de Sacher-Masoch; tradução Jorge Bastos. Rio de Janeiro: Taurus, 1983.

Notas: 1 - Gabriel, Peter. Extra/ordinary objects 1. New York: Taschen, 2003. 2 - Ver “Fetichismo”. In: SIGMUND, Freud. O mal-estar da civilização, vol. XXI. 3 - Steele, Valerie. Fetiche: moda, sexo & poder; tradução de Alexandre Abranches Jordão. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. 4 - Baudrillard, Jean. L’échange symbolique et la mort. Paris: Gallimard, 1976. 5 - Kellner, Douglas. From Marxism to Postmodernism and Beyond. Califórnia: Stanford University Press, 1989. p. 99. 6 - Marra, Heloísa. In: O Globo, Caderno Ela, 21 de novembro de 1998. p. 5.

9 - O Globo, 14 de março de 1999, Segundo Caderno, p. 1-2. H é o nome do programa que era levado ao ar na TV Bandeirantes. 10 - Veríssimo, Luís Fernando. O Globo, 25 de fevereiro de 1999, p. 7. 11 - Silva, Tomaz Tadeu da. O currículo como fetiche: a poética e a política do texto curricular. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. 12 - Ab’Sáber, Tales A. M. Folha de S. Paulo, Sinapse, 26 de agosto de 2003, p. 29. 13 - Coelho, Machado. “Roland Barthes se diverte com fetiches da classe média”. In: Folha de S. Paulo, Ilustrada, 15 de março de 2003, p. E-5.

Foto: Anderson de Spuza - Fashio Rio Edição Primavera/Verão 2009/2010. 24 - Informe C3

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Ensaio 03 Luciane Coccaro

O Corpo da moda - proAna Jejum como estilo de vida ou é só lipofobia mesmo?

O jejum é uma prática comum a muitas crenças religiosas, pois a presença de tabus alimentares e de regras restritivas a certos alimentos associados a determinadas datas é visto como algo normal. Historicamente, no século XII temos casos de santas católicas que morriam de fome por seus ideais, por suas crenças religiosas. O jejum nesse caso pode ser visto como virtude e é valorizado no contexto religioso. Mais próximo historicamente falando temos na novela das seis da Rede Globo de TV uma moça que fez jejum pela cura de seu amado e é considerada santa pela sua comunidade. O fato de alguém jejuar por amor é tornado virtude na novela e mostra como valorizamos o sacrifício por amor também em nossos dias. No conto “Um artista da fome” Kafka (1996) narra à estória de um faquir que preso a uma jaula num circo é visto dia a dia definhando e ficando cada vez mais magro e menor, até o momento em que ele é indagado sobre a razão de seu jejum e ele responde, eu não como porque não encontrei o alimento que me satisfaz. Particularmente, adoro esse conto, porque ele coloca A proposição da arte, a metáfora do artista numa constante insatisfação e buscando através de sua obra as respostas mais internas, talvez inalcançáveis, mesmo assim segue criando na tentativa de matar a fome com sua arte. Esses exemplos de jejuns nos remetem a nossa sociedade, e me pergunto em que momento ela decidiu (como cultura) seguir a regra de passar fome para esbanjar um corpo magro sinônimo de distinção e poder social. Questão essa motivada pelo conhecimento do site: http:// www.proana-paradise.cjb.net/ - Bom, recomendo não pelo exótico da prática de não comer, porque isso não é assim nada de novo, mas pelo discurso das Anas de que ser anoréxica não é uma doença e sim um estilo de vida. Algo interessante é pensar que em todos os casos, seja no site ProAnas, seja no caso das virgens santas que jejuavam ou no caso do Faquír, todos esses eventos de jejuar ocorrem de forma pública, para uma platéia. A visibilidade e a exposição é algo recorrente. Talvez a idéia desse artigo seja mesmo refletir sobre o porquê do jejum ser tão valorizado por esses grupos e em especial pelas Anas - foco dessa reflexão - que via internet espalham fotos e mais fotos do que elas consideram perfeição de corpo como ideal a ser atingido.

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O jejum na medicina é recomendado horas antes de uma intervenção cirúrgica e, pontualmente dependendo da doença diagnosticada são sugeridas regras restritivas a certos alimentos. Mas o caráter desse jejum não é público, mas uma conversa entre médico e paciente, salvo aqueles conhecimentos que vazam das consultas médicas para a mídia e daí acabam se tornando verdades no senso comum e, acabam contaminando nossas escolhas alimentares. O ponto que queremos ressaltar aqui é que a medicina, além de voltar-se principalmente para o tratamento de doenças, opera também como um saber sobre a vida e a morte. Nesse sentido, ao definir padrões de comportamento saudável, expande-se sobre aspectos da vida social que não eram definidos como médicos anteriormente. Este é o caso da anorexia e, conseqüentemente, das práticas alimentares, que têm consistentemente sido alvo de intervenção por parte de áreas da medicina.


Influências da biomedicina no comportamento de camadas médias e elitizadas da sociedade, bem como destas quando demandam respostas científicas para seus problemas junto a setores médicos, constituem-se uma via de mão dupla: nem só a sociedade influencia como também é influenciada por saberes médicos. Segundo Fischler (1995a), existe uma imbricação entre o campo médico e setores dominantes da sociedade, posto que os médicos fazem parte da sociedade, havendo portanto uma relação entre posição ocupada no interior do campo médico e a camada social a qual pertencem. A anorexia é um transtorno alimentar segundo Drauzio Varella no site: http://drauziovarella.ig.com. br/arquivo/arquivo.asp?doe_id=63 – Esse médico é um exemplo na medicina de alguém que faz a ponte entre conhecimentos do campo médico com a sociedade, ou seja, ele se popularizou – ganhou visibilidade - através da participação em programas de TV, séries do programa Fantástico onde ele fala de doenças de forma bastante clara e simples, construindo um discurso direcionado ao público leigo. Anorexia nervosa é um distúrbio alimentar resultado da preocupação exagerada com o peso corporal, que pode provocar problemas psiquiátricos graves. A pessoa se olha no espelho e, embora extremamente magra, se vê obesa. Com medo de engordar, exagera na atividade física, jejua, jejua, vomita. É um transtorno que se manifesta principalmente em mulheres jovens, embora sua incidência esteja aumentando também em homens. causas Diversos fatores favorecem o aparecimento da doença: predisposição genética, o conceito atual de moda que determina a magreza absoluta como símbolo de beleza e elegância. (Drauzio Varella, negrito meu)

Fotos: Anderson de Souza - Salinas - Fashion Rio Edição Primavera/Verão 2009/2010.

Segundo Goldenberg (2002) ao pesquisar camadas médias da Zona Sul Carioca percebeu que existiria atualmente uma nova moral com relação ao corpo e a sua visibilidade e exposição que é a moral da boa forma. Para a autora tem se expandido uma visão de corpo construído através de academias e ou plásticas cirúrgicas para manter uma aparência jovem e magra. Rapidamente tem se difundido nas revistas, nas novelas, nos comerciais de TV, nas passarelas, na internet esse padrão de corpo cada vez mais jovem e magro. Envelhecer e engordar são muito condenados em nossa sociedade atual. Na moda a primeira aparição emblemática desse corpo magro - anoréxico? - foi a modelo Twiggy nos anos 60. E desde então esse corpo foi sendo visto, valorizado e foi sendo consumida a idéia de padrão de beleza enquadrado nesse molde de corpo. Tínhamos no cinema uma diva magrinha – anoréxica? – Audrey Hepburn, símbolo de beleza e elegância da década de 50. E no desenho animado, muitos de nós nos criamos dando muitas risadas da heroína – anoréxica? – Olívia Palito.

Fotos: Anderson de Souza - Carlos Tufvesson Fashion Rio Edição Primavera/Verão 2009/2010.

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Então, modelos de corpo magro não faltam para nos informar do padrão de beleza exigido e internalizado, naturalizado como O certo em nossos dias. Santanna (1995) é uma autora que estudou a partir da década de 50 como as divas do cinema americano foram vendendo a imagem de beleza da época e por tabela foram ditando a moda na maquiagem, no vestuário e no comportamento. Seu estudo vem até a década de 90. Boa leitura para quem quer aprofundar e entender porque e o que consumimos como moda. Aliás, nas fotos encontradas no site proAna estão lá fotos de manequins consideradas magras e valorizadíssimas pelas Anas como modelo de perfeição de corpo, ideal a ser perseguido por elas através de suas dicas de jejuns e receitas para emagrecer. No tom do site a gente encontra uma apologia mesmo a esse estilo de vida magro de não comer em contraponto com a noção de anorexia como doença a ser tratada. O interessante é que o grupo proAna não se percebe nem se enquadra na categoria biomédica de doente. Ao invés disso, constrói um discurso linkado no padrão de corpo da moda – calcado no modelo de corpo magro presente nas revistas e passarelas desde 1960.

Fotos: Anderson de Souza - Vitor Dzenk - Fashion Rio Edição Primavera/Verão 2009/2010.

Talvez seja pertinente nos perguntarmos em que momento comer vira um problema em nossa sociedade? Para Fischler (1995a) haveria na nossa sociedade atual, uma visível delimitação entre cozinha gastronômica – associada a prazer – e cozinha dietética, ligada à saúde e marcada por preocupações na preparação de pratos menos calóricos com vistas a uma diminuição do peso corporal. Fischler (1995a) considera ter ocorrido uma expansão de um mercado específico de regimes e dietas para emagrecer, assim como uma proliferação de produtos diet e light, alternativas para substituir o uso de açúcar branco refinado. Pensando no desenvolvimento de alternativas culinárias dietéticas, observa-se uma relação nem sempre simétrica entre o discurso das diferentes linhas de culinária – dietéticas ou não – com o discurso dos médicos a respeito delas e o discurso dos mercados de saúde. Os mercados de saúde englobam diversas marcas de produtos industrializados diet fabricados inicialmente apenas para o consumo de diabéticos, mas que na prática foram sendo também consumidos por aqueles que fazem dietas alimentares para emagrecer. Estes produtos dietéticos estão dispostos em locais distintos nas prateleiras de supermercados. A maior parte destes produtos dietéticos enfatiza em seus rótulos as baixas calorias e um percentual menor de gordura.

Fotos: Anderson de Souza - Lenny - Fashion Rio Edição Primavera/Verão 2009/2010.

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Conforme assinala Bourdieu (1999), a produção de conhecimentos sobre dietas restritivas nos fornece pistas sobre a existência de uma espécie de subcultura feminina, aliada ao fato de que na sociedade atual tem sido notada uma preferência pela magreza difundida como um ideal de corpo-feminino. Este autor associa os cuidados da mulher com a estética corporal à expectativa que ela


tem de ficar atraente para agradar ao sexo oposto. Segundo ele, este querer agradar é uma forma de submissão feminina à dominação masculina, dominação simbólica incorporada pelas mulheres, que são a parte dominada. Além disto, este crescimento da produção e da demanda por produtos para emagrecer ou com baixas calorias pode ser explicado, segundo Fischler (1995a), devido à lipofobia, que regeria cada vez mais a relação moderna com o corpo, pelo menos o corpo feminino. Na sua visão, as mulheres estariam mais sujeitas às influências de uma obsessão pela magreza devido à lipofobia. Os fenômenos de lipofobia e de anorexia nos mostram que o fenômeno é mais complexo e tem duplo sentido: os juízos morais sobre o açúcar e os prejuízos da gordura são objeto dos cientistas e dos profanos; (...) médicos e eruditos são afetados também pelos movimentos profundos da civilização e da sociedade. (Fischler, 1995a: 318) O uso do açúcar na alimentação foi objeto de estudo de Fischler (1995a), a ponto de o autor afirmar a existência no mundo moderno de uma sacarofobia, ou seja, um horror ao açúcar. Apesar de mais recentemente ser a gordura e não tanto o açúcar reconhecida pelo autor como elemento condenado por setores da biomedicina, por ser responsável por engordar quando ingerido em excesso. Essas considerações nos indicam o quanto setores médicos e camadas médias e altas da sociedade estão imbricados. A lipofobia seria um exemplo desta correlação entre um saber médico que condena a gordura corporal e a produção de uma estética feminina que valoriza a magreza. Então, embora a biomedicina tenha se diferenciado da medicina antiga em muitos aspectos, principalmente a partir do desenvolvimento da pesquisa científica, ela ainda possui características semelhantes no que se refere a uma tendência de normatização à vida cotidiana. E concluindo, considero o fenômeno ProAna, pro anorexia, pro deixar de comer como estilo de vida – dito por elas mesmas explicitamente no site – em oposição a noção biomédica de que anorexia é transtorno alimentar e doença que leva à morte, e por esse motivo deveria ser tratado. Por outro lado, considero a lipofobia um exemplo da correlação entre um saber médico que condena a gordura corporal e a produção de uma estética feminina que valoriza a magreza. Portanto, esse movimento de lipofobia crescente em nossa sociedade propicia cada vez mais a idéia de magreza como regra social. A crença num padrão de corpo magro como bonito e valorizado em nossos dias talvez seja chave para o entendimento da proliferação da anorexia, legitimando um discurso lipofóbico pro jejum em nome da beleza e da perfeição.

Fotos: Grão Imagem - André Lima - SPFW Primavera/Verão 2009/2010.

Obras consultadas BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. Rio de Janeiro, Editora Bertrand Brasil, 1999. FISCHLER, Claude. El (h)omnívoro. El gusto, la cocina y el cuerpo. Barcelona, Editorial Anagrama, 1995a. tFLANDRIN, Jean-Louis & MONTANARI, Massimo et alli. História da alimentação. São Paulo, Estação Liberdade, 1998. GOLDENBERG, M. (Org.) O nu e o vestido. Dez antropólogos revelam a cultura do corpo carioca. Rio de Janeiro, RJ: Record, 2002. KAFKA, Franz. Um artista da fome e a Metamorfose. RJ: Ediouro, 1996. SANTANNA, Denize Bernuzzi. Cuidados de si o embelezamento feminino: Fragmento para uma história de corpo no Brasil. In: Políticas do corpo. SP: Estação Liberdade, 1995.

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A moda estรก relacionada ao tempo...



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Yves Saint Laurent


Exposição

Fotos: Anderson de Souza Texto: Daiane Oliveira da Silva

Yves

Saint Laurent Ano da França no Brasil traz figurinos de Yves Saint Laurent ao Rio

A partir do dia 25 de maio no Centro Cultural do Banco do Brasil no Rio de Janeiro iniciou a exposição “Yves Saint Laurent- Viagens Extraordinárias”, com apoio da curadoria da Fundação Pierre Bergé - Yves Saint Laurent, que por meio de 50 figurinos completos, mais de 240 acessórios, como braceletes, brincos, sapatos, chapéus e turbantes, croquis originais e dois vídeos (uma entrevista e o registro de seu último monumental desfile realizado no centro Pompidou, em Paris), a mostra será uma retrospectiva de 40 anos de criação de Yves Saint Laurent, ícone da moda do séc. XX, com suas coleções inspiradas em diferentes países como África, Ásia, Espanha, Marrocos, Rússia e Índia. Yves não esteve em todos esses países, por isso o nome, reforçando e valorizando a imaginação do estilista, que tinha grande interesse nessas diferentes etnias. A mostra está dividida em três salas, cada uma com cores fortes destacando o tom étnico da exposição.

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Viagens Extraordinรกrias

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Patrocínio: Banco do Brasil e Citroen

Iluminação: Isabela Reis e Carlos Lafert (Studio Lov)

Realização: Centro Cultural Banco do Brasil

Sonorização: Dominique Chalhoub (Spectacle Produção de Eventos Culturais)

Curadoria: Fundação Pierre Bergé Yves Saint Laurent Coordenação Geral: Christopher Coffrant, Ana Cecília Chaves e Héloise Calandra (Zadig!)

Projeto Gráfico: Alexandre Andrada Assessoria de Imprensa: CW&A Comuniação

Cenografia: Karol Pichler

Assistentes de Produção: Alca Melo e Roberto Lima

Consultora Pedagógica: Helen Pomposelli

Painéis Fotográficos: Fotosfera

Coordenação de montagem: Pedro Vieira Arquitetura & Maecenaria

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Entrevista 01

Relização: Anderson de Souza Elaboração das questões: Wagner Ferraz Transcrição das respostas: Daiane Oliveira da Silva Foto: Anderson de Souza

Glória Kalil Entrevistada por Anderson de Souza no Fashion Rio Primavera/Verão 2009/2010.

Glória Kalil e Paulo Borges no Fashion Rio Primavera/Verão 2009/2010. 1 - Anderson: O que tu tem percebido nos desfiles apresentados no Fashion Rio em relação a consumo, arte e identidade? Glória: A moda é uma arte aplicada, não é uma arte pura, mas é uma arte aplicada que é totalmente ligada à idéia do consumo. Existem algumas artes, que são as artes aplicadas que são ligadas à consumo, por exemplo, arquitetura tem que ter um cliente, arte, quadros e esculturas têm que ter clientes, cinema é arte, mas tem que ter espectador e moda tem que ter comprador. Agora identidade é outra praia (risadas).

2 - Anderson: Como tu defines “Moda” com base na diversidade cultural brasileira? Glória: Não, eu não consigo definir moda baseado na nossa identidade, na nossa diversidade, mas a nossa diversidade certamente influencia a nossa moda, nós temos uma... Mas a moda hoje em dia é uma grande oferta e que privilegia todas as diversidades do mundo. Hoje em dia não existe mais uma moda ditatorial, uma moda única, hoje em dia a moda é múltipla mesma. E o que faz, com que todo mundo se sinta representado, por questão de você procurar a moda e as marcas que trabalham com roupas que te representem e escolher roupas que te representem, por que você tem praticamente que todas as ofertas. Por exemplo, uma mulher pode querer usar uma saia micro, ou uma saia mini, ou uma saia pelo joelho, ou uma saia abaixo do joelho, ou uma saia até o chão, ela vai achar, dentro da mesma estação de moda esta oferta, ela vai lá e escolhe o que combina com ela. Então há oferta muito grande dentro da moda hoje, e ela então tem pra todo mundo, inclusive para os aspectos da nossa diversidade.

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“A moda é uma arte aplicada, não é uma arte pura, mas é uma arte aplicada que é totalmente ligada à idéia do consumo”. 3 - Anderson: Quando se vê um desfile com foco mais comercial normalmente essas coleções realmente são aceitas pelos consumidores ou é uma tentativa dos criadores em fazer com que isso aconteça? Glória: Depende, existe, você viu, aqui nesses desfiles que nós vimos até agora no Fashion Rio, têm roupas que são, completamente absorvidas e rapidamente, aliás, são roupas que na minha opinião nem deveriam estar na passarela, por que são tão comuns e tão iguais as que já tem, que já estão andando pelas ruas, e nas vitrines, que nem precisava desfilar, que não apresenta nenhuma novidade. São roupas que já estão sendo usadas. Quase uma produção de moda, não é uma criação de moda. Agora, têm outros que não, que propõe formas um pouco mais novas, que propõe..., que são os mais criativos, que estão propondo algumas idéias novas, que eles jogam pra ver como é que o consumidor vai reagir. Algumas vezes o consumidor adora e usa, e outras vezes ele recusa.


4 - Anderson: Existe algo que tu identifiques que esteja ausente ou faltando na visão dos criadores de moda brasileiros, que pode ser percebido no resultado final de suas coleções?

Foto: Anderson de Souza - Luiza Bonediman - Fashion Rio Primavera/Verão 2009/2010.

Glória: Eu não sou uma criadora. Eu sou uma observadora. Se eu fosse uma criadora saberia o que esta faltando. Eu vejo aqui, às vezes, é que eu não percebo novidade em alguns trabalhos e percebo novidade em outros. Em algumas coleções você vê que há uma novidade. Você pega uma coleção que hoje nós vimos, por exemplo, uma coleção como a daquela menina, Luiza Bonadiman. Você viu a coleção dela? O que me encanta naquele trabalho, é a absoluta radicalidade dele, ela faz uma coleção que é pra ser maiô de banho, enfim, absolutamente impossível usar qualquer um daqueles looks, entendeu? Agora ela vai fundo, ela usou três cores e fez um trabalho de estilo absolutamente radical. Tem uma roupa que da pra usar (risadas), e ela não ta nem aí. Ela fez uma coisa absolutamente radical. Agora é claro que aqueles decotes vão ser usados eventualmente como uma **bodes**, com saias, com calças... Pra dançar, pra noite, pra balada e tudo. Jamais aquilo vai aparecer numa praia na vida. Jamais pode chegar perto do Sol, de uma areia, do mar. Então eu acho bonito quando você vê o criador ir fundo na sua idéia, na sua função, muito mais do que..., eu posso até não gostar, mas às vezes eu sei observar quando ele criou uma coisa e foi fundo. E às vezes tem uns que fazem umas roupinhas usáveis e tal, mas que não muda nada, não acontece nada com você, não é? 5 - Anderson: Pra ti onde está a moda? Glória: A moda hoje está nas mãos de quem a usa. Pra mim hoje o importante é o estilo e não a moda. Mil estilos. É exatamente isso, é o que a pessoa é, olhar todas as ofertas da moda e ir lá e escolher daqui, dali, daqui, dali tudo o que o representa e montar o seu, a sua visão na moda, se apresentar através da moda com as escolhas dele, sem que ninguém te de uma roupa pronta pra por. Então eu acho que a moda ta na escolha de cada um.

“...eu posso até não gostar, mas às vezes eu sei observar quando ele criou uma coisa e foi fundo”. Foto: Anderson de Souza - Luiza Bonediman - Fashion Rio Primavera/Verão 2009/2010.

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Ensaio 04

Traços da filmografia

Anderson de Souza

de Almodóvar nas costuras de

Martins Paulo

1. Imagem As imagens são meios de expressão que fazem parte da cultura humana desde seu início mais remoto, sejam estas imagens expressas como pinturas rupestres, tatuagens na pele de múmias ou imagens geradas a partir dos primeiros registros sensoriais percebidos. E buscar entender as informações transmitidas através das imagens é cada vez mais primordial. “as investigações das imagens se distribuem por várias disciplinas de pesquisa, tais como a história da arte, as teorias antropológicas, sociológicas, psicológicas da arte, a critica de arte, os estudos das mídias, a semiótica visual, as teorias da cognição. O estudo da imagem é assim, um empreendimento interdisciplinar.” SANTAELLA (2005, p.13) É importante compreender que a imagem não é apenas um fenômeno sensório proporcionado pela visão. Pois segundo SANTAELLA (2005) as imagens podem ser divididas em dois domínios. O domínio das imagens como representações visuais, onde as imagens partem de objetos materiais identificados pelo órgão olho, como por exemplo, desenhos, pinturas, gravuras, esculturas, fotografias, imagens cinematográficas, televisivas, holográficas e infográficas. E o segundo domínio que existe a partir de imagens imateriais. Domínio que parte das imagens geradas na mente humana, imagens que surgem como representações mentais, imaginações. E estes dois domínios da imagem não podem existir sozinhos, pois dependem um do outro para existir. “Não há imagens como representações visuais que não tenham surgido de imagens na mente daqueles que as produziram, do mesmo modo que não há imagens mentais que não tenham alguma origem no mundo concreto dos objetos visuais.”. SANTAELLA (2005, p.15) E retomando o que foi dito anteriormente, imagem não é apenas visual é também olfativa, auditiva, gustatória, e somatosensitiva. Pois segundo GREINER quando cita Damásio ao esclarecer que quando esse autor:

Imagem 01 - 11º Premio Rio Moda Hype desfile Martins Paulo look 01. 2009. Foto Anderson de Souza.

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“se refere portanto ao termo “imagem” quer dizer um “padrão mental” com uma estrutura construída com sinais provenientes de cada uma das modalidades sensoriais (...) Essa modalidade somatosensitiva inclui várias formas de percepção: tato, temperatura, dor, percepção muscular, visceral, vestibular.”(2005, p.72)


São muitas as teorias sobre o assunto “imagem”, muitas delas se opõem e outras se complementam. Porém dentro destas teorias destaco as percepções de SANTAELLA (2005) ao comentar sobre o quanto é relativo interpretar uma imagem. Pois com base no pensamento da autora, para cada imagem a forma como ela será interpretada dependerá de como esta imagem poderá ser apresentada, e/ou dependerá do contexto onde esta imagem está inserida.

1.1 Imagens e Moda

Na sociedade contemporânea, falar de moda é falar diretamente de imagens específicas geradas pela mídia impressa, digital meios de comunicação e eventos de moda. O fenômeno moda é algo que tem movido as sociedades que são regidas de alguma forma pelo sistema capitalista. Seres que diariamente são bombardeados com milhões de informações sensoriais sejam estas imagens apresentadas na televisão, em revistas, jornais, outdoors, internet. Os geradores dessas imagens se utilizam de artifícios não apenas visuais, mas outras formas de proporcionar sensações e visualizações, como por exemplo, o cheiro de um perfume doce, o odor de café passado na hora, a fumaça de cigarro, o som da buzina de um carro, a música ouvida no rádio, o gosto peculiar do que queijo gorgonzola, o azedo de um limão, o amargo do café sem açúcar, ou mesmo o cheiro de suor. E é bem provável que quando um indivíduo se depara com exemplos como os citados, seja tocado ao menos por uma sensação proporcionada pelos casos apresentados.

Imagem 2 - 11º Premio Rio Moda Hype desfile Martins Paulo look 01. 2009. Foto Anderson de Souza.

A moda, em especial a que trata de produtos do vestuário, estabelece uma relação praticamente inseparável com a imagem. Pois para uma determinada marca de roupas levar seu produto ao conhecimento do consumidor, se faz necessário apresentá-lo de alguma maneira, proporcionar o contato deste consumidor com este produto. Este contato pode se dar de diversas maneiras, por exemplo através de fotos impressas nas páginas de uma revista, de uma propaganda na televisão, do produto exposto em uma vitrine, através de um desfile de moda ou entre tantas outras formas. O desfile é um artifício muito utilizado para apresentar os produtos de moda, pois a partir de um desfile são geradas imagens fotográficas que podem vir a ser apresentadas em revistas, jornais e internet, audivisuais a serem apresentadas na internet e/ou televisão, e para quem teve a oportunidade de presenciar este desfile, a experiência é somatosensitiva. É através do desfile que o criador poderá apresentar seu produto de maneira que o consumidor tenha o desejo de consumir o produto apresentado na passarela. As roupas apresentadas em desfiles possibilitam a apresentação de imagens que indicam modelos representacionais de estilos de vida. Imagem 3 - 11º Premio Rio Moda Hype desfile Martins Paulo look 01. 2009. Foto Anderson de Souza.

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E uma das características que popularizaram o trabalho de Alexandre e de tantos outros estilistas, tem sido a busca pelo inusitado, criando a partir de temas inesperados, fugindo do senso comum, ou mesmo se utilizando deste senso comum, porém de maneira diferente ao que já foi feito até então.

2.Imagens criadas por Almodóvar que inspiram a moda

A partir dos anos 30 a moda passou a se popularizar por intermédio do cinema. Neste período de pósguerra e recessão econômica, o cinema passou a construir modelos idealizados de vida como forma de aquecer a economia. O que resultou no aparecimento das grandes Divas como Marlene Dietrich, Greta Garbo, Marilyn Monroe, entre outras que inspiram a criação de moda até hoje.

Imagem 4 - Cartaz PEDRO ALMODÓVAR - (Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón) - 1980; color. Disponível em: <http://ssrj-musica-livros.blogspot.com/2009/04/ baixar-filmes-pedro-almodovar-descarga.html>. Acesso em 15 de junho de 2009. Alguns elementos utilizados na passarela auxiliam na construção da imagem que o estilista deseja transmitir. A cenografia, a iluminação, os acessórios, as modelos, a maquiagem, os penteados, a música, ou seja, um conjunto de elementos que permitirá ao estilista esclarecer sua pesquisa e as fontes onde se inspirou. Ao iniciar o desenvolvimento de uma coleção de artigos de vestuário, o estilista começa sua pesquisa partindo de uma Ideia inicial. Uma ideia que lhe proporcionará imagens materiais e/ou imateriais. Uma das técnicas de desenvolvimento de coleção consiste em pesquisar o assunto que se pretende abordar, e ir juntando imagens que possibilitarão a construção de painéis de inspiração, painéis temáticos. Painéis de onde serão extraídos os elementos que irão compor esta coleção, como cores, formas e detalhes, elementos que possibilitarão complementar a criação dando sentido a golas, bolsos, calçados, estampas, acessórios etc. E uma inspiração pode surgir de qualquer coisa, de uma foto antiga desgastada pelo tempo, de uma xícara de porcelana trincada, ou a exemplo do estilista Alexandre Herchcovitch que para sua coleção masculina do verão 2007/2008 teve como inspiração bandas de Death Metal e a apologia ao horror, que era representado na coleção por “botas pesadas, com apliques de metal e sola-trator; acessórios contrastantes, camuflagem; maquiagem pesada, uso insistente do capuz” HERCHCOVITCH (2007, p.22).

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Entre tantos cineastas que inspiram a moda através de suas obras pode se destacar o trabalho do cineasta espanhol Pedro Almodóvar. Ocupando papel de destaque dentro das obras cinematográficas, pois o ao longo de sua carreira o diretor desenvolveu uma maneira singular de contar suas histórias. Sempre pontuadas por dramas familiares, acontecimentos absurdos, criticas sociais, sexo, humor sarcástico, violência e realismo. Sendo capaz de prender a atenção do espectador com longos discursos sem precisar explodir um carro sequer. E embora possa parecer que a receita seja a mesma para todos os seus filmes, o resultado de cada trabalho possui identidade e características distintas. E com base em algumas imagens criadas por Almodóvar, o piauiense Martins Paulo, certificado em Design de Moda e estudante de Artes Visuais na Universidade Federal do Piauí (UFPI), desenvolveu para a 11ª edição do Prêmio Rio Moda Hype(1) uma coleção intitulada “Mujeres em rojo sangre”. Coleção basicamente de roupas femininas que visava representar de maneira intensa e complexa as mulheres de Almodóvar de uma Espanha Kitsch e pop. Nos filmes de Almodóvar, as tramas apresentadas têm como cenário sempre a Espanha, retratando de forma detalhada hábitos e costumes da população local. Martins Paulo divulgou no release de sua coleção, que suas inspirações partem da primeira fase da filmografia do diretor, ou seja, período que compreende os anos oitenta e inicio dos anos noventa, complementadas por referencias das roupas tradicionais da região de La Mancha (região da Espanha onde nasceu o Diretor) e por detalhes de trajes folclóricos, como a exemplo dos babados das saias do flamenco.

2.1 - O “rojo sangre”

A cor “rojo sangre” que traduzido do espanhol para o português vem a ser “vermelho sangue” e que dá nome a coleção do estilista, está presente em todos os dez looks(2) apresentados, e também se trata de uma cor presente em todos os cartazes da filmografia do diretor espanhol. Em ambos os casos a cor aparece hora em grandes imagens, hora em pequenos detalhes.


E analisando a fotografia do primeiro look(3) apresentado por Martins Paulo em seu desfile, pode ser percebido que o vermelho sangue pontua praticamente todo o look, estando presente nos óculos, em praticamente todo o top (parte superior do conjunto), e em detalhes nas camadas de babados da saia. O uso desta cor que chama tanto a atenção em relação às demais cores Seria uma forma de causar impacto? O vermelho em torno aos olhos que se espalha pelo restante da peça seria um pedido de atenção? Afinal de contas, esta cor é comumente utilizada pela saciedade dentro do contexto de se chamar a atenção para algo, seja no trânsito nos faróis dos veículos automotores, nas placas de atenção, sinais de perigo ou mesmo na moda através de cartazes de liquidação. E é provável que esta cor que causa tanto impacto, tenha esta propriedade de reagir sobre o individuo exatamente por remeter o imaginário do observador a outros objetos que tenham esta cor. A cor é percebida mais rapidamente que o objeto em si. Ao reagir à cor, o indivíduo sofre ação do objeto: é uma atitude passiva. Ao contrario, ao perceber a forma, ele tem que examinar o objeto, definir sua estrutura, e elaborar uma resposta: é uma atitude ativa, e é isso que caracteriza a mente mais ativamente organizadora. FARINA apud SCHACHTEL (1986, p.104) E relacionando a presença do vermelho neste primeiro look(4) de Martins Paulo, com a utilização desta mesma cor nos filmes de Almodóvar, pode-se chegar a conclusões semelhantes, pois esta cor está presente nos cartazes dos filmes podendo ser uma forma de chamar a atenção para os títulos, sendo utilizados não apenas nas fontes, mas também nas imagens que insinuam sexo, violência, perigo, calor, sangue entre outras possíveis leituras que dependem da memória de cada indivíduo. O que pode ser confirmado por Farina ao citar Gérard ao dizer que a “memória é a modificação do comportamento pela experiência” (1986, p.109) E a cor que predomina nesse primeiro modelo e que se dissemina por todo o restante da coleção de Martins Paulo, também podendo ser referenciada ao sentido mais intrínseco do nome da cor, pois segundo FARINA (1986), esta cor simboliza aproximação, seria uma cor que proporciona um encontro. Seria o encontro dos olhos com esta primeira sensação? Seria o encontro dos presentes no desfile com este primeiro look da coleção? Seria a intenção de uma primeira impressão que fosse marcante? Pois analisando a foto deste look, uma das impressões que se tem é que a modelo caminha de encontro aos olhos do observador, demonstra intenção de se aproximar mesmo sendo a foto uma imagem estática. Além das leituras apresentadas até então, é importante frisar que o vermelho é uma cor que apresenta diversos significados em muitas culturas. E na cultura ocidental, pode estar associado um vasto repertório de imagens e termos correlatos como a vida, a morte, a paixão, a amor, a sensualidade, a calor, etc. Leitura que pode ser feita em decorrência do vermelho ser a cor do sangue, sangue que da vida, o sangue que circula pelos corpos sendo bombeado pelo coração, o sangue que aquece, o sangue da menstruação, o sangue que escorre do nariz

Imgem 5 - Cartaz PEDRO ALMODÓVAR - (Labirinto de Pasiones) - 1982; color. Disponível em: <http://ssrj-musica-livros.blogspot.com/2009/04/baixar-filmes-pedro-almodovar-descarga.html>. Acesso em 15 de junho de 2009. ou da boca ao se levar um soco, o sangue que cristo derramou na cruz. E que segundo Goethe (1993), é a cor que apresenta alta-energia, estando associada a pessoas enérgicas, sadias e brutas, sendo observada entre povos tidos como selvagens e em crianças. Sendo que todas estas leituras podem ser facilmente associadas à filmografia de Almodóvar. 2.2 - As formas A cintura alta e marcada por um cinto largo, os recortes que proporcionam a peça refinamento e ousadia lhe dão estrutura e valorizam as curvas do corpo feminino, que complementado por um abotoamento frontal, pode ser associado ao trench coat(5) usado pelo próprio Almodóvar em Laberinto de Pasiones (1982)(6) na cena onde ele aparece cantando algo ao estilo New Wave oitentista. A cintura marcada também pode fazer referência ao filme ¡Átame! (1989)(7) , onde Marina Osorio (personagem vivida por Victoria Abril) uma atriz pornô que é raptada e amarrada por um admirador obcecado. E esta imagem da cintura marcada pode ser associada às imagens de espartilhos e corpetes que aprisionavam as mulheres em seus interiores, modelando e deformando suas siluetas, o que muito além da busca pela sensualidade, pode ser relacionado uma repressão feminina(8) , a um sufocamento causado pela prisão a modelos e valores tradicionais equivocadas e ultrapassados e, de certa forma, uma prisão ao passado.

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As camadas sobrepostas dos babados da saia podem referenciar as saias de dança flamenca, muito tradicional na Espanha, assim como também nas saias de dança flamenca facilmente identificados no filme La Flor de mi Secreto (1995)(9) . Ou mesmo aos exageros dos anos oitenta, presente em praticamente todos os filmes do diretor durante este período. Embora em alguns conceitos de moda os babados possam ser interpretados como referência de romantismo e feminilidade. Os detalhes entrelaçados em azul, vermelho e preto, presentes nas laterais do top, podem se referir a toda a trama construída nos filmes de Pedro. Trama envolvente que acaba hipnotizando pela minúcia como é construída. Tramas como a de Yolanda no filme Entre Tinieblas (1983)(10) onde a personagem, vivida pela atriz Cristina Sánchez Pascual, cantora e aventureira, que sofre o drama de perder o noivo, morto por overdose. Passa a ser perseguida pela polícia, acaba se refugiando em um convento. Porém, entre as irmãs encontra a mesma vida que conhecia no mundo exterior, incluindo uma madre superiora viciada em heroína que se apaixona por ela. Além de outras irmãs que também possuem seus hábitos viciosos. O calçado, um par de escarpins pretos, abertos na frente com tiras cruzadas e salto médio, um modelo que pode ser considerado tradicional entre as mulheres, podendo remeter a uma tradição, uma formalidade, a um modelo. E assim como o corpete, modelando e possivelmente proporcionando uma nova silueta ao corpo, lhe projetando mais alto do que ele realmente é. Seria este

sapato um elemento que proporcione uma superioridade? Uma supremacia feminina? Que reforce a importância da imagem desta mulher por onde ela caminhe? Conclusão A análise deste primeiro look apresentado por Martins Paulo dentro da 11º Prêmio Rio Moda Hype, possibilitou um grande numero de questionamentos e reflexões. Questionamentos que talvez nunca venham a ser respondidos por completo, mas que talvez permitam que sejam geradas outras novas perguntas. E uma das reflexões partiu do fato de que foi falado tanto sobre os possíveis simbolismos, significados e leituras dos elementos presentes neste 1º look, porém ao concluir este trabalho, é como se nada tivesse sido dito. Pois a riqueza de informações é de tal dimensão, que só foi possível percebê-la quando se estava trabalhando com elas. O trabalho de Martins Paulo soube expressar de maneira criativa, clara e coerente suas referências a filmografia de Almodóvar demonstrando realmente que houve uma pesquisa. Se utilizando de elementos abstraídos do trabalho do cineasta, sem simplesmente copiá-los. A forma como o estilista coordenou todos os detalhes na composição do look, foi fundamental para possibilitar sua leitura, construindo um sentido em relação ao tema.

Notas: (1) - Disponível em : http://www.riomodahype.com.br/ Acessado em 15 de junho de 2009. (2) - O termo look está sendo empregado aqui no sentido de conjunto de peças de vestuário , é o estilo, o resultado da soma de roupa, acessórios, maquiagem e cabelo, que se percebe numa única olhada. Sinônimo de visual – disponível em http://dicionario.babylon.com/LOOK Acessado em 15 de junho de 2009. (3) - Ver imagens 1,2 e 3. (4) - Ver imagens 1,2 e 3. (5) - Casaco oitocentista em estilo militar, com DRAGONAS e uma PALA dupla nos ombros. No século XX, a versão civil do casaco de soldado da Primeira Guerra Mundial tornou-se conhecida como trenchcoat. Feito de lã leve ou misturado à algodão, é usado como CAPA DE CHUVA ou como sobretudo. Disponível em http://dicionario.babylon. com/ Acessado em 15 de junho de 2009. (6) - Ver imagem 5. (7) - Ver imagem 6.

Imagem 6 - Cartaz PEDRO ALMODÓVAR - (¡Átame!) 1989; color. Disponível em: <http://ssrj-musica-livros.blogspot.com/2009/04/baixar-filmes-pedro-almodovar-descarga.html>. Acesso em 15 de junho de 2009.

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(8) - Ver imagem 4. (9) - Ver imagem 7. (10) - Ver imagem 8


Referências Bibliográficas FARINA, Modesto. Psicodinâmica das cores em comunicação. São Paulo: Edgard Blücher, 1986. GOETHE, Johann Wolfgang Von. Doutrina das Cores. São Paulo: Nova Alexandria, 1993. HERCHCOVITCH, Alexandre. Coleção Moda Brasileira: Alexandre Herchcovitch. São Paulo: Cosac Naify, 2007. SANTAELLA, Lúcia. Imagem: Cognição, semiótica, mídia. São Paulo: Iluminuras, 2005.

Sites Pesquisados <http://www.martinspaulo2.blogspot.com/> Acesso em 15 de junho de 2009. <http://www.allmodovar.com.br/filmes/film.htm> em 15 de junho de 2009.

Acesso

Imagem 7 - Cartaz PEDRO ALMODÓVAR – (La Flor de mi Secreto)- 1995; color. Disponível em: <http://ssrj-musicalivros.blogspot.com/2009/04/baixar-filmes-pedro-almodovar-descarga.html>. Acesso em 15 de junho de 2009.

“Não há imagens como representações visuais que não tenham surgido de imagens na mente daqueles que as produziram, do mesmo modo que não há imagens mentais que não tenham alguma origem no mundo concreto dos objetos visuais.”. SANTAELLA (2005, p.15)

Imagem 8 - Cartaz PEDRO ALMODÓVAR – (Entre Tinieblas)- 1983; color. Disponível em: <http://ssrjmusica-livros.blogspot.com/2009/04/baixar-filmespedro-almodovar-descarga.html>. Acesso em 15 de junho de 2009.

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Crítica Teatral

Rodrigo Monteiro

Sugestão ao Professor de Matemática

Foto: Julio Appel Geralmente demoro de um inverno ao outro para fazer uma manta de tricô. Não que eu seja ruim, mas é que trabalho não é uma das idéias pertencentes ao meu “sistema tricô”. Dentro dele, está também frio, vontade de não pensar, filme dublado, novela, papo furado, algo quente para beber, insônia. Não sei muitos pontos, então, preciosismo é outra coisa que não está nesse meu sistema. As mantas que eu faço geralmente são cheias de erros que eu não desfaço porque sinto que, assim, o negócio fica “bem do meu jeitão”. Meu “Sistema Tricô” compreende, assim, pontos errados, buracos, falhas. Qualquer sistema pode ser atualizado. Pierre Levy nos leva a saber que atualizar é mais do que adaptar: é utilizar-se das condições existentes no sistema objetivo, considerando a instabilidade desse sistema nos fatores tempo, espaço e demais idiossincrasias, como forma de re-hierarquizar o sistema fonte. Eu posso, por exemplo, fazer uma peça de teatro sobre tricô. Para tanto, irei rever tudo aquilo que pertence ao sistema tricô e redistribuir, excluir, incluir, modificar coisas a partir do que me oferece o teatro enquanto condição discursiva. O teatro, ao longo dos milênios, acumulou um universo bastante grande de possibilidades. Um universo finito no entanto. Poderia colocar dois atores vestidos de agulhas a se enroscar em um grande fio de lã. Seria uma coreografia. Ao fundo, poderia ter uma lareira crepitando. Seria lindo. Lindo por apenas alguns minutos. Duas agulhas se enroscando exige muita paciência do espectador. O único conflito é chegar até o fim da carreira e começar uma nova trocando de lado. Sem falar que muito provavelmente só quem sabe fazer tricô é que vai compreender bem isso e até achar engraçado em alguns momentos. A grande maioria vai dormir com o barulhinho do fogo no sétimo minuto. Fazer isso seria o jeito menos aproveitável de atualizar o “Sistema Tricô” para o palco.

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Mas tricotar é relacionar. Você, com a ajuda da agulha, relaciona o ponto que está fazendo com o ponto origem e o ponto da carreira de baixo. Disso, nasce o ponto destino que, tão logo é feito, já é origem de outro também. Você, na falta de algo melhor, começa a dar aula em uma escola pública e não ganha tão bem quanto acha que merece. Um dia, numa reunião de organização da Gincana Junina, você fica no turno da tarde e conhece a professora gostosona da terceira série. No recreio, rola um bate papo e você fica sabendo que, na escola privada onde ela trabalha, estão precisando urgente de um professor de matemática. Você é professor de matemática. Pega o email dela, manda o currículo e ainda aproveita para marcar uma ida ao teatro no final de semana. A escola origem faz nascer uma oportunidade destino. As agulhas se relacionam. O ponto nasce. E você não dorme na platéia. Sucesso! Luciano Alabarse não aproveitou as possibilidades que o teatro oferece ao sistema “Diálogos de Platão”. Todo o palavrório filosófico que funciona muito bem no preto e branco do livro fica muito chato no palco. No teatro, você não pode voltar e reler, há dezenas de outras informações além do texto e, inevitavelmente, você fica tentando unir um ao outro porque é justamente essa a diferença do signo lingüístico e do signo teatral. O texto dito pelos onze atores vira música de lareira e, no sétimo minuto, já não lembramos mais o que foi dito no terceiro e nos preparamos para não ter tempo para pensar na próxima hora e meia. E nos concentramos na imagem e no movimento. Nada combina. Marcelo Adams, que diz o texto muito bem, está com o cabelo emplastado de algo que tende a deixá-lo grisalho. E aí lembramos de Luiz Paulo Vasconcelos, Mauro Soares e José Baldissera e pensamos, por que o Marcelo Adams e não um deles? Os dez alunos da “Escolinha do Professor Sócrates”, com toda a superficialidade das interpretações, sem nada da profundidade da


comédia, são de ruins a péssimos em suas construções. Dá pena de ver Vinícius Meneguzzi fazer uma bichinha afetada e Lutti Pereira repetir seu Tirésias. É constrangedor ver Marcos Contreiras fazer uma bicha velha e chamar Sócrates de “gordinho” para fazer a platéia sonolenta acordar, rir e dormir de novo, talvez consciente de que o que o ator está fazendo é vergonhoso. E o exemplo dado acontece em quase todas as interpretações. Nenhum personagem foi construído para além de um nome e de um texto decorado. Há um bêbado, um irritado, um sonolento... E todos comem, comem e comem... Beber não bebem porque o que o garçom serve, e vemos isso, não encheria uma só colher de vinho. Sim, há um garçom vestido de terno e gravata borboleta. E não se faz a menor idéia do porquê ele está vestido assim uma vez que todos vestem vestidos tal qual nos quadros que vemos de Sócrates, Platão e a Academia. Roupas brancas que chegam a reluzir de tão limpinhas: um figurino que é não só para o público e para os atores, mas também parece ser falso para os próprios personagens.

Leituras Indicadas

Título: O Funk e o Hip-Hop Autor: Micael Herschmann Editora: UFRJ Ano: 1ª EDIÇÃO - 2000

Herschmann esboçando um mapa da realidade de jovens inseridos nas manifestações culturais do Funk e do Hip Hop do Rio de Janeiro e de São Paulo, analisa os processos de estigmatização e glorificação desses jovens na mídia e as implicações de seus estilos de vida na esfera pública.

Na parede do fundo do palco, grita a frase: “Conhece-te a ti mesmo”. E, nos perguntamos, como Luciano Alabarse, líder de uma grande equipe de artistas e técnicos, coordenador do Porto Alegre em Cena e homem respeitabilíssimo por tudo o que fez nas artes cênicas, pode deixar que isso saísse da sala de ensaios? Fica o conselho a você, professor de matemática que marcou uma ida ao teatro com a professora da terceira série: prefira “O Exterminador do Futuro”. Por pior que seja, o diretor do filme conseguiu aproveitar bem o que o cinema lhe dispunha. FICHA TÉCNICA Texto: Platão Elenco: Luiz Paulo Vasconcellos, José Baldissera, Marcelo Adams, Vika Schabbach, Carlos Cunha Filho, Alexandre Magalhães e Silva, Lutti Pereira, Marcos Contreras, Rafael Mentges, Fernando Zugno, Eduardo Steinmetz, Rodrigo Fiatt, Fabrizio Gorziza, Daniel Bacchieri, Lê Souza e Vinicius Meneguzzi. Participação Especial: Sandra Dani Direção: Luciano Alabarse Cenário: Sylvia Moreira Figurino: Rô Cortinhas Iluminação: Cláudia de Bem e Maurício Moura Direção Musical: Moysés Lopes

invadem a cena

A Edição do Corpo - Tecnociência, Artes e Moda

Título:

Autor: Nízia Villaça Editora: Estação das Letras Ano: 2007

Através do discurso científico, das artes, da moda e da mídia, o livro “A edição do corpo: tecnociência, artes e moda”, levanta questões sobre como a cultura corporal vem sendo discutida no mundo contemporâneo.


Banco de Dados Terps铆

Wagner Ferraz

Foto: Ant么nio Carlos Cardoso


Terpsí “Esperto e Desperto” O singular trabalho desenvolvido pela Terpsí Teatro de Dança nos seus 21 anos de trajetória, tem sido foco de estudo de muitos pesquisadores que investigam sua linguagem em dança. Mas o trabalho da Terpsí não se resume ao resultado cênico, que é fantástico. A Cia Terpsí se diferencia, instiga a pesquisa e faz perceber que a investigação em dança é fundamental pelo trabalho durante a construção de suas obras, ou seja, pelo seu processo de investigação e criação. Mesmo durante oficinas ministradas por Carlota Albuquerque, diretora e coreógrafa da Terpsí percebe-se a forma como ela enquanto indivíduo (e enquanto grupo com ela costuma dizer) busca mediar a relação entre o corpo e a criação em dança. Carlota costuma falar de um interprete “esperto e desperto”. “Esperto” ou atento para o espaço, para o outro, para a música, para o silêncio, para as sensações... E “desperto” para reagir ou interagir com tudo isso, para perceber o corpo em diferentes espaços com diferentes estímulos. E a partir desse perceber se permitir despertar para ações calculadas ou impulsivas. Assim surge um tabuleiro onde as estratégias são traçadas, mas o “acaso” como cita SALLES (2004) pode se manifestar. Carlota na sua experiência e grande inteligência mediadora, que ouve, olha e compreende o outro, o interprete, o espectador, faz com que o “esperto e desperto” esteja nas obras da Terpsí. Mesmo que muitas vezes de forma discreta, mesmo que muitas vezes os próprios intérpretes não percebam em alguns momentos. Mas está lá... Estar “esperto e desperto” talvez possa ser visto por muitos como algo simples e comum. Mas o que chama a atenção no trabalho de Carlota Albuquerque e refletido nas obras da Cia Terpsí é o fato de não precisar dizer o que é o “esperto” e o que é o “desperto”. Pois quando esta Cia cria suas cenas muito mais do que “um movimento pelo movimento” se instaura. É algo que se precisa presenciar, precisa-se viver... A cena criada pela Terpsí Teatro de Dança, propõe o “despertar” para observar de diferentes ângulos, o que só é possível pelos indícios apresentados que automaticamente colocam o espectador no seu mais intenso estado de “esperto”. “Esperto e desperto” sem se preocupar onde está um ou esta o outro.

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Ensaio 05 Francine Pressi

A Moda no Contexto Hip Hop Há poucos dias atrás, deparo-me com uma situação um tanto inusitada e que me marcou de uma forma muito significativa. Ao discutir em aula com meus alunos a simples escolha de um figurino para o próximo trabalho a ser desenvolvido, ouço ao longe a seguinte frase de um aluno que possui por volta de seus 13 anos: “... NÃO! Preto não! Tem que ser rosa, porque o rosa é a cor que está na moda no hip hop!”. De onde exatamente ele extraiu esta ideia? Bem, confesso que não sei, mas estas palavras ficaram ressoando em minha mente por vários dias, me fazendo pensar se estaria eu “desatualizada” ou ele preocupado demais com certos modismos. Por que não outra cor? Será que em um processo de criação, seja ele qual for, é mais interessante “estar” na moda ou “criar” uma moda? O que os leva a esta quase necessidade de estar na moda? E que moda é esta afinal?

Algo muito interessante que acontece referente à dança mais especificamente, é o fato de os adeptos ao Street Dance terem a oportunidade de andar pelas ruas com o mesmo estilo de roupas que utilizam para dançarem, seja em palcos ou não.

De fato a Cultura Hip Hop vem passando por constantes mudanças desde sua origem, que variam nacional e regionalmente, mas desde o início, já era possível ver a importância dada à questão da moda e principalmente, ao estilo de cada indivíduo, não só no dia-a-dia, mas também no momento de subir aos palcos para cantar ou dançar.

A moda em si, faz de muitos indivíduos “escravos de seus caprichos”. Muito volúvel muda rapidamente suas tendências fazendo com que os adeptos aos modismos tenham que acompanhar seu rápido jogo de mudanças, para que não tenham a “infelicidade” de ficar por fora das últimas tendências da estação. E teria ela, a incrível capacidade de oscilar constantemente entre o novo e o velho, o visual e o funcional, a venda e o sonho.

“O visual do b-boy era ditado pelo bolso e pela praticidade(1) – moletons de capuz, bonés, tênis grandes, agasalhos esportivos – mas, lá no palco, a quantidade crescente de DJs, MCs e dançarinos pedia maior produção para se diferenciar. Grand Master Flesh(2) e seus Furious Five(3) não deviam nada para o Village People em termos de extravagância visual, incluindo roupas de couro vermelhas, cocares, quepes e adereços com trancinhas. Já Bambaataa(5) juntou referências tribais, punk e futuristas”. (ROCHA, 2005: 22). Na década de 80 muitos dançarinos brasileiros seguiram à risca a moda surgida a partir do lançamento de filmes como Beat Street ou Flash Dance, por exemplo, onde em geral a beleza negra ganhava destaque, os cabelos blackpower, as mini blusas e calças justas se faziam muito presentes. Atualmente, é visível nas ruas as pessoas adeptas a moda hip hop vestidas geralmente com roupas mais leves e soltas como calças largas, camisetas mui-

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Esta forma e hábito de se vestirem lhes permitiriam talvez, uma relação mais orgânica com seus próprios movimentos? Sairiam eles em vantagem quando comparados, por exemplo, a bailarinas clássicas, que certamente não andam por aí a passeio com seus tutus, sapatilhas de ponta e coroinhas na cabeça? Que espécie de relação os dançarinos de Street Dance mantêm com o estilo de roupas que utilizam e os identificam enquanto adeptos à moda hip hop? Até que ponto a moda ditada nas passarelas é capaz de atingir a moda no hip hop?

Para Lesa Rodrigues (2001), “sem a proteção natural de pêlos ou coros espessos, homens e mulheres dependem da roupa para escapar do frio, da chuva, do sol [...]. Este seria um lado funcional, que dispensaria diferenciações de cores, estampas ou comprimentos. O lado visual, que personaliza a figura e atende à vaidade, impôs as cíclicas mudanças de estilo [...]”. (RODRIGUES, 2001: 159). Com o auxílio do universo midiático, rapidamente é possível estar por dentro das novas tendências, estas capazes de influenciar o mundo. “Ou, pelo menos, o mundo que acredita e consome moda” (RODRIGUES, 2001: 159). Hoje, é possível encontrar no jovem consumidor, o caminho para um mercado promissor, especialmente,


Pensando nisso, algumas marcas se voltaram a estes grupos de consumo ou estas tribos urbanas, e passaram a confeccionar roupas que fossem capazes de se adequar ao estilo destes jovens. “Para enfatizar a conivência entre produto e consumidor, convencionou-se chamar a estilo street ou streetwear, vestir das ruas, como se fosse criado por seus usuários” (RODRIGUES, 2001: 162).

Mas e o que dizer daqueles jovens desprovidos de condições financeiras para adquirirem certos bens de consumo? Estes, também são seduzidos pelos mesmos apelos de comerciais e videoclipes lançados a todo o instante na mídia. Como podem eles supostamente, se autoafirmarem perante a sociedade, se não possuem o tênis ‘x’, ou a camiseta ‘y’? A solução seria comprar produtos falsificados ou roubar os originais?

A mídia teve e ainda tem um importante papel na hora de propagar todas as novas tendências, seja da música, da dança, ou da moda. Entretanto, segundo Herschamnn:

[...] O mesmo tipo de realização consegue a garota de poucas posses, que encontra uma bolsa de material sintético, igual àquela de couro, vista na revista sofisticada. Com sua bolsa a tiracolo, ela se sente dentro do padrão de elite das princesas e atrizes internacionais. (RODRIGUES, 2001: 163).

[...] talvez o principal indício da crescente visibilidade e presença do hip-hop na agenda do mercado brasileiro se dê no plano da indumentária. Nos últimos anos, inúmeras confecções e lojas em todo o País cada vez mais se destinam a produzir e vender peças como bonés, gorros, jaquetas, tênis de street ball, calças de moletom etc. que têm encontrado na juventude, consumidores ávidos. A utilização de uma certa “estética das ruas” – bastante característica do hip-hop – nas campanhas publicitárias destes e de outros produtos destinados a um público jovem sugere um “consumo difuso” desta expressão cultural. (HERSCHMANN, 2005: 117). Mas e nas danças oriundas do hip hop, o que prevalece nas escolhas da indumentária? Seria a praticidade e funcionalidade das roupas ou apenas o lado visual, que garantiria o “estilo” destes indivíduos? Por vezes questionei meus alunos quanto a esta questão da moda na cultura hip hop e sua influência nos trabalhos desenvolvidos por eles. Pergunto-lhes o que, na visão deles, é mais importante naquele momento, se é primeiramente adquirir um conhecimento prático/teórico sobre as danças que desenvolvem ou sustentar um “estilo hip hop” que se quer condiz com a real ideologia desta cultura? Segundos de silêncio e olhares baixos... O pensar se faz necessário, pois revêem neste momento uma série de questões que até então lhes eram as mais aceitas no senso comum. Mas entre olhares de estranhamento, sempre sai um imenso sorriso, quase que expressando alívio, junto a uma frase do tipo: “Nossa, é mesmo né sora, o cara às vezes fica se achando, mas só tem estilo e não dança nada... é melhor aprender a dançar primeiro...”. Não os questiono sobre se é certo ou errado aderir à estes estilos, e muito menos se devem ou não vestirse desta ou daquela maneira, mas os faço pensar sobre estas questões que os cercam diariamente sem que se dêem conta disso. Qual o papel que a roupa desempenha no desenvolvimento das danças que praticam? É possível perceber que estes jovens são constantemente bombardeados com apelos por todos os lados através da mídia, sendo algo cada vez mais comum, que grupos de adolescentes queiram se “encaixar” no mundo através da adesão de determinados estilos que correspondam às suas visões de vida. E nessa busca desenfreada por um “lugar ao sol”, para muitos, obter um produto qualquer de marca pode torna-se muitas vezes uma obsessão, que é fomentada por apelos midiáticos que dizem em entrelinhas: adquira este produto e veja sua vida se modificar!

Embora para muitos pareça absurdo, não se pode descartar a ideia de que certos pensamentos, como o roubo, assombrem o imaginário de muitos jovens não só no Brasil, mas no mundo. Nota-se que a cultura hip hop consegue agregar um grande número de indivíduos que constroem suas identidades a partir de alguns signos ditados por comportamentos, modos de pensar, agir e se vestir, e que une-os através de sentimentos capazes de expressar a insatisfação e inconformidade diante de certas situações sociais, isto é, agrega jovens no mundo inteiro a partir de uma ideologia, que hoje, muitas vezes se faz esquecida, ou até mesmo desconhecida, por muitos que apenas seguem os modismos do momento e não fazem parte de fato desta cultura. Esta sensação de agregação de jovens espalhados pelo mundo inteiro em torno de certos sentimentos e ideais seria realmente a mesma em qualquer local do planeta? Não haveria talvez, algumas modificações em relação a isso em função da cultura regional/nacional? Existiria de fato um único “estilo” de hip hop, ou estaríamos falando em culturaS(5) hip hop? Seria possível, falar em códigos de conduta, capazes de reger o hip hop e definir a maneira como os indivíduos que dele participam, se articulam no convívio social? Seriam estes códigos os geradores de tamanha busca por um “estilo” ou entraria aí o papel da mídia e da moda como grandes fomentadoras de tais ideais? Um exemplo ilustrativo de como a incorporação do hip hop à moda extrai do estilo todo o seu caráter transformador é a matéria “hip hop é chique”, publicada na revista Raça Brasil (Martins, set./out., 2003, p. 18-25) a matéria afirma que o fim do teor político-social do hip hop “associado às letras de rap e a grafites de contestação e denúncia” ocorreu em meados dos anos 80, mas que a temática não mudou(6). Por outro lado, a matéria relata a suposta adesão pelos “rappers moderninhos” de roupas de grifes, criadas por estilistas como Reinaldo Lourenço, Domenico Dolce e Stefano Gabbana, ao contrário da inicial aversão da “classe dos excluídos” pelas marcas. (RONSINI, 2007: 106). A expressão ”rappers moderninhos”, dentro do contexto proposto, possivelmente refere-se a uma classe

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Com tantas “imposições de ‘originalidade’, e de ‘estilo original’” (Ostrower, 1987: 140), os jovens acabam pulando de um estilo a outro, na mesma rapidez com que trocam de roupa, apenas para se adequarem ao que está em voga no momento. Mas onde estaria a autenticidade do indivíduo nesta busca premeditada por uma originalidade ditada pela moda? Que espaço teria hoje sua personalidade, para criar e/ou renovar formas que ele julga se adequarem ao seu próprio “estilo de vida”? É possível em muitas situações, encontrar pessoas de classe baixa, que muitas vezes, não possuem condições financeiras nem se quer para se sustentarem direito, que dirá então, para estarem aderindo à moda, a cada vez que esta resolve lançar um novo produto no mercado. Segundo Ronsini, “[...] o hip-hopper é visto como marginal pelo vestuário simples e gasto pelo uso e pelo tempo, que não se amolda ao padrão juvenil ditado pela mídia.” (RONSINI, 2007: 149). Acredita-se que esta seja uma citação válida quando se refere a um grupo de hip hoppers de classe baixa, em vista de que, como dito anteriormente, os mesmos não possuam condições financeiras para se adequarem ao meio ditado pela mídia (ou seria pela moda?). Mas, e ao analisar um grupo de hip hoppers de classe média, por exemplo, será que suas vestimentas seriam as mesmas e a sociedade também os encararia como marginais? E será que estes realmente poderiam ser considerados hip hoppers? É comum observar-se bailarinos de street dance, geralmente pertencentes a alguma Cia. de Dança voltada para as classes média e alta, desfilando pelas ruas e eventos de dança, vestidos com roupas de marcas consagradas no mercado e calçando geralmente um belo par de tênis Adidas(7). A opção pelas roupas utilizadas seria um elemento fundamental para a aprovação ou reprovação de um indivíduo no grupo? E o tênis, seria o principal símbolo de status entre os dançarinos? Em conversas informais é possível constatar uma suposta insatisfação por parte de alguns bailarinos, em terem sempre que se adaptarem às “exigências” de determinados grupos, para conseguirem se manter dentro daquele círculo de convivência e de trabalho. Nota-se que a questão do estilo é algo muito forte dentre os bailarinos de Street Dance e que geralmente a roupa e o calçado utilizados podem vir a ser muitas vezes, uma forma de demarcar seu status dentro e fora do grupo. Haveria talvez uma pressão por parte dos “outros” sobre o sujeito para que este se adequasse às possíveis ideias do grupo e consequentemente conseguisse ser aceito pelo meio? Será realmente necessário estar aderindo sempre às cíclicas mudanças desta moda no contexto hip hop? Notas: (1) - [grifo meu] Acredita-se na possibilidade de que este visual ainda seja talvez ditado pelo bolso e pela praticidade dos dançarinos.

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Ilustração 2: Tênis da Adidas 4 Elements of Hip Hop Collection. (2) - DJ, começou a aperfeiçoar as técnicas de Kool Herc, mostrando grande destreza e agilidade nas trocas de um disco para o outro. Seu nome verdadeiro era Joseph Saddler. (3) - Segundo (ROCHA, 2005: 20), em 1978, Flash juntou os Furious Five para acompanhá-lo. O time, Melle Mel, Cowboy, Kidd Creole, Rahiem e Scorpio, era considerado o melhor grupo de MCs da cena. (4) - DJ Afrika Bambaataa. (5) - CulturaS (com a letra S maiúscula mesmo) no sentido de haver possibilidades de se encarar o hip hop sob diversas formas, dependendo talvez do contexto cultural em que estejam inseridos os indivíduos adeptos à ele. (6) - Teria mesmo, o teor político-social do hip hop chegado ao fim nos anos 80? (7) - Em nível de curiosidade, um grupo de Dj e Mcs conhecidos como Run DMC, receberam o patrocínio da marca Adidas quando alguns empresários assistiam ao seu show por volta da década de 80. A razão é o fato de terem uma música chamada My Adidas. “Na hora de My Adidas, o Run pediu para quem estivesse de Adidas na platéia mostrasse o tênis. Milhares de tênis erguidos depois, os alemães selaram acordo ali mesmo”. (ROCHA, 2005:33) Ilustrações: 1 - Ilustração do Título: pode ser acessada em seu original no site <http://www.sneakersbr.com.br> (acessado em 08 de julho de 2009) 2 - Ilustração 2 <http://www.sneakersbr.com.br/news/948/ Adidas_4_Elements_of_Hip_Hop_Collection_ > (acessado em 08 de julho de 2009) Referências: - GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana: Tradução de Maria Célia Santos Raposo. 15ª ed. – Petrópolis, Vozes, 2008. - HERSCHMANN, Micael. O funk e o hip hop invadem a cena. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2005. - OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. Petrópolos, Vozes, 1987. - ROCHA, Carlos. Hip Hop – Coleção para saber mais: Revista Super Interessante. São Paulo: Editora Abril, 2005. - RODRIGUES, Iesa. O fórum global da moda e o selffashion. In: VILLAÇA, Nízia e GÓES, Fred (Orgs). Nas fronteiras do contemporâneo: território, identidade, arte, moda, corpo e mídia. Rio de Janeiro: Mauad: FUJB, 2001. - RONSINI,Veneza V. Mayora. Mercadores de sentido: consumo de mídia e identidades juvenis. Porto Alegre: Sulina, 2007.


Um minuto de silĂŞncio?


Pina Bausch 1940 - 2009

Inesquecível criadora de momentos de poesia Sayonara Pereira

O nome da bailarina e coreógrafa alemã Pina (Philippine) Bausch que nasceu na cidade de Solingen em 1940, foi sempre associado diretamente a sua condição de criadora e mentora da dança teatral contemporânea. Suas peças coreográficas têm sido apresentadas nos quatro cantos do mundo, para platéias deslumbradas e sua obra já foi analisada por vários pesquisadores, em prosa e verso. Fotógrafos lhe dedicaram livros de fotos; documentários e filmes foram rodados sobre esta brilhante coreógrafa e seu maravilhoso e diversificado Ensemble sediado na cidade de Wuppertal na Alemanha.


Ensaio 06

PINA BAUSCH

Inesquecível criadora de momentos de poesia Sayonara Pereira Poucos são os coreógrafos capazes de tocar profundamente a alma humana com suas criações, Pina Bausch encontra-se neste seleto grupo que consegue trazer para a cena situações cotidianas, questões que emergem dos sentimentos mais densos do homem, apresentaos com uma caligrafia única e cria momentos de poesia. A temática abordada pela dança teatral de Pina Bausch, ao longo de mais de três décadas, manteve sempre a mesma essência. Somente a ótica, pela qual os temas são tratados, modificaram-se sutilmente, talvez como o estado de ânimo do homem contemporâneo, que mesmo com todos os progressos tecnológicos ainda se emociona com os mesmos temas: amam, sentem medo, são solitários e sentem saudades. Aluna de Kurt Jooss (1901-1979), coreógrafo alemão e fundador do departamento de dança da Folkwang Hochschule na cidade de Essen – Alemanha, escola onde Bausch fez grande parte de sua formação e deu início as suas criações. Com Jooss Bausch aprendeu sinceridade, e a lapidar as qualidades já existentes nos corpos dos intérpretes-colaboradores que vieram a protagonizar as suas 49 peças ao longo desta fértil trajetória criativa. Bausch flexibilizou e alargou todos os conceitos relativos a dança cênica existente e podemos dizer que seu trabalho é um “divisor de águas” entre o que existia até a década de 70 e o que passou a existir a partir de então. As cenas desenvolvidas em suas peças coreográficas foram situadas em lugares muitas vezes ecléticos como: um campo de cravos (Nelken-1982); uma reunião de pessoas, em volta de uma mesa, todos com água até a altura dos tornozelos ( Arien -1979 ), tendo um hipopótamo como convidado ; em uma sauna (Nefés -2003) onde ao longo da peça bolhas de água brotam do chão. São incontáveis os lugares inusitados que somos convidados a passar e conhecer. Suas peças coreográficas, compostas de uma gama de associações, de pequenas histórias, trazidas por seus intérpretes, muitas vezes autobiográficas, conseguem estabelecer ligações com as nossas próprias histórias. E esta proximidade nos da oportunidade de rirmos de nossa própria solidão ou chorarmos por uma cena que nos remeteu de volta às lembranças longínquas de nossa infância.

Pina Bausch introduziu o uso da palavra na cena

a partir dos anos 1980 e sabia lidar, de forma brilhante com códigos estabelecidos a partir do gesto e da voz, responsáveis não só pela performance do espetáculo, como também pela linguagem, expressividade e estética cênica. Seus espetáculos sempre deixaram o público muito curioso, emocionado, próximo e tocado verdadeiramente por todas aquelas imagens belas, sensíveis, surreais ou grotescas presentes em sua obra. Bausch, sempre se interessou em observar pessoas e seus respectivos comportamentos, por todos os lugares do mundo por ande andou, importando-se com o que move as pessoas e não como elas se movem. Achava ótimo que a dança não fosse apenas bonita ou simpática, mas que tivesse a ver com cada um de nós, com os nossos sentimentos, com as nossas aspirações e com o nosso sofrimento. Bailarinos muito maduros, integram o seu Ensemble, e cenicamente, com suas movimentações muitas vezes reduzidas, mas sempre precisas, sensíveis, e humanos chegam muito perto dos sentimentos das pessoas que estão sentadas na platéia. Com movimentos de braços, do torço e do plexo inigualáveis, seus intérpretes conseguem dosar da maneira mais adequada possível, seus limites físicos oferecendo os ingredientes para que o público trafegue dentro de seus medos, suas descobertas, seus chistes como partners. Pina Bausch faleceu no dia 30 de junho (2009) na cidade de Wuppertal, cidade industrial e muito cinza, que a abrigou, seu elenco e todas as suas idéias inigualáveis, ao longo das últimas quase quatro décadas. Sua perda, inesperada será sentida por todas as pessoas próximas e por todo o público que esta criadora quase tímida, languida, que com seus olhos de um azul profundo, cativou por todos os lugares em que passou. O público brasileiro conheceu seu trabalho em 1980 (Sagração da Primavera -1975) e se maravilhou em 2006 com a obra - Para as crianças de ontem, hoje e amanhã (2002). “Experimentar outras coisas, é o que eu quero sempre, e ir aonde ainda não estive” palavras de Pina Bausch em entrevista de 2007.

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Entrevista 02 Wagner Ferraz

Fotos: Didio Modelo: Marcos Grabowski



Grabowski

Marcos 82 - Informe C3 88 - Informe C3


Mister Gay Brasil 2008

Comecei com meu primeiro curso de modelo, quando tinha 10 anos, com a Cia. LIONS que na época passaram no meu colégio divulgando o trabalho. Interessei-me muito, lembro que sem muito apoio da minha família. A partir de então nunca parei, em Goiânia tem um grande evento que acontece uma vez por ano, todos os anos, o Flamboyant Fashion, que tem a duração de uma semana. Quando esse evento acontecia eu costumava chegar ao shopping as 10 horas da manhã, esperava pelo ensaio técnico com Pazeto, ficava totalmente alucinado com o trabalho dele, passava o dia esperando um convite para desfilar no shopping, isto antes dos 15 anos, ainda não tinha contrato com nenhuma agência por ser muito novo. Mas ainda antes da maior idade eu já havia feito di-

reção técnica em muitos eventos da agencia FOX-7 PRODUCTION, desde de encerramento de cursos até direção de 3 temporadas do Araquáia Model Fashion, que não eram referencias de evento de moda, mas pra mim era minha vida. Pois dos meus 16 aos 18 anos, morei em um quarto de estudante na agência esta onde eu era o Bom Bril, fazia de tudo produção de foto, modelava, ministrava o curso de modelo, claro junto com Neiva Rocha que é a dona junto com seu marido o fotógrafo Richard Rocha, que hoje são donos de do Goiânia Fashion Week. Fui para São Paulo passando pela Marlym Models, Mega, Traffic Models em Madrid onde fiquei 3 meses pegando uma campanha da Puma. Também fiz um curso de introdução à moda no IED (Instituto Europeu de Design). Vol-

Foto: Cláudio Etges 89 - Informe C3


tando para Goiânia, fui diretor da agência Look Models Production onde também ministrava cursos de modelos, direção e produção de fotos. Fizemos também uma revista, a Look Magazine ganhamos o Oscar Goiás, por descobrir a ganhadora do Super Model Brasil, Brenda Queiroz. Porem tivemos que fechar a empresa por traições por parte de bookers e administração. Também tenho que menciona a minha filha ¨sobrinha¨, já que tinha que dividir meu tempo com ela nesta fase, hoje em dia meu tempo e todo pra ela. Atualmente estou entrando na Ford Floripa. Sem falar em pintar quadros por roby, meu primeiro quadro foi em 1999, lindo, pequeno, mas eu adoro uma natureza morta. Tudo que envolve sensibilidade artística me interessa muito. 1 - Ferraz: Fale sobre tua experiência ano concurso Mister Gay Brasil (deste o início até o momento que recebeu o título). Marcos: Sobre o concurso foi tudo muito rápido, recebi o convite por parte do The Pub que queria um representante e também seria o primeiro representante de Goiânia no concurso. Então no começo muitas dúvidas, mas aceitei e fomos até Brasília fazer o material fotográfico com Dudu Lima e o pessoal do site “Parou Tudo” que fez o makeof. Depois do material on line no site uol era só esperar. No dia do concurso eu estava com 30% dos votos sendo que o segundo tinha 10% e o restante dos candidatos estavam abaixo dessa porcentagem, mas este era o voto popular. Todos os candidatos tinham muito a acrescentar no concurso, havia vários candidatos fortes, então tentei ser o mais transparente possível sendo eu mesmo defendendo nossas qualidades e valorizando nossa subcultura. E sempre com um sorriso, acabei ganhando o titulo que teve uma repercussão em Goiânia com minha família que eu adorei. 2 - Ferraz: O que alterou na tua vida depois de ter vencido o Mister Gay Brasil? Marcos: O que mudou na minha vida depois do concurso: Tirando perder minha liberdade teve muitas coisas boas mas nada de grandes mudanças, muitas experiências boas. 3 - Ferraz: Como acredita que as pessoas te viam antes de vencer o concurso e como elas te veem agora? Marcos: Então, como as pessoas me viam rsrsrsr (risos), creio que seja um pouco complicado simplificar assim, mas no geral em Goiânia dentro do “meio” eu já era bem conhecido por minha historia de vida, e sempre tive amigos maravilhosos. Depois do concurso percebi uma cobrança maior, mas por parte de pessoas que não me conhecem, cobranças que apontavam para meu fisico a caráter. Mas não tive problema nenhum com isso pois sempre fui o caretinha da turma que sonhava e amava demais. Mas voltando pro agora, eu adoro ser referencia ou pelo menos passar alguma mensagem pro nosso “meio” que muitas vezes é tão superficial, rápido e perigoso. Como por exemplo, eu tenho uma filha que na verdade e minha sobrinha, mas como minha irmã deu a luz aos 15 anos, sempre fui o pai para ela que mora comigo a 5 anos, atualmente em Florianópolis. Com o concurso eu percebi que poderia falar para o nosso “meio” que existe muito mais alem do que o trivial através de minha História, mas sem muito escândalo, por que depois do concurso percebi o verdadeiro valor do anonimato.



4 - Ferraz: Fale sobre como está tua vida hoje (compromissos, agenda...) em relação ao título que conquistou? Marcos: Na minha vida esta tudo maravilhoso por que tenho pessoas que eu amo muito e que moram comigo, compromissos entre educar uma criança de 11 anos que está na “aborrecencia”. Acabo de entrar na Ford Models, vou fazer um material fotográfico com Didio (REVISTA JUNIOR), vamos estar também no fim de semana no orgulho de Campinas para a campanha “Vista-se”. Também acabei de pintar um quadro, “reflexo”, que vou doar a Instituiçao Brenda Lee, depois vou passar um mês estudando francês em Paris e esperar o resultado positivo do concurso!

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5 - Ferraz: E qual o teu papel hoje na cultura gay brasileira? Marcos: Meu papel na cultura GLS como para qual quer cidadão em varias outras subculturas consiste em se perguntar: Qual e meu papel na vida? E estar orgulhoso dele! As fotos são do arquivo pessoal de Marcos Grabowisk e foram feitas pelo fotógrafo Didio. http://www.didiophoto.com/ http://modelsbydidio.blogspot.com



Ensaio 07

priscilladavanzo

HOME : a moda e a sustentabilidade fora de uma perspectiva hist贸rica


Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/01090811.tif Acessada em: 02/07/2009 -Source chaude du Grand Prismatic, parc national de Yellowstone, Wyoming, Etats-Unis (44°27’N - 110°51’ O).


Logo no início do filme, uma animação “bizar com os logos de patrocinadores da mais alta costura européia formam o título do filme. Gucci, Yves Saint Laurant, Bottega Veneta, Balenciaga, Stella McCartney, Steve McQueen, entre outros deslizam pela tela formando a palavra HOME. O filme não é um documentário, nem tampouco uma ficção. É um apanhado de imagens bonitas e bem desenhadas escolhidas a dedo para florear a narrativa simplista do conteúdo “sustentável”.

Barrière de corail, Queensland, Australie (16°55’ S – 146°03’ E). Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/01150016.tif Acessada em: 02/07/2009

Pirogues dans le port de Mopti sur fleuve Niger, Mali (14°30’N - 4°12’O). Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/01261621.tif Acessada em: 02/07/2009

O filme inicia-se com uma viagem às maravilhas que o planeta construiu nos 4 bilhões de anos antes do homem [homo sapiens] aparecer no planeta terra e como a sua chegada trouxe mudanças irreversíveis a ele. O roteiro em si, carregado de características ongueiro-sociológicas, desagua uma tonelada de números, estatísticas e surveys acusando o homem de, na sua natureza progressista, estar, além de expropriando a população mais carente e pobre do mundo, destruindo o próprio planeta. Não se apresenta nenhum contexto histórico universal. Para os autores e para todo o segmento da alta costura patrocinador do filme não existe luta de classes. Daí, as questões ficam perdidas e mesmo sem significado. A necessidade de soterrar o espectador com todos esses números é exatamente a falta de uma perspectiva histórica para o filme. A narração friza o período dos anos 1950 como o início do desenvolvimento industrial-destruidor humano e não a Revolução Industrial nos meados do século XVIII. Os realizadores não conseguem perceber que a burguesia realizou, sim, tarefas progressistas para a humanidade e desenvolveu as forças produtivas exatamente até o início do Século XX, quando estas estagnaram. O capitalismo, desde a sua forma inicial já propunha a destruição do que o alimenta em troca de sua sobrevivência [e com isso sua própria destruição] e é exatamente por isso que para os autores a “destruição” do ecosistema [e nós também não fazemos parte dele?] não tem nenhuma conexão com o modo de produção existente no momento. Logicamente, sem a perspectiva correta, o filme se perde em falsas esperanças [falsas questões] de que o mundo capitalista conseguirá administrar a sua própria crise e não percebe a contradição que existe aí. A começar, o modo de produção capitalista está em crise, mas diferente do que se costuma dizer, a crise não é a crise atual, isolada; é na verdade uma mesma crise iniciada no fim do Século XIX e que vem se arrastando até então. A crise é a crise de superprodução, dos excessos, da falta de planificação. O capitalismo não é mais capaz de desenvolver as forças produtivas pois não consegue mais socializar o trabalho, daí as demissões, bancarrotas e coisas do gênero. Sem uma planificação e uma socialização do trabalho não há como prosseguir sem cair na barbárie. Nessa perspectiva é impossível pensar em uma solução “sustentável”. Na verdade, é impossível pensar em qualquer tipo de solução que não seja a superação desse modo de produção.

Caravane de dromadaires près de Tichit, Mauritanie (17°29’N - 9°06’O). Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/01270510.tif Acessada em: 02/07/2009

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Ao mesmo tempo que o desenvolvimento indústrial e tecnológico é colocado como “vilão”, a própria produção do filme desfruta de toda essa “vilania” e utiliza o que há mais avançado na tecnologia: câmeras high definition, filmagem aérea [100% das filmagens são aéreas],


Récolte de blé dans la vallée du Dadès, Maroc (31°26’ N – 6°01’ O). Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/01302705.tif Acessada em: 02/07/2009

Récolte de blé dans la vallée du Dadès, Maroc (31°26’ N – 6°01’ O). Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/01302705.tif Acessada em: 02/07/2009

Epandage de pesticides à Navaisha, Kenya Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/01361122.tif Acessada em: 02/07/2009

Puits près de Khudiala, Rajasthan, Inde (26°26’ N 72°40’ E). Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/01571114.tif Acessada em: 02/07/2009

Marais du Pantanal près de Corumba, Mato Grosso do Sul, Brésil (17°54’ S - 57°21’ O). Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/02011105.tif Acessada em: 02/07/2009


Bidonville de Makoko, face à l’île de Lagos, Lagos, Nigéria (6°30’ N - 3°24’ E). Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/02175204.tif Acessada em: 02/07/2009

Home: Nosso Planeta, Nossa Casa (Home) dir. Yann Arthus-Bertrand 2009, França, 93 minutos. Em algumas poucas décadas, a humanidade interferiu no equilíbrio estabelecido no planeta há aproximadamente quatro bilhões de anos de evolução. O preço a pagar é alto, mas é tarde demais para ser pessimista. A humanidade tem somente dez anos para reverter essa situação, observar atentamente à extensão da destruição das riquezas da Terra e considerar mudanças em seu padrão de consumo. Produzido por Luc Besson e Denis Carot. www.home-2009.com.br

transporte através do mundo todo e a própria rede da internet, entre milhões de outros recursos. Lançado propositalmente no Dia Mundial do Meio Ambiente, simultaneamente em quase 50 países em versões dubladas e legendadas nos cinemas, na internet e com todos os artifícios da copyleft, para uma distribuição “massiva” [as massas certamente não são o público alvo do filme] que visa que ele seja visto pelo maior número de pessoas possíveis. Essa é uma ação da cruzada que a indústria da moda tem seguido na direção de um “consumo consciente”. Terre de Baffin, Canada Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/02243414 .tif Acessada em: 02/07/2009

Port Harcourt sur le delta du Niger, Nigéria Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/02164617.tif Acessada em: 02/07/2009

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A sustentabilidade é uma das maiores falsas questões do momento. Mesmo seus “requisitos básicos” são só um amontoado de palavras bonitas banhadas num moralismo sem fim: ecologicamente correcto, economicamente viável, socialmente justo e culturalmente aceito. Nada aponta para uma solução real [a superação do capitalismo] mas apenas para meia-soluções que visam apenas “tapar o sol com a peneira”. A produção planificada é a única solução verdadeira para todos as questões sociais, ecológicas e culturais, pois é a única solução que retomaria o desenvolvimento das forças produtivas e a socialização do trabalho. Qualquer outra solução é apenas o desperdício de trabalho humano. As imagens são belas, impecáves na fotografia “poética” intensionada a “tocar”, assim como a trilha sonora world music de Armand Amar composta com cânticos e instrumentos dos recônditos do mundo. Nada poderia retornar mais ao artesanato pré capitalista, caminho que as ciências sociais trilham cegamente, sem perceber que a roda da história não pode girar para trás. A confusão trazida pelo projeto [e não só esse projeto em particular, mas a sustentabilidade no geral] é tão grande que só pode ter o intuito de gerar uma estagnação no desenvolvimento histórico. Nada é esclarecido. Fica só essa idéia vazia de retorno a um passado já ultrapassado. E sem o esclarecimento, o futuro distancia-se cada vez mais.


Ocultar a necessidade histórica e esconder debaixo de falsos conceitos os próprios “deslizes” que eles mesmos têm é típico de quem não quer enxergar [ou admitir] que como ptoprietários ou pequenos proprietários estão expopriando a classe trabalhadora e os recursos do planeta. Escondem de si mesmos o futuro que os aguarda nesse modo de produção [serem expropriados por expropriadores mais poderosos] e ao mesmo tempo não permitem que a humanidade alcance seu futuro fora deste modo de produção. A própria burguesia, quando se estabeleceu como classe dominante, apresentou a chave para o futuro da humanidade, criou a classe trabalhadora, que por ser livre de proprietário e livre de propriedade é a única capaz de proporcionar à humanidade, o futuro.

Maisons solaires de l’écoquartier Vauban à Fribourg-enBrisgau, Allemagne (47°58’N - 7°50’E). Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/02485423.tif Acessada em: 02/07/2009

Eoliennes Tehachapi, Californie, Etats-Unis Imagem pesquisada em: http://www.europafilmes.com.br/img/Home/02502118.tif Acessada em: 02/07/2009

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Ensaio 08

Paulo Duarte - Portugal

Religião: “à la carte”? Se pensarmos, nos dias de hoje, por exemplo, com o arsenal nuclear suficiente para pura e simplesmente eliminar o planeta Terra, o que nos garante a Vida? Será o ser humano reduzido a uma pura dimensão biológica, como se de um objecto se tratasse, que se faz e desfaz? De facto, a dimensão religiosa é muito importante para a evolução humana, pois vivida, sem fundamentalismo, permite o respeito pelo mais além difícil de explicar, por mais que se queira buscar razões para “controlar” a divindade, o sagrado, o transcendente. Ora, mas para quem vive no apogeu do desenvolvimento, a religião pode ser ou subvalorizada, ou encarada como uma moda do momento… Será assim? O ser humano na busca do sentido da vida(1) deseja, quer saber, sobre a verdade do que acontecerá com o desenrolar da sua mesma vida . De salientar que a busca da verdade, por parte do humano, “não se pode separar da realização do humano mediante a sua actividade livre no mundo. (…) O mundo não é uma realidade que só seja para conhecer ou contemplar, é uma realidade a realizar e a humanizar com vista à humanização do próprio ser humano”(2). No entanto, a verdade não pode estar alicerçada no perigoso sincretismo das várias posições filosóficas. Maurice Blondel, na obra La Acción, afirma que: “Ser de todos os tempos e de todas as raças através da história; aproximar-se por meio da filosofia, ao teatro da batalha interminável dos sistemas; levar dentro do mesmo o realismo, o idealismo, o criticismo e o evolucionismo (…) é um amável engenho para dar-se o todo sem se dar nada”(3). No fundo, seria seguir diluído com a possibilidade de ter os pensamentos misturados, aceitando assim tudo o que fosse possível(4). Poder-se-ia ter uma porta aberta para o relativismo, levando o ser humano para o sem sentido. O mesmo se pode dizer sobre a dimensão religiosa. Pertencer a esta ou aquela comunidade, ou viver esta ou aquela religião, não deve ser um aproveitar porque dá jeito, ou porque se quer seguir, já que esta ou aquela pessoa “famosa” a segue. Sem dúvida que poderemos encontrar muitos caminhos de sincretismo, devido à mistura de culturas que ao longo da história foi acontecendo No entanto, a busca do tal sentido deve permitir que se viva o aprofundar da religião, num compromisso que leva à descoberta e vivência da mesma.

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A vivência consciente como resultado de uma reflexão e de um assumir da dimensão religiosa com seriedade e respeito, também contribui para a integração do ser humano no todo que é pela sua vontade. No entanto, esta unidade, no todo que é, não deve implicar o rumo para o individualismo. Uma coisa é a tomada de consciência da individualidade do ser humano, outra é a do fechamento sobre si próprio no individualismo. Este fechamento conduz ao nada. O ser perde assim o sentido da vida em direcção aos outros, dá-se “uma extinção gradual do eu”(5), acabando por morrer. No entanto, considero que há a morte para a vida e há a morte para viver. Ou seja, a aniquilação da vida, na perda do sentido, é a morte para a vida inerente ao ser humano que se fecha em si, enquanto que o desejo de uma morte da pessoa com o objectivo de ter mais vida a torna mais próxima do absoluto. Dar a vida pelo outro é não ter receio de perder a vida própria para que o outro seja. Afinal, uma decisão em direcção ao outro acaba por ser esta morte geradora de vida. Para quê? Precisamente para ir ao encontro do sentido, da felicidade. Isto acontece nesta busca da individualidade como forma de sair de si. E quem dá o passo na caminhada da sua vontade de saída de si, também através da vivência religiosa, fá-lo por convicção e não como um simples apetite do momento. Muitas vezes muda-se de religião, como quem muda de roupa. Não creio que exista a “religião da moda”, porque a religião não se resume ao simples cumprir tarefas, actividades. A religião, como realidade humana, é uma entrega voluntária ao reconhecimento de uma entidade absoluta, relacionando-se o ser humano, dessa forma, com a mesma entidade. No fundo, essa relação que vive com a entidade absoluta permite ao ser humano um conhecimento profundo de si que o leva ao outro, e que pode exigir a abnegação de algumas vontades. Ou seja, cada qual, na sua individualidade, tem de buscar a relação de modo a tornar-se mais próximo do todo, e tal tem um carácter marcadamente religioso quando se vive o compromisso sério com a religião que se professa. Pensar que, “o que parece imenso por fora é o que verdadeiramente tem limites, naquele que parece finito e particular como um ser ou como um facto singular, aí, no seu interior habita um infinito”(6).

A interioridade, o dentro, para usar o termo de


Notas: Blondel, é a vitória sobre o universo inteiro. Assim, a vida humana é “a organização de um pequeno mundo que reflecte o maior, e manifesta até pela sua disposição íntima a dissimetria e a variedade do universo”(7). A importância do acto consciente, e até mesmo inconsciente, do ser humano, na sua individualidade, influencia o universo inteiro. E tal também acontece quando se descobre a densidade da religião que se professa, o que faz com que se dê uma evolução da pessoa, quando age no sentido de um maior crescimento, não só pessoal, como social. A acção consciente, vivida não pelo sabor do momento, é, então, mediadora entre todas as formas de actividade corporal, mental e espiritual. Daí que, também na vivência da religião com seriedade, há uma ligação entre os várias dimensões do ser. “No nosso organismo complexo a unidade só se dá por coesão e a coesão por cooperação”(8). Esta acção traz consigo o peso da responsabilidade pela união, pela solidariedade. Afinal, o ser humano como ser de relação acaba por dirigir a sua acção em direcção ao outro. E aquilo que faz não tem meiotermo, ou faz, ou não faz. O que implicará uma transformação, ou seja, não se pode agir sem que isso não altere o ser humano, e por vezes quem o rodeia, mesmo que de forma imperceptível. É de salientar que na decisão está presente a influência de tudo o que o ser humano é, a sua história, a sua vida, a sua relação com os outros, e, numa boa decisão, tendo em conta estes aspectos, o ser humano pode viver o processo da liberdade ordenando o que sente e o que vive, no fundo os seus desejos. Mesmo quando, “actuar equivale, sem dúvida, a refrear alguns desejos, mortificar alguns órgãos para satisfazer e vivificar outros”(9). A acção tem de levar ao outro, tem de vivificá-lo. Pois, “egoísmo e desinteresse seguem a mesma lei, ainda que aplicada de modo diferente. Não podemos nunca bastarmo nos a nós mesmos. Para tentar ser melhor, o mais completamente uno, não se deve, nem se pode permanecer só”(10). A acção exerce efeitos sobre outros, não está isolada, fechada sobre si. “O que é feito por mim, mesmo com o concurso do outro, já não é só para mim e para este outro. O acto realizado tem necessariamente um alcance maior”(11), atingindo assim, a comunidade, a sociedade, todo o mundo, tendo em conta que nos influenciamos mutuamente, o sujeito sobre a sociedade, a sociedade sobre o sujeito e até mesmo a sociedade sobre a sociedade. Não será difícil nos apercebermos da amplitude do maior alcance se pegarmos em vários exemplos dos últimos tempos focando-nos apenas no carácter religioso. Em nome da religião pode-se chegar a extremos de bondade e maldade. Por isso é que a religião não é um simples apetite, nem mesmo pode estar reservada para as pessoas sem formação, ficando encerrada numa superstição, limitada ao foro exclusivamente pessoal, o factor religioso deve ser vivido, estudado e aprofundado com seriedade, de modo a que o bem que advém prevaleça sobre o fundamentalismo, contribuindo para uma maior humanização do ser humano.

(1) - Isto remete-me para a forte afirmação de Jesus: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14, 6) Olhando para esta frase, encontro aqui o objectivo a alcançar pelo ser humano, mesmo tendo consciência de que entro no campo teológico. Se atendermos ao “Eu sou”, há a afirmação da individualidade daquilo que é, e não é, de todo, uma insegurança sobre a verdade de si próprio. Ora, então o que é? É caminho, é dinamismo, no fundo acção que o leva adiante, é verdade que assegura a certeza, e é vida, que nos permite dizer que somos quem somos, diante de cada um e diante dos outros. O respeito da individualidade, na comunidade. A vida em nós que se relaciona com a vida do todo. Assim, o caminho vai-nos encaminhando para a verdade que nos permite ir percebendo a vida na sua totalidade. (2) - GEVAERT, Joseph – El problema del hombre. Salamanca: Ediciones Sigueme, 1984, p. 187. (3) - BLONDEL, Maurice. – La Acción. Madrid: BAC, 1996, p. 3. (4) - No entanto, isto não deve ser considerado como um total fechamento ao que estas várias posições filosóficas dizem. Só mesmo o que é totalmente infundado seja de desprezar. Se surgiu este ou aquele pensamento, poderá ter havido uma razão, que rapidamente se poderá refutar. Ainda assim há que tê-la em conta para que se faça uma refutação justa. Lembrando o pensamento de Gadamer sobre o conhecimento hermenêutico: “a verdadeira capacidade de conhecimento hermenêutico é a nossa capacidade de ver o que é duvidoso”, que não será numa atitude de cepticismo, mas sim de aprofundamento da realidade, até mesmo com o que possa ser duvidoso. Cf. GADAMER, Hans-George – “A Universalidade do Problema Hermenêutico”, In: Hermenêutica Contemporânea, Lisboa: Edições 70, 1980, p. 192. (5) - Ibidem, p. 57. (6) - Ibidem, p.124 (7) - Ibidem, p.126. (8) - Ibidem, p. 220. (9) - Ibidem, p. 232. (10) - Ibidem, p. 237. (11) - Ibidem, p. 269.

Bibliografia BLONDEL, Maurice. – La Acción. Madrid: BAC, 1996. GADAMER, Hans-George – “A Universalidade do Problema Hermenêutico”, In: Hermenêutica Contemporânea, Lisboa: Edições 70, 1980. GEVAERT, Joseph – El problema del hombre. Salamanca: Ediciones Sigueme, 1984.

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Fotos: Gr達o Imagem - Cavalera - SPFW Primavera/Ver達o 2009/2010.

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Ensaio 09 Kássia Garcia

Uma breve passagem pela história da moda e a luta de classes Dentro dos estudos feitos sobre moda, existem duas vertentes sobre de onde ela teria nascido. Alguns crêem que a moda nasceu da necessidade de se abrigar, uma necessidade humana trabalhada característico com a sua civilização, investigações sob as quais requer um grande estudo arqueológico. Sobre este prisma, muitos docentes tratam deste período histórico como história da indumentária, mas não da moda. A outra vertente de estudos considera que a história da moda nasceu de fato, junto com a história materialista, no momento da ascensão da sociedade burguesa e nascimento do capitalismo. A lógica da moda atua sob a percepção da condição do emergente novo poder industrial na busca de legitimação perante a resistente nobreza feudal artesanal. A aquisição de títulos de nobreza, regras de etiqueta da côrte assim como suas vestimentas, anunciavam uma lógica de mimetismos, que se desdobraram em alguns tipos sociais em uma atmosfera de multidões descritas em poemas de Baudelaire, enquanto a significação de cada coisa passa a ser fixada pelo preço, desperta ao autor dimensão do inferno instalado em seu interior. Walter Benjamin o descrevia como “um poeta obrigado a reivindicar a dignidade do poeta numa sociedade que já não tinha nenhuma espécie de dignidade a conceder” (BENJAMIN, 1983, p.159). Do período aristocrático, a burguesia herdou a forma de fazer suas roupas sob medida, extremamente ostentatória, de modo que despertou o interesse de autores como Thorstein Veblen, George Simmel, Norbert Elias, entre tantos outros que fundamentaram teorias da distinção social, por enxergarem no vestuário, tal como Pierre Bourdieu descreveu, a determinação de nossos comportamentos se dá por nossas classes sociais e podem pertencer a um processo de distinção, ou seja, dos gostos que denotam hierarquia. BOURDIEU (1983) Do século XIX ao século XX, muitas mudanças ocorreram na sociedade e na moda. Grandes costureiros precisaram adaptarem-se à evolução industrial do prêt a porter(1) em uma adequação pela demanda de novos consumidores que até então obtinham seus vestuários artesanalmente. A revolução industrial possibilitou a expansão dos lucros na area têxtil, expandiu também a mais valia desenfreada nos modos de produção por meio da relação com o proletariado. O paradoxo do sistema capitalista indicava que o vestuário que até então era um bem de luxo passado de

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gerações a gerações, transformou-se “no primeiro item de consumo disponível em larga escala (…) historiadores da indumentária concluíram que as roupas foram democratizadas durante o século XIX” (CRANE, 2006, p.27). Um exemplo disso eram os espartilhos, que por ser necessário ser vestido por uma outra pessoa, subetendidamente uma criada e o status social de ter uma criada, trazia à mulher a bela silhueta para a postura correta dentro das convenções sociais. “ Os corseletes eram feitos tanto de cotim (um tecido grosso de sarja de algodão) aos mais caros feitos em cetim” (MENDES.e DE LA HAYE, 2003, p.15). Surgiam novas formas de tornar acessível para a demanda maior assalariada, a pequena burguesia incentivou até os ítens mais artesanais em uma produção em escala Simultaneamente a esta “democratização”, não unicamente na moda, mas no âmbito mercadológico capitalista, tende sempre a expropriar o artesanato de uma maneira geral: dos agricultores, tecelões, pequenos burgueses, grandes costureiros, e por fim, através da mais valia desenfreada, os trabalhadores alienados das fábricas, que se confrontam com a ameaça do desemprego ou da concorrência máquina. “O crescimento fenomenal das roupas prontas no fim do século XIX e início do século XX dependeu, em grande parte, das “sweted industries”*(indústrias suadas), sem regulamentação. Fabricantes exclusivos exploravam esse reservatório de mão de obra barata para o acabamento das roupas. Os produtores britânicos empregavam trabalhadores “autônomos” de costura e alfaiataria, por tarefa ou por temporada, com salários que mal garantiam sua subsistência” (MENDES.e DE LA HAYE, 2003, p.9) A passagem resumida pela história do século XIX mostra a continuidade do período moderno, onde alguns pensadores declarando-se pós modernos ainda discutem questões como a democratização e a liberdade de identificação através do consumo. Esses autores contemporâneos como Grant Mc Cracken, Collin Campbell, Gilles Lipovetsky, desconsideram o tema sobre o consumo de forma dialética dentro da perspectiva histórico-universal. De fato há maior acesso às mercadorias mas através de mecanismos capitalistas, que persistem velados por tais autores, que consequentemente não alcançam o cerne do problema- a crise de superprodução. A influência de meios de comunicação traziam informação sobre a alta costura e os grandes costureiros. As pioneiras revistas “Le Mode” e “Gazette du Bon Ton”, ofereciam novidades da moda para serem copiados pela pequena burguesia e posteriormente em contato com outras classes que até então não tinham acesso aos requin-


tes da aparência. Quem melhor compreendeu o ciclo da reprodutibilidade foi Walter Benjamin que define aura num objecto como a aparição única (ou rara) de uma realidade longínqua. Ele encontra duas tendências: 1) exigência que as coisas estejam próximas, 2) a reprodução deprecia o que é único. BENJAMIN(2005).

com comprimento maior alegando que “o comprimento das saias reflete a situação econômica” (MENDES.e DE LA HAYE, 2003, p.69). O caráter fetichista das mercadorias é uma constante em todos os setores da moda, o exemplo de Jean Patou nos serve para esclarecermos o funcionamento das criações moda:

Portanto não nos limitemos apenas no controle social e na ideologia dos patrocinadores das revistas, é preciso considerar a contradição destas ideologias quando a beleza como necessidade é capaz de elevar o proletário à sua condição. A contribuição de George Simmel sobre a teoria da imitação das classes altas pelas classes baixas, coloco aqui uma alegação oposta que aparece neste trecho da obra de Diana Crane: “ Na verdade, os trabalhadores franceses e suas mulheres adotaram roupa da moda de modo seletivo: certos estilos não foram escolhidos” (2006, p.129). Um das questões deste estudo é desvelar a existência de tal capacidade escolha dos trabalhadores franceses, assim como no restante do mundo.

“A forma mercadoria e a relação de valor dos produtos de trabalho, na qual ele se representa, não têm que ver absolutamente nada com sua natureza física e com as relações materiais que daí se originam. Não é mais nada que determinada relação social entre os próprios homens que para eles aqui assume a forma fantasmagórica de uma relação entre coisas(…) Esse caráter fetichista do mundo das mercadorias provem, como a análise precedente já demonstrou, do caráter social peculiar do trabalho que produz mercadorias relações reificadas entre pessoas e relações sociais entre as coisas.” (MARX, 1988, p.71)

Os discursos dominantes referem-se a uma postura marginal tudo que saia das convenções da etiqueta adotada pela alta burguesia, a moda mostra algumas tensões sociais através trajes polêmicos da mesma forma em que absorve a tensão e a modifica a um estado passivo. O estilo masculino adotado por mulheres no século XIX revelava-se como a luta de classes de mulheres oprimidas em uma sociedade patriarcal. Gravatas usadas por mulheres ganhar outra conotação de poder no espaço social, ao longo dos anos tornaram-se fita e laços, posteriormente incorporadas por toda a sociedade feminina de todas as classes sociais. A moda é um mercado e não arte. Na mesma época o paletó passou pelo mesmo processo até tornar-se o tailleur. As calças foram bastante polêmicas sendo aceito apenas após de décadas na Segunda Guerra Mundial, devido a necessidade das mulheres que trabalhavam na indústria pesada. Em 1920 a estilista Coco Chanel lançou a calça feminina, porem não obteve êxito. Neste período as mulheres influenciadas socialmente, mostrariam sua emancipação de forma polêmica ainda que dentro da atmosfera ideológica social. Um estilo aerodinâmico do cabelo curto e maquiagem pesada a la garçonne, corpo masculinizado pelo esporte e roupas mais curtas que escondiam o busto e o quadril e soltas para dançar jazz. A moda ajuda a compreender sua manifestação apenas ocorre dentro de um sistema ideológico social. Embora não tivesse tido sucesso no caso das calças, Chanel foi das primeiras a licensiar seu nome para uma linha cosmética buscando popularizar sua clientela, adotou também a simplicidade como característica da marca. Chanel era visionária, como uma uma grande proprietária, temia perder suas propriedades e passava a entender que não podia negar a força da evolução da história e da iminência da história da luta de classes. Muitas vezes estilistas, como grandes donos dos modos de produção, usam desesperadamente argumentos quase metafísicos para fundamentarem suas coleções, cito aqui apenas um exemplo de Jean Patou que próximo da crise da bolsa de 1929, lançou um vestido

Ao fim da Segunda Guerra, os Estados Unidos em posição de vantagem industrialmente, estouraram suas produções têxteis de prêt a pórter e de marketing. Era a época do new way of life onde vestidos suntuosos, representados pelo new look de Christian Dior, propunham uma mulher propriamente doméstica vestida de forma voluptosa, um símbolo de fertilidade incentivada pela campanha Norte Americana do baby boom. Em uma nação capitalista, contexto em que vivemos até hoje, os grandes produtores são uma ínfima minoria, conhecidos como trustes(2), a pequena burguesia que crê veemente que faz ou fará parte desta pequena elite e o restante se trata de uma grande massa de cidadãos assalariados também submetidos a ideologia de participação social e planos de carreiras nas indústrias.. A classe operaria minada por inúmeras explorações redundantes à história materialista nos leva ao embate às contradições do capitalismo: O esgotamento da mão de obra esquecendo-se que este é seu produtor e consumidor das mercadorias geradoras do capital. Em meados do final 1950 e durante a década 1960, mais mudanças ocorreram, jovens assalariados, inconformados com o sistema American way of life, rompem com o establishment alterando significamente a moda. A começar pelo reconhecido vestuário e uniformes do operariado, a calça jeans, uma camiseta branca parte da roupa de baixo, e coturnos de trabalho simbolizaram uma imagem de pulsão à mudança. Essa grande mudança da moda de classe ocorreu nos anos 1960 e após isso a moda nunca mais seria a mesma. Autores contemporâneos fragmentam-se nas bases virtuais das fronteiras . A teoria da pós modernidade consiste-se : “na dissolução de algumas fronteiras e divisões fundamentais, notadamente o desgaste da velha distinção entre cultura erudita e cultura popular. Os autores pós modernos não citam mais tais “textos” como um Joyce ou um Mahler fariam, mas os incorporam a ponto de ficar cada vez mais difícil discernir a linha entre a arte erudite e formas comerciais.” (JAMENSON,1997, p.17)

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Para além das reais consequências da modernidade, pós modernidade, hipermodernidade GUIDDENS(1991), a máxima de Karl Marx “Tudo que é sólido desmancha no ar”, relembra-nos sobre a constante base do capital em suas diversas crises históricas originadas pela mesma lógica da mais valia e da superprodução.

Bibliografia

Atualmente os fatos da crise do “consumo” mostram mais uma vez a estagnação das forças produtivas, que não cria nenhuma riqueza material, extinguindo trabalho social, repercutindo em apropriações de temas frívolos e fetichizados, no qual o mais recentemente é sugerir ao consumidor agir inserido em uma ideologia da sustentabilidade.

BENJAMIN, Walter. Sobre alguns temas em Baudelaire: textos escolhidos. Trad. José Martins Barbosa e Hermerson Alves Batista. São Paulo: Abril Cultural (Os Pensadores), 1983.

“A verdadeira relação entre exploradores e controladores democráticos é caracterizada do melhor modo pelo fato de que os senhores “reformadores”, tomados de santa emoção, param ao limiar dos trustes com seus segredos” industriais e comerciais.” (TROTSKY,1938)(3).

BOURDIEU, Pierre. Textos Escolhidos (Org.Renato Ortiz). São Paulo: Ática, 1983.

Ainda pairamos sob soluções “democráticas” inviáveis pois a única solução para a volta do desenvolvimento das forças produtivas é apenas possível através da superação do capitalismo. A moda, encontrou formas estéticas corretas para as grandes massas, mais ainda deve voltar a debater sobre os modos de produção, para a própria sustentabilidade dos profissionais da area.

____________. Walter Benjamin. Org.Flavio R. Koethe. São Paulo: Ática, 2005.

____________. Alta Costura e alta cultura em Questões de Sociologia. Trad. Sérgio Miceli. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1983. CAMPBELL, Collin. A ética romântica e o espírito do consumismo moderno. Rio de Janeiro: Rocco, 2001. CRANE, Diana. A moda e seu papel social: classe, gênero e identidade das roupas. Trad. Cristiana Coimbra. São Paulo: Ed. Senac. São Paulo, 2006. DOUGLAS, Mary e ISHERWOOD, Baron. O mundo dos bens. Para uma antropologia do consumo. Trad. Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Ed.UFRJ, 2004. LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero. A moda e seu destino nas sociedades modernas. Trad. Maria Lucia Machado. São Paulo: Cia das Letras, 2002.

Notas: (1) - Prêt a Pórter é um termo francês originado do inglês ready to wear que significa “pronto para vestir”, termo cunhado para a roupa confeccionada industrialmente em grades P, M e G (2) - Léon Trotsky definia trustes a alta burguesia que deveria revelar seus segredos ao operariado em seu Programa de Transição: “Os operários não possuem menos direitos que os capitalistas em conhecer os “segredos” da empresa, do truste, do ramo de indústria, de toda a economia nacional em seu conjunto. Os bancos, a indústria pesada e os transportes centralizados devem ser os primeiros a serem submetidos à observação”. (3) - Pesquisado em http://marxists.org/portugues/ trotsky/1938/programa/cap01.htm#1. Acessado em 03/07/2009.

106 - Informe C3

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política (vol.1). Trad. Regis Barbosa e Flavio R. Koethe. 3a ed. São Paulo: Nova Cultural (Os economistas), 1988. McCRACKEN, Grant. Cultura & Consumo. Novas abordagens ao caráter simbólico dos bens e das atividades de consumo. Trad. Fernanda Eugênio. Rio de Janeiro: MAUAD, 2003. MONEYRON, Frédéric. A moda e seus desafios. Trad. Vinicius Dantas. São Paulo: Ed. Senac, 2007. MENDES, Valerie.e DE LA HAYE, Amy. A moda do século XX. Trad. Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2003. VEILLON, Dominique. Moda & Guerra:um retrato da França ocupada. Trad. André Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004.



Ensaio 10

T. angel

Beautification Dentre os inúmeros fatores motivacionais que faz com que um indivíduo modifique seu próprio corpo temos, sem dúvida alguma, o fator estético. Abordaremos aqui a modificação corporal no sentido dos ditos primitivos modernos¹. Tatuagem, piercing, escarificação e implantes são técnicas por quais os adeptos de tais práticas trilham para alcançar o belo. Conceito de beleza que destoa e causa estranhamento na grande massa da sociedade contemporânea. O website brasileiro FRRRKguys.com que trabalha a modificação corporal partindo de um pressuposto da beleza oriunda de tal prática, criou um canal denominado Beautification. Unindo a beleza (beauty) e a modificação corporal (body modification) o canal vem abordando diversas técnicas de manipulações do corpo, passeando pelo (hoje) tradicional e comum body piercing e indo até modificações mais peculiares ou como são chamadas pelos principais sites de modificação corporal do mundo², extremas. Em sua maioria, as modificações extremas são aquelas bastante próximas de um procedimento cirúrgico, exemplos, bipartição da língua, implantes subcutâneos ou transdermais, modificações genitais e etc. O segundo ponto bastante interessante do canal é que narra um pouco do histórico das práticas no Brasil. Contando com entrevistas de profissionais respeitados, como André Meyer, Ronaldo Sampaio (Snoopy), Valnei,

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João Caldara, Dark Freak, dentre outros, o canal é útil tanto para quem simplesmente quer se modificar como para aqueles que modificam profissionalmente o corpo de outrem. Vale citar, que algumas modificações corporais ainda não são feitas no Brasil, como é o caso do eyeball tattooing. Nesse caso contamos com a entrevista de Howie (Lunacobra), o único artista capacitado no mundo para execução de tal procedimento. Atualmente estamos desenvolvendo novos artigos para o canal Beautification, a idéia é que possamos ter ao menos um de cada técnica. Qualquer similaridade com um catálogo, revista de beleza não é coincidência. Pelas modificações corporais serem em sua grande maioria irreversíveis, o consumo de informação sobre o que se deseja fazer é imprescindível. Beautification, beleza e transformação, está disponível no endereço: http://www.frrrkguys.com/beautification.html Faça uma visita! ¹ Termo cunhado por Fakir Musafar para definir pessoas que manipulavam o corpo partindo de proposições tribais. ² BMEzine.com, Pielmag.com colocam essa definição.


Fotos enviadas por T. Angel. DisponĂ­veies em: http://www.frrreakguys.com

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Ensaio 11 Marta Perez

Identidades à deriva ‘meus amigos julgam até que perdi minha identidade se perdi, (...)! ainda tenho meu C P F’ Ivan Monteiro, poeta brasiliense Mesmo que não atentemos para tal, a maneira como cada um de nós realiza opções no vestuário, aparência, atividade física, cultura, lazer, dentre inúmeros outros campos, está relacionada ao grau de identificação com este ou aquele estilo, de modo a nos percebermos enquanto ‘únicos’, em outras palavras, refere-se à nossa identidade pessoal. Mas o que vem a ser mais precisamente ‘identidade’? Identidade pode ser definida como a relação que cada indivíduo, coisa ou entidade, mantêm consigo mesmos ao longo de sua existência. A reflexão filosófica considera identidade e existência ligadas como ‘irmãs siamesas’. É comparando uma coisa consigo, em tempos diferentes, que formamos as idéias de identidade e de diversidade. Silva observou que a questão da identidade e da diferença está hoje no centro da teoria social e da prática contemporânea. No cenário pós-moderno, ao mesmo tempo em que as antigas fontes de ancoragem da identidade estão em crise - a família, o trabalho, a igreja, entre outras -, desenvolve-se uma política da identidade, em que grupos culturais buscam visibilidade na cena social, questionando a posição privilegiada das identidades até então hegemônicas. Atentando para a complexidade do conceito, Hall afirma que, embora possamos nos ver, seguindo o senso comum, como sendo ‘a mesma pessoa’, em todos os encontros e interações, somos posicionados de maneira diferente, de acordo com os diferentes papéis sociais que estamos exercendo em cada momento e lugar. Ele aponta para o declínio de identidades que estabilizavam o mundo social e o surgimento de novas, fragmentando-se a noção de indivíduo enquanto sujeito unificado (Hall,1997:9). O indivíduo é idêntico a si mesmo, quaisquer que sejam as transformações mais ou menos importantes que lhe possam acontecer. Contudo, numerosos filósofos concebem a identidade como uma pura e simples ilusão mental, ou uma ‘ficção do espírito’, como testemunha a célebre máxima de Heráclito segundo a qual ‘não podemos nos banhar duas vezes no mesmo rio’. Segundo o ‘mobilismo universal’, o mundo constitui-se de seres em constante devir. Os seres não são, mas se tornam, e se tornam sempre outros.

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Voltando no tempo, recorda-se que a noção de individualismo surgiu num determinado momento histórico, na passagem para a modernidade: simultaneamente, o nascimento perdia seu caráter decisivo como critério de posição na hierarquia social, de modo que, a cada um, passou a ser imposta a necessidade de definir sua posição e elaborar as imagens de si, o que trouxe novas insatisfações e sofrimentos íntimos (Corbin,1995:419). Todavia, desde seu advento o indivíduo sofreu transformações radicais. Se é que realmente está acontecendo, a suposta ‘crise de identidade’ situa-se num processo mais amplo, em que se deslocam as estruturas e processos centrais das sociedades modernas. Quadros de referência que ofereciam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social vêm passando graves abalos. As sociedades do final do século XX e início do século XXI estão sofrendo uma mudança responsável pela fragmentação das paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, que, no passado, nos tinham fornecido sólidas localizações como indivíduos sociais. Hall descreveu a perda de um ‘sentido de si’ em termos de um processo de descentramento ou fragmentação do sujeito moderno (Hall,1997:9). A partir de ‘pontos estratégicos’, Hall distingue três concepções de identidade ao longo da História: a do sujeito do Iluminismo, a do sujeito sociológico e a do sujeito pós-moderno. O primeiro corresponde a uma concepção decisivamente ‘individualista’ do ‘sujeito humano’. Nela, a identidade da pessoa seria o ‘centro essencial do eu’. A modernidade libertou o indivíduo de seus pontos de apoio nas tradições e estruturas divinamente estabelecidas, concebendo a pessoa humana como um indivíduo centrado, unificado, dotado das capacidades da razão, consciência e ação, cujo ‘centro’ consistia num núcleo interior que permanece essencialmente o mesmo, contínuo e idêntico, desde o nascimento e por toda sua existência (idem:13,23-25). O deslocamento do eixo da tradição para o próprio indivíduo enfatiza a idéia de livre-arbítrio. A noção de sujeito sociológico refletiu a crescente complexidade do mundo moderno e a consciência de que esse núcleo interior do sujeito não era autônomo e autosuficiente, mas sim formado na ‘relação’ com ‘outras pessoas importantes para ele’, em que são mediados valores, sentidos e símbolos – a cultura – dos mundos habitados. Mead, Cooley e os interacionistas simbólicos são figuraschave da concepção ‘interativa’ entre o eu e a sociedade. O sujeito ainda possui o núcleo de um ‘eu real’, mas este inclui, é formado e trans-formado, em diálogo contínuo


com mundos culturais ‘exteriores’ e identidades que esses mundos oferecem. A identidade corresponde àquilo que preenche o espaço entre o ‘interior’ e o ‘exterior’, entre o mundo pessoal e o mundo público, ‘costurando’ o sujeito à estrutura. (idem,11-12). Em nossa era, isso está mudando: o sujeito‘pósmoderno’ fragmenta-se, perdendo sua identidade estável e compondo-se de várias identidades. O processo de identificação, através do qual nos projetamos em nossas identidades culturais, tornou-se mais provisório, variável e problemático. Sem uma identidade fixa, essencial ou permanente, o sujeito assume identidades diferentes, sem que sejam unificadas ao redor de um ‘eu’ coerente. Existem, simultaneamente, dentro de cada um, identidades contraditórias, empurrando em diferentes direções, deslocando continuamente as identificações. Hall afirma que a identidade plenamente unificada, completa, segura e coerente é uma mera fantasia, fruto da construção de uma cômoda história sobre nós mesmos ou uma ‘narrativa do eu’ confortadora. À medida que os sistemas de significação e representação cultural se multiplicam, somos confrontados por uma multiplicidade desconcertante e cambiante de identidades possíveis, com as quais poderíamos nos relacionar temporariamente. Esse deslocamento afina-se com o ‘mobilismo universal’. Os pontos críticos da volatilidade das identidades do sujeito contemporâneo podem ser identificados no discurso da publicidade, do cinema, entre outros. É evidente a preocupação da publicidade em atingir numerosos nichos de mercado, ao afirmar que seus produtos se prestam a variados tipos de personalidade e estilos de vida. Em anúncio de televisão do shopping ‘Conjunto Nacional’, de Brasília, há personagens com diferentes tipos de perfil; no do Banco ‘HSBC’, um único ator passa por metamorfoses-relâmpago, representando uma pessoa que assume diferentes estilos, para a qual é ‘o melhor banco’. O jingle do Banco ‘Itaú’ refere-se a tipos-ideais ‘modernos, apressados, práticos, urbanos’, de aparência não-convencional, praticante de esportes radicais, funcionária de repartição, apresentando-se como o banco ideal para todos eles, sob sugestivo lema ‘quem tem que ser careta é o seu banco e não você’. É nítida a intenção da propaganda de atingir os mais diferentes estilos e não somente um.

O esforço dedicado à construção da identidade não envolve somente a aquisição e consumo de bens e serviços, mas atinge hoje a fronteira mais emblemática do sujeito, em seu envelope material que o separa do mundo, ou seja, o próprio corpo e sua pele. A necessidade radical de se constituir enquanto indivíduo levou à idéia de que o corpo não deva mais ser aceito como sina, como uma mera bagagem física que acompanha o self, de modo que, cada vez mais, tenhamos de decidir não somente quem somos e como agimos, mas como parecemos para o mundo, como construimos nossos corpos. A anorexia, a bulimia e outras patologias alimentares, freqüentes no ‘mundo rico’ estão começando a aparecer nas sociedades dos países em desenvolvimento. Giddens observou que ‘o crescimento dos distúrbios alimentares é um índice negativo do avanço desses desenvolvimentos no âmbito da vida cotidiana’. (Giddens,1996: 98).

Fotos: Grão Imagem - Alexandre Herchcovitch/Feminino - SPFW Primavera/Verão 2009/2010.

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Esses distúrbios sinalizam as dificuldades engendradas pela imposição de uma construção ativa da identidade e da forma do corpo. A insatisfação gerada pela dificuldade de alcançar os padrões de beleza vigentes é, em grande parte, socialmente construída. Não é por acaso que tantos filmes venham trazendo o assunto e personagens com distúrbios da imagem corporal. Já na década de 1980, o canadense ‘O Declínio do Império Americano(1) apresentava o nascente culto ao corpo com diálogos durante a prática de atividades numa academia. Os personagens perseguem ansiosamente a felicidade e a realização pessoal num mundo individualista e que, segundo a personagem da escritora, já apresentava sinais de decadência. Ela queixa-se de ter nascido numa época errada, pois ‘antes não era preciso ser tão magra’.

direções e engendram novos segmentos sociais e nichos de mercado. Tanto nas escolhas cotidianas mais banais quanto nas opções que envolvem a criação artística, a reflexão pode ser uma poderosa arma a fim de encontrar o que realmente faz sentido para cada um, na busca de brechas para a tão desgastada, porém tão desejada, noção de ‘originalidade’.

Em ‘Elefante’ (2003) - roteiro baseado na tragédia da escola de Columbine - três adolescentes apresentavam bulimia: além de contarem calorias durante as refeições, logo em seguida, iam ao banheiro provocar vômito, cada uma trancada em sua ‘privada’. Em ‘minha vida sem mim’ (2003), uma personagem é uma comedora compulsiva, insatisfeita com sua silhueta, em eterna dieta. Uma garçonete afirma que, se enriquecesse subitamente, iria a um cirurgião pedir que a deixasse idêntica à pop-star de uma foto. Em ‘Como tudo na vida’ (2003), de Wood Allen, uma personagem magra considera-se gorda. Em ‘Beleza Americana’ (1999), uma moça caricaturalmente vulgar e vaidosa, bonita e insegura, repete seu pior receio: ‘não existe nada pior no mundo do que ser comum’.

Referencias Bibliográficas

O que esses personagens possuem em comum é a busca ansiosa pela construção de uma identidade com a qual se satisfaçam, que lhes ‘sirva’, lhes ‘caia bem’. Não é por acaso que, no idioma inglês, o verbo fit se presta tanto a esta adequação quanto à boa-forma do corpo. A dinâmica contemporânea da construção do self possui elementos de continuidade e de ruptura com o advento do individualismo, ocorrido há mais de três séculos, ao mesmo tempo em que o leva às últimas conseqüências.

Notas: (1) - Este e os demais filmes mencionados são disponíveis em videolocadoras.

- Corbin, Alain. In Áries, Philippe. Duby, Georges. História da Vida Privada. Da Revolução Francesa à Segunda Guerra. São Paulo: Companhia Das Letras, 1995. - Giddens, Anthony. As conseqüências da modernidade. O futuro da política radical. São Paulo: UNESP, 1996. - Hall, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: D & P Editora, 1997. - Peres, Marta Simões. Corpos em Obras. Tese de Doutorado. Departamento de Sociologia. Brasília: Universidade de Brasília, 2005.

Se recordarmos, porém, que tocar num extremo pode acabar engendrando seu oposto, há quem enxergue na radicalização do indivíduo o prenúncio de sua própria dissolução. Autores divergem acerca do assunto, defendendo sua permanência, e negando o individualismo, considerando-o uma noção ultrapassada. No complexo universo da existência humana, convivem elementos muitas vezes díspares, os quais, para efeito de estudo, o cientista social busca distinguir, sem perder de vista que eles não se encontram claramente separados na realidade. Essas passagens demonstram que a hiper-modernidade assiste a um complexo fenômeno de relação entre subjetividades individuais e sociedade. De um lado, uma pressão no sentido da massificação e, do ponto de vista individual, a necessidade de possuir um ‘estilo próprio’ e de se afirmar enquanto ‘único’. O mercado se sofistica para captar cada vez mais as diferentes preferências do público, convencendo os consumidores de que são ‘especiais’. A velha imagem ‘nadar.contra a corrente por ser diferente’ não dá conta desta dinâmica, já que numerosas correntes não-hegemônicas apontam para múltiplas

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Fotos: Anderson de Souza - Coven - Fashion Rio - Primavera/Verão 2009/2010.


O SEXO Por Mário Gordilho

Em todas as suas formas... Homem como homem, Homem com mulher, Homem com mulheres, Homens com mulher, Homens com mulheres, Homem como mulher, Homem com homem, Homem com homens, Homem com objeto, Homem como objeto, Homem com animal, Homem como animal... O sexo é individual! Em todas as suas formas... Mulher como mulher, Mulher com homem, Mulher com homens, Mulheres com homem, Mulheres com homens, Mulher como homem, Mulher com mulher, Mulher com mulheres, Mulher com objeto, Mulher como objeto, Mulher com animal, Mulher como animal... O sexo é irracional! Pleno, embora quimérico, É o sexo simulado, Consciente ou inconsciente, Independente Da companhia ou situação. É o que nos conduz A um profundo e solitário Êxtase...

Se assim não o fosse O que seriam dos feios Ao desejarem os belos? O que seriam dos belos Ao desejarem os feios? O que seriam dos anônimos Ao desejarem os famosos? O que seriam dos famosos Ao desejarem os anônimos? O que seriam dos excêntricos Ao desejarem o estranho? O que seriam dos humanos Ao desejarem os fantasmas? O pudor excessivo, A discriminação ou o preconceito, Dificultam reais satisfações. Sublime é a harmônica interação Entre o sexo real e o imaginário. O que é raro! Mas, na nossa mente impenetrável, Extremamente criativa, É sempre possível Qualquer forma de prazer humano... 113 - Informe C3



Fotos: Gr達o Imagem - 2nd Floor - SPFW Primavera/Ver達o 2009/2010.



C3

Processo

Grupo de Pesquisa

Revista Virtual

Informe C3

Corpo - Cultura - Artes - Moda

O “Processo C3 Grupo de Pesquisa” busca investigar os processos de construção do Corpo em diferentes contextos Culturais, relacionando com os discursos e práticas da Contemporaneidade. Tendo as artes, Moda e questões socioculturais como focos para tentar esclarecer e fortalecer interrogações.

Colabore

Colabora - envie sua opiniã, dúvidas, questionamentos, idéias... Esteja mais próximo de nós, mesmo que através de uma mensagem por email. wag_ferraz@hotmail.com

Anderson de Souza Pesquisador anderson_design4@yahoo. com.br (51) 9231 5595

Francine Pressi - Pesquisadora culturaderua_@msn.com (51) 8457 3757

Wagner Ferraz - Pesquisador e Diretor wag_ferraz@hotmail.com (51) 9306 0982 www.processoc3.com

www.processoc3.com 117 - Informe C3


Quem é quem?

Processo C3 Grupo de Pesquisa

O Processo C3 surgiu da união de três jovens* pesquisadores para produzir um trabalho coreográfico de linguagem contemporânea – “Campanha de prevenção ao câncer de próstata” - para o Cri-Ação Dança (evento realizado pelos estudantes da Graduação em Dança da Universidade Luterana do Brasil, ULBRA-Canoas/RS). Também ligados por “bolsas” oferecidas pelo CEC Terpsí da Cia Terpsí Teatro de Dança de Porto Alegre, onde participavam de oficinas de Ballet Clássico, Alongamento, Dança Contemporânea e Processo Criativo, os três estudantes resolveram “legitimar” a união e formar o presente grupo de pesquisa com a intenção de dividir suas buscas e dúvidas. Dessa forma surgiu o grupo de pesquisa Processo C3, que apresenta os processos pelos quais os participantes/fundadores têm passado, na busca por compreender os processos que constroem o CORPO em diferentes CULTURAS relacionando sempre com a CONTEMPORANEIDADE. Hoje o Processo C3 conta com colaboradores no Informe C3 que se empenham para que este veículo posso existir. O “Processo C3 Grupo de Pesquisa” busca investigar os processos de construção do Corpo em diferentes contextos Culturais, relacionando com os discursos e práticas da Contemporaneidade. Tendo as artes, Moda e questões socioculturais como focos para tentar esclarecer e fortalecer interrogações. *Anderson de Souza, Francine Pressi e Wagner Ferraz

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Currículos Processo C3 Anderson Luiz de Souza - Brasil/RS/Canoas

Bacharel em Moda pelo Centro Universitário de Maringá - CESUMAR. É aluno da Especialização em Arte Contemporânea e Ensino da Arte na Universidade Luterana do Brasil - ULBRA. Atualmente é Docente no SENAC Moda e Beleza / Canoas-RS no Curso Técnico em Moda e em cursos livres atuando nas áreas de história da moda, desenho e criação, pesquisa em moda e cultura, técnicas de vitrinismo e produção de moda. Pesquisador do grupo de pesquisa Processo C3, idealizador e responsável pelo site www.ferrazdesouza.com que busca disponibilizar informações relativas aos estudos sobre o corpo e cultura (dança, moda, artes, entrevistas, cinema, exposições, eventos...). Como bailarino de dança contemporânea atuou em vários espetáculos, performances, festivais e mostras de dança. Artista Plástico integrante do Grupo/Projeto Arquivo Temporário (grupo de artistas que buscam através de suas obras chamar a atenção para prédios históricos e espaços culturais de pouca visitação). Ministra palestras sobre : A relação Moda e Figurino, Inspirações e Tendências de Moda, Vitrinismo construindo cenas. Além de trabalhar como assistente de fotografia, estilista, figurinista, ilustrador de Moda e designer gráfico. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq. br/7662816443281769 .

Francine Cristina Pressi - Brasil/RS/São Leopoldo

Graduada como Tecnóloga em Dança pela Universidade Luterana do Brasil - ULBRA em 2008, foi agraciada por mérito acadêmico ao obter melhor média durante o curso de Tecnologia em Dança. Hoje está cursando Licenciatura em Dança pela ULBRA. É bailarina, professora, coreógrafa e pesquisadora em dança com ênfase em linguagens contemporâneas. Desenvolve trabalhos artísticos como bailarina desde 2003, participando de várias performances, espetáculos, festivais e mostras de dança, atuando em companhias de dança como a Cia. Corpo Alma, Cia. Hackers Crew, e colaborando como bailarina/interprete de dois estudos coreográficos orientados por Carlota Albuquerque e dirigidos por Wagner Ferraz (O Jogo) e Raul Voges (Provisório – Processo I). Hoje atua também na área de pesquisa em dança, abordando temas como dança, corpo, moda, cultura e contemporaneidade dentro do grupo de pesquisa Processo C3 dirigido por Wagner Ferraz.. Endereço para acessar este CV: http:// lattes.cnpq.br/8890297538503375.

Wagner Ferraz - Brasil/RS/Canoas

Graduado em Dança pela ULBRA, cursa Especialização em Educação Especial e em Gestão Cultural. Bailarino, coreógrafo, professor de dança e pesquisador em dança com ênfase em linguagens contemporâneas, tem como foco investigar a relação corpo e cultura. Já dirigiu coreografou e atuou em vários espetáculos, performances, festivais e mostras de dança. Integrou o elenco da Cia Terpsí Teatro de Dança (2006/2007). Atualmente também ministra aulas e oficinas de dança, processo criativo em dança, dança contemporânea e expressão corporal no ensino regular e no ensino especial com pessoas com deficiência física, mental, auditiva e visual, além de outras síndromes. Diretor e pesquisador do grupo de pesquisa Processo C3, idealizador e responsável pelo site www.ferrazdesouza.com e Informativo FdeS onde busca disponibilizar informações relativas aos estudos sobre o corpo e cultura (dança, moda, artes, entrevistas, cinema, exposições, eventos...). Desenvolve trabalhos como assistente de fotografia e webdesigner. Ministra palestras sobre : Processo Criativo, Expressão Corporal e Adaptações para pessoas com deficiência, Dança e Adaptações para pessoas com deficiência, Corpo e Território, Modificações Corporais, Construção Social da Beleza e da Feiúra, Construção Socail de Corpo e Realções entre Corpo e Moda. Atua principalmente nos seguintes temas: dança, criação, coreografia, performance, corpo, corpo-moda, cultura e pesquisa. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/7662816443281769 .

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Colaboradores Sayonara Pereira - Campinas/SP/Brasil

Doutora em Artes pela UNICAMP-SP, e professora colaboradora na mesma Universidade Bailarina, coreógrafa, pesquisadora, pedagoga em dança licenciada pela Hochschule Für Musik Köln – Alemanha. Convidada pela bailarina e coreógrafa alemã Susanne Linke estudou na Folkwang Hochschule(1985), escola dirigida por Pina Bausch, localizada em Essen - Alemanha, cidade onde também viveu e atuou profissionalmente entre (1985-2004). Email:sayopessen@gmail.com

Luciane Coccaro - Rio de Janeiro/Porto Alegre/Brasil

Mestre em Antropologia Social/UFRGS; Bacharel em Ciências Sociais/UFRGS; Professora Assistente do curso de Bacharelado em Dança – Departamento de Arte Corporal – UFRJ; Foi Professora Adjunta do Curso de Graduação Tecnológica de Dança/ULBRA; Foi Professora Adjunta da Faculdade Decision de Administração de Empresa/FGV; Foi Professora do Curso de Pós-Graduação em Enfermagem/IAHCS; Bailarina – Prêmio Açorianos 2000; Atriz – Prêmio Volkswagen 2003; Coreógrafa de dança contemporânea; Diretora da Cia LuCoc e do Grupo Experimental de Dança da ULBRA – de 2006 até 2008; Diretora e intérprete do Espetáculo Estados Corpóreos em 2009.

Paulo Duarte - Portugal/ Coimbra

Jesuíta. Licenciado em Filosofia, pela Faculdade de Filosofia de Braga – Universidade Católica Portuguesa. Professor de Religião e bailarino. Tem como interesse de estudos a relação entre o corpo/dança e a espiritualidade. Já actuou em espectáculos de dança contemporânea e em performances.

Nízia Villaça - Rio de Janeiro/Brasil

Possui graduação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1962), mestrado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1974), doutorado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1982) e pós-doutorado em Atropologia Cultural, Paris V - Sorbonne (1985). É professora titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tem experiência na área de Comunicação, atuando principalmente nos seguintes temas: epistemologia da comunicação, corpo, moda, antropologia do consumo e artes, no contexto sulamericano e global. Já publicou vários livros e é pesquisadora do núcleo de pesquisa ETHOS – Comunicação, Comportamento e Estratégias Corporais. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq - Nível 1C. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/4141738725910147

Kássia Simões Garcia - São Paulo/Brasil

Bacharel em Moda, Universidade Veiga de Almeida- RJ Pós Graduação “Latu Sensu”em Moda e Criação, Faculdade Santa Marcelina- SP Mestrado (Stricto Sensu) em Moda Cultura e Arte, SENAC- SP.

Daiane Oliveira da Silva - Canoas/RS/Brasil

Formada no ens.médio, curso profissionalizante de Administração e no curso de novo método de ensino da Lingua Portuguesa no IPUC. Participou do curso e grupo de teatro aberto pela prefeitura de Canoas, que tinha como objeto levar o teatro para as escolas.Cursando Técnico em Moda no SENAC / Canoas e cursando Ballet Clássico. Atuou, na modalidade Street Dance, em dois espetáculos através do Espaço Cultural Art e Dança. Também cursando Língua Inglesa.

120 - Informe C3


priscilladavanzo - São Paulo/Brasil

Formada em Artes Plásticas pelo Instituto de Artes da UNESP onde defendeu o mestrado com a pesquisa “ corpo obsoleto: projetos artísticos para uma nova concepção do corpo humano” [2006]. Curadora do projeto [In.CoRpo.Ro] juntamente com Monica Rizzolli, que organiza mostras, colóquios e oficinas relacionadas a performances e ações corporais. Na sua produção trabalha com diferentes técnicas e linguagens sempre tendo em foco o corpo humano. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/6098104817118235

Rodrigo Monteiro - Porto Alegre/RS/Brasil

Licenciado em Letras, atuando profissionalmente como professor de Língua Portuguesa, Língua Inglesa e Literatura. Leciona desde 1997, quando concluinte do Curso de Magistério. É Bacharel em Comunicação Social - Habilitação Realização Audiovisual, com especialidade em Direção de Arte e em Roteiro. Foi aprovado em primeiro lugar no processo de seleção 2009 para o Mestrado em Artes Cênicas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Escreve dramaturgia desde 2000. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq. br/7379695337614127

T. Angel - São Paulo/Brasil

Técnico em moda pelo SENAC e graduando em História pela Universidade FIEO, atualmente integra o staff do site argentino Piel Magazine e é diretor geral do website Frrrk Guys, que aborda as temáticas da modificação corporal e da beleza masculina oriunda dessa prática. Além disso, desde 2005 vem atuando no cenário da performance art. Nos últimos anos, Thiago Ricardo Soares vem colaborando com artigos para diversas revistas nacionais e internacionais. Tem experiência na área de História, atuando principalmente nos seguintes temas: body art, performance e modificação corporal. Como pesquisador histórico, interessa-se pelos seguintes temas: body art, performance e modificação corporal. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/2319714073115866

Mário Gordilho - Vila Velha/ES/Brasil

Pós-Graduação em Engenharia de Produção (Industrial) – Fundação Ciciliano Abel de Almeida/UFES, Vitória - ES. Graduação em Engenharia Civil - UFBA, Salvador - BA. Auditor Fiscal da Receita Estadual do ES – Secretaria da Fazenda do ES, Vitória - ES (concursado como portador de deficiência, e em exercício). Atuante como Engenheiro Civil (cedido pelo DF) no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 17ª Região, Vitória – ES. Auditor Fiscal da Receita do Distrito Federal – Secretaria da Fazenda do Distrito Federal, Brasília – DF (concursado como portador de deficiência). Atuante como Engenheiro Civil em áreas de projetos, orçamentos, fiscalização e manutenção de Obras Civis, como Engenheiro da Seção de Projetos e Obras do Serviço Social da Indústria – Federação das Indústrias do ES (FINDES), Vitória - ES. Atuante como Engenheiro Civil em áreas de projetos de estruturas metálicas, com cálculos e desenhos em CAD, como Engenheiro - Enpro Engenharia e Projetos Ltda., Salvador - BA. 1987. Atuante como Auxiliar Técnico em acompanhamento de montagem de estruturas metálicas– Metalúrgica São Carlos Ltda., Salvador - BA. Autor de alguns artigos, textos,e resenhas publicados no jornal Bahia Hoje, de Salvador-BA, além de jornal virtual da Intranet do TRT 17ª Região; e da gazeta online, ambos em Vitória-ES. Autor dos blogs: http://elencobrasileiro. blogspot.com e http://elencoestrangeiro.blogspot.com

Marta Peres - Rio de Janeiro/Brasil

Professora Adjunta do Departamento de Arte Corporal EEFD-UFRJ, Doutora em Sociologia (UnB) com Pós Douturado em Antropologia, fisioterapeuta e bailarina. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/5570019500701293.

121 - Informe C3



Fotos: Gr達o Imagem - 2nd Floor - SPFW Primavera/Ver達o 2009/2010.


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