Livro como identificar oportunidades de negócios

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COMO IDENTIFICAR OPORTUNIDADES DE NEGÓCIOS

Maria Carolina Zanette


APRESENTAÇÃO Como Identificar Oportunidades de Negócios O lançamento de novos produtos e serviços pelas empresas - assim como a emergência de novos empreendimentos - depende de que oportunidades sejam identificadas e entendidas da melhor forma possível. Nessas oportunidades de negócio, encontram-se janelas para se transformar o mercado e para que a economia se desenvolva. Contudo, a complexidade e o ritmo veloz da sociedade contemporânea dificultam a compreensão sobre o ambiente das empresas, fazendo com que as percepções rapidamente percam a sua validade. Nesse contexto, é preciso conhecer as principais ferramentas usados pelo marketing e ter familiaridade com mudanças mais importantes no comportamento dos consumidores. Com tais necessidades em mente, esta disciplina tem os seguintes objetivos: • Apresentar as práticas adotadas em marketing para a compreensão do mercado e identificação de oportunidades. • Delinear as tendências recentes sobre a evolução dos mercados e da tecnologia. Para cumprir tais finalidades, começa-se na Unidade 1 apresentando o contexto o marketing hoje se insere: discute-se o papel dos mercados emergentes, da internet e o poder conquistado pelos consumidores. Tendo esse panorama ao fundo, é preciso fazer um esforço de coleta de dados do mercado, tema da Unidade 2, seguido de um processo de análise para transformar esses dados em informações (Unidade 3). De posse de informações e conhecimento do mercado, é preciso direcionar a criação de valor (Unidade 4) e, especialmente, reconhecer os segmentos de clientes que se queria atingir (Unidade 5). Para que o cliente se decida na prática pelo valor criado pela empresa, deve-se entender o processo de compra (Unidade 6). Por fim, são tratados alguns tópicos especiais: a função do marketing boca-a-boca e das redes sociais (Unidade 7) e, de forma geral, o impacto da mudança tecnológica (Unidade 8). Bons Estudos!



UNIDADE 1 O mundo novo que o marketing enfrenta As relações entre empresas e consumidores dependem do cenário e do contexto no qual ambos estão inseridos. Um negócio não prospera sem saber quem é seu público alvo ou quais as condições econômicas e sociais nas quais esse público alvo vive. Dessa forma, para antever oportunidades de negócios e fazer a melhor aposta, é importante fazer uma breve descrição dos novos cenários em que os gestores atuam e atuarão no futuro. Serão apresentadas aqui algumas das novas tendências que se configuram essenciais para a compreensão do mercado consumidor mundial e nacional. São elas: (1) mercados emergentes (2) a mudança no paradigma da comunicação entre os consumidores e (3) o poder do novo consumidor e a co-criação;

Objetivos da sua aprendizagem • Entender a importância dos mercados emergentes; • Apresentar a internet como um novo elemento na comunicação entre empresas e consumidores; e • Mostrar que os consumidores estão assumindo um novo papel no mercado, de poder e criação.

1.1  Mercados emergentes Mercados emergentes são aqueles considerados em desenvolvimento. Há uma década, muitos dos países considerados atualmente emergentes eram pouco atrativos para as empresas. Em 2001, no entanto, o chefe de pesquisa em economia global da instituição financeira Goldman Sachs cunhou o termo BRIC (um trocadilho com a palavra brick em inglês, que significa tijolo) para representar mercados que seriam promissores no futuro. A sigla BRIC representa os países Brasil, Rússia, Índia


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e China. Posteriormente a África do Sul foi adicionada à lista em 2011, formando então os BRICS (S de South Africa). Segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) os BRICS atualmente representam 43% da população mundial e vêm exibindo taxas de crescimento acima da média dos países de economias consideradas desenvolvidas. Enquanto a projeção para as economias emergentes indica um crescimento econômico de 5% em 2013, a projeção para os países desenvolvidos é de 1,3%. No entanto, a maioria da população nesses países continua a ter uma renda disponível considerada baixa. O rendimento médio mensal do brasileiro, por exemplo, foi de R$ 1.863,65 no primeiro trimestre de 2013. Contudo, a renda mais baixa dos países emergentes pode representar uma oportunidade para as empresas. Em 2004, o autor C.K. Prahalad lançou o livro “A Riqueza na Base da Pirâmide”, no qual ele argumenta que, embora os consumidores dos países emergentes tenham individualmente uma renda pequena, em seu agregado, eles formam um mercado poderoso que, se bem explorado, pode ser também muito lucrativo. Um dos exemplos usados pelo autor foi o da loja de eletrodomésticos brasileira Casas Bahia, que, ao oferecer produtos para serem comprados com o desembolso de pequenas parcelas propiciou o acesso a produtos eletrônicos aos consumidores sem que isso lhes pesasse muito nos bolsos. Em 2005 o Maganize Luiza virou caso da Harvard Business School. O interesse da mais famosa universidade de negócios do mundo na empresa aconteceu pelo seu sucesso com a classe média emergente do Brasil, também chamados de consumidores da base da pirâmide. Para alcançar esses consumidores, a empresa apostou em uma estratégia financeira de confiança em seus clientes, dando crédito mesmo àqueles que não possuíam renda formal. Para diminuir seus custos ao acessar esses clientes em comunidades afastadas, investiu em lojas onde a escolha dos produtos era feita de modo virtual, por meio de terminais eletrônicos. E para fazer os consumidores comprarem mais e tornaremse fiéis ao negócio, ligou a cobrança à presença física do cliente na loja. Atualmente, o Magazine Luiza tem quase 750 lojas espalhadas por todo o país e um faturamento de mais de 9 bilhões de reais. O caso do Magazine Luiza ilustra a ideia de Prahalad: mercados emergentes representam grandes oportunidades. Ficar de olho na nova classe média é fundamental para quem busca novas oportunidades no mercado. 2


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1.2  A mudança no paradigma da comunicação entre os consumidores Além de mudanças na configuração da economia mundial, o gestor hoje se defronta com algo relativamente novo: a comunicação horizontal entre os consumidores. Se fosse possível construir uma máquina do tempo e trazer um gestor de marketing da década de 70 aos tempos atuais, ele provavelmente teria de buscar uma outra área de atuação. Naquela época, as empresa se comunicavam por meio da mídia de massa: basicamente jornais, revistas, televisão e rádio. Quem definia o que era bom eram os jornalistas e colunistas que atuavam nesses meios de comunicação e os consumidores pediam dicas geralmente a outros consumidores que habitavam na mesma comunidade. Líderes de opinião eram vizinhos ou presidentes de clubes, geralmente mais informados que a média de comunidade, a quem os outros recorriam quando queria saber de um produto (KATZ; LAZARSFELD, 1955). Nas décadas de 80 e 90, o mercado de mídia começou a se diversificar: revistas passaram a ser cada vez mais especializadas – como, por exemplo, revistas voltadas à prática de corrida, culinária ou ao público homossexual e surgiram canais pagos na televisão abordando assuntos tão distintos como música e vida animal. Mas foi nos anos 2000 que a verdadeira revolução aconteceu: a internet. Com a internet, a informação se democratizou. Se antes da internet e das redes sociais era necessário consultar um guia de cinema de um jornal ou revista para saber a qualidade de um filme ou perguntar para aquele amigo que lia todos esses guias, atualmente basta digitar o nome do filme no Google ou perguntar no Facebook qual a qualidade do mesmo. A resposta virá dos amigos ou surgirá na tela a opinião de um blogueiro especialista, acompanhada dos índices de preferência dos leitores do Internet Movie Database (IMDb). A figura 1, elaborada pelo físico estudioso das ciências sociais Duncan Watts e seu colega Peter Dodds, mostra uma representação gráfica dessa nova forma de comunicação. Na primeira parte, vê-se que é a mídia de massa, simbolizada pelo televisor ao centro, que informa aos consumidores líderes de opinião, os quais passarão a informação ou opinião adiante para pequenos grupos de colegas e conhecidos (ou seja, é um modelo de dois passos). Já na segunda parte, vê-se que a mídia de 3


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massa é apenas parte da conexão entre os consumidores. Ela não sumiu e continua sendo provedora de informações, mas agora os consumidores comunicam-se entre si, independente da distância entre eles, informando e sendo informados por várias outras pessoas.

Figura 1: Modelo de interação entre mídia e consumidores. Fonte: Watts e Dodds, 2007

1.3  O poder do novo consumidor e a co-criação

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Se a conexão entre os consumidores superou barreiras físicas, fazendo a informação correr mais velozmente, o poder do consumidor também aumentou. E esse é um consumidor cada vez mais consciente de seus direitos, mais bem informado e mais ligado em causas sociais e ambientais. Uma propaganda polêmica na era pré-internet possivelmente geraria alguns protestos de consumidores: cartas em jornais e reclamações direcionadas ao Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Contudo, na era dos consumidores conectados e com poder de mobilização, uma marca pode ser forçada a se retratar ao associar algo ofensivo ao seu nome. Em 2012, a marca de preservativos Prudence postou em sua página no Facebook uma tabela que indicava a quantidade de calorias que um casal poderia perder durante uma relação sexual. Um dos itens da tabela dizia que tirar a roupa de uma mulher com o seu consentimento queimaria 10 calorias, enquanto sem este mesmo consentimento, o número de calorias queimadas seria 190. O trecho foi considerado como incitação à violência sexual por vários líderes de opinião das mídias sociais. Após 4


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milhares de protestos, a empresa desculpou-se e comprometeu-se a veicular postagens contra a violência sexual. Os consumidores também têm desejo de ter uma melhor experiência de consumo de produtos e serviços e estão cada vez mais propensos a colaborar com as empresas para obter essas experiências. Os consumidores atualmente co-criam sua satisfação com empresas, ou seja, o que vale é menos o produto e mais a experiência (PRAHALAD; RAMASWAMY, 2004). Um consumidor, em um bar, não leva em conta apenas a cerveja, a música ou o atendimento. Ele leva em conta todo um contexto que vai desde a interação com o garçom até a qualidade da comida. E os consumidores estão dispostos a colaborar com as empresas para melhorar suas experiências com o produto, como quando um cliente pede um prato especial para o cozinheiro do bar e esse acaba entrando permanentemente no cardápio. Hatch e Schultz (2010) mostram um exemplo: fundado em 1932, o grupo Lego lançou suas famosas peças de plástico que se encaixam uma na outra apenas em 1957. Depois de um sucesso estrondoso e de uma crise no início dos anos 2000 devido à excessiva diversificação de produtos, em 2004 a empresa começou a tomar novos rumos. Ao longo de sua história, a empresa angariou fãs de todas as idades e decidiu abrir-se para esses fãs na era da internet. A marca passou a estar oficialmente presente dialogando com membros das comunidades de marca da Lego na internet, e gestores de alto escalão da empresa passaram a frequentar eventos promovidos pelos fãs adultos do brinquedo. Ao dialogar com os fãs, a empresa teve acesso a inovações criadas e sugeridas por eles, o que levou a grandes melhorias e também a algumas adaptações menores em seus produtos. Hoje, fãs da empresa que se reúnem em comunidades de marca podem inclusive passar um tempo na fábrica, na Dinamarca, trabalhando em inovações para os produtos Lego. São os embaixadores Lego. Para a estratégia dar certo, contudo, diálogo e transparência são necessários. A experiência para o consumidor precisa ser tão gratificante quanto é oportuna para a empresa.

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Referências FREI, F. Magazine Luiza: Building a Retail Model of “Courting the Poor”. Harvard Business School. 2006. HATCH, M. J.; SCHULTZ, M.. Toward a theory of brand co-creation with implications for brand governance. Journal of Brand Management, v. 17, n. 8, p. 590-604, 2010. IMF. World Economic Outlook Database. Disponível em: http://www. imf.org/external/pubs/ft/weo/2013/01/weodata/index.aspx. KATZ, E.; LAZARSFELD, P. F. Personal Influence: The Part Played by People in the Flow of Mass Communications (2° ed.). New Brunswick: Transaction Publishers, 1955. PRAHALAD, C. K. A riqueza na base da pirâmide. Artmed, 2008. PRAHALAD, C. K.; RAMASWAMY, V.. Co-creating unique value with customers. Strategy & Leadership, v. 32, n. 3, p. 4-9, 2004.

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WATTS, D. J.; DODDS, P. S. Influentials, Networks and Public Opinion Formation Journal of Consumer Research, v. 34, n. 4, p.441-458. 2007.

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UNIDADE 2 Os dados sobre o seu mercado Em um mundo onde o consumidor tem cada vez mais poder, onde as empresas têm de lidar com novos canais de comunicação diferentes da mídia de massa à qual elas estavam acostumadas, onde boatos se espalham na velocidade da banda larga e onde mercados emergentes vêm crescendo e tomando seu lugar ao sol na geopolítica mundial, informação é fundamental. Informação, mais do que nunca, é poder. Para coletar as informações necessárias para a compreensão do mercado no qual a empresa atua e o comportamento dos consumidores que ela quer atingir, os gestores utilizam-se de pesquisas de marketing. Para uma das maiores autoridades no assunto, Naresk Malhotra, a pesquisa de mercado é o que liga o consumidor ao gestor, criando e avaliando oportunidades para definir e avaliar as estratégias empresariais, seja em produtos, preços, distribuição, seja em comunicação. A pesquisa de marketing faz parte do Sistema de Informações de Marketing (SIM) de uma empresa, unidade responsável por abastecer e organizar as informações internas e externas de uma organização. O processo de pesquisa pode ser majoritariamente divido em três partes: definição dos objetivos da pesquisa, coleta e análise. A definição dos objetivos é a parte mais relevante do processo: sem objetivos claros e precisos que se quer descobrir, a pesquisa torna-se inócua e fornece dados que podem levar a uma decisão equivocada por parte do gestor. A coleta, parte que será aprofundada nesta unidade, é quando os dados são levantados a partir de fontes disponíveis no ambiente de mercado. A análise é o procedimento responsável por transformar esses dados em informações, ou seja, processá-los para que sejam úteis aos tomadores de decisão. Nesta unidade, serão apresentadas formas de coletar dados sobre os consumidores e seu comportamento. Tais dados podem ser coletados em fontes diversas e de maneiras distintas. Serão apresentadas aqui as seguintes sessões: (1) tipos de fontes de dados; (2) coleta de dados qualitativos e quantitativos e (3) novas tendências em pesquisa de mercado.


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Objetivos da unidade • Introduzir o conceito de pesquisa de mercado; • Apresentar as diferentes fontes de dados possíveis; • Explicar como a coleta dos dados pode ser feita; • Mostrar novas tendências na pesquisa de mercado.

2.1  Tipos de fontes de dados

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O gestor de uma famosa pizzaria em São Paulo decide que está na hora de expandir seus horizontes e abrir uma filial no interior. Mas qual cidade escolher? Uma famosa marca de roupas deseja expandir sua marca para o setor de decoração interior. Como saber se essa é uma boa ideia? Um gabaritado pesquisador da indústria farmacêutica deseja usar suas descobertas científicas para a criação de um novo cosmético. Será que o que é aplicado na saúde pode ser aplicado à estética? Esses são problemas que geralmente podem ser resolvidos por meio da consulta de dados secundários. Dados secundários são relatórios, livros, pesquisas já prontas ou painéis de dados que já foram coletados, não necessariamente visando responder às questões específicas dos gestores. No caso do gestor da pizzaria, ele poderia olhar dados sobre renda e população de várias cidades do interior de São Paulo disponíveis no site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), coletadas no Censo oficial de 2010. No caso da marca de roupas, relatórios da Empresa Brasi¬leira de Estudos de Patrimônio (EMBRAESP) sobre o mercado imobiliário podem indicar se esse está suficientemente aquecido para o investimento em uma empresa de objetos de decoração. Por fim, o pesquisador pode consultar revistas científicas da área farmacêutica para entender quais compostos químicos podem ser usados na fabricação de cosméticos. Fontes de dados secundários podem estar disponíveis gratuitamente - sites governamentais, relatórios de associações, relatórios setoriais disponíveis pelo Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) - ou podem ser pagos, como no caso dos relatórios da EMBRAESP ou de painéis prontos de empresas de pesquisa de mercado. A Figura 1 mostra as possíveis fontes de dados secundários às quais uma empresa pode recorrer. 2


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Fontes de dados secundários Publicações Gerais Governamentais Institucionais

Governos Federal Estaduais Municipais Autarquias

Instituições Universidades Faculdades Centros de pesquisa Sindicatos (patronais e de empregados) Federações (patronais e de empregados) Associações (patronais e de empregados)

Serviços padronizados Do varejo Do atacado Da indústria Dos meios de comunicação

Figura 1: Fontes de dados secundários.

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Fonte: Najib Mattar (2007)

No entanto, existem perguntas que precisam de informações específicas dos clientes (atuais ou potenciais) para serem respondidas. Qual a satisfação dos clientes de uma empresa aérea? Quanto o consumidor pagaria por uma inovação em um tablet. Como uma nova tecnologia na tela? Qual a melhor forma de comunicar um novo sistema de segurança em um carro? Para responder a essas questões, precisamos da interação com o consumidor. Quando os dados são coletados a partir de perguntas ao cliente ou de observação de seu comportamento, estes são chamados dados primários. A empresa aérea pode, por exemplo, primeiro conversar com alguns consumidores para entender quais os pontos críticos de sua experiência (entrevistas em profundidade) de voo e depois distribuir questionários para seus passageiros perguntando sobre sua satisfação (o chamado survey). O fabricante de tablets pode mostrar diversos aparelhos com funções e preços distintos e pedir para que o consumidor hipoteticamente escolha qual compraria (ou seja, um experimento). A montadora de carros pode contratar um pesquisador para observar famílias em passeios de carro por um tempo para entender a importância da segurança durante o processo de dirigir e passar esse sentimento à agência de propaganda que trabalhará a mensagem (uma etnografia). 3


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Na próxima sessão, serão discutidas as principais formas de coleta de dados primários.

2.2  Coleta de dados qualitativos e quantitativos

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Os dados primários podem ser divididos em qualitativos e quantitativos. Dados qualitativos são aqueles coletados de maneira pouco estruturada e com amostras pequenas. Incluem principalmente entrevistas a grupos de foco, entrevistas em profundidade e etnografias, técnicas definidas no quadro 1. Em linhas gerais, dados qualitativos não são conclusivos e não se pode concluir padrões na população ou no setor a partir dos mesmos (MALHOTRA, 2005). Contudo, são ideais para explorar ideias, conceitos e entender o contexto cultural e a visão de mundo dos consumidores. Recentemente, a Xerox realizou uma etnografia com enfermeiros, com foco no detalhes de seu trabalho e nas soluções que eles propunham para selecionar diversos problemas. A partir dos dados coletados nessa pesquisa, a empresa desenvolveu o software Digital Nurse Assistant, que ajuda os enfermeiros em hospitais a controlarem as informações dos pacientes atendidos, economizando o tempo dos enfermeiros e aumentando a eficiência dos atendimentos. Já os dados quantitativos são aqueles que geralmente levam a conclusões estatísticas. A coleta de dados quantitativos é sistemática, e todos os consumidores que respondem a essa pesquisa geralmente são apresentados às mesmas exatas perguntas ou são requisitados a apresentar os mesmos dados. As perguntas geralmente são medidas em escalas, ou seja, atribui-se um número para cada resposta (exemplo: 1 para péssimo e 5 para ótimo). É melhor que haja uma quantidade grande de respondentes para esses questionários e suas respostas são computadas matematicamente. Quando a marca de cereais matinais Kellog´s decidiu lançar uma extensão de marca, ou seja, um novo produto ligado a uma marca já consolidada, do seu famoso cereal Crunchy Nut no Reino Unido, a decisão pelo Crunchy Nut Bites foi tomada pelos próprios consumidores. Após uma geração de ideias de produtos desenvolvida em um grupo de foco, foi realizada uma pesquisa na qual os consumidores classificaram essa ideias. E eles escolheram o Crunchy Nut Bites. Dados primários, apesar de mais custosos que os dados secundários, são uma valiosa ferramenta para a tomada de decisões. 4


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O Quadro 1 mostra as principais técnicas de coleta e suas definições. Formas de obtenção de dados qualitativos Grupos de foco Discussão entre um grupo de pessoas, geralmente entre 6 e 12, conduzida por um moderador e gravadas em vídeo. Sua principal vantagem é a sinergia gerada entre os participantes. Entrevistas em profundidade Entrevistas individuais com clientes, de duração de cerca de uma hora, sem necessariamente ter um conjunto de perguntas específicas, fluindo naturalmente entre entrevistador e entrevistado. Ideal para entender sentimentos dos consumidores em relação a produtos ou serviços. Etnografia Imersão no universo do consumidor. Pode ser na sua casa, no seu local de compra, no seu trabalho, etc. O pesquisador observa o comportamento do cliente e pode também entrevistá-lo. Ideal para entender a relação do consumidor com o produto ou serviço em termos de usos e emoções. Formas de obtenção de dados quantitativos Survey Consiste na aplicação de questionários fechados e estruturados (com escalas) em um grande número de consumidores. A aplicação pode ser feita por meio pessoal, telefone, internet ou correio. Painel Coleta sistemática e contínua de informações diversas. Ideal para acompanhar a evolução de determinado dado. Experimentos O consumidor faz escolhas ou responde a questões em um ambiente e/ou situação controlados, ou seja, sem influências externas ao que se quer descobrir. Quadro 1: Formas de obtenção de dados. Adaptado de Najib Mattar (2007) e Malhotra (2006)

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2.3  Novas tendências em pesquisa de mercado Os dados obtidos pela pesquisa tradicional de mercado são muito úteis à tomada de decisão, como demonstrado. No entanto, novas fontes de dados surgiram com a era digital: as grandes bases de dados e a possibilidade de etnografia online, ou netnografia. Big Data (grandes bases de dados) é a expressão pela qual são chamados os dados agregados no tráfico da web, nos softwares e nos sensores que monitoram entregas, fornecedores e clientes. Empresas como o Google e o Facebook têm como seu foco principal a gestão de dados dos usuários, de forma que as propagandas direcionadas aos consumidores 5


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nesses sites sejam personalizadas de acordo com as características dos mesmos divulgadas na rede. O Wal Mart usa as grandes bases de dados para selecionar produtos para lojas específicas. Os departamentos de polícia dos Estados Unidos usam mapeamentos computadorizados de variáveis como dias de pagamento, eventos esportivos, feriados e dias chuvosos para prever crimes. Ainda que existam preocupações com a privacidade dos indivíduos, o repórter de tecnologia do New York Times, Steve Lohr argumenta: “Parece ser um caminho sem volta. Os dados estão no banco do motorista”. A netnografia, por sua vez, bebe na mesma fonte das grandes bases de dados: a disponibilidade de informações na internet. Mas, ao contrário dos Big Data, que requerem na maioria das vezes análises quantitativas, a netnografia é uma forma de coleta de dados qualitativos. Robert Kozinets, um dos principais especialistas no tema, indica que a ideia da netnografia é uma imersão em comunidades virtuais. É como uma etnografia, mas em vez de acompanhar a rotina das pessoas em um local físico, o pesquisador acompanhará todas as postagens e comentários de uma comunidade virtual. Os dados, sejam qualitativos ou quantitativos, primários ou secundários, virtuais ou físicos, realmente estão no banco do motorista.

Referências BNDES. Disponível em: http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/ bndes_pt. Acesso em? EMBRAESP. Disponível em: http://www.embraesp.com.br/ Acesso em?

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HEALTHBIZDECODED. Xerox’s Innovation Day at PARC Showcases Advances in Healthcare. 2013. Disponível em: http://healthbizdecoded.com/2013/04/xeroxs-innovation-day-at-parc-showcases-advances-in-healthcare/ Acesso em? IBGE. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/ Acesso em?

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KOZINETS, R. V. The field behind the screen: Using netnography for marketing research in online communities. Journal of Marketing Research, v. 39, n. 1, p. 61-72, 2002. LOHR, S. The Age of Big Data. The New York Times. 2012. MALHOTRA, N. K. Pesquisa de marketing: uma orientação aplicada. São Paulo: Bookman, 2006. NAJIB MATTAR, F. Pesquisa de Marketing. São Paulo: Elsevier Inc. 2007.

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NEW products from market research. The Times 100. Disponível em: http://businesscasestudies.co.uk/kelloggs/new-products-frommarket-research/information-gathering-discovery-to-selection. html#axzz2UcztRK5A.

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UNIDADE 3 Transformando dados em informações A pesquisa de mercado é uma ferramenta utilizada para abastecer o sistema de informações de marketing (SIM) com informações detalhadas para que os gestores possam criar a avaliar estratégias referentes a produtos, preço comunicação e distribuição (MALHOTRA, 2006). Para tanto, são usados dados primários (obtidos diretamente com o consumidor ou o mercado) e/ou secundários (obtidos de fontes terceiras cuja coleta não se refere ao objetivo final da pesquisa). Entre os dados primários existem aqueles de natureza qualitativa (dados coletados de maneira pouca estruturada) ou quantitativos (coletados de maneira estruturada e passíveis de matematização). Nesta sessão, serão mostradas formas pelas quais os dados se transformam em informações úteis para os gestores tomarem decisões acertadas para sua empresa. As sessões apresentadas nesta unidade são: (1) tipos de pesquisa de mercado; (2) notas sobre análise de dados.

Objetivos da sua aprendizagem • Ressaltar a importância dos objetivos da pesquisa de mercado; • Diferenciar pesquisas exploratórias e conclusivas; • Dar noções básicas de análise de dados quantitativa.


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3.1  Tipos de pesquisa de mercado Para uma pesquisa de mercado ser bem sucedida, a principal tarefa do gestor é ter um objetivo bem definido. Um objetivo bem definido significa fazer a pergunta certa. Objetivos por demais abrangentes podem deixar uma pesquisa sem foco. Objetivos específicos demais podem ser uma perda de dinheiro para a empresa, dado que pesquisas de mercado tendem a ser custosas. Um gestor que faz a pergunta “por que meu produto não é tão vendido quanto o do meu concorrente?” provavelmente terá resultados óbvios para ele no relatório da pesquisa. Já um gestor que faça a pergunta “em que atributos a imagem do meu produto difere-se da imagem do produto do meu concorrente?” está caminhando na estrada correta em obter uma resposta para seu problema. Saber qual a informação necessária para a tomada de decisão é, portanto, crucial. E o gestor deve apoiar-se em dados internos para elaborar sua necessidade. Feito isso, define-se a pergunta de pesquisa que guiará um projeto de pesquisa de mercado. É a pergunta que definirá o tipo de pesquisa de mercado a ser executado. Há dois tipos de pesquisas possíveis: exploratórios e conclusivos. A figura 1 apresenta as definições desses dois tipos de pesquisa. Pesquisa Exploratória

Visa prover o pesquisador de um maior conhecimento sobre o tema ou problema de pesquisa em perspectiva

Pesquisa Conclusiva

Possuem objetivos bem definidos, procedimentos formais, são bem estruturadas e dirigidas para a solução de problemas ou avaliação de alternativas de cursos de ação.

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Figura 1: Tipos de pesquisa de mercado. Fonte: Najib Mattar (2007)

3.1.1  Pesquisas exploratórias A pesquisa de mercado exploratória é geralmente indicada para perguntas de pesquisa mais amplas. Uma pesquisa exploratória não fornece 2


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uma resposta definitiva a um problema, contudo pode trazer novas formas de compreensão de uma situação. Pesquisas exploratórias também podem ajudar a entender um contexto cultural ou a descrever detalhadamente os sentimentos de um cliente sobre a marca. Em linhas gerais, as pesquisas exploratórias são qualitativas – grupos de foco, entrevistas em profundidade e etnografias - ainda que seja possível fazer pesquisas exploratórias com dados quantitativos ou dados secundários. Muitas vezes, as pesquisas exploratórias podem fornecer diretrizes para uma futura pesquisa conclusiva ou podem mesmo alterar o foco da pergunta de pesquisa, por meio de novas descobertas. A marca Activia, da Danone, antes de ser introduzida no Brasil, foi objeto de um complexo processo de pesquisa de marketing. Lançada em 1987, na Espanha, e no Brasil em meados da década de 2000, o iogurte Activia, uma inovação da Danone que alia a nutrição do iogurte com a melhoria do funcionamento intestinal, foi alvo de interesse comercial da Danone no mercado nacional após a constatação de que uma em cada três mulheres no Brasil queixava-se de intestino preguiçoso. Mas como comunicar essa nova marca para essas mulheres? Para delinear a comunicação, era necessário entender quais os sintomas que elas sentiam e qual era a forma de lidar com esses sintomas. Foi apenas após esse entendimento que a empresa enviou seus primeiros briefings para a agência de comunicação trabalhar na mensagem a ser veiculada (ALMEIDA; ZUPPO, 2011). O exemplo do Activa é típico de uma pesquisa exploratória: quais os sintomas e como as pessoas lidam com isso? O estudo não obteve informações como “qual o sintoma mais comum?” ou “qual a estratégia preferida da mulher brasileira para lidar com os sintomas do intestino preguiçoso?”. Essas são perguntas respondidas por estudos conclusivos.

3.1.2  Pesquisas conclusivas As pesquisas conclusivas visam encontrar uma resposta objetiva para uma pergunta de pesquisa específica. Qual a satisfação dos clientes, em uma escala de 0 a 10? Quantos consumidores uma propaganda atingiu? Em que porcentagem o market share da empresa aumenta caso a embalagem do produto seja modificada? 3


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Em linhas gerais, os estudos de mercado conclusivos são quantitativos, ou seja, a resposta final da pergunta de pesquisa é um número ou uma informação estatisticamente justificada, amparada por um nível de confiança estatístico, que indica a confiança do resultado. As pesquisas conclusivas se dividem em 2 tipos, apresentados na figura 2. Descritiva

Verifica as característica dos grupos e a relação entre as variáveis. Estima proporções de determinadas características

Conclusiva

Explicativa (*)

Verifica relação de causa e efeito. Testa hipóteses sobre as relações de causa e efeito

* Também chamada de causal

Figura 2: Tipos de pesquisa conclusiva. Fonte: Najib Mattar (2007).

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A pesquisa conclusiva pode ser dividida em dois tipos: descritiva ou explicativa. A pesquisa descritiva geralmente busca apenas fazer um retrato de uma situação. É o caso da pesquisa eleitoral: pergunta-se a uma amostra representativa de eleitores em quem eles pretendem votar e divulgam-se os índices de preferência de cada candidato. É o caso também da pesquisa de recall feita pela Activia com seus consumidores: a cada propaganda idealizada, testa-se a proporção de mulheres que se lembrarão da marca após algum tempo, antes mesmo da propaganda ir ao ar (ALMEIDA; ZUPPO, 2011). Esse tipo de pesquisa fornece informações distintas, mas não dá a relação entre elas. Já a pesquisa explicativa traz relações entre dois fatores. Ela mostra causalidade. Presume-se, por exemplo, que quando um consumidor compra um hambúrguer no Mc Donald´s, ele o faz porque está com fome. Pode ser que o consumidor não esteja faminto sempre (ele pode ser apenas guloso), mas na grande maioria dos casos, esse será um fato. Então se 90% dos consumidores que compram no Mc Donald´s fazem isso quando têm fome, é possível presumir que um consumidor qualquer, 4


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desconhecido, esteja lá porque está com fome. A causa da sua compra é a fome. Mas existem causas mais sutis que podem surtir efeitos diferentes. A Microsoft estava interessada em aumentar o número de avaliações do seu sistema de ajuda do Office, que somente dava aos usuários a opção de responder “Sim” ou “Não” em relação à utilidade de um artigo do serviço de ajuda. A empresa tentou então mudar o sistema de avaliação. Em vez de o usuário responder dicotomicamente, ele daria uma nota de 1 (menos útil) a 5 (mais útil) para o artigo. Essa estratégia provou-se pior para a empresa, pois o número de avaliações, na verdade, diminuiu. Como essa foi a única modificação feita no sistema (os artigos eram os mesmos, só mudou o sistema de avaliação), a Microsoft concluiu que era melhor deixar o sistema de “Sim” e “Não” (KOHAVI; HENNE; SOMMERFIELD, 2007). O exemplo da Microsoft mostra um experimento controlado, ou seja, uma situação na qual tudo permanece constante, exceto a variável sendo testada (forma de avaliações). Por ser uma situação controlada, é possível dizer que a causa da diminuição de avaliações foi a mudança no sistema. No entanto, pesquisas conclusivas explicativas também podem ser realizadas com dados coletados de outras fontes.

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3.2  Notas sobre análise dos dados Geralmente os gestores não participam das análises de dados coletados por agências de pesquisas. Contudo, em muitas circunstâncias, o gestor pode precisar utilizar ferramentas de análises de dados em bases que ele já tem disponíveis para si ou em dados qualitativos coletados internamente. O tratamento de dados qualitativos requer habilidades específicas e muita experiência do pesquisador, pois este deverá interpretar os dados usando sua expertise e sensibilidade. Contudo, para dados quantitativos, algumas medidas estatísticas bastante simples já fornecem informações relevantes. Segundo Stevenson (1997), as três medidas quantitativas mais usadas para análise de dados são: a) Média: A média é o valor que teoricamente pode substituir todos os valores do que está sendo medido. Se a variável fosse constante, seu valor seria a média. Por exemplo, se a média de satisfação dos clientes de uma empresa telefônica com seus serviços é de 3 em 10, pode-se supor que qualquer indivíduo escolhido aleatoriamente da amostra tivesse atribuído nota 3 à 5


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satisfação. A média é calculada pela soma de todos os valores dos dados dividida pela quantidade de valores observados. b) Moda: A moda é o valor mais que ocorre com mais frequência em determinado conjunto de dados. c) Mediana: A mediana é um valor de medida central. Pode ser mais confiável que a média quando a base de dados tem valores muito grandes ou muito pequenos que distorcem a média. Por exemplo, em um conjunto de consumidores, há uma grande maioria de jovens, porém um pequeno grupo de muito velhos, que puxa a média para cima. Nesse caso, a mediana é um retrato mais fiel da idade que representa a amostra. A mediana pode ser determinada como o valor que divide os dados “ao meio”, deixando os 50% menores valores de um lado e 50% maiores valores do outro. Em resumo, a definição do objetivo é a questão fundamental para que dados sejam informações. E conhecer a forma pela qual esse processo de transformação de dados em informações aconteça ajuda o gestor na tomada de decisões e na interpretação dos resultados apresentados por empresas de pesquisa.

Referências ALMEIDA, M.I.; ZUPPO, C.P. ACTIVIA: Consumer insight e construção de marca. Central de Casos ESPM. 2011. KOHAVI, R.; HENNE, R. M.; SOMMERFIELD, D.. Practical guide to controlled experiments on the web: listen to your customers not to the hippo. In: Proceedings of the 13th ACM SIGKDD international conference on Knowledge discovery and data mining. ACM, 2007. p. 959-967.

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MALHOTRA, N. K. Pesquisa de marketing: uma orientação aplicada. Bookman, 2006. NAJIB MATTAR, F. Pesquisa de Marketing. São Paulo: Elsevier Inc. 2007. STEVENSON, W. J. Estatística aplicada à administração. São Paulo: Habra. 1997. 6


UNIDADE 4 Criando e gerenciando valor A palavra “valor” é amplamente utilizada no mundo dos negócios. No entanto, essa palavra pode ter vários significados, dependendo da orientação de marketing seguida pela empresa. Além disso, as mudanças no contexto de negócios ocorridas nos últimos anos, como o maior poder dos consumidores, a globalização e a maior velocidade no fluxo de informações, estão transformando o conceito de valor em marketing. Nesta unidade, serão apresentados: (1) o conceito de valor e as orientações de marketing; (2) criando e retendo valor para os clientes e (3) o valor além da troca: tudo são serviços.

Objetivos da sua aprendizagem • Apresentar o conceito de valor em relação às orientações de marketing que a empresa pode adotar; • Mostrar as formas tradicionais pelas quais o valor é gerado e retido nas organizações; • Discutir o conceito de valor em uma economia de serviços.

4.1  O conceito de valor e as orientações de marketing Quando a industrialização começou a despontar no mundo, no século XIX, o cliente não era um elemento fundamental para os negócios: havia pouca diferenciação de produtos, as marcas eram praticamente inexistentes e não havia televisão, jornais, rádio ou revistas para fazer a comunicação dos produtos. Em um contexto como esse, as empresas não disputam os consumidores e o marketing é uma ferramenta pouco necessária, ele é orientado apenas à produção. Conforme a indústria e o mercado foram se desenvolvendo, as empresas passaram a melhorar seus produtos, incrementando-os para


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garantir melhor desempenho, ou seja, orientaram ao produto. Com a proliferação do número de empresas, só melhorar o produto não bastava: era necessário promovê-lo, divulgá-lo e até “empurrá-lo” para o consumidor. Essa visão de promoção ostensiva foi chamada de orientação para vendas. Muitas empresas ainda seguem essa linha de pensamento e isso pode ser prejudicial aos negócios. A Kodak, uma antiga gigante do ramo fotográfico cometeu esse erro: ao ignorar as câmeras digitais e focar principalmente em melhorar seus produtos existentes, especialmente câmeras fotográficas que usavam filmes, a empresa perdeu a competição no novo mundo da fotografia. Nos últimos anos, a Kodak se viu forçada a vender suas 1.100 patentes para um consórcio de empresas que reuniam Google, Apple e outros gigantes da tecnologia a um preço bem menor do que os 2,5 bilhões de dólares estimados. Em janeiro de 2012, a empresa entrou no sistema de proteção à falência dos Estados Unidos. O que aconteceu com a Kodak? A mesma coisa que ocorreu com a indústria de trens dos Estados Unidos na década passada: elas foram míopes. Miopia em marketing é o erro de se prestar mais atenção a produtos específicos que a companhia oferece do que aos benefícios e experiências produzidos por esses produtos (LEVITT; 1975). Consumidores têm desejos, derivados de necessidades. Necessidades são um estado de privação (física, social ou individual), enquanto os desejos são a necessidade direcionada a um produto. Assim, as pessoas têm necessidade de registrar os momentos felizes de suas vidas (uma necessidade social), mas a forma pela qual isso é feito (o produto) pode ser modificado. Focar no produto, e não na necessidade do consumidor, é uma evidência de miopia em marketing. O foco nas necessidades do cliente levou à orientação para o marketing. As empresas passaram a conhecer o consumidor por meio de pesquisas de mercado, entender suas necessidades e, só a partir disso, oferecer produtos que os satisfizessem. Mais do que um produto, as empresas passaram a oferecer propostas de valor para o cliente; Segundo Kotler e Keller (2006), uma proposta de valor é um conjunto de todos os benefícios que as empresas visam entregar para os clientes. Um Resort no Nordeste brasileiros pode oferecer como seu principal benefício a diversão (benefício central). Mas esse Resort também vai ter de oferecer segurança, conforto, ambiente agradável e bom atendimento. A proposta de valor é apresentada pelo cliente através da marca e uma boa 2


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comunicação deve enfatizar o benefício central do produto, sobre o qual será construído o seu posicionamento. A orientação ao marketing visa à satisfação do cliente: a empresa oferece uma proposta de valor a esse. O cliente percebe um valor naquilo, mas também percebe os custos que deverão ser desembolsado por ele. Caso o valor percebido seja maior do que os custos, houve a geração de valor para o cliente. E um cliente que percebe o valor, estará satisfeito e possivelmente se tornará um cliente fiel. Por fim, a orientação societal de marketing indica que as empresas atualmente devem estar atentas a uma proposição de valor que vai além do produto: caso o cliente se sinta danificado por uma prática social ou ambiental prejudicial por parte da empresa, o valor do produto consumido pode ser diminuído na percepção do cliente. Orientação para a produção

• O papel do marketing é, essencialmente, entregar produtos em locais onde possam ser comprados.

Orientação para o produto

• Considera que os consumidores preferem os produtos de melhor qualidade, desempenho e aspectos inovadores. Portanto as organizações deveriam esforçar-se para aprimorar seus produtos permanentemente.

Orientação para vendas

• A orientação para venda é investe em promoção, “empurrando” os produtos aos consumidores.

Orientação para o marketing

• A função principal da empresa não é mais produzir e vender, mas satisfazer os clientes, consultando-a antes de produzir qualquer coisa, via estudos de mercado.

Orientação para o marketing societal

• A ideia que uma empresa deve considerar os desejos dos consumidores, as necessidade de própria empresa e os interesses dos consumidores e da sociedade no longo prazo.

Figura 1: Orientações de gestão de marketing. Fonte: Adaptado de Kotler e Armstrong (2007)

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4.2  Criando e retendo valor para os clientes O objetivo final do marketing é gerar valor para o cliente e capturar valor dos clientes para a obtenção de lucros empresarias. A Figura 2 ilustra o processo de marketing como gerador de valor. Entenda o mercado e os desejos dos consumidores

Desenhe uma estratégias com foco no cliente

Construa um programa integrado de marketing que entregue valor superior

Fomente relações com seus clientes

Capture valor dos clientes para criar seus lucros

Figura 2: Um modelo simplificado do processo de marketing. Adaptado de Kotler e Armstrong (2007)

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Kotler e Armstrong (2007) sugerem algumas estratégias para capturar o valor do cliente: a) Crie satisfação no seu cliente, isso levará à fidelidade: Perder um cliente é mais que perder uma venda. Pense na Microsoft. Uma empresa que usa o sistema Windows não o compra apenas uma vez. A empresa compra o sistema operacional e, se satisfeita com o mesmo, atualiza-o periodicamente. Sendo um cliente fiel, a empresa tem um valor a longo prazo para a Microsoft, ou costumer lifetime value. Perder esse cliente para a Apple não significa apenas deixar de vender o Windows 8, mas pode significar deixar de vender as atualizações posteriores do software também. b) Aumente o seu share of costumer. A Amazon é uma empresa que foi bem sucedida em aumentar o seu share of costumer, ou seja, a porção das compras de um cliente que a empresa ganha para si. Começando como site que trabalhava apenas com venda de livros, a Amazon hoje vende diversos produtos, tem o seu próprio e-reader (o Kindle) e 11% do mercado de tablets. O consumidor que antes comprava em outros varejistas, hoje pode adquirir seus produtos na Amazon, gastando mais o seu dinheiro lá. c) Construa relações com os clientes certos: classifique os seus clientes e invista mais tempo e relacionamento naqueles que possuem mais potencial de serem fieis (não se esqueça daqueles que já são fieis). Clientes fieis não só garantem um 4


Criando e gerenciando valor – Unidade 4

grande costumer lifetime value, mas também tendem a recomendar mais a empresa.

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4.3  O valor além da troca: tudo são serviços Até aqui o valor foi entendido como uma troca: a empresa oferece algo que o cliente valoriza, cultiva relacionamentos com ele e oferece soluções para suas necessidades a um custo que o cliente percebe como menor do que o benefício recebido. Contudo, em um ambiente de negócios cada vez mais complexo, os produtos vão se tornando cada vez mais parecidos com serviços. Um iPad, por exemplo, é uma plataforma para serviços (os aplicativos). Por mais tecnologia que um iPad contenha, mais velocidade, mais sensibilidade ao toque, ele sozinho, sem uma conexão de internet e a Apple Store é praticamente uma tábua de carne. Contudo, com internet e aplicativos para trabalho, jogos e relacionamentos, um iPad torna-se uma ferramenta poderosíssima de trabalho, entretenimento e conexão. Serviços são flexíveis e dependem da interação e da co-criação do cliente. É o consumidor que escolhe que aplicativos baixar, é ele que baixa e é ele que atualiza. Também são dependentes do contexto e de um processo que gera uma experiência: em uma viagem aérea, os consumidores passam por toda uma experiência que vai do check-in à entrega das malas e essa experiência depende de uma série de fatores do próprio consumidor: se ele tem experiência em voar, o quanto ele valoriza o voo, a expectativa que ele coloca na empresa aérea. Gray e Wal (2012) anunciam que o mundo está evoluindo para uma era de serviços, ou, como colocam Vargo e Lusch (2004): o marketing está evoluindo para uma nova lógica dominante na qual importará não somente o produto vendido, mas toda a experiência pela qual o cliente passa: o processo de compra, o uso e o descarte do produto. Consumidores usam os produtos ao seu modo, co-criando assim o valor com a empresa, já que a proposta de valor deixa de ser algo pronto completamente moldado pela organização e oferecido ao cliente em troca de seu dinheiro. Comunidades de marca (MUÑIZ; O´GUINN) tornam-se espaços de socialização, onde consumidores fãs de uma marca se encontram, fazem amigos e trocam experiências, como em convenções onde fãs de Star Trek vão fantasiados como seus personagens favoritos (KO5


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ZINETS, 2001) ou fãs de Harley David Davidson se unem por uma vida na estrada (SCOUTEN; MCALEXANDER, 1995). E a tecnologia também está evoluindo para que uma economia de serviços se torne uma realidade: já existem impressoras em três dimensões (3d), por meio das quais qualquer consumidor pode criar (ou comprar) o design de um produto e imprimi-lo em sua própria casa. Essas impressoras já vêm sendo usadas para a fabricação de materiais médicos. Recentemente, foi divulgado o primeiro vestido feito com impressoras 3d, usado pela modelo Dita Von Teese. Novas orientações de marketing e concepções de valor surgirão conforme forem ocorrendo mudanças no mercado. As empresas devem estar atentas e não perder o foco no relacionamento com o cliente.

Referências GRAY, D.; WAL, T.V. The connected company. Sebastopol (CA): O´Reilly. 2012. KOTLER, P. & ARMSTRONG, G. Princípios de Marketing. São Paulo, Pearson, 2007. KOTLER, P; KELLER, K. L.. Administração de Marketing. 12. ed. São Paulo: Pearson Prentice-Hall, 2006. KOZINETS, R. V. Utopian enterprise: Articulating the meanings of Star Trek ’ s culture of consumption. Journal of Consumer Research, v. 28, n. 1, p. 67-88, 2001. LEVITT, T. Marketing myopia. Harvard Business Review, sept./oct. 1975.

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MUÑIZ, A. M; GUINN, T. C. O. Brand community. Journal of Consumer Behaviour, v. 27, n. 4, p. 412-432, 2001. SCHOUTEN, J. W.; MCALEXANDER, J. H. Subcultures of Consumption : An Ethnography of the New Bikers. Journal of Consumer Research, v. 22, n. 1, p. 43-61, 1995. 6


UNIDADE 5 Segmentação de mercado Para garantirem a satisfação e a lealdade de seus clientes, as empresas precisam gerar valor. O primeiro passo para que a geração de valor aconteça é a proposta de valor do produto ou serviço. Uma proposta de valor é um conjunto de todos os benefícios que as empresas entregam para os seus clientes (KOTLER; KELLER, 2006). Caso o consumidor perceba o valor como mais benéfico do que o preço cobrado por ele, ele se tornará um cliente. As propostas de valor, no entanto, diferenciam-se conforme o público que a empresa pretende atingir. Um segmento de mercado é um conjunto de consumidores que compartilham preferências similares (KOTLER; KELLER, 2006). As empresas não definem segmentos de mercado, elas apenas constroem suas estratégias de produto e comunicação para segmentos já existentes. A Nivea, por exemplo, divide a sua linha de protetores solares visando a diferentes públicos: crianças, que precisam de um protetor com maior resistência à água, consumidores que buscam bronzeado e que preferem mousse ou spray em vez de creme, consumidores que evitam o sol, que preferem loções com alto fator de proteção solar, entre outros grupos. Nesta unidade, serão apresentadas as sessões: (1) os principais tipos de segmentação; (2) segmentação e posicionamento; e (3) novas tendências de consumo: tribos.

Objetivos sua aprendizagem • Apresentar o conceito de segmentação; • Definir os tipos de segmentação; • Relacionar a segmentação ao posicionamento; • Discutir a ideia de segmentação de mercado na contemporaneidade.


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5.1  Principais tipos de segmentação

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A geração Y, cujos membros são chamados de Millennials, é aquela que engloba as pessoas nascidas entre a segunda metade da década de 80 e o começo dos anos 2000. Os nascidos neste período são quase nativos digitais e formam a geração mais familiarizada com a internet. Não é surpreendente, portanto, que eles também sejam os que mais comentem e recomendem produtos nas redes sociais e os mais influenciados pelo conteúdo da internet (MANGOLD, SMITH, 2012). A empresa que deseja vender seus produtos para o público jovem, precisa estar atenta a essa informação. O exemplo da geração Y mostra um típico segmento definido pela idade dos consumidores. Mas existem outras formas de segmentação que podem ser usadas: geográfica, demográfica, psicográfica, por ocasiões, por benefícios, por taxa de uso e por atitudes, cujos critérios encontramse descritos na Figura 1. Dentre os tipos de segmentações mais simples, destacam-se a geográfica, a demográfica e a por ocasiões. A segmentação geográfica pode ser exemplificada pelo McDonald´s, pois o cardápio da rede de fast food varia por países. Na Índia, os hambúrgueres não são feitos com carne de vaca, e, em Portugal, o cardápio oferece Mc Nuggets de Bacalhau. Já a segmentação demográfica inclui critérios como renda, estado civil e idade. Pessoas casadas e com filhos pequenos tendem a preferir pacotes turísticos que incluam segurança para as crianças e tranquilidade para os pais, enquanto pessoas jovens e solteiras preferem viagens nas quais atrações de vida noturna são um destaque. Por fim, a segmentação por ocasião indica que os consumidores irão comprar os produtos em apenas determinadas épocas do ano ou situações. Ovos de páscoa são vendidos em apenas um período do ano. A segmentação psicográfica indica estilos de vida e personalidades do consumidor. Um dos sistemas mais usados para a segmentação psicográfica é o VALS-2, uma classificação dos consumidores americanos realizada pela Stanford Research Institute com base em seus valores e hábitos de consumo. O VALS-2 indica a existência de oito classes preponderantes de consumidores nos Estados Unidos. Como ilustração, são descritos a seguir, na tradução de Veiga-Neto (2007) os consumidores do grupo Idealista. 2


Segmentação de mercado– Unidade 5

“Idealistas (Thinkers): são pessoas maduras, satisfeitas, apreciadores de conforto, refletem personalidades que estimam a ordem, o conhecimento e a responsabilidade. A maioria tem boa formação profissional (ou é aposentado recente). Eles estão bem informados sobre as notícias nacionais e mundiais. Estão despertos para oportunidades que permitam alargar seu conhecimento geral.” Os consumidores também podem variar em sua relação com o produto ou com o serviço que a empresa oferece: há consumidores que buscam preços mais baratos e há aqueles que buscam conforto (benefícios distintos), há aqueles que são heavy users de um produto ou serviço e há clientes esporádicos e, por fim, os consumidores também variam quanto às atitudes que têm em relação ao produto ou ao serviço. A Apple, por exemplo, é uma empresa que agrega fãs entusiasmados com seus lançamentos e também detratores de seus produtos (BELK; TUMBAT, 2005). Geográfica

• região, tamanho do município/cidade, concentração urbana/rural e clima • idade, sexo,tamanho da família, ciclo de vida da

Demográfica família, renda, ocupação, educação, religião, raça e nacionalidade

Psicográfica

Ocasições

• normais e datas especiais

Benefícios

• qualidade, serviço e economia

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• classe social, estilo de vida e personalidade

Atitude

• pequena, média e grande

• entusiástica, positiva, indiferente, negativa e hostil

Figura 1: Critérios de segmentação. Fonte: Adaptado de Campomar e Ikeda (2006)

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5.2  Segmentação e posicionamento

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Sabendo os segmentos de mercado existentes, o gestor estará apto para escolher o público-alvo a ser atendido. Da escolha do público-alvo, surge o conceito de posicionamento, que é “a ação de projetar o produto e a imagem da empresa para ocupar um lugar diferenciado na mente do público-alvo” (KOTLER; KELLER, 2006, p. 305). Posicionado o produto ou serviço, o gestor estará apto a elaborar a sua proposta de valor para o cliente e as estratégias de distribuição, preço e comunicação. A Mr. Beer é uma franquia que oferece cervejas importadas. Fundada em 2009, já conta hoje com 60 unidades espalhadas pelo território nacional, geralmente quiosques em shopping centers, ideais para homens e mulheres (40% do público) que querem uma descontração na sua jornada de compras. O público-alvo da empresa tem entre 25 e 45 anos, poder aquisitivo elevado, interesse por gastronomia e conhecimento de culturas internacionais (PIASKOWY, 2011). Para garantir que a experiência dos clientes no Mr. Beer seja excepcional, a franquia oferece 200 rótulos de cerveja e funcionários treinados e especialistas na cultura cervejeira. O posicionamento da Mr. Beer indica que é um produto voltado para pessoas com poder aquisitivo mais alto. Situando seus quiosques em shopping centers sofisticados e expondo as cervejas para o público que passa, a empresa se diferencia de outros quiosques de chope ao mostrar sua sofisticação aos consumidores. Ainda que haja pontos de paridade, ou seja, características em comum com outros bares, são os pontos de diferença, as características únicas da empresa, os responsáveis pelo posicionamento que fez a Mr. Beer mostrar um desempenho excepcional. Uma empresa pode também adotar uma estratégia de baixos custos. É o que fazem hotéis da marca Ibis Budget, que oferecerem aos seus clientes o necessário para uma noite confortável, sem muitos luxos. Independente do posicionamento escolhido, a empresa deve garantir que a comunicação seja corretamente dirigida ao público alvo escolhido e comunique o diferencial da proposta de valor (seja esse o produto, a imagem ou o preço). Deve garantir também que os canais de distribuição sejam adequados aos clientes a serem atendidos.

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Segmentação de mercado– Unidade 5

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5.3  Novas tendências de consumo: tribos O modelo tradicional de segmentação, público-alvo e posicionamento, contudo, não contempla uma série de mudanças e tendências que surgiram na última década e que estão alterando o conceito de marketing. Entre tais tendências, uma que particularmente influencia as práticas de segmentação e posicionamento é a tribalização dos consumidores (COVA; KOZINETS; SHANKAR, 2007). As marcas e as atividades de consumo têm uma importância ímpar na vida dos consumidores atualmente. Se até algumas décadas atrás, um indivíduo era, antes de tudo, o seu trabalho, hoje o indivíduo é, antes de tudo, o seu consumo. O famoso livro 50 Tons de Cinza, uma trilogia erótica que vendeu milhões de cópias no mundo todo, foi criado a partir da história da também famosa “Saga Crepúsculo”, que narra o romance entre uma adolescente e um vampiro. A autora de 50 Tons de Cinza, E.L. James, começou a sua história em uma comunidade online de fan fiction, um fórum em que pessoas anônimas e escritores amadores desenvolvem textos com base em seus personagens preferidos. Antes de seguir com a publicação do livro, sua narrativa tinha como personagens os mesmos da “Saga Crepúsculo” e já havia sido lida por milhares de fãs, dos quais 37.000 haviam comentado e dado respostas positivas ou negativas ao texto. E.L. James, ou Erika Leonard James, antes de ser uma escritora, era uma fã. E como fã, buscou outros consumidores que tinham o mesmo interesse que ela e se engajou em atividades que modificaram a proposta do livro que ela tanto adorava. Situações como essa não acontecem apenas com livros ou outros produtos culturais. Os consumidores se unem em tribos em torno dos mais diversos produtos e atividades: carros e modificações que podem ser feitas nos mesmos, programas de computador e eletrônicos diversos, moda e muitos outros. Eles se unem porque compartilham valores que estão embutidos no conceito da marca e muitas vezes podem modificar os significados que a empresa pretendeu atribuir ao produto na sua proposta de valor. Os processos de segmentação tradicionais, ainda que descrevam características, valores e comportamentos das pessoas, não chegam aos níveis das tribos, onde consumidores consideravelmente diferentes participam da criação de novas ideias baseadas na marca, valorizam a marca e se unem em torno de ideais e imagens dessa marca. Estar atento ao 5


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que acontece nas redes sociais (Facebook, Twitter, Fóruns e Blogs) é uma forma de alcançar o consumidor tribalizado. É mais um exemplo de como a tecnologia está mudando o panorama do marketing.

Referências BELK, R. W.; TUMBAT, G. The Cult of Macintosh. Consumption Markets & Culture, v. 8, n. 3, p. 205-217, September. 2005. CAMPOMAR; M.C., IKEDA; A.A. O planejamento de marketing e a confecção de planos: dos conceitos a um novo modelo. São Paulo: Saraiva. 2006. COVA, B.; KOZINETS, R. V.; SHANKAR, A. Tribes, Inc.: the new world of tribalism. In: COVA, B.; KOZINETS, R. V.; SHANKAR, A. (Org.). Consumer Tribes. Oxford: Elsevier, 2007. p. 3-26. Eakin, E. Grey Area: How ‘Fifty Shades’ Dominated the Market. The New York Review of Books. 2012. Disponível em: http://www.nybooks. com/blogs/nyrblog/2012/jul/27/seduction-and-betrayal-twilight-fiftyshades/ KOTLER, P; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 12. ed. São Paulo: Pearson Prentice-Hall, 2006. MANGOLD, WG; FAULDS, DJ. Social media: The new hybrid element of the promotion mix. Business horizons, v. 52, n. 4, p. 357—365, 2009. Piaskowy, M.S. Mr. Beer Cervejas Especiais. Central de Cases ESPM. 2011.

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SEGMENTATION: A Nivea case study. The Times 100. Disponível em: http://businesscasestudies.co.uk/nivea/segmentation/introduction. html#axzz2V680s8na. VEIGA-NETO, A. R. Um estudo comparativo de formas de segmentação de mercado: uma comparação entre VALS-2 e segmentação por variáveis demográficas com estudantes universitários. Revista de Administração Contemporânea, v. 11, n. 1, p. 139-161, 2007. 6


UNIDADE 6 O processo de decisão de compra. O objetivo do marketing é atender às necessidades dos consumidores (KOTLER; KELLER, 2006). Necessidades são estados de privação - como fome, sede, desejo de auto-expressão ou de interação social - que podem ser satisfeitos por meio de produtos – ter fome de cachorro-quente, sede de suco de laranja e vontade de se expressar e socializar pelo Facebook (KOTLER; ARMSTRONG, 2007). A necessidade a ser satisfeita é um problema para o consumidor, que será resolvido por meio do consumo. Nesta unidade, será apresentado o processo de tomada de decisão do cliente. As sessões que detalham tal processo são: (1) o processo de tomada de decisão; (2) busca por informações dos produtos; e (3) a forma de avaliação das informações obtidas para a decisão.

Objetivos da sua aprendizagem • O processo de tomada de decisão; • Reconhecimento da necessidade da compra e busca por informações dos produtos; • Forma de avaliação das informações obtidas para a decisão.

6.1  O processo de tomada de decisão Daniela e Fábio estão planejando se casar no ano que vem. Para isso, pretendem comprar um apartamento. A necessidade do casal, de abrigo, já se tornou um desejo: o apartamento. Ou seja, há um problema reconhecido a ser resolvido. O próximo passo para Daniela e Fábio é buscar informações sobre apartamentos disponíveis na cidade onde eles habitarão. Para isso, eles podem contar com a ajuda de um corretor, de sites de classificados, de classificados em jornais ou mesmo de aplicativos para celulares. Com as informações em mãos, é hora de avaliar as alternativas. Melhor um apartamento mais barato, mas mais distante do trabalho? Dado o orçamento disponível para a compra, no que vale mais a


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pena investir: espaço interno ou maior área de lazer coletiva? Só após tal avaliação que Daniela e Fábio escolherão o apartamento adequado (escolha do produto) e realizarão sua mudança (resultados). A figura 1 mostra em forma linear os estágios na tomada de decisão do consumidor. Reconhecimento do problema

Busca de informações

Avaliação de alternativas

Escolha do produto

Resultados Figura 1: Estágios na tomada de decisão do consumidor. Fonte: Adaptado de Solomon (2010).

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Por mais plausíveis que esses estágios de tomada de decisão pareçam, em muitos casos os consumidores simplesmente não decidem suas compras de uma maneira racional. Consumidores podem comprar por hábito ou impulso. Fábio toma a mesma marca de iogurtes desde criança, consumindo a marca por hábito, sem considerar outros fatores. Já Daniela, quando está na fila para pagar no supermercado, dificilmente resiste às guloseimas que estão expostas nas prateleiras ao lado do caixa, comprando por impulso. Um dos principais fatores que diferencia o nível de envolvimento do consumidor com a compra é o risco. O risco da compra não é apenas financeiro (SIQUEIRA, 2008). No caso de Daniela e Fábio, eles podem estar preocupados com a opinião da família em relação ao apartamento (risco social), com o tempo que ficarão na casa em que escolherem ou se terão de comprar uma nova quando a família aumentar (risco temporal) e com 2


O processo de decisão de compra – Unidade 6

o tanto que terão de gastar em manutenção e condomínio se o apartamento não for novo (risco funcional).

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6.2  Busca por informações dos produtos A busca por informações sobre os produtos pode ser tanto interna quanto externa (HOYER; MACINNIS, 2010). A busca interna é aquela feita na própria memória. As informações sobre produtos na memória podem ter sido aprendidas durante a vida do consumidor, com seus pais e cônjuges (FOURNIER, 1998), por exemplo, ou podem ter sido transferidas por contatos com comunicações da empresa. A memória interna, contudo, pode ser “traiçoeira”, pois muitas vezes as pessoas tendem a buscar apenas justificativas para suas decisões e não realmente buscar alternativas. Já a busca externa envolve diversas fontes, como as próprias lojas, as propagandas, serviços ao consumidor, tais quais classificados, outros consumidores e a internet. Não que a busca de informações externas seja também racional. Primeiramente, porque há tantas informações disponíveis, que é humanamente impossível para qualquer consumidor conhecer todas elas. Depois porque os consumidores buscam por variedade e muitos deles estão inclusive atentos às novidades do mercado, fazendo buscas contínuas de informações. Voltando ao casal Daniela e Fábio, é como se eles olhassem o guia gastronômico de sua cidade semanalmente em busca de novas pizzarias, mesmo já tendo uma preferida (e comessem uma pizza não tão gostosa só para variar). As novas tecnologias estão permitindo buscas mais acuradas por partes dos consumidores. Com aplicativos para smartphones, os consumidores buscam por preços mais baixos mesmo dentro das lojas. Ou frequentam uma loja, veem o produto, mas depois compram pela internet, tanto pelo preço, quanto pela conveniência. No varejo, essa integração entre online e o concreto pode trazer consequências significativas para as empesas, como guerra de preços, diferenças no layout e redução significativa de estoques nas lojas.

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6.3  Forma de avaliação das informações obtidas para a decisão

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Quando o consumidor já está munido de informações, é hora de selecionar as alternativas. Se a busca foi apenas na memória interna, o mais provável é que o consumidor lembre-se apenas de algumas marcas, que incluem possivelmente as de que ele mais gosta e algumas que ele realmente detesta. Esse conjunto é o conjunto evocado do consumidor. Para tomar sua decisão, no entanto, o consumidor não considerará todas as marcas evocadas ou pesquisadas em fontes externas. Experiências anteriores com uma marca podem sido ruins, outras marcas podem ter preços proibitivos. Assim, apenas o conjunto de consideração incluirá as marcas que o consumidor realmente pretende comparar antes de sua compra. Estar na mente do consumidor e no seu grupo de consideração é essencial para as vendas de uma empresa. A Hyundai, fabricante coreana de carros, conseguiu crescer tanto no mercado mundial quanto no mercado nacional, ao investir pesadamente em carros de luxo (ECONOMIST, 2009) e em comunicação massiva com os consumidores. No Brasil, o desempenho em market share da Hyundai já supera o de montadoras consolidadas como Honda, Toyota e Peugeot (RIATO, 2012). Para julgar e decidir em relação às marcas do seu conjunto de consideração, o consumidor decide por meio de critérios, que podem variar consideravelmente de produto para produto. Ao decidir a operadora de celular, o cliente leva em conta cobertura, preço, qualidade dos serviços, entre outros atributos. Contudo, nem todos os clientes consideram planos que incluam ligações interurbanas ou ligações grátis para os membros da família. Ou seja, critérios de decisão podem variar conforme o possível cliente. Além disso, as empresas podem comunicar um critério aos consumidores que passa a ser um fator decisório no julgamento. A Pepsi-Cola gastou US$ 25 milhões para convencer seus consumidores da relevância da data de validade nos refrigerantes, ainda que 98% das latas fossem já consumidas dentro do prazo correto. Após esse maciço investimento em comunicação, a data de validade passou a ser um dos critérios mais relevantes na hora da escolha do refrigerante nos supermercados (SOLOMON, 2010). Há muitos casos nos quais os consumidores simplesmente não fazem cálculos mentais e tomam decisões por meio de regras simples, atalhos mentais, chamados heurísticas. Esses atalhos são mais proemi4


O processo de decisão de compra – Unidade 6

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nentes nas compras por impulso ou por hábito, mas podem estar presentes em quaisquer decisões tomadas pelos consumidores. Alguns exemplos de heurísticas são: a) Marcas conhecidas: um brasileiro vai à China e precisa comprar pasta de dentes no supermercado local. Entre tantas marcas desconhecidas em caracteres que ele desconhece, ele reconhece o logotipo da Colgate. É essa a sua escolha. A justificativa para esse exemplo é que marcas conhecidas trazem familiaridade aos consumidores, reduzem seus riscos e evitam esforço mental na tomada de decisão. b) Mais caro é melhor: Fábio quis impressionar Daniela na primeira vez em que saíram para jantar juntos. Escolheu um dos vinhos mais caros do cardápio. Daniela, como conhecedora de vinhos, fez uma sugestão mais barata, mas que tinha recebido vários prêmios. Uma das crenças de mercado mais enraizadas nos consumidores é a de que um bom produto é sempre o mais caro. Geralmente, há relação entre preço e qualidade, mas existem exceções (vinhos são bons exemplos disso). c) País de origem: O mote das lentes para óculos Hoya é “tecnologia japonesa ampliando sua visão”. Marcas de moda de luxo, como a Gucci, tendem a enfatizar que seus produtos são feitos na Itália. Os consumidores tendem a atribuir características estereotipadas aos produtos de determinados países. Assim, o Japão está ligado à tecnologia e a Itália à moda. d) Inércia: É a compra pelo “sempre comprou”. Quando o consumidor compra uma marca por inércia e não por fidelidade (ou seja, de forma pensada), é relativamente fácil atraí-lo para um concorrente por meio de promoções de preços e comunicação.

Referências ECONOMIST. Sui Genesis. The Economist. 2008. Disponível em: http:// www.economist.com/node/13235107?zid=293&ah=e50f636873b4236 9614615ba3c16df4a. HOYER, Wayne D.; MACINNIS, Deborah J. Comportamento do Consumidor. São Paulo, Cengage Learning, 2010. 5


Como identificar oportunidades de negócios

KOTLER, P. & ARMSTRONG, G. Princípios de Marketing. São Paulo, Pearson, 2007. KOTLER, P; KELLER, K. L.. Administração de Marketing. 12. ed. São Paulo: Pearson Prentice-Hall, 2006. RIATO, G. Briga pelo mercado de veículos leves fica mais acirrada. Automotive Business. 2012. Disponível em: http://www.automotivebusiness.com.br/noticia_det.aspx?id_noticia=12728. Acesso? SIQUEIRA. R. Miopia em alta definição: Uma análise do comportamento do consumidor frente à escolha de uma TV de alta definição. Central de Cases ESPM. 2008.

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SOLOMON, M.R. O comportamento do consumidor: comprando, possuindo e sendo. Porto Alegre: Bookman, 2010.

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UNIDADE 7 Inovações radicais e o marketing boca a boca O professor de Harvard, Clayton Christensen diz que mesmo empresas bem geridas entram em falência porque as mesmas práticas de gestão que permitiram que elas se tornassem líderes na indústria dificultam a criação de inovações radicais, que eminentemente aparecem e roubam seus mercados. Inovações radicais são aquelas que modificam toda uma indústria, como a substituição das televisões de tubo pelas de telas de LCD e outros materiais. No entanto, as empresas muitas vezes concentram-se apenas melhorar os produtos que já estão em seus portfólios, perdendo a oportunidade de desenvolverem inovações que realmente mudarão a indústria e garantirão lucros futuros no longo prazo. Esta unidade busca mostrar os principais desafios que um empreendedor enfrenta ao criar uma nova tecnologia. Para tanto, serão apresentadas as sessões: (1) inovações incrementais ou radicais; (2) o abismo das inovações radicais; e (3) difusão de informações: boca a boca.

Objetivos da sua aprendizagem Nesta unidade, serão apresentados conceitos sobre difusão de inovações. A pergunta a ser respondida é: como uma inovação radical passa a ser adotada pelos consumidores? Para responder a essa pergunta, serão explorados os seguintes tópicos: • As diferenças entre inovações incrementais e radicais; • As dificuldades (abismo) que uma inovação percorre para chegar aos consumidores; • A lógica da difusão dos produtos e o marketing boca a boca.


Como identificar oportunidades de negócios

7.1  Inovações incrementais ou radicais Inovações podem ser incrementais ou radicais (também chamadas de disruptivas). Inovações incrementais são aquelas que, apesar de não modificarem o mercado como um todo, criam fontes de renda para a empresa. Um exemplo desse tipo de inovação é o incremento de tela retina nos tablets da Apple. A tela retina não muda a forma pela qual os consumidores utilizam seus iPads, mas traz uma visualização melhor e uma experiência mais agradável. Já inovações radicais são aquelas que mudam completamente o mercado e a forma pela qual as pessoas lidam. São exemplos de inovações radicais a câmera digital (que faliu a Kodak), a internet (que destruiu o setor de enciclopédias) e os computadores (que substituíram as máquinas de escrever). Inovações incrementais são alcançadas quando as empresas escutam seus clientes e investem em tecnologias que satisfaçam as suas necessidades. São necessárias e lucrativas, mas mantêm a empresa em uma zona de conforto. Ao investir sempre em melhorar os produtos que já existem, as empresas podem falhar por deixar de criar produtos realmente inovadores. Já as inovações radicais revolucionam a proposta de valor que é oferecida ao cliente, ou seja, o conjunto de benefícios que aos quais o produto ou serviços se propõem. Mas como é a aceitação dos consumidores em relação a inovações radicais?

7.2  O abismo das inovações radicais

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Muitas inovações não se tornam casos de sucesso. Os produtos da Apple chamam a atenção pelo seu poder disruptivo e são tratados como casos de sucesso no mundo da tecnologia. A ferramenta Newton, da Apple, foi lançada em 1993 como um assistente digital pessoal. Após sofrer sérias críticas da imprensa especializada, não foi muito bem nas vendas, ainda que tenha angariado uma comunidade de fãs com quase 200.000 usuários durante o auge da popularidade do produto. Em 1996, no entanto, surgiu o Palm Pilot, que passou a liderar a categoria. O Apple Newton foi descontinuado em 1998 (MUÑIZ; SCHAU, 2005). 2


Inovações radicais e o marketing boca a boca– Unidade 7

Para Geoffrey Moore, autor do livro Crossing the Chasm, o padrão de adoção de novas tecnologias segue uma curva de crescimento em forma de sino (Figura 1). Essa curva mostra um abismo que o Apple Newton não conseguiu ultrapassar: aquele entre os adotantes imediatos e a maioria tardia. Maioria tardia

Adotantes imediatos A B I

Retardatários

S M O Inovadores

Maioria antecipada

Figura 1: Participantes no ciclo de vida de adoção de tecnologias.

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Fonte: Adaptado de Moore (2002)

Cada um destes participantes no ciclo de vida de adoção de tecnologias tem suas características próprias: a) Inovadores: são os primeiros a comprar novos produtos com tecnologia disruptiva. São entusiastas da tecnologia que desejam sempre estar testando lançamentos. São consumidores que acreditam que a tecnologia tem valor em si mesma, que demandam acesso a um especialista no caso de qualquer problema, que pretendem pagar barato e que se sentem recompensados apelas por estarem adotando uma nova tecnologia. b) Adotantes imediatos são o segundo grupo a adotar tecnologias. São visionários que enxergam oportunidades em combinar uma tecnologia emergente a uma oportunidade e o carisma para convencer demais colegas e amigos a comprarem a 3


Como identificar oportunidades de negócios

mesma tecnologia. São eles que geram as primeiras receitas e a visibilidade. c) Maioria antecipada: são pragmáticos e aceitos como líderes em tecnologia pela maioria tardia. São avessos ao risco e sensíveis ao preço e se comunicam com colegas e amigos dentro de sua comunidade. d) Maioria tardia: são conservadores e tendem a evitar inovações radicais. Acreditam mais em tradição do que em progresso e buscam produtos disponíveis em diversos canais de distribuição. São muito importantes para a vida do produto após o desenvolvimento tecnológico. e) Retardatários: são os últimos a adotarem uma tecnologia. O abismo separa os adotantes imediatos da maioria antecipada, mais avessa ao risco e que busca maior segurança. Para conseguir superar o abismo, é preciso ter informações sobre como a difusão de informações funciona.

7.3  Difusão de informações: boca a boca

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O abismo das inovações radicais não é cruzado facilmente. A tecnologia só é válida em si mesmo para os inovadores. Para os outros grupos, a tecnologia nova precisa oferecer uma solução a uma necessidade, precisa ter uma proposta de valor (conjunto de benefícios) para o cliente. São os adotantes imediatos que dão o valor à nova tecnologia, que definem o seu uso. O Apple Newton chegou neste estágio e angariou alguns fãs entusiasmados. Para cruzar o abismo e chegar à maioria antecipada, um processo de difusão precisa acontecer. No começo de 2013 a internet foi invadida por vídeos com pessoas vestidas de maneiras diferentes dançando ao refrão “The Harlem Shake”. Em menos de um mês, 4.000 mil pessoas enviaram suas versões de Harlem Shake ao Youtube e as compartilharam nas redes sociais. Mas como isso aconteceu? No dia 2 de Fevereiro de 2013 um usuário do YouTube postou um vídeo chamado Do the Harlem Shake, no qual aparecem rapazes fantasiados movimentando-se lentamente. A luz apaga, reacende e então todas as pessoas dançam freneticamente Harlem Shake. No dia 5 de Fevereiro o vídeo tinha 300.000 visualizações no Youtube. No dia 7 de fevereiro surgiu a primeira paródia, com funcionários de um escritório. Em poucos 4


Inovações radicais e o marketing boca a boca– Unidade 7

dias, blogs e sites famosos como o BuzzFeed e o College Humor fizeram suas próprias paródias e o vídeo explodiu. O vídeo original conta com 50 milhões de visualizações no Youtube, número similar ou superado por muitas das paródias. O processo de difusão do Harlem Shake é bastante similar ao processo de adoção de tecnologias disruptivas, como mostra a Figura 2. Interesse com o passar do tempo O número 100 representa o interesse máximo das pesquisas

100

B

80 60 40 20

A abr 2013

Figura 2: Interesse no termo “Harlem Shake” no Google.

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Fonte: Google Trends.

O processo de difusão das inovações é muito similar à prática do boca a boca. As pessoas divulgam coisas que as interessam umas para as outras. Contudo, as pessoas tendem a divulgarem informações em pequenos grupos, sejam estes reais ou virtuais: elas indicam produtos para os familiares, os amigos, os colegas, ou seja, para pessoas com quem elas têm laços fortes (BROWN; REIGEN, 1987). Para que a informação saia desse pequeno círculo, é preciso que alguém influente, cuja opinião tenha alcance em vários grupos diferentes (um hub, segundo a denominação de Malcom Gladwell em seu famoso livro O Ponto de Desequilíbrio) se manifeste. No caso do Harlem Shake, quando sites como o BuzzFeed e o College Humor fizeram suas paródias, milhões de pessoas “adotaram” o Harlem Shake. No caso do Apple Newton, muitos dos hubs, ou seja, aqueles que influenciariam o público geral, tiveram más impressões e fizeram revisões negativas do aparelho. Sem informações dos hubs que garantam a 5


Como identificar oportunidades de negócios

segurança da compra, o abismo não é superado e a inovação não chega à maioria antecipada.

Referências BROWN, J.J; REINGEN, P. H. Social ties and word-of-mouth referral behavior. Journal of Consumer Research, v. 14, n. 3, p. 350-363, 1987. CHRISTENSEN, Clayton. The innovator’s dilemma: when new technologies cause great firms to fail. Harvard Business School Press, 1997. GLADWELL, M. The tipping point: How little things can make a big difference. New York: Little Brown, 2002. GOOGLE trends. Disponível em: http://www.google.com/trends/. Acessoem? MOORE, Geoffrey A. Crossing the Chasm: Marketing and Selling Disruptive Products to Mainstream Customers. Nova York: HarperBusiness, 2002.

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MUNIZ, A. M.; SCHAU, H. J. Religiosity in the abandoned Apple Newton brand community. Journal of Consumer Research, v. 31, n. 4, p. 737-747, 2005.

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UNIDADE 8 A tecnologia como condutora de mudanças nos negócios A tecnologia e a infraestrutura trazem mudanças na forma como os negócios são feitos (BESANKO, 2005). Não fossem mudanças tecnológicas como as ferrovias e os telégrafos, dificilmente a empresa moderna como todos a conhecem existiria, ou seja, a expansão só foi possível por causa de tais avanços. A mudança tecnológica recente que revolucionou a forma pela qual os negócios são feitos foi a internet. Tom Friedman, em seu livro “O Mundo é Plano”, de 2005, faz um relato de como as novas tecnologias estariam mudando as formas de fazer negócios e facilitando a globalização. Mesmo com algumas críticas (GHEMAWAT, 2007), o livro atingiu o seu objetivo de demonstrar que a empresa contemporânea está diferente da empresa moderna tradicional. A primeira edição do livro de Friedman, no entanto, ainda não mencionava dois dos maiores fenômenos que a internet proporcionou: as redes sociais e a tendência mobile. Com as redes sociais, os consumidores encontraram meios de se comunicar com as empresas e com outros consumidores. E com o maior acesso à internet em dispositivos móveis e a revolução dos aplicativos, ficou muito mais fácil e barato utilizar esses novos meios de comunicação. Nesta unidade, serão analisadas três consequências da internet na situação das empresas e dos consumidores: (1) a teoria da cauda longa; (2) as redes sociais e o mobile e; (3) o crowdsourcing.

Objetivos da sua aprendizagem Nesta unidade, serão apresentados conceitos relativos às mudanças que a internet trouxe à economia e aos negócios. Serão apresentados os seguintes tópicos: • Teoria da cauda longa; • Redes sociais online; • Crowdsourcing.


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8.1  A teoria da cauda longa

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Palhaços Assassinos do Espaço Sideral é um filme de 1988 que mistura terror, comédia e ficção científica. Como alguns outros (poucos) filmes do “gênero”, ganhou status de cult com o passar dos anos e foi chegando às gerações mais novas. Qualquer adolescente fã de filmes de terror consegue (muitas vezes ilegalmente) ter acesso ao filme, compartilhar suas opiniões com seus amigos e dar uma nota para o mesmo no IMDb (Internet Movie Database). Ter acesso a filmes alternativos nem sempre foi tarefa fácil. Imagine um jovem de uma cidade pequena, com acesso apenas a uma locadora. A locadora, para ser mais lucrativa em um local cujo público é restrito dificilmente investiria na compra de um filme como Palhaços Assassinos, pois ele ocuparia o espaço de outros filmes clássicos ou blockbusters, muito mais rentáveis para o empresário. O adolescente, para obter o filme, precisaria provavelmente viajar a uma cidade grande, como São Paulo, ir a uma loja especializada em objetos alternativos e comprar o filme. Com o surgimento dos negócios digitais, a situação mudou. O adolescente de gosto peculiar consegue encontrar o filme facilmente para assistir na Netflix (serviço de assinaturas que disponibiliza filmes e séries). Mas por que vale a pena para a Netflix disponibilizar o filme? Chris Anderson era editor da revista Wired no começo da década passada. Tendo muito contato com empresas de tecnologia e mergulhando em dados de empresas como a própria Netflix, ele desenvolveu a teoria da cauda longa. O nome cauda longa vem de uma distribuição estatística que representa grandes bases de dados de forma decrescente. Anderson argumenta que para a Netflix, o custo de manter um filme alternativo em seu catálogo é praticamente irrelevante. Palhaços Assassinos do Espaço Sideral não ocupará o espaço de Se Beber, Não Case. Não há custos de estocagem e nem disputa por espaços em uma prateleira. Mas mais interessante do que isso, ele descobriu que por mais obscuro que fosse o filme ou a música procurada, sempre havia alguém comprando. Há mercado longe dos hits e isso é uma mudança considerável para as empresas, pois as que atuam online têm um mercado que antes não era atendido sem custos adicionais por isso.

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A tecnologia como condutora de mudanças nos negócios – Unidade 8

8.2  Redes sociais online Há várias razões pelas quais os consumidores criam uma conta no Facebook, ainda que essas razões não estejam muito claras na hora em que eles clicam no “Concordo com os termos e condições” do site. Algumas das razões que as pesquisas vêm apontando são o desejo de se expressar (SCHAU; GILLY, 2003), o desejo de se socializar e a identificação com temas culturais, políticos ou de consumo que estão presentes nas redes sociais (BAGOZZI; DHOLAKIA, 2006). A associação traz poder e os consumidores passaram a ter voz mais ativa no relacionamento com as empresas, tanto para o bem, como em projetos de co-criação e boca a boca positivo, quanto para o mal, quando o consumidor faz boca a boca negativo e campanhas de boicote. Existem três principais tipos de afiliação na internet, descritos na Figura 1 e as empresas podem fomentar oportunidades em cada um eles.

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Pools: Pessoas se associam por gostar de uma mesma atividade ou marca Ex: Fã de 4x4 Corredores

Webs: Pessoas se associam para se relacionarem com outras Ex: Facebook Redes de pessoas com doenças específicas

Hubs: Pessoas se associam em torno de uma figura (real ou fictício) carismática Ex: Fãs do Luciano Huck Fãs da Cleycianne (personagem fictício)

Figura 1: Tipos principais de filiação. Fonte: adaptado de Fournier e Lee (2009)

As empresas podem incentivar Pools, ou comunidades de marca. A Nike mantém no Facebook a página Nike Corre, com mais de 1,5 milhões de fãs. Na páginas Nike corre, os consumidores (mesmo aqueles que não correm com tênis Nike!) compartilham informações sobre seus treinos, sobre eventos de corridas e postagens motivacionais. Comunicações sobre o próprio tênis existem, mas não são as únicas na página. A Nike 3


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conseguiu unir a marca a um estilo de vida de muitos consumidores e sua página é um caso de sucesso. Nas redes tipo Webs, as empresas têm a oportunidade de incentivar o boca a boca. A Dove recentemente lançou uma campanha na qual consumidoras se descreviam para um artista, que as desenhava segundo as características que informavam. Após o primeiro desenho, uma segunda pessoa descrevia as mesmas mulheres para o artista. Ao final, os dois retratos foram mostrados para as mulheres, que constataram se enxergar menos belas em relação à forma como os outros as viam. O vídeo da campanha foi ostensivamente divulgado nas redes sociais, ampliando o seu alcance a cada compartilhamento. No caso dos hubs, as empresas podem oferecer produtos para que esses hubs o divulguem para os seus próprios seguidores, e podem inclusive pagá-los por isso, contanto que haja um aviso sobre este pagamento. Essa prática é muito comum em blogs de moda ou de maquiagem. Uma tendência que não deve ser esquecida é o mobile. Um recente relatório da Nielsen indica que, em praticamente todas as redes sociais, houve aumento de acessos por tablets e smartphones, enquanto o número de acessos via notebooks e computadores decresceu. Na indústria de jogos, a mudança já é bastante visível: a gigante Zynga, criadora de jogos como o Farmville demitiu recentemente 520 funcionários. Seus jogos formatados para computadores não atingiram o mesmo resultado nas lojas de aplicativos dos smartphones. Mas as plataformas móveis também trazem oportunidades, como o aumento de consumidores que postam estar em um lugar ou fotos desse lugar, divulgando o varejo, ou clientes que postam sobre suas compras e características de seus produtos, também contribuindo com o boca a boca. Utilizar o componente de geolocalização também é uma oportunidade. A Pizza Hut lançou um aplicativo para iPhone pelo qual as pessoas poderiam montar sua própria pizza e buscá-la no restaurante mais próximo, cuja distância era calculada por meio de coordenadas de GPS. O resultado: mais de um milhão de downloads em oito meses e aumento das vendas por aplicativos móveis em 20% após o lançamento dessa campanha (RYAN; JONES, 2011).

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A tecnologia como condutora de mudanças nos negócios – Unidade 8

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8.3  Crowdsourcing e crowdfunding Corwdsourcing e crowdfunding são duas tendências que também se popularizaram e fortaleceram devido às tecnologias surgidas no fim do século XX e no começo do século XXI. Foi Jeff Howe, da Wired Magazine, quem primeiro cunhou o termo crowdsourcing, a união da multidão (crowd) com a terceirização (outsourcing). A ideia primordial do crowsourcing é o uso de um grande contingente de pessoas para resolver um problema. A Azul, da companhia aérea americana JetBlue, quando entrou no mercado brasileiro, em 2008, fez um concurso para decidir qual seria o nome da empresa. Milhares de consumidores se envolveram com sugestões e votos e a decisão final foi o nome atual. Outro exemplo de corwdsourcing é a própria Wikipedia, a enciclopédia gratuita disponível online. A Wikipedia funciona com colaboração dos próprios consumidores. Os mecanismos de controle de qualidade dos artigos são feitos por editores que também não recebem nenhum benefício financeiro por isso, apenas o prestígio de ser editor na Wikipedia. Financeiramente, a Wikipedia mantem-se com doações. O crowsourcing é uma ferramenta poderosa de interação com os consumidores, que se sentem co-produtores da empresa e participam de uma experiência direta com o produto, a marca e a organização. Mas também é útil para a resolução de problemas internos da empresa, que pode ter sua própria plataforma colaborativa. O crowfunding baseia-se na mesma ideia de multidão. Mas nesse caso é uma multidão de financiadores. Veronica Mars é uma série que foi ao ar entre 2004 e 2007. A série conta a história da personagem Veronica, uma adolescente cuja melhor amiga foi assassinada e que desvenda crimes e busca pistas para limpar o nome do seu pai. Em 2013, foi lançado um projeto para a arrecadação de fundos para a realização de um filme da série no site Kickstater, onde consumidores podem fazer doações a projetos de crowdfunding, ou seja, colaborar diretamente com projetos que achem interessantes. Com uma meta de US$ 2.000.000,00, o projeto para o filme de Veronica Mars arrecadou quase US$ 6.000.000,00 de mais de 90.000 apoiadores. O projeto do filme se concretizará. As empresas hoje estão em rede e precisam aprender a se comunicar com fornecedores e consumidores desta forma. Entender as ten5


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dências que as novas tecnologias desencadearam é apenas um primeiro passo nesta empreitada.

Referências ANDERSON, Chris. A Cauda Longa - do Mercado de Massa para o Mercado de Nicho. Rio de Janeiro: Campus, 2006. BESANKO, D. et al. A economia da estratégia. Porto Alegre: Bookman. 2005. DHOLAKIA, Utpal M.; BAGOZZI, Richard P.; PEARO, Lisa Klein. A social influence model of consumer participation in network-and small-group-based virtual communities. International Journal of Research in Marketing, v. 21, n. 3, p. 241-263, 2004. FOURNIER, S.; LEE, L. Getting brand communities right. Harvard Business Review, v. 87, n. 4, p. 105-111, 2009. FRIEDMAN, T. L. The World Is Flat: A Brief History of the Twentyfirst Century New York: Farrar, Straus and Giroux. 2005. GHEMAWAT, Pankaj. Why the world isn’t flat. Foreign Policy, p. 5460, 2007. HOWE, Jeff. The rise of crowdsourcing. Wired Magazine, v. 14, n. 6, p. 1-4, 2006. NIELSEN. The Social Media Report. 2012.

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RYAN, D.; JONES, C. The Best Digital Marketing Campaigns in the World: Mastering the Art of Customer Engagement, London: Kogan Page. 2011. SCHAU, H. J.; GILLY, M.C. We are what we post? Self-presentation in personal web space. Journal of Consumer Research, v. 30, n. 3, p. 385–404, 2003. 6


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