Margarida Medeiros
2018
Agradecimentos
O resultado deste trabalho não teria sido possível sem os meus pais, avó materna e toda a minha família, que, com muito carinho, apoio e paciência, não mediram esforços para que eu chegasse até aqui. Ao meu namorado por estar sempre presente e dando o seu apoio incondicional. Queria também agradecer a ajuda do Doutor Martinho e do Senhor Nuno, do Museu de Arte Sacra, pela disponibilidade em facilitar a minha pesquisa sobre a Sé. Ao Antero, à Sofia e ao Vitor da loja ACVideo, onde realizei o estágio foram pessoas sempre dispostas a ajudar. Por fim, e não menos importante, aos coordenadores Carol Aguiar, Isabel Lucas e Paulo Pimenta, e a todos os professores do curso, pelas dicas, pelos sermões, pela paciência, principalmente. Não poderia deixar de agradecer aos meus colegas de turma pela entreajuda e amizade. A todos que permitiram que este livro seja uma realidade, muito obrigada.
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Construção
A
Sé do Funchal foi ordenada construir expressamente “ junto ao povoado” por D. Manuel I, pai de D. João III, em 1485, no centro do burgo quinhentista da cidade do Funchal, num sítio estratégico, junto ao mar, na margem poente entre as Ribeiras de Santa Luzia e de São João . Na prospera cidade açucareira, onde já se centralizariam bastantes das atividades comerciais da afadigada zona mercantil, com uniões aos principais centros e
surgidouros da Europa e onde distinguiam presença mercadores de diversas paragens.
A construção do edifico ter-se-á iniciado em 1493, em 1508 foi abençoada, continuando assim as obras ainda por mais alguns anos mas com desânimos e falta de financiamento, com chamadas de atenção do rei, sobre desleixada cobrança do imposto do vinho. A Alfandega retira 1000 arrobas de açúcar, para o custo das obras. Erigida também com donativos da população e com os impostos sobre o comércio do açucar, para ter continuidade como centro religioso da diocese da Sé do Funchal e uma meta no desenvolvimento da cidade, hoje em dia a igreja ocupa um lugar de símbolo religioso e político, espelho da riqueza produzida na ilha e da grande importância estratégica do arquipélago da Madeira.
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Igreja da Sé Portal
A
Igreja da Sé tem aproximadamente 1540m2, com planta gótica de cruz latina com três naves, transepto e cabeceira. A influência manuelina faz sentir-se nos pormenores decorativos, nas esferas armilares, nos capitéis de colunelos das janelas e na balaustrada no terraço da capela do Santíssimo, onde carateriza a Cruz de Cristo, que também podemos encontrar nos fechos das abóbadas. É possivel que tivesse havido uma construção manuelina na área do adro hoje virado à Rua do Aljube, a acreditar num óleo de Max Römer (pintor) datado de 1946, onde aparece um portal manuelino e que poderia ter sido o que restava da inicial instalação do cabido, antes da
construção do edificio a meados do sé culo XVIII. Esse mesmo portal tem ogivas de oito arquivoltas, com o último alteado, onde se inscreve o que parece uma custodia e é rematado com as armas portuguesas. As arquivoltas do portal apresentam uma requintada decoração de folhagens e frutos nos capitéis e no penúltimo dos arcos ogivais de remate de toda a composição do portal.
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Torre Rosácea
A
torre adossada, que se ergue a uma enorme altura (aproximadamente 52 metros) ainda é o marco principal da cidade sobre a malha urbana envolvente. de seção quadrada, junto ao transepto do lado do Evangelho, expõe grandes escadarias iluminadas por frestas, próprias do estilo gótico, de acesso ao caracol com 158 degraus, cantaria basáltica, duas salas. No primeiro e segundo compartimento, há pequenas janelas góticas em cantaria saliente, no piso sacristia, uma enorme janela, o piso dos sinos, o ultimo antes do coruchéu, é aberto por 6 enormes arcos, dois em cada lado, onde estão os 6 sinos, no terraço encontra-se o relógio rematado por ameias à maneira dos
castelos medievais.
De seção a primeira com abóbada nervada com bocetes e porta de arco quebrado de acesso ao antigo coro e piso no alto com vãos de arcos ogivais nas quatro direções. Terminada por eirado, com ameias de efeito decorativo, troncocónico e um coruchéu de azulejos mudéjares, monocromos, a verde, azul, branco, mel e castanho. A atual imagem da Diocese as alvenarias aparelhadas de cantaria avermelhada da Região, material de fácil trabalho e, por isso, muito utilizado nos primeiros 2 séculos do povoamento. O pano central da fachada é na totalidade em cantaria avermelhada aparente do Cabo Girão, apresenta dois registos separados por uma pequena cornija. O registo é marcado por uma elegante rosácea, com grilhagens de fino corte, desenvolvendo por motivo central uma delicada cruz de cristo, que remata também as empenas no seu eixo central, sobre base alteada, que repete com outra dimensão, a encimar estão a larga cornija superior, sendo o registo inferior marcado pelo portal.
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Cabeceira Gárgula
É
forrada a cantaria vermelha, com abside facetada, com quatro contrafortes de andares escadeados, com frisos separadores, sustentando a abóboda da capela-mor.
Tem
gárgulas facetadas para escoamento de águas dos terraços e acabam em pináculos troncocónicos concluídos por esferas. A cabeceira tem duas longas frestas rampeadas com arco ogival, com capiteés vegetalistas a noroeste e de cariz antropomórfico a sudoeste. A caracterização estilística deve integrar-se no sentido do gótico final, gótico quatrocentista pós- batalhino, onde uma raiz despojada ganha uma carga decorativa, sob
diversas influências, princípios estilísticos multiculturais, de geografias e posições conceptuais muito diversas ou até mesmo antagónicas.
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Nave Central
A
nave central é separada pelo cruzeiro, da capela-mor, cuja construção foi oferecida por D.Manuel I. O arco triunfal apresenta duas arquivoltas quebradas, com elegantes caireis, com capiteis esculpidos com cenas zoomórficas. A nave central é também mais elevada, prossegue para a zona do cruzeiro, seguindo desta perpendicularmente os 2 braços do transepto com a mesma altura, no entanto, só cruzam na estrutura do telhado, formando neste uma excelente interseção. O teto, de grande complexidade, é um raro exemplo em Portugal pelo estado original, pela dimensão, riqueza a nível decorativa, de idêntica raridade, o retábulo da Sé
constitui um único exemplo em Portugal de uma estrutura retabular de talha e pintura na integra no sítio de origem.
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Capela-mor
A
o contrário das naves, apresenta como nas capelas laterais, uma abóboda nervada de cruzaria de ogivas, decorada com bocetes heráldicos, em cadeia longitudinal, a esfera armilar, Cruz de Cristo e as armas reais, para além de elemento vegetalistas. A capela-mor e o retábulo é a única estrutura que permanece in situ, no conjunto da pintura primitiva portuguesa conhecida. No interior da capela-mor, salientam-se duas frestas onde foram colocadas, em julho de 1959, 2 vitrais de J. Rebocho. O que tem mais destaque na capela-mor é a
obra de talha do cadeiral e o próprio retábulo restaurado há sensivelmente pouco tempo. O pano de fundo desta capela está ocupado com um políptico ( quadro pintado em vários panéis ), constituído por uma maravilhosa coleção de tábuas destinadas ao mestre Lourinhã, ou até um conjunto de pintores ligados ao mestre Lourinhã, de origem flamenga. É emoldurado por uma talha do gótico final e encimado com um largo sobrecéu entalhado e esvaziado. No centro esta a Virgem e o Calvário, que existe alguns elementos escultóricos do Museu de Arte Sacra.
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Cadeiral dos Cónegos
U
ma obra manuelina de excelência e foi recentemente atribuído a Mestre Machim Fernandes a realizar até 1512 o cadeiral de Santa Cruz de Coimbra, com semelhanças com o Funchal. A estrutura compositiva e decorativa do Cadeiral do Funchal tem parecenças com o da Catedral de Yuste, em Espanha, onde modelos do gótico final mostram igualmente elementos do protorrenascimento. Um santoral corrido ao longo da fiada de cadeiras superiores, designada aos capitulares, sentes em estreitas bases. O cadeiral abrange duas ordens de cadeiras corais, uma mais alta destinada aos cónegos e a inferior aos capelães. A parte alta acaba com um baldaquino onde se
encontra finamente esculpido um rendilhado numa talha dourada. Sobre cada um dos assentes da parte superior esta esculpida uma imagem que é considerado ser de um apóstolo ou de algum profeta. Nas costas dos 22 cadeiras, as imagens esculpidas mostram vestes amplas e concebidas num estilo de influencia flamenga. Na parte de baixo, os remates das cadeiras dos capelães, como os braços e a parte inferior dos bancos moveis são ornados com pequenas figuras que ocorrem a imaginação, a fé, a ironia, sátira dos artistas que realizaram.
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Pia de água Púlpito
C
om repinte grosseiro nos dias de hoje, de recorte sextavado com base troncocónica e elemento encordoado, tambem em mármore brecha da Arrábida, como a mesa do altar-mor.É um pequeno altar manuelino, ficando pela boca do poço, estas pias encontram-se nas portas sul e norte. O púlpito e a pia batismal foram oferecidos pelo rei D. Manuel e foram talhados em pedra Arrábida . O púlpito tem uma forma cilíndrica e está suportado por uma coluna de aproximadamente 2 metros, composta de base, fuste e capitel. A escada que dá acesso a esse mesmo púlpito é maciça e tem um pequeno muro que se
adapta como um corrimão. Na parte de fora da escadaria do púlpito, estão esculpidas várias letras, como uma forma de assinatura, de identificar os pedreiros que por ali passaram . A sua cobertura é docel, uma obra de fins do século XVII, sendo, assim, da mesma altura que a construção dos altares das naves laterais.
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Senhor Bom Jesus Santo António
O
retábulo do Senhor Bom Jesus é considerado como uma obra tardo maneirista com algumas lembranças do estilo flamengo, com uma estrutura global já particular do renascimento, havendo a semelhança entre os traços deste altar e o antigo camarim da Sé. A sua estrutura apresenta duas ordens arquitetónicas, na parte superior e na parte inferior, 4 colunas que intermitam as variadas pinturas existentes,
no cimo esta o óculo que envolve a rosácea e dois anjos reclinados em vulto.
No lado oposto ao altar de Bom Jesus, está o altar Santo António, é um antigo altar do século XVI, este mesmo altar tem traços que o aproximam imenso do altar de Bom Jesus, tendo 2
níveis suportados por 2 conjuntos de colunas salomónicas ornadas com flores, folhas , cachos, aves e anjos. Também com um óculo superior entalhado envolvendo a rosácea do transepto e mais 2 anjos reclinados coroam a estrutura lateral.
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Santíssimo Sacramento
A
capela do Santíssimo Sacramento encontra-se no lado esquerdo da capela-mor , mandada construir pelo rei D. Manuel, continua com o mesmo traço gótico da capela do Amparo. A abóboda está ornamentada por nervuras que se tocam no centro e prendem-se por chaves onde estão esculpidos vários símbolos eucarísticos ( o cordeiro, espigas de trigo, cacho de uvas). As talhas de porcelana chinesa que se encontram nesta capela foram adquiridas no leilão de espólio de D. Luís Rodrigues Vilares, em 1811.
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Nossa Srª. da Assunção Custódia
O
retábulo preenche toda a parede fundeira da capela-mor por detrás da antiga banqueta do altar, onde 6 elegantes pilastras molduram 5 faces do políptico na vertical , dividida em 3 níveis horizontais. No alinhamento central, em baixo o sacrário de finos recortes vazados e estrutura gótica final. Ao centro, em nicho profundo sobre base coeva, sendo a imagem de Nossa Senhora da Assunção. O Ostensório ( custódia ) utilizado para a exposição da hóstia consagrada à adoração dos fiéis, ostensório em ouro cinzelado revelado e vazado e aplicações
de crisoberilos, apresenta características formais do período artístico neoclássico e emoldura-se na tipologia de “ ostensórios radiantes”, devido ao facto de o recetáculo da hóstia ser rodeado por uma auréola radiante, chamando as radiações de luz. Os elementos decorativos da custódia remetem assim para o tema de morte sacrificial e da ressurreição de Jesus Cristo ( o cordeiro sentado sobre o livro do apocalipse, a mítica ave fénix com poder de renascer das cinzas; pelicano que alimenta as crias com a sua própria carne e sangue; altar do sacrifícios espigas de trigo e videira, o pão e o vinho são símbolos eucarísticos do corpo e sangue de Jesus Cristo.
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Campainha Sacras
U
m cuidadoso trabalho rico em motivos florais e vegetalistas que vem a preencher toda a superfície desta campainha, desde a campânula até à extremidade do mastro. Pouco se percebe em concreto, haverá a possibilidade que esta mesma campainha seja mencionada no livro de contas da Confraria do Santíssimo Sacramento, em 1817. As sacras são tabelas com alguns textos inalteráveis da missa, postas sobre o altar como auxiliar de memória para o celebrante. Entre as sacras que exibimos,
podemos ver, na maior, um medalhão com o trigrama “ JHS “ envolvido por uma banda com uma interessante inscrição do livro de Isaías (24): “ Glorificai nas ilhas do mar o nome do Senhor”- uma alusão, talvez, à especificidade geográfica do lugar- a Ilha para a qual foram concebidas estas sacras.
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Bibliografia Planta da Sé
Gomes, Cónego Vítor. Almanaque. (2017). Funchal: PEF, pp. 95-117. Carita, Rui. (2015). A Sé do Funchal 1514-2014. Funchal: Governo da Região Autónoma da Madeira,pp.33-219 Freitas, Diva. (2014). Intervenções de Reabilitação do Património Monumental da RAM: a Sé do Funchal. Islenha, 54, pp. 39-55. Sousa, Francisco. António Clode . (2018). Obras Referência dos Museus da Madeira. Funchal: Facsimile, Lda, pp. 116-128 Sousa, Francisco. António Clode . (s.d.). Sé Catedral. Funchal: ACD Print, S.A, pp. 5-85
Ficha Técnica Título: Aprendendo com a Sé do Funchal Autor: Margarida Medeiros Revisão: Vera Carvalho Colobaração: Professor Martinho, Senhor Nuno, Professora Rita, ACVídeo, Senhor Bruno, Graça Medeiros, Carlos Medeiros, Cecília Pereira, Miguel Sousa, Magda Santos. Apoio Cientifico Pedagógico: Carol Aguiar, Isabel Lucas, Paulo Pimenta, Vera Carvalho. Fotografias: Margarida Medeiros Edição: Margarida Medeiros Capa: Margarida Medeiros Design: Margarida Medeiros 1ª Edição, Escola Secundária de Francisco Franco, Funchal, 2018 Impressão: Style Publicidade- Toldos