Livro: Questões de cenografia II - cenografia no teatro e em outros contextos

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ISMAEL SCHEFFLER E SIMONE LANDAL (ORGS.)

QUESTÕES DE CENOGRAFIA II Cenografia no teatro e em outros contextos

1ª edição

Curitiba Arte Final 2016


As opiniões expressas nos artigos são de inteira responsabilidade dos autores. A publicação de artigos, fotos e desenhos foi autorizada pelos responsáveis ou seus representantes. Capa: Arte Final (artefinalizando@gmail.com) Foto: Cayo Vieira. Espetáculo: Alice no País das Maravilhas (Roteiro: Beto Lanza. Direção: Alfredo Gomes e Beto Lanza. Cenografia: Alfredo Gomes. Bonecos: Alfredo Gomes, Inecê Gomes e Amábilis de Jesus). Pivete Cia de Arte, Curitiba, PR. Produção Editorial: Ismael Scheffler Organização: Ismael Scheffler e Simone Landal Para contatos sobre esta publicação ou sobre o Curso de Especialização em Cenografia da UTFPR: Universidade Tecnológica Federal do Paraná – Campus Curitiba Departamento Acadêmico de Desenho Industrial Curso de Especialização em Cenografia Av. Sete de Setembro, 3165 – Rebouças – Curitiba – PR – CEP 80230-901 E-mail: cenografia-ct@utfpr.edu.br

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA – Este livro não pode ser comercializado.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

E82

Questões de cenografia II [livro eletrônico] : cenografia no teatro e em outros contextos / Ismael Scheffler, Simone Landal (orgs.). – 1. ed. -- Curitiba : Arte Final, 2016. Vários autores. Bibliografias. ISBN : 978-85-68616-03-1 1. Teatro – Cenografia e cenários – Estudo e ensino. 2. Teatro infantojuvenil. 3. Animação cultural. 4. Espaços públicos. 5. Espaço (Arte). 6. Criação na arte. 7. Arte – Exposições – Cenografia e cenários. 8. Arquitetura de interiores. 9. Artes – Estudo e ensino – Curitiba (PR). 10. Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curso de Especialização em Cenografia. I. Scheffler, Ismael, org. II. Landal, Simone, org. CDD (22. ed.) 792.025 Biblioteca Central da UTFPR, Câmpus Curitiba


SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO..................................................................................................................... 6 PUBLICAÇÕES RELACIONADAS ......................................................................................... 8 RESUMOS ................................................................................................................................. 9

PARTE I - CENOGRAFIA TEATRAL ......................................... 13 1. POSSIBILIDADES CENOGRÁFICAS NO TEATRO DE ANIMAÇÃO: DESDOBRAMENTOS E TRANSFORMAÇÕES DA IMAGEM NO ESPAÇO................... 14 Marcos Araújo de Oliveira

2. A CENOGRAFIA DE ESPETÁCULOS PARA CRIANÇA NO ESPAÇO ESCOLAR .... 27 Élcio Levi Brandão Diniz 3. O TEATRO FORA DO TEATRO: APROPRIAÇÃO DE ARQUITETURAS URBANAS EM ESPETÁCULOS TEATRAIS ........................................................................................... 41 Ana Luiza Suhr Reghelin 4. A ESCRITA CENOGRÁFICA NO TRABALHO DE FERNANDO MARÉS COM A COMPANHIA BRASILEIRA DE TEATRO ENTRE OS ANOS DE 2010 E 2012 ............... 58 Paulo Vinícius Alves 5. A TIPOGRAFIA COMO ELEMENTO CENOGRÁFICO ................................................. 72 Juliane Brito Scoton 6. O USO DO CARRO COMO DISPOSITIVO CENOGRÁFICO NO ESPETÁCULO ROMEU E JULIETA DO GRUPO GALPÃO .......................................................................... 87 Victor Hugo Carvalho de Oliveira 7. A APROPRIAÇÃO POR GERALD THOMAS DAS OBRAS DE MARCEL DUCHAMP ................................................................................................................................................ 103 Gina Mara Age do Amaral 8. CENOGRAFIA PARA O PÚBLICO INFANTIL ............................................................. 116 Maricélia Romero


PARTE II - CENOGRAFIA APLICADA EM DIFERENTES CONTEXTOS .................................................................................. 133 9. A CENOGRAFIA NO ESPAÇO EXPOSITIVO: ASPECTOS HISTÓRICOS DA CENOGRAFIA EM EXPOSIÇÕES ...................................................................................... 134 Virgínia Escóssia da Rocha Pitta e Simone Landal 10. CENOGRAFIA APLICADA A EXPOSIÇÕES EM MUSEUS DE ARTE. MARMUSEU DE ARTE DO RIO DE JANEIRO .......................................................................... 150 Marina Moraes de Araújo e Simone Landal 11. A RELAÇÃO ENTRE CONCEITOS DE ARQUITETURA DE INTERIORES E CENOGRAFIA EM LOJA CONCEITO ............................................................................... 164 Keila Rafaela Zeni

12. CENOGRAFIA APLICADA AO VITRINISMO ............................................................ 182 Fernnanda Driessen 13. MAGIA TEATRAL EM ATRAÇÕES DE PARQUES TEMÁTICOS ........................... 198 Juliana Luiza Choma 14. ESPAÇOS PÚBLICOS: UM POTENCIAL CULTURAL .............................................. 217 Anelise Bassani Gueri APÊNDICES .......................................................................................................................... 230 A) Ementas das disciplinas do II Curso de Especialização em Cenografia (2013-2014) ... ............................................................................................................................................ 230 B)

II Seminário de Cenografia ...................................................................................... 233

C)

Seminário de Design Cênico: elementos visuais e sonoros da cena ........................ 234

D)

Exposição Maquetes Cenográficas .......................................................................... 237


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APRESENTAÇÃO

Esta publicação reúne os artigos produzidos como trabalhos de conclusão dos alunos da segunda turma do Curso de Especialização em Cenografia (2013-2014), realizado pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná, em Curitiba, PR. Os textos aqui apresentados refletem os diversos interesses dos alunos provindos de diferentes áreas de formação e experiências profissionais, principalmente do Teatro, da Arquitetura e Urbanismo, das Artes Visuais e do Design. Embora o curso tenha uma abordagem principal voltada à cenografia teatral, no que se refere às pesquisas finais, há abertura para a exploração de temas mais abrangentes. Os interesses dos alunos se dirigem, como a própria cenografia tem experimentado, a campos que englobam além da cenografia para a cena, a cenografia aplicada a espaços expositivos, à decoração de interiores, ao vitrinismo e a parques temáticos. Nesta publicação, os artigos foram agrupados em duas partes: Cenografia teatral e Cenografia aplicada em diferentes contextos. Entre estudos de caso e estudos conceituais, o leitor poderá transitar por diferentes reflexões e referências que tomam práticas e pesquisas nacionais e internacionais. Em alguns estudos, se pode observar o interesse pelo contexto imediato, dando esta publicação, em certa medida, uma aproximação à cenografia no contexto curitibano. Embora a UTFPR não ofereça cursos de graduação em áreas artísticas, diversas ações tem sido empreendidas a partir do Departamento Acadêmico de Desenho Industrial que possui em seu corpo docente profissionais de áreas afins à cenografia. Para este curso de especialização, além de professores da própria universidade, também houve a colaboração de professores de outras instituições, inclusive de outros estados brasileiros, o que permite a viabilização e o enriquecimento do curso na UTFPR. Em sua segunda edição, o curso contou com os seguintes professores: Ivone Terezinha de Castro (UTFPR), Eliane Betazzi Bizerril Seleme (UTFPR), Laíze Márcia Porto Alegre (UTFPR), Simone Landal (UTFPR), Ismael Scheffler (UTFPR), Maurini de Souza (UTFPR), Amábilis de Jesus da Silva (UNESPAR/FAP), Nádia Moroz Luciani (UNESPAR/FAP), Walter Lima Torres Neto (UFPR), Alfredo Gomes Filho (Proscenium Cenografia), José Dias (UNIRIO/ UFRJ) e André Carreira (UDESC). O programa curricular da segunda turma do curso (2013-2014) correspondeu as seguintes disciplinas: História da cenografia e do lugar teatral; Sociedade e espaço teatral; A modernização teatral e a cena contemporânea; História das Artes Visuais; Interdisciplinaridade artística contemporânea; Introdução à dramaturgia; Apropriação e memória da arquitetura; Projetos e registros cenográficos; Composição visual em cenografia; Atelier de criação plástica; Atelier de materiais e SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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técnicas cenográficas; Laboratório de experimentação espacial; Laboratório de iluminação cênica; Análise dramaturgia, cênica e cenográfica; Cenografia aplicada a exposições; Metodologia da Pesquisa (as ementas estão disponíveis ao final da publicação). Durante o curso, além das 470 horas-aulas, os alunos também realizaram visitas técnicas ao auditório da UTFPR, às salas do Teatro Guaíra, ao Teatro Positivo e ao atelier de cenografia Proscenium/ Villa Hauer Cultural. Em atividades paralelas propostas pelo curso, tiveram a oportunidade de conhecer o trabalho cenográfico realizado na Rede Globo de Televisão por meio de sua colaboradora Janaína Marchioro (arquiteta e ex-aluna da primeira turma do curso) e do curitibano Paulinho Maia, com ampla e significativa experiência em figurinos e cenografia em teatro e em dança. Além disto, puderam participar do Seminário de Design Cênico: elementos visuais e sonoros da cena, realizado na UTFPR em novembro de 2013, evento que contou com a participação de pesquisadores e profissionais de cenografia, iluminação cênica, figurino, maquiagem e sonoplastia de nove estados brasileiros, além da contribuição do cenógrafo francês Jean-Guy Lecat, vindo ao Brasil especialmente para o evento. Outra atividade significativa no percurso do curso foi a exposição Maquetes Cenográficas, realizada no SESC Água Verde, em Curitiba, durante o Festival Palco Giratório na capital paranaense, em agosto de 2014. Um grupo de alunas trabalhou no projeto expográfico aplicando conhecimentos do curso para a realização desta exposição que incluiu diferentes trabalhos realizados ao longo do curso. De 04 a 06 de dezembro de 2014, foi realizado o II Seminário de Cenografia, que além de contar com a participação do cenógrafo e figurinista Carlos Kur, deu oportunidade para que vários alunos do Curso de Especialização apresentassem publicamente suas pesquisas. Após a publicação do livro Questões de Cenografia I, em 2014, esperamos novamente contribuir, por meio desta edição, com a disponibilização de material bibliográfico no campo da cenografia. A todos, uma excelente leitura! Prof. Dr. Ismael Scheffler Coordenador do Curso de Especialização em Cenografia UTFPR

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PUBLICAÇÕES RELACIONADAS

Questões de Cenografia I O livro traz cinco textos de autores diferentes referentes ao campo da cenografia, elaborados em torno da primeira turma do Curso de Especialização em Cenografia da UTFPR: Ismael Scheffler: Formação em cenografia e os Cursos de Especialização em Cenografia da UTFPR ; Maria Cristina Gomes de Araújo: O processo criativo da cenografia no Grupo Obragem de Teatro ; Larissa Kaniak Ikeda: Wielopole, Wielopole: um universo de Tadeusz Kantor ; Juliana Perrella Longo: O uso da cenografia em museus e espaços expositivos ; Luciana Galvão Dombeck: Cenografia aplicada a ambientes comerciais.

SCHEFFLER, Ismael; PORTO ALEGRE, Laíze Márcia (Orgs). Questões de cenografia I . Curitiba: Arte Final, 2014. 151 p. Maquetes cenográficas: catálogo da exposição Este catálogo registra a exposição Maquetes cenográficas realizada no SESC Água Verde, em Curitiba, PR, em agosto de 2014, durante o Festival Palco Giratório, nesta cidade. A exposição apresentou maquetes realizadas pelos alunos do II Curso de Especialização em Cenografia (2013-2014), em três diferentes disciplinas. Também apresentou diferentes elementos do processo de criação da cenografia do espetáculo Babel, enfatizando a importância das maquetes, criado em 2013 e apresentado em 2013 e 2014, por dois programas de extensão universitária da UTFPR, que trabalharam associados: o TUT (Grupo de Teatro da UTFPR) e o PEDC (Programa de Extensão Desenvolvimento Cenográfico).

SCHEFFLER, Ismael (Org.) Maquetes cenográficas: catálogo da exposição . Curitiba: UTFPR, 2014. 48 p. Anais do Seminário de Design Cênico: elementos visuais e sonoros da cena O Seminário de Design Cênico: elementos visuais e sonoros da cena foi realizado na UTFPR, Curitiba - PR, de 06 a 09 de novembro de 2013. Nos Anais do evento, estão publicados os 12 resumos expandidos selecionados pelo Comitê Científico. São cinco trabalhos que enfocam na temática figurino, dois que abordam as propostas cênicas do grupo Teatro da Vertigem e cinco trabalhos que enfocam temas relacionados à iluminação cênica, à fotografia e a outras mídias. Entre os trabalhos selecionados, encontram-se pesquisas realizadas em cursos de graduação e em programas de pós-graduação de diferentes regiões do Brasil.

Seminário de Design Cênico: elementos visuais e sonoros da cena, 2013, Curitiba. Anais... Curitiba: UTFPR, 2013. (Org. Ismael Scheffler) 83 p. Babel: o processo de criação do espetáculo teatral - catálogo da exposição. Este catálogo documenta dois importantes projetos de extensão e pesquisa realizados na UTFPR, em Curitiba, no ano de 2013: o espetáculo teatral "Babel" e a exposição "Babel: o processo de criação do espetáculo teatral". Apresenta o percurso criativo do espetáculo "Babel", desenvolvido por dois programas de extensão da UTFPR: o Programa de Extensão Desenvolvimento Cenográfico e o TUT - Grupo de Teatro da UTFPR. São apresentadas informações sobre o processo criativo e uma seleção de fotos que retratam o espetáculo.

SCHEFFLER, Ismael (Org.) Babel : o processo de criação do espetáculo teatral : catálogo da exposição. Curitiba: UTFPR, 2013. 78 p.

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RESUMOS

PARTE I – CENOGRAFIA TEATRAL 1. POSSIBILIDADES CENOGRÁFICAS NO TEATRO DE ANIMAÇÃO: DESDOBRAMENTOS E TRANSFORMAÇÕES DA IMAGEM NO ESPAÇO Marcos Araújo de Oliveira Este artigo tem por objetivo apontar questões inerentes ao uso do espaço no Teatro de Animação. Usando como referência os estudos de Paulo Cesar Balardim Borges e Osvaldo Anzolin, analisa-se o espetáculo Voyageurs Immobiles, de Philippe Genty, para observar o espaço enquanto imagem única. Analisa-se ainda, a cenografia em transformação nas proposições de Alfredo Gomes Filho, da Pivete Cia de Arte, na qual mantem-se os espaços definidos para ator e objeto. Nesses dois estudos de caso, busca-se observar a cenografia como um discurso, potencializando as suas funções em cena. Palavras-chave: Cenografia. Teatro de Animação. Espaço Cênico.

2. A CENOGRAFIA DE ESPETÁCULOS PARA CRIANÇA NO ESPAÇO ESCOLAR Elcio Levi Brandão Diniz Este artigo traz uma reflexão sobre espetáculos teatrais infantis apresentados em escolas públicas de Curitiba. Atendo-se principalmente às questões de espacialidade e cenografia, o texto procura estabelecer uma interlocução entre as pontuações de Agustín Escolano e Viñao Frago a respeito do espaço escolar e reflexões de pesquisadores da área do teatro, como Osvaldo Gabrieli, André Carreira e Walter Lima Torres Neto. A fim de investigar o potencial de uso cênico dos ambientes da escola, o artigo reflete sobre o modo como se organiza o espaço escolar e como se estabelece o espaço teatral dentro deste contexto, além de verificar o papel do cenógrafo em realizações cênicas desta natureza. O artigo se propõe, então, a problematizar questões artísticas e cenográficas dos espetáculos levados às escolas, procurando compreender como se dá o espaço do teatro dentro do espaço da escola. Palavras-chave: Cenografia. Teatro infantil. Espaço. Escola.

3. O TEATRO FORA DO TEATRO: APROPRIAÇÃO DE ARQUITETURAS URBANAS EM ESPETÁCULOS TEATRAIS Ana Luiza Suhr Reghelin A modernização teatral trouxe novas possibilidades para o trabalho com atores, a encenação, a cenografia e também a utilização do espaço teatral. É sobre as transformações ocorridas no espaço teatral que este artigo irá tratar, mais especificamente sobre as experiências que foram desenvolvidas em espaços não teatrais, em especial na ocupação de arquiteturas da cidade. O artigo relaciona experiências de apropriação destes espaços não só fisicamente, mas também das simbologias e historicidade inerentes a eles. Palavras-chave: Teatro contemporâneo. Espaço teatral. Teatro na cidade.

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4. A ESCRITA CENOGRÁFICA NO TRABALHO DE FERNANDO MARÉS COM A COMPANHIA BRASILEIRA DE TEATRO ENTRE OS ANOS DE 2010 E 2012 Paulo Vinícius Alves Este texto apresenta uma revisão da cenografia no teatro a partir do início do século XX, propondo, numa abordagem histórica, a fim de articular a compreensão do conceito de “escrita cenográfica” ou “dramaturgia cenográfica” do trabalho que o cenógrafo Fernando Marés desenvolveu com a Companhia Brasileira de Teatro de Curitiba entre os anos de 2010 e 2012. O artigo enfoca a abordagem da cenografia como dramaturgia visual de um espetáculo, tornando a espacialidade como signo atuante para a construção e a recepção da cena teatral. Apresenta-se um recorte específico de pensadores e propulsores da evolução cenográfica no século XX, para então relacioná-los com o trabalho de Fernando Marés. Destaca-se, nessa base histórico teórica, os estudos de Roubine (1998) e Lehmann (2007). Palavras-chave: Cenografia. Evolução cenográfica. Fernando Marés.

5. A TIPOGRAFIA COMO ELEMENTO CENOGRÁFICO Juliane Brito Scoton Este artigo tem como objetivo apresentar e discutir os possíveis usos da tipografia no âmbito da cenografia teatral. Seu desenvolvimento é traçado por uma pesquisa bibliográfica sobre a história da tipografia, seus usos e sua relação com as artes, para que seja possível compreender sua função; em seguida, é estudada a tipografia no contexto teatral, em que a palavra é mais comumente falada do que escrita; e, por fim, é proposto o estudo de caso da montagem Amorfo, no qual este uso é explorado, comprovando que a presença da tipografia na cenografia pode auxiliar na contextualização da narrativa, na interpretação da obra e que interfere diretamente na dramaturgia. Palavras-chave: Cenografia. Tipografia. Dramaturgia.

6. O USO DO CARRO COMO DISPOSITIVO CENOGRÁFICO NO ESPETÁCULO ROMEU E JULIETA DO GRUPO GALPÃO Victor Hugo Carvalho de Oliveira Partindo de fontes iconográficas (fotos e videodocumentário), esta pesquisa é um estudo de caso que visa descrever e analisar a função cênica e a dimensão simbólica do uso do carro (Veraneio) como dispositivo cenográfico, na montagem do texto dramático Romeu e Julieta (1992) de William Shakespeare, apresentada pelo Grupo Galpão com encenação e cenografia de Gabriel Villela. Assim, o interesse com este artigo é discutir o trabalho teatral de um agente criativo que acumula as funções de encenador e cenógrafo, focando no resultado cênico do uso do dispositivo cenográfico. Palavras-chave: Encenação. Cenografia. Dispositivo cenográfico.

7. A APROPRIAÇÃO POR GERALD THOMAS DAS OBRAS DE MARCEL DUCHAMP Gina Mara Age do Amaral O propósito deste artigo é compreender a apropriação feita por Gerald Thomas, diretor brasileiro de teatro, das obras de arte de Marcel Duchamp, com enfoque na Roda de Bicicleta (1913). Thomas utiliza-se desta obra na criação do espetáculo Carmem Com Filtro 2 (1986), por meio do procedimento de fragmentação artística, com grande atenção aos detalhes e à plasticidade de seu trabalho, deixando também em voga o estilo de apropriação por ele adotado. Desse modo, será estudado como foi feito tal espetáculo, em relação aos objetos apropriados. Foram utilizados a abstração de espectadores que assistiram à peça, relatos de críticos, vídeo e livros opinativos acerca da Arte para fazer esta pesquisa. Palavras-chave: Apropriação teatral. Roda de Bicicleta. Gerald Thomas. Marcel Duchamp.

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8. CENOGRAFIA PARA O PÚBLICO INFANTIL Maricélia Romero Este artigo é sobre a cenografia para as crianças. Nele, destaco os seguintes tópicos: a importância de uma cenografia concebida de forma que respeite os pontos de vista da história encenada, do fluxo dos atores em cena e do público. Levando em conta que esses tópicos devem ser pensados juntamente com as questões relativas ao espaço onde se desenvolverá a cena, busquei saber como foi a percepção da mudança do espaço durante o desenrolar da peça, sabendo ser este, um ambiente frequentado diariamente pelo público e, finalmente, listei essas percepções, utilizando o método de pesquisa exploratória em informações obtidas por meio de entrevista com dois professores e um aluno. Todos os entrevistados conhecem bem o ambiente escolar pesquisado e assistiram a transformação do mesmo durante apresentação da peça que norteou esta pesquisa. Palavras-chave: Cenário. Teatro infantil. Escola.

PARTE II – CENOGRAFIA APLICADA EM DIFERENTES CONTEXTOS 9. A CENOGRAFIA NO ESPAÇO EXPOSITIVO: ASPECTOS HISTÓRICOS DA CENOGRAFIA EM EXPOSIÇÕES Virgínia Escóssia da Rocha Pitta e Simone Landal O presente artigo tem como objetivo investigar por que algumas exposições de arte utilizam a cenografia como linguagem expositiva. Para isso, será estudado e analisado o histórico das exposições de arte com a intenção de compreender em que momento a cenografia entra nesse contexto. As exposições se inserem numa conjuntura que vai além do espaço expositivo da galeria, fazendo parte do sistema das artes. Percebe-se que os novos formatos expositivos, apropriando-se ou não da cenografia, parecem ter surgido ao longo dos movimentos artísticos e dos questionamentos que envolvem o conceito do que seja arte. Partindo desse estudo, serão realizados paralelos entre os fatores históricos e os elementos que caracterizam as exposições de arte hoje. Conclui-se que a cenografia, como elemento do universo teatral, foi absorvida pelo espaço expositivo por ser um elemento comunicador e facilitador entre obra e espectador. Palavras-chave: Exposições de arte. Espaço expositivo. Cenografia para exposições. Cenografia como linguagem.

10. CENOGRAFIA APLICADA A EXPOSIÇÕES EM MUSEUS DE ARTE. MAR- MUSEU DE ARTE DO RIO DE JANEIRO Marina Moraes de Araújo e Simone Landal Este artigo tem como objetivo investigar aspectos da cenografia aplicada a exposições de arte. Para pensar as características dessa atividade, foi necessário buscar referências bibliográficas que abordassem o tema, relacionando com o conceito do cubo branco, apresentado pelo autor O’Doherty. Como objeto de estudo são apresentados três exposições recentes do MAR - Museu de Arte do Rio, inaugurado no ano de 2013. A escolha desse museu está relacionada ao interesse pelo estudo do contexto brasileiro, nessa área de atuação, e suas presentes mudanças nas últimas décadas. Palavras-chave: Cenografia aplicada a exposições. Museus. Museu de Arte do Rio. Museu de Arte São Paulo.

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11. A RELAÇÃO ENTRE CONCEITOS DE ARQUITETURA DE INTERIORES E CENOGRAFIA EM LOJA CONCEITO Keila Rafaela Zeni Este artigo descreve alguns dos preceitos de Arquitetura de Interiores e Cenografia que norteiam a execução de um projeto para uma loja conceito, visando salientar a importância de integrá-las para o bom atendimento do seu público-alvo e em consequência valorizar sua visibilidade no varejo. Para tanto foi realizado um estudo de caso no projeto da Flagship Store Barneys em Nova Iorque que recebeu a Gaga´s Workshop no período de Natal de 2011. Por meio da pesquisa bibliográfica e a luz do referencial teórico, podem-se constatar diversos aspectos desta relação, como o entendimento do espaço em prol do cliente ou expectador, assim como observar a diferença entre uma loja comum e uma loja conceito. Em uma loja conceito, os diversos ensinamentos provenientes destas duas áreas, são aplicados de tal forma que a organização do espaço ultrapassa a noção de ornamentação e de apenas decoração; torna-se um espaço em que se impõe historicidade e significados. Palavras-chave: Arquitetura. Cenografia. Loja conceito.

12. CENOGRAFIA APLICADA AO VITRINISMO Fernnanda Driessen Este artigo apresenta uma visão da relação entre a cenografia e a prática do vitrinismo, mostrando como os conceitos utilizados na arte cênica são aplicados no momento da produção de vitrines para lojas de varejo. Inicialmente é feita uma análise das relações da cenografia com o espaço, tempo e questões de linguagem artística. Depois são apresentados exemplos de vitrines conceituais que ilustram o caráter cenográfico aplicado, juntamente com uma análise dos aspectos artísticos, conceituais e cênicos desta prática. Conclui-se que a relação estabelecida entre cenografia e vitrinismo é enriquecedora para as experiências de consumo do comércio varejista. Palavras-chave: Cenografia aplicada. Vitrinismo. Vitrines conceituais.

13. MAGIA TEATRAL EM ATRAÇÕES DE PARQUES TEMÁTICOS Juliana Luiza Choma Este artigo tem como objetivo a compreensão da conexão entre os aspectos tecnológicos e cenográficos de atrações de parques temáticos como forma de criar no visitante uma experiência diferenciada de entretenimento. Através de levantamento bibliográfico e estudo de campo, utilizou-se o brinquedo The Haunted Mansion, localizado no parque Magic Kingdom (complexo Walt Disney World – Florida, Estados Unidos), como estudo de caso para levantamento de histórico, método e conceituação de projeto e resultado final apreendido pelo público. Palavras-chave: Parques temáticos. Cenografia. Magia teatral. The Haunted Mansion.

14. ESPAÇOS PÚBLICOS: UM POTENCIAL CULTURAL Anelise Bassani Gueri Este artigo apresenta-se como uma análise de pesquisas bibliográfica e analítica a partir de estudos dos espaços públicos e seus potenciais culturais, levando em consideração a visão da população sobre a “imagem da cidade”, bem como a fluxos urbanos e eventos culturais. Inclui acontecimentos históricos para esclarecer o diálogo inicial entre sociedade e espaço cultural. Utiliza-se de exemplos localizados no centro da cidade de Curitiba para elucidar o pensamento de potencialidade do lugar e questioná-los quanto às atuais utilizações em aspectos culturais, assim como sobre as influências políticas. Palavras-chave: Espaços públicos. Imagem da cidade. Eventos culturais. Curitiba.

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PARTE I

CENOGRAFIA TEATRAL

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1. POSSIBILIDADES CENOGRÁFICAS NO TEATRO DE ANIMAÇÃO: DESDOBRAMENTOS E TRANSFORMAÇÕES DA IMAGEM NO ESPAÇO Marcos Araujo de Oliveira1

Resumo Este artigo tem por objetivo apontar questões inerentes ao uso do espaço no Teatro de Animação. Usando como referência os estudos de Paulo Cesar Balardim Borges e Osvaldo Anzolin, analisa-se o espetáculo Voyageurs Immobiles, de Philippe Genty, para observar o espaço enquanto imagem única. Analisa-se ainda, a cenografia em transformação nas proposições de Alfredo Gomes Filho, da Pivete Cia de Arte, na qual mantem-se os espaços definidos para ator e objeto. Nesses dois estudos de caso, busca-se observar a cenografia como um discurso, potencializando as suas funções em cena. Palavras-chave: Cenografia, Teatro de animação, Espaço cênico.

Introdução O presente artigo tem por finalidade discutir o uso da cenografia no Teatro de Animação, partindo do pressuposto que esta deve abrigar as ideias da encenação para potencializar seu discurso. Entendendo assim, que cenografia é uma parte indivisível do espetáculo. Servindo-se dos estudos de Paulo César Balardim Borges e Osvaldo Anzolin a pesquisa na busca por uma cenografia viva que pudesse ser vista como parte da própria animação, se deparou com os trabalhos de Phillipe Genty e do cenógrafo Alfredo Gomes Filho da Pivete Cia de Arte. Partindo do trabalho de ambos foi possível identificar questões relevantes para o entendimento da cenografia em simbiose com os demais elementos de cena a ponto de tornar suas fronteiras turvas.

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Marcos Araujo de Oliveira é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). É Licenciado em Educação Artística com Habilitação em Artes Cênicas pela Universidade do Estado de Santa Catarina (2009). Trabalha com confecção e manipulação de bonecos desde 2007. O presente artigo foi orientado pela profa. Dra. Amabilis de Jesus da Silva, da Universidade Estadual do Paraná - Campus Curitiba II – Faculdade de Artes do Paraná. Revisão: Veruska Costa Haber. E-mail: maofluzao@hotmail.com. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Na obra de Phillipe Genty, através do estudo do espetáculo Voyageurs Immobiles, pode-se identificar que a cenografia assume papel de personagem ao ser entendida como uma imagem única em diálogo com o subconsciente do espectador. A escolha pela Pivete Cia de Arte se dá pelo seu desenvolvimento na área de mecanismos para a cenografia. A pesquisa entende que outras companhias desenvolvem trabalhos semelhantes no que tange a cenografia do Teatro realista com bonecos, porém os mecanismos utilizados pelo grupo se destacam como elementos fundamentais da dramaturgia.

Um olhar para a cenografia no Teatro de Animação A história do teatro de animação nos mostra que a escrita do livro Sobre o teatro de marionetes, de Heinrich von Kleist, foi um dos fatores que alavancou o interesse por essa linguagem em diversos artistas do teatro do início do século XX, entre eles Alfred Jarry e Edward Gordon Craig. Desse interesse, muitas discussões foram feitas em torno de suas vantagens, sobretudo, por ser ela um lugar no qual se pode extrapolar a realidade. Marcadamente, essa foi uma época de grandes experimentações, que trouxeram novos entendimentos sobre os modos de interpretação dos atores, incluindo desde o uso das vozes, do corpo, da movimentação, assim como modificações na compreensão da totalidade da cena. A partir daí muitas pesquisas foram realizadas abrindo novas possibilidades no fazer. Em meados do século XX, contudo, a formação de grupos em diversos países ajudou a disseminar essa arte e a buscar os seus limites, as suas fronteiras, para o aprofundamento ou para tentar ultrapassá-los. As linguagens do teatro oriental passam a ser mais visitadas, e o Bunrako, o Nô, o Teatro de Sombras Balinês e Chinês, entre outros, trazem importantes colaborações para que o teatro de animação se desenvolvesse e ganhasse um caráter erudito no ocidente. O que não fez com que o Teatro popular desaparecesse, mas sim, que também se influenciasse por essas novas descobertas. Por um lado, conforme aponta os estudos de Juliano Valdir de Souza (2010), as primeiras manifestações artísticas nessa área, no Brasil, eram voltadas para sua história, sua eruditização ou sua relação de simulacro com o ser humano. Por outro, a década de 1970 foi de grande efervescência, pautando a pesquisa nas possibilidades de utilização dos materiais em cena, novas formas de dramaturgia (incluindo os temas adultos) e o tema “visualidade” tomou outras dimensões. Na atualidade, por exemplo, o surgimento da Móin-Móin - Revista de Estudos sobre Teatro de Formas Animadas em 2005, tem tido um importante papel para a difusão das pesquisas relacionadas a esta área no Brasil. Com o crescente interesse, a

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cenografia e suas funções no Teatro de Animação vem sendo estudadas com mais afinco. Suas múltiplas possibilidades e discursos apontam para uma gama de utilizações que suscitam discussões acerca das escolhas que serão feitas em cada processo de construção de espetáculo. Esse aprofundamento na linguagem do teatro de animação oportunizou perceber alguns princípios relacionados à construção da dramaturgia, intrinsicamente ligada ao próprio entendimento que se deve ter do boneco. Segundo Ana Maria Amaral (1996) a dramaturgia do Teatro de Animação se serve de silêncios e pausas seguidas de movimento. Para a pesquisadora, o boneco é, em sua essência, imagem e movimento. Visto isto, entende-se que o boneco em si já possui discurso, sua presença e sua limitação o levam para um campo de movimentação fragmentada onde um simples gesto ganha potência. É relevante pensar, que ao entender o boneco como imagem provida de significado, o nosso olhar se depara com uma rede de imagens entrelaçadas que compõem o espetáculo, pois tudo aquilo que se vê é dotado de significação. Osvaldo Anzolin (2010) entende o fazer teatral como uma arte da imagem, e enfatiza que na animação a imagem ganha ainda mais força por se tratar do inanimado ganhando vida. Cada elemento posto em cena carrega significados que o ligam à representação, desta forma o autor refuta a utilização de qualquer elemento que não possua função dentro da encenação. Para ele, esta função pode ser imagética: criar através de sua presença uma leitura intelectual do espectador (um lustre majestoso em um palco nu, pode transportar o espectador para um lugar suntuoso); ou instrumental: gerar possibilidade de ação com o elemento ou suportar a ação (qualquer objeto usado diretamente pelo ator seja utensilio ou plataforma de sustentação). É importante levar em consideração que uma função não elimina a outra e não existem absolutismos. Ambas as funções dialogam e estão presentes em todos os elementos. Caso contrário, eles se tornam ornamentos da cena. Paulo César Balardim Borges (2013) analisando o cenário do Teatro de Animação no Brasil, constata que muitas companhias de teatro de bonecos estão utilizando a visualidade como dramaturgia de seus espetáculos. Assim, mesclando cada vez mais essas duas funções propostas por Anzolin. Ao considerar a visualidade do espetáculo como dramaturgia se torna possível abrigar as ideias da encenação em todos seus elementos, multiplicando as possibilidades de leitura da obra por parte do espectador. Patrice Pavis considera a cenografia como “resultado de uma concepção semiológica da encenação: conciliação dos diferentes materiais cênicos, interdependência desses sistemas, em particular da imagem e do texto” (PAVIS, 1999, p.45).

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O que reforça a ideia de se colocar em cena elementos que carreguem funcionalidade e discurso coerente com o proposto pela encenação. Fazendo um panorama nacional do Teatro de Animação, sem querer reduzi-lo a duas vertentes por entende-lo como muito mais complexo e diversificado, Borges (2013) apresenta o que considera uma divisão possível e preponderante entre os espetáculos no Brasil. Uma primeira vertente ligada ao teatro tradicional, que utiliza-se de bonecos tridimensionais e oculta seu manipulador. E a segunda, ligada ao teatro experimental, que mescla boneco, ator e objeto de cena, criando assim uma malha heterogênea e explorando possibilidades de relação entre esses elementos. Levando em consideração essa divisão e analisando em primeira instância a vertente tradicional, percebe-se que a ocultação do manipulador pede elementos cenográficos específicos que a possibilitem. Souza descreve essas estruturas: As estruturas consistem basicamente em armações de madeira ou metal e tecido, pouco maior que a altura de um homem em pé. (...) Possuem uma abertura superior pela qual se observa os bonecos de luvas e de vara, ou na parte inferior, geralmente para os bonecos de fios ou tringle. (SOUZA, 2010, p.13)

Essas estruturas tradicionalmente chamadas de empanadas, tem como função principal criar a possibilidade de ocultação do ator enquanto isolam o universo do boneco. Comumente a cenografia nessas situações são imagens bidimensionais fixadas na área de atuação do boneco ou objetos tridimensionais em escala. Souza lembra ainda que existe uma grande gama de possibilidades de empanadas, desde as mais simples: tecidos estendidos em portas ou janelas; até as mais rebuscadas, que podem por exemplo, reproduzir pequenos palcos à italiana. Levando em consideração a segunda vertente indicada por Balardim as possibilidades cenográficas se multiplicam. Uma vez colocada em relação ao boneco, ator e objeto de cena, todo o universo do espetáculo se torna mutável. Mas um ponto se mantém, ao pensar a cenografia para o teatro de animação seja qual for a forma de manipulação dos bonecos, devese pensar no espaço em duas instâncias: onde transitará o boneco e onde transitará o ator, por mais tênue que esta linha se coloque, ou por mais mesclados que sejam estes espaços. O ator pode coabitar o espaço do boneco, estar presente e dialogar com o mesmo independe da escala que se encontre, porém ambos ocupam cada um seu lugar específico no espaço e possuem distintos significados na leitura do espectador.

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Sobre esta divisão de espaços ator/boneco, Anzolin (2010) entende que no Teatro de Animação o espaço deve ser considerado tripartido. Considerando que, no teatro de atores o espaço cenográfico é pensado a partir da divisão entre espaço cênico e o espaço destinado aos espectadores. No Teatro de Animação o espaço também tem essa divisão, entretanto o espaço cênico se subdivide entre o espaço de atuação do ator e o espaço de atuação do boneco/objeto. Independe de quão mesclados sejam, cada uma dessas subdivisões possui uma malha de significados. Entendendo esta divisão espacial, e que toda a imagem que chega ao espectador se torna parte constituinte da dramaturgia do espetáculo, vislumbra-se um campo da cenografia muito mais amplo, englobando inúmeros elementos constituintes da cena: desde a forma de manipulação dos objetos/bonecos, o material de que são feitos, qual o diálogo entre as estruturas necessárias e o universo espetacular, onde estarão os atores, até que distância e de que ângulo o espectador se relacionará com o espetáculo. É importante levar em consideração nessas escolhas, que todos os elementos abriguem o discurso da encenação. Nos espetáculos de Philippe Genty pode-se visualizar esse amálgama, onde se percebe uma grande interrelação entre cenografia, bonecos e atores. Podendo analisar sua cenografia além de apenas um componente do espetáculo, mas como um elemento vivo, como um personagem que é manipulado. Uma imagem única que é dotada de significação e transformada. Já nas montagens da Pivete Cia de Arte, as soluções encontradas pelo cenógrafo Alfredo Gomes Filho são pensadas a partir da ocultação do corpo do ator. No entanto, os dispositivos criados pautam-se na noção de que a cenografia também deve ser animada, para não romper com a dinâmica da totalidade da montagem.

A poética de Philippe Genty no espetáculo Voyageurs Immobiles Philippe Genty é um diretor, autor e pesquisador Francês que cria espetáculos e cenas de teatro de animação baseado em formas e bonecos de variados tamanhos buscando atingir o imaginário do espectador. Sua companhia de teatro a “Compagnie Philippe Genty” é referência na área de animação e mistura em seus espetáculos animação, teatro, dança, mimo, jogos de luz, música e sons. Segundo Genty (2008), as formas animadas podem se relacionar com o espectador de forma subjetiva e interior. Apoiado na interpretação dos sonhos de Sigmund Freud, o autor percebe o poder do objeto em ação para criar imagens que são lidas de formas particulares por cada indivíduo. Para entender a cenografia em seus trabalhos é importante perceber a potência transformadora que a matéria possui sobre o humano. O

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espaço proposto por ele é mutável, como um portal que convida o espectador a sonhar. “A matéria e o objeto desviados de sua função habitual, o títere ou o manequim confrontados com os atores vão se valorizar mutuamente, como se o inerte desse ainda mais vida ao que é vivo, e vice-versa. ” (GENTY, 2008 p. 135) Partindo desse pensamento, em seus espetáculos, bonecos, atores e cenografia se fundem em uma mistura que fala tanto, ou mais, ao subconsciente do espectador que a seu consciente. Os elementos da cena se encontram tão mesclados e possuem uma linha tão tênue entre material e humano que todo o espetáculo parece pulsar. Em uma cena de Voyageurs Immobiles [Viajantes Imóveis] o palco está tomado por um tecido que se move como o oceano, sete atores aparecem à deriva em uma caixa. Um a um eles vão sumindo para dentro da caixa logo após um ator cobrir-lhes a cabeça com uma caixa de papelão. Quando esse está sozinho na cena os outros voltam com a caixa sobre a cabeça fechada e abrem revelando uma máscara com as feições do ator que estava só. A cena se desenvolve até que este ator também aparece com uma caixa na cabeça, criando no espectador uma ideia de que todos são máscaras. A despersonificação do ator a partir da imagem repetida de seu rosto o funde com a cenografia formando um quadro onde cada imagem carrega seu significado, mesmo o ator que não encontra-se mascarado. Seria simplório pensar que trata-se de cenografia apenas o tecido/oceano e a caixa à deriva, dando a cenografia papel secundário de plano de fundo da cena. O que se vê na cena descrita é a apropriação de Genty da imagem do rosto do ator e sua reprodução, ele consegue colocar como elemento de cena o próprio ator fundindo-o com o inerte. Borges ao falar da relação entre ator, objeto e espaço no Teatro de Animação cita que: Os processos combinatórios entre o corpo dos atores, os objetos e o espaço, visam a articulação de significações num sistema semiológico ampliado, caracterizado por desdobramentos que sublinham a manifestação de presenças múltiplas geradas através de cruzamentos.

(BORGES, 2013, p.221)

Com esse pensamento, reforça-se o entendimento amplo de cenografia que a cena citada possui. Uma das possibilidades de modos operativos entre ator e objeto, neste caso uma máscara, que Borges (2013) aponta é a fusão de ambos criando um ser híbrido construído a partir de associações. As máscaras na cena de Voyageurs Immobiles, despersonificam e fundem os corpos, dando a eles a mesma potência imagética. O ator, mesmo desmascarado, se torna parte dessa massa e, pode portanto, ser visto como elemento e não persona.

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Outra característica da cenografia nos espetáculos de Genty é a utilização de um dispositivo cênico que possibilite uma constante mudança do espaço. Borges (2013) ao analisar as possibilidades de dispositivos cênicos no Teatro de Animação conceitua quatro tipos encontrados em sua pesquisa: estático, instável, desdobrável e camuflado. Philippe Genty, no espetáculo analisado, utiliza, o que Borges classifica como dispositivo cênico camuflado. Ele constrói um aparato com o objetivo de camuflar trucagens e criar mecanismos para transformar o espaço magicamente. Para ele, o palco não tem entradas e saídas laterais, os atores aparecem e desaparecem da imagem. Essas possibilidades transportam o espectador a um universo como o do sonho. O palco, que por vezes está lotado de elementos, logo em seguida é visto quase vazio. Em outra cena, através do efeito da iluminação, o espectador é conduzido de um oceano, onde uma personagem está à deriva, para o interior de quatro caixas de transporte empilhadas. Cada caixa dessas, iluminadas de seu interior, tem um bebê formado pela cabeça do ator e um corpo-miniatura manipulado. A cena transcorre até que as caixas se separam como se caíssem na água e passam a navegar pelo oceano. Escuta-se sons de aves na trilha sonora indicando que as caixas estão se aproximando da terra, até que somem junto com o tecido que formava o mar e surge um deserto de papel tomando todo o palco por onde passa um caminhão sem nenhum manipulador aparente. Essa transformação e transição de imagens não representa, para Genty (2008), uma abstração da realidade, mas sim uma forma de confrontar o inconsciente com o cotidiano. Como em um sonho que mudamos de um lugar ao outro sem explicação lógica, as imagens apresentadas em seus espetáculos se metamorfoseiam, se mesclam, se desdobram para dialogar com o subconsciente do espectador. Por isso Genty se serve de imagens que carregam múltiplos sentidos, afim de suscitar uma viagem interior mais profunda, onde o espectador confronte suas angústias, medos e desejos com a realidade (GENTY, 2008). É interessante pensar como a multiplicidade de imagens presente no espetáculo influencia a atuação dos atores, criando-se possibilidades espaciais que modificam e provocam seus corpos, tendo como reflexo diversas formas de interpretação. Em uma cena como a dos bebês, o espaço cênico se reduz ao interior das quatro caixas, e a interpretação se condensa a esse espaço. Em outro momento, ao colocar seis corpos dentro de uma única caixa, na cena das máscaras, a proximidade dos atores gera uma corporeidade específica que se modificaria em um espaço mais amplo. Com isso se torna evidente como o espaço

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proposto, em seus espetáculos, determina a ação dos atores. Genty, analisando sua trajetória, conta que ao se ater ao discurso dos materiais pode potencializar seus espetáculos:

Bem no início das nossas criações, eu tinha tendência a querer ditar tudo, a impor. O espantoso é que são os materiais, os objetos, as marionetes que vão me ensinar a escutar. Eu descobria que, ao obrigalos a fazer o que estava escrito, eles saíam empobrecidos. Em compensação, se nos púnhamos à sua escuta, eles nos conduziam a descobertas assombrosas, revelando-nos coisas enterradas dentro de nós mesmos. (GENTY, 2008, p.141)

Entender o material como parte constituinte do discurso do espetáculo é percebê-lo como fonte criativa em diálogo com o humano, e não apenas a serviço dele. Por entender dessa forma, Genty não se preocupa, em sua encenação, com a ocultação dos manipuladores, e o que gera sentido é a fusão entre o animado e o inanimado. Ao assumir a presença do manipulador, esta é mesclada com a do objeto como um duplo, entendendo que o ator age e interage com o boneco ao manipulá-lo. Em outra cena onde aparece um grupo de personagens correndo no deserto, um deles é um boneco. Os atores manipuladores formam um coro com ele, reforçando sua ação enquanto ele se transforma. A imagem é formada pelo grupo, assumindo a coexistência de atores e boneco. Esta se transforma pela ação. Ao modificar o corpo do boneco cria-se a ideia de evolução, transformação, passagem de tempo. O que gera a leitura do espectador é o todo, como uma paisagem que se modifica. Portanto é o conjunto de fatores integrantes da cena, boneco, atores, figurino, ambientação e iluminação que formam a imagem final a ser decodificada pelo subconsciente do espectador. Este conjunto de imagens em transformação forma a cenografia dos espetáculos de Philippe Genty, não havendo assim, a necessidade de construção de áreas por onde o ator possa agir oculto sobre os objetos. Ao assumir a presença do ator, Genty dá a ele a mesma importância do boneco, associando-os como parte integrante da cena.

Pivete Cia de Arte: Alfredo Gomes Filho e o espaço em movimento A Pivete Cia de Arte é uma companhia de Teatro de Bonecos da cidade de Curitiba que direciona sua pesquisa para o Teatro realista com bonecos. O grupo é formado por artistas que em 1996 se reuniram com o intuito de formar um trabalho voltado para o desenvolvimento de técnicas para o Teatro de Animação. Esta pesquisa se pauta no

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desenvolvimento de novos conceitos de construção de elementos cenográficos e da utilização de materiais na confecção dos objetos. As suas montagens passam por uma pesquisa de pelo menos um ano, nos quesitos referentes à linguagem de manipulação, a estética do espetáculo e do tema a ser abordado. É interessante salientar que em sua cenografia, sempre dinâmica, a companhia busca inspiração na própria cidade de Curitiba, reinventando-a através da reprodução de edifícios. Isso se torna possível porque a Pivete conta com um cenógrafo permanente em sua equipe de trabalho. Alfredo Gomes Filho desenvolve, em sua pesquisa, as diversas áreas do conhecimento referentes à cenografia e suas linguagens. O cenógrafo traz em seu currículo grandes projetos cenográficos, na área museográfica, teatral, de eventos e de arquitetura cênica, com a construção de maquinaria e vestimenta cênica. O primeiro espetáculo da companhia, CWB Número Zero (1999), descreve a trajetória de um grupo de jovens desajustados a partir de um roubo mal sucedido a uma loja de conveniências. É a história de quatro adolescentes que tentam a sobrevivência nas ruas de uma grande cidade. A construção do roteiro foi baseada em histórias reais extraídos do trabalho realizado pela companhia com crianças de rua na cidade de Curitiba, usando como metáfora para a narrativa as aventuras dos garotos da terra do nunca. Em sua cenografia, buscaram trabalhar com elementos tridimensionais e com a ocupação de espaços e planos, o que resultou em uma dinâmica de representação cenográfica. A cidade de Curitiba ficou nas entrelinhas, com alguns de seus ícones, escolhido por "relações afetivas" pelos componentes do grupo. Em entrevista concedida para esta pesquisa, Gomes Filho (2014) explicou como organizou as mudanças cenográficas com influência em histórias em quadrinho e no cinema. A movimentação das estruturas, como as paredes dos prédios, criou novos espaços onde se varia a escala de todos os elementos funcionando como um quadro ou equivalente ao zoom de uma câmera. O prédio abandonado, representando o real, situado no marco zero de Curitiba e onde desenrola-se toda a trama, transforma-se no velho elevador onde os quatro jovens vivem o momento anterior a invasão da polícia. Esta cena, em preto e branco, possui uma escala maior, quebrando os padrões da cenografia geral do espetáculo. O cenógrafo salientou ainda a importância da busca de conhecimentos que agreguem possibilidades para resolver “problemas” propostos pela dramaturgia. Em CWB Número Zero, Beto Lanza, diretor do espetáculo, pediu que construísse uma estrutura de um prédio a ser demolido em cena. A partir daí, Gomes Filho buscou em seus conhecimentos coisas do

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cotidiano, do mercado, que pudessem reproduzir o efeito desejado. Segundo ele a busca é de coisas existentes para adapta-las, pois pouco se cria do zero. Chegou a um mecanismo onde, ao acionar uma traquitana, o prédio descia e em cima dele estava outro prédio em ruinas, que em conjunto com do efeito da iluminação, dava ao espectador a impressão da demolição. Em sua busca pelo efeito mais próximo da realidade, ele hoje, diz que teria acrescentado fumaça a “demolição” tornando-a ainda mais realista. Em seu segundo espetáculo Alice no País das Maravilhas (2005) a Pivete Cia de Arte propôs um espaço mais inusitado, o grupo estava desenvolvendo o que convencionaram como Teatro de Intervenção. Segundo seu pensamento, o termo foi adotado arbitrariamente em diálogo com a expressão manipulação direta, por entender que:

Cada artista (indivíduo) interage com sua criação (objeto) a partir da ideia de que a sua ânima é que deflagra o fenômeno teatral, ou seja, cada gesto posto em cena é necessariamente o resultado da interferência de um ou mais corpos animados em outro a ser permeado de vida (ainda que efêmera). Isto se aplica aos bonecos, aos cenários, ao roteiro, à música, e assim por diante. (PIVETE, 2014).

O Grupo queria transformar o espaço por onde passasse, construindo rapidamente uma estrutura que tivesse as possibilidades cenográficas de um teatro e que pudesse ser desmontado com a mesma velocidade, dando ao espetáculo um caráter efêmero. Nessa montagem criou-se um espaço inflável no formato de meia garrafa, que simulava uma caixa preta. É interessante compreender que, ao se surpreender, em meio ao dia a dia da cidade, com a estrutura gigante, o espectador já embarca no universo do espetáculo, sendo umas das pessoas que entram no inflável ou não. Ao deparar com o elemento, o espectador já está em contato com parte da cenografia. Seu formato e presença são providos de discurso, e criam uma expectativa de o que há dentro dele. O espetáculo contou as aventuras de uma adolescente às voltas com a descoberta dos seus desejos. O roteiro da peça tem como base a fuga de uma garota que, em conflito com o tédio da vida cotidiana, resolve transformar sua realidade num divertido e arriscado jogo de inversão de papéis. A partir da obra de Lewis Carroll, recriou-se espaços onde Alice se depara com os seus "desejos". Esses ambientes surgem e se transformam dentro da estrutura do inflável. Mais uma vez, o grupo utilizou-se da estética realista, porém Gomes Filho (2014) revela que utilizou um aparato diferente do primeiro espetáculo no que concerne a ocultação dos manipuladores. Segundo ele, a técnica de manipulação direta tem como estrutura base o SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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balcão, porém era preciso abrir espaço para que o manipulador transitasse pela cenografia e se mantivesse oculto. Foi levado em conta o ângulo da iluminação, sua incidência e intensidade, o figurino dos atores e sobre tudo o espaço que estes ocupariam. No espetáculo em questão, para que os atores consigam acessar os objetos a serem manipulados, as paredes eram móveis. Elas apresentavam o espaço, convencionando para o espectador sua existência, que permanece em seu imaginário, e depois retiradas para que os manipuladores pudessem agir. A movimentação da cenografia é ainda mais dinâmica nesse espetáculo. O inflável que era utilizado tinha cerca de 10 metros quadrados e possuía paredes falsas na parte interior para permitir a movimentação e ocultação dos atores entre elas e as paredes reais do inflável. Também nesses corredores ficava toda a cenografia que entrava e saia diante do público. O cenário não é estático, há cenas aéreas, nas laterais e à frente. O espaço cênico inicia vazio e vai se transformando no decorrer das ações. Para Gomes Filho, o cenário também deve ser entendido como um objeto a ser manipulado, transformado pelo ator. Atualmente (final de 2014) o grupo trabalha em um projeto que já tem 10 anos de pesquisa e que olha para uma Curitiba do futuro. A idealização da cenografia partiu de um prédio da cidade, onde o grupo acredita que poderá vir a ter uma estação de metrô. Para este espetáculo, que ainda está em processo, Gomes Filho (2014) está construindo uma estrutura que mescla a ideia dos espetáculos anteriores. Assim como em CWB Número Zero, o plano de fundo é a cidade de Curitiba, que será mais uma vez reconstruída pelo grupo, escolhendo pontos que lhe sirvam de dramaturgia. A estruturas serão móveis possibilitando a criação de espaços em transformação se servindo mais uma vez das linguagens do cinema e das histórias em quadrinhos para a criação de quadros e zooms. Porém dessa vez o público, ao entrar no espaço de representação, se deparará com apenas um balcão, e toda a cenografia será construída em cena, assim como em Alice no País das Maravilhas, os espaços se constituirão diante do espectador. A estrutura que está sendo construída, é ainda mais dinâmica que as anteriores e reforça o pensamento do cenógrafo. Para ele, a cenografia não deve apenas adornar, mas sim compor o espaço em benefício da cena. Deve transformar, movimentar, criar possibilidades de mudanças de olhar para o espectador. Ela deve ser animada com a mesma importância dada aos bonecos, pois ela é parte constituinte da animação.

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Considerações finais Sendo a transformação do espaço recorrente nos espetáculos analisados, é importante salientar algumas especificidades de cada caso, sem o intuito de apontar como deve-se conceber a cenografia para o Teatro de Bonecos, ou mesmo de afirmar que estas são as únicas formas possíveis. A cenografia nos espetáculos de Philippe Genty possui um caráter de imagem total, e portanto ela é, em consonância com os demais elementos, um todo em transformação. Ela pode assumir o papel de personagem na dramaturgia proposta. Não trata-se de um lugar específico que o ator habita, mas sim de uma imagem que busca falar ao subconsciente, sua transformação e manipulação é feita de forma que o espectador se veja imerso em um universo onírico, em que ele reconhece elementos que dialogam com sua psique. Já a cenografia de Alfredo Gomes Filho, transforma-se mas mantém o caráter de espaço que os personagens habitam. O “onde” é evidente, e este se transforma em outros lugares, porém sempre com o caráter de ambiente. Reforçado pela utilização da cidade de Curitiba como plano de fundo de seus espetáculos, sua fidelidade com o real se dá de tal forma que o espectador é capaz de reconhecer a cidade. Os elementos em escala facilitam ainda mais esse entendimento, e suas transformações, nos espetáculos da Pivete Cia de Arte, surgem como forma de dinamização da cena, criando novos ângulos de visão para o espectador. O mesmo lugar é visto por ângulos diferentes, de mais perto ou mais longe, porém mantendo a identidade do lugar. Outro ponto de analise interessante entre os autores é da perspectiva do espaço que o ator ocupa. Para Genty sua presença está em diálogo com a cena, assumindo-o como agente, onde anima e é reanimado pelos demais elementos presentes. Porém, o ator surge e desaparece dentro da imagem, não utilizando entradas e saídas do palco. Já Gomes Filho, devido ao caráter realista de sua cenografia, oculta a presença dos atores, afim de reforçar o universo ficcional proposto por ele. A partir desses pensamentos, ambos têm de resolver, em sua cenografia, elementos que possibilitem estes efeitos. Portanto constroem pontes de aproximação com figurino e iluminação, afim de conseguir atingir seu objetivo. É importante salientar que eles entendem a importância da cenografia abrigar o discurso da encenação, reforçando-o em seus espetáculos. Segundo Anzolin (2010), a cenografia é o conjunto de elementos que compõem o espaço de uma cena, e por tanto deve ser pensada em consonância com as questões dramatúrgicas, sob pena de se apresentar enquanto elemento alegórico, desviando assim a

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atenção do espectador do que realmente importa. É importante entende-la portanto, como parte integrante da dramaturgia, para potencializar seu discurso e criar possibilidades de diálogo com o espectador. Referências: AMARAL, Ana Maria. Teatro de Formas Animadas: Máscaras, Bonecos, Objetos. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1996. 3ª edição. ANZOLIN, Osvaldo. Espaço e Cenografia no Teatro de Animação. In: Móin-Móin: Revista de Estudos sobre Teatro de Formas Animadas. Jaraguá do Sul: SCAR/UDESC, 2010. Ano 6, Nº 7. BORGES, Paulo César Balardim. Desdobramentos do ator, do objeto e do espaço. Florianópolis, UDESC/CEART, 2013, 395 p., Tese (Doutorado em Teatro). GENTY, Philippe. Uma viagem entre percepção, forte impressão e interpretação. Revista Móin-Móin: Revista de Estudos sobre Teatro de Formas Animadas. Trad. José Ronaldo Faleiro. Jaraguá do Sul: SCAR/UDESC, 2008. Ano 4, Nº 5. GOMES FILHO, Alfredo. Trajetória da Pivete Cia de Arte. Curitiba, 6 set. 2014. Entrevista concedida aos pesquisadores Amabilis de Jesus da Silva e Marcos Araujo de Oliveira. KLEIST, Heinrich von. Sobre o teatro de marionetes. Trad. Pedro Süssekind. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1997. PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. São Paulo: Perspectiva, 1999. PIVETE Cia de Arte. Site oficial da Cia. Disponível em: <http://piveteciadearte.br.tripod.com/aliceapresentacao.htm>. Acessado em: 07/09/2014. SOUZA, Juliano Valdir. O cinema como possibilidade cenográfica para o Teatro de Bonecos. Florianópolis, UDESC/CEART, 2010, 73p, Monografia (Trabalho de Conclusão de Curso em Licenciatura em Educação Artística com Habilitação em Artes Cênicas).

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2. A CENOGRAFIA DE ESPETÁCULOS PARA CRIANÇA NO ESPAÇO ESCOLAR Elcio Levi Brandão Diniz2

Resumo: Este artigo traz uma reflexão sobre espetáculos teatrais infantis apresentados em escolas públicas de Curitiba. Atendo-se principalmente às questões de espacialidade e cenografia, o texto procura estabelecer uma interlocução entre as pontuações de Agustín Escolano e Viñao Frago a respeito do espaço escolar e reflexões de pesquisadores da área do teatro, como Osvaldo Gabrieli, André Carreira e Walter Lima Torres Neto. A fim de investigar o potencial de uso cênico dos ambientes da escola, o artigo reflete sobre o modo como se organiza o espaço escolar e como se estabelece o espaço teatral dentro deste contexto, além de verificar o papel do cenógrafo em realizações cênicas desta natureza. O artigo se propõe, então, a problematizar questões artísticas e cenográficas dos espetáculos levados às escolas, procurando compreender como se dá o espaço do teatro dentro do espaço da escola. Palavras-chave: Cenografia, Teatro infantil, Espaço, Escola

Introdução O teatro infantil, ou teatro para crianças, vem se consolidando há mais de meio século em nosso país. Boa parte das produções teatrais ofertadas às crianças se propõe a ocupar as salas de espetáculos tradicionais, mas há também espetáculos nas ruas, nas escolas e em espaços alternativos. Nos últimos anos, a produção de teatro para as escolas públicas de Curitiba tem se intensificado, por conta do fomento a projetos artísticos destinados a este público. Existem leis de incentivo à cultura, como as do PAIC - Programa de Apoio e Incentivo à Cultura (Legislação Municipal de Curitiba, 2005), que destinam uma parcela do dinheiro público a produções culturais. Ou seja, boa parte das montagens teatrais destinadas às crianças de Curitiba é subsidiada pelo dinheiro público.

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Elcio Levi Brandão Diniz é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). É Bacharel em Musicoterapia pela Faculdade de Artes do Paraná (2006). É diretor artístico e cenógrafo. O presente artigo foi orientado pelo prof. Dr. Ismael Scheffler, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Revisão: Marcos Fernando Justino da Silva. E-mail: levibrando@yahoo.com.br SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Neste contexto, muitas vezes as crianças são levadas das escolas às salas de teatros da cidade, mas é comum também o contrário, quando o teatro é levado à escola. Este artigo trata justamente sobre espetáculos profissionais de teatro, destinados ao público infantil e apresentados no ambiente escolar. O escopo deste trabalho é refletir sobre a cenografia e o espaço teatral dentro do espaço da escola. É importante diferenciar o “teatro para crianças” do “teatro escolar”. O primeiro é uma modalidade artística destinada ao público infantil e o segundo se refere ao ensino e prática teatral realizada com e pelas crianças, sob orientação de um professor. O teatro praticado nas escolas, nas disciplinas de arte-educação e atividades extracurriculares, tange, principalmente, os aspectos artístico-pedagógicos do fazer teatral. Para esta reflexão, nos atemos ao teatro profissional produzido para o público infantil e levado às escolas. Assim sendo, num primeiro momento, abordaremos os aspectos gerais do teatro infantil na escola. Em seguida trataremos do espaço escolar, com apoio nos autores espanhóis Agustín Escolano e Antonio Viñao Frago, a partir dos textos Arquitetura como programa, espaço-escola e currículo e A dimensão espacial dos estabelecimentos de ensino e a dimensão educativa do espaço escolar, respectivamente. Discorreremos, então, sobre a cenografia de espetáculos infantis e posteriormente refletiremos sobre o espaço teatral e o teatro de rua, apoiando-se nas reflexões de Walter Lima Torres Neto e de André Carreira.

Teatro infantil na escola É preciso primar pela qualidade da produção teatral para as crianças tanto quanto a qualquer outra forma de teatro, afinal, como comenta o diretor de teatro infantil Ilo Krugli, ao tratar sobre o teatro adulto e o teatro para crianças, “a essência é a mesma, o acontecimento, o ritual teatral é o mesmo” (KRUGLI, 2003, p.48). O público infantil não deve ser subestimado. As crianças são merecedoras de um teatro, de uma cenografia, que reflita e dialogue com a sua realidade, com o seu espaço. O historiador e diretor teatral Lourival Andrade Jr. (2003) é enfático ao pontuar que boa parte dos espetáculos levados às escolas é de qualidade ruim. O autor menciona que existem alguns projetos que têm o intuito de formação de plateia, mas que são utilizados por alguns produtores culturais apenas como uma oportunidade financeira, resultando em montagens alienadas das reais necessidades e potencialidades das crianças. Pensar um teatro infantil ou, como preferem muitos, um teatro dirigido às crianças, implica pensar a forma pela qual podemos permitir e garantir às crianças um lugar e uma linguagem diferenciadas, que as auxiliem na descoberta de suas próprias linguagens. Um lugar e uma linguagem que lhes permitam suporem-se diferentes do SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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que lhes é dado ser cotidianamente; que permitam aprenderem, o quanto antes, a se tornarem sujeitos e não objetos da cultura. (ANDRADE JR., 2003, p. 28)

Esta premissa se aplica a toda forma de teatro para crianças, entretanto, quando abordamos especificamente o teatro infantil nas escolas, percebemos que é uma modalidade ainda pouco mencionada em pesquisas acadêmicas na área do teatro. A maioria das escolas públicas do Paraná não possui um local destinado especificamente a apresentações culturais. Frequentemente, são utilizadas quadras e ginásios de esporte, procurando-se, comumente, um local amplo que permita boa visibilidade e audição. De acordo com a Secretaria de Educação do Paraná, no Boletim Resultados do Censo Escolar (2013)3, considerou-se os pátios cobertos e auditórios, como espaços propícios a atividades culturais. Portanto, há uma orientação para que se utilize estes espaços para tal fim. Levando em conta que uma minoria das escolas possui auditórios e que muitas não possuem pátio coberto, outras alternativas de uso acabam sendo as quadras esportivas a céu aberto, os bosques, bibliotecas e salas de aula. No teatro apresentado nas escolas, é recorrente também uma disposição alinhada da plateia, com tendência à relação frontal do teatro, isto é, com a separação de uma área para o público e outra para a cena em lados opostos. Sendo assim, algumas cenografias tendem a se estabelecer de modo a ocupar um posicionamento semelhante ao que ocupariam em um palco tradicional. Por vezes estas cenografias acabam sendo “engolidas” pelo ambiente escolar, ou seja, não conseguem se sobressair, destacar-se diante de um ambiente que, diferentemente de uma sala de espetáculos dita “neutra”, carrega fortes informações. A escola é marcada pelas relações sociais ali estabelecidas, bem como por suas dimensões, suas luminosidades, seus ruídos e deficiências acústicas, fatores que, inevitavelmente, acabam por somar-se às informações de um espetáculo. Assim, para refletir sobre o espaço e a cenografia do teatro infantil nas escolas, é preciso compreender diversos aspectos do ambiente escolar e suas possíveis relações com o fazer teatral. Uma das características que influencia qualquer atividade realizada dentro do espaço escolar é o fato da escola abrigar, socialmente, o lugar onde se ensina, onde se educa. Assim, quando o teatro vai à escola é recorrente a tentativa de compreendê-lo como instrumento didático, seja por parte dos profissionais da escola ou mesmo pelos próprios produtores e artistas.

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Informação contida no campo Infraestrutura e Equipamentos das Escolas, do Censo Escolar 2013, realizado pelo INEP, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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O dramaturgo Carlos Augusto Nazareth, em entrevista à Rio Mídia, em 2007, afirma que em nossa cultura é comum, ao falar em arte para crianças, associar a questões educativas. Para o Nazareth, a arte atua num campo muito mais amplo, podendo sim ser pensada pelos aspectos pedagógicos, uma vez que forma seres humanos, mas não devendo ser vista como didática. “A expressão artística, voltada para a criança, não tem que ter a finalidade de educar ou ensinar. Quando a arte é colocada a serviço da educação, da didática, da moral, dos bons hábitos, sua importância se reduz.” (NAZARETH, 2007) O autor pontua que a escola tem uma visão atrelada ao ensinar, prendendo-se a padrões convencionais e formativos, tratando do teatro não puramente como arte e sim como mais um recurso didático. Para Nazareth, este tratamento provém do intuito da escola em procurar transformar tudo em conteúdo programático. Neste pensamento sistematizado, é comum questionar-se de que modo tal espetáculo pode ser aproveitado em aula e como se relaciona com a matéria que está sendo ministrada.

Ao trabalhar com o teatro, ou com o texto literário, a escola quer saber qual é a mensagem transmitida. Ora, mensagem tem um caráter de ensino, um caráter moralista. A arte é libertária. A escola muitas vezes não consegue entender que a arte se basta por si mesma. Se você possibilita que uma criança tenha acesso a um bom espetáculo, você não precisa fazer mais nada. (NAZARETH, 2007)

Ainda que entendamos o teatro primordialmente como manifestação artística, no caso do teatro na escola, por estar inserido no contexto educacional ou simplesmente por se tratar de uma prática de adultos dirigida às crianças, a arte teatral passa a ter aspectos didáticos. Ainda assim, a cenografia para crianças não precisa ter o foco no didatismo, uma vez que pode ser uma expressão artística genuína, permitindo ampla leitura por parte dos expectadores e proporcionando aos atores e público, um espaço lúdico e criativo, capaz de provocar diferentes dinâmicas e vivências artísticas.

O espaço escolar Antonio Viñao Frago (2001) distingue os conceitos de espaço e lugar. O autor afirma que a ocupação e utilização do espaço supõe sua constituição como lugar, sendo o lugar uma realidade construída socialmente, que utiliza-se do espaço como suporte. Ou seja, a escola é, antes de tudo, um lugar social e está fisicamente localizada em determinado espaço. O autor, ao realizar um estudo sobre a dimensão espacial dos estabelecimentos de ensino na Espanha, demonstra que historicamente as escolas se organizavam em espaços

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constituídos originalmente para outros fins, como monastérios, fábricas e dependências públicas, sendo relativamente recente a construção de prédios especificamente para abrigarem escolas. “A escola pois, enquanto instituição, ocupa um espaço e um lugar. Um espaço projetado ou não para tal uso, mas dado, que está ali, e um lugar por ser um espaço ocupado e utilizado” (FRAGO, 2001, p.62). Embora a realidade espanhola seja distinta da realidade brasileira e, mais especificamente, da realidade paranaense, podemos nos apropriar de alguns importantes conceitos apresentados pelo pesquisador, tal qual o conceito da escola como espaço físico e lugar social. Entendendo que a escola, enquanto lugar, é construída e definida a partir das relações que ali se dão, bem como por meio dos símbolos e significados a ela atribuídos. Em concordância ao pensamento de Frago, Agustín Escolano (2001, p.26) nos chama a atenção para o fato de que o espaço escolar abriga determinados discursos que são refletidos por meio da própria arquitetura e ainda pelas construções culturais.

A arquitetura escolar é também por si mesma um programa, uma espécie de discurso que institui na sua materialidade um sistema de valores, como os de ordem, disciplina e vigilância, marcos para a aprendizagem sensorial e motora e toda uma semiologia que cobre diferentes símbolos estéticos, culturais e também ideológicos. (ESCOLANO, 2001, p. 26)

Antes de qualquer produção teatral ocupar a escola, já existem, nas crianças e adultos que ali convivem, determinadas relações com aquele local, bem como uma pré-disposição a compreendê-lo e utilizá-lo de determinado modo. Os espaços que costumam ser utilizados para as apresentações de teatro servem, cotidianamente, para outros fins. Por exemplo, um refeitório, que é frequentado durante alguns horários do dia especificamente para as refeições, quando é ocupado por um grupo de teatro, recebe nova significação. As mesas e cadeiras são reposicionadas e forma-se uma espécie de auditório, onde por alguns momentos não se escuta o ruído dos pratos e talheres, mas sim as sonoridades de um espetáculo artístico. Alguns elementos deste espaço, entretanto, continuam os mesmos, principalmente os estruturais, como as janelas, cortinas, forro, piso e até mesmo o cheiro. O refeitório empresta seu espaço ao teatro, mas não deixa de ser refeitório. Sendo assim, os artistas, ao apropriarem-se de determinado local, inevitavelmente precisam lidar com as características próprias do mesmo. Há também alguns aspectos do comportamento dos alunos, professores e demais funcionários que podem influir na relação com o espaço teatral. É comum encontrar adultos pedindo que as crianças façam silêncio durante o espetáculo, virem pra frente, sentem direito, enfim, vigiando e dando comandas que reforçam uma certa estrutura de organização e SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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controle já existentes no dia a dia da escola. É também frequente a interação entre as crianças da plateia, seja brincando, conversando ou mesmo discutindo, visto que são colegas de turma e têm bastante intimidade entre si. Assim sendo, cada local da escola é repleto de significados e modos de funcionamento que influenciam diretamente o fazer teatral. Sobre a escolha do local para as apresentações e o modo como se utiliza estes espaços, é relevante considerar os estudos de André Carreira. Ao discutir o teatro de rua, o autor trabalha com alguns conceitos provenientes do campo do urbanismo e da geografia cultural, como os de fluxo e repertório de uso: “O espaço urbano está definido pelo repertório de usos do cotidiano. O que fazem os cidadãos das instituições em suas operações do dia a dia define territórios, que, no entanto, são mutáveis” (CARREIRA, 2009). O ambiente escolar também é determinado por seus fluxos, da porta de entrada ao limite dos muros. Existe a quadra onde se praticam as aulas de educação física e onde também, em certo horário, formam-se as filas; a sala da direção e outros espaços restritos aos alunos; o corredor entre as salas, onde se deve andar mais lentamente; o bosque, onde é possível correr e brincar de pega-pega durante o recreio, mas que nos dias de chuva tem acesso limitado. De certo modo, os fluxos da escola acompanham um padrão de conduta escolar, mesmo assim, podem ser alterados ou reorientados de acordo com a necessidade e criatividade da comunidade escolar e/ou dos artistas. Frago destaca que a decisão do educador, seja em manter o espaço como é dado ou em modificá-lo, faz parte do processo de educação. Quando um educador, por exemplo, decide alterar o posicionamento das carteiras em sua sala de aula ou mesmo trocar a posição de sua mesa, interfere diretamente na relação das crianças com o espaço.

Assim, todo educador, se quiser sê-lo, tem de ser arquiteto. De fato, ele sempre o é, tanto se ele decide modificar o espaço escolar, quanto se o deixa tal e qual está dado. O espaço não é neutro. Sempre educa. Resulta daí o interesse pela análise conjunta de ambos os aspectos – o espaço e a educação –, a fim de se considerar suas implicações recíprocas. (FRAGO, 2001, pg. 75)

Isto pode ser aplicado também aos artistas de teatro, quando, durante a apresentação de um espetáculo, tratam de reorganizar o espaço para a montagem do cenário ou mesmo quando orientam o público sobre como e onde devem se sentar. A fim de intervir artisticamente na escola, visto que é um lugar diferente das salas de espetáculo convencionais, é importante observar as características próprias deste meio, levando em conta desde a sua constituição arquitetônica até os fluxos e comportamento das pessoas que ali convivem.

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Cenografia no teatro infantil Osvaldo Gabrieli (2003), ao falar sobre cenografia no teatro infantil, atenta-nos para o fato de que esta modalidade teatral padece de diretores, produtores, cenógrafos e figurinistas, que de fato compreendam o que significa fazer teatro infantil e que reflitam uma cenografia para ser vista e apreciada por crianças. O autor ainda destaca a importância de distinguir cenografia e decoração, bem como a necessidade de haver um espaço cenográfico lúdico. Segundo Gabrieli, vários cenários de peças de teatro para crianças utilizam elementos justapostos, que não se relacionam entre si, nem tão pouco são aproveitados pelos atores ou pelas marcações de cena do diretor. Para o autor, este tipo de composição é posta em cena com o intuito de decorar a “neutralidade” da caixa preta. “Estes elementos [...] desprovidos de ‘vida cênica’, carecem de ‘ilustrar’ pobremente onde o ator está e, o que é pior, poluir a cena com cores e formas colocadas gratuitamente, gerando um elemento que funciona como ruído à percepção do público” (GABRIELI, 2003, p.77). Ao trazer o termo caixa preta, o autor refere-se ao tipo de palco presente em edifícios teatrais que adotam o modelo da cena italiana ou, como também é chamada, “cena frontal”. Modelo que, numa visão conservadora, como pontua Walter Lima Torres Neto (2004), se consagrou ao longo dos séculos XIX e XX como o lugar teatral por excelência. Neste tipo de espaço, destaca-se, frente à plateia, um palco cujo fundo e laterais são recobertas por panos pretos que, além de esconder a maquinaria teatral e os bastidores, pretendem conferir ao palco certa “neutralidade”. Nestes espaços as cenografias, sejam pequenas ou grandiosas, contam com uma estrutura de palco que inclui cortinas, pernas, varas para pendurar cenário e, às vezes, até alçapões, além de estrutura para iluminação cênica. Claramente, a crítica de Gabrieli se dirige às cenografias desenvolvidas para este tipo de palco. Entretanto, num sentido mais amplo, a reflexão cabe aos cenários feitos para as escolas, visto que alguns vícios de uso do palco italiano também lá são reproduzidos, tais como a relação frontal com a plateia e o uso de tecidos, cortinas e estruturas que tratam de recriar os bastidores onde se pode “esconder” o que não está em cena. Quando o público observa a cena apenas de frente, a cenografia também torna-se um tanto frontal, bem como a interpretação dos atores. Estas características são diferentes no teatro de arena, por exemplo, onde a cenografia pode ser vista de todos os ângulos e onde a ação também pode ser contemplada por todos os lados. Ao desenvolver as cenografias de espetáculos infantis para as escolas, os grupos de teatro, em geral, optam por cenários reduzidos, de prática montagem e fácil transporte. São

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comuns as estruturas multiuso, como caixas de madeira, lonas recobrindo o piso, bem como os biombos e as empanadas (uma espécie de biombo leve, recoberto por tecido). Estas opções pretendem dar soluções portáteis a um conceito de lugar teatral dicotômico, de um modelo teatral baseado na caixa cênica. A questão da praticidade e dinâmica na montagem das estruturas é, de fato, relevante na concepção da cenografia para escolas. Entretanto, criar cenários práticos não é o bastante, pois, se eles não proporcionam integração com o ambiente escolhido, podem facilmente se tornar meramente decorativos e sem força dramática. Cabe ao cenógrafo, então, considerar juntamente com as estruturas, formas, tipos de material, cores e texturas, a espacialidade da cena. Se as criações de cenografia infantil para palcos tradicionais, segundo Gabrieli, carecem de vitalidade cênica, tanto mais carecem nas escolas, visto que não há tablado, nem moldura, nem coxias, nem panos e tão pouco maquinaria e a mesma capacidade para a iluminação cênica. Como não existe nas escolas a caixa preta, é preciso repensar, por conseguinte, se o uso da cena italiana é um modelo adequado às montagens teatrais feitas em âmbito escolar. Estudos sobre o espaço teatral alternativo podem subsidiar o desenvolvimento de um pensamento criativo mais amplo em relação à cenografia para o teatro voltado à criança no ambiente escolar.

O espaço cênico O professor e diretor teatral Walter Lima Torres Neto (2004), com o texto Nota sobre o trabalho do Diretor com o espaço teatral, desenvolve a ideia de que não há como conceber uma encenação sem pensar no espaço cênico. O autor afirma que, após o surgimento do moderno diretor teatral, no final do século XIX o espaço cênico passou a ter também a função de articulador da escrita dramática e, por conseguinte, da representação. Ou seja, “o espaço passa a configurar uma intermediação definitiva e a partir daí não haverá mais como dissociar o trabalho de encenação do trabalho de concepção de um determinado espaço cênico” (TORRES, 2004, p.41). Torres ainda diferencia espaço cênico e lugar teatral, compreendendo-os como duas noções complementares. O lugar teatral sendo entendido, sobretudo, como “[...] um lugar de representação, mas igualmente de encontro, de sociabilidade: encontro entre atores, encontro entre espectadores, membros de um público. [...] um lugar de trocas simbólicas.” (TORRES, 2004, p. 36). Segundo o autor, o lugar teatral existe tanto nas tradicionais edificações arquitetônicas, justamente denominadas “teatro“, quanto em salas teatrais não convencionais e

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locais como praças, igrejas, museus, escolas, residências, presídios, dentre tantos outros. Já o espaço cênico estaria contido no lugar teatral, possuindo duas unidades distintas – uma sendo o espaço destinado ao jogo dos atores, compreendido também como palco, e a outra sendo o espaço destinado à plateia. Assim, podemos relacionar este conceito com a distinção de Frago para a escola como espaço e como lugar. A escola não é um lugar teatral, mas, cada vez que o teatro vai à escola, ela abriga, de certa forma, um lugar teatral. À medida que se estabelece um espaço cênico e um espaço para a plateia, gera-se um ambiente propício para que haja a relação entre atores e espectadores. Ou seja, no momento do acontecimento teatral, aquele determinado espaço da escola, em certa medida, transforma-se num lugar teatral. Atores e público, ao se encontrarem em um lugar teatral, dispõem-se de acordo com o espaço cênico proposto, seja de modo frontal, em formato de arena, em corredores laterais, dentre tantas outras possibilidades. Existem inúmeros modos de se organizar um espaço, para tanto, Torres traz também a importância de levar-se em conta o olhar do espectador ao desenvolver a concepção de um espaço cênico, afirmando ser esta uma etapa fundamental durante o processo de criação.

A primeira etapa se dedicaria a determinar a escolha da estrutura espacial que melhor se adequaria como suporte à montagem do ponto de vista da organização do olhar. Isto é, como queremos que o nosso espectador se situe diante da cena e consequentemente olhe a representação. Onde o colocamos para que sua posição possa desfrutar da representação. (TORRES NETO, 2004, p.42)

Na maioria das escolas paranaenses, como referido anteriormente, não há um lugar teatral pré-determinado e que seja condizente ao modelo convencional de sala de espetáculo. Isto pode ser entendido como uma barreira às propostas teatrais para a escola ou, então, como uma grande oportunidade de explorar novas possibilidades espaciais. Portanto, para eleger dentro do espaço da escola o lugar que melhor irá abrigar a ação dramática e ainda escolher o modo mais adequado a se organizar o espaço cênico, deve-se levar em conta tanto a articulação dos atores quanto a percepção do público.

Pensando o teatro na escola a partir do teatro de rua Observando a definição de André Carreira para o teatro de rua, é possível identificar algumas semelhanças com o teatro apresentado nas escolas. Em síntese, o autor considera que “[...] o teatro de rua abarca todos os espetáculos ao ar livre que optam por ficar fora dos teatros convencionais e utilizam espaços urbanos apropriados temporariamente para o SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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fenômeno teatral, permeáveis ao público acidental.” (CARREIRA, 2007, p. 54). O teatro na escola pública paranaense, por vezes também é apresentado ao ar livre, em espaços alternativos, com dimensões, sonoridade e luminosidade variadas. Entretanto, ao contrário do teatro de rua, o espaço não é permeável ao público acidental. Na escola a plateia é bastante específica e mensurável. Isto acarreta, primeiramente, em saber-se a faixa etária e quantidade de espectadores que estarão presentes em cada apresentação, fato que demonstra uma enorme diferença entre o público da escola o público de rua. Além disso, o público escolar, que é formado por crianças, professores e, eventualmente, funcionários, carrega consigo uma postura e conduta próprias de seu ambiente. Segundo Frago, o modo de funcionamento da escola é construído culturalmente e carrega consigo valores e questões de ordem, disciplina e vigilância. Se na rua as intervenções do público são quase que incontroláveis, na escola existe um maior controle e limite. As crianças são orientadas desde onde se posicionar para assistir ao espetáculo até o modo como devem se comportar. Além disso, o espaço escolhido para realização de determinado espetáculo, por mais alternativo que seja, estará sempre inserido no contexto escolar. Ao determinar o local para uma montagem teatral, tanto na rua quanto na escola, é preciso levar em conta as dimensões físicas e arquitetônicas do espaço escolhido, a fim de compreender suas possibilidades e limitações. Na escola, por exemplo, uma mesma cenografia pode parecer grande demais para uma sala de aula, biblioteca ou refeitório e, ao mesmo tempo, parecer pequena diante da imensidão de um ginásio esportivo. Considerandose que os cenários levados às escolas são, na maioria das vezes, compactos, estreitos e relativamente baixos, ao fundo ou atrás deles sempre existirão informações do local onde estão inseridos. Sejam quadros negros, armários, janelas, cortinas, cartazes, ou, no caso da área externa, os muros, telas de proteção, árvores, prédios que circundam o terreno da escola ou mesmo as edificações da própria escola. Ainda que o olhar do espectador seja direcionado à cena, sua visão é ampla e capta todo o entorno. Sobre os recursos de iluminação, como a maioria das apresentações são realizadas no período diurno, tornam-se bastante limitados, visto que os espaços da escola são permeáveis à luz solar. Neste caso, deve ser levada em conta principalmente a iluminação natural, pois cada sala, salão ou quadra, tem uma luminosidade específica. Cada local reage de acordo com os fatores naturais do tempo, que ora oferece um céu azul e sol forte, ora oferece um dia nublado, escuro ou chuvoso.

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Todos estes aspectos são passíveis de controle quando se está dentro de uma sala de espetáculos convencional, onde também o público pode ser disposto do modo mais confortável possível. Na escola, frequentemente as crianças são convidadas a sentarem-se no chão, o que não é um problema, desde que não esteja sujo, nem úmido, nem muito gelado. Seguindo este raciocínio, se levarmos em conta as intempéries da natureza, como dias frios, dias de muito calor ou dias de chuva, encontraremos ainda mais desafios, tanto para os artistas quanto para os espectadores. Seguindo este raciocínio, notamos mais algumas semelhanças entre o espaço do teatro de rua e o espaço do teatro na escola, ambos são passíveis de múltiplos acontecimentos, que podem fomentar a dispersão, tanto por parte do público quanto por parte dos atores. Ao falar sobre a rua, Carreira considera que ela “[...] é um espaço de efervescência de ruídos e de movimentação aleatória que corta de forma contundente a construção da cena, interferindo na articulação das linguagens do espetáculo e nos procedimentos técnicos do ator”. (CARREIRA, 2007, p.45). Ou seja, a rua é um espaço dinâmico e permite, durante um acontecimento teatral, intervenções como gritos, buzinas e transeuntes passando ao fundo da cena. A cena acontece porque cria-se um espaço cênico, às vezes por convenção ou a partir de um jogo teatral, que diferencia o status dos atores do status do público, mas ela pode ser quebrada a qualquer momento. Entretanto, na escola percebe-se uma organização diferente, pois mesmo sendo um espaço alternativo semelhante ao da rua, traz certo controle por parte dos adultos. É comum que as crianças sejam vigiadas por coordenadores e professores, a quem uma das funções atribuídas é justamente a de cuidar e manter determinada ordem. A princípio esta prática se dá em prol de possibilitar a crianças a compreensão do conteúdo apresentado, mas pode tornar-se exagerada ou automatizada, ou seja, utilizada simplesmente por força de hábito. Isto remete novamente ao modelo da cena italiana tradicional, da caixa preta, onde o público deve ficar acomodado na penumbra, em silêncio e intervir o menos possível na encenação e jamais invadir a cena. Aqui soma-se também a visão do didatismo, onde se orienta aquietar o corpo e concentrar a mente para a absorção do conteúdo apresentado pelo professor. Deste modo, a forma como a escola opera, fatalmente influi na relação entre artistas e espectadores, isto é, o fazer teatral sujeita-se à estrutura do espaço escolar. Sobre este aspecto, somam-se as considerações de Frago, ao referir-se ao emprego do espaço como um produto cultural atrelado às relações interpessoais, posturas e hierarquias.

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O espaço comunica; mostra, a quem sabe ler, o emprego que o ser humano faz dele mesmo. Um emprego que varia em cada cultura; que é um produto cultural específico, que diz respeito na só às relações interpessoais – distâncias, território pessoal, contatos, comunicação, conflitos de poder –, mas também à liturgia e ritos sociais, à simbologia das disposições dos objetos e dos corpos – localização e posturas –, à sua hierarquia e relações. (FRAGO, 2001, p.64)

A arquitetura das escolas públicas de Curitiba é diversa, bem como a ocupação e o emprego de seus espaços. Ainda que estejam inseridas dentro de um mesmo contexto cultural, as posturas adotadas por cada instituição e as relações entre coordenadores, professores e alunos, variam de uma escola para outra. Portanto não é possível mensurar ou determinar como as relações espaciais e interpessoais intervêm nas produções teatrais levadas às escolas. Seria necessário um estudo aprofundado em cada instituição a fim de especificar maiores detalhes. Entretanto, sabe-se que o funcionamento e as práticas da escola influenciam no fazer artístico inserido neste contexto. Assim sendo, a presença dos professores e coordenadores antes, durante e depois das apresentações pode interferir no acontecimento teatral, uma vez que, conforme a postura adotada por eles, as crianças alteram seu comportamento.

Considerações finais Ao desenvolver uma cenografia para espetáculo teatral infantil destinado à escola, é importante considerar diversos aspectos referentes ao modo como o espaço teatral se insere no ambiente escolar. Cabe ao diretor, ao cenógrafo e à equipe de criação, portanto, pensar o modo como o espaço será, pelos atores e pelo público, reciprocamente impactado, estudando o modo mais adequado para dispor um espaço cênico que envolva as crianças e os artistas. Assim, tanto a criação do texto dramático, quanto a dos cenários, figurinos, sonoplastia, maquiagem e adereços, devem estar atreladas a outras determinantes escolhas, como o local apropriado para a apresentação e a disposição dos espaços para público e cena. O ambiente da escola oferece aos artistas do teatro, ao mesmo tempo, desafios e possibilidades, que podem trabalhar contra ou a favor da encenação. Um possível caminho para atribuir à cenografia infantil na escola a ludicidade e vitalidade mencionadas por Gabrieli, seria o desprender-se das convenções do palco italiano e investigar o potencial cênico oferecido pelos espaços da escola, compreendendo o olhar do público como fator fundamental à construção dramática. Existem modelos enrijecidos no teatro para crianças apresentado no ambiente escolar, sejam eles o modelo de ensino, modelo de teatro e modelo de relação espacial, mas que podem ser superados, a fim de se realizar um teatro que traga o potencial do ambiente escolar SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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para dentro do jogo teatral. A escola, ao abrigar o teatro, torna-se naturalmente um espaço cênico alternativo. A fim de trazer novas leituras e fazer novos usos dos espaços da escola, a arte teatral pode romper com alguns limites, proporcionando um olhar diferenciado e descobrindo o que o espaço escolar oferece de único.

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NAZARETH, Carlos Augusto. O teatro infantil Brasileiro. Rio Mídia, Rio de Janeiro 2007. Disponível em: <http://portalmultirio.rio.rj.gov.br/portal/riomidia/rm_entrevista_conteudo. asp?idioma=1&idMenu=4&label=Entrevistas&v_nome_area=Entrevistas&v_id_conteudo=67 221# >. Acesso em: 11 ago. 2014. TORRES NETO, Walter Lima. Nota sobre o trabalho do diretor com o espaço teatral. Teatro Transcende, Blumenau, n.13, 2004.

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3. O TEATRO FORA DO TEATRO: APROPRIAÇÃO DE ARQUITETURAS URBANAS EM ESPETÁCULOS TEATRAIS Ana Luiza Suhr Reghelin4

Resumo: A modernização teatral trouxe novas possibilidades para o trabalho com atores, a encenação, a cenografia e também a utilização do espaço teatral. É sobre as transformações ocorridas no espaço teatral que este artigo irá tratar, mais especificamente sobre as experiências que foram desenvolvidas em espaços não teatrais, em especial na ocupação de arquiteturas da cidade. O artigo relaciona experiências de apropriação destes espaços não só fisicamente, mas também das simbologias e historicidade inerentes a eles. Palavras-chave: teatro moderno, espaço teatral, teatro na cidade Introdução O presente artigo vai tratar sobre a utilização de arquiteturas urbanas para a realização de espetáculos teatrais, mais especificamente a utilização de edifícios que possuem uma função cotidiana e foram utilizados como local para a realização de um espetáculo. Importante destacar que este artigo não trata de prédios que se transformaram permanentemente em espaços teatrais, mas sim os que em um período determinado foram ocupados para uma realização teatral. Para abordar esse assunto é necessário voltar ao passado recente do teatro, no qual as primeiras tentativas de romper com a encenação tradicional, em um palco à italiana ou palco frontal, aconteceram. O palco à italiana foi considerado por muito tempo o espaço ideal para realizações teatrais, durante o século XIX essa arquitetura – apesar da coexistência de outras estruturas, como o palco elisabetano, teatro de rua da commedia dell'arte – foi a maneira consagrada para apresentações teatrais. O pesquisador teatral Jean-Jacques Roubine em seu livro A Linguagem da Encenação Teatral (1998) descreve que: Com os seus aperfeiçoamentos técnicos – sem esquecer o conforto e os diversos requintes que proporciona aos espectadores – ele [o palco

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Ana Luiza Suhr Reghelin é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). Formada em Educação Artística - Artes Plásticas pela Universidade Federal do Paraná, com Pósgraduação em Gestão Cultural pelo SENAC – PR. O presente artigo foi orientado pelo prof. Dr. Ismael Scheffler, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Revisão: Marcos Fernando Justino da Silva. E-mail: lusuhr@hotmail.com SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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italiano] aparece como o supra-sumo da arquitetura teatral. Ele é a solução que oferece as melhores condições de visibilidade e acústica. A que possibilita todas as transformações cênicas exigidas pela ação. A que permite os efeitos de ilusão (desde a imitação naturalista até a magia feérica) mais perfeitos. (ROUBINE, 1998, p.81)

Foi a partir do final do século XIX que encenadores e teóricos teatrais passaram a questionar as formas tradicionais do teatro, os modos de encenação, o trabalho com os atores, a construção cenográfica e também o palco e a estrutura teatral. O primeiro nome citado por Roubine como precursor destas mudanças é de André Antoine que, na França, no ano de 1887, criou o Théâtre Libre, grupo que desenvolveu o chamado teatro naturalista. O teatro naturalista não buscou representar o mundo real, mas sim levá-lo ao palco. Com essa intenção os cenários de telões pintados, muito utilizados no teatro tradicional, já não eram mais suficientes. Construções realistas e objetos reais foram colocados em cena então, de forma a levar a vida ao palco. A intenção do naturalismo foi quebrar com as convenções do teatro de ilusão, que até então era a forma tradicional do teatro. No espetáculo naturalista o espectador assistiria mais a um recorte da vida real do que a uma representação da vida real. Soma-se ao grupo dos naturalistas o trabalho desenvolvido na Rússia por Constantin Stanislávski, focado principalmente no trabalho com os atores. Em paralelo ao Naturalismo, desenvolveu-se no teatro propostas simbolistas – em consonância com o movimento simbolista da Literatura – que buscavam um teatro de novas estruturas de representação e interpretação e que exploravam as possibilidades da imaginação. No teatro simbolista tem destaque os nomes de Adolphe Appia e Edward Gordon Craig, cujas pesquisas o teórico Walter Lima Torres Neto considera fundamentais para o processo de emancipação do espaço teatral e explica que: Se, por um lado, teve-se com Appia uma revolução que promoveu a cena arquitetural com seu jogo de volume e sombras, por outro lado, com Craig teve-se a defesa de uma cena estimulada pela sugestão poética por oposição ao realismo do cenário e do jogo psicológico por parte dos atores. Ambos defenderam a condição do teatro, e, por conseguinte, da cena teatral, como uma arte do movimento, estruturada a partir de linhas, cores, gestos, volume, forma, ritmo e outros elementos visuais. (TORRES, 2004, p.40).

Sobre a estética do teatro simbolista, o teórico Newton de Souza em seu livro A roda, a engrenagem e a moeda: vanguarda e espaço cênico no teatro de Victor Garcia no Brasil (2003) pontua que: [...] [o simbolismo] não pretende a reprodução da realidade no palco; consequentemente, o tratamento visual dado à área de representação, em vez de fazer uso de objetos reais, coloca sobre o palco praticáveis cujas formas geométricas oferecem sentido abstrato à composição, auxiliados pelos recursos a luz elétrica [...] Retirando as referências

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espacio-temporais, o ambiente passa a ser o do sonho, da alegoria e da irrealidade (SOUZA, 2003, p. 39).

Segundo Roubine, Craig assumiu a utilização do palco frontal, pois ele atendia em parte as necessidades de suas peças. As alterações que promoveu foram relacionadas à utilização da cenografia, que ao invés de ser composta por telões, ou cenários que ambientavam o texto teatral, era composta de anteparos móveis que permitiam a manipulação pelos atores. Craig explorou também as possibilidades da luz na criação de formas, espaços e volumes. [...] se Craig se conforma com a estrutura à italiana, ele não hesita em esvazia-la de tudo que não corresponde à sua estética, e em remodelála à sua conveniência. Em última análise, os únicos elementos conservados ou melhorados são os equipamentos técnicos (maquinaria, iluminação), a relação frontal entre palco e plateia e a invisibilidade das fontes de produção do espetáculo (ROUBINE, 1998, p. 90)

Outro ponto que diferenciou o teatro simbolista do naturalista foi a função que conferiu ao espectador. Enquanto os naturalistas buscaram um espectador contemplador, mas que se identificasse, que sentisse a emoção que a realidade apresentada buscava transmitir, o teatro simbolista desejava um espectador atuante por meio da imaginação, que a partir dos elementos e sugestões colocados em palco elaborasse significações e interpretações sobre o que era apresentado. Isso colocou o espectador como atuante, como alguém que, estando no teatro, envolvia-se com o que era apresentado e agia sobre essa proposição teatral, apesar de não participar fisicamente da peça. Importante destacar que tanto os naturalistas quanto os simbolistas assumiram a utilização do palco de vista frontal, modificando a sua maneira e intenções, algumas estruturas, maquinarias e estilos de configuração das cenas e de atuação, mas preservando o posicionamento frontal do público com o espetáculo. Isto porque as montagens necessitavam deste ponto de vista para uma melhor recepção do espetáculo. O teatro moderno surgiu a partir dessas mudanças que envolveram o fazer do ator, a encenação, a cenografia e também o espaço teatral. Esse novo olhar passou a ser um elemento a mais de criação e de significação. Seguindo essa linha, algumas experiências foram feitas no início do século XX, explorando as possibilidades do teatro fora dos edifícios teatrais, levando a teatralidade para espaços da cidade. Muitas dessas experiências, que possuíam relações com as vanguardas artísticas das Artes Visuais, buscaram ultrapassar as tradicionais estruturas das artes, questionar os padrões de validação da arte e também interferir de uma maneira diferente com seu interlocutor, questionar, incomodar, dialogar com ele. Levar a arte

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para outras esferas que não só a da contemplação. Newton de Souza (2003) pontua algumas destas experiências: Entre as décadas de 1910 e 1920, foram realizadas as serates em cafés, porões dos teatros e galerias; o Teatro Surpresa, recheado de figurantes e intervenções inusitadas; o Teatro de Variedades, o Teatro Jornal e o Teatro Tátil [...] Em Berlim, Johannes Baader invadira a catedral da cidade desconcertando o padre que realizava o sermão ao ridicularizar o Cristo [...] Para os cubo-futuristas, após a Revolução de 1917, o teatro, entendido como veículo de agitação e propaganda, ganha as ruas e os fronts levando informações a respeito da guerra civil. (SOUZA, 2003, p. 44)

É interessante destacar que, em conjunto a estas intenções de ultrapassar a maneira tradicional de fazer teatro, de usar o espaço teatral, também estava a intenção de modificar a postura e dinâmica do público. Roubine aponta que essa modificação na maneira de dialogar com o público foi gerada pela intenção de democratização cultural que não privilegiou as classes sociais mais elevadas, mas intencionou levar o teatro a um público que normalmente não o frequentava, desejando também uma transformação deste espectador em um agente do teatro, seja estaticamente – ao estimular a reflexão, ou a criação de significados – ou então ativamente, colocando o espectador em cima do palco, conversando com o ator, existindo dentro de uma cena. Sobre isso Roubine indica os trabalhos desenvolvidos a partir dos anos de 1950 pelo Living Theatre de Judith Malina e Julian Beck, também por Ariane Mnouchkine, com o Théâtre du Soleil criado em 1964 e as pesquisas desenvolvidas por Luca Ronconi e por Jerzy Grotowski. As experiências realizadas por cada um deles são múltiplas e diversas, mas eles são alguns dos nomes do teatro experimental, que buscou novos caminhos para o trabalho dos atores, para a criação teatral e para a experiência teatral. Seus espetáculos muitas vezes proporcionavam a aproximação do espectador, gerando novas experiências pelo contato físico, sensorial, novas maneiras de posicionar, aproximar ou distanciar o público, para que este experimentasse outros pontos de vista ou múltiplos pontos de vista para uma mesma cena. O conforto das poltronas já não era mais a intenção, bancos sobre o palco, estruturas que levavam o público a assumir papéis que iam além da observação, às vezes como cenário ou parte do elenco, um espectador que se movimentava, por vezes interagia ou reagia a uma cena. Essas experiências conferiram ao espectador novas sensações e sentimentos, os quais Roubine assim descreve: A gama vai da participação mais ou menos ativa na representação até a integração no universo da ficção [...] da euforia que nasce do jogo e da sensação de estar pertencendo a uma coletividade até um mal-estar SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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provocado pela desorientação, a vaga impressão de estar transgredindo uma misteriosa proibição... De qualquer maneira, para esse espectador a prática do teatro pode tornar-se, ou voltar a ser, uma experiência, uma aventura, enfim algo novo e intenso que, assim como queria Artaud, não o deixará inteiramente intacto... (ROUBINE, 1998, p.117)

Além das experimentações feitas com a linguagem, a encenação, o trabalho de ator e a relação palco-plateia, alguns encenadores passaram a desenvolver pesquisas sobre o teatro fora do teatro, explorando os espaços da cidade, a rua, as praças e edifícios. Essas experiências são continuidade das mudanças na forma do teatro se relacionar com o público na medida em que companhias buscaram uma relação mais direta e intensa. Também na percepção de encenadores e cenógrafos sobre o espaço teatral, seu potencial criativo e suas possibilidades de diálogo com a encenação. Pensando sobre o acontecimento teatral relacionado ao seu espaço de realização, as observações desenvolvidas pelo teórico Francisco Javier sobre o espaço cênico em seu texto El espacio escénico como sistema significante destacam o espaço como um local capaz de promover trocas simbólicas e físicas com o espectador antes mesmo do espetáculo iniciar. O ato de entrar em um teatro, de colocar-se em contato com o local onde será desenvolvido o espetáculo; o olhar que se dá ao lugar destinado aos atores, que percorre o cenário, a sensação de estranheza ou de familiaridade que gera no espectador, estamos falando sem dúvida nenhuma sobre o fenômeno da significação. (JAVIER,1998, p.12)5

Se as trocas simbólicas apontadas por Javier, entre o espectador e o espaço teatral, configuram-se como uma força de significação em um espaço teatral tradicional, é possível imaginar então como a utilização de espaços da cidade para uma realização teatral interfere e intensifica a experiência teatral para o espectador. É possível reconhecer a cidade como detentora de carga simbólica, construída pela história e pela memória. Essas memórias, presentes nos espaços urbanos e nos edifícios da cidade, são construídas individualmente por cada cidadão, de acordo com suas experiências com estes locais e seu repertório cultural. Cláudio Guilarducci em seu texto Memória Urbana: um espaço construído e um tempo contado vai pesquisar a construção dessa memória por meio das relações sociais entre os cidadãos e entre os cidadãos e o espaço urbano.

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“El hecho de entrar a um teatro, de ponerse em contacto com el ámbito donde se va a desarrollar el espectáculo; la mirada que se enfrenta con el lugar destinado a los actores, que recorre el escenario, la sensación de extrañeza o de familiaridad que suscita en el contemplador, están hablando sin ningún lugar a dudas del fenómeno de la significación.” (JAVIER,1998, p.12) SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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A memória urbana está relacionada às lembranças e a todo trabalho articulado no ato de lembrar – correspondências, relações, analogias, contrastes e etc. – elaborados pela imaginação. Além disso, o ato de lembrar não necessita obrigatoriamente de uma base material perpetuada na paisagem da cidade, pois a memória é construída na e pela sensibilidade e torna-se mais real que os próprios referentes concretos e materializados (GUILARDUCCI s.d.)

Essa definição é importante para pensarmos sobre a capacidade dos espaços urbanos em possuir significações e é esta carga simbólica que muitos dos grupos teatrais buscam, quando se apropriam de espaços e arquiteturas da cidade para a criação e realização de espetáculos teatrais. Nesse sentido a colocação de Evill Rebouças é muito clara em descrever essa capacidade de significação presente nos espaços e como essa significação se insere dentro do espetáculo teatral Se compreendermos o termo dramaturgias como uma somatória entre textos ditos e aqueles que se encontram entre as lacunas da encenação, podemos afirmar que a qualidade gerada pela carga semântica do espaço passa a responder por importantes discursos do espetáculo. O espaço historicizado contamina a encenação com uma espécie de metatexto. As cargas semânticas embutidas nesses locais passam então a fazer parte dos discursos dramatúrgicos. Embora não estejam materializados pela palavra em forma de diálogos ou mesmo quando os autores não consideram certas especificidades em suas escritas, a percepção do espectador passa a impregnar-se de valores acerca do edifício público. (REBOUÇAS, 2009, p.174)

Para exemplificar essa relação entre a dramaturgia do espetáculo e a dramaturgia presente nos espaços e como a união destes elementos desperta possibilidades de interpretações sobre o espectador, podemos utilizar uma descrição presente no livro O Teatro pós-dramático (2007) do pesquisador alemão Hans-Thies Lehmann, da peça Rudi, de Klaus Michael Grüber, realizada no ano de 1979. O encenador levou o público até as ruínas de um hotel de luxo de Berlim, este hotel foi parcialmente destruído durante a II Guerra Mundial e posteriormente com a construção do Muro de Berlim foi totalmente interditado. O público, ao entrar no espaço deste hotel, visualizava toda a mobília e objetos que ainda permaneciam lá e também observava um ator sentado em uma poltrona, que lia/narrava a novela Rudi, de Bernard von Brentano, a história de um jovem que se associa ao partido comunista e sendo levado para o conflito armado entre nazistas e comunistas morre ao detonar acidentalmente uma bomba. O contexto entre a história narrada e o local onde o espetáculo acontece acaba por se relacionar já que o hotel foi um dos locais destruídos pela guerra. Erika Fischer-Lichte (2013), que faz uma análise sobre esse espetáculo, afirma que apesar desta relação, o espectador é a todo o momento desviado dessa ligação facilitada, à medida que o diretor inseriu objetos no

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espaço que não se relacionavam a história e também pela presença de outros dois atores em outros cômodos em ações como tocar um piano e estar em uma cadeira de rodas. Também a atitude não estática do público, que podia caminhar livremente e conhecer os aposentos do hotel enquanto ouvia a narração por meio de alto-falantes, instalados nos aposentos do hotel, confere uma atitude não contemplativa, o que a autora compara a uma visita ao museu. Fischer-Lichte chama a atenção para essa falta de conexão direta entre o que o público ouve, a história narrada, e ao que ele vê, objetos, outras cenas etc. Talvez tenha sido justamente essa a intenção do diretor, colocar elementos narrativos, como a leitura da novela Rudi e objetos e permitir ao espectador que ao longo desta visita construísse ligações e histórias geradas a partir do local e de sua memória, sem que esses seguissem uma narrativa linear. Havia uma história, houvera uma História, mas não mais havia coerência. O que restava, os vestígios da História, jazia em pedaços impedindo qualquer possibilidade de encontrar sentido naqueles fragmentos. Não somente não havia nenhuma delimitação estável dentro da qual podia-se perceber e agir (teatro e museu), mas também nenhuma coerência era oferecida, nem na relação entre os aposentos reais, os objetos adicionados e a história ficcional do romance, nem na relação que o visitante podia estabelecer por seus deslocamentos reais de um cômodo a outro. (FISCHER-LICHTE, p.27, 2013)

O teatro que se apropria de arquiteturas urbanas para sua realização propõe, na maioria das vezes, a ocupação do espaço público por ações que tirem esse espaço de seu uso cotidiano; também busca ativar espaços que podem estar esquecidos na cidade – uma das intenções do caso citado acima – e, pelo viés da dramaturgia e da teatralidade, utilizar esses espaços é contar com os significados, memórias e sensações destes locais, utilizar esse repertório para compor o ambiente da experiência teatral. Os textos do diretor e pesquisador André Carreira são grandes norteadores para a compreensão do teatro que ocupa a cidade e que utiliza a cidade como dramaturgia. Sua pesquisa, que se fundamenta em estudos teatrais, também se nutre de estudos urbanísticos com referências de Kevin Lynch e James Duncan e questões sociais e antropológicas com referências de García Canclini e Michel de Certeau entre outros teóricos. Carreira direciona suas investigações ao espaço da rua, da praça, mas algumas de suas colocações podem ser empregadas também para pensarmos sobre a utilização de prédios e construções da cidade, principalmente no que tange a questão de usos e fluxos que geram o imaginário urbano destes locais e das trocas simbólicas entre estes espaços e a ação dramatúrgica.

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Carreira, em seus estudos, destaca a capacidade do espaço urbano em existir como um campo simbólico e como esse simbólico é construído pelos usos e ações diárias dos habitantes dessa cidade, pelas interações e trocas que cada habitante com seu repertório cultural gera, construído o imaginário dos locais urbanos: O ambiente urbano constitui lugares cujas regras de funcionamento, usos e modos operacionais diversos, geram imagens e um potencial dramatúrgico próprio. Portanto, a silhueta da cidade pode ser compreendida como uma estrutura dramatúrgica que propõe ao teatro sempre uma relação de fruição do ambiente como significante fundamental do acontecimento cênico. (CARREIRA, 2009, p. 2).

Espetáculos teatrais que se apropriam de edifícios urbanos intencionam, em sua grande maioria, utilizar o espaço não como cenografia de fundo, mas como um dispositivo cênico, que se relacione diretamente ao ato teatral e que seja gerador de sentidos. Nestes casos, o ato teatral se apropria da carga simbólica presente nos espaços que por si só já possuem dramaturgia, utilizando-a como um caminho de significação para o espectador que se insere nesse local. Em muitos casos, este espaço é utilizado também como própria fonte de construção do espetáculo. Marvin Carlson no seu texto A cidade como teatro (2012) transcreve o comentário do diretor teatral Armand Gatti, referente a sua montagem, La coluna Durruti, que aborda o período da Guerra Civil Espanhola, que foi realizada em uma fábrica abandonada na Bélgica. Nesse relato é possível identificar a importância que a carga simbólica, e nesse caso também histórica, possui para um espetáculo teatral que utilizou como recurso se apropriar do espaço não só fisicamente, mas simbolicamente. Como este tipo de assunto é normalmente o lugar, é a arquitetura que faz a escrita. O teatro não foi localizado em algum tipo de lugar utópico, mas em um lugar histórico, um lugar com história. Lá havia graxa e havia marcas de ácidos, porque era uma fábrica química; você poderia ainda ver traços de trabalho; ainda havia roupas de trabalho em volta, ainda havia marmitas na esquina, etc. Em outras palavras, todas essas marcas de trabalho deixadas, tinham sua linguagem própria. Esses espaços que conheceram o trabalho de seres humanos dia após dia tinham a sua própria linguagem e, ou você usava essa linguagem ou não dizia nada... É por isso que eu escrevi em um artigo “uma peça com a autoria de uma fábrica (GATTI apud CARLSON, 2012, p. 20).

O contexto brasileiro: experiências de apropriações urbanas Espetáculos que utilizam espaços não teatrais, mais especificamente edifícios da cidade, também foram desenvolvidos por grupos brasileiros de teatro e nessa área, é SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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imprescindível citar os trabalhos realizados pelo grupo Teatro da Vertigem, com sede na cidade de São Paulo e dirigido por Antônio Araújo. O grupo, que possui destaque no Brasil com pesquisas e criações de espetáculos em espaços não convencionais, realizou A Trilogia Bíblica, principal produção do grupo, que é composta por três espetáculos: Paraíso Perdido, 1992, com texto de Sérgio de Carvalho; O Livro de Jó, 1995, com texto de Luís Alberto de Abreu; e Apocalipse 1,11, 2000, com texto de Fernando Bonassi. Estes espetáculos foram realizados em diferentes prédios da cidade como uma igreja, um hospital e um presídio, respectivamente. O texto Do Sagrado ao Profano: o Percurso do Teatro da Vertigem, escrito por Silvana Garcia (2002) e presente no livro Teatro da Vertigem: Trilogia Bíblica apresenta de forma completa como cada espetáculo utilizou estes locais: Em O Paraíso Perdido, em primeira instância, o espaço coincide com o mote, é adequado a ele, e a peça dialoga com os conteúdos semânticos que já estão lá impregnados. Assim, o uso que os atores fazem do espaço e dos objetos que ali se encontram concerne principalmente à sua realidade material e denuncia um processo de exploração certamente desenvolvido durante os ensaios: deslocamento dos bancos dos fiéis, aproveitamento dos locais ocultos como confessionários e a parte posterior do órgão, altar como púlpito, e outros procedimentos similares. Em O Livro de Jó, o contraste é mais impressionante. O cenário do episódio bíblico pressupõe um deserto, e isso ganha evidência simbólica imediata no espaço físico de um hospital abandonado. O transcorrer do espetáculo tem um sentido ascensional, cumprindo uma trajetória para o alto que acompanha o sofrimento da personagem. Cada um dos três andares percorridos também poderia corresponder ao percurso de Jó em seu caminho de redenção, do Inferno ao Céu, passando pelo Purgatório. Em Apocalipse 1,11, multiplicam-se os lugares, e, com isso, amplificam-se as ressonâncias. O edifício, sendo um presídio, já sugere todos os equivalentes a lugar de exclusão – punição, perda da liberdade, submissão, humilhação –, correspondendo estas literalmente a várias das situações às quais são submetidas as personagens. Mas também residem nele referências concretas, evocadas pela peça, em especial a repressão durante a ditadura militar e o massacre dos presos do Carandiru em 1992. (GARCIA, 2002, p.33)

Cada um destes espetáculos utilizou o espaço de maneira diversa, um como uma referência direta ao texto, como em Paraíso Perdido cujo tema bíblico foi tratado dentro de uma igreja, utilizando seus símbolos, seus objetos. Apocalipse 1.11 também possui essa utilização em alguns momentos, quando a referência ao presídio é feita diretamente por meio de personagens que são presidiários, já em outros momentos ele se aproxima da forma como o espetáculo O Livro de Jó, utilizou o ambiente, que aparenta a intenção de criar a sensação de confinamento, de desconforto para o espectador, utilizando a memória que este local SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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usualmente desperta na maioria dos espectadores, pois o texto em si não faz uma referência direta ao espaço. Estes três espetáculos utilizaram da carga simbólica presente nestes locais influenciando a recepção e percepção do espetáculo pelo público. Pelos relatos e críticas que são possíveis consultar no livro Teatro da Vertigem: Trilogia Bíblica (2002), fica evidente como esses espetáculos impressionaram o público – seja pela surpresa, pela angústia, pelo inesperado ou desconforto – e parece claro que essa intensidade, para além de toda carga dramática do texto e da qualidade dos atores, é acentuada pelo fato de o espetáculo acontecer dentro de locais que possuem uma simbologia muito forte em nossa sociedade – ideias de culpa, pecado, morte, agressão, sofrimentos. Todos esses elementos fazem parte do espetáculo mesmo antes da cena iniciar. O espectador apreende antes o espetáculo, seu imaginário já acessa imagens mentais, significações que esse indivíduo possui com o local. Seu imaginário já está construindo a peça teatral, as sensações e intensidades antes mesmo de ela acontecer. Outro grupo que também se destaca pela pesquisa em espaços não convencionais, como edifícios da cidade, é o Grupo XIX de Teatro, criado em 2001 na cidade de São Paulo. O grupo propõe criações que ativam espaços esquecidos, como edifícios e vilas antigas e utilizam estes locais para compor a ambientação e construção das narrativas, que em sua maioria abordam temáticas sociais e políticas. O destaque está na primeira criação do grupo, o espetáculo Hysteria, de 2001, que abordou a condição das mulheres no Brasil no século XIX e foi ambientado em um hospício. No site do grupo é possível conhecer detalhes sobre os outros espetáculos que o grupo desenvolveu também nesta linha de pesquisa. A citação que segue abaixo é referente ao espetáculo Hysteria e sobre a escolha do local para sua realização: A opção por colocar a cena em um edifício “de época” não só é um resgate físico de como aquelas pessoas [personagens] viveram, mas é também a tentativa de resgatar um pouco da memória espacial destes locais em que nos apresentamos. Apenas colocar a peça em uma “casa antiga” não bastava. Era preciso que toda a estrutura da peça estivesse voltada para este local [...] É preciso que a plateia não só contemple esta arquitetura diferenciada, mas também interaja, vivencie este local, não perdendo nunca a noção de que aquelas mesmas paredes já circundaram outras velhas histórias, tão diferentes ou iguais àquelas que agora presencia. (GRUPO XIX DE TEATRO)

Experiências em espaços não teatrais em Curitiba Para a pesquisa sobre a ocupação de espaços não teatrais na realização de espetáculos na cidade de Curitiba, o livro Palco Iluminado: 10 anos de história do Festival de Teatro de Curitiba, do escritor Geraldo Peçanha de Almeida, mostra-se como um guia, pois o autor

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produz uma compilação dos 10 primeiros anos de realização do Festival de Teatro de Curitiba. Nesse livro estão relacionadas todas as peças que estiveram em cartaz ao longo desses 10 anos – atualmente o festival já está em sua 24ª edição. Nesta pesquisa é possível verificar, por exemplo, que o grupo Teatro da Vertigem apresentou todos os três espetáculos da Trilogia Bíblica em Curitiba. Paraíso Perdido, apresentado na primeira edição do Festival, no ano de 1992, foi montado na Catedral Metropolitana de Curitiba, o espetáculo O Livro de Jó foi apresentado no ano de 1995, montado no Centro Metropolitano de Saúde e o último espetáculo da Trilogia, Apocalipse 1, 11, apresentado no ano 2000, foi montado na Penitenciária Estadual em Piraquara, na região metropolitana de Curitiba. Segundo relato do livro de Almeida, construído a partir de notícias de jornais da época, a realização destes três espetáculos em Curitiba, apesar de em anos diferentes, foi bem recebida pelo público, pois o grupo e suas criações já tinham grande destaque e reconhecimento adquiridos por boas avaliações e repercussão que tiveram durante as temporadas em São Paulo e em outras cidades, dessa forma o público de Curitiba possuía grandes expectativas sobre essas montagens. Apesar de algumas polêmicas que se relacionaram à utilização dos espaços da cidade, como a Catedral de Curitiba e o Centro Metropolitano de Saúde, todos os espetáculos tiveram ingressos esgotados e foram muito bem avaliados pelo público e pela mídia. No livro de Almeida podemos encontrar algumas descrições dessa repercussão: “O espetáculo [Paraíso Perdido] é recebido com êxtase pelos curitibanos. O público aplaudiu com entusiasmo a montagem.” (ALMEIDA 2005, p.70) e “O espetáculo [Apocalipse 1,11] foi ovacionado pelo público e pela crítica. O diretor foi aplaudido por várias vezes, e a montagem foi eleita por alguns veículos de comunicação a melhor peça do IX Festival de Teatro de Curitiba”. (ALMEIDA 2005, p.243) Outros espetáculos que se apropriaram de espaços urbanos em Curitiba foram Tempestade e Ímpeto, do grupo de São Paulo, Orlando Furioso, com direção de Renato Cohen. O espetáculo apresentado no ano de 1992 utilizou o espaço do Provincialado da Santíssima Trindade (antigo Cassino Ahú), no bairro Ahú, e pela descrição presente no livro utilizou o bosque que existe nesse local. Em trecho descrito no livro, O espetáculo leva o público a passear pelo jardim (literalmente) [...] Com sua mescla de exacerbações românticas ocidentais e de dialéticas questões budistas, a montagem de Cohen, dentro de um bosque, recorre à força da natureza, de imagens, de mantras tibetanos, da dança e do ritual para tirar o espectador do mundo cotidiano, incolor, e SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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projetá-lo para outra dimensão, a do sono e do sonho, onde quase se diluem as fronteiras entre a arte e a vida. (ALMEIDA, 2005, p.68)

Na nona edição do Festival, no ano 2000, foi realizado o espetáculo The Game, do diretor paranaense Tony Silveira, a montagem foi feita no Palace Hotel Costa Brava e, segundo o livro de Almeida, a peça foi inspirada no jogo Detetive – jogo de tabuleiro em que os participantes assumem o papel de detetives e por meio de pistas buscam desvendar o mistério e descobrir quem foi o autor do crime. Na peça, assim como no jogo, os espectadores foram conduzidos pelos aposentos do hotel, recebendo informações e pistas para conhecer a história e conhecer seu final. “O público está presente na hora do crime e deve seguir as pistas juntamente com os atores, a fim de desvendar o mistério” (ALMEIDA, 2005, p. 268). Nessa compilação feita por Almeida, é possível identificar outros espetáculos que foram realizados em espaços não teatrais, como bares, parques, restaurantes, mas que não inseriram as características e especificidades destes locais no contexto da peça. Não houve um diálogo efetivo entre a dramaturgia do espetáculo e a dramaturgia contida nestes locais. Muitos espetáculos buscam estes locais como uma forma de deslocar o público dos espaços teatrais convencionais e para buscar relações mais próximas com o público, mas não exploram os potenciais criativos e simbólicos que os espaços cotidianos podem acrescentar ao espetáculo. Por essa característica eles não são citados neste artigo. Em pesquisa nos guias da programação do Festival de Teatro de Curitiba dos últimos quatro anos (2010 a 2014), é possível identificar mais peças que se apropriaram de arquiteturas urbanas e que inseriram estes espaços como elementos de suas criações. No ano de 2010 foi realizada a peça Burlescas, da Companhia Silenciosa, de Curitiba. A peça, realizada no bar Blues Velvet, no Centro de Curitiba, buscou o ambiente que remetesse ao ambiente de cabaré “uma montagem instigante, composta por performances, danças sensuais, música eletrônica ao vivo, discotecagens inusitadas, esquetes teatrais, projeções de vídeo.” (BEM PARANÁ, 2010), estes elementos apresentados na peça buscavam referências ao espetáculo burlesco. A escolha por um bar que se localiza em uma região da cidade de Curitiba, tida como underground, foi intencional e buscou despertar sensações e criar expectativas e inquietações no espectador, preparando o público para a experiência cênica que ele iria vivenciar. O descritivo da peça apresenta: “Burlescas proporciona uma relação mais ativa entre obra e público, que circula livremente pelos ambientes, assiste às apresentações, interage SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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com o que está acontecendo e também com os outros espectadores na medida em que assim quiser, elemento que torna cada apresentação diferente e única” (BEM PARANÁ, 2010). No Festival de Teatro de 2011, a peça Navalha na Carne, texto de Plínio Marcos, montada pela companhia carioca Sete Sóis Produções Artísticas, utilizou um hostel, localizado no Centro de Curitiba, como local de realização da peça. A apropriação deste espaço se deu pelo ambiente que a peça retratou, um quarto de hotel de baixo nível – apesar de o hostel utilizado não ser um local desse estilo, mas estar em uma região de hotéis de baixo custo – um espaço de natureza semelhante ao cenário da peça e pelos espectadores assistirem a peça dentro de um dos quartos deste hostel. Segundo a sinopse da peça: “para reforçar a violência, não só física como verbal, usamos o diálogo original na íntegra, convidando o público a assistir com a respiração presa, como se estivesse acontecendo ‘in loco’ o enfrentamento cara a cara com a crueldade e a violência dos personagens” (20º FESTIVAL DE TEATRO DE CURITIBA, 2011, p.166) Na edição de 2012, a peça Memórias Torturadas – A Ditadura e o Cárcere no Paraná se apropriou da Penitenciária do Ahú para falar sobre a ditadura de 1964 no Paraná e os temas relacionados a ela, tortura, censura, política. Relevante destacar que a penitenciária foi realmente utilizada como cárcere para presos políticos na década de 70 e atualmente está desativada. Em reportagem concedida ao repórter Roger Pereira, do portal Terra, na seção Arte e Cultura, o escritor e diretor da peça Gehad Hajar falou sobre as intenções e motivações para a criação do espetáculo, na reportagem é possível ler também uma breve descrição do clima do espetáculo e a forma de utilização do espaço da penitenciária: “o público passa por momentos angustiantes, percorre as galerias escuras do presídio, assiste a uma cena de tortura no pátio central da prisão e, na sequência sobe para o terceiro andar de alas de celas, onde acompanha a história [...]” (PEREIRA, 2012). De forma diferente ao que foi realizado pelo Teatro da Vertigem no espetáculo Apocalipse 1.11, que utilizou o espaço pela carga simbólica que possui dentro de nossa sociedade sem que o texto tivesse uma relação direta com aquele presídio, o texto de Memórias Torturadas relacionou-se diretamente ao local e aos fatos históricos que aconteceram lá – além de utilizar a simbologia que o presídio possui. Isso se configurou como um fator a mais de significação e de aproximação do público com o espaço e com o espetáculo, principalmente para espectadores que possivelmente vivenciaram essa história. Hajar ainda explica sobre a escolha do local:

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A ideia só faz sentido aqui no presídio, se formos levar o espetáculo para fora, teremos que reescrever todo o texto. Trouxemos o público para cá para sentir um pouco da sensação. Sabe-se lá quantas pessoas foram torturadas e até morreram aqui dentro", contou Hajar. "O objetivo é causar um mal-estar mesmo, para que as pessoas deem mais valor a quem deu a vida para termos um país democrático. (PEREIRA, 2012)

Na edição de 2013 o Festival de Teatro trouxe a peça Uma História Radicalmente Condensada da Vida Pós-Industrial, do grupo paulistano Coletivo Independente. A peça, baseada no livro de David Foster Wallace, foi realizada no bar Gato Preto, tradicional bar boêmio do centro de Curitiba. O público, que se misturou com os frequentadores do bar, recebeu um aparelho com fone de ouvido que transmitiu as falas dos atores, somente essas pessoas puderam ouvir o texto da peça, que se desenrolou durante uma noite comum de funcionamento do bar. O texto que se ouve é construído a partir de trechos do livro de Wallace, livremente adaptados para a situação e a arquitetura dos espaços. Efeitos sonoros controlados remotamente com o auxílio de equipamentos de som e computadores se sobrepõem à atuação dos atores criando um ambiente que existe principalmente como camada sonora para os espectadores. Ator e “plateia” se inserem assim dentro de uma espécie de realidade isolada dos demais visitantes. Esse espaço intransponível de fricção entre o real e o fictício, entre a “verdade” e a “mentira”, entre a experiência pessoal e coletiva é também o espaço que circunscreve o universo dos personagens do livro. (FLORES, 2013)

Em outra matéria sobre o espetáculo encontram-se informações sobre a escolha do espaço pelo grupo e sobre a utilização deste local: Queríamos um lugar com história na cidade. Um lugar que fosse tradicional, mas que tivesse um ar decadente”. Para o staff da peça, a realidade do lugar se mistura inúmeras vezes com a história que eles contam. A atriz revela, ainda, que a mistura do habitual público da casa com o público do festival em si enriqueceu o enredo e as interferências performáticas. (PANEK, 2013)

Estas foram algumas das peças realizadas ao longo das edições do Festival de Teatro de Curitiba até o ano de 2013, que se apropriaram de arquiteturas urbanas e que se aproximaram da ideia de criação a partir de espaços não tradicionais do teatro. Principalmente no sentido de utilizar estes espaços como possibilidade de criação e de diálogo entre o espetáculo e a dramaturgia destes locais.

Considerações Finais Ao longo do artigo foram citadas peças e comentários sobre espetáculos teatrais que,

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em sua maioria, propuseram a ocupação de arquiteturas da cidade como uma forma de utilizar a dramaturgia presente nestes espaços e de maneira que essa característica aproximasse e integrasse a cena e o público. Essa intencionalidade é uma característica atual, mas que vem sendo desenvolvida desde o início do século XX, com criações teatrais que buscaram quebrar com as tradições do palco à italiana e de vista frontal, que determinavam posições muito estáticas e impessoais para o espectador. As pesquisas que foram desenvolvidas a partir desse período inicial da modernização teatral demonstraram a procura por relações diferenciadas entre o espetáculo e o público, mas também na exploração de novos espaços para realizações teatrais e a exploração destes espaços como fonte criadora e geradora de significações para o espetáculo. A pesquisa e escrita deste artigo pretendeu destacar uma das múltiplas possibilidades de criação cênica, que se tornaram possíveis a partir da modernização teatral. Este artigo procurou apresentar pesquisas cênicas que saíram dos espaços tradicionais do teatro e buscaram, nos espaços urbanos, arquiteturas que proporcionassem a criação teatral a partir de estruturas, simbologias e historicidades destes locais, e que também e principalmente, utilizaram essas características como caminho para intensificar a experiência teatral para os espectadores.

Referências: 20º FESTIVAL DE TEATRO DE CURITIBA. PROGRAMA OFICIAL, 2010. 21º FESTIVAL DE TEATRO DE CURITIBA. PROGRAMA OFICIAL, 2011. 22º FESTIVAL DE TEATRO DE CURITIBA. PROGRAMA OFICIAL, 2012. 23º FESTIVAL DE TEATRO DE CURITIBA. PROGRAMA OFICIAL, 2013. ALMEIDA, Geraldo Peçanha de. Palco Iluminado: 10 anos de história do Festival de Teatro de Curitiba – Curitiba: Ed. UFPR, 2005. BEM PARANÁ. Companhia Silenciosa leva "Burlescas" ao Fringe. Curitiba, 16 mar. 2010. Disponível em: < http://www.bemparana.com.br/noticia/138257/companhia-silenciosa-levaburlescas-ao-fringe >. Acesso: 02 set. 2014. CARLSON, Marvin. A cidade como teatro. O Percevejo Online. v. 04, n. 01, ago – dez. 2012. Disponível em: < https://docs.google.com/file/d/0BwfmmsYdfziLWhleHY5SjNLa1U/edit?pli=1>. Acesso em: 31 jul. 2014.

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4. A ESCRITA CENOGRÁFICA NO TRABALHO DE FERNANDO MARÉS COM A COMPANHIA BRASILEIRA DE TEATRO ENTRE OS ANOS DE 2010 E 2012 Paulo Vinícius Alves6

Resumo: Este texto apresenta uma revisão da cenografia no teatro a partir do início do século XX, propondo, numa abordagem histórica, a fim de articular a compreensão do conceito de “escrita cenográfica” ou “dramaturgia cenográfica” do trabalho que o cenógrafo Fernando Marés desenvolveu com a Companhia Brasileira de Teatro de Curitiba entre os anos de 2010 e 2012. O artigo enfoca a abordagem da cenografia como dramaturgia visual de um espetáculo, tornando a espacialidade como signo atuante para a construção e a recepção da cena teatral. Apresenta-se um recorte específico de pensadores e propulsores da evolução cenográfica no século XX, para então relacioná-los com o trabalho de Fernando Marés. Destata-se, nessa base histórico teórica, os estudos de Roubine (1998) e Lehmann (2007). Palavras-chave: Teatro, cenografia, evolução cenográfica, Fernando Marés.

Introdução Este artigo foi escrito como requisito parcial para obtenção do título de Especialista junto ao Curso de Especialização em Cenografia da Universidade Tecnológica Federal do Paraná e procura refletir sobre a cenografia enquanto signo teatral atuante dentro do espetáculo, que informa e se revela na duração das cenas, caracterizando-se como um elemento importante para a dramaturgia visual. A partir da revisão bibliográfica, foi traçado um panorama de como a cenografia foi abordada durante o século XX, buscando mapear pontos de confluência com a escritura cenográfica de Fernando Marés no trabalho desenvolvido com a Companhia Brasileira de Teatro entre os anos de 2010 e 2012, cujos depoimentos foram colhidos por meio de entrevista7, em que ele relatou os processos desenvolvidos na construção cenográfica dos espetáculos Vida (2010), Oxigênio (2010), Isto te interessa? (2011) e Esta criança (2012).

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Paulo Vinícius Alves é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). Bacharel em Artes Cênicas pela Faculdade de Artes do Paraná (2008). Licenciado em Filosofia pela Universidade Estadual Paulista (1998). É artista, cenógrafo, diretor e figurinista atuante em diversos grupos e companhias curitibanas. Diretor artístico da produtora Figurino e Cena Produções Artísticas. O presente artigo foi orientado pela profa. Dra. Maurini de Souza, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Revisão: Luiz Henrique Bezerra. E-mail: figurinoecena@gmail.com 7 Entrevista cedida a Paulo Vinícius por e-mail. Respondido em 15 jun. 2014. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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A evolução da cenografia na caixa cênica italiana Segundo Roubine (1998), o modelo à italiana de palco é a construção mais adotada pelo teatro desde o século XIX, principalmente pelos mecanismos técnicos que possibilitam, entre outros fatores, os recursos de acústica, as condições para melhor visibilidade da cena, os efeitos de ilusões e as transformações cenográficas exigidas pelas ações dramáticas. Apesar das muitas manifestações e tentativas alternativas de uso de outros lugares teatrais no decorrer da segunda metade do século XX e do século XXI, na tentativa de aproximar a cena teatral do espectador, diretores e encenadores continuaram a utilizar o palco italiano como um espaço fechado em si mesmo, com a antiga noção de quarta parede, onde os atores não se relacionavam com a plateia, que assistia ao evento teatral como quem via uma pintura em movimento, dentro de uma moldura. A abordagem deste artigo será focalizada sobre um recorte específico, a partir do uso e desenvolvimento da cenografia dentro da caixa cênica italiana como uma espacialidade que ultrapassa a noção de ambientação ou decoração cênica. Ao se lançar um olhar para o uso da cenografia durante o processo histórico do teatro, percebe-se que as construções cenográficas acompanharam as características dos diferentes períodos artísticos do século XX e XXI e se desenvolveram mediante ao pensamento técnico teatral de cada momento. Para uma melhor compreensão do cenário construído na contemporaneidade, faz-se necessário rever os processos utilizados na construção histórica da cenografia em que, por exemplo, os mecanismos que possibilitaram os efeitos cenográficos do período Barroco foram relevantes para pensar o efeito teatral na encenação contemporânea, inclusive no trabalho do cenógrafo Fernando Marés na Cia Brasileira de Teatro. Roubine (1998) comentou que a cenografia do final do século XIX foi marcada pela presença dos pintores na criação e execução dos cenários. Painéis pintados representavam os lugares e tentavam reconstruir a realidade; neste sentido, até o Simbolismo buscava uma maneira mais subjetiva de significar sentimentos ou sensações por meio desses telões. A posição fixa e frontal do espectador diante da cena se relacionava com a postura de quem vê uma pintura num quadro e o cenógrafo, por sua vez, utilizava-se do painel de fundo de forma não muito diferente que a do suporte da tela pintada, o quadro; dessa forma a característica bidimensional da pintura, mantinha-se na cenografia desse período. A caixa cênica do palco enquanto espaço cênico permaneceu manifestamente subaproveitada pela cenografia pictórica. Com efeito, e salvo em caso de exigências específicas da peça ou do encenador, a área de representação ocupa um plano único, e os únicos volumes que o pintor integra à composição da imagem cênica são os figurinos e os acessórios (ROUBINE, 1998, p. 132).

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A pintura representava os lugares e os ambientes onde se passavam as ações, porém pouco se relacionavam com o espaço tridimensional do teatro. Essa proposição foi inicialmente apresentada por Adolphe Appia (1862-1928) e Edward Gordon Craig (18721966), teóricos que consideraram que o espaço cênico deveria ser estabelecido em três dimensões, estruturando o espaço, valorizando questões arquiteturais como volumes, profundidades, níveis, sombras e luzes, elementos com que o corpo do ator, também tridimensional, pudesse se relacionar, criando relações rítmicas, um espaço vivo, como o próprio Appia assim denominou nas suas construções espaciais. O espaço vivo será, portanto, aos nossos olhos, e graças à intervenção intermediária do corpo, a placa de ressonância da música, poder-se-á mesmo avançar o paradoxo de que as formas inanimadas do espaço, para se tornarem vivas, têm de obedecer às leis de uma acústica visual (APPIA, sd, p.32).

A cenografia passou por uma mudança estrutural a partir desses dois teóricos do teatro, deixando apenas de decorar o palco e abrindo lugar para um novo momento cenográfico, como Jean Jacques Roubine na sua obra A linguagem da encenação teatral chamou de cenário de arquiteto: Trata-se, em suma, de elaborar um sistema coerente de volumes e de planos, que só manterão com a realidade uma relação alusiva ou simbólica, e que farão do espaço da representação antes de mais nada uma base eficaz para as evoluções do ator. Por oposição ao cenário de pintor, que vale das combinações de cores dentro das características bidimensionais, temos aqui os rudimentos de uma nova teoria, que dá início ao cenário de arquiteto (ROUBINE, 1998, p. 132).

Tanto Appia quanto Craig propuseram que as mudanças na cenografia deveriam acontecer dentro dos limites e recursos da caixa cênica, estabelecendo-se na relação frontal com a plateia. Nenhum dos dois defendeu a necessidade de outro espaço para a apresentação do espetáculo. Ambos acreditavam que as mudanças deveriam ser apenas estruturais, ou seja, o palco italiano e a relação frontal com a plateia ainda poderiam ser abordados de inúmeras formas, valorizando a tridimensionalidade da cena. Segundo Marco Aurélio de Almeida Hans-Thies Lehmann informa no seu livro Teatro pós-dramático, que os paradigmas de entendimento dos signos teatrais sofreram mudanças a partir do século XX, com o nascimento do cinema, que obrigou o teatro a olhar para suas próprias formas expressivas, ganhando aplicabilidade somente no início da década de 1970. Segundo ele, a partir desse período, o texto deixa de ser o principal viés da construção cênica, transpondo aos outros signos do espetáculo uma importância tão grande quanto à supremacia do texto de até então. Dessa maneira, o figurino, a iluminação, a sonoplastia e a cenografia seriam SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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tomados também como material criativo e signo atuante para a construção do espetáculo. “O palco passa a ser o texto, não a literatura. Esta se encontra amalgamada com outros materiais para dar conta da nova escrita: a escrita espetacular” (ALMEIDA, 2010, p. 71). Outros elementos são incorporados ao conceito de espacialidade, que foram se desenvolvendo junto com o conceito de dramaturgia visual, assim como o conceito de dramaturgia sonora, que Silvia Fernandes elucida, a partir de sua leitura sobre Lehmann: Segundo Lehmann (2007), a dramaturgia visual em geral acompanha a sonora no teatro pós dramático. Ela não precisa ser organizada exclusivamente de modo imagético, pois se comporta, na verdade, como uma espécie de cenografia expandida que se desenvolve numa lógica própria de sequências e correspondências espaciais, sem subordinar-se ao texto, mas projetando no palco uma trama visual complexa como um poema cênico (FERNANDES, 2010, p. 26).

Na contemporaneidade os espaços alternativos são revisitados e reinventados, segundo as necessidades de cada linguagem teatral específica, porém a caixa cênica permanece como o mais confortável lugar teatral, desejável para as mais variadas encenações, principalmente pelas facilidades obtidas com os recursos técnicos. Um lugar provido de recursos técnicos de iluminação, sonoplastia e maquinaria cênica, configura-se como a melhor opção para as produções teatrais que buscam adequar os recursos financeiros, disponíveis e limitados de produção, com os desejos eloquentes e ambiciosos referentes à construção cenográfica. A aceitação do palco italiano na contemporaneidade como uma possibilidade de ampliação do discurso cenográfico, ressignificando os lugares concretos da cena, expandindo a relação cena-público para outras camadas da recepção, é a investida do cenógrafo Fernando Marés como exemplo de escrita cenográfica para a efetivação de uma dramaturgia visual que dialogue com os desejos de criação teatral do artista contemporâneo.

A escrita cenográfica no trabalho de Fernando Marés No tocante ao discurso da cenografia de Fernando Marés, apresentada nos mais recentes espetáculos da Companhia Brasileira de Teatro, grupo curitibano com destaque internacional e dirigido por Marcio Abreu, é possível perceber um trabalho que se relaciona com o contexto da encenação, explorando outras camadas do entendimento e que vão além da localização espacial ou puramente de um lugar onde a cena acontece. Neste sentido, a cenografia propõe seu próprio discurso além do ilustrativo. Mais do que um espaço realista, o cenógrafo tem criado diferentes espacialidades em que a possibilidade do habitar é mais coerente com o que a dramaturgia textual propõe na encenação. Entendemos aqui o conceito de espacialidade como um lugar de relação da cena com o público, onde o discurso teatral possa existir. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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De acordo com a entrevista realizada nesta pesquisa, o cenógrafo Fernando Marés diz pensar a cenografia no contexto do próprio termo, ou seja, como grafia da cena, uma escrita que se desenrola durante a duração da encenação. A forma cenográfica desenvolvida pelo artista busca se estabelecer como um discurso repleto de significantes que, junto aos demais signos da encenação, são comunicados ao espectador. Dessa maneira, seu trabalho ultrapassa os limites da localização do “onde”, uma classificação histórica remetida à cenografia na evolução teatral, pois por muito tempo, a cenografia foi arquitetada apenas como um instrumento para se reconstruir principalmente um lugar concreto onde a cena aconteceria e, nesse sentido, o espaço era pensado muito mais como ornamentação do que como “signo atuante” ou “objeto falante”, como define Marés. Nesse momento, é interessante estabelecer um paralelo com a explicação dada por Hans-Thies Lehmann, em seu livro Teatro pós-dramático, para o espaço teatral pós-dramático: O espaço teatral pós-dramático estimula conexões perceptivas imprevisíveis. Ele pretende ser mais lido e fantasiado do que registrado e arquivado como informação; ele visa constituir uma nova “arte de assistir”, a visão como construção livre e ativa, como articulação rizomática (LEHMANN, 2007, p. 276).

O conceito de rizoma na citação de Lehmann está ligado a maneira sem precedentes como o espaço é abordado no teatro pós-dramático. A articulação pós-dramática do espaço teatral não tem raízes em nenhum período anterior da história. Nesse sentido, a cenografia poderá ser entendida como uma arte vinculada ao tempo e ao espaço teatral e, por isso é uma área com muitas possibilidades de comunicação. Para Marés, expandir o espaço e o tempo, essas duas grandezas teatrais, é o que deve ser desenvolvido pela cenografia na contemporaneidade, de acordo com os demais signos do espetáculo, articulando oportunidades e sabendo dialogar com a cena que se apresenta. Nesse sentido, ele acredita que a cenografia é um passo a mais do que o design e a arquitetura, pois é a forma do cenário em ação, em movimento na cena. O espaço surgirá entre as imagens e a leitura que se faz do acontecimento teatral, pois não é dado como estático, existindo a possibilidade, por exemplo, do movimento, ou, em outras palavras, do efeito teatral de deslocamento da forma cenográfica. A cenografia deve ser lida pelo espectador no tempo da cena e não apenas descrever o local onde se passa a ação dramática. É um lugar que deve estar o tempo todo em movimento, possibilitando ao expectador construir o sentido da cena e não apenas ser tomada como o suporte para o trabalho do ator e a pura plasticidade da cena.

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No teatro pós-dramático o espaço se torna uma parte do mundo, decerto enfatizada, mas pensada como algo que permanece no cotidianuum do real um recorte delimitado no tempo e no espaço, mas ao mesmo tempo continuação e por isso fragmento da realidade e da vida (LEHMANN, 2007, p. 268).

O entendimento dessa espacialidade só será possível na relação do teatro com o público, que se completa a partir da sucessão de cenas apresentadas na duração do espetáculo, não é um entendimento desenvolvido apenas a partir das proposições do cenógrafo. Por outro lado, toda a equipe de criação deverá compartilhar desses conceitos acerca do espaço teatral apresentado pela cenografia contemporânea. Marés defende um trabalho feito em conjunto, com a soma de diferentes interesses: do texto, do diretor e dos demais artistas envolvidos numa produção. A cenografia é um dos discursos da encenação e deve estar em comum acordo com os demais discursos, pois quando o cenário ficar pronto, será metade do caminho que deverá ser percorrido pelos artistas envolvidos, pois ainda faltará se fazer aquilo que realmente importa, a cena, um trabalho desenvolvido em conjunto por vários interesses e vontades coletivas. A cenografia, entendida como dramaturgia, busca evocar os sentidos do espectador, atuando junto ao conjunto da cena. Propor as novas camadas da recepção sensorial e propor a atualização em tempo real daquilo que é dito e visto pelo espectador no correr da cena é entender a cenografia como elemento atuante no espetáculo, ou seja, um discurso que só será comunicado na duração do evento teatral. Questionado sobre os deslocamentos e movimentos de suas paredes e objetos cenográficos, Marés diz que junto à presença cenográfica está a possibilidade do efeito, o movimento, o deslocamento da forma cenográfica no espaço, transformando o cenário em atuante na encenação. A característica da ação cenográfica é inteiramente relevante, uma vez que o movimento e o deslocamento estiveram presentes nos mais recentes trabalhos do artista. É sobre essa característica que se propõe refletir com a abordagem às criações dos cenários da Companhia Brasileira de Teatro, apresentadas na sequência. Vida8 (Figuras 1 à 5), um espetáculo que estreou em Março de 2010 no teatro José Maria Santos em Curitiba, foi resultado da pesquisa que a companhia desenvolveu a partir dos estudos sobre a vida e a obra do poeta curitibano Paulo Leminski, falecido em 1989. Nesse espetáculo, o espaço foi pensado como transitório, de passagem. O cenário apresentava uma construção de gabinete, um grande salão, cuja parede de fundo se deslocava 8

Espetáculo Vida – FICHA TÉCNICA – Elenco: Giovana Soar, Nadja Naira, Ranieri Gonzales e Rodrigo Ferarini – Texto e direção: Marcio Abreu – Dramaturgia: Giovana Soar, Marcio Abreu e Nadja Naira – Trilha sonora: André Abujanra – Musico: Gustavo de Proença – Preparação Vocal: Babaya – Cenário e figurino: Fernando Marés – Design Gráfico: Pablito Kucarz – Fotografia: Elenize Dezgeniski – Vídeos: Marlon de Toledo – Direção de Produção: Cássia Damasceno – Realização: Companhia Brasileira de Teatro. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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em direção oposta ao proscênio, ampliando a profundidade, bem como as paredes laterais. A cenografia criada se relacionava com o texto, dramaturgicamente na medida em que o deslocamento da parede potencializava o espaço como signo da transformação. Referencialmente, a ideia era a de um não lugar, um espaço social em que não se habita na realidade, mas que é possível de ser compartilhado com os atravessamentos individuais de cada personagem. Esse conceito do não lugar foi desenvolvido pelo antropólogo Marc Auge e se relaciona com os espaços públicos como aeroportos e rodoviárias, principalmente quando “existem espaços onde o indivíduo se experimenta como espectador, sem que a natureza do espetáculo lhe importe. Tal fenômeno pode ser percebido melhor quando pensamos na situação do viajante, cujo espaço praticado enquanto viaja seria o arquétipo do não lugar” (AUGE, 2012, p. 81). A cenografia de Vida apresenta ao público um salão de festas, um lugar de passagem, que não pertence aos personagens, uma não propriedade onde se desenrolam vivências sociais. Metaforicamente, o mundo é um não lugar dos seres viventes, pois também eles estão aqui de passagem. Marés lembra que a ideia de propriedade é um conceito inventado e não natural para se obter um mínimo de segurança diante do mundo; com essa imagem, ele justifica o mapamúndi que, sem motivo aparente, parece despencar da parede de fundo do cenário.

Figura 1 − Espetáculo Vida Foto: Elenize Dezgeniski (2010)

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Figura 2 − Espetáculo Vida Foto: Elenize Dezgeniski (2010)

Em Vida, a cenografia está intimamente ligada à dramaturgia textual, à questão cênica, pois resignifica o entendimento do espectador ao apresentar uma grande e pesada parede movente que, segundo o cenógrafo, pode se opor ou concordar com a cena que se apresenta, dependendo exclusivamente do sentido que o espectador atribui a essa relação. O deslocamento da parede não é apenas um efeito técnico dentro do espetáculo, é a cena que comunica ao público tentando se resignificar, isto é, a cenografia “explodindo seus questionamentos”, abrindo brechas para seus condicionamentos. Deslocar um objeto aceito como pesado e imóvel traz a intenção implícita do desconforto, foge do costume e faz com que o espectador tenha sempre que retomar a cena a cada vez. Acho que a parede se move porque o movimento é um predicativo inerente ao teatro, revisto sempre sob a ótica da impermanência porque provoca não a ilusão consentida, mas a desilusão, explodindo a comodidade. Nesse jogo cênico se inquieta o olhar e se transita por um caminho crítico e reflexivo, prazeroso e brilhante, arejando a cena e o teatro (MARÉS, 2014).9

Figura 3 − Espetáculo Vida Foto: Elenize Dezgeniski (2010) 9

As citações de Fernando Marés são trechos da entrevista realizada com o cenógrafo e serão sempre indicadas dessa maneira. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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O processo de desenvolvimento da escrita cenográfica teve continuidade na criação da cenografia do espetáculo Oxigênio10 (Figura 6 a 10), que estreou em dezembro de 2010. Dessa vez, a questão inicial era criar um cenário compatível com a sala de ensaios da Companhia Brasileira. O local de estreia era uma sala não convencional de espetáculo, pequena e para uma plateia pequena. A montagem aproveitou toda a escala daquele espaço, estruturando volumes e formas que depois pudessem ser adaptados em diferentes palcos, já que o espetáculo viajaria para várias cidades.

Figura 4 − Espetáculo Oxigênio Foto: Elenize Dezgeniski (2010)

O texto de Oxigênio possibilita a criação de imagens, dessa maneira a cenografia deveria atualizar seus conceitos, de forma distinta dos que a dramaturgia textual já apresentava. Novamente a concepção idealizada foi a de transitoriedade, de passagem, um espaço em que uma história de amor e morte fosse apresentada e narrada nas dez cenas propostas pela dramaturgia. A encenação trazia uma banda de rock que ensaiava e se apresentava enquanto a história era contada, Marés comenta que havia o interesse de que os estados dos atores fossem alternados enquanto personagens e músicos no desenvolvimento das cenas. A cenografia de Oxigênio apresentou uma rampa que foi pensada para que o público fosse se posicionado com um sentido determinado, em que texto, músicas e ações físicas “escorressem” em direção a ele. Sob esse intuito, um palco elevado com cortinas que se abriam foi criado ao fundo e, na frente dele, essa rampa descia até a frente do palco real. 10

Espetáculo Oxigênio – FICHA TÉCNICA – Elenco: Patrícia Kamis e Rodrigo Bolzan – Direção: Marcio Abreu – Texto: Ivan Viripaev – Musico: Gabriel Schwartz – Tradução: Irina Starostina e Giovana Soar – Adaptação: Marcio Abreu, Patricia Kamis e Rodrigo Bolzan – Iluminação: Nadja Naira – Cenário: Fernando Marés – Figurino: Ranieri Gonzalez – Design Grafico: Pablito Kucarz – Fotografia: Elenize Dezgeniski – Cenotécnico: Mateus Fiorentino – Direção de Produção: Cassia Damasceno – Realização: Companhia Brasileira de Teatro. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Sobre a rampa, a encenação transitava a partir das referências de bandas de garagem, rock and roll e performances, desenrolando-se sobre uma espacialidade criada para presentificar as ações e conferir as cenas os seus próprios limites. A rampa cenográfica instaurava um ambiente de readequação física e psicológica para o ator, como um dispositivo que permitisse ao seu corpo questões como o equilíbrio, a segurança e realinhamento, como ressalta Marés em sua entrevista. Essas relações remetem-se às proposições de Appia, quando criou os espaços rítmicos, propondo que a “adequação psicológica se combina alí com uma tensão física instaurada por um sistema de planos inclinados, de escadas e de todos os elementos arquitetônicos suscetíveis de obrigar o corpo a dominar as dificuldades em trampolins para a expressividade” (ROUBINE, 1998. p. 119).

Figura 5 − Espetáculo Oxigênio Foto: Elenize Dezgeniski (2010)

Novamente a ideia de escrita cenográfica é tomada como mote principal, como viés para um discurso que será decifrado no momento da cena, pois na última cena de Oxigênio a rampa é levantada (Figura 10), revelando um campo/jardim de flores secas refletido num espelho, quebrando o detalhe cenográfico que antes se dava pela cor preta, surpreendendo o público e revelando uma nova espacialidade que renovava a assimilação daquilo que estava sendo visto e ouvido até então.

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Figura 6 − Espetáculo Oxigênio Fonte: Elenize Dezgeniski (2010)

Sobre essa atitude cenográfica da ressignificação, Marés explica que busca imaginar a cena como um rio para entender os refluxos, os ritmos e o que está abaixo da superfície. A atitude cenográfica instaurada, menos pelo efeito e mais pela significação, é eficaz quando tenta propor os movimentos ou os deslocamentos presentes na cenografia como relações com a textualidade cênica, pois, “encenar, cenografar e apresentar são verbos concomitantes e precisam estar ajustados cenicamente, procurando, sempre um comum, que é a cena do teatro” (MARÉS, 2014). Em setembro de 2011, no Teatro Novelas Curitibanas, Isso te interessa?11(Figura 11 à 15), outro espetáculo da Cia Brasileira de Teatro, foi levado ao público com uma cenografia menos sofisticada que as anteriores, mas que também permitiu uma reflexão a partir do deslocamento das formas cenográficas. Em determinado momento, os elementos do cenário se deslocam das suas posições iniciais, uma luminária entortando, uma mesa tombando, denotando tempo passado e perdido das vidas reprimidas de uma família, tomada nas três gerações diferentes como o espetáculo apresentava. Os atores ora vivenciam os personagens da família, ora narram as situações por eles vividas, comentando seu próprio drama e, ao mesmo tempo, imergindo-se nele. Marés explica que novamente o sentido trabalhado na cenografia foi o de “despertencimento”.

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Espetáculo Isso te interessa? – FICHA TÉCNICA: Elenco: Giovana Soar, Nadja Naira, Raniere Gonzales e Rodrigo Ferrarini – Direção: Marcio Abreu – Texto: Noëlle Renaude – Tradução: Giovana Soar e Marcio Abreu – Assistente de direção: Cassia Damasceno – Iluminação: Nadja Naira – Sonoplastia: Moa Leal e Marcio Abreu – Cenário: Fernando Marés – Figurino: Ranieri Gonzales – Consultoria vocal: Babi Farah – Design gráfico: Pablito Kucarz – Fotografia: Elenize Dezgeniski – Cenotécnico: Anderson Quinsler e Mateus Fiorentino – Aderecista: Leopoldo Baldessar – Direção de Produção: Cássia Damasceno – Realização: Companhia Brasileira de Teatro. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Sobre os movimentos e deslocamentos cenográficos, ele diz que são momentos preciosos e que nem sempre são possíveis de serem usados, pois devem estar sempre intimamente ligados às situações cênicas trabalhadas, o que liga à observação de Lehmann (2007, p. 282) quando apresenta que, em um caso como esse, “o espaço se torna coparticipante, sem que lhe seja atribuída uma definição definitiva”. O procedimento de Marés, nesse sentido, aponta para uma sintonia entre os diferentes signos teatrais, dentre os quais a cenografia se inclui.

Figura 7 − Espetáculo Isso te interessa? Foto: Elenize Dezgeniski (2011)

Em novembro de 2012 a Companhia Brasileira estreou Esta criança12 e mais uma vez Fernando Marés evocou, na construção cenográfica, um espaço possível de se habitar sem se fechar se no seu próprio sentido. Por um lado, o espaço criado dava conta de ambientar as necessidades dramatúrgicas do espetáculo e, por outro lado, apresentar uma construção concreta que questionasse os limites da encenação, pois brincava com as dimensões e os limites do próprio palco. A cenografia possibilitou romper os limites do drama clássico ao romper e extrapolar os contornos da boca de cena, atravessar o proscênio e avançar no sentido da plateia ocupando alguns lugares. Essa proposição concreta/espacial instaurava no espaço, como o próprio

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Espetáculo Esta Criança – FICHA TÉCNICA – Elenco: Renara Sorrah, Giovana Soar, Raniere Gonzales e Edson Rocha – Direção: Marcio Abreu – Texto: Joël Pommerat – Tradução: Giovana Soar com a colaboração de Lilian Ruth de Sá – Iluminação e assistência de direção: Nadja Naira – Cenário: Fernando Marés – Trilha e efeitos sonoros: Felipe Storino – Figurino: Valéria Stefani – Programação visual: Fábio Arruda e Rodrigo Bleque – Fotografia: Gilberto Evangelista – Direção de Movimento: Marcia Rubin – Preparação Vocal: Babaya – Direção de produção: Cassia Damasceno e Faliny Barros – Realização: Renata Sorrah Produções e Companhia Brasileira de Teatro. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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cenógrafo denomina, um “paralelepípedo cenográfico”, de formas grandes e volumes intensos. A parede de fundo também se deslocava lateralmente em determinado momento e o conjunto de efeito e massa cenográfica propunha um questionamento diferenciado dos processos anteriores, rompendo com as características de um “cenário obediente”. Ao explicar as questões apresentadas no cenário de Esta criança, Marés diz que “a relação cenário/palco se dá de forma contundente e radicalizada quando o objeto se interpõe como um outro palco ao palco italiano, criando tensões espaciais e de lugares cênicos” (Marés, 2014). Nesse sentido, o cenógrafo se aproxima no que Lehmann (2007, p. 267) identificou como expansão do cenário, quando comenta que “em todas as formas espaciais para além do palco de ficção dramático, o espectador se torna em alguma medida ativo, converte-se voluntariamente em coautor”. O espectador, portanto, é convidado ao questionamento daquilo que está vendo na sua frente, ao seu redor ou mesmo no espaço em que ocupa, pois o cenário contribui para essa mescla dos significados entre o espaço do palco e o espaço da plateia. A questão apresentada no trabalho de Fernando Marés é como a cenografia pode expandir os limites de entendimento do espectador para com o espetáculo. Possibilitar que o espectador possa se relacionar com o discurso cenográfico é agir em harmonia com o comportamento pós-dramático, como entendemos a partir das considerações de Lehmann ao identificar que a cenografia pode dizer tanto quanto o próprio texto verbal.

Considerações finais O pano de fundo para o desenvolvimento das ideias presentes neste texto foram os desdobramentos das questões, com o embasamento teórico aqui apresentado, enviadas ao artista e pesquisador Fernando Marés a respeito do conteúdo dramatúrgico de seus trabalhos em cenografia. As respostas de Marés para as questões propostas na entrevista foram esclarecedoras para os desdobramentos das questões e já apontavam para outras camadas de associação com as ideias de Lehmann a respeito do pós dramático. A partir de um olhar para as especificidades do teatro enquanto linguagem, fica mais claro ver as opções utilizadas por Marés em sua cenografia, como as paredes de Vida e a rampa de Oxigênio, que ao se moverem alteravam a espacialidade e renovavam as percepções do espectador sobre o entendimento da dramaturgia. Pode-se concluir que as relações identificadas pelo espectador na cenografia de Marés estão em conformidade com as proposições de um teatro pós-dramático, principalmente por ser um teatro em que os diferentes elementos componentes da cena também são responsáveis

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pela criação do espetáculo, independente da supremacia do texto, pois agregam novos significados para o discurso artístico. Em determinado momento, o entrevistado afirma que “cenografar é a forma do cenário em ação, em movimento na cena. O espaço surge daí, entre as imagens e a leitura que se faz do acontecimento” (MARÉS, 2014). No momento em que a escrita cenográfica agrega novas informações na construção da cena, levantando outros questionamentos que ainda não foram apresentados pelo texto verbal, ela é uma importante ferramenta de comunicação com os espectadores, participantes do espetáculo de forma intrinsecamente ligada aos outros signos. Uma cenografia que busca ressignificar a cena na duração do espetáculo, colocando o espectador numa postura ativa de questionamentos, no momento da execução do efeito cenográfico faz também, por outro lado, entender a potência dos meios de expressão genuinamente teatrais. Aproximar o teatro das suas próprias formas de expressão e atualizarse, ainda que dentro da caixa cênica de um teatro à italiana, é lembrar que o teatro dispõe de uma grande quantidade de recursos que, somados às relações e proposições artísticas dos artistas criadores, podem propulsionar diferentes espaços de relação com o público, espaços ativos, vivos, potencialmente criativos, como os desenvolvidos por Fernando Marés na sua trajetória com a Companhia Brasileira de Teatro.

Referências: ALMEIDA, Marco Aurélio P. de. A encenação no teatro pós-dramático in terra Brasilis. In: GUINSBURG, J; FERNANDES, Silvia (Orgs.). O pós-dramático. São Paulo: Perspectiva, 2010. APPIA, Adolphe. A obra de arte viva. Lisboa: Editora Arcádia, sd. AUGE, Marc. Não lugares: introdução a uma antropologia da supermodernidade. Trad. Maria Lúcia Pereira. Campinas: Papirus, 2012. FERNANDES, Silvia. Teatros pós-dramáticos. In: GUINSBURG, J; FERNANDES, Silvia (Orgs.). O pós-dramático. São Paulo: Perspectiva, 2010 LEHMANN, Hans-Thies. Teatro pós-dramático. Trad. Pedro Süssekind. São Paulo: Cosac & Naify, 2007. MARÉS, Fernando. Entrevista concedida a Paulo Vinícius Alves: Figurino e Cena: Curitiba, 2014. ROUBINE, Jean Jacques. A linguagem da encenação teatral. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.

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5. A TIPOGRAFIA COMO ELEMENTO CENOGRÁFICO Juliane Brito Scoton13

Resumo: Este artigo tem como objetivo apresentar e discutir os possíveis usos da tipografia no âmbito da cenografia teatral. Seu desenvolvimento é traçado por uma pesquisa bibliográfica sobre a história da tipografia, seus usos e sua relação com as artes, para que seja possível compreender sua função; em seguida, é estudada a tipografia no contexto teatral, em que a palavra é mais comumente falada do que escrita; e, por fim, é proposto o estudo de caso da montagem Amorfo, no qual este uso é explorado, comprovando que a presença da tipografia na cenografia pode auxiliar na contextualização da narrativa, na interpretação da obra e que interfere diretamente na dramaturgia. Palavras-chave: tipografia, cenografia, teatro, dramaturgia.

Introdução Derivada do grego, a palavra tipografia (Typos: forma, e graphein: escrita) é um termo da área do design gráfico que tem como função dar ordem estrutural e forma à comunicação impressa. É um componente de informação e comunicação que também pode servir como elemento ornamental. Se a história da tipografia revela dados importantes sobre os modos de pensar e os usos de tecnologias no decorrer da história da humanidade, mostrando diversos subterfúgios de comunicação, expressão, de propaganda política, entre outros, pretende-se, nessa pesquisa, observar alguns desdobramentos surgidos ao longo dos séculos. Para tanto, aponta-se as transformações no entendimento de suas funções. Depois, observa-se a apropriação da palavra escrita feita pelas artes do final do século XIX e início do século XX, na qual a tipografia ganha espaço. No teatro, a palavra escrita encontra outras funções ao ser posta no cenário, lado a lado com a palavra falada. Com a intenção de discorrer sobre essas funções da palavra escrita e do alargamento do campo da cenografia, a presente pesquisa analisa a montagem de Amorfo, sob direção de Adriano Esturilho.

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Juliane Brito Scoton é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). Especialista em Artes Visuais, Cultura e Criação pelo SENAC-PR (2011). É Bacharel em Design pela Universidade Salvador (2009). O presente artigo foi orientado pela profa. Dra. Amábilis de Jesus da Silva, da Universidade do Estado do Paraná – Campus II - Faculdade de Artes do Paraná. Revisão: Marcos Fernando Seraph. E-mail: juliane.scoton@gmail.com SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Typos e graphein Das funções da tipografia, a afirmação de Ellen Lupton, sobre o seu surgimento estar relacionado com os gestos do corpo, parece constituir uma informação de grande relevância, por refletir “uma tensão contínua entre a mão e a máquina, o orgânico e o geométrico, o corpo humano e o sistema abstrato" (LUPTON, 2006, p.13). Mas a partir dessa primeira função, outras vão sendo sobrepostas, por vezes apagando-a, por vezes retomando-a. Bringhurst (2005) expõe que a tipografia surge da necessidade de impressão dos textos em grande quantidade. Antes da tecnologia de impressão, os livros eram feitos por escribas, em processo artesanal, e, por isso, trabalhoso e demorado. A impressão tipográfica apareceu na China no século VIII, onde páginas inteiras de texto eram talhadas por escribas em uma placa de madeira, técnica de xilogravura usada também para fazer as ilustrações. No mesmo século XV, outra mudança revolucionou tanto a história da escrita quanto a história da comunicação, a criação dos tipos móveis, por Johannes Gutemberg, na Alemanha. Mesclando técnicas da sua profissão de ourives, criou uma peça para cada letra, inicialmente de madeira e depois de metal, e cada tipo era posto em uma matriz para dar forma à página do texto, formando uma espécie de carimbo que depois de pressionado ao papel resultava na impressão (FUNK; SANTOS, 2008, p. 125-129). Em pouco tempo essa técnica se espalhou pela Europa. A impressão com tipos móveis passou a permitir a produção em massa e o livro impresso tornou-se "o primeiro bem de comércio uniformemente reproduzível" (MCLUHAN, 1977, p. 176), com o qual um único livro, publicado em vários exemplares, abrangia uma quantidade significativa de leitores. Para isso, o livro deveria ter um cuidado especial, além de uma grande produção, ele deveria ter seu conteúdo compreendido pelo máximo de leitores possível. Aponta-se, então, outra função: a de padronização da escrita, levada a cabo com a impressão da Bíblia de Gutenberg, 1454. Além da possibilidade de produção em massa, a Bíblia de Gutenberg chama a atenção para a simulação do manuscrito da época com maior fidelidade possível, com grande quantidade de ligaturas e variações do mesmo caractere e com o objetivo de imitar a irregularidade da página escrita à mão. Juntamente com seu formato imponente, feito para ser lido sobre uma mesa ou púlpito, obriga o leitor a ir ao seu encontro (FERRAZ, 2010, p. 32). Aqui já se nota o impacto da tipografia sobre a comunicação, a imprensa, a religião e a política. E segundo o autor, a reforma protestante no século XVI só pôde ter o alcance e repercussão na época por causa da distribuição de milhares

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de cópias das 95 teses de Martinho Lutero. Então, vários fatores se somam surtindo efeitos de proporções, talvez, inesperadas. Mesmo que no início desempenhando apenas um papel funcional – de escrever – a tipografia nunca deixou de ter preocupação com sua forma, e, cada vez mais, novos valores foram sendo agregados, como: valor estético, estilos e legibilidade. Ainda no século XV, com o Renascimento na Itália, os valores clássicos romanos foram retomados e as escritas góticas foram substituídas pelas humanistas, com formas mais leves e arredondadas, que favoreciam o conforto da leitura. Conforme Clair e Busic-Snyder, "à medida que a atividade da imprensa foi se espalhando até a Itália, os compradores de livros começaram a preferir os caracteres tipográficos produzidos lá" (CLAIR; BUSIC-SNYDER, 2005, p. 58). Com o passar do tempo, as fontes14 foram se adequando às diversas necessidades, então surgiram as fontes itálicas, inventadas por Francesco Griffo em 1501, criadas para economizar espaços nas páginas. As fontes em negrito ou bold, para criar destaques no texto, só seriam criadas no século XIX. Aldus Manutius, um impressor e editor italiano da época, ficou bastante conhecido por revolucionar os formatos dos livros, eliminando o que não fosse essencial, como: frontispícios, ornamentos, gravuras e encadernações luxuosas, criando o "livro de bolso", utilizando letras itálicas para economizar na quantidade de páginas, tornando-o mais barato e acessível, e que também poderia ser facilmente transportado e lido individualmente em qualquer lugar (FERRAZ, 2010). No século XVI, após a Contrarreforma, estava em vigor o estilo barroco, que enfatizava os aspectos espirituais e emocionais da igreja Católica, fundamentada na expressão das emoções com cores vibrantes.

Novelas, diários e panfletos políticos tornaram-se amplamente disponíveis para a emergente classe média europeia e havia uma sede insaciável pela palavra impressa. As novelas causavam um impacto tremendo sobre as normas morais e culturais. Cartazes e panfletos, como também jornais (o primeiro foi impresso em Estrasburgo, em 1609), circulavam na maioria das cidades da Europa. Em Amsterdã, os livros eram impressos em tipo condensado para caberem nos bolsos dos coletes. (CLAIR, 2009, p. 70)

A convivência cada vez mais intensa com a palavra escrita certamente foi sinal de mudanças na estruturação da linguagem e da comunicação. As transformações nos estilos vieram no esteio não só das novas possibilidades tecnológicas, mas também das tendências artísticas e filosóficas. Não ao acaso, o século XVIII foi uma época de originalidade 14

Fonte é o mesmo que tipo ou letra.

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tipográfica (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 153), na qual a tipografia foi influenciada, principalmente, por novos estilos manuscritos. Nos anos 1720 surge em Paris o Rococó, um estilo de design altamente ornamental e detalhista. O Rococó representava a reação da aristocracia Francesa ao barroco, caracterizava-se por seu aspecto hedonista e fidalgo. A tipografia da época Rococó expressou-se com linhas finas, floreios curvilíneos e elementos orgânicos, letras manuscritas renasceram com os mestres da caligrafia, que criavam letras capitulares e cartões elaborados. Já em 1730, o ourives William Caslon elaborou um tipo que mesclava o romano e o itálico, a Caslon Old Face, denominada neoclássica, com proporções equilibradas e traços espessos que favoreciam a legibilidade. Essa fonte foi amplamente usada, tornou-se a fonte padrão para impressão de livros na Inglaterra. Documentos importantes como a Declaração da Independência e a Constituição dos Estados Unidos utilizaram essa tipografia (CLAIR, 2009). Outro tipógrafo de destaque dessa época foi John Baskerville, que criou fontes bastante definidas e com alto contraste entre suas formas. Sua pretensão era superar Caslon, mas alguns contemporâneos o consideravam amador e extremista, ainda disseram que suas letras "machucavam os olhos" (LUPTON, 2006). Infelizmente, Baskerville morreu antes de saber que suas tipografias eram primorosas e amplamente aceitas pelos leitores. Ainda, no mesmo século, houve a Revolução Francesa, que foi, antes de tudo, uma revolução de ideias. Neste século, como já referido, as ideias já circulavam pela palavra impressa, a imprensa atuava como "uma força ativa na história" (DARNTON, 1996) pela disputa do controle da opinião pública. No século XIX, Giambattista Bodoni, na Itália, e Firmin Didot, na França, superaram Baskerville e criaram fontes com contrastes ainda mais extremos, com eixos totalmente verticais e serifas nítidas e retas, criando o estilo Romântico, associado ao Romantismo, movimento que pregava o lirismo em oposição ao racionalismo do Iluminismo. Desvinculando, assim, a tipografia da caligrafia, segundo Ellen Lupton, "uma abordagem abstrata e desumanizada do desenho de letras" (LUPTON, p. 21). A ascensão da industrialização e do consumo de massas acarretou grandes mudanças na sociedade e na economia que refletiram na arte e na literatura da época. Para atender a demanda crescente de produtos, os anúncios se tornaram predominantes. Houve então a "explosão" da propaganda que trouxe consigo a exigência de novas formas tipográficas, para serem usadas em cartazes, catálogos, papéis de carta etc. Os fabricantes buscavam fontes chamativas para atrair maior atenção para seu produto e a partir daí surgiram fontes com as

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mais variadas formas. O processo de impressão tornou-se industrializado e, portanto, a busca por uma tipografia com formas rígidas e proporcionais foi substituída por uma flexibilidade de formas. A ênfase em vender mercadorias conduziu o design de tipos do período. Anteriormente, as mudanças na tipografia tinham sido orientadas pelos instrumentos, materiais e pela tecnologia disponível aos impressores e pelo seu senso de estética. O resultado era material de leitura na forma de livros e panfletos. Agora, no entanto, a mudança era determinada pela indústria manufatureira, e as necessidades dos anunciantes influenciavam os aspectos estéticos do design de tipos (CLAIR, 2009, p. 79).

Uma infinidade de famílias tipográficas15 foi surgindo, com os mais variados pesos e contrastes de formas, o que prejudicava a leiturabilidade. Este período caracterizado pela variabilidade das letras e pela falta de preocupação com o texto coincidiu com a Era Vitoriana do império britânico, cuja tipografia característica é conhecida por Tipografia Vitoriana: "Sombras, silhuetas e adornos eram aplicados, retendo, ao mesmo tempo, a estrutura clássica das letras" (FERRAZ, 2010, p. 40). Ainda na época Vitoriana, surgiram as fontes Realistas, relativas ao movimento artístico Realismo, de eixo vertical e com serifas ausentes ou abruptas. Bringhurst (2005, p. 146-147) classifica essas letras como destinadas à composição de texto, sem decoração, modulação no traço e proporções mais sutis.

A palavra nas artes Como consequência à Revolução Industrial, os movimentos artísticos da virada do século XIX para o século XX incluíram em seus processos de criação temas que circundavam as problemáticas em torno da massificação da informação, da maquinização do corpo, a fragmentação, a repetição e outros, como a diminuição dos trabalhos artesanais, invenção da fotografia e a rápida expansão da publicidade. Os modos de articulação dessas problemáticas podem ser analisados, nas diferentes áreas artísticas, tanto por assimilação como por busca de um distanciamento desses preceitos. Ainda no final do século XIX, por exemplo, o movimento estético Arts and Crafts, iniciado na Inglaterra e liderado por William Morris, caracterizava-se pela valorização dos trabalhos artesanais em oposição à industrialização. Na tipografia não foi diferente, houve o resgate das letras "para ler" opostas às letras deformadas utilizadas na propaganda. William

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Família tipográfica é um conjunto de letras com as mesmas características fundamentais, apresentadas com variações de espessura, largura, altura e/ou outros detalhes, como Times New Roman ou Arial. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Morris também projetou alguns tipos e criou alguns projetos gráficos que, embora não populares, defendiam a percepção e compreensão do leitor (CLAIR, 2009, p. 87). As estéticas ornamentais da Era Vitoriana e do Arts and Crafts acabaram por influenciar o surgimento do movimento Art Nouveau, caracterizado pelas formas e estruturas orgânicas e em linhas curvas, frequentemente era manifestado em cartazes. A tipografia deste movimento era desenhada à mão e integrava o texto com a ilustração. Da Art Nouveau originará, posteriormente, o Art-déco, caracterizado pelas formas geométricas e monumentalidade, as tipografias do Art-déco seguiam as características do movimento, com formas geométricas e elementares, contrastes entre linhas finas e grossas, linhas retas e curvas. Os questionamentos dos antigos valores, assim como a função das artes na sociedade, foram impulsionadores para que a tipografia viesse a ocupar lugar de destaque nos movimentos das vanguardas artísticas europeias (MEGGS; PURVIS, 2009). Dentre esses movimentos, o Dadaísmo, surgido na Suíça em 1916, respondeu criticamente aos modos de organização na sociedade quando percebeu que até mesmo com a forma de posicionar as palavras numa página (vertical ou horizontalmente) já se dimensionavam os condicionamentos às estruturas pré-estabelecidas. Além dos processos de criação orientados pelo non-sense e pela linguagem sem sentido, os dadaístas também assumiram outras estratégias na composição dos tipos em suas escritas, cartazes e obras artísticas. Nesse movimento, a tipografia passa a ser uma linguagem artística, tendo por guia os posicionamentos do tipo intuitivamente, desrespeitando as regras horizontais e verticais, assim como a junção de elementos abstratos e em tamanhos e formas variadas. A colagem, técnica mais utilizada pelos dadaístas, facilitou que a “desorganização” fosse um dado constituinte de suas pesquisas (MEGGS; PURVIS, 2009). O abandono da ilusão tridimensional, representado pela pintura no plano dimensional, defendida pelo Cubismo, sobretudo por Pablo Picasso e Goerges Braque, também proporcionou outros modos de abordagem da tipografia. Nas telas cubistas, ficaram frequentes as colagens de fragmentos impressos e rótulos, sugerindo novas formas de comunicação: "o uso de letras estampadas ou gravadas nas suas pinturas, abria novas possibilidades para a tipografia" (HULBURT, 2002, p. 18). O Movimento De Stijl, surgido em 1917, na Holanda, e que teve por mentor Piet Mondrian, caracterizava-se pelo equilíbrio de formas geométricas abstratas e tentava evitar a representação das imagens. Nas composições do De Stijl, a tipografia era geralmente separada por barras negras do resto da composição (CLAIR, 2009). Theo van Doesburg, um dos

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fundadores do movimento, criou uma tipografia geométrica chamada An Alphabet, que era baseada em um quadrado. A Bauhaus, escola alemã de design, artes plásticas e arquitetura fundada pelo arquiteto Walter Gropius, 1919, em resposta às consequências da I Guerra Mundial e da Revolução Industrial cria o lema “a forma segue a função”, seguindo o princípio de que “menos é mais”. Consonantes com as influências técnicas e estéticas da época, a Bauhaus aposta numa tipografia que possa ser universal, com fontes geométricas sem nenhum resquício de caligrafia (FERRAZ, 2010). László Moholy-Nagy foi um dos nomes mais importantes dessa escola, apregoando a funcionalidade na utilização dos tipos. Segundo Clair:

Ensinou que ideias de tensão e de elementos visuais contrastantes podiam ser conseguidas por meio da disposição de tipos. Os sinais tipográficos foram mudados de seu uso primário entre margens e elementos decorativos para posições de ênfase e significado. Ele encorajou os estudantes a tentarem o design de uma fonte tipográfica funcional com as "proporções corretas" sem decorações individuais e estranhas (CLAIR, 2009, p. 99).

Na Rússia, a oposição, por parte dos artistas, à velha ordem e sua arte conservadora, gera a partir de 1917 a chamada Revolução Russa. Somando às suas criações campanhas de propaganda em defesa dos revolucionários, a tipografia encontra abrigo entre os recursos de disseminação dos ideais revolucionários. Mas, em 1920, a ascensão do bolchevismo provocou "uma profunda cisão ideológica quanto ao papel do artista no novo Estado comunista" (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 374). Resultante dessa cisão, o Construtivismo surge como um movimento de bastante ênfase no design tipológico16. Se a arte construtivista soviética expressava-se por meio de formas e cores básicas, as experimentações na tipografia e design caracterizavam-se pelos elementos simples, robustos, lineares, perspectiva e planos angulares, rompendo com os limites verticais e horizontais das composições. Vários designers construtivistas, como El Lissitzky e Kurt Schwitters, criaram layouts tipográficos, incorporando técnicas de fotomontagem, colagem e letras construídas com formas geométricas, que resultavam em composições assimétricas.

Teatro: palavra falada e palavra escrita No estudo proposto por Klemens Gruber em A encenação da escritura: intermedialidade e vanguarda, o autor comenta sobre o interesse pela palavra escrita e a

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Tipologia: ciência que estuda os tipos (letras).

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relação entre as palavras e as imagens, despertado não só no campo da pintura, mas também no teatro, cinema e publicidade do início do século XX:

Por que houve de repente uma invasão de letras nas telas dos pintores, em forma de recorte de jornais, bilhetes de bonde, cardápios de restaurante, mas também letras isoladas, maravilhosamente moldadas e sem qualquer significado, em uma espécie de dilúvio letrista que tomou conta da paisagem artística depois da saída do naturalismo (GRUBER, 2011, p. 02).

Entre outros motivos, o autor aponta as inovações tecnológicas que amplificaram as explorações básicas e, sobretudo, as intersecções entre vida e arte buscadas pela arte nesse período. E se “a escrita tinha invadido a cidade moderna, e a palavra e a imagem colidiam em uma textura complexa” (GRUBER, 2011, p. 2), naturalmente foi entendida tanto como signo como o meio de comunicação de maior relevância para aquele momento. Tornadas ícones da vida cotidiana, às letras cabiam a ocupação de espaços da cidade, em integração com a paisagem metropolitana. Da retrospectiva do Gruber destacam-se, para os objetivos dessa pesquisa, as considerações feitas a respeito da utilização da escrita no teatro. Creditando à diminuição da importância da linguagem, tendo sido o texto deixado de ser o centro das preocupações dessa arte, o autor assinala que a palavra ressurge na sua forma escrita, equiparada ao corpo do ator, à voz e ao espaço. Na lista de encenações marcadas pelo uso da palavra escrita, Gruber relembra Machina Typografica, de Giacomo Balla, em 1914; Within the quota, encenada pelo Ballet Suédois de Paris, que trazia na rotunda uma gigantesca página de jornal, com letras gigantes e diversificadas, em ataque à política da imigração norte-americana e os tabloides; O corno magnífico, de Meyerhold, em 1927, com as máquinas abstratas postas pela cenógrafa Popova, nas quais as letras vinham pintadas em caracteres latinos. E ao se referir ao encenador Elwin Piscator, Gruber fala que uma das funções do uso da palavra escrita em seus trabalhos era a de “intensificar o potencial expressivo de sua estética multimídia e para criar ligações pedagógicas e propagandísticas com a realidade” (GRUBER, 2011, p. 09). Interessante notar que, além das manchetes de jornais projetadas na rotunda, Piscator também colocava faixas no auditório, reafirmando a ideia de fragmentos da realidade levados à cena. Bertold Brecht, contudo, intentará outros fins para o uso das palavras: “Assim como outros procedimentos para o estabelecimento de distância, a escrita interrompe a trama, comentando ou explicando conexões, situando-a fora de seu contexto familiar” (GRUBER,

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2011, p. 09). O autor assinala também as preferências de Brecht por caracteres manuscritos e fontes antigas, e comenta que Brecht tinha simpatia pelas tipografias da Bíblia de Lutero. A escolha por tais caracteres seria certo gosto em exibir técnicas culturais tradicionais. Ainda sobre a palavra escrita na cenografia de Brecht, Gruber aponta três funções: a função dramática, a perceptual e a estética. E é a partir dessas três funções que se pretende observar a montagem Amorfo.

Amorfo: a palavra escrita Amorfo é uma montagem com texto, direção e sonoplastia de Adriano Esturilho, com Andrew Knoll, Luiz Bertazzo e Patricia Saravy no elenco; cenografia de Guenia Lemos; figurino de Felipe Custódio; iluminação de Judy Fiorese; vídeos e projeções de Giuliano Andresso, Fábio Allon e Bruno de Oliveira. É uma peça curitibana que teve sua primeira montagem em 2007, no teatro Falec, e segunda montagem em maio de 2014 no teatro Barracão Encena, no qual deteremos o presente estudo. Tendo por referências a cultura pop e kitsch dos anos 80, a história relata a vida de Pedro, que recebe uma fita VHS pelo correio, na qual contém um filme de sua ex-namorada contando a notícia que está com AIDS, trazendo à tona memórias e sofrimentos do passado, confrontando-os com seus dilemas existenciais do presente.

Figura 1 - Painel com projeção em Amorfo Foto: Guenia Lemos

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A história não é apresentada no palco de forma linear. O uso de vídeos e de projeções de palavras/frases é procedimento que colabora na quebra da linearidade, causando rupturas, pausas, sobreposições e simultaneidades. Tecnicamente, dois projetores de vídeo e um de slides ficam posicionados em cadeiras da plateia, aparentes, apenas envoltos por elementos cenográficos que delimitam a área de projeção para não prejudicá-la. Enquanto que o cenário é composto por um painel de canos de PVC (policloreto de vinil) ao fundo, que servem de suporte para as projeções, e um emaranhado de rolos de fitas VHS (video home system) espalhados por todo o piso, que se estendem a algumas cadeiras da plateia, onde estão posicionados os projetores. Há também objetos espalhados pelo palco, como caixas de som, baldes, fitas VHS, lanterna, megafone e guitarra.

Figura 2 - Cenário e interação dos atores com as projeções em Amorfo Foto: Guenia Lemos

Diversos recursos são apresentados por meio dessas mídias, como, por exemplo, fotografias, imagens e vídeos relacionados ao passado da personagem, e duplicação de cenas ao vivo. E o tratamento dado às imagens auxilia na criação da atmosfera oitentista almejada pela direção. A projeção de palavras/frases ocupa um lugar de destaque, por não ser tão frequente em montagens teatrais. Se Gruber aponta que no início do século XX as inovações tecnológicas amplificaram as explorações das palavras tanto no cotidiano como nas linguagens artísticas, SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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cabe refletir sobre o papel desempenhado pela palavra escrita na atualidade, em tempos de comunicação digital. Em Amorfo, a maneira como a palavra falada/escrita é apresentada parece resgatar e ao mesmo tempo questionar seus usos linguísticos habituais, pois suas propriedades construtivas e comunicativas são exploradas. Conforme as reflexões de Gruber no âmbito das funções dramáticas, no teatro a palavra escrita encontra poder somente quando a cena deixa de ser textocêntrica. Esse entendimento, paradoxal, tanto culminaria numa cena mais imagética quanto numa cena em que a palavra retoma a sua força, ou mesmo numa cena na qual a palavra se torna imagem, representando uma ação. Amorfo também pode ser analisado sob essa perspectiva. Em entrevista cedida para essa pesquisa, Adriano Esturilho17, autor e diretor da peça, esclareceu que durante a escrita do texto já previa a utilização das projeções e a presença efetiva da palavra escrita. Segundo ele, a peça tem uma proposta de fragmentação de um personagem, que é vivido por dois atores como um alter-ego, e a utilização da palavra escrita nas projeções possui função dramatúrgica de construção deste personagem. As palavras escritas, projetadas no cenário e, portanto, pertencentes a ele, se tornam parte do universo formal do espetáculo. Conciliam-se com a produção de imagens, provocando níveis diferentes de percepções, observa-se aqui a função perceptual da palavra. Advindo da área de Letras, sua primeira formação, Esturilho explica que sempre acaba flertando com o princípio da Poesia Concreta, no qual a palavra é tida como “material”. Sabrina Vilarinho esclarece que a poesia concreta surge num momento em que a literatura partilha do pensamento disseminado no Movimento Concretista, valorizando e incorporando aspectos geométricos à arte. E a poesia concreta, então, “tem como característica primordial o uso das disponibilidades gráficas que as palavras possuem sem preocupações com a estética tradicional de começo, meio e fim e, por este motivo, é chamado de poema-objeto” (VILARINHO, 2014). Seguindo essa linha de raciocínio, em Amorfo seria possível constatar que a preocupação estética está inscrita no contexto geral da cena e, para tanto, a pesquisa de tipografia foi tão importante quanto a pesquisa da própria escrita da palavra, das suas divisões, de modo a torná-la potente. Esturilho argumenta que buscou um “jogo” semântico entre as sílabas, com maiúsculas e minúsculas, fragmentações, uso de parênteses e

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Entrevista cedida no dia 25 de agosto de 2014.

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pontuações, que as inserem dentro da dramaturgia e levam o espectador a pensar, como, por exemplo, no momento em que o personagem vomita e é projetada a palavra "vo[MITO]".

Figura 3 - Jogo semântico de palavras em Amorfo Foto: Guenia Lemos

Segundo o diretor, dessa forma o texto ganha outra dimensão e outro significado semântico, criando uma construção de cena mais transversal, com elementos que acontecem em paralelo. Cabe ao espectador escolher ao que dará mais ênfase, já que há simultaneidade de informações. Mas as palavras podem ser um reforço às imagens e textos trazidos pelos atores, atuando em confluência e até mesmo em redundância. Esse procedimento de justaposição, para Esturilho, acrescenta outra interface: a performance, área em que também possui experiência. As informações se dão em multiplicidades, mas as escolhas são do espectador. Sendo a palavra escrita uma forma que se insere na cenografia como parte da projeção, outro diferencial pode ser notado no processo de criação. Esturilho comenta que se reuniu com a cenógrafa e a equipe de vídeo para discutir as propostas. O desafio maior teria sido, segundo ele, escolher uma tipografia que não se distorcesse quando projetada no suporte de canos do cenário. Houve cinco propostas de tipos, com diferentes espessuras e alturas, até se chegar ao escolhido, o que só aconteceu com o cenário já montado e com os projetores posicionados, optando por uma tipografia em negrito, com serifa, que facilita a leitura e tem menor distorção. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Sobre o jogo entre palavra escrita e a palavra falada, o autor e encenador diz se interessar pelo trânsito entre a literatura, o teatro, o cinema e a música, pois a palavra se faz presente em cada uma dessas linguagens. No acúmulo dessas passagens, a palavra chega ao espectador já transformada. Para exemplificar, Esturilho fala dos trechos que foram musicados durante a encenação, e isso em função de uma maior tolerância que se tem com o texto cantado, com o qual o entendimento cartesiano e racional cede vez a outros entendimentos, como criar um sentimento por meio da música. Na escrita do texto comentou o que poderia ser um distanciamento, usando de quebras, para que o público pudesse refletir sobre o acontecimento. As projeções ainda ajudavam a criar os picos emocionais necessários na narrativa. Sobre as infiltrações da palavra escrita na dramaturgia falada, Esturilho diz que com essa alternativa, o texto também passou a fazer parte da cenografia, fugindo aos formatos tradicionais do teatro que separam estes elementos. Em Amorfo, há uma compreensão da dramaturgia mais ligada à compreensão de um encenador, pois cada elemento do palco, assim como as projeções, possuía uma posição específica que fazia relação direta com os atores, o que necessitou a participação da cenógrafa, da iluminadora e dos editores do vídeo, todos acompanhando os ensaios com os atores, num esforço em conjunto. Para que isso fosse possível, os ensaios já aconteceram com todo o equipamento de projeção montado, pois, somente dessa forma haveria a consciência de como tudo estava acontecendo, que havia determinada ação, com determinada imagem, interligada com determinado texto. Em geral isso não acontece, cada coisa é feita em paralelo, nesse sentido o diretor diz que a projeção é um "outro ator". A panorâmica trazida por Gruber sobre a utilização de palavras escritas na cenografia também pode estabelecer um diálogo com a proposição de Amorfo. Na entrevista, quando surgiu a pergunta se havia alguma influência ou inspiração nas montagens de outros encenadores, Esturilho rapidamente citou o teatro-conferência de Brecht, no qual a discussão política é marcada pelo recurso do distanciamento, gerando uma linha de identificação e também de quebra. E comenta que quando montou A exceção e a regra (1929/1930), texto de Brecht, utilizou textos de jornais, levando para a cena fatos cotidianos, aproximando a cena ao dia a dia do espectador.

Considerações finais

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A montagem de Amorfo oferece importantes reflexões sobre o uso da palavra escrita no teatro. Gruber ressalta que os encenadores do início do século XX estavam motivados pela ideia de aproximar a arte da vida. E se a palavra tinha tomado conta das pinturas; do cinema; da cidade, em cartazes, letreiros e anúncios; nada mais plausível do que trazê-la para a cena. No entanto, a escolha dos tipos era de fundamental importância, pois não só detinha informações (como, por exemplo, a escolha da cenógrafa Popova pelas letras pintadas em caracteres latinos, em O corno magnífico), mas também compunha com os demais elementos da cenografia. As três funções da palavra escrita na cenografia apontadas por Gruber – dramática, perceptual e estética – são facilmente percebidas na montagem de Amorfo. Porém, em função das diferenças de contextos e de tecnologias, Amorfo consegue trazer à tona uma discussão que para além das funções observadas abre espaço para se pensar na funcionalidade dos tipos no contemporâneo. Lembrando que na atualidade, as relações, em sua maioria, são mediadas pela escrita rápida em mensagens telefônicas, e-mails, redes sociais, whatsapp e outros, percebe-se que as padronizações nas formas de escrita e das tipografias estão em constante mudança e, ao mesmo tempo, também se restringem aos aparatos disponíveis em cada um dos veículos. E vários fatores influem para que a palavra escrita se sobressaia, sobretudo o econômico. Amorfo parece estabelecer uma ponte entre a história da tipografia, na qual se vê refletida toda a história da humanidade em relação à difusão do conhecimento, do poder e dos padrões estéticos; entre a história das artes visuais e do teatro. Mas, considerando o contexto atual, fica ainda mais evidente que a palavra escrita na cenografia redimensiona as noções de dramaturgia. Também se destaca que em Amorfo as funções da cenografia são acrescidas de outras possibilidades. É comum pensar na função da cenografia de ambientação, de síntese e abstração do texto dramatúrgico ou de dispositivo cênico para auxiliar ou impulsionar a movimentação dos atores. Aqui, o procedimento faz materializar o que frequentemente se pensa apenas no plano do sonoro: a palavra e, então, como elemento cenográfico. Referências: BRINGHURST, Robert. Elementos do Estilo Tipográfico. São Paulo: CosacNaify, 2005. CLAIR, Kate. Manual de Tipografia. Porto Alegre: Bookman, 2009. CLAIR, Kate; BUSIC-SNYDER, Cynthia. Manual de tipografia – a história, a técnica e a arte. São Paulo: Bookman, 2005.

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COHEN, Miriam Aby. Cenografia Brasileira Século XXI: Diálogos possíveis entre a prática e o ensino. 2007. (Pós-Graduação em Artes Cênicas) Universidade de São Paulo. São Paulo, 2007. DARNTON, Robert (org.). Revolução impressa: a imprensa na França 1775-1800. São Paulo: Edusp, 1996. FERRAZ, Naieni. Tipografia & história: um estudo sobre as revoluções estéticas no desenho da letra impressa. (Trabalho de Conclusão de Curso em Desenho Industrial). Santa Maria UESM, 2010. FUNK, Suzana; SANTOS, Ana Paula. A importância da tipografia na história e na comunicação. In: Actas de Diseño. Buenos Aires, año III, v.5, 2008. HULBURT, A. Layout: o design da página impressa. São Paulo: Nobel, 2002. LAS-CASAS, Luiz Fernando Luzzi. Cinedesign: Typography in Motion Pictures. 2006. (Tese de Doutorado em Design). Universidade de Nova York. Nova York, 2006. LUPTON, Ellen. Pensar com tipos. São Paulo: CosacNaify, 2006. MCLUHAN, M. A galáxia de Gutenberg. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1977. GRUBER, Klemens. A encenação da escritura: intermedialidade e vanguarda. Trad. Alex Castro. In: Projeto Revoluções. Disponível em: <Revoluções.org.br/v1/sites/default/files/a_encencao_da_escritura.pdf>. Acesso em: 25 ago. 2014. VILARINHO, Sabrina. Mundo Educação. Poesia Concreta. Jul 2010. Disponível em: <http://www.mundoeducacao.com/literatura/poesia-concreta.htm>. Acesso em: 6 set. 2014.

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6. O USO DO CARRO COMO DISPOSITIVO CENOGRÁFICO NO ESPETÁCULO ROMEU E JULIETA DO GRUPO GALPÃO Victor Hugo Carvalho de Oliveira18

Resumo: Partindo de fontes iconográficas (fotos e videodocumentário), esta pesquisa é um estudo de caso que visa descrever e analisar a função cênica e a dimensão simbólica do uso do carro (Veraneio) como dispositivo cenográfico, na montagem do texto dramático Romeu e Julieta (1992) de William Shakespeare, apresentada pelo Grupo Galpão com encenação e cenografia de Gabriel Villela. Assim, o interesse com este artigo é discutir o trabalho teatral de um agente criativo que acumula as funções de encenador e cenógrafo, focando no resultado cênico do uso do dispositivo cenográfico. Palavras-chave: Encenação. Cenografia. Dispositivo cenográfico.

Introdução O tratamento dado ao espaço cênico no teatro é algo que sempre permeou a sua prática e está registrado na história do espetáculo. É previsto que o trabalho em cima do espaço cênico seja uma preocupação de vários agentes criativos, como o ator, o iluminador, o cenógrafo, o figurinista, o dramaturgo e o diretor. No entanto, o fato do fazer artístico da cenografia e da encenação ser pensado por um mesmo artista cênico torna-se algo existente na prática do teatro – uma vez que o teatro contemporâneo põe em voga várias discussões acerca da prática cênica vinculada a outras questões, sejam elas econômicas, políticas, sociais, estéticas e até mesmo da ordem da técnica e da tecnologia. O interesse em discutir sobre o uso do dispositivo cenográfico de um encenadorcenógrafo deve-se ao fato desse uso estar atrelado a uma produção discursiva, o que é próprio da teatralidade contemporânea, enquanto criação espetacular. O cenário, nesse caso, torna-se

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Victor Hugo Carvalho de Oliveira é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). É Bacharel em Teatro (2008) e Bacharel em Psicologia (2008) pela Universidade Regional de Blumenau. É cenógrafo, diretor e ator da SinoS Cia de Teatro, em Blumenau (SC) desde 2009. O presente artigo foi orientado pelo prof. Dr. Walter Lima Torres Neto, da Universidade Federal do Paraná. Revisão: Marjure Kosugi. E-mail: victorholiveira@hotmail.com

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um veículo, a concretização em cena daquilo que a encenação tem a dizer com o espetáculo pretendido. Desse modo, o cenário pode ser entendido como a espacialização de um texto dramático ou ainda como a concretização de um argumento cênico que a figura do encenadorcenógrafo terá à mão para criar seu texto espetacular. Este texto entendido como algo diferente do texto dramático, que possa complementá-lo, reforçá-lo, distorcê-lo ou ainda apresentar a ele um novo olhar. A problemática que se coloca na relação entre o uso do dispositivo cenográfico proposto pelo encenador-cenógrafo e o resultado da sua produção cênica, enquanto texto espetacular, serviria para demonstrar a existência dessa prática artística em nível de legitimação como algo próprio do teatro contemporâneo. A descrição referente ao tratamento dado ao espaço cênico por um agente criativo que se incumbe tanto da função de encenador quanto de cenógrafo é uma forma de identificar como este pensar se concretiza em cena. Além de relacionar as opções tomadas pelo encenador-cenógrafo quanto à função cênica e à dimensão simbólica presentes no tecido do espetáculo costurado com os demais enunciadores, como: figurino, caracterização, maquiagem, gestualidade dos atores, etc. No entanto, a ênfase deste trabalho está na análise das fontes iconográficas (fotos e vídeo) referentes à montagem do espetáculo Romeu e Julieta feita pelo Grupo Galpão, com o encenador-cenógrafo Gabriel Villela; e tem como finalidade analisar o uso do carro (uma Veraneio) como um dispositivo cênico, no espaço cênico do espetáculo. Para tanto, foi realizada uma descrição denotativa dos elementos do espaço cênico, com o intuito de destacar as funções cênicas que a Veraneio adquiriu ao longo do espetáculo, seguida de uma apreciação acerca dos signos usados na criação espetacular. A pesquisa é de cunho qualitativo do tipo documental com interpretação dos dados a partir da análise de conteúdo, pois se busca uma análise das referências com vistas a uma interpretação de acordo com o contexto dado. Segundo Godoy (1995), a abordagem qualitativa não requer do investigador um exercício de pesquisa com uma proposta de forma rígida, pois características como a imaginação e a criatividade são apreciadas para que os trabalhos sejam explorados de maneira inovadora. Dessa forma, nota-se que a pesquisa documental traz em seu bojo um caráter inovador, gerando contribuições significativas no estudo de alguns temas. Nota-se também que a análise de conteúdo parte da ideia de que há um sentido a ser investigado por trás do discurso aparente, simbólico e polissêmico.

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Conceituação de espaço cênico: encenação/cenografia O espaço cênico abarca em si um emaranhado complexo de argumentações conceituais sobre o que o caracteriza. Porém, antes de comentar sobre ele é preciso apontar que não existiria teatro – tanto como comunhão social quanto como arte – sem a sua presença. Isto porque “o espaço cênico se organiza em estreita relação com o espaço teatral (o do local, do edifício, da sala)” (PAVIS, 2005, p. 133). Desse modo, o espaço cênico estava presente desde a forma arquitetônica rudimentar do teatro grego, projetado nas encostas naturais da antiga Grécia até as recentes formas contemporâneas. Ele incidiu na ideia de edifício teatral do Império Romano com seu pão e circo. Apareceu na Idade Média, nos altares das igrejas com seus autos religiosos, mas também ganhou as praças e feiras onde os efeitos produzidos pela maquinaria cênica empregada na época – a fim de ilustrar as agruras do inferno em detrimento à paz dos céus – estiveram fortemente presentes. O espaço cênico perpassou pelos tablados elisabetanos dando vida à dramaturgia shakespeariana, e também pelos Corrales espanhóis. Encontrou as ruas com as companhias mambembes de Commédia Dell’Arte com suas carroças e tablados montados e desmontados a cada apresentação. E chegou ainda à necessidade de uma “arquitetura própria para o fazer teatral”, um lugar teatral, que resultou no teatro à italiana – que fora legitimado pelos realistas, pois a caixa cênica corroborava para o ilusionismo, mas que fora igualmente confrontado. Desse processo histórico, resultaram a explosão espacial e a pluralidade dramatúrgica e espetacular encontradas na cena contemporânea. Conforme Roubine (1998) estabelece, foi a partir do século XVII que sucedeu ao palco italiano tornar-se uma forma de realização plena, um caminho de melhorias técnicas. O palco italiano verteu-se em um espaço dominante na vida teatral do século XIX, com algumas exceções no início do século XX. O palco italiano possuía melhoramentos técnicos, sem contar no conforto e no glamour que a sala oferecia aos seus frequentadores – em sua maioria burgueses –, vindo a se tornar, assim, a quinta-essência da arquitetura teatral. Roubine (1998) ressalta ainda que o palco italiano fora eficiente no que diz respeito às condições de visibilidade e de acústica, além de ter proporcionado melhores condicionamentos aos efeitos de ilusão. Portanto, a reflexão sobre o espaço cênico alcança um transbordamento inevitável para além do dado teatral, pois, como afirma Roubine (1998), o espaço é algo visto nas representações teatrais ao longo da história como algo suscetível a dados socioculturais e econômicos quanto ao seu aparecimento e desenvolvimento. A afirmação do espaço à italiana,

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por exemplo, era evidenciada pela relação entre as concepções estéticas (naturalismo versus simbolismo) que se confrontavam e marchavam juntas, como também o tipo da arquitetura que as acolhia, e por conta de uma estratificação social e da posição de passividade adotada pelo público que a configuração deste tipo de sala impunha. Já a negação do espaço à italiana vinha do lado daqueles que pretendiam uma democratização do teatro, pois eram contrários às desigualdades cometidas pela organização da sala à italiana. “Democratizar o teatro seria, portanto, democratizar antes de mais nada a relação mútua dos espectadores, assim como sua relação com o palco” (ROUBINE, 1998, p. 83). É certo que para haver teatro é necessário que alguém (ator) faça algo para outro alguém (espectador) assistir. Assim, tanto o ator quanto o espectador são essenciais ao teatro. Da mesma forma, o espaço também o é. Anne Ubersfeld em seu texto Espaço e Teatro afirma já nas primeiras linhas que: Se o ator é o elemento fundamental no teatro, ele não poderia existir sem um espaço onde se desenvolver. Podemos definir o teatro como um espaço em que estão juntos os que olham e os que são olhados, e a cena como o espaço dos corpos em movimento. O espaço teatral compreende atores e espectadores, definindo certa relação entre eles. O espaço cênico é o espaço próprio aos atores; o lugar cênico é esse espaço enquanto materialmente definido [...]19.

Ao avaliar as diferentes soluções cenográficas e as novas experiências estabelecidas entre a cena e o público ocorridas ao longo da história do espetáculo, Pavis (2005) aponta que o termo “espaço cênico” tornou-se neutro para melhor descrever os dispositivos polimorfos da área em que os atores agem. Espaço cênico é basicamente aquilo que se percebe como o lugar onde acontece o jogo entre os atores, isto é, onde se encontra disposta a cenografia. Cenografia é a identificação de um espaço único e irrepetível capaz de receber sem inúteis interferências as personagens propostas e os atores que as interpretam. A verdadeira cenografia é determinada pela presença do ator e de seu traje; a personagem que se movimenta nas áreas que lhe são atribuídas cria constantemente novos espaços alterados, consequentemente, pelo movimento dos outros atores: a soma dessas ações cria uma arquitetura cenográfica invisível para os olhos mas claramente perceptível, no plano sensorial, pelo desenho e pela estrutura dramatúrgica do texto apresentado. (RATTO, 1999, p. 38)

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UBERSFELD. Anne. Espaço e Teatro. Em: ˂http://www.grupotempo.com.br/espaco-e-teatro/˃. Acesso em: 26 jun. 14. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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A cenografia está inserida, isto é, encontra-se imersa no espaço cênico. Assim como o trabalho de encenadores se valeu da apropriação e da reformulação do uso de dispositivos cenográficos como meio de expressar seus pensamentos e inspirações.

A encenação e a cenografia: uma possível junção O surgimento da figura do encenador, conforme Roubine (1998) aponta, foi facilitado pela presença de dois fenômenos ocorridos nos últimos anos do século XIX: a perda da noção de demarcações geográficas e a descoberta da iluminação elétrica. Tanto a possibilidade da troca de experiências teatrais empreendidas pelos Meininger – conjunto criado alguns anos antes pelo Duque de Saxe-Meininger nas tounées por toda a Europa por conta de uma facilitação do tráfego entre os países – quanto a descoberta da eletricidade e o seu uso na cena teatral foram determinantes para uma evolução tecnológica e científica na sociedade da época. Conforme Mantovani (1989) aponta, o que os Meininger fizeram foi espalhar os princípios teatrais que primavam pela busca de unidade na criação da cena e do espetáculo com seus elementos interligados uns aos outros. Assim, o cenário deveria estar subordinado à ação expressada pelo ator; isto é, não haveria possibilidade de negação da relação dinâmica entre o ator que se movimenta em cena e o cenário. Tais princípios influenciaram de forma decisiva artistas cênicos como Antoine, Stanislavsky, Appia, Craig e Meyerhold. Surgia, então, a ideia moderna do diretor teatral, denominado encenador, que entenderia que a sua obra teatral “(...) é outra coisa – e é mais – do que a simples definição de uma disposição em cena, uma simples marcação das entradas e saídas ou determinação das inflexões e gestos dos intérpretes” (ROUBINE, 1998, p. 24). Torres (2007) afirma que o termo “encenador” é uma ideia moderna da função da direção teatral, diferente da função de ensaiador, visto que o encenador teria uma postura mais crítica de atrito constante com a dramaturgia, inclusive reivindicando para si a autoria da cena. O trabalho do diretor teatral ou encenador residiria no condicionamento, próprio de sua visão, de manejar os melhores recursos no intuito de transpor a escrita dramatúrgica à escrita cênica. O encenador seria o responsável por empregar uma unidade à peça representada e ainda, conforme Roubine (1998) ressalta, daria um sentido à prática do teatro em geral. Assim, a encenação estaria cercada da derivação teórica de que ela abrangeria todos os

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elementos constitutivos de uma montagem teatral, como o cenário, a relação palco versus plateia, o texto, o ator e sua teorização. Numa ampla acepção, o termo encenação designa o conjunto dos meios de interpretação cênica: cenário, iluminação, música e atuação [...]. Numa acepção estreita, o termo encenação designa a atividade que consiste no arranjo, num certo tempo e num certo espaço de atuação, dos diferentes elementos de interpretação cênica de uma obra dramática (VEINSTEIN apud PAVIS, 2005, p. 122).

André Antoine (1858-1943) com o Thèatre Libre, fundado em 1887, e depois Stanislavski (1863-1938) com o Teatro de Arte de Moscou, fundado em 1897, foram importantes encenadores do final do século XIX a entenderem que, para além da criação artística, importava também a sistematização de um pensamento teatral. Naquele momento, ambos estavam sob a influência dos pensamentos naturalistas difundidos por Émile Zola (1840-1902). Tendo em vista a encenação naturalista, os cenários não tinham somente como função a representação, mas serviriam também como um condicionamento imposto ao ator, conforme afirma Mantovani (1989), já que havia uma relação entre o ator e o cenário. Por isso, os cenários não eram simplesmente um lugar, mas eram, antes, um ambiente. Assim como a vida do homem era condicionada pela objetividade do ambiente que o cercava, assim também acontecia com as personagens e os cenários. Por isso, as montagens teatrais de Antoine e Stanislavski aconteciam em um palco concebido dentro dos parâmetros do naturalismo, onde a cenografia fotográfica retratava o real. Sonrel, citado por Magaldi (2004), aponta que “a fotografia representa na segunda metade do século XIX o mesmo papel do diorama no fim do século XVIII e da perspectiva no século XVII. Admira-se aí o trompe-l’oeil e a imitação servil, objetiva, da natureza” (MAGALDI, 2004, p. 39). Estas técnicas cenográficas alicerçadas pelo uso da perspectiva davam a ilusão de realismo às cenas que as empregavam. Até os idos do século XIX, com o advento do encenador, a cenografia estava ligada ao emprego da perspectiva, sendo representada muitas vezes por grandes painéis pintados. A pintura, no teatro, completa a construção arquitetônica. Às vezes, havendo muitas mudanças de ambiente ou desejando-se um efeito de leveza, que é difícil de obter com o cenário construído, apela-se para uma solução pictórica, amoldada ao espírito da arquitetura. Uma tela com móveis e objetos pintados não deixa por isso de sugerir um espaço construído, que é aquele em que se move o ator (MAGALDI, 2004, p. 35).

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Mantovani (1989) expõe que Antoine funda o Thèatre Libre em 1887, mas já em 1890 Paul Fort funda na cidade de Paris o Thèatre d’Art como reação ao naturalismo. Assim nascia o movimento simbolista que pretendia a busca da realidade além do visível, do palpável e do objetivo, pois a fantasia e o mundo fantástico dos sonhos seriam os ingredientes para revelar a realidade interna. A cenografia simbolista realçaria o uso da cor como linguagem simbólica. Dessa maneira, ela se tornaria um ato criativo por concebê-la como uma composição cromática, recusando a reprodução fotográfica. O palco simbolista não se preocupou em representar a realidade segundo Mantovani (1989), mas, antes, em explorar zonas dos estados da alma. Sua ocupação não era a de descrever, mas a de encantar. Por isso, a escolha simbolista incidiu por um cenário mais essencial, subjetivo, onírico e especificamente teatral, retirando todo o acúmulo de móveis e objetos. A utilização da iluminação ganhou força poética no tratamento cênico. Além de o texto ser complementado pela música e pela dança. Consequentemente, a encenação ganhava uma amplitude poética e este fato influenciou vários outros artistas em suas pesquisas e práticas cênicas. Meyerhold (1874-1942) rompeu com o naturalismo e a partir de 1905 sugeriu uma modernização na encenação. Conforme ressalta Mantovani (1989), a função dos cenários seria a de dar um direcionamento à imaginação do público. Assim, Meyerhold substitui o universo cênico realista por um jogo de planos, procurando por uma estilização e simplificação além de uma essencialidade nos seus cenários. Para ele, o cenário deveria contribuir para a atuação dos atores. Por isso seus cenários construtivistas eram verdadeiros dispositivos cenográficos. Dispositivo cenográfico entendido como elemento essencial à realização da cena, ou seja, é a junção perfeita e harmoniosa entre a escritura da encenação e da cenografia, primando pela concepção de unidade, sem o que o espetáculo se descaracterizaria. Estes dispositivos seriam criados não apenas, mas, muitas vezes, pelos encenadores-cenógrafos que nas suas encenações precisam de um tratamento objetivo do espaço cênico e encontram no uso do dispositivo tanto um argumento cênico pertinente à encenação como a possibilidade criativa de espacialização cênica, cenográfica e dramatúrgica. Afinal, o conceito de espaço quase se mistura com o conceito do próprio teatro. E, ao dispor de um elemento essencial como o dispositivo cenográfico, este serviria como guia para as evoluções dos atores por dinamizar as suas movimentações e desenhos das cenas, e também como um ancoradouro para a própria evolução do espetáculo no tempo e no espaço da encenação. Assim, além de ter uma função cênica, ele também participa para a depuração da dimensão simbólica que o

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espetáculo contém. O dispositivo cênico, dessa forma, estaria a serviço tanto da encenação quanto da cenografia no que tange a passagem do texto dramático ao cênico. Appia (1862-1928) e Gordon Craig (1872-1966), que vale ressaltar foram encenadores e cenógrafos, conforme aponta Mantovani (1989), propunham que seus cenários passassem pela noção de funcionalidade e possibilidade poética, explorando outras formas de realização cênica. Appia propôs que o espaço cênico fosse um espaço vivo a ser trabalhado segundo a verticalidade e horizontalidade, dimensionando o chão e a profundidade que a cena adquirisse quando o ator se movimentasse. Já Craig trabalhou com a verticalidade cunhando os screens (grandes painéis móveis dispostos em sentido vertical) com o uso da cor como dimensão simbólica, e também para propiciar a atmosfera do espetáculo. O cenário estaria, portanto, em ambos casos, ligado à encenação, pois tanto Appia quanto Graig sendo encenadores-cenógrafos disporiam de soluções plásticas para seus espetáculos. O cenário não apenas se liberta de sua função mimética, como também assume o espetáculo inteiro, tornando-se seu motor interno. Ele ocupa a totalidade do espaço, tanto por sua tridimensionalidade quanto pelos vazios significantes que sabe criar no espaço cênico. O cenário se torna maleável (importância da iluminação), expansível e co-extensivo à interpretação do ator e à recepção do público (PAVIS, 2005, p. 43).

Pavis (2005) aponta que a cenografia denotaria o desejo de ser uma escritura no espaço tridimensional e não simplesmente uma arte pictórica de tela pintada. A cenografia se tornaria, dessa maneira, o resultado de um pensamento semiológico arquitetado pela figura do encenador. “[...] conciliação dos diferentes materiais cênicos, interdependência desses sistemas, em particular da imagem e do texto [...]” (PAVIS, 2005, p. 45). Pavis (2005) ainda pontua que: [...] o discurso da encenação é a organização de materiais textuais e cênicos segundo um ritmo e uma interdependência próprias do espetáculo encenado. Para definir o mecanismo discursivo da encenação, é preciso relacioná-lo com as condições de produção, as quais, por sua vez, dependem da utilização particular feita pelos “autores” (dramaturgo, encenador, cenógrafo etc.) dos diferentes sistemas artísticos (materiais cênicos) que eles têm a disposição num dado momento histórico. (PAVIS, 2005, p. 102)

Dessa forma, o espaço cênico é objeto tanto da encenação quanto da cenografia, pois ambas se debruçariam na criação de um discurso, que resultaria na criação espetacular.

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A junção dessas duas áreas é algo comum na história do espetáculo após a reivindicação do status de criador por parte dos artistas dessas áreas – seja cada uma individualmente, seja quando elas se acumularam na figura do encenador-cenógrafo. Um exemplo brasileiro dessa junção é o espetáculo Romeu e Julieta do Grupo Galpão, em que se nota a assinatura de Gabriel Villela tanto na encenação quanto na cenografia. Antônio Gabriel Santana Villela, conforme a definição de seu verbete na Enciclopédia Itaú Cultural, nasceu em Carmo do Rio Claro em Minas Gerais no ano de 1958. Formou-se como diretor teatral pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/SP). É diretor, cenógrafo e figurinista. Tornou-se um dos mais prestigiados diretores na década de 1990, pois em suas obras nota-se a presença de uma teatralidade barroca, vigorosa e com apelos ao imaginário brasileiro. A partir de 1992, Gabriel iniciaria uma parceria com o grupo mineiro Galpão para a encenação, adaptada para a rua, de Romeu e Julieta, do dramaturgo inglês William Shakespeare. Espetáculo que chegou a ser apresentado em várias cidades do Brasil e também da Europa, inclusive no Shakespeare’s Globe Theatre, em Londres, na Inglaterra; e recebeu várias premiações, tornando-se um marco do teatro brasileiro na década de 1990. No caso do espetáculo Romeu e Julieta, o presente artigo pretende analisar, a partir de fontes iconográficas (fotos e o videodocumentário), o uso do carro (Veraneio) como dispositivo cenográfico no arranjo do cenário dentro do espaço cênico; entendendo que espaço cênico é um termo mais amplo – por comportar inclusive a ideia da relação palco versus plateia – do que o termo carro, que é considerado neste trabalho como um dispositivo cenográfico a serviço do encenador-cenógrafo.

O uso do carro como dispositivo cenográfico O cenário do espetáculo Romeu e Julieta concentra-se em torno do carro (Veraneio). A ideia de usá-lo na encenação foi do próprio diretor Gabriel Villela, segundo uma conversa informal que aconteceu com o ator do Grupo Galpão, Eduardo Moreira, durante o 27° Festival Internacional de Teatro Universitário de Blumenau (SC) em 2014. Ele afirmou ainda que Gabriel, quando viu o carro que pertencia ao grupo, logo disse que, independente de qualquer coisa, ele partiria da ideia do carro para a sua proposta de montagem. Ainda segundo Moreira, Villela se preocupa muito com o chão onde o ator trabalha. E sempre parte de uma possível

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solução do espaço para a proposta da encenação do texto dramático. Foi assim que o carro tornou-se um elemento essencial no espetáculo de Gabriel Villela. O cenário do espetáculo é composto por um dispositivo, o carro (uma Veraneio, chamada carinhosamente de Esmeralda), de cor vermelho escuro, estacionado lateralmente e disposto no centro da cena. Nos vidros das janelas há a aplicação de adesivos com desenhos de flores, e as janelas possuem uma cortininha vermelha que esconde o interior do carro. Na parte dianteira (capô) existe um primeiro tablado de madeira com uma escada de seis degraus, igualmente feita de madeira, disposta do lado esquerdo (em relação ao público). Assim, a parte dianteira do carro está embaixo desse tablado que não se apoia no carro, pois possui sustentação própria. Há ainda uma escada de madeira armada que serve de apoio para um grande guarda-sol colorido aberto. O segundo tablado tem um revestimento em sua borda lateral, uma espécie de tapete avermelhado com desenhos de rosas brancas e com franjas, e fica apoiado no comprimento total da parte de cima do carro (teto). Nos cantos dos dois tablados ficam pequenos vasos com flores coloridas artificiais e varas de bambu compridas, sendo que em uma delas fica presa uma lua com estrelas. Os pisos dos tablados são de comprimentos diversos. Os tablados, o chão à frente do carro e o interior do carro formam espaços vazios que são usados pelas personagens nas evoluções dos desenhos das cenas ao longo do espetáculo. Atrás do carro é o espaço fora da cena, onde os atores dispõem os objetos cênicos, se arrumam e aguardam suas deixas para entrar em cena. É uma espécie de coxia. No chão em frente ao carro estacionado há o contorno de dois corpos desenhados e de duas cruzes de madeira – em uma está escrito o nome de Romeu e em outra o nome de Julieta. Há também um banquinho com o acento revestido de um tecido vermelho com franjas nas laterais. Conforme observado na descrição feita do cenário acima, o carro assume o papel central dentro da organização cenográfica. Ele encontra-se no centro do acontecimento teatral. Enquanto dispositivo, ele insinua um espaço onde os atores podem transitar com suas personagens. Os diferentes tablados à sua volta dimensionam as possibilidades do uso do espaço e potencializam as construções de diversas relações entre eles e os acontecimentos da cena. A encenação tem a seu serviço um pertinente dispositivo que possibilita criar as cenas de forma onírica e poética.

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Apesar de a encenação conceber o espetáculo para o espaço da rua, observa-se que a cena foi pensada em torno do carro em um ângulo de 180°, isto é, tendo uma frente onde o espetáculo deve ser apresentado para o público. Dessa forma, a encenação estabelece uma relação quase de frontalidade na relação da cena com o público. Os outros aspectos visuais, como os figurinos, as caracterizações e maquiagens, são pertinentes dentro da proposta da encenação, porque dialogam com a realização do cenário e das cenas. Da mesma forma, a seleção das músicas tocadas e cantadas ao vivo pelos atores também corrobora para estabelecer uma atmosfera ora de romance ora de eminente tragédia. O trabalho corporal dos atores, advindo de exercícios do circo-teatro, mistura a tragédia com a comédia, o teatro de rua com a arte popular, e é percebido pelo público nas construções e movimentações das personagens no espaço. Tudo muito ligado, sem dispêndios desnecessários de energia física. Durante o decorrer do espetáculo são utilizados pernas-de-pau, instrumentos musicais, sombrinhas, bonecos representando damas da corte, espadas, folhagens representando as máscaras no baile da casa dos Capuletos. Estes objetos são empregados pela encenação como recurso cênico em busca de atingir o imaginário do público, ativando a sensibilidade e a receptividade dentro dos tênues e nebulosos limites do trágico e do cômico. No entanto, serão analisados em seguida quais seriam as funções cênicas e a dimensão simbólica que o carro como dispositivo cenográfico assumiria dentro da encenação de Romeu e Julieta.

Sobre as funções cênicas e a dimensão simbólica O carro é utilizado em cena não como um veículo propriamente dito, mas com outras finalidades, tornando-se assim um importante dispositivo cenográfico. O carro é destituído de sua função real e recebe um tratamento plástico e poético. Ele é o elemento essencial da cenografia, pois além de estruturar o cenário ao seu entorno, também é um elemento simbólico que materializa o imaginário. No entanto, a apropriação do carro na cena não é novidade. Isto é bastante comum no âmbito da arte circense. Os chamados “carros-bombas” estão presentes em diversos números de palhaços. Só que o tratamento dado a eles na cena circense é feito dentro de um determinado registro, totalmente diferente do proposto na montagem de Romeu e Julieta pelo diretor do Grupo Galpão. No circo, estes carros são desmantelados, maltratados, muitos explodem, têm suas portas deslocadas e revelam grosseiramente o seu interior, na busca do

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efeito cômico. Assim, a apropriação ocorre mediante o esculacho, a pancadaria; enfim, seu uso é baseado no registro anedótico. Já em Romeu e Julieta, Villela apropria-se do carro como um importante dispositivo cenográfico, dando-lhe um tratamento erudito. A integridade física do carro é respeitada pelos atores em cena. Muito disso pelo próprio teor do texto dramático, que costuma exigir um posicionamento mais reverente. O dispositivo torna-se o centro da cena, uma vez que envolve os acontecimentos dramáticos e cênicos. Nota-se que a necessidade cênica de sua existência é pertinente tanto do ponto de vista dramático, pois os desenlaces textuais são amarrados por um desenho cênico coreografado, quanto do ponto de vista estético, porque o carro apresenta-se como um elemento visual de alta teatralidade. Outra característica importante a ser apontada é a forma como o cenário afeta os corpos dos atores. A circulação dentro e em torno do carro faz com que as dificuldades ocasionadas pelos obstáculos (sair e entrar no carro, abrir e fechar a janela, subir e descer as escadas, degraus e tablados) dinamizem a movimentação dos atores. As marcações cênicas que se apropriam das dificuldades geradas por este dispositivo, somadas ao trabalho corporal circense, são um exemplo disso. O dispositivo cenográfico detém as funções cênicas pensadas pelo encenadorcenógrafo. Ele não se caracterizaria como tal se não estivesse imbricado no interior da encenação, já que ele é essencial, não podendo ser algo fortuito ou meramente decorativo. Este é um dado importante, conforme Pavis (2005) indica, pois o encenador pretende reunir todos os elementos constitutivos, ou seja, os sistemas cênicos presentes no espetáculo, a fim de gerar uma concepção, um discurso. O dispositivo deve também auxiliar na produção do sentido do espetáculo. “A cenografia contemporânea concebe sua tarefa como um dispositivo próprio que pretende não mais ilustrar o texto, mas esclarecê-lo [...] ao buscar estabelecer uma nova situação para a enunciação [...], bem como situar o sentido da encenação nas relações entre o tempo e o espaço.” (TOLEDO, 2011, p. 93-94) O dispositivo em questão assume no âmbito da cena a estruturação dos espaços de atuação em que as situações dramáticas são anunciadas e desenvolvidas ao longo do espetáculo. O jogo entre os atores, suas relações de proximidade e distanciamento, o dentro e o fora da casa da família dos Capuletos são algumas situações que acontecem no entorno e até mesmo dentro do carro – já que ele permanece no centro dos acontecimentos narrativos e cênicos, como um elemento central para as construções das cenas. As espacializações dos

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ambientes solicitados pelo texto dramático são construídas obedecendo à função que o dispositivo alude à cena. A seguir serão pontuadas quais são estas funções: A primeira função é a do carro como empanada (lugar onde se desenvolvem as cenas tradicionais no teatro de animação). Já na abertura do espetáculo as janelas do carro transformam-se em uma espécie de empanada onde dois bonecos cantam declarações de amor um para o outro. Os vidros do carro, que estão abaixados, revelam uma cortininha vermelha onde aparecem primeiro os bonecos e em seguida as atrizes/manipuladoras que ficam visíveis para o público. Aqui se percebe uma das transformações do carro, quando ele passa a ser um espaço para a manipulação de bonecos. A segunda função é do teto do carro como palco central, uma espécie de picadeiro. Nesta mesma cena de abertura ocorre a luta entre as famílias rivais Capuleto e Montéquio. No calor desta disputa, ouve-se o rufar de tambores e, no alto do tablado apoiado no teto do carro, adentra uma figura andando em corda bamba, fazendo gracejos ao público – tal qual acontece com as personagens no circo. É neste palco central, pensado pelo encenador-cenógrafo, onde os acontecimentos-chave ocorrem. Pode-se dizer também que este é o local do prenúncio da tragédia, pois nele acontecem inúmeros desenlaces dramatúrgicos, como o anúncio da tragédia feito pelo narrador/poeta, o decreto do Príncipe de Verona, a morte de Mercúrio, a última noite de Romeu e Julieta, o sofrimento de Julieta pelo desterro de Romeu, o sermão duro dos pais de Julieta e a solução fatídica dada pelo Frei Lourenço. Para isso, o carro é constantemente transformado, através das marcações das cenas, operando um conjunto de ressignificações. É importante ressaltar que o carro não é transformado em sua materialidade, mas em sua significação, isto é, em seu sentido; à medida em que os acontecimentos dramatúrgicos vão ocorrendo, as cenas e os atores interagem com o dispositivo de uma forma cênica que faz com que o público perceba a transformação de um lugar para outro no uso deste palco central. Na terceira função o carro assume a espacialidade do interior e da fachada da casa da família dos Capuletos. Isto acontece com bastante frequência ao longo do espetáculo, com a função de mostrar ao público o que acontece dentro e o que acontece fora da casa dos Capuletos. A quarta função é quando o carro é usado para a cena do balcão. Nesta cena Julieta encontra-se apoiada na janela do carro (que representa o peitoril da janela de seu quarto) contemplando a lua e pensando no amor. Romeu a admira do tablado acima dessa janela, mais precisamente do tablado no teto do carro. Estabelece-se um jogo cênico que revela uma

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inversão de posições das personagens propiciadas pelo uso do dispositivo, já que, em geral, a cena é vista com Julieta no alto de sua janela e Romeu no chão. Nesta montagem, Villela inverte essas posições e cria uma movimentação de sobe e desce no decorrer do desenho da cena, aproveitando as possibilidades do uso do carro como dispositivo. Na quinta função o carro se transforma em carruagem. Este é o momento em que a ama de Julieta vai à busca de Romeu para obter notícias. Neste caso, o dispositivo é usado de forma cômica, por ser transformado em uma espécie de carruagem. Percebe-se que o público se diverte com o jogo estabelecido entre os atores. Até então o carro não foi usado como tal, pois, apesar de a carruagem ser um veículo de transporte, está longe de ser motorizada. Na cena ocorre uma ressignificação desse meio ao fazer menção à utilidade real do carro. A sexta função é do carro como uma espécie de cortina. O carro é transformado em algo que descortina a visão do público, revelando o jazigo de Julieta. Quando a ré do carro é acionada, abre-se um espaço no meio da cena e o cenário é partido ao meio, como em um movimento imagético do rompimento, desenlace do corpo físico para a morte. Assim é revelado o velório de Julieta. Percebe-se aqui o uso do dispositivo com a sua movimentação real (é acionado a ré) gerando o desequilíbrio na configuração espaço-temporal da cenografia, empregando uma significação e reforçando a atmosfera cênica da tragédia. A sétima função é do carro como coxia e backstage. As entradas e saídas das personagens se dão pelas laterais, por dentro do carro e também por uma escada, que vai do tablado posicionado no teto do carro ao espaço atrás dele. Os atores e os objetos cênicos ficam atrás do carro em uma espécie de backstage fora do alcance do olhar do público, já que o carro encobre essa visão. Esta é mais uma função do uso do carro, que demarca o espaço do fora de cena e também o espaço limiar entre o fora e o dentro de cena (a coxia). Assim, as diversas funções atribuídas ao dispositivo cenográfico analisadas neste artigo acontecem ao longo da encenação. E a dimensão simbólica empresta à cena uma rede de significações que dá sentido como vetores comunicacionais ao público. Não tem como dissociar as funções cênicas no uso do dispositivo das dimensões poéticas e simbólicas, pois elas andam juntas e são sincrônicas para a produção do sentido pretendido pela encenação. Com isto posto, será apresentada a seguir uma possível leitura da dimensão simbólica no uso do carro em questão. O público tem a visão da lateral da anatomia/lataria do carro, fazendo lembrar os carros que se prestam em levar os mortos por conta da traseira mais alongada que esse modelo possui. Do lado de dentro do carro apenas algumas personagens entram e saem ao longo do

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espetáculo, como é o caso da Julieta, da sua ama e da Sra. Capuleto, uma tríade feminina cúmplice, em alguma medida, no desfecho trágico da história encenada. As cenas com as demais personagens acontecem em torno do carro, nos tablados que o circunda e no chão. Já foi mencionado que o carro empregado na montagem teve a função de ser tanto a casa da Julieta quanto o descortinamento de seu próprio mausoléu. Ao fazer uma leitura conotativa do emprego mencionado acima, o público seria levado a perceber o nível simbólico do discurso do encenador, no interior do espetáculo ao lançar mão do dispositivo cenográfico em questão. Dessa maneira, o carro receberia uma dimensão simbólica se visto como uma alusão metafórica do carro real que se responsabiliza por transportar os mortos até a sua última morada. Essa possível leitura referenciada pelo cortejo fúnebre, tão bem conhecido pelas culturas ocidentais, ativaria, a partir da leitura do movimento feito pelo dispositivo ao descortinar a morte de Julieta para Romeu, o entendimento poético das antíteses contidas no interior do texto espetacular: vida e morte, amor e ódio, esperança e desespero.

Considerações finais A história do espetáculo ocidental apontou que o espaço cênico e os procedimentos e mecanismos envolvidos no processo de uma encenação foram preocupações de agentes criativos que, além de produzir espetáculos, também teorizavam sobre o teatro. E o fato da cenografia e da encenação serem realizadas pela mesma pessoa também se tornou algo comum, pois, historicamente, verificaram-se nos artistas os anseios em busca de inovações cênicas. No caso da montagem do espetáculo Romeu e Julieta percebe-se uma articulação harmoniosa tanto da cenografia quanto da encenação, igualmente engendradas pelo Gabriel Villela, pois a ideia de usar o carro como dispositivo cenográfico veio como uma solução para o problema de adaptar a escrita dramatúrgica à escrita cênica. Portanto, a ideia do diretor de que a cenografia giraria em torno do carro mostra a importância deste dispositivo nos sentidos cênico, dramático e cenográfico. Cênico porque o dispositivo serve a proposta da encenação na elaboração e expressão das cenas. Dramático pelo seu uso estar em consonância com os desfechos dramáticos e as evoluções dramáticas das personagens. E, por último, cenográfico, pois o dispositivo empregado possui um tratamento estético e está a serviço da cenografia. Logo, se ele fosse retirado da configuração do espetáculo, a peça se descaracterizaria, já que ele é elemento essencial ao espetáculo.

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Percebe-se que a encenação foi condicionada pelo uso do dispositivo proposto, cujas várias funções que exerceu foram descritas e analisadas neste trabalho, assim como a sua dimensão simbólica e poética. Assim, o dispositivo tornou-se um meio objetivo de expressar o imaginário do público e levá-lo a embarcar na história encenada. Isto só foi possível porque o espetáculo foi concebido e pensado partindo da ideia do uso do carro (Veraneio) como dispositivo cenográfico por um encenador-cenógrafo.

Referências: ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL. Verbete Gabriel Villela. Disponível em: ˂http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa359371/gabriel-villela˃. Acesso em: 21 jul. 2014. GODOY, Arilda Schmidt. Pesquisa Qualitativa: tipos fundamentais. Administração de Empresas, São Paulo, v. 35, n. 03, p. 20-29, 1995.

Revista

de

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7. A APROPRIAÇÃO POR GERALD THOMAS DAS OBRAS DE MARCEL DUCHAMP Gina Mara Age do Amaral20

Resumo: O propósito deste artigo é compreender a apropriação feita por Gerald Thomas, diretor brasileiro de teatro, das obras de arte de Marcel Duchamp, com enfoque na Roda de Bicicleta (1913). Thomas utiliza-se desta obra na criação do espetáculo Carmem Com Filtro 2 (1986), por meio do procedimento de fragmentação artística, com grande atenção aos detalhes e à plasticidade de seu trabalho, deixando também em voga o estilo de apropriação por ele adotado. Desse modo, será estudado como foi feito tal espetáculo, em relação aos objetos apropriados. Foram utilizados a abstração de espectadores que assistiram à peça, relatos de críticos, vídeo e livros opinativos acerca da Arte para fazer esta pesquisa. Palavras-chave: apropriação teatral, Gerald Thomas, Roda de Bicicleta, Marcel Duchamp

Introdução A arte reinventa a si mesma, num processo ininterrupto e perene, no qual o artista revisa seus próprios conceitos, os mescla com o conceito de outrem – seja um ser, uma sociedade ou uma ideia – e os apresenta novamente. A interação que a arte possui consigo mesma pode ser, muitas vezes, subjetiva, o que torna importante seu estudo detalhado, que se dá por meio da observação empírica. Gerald Thomas Sievers (1954), mais conhecido como Gerald Thomas, é um diretor de teatro brasileiro que possui uma polêmica e ampla carreira. Originalmente formado em Filosofia, aprofundou-se no estudo do teatro no La MaMa Experimental Theater de Nova Iorque. Suas peças já foram apresentadas em vários países, em teatros como o Lincoln Center em Nova Iorque, o Teatro Estatal de Munique, o Wiener Festwochen de Viena e em eventos como o Festival de Taormina, além de ter recebido três Prêmios Molière e 18 outros prêmios. Thomas admite a paixão pelo trabalho de Marcel Duchamp (1887-1968) várias vezes. Duchamp – pintor, escultor e poeta – trabalhou com a crítica à arte moderna, com o 20

Gina Mara Age do Amaral é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). Especialista em Arte Educação pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (1991). É Bacharel em Artes Cênicas com habilitação em Direção Teatral pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (1988). É artista plástica com exposição individual na SP CRAFT (2002). O presente artigo foi orientado pelo prof. Dr. Walter Lima Torres Neto, da Universidade Federal do Paraná. Revisão: Marjure Kosugi. E-mail: gmaamaral@terra.com.br SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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excesso de virtude visual em detrimento da “alma” da arte. Essas críticas aproximam o brasileiro do trabalho de Duchamp. Em seu blog, Thomas cita que “Duchamp é aquele que mais amo, que mais admiro, que riu de tudo, que desmembrou tudo há exatos cem anos! Não houve mais ‘arte’ depois dele, no entanto não entendemos mesmo a mensagem: e o que fazemos? Arte. Ou pensamos que fazemos” (THOMAS, 2009). O ápice da admiração de Gerald Thomas por Duchamp só poderia ser expressado por meio de seu trabalho, o teatro. O ready-made, que é justamente a crítica de Duchamp em seu modo mais brutal, um estilo criador ele mesmo, é corriqueiramente apresentado nas obras e releituras de Thomas, que também se utiliza de outras características das obras do autor. No ano de 1986, Thomas apresenta a peça Carmem Com Filtro 2, em que trata especificamente do problema da desconstrução e do esvaziamento do “mito Carmem”, do questionamento dos conceitos de personagem, persona, figura no teatro contemporâneo.

No caso do mito Carmem, um dos filtros são os segmentos de personagens que agem como camadas superpostas a um núcleo inicial. Esse núcleo começa a construir-se com o gesto da primeira Carmem de Prosper Merimée, criada num conto breve de 1845, onde o escritor romântico francês fixa a vida dos ciganos espanhóis, destacando a figura da mulher fatal que destrói a vida de um tenente denominado José; e especialmente no enredo da ópera de Bizet. Na sequência de reinterpretações começa pela vulgarização romântica de George Bizet, que imortalizou a cigana através dos leitmotive da ópera, com libreto de Meilhac e Halévy composto em 1875. Thomas se baseia especialmente no enredo da ópera de Bizet e agrega às citações da narrativa operística a Helena grega, mítica causadora da Guerra de Tróia, e a Helena do Fausto de Goethe (FERNANDES, 1996, p. 107108).

A Carmem com Filtro 2, protagonizada por Bete Coelho, é completamente diferente da original; uma releitura feita com diversos elementos da justaposição que Thomas propõe, enquanto quebra os paradigmas mitológicos sobre a personagem e o teatro como um todo. Thomas faz a apropriação, cuja definição exata será abordada em seguida, da obra Roda de Bicicleta de Marcel Duchamp – que se tornou famosa por ter inaugurado o estilo ready-made, que consagrou seu criador. A interação dos elementos de Duchamp com o cenário de Thomas é uma reverberação, cuja interação será melhor compreendida com a conceituação do termo “apropriação”, desenvolvida a seguir nesse artigo.

Conceito citação e apropriação Diz-se que “apropriação”, em termos gerais, refere-se ao ato de alguém se apossar de algo que não é de sua autoria como se assim o fosse. Na arte contemporânea, essa expressão SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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pode indicar que o artista incorporou à sua obra materiais mistos e heterogêneos que, no passado, não faziam parte do seu fazer artístico, como imagens, objetos do cotidiano, conceitos e textos. Pode indicar também que o artista se apropriou de partes ou da totalidade de obras de autores que ocupam lugar consagrado na história da arte. A apropriação, enquanto forma de trabalhar a arte, difere de outros conceitos semelhantes por terem vieses extremamente diferentes: a releitura e o citacionismo. Segundo Barbosa (2005), “apropriar-se concerne ao ato de retirar imagens ou objetos de seus locais de origem, utilizando-os para construir uma obra (ou outra obra)” (BARBOSA, 2005, p. 71). Releitura, por sua vez, significa “ler novamente, dar novo significado, reinterpretar, pensar mais uma vez” (BARBOSA, 2005, p. 73). Posição em concordância assume Pillar (2003, p. 11), ao afirmar que reler é “um fazer a partir de uma obra, é recriar o objeto, reconstruindo-o num outro contexto com novo sentido; é uma criação com base num referencial”. Já a citação indica “o uso, em determinada produção, de elementos que se relacionam a artistas, situações e movimentos consagrados pela história da arte, admitindo-se que seja empregado, até mesmo, o modo de trabalhar ou a cor mais comum utilizada pelo artista citado” (BARBOSA, 2005, p. 91). É notável que, de acordo com a autora, a citação utiliza-se de múltiplas referências, que podem ser interpretadas, inclusive, como ironia. Dentro do trabalho de Gerald Thomas, em alusão às obras de Marcel Duchamp, o que se percebe a princípio é que não se trata de citação, e sim de apropriação. Ao reutilizar elementos como a Roda de Bicicleta, Thomas dá à sua peça o valor artístico que Duchamp impregnou às suas obras. Além disso, por tal apropriação fazer parte da cenografia do espetáculo, incorpora-se ao teatro o que antes eram obras de exposição; derrete-se a estaticidade do objeto, colocando-o em movimento subjetivo. É válido frisar que Thomas faz de sua cenografia parte viva do espetáculo; não como decoração ou mera “diversão visual”, mas como elemento da obra, como conceito artístico. Pavis (2011, p. 45), no Dicionário do Teatro, define: “a cenografia marca seu desejo de ser uma escritura no espaço tridimensional (ao qual seria necessário acrescentar a dimensão temporal), e não mais uma cena pictórica de tela pintada, como o teatro se contentou em ser até o naturalismo”. Assim, Thomas concretiza o parecer moderno em seu espetáculo teatral, interagindo com elementos de outro artista, fazendo o cenário ser parte da obra tal como um personagem, muito além de ser, unicamente, parte visual. Isso concorda exatamente com a noção de Marcel Duchamp e do ready-made, conforme veremos a seguir.

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Duchamp Marcel Duchamp foi um pintor, escultor, enxadrista e poeta, nascido na França, porém com cidadania nos Estados Unidos. É um dos precursores da arte conceitual e introduziu a ideia de ready-made como objeto de arte, sendo esta ideia definida como uma retirada, ou envio, de elementos da vida cotidiana para o mundo das artes, ou ainda, nas palavras de Argan, “os ready-mades podem ser lidos como gesto gratuito, como ato de protesto dessacralizante contra o conceito ‘sacro’ da ‘obra de arte’, mas também como vontade de aceitar na esfera da arte qualquer objeto ‘finito’, desde que seja designado como ‘arte’ pelo artista” (ARGAN, 1992, p. 114). Duchamp apropriava-se de objetos comuns, industriais, cotidianos e levava-os às galerias, elevando-os à categoria de arte. Percebe-se, dentro deste comportamento criativo, uma forte crítica à idealização da noção comum de obra de arte. Duchamp diz que a arte não tem alma, trata-se de mera exposição visual e, por isso, quaisquer objetos industrializados servem ao seu propósito de artista; ele não pretendia criar objetos belos ou interessantes, estendendo a crítica, portanto, à dicotomia entre bom e mau gosto artístico e também à arte “apenas visual”. Essa concepção foi expressada também em relação à obra Pá de Neve (1915), o primeiro ready-made americano, que era um produto de massa, um objeto feito por máquina, sem qualquer pretensão estética, escolhido por ser indiferente aos olhos e ao mesmo tempo pela ausência de bom ou mau gosto. A obra que inaugurou o ready-made de Duchamp foi a Roda de Bicicleta (1913), constituída pela roda da frente de uma bicicleta, que tinha a forquilha reta e estava montada de cabeça para baixo, sobre um banquinho comum de cozinha: este, porém, não era um objeto indiferente aos olhos, mas poderia passar despercebido ao crivo artístico. Como afirma Tonkins (2004, p. 178), “O próprio Duchamp disse que ao olhar para a Roda de Bicicleta sentia o mesmo prazer que ao contemplar o fogo numa lareira”. Ele achava maravilhosamente relaxante girar a roda e ficar observando os raios confundirem-se, tornarem-se invisíveis, depois irem reaparecendo devagar enquanto o movimento perdia força; alguma coisa nele era tocada, como havia dito, pela imagem de um círculo que gira em torno do seu eixo, continuamente, onanisticamente. Duchamp pretendia “captar a mente, e não o olho” (STAFFORD, 2008), e criou vinte e um ready-mades. O mais emblemático deles, depois da sua morte, foi A Fonte (1917), que consistia em um urinol comum invertido com 60 cm de altura, assinado por R. Mutt. 1917, marca da indústria que o produziu.

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Embora largamente relacionado com o ready-made, o trabalho de Duchamp não se resume a esta prática. Influenciado por várias escolas de arte, ele também criou pinturas, que decorrem de seus conceitos de “perspectiva” e “movimento”, e alguns de seus trabalhos feitos em vidro ficaram especialmente famosos, como A noiva despida pelos seus celibatários, mesmo ou O grande vidro, que representa um moinho feito com complexas engrenagens e uma mulher. A obra é composta por duas lâminas de vidro, uma sobre a outra, onde se vê uma figura abstrata na parte de cima, que seria a noiva, e, na parte de baixo, percebe-se uma porção de outras figuras (feitas de cabides, tecido e outros materiais), dispostas em círculo, ao lado de uma engrenagem (retirada de um moinho de café), que seria uma recriação de seu próprio quadro A noiva. Mesmo não sendo adepto de nenhum estilo de arte propriamente dito, Duchamp deixou legados importantes para várias “escolas”, sendo reverenciado e homenageado por vários artistas. Apesar disso, ele nunca assumiu uma postura crítica diretamente, inclusive preferindo permanecer recluso durante a maior parte de sua vida. Marcel Duchamp não vivia exclusivamente de arte. Também era um entusiasta do jogo de xadrez, tendo dedicado parte da vida ao estudo deste jogo, tendo, aparentemente, mantido uma distância polida da arte durante o período em que secretamente trabalhou (de 1946 a 1966) na construção de uma espécie de quarto, um ambiente tridimensional, que deveria ser visto através de uma fresta na porta. Essa obra, Étant donnés, ficou conhecida apenas depois de sua morte. Ela representa uma mulher nua, com as pernas abertas, deitada de costas e segurando uma lâmpada de gás. O título completo, em tradução livre, seria Étant donnés – 1. A cachoeira 2. O gás que ilumina, que representam as duas partes da obra em questão. A obra de Duchamp, apesar de não ter uma quantidade tão expressiva, é uma atitude, um gesto crítico radical; uma desconstrução, uma remodelagem no conceito do que seria arte. Também é interessante como o artista faz releituras de si mesmo, deixando claro seu imperativo artístico: “Será arte tudo o que eu disser que é arte” (GULLAR, 2013). A atitude crítica de Duchamp ainda repercute, tantos anos depois de suas criações.

Gerald Thomas Gerald Thomas é um diretor e ator de teatro brasileiro. Ao longo de sua carreira, longamente vivida no exterior, ficou conhecido pela mídia por suas polêmicas, como mostrar as nádegas no espetáculo Tristão e Isolda em 2003, e pelas suas releituras, apropriações e recriações no cenário artístico. Thomas, conforme consta em seu blog, acredita que “destruiu tudo que se há para destruir no século XX, e colocou sob lentes microscópicas muito precisas

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todos os cacos de mosaico”. Thomas também contestava todo o cenário artístico-teatral, sendo por vezes, devido a isso, ostracizado dentro deste meio. Silvia Fernandes escreve que “as ideias dele [Gerald Thomas] provêm, às vezes, de desenhos, os quais se transformam em cena” (FERNANDES, 1996, p. 101). A partir dessa ótica podemos voltar a definir a cenografia de Thomas como algo vivo, incorporado à interpretação de cada um dos atores, tal como um personagem. Thomas, portanto, apropria-se, cita e cria parataxes artísticas, definidas por Teixeira Coelho (2011, p. 120) como “um processo que consiste em dispor, lado a lado, blocos de significação sem que fique explícita a relação que os une”; uma aglutinação de experiências artísticas que compõe o espetáculo. Isso concorda com a ideia apresentada de “filtro” criado no modernismo, porém adaptado – por meio dessa parataxe – para o pós-modernismo por vários outros artistas. Conforme Silvia Fernandes descreve:

Os espectadores foram convidados a mergulhar no meio de dezenas de citações de filósofos, artistas plásticos, escritores, cineastas, músicos, todos democraticamente fervidos no caldeirão de referências do diretor. Marcel Duchamp, Samuel Beckett, Tadeusz Kantor, os dois Richards – Wagner e Foreman – Dante Alighieri, Christo e Cristo, Francis Bacon, James Joyce, Proust, Shakespeare e Haroldo de Campos passaram a ser “incestuados” na ópera seca de Gerald Thomas (FERNANDES; GUINSBURG, 1996, p. 13).

A carreira teatral de Thomas é extensa, pontuada por opiniões críticas da mídia e de si mesmo. Produtor de diversos estilos, incluindo musicais e óperas, ele fez parceria com atores consagrados pela mídia, como Ney Latorraca. O resgate artístico e a “destruição” do conceito de arte como algo estático são propostas do diretor que estão presentes em todas as suas peças. Gerald Thomas teve crises profissionais, como em 2009, quando declarou que abandonaria suas atividades teatrais, com uma “carta de abandono ao teatro”. Porém, continua em atividade – ainda em abril de 2014 apresentou sua nova peça, Entredentes, em que estão presentes várias de suas releituras, além da constante música de características minimalistas, que é também marca registrada do diretor.

Interação de Thomas com Duchamp Ao observar as propostas de Thomas dentro do teatro, especialmente no que concerne à cenografia, podemos perceber direta similaridade com o artista francês Marcel

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Duchamp; ambos possuem uma proposta artisticamente contundente, destrutiva, que busca a liberação dos paradigmas. A escolha de Duchamp por Thomas é compreensível. Este nutre admiração ímpar por aquele, conforme denota em notas de seu blog pessoal, uma espécie de diário. Ele também define Duchamp como “um semideus mefistofáusicos”, em alusão à obra Fausto (FERNANDES; GUINSBURG, 1996, p. 101), em que estão presentes tanto a Roda de Bicicleta quanto outros elementos de Marcel Duchamp. Não por acaso, Gerald Thomas cita e apropria-se das obras de Marcel Duchamp em vários dos seus espetáculos, mas existe pouco material referencial que se possa utilizar para pesquisa. Apesar disso, o autor, quando questionado diretamente por e-mail, afirma que se apropriou da Roda nos espetáculos Navio Fantasma (1986), Carmem Com Filtro 2 (1986), Um Processo (1988), Dr. Fausto (1995), M. O. R. T. E (1989), e “em outros também”, que declara de maneira tácita não se recordar completamente. O grande motivo para tal apropriação está na interpretação do espectador. Ao se utilizar de Duchamp, Thomas quebra o mito que cerca os personagens usados em suas releituras e adaptações. Especificamente quanto à Carmem Com Filtro 2 (1986), obra que analisarei abaixo, Thomas assume a cenografia original, mas muda completamente o sentido; expande seus limites geográficos. A mistura com o imperativo artístico de Duchamp faz de Carmem, a personagem central desta peça – anteriormente prostituta, parecendo forte em suas escalas de fraqueza – uma miserável, um reles ser humano, já que está sendo relacionada justamente com a desconstrução do artístico, o industrial, feito em massa, comum, o que Duchamp tanto criticava. Será explicitado como e quando Thomas retira e desmitologiza Carmem, abaixo.

Carmem Com Filtro 2 Thomas foi mais um dos encenadores que, na década de 1980, produziu releituras da Carmem de Merimée, consequência do brilhante espetáculo A Tragédia de Carmen (1981), dirigido por Peter Brook. Sobre isso, Edélcio Mostaço pontuou à época:

Buscando o fluxo de sentidos que alimenta o banco da memória, a realização pretende construir uma metáfora incessante sobre Carmem. Usa do minimalismo o método (se assim podemos referir as pausas exasperantes, a desrealização espaço-temporal, os gestos diminutos, as repetições obsessivas) e da síntese melodrama/expressionismo a configuração externa (se assim podemos dizer dos desempenhos dos atores, das ressonâncias cenográficas, dos contrapontos narrativos criados entre os protagonistas). (1986, p. 59) SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Outro ponto reforçado pelo diretor é o resgate dos elementos pós-modernos, que se tornam o “filtro” que o título da obra acusa:

Materializa para nós, brasileiros, quinze anos de pesquisas teatrais que, por variados motivos que vão da censura ao provincianismo, deixamos de acompanhar em relação ao resto do mundo. Daí, talvez, sua chocante novidade, mas agradável convite, para o público repensar seus padrões teatrais, agora com os filtros trazidos pela pósmodernidade (MOSTAÇO, 1986, p. 59).

A obra é feita em um estilo de fragmentação, um conceito do teatro aplicado à idade pós-moderna, que Desgranges descreve como:

[...] a arte teatral na contemporaneidade não é uma síntese aberta à conclusão, mas fragmentos que propõem uma atitude analítica ao espectador, não busca construir um consenso acerca da leitura do mundo, mas sim que o espectador contemple e analise a obra a partir de seu ponto de vista. A arte recente apresenta-se de forma desconexa, em justaposições de elementos que não se harmonizam, contraria a noção de organicidade do modernismo, em que as partes formavam um todo e esta disjunção das partes e a multiplicidade de estilos, propõe uma atitude criativa ao interlocutor. (2006, p. 61)

Essa síntese de desconstrução da personagem Carmem é apresentada por Thomas durante todo o espetáculo. Bornheim (1996, p. 228-229), nesta mesma linha, aponta que “o processo de fragmentação talvez seja o pressuposto básico de todas as criações de Gerald Thomas [...]. Com isso, de certa maneira, o leitor compõe o livro.” O mito-mulher Carmem é desconstruído por meio da apropriação do ready-made, uma vez que este estilo, conforme apresentado, denotava uma falta de essência na arte; uma arte industrial, sem alma. A personagem protagonizada por Bete Coelho gira a Roda de Bicicleta diversas vezes, tal como fizera Duchamp em seu estúdio. É perceptível que esse seja um gesto de escárnio, tal como, segundo Bornheim (1986), “seu tempo passou, Carmem, seu tempo passou, mito”. Percebe-se também uma crucificação de Carmem, o que resulta na ideia de morte do personagem, para então ressuscitá-lo no terceiro dia; tudo isso é uma alusão à ideia de Duchamp de que o que deve ser captado é a mente, não apenas os olhos; com uma intersubjetividade clara, existe então a apropriação mencionada, dando à sua obra parte do que Duchamp quis passar. Outra obra de Duchamp que é representada no espetáculo Carmem de Thomas é Étant Donnés, a última criação do francês. Ao passar uma mulher nua, com a genitália

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exposta para a plateia, Thomas novamente resgata Duchamp, e mostra que Carmem já foi destruída. O espetáculo é transparente; consegue realmente dizer tudo que pretende e transmiti-lo ao público. Mas há uma condição: é que o público logre desvencilhar-se do coloquialismo naturalista que caracteriza quase a totalidade da literatura burguesa. E é aqui que as coisas se adensam. Recusada a temática da prosa vulgar, prejudica-se também os possíveis locutores dessa prosa. Impõe-se até mesmo a pergunta: qual é a personagem central do espetáculo? Carmem ou o Filtro? Carmem é com toda a evidência apenas um pretexto, acoimado, de resto, por um processo sistemático de esvaziamento – tudo, aliás, é esvaziado. (BORNHEIM, 1989, p. 229-230).

Isto se mostra de aguda complexidade para o ator: “O processo de desconstrução principia com a desestruturação dos esquemas corporais rotineiros e a desestabilização dos códigos de interpretação já introjetados” (FERNANDES, 1996, p. 98).

A apropriação dentro de Carmem com Filtro 2 O espetáculo Carmem com Filtro 2 começa de maneira a já centralizar a Roda de Bicicleta. Carmem entra no palco, gira a roda e desfigura sua expressão. A Roda de Bicicleta é um objeto da cenografia que entra e sai de cena e interage com Carmem de modo a dar a entender que é parte da personagem, parte de seu desespero e opressão. A atriz jaz petrificada no chão, depois de girar a roda com muito vigor. E então é possível compreender o uso da Roda de Bicicleta como uma busca por uma nova vida, uma Carmem diferente; busca que esbarra no empecilho proposto por Duchamp: a Roda não tem vida, não tem alma. O desespero da personagem vem do fracasso da busca de uma nova essência no objeto proposto; e, com o desencontro, entende-se que ela não tem mais essência, perdeu a que já possuía e não conseguiu um novo sentido ao encontrar Duchamp. Assim vem a quebra do mito, a não existência de Carmem enquanto Carmem. Duchamp aparece como um filtro – ganhando evidência à medida em que a peça avança – que depõe contra a existência desta Carmem. Um objeto de decoração, conforme descrito pelo seu criador, que lhe causava relaxamento, assim mencionado, ao invés de toda a intensidade da personagem. A análise de Fernandes é bastante completa: “A cena provoca atritos na figura de Carmem, pois a iluminação, o cenário, os objetos de cena, e as demais personagens auxiliam sua contrafação.” (FERNANDES, 1996, p. 122). Todos os elementos da encenação auxiliam na composição do discurso ao redor da atriz/personagem. A contrafação de Carmem é auxiliada pelo enxerto de situações visuais, musicais ou verbais que nem sempre têm a ver

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com sua trajetória. É como se atores e objetos fossem elementos constritores que figurassem um ou mais contrapontos à imagem da mulher (Fotografia 1).

A Roda de Bicicleta de Marcel Duchamp, a capa do toureiro, a imagem santificada de Micaela que se mostra em breves aparições no nicho do cenário, os cortejos de personagens inválidas em cadeiras de roda, o punhal de José, os comentários sarcásticos da dupla beckettiana, que desta vez aparece com nomes emprestados às personagens da ópera (Morales e Zuniga), a música sincopada de Philip Glass, as mulheres de luto que brigam com ela ou os homens encarregados de desfigurá-la com apalpações, agredi-la com safanões milimetricamente arranjados, conduzi-la em procissão pelos cantos do palco como santa crucificada (FERNANDES, 1996, p. 128).

Fotografia 1 – Cena final da peça Carmem com Filtro 2. Foto: Ary Brandy. Fonte: internet

Tudo cria um invólucro no qual a personagem é limitada pela gestualidade imposta pelo encenador. “[...] Carmem é oprimida por um cenário, acuada por personagens, crucificada por objetos, perseguida por uma iluminação que investiga sua postura, perscruta seu gesto ou apaga seu corpo para pôr em evidência um rosto deformado.” (FERNANDES, 1996). A autora continua:

[...] não há lugar para as Carmens num espetáculo que ritualiza a perda do referente simbólico universal. Há lugar para a Roda de Bicicleta, um signo de orientação (ou desorientação) colocado no centro do palco. Uma mulher cobre a roda com um véu negro. Jose II/Escamillo retira o véu da roda e transfere para Carmem. Como se SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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passasse por um ritual de des-investimento simbólico, ela recebe de volta sua matriz caracterizante, desta vez associada à Roda de Bicicleta – “um niilismo que gira sobre si mesmo e se refuta” – e volta a abrir os braços, reassumindo a postura crucificada (FERNANDES, 1996, p. 137-138).

A apropriação também advém de um exercício de repetição, dado que a Roda possui interação constante com a peça, que é girada, mas não leva a nenhum lugar. Entretanto, Duchamp é apropriado de diversas outras maneiras, assim como a dissolução do personagem Carmem é, também, feita de outras formas.

Conclusão Entende-se a partir do exposto que Thomas obtém êxito no objetivo de atrelar Duchamp com a sua desconstrução de personagem, especialmente de Carmem. Isso se dá porque ocorre uma parataxe. A parataxe contradiz a ideia de silogismo, o simplismo lógico; ela é densa, voltada ao público que conhece a Arte, sendo meramente exposta como uma cadeia que “parece” ter relação, mas não necessariamente fazer sentido. Frisa-se que “[...] a parataxe não é uma invenção do pós-modernismo, claro. [...]. Mas parece existir grande uso do processo na atualidade” (COELHO, 2011, p. 120). Compreender a parataxe criada por Thomas em seus espetáculos não é uma tarefa fácil para o espectador comum, porque ele usa novos signos justapostos com os velhos. A Roda de Bicicleta carrega o símbolo da roda original, comum, mas a obra em si é carregada de referências de um artista emblemático que muda o cenário da arte mundial, e o próprio Thomas a classifica como um ready-made relido. Muitas vezes pode ocorrer por parte do público o reconhecimento de um único símbolo em relação à roda, ou ainda, o público pode entender que o banco é uma espécie de pedestal, ou que esse objeto está deslocado do seu contexto, ou enfim, toda a subjetividade artística, o que pode ocasionar um olhar simplista diante do espetáculo. Gerald Thomas usa outros elementos de fragmentação e destruição, que, por vezes, gera frustração ao espectador desprovido da estética de cada obra. Com isso, parece que ele elitiza o teatro, concebido para um público erudito. Ou para os que adoram sua construção plástica. Mais uma vez, nos defrontamos com as ideias de Duchamp. Na entrevista com Cabanne, ele afirmou que o que o fascinava nos espetáculos teatrais era “a loucura do inesperado” (TONKINS, 2004, p. 109).

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Conforme biografia de Duchamp escrita por Tonkins: “E que a ideia que faço de arte é a que tanto ela pode ser ruim, como boa, como indiferente, mas de qualquer modo continua sendo arte, da mesma maneira que uma emoção pode ser ruim, não deixa de ser uma emoção” (TONKINS, 2004, p. 518). Thomas se apropria da Roda e faz uso dela como mecanismo de condução de Carmem e ainda usa as ideais de Marcel Duchamp fundamentando a construção de seu espetáculo. Ambos tornam o material, o industrial, em um objeto de Arte; ambos recriam e reinventam o conceito do artístico, permitindo explorar o que há de mais humano na nossa civilização; mais do que isso, permitindo ao interlocutor que veja cada uma das suas pedestalizações depostas. Tanto para Thomas quanto para Duchamp, o que importa é o ato criativo, ficando para o público a tarefa árdua de compreender e definir o sentido estético. Para eles, os graus dos conhecimentos do espectador são indiferentes.

Referências: ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna: Do Iluminismo aos movimentos contemporâneos. Porto Alegre: Companhia das Letras, 1992. BARBOSA, Ana Amália. Releitura, citação, apropriação ou o quê? In: BARBOSA, Ana Mae. Arte/Educação contemporânea: consonâncias internacionais. São Paulo: Cortez, 2005. BRANDY, Ary. Cena final da peça Carmem com Filtro 2. Disponível em <http://geraldthomas.net/drawings_paintings.html>. Acesso em: 27 jul. 2014. CABANNE, Pierre. Marcel Duchamp: Engenheiro do Tempo Perdido. Tradução: Paulo José Amaral. São Paulo: Perspectiva, 1987. COELHO, Teixeira. Moderno Pós Moderno. 5. ed. São Paulo: Iluminuras, 2011. BORNHEIM, “Thomas Muda o Sentido do Teatro Clássico e Faz o Avesso de Carmem”, Folha de São Paulo, 24.2.1989. DESGRANGES, Flávio. A pedagogia do teatro: provocação e dialogismo. São Paulo: Hucitec: Mandacaru, 2006. FERNANDES, Silvia. Memória & Invenção: Gerald Thomas em Cena. São Paulo: Perspectiva, 1996.

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FERNANDES, Silvia; GUINSBURG, Jacó (orgs.). Um Encenador de Si Mesmo: Gerald Thomas. São Paulo: Perspectiva, 1996. GULLAR, Ferreira. Será Arte? Folha de São Paulo. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ferreiragullar/1228152-sera-arte.shtml>. Acesso em 27 out. 2014. MOSTAÇO, Edélcio. “Carmem”, a ousadia volta aos palcos após 15 anos. Folha de São Paulo Ilustrada. São Paulo, p. 59. 19 jun. 1986. PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. 3. ed. Tradução: Jacó Guinsburg e Maria Lúcia Pereira. São Paulo: Perspectiva, 2011. PILLAR, Analice Dutra. Leitura e releitura. In: PILLAR, Analice Dutra. A educação do olhar no ensino das artes. 3. ed. Porto Alegre: Mediação, 2003. STAFFORD, Andrew. Making Sense of Duchamp. Página em inglês. Disponível em: <http://www.understandingduchamp.com/>. Acesso em: 29 jul. 2014 THOMAS, Gerald. Biografia completa de Gerald Thomas. Disponível em: <http://geraldthomasblog.wordpress.com/perfil-completo/>. Acesso em: 29 jul. 2014. THOMAS, Gerald. Peças que utilizei a Roda. [mensagem pessoal] Mensagem recebida por: <gmaamaral@terra.com.br>. em 12 jul. 2014. TONKINS, Calvin. Duchamp: Uma Biografia. Tradução: Teresa de Rezende. São Paulo: Cosac Naify, 2004.

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8. CENOGRAFIA PARA O PÚBLICO INFANTIL Maricélia Romero21 Resumo Este artigo é sobre a cenografia para as crianças. Nele, destaco os seguintes tópicos: a importância de uma cenografia concebida de forma que respeite os pontos de vista da história encenada, do fluxo dos atores em cena e do público. Levando em conta que esses tópicos devem ser pensados juntamente com as questões relativas ao espaço onde se desenvolverá a cena, busquei saber como foi a percepção da mudança do espaço durante o desenrolar da peça, sabendo ser este, um ambiente frequentado diariamente pelo público e, finalmente, listei essas percepções, utilizando o método de pesquisa exploratória em informações obtidas por meio de entrevista com dois professores e um aluno. Todos os entrevistados conhecem bem o ambiente escolar pesquisado e assistiram a transformação do mesmo durante apresentação da peça que norteou esta pesquisa. Palavras-chave: cenário, teatro, infantil, escola. Introdução Existem algumas características nos cenários criados para o teatro infantil que podemos dizer, são comuns no imaginário do público. Tanto que quando falamos em teatro infantil, em geral, nos vêm à mente elementos/adereços cênicos com dimensões superiores às realistas, cores intensas e diversidade de texturas, quase provocando um êxtase visual. Pensando no espaço escolar, foco principal desse artigo, o cenário tem um papel ainda mais importante nessa viagem ao mundo da imaginação, uma vez que ele, na maioria das vezes, visa trazer um clima diferente e despertar a curiosidade num ambiente que é de total conhecimento da criança, pois faz parte de seu cotidiano. Levando em conta que a criança recebe informações visuais de todos os lados, quer de formas virtuais, quer concretas, e no intuito de caminhar na contramão dessa vivência diária imposta à criança pelos diversos caminhos por onde esta passa, o teatro alvo desta pesquisa propõe a construção cenográfica minuciosa e, visando a coerência, ter como ponto de partida uma pesquisa em conjunto entre diretor, cenógrafo, figurinista, iluminador e atores para que o resultado final seja harmonioso. Sobre esse pensamento, Osvaldo Gabrieli, diretor do Grupo teatral XPTO, sugere:

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Maricélia Romero é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica do Paraná (2014). É Bacharel em Artes Cênicas com habilitação em Direção pela Faculdade de Artes do Paraná (1999). É diretora de Produção pelo SATED PR (1999). É diretora de teatro para crianças na Cia. de Teatro Luz e Vida desde 2001. É coordenadora de mídias (vídeo e rádio para línguas portuguesa e espanhola – área de atuação: América Latina e Caribe, pela RBC Brasil). Escritora e autora de livros e roteiros para peças infantis. O presente artigo foi orientado pela profa. Dra. Laíze Márcia Porto Alegre, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Revisão: Patricia Kiefer. E-mail: mariromero11@gmail.com SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Algumas perguntas deverão ser formuladas junto à direção do espetáculo. Os elementos estarão fixos ou serão estruturas móveis capazes de desenhar ambientes diferentes? Partiremos de uma proposta realista, figurativa de cenário, ou utilizaremos elementos simbólicos apenas sugerindo espaços e deixando a imaginação do público "navegar"? Utilizaremos um figurino básico formal ou elementos estilizados, exagerados, que ampliem os recursos do ator? (2003, p. 78)

Não é fácil responder coerentemente a essas questões no momento inicial de criação, porém, ao pensarmos na obra final montada no espaço cênico, vemos a necessidade da pesquisa cuidadosa de cada detalhe. No material a ser utilizado, por exemplo, que leva em conta o peso, textura, maleabilidade ou rigidez; nos adereços com as cores (do pigmento), dimensões, etc, que harmonizam com as cores, quantidade e intensidade da luz, etc. Essa coerência, juntamente com uma boa pesquisa sobre a obra para a qual o cenário será criado, propiciará a construção de uma cenografia favorável à apresentação de uma mensagem dentro de uma estética que estimule a imaginação criadora, desprezando assim qualquer adereço que tenha como motivação ser meramente decorativo. A cenografia então, será criada de modo que cada elemento da composição tenha uma função bem definida. Nada pode estar em cena simplesmente por ser bonito para os padrões da época ou para simplesmente alegrar o olhar infantil. Antes, este caminho será naturalmente construído ao haver a coerência harmônica entre todos os elementos do espetáculo. Assim, a obra apresentada será mais do que um simples entretenimento. Ela poderá despertar na criança sua potencialidade de criação e imaginação, já que uma inexiste sem a outra. O conjunto harmonioso da obra trará ambiente favorável ao desenvolvimento do senso crítico e da apreciação da arte. A o prazer em apreciar a arte será uma consequência natural desse conjunto. Vejamos a seguir o que diz Lourival Andrade Júnior; Atualmente “alguns” tentam nos convencer de que a globalização é a única saída e de que as distorções sociais serão aplacadas pela onda neoliberal. Muitos acreditam nisso. E os nossos olhos se deparam a cada dia com mais miseráveis, violência, desrespeito ao meio ambiente, escândalos políticos de toda ordem, desemprego e “maquinização” do homem. Fazermos um teatro engajado não significa um teatro panfletário, mas responsável. A “arte pela arte” é muito bela para os parnasianos. O mundo precisa de crianças eticamente preparadas para mudar o que deve ser mudado e criar alternativas menos autoritárias para os que virão. O teatro também é responsável por isso. É claro que existem os alienados e não são poucos. A estes só resta a mera passagem pela vida sem deixar nada de construtivo, pois apenas “papagaiaram”, nada mais. Volto a insistir que a discussão sobre o social e o respeito ao diferente devem estar presentes em nossas práticas teatrais. E as crianças de hoje nos agradecerão num futuro não muito distante. (2003, p. 56-57)

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O cenário para o teatro no ambiente escolar Partindo dos pontos citados, podemos entender que a composição de um cenário pode influenciar o público infantil em sua compreensão da obra. É possível que a criança não tenha as explicações sobre sua percepção quanto à harmonia ou não dos componentes de um cenário numa peça teatral, mas é muito provável que ela, a seu modo, exteriorize sua opinião na forma de “gostar ou não gostar” do que viu. Será que o cenário tem um papel importante na transposição da criança do mundo real para um mundo imaginário e de sonhos, mesmo num ambiente que faz parte do dia a dia escolar da criança? Esse artigo objetiva discutir o impacto que o cenário harmonioso, bem pensado e construído a partir do estudo interdisciplinar das áreas envolvidas para a viabilização da apresentação da obra, gera no público infantil. Os objetivos específicos são: sondar qual o interesse do público infantil no cenário de uma apresentação teatral; perceber o impacto do cenário no público infantil dentro do ambiente escolar que lhe é familiar; discutir a relevância do trabalho em conjunto entre cenógrafo, figurinista, diretor, iluminador e ator para a coerência na construção da obra. A respeito desta colocação, é possível verificar a importância da participação interdisciplinar na concepção e construção do cenário. A companhia de teatro que encena a peça alvo da pesquisa leva essa responsabilidade às últimas consequências, sendo que os próprios atores interferem e participam durante todo o processo (ver fotos A, B C e D). Sendo assim, todas as movimentações, marcas e manejos em cena, são feitos com a destreza de quem conhece profundamente cada elemento da cenografia e suas funções dentro da obra. Sobre isso, o consagrado cenógrafo brasileiro José Dias comenta: “Não podemos separar cenários, figurinos, adereços ou até mesmo a marcação de cena, isto é, a marcação dos atores, porque também estabelecem fluxos, massas, volumes, num determinado espaço.” (2004, p. 57).

Fonte: Mari Romero

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Quando falamos aqui em teatro na escola, não nos referimos à chamada “peça didática” das teorias brechtianas apresentadas no livro Brecht: um jogo de aprendizagem, bem como das peças ditas didáticas dos Jesuítas. A proposta, explicitada por Brecht, para educar os jovens através do jogo teatral, é merecedora de desdobramentos através de experimentações e pesquisas futuras, dado ao amplo universo de questões que suscita. Constitui característica do modelo brechtiano a exigência de reavaliação constante, buscando a abordagem metodológica aqui delineada definir a função a ser exercida pelo jogo no processo de aprendizagem com a peça didática. (KOUDELA, 1991, p. xxv)

Não há dúvidas sobre a importância de ambas as contribuições para o teatro como um todo e ainda mais dentro da história do teatro no Brasil, que teve o teatro jesuítico como o marco inicial. Em toda parte, nas escolas latinas secundárias, nos colégios da Societa Jesu, a arte da retórica, a disputatio na eloqüência era posta à prova no palco. O drama escolar protestante, em sua maneira modesta, havia ajudado os defensores da Reforma afiar o fio de sua navalha verbal. Agora o teatro jesuíta, por outro lado, procurava deliberadamente efeitos cênicos e endossava as artes que falava aos olhos e ouvidos, à mente e aos sentidos. A palavra simples do púlpito foi superada pela representação viva no palco (BERTHOLD, 2001, p. 338-341).

Porém, não abordaremos aqui os conteúdos das peças e sim a forma. Tanto as peças do teatro brechtiano quanto as do teatro jesuítico são conhecidas como didáticas, pois tinham conteúdos que visavam transmitir valores. Não significa que a peça que serviu de objeto para nossa pesquisa não tenha em si um trabalho similar no tocante à apresentação e/ou valorização de conteúdos a serem assimilados pelo público; porém deixemos desde o início claro que este não é o foco de nosso estudo. Seguimos, portanto com o esclarecimento de que este artigo analisa não o conteúdo, mas sim a forma que transforma o espaço e a percepção destes no público. Mais precisamente de professores e de crianças entre 4 e 10 anos, público da peça O Pequeno Grande Amigo22, usada como elemento central da pesquisa sobre a percepção descrita anteriormente.

A criança de hoje A criança, na atualidade, tem interferências de todos os lados que influenciam em sua formação social, intelectual, cognitiva, emocional e até, espiritual. Dentre outros meios, boa 22

Peça de autoria e direção de Mari Romero, para a Cia de Teatro Luz e Vida, sediada em Curitiba desde 2001, com montagens feitas, sempre, em espaços alternativos. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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parte dessa influência vem por intermédio de diferentes mídias o que tem adiantado e encurtado a infância. Maria Helena Kühner diz que (...) é hoje comum ouvirmos uma frase – constatação ou reclamação – a respeito das crianças: que são mais espertas, mais ativas, mais inquietas e atentas ao que se passa em torno. Serão elas realmente mais amadurecidas, ou mais precocemente amadurecidas, que as de outras épocas? Ou isso é apenas impressão de alguns, frutos de uma distância no tempo que altera as próprias lembranças e vai nublando a visão, fazendo estranhar os objetos percebidos? Ou até de um sentirem-se deslocados em um mundo cujos valores, aspirações e necessidades são cada vez mais diversos dos seus? Qualquer que seja a resposta (...) é evidente ter havido uma alteração nos comportamentos e atitudes da criança que, obviamente, não poderia ficar ilhada ou alheia às profundas transformações que os tempos estão trazendo (...) (2003, p. 17)

Sem dúvida, as crianças de hoje vêm sendo superestimuladas cada vez com menos idade por meios de comunicação diversos e nem sempre estão obtendo mais conhecimento ou desenvolvendo sua imaginação ou, até mesmo, o pensar e o poder reflexivo. O que é mais comum na atualidade é o despejo assoberbado de informações muitas vezes irresponsável, tanto por quem a disponibiliza, quanto pelos pais que deveriam ser o filtro de controle dessas informações no tocante à adequação para cada fase de maturidade intelectual e emocional. As mídias como um todo, têm tomado um lugar importante na vida dessa criança e, segundo Kühner, “as crianças estão usando esses meios como uma das fontes de onde extraem material para organizar e interpretar suas experiências”. Com tanta concorrência, como alcançar o público infantil por meio dessa mídia tão interpessoal que é o teatro, transportando-o por um momento a um mundo onde sua imaginação possa voar livremente? E qual o papel do cenário para o teatro infantil no ambiente escolar em meio a esse contexto?

O cenário em movimento “Na infância, mais do que em outra idade, tudo está em transformação.” (BETTELHEIM, 2002, p. 39). No livro A psicanálise dos contos de fadas, Bruno Bettelheim comenta sobre a relação da criança com os objetos, dizendo que para a criança, os objetos são dotados de vontade e agem a exemplo das pessoas. Neste sentido, ela entra facilmente no jogo da cena proposta na cenografia da peça pesquisada neste artigo, quando o sol “aparece sorridente” ao lado da árvore que compõe a floresta “criada” a partir de uma dança feita pela

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personagem que manipula um “pincel e tinta mágicos” (um tecido é o adereço cenográfico usado como tinta). (cena das fotos 3 e 4).

Fonte: Mari Romero

Fonte: Mari Romero

Ao construir a história lentamente a partir do espaço cênico desprovido de qualquer adereço, a cenografia da peça é composta como se as personagens (atores) conduzissem as crianças do público por um caminho, juntos na construção desse espaço, onde tudo é possível, conforme vemos na citação do artigo A importância dos contos de fadas no desenvolvimento da imaginação, de Juliana B. da Ressurreição: “(...) neste espaço, onde dominam as leis do sobrenatural e do imaginário, não existem distâncias e os personagens podem deslocar-se com grande facilidade...” (2014, p. 28) Esse movimento não é apenas dos atores que movem os adereços montando o cenário no fluxo da evolução da história encenada, mas também o movimento da imaginação do público, que embarca na transformação do espaço, abstraindo o fato de estarem no mesmo pátio de todos os dias. Pode-se traçar um paralelo com o ato da leitura, que ao movimento do virar das páginas o leitor vê, em sua imaginação, a história sendo construída. Esta construção só pode ser satisfatória quando há coerência, harmonia e habilidade na execução dos signos teatrais. Estes devem ser muito bem pensados, estudados e aplicados desde a concepção do espetáculo, culminando assim, nessa viagem da imaginação criadora desejada na montagem da peça.

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Os signos teatrais Segundo Tadeus Kowzan (2003), no livro Semiologia do teatro, encontramos treze sistemas de signos. A seguir, uma breve síntese dos mesmos. O primeiro signo trata da palavra pronunciada pelos atores durante a representação. Em seguida o tom, pois segundo ele, a palavra não é somente um signo linguístico e o modo como é pronunciada dá-lhe um valor semiológico suplementar. A mímica facial refere-se à expressão corporal do ator, aos signos espaços-corporais criados para as técnicas do corpo humano, signos que podem ser chamados de cinésicos, cinestésicos, ou cinéticos. Ele inicia pela mímica facial, porque, segundo o autor, ela é o sistema de signos cinésicos mais aproximados da expressão verbal. Como quarto signo, ele apresenta o gesto que constitui, depois da palavra (e sua forma escrita) o meio mais rico e maleável de exprimir os pensamentos, isto é, o sistema de signos mais desenvolvido. O movimento cênico do ator é o terceiro sistema de signos cinestésicos e compreende o deslocamento do ator e suas posições no espaço cênico. A maquiagem teatral está destinada a valorizar o rosto do ator que aparece em cena em certas condições de luz. Já o penteado, do ponto de vista semiológico, tem um papel que demonstra ser, em certos casos, decisivo, é por isso que o autor decidiu considerá-lo como um sistema autônomo de signos. O vestuário, mesmo na vida real, é portador de signos artificiais de uma grande variedade. No teatro é o meio mais exteriorizado, mais convencional de definir o indivíduo humano. Os acessórios constituem, por vários motivos, um sistema autônimo de signos. Na classificação do autor, situam-se melhor entre o vestuário e o cenário porque numerosos casos limítrofes aproximam-nos de um ou outro. Todo elemento do vestuário pode se tornar em acessório, desde que tenha um papel particular. O cenário, o décimo signo, está sendo mencionado mais a frente, por ser o foco dessa pesquisa. Com relação à iluminação, o autor diz que ela deve ser explorada, principalmente, para valorizar outros meios de expressão, mas ela também pode ter um papel semiológico autônomo. No que concerne à música aplicada ao espetáculo, sua função semiológica é quase sempre inquestionável. Os problemas específicos e muito difíceis colocam-se no caso em que ela é o ponto de partida de um espetáculo (ópera, balé). No caso em que ela é acrescentada ao espetáculo, seu papel é o de sublinhar, de ampliar, de desenvolver, às vezes de desmentir os signos dos outros sistemas, ou de substituílos. O campo semiológico do ruído é tão vasto, e talvez mais vasto ainda, quanto o universo dos ruídos.

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Como signo, o cenário exerce uma função que vai muito além da decoração. Pensando semiologicamente, o cenário pode ser denominado, também, como dispositivo cênico, segundo Kowzan: A tarefa primordial do cenário, sistema de signo que se pode também denominar de dispositivo cênico, decoração ou cenografia, é a de representar o lugar: lugar geográfico (paisagem de pagodes, mar, montanha), lugar social (praça pública, laboratório, cozinha, bar), ou os dois ao mesmo tempo (rua denominada por arranhacéus, sala com vista para a Torre Eiffel). O cenário ou um de seus elementos podem também significar o tempo: época histórica (tempo grego), estações do ano (tetos cobertos de neve), certa hora do dia (o sol se escondendo, lua). Ao lado de sua função semiológica de determinar a ação no espaço e no tempo, o cenário pode conter signos que se relacionem com as mais variadas circunstâncias. Limitar-nosemos a constatar que o campo semiológico do cenário teatral é quase tão vasto quanto o de todas as artes plásticas. (...) Há cenários ricos em detalhes e cenários que se limitam a alguns elementos essenciais, até mesmo a um único elemento. (...) O valor semiológico do cenário não se esgota nos signos implicados em seus elementos. O movimento dos cenários, a maneira de colocá-los ou de mudá-los pode trazer valores complementares ou autônomos. (...) (KOWSAN, 2003, p. 111 e 112).

Vê-se que o cenário é parte importante para situar o espectador no ambiente em que a história é dramatizada, bem como, no tempo em que ela ocorre. No caso de um público infantil, onde muitas vezes a criança ainda não tem a percepção real da metáfora, o cenário pode então tornar-se o facilitador para que tal ocorra durante a peça. Infelizmente, quando se trata de peças infantis, muitos problemas interferem na real valorização que se deve à criação cenográfica para este público. Nesse sentido, Gabrieli aponta, carência de recursos materiais, de espaços adequados, muitas vezes sobrevivendo em suas temporadas, das sobras do espaço e iluminação do espetáculo adulto com quem divide a sala. Acredito, porém, ser ainda mais marcante o fato de muitas vezes existir um despreparo por parte de cenógrafos, figurinistas, diretores e produtores, sobre o que significa fazer teatro infantil, fazer teatro com projeto cenográfico adequado para criar teatro infantil, um cenário para ser visto e apreciado por crianças (GRABRIELI, 2003, p. 77).

Essa falta de experiência pode gerar outros problemas ao pequeno espectador. Para Gabrieli a cenografia, em alguns casos, acaba sendo apenas preencher um palco com múltiplos elementos: “Tenho observado em vários espetáculos a farta utilização de elementos justapostos (tecidos, elementos planos pintados, objetos) que estão em cena com o intuito de “decorar” a neutralidade da caixa preta” (2003, p. 77). No entanto, é importante salientar que o cenário para ser o portal que se propõe a levar a criança para além de sua imaginação, conduzindo-a a um mundo novo e cheio de possibilidades que estimulem sua mente e sua criatividade, deve ser minuciosamente SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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concebido. Dessa forma ela conseguirá, durante o desenrolar da história, caminhar imaginariamente para além do espaço cotidiano. Ainda que ali esteja fisicamente, em sua imaginação, ela pode estar onde a história propuser que esteja. Nessa direção, Gabrieli chama o espaço cenográfico de (...) “área do jogo” do ator ou espaço cenográfico lúdico. A cenografia nesse caso existe para colocar o jogo teatral num contexto simbólico que organiza o olhar do espectador. Um cenário que expressa uma “concepção visual”, uma intenção plástica ao articular imagens, cores e formas, para organizar o olhar do espectador, provocar sensações e sensibilizar o olhar da criança, um cenário que sirva também de apoio especial e temporal para o ator se manifestar (2003, p. 77).

A pesquisa Através de abordagem qualitativa, utilizando como instrumento de coleta de dados uma entrevista semi-estruturada com professoras e alunos do Ensino Fundamental 1 de duas escolas, a pesquisa qualitativa se fundamenta na relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, na qual existe uma interdependência entre o sujeito e o objeto, não permitindo que o conhecimento se reduza a um simples conjunto de dados. Na pesquisa qualitativa, a coleta de dados e a análise não se caracterizam por momentos separados, como afirmou Triviños (1987, p. 131), possibilitando que, na interpretação das informações, o pesquisador recorra a outros referenciais para realizar a análise adequadamente. A entrevista semi-estruturada foi escolhida como método de pesquisa porque as pessoas entrevistadas falam sobre o tema proposto com base em suas experiências, “e que no fundo são a verdadeira razão da entrevista. Na medida em que houver um clima de estímulo e aceitação mútua, as informações fluirão de maneira notável e autêntica” (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 34). As questões propostas na entrevista partiram dos objetivos da pesquisa, priorizando conhecer o impacto da cenografia na visão de educadores e alunos. O instrumento utilizado é constituído por questões que buscam informações concernentes à visão do professor e do aluno sobre o assunto em pauta por meio de quatro questões abertas: As cinco perguntas utilizadas como instrumento da pesquisa foram: “No seu entendimento, o que é cenário?”; “Na sua opinião, qual a importância do cenário numa peça teatral infantil?”; “O que você sentiu quando percebeu a transformação e construção do

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cenário durante a peça O Pequeno Grande Amigo apresentado na escola?”; “Na sua opinião, como você viu o pátio da escola transformado por um cenário teatral?”; “Qual o impacto do cenário da peça apresentada na escola, na formação dos alunos?” A pesquisa de campo foi até duas escolas que receberam a peça alvo da pesquisa, entrevistou educadoras e alunos e selecionou as entrevistas apresentadas a seguir. Embora este artigo apresente dados pesquisados em trabalhos teatrais realizados dentro de escolas, esta pesquisa não pretende investigar fórmulas ou técnicas do teatro pedagógico ou didático, mas sim, centrar a atenção nas respostas que possam dar uma melhor visão sobre as percepções das interferências e intervenções da presença do teatro no ambiente escolar. Os entrevistados responderam as questões com base na apresentação da peça O Pequeno Grande Amigo que foi apresentada na escola, ao mesmo tempo em que, por ser uma entrevista semi-estruturada, comentavam as situações e pediam orientações quando não entendiam por completo, a consigna apresentada. A escolha das duas escolas foi norteada pela proximidade cronológica em relação às apresentações da mesma peça já citada, tendo em vista não deixar muito tempo se passar entre apresentação e pesquisa. Ambas as escolas estão situadas em Curitiba. Uma no bairro Água Verde e outra na Vila Fanny. As escolas oferecem atendimento em dois períodos, sendo eles, integral e meio período para todas as séries ofertadas na Educação Infantil e no Ensino Fundamental I e II. A seguir, as entrevistas selecionadas, com as duas professoras e o aluno: Questão 1: No seu entendimento o que é cenário? Professora 1 (Doutora em Arte-Educação pela Universidade de Lisboa, Portugal): Cenário é contextualista de linguagem artística. Ele contextualiza a mensagem e exterioriza o que vai ser internalizado da mensagem. Dentro da hierarquia das linguagens artísticas, o cenário está inserido em um apoio – um pano de fundo para favorecer a peça que no caso seria a linguagem principal. Quando o cenário se mostra como o "astro principal", ele perde sua função de ser o coadjuvante por natureza. Professora 2 (Pedagoga, professora de musicalização infantil, compositora e produtora cultural): Cenário é o ambiente em que um conflito se passa. Ele é o lugar, que por si só revelará muito sobre o que se há de esperar, ou não, da peça proposta. Ele revela ou gera mistério, é o pano de fundo da história, a paisagem que dá base para o que se contará.

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Aluno do Ensino Fundamental 1 (8 anos, representa os alunos da faixa etária apropriada para a peça e pesquisa): Uma coisa que você coloca atrás para mostrar o lugar onde você está. [Serve para] Representar o que você está fazendo, tipo, um trânsito de carro, que você está dirigindo numa rua dentro de um carro, ou que você está fazendo comida na panela, na cozinha. Segundo as respostas apresentadas nas entrevistas, o cenário tem como principal significado o ambiente. Perceber-se que todos descrevem o cenário como indicador da paisagem, local, lugar onde o fato histórico está sendo narrado na peça. O aluno, por sua vez, vai um pouco mais além quando se refere ao cenário como sendo, além de sinalizador do ambiente, um sinalizador de ação como um carro – sinalizando a direção do veículo, ou a panela como sinalizador da ação cozinhar. É possível perceber que para a criança o cenário é facilmente confundido com acessórios, que são, para Kowzan, um signo teatral autônomo. No entanto, é possível que um carro seja por si só um cenário, e dependendo da proposta e do roteiro de uma história, a própria panela também pode vir a ser um cenário, mesmo sendo mais comum vê-la como um acessório cênico. Questão 2: Na sua opinião, qual é a importância do cenário numa peça teatral infantil? Professora 1: Extrema importância. Ele consegue transportar a criança através de uma realidade virtual – virtual por não ser real do cotidiano, por ser fantasioso e por isso, capaz de conduzir a criança através da história. É como um tapete mágico que leva a criança para dentro da peça, mesmo sentadinha em seu lugar. Professora 2: Importantíssimo. É muito difícil para um ator conseguir transportar a criança para um mundo de imaginação sem um cenário. Não é impossível, mas ele terá que contar com um esforço maior da criança para entrar nesse mundo surreal. O cenário, por sua vez, ajuda a criança a entrar nesse novo mundo. É como um portal onde a criança sai da sua realidade e vai para outro mundo, como Alice, como os irmãos de Nárnia, como a menina Sara do Cavalo de fogo. Cada um tem seu próprio portal, buraco no chão, guarda-roupa ou o cavalo, o cenário tem a função de transportar a criança para um mundo de imaginação e aventura, dando asas à sua mente, despertando sua criatividade. Aluno: É importante porque a criança fica mais alegre com o teatro, gosta mais, se não tivesse cenário seria chato, porque o cenário dá mais vida. Às vezes quando tem um cenário interessante de um teatro bom eu sinto vontade de ir lá brincar e fazer alguma coisa. Na análise das respostas a essa segunda questão, o cenário aparece como um suporte tanto para o trabalho do ator quanto para o público/criança com relação à compreensão da

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mensagem e ao envolvimento de ambos na história. Ele também aparece como despertamento para a interação não só do público e do ator com a história, mas também, com o dispositivo cênico que ele é (cenário) em potencial. Para o espectador pesquisado, o cenário é primeiro, um convite para entrar na história proposta e em segundo lugar, um forte apelo ao brincar (subir no palco e brincar fisicamente com o cenário). O aluno faz menção ao desejo de transpor a barreira da quarta parede e transformar o cenário em seu lugar, ambiente de sua criação/brincadeira. Questão 3: O que você sentiu quando percebeu a transformação e construção do cenário durante a peça O pequeno grande amigo que foi apresentado na escola? Professora 1: Assisti como uma criança – me senti com a expectativa da criança ao ver a possibilidade de ver algo acontecer. Havia uma expectativa de algo que estava por acontecer e que ninguém sabia o que seria. Tornei-me criança de novo com essa expectativa do "vir a ser" (seria diferente de um cenário já pronto ao chegar). O conceito do in progress atrai pela curiosidade, porém, especificamente nessa peça, a sutileza dessa construção que se dá diante dos olhos do público traz o público para caminhar com a construção juntamente com as cenas a ponto do público se dar conta da transformação depois dela ocorrida. As transformações feitas com naturalidade reforçam a transposição do público para a história. Professora 2: Surpresa. Quando eu vi aqueles biombos, não sei se é esse o nome, eu achei muito pobre. Fiquei atenta para ver se algo novo apareceria, então, de repente, algo aconteceu! Aquilo que era de uma cor, se transformou numa linda árvore, com frutas amarelas e um sol radiante e sorridente! Creio que as crianças sentiram o mesmo que eu. Algo que parecia nada virou tudo! Me senti, literalmente transportada para a floresta das formiguinhas. Foi muito bacana! Aluno: Senti que tudo mudou e que ficou mais legal. Quando estava tudo azul, estava chato porque eu pensei que seria tudo azul e vazio e feio. Depois que eles mudaram o cenário ficou tudo mais interessante e legal. A resposta trazida pelo aluno na terceira pergunta, levanta novamente a questão abordada na fundamentação desse artigo, sobre se existe ou não uma nova criança. Vem à tona em sua fala a necessidade de um estímulo. A criança de hoje está acostumado com tudo pronto e acabado, por isso, há uma frustração inicial. Mas nesse caso, o cenário vai se construindo conforme a cena é construída, e identifica-se nas respostas que essa transformação/construção, derruba essa frustração e gera surpresa. O fato do cenário não estar pronto, gera expectativa em todos os casos pesquisados o que satisfaz positivamente a

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proposta do autor/diretor com relação ao objetivo desejado para esse cenário nessa peça que foi apresentada (O pequeno grande amigo). Não é do interesse do autor/diretor que as crianças se deparem com algo pronto, um cenário perfeito decorando o palco a espera do público. Pelo contrário, o objetivo central da criação desse cenário que as crianças se deparem com a empanada e se perguntem – “O que vai acontecer aqui?” “Será que é isso mesmo?” “Não está faltando alguma coisa?” “Vai ser feio assim o tempo todo?” – para que, no decorrer da construção e do desenrolar da história, elas participem da criação e construção do cenário e se deixem levar por ele para um mundo cheio de criaturinhas que elas vão se apaixonar, brincar e aprender enquanto vivenciam aventuras que retratam sua própria realidade infantil, e as respostas da terceira questão, demonstram que este objetivo foi atingido. Questão 4: Na sua opinião, o que você achou de ver o pátio da escola transformado por um cenário teatral? Professora 1: Levei quase um susto ao ver que o espaço estava transformado, pois mesmo sendo observadora, não percebia que estava sendo modificado a não ser quando já havia sido feito. Professora 2: Muito legal! De repente, o ambiente que era familiar se tornou em outro lugar, outro mundo! Eu estava na floresta do Smilinguido, gente! (risos) Isso é muito bacana, mesmo. Percebi a reação dos alunos enquanto eles faziam o “teletransporte” ambiental. A transformação é sutil e de repente, estamos lá, em outro lugar, quase sem perceber em que momento ocorreu a transformação. Eu gostei muito desse mistério sendo desvendado. Já assisti outras peças onde o cenário já estava todo montado, é legal, também, mas vendo a transformação ocorrendo aos poucos, parece que o cenário é um dos personagens da história. Aluno: Primeiro fiquei sem saber o que ia acontecer “Nossa, a gente vai assistir um teatro! Aposto que vai ser legal!” Meus amigos e eu fomos correndo para pegar o melhor lugar para assistir o teatro. A palavra-chave para análise das respostas a quarta questão é ressignificado. Em todas as respostas percebe-se o relato que o cenário construído no ambiente escolar traz um ressignificado ao ambiente que é comum ao cotidiano do aluno e do professor durante o momento da peça, reforçando a ideia do portal, que depois, volta a ser pátio novamente. Ele gera expectativa nas crianças que, ao passarem pelo cenário no seu pátio, sentem-se instigados e cria um movimento interno que é exteriorizado fisicamente pelo aluno – “vamos pegar o melhor lugar pra assistir o teatro” – o cenário cumpre seu papel como portal.

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Questão 5: Qual o impacto do cenário da peça apresentada na escola, O pequeno grande amigo, na formação dos alunos? Professora 1: Gostei muito do trabalho do "dentro e fora", mesmo dentro do palco – o trabalho das coisas que estavam dentro da cena e fora da cena, poder ver que tudo está no palco. Essa distinção do estar dentro do palco, mas fora da cena foi muito marcante. Inclusive ao término da peça, quando tudo é desmontado, fica a sensação de ter viajado num mundo paralelo e ao desmontar no final, a sensação é de voltar a realidade. (enquanto espectadora ela estava fisicamente fora do palco, mas em sua imaginação, se sentia dentro do espaço cênico junto com os atores). Professora 2: Deixa eu ver... difícil, né? Como professora, fico atenta ao que se passa numa peça porque, geralmente, terei que responder muitas questões em sala para os alunos sobre o conteúdo e tudo mais, porque nossa escola procura desenvolver um senso crítico baseado na bíblia e as crianças são muito literais em alguns aspectos. Essa peça, em particular, foi muito adequada para a faixa etária dos alunos que assistiram crianças do 1º ao 5º ano. Creio que a proposta do cenário foi atingida, eu me senti como as crianças, levada a outro lugar. Então, acho que ele ajudou na formação desse mundo e instigou a imaginação das crianças, o que é fundamental desenvolver nas crianças nessa fase de sua vida porque futuramente, serão crianças mais criativas e menos travadas em todos os aspectos. Acho que é isso. Aluno: União e a individualidade. Porque a gente sempre pode ter amigos. Que a gente não pode discriminar outra pessoa. Meu objetivo como autora e diretora (cenógrafa?) da peça é que o espectador entre no palco, não fisicamente, mas na sua imaginação. A resposta da professora 1, demonstra o alcance pleno desse objetivo. As demais respostas reforçam a importância dos signos teatrais, pois se pensarmos o cenário como o portal ou o caminho condutor nessa transposição para o mundo imaginário da história representada, isto é possível por meio da interação e da utilização harmônica dos signos teatrais por parte dos atores em cena. Na visão do aluno, percebe-se que não existe a diferenciação entre peça (conteúdo) e cenário. A criança percebe tudo como um todo (cenário, história, acessórios, personagens, etc.), e consegue absorver do contexto geral segundo a sua própria leitura, de acordo com seu repertório individual. Muitas de suas percepções ainda estão no âmbito da intuição e são, comumente, inconscientes. Ainda assim, o aluno (de 8 anos) conseguiu refletir e responder coerentemente a cada uma das questões, o que reforça a ideia de que criança não deve ser subestimada e que é necessário pensar em cada signo de maneira responsável e madura ao

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criar uma peça teatral para o público infantil. O aluno entrevistado deixa claro que existem peças boas e peças ruins, segundo seu entendimento. Ele expressa isso quando diz que “às vezes dá vontade” como sendo algo que nem sempre a peça ou o cenário consegue despertar seu interesse, nota-se que a criança é sensível ao mundo que lhe rodeia. Os temas levantados na entrevista foram organizados em categorias. A construção dessas categorias foi baseada no referencial teórico em que esta pesquisa está apoiada. Minayo (2002) possibilita o entendimento sobre a organização de categorias quando apresenta o seguinte conceito: “abrange elementos ou aspectos com características comuns ou que se relacionam entre si”. Segundo esta mesma autora as categorias podem ser estabelecidas antes mesmo do trabalho de campo, na fase exploratória ou a partir da coleta dos dados da pesquisa. As categorias estabelecidas nesta pesquisa, a partir da questão 1 diz respeito ao cenário interferindo na linguagem, interação, contextualização, ambientação e localização espacial. As categorias estabelecidas a partir da questão 2, foram o cenário interferindo nas áreas de concentração, percepção, localização espacial, transporte ambiental, ludicidade (por meio da análise das respostas, chegou-se a conclusão que as criança sente vontade de brincar com o cenário) e ponte entre o real e o imaginário. As categorias estabelecidas a partir da questão 3, foram o cenário interferindo nas áreas de despertamento, motivação, interesse, afetividade e fruição. As categorias estabelecidas a partir da questão 4, são o cenário interferindo nas áreas de relação, transporte imaginativo (ir e vir), readequação espacial, suspense e inovação visual. Finalmente as categorias estabelecidas a partir da questão 5, foram o cenário interferindo nas áreas de formação ética, individualidade x coletividade, criticidade, estar dentro ou fora da realidade ou de um mundo imaginário.

Considerações finais Com base na pesquisa feita com professoras e aluno este artigo buscou responder sua questão inicial sobre a percepção e impacto que o cenário harmonioso, bem pensado e construído gera no público infantil. A partir das respostas analisadas, conclui-se que o cenário tem, sim, um papel fundamental como dispositivo cênico para uma peça infantil. Os entrevistados não veem, em nenhum momento, o cenário como algo dispensável ou mesmo decorativo para o palco ou como sendo algo para apenas chamar a atenção da criança.

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Tanto professoras quanto aluno veem o cenário como pano de fundo e contextualização de um ambiente onde uma história será narrada. É possível assim concluir que cada componente do cenário deve ser pensado com responsabilidade e respeito para com o público infantil que é sensível à sua proposta e função, ainda que não as compreenda ou explique racionalmente. Ao sondar o interesse do público infantil no cenário de uma peça teatral, percebeu-se que a criança é atenta a cada componente que forma um espetáculo. Fica claro que a criança entende que a função do cenário é situar o espectador no ambiente em que a história é narrada, e que ele não é apenas uma decoração do local onde ocorrerá a cena. Observou-se também, que o cenário dentro do ambiente escolar gera curiosidade no aluno e que a criança, ao assistir a peça, permite-se levar e transportar para um mundo imaginário totalmente diferente daquele espaço cotidiano onde está, fazendo com que este passe a ter outro significado, dando vazão à sua imaginação. Por meio da pesquisa realizada para a escrita desse artigo, foi possível perceber que é bastante comum e recorrente a ideia de que o cenário no teatro infantil atua como de caminho ou portal para a transição do mundo real para o mundo imaginário da história que será contada cenicamente. É como se ao abrir a cortina, ou iniciar a cena, o cenário tivesse como parte de suas funções, ser um convite visual à entrada no mundo de sonho, fantasia ou imaginação. Porém, por meio do estudo dos signos teatrais, percebeu-se que o cenário por si só não consegue transportar a criança para um mundo surreal, mas que é o funcionamento conjunto e coeso de todos os signos teatrais que a levará a esse lugar imaginário. O cenário exerce o papel do portal, portanto, figurinista, cenógrafo, diretor e iluminador devem estar em plena harmonia durante o processo dessa construção artística. Respeitar essa criança que já não é como as crianças de anos atrás, esse aluno que é bombardeado por informações que muitas vezes não contribuem positivamente para sua formação, considerar o público infantil como seres capazes de ter senso crítico enquanto plateia, é o dever do artista como um todo, seja ele diretor, roteirista, cenógrafo, iluminador, figurinista, maquiador ou ator. É preciso tomar para si, enquanto artista, principalmente do público infantil, a responsabilidade que temos enquanto participantes de uma mesma sociedade com relação à parceria na construção desse futuro cidadão que deve ser reflexivo para atuar de maneira responsável num mundo que é nosso e das gerações futuras.

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PARTE II

CENOGRAFIA APLICADA EM DIFERENTES CONTEXTOS

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9. A CENOGRAFIA NO ESPAÇO EXPOSITIVO: ASPECTOS HISTÓRICOS DA CENOGRAFIA EM EXPOSIÇÕES Virgínia Escóssia da Rocha Pitta23 Simone Landal 24 Resumo: O presente artigo tem como objetivo investigar por que algumas exposições de arte utilizam a cenografia como linguagem expositiva. Para isso, será estudado e analisado o histórico das exposições de arte com a intenção de compreender em que momento a cenografia entra nesse contexto. As exposições se inserem numa conjuntura que vai além do espaço expositivo da galeria, fazendo parte do sistema das artes. Percebe-se que os novos formatos expositivos, apropriando-se ou não da cenografia, parecem ter surgido ao longo dos movimentos artísticos e dos questionamentos que envolvem o conceito do que seja arte. Partindo desse estudo, serão realizados paralelos entre os fatores históricos e os elementos que caracterizam as exposições de arte hoje. Conclui-se que a cenografia, como elemento do universo teatral, foi absorvida pelo espaço expositivo por ser um elemento comunicador e facilitador entre obra e espectador. Palavras-chave: histórico das exposições de arte, espaço expositivo, cenografia para exposições, cenografia como linguagem.

Introdução A proposta deste artigo é entender em que momento e por que a cenografia, elemento do universo teatral, passou a fazer parte do espaço expositivo. O ponto de partida para o desenvolvimento do texto é a investigação dos fatores históricos relacionados as exposições de arte, pois, a partir destes, acredita-se que é possível captar elementos e conceitos que se desenvolveram ao longo do tempo e foram agregados às mesmas, surgindo, assim, o que conhecemos hoje por exposições de arte. No primeiro momento deste artigo será analisada a história da arte e das exposições pois acredita-se que as exposições mantêm uma relação direta com as propostas artísticas. Baseando-se nos fatores históricos, serão levantados alguns conceitos que modificaram o 23

Virgínia Escóssia da Rocha Pitta é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). É Arquiteta e Urbanista formada pela Universidade Federal do Ceará (2010). O presente artigo foi orientado pela profa. MSc. Simone Landal, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Revisão: Fernanda da Escóssia. E-mail: virginiaescossia@gmail.com 24 Simone Landal é Mestre em Comunicação e Linguagens pela Universidade Tuiuti do Paraná (2005), possui especialização em História da Arte, pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná (2001) e graduação em Desenho Industrial - Habilitação em Programação Visual pela Universidade Federal do Paraná (1994). Professora Assistente do Departamento Acadêmico de Desenho Industrial da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. E-mail: simonelandal@terra.com.br SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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espaço expositivo e parecem ter sido essenciais para a utilização da cenografia como linguagem das exposições. Os pontos analisados no segundo momento do artigo serão a fruição do espectador, a obra de arte total, o espaço e a exposição de arte como comunicação. Estes conceitos parecem ser fundamentais no contexto de abertura do universo expositivo para o desenvolvimento da cenografia como linguagem de uma exposição. A escolha deste tema para pesquisa surgiu a partir da observação de que algumas exposições em museus e galerias e da percepção que algumas exposições utilizam a cenografia no espaço expositivo. A partir desse questionamento, busca-se entender como o espaço expositivo se apropriou da cenografia, elemento do universo teatral. Para fundamentação teórica, foi feita uma pesquisa sobre a construção dos conceitos referentes aos espaços expositivos contemporâneos, a partir das teorias de Sonia Salcedo del Castillo, no livro “Cenário da Arquitetura da arte”; e Lisbeth Rebollo Goncalves, no livro “Entre Cenografias - O Museu e a Exposição de Arte no Século XX”. Essas referências foram essenciais para o desenvolvimento deste trabalho desde o início do projeto de pesquisa, pois nortearam quais deveriam ser os elementos principais a serem levantados e analisados para as devidas conclusões presentes neste artigo.

Aspectos Históricos Para a compreensão da cronologia das exposições e da história da arte é necessário entender que uma exposição é o momento máximo de uma obra e de seu artista, pois é quando ela se torna de conhecimento do outro, quando deixa o ateliê e se torna “pública”25. Esse momento faz parte de algo maior, que é o chamado circuito da arte, onde existe alguém que produz, alguém que financia a produção, alguém que exibe, alguém que vê e alguém que compra. Resumidamente pode-se dizer que esse é o ciclo do circuito artístico, porém nem sempre todos esses pontos se fazem presentes no circuito. Em alguns casos quem financia a obra é o próprio artista, e nem sempre alguém chega a compra-las. Nesse circuito também faz parte a crítica de arte, iniciada por Denis Diderot em 1765, através de seu texto “O Salão de 1765”. Esse ensaio, que surge em função dos Salões Parisienses, é um novo modelo de texto, nascendo de um modo diferenciado de contato com a

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A expressão pública utilizada nesse contexto não se refere a algo que começou a fazer parte do povo, da população em geral, mas se refere a algo que deixa de ser do conhecimento apenas do artista, e passa a ser do conhecimento do outro, de outras pessoas, não necessariamente do conhecimento do “povo”. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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arte. E é a partir deste circuito, abordando a exposição como ponto máximo de um artista, que será traçado a linha cronológica das “exposições de arte” nos moldes que se conhece hoje. Feito esse juízo inicial a respeito do circuito artístico, entende-se que as exposições de arte, juntamente com a arte, estão contidas em um contexto maior, e por isso suas histórias estão diretamente associadas, sendo impossível falar de exposições de arte sem entender o que aconteceu no cenário artístico. Segundo Sonia Salcedo del Castillo, “os elos iniciais dessa corrente de fatos, formaram-se a partir dos salões parisienses, em meados do XVIII” (CASTILLO, 2008, p. 25). Os salões parisienses eram eventos onde a produção artística da Academia era exibida e possivelmente vendida para a aristocracia e para a nascente burguesia. Pode-se dizer que os salões parisienses do século XVIII são o início do que chamamos de formação de um circuito artístico. A exibição da produção da academia era feita em salões dos palácios em Paris, onde a praxe de montagem da época era: quadros dispostos nas paredes por temática e formato, colocando o máximo de obra no mínimo de espaço possível. Os quadros maiores e mais importantes (segundo critérios da Academia) ficavam na altura dos olhos, e os outros localizavam-se acima ou abaixo destes. Os salões onde eram exibidos os quadros tinham características do rococó, ou seja, excesso do decorativismo. No século XIX, como produto da Revolução Industrial, surgem as Exposições Universais, que tinham como objetivo mostrar para a população os feitos da nova era, propagando assim o progresso industrial na sociedade. Como uma floresta de novidades26 as Exposições exibiam objetos industriais dos mais variados gêneros que causavam encantamento ao público, e também objetos de arte. Baudelaire27 descreve que esses objetos geravam um outro tipo de prazer estético: “o impacto exercido pela industrialização sobre as concepções de espaços e montagens também influenciava a percepção e fruição dos objetos expostos” (CASTILLO, 2008, p. 29). O julgamento estético das obras ficava comprometido pois os objetos industriais geravam maior interesse do que as obras de arte. Havendo, dessa forma, uma perda na imaginação do público gerada pela busca de novidade, tendo como consequência apenas a contemplação da obra, e não o entendimento do seu real significado.

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Floresta de novidades – termo utilizado por Baudelaire a respeito das Exposições Universais que aconteceram na Europa no século XIX. Fonte - Castillo, Sonia Salcedo Del - “Cenário da Arquitetura da Arte”. 27 Charles-Pierre Baudelaire – poeta francês e teórico da arte francesa, que escreveu resenhas sobre as exposições do século XIX. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Com essas duas tipologias de mostra, pode-se dizer que a arte começa a chegar a uma parcela maior da sociedade, principalmente à nascente elite burguesa que se formava com os acontecimentos da Revolução Industrial. Pode-se dizer que com as nascentes exposições começa a haver uma “popularização da arte”28. É interessante lembrar também que, até esse período, a arte, principalmente a “arte oficial” produzida dentro da Academia, era uma reprodução do objeto, da vida e da natureza. Era uma espécie de mímese e uma visão idealizada do mundo. No final do século de XIX, após a Revolução Industrial e com o advento de novas técnicas, a fotografia é um exemplo destas, “a arte iniciaria nessa época o gosto pela pesquisa técnica deixando de satisfazer os desejos narcisísticos do público burguês” (CASTILLO, 2008, p. 36). Aos poucos, o ilusionismo perspectivista, a verossimilhança e a mimese do objeto representado deixavam de ser utilizados dando lugar à subjetividade do autor, onde a percepção do artista em relação ao objeto representado era mais importante que a representação fiel do objeto. Essa desconstrução academicista é desenvolvida através de novas técnicas utilizadas, podendo ser percebida na pintura inovadora de Manet e nas obras dos artistas impressionistas. Nesses dois tipos de exposições, Salões Parisienses e Exposições Universais, percebese que nenhuma tinha como objetivo a arte e si. Os Salões visavam a exibição da produção da Academia tendo como maior objetivo a especulação e possível venda das peças, enquanto que as Exposições Universais focavam na divulgação dos produtos industriais. Nenhuma delas tinha como objetivo fortalecer as ideias artísticas. Com isso, houve o descontentamento daqueles que queriam, com as exposições, mostrar sua obra como uma forma de defender suas ideias e convicções artísticas. Diante desta situação, alguns artistas vão em busca de uma nova atitude com o intuito de valorização de sua obra e de seu pensamento artístico. Assim aconteceu com Courbet, que em 1855 construiu um pavilhão intitulado “Realismo” para expor suas obras, e com Manet, que repetiu a mesma ação doze anos depois. A necessidade que alguns artistas tiveram de expor fora dos Salões significa o início de uma autonomia no circuito artístico, deixando de depender exclusivamente daqueles que patrocinavam os Salões e as Exposições Universais. Pode-se dizer que as exposições individuais contribuíram para o que viriam a ser chamadas futuramente de vanguardas modernas do início do século XX. Como forma de ampliação e maior autonomia do circuito, alguns artistas se reuniram para elaborar mostras 28

Popularização da arte – esse termo não significa que a arte começava a chegar a todas as parcelas da sociedade, mas sim que a arte começa a ter um público que não a nobreza e o clero. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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coletivas, onde adotavam concepções de montagem inéditas, sendo mais persuasivas e atrativas para o público. A primeira dessas mostras coletivas aconteceu em 1874 sob a liderança de Monet, surgindo nesse momento o grupo dos impressionistas. As exposições coletivas muitas vezes enfatizaram uma preocupação com o “modo de expor”, com a montagem, como forma de valorização das peças e também como forma de persuadir o público. Porém, ainda não havia uma preocupação espacial, no sentido da localização das obras, pois as molduras ainda faziam parte das telas. A necessidade de eliminação da moldura surge a partir do momento em que a perspectiva renascentista vai deixando de ser usada e a pintura começa a ser expandida para além dos limites da tela. Partindo desse princípio, alguns artistas pintavam as molduras e outros começaram a eliminá-la. A busca por um novo espaço na arte tem início com a quebra das molduras, que futuramente viria a ser uma das premissas das vanguardas modernas. A busca pelo novo espaço também se reflete nas montagens expositivas a partir das mostras coletivas, onde as obras começavam a dialogar com o espaço na qual estavam expostas e, principalmente, com o espectador. Junto com as nascentes premissas vanguardistas e com as novas concepções de montagens das exposições foi necessário o surgimento de um novo olhar por parte do observador, uma nova atitude diante da obra. Como a arte deixava de ser representativa, o espectador não iria apenas contemplá-la, ele teria que compreendê-la. “Ao espectador não cabia apenas contemplá-la, era preciso, acima de tudo, testemunhar sua presença ou, mais radicalmente, encarnar sua própria ausência dentro dela” (CASTILLO, 2008, p. 36). É interessante questionar nesse momento a nomenclatura dada ao ato de expor uma obra artística. O substantivo exposição deriva do verbo expor, e segundo o dicionário significa “ato de expor”, ou seja, “pôr à vista, mostrar.” Dessa forma, a palavra exposição significa mostrar algo a alguém. A designação “salão parisiense” surge porque a primeira vez que se “pôs à vista” uma obra de arte foi dentro de um salão de palácio em Paris. Depois surge a nomenclatura “Mostra”, utilizada por artistas impressionistas para designar suas primeiras exposições coletivas, criando seu próprio espaço para “pôr à vista”, mostrar suas obras. Atualmente, usamos o substantivo exposição para designar não somente o ato de expor algo, mas para caracterizar uma tipologia estrutural de como expor esse algo, Exposições de Arte. No final do século XIX, a produção artística de algumas exposições coletivas tomaria para si o espaço como limite para suas propostas de montagens, caracterizando, assim, as

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montagens de algumas associações artísticas denominadas de Secessões29. Estas perceberam a importância do espaço para a apresentação das obras, e começaram a eliminar qualquer aparato decorativo das salas onde seriam expostas as mais variadas tendências da arte. Adquiria-se, dessa forma, tanto para objeto de arte como para o espaço de montagem um único paradigma, a arte como unidade. Com as Secessões as exposições começaram a ser pensadas como um todo artístico com unidade e totalidade espacial. Os grupos de secessão traziam o conceito de arte total, no sentido da exposição significar algo, onde as variadas tendências artísticas deveriam formar uma unidade. Nascia a proposta de um sentido de homogeneidade absoluta entre artista, obra, espaço e montagem, objetivando, como resultado, uma obra de arte total. Uma das principais exposições foi a de Viena, em 1902, onde foi construído um prédio próprio para essas novas tipologias de montagens. Com o início das vanguardas modernas e das novas montagens expositivas, a palavra fruição começa a aparecer. No Salão Parisiense o espectador contemplava as obras de arte. Com a nova visualidade o espectador passa a ter a necessidade de fruir a obra, de entender, contestar, para depois contemplar. A palavra fruição significa “como algo afeta alguém, como algo é entendido, como espectador cria a história”30. No início da década de 20 os museus tinham caráter de conservação de acervo, assemelhando-se a uma biblioteca, onde existe material de pesquisa. Apesar de existirem exposições em museus, estas não apresentavam caráter de “expor” como aconteciam nas exposições vanguardistas modernas. “À medida em que as propostas artísticas rompiam com os modelos tradicionais, a realização de exposições assumia um papel cada vez mais importante para a veiculação da produção artística” (CASTILLO, 2008, p. 83), gerando cada vez mais o interesse e intelectualização do público e também a autonomia do circuito artístico. As vanguardas artísticas não pretendiam apenas expor as obras em relação a um espaço, mas fazer com que elas resultassem numa provocação à estabilidade do pensamento racional de forma a sensibilizar o público. Para tal, recorriam a ambientações, publicidade e informação, no intuito de atingir e atrair o maior número de pessoas. Assim, as montagens e exposições começavam a se tornar importantes para que houvesse interação do espectador

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Grupos de Secessão: grupos organizados por artistas que queriam mostrar as variadas tendências de arte que rompiam com o tradicionalismo e renunciavam todo e qualquer aparato decorativo. 30 Camila Gottems, “Obras de arte positivas e sensoriais: instigando a fruição e a experiência artístico-estética em situações de ensino-aprendizagem”, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Monografia do Curso de Graduação em Artes Visuais – Licenciatura. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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com as obras expostas, pois passavam a ser espaços onde os artistas revelavam suas convicções. Diante da vitalidade moderna e de suas novas demandas sobre a fruição artística, os protótipos museológicos não estavam condizentes com as novas proposições artísticas. Dessa forma, o museu passa a ser tema alvo das experiências vanguardistas do século XX, no qual boa parte das vanguardas arquitetônicas modernas passaria a se dedicar a essa tipologia, reformulando tanto seu programa quanto seu conceito tradicional. Por serem equipamentos institucionais e como forma de aproximar a arte da vida da população, os artistas modernos voltaram-se para os museus, levando as exposições para seu interior. Nesse contexto de desenvolvimento da vanguarda moderna, existe um fato histórico que parece ter influência sobre o circuito da arte moderna. Na década de 20, em pleno pósguerra a Europa encontrava-se “destruída” devido o pós-guerra, enquanto o capitalismo industrial americano prosperava. Diante dessa situação alguns artistas migram para os Estados Unidos para poder viver de sua arte. Dessa forma, a primeira guerra mundial se apresenta como um dos pontos que impulsionaram o circuito da arte para os Estados Unidos. Chegando à nova capital, a arte teria que “desvincular-se dos cânones racionalistas e adaptar-se culturalmente a um pragmatismo da ação independente do conhecer” (CASTILLO, 2008, p. 100). Essa adaptação parece ter sido favorecida pela liberdade que a cultura norteamericana oferecia aos artistas europeus, diferente do que acontecia no cenário europeu durante o século XIX, sempre comprometido com a história e a tradição. Desde o início dos salões parisienses percebe-se que as políticas socioeconômicas interferem diretamente nos limites da arte, sendo esta questão uma das motivações encontradas por alguns artistas no início do século XIX para buscar uma maior autonomia do circuito artístico. Percebe-se que as políticas socioeconômicas andam lado a lado com o sistema das artes influenciando-o diretamente. Isto será percebido mais fortemente a partir do século XX, quando o circuito artístico se vincula ao consumo cultural. Desde o século XIX o capitalismo industrial arrasta consigo a evolução de uma estética ligada ao consumo, ampliando fortemente o mercado artístico. Isso pode ser provado pelo fato de que “as grandes coleções de arte foram construídas sobretudo por grandes nomes do empresariado industrial” (CASTILLO, 2008, p. 103). Dessa forma, a arte, assim como a cultura, sob a égide do progresso, passou a ser administrada como empresa financeira: tanto as coleções particulares como os acervos de museus transformavam-se em investimento. Resumidamente este é o significado da expressão consumo cultural.

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No início do século XX, os Estados Unidos tinham forte interesse em constituir um patrimônio cultural que não fosse de natureza norte-americana, mas voltado aos valores europeus, e com seu capitalismo industrial efervescente, a arte começa a ser transformada em objeto de consumo, ampliando, dessa forma, o mercado artístico. Esse contexto foi o ideal para que prosperassem os ideais das novas montagens expositivas e os conceitos para as novas tipologias museográficas que, sob a lógica do consumo cultural, se transformariam em um negócio financeiramente lucrativo. Essa estrita relação que se firmava entre Europa e Estados Unidos significava, para os americanos, crescimento cultural como sinônimo de progresso. Para os artistas europeus, o novo mundo era sinônimo de liberdade, internacionalismo e prosperidade. Essas questões formaram um terreno propício para a afirmação da vanguarda moderna, com consequente desenvolvimento sobre o conceito do museu moderno. As exposições vanguardistas que aconteciam nas galerias de Nova York se mostravam cada vez mais interessantes e economicamente viáveis devido ao “amplo horário de visitação, divulgação, inovação nas montagens, conteúdo das exposições e diversificação expositiva das mostras temporárias” (CASTILLO, 2008, p. 105). Além de todas essas características, a capacidade empresarial dos galeristas americanos foi um dos fatores determinantes para atrair compradores e visitantes. O conceito das galerias de arte americanas de conciliar a arte à ideia de mercado, buscava atingir amplamente o público, principalmente com suas concepções de montagens inéditas junto com o rico acervo de vanguarda. As exposições nessas galerias impulsionaram e afirmaram o circuito moderno, pois, ao lado do acervo moderno europeu, as galerias lançavam novos artistas norte-americanos. Além das exposições e de novos nomes da arte como Pollock, a atuação da crítica de Greenberg e Rosenberg, lançaram a arte norte americana para o mundo. Nesse contexto, surgem os museus modernos em Nova York, primeiramente com o MOMA, em 1929, e 30 anos depois o Guggenheim, em 1959. Esses edifícios serviriam de molde do museu moderno tanto no que diz respeito ao seu conceito de lugar ideal para a arte moderna, quanto no que diz respeito a sua arquitetura. O fato de as mostras coletivas artísticas voltarem seus olhos para os museus e os “invadirem” com suas exposições vanguardistas era inevitável, pois por serem equipamentos institucionais neles residiria o reconhecimento máximo, a posteridade.

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Com o novo contexto artístico de maior liberdade de expressão, progresso e consumo cultural, ao mesmo tempo em que ocorriam as exposições nas galerias norte-americanas e a concretização do museu moderno enquanto lugar ideal da arte moderna, desenvolviam-se também novas correntes artísticas americanas como o Expressionismo Abstrato e a Arte Pop, que eram, ao mesmo tempo, uma forma de afirmação da arte moderna e uma reação pósmoderna31. A reação pós-moderna referida é no sentido de que o projeto moderno vai enfraquecendo, a coletividade das vanguardas modernas não fazia mais sentido, pois o valor de troca assentado no capital, parece superar qualquer outro. A nova produção começava a guardar, para além das imagens, um entendimento da superficialidade do contexto social que a cerca. A Arte Pop parece surgir como uma consequência do envolvimento da arte com a lógica de consumo, levando essa questão ao máximo no que diz respeito a reprodução de objetos: trazia para a obra a repetição de objetos do consumo diário, com o intuito de discutir questões referentes à banalização da arte e de seu conceito, devido ao consumismo. Nesse contexto artístico prenunciava-se o colapso moderno, pois a reprodução do objeto era o modelo representativo e conceitual do envolvimento entre logica de consumo e produção artística. As montagens das exposições da década de 60 eram inovadoras, principalmente porque inseria a atividade expositiva na esfera do projeto artístico. As obras que eram expostas passavam a se vincular cada vez mais ao espaço expositivo, porém segundo critérios que manipulassem a percepção do espectador. Os organizadores dessas exposições desenvolviam princípios e concepções de montagens conforme os modelos da tecnologia, pois eram influenciados pelo rápido progresso tecnológico. Essas questões e características podem ser percebidas em mostras bastante radicais que aconteceram na Europa e influenciaram as linguagens das exposições seguintes. São elas a I Documenta de Kassel32, em 1955 e na Exposição This is Tomorrow, Londres, 1956. Nesse contexto é interessante relembrar algumas questões da arte moderna para que se compreenda o início da arte contemporânea, e consequentemente os rumos das montagens

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O termo pós-moderno utilizado neste artigo não faz referência ao pós-moderno utilizado por Zygmunt Bauman. Aqui, o termo será utilizado apenas para se referir ao momento que sucede ao movimento moderno, que sucede aos ideais das vanguardas artísticas modernas. 32 I Documenta de Kassel é considerada uma das maiores e importantes exposições da arte contemporânea e da arte moderna internacional. Essa exposição de arte aconteceu pela primeira vez em 1955 e ocorre até os dias de hoje a cada cinco anos em Kassel, na Alemanha. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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expositivas. As vanguardas modernas tinham como preceito o rompimento das regras acadêmicas na busca de um novo estilo capaz de expressar a vida moderna, declararam que o objetivo da arte não era o da simples representação do visível, mas a expressão interior da emoção e da sensibilidade, e buscaram a concepção de um novo espaço da arte onde pudessem diminuir a distância entre vida e arte. Com a Pop Art, percebe-se que algumas dessas questões foram levadas ao extremo. A partir da década de 60, a arte toma outro rumo, se apropria de novos elementos e meios, como o vídeo e a fotografia, e de novos espaços de expressão. Nesse período começam a ser propostas diferentes formas de arte, que nem sempre utilizavam o objeto como “fim”, como é o caso das instalações, performances, happening, land art, body art, site specific, dentre outros. A busca moderna de um novo espaço da arte gera cada vez mais a interdependência entre obra, espaço e sujeito fruidor, e esta questão desemboca em uma nova corrente artística, o Minimalismo, e consequentemente a arte conceitual, que caracterizará a arte contemporânea na década de 60. Na corrente Minimalista a relação obra-espaço-espectador se modifica de uma forma que, para “fruir” a obra, o espectador deve vivenciá-la, e a totalidade de sua obra é definida tal qual o todo de uma exposição. A obra deixava de ser apenas um objeto e passava a ser também a experiência com o objeto. As experiências espaciais minimalistas iam de encontro à ausência de significado espacial pressuposta pelo conceito do cubo branco, pois começavam a ser propostas situações espaciais que se efetivavam apenas quando se incluía a experiência perceptiva do sujeito fruidor. O espaço minimalista pede a experiência do espectador, porque só ela é capaz de conferir sentido a sua totalidade e, diferente do cubo branco, que “mortifica o espaço em favor da obra, o Minimalismo, vivifica-o ao incorporá-lo a sua obra” (CASTILLO, 2008, p. 158). Até esse momento, existe uma definição de objeto artístico como sendo quadro ou escultura, mas as novas correntes artísticas, iniciadas com o Minimalismo, começavam a trazer um novo conceito onde o objeto passava a ser o próprio lugar da exposição. Essa corrente artística foi uma espécie de transição do quadro para o espaço literal, é como se a obra “saísse” da parede e do pedestal ganhando o espaço. Cada vez mais a relação das obras com o espaço e o contexto nas quais estavam inseridas passa a ser ponto de partida para a produção artística. A partir de 1970, a nova tipologia foi denominada de instalação, sendo “uma obra que exige como totalidade a relação

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entre o objeto instalado num determinado lugar, onde o espaço resultante deve fornecer uma experiência perceptiva ao observador”33. Os novos experimentalismos dos anos 1960 e 1970 “incorporavam em sua produção a interdependência entre espaço e obra, e o conceito moderno de galeria começava a ser questionado, pois o espaço expositivo perdia seu estatuto de neutralidade, ganhando importância na totalidade da obra” (CASTILLO, 2008, p. 183). Além da questão do espaço, essas tipologias passaram a reduzir sua forma material do objeto em imagem, pois como as experiências quebravam os espaços arquitetônicos e buscavam seu lugar especifico no espaço, o caráter das obras passava a ser efêmero e, consequentemente, a exibição de sua forma passava a ser o registro, e não mais o objeto. Para o objeto entrar nas galerias e ser exibido, ele vinha na forma de imagem. No contexto da arte minimalista, das instalações e das novas concepções características da década de 70, as questões do cubo branco começam a ser questionadas, pois a arte não estava mais somente ligada ao objeto34, iniciando-se uma nova discussão acerca dos museus. A obra contemporânea necessitava de um novo lugar, pois esta passava a se interrelacionar com o contexto na qual está inserida. O museu moderno não se apresentava como o melhor lugar na nova arte e, dessa forma, começavam a surgir novos conceitos e propostas de museus, de exposições e dos espaços expositivos, quebrando com o conceito modernista do cubo branco. A discussão acerca do museu e do espaço expositivo modernista, enquanto sua tipologia, proposta e significado teve início a partir dos anos 70, com a publicação do ensaio de Brian O'Doherty35 em 1976, e com a construção do Centro Georges Pompidou, em Paris, em 1977. Questão Se a arte moderna traria para a sua obra uma nova relação com o espaço e, consequentemente, com o espectador fazendo-o fruir/entender a obra ao invés de contemplála, a arte contemporânea traria o conceito do espaço como lugar da arte e, com isso, traz a relação entre obra e contexto em que está inserida. “À medida que as experiências artísticas incorporavam o espaço, o corpo e a palavra como lugar de suas obras, surgiam novos meios de veiculação artística” (CASTILLO, 2008, 33

Definição do termo instalação segundo a artista plástica Fernanda Junqueira, em seu artigo “Sobre o conceito de instalação” publicado no volume 14 de 1996 da Revista Gávea – PUC RIO. 34 O tema de o objeto não ser mais uma finalidade da arte foi discutida, levando a questionamentos acerca do que seria o objeto de arte, do que seria arte, e do fim da arte. 35 O’DOHERTY, Brian. No interior do cubo branco: a ideologia do espaço da arte / Brian O’ Doherty; introdução Thomas McEvilley; tradução de Carlos Mendes Rosa; revisão técnica Carlos Farjado; apresentação Martin Grossman. - São Paulo; Martins Fontes, 2002. - (Coleção a). SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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p. 324), e, consequentemente, novos meios de expor esses novos formatos. Com esses novos formatos, nos últimos anos do século XX assistiu-se à introdução de outros conceitos expográficos, onde a cenografia torna-se uma possibilidade que pode ser usada como dispositivo para contextualizar a obra exibida. As modificações no modo de conceber e apresentar as exposições muda, em grande parte, em compasso com as mudanças que aconteceram na arte contemporânea.

Cenografia em Exposições A partir do estudo histórico percebe-se que as modificações ocorridas no espaço expositivo ao longo do tempo possibilitaram a utilização da cenografia como linguagem das exposições e, por isso, torna-se possível entender em que momento a cenografia entrou no universo expositivo. O conceito de cenografia em exposições utilizado neste artigo é entendido como o modo de se expor uma obra, o modo de contar a narrativa de uma exposição, ou como diz Lisbeth Rebollo Gonçalves, é o “modo de criar uma atmosfera que se pensa ideal e representativa das situações envolvidas numa apresentação narrativa. A cenografia é a apresentação de um discurso sobre a arte que colabora para promover a recepção estética e instigar a imaginação do espectador” (GONÇALVES, 2004, p. 37). Alguns conceitos e elementos desenvolvidos ao longo da história das exposições estão presentes no modelo de exposição de arte conhecido atualmente, por isso, a proposta deste tópico do artigo é identificar e analisar os elementos e conceitos facilitadores da cenografia no espaço expositivo contemporânea36. O primeiro conceito a ser analisado é a fruição do espectador. Nos Salões Parisienses os espectadores contemplavam as obras de arte que eram expostas. No final do século XIX, as obras das vanguardas modernas sofreram transformações, e por isso demandavam uma nova postura diante da obra por parte do espectador. A observação contemplativa característica dos Salões não era suficiente para as obras vanguardistas, pois estas passavam a ser carregadas de subjetividade. Ao público era necessário um entendimento da obra para depois contemplá-la e, dessa forma, a mudança no olhar do espectador passava a ser modificada. Nos anos de 1960-70, período da arte contemporânea, houve uma nova necessidade de transformação na percepção do objeto artístico. As obras pediam a intervenção e interação do sujeito fruidor, para sua compreensão. Essa interação parece ter sido iniciada com o 36

O termo contemporâneo utilizado nessa frase não diz respeito ao movimento artístico, mas o momento que se vive atualmente. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Minimalismo, pois um de seus significados era a experimentação do observador estabelecida entre seu corpo e o objeto. As formas e objetos desenvolvidos pela corrente minimalista não tinham um real significado, os artistas sugeriam que “o significado formal do que se criava dependia inteiramente da experimentação perceptiva daquele para o qual se cria” (CASTILLO, 2008, p. 187), ou seja, a obra só fazia sentido com a presença e interação do observador. A obra minimalista “confere à experiência estética uma temporalidade distinta daquela emoção instantânea que caracteriza a fruição da obra modernista” (CASTILLO, 2008, p. 188). Considerar a fruição como elemento fundamental no contexto de uma exposição é o ponto inicial para a abertura da cenografia, pois esta é concebida sob uma perspectiva semelhante à do objeto minimalista, sua existência pede a presença do espectador. Segundo Fried37 “a presença que se estabelece na totalidade do espaço minimalista é teatral” (CASTILLO, 2008, p. 188), ou seja, é teatral porque ocorre um encontro da obra de arte com o espectador. O espaço da galeria tornava-se teatral pois a obra passava a precisar de outro sujeito para acontecer, existir. Com o desenvolvimento do “modo de ver” do espectador a cenografia adentrou ao espaço expositivo com o objetivo de significar o contexto na qual a obra será inserida. Dessa forma, o conceito do cubo branco passava a não fazer mais sentido, pois rejeita tudo aquilo que possa interferir na obra, todos os elementos que contivessem algum significado além da obra. A segunda questão a ser abordada é o conceito de obra de arte total. O conceito de totalidade de uma exposição foi desenvolvido no movimento moderno, conforme discussão no início deste artigo. As premissas modernas não falam de cenografia enquanto linguagem, mas trazem o conceito de obra de arte total que nada mais é do que uma exposição com uma unidade, com o objetivo de significar algo ao público, comunicar ao público as obras de arte de forma que eles entendessem aquela exposição como um único contexto. Além do conceito das exposições como obra de arte total surge, no contexto da Arte Povera europeia, outro conceito que parece derivar da arte total. Em 1969 houve uma exposição organizada por Harold Szeemann38 com 69 artistas do mundo inteiro, que inaugurou uma forma de expor até hoje explorada, a exposição como objeto artístico. Nesse contexto destaca-se a figura do curador na qualidade de idealizador de um produto artístico e, 37

Michael Fried é um modernista crítico de arte e historiador de arte que traz a questão da teatralidade da corrente minimalista à sua crítica. 38 Harold Szeemann foi um curador de arte e historiador suíço que realizou a exposição de 1969 contribuindo com a definição do conceito de curadoria. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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dessa maneira, a exposição parecia configurar-se numa forma de representação artística quanto a própria arte. A partir do momento em que as exposições ganham caráter de projeto artístico, elas ganham subjetividades temáticas ou conceituais, abrindo espaço para a cenografia, ou seja, para novas maneiras de se contar a história proposta pelo curador. O terceiro ponto é a questão do espaço. Da mesma forma que houve uma modificação/transformação no “modo de olhar a obra” por parte do espectador, ocorreu também uma transformação no espaço a partir das vanguardas modernas. Esse novo conceito espacial continuou a se desenvolver até chegar ao espaço da arte contemporânea, tendo seu ponto de partida no Minimalismo e, posteriormente, nas instalações. A obra minimalista sai da parede, ou seja, dos quadros, e ganha o espaço onde começava a se construir novas experiências espaciais entre obra e espaço e obra e espectador. “As experiências minimalistas, além de terem ampliado o campo escultórico, expandiram também o campo expositivo” (CASTILLO, 2008, p. 175), pois essas novas possibilidades espaciais artísticas foram percebidas também nas exposições. Essa nova premissa do espaço minimalista melhor se desenvolve nas instalações, pois no Minimalismo a obra não tinha significado, o artista “jogava” seu significado para o espaço, para a relação do espectador com o espaço gerado pela obra. A instalação também traz a questão da percepção do espaço pelo observador, porém esta tem significado no objeto artístico, diferente do conceito minimalista. Verifica-se uma estreita relação entre as exposições e as instalações, podendo-se dizer que o modelo de exposição de arte que conhecemos hoje surge da instalação, pois ela traz o significado do espaço gerado e o significado da obra em si. Esses significados da instalação trazem o conceito de totalidade que se espelha na concepção do todo expositivo. Com o Minimalismo houve o início da relação do sujeito fruidor com o espaço, e com a instalação, houve a conscientização deste. Essas questões da obra de arte relacionadas ao espaço tornam o campo expositivo mais elástico e transitório, e as novas propostas artísticas estreitaram a relação entre cena e visualidade, iniciando o rompimento de fronteiras entre as disciplinas e expressões artísticas. O último ponto a ser analisado é a exposição de arte como comunicação. Segundo ARCHER39, a questão de a arte não está mais ligada somente ao objeto aproxima e distancia o espectador de seu entendimento do que seja arte. Aproxima pela questão da utilização dos 39

Michel Archer, “Arte contemporânea - Uma história concisa”.

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materiais, não existe mais uma definição de “material próprio da arte”. Tudo passa a ser matéria-prima: palavras, comida, pessoas, etc. E afasta na medida em que a obra não é compreendida tão facilmente pelo público. É exatamente nesse ponto de “a arte afastar o espectador por não ser compreendida” que as exposições de arte passam a ter o objetivo de facilitar o significado das obras e dialogar com o espectador, tendo a cenografia como agente comunicador entre artista e público. Dessa forma, a cenografia entra no espaço expositivo como um meio de comunicação, como uma nova maneira de comunicar a arte. No início das montagens vanguardistas do final do século XIX, não se fala em cenografia no espaço da expositivo, mas as exposições tinham características de montagens muito próprias, tinham uma preocupação com o decór, que era o modo de expor. Com o objetivo de comunicar a obra de arte ao público, as montagens expositivas adquiriram extrema importância para o devido entendimento da nova arte pelo público. É nesse momento que a cenografia começa a ter espaço dentro do contexto das exposições e, cada vez mais, torna-se um elemento importante na comunicação entre obra e espectador, pois ela narra e significa a exposição, ela contextualiza o expectador e comunica a subjetividade do objeto artístico. Com esse conceito, a cenografia passa a ser uma nova concepção expositiva, evocando antes a ideia e não o objeto, e convocando mais a participação do que a contemplação do espectador, tendo como objetivo “compreensão do público a respeito de uma produção, cujo entendimento envolve contextualizações culturais” (CASTILLO, 2008, p. 219). A cenografia cria a condição intertextual para proporcionar a comunicação da arte de forma a condicionar o efeito estético, ou seja, a recepção da arte em exibição. Sonia Salcedo deixa claro que para cada manifestação/movimento novas concepções expositivas vão sendo determinadas, moldadas e pensadas, pois para cada tipologia da arte existe um tipo de fruição e, consequentemente uma linguagem para sua montagem. Após o levantamento de todas as questões acima analisadas, conclui-se que a chegada da cenografia, elemento do universo teatral, ao espaço expositivo aconteceu graças às novas correntes artísticas que mudaram o conceito das exposições. O objeto foi substituído pela efemeridade e “a obra passou a ser feita no lugar expositivo, como efeito o espaço expositivo adquire flexibilidade semelhante à da caixa preta do teatro” (CASTILLO, 2008, p. 326).

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Conclusão A pesquisa para este artigo possibilitou compreender que os elementos e conceitos característicos das exposições de arte da atualidade têm seu fundamento e desenvolvimento ao longo da história das exposições e, consequentemente, da história da arte. Os conceitos levantados e analisados foram modificados ao longo do tempo de acordo com as necessidades das novas propostas artísticas e possibilitaram que a cenografia fizesse parte da linguagem do espaço expositivo. Com esses questionamentos, conclui-se que a cenografia passa a fazer parte do universo expositivo principalmente por ser um elemento de comunicação entre obra e espectador. Os conceitos sobre fruição, espaço e obra de arte total são os meios que abriram espaço para a cenografia, mas a questão da comunicabilidade entre obra e espectador parece ser o principal conceito para a permanecia desse elemento teatral no espaço expositivo. Nesse novo momento, uma obra de arte melhor será apreciada quanto melhor ela se comunicar com seu público.

Referências: ARCHER, Michel. Arte contemporânea – Uma história concisa. – São Paulo; Martins Fontes, 2001. CASTILLO, Sonia Salcedo del. Cenário da arquitetura da arte: Montagens e espaços de exposições / Sonia Salcedo del Castillo. – São Paulo: Martins, 2008. GONÇALVES, Lisbeth Rebollo. Entre cenografias: O museu e a exposição de arte no século XX / Lisbeth Rebollo Gonçalves. – São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo/Fapesp, 2004. GOTTEMS, Camila. Obras de arte positivas e sensoriais: instigando a fruição e a experiência artístico-estética em situações de ensino-aprendizagem. Monografia do Curso de Graduação em Artes Visuais – Licenciatura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2011. O’DOHERTY, Brian. No interior do cubo branco: a ideologia do espaço da arte / Brian O’ Doherty; introdução Thomas McEvilley; tradução de Carlos Mendes Rosa; revisão técnica Carlos Farjado; apresentação Martin Grossman. - São Paulo; Martins Fontes, 2002. - (Coleção a) REIS, Paulo Roberto de Oliveira. Exposições de arte – Vanguarda e política entre os anos 1965 e 1970 – Tese apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Doutor. Curso de pós-graduação em história, setor de ciências humanas, letras e artes, Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2005.

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10. CENOGRAFIA APLICADA A EXPOSIÇÕES EM MUSEUS DE ARTE. MAR- MUSEU DE ARTE DO RIO DE JANEIRO Marina Moraes de Araújo40 Simone Landal41 Resumo: Este artigo tem como objetivo investigar aspectos da cenografia aplicada a exposições de arte. Para pensar as características dessa atividade, foi necessário buscar referências bibliográficas que abordassem o tema, relacionando com o conceito do cubo branco, apresentado pelo autor O’Doherty. Como objeto de estudo são apresentados três exposições recentes do MARMuseu de arte do Rio, inaugurado no ano de 2013. A escolha desse museu está relacionada ao interesse pelo estudo do contexto brasileiro, nessa área de atuação, e suas presentes mudanças nas últimas décadas. Palavras-chave: Cenografia aplicada a exposições, Museus do Brasil, MAR- Museu de Arte do Rio, MASP-Museu de Arte São Paulo

Introdução Museus são espaços que possuem várias tipologias na sua configuração: museus de antropologia, arqueologia, artes visuais, ciências, história entre outros. Eles são estruturados e denominados de acordo com os objetos que abrigam. Santos (2011) apresenta em sua pesquisa as diversas tipologias de museus que o Brasil hoje utiliza através do Cadastro Nacional de Museus. Para direcionar o olhar, em relação ao tema da arte, a pesquisa é focada na interpretação do espaço, em especial no contexto brasileiro de museus de arte. Estes se configuram nessa tipologia: Artes visuais – Coleções de pinturas, esculturas, gravuras, desenhos, incluindo-se a produção relacionada à Arte Sacra. Pensar, projetar e conceber um museu de arte carrega um pensamento histórico relacionado ao modo de expor obras e sua relação com teorias. Dentro desses aspectos se encontram os profissionais que atuam na concepção desses espaços: curadores, designers, arquitetos, entre outros. Pessoas que trabalham na disposição dos objetos e podem influenciar ou colaborar no entendimento e apreciação da obra de arte.

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Marina Moraes de Araújo é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). Bacharel em Design Visual pela Universidade Positivo (2010). O presente artigo foi orientado pela profa. MSc. Simone Landal, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Revisão: Veruska Costa Haber. Email: marina.moraes.araujo@gmail.com 41 Simone Landal é Mestre em Comunicação e Linguagens pela Universidade Tuiuti do Paraná (2005), possui especialização em História da Arte, pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná (2001) e graduação em Desenho Industrial - Habilitação em Programação Visual pela Universidade Federal do Paraná (1994). Professora Assistente do Departamento Acadêmico de Desenho Industrial da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. E-mail: simonelandal@terra.com.br SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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A teoria que se estrutura como fio condutor desse artigo é denominado pelo autor O' Doherty (2002) como cubo branco. A forma de pensar o espaço expositivo e sua relação com a cenografia também é apresentado nesse artigo a partir da produção literária de autores como Salcedo (2008) e Rossini (2012). Em contraponto ao cubo branco se estabelece uma outra teoria, da caixa preta, na qual o curador ou outro profissional relacionado a exposição se torna um diretor dos elementos a serem expostos.

Exposições de arte: aspectos pontuais de um percurso histórico As questões de postura são intrínsecas ao Modernismo. O Impressionismo deu início aquela aflição do Espectador inseparável da arte mais avançada. Ao lermos os informes da vanguarda, parece que o Modernismo desfilou por uma enorme angústia sensorial. Dessa vez o objeto de exame torna-se ativo; nossos sentidos são postos à prova (O' DOHERTY, 2002, p. 66).

O cubo branco é um paradigma no ramo de exposições de arte. Um modelo funcional em relação a sua estrutura, mas complexo na sua representação conceitual. Nesse modelo costuma-se resumir o espaço expositivo a paredes brancas, pouco texto de apresentação das obras e quadros alinhados. O' Doherty (2002) apresenta o cubo branco como uma estética estabelecida conforme alguns propósitos de organização: a apresentação dos quadros foi separada e ordenada de maneira que o espectador mantivesse uma linearidade de contemplação. Nesse modelo conceitual, o entorno do museu não está autorizado a ocupar o espaço da galeria. As janelas são lacradas, o chão e o teto não estabelecem relação com as obras. Para O' Doherty (2002), a formalização do espaço da galeria se tornou uma das doenças fatais do modernismo, pois a partir dessa busca de não interferência no contexto da obra e da minimização da sala de exposição, o espectador se tornou passivo ao que estava sendo apresentado, padronizando a experiência de observar uma obra de arte. Para entender como se constituiu essa configuração moderna precisamos pontuar alguns breves pensamentos históricos que nos servirão de embasamento para compreendermos como o modo de expor interfere diretamente no que está sendo exposto. O público europeu do século XVIII e sua relação como os salões parisienses remontam a uma época em que as obras de arte costumavam ser acumuladas em paredes com o intuito de atrair grandes compradores de caráter especulativo. Para Castillo (2008) essa relação de sobrepor obras de arte as desvalorizava, pois proporcionava uma certa confusão do observador ao contemplá-la, fosse ele público ou comerciante de arte. Os primeiros grupos de SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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vanguardas se opunham a esse modelo especulativo, buscando uma individualização dos seus trabalhos em contraponto a essa dispersão ocasionada pela disposição de quadros acumulados um ao lado do outro. Sobre essa mudança de paradigma na passagem do século XX, Castillo (2008) descreve que os grupos de sucessões fundados em Berlim, Viena, Munique, Bruxelas e São Petersburgo e as suas exposições tinham a intenção de apresentar tendências das artes sem os aparatos decorativos dos salões e do gosto burguês. Possuíam como modelo: a arte como unidade, ela deveria ser o ponto principal de observação da exposição e tudo que distraísse esse objeto seria eliminado do campo de visão. Esse pensamento de exclusão do entorno foi caminhando para a padronização do espaço da galeria através das mudanças do pensamento estético moderno. Essa busca por formalização da apresentação da obra de arte foi algo muito presente na reformulação da arquitetura desses espaços. Com a propagação de conceitos através de projetos e construções dos novos modelos de museus, essas teorias se solidificaram como uma prática estrutural, abordando desde a disposição de salas à uniformização da pintura das paredes na cor branca. Kiefer (1998) afirma que as ideias modernistas só vieram se concretizar em forma de projeto na década de 1930, quando Le Corbusier projetou o Museu Sem Fim nos arredores de Paris. O abrigar de grandes acervos e exposições tornou o espaço expositivo objeto de desejo e de aplicação dos conceitos modernos. O modernismo na arquitetura não demorou a chegar na América Latina, sua inovação em relação as propostas de ocupação do espaço trouxeram uma nova visão para o museu e seu entorno. A arquiteta Lina Bo Bardi é uma das representantes desse período no que se refere ao espaço da arte no Brasil. Puppi (2011), quando se refere a obra de Bardi, comenta que um dos avanços do modernismo brasileiro foi a construção de espaços fluídos e transparentes como o edifício do MASP (Museu de Arte de São Paulo). Projetado por Bardi em 1956 e inaugurado em 1968, o projeto interno foi pensado de forma que suas galerias fossem totalmente livres de pilares. Como não havia paredes para pendurar as obras, a arquiteta projetou uma estrutura capaz de permitir que elas ficassem suspensas. A concepção interna de espaço foi projetada para que as obras se destacassem do solo e das paredes, criando um ambiente propício à fruição no primeiro contato visual, somente depois disso que o espectador buscaria um conhecimento contextual da obra.

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Esse suporte tinha como base um cubo de concreto com um recorte na face superior. Um vidro horizontal era encaixado nesse corte, criando uma parede transparente de suporte individual para cada obra de arte. A sequência das obras no salão expositivo não obedecia nenhuma cronologia, como apresenta Puppi (2011). “A intenção é provocar o choque e a curiosidade de investigação” como a própria Lina afirma, referindo-se às instalações do MASP, ainda na rua 7 de abril em 1951, e certamente dar liberdade de percurso ao visitante, único responsável por suas escolhas. (2011, apud ANELLI, 2010, p.100). O MASP, com o passar dos anos e o surgimento de novas propostas de curadoria, modificou sua estrutura inicial, proposta por Bardi, caminhando para um modelo tradicional expositivo. Para Kiefer (1998), essa substituição foi realizada pois o excesso de luz, ocasionado pelas janelas abertas, dispersava a atenção do espectador, e a falta de paredes dificultava a organização das obras no espaço expositivo. Santos (2011) apresenta o conceito da Nova Museologia, movimento internacional que surge nos anos de 1980: “o essencial para a Nova Museologia é o aprofundamento nas questões de interdisciplinaridade e a reflexão crítica sobre a área” (SANTOS, 2011, p. 37). A busca pela investigação e novas práticas de atuação na área de museus passa a assumir um papel fundamental no pensamento conceitual museológico. A preocupação não é mais estrutural, que parte do conceito estabelecido de Cubo Branco, agora o prédio (edifício) passa a se relacionar com um espaço territorial do espectador, se faz necessário relacionar a comunidade e o entorno do museu com o seu patrimônio e estabelecer relações de pertencimento: A Museologia, no pós-guerra, apresenta-se diante de uma sociedade em profunda transformação sociocultural e político-econômica. Os processos informacionais e comunicacionais se aceleram em uma dimensão e uma dinâmica até então desconhecidas, em que a conservação já não é mais suficiente para responder às necessidades do público de museus (SANTOS, 2011 p. 36).

Para Santos (2011), a mudança gradativa na museologia nacional se dá a partir de 1960, mais precisamente entre 1960 e 1980, visando o desenvolvimento social do museu no Brasil. Passando a representar uma visão cultural e legitimando a produção de arte e cultura no país, surge uma necessidade de guardar tradições e histórias e uma crescente importância nos requisitos institucionais e de investimento governamental. No avançar dessas questões acerca do espaço, do contexto e da linguagem, muitas questões foram discutidas no que se refere a disposição de telas no espaço expositivo por SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Bordieu (2003). Em sua pesquisa sobre os museus de arte na Europa ele aborda o receptor e como ele se relaciona com as informações apresentadas na exposição. Para o autor é importante perguntar de que forma o conteúdo pode ser abordado proporcionando uma experiência sensorial e estética ao visitante. Quais são esses elementos importantes para proporcionar o acesso das pessoas aos museus, e sua relação com as obras de arte? Para Bordieu (2003) a obra de arte não existe se os detentores de informação, nesse caso, os curadores e educadores, não possibilitarem meios para decifrar o contexto em que a obra está inserida. A cenografia apresenta como um meio de transpor os elementos da exposição para o espaço através de materiais e estruturas que possibilitam o profissional que está projetando a exposição na abordagem do tema.

Cenografia aplicada à exposição: o modelo da caixa preta Para Rossini (2012), o espaço do museu contemporâneo está cada dia mais flexível pois se adapta a cada nova proposta curatorial, buscando recursos em diferentes áreas do conhecimento e equipes multidisciplinares para construir a narrativa da exposição relacionando o tema com a cenografia aplicada. A cenografia teatral vai além de uma simples representação figurativa do contexto da peça apresentada. Seu campo expandiu para inúmeras possibilidades com o caminhar de sua história assim como o espaço do museu. Rossini (2012) ressalta que a mudança formal de representação não modificou de imediato a interpretação do termo, pois o sinônimo de cenografia ainda persiste no termo de representação pictórica de um determinado espaço. Ele ainda ressalta: “ela é também um elemento narrativo, um auxiliar que permite situar espacial e temporalmente o tema abordado por um texto teatral ou por uma exposição” (Rossini, 2012, p. 02). Outro termo apresentado por Rossini (2012) é de cenografia expandida. Segundo ele, a busca por conceitos que se apliquem às artes visuais é algo constante. A mostra internacional de cenografia (11ª Quadrienal de Praga) teve como tema “Scenography Expanding” e propôs um discurso com diversos profissionais acerca do termo cenografia. No material de divulgação do evento realizado em Riga, Belgrado e Évora, Scenography Expanding Symposia (2010), publicado em língua portuguesa, afirmava-se que : Ao longo da última década, a cenografia e o design de performance têm-se progressivamente deslocado da caixa negra do teatro para um território híbrido, situado na intersecção entre teatro, arquitetura, SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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exposição, artes visuais e media. São espaços simultaneamente híbridos, mediados, narrativos, e o resultado de transformações no entendimento transdisciplinar do espaço e numa consciência distinta de intervenção social. Esses dois fatores de "expansão" podem ser vistos como forças centrais na prática e no pensamento cenográfico contemporâneo" (ROSSINI, 2010, p. 2).

Por outro lado, Salcedo (2008) considera que a cenografia aplicada no espaço do museu assume uma significação semelhante ao espaço da caixa preta teatral. O projetista da exposição tem autonomia simbólica para costurar os temas e obras expostas; essa liberdade criativa nem sempre é apresentada como forma de potencializar a obra de arte e o seu contexto, mas sim como forma da adoção de práticas espetaculares no espaço da arte. Para a autora, as obras assumem uma subjetividade excessiva, semelhante a de um diretor teatral que, ao elaborar uma obra cênica, considera o caráter imaginário dos elementos que está manipulando: cenografia, ator, espaço cênico. No caso do diretor de teatro ou do encenador, que possuem maior autonomia estética para recriar contextos de acordo com a sua proposta criativa, a exposição pode ser vítima de uma esterilização da percepção em prol da experiência do espectador. Tal analogia entre obra expositiva e obra cênica exige uma reflexão crítica e teórica mais apurada. Entretanto, se ela de fato existe, como tentamos revelar com esta pesquisa, a exposição tornou-se um fenômeno de extrema complexidade. Assim como no espetáculo teatral, para usar as palavras de Eleonora Fabião, “muitas são as camadas que compõem e inúmeros os elementos” (SALCEDO, 2008, p. 303).

Para Rossini (2012), é necessário tomar o devido cuidado ao utilizar o termo cenografia expandida, pois, devido a popularização da prática de cenografia em espaços expositivos, costuma-se relacionar essas ações à excessos e elementos supérfluos no projeto. Para ele é interessante compreender como essa nova proposta possibilita e amplia a percepção de linguagens. No contexto dos museus brasileiros de arte, a cenografia aplicada é motivo de crítica nas últimas décadas. Uma das mostras mais comentadas, dentro das propostas cenográficas, é a Brasil + 500 anos, uma exposição que comemorou os 500 anos do Brasil e apresentou obras em meio a cenários projetados por Bia Lessa e outros profissionais. Salcedo (2008) denomina essa exposição como um paradigma das exposições espetaculares pela profusão de elementos sendo que, para a autora, eles se relacionam a uma

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subjetividade excessiva ou uma interpretação superficial, deslocando as obras de arte do seu contexto para vincular a temas preconcebidos. O antigo cenário estático agora convida o público a ser um elemento na construção da narrativa. Para entender é preciso interagir, uma das máximas dessas novas propostas de exposição. Para Menezes (2011) o problema não vem da interação ou dos aparatos interativos mas sim quando acontece a banalização da interação na exposição. Os objetos de arte se tornam “brinquedos”, a novidade do suporte e a camada de simbologia da ferramenta pode anular a espessura no sentido de contemplação e interpretação da obra de arte. Em entrevista a Menezes (2011), o curador de exposições interativas Marcelo Dantas, comenta sobre a utilização de linguagens relacionada ao cinema, interatividade, cenografia em espaços expositivos: Nem todo mundo vai ter a capacidade de entrar em alta densidade com o conteúdo. E tudo bem, as pessoas vão entrando aos poucos. Pode ser que algumas pessoas nunca entrem e faz parte da vida. Se o museu negligenciar as pessoas que vão ver o museu de forma superficial ele está atirando no próprio pé porque ele não está construindo plateia... O museu é um fomentador de interesse, que faz com que você vá buscar esse conhecimento em outras fontes e depois você volte ao museu e reconheça essas fontes nele próprio (MENEZES, 2011, p. 62).

Para exemplificar no contexto nacional a interação em museus, podemos sair um pouco do contexto do museu de arte e pensar na proposta do Museu da Língua Portuguesa, inaugurado em 2006. Surgiu como proposta inovadora de ser o primeiro museu a representar uma língua falada e escrita no mundo. O seu conteúdo se relaciona com o visitante, de maneira a fazer com que ele se envolva com o que está sendo apresentado. Larissa Graça, coordenadora da Fundação Roberto Marinho, em entrevista a Menezes (2011), avaliando as mudanças tecnológicas desde 2006, comentou sobre a importância da mesa interativa que conectava as palavras no Museu da Língua Portuguesa e fornecia o significado para o visitante. Esse objeto se tornou um marco desse conceito cenográfico interativo no Brasil. Hugo Sukman ao apresentar esse tema, também em entrevista a Menezes (2011), distingue a concepção de museu de arte e narrativo. No caso dos museus contemporâneos as exposições são necessariamente narrativas, precisam contar uma história e partir de algum contexto, frase, tema, como é o caso no Brasil: Museu do Futebol, Língua Portuguesa, Minas e metais, Gente Sergipana, Catavento Cultural entre outros espaços inovadores inaugurados nos últimos anos. SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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No caso dos museus de arte, a liberdade criativa se restringe ao contexto histórico que esse espaço agrega e a concepção simbólica que se restringe. Todos esses projetos citados acima têm como instituição idealizadora a Fundação Roberto Marinho, que concebe com profissionais o conceito desses museus e se torna uma das instituições responsáveis pela realização desses espaços. Nos últimos anos, após o grande sucesso de crítica e público dos museus de conhecimento, a instituição FRM – Fundação Roberto Marinho, em parceria com a prefeitura do Rio de Janeiro, concebeu o MAR- Museu de Arte do Rio. Um museu diferenciado em sua proposta curatorial, pois busca relacionar todo seu conteúdo com a identificação da cultura carioca e se configura como um laboratório de propostas estéticas, discutindo o que tem de mais novo em teoria no modo de expor obras de arte e sua relação com o público. A gerente de projeto da Fundação Roberto Marinho, Larissa Graça, em entrevista a Menezes (2011), fala que para os projetos da FRM são considerados os conteúdos de interação em três níveis: o hand-on (o conteúdo pode ser tocado e manipulado), minds-on (ao ser tocado o conteúdo transmite uma mensagem ou conhecimento) e hearts-on (ao ser tocado ele transmite conhecimento, emociona e encanta). Ela conta que a FRM já busca um quarto nível de interação em exposições nos museus no Rio de Janeiro. O quarto nível de interatividade seria uma surpresa para o visitante, a transformação no espaço expositivo aconteceria através de um movimento do espectador, ocasionando uma reação não esperada. Tratando-se da interação em exposições, o curador Marcelo Dantas, em entrevista a Menezes (2011), ressalta que não é só uma relação de dispositivos digitais que trabalham e abordam o tema da interação:

Quando o museu usa essa frase “não me toque” ele está criando um abismo da possibilidade de emocionar essa pessoa. Eu acho que o toque é simbólico, não só interativo... Interatividade é uma coisa que vai muito além de apertar botões ou telas, interatividade é, acima de tudo, você entender que são pessoas se relacionando com pessoas, assim como a internet não é a ligação de múltiplos e múltiplos computadores, mas sim de múltiplas e múltiplas pessoas. A interatividade é colocar múltiplas e múltiplas pessoas juntas (MENEZES, 2011 p. 58).

MAR - Museu de Arte do Rio, concepção do seu espaço e a proposta de suas exposições O Museu de Arte do Rio foi construído através de uma iniciativa da Prefeitura do Rio de Janeiro com apoio do Governo do Estado do Rio de Janeiro e do Ministério da Cultura, em SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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parceria com a Fundação Roberto Marinho, tendo a Vale e o Itaú como patrocinadores. Tem administração do grupo Odeon, associação privada sem fins lucrativos. Essa iniciativa da prefeitura do Rio de Janeiro faz parte de um projeto denominado Porto Maravilha, que tem como propósito a revitalização da região portuária da cidade. O museu foi inaugurado em 1º de março de 2013. O MAR está relacionado as ações de valorização do patrimônio histórico da região portuária do Rio de Janeiro e com a aproximação do Museu com o Morro da Conceição. O conceito do espaço foi pensado de forma que os moradores da região se identificassem através das exposições e atividades de preservação dos bens culturais. O Museu já nasceu com uma Escola do Olhar ao lado, cuja proposta museológica é inovadora: proporcionar o desenvolvimento de um programa educativo de referência nacional e internacional, relacionado ao programa curatorial que norteia as exposições. Com essa proposta, o MAR não se configura como um simples museu de arte, mas como um complexo educativo de divulgação do pensamento cultural e educativo no ramo das artes. Paulo Herkenhoff, diretor cultural do museu, em palestra na PUC/SP, apresenta que o projeto no início foi pensado como um local para abrigar coleções, sendo a ideia inicial transformar o espaço na Pinacoteca do estado do Rio de Janeiro. Ao ser perguntado sobre o modelo ele comentou que essa estrutura se tratava de algo anacrônico para a realidade atual da museologia no país e no mundo. Nesse pensamento de propor uma nova forma de olhar o modo de expor e a idealização do espaço expositivo, O MAA busca transpor o cubo branco e relacionar suas exposições a um ambiente mais híbrido e fluído em sua essência. Com essas relações estabelecidas, suas mostras possuem uma abertura para análise da cenografia aplicada a exposição no espaço do museu, relacionando a curadoria com elementos estruturais de disposição das obras. Um lugar onde se propõem inovar, no seu contexto, e abre espaço para projetos inovadores de disposição dos elementos estruturais. As exposições selecionadas para análise nesse artigo, são referentes a dois períodos do museu (2013-2014). A primeira selecionada para análise, foi uma das mostras de abertura: O CO-LE-CI-O-NA-DOR: arte brasileira e internacional na Coleção Boghici (2013). Tinha como objetivo apresentar como foi disposto o pensamento de exposição do colecionismo, um modelo bem tradicional no ramo das artes. As outras duas exposições analisadas foram: Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas- Arte e Sociedade 2 (2014) e TATU: Futebol, Adversidade e cultura de caatinga (2014).

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A exposição de abertura, O CO-LE-CI-O-NA-DOR: arte brasileira e internacional na Coleção Boghici (2013), tendo projeto cenográfico de Daniela Thomas e Felipe Tassara, levou a público 136 obras do acervo do marchand Jean Boghici, um dos colecionadores com mais tempo de atividade no Rio de Janeiro. Dentre os artistas expostos na mostra: de Tarsila do Amaral a Lygia Clark, de Di Cavalcanti a Brecheret, de Kandinsky a Debret, de Rodin a Max Bill, entre outros grandes artistas dos últimos séculos. O curador Leonel Kaz fala sobre a prática do trabalho do Marchand e sua relação com o projeto cenográfico de Daniela e Felipe. Para ele, a relação de disposição das obras no espaço expositivo, de forma desordenada, permite o espectador caminhar pelo trabalho do colecionador. Como não possui um tempo cronológico e indutivo de cada quadro, o visitante buscava um interesse conceitual ou simbólico. Para o curador, o trabalho de cenografia e expografia representou de forma exemplar as duas salas: explosão e espiral, as obras se encontram soltas no ar, um conjunto de obras que não possui uma sequência lógica. Podemos retomar o pensamento do princípio desse artigo e o trabalho de Lina Bo Bardi no MASP e de como o conceito de estruturas e telas, flutuantes no espaço expositivo, foi implantado de forma a simbolizar a mente de um colecionador. Guimarães, Amora e Coelho (2010) relacionam aspectos da cenografia de exposições no Brasil e sua relação com Lina Bo Bardi, precursora nessa atuação. Partindo de uma análise de retrospectiva do trabalho da arquiteta e designer de exposição, a mostra O CO-LE-CI-O-NA-DOR no MAR busca um referencial estético e formal com os princípios de Lina de dispor objetos no espaço expositivo. Podemos perceber alguns elementos em comum na mostra O CO-LE-CI-O-NA-DOR e na exposição de abertura do MASP, já citada no início desse artigo. A base formal e seus elementos de construção possuem semelhanças de materiais: o concreto foi utilizado como base de suporte para os quadros nos dois casos, mas ao invés do vidro (MASP), no Museu do Rio as obras foram penduradas com cabos de aços, permitindo um intervalo das telas com o vazio, a obra de arte paira como se estivesse livre da parede. A segunda exposição a ser analisada é: Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas- Arte e Sociedade 2 (2014). É uma mostra que faz parte de um pensamento de curadoria do museu que discute algumas questões da sociedade brasileira, nesse caso envolvendo a educação e como alguns artistas representam o tema. Como forma de organizar as obras e envolver o visitante, foi pensado um ambiente cenográfico e alguns objetos de interação dentro do espaço expositivo: ao entrar na mostra o espectador encontra um ambiente de sala de aula (Imagem 01), disposto com carteiras e

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alguns quadros e esculturas. Todo o entorno faz com que o espectador busque no seu referencial simbólico do ambiente da sala de aula e possibilite retomar na memória o ambiente escolar. Ao sair desse espaço foi instalada uma rampa com uma faixa amarela (Imagem 02), que encaminha para uma segunda sala de paredes brancas. Na entrada da sala, no chão, lê-se a seguinte frase: Atenção cuidado com o vão entre o trem e a palavra . Um elemento de advertência e interação com o espectador provoca uma pausa no deslocamento do visitante e uma modificação no sentido e percepção do espaço do museu.

Imagem 01- Fotografia: Marina Moraes

Imagem 02- Fotografia: Marina Moraes

A terceira, e última mostra é o TATU: Futebol, Adversidade e cultura de caatinga (2014) que trata de uma confluência entre a questão do futebol em um contexto de Copa do Mundo no Brasil e sua representação através do mascote Tatu Bola. Além do espaço expositivo, ela se espalha pelo museu ocupando a passarela que une a Escola do Olhar ao Pavilhão de Exposições. Na entrada do Museu o visitante já pode perceber a grama sintética em todo piso, e as mesas de futebol de botão proporcionam atividades inusitadas aos visitantes. Assim como na exposição Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas- Arte e Sociedade 2 (2014), as obras de arte expostas na mostra do TATU se relacionam com o contexto proposto pela curadoria. A proposta cria uma narrativa com as obras de artes, objetos e elementos cenográficos que em alguns momentos se confundem entre si. Na imagem (03) podemos ver uma estrutura cenográfica central, no qual era inteira pintada de azul com uma cartaz vermelho escrito em amarelo a seguinte frase: Existe azul mais bonito do que o meu?

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Essa interação dos espaços e a obra proporcionam uma provocação ao espectador. Ao perceber se os elementos fazem ou não parte da cenografia da exposição, onde começa ou onde termina a obra de um ou outro artista, o espectador se relaciona de uma forma diferente com o que está sendo exposto. Esses limiares se misturam, tornando-se um elemento único dentro do contexto. Desenhos pintados na parede, como na imagem (04), cores diversas e estruturas irregulares fazem com que o visitante não passe despercebido por detalhes e pela profusão de elementos e obras de arte.

Imagem 03- Fotografia: Marina Moraes

Imagem 04- Fotografia: Marina Moraes

Conclusão Essa pesquisa possibilitou investigar como tem se configurado o espaço do Museu de Arte do Rio através da análise de três exposições, no período de 2013-2014. Localizados nas principais capitais culturais do país, Rio de Janeiro e São Paulo, o MASP- Museu de Arte de São Paulo e o MAR- Museu de Arte do Rio foram o fio condutor dessa pesquisa, pois a partir de suas propostas expositivas apresentaram formas inovadoras, no que se referem ao espaço expositivo e sua relação com o visitante. A pesquisa acerca da cenografia aplicada a exposições possui muitas aberturas pra novas pesquisas. O tema por ser amplo possui diversas interpretações e reflexões, que vão desde práticas teatrais aplicadas ao ambiente de exposição até buscar uma análise com relação a linguagem abordada nos dois meios. Esse artigo teve como intenção relacionar algumas práticas cenográficas a prática autoral do curador, designer ou arquiteto no que se refere a montagem de exposições.

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No desenvolvimento desse artigo, vários assuntos se mostraram possíveis de abordagem numa futura pesquisa. O MAR, por se tratar de um museu novo, recém inaugurada, também possui uma abertura para novos pensamentos e artigos, alguns temas precisam voltar a ser analisados com mais calma, a partir de uma estruturação do pensamento museológico e a realização de outras montagens. Como no caso do MASP, o MAR só vai definir e firmar um estilo institucional após algum tempo de atuação. Dessa forma, a pesquisa fica em aberto, merecendo um acompanhamento com novos trabalhos e uma nova avaliação quando os museus no entorno do MAR, na Zona Portuária do Rio de Janeiro, também forem inaugurados. Há questões que poderiam ser tratadas futuramente, como o estudo do hipertexto, realidade aumentada e novas mídias nos museus interativos e como essas práticas se relacionam na apresentação das obras de arte. Leonel Kaz diz que: “Museu é lugar de experiência. Tudo o que é pode não ser: há uma mágica combinatória em todas as coisas, como as crianças nos ensinam. Tudo pode combinar com tudo, independente de critérios, ordenamentos, hierarquias. A ordem do Museu pressupõe a desordem do olhar. ” (Leonel Kaz, curador do MAR- Museu de arte do Rio).

Referências: APRESENTAÇÃO do Projeto Porto Maravilha. Disponível em: <http://www.slideshare.net/viniciusmoro/projeto-porto-maravilha > Acesso em 20 ago. 2014. BOURDIEU, Pierre; DARBEL, Alain. O amor pela arte: os museus de arte na Europa e seu público. Trad. Guilherme João de Freitas Ferreira. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo: Zouk, 2003. FUNDAÇÃO Roberto Marinho. Disponível em <http://www.frm.org.br/main.jsp?lumPageId=FF8081811F27C555011F37254F73287F&lumI temId=FF8080812B758CD4012BCFF2B3CF5DF6%20%20%20> Acesso em 1 set. 2014. GUIMARAES, Cêça; AMORA, Ana Albano; COELHO, Ricardo. Aspectos da cenografia de exposições no Brasil e a ação precursora de Lina Bo Bardi. In: 2º Seminário Internacional: Museografia e Arquitetura de Museus. Identidades e comunicação, 2010, Rio de Janeiro. Anais do 2º Seminário Internacional: Museografia e Arquitetura de Museus. Identidades e comunicação. Rio de Janeiro: FAU/PROARQ, 2010. KIEFER, Flávio. MAM/RJ, MASP - Paradigmas Brasileiros na Arquitetura de Museu. Tese de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS, Brasil, 1999. MENEZES, Natassja Oliveira. O Boom de museus interativos no Rio de Janeiro: Linguagem e Democratização da cultura. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 2011

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MINISTÉRIO da Cultura, Santander e São Carlos apresentam: O CO-LE-CI-O-NA-DOR: arte brasileira e internacional na Coleção Boghici. Disponível em: <http://www.museudeartedorio.org.br/pt-br/exposicoes/atuais?exp=7> Acesso em 1 set. 2014. O COLECIONADOR: Leonel Kaz fala sobre mostra que reúne obras do acervo do marchand Jean Boghici. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=BioJzgUxx6U> Acesso em 1 set. 2014. O COLECIONADOR: marchand Jean Boghici fala sobre seu acervo e a mostra no MAR. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=qSJ8c7Q5mgU > Acesso em 1 set. 2014. O COLECIONADOR: Stella Tennenbaum fala sobre a cenografia da mostra. Disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=HiO1-2NPbQ8 > Acesso em 1 set. 2014. O' DOHERTY, Brian. No Interior do Cubo Branco: A ideologia do espaço da Arte. Tradução de Carlos Mendes Rosa. São Paulo; Martins Fontes, 2002. (Coleção a) PALESTRA com Paulo Herkenhoff - Arte: História, Crítica e Curadoria (PUC/SP). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=xls-a3sPTZ8> Acesso em 01 dez. 2014. PUPPI, S.O.F. Lina Bo Bardi é o Museu Imaginário de André Malraux. In: 9 SEMINÁRIO DOCOMOMO BRASIL- Interdisciplinaridade em documentação e preservação do patrimônio recente. Brasília, 2011. ROSSINI, Élcio. Cenografia no teatro e nos espaços expositivos: uma abordagem além da representação. In: Transformação vol.24 no.3 Campinas Sept./Dec. 2012 SANTOS, Vania Carvalho Rôla; Gestão, informação e comunicação museológica: um estudo comparativo entre pequenos e médios museus brasileiros e Franceses. Orientadora: Helena Maria Tarchi Crivellari. Tese (doutorado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Ciência da Informação, 2011.

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11. A RELAÇÃO ENTRE CONCEITOS DE ARQUITETURA DE INTERIORES E CENOGRAFIA EM LOJA CONCEITO Keila Rafaela Zeni42

Resumo: Este artigo descreve alguns dos preceitos de Arquitetura de Interiores e Cenografia que norteiam a execução de um projeto para uma loja conceito, visando salientar a importância de integrá-las para o bom atendimento do seu público-alvo e em consequência valorizar sua visibilidade no varejo. Para tanto foi realizado um estudo de caso no projeto da Flagship Store Barneys em Nova Iorque que recebeu a Gaga´s Workshop no período de Natal de 2011. Por meio da pesquisa bibliográfica e a luz do referencial teórico, podem-se constatar diversos aspectos desta relação, como o entendimento do espaço em prol do cliente ou expectador, assim como observar a diferença entre uma loja comum e uma loja conceito. Em uma loja conceito, os diversos ensinamentos provenientes destas duas áreas, são aplicados de tal forma que a organização do espaço ultrapassa a noção de ornamentação e de apenas decoração; torna-se um espaço em que se impõe historicidade e significados. Palavras-chaves: arquitetura, cenografia, loja conceito.

Introdução As atividades de Cenografia têm se expandido com o passar dos anos de modo que vem alcançando uma multidisciplinaridade de atuação. Não a encontramos somente no teatro, mas também em exposições, cinema, televisão, entre outros. A Arquitetura de Interiores é mais um desses campos que vem se relacionando com a Cenografia. Diversos ambientes internos em residências e espaços comerciais já contam com esta integração. Por meio de uma pesquisa bibliográfica, percebeu-se que a correlação da Arquitetura de Interiores e Cenografia é comumente aplicada na prática, mas é carente de estudos aprofundados, principalmente quanto à elaboração de um projeto de loja conceito. Dessa maneira sentiu-se a necessidade de buscar referenciais teóricos e aplicá-los na análise de uma loja, a fim de responder a seguinte questão de pesquisa: Quais conceitos de Cenografia estão vinculados ou contribuem para a Arquitetura de Interiores ao se projetar uma loja conceito? 42

Keila Rafaela Zeni é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). É Bacharel em Arquitetura e Urbanismo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2011). Arquiteta no escritório Kompasso Arquitetura em Curitiba/PR. O presente artigo foi orientado pela profa. Dra. Laíze Márcia Porto Alegre, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Revisão: Larissa Bonacin. E-mail: contato@kompassoarquitetura.com.br SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Com base na problemática da pesquisa, este estudo se aprofundará na análise da Cenografia e Arquitetura de Interiores, e refletirá sobre a sua aplicação na montagem da Flagship Store Barneys de Nova Iorque que recebeu a Gaga´s Workshop no período de Natal de 2011. Este estudo fundamenta-se na pesquisa bibliográfica, baseando-se em publicações e sites, já que o acesso à loja física não se tornou possível. Coube elencar esta loja para o estudo de caso, pois na Cenografia temos a participação do artista brasileiro Eli Sudbrack, reconhecido internacionalmente pelos seus trabalhos cenográficos, e com diversos trabalhos no Brasil, tais como a fachada e interior da loja conceito Melissa em dezembro de 2011, em São Paulo. O termo loja conceito tem origem nas chamadas Flagship Store, que surgiram no final dos anos 90 em países pertencentes à Ásia e Europa aliando referências de moda, comércio, e cultura. A palavra Flagship, pode ser traduzida como Navio-Almirante, o que representa o navio em que viaja a mais alta patente oficial nas forças navais, o Almirante ou Comandante. Quando identificamos uma loja como Flagship Store, rapidamente a importância deste espaço no varejo torna-se muito maior. Tal denominação refere-se ao local em que a marca escolheu para mostrar ao seu público-alvo toda sua essência mercadológica. É o local em que seu produto vai ser exposto com a finalidade de maximizar o interesse de aquisição por parte de seus consumidores. Logo, para se tornar uma loja conceito é de suma importância o entendimento do seu espaço e que este dialogue com os interesses do varejo e dos clientes. A relevância do assunto proposto é justamente pela carência de estudos relacionados a esta integração dos profissionais da área de Arquitetura e Cenografia ao projetar-se uma loja. É assunto de interesse, sobretudo das duas áreas em questão, bem como lojistas, designers e demais profissionais envolvidos nesta categoria de projeto. A seguir serão abordados os temas referentes à concepção de projetos para espaços comerciais no ramo do varejo.

Espaço Quando pensamos em Cenografia ou Arquitetura de Interiores inevitavelmente relacionamos a um espaço. Desta maneira vale aqui relacionar alguns conceitos sobre o tema.

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Para a Cenografia e logo, para o teatro, primeiramente pensamos em um palco, como espaço físico para encenações, mas sabemos que além do palco, a cena pode estar estruturada em diversos lugares: escolas, praças, igrejas, residências. Desta maneira, interessa-nos o entendimento de algumas definições: espaço teatral, espaço cênico, e espaço interior. Para Pavis (2003), o lugar teatral ou espaço teatral se define dentro de um edifício teatral ou nos mais diversos locais, bastando apenas que haja o conjunto da encenação e plateia. Com a transformação das arquiteturas teatrais – em particular o recuo do palco italiano ou frontal – e o surgimento de novos espaços – escolas, fábricas, praças, mercados etc. -, o teatro se instala onde bem lhe parece, procurando, antes de mais nada, um contato mais estreito com um grupo social, e tentando escapar aos círculos tradicionais da atividade teatral. (PAVIS, 2003, p. 138)

Agora quando falamos em palco, ou local propriamente da encenação, para Pavis (2003, p.133) trata-se do espaço cênico, “[...] o espaço concretamente perceptível pelo público na ou nas cenas [...] É quase aquilo que entendemos por ‘a cena’ de teatro. O espaço cênico nos é dado aqui e agora pelo espetáculo, graças aos atores cujas evoluções gestuais circunscrevem este espaço.” Será no espaço cênico que o cenógrafo irá idealizar e construir seu projeto, o local em que a realidade estará representada. A última definição de Pavis para espaço que se torna importante esclarecer é o espaço interior, que para Arquitetura de Interiores possui um significado oposto, mais físico. O espaço interior para o Teatro está relacionado ao papel do expectador em relação à peça assistida. A questão da catarse aqui é levantada, assim como o expectador estar envolvido emocionalmente com a encenação, relacionando-a com experiências pessoais, suas memórias; vivenciar mentalmente, imagens e outros espaços além daqueles apresentados na peça. Pavis (2003, p.136) define que “o teatro é também o local no qual o espectador deve projetar-se (catarse, identificação). A partir de então, como que por osmose, o teatro se torna espaço interior.” Já para Arquitetura de Interiores, quando falamos em espaço interior, estamos nos referindo a um espaço interno a uma edificação. Os planos das paredes e tetos definem este espaço, juntamente ao sistema estrutural neles contidos.

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A partir disso poderíamos já pensar no que irá definir um espaço interior arquitetônico em um espaço cênico, para que dessa maneira pudéssemos reconhecer a Cenografia como parte integrante da Arquitetura de Interiores. A encenação ficará por conta dos clientes que irão interagir com os produtos expostos. Podemos dizer que tratar um espaço dessa maneira fará com que ele se torne ainda mais cheio de significados, visto que o espaço interior fará sentido para quem o experimenta. O espaço se definirá por meio da junção do que concretamente existe, mas também irá remeter ao que o espaço simboliza como signo43. Tendo em vista estes conceitos, vale refletir sobre a relação visual entre o cliente e este espaço cênico em uma loja conceito.

Relação Visual O cliente antes de decidir se irá adquirir algum produto, passará pelo momento de observação do espaço. Claro que aqui teremos influências diversas nesta relação visual, como fatores sociais e ambientais, tais como seu próprio humor, o atendimento que lhe será oferecido e até mesmo a situação climática. Para Cenografia, o espaço deixa de ser apenas significante tornando-se significado, quando há identificação do usuário, expectador ou cliente com o que está sendo visto. Ou seja, ao pensarmos em uma loja, o significante será o lugar onde se vendem vários produtos, já o significado será concretizado através da cenografia e a relação entre o cliente e o produto ali exposto. Nesta relação, diversos aspectos serão observados e que às vezes são sutilmente tratados em um ambiente: a linha, a forma, a direção, a textura, a cor, a luminosidade. E todos estes elementos deverão estar dispostos em equilíbrio. O equilíbrio será entendido como a relação harmônica entre objetos introduzidos e distribuídos em um espaço interno, o relacionamento mútuo entre figura e fundo. Para Arquitetura, de acordo com Ching (2013),

O espaço não é uma matéria concreta como a pedra ou a madeira. É um vapor inerentemente difuso e sem forma. O espaço universal não tem definição. Uma vez

43

A definição clássica de signo é algo que é usado, referido ou tomado no lugar de outra coisa. A palavra signo, portanto, pode abarcar desde os "signos naturais", também chamados de índices ou sintomas, como as nuvens carregadas e a fumaça, que indicam (são índices de) chuva e fogo, respectivamente; até os signos substitutivos (ícones), como a maquete de um edifício, a planta de uma casa ou o retrato de uma pessoa e os símbolos (a bandeira de um país, a suástica, a estrela de David, etc.) [...]Em termos simples, um signo é toda unidade portadora de sentido. (SCHAFF, 1968) SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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que um elemento é colocado em seu campo, contudo, é estabelecida uma relação visual. À medida que outros elementos são introduzidos no campo, diversas relações se estabelecem entre o espaço e os elementos, bem como entre os próprios elementos. O espaço, então, é formado por nossa percepção e tais relacionamentos. (CHING, 2013, p. 2)

A linha é um elemento essencial na formação de qualquer construção visual. Será a partir dela a criação de texturas, formas e o do entendimento do espaço a ser trabalhado. As formas lineares: horizontais, verticais, diagonais e sinuosas, adotam diversas posições no espaço, definindo relacionamentos e estabelecendo padrões entre os elementos de projeto. Estes padrões, por vezes, tornam-se texturas, ou seja, linhas que são dispostas de certa maneira a descrever suavidade ou rugosidade. Segundo Ching (2013), há dois tipos básicos de textura. A textura tátil é real e pode ser sentida por meio do tato; a textura visual é percebida pelos olhos. Todas as texturas táteis também conferem textura visual. A textura visual, por outro lado, pode ser ilusória ou real. Já a luz influencia na percepção das texturas e nos demais elementos dispostos no espaço. A iluminação, em uma loja, servirá não apenas para destacar um ponto focal, iluminar os corredores ou simplesmente fazer uma luz geral, cada aplicação pode receber um significado. Se esta estiver dentro de um contexto de historicidade, sua cor, seu movimento irão transmitir sensações aos que veem. Conforme diz Gurgel (2010), em Arquitetura:

Luz e cor não podem e não devem ser pensadas independentemente. A quantidade, o tipo e a qualidade da luz podem alterar completamente uma cor. Uma determinada cor pode alterar completamente a quantidade, o tipo e a qualidade da luz incidente e refletida sobre ela. Portanto, elas devem ser pensadas em conjunto. [...] A iluminação é uma das principais ferramentas utilizadas para iludir nosso olhar, simular alterações nos espaços ou ainda tapear nossos sentidos. (GURGEL, 2010, p. 38/39)

Assim textura, cor e luminosidade são principais elementos que irão definir dramaticidade ao espaço. Como diz Nero (2009), para o cenógrafo é necessário dominar volumes, cores, luzes, para que ela sirva ao momento histórico, ao clima dramático e aos conflitos contidos na obra a ser representada. Dessa forma, podemos entender que a dramaticidade está relacionada tanto a prática da Arquitetura de Interiores, quando estudamos que sensações as texturas, cores e luzes podem exercer sobre quem as observa, como na Cenografia onde a dramaticidade refere-se ao SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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conflito da combinação destes elementos a fim de tornarem-se signos, transmitindo uma história a ser absorvida ou sentida pelo expectador (cliente). A relação visual, então, ficará completa quando todos estes elementos estiverem bem definidos em harmonia, suas intenções não necessariamente ficarão claramente visíveis, mas é importante que aquilo que será visto provoque alguma reação no expectador. Em uma loja conceito, para se estabelecer a relação visual entre cliente e produto, podemos salientar também a importância da existência de alguns aspectos funcionais e estéticos, para assim a definirmos como espaço cênico.

Aspectos Funcionais Gurgel (2010) descreve como design a arte de combinar formas, linhas, texturas, luzes e cores para criar um espaço ou objeto que satisfaça três pontos fundamentais: a função, as necessidades objetivas e subjetivas dos usuários e a utilização coerente e harmônica dos materiais. Então, ao projetarmos uma loja, um dos itens que devemos nos ater serão as funcionalidades internas deste espaço. De acordo com Parente (2000, p.294), a atmosfera da loja “[...] é criada utilizando os recursos da apresentação externa e interna da loja, das soluções de layout e da forma de exposição dos produtos, incluindo sua linha de produtos, seus preços e o pessoal de atendimento”. Segundo o autor, a apresentação externa destaca-se como forte influência na percepção do cliente sobre a qualidade da loja. Já o ambiente interno ajuda a manter o cliente estimulado ao processo de compra. Não cabe aqui citar muitos aspectos de marketing em varejo, mas o que Parente diz já nos é suficiente para entender a importância da disposição geral externa e interna de uma loja para que seja estabelecida uma boa relação visual. Sobre aspectos externos, vale salientar que alguns fatores como localização, fachada, visibilidade da loja em relação à rua, são de extrema importância para atrair clientes. Nesta transição entre o projeto Arquitetônico e a Arquitetura de Interiores, localizamos a vitrine. A vitrine tem por objetivo causar impacto a quem passa e ser uma das melhores formas de atrair a atenção de prováveis clientes. A Cenografia torna-se essencial neste momento, como diz Tony Morgan (2008, p.50), “as vitrines assumem uma história ou incorporam outros elementos e adereços, que podem ter

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algo em comum com a mercadoria ou não possuir nenhuma conexão, embora haja um equilíbrio artístico entre adereços e produtos.” O espaço da vitrine deve ser projetado lembrando que a vida útil do que ali se expõe é curta, devendo ser atualizado constantemente. Uma boa estrutura de iluminação deve estar à disposição, possibilitando montagens diversas, exposição de obras de arte, montagens eletrônicas e até mesmo performances. Quando analisamos o espaço interior da loja, Morgan (2008, p.112), em seu livro sobre Visual Merchandising44, explica que ao questionar os consumidores sobre os fatores que determinam suas lojas preferidas, a maioria provavelmente responderá que o espaço é agradável, os produtos são facilmente encontrados e a sinalização é clara e explicativa. Logo, para garantirmos a facilidade de localização de produtos, a primeira definição a ser discutida quanto à funcionalidade em uma loja diz respeito ao layout e sob quais aspectos os produtos ali expostos estarão submetidos para que seja exercido o ato de comprar com conforto e dinamismo. Este deverá ser projetado de maneira lógica, incentivando o cliente a circular pela loja e vivenciar a totalidade do seu espaço. Podemos citar que o agrupamento de produtos, a largura dos corredores, a localização do caixa são alguns dos itens a serem considerados no layout. Para projetar, então, deve se iniciar pela seleção de produtos a serem comercializados e a correlação dos mesmos. Para Morgan (2008), “Além da correlação dos produtos deve-se planejar a localização das categorias de produtos ou marcas mais importantes, que deverão estar nas melhores zonas do estabelecimento. Essas marcas e produtos ajudam o cliente a entender o que é vendido na secção ou na loja, além de reforçar a qualidade da mercadoria comercializada.” (MORGAN, 2008, p. 114)

Vale aqui ressaltar o estudo minucioso quanto às dimensões ideais e os espaços necessários para os produtos correlacionados. É importante identificar que características qualitativas se deseja ressaltar para que o estabelecimento se destaque e seja escolhido pelos clientes.

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Visual Merchandising é qualquer técnica, ação ou material promocional usado no ponto-de-venda, que ofereça informação e visibilidade a: produtos, marcas ou serviços, motivando e influenciando as decisões de compra dos consumidores. (Acessado em 08/08/2014: http://marcianassrallah.com.br) SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Com essa definição em mente, o layout poderá estar disposto sob duas formas de circulação: livre ou forçada. A circulação quando dita livre (FIG. 1), refere-se a não definição de uma condução contínua do cliente a um destino pré-definido, que chamaríamos de forçada, mas mesmo assim permite a identificação de setores.

Figura 01 – Croqui de planta de loja com circulação livre Fonte: Keila R. Zeni

Um dos fatores mais importantes ao projetar uma loja, seria definir certos pontos focais, tais como: a marca, um produto recém-lançado, uma instalação ou obra de arte e até mesmo o caixa. E estes pontos focais devem formar certas linhas visuais dentro do espaço e logo um caminho a ser percorrido. Quando se diz circulação forçada (FIG. 2), significa que este caminho a ser percorrido permite ao cliente muitas opções de deslocamento, mas de maneira “forçada”, pois o cliente orienta-se ao destino desejado por meio de expositores e demais elementos dispostos no ambiente.

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Figura 02 – Croqui de planta de loja com circulação forçada Fonte: Keila R. Zeni

Esta orientação também contará com o uso de diferentes materiais, cores, o próprio desenho de piso e forro, assim como a iluminação. Uma boa sinalização contribui para orientar os deslocamentos. É importante lembrar que ao utilizar gôndolas e expositores em meio à circulação deve-se considerar uma altura que não impeça a visualização total do interior da loja. Manter o cliente com uma visão ampla permite que ele possa interagir de maneira mais dinâmica com os produtos, além de auxiliar os vendedores na visualização e prontidão para atendê-los. A acessibilidade deve ser planejada de maneira a facilitar o tráfego de cadeiras de rodas e carrinhos de bebê. O espaço entre os corredores deve permitir preferencialmente uma via de mão dupla, em que o cliente possa circular sem esbarrar nos produtos. Ao garantir um bom atendimento, o cliente poderá se deslocar eventualmente aos provadores e sanitários. Estes devem estar reservados em uma área mais isolada do grande fluxo da loja e ter fácil acesso para o auxilio dos vendedores. Para os provadores, oferecer uma boa área de espelhos e uma iluminação que não interfiram na cor dos produtos também é essencial. Por fim, após permitir que o cliente circule por todos os setores da loja, é preciso facilitar o seu deslocamento para os balcões de caixa para assim concretizar a compra. Normalmente estará localizado no final da loja. Demais áreas auxiliares (administração, estoque, copa, entre outros) devem possuir acessos discretos e que não interfiram no atendimento da loja.

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Ao definirmos os aspectos funcionais em uma loja conceito, não podemos esquecernos de analisar os aspectos estéticos, os considerando não somente como decoração para assim o definirmos como espaço cênico.

Aspectos Estéticos Grewal e Baker (2002) descrevem os fatores de design como aqueles que apresentam características visuais, sejam elas funcionais ou estéticas. Os autores definem que o layout da loja (agrupamento de produtos, largura dos corredores, localização dos caixas) e o conforto oferecido são características funcionais, enquanto a arquitetura do local, as cores e os materiais utilizados, o estilo e a decoração são características estéticas. Ao citar aspectos estéticos cabe aqui analisar que não utilizamos apenas de decoração para a elaboração de um espaço cenográfico. Conforme Nero (2009): “Na maioria dos casos, a cenografia não se oferece como panacéia de marketing, não vem apenas para ajudar a vender, mas dá sentido ao que se queria dizer, empresta estilo, luz, projeções, cor, humanismo e grandeza. Lembra espaços em muitos estilos, proporciona evocações, desenha movimentos simbólicos, atribui historicidade.” (NERO, 2009, p.100). Este trecho descreve um pouco do conceito geral que se propõe também à aplicação da Cenografia em uma loja conceito. Para um resultado realmente satisfatório de um projeto, neste caso, é necessário aliar a historicidade ao produto. Dessa maneira o cliente sentirá mais próximo da marca, fazendo possíveis conexões entre sua própria história e a do produto. Quando descrevemos que não basta apenas a decoração, logo devemos nos perguntar, qual seria a diferença entre decoração e Cenografia. Existiu um período na história da Cenografia em que se podia dizer que o cenógrafo estaria muito próximo de ser um decorador, pois a sua função estava resumidamente em adornar o teatro, como para os gregos ou a utilização de painéis pintados com imagens em perspectivas, como no Renascimento. O termo Cenografia passou a ser utilizado, a partir do final do século XIX, com a intenção de diferenciar o conceito de cenário teatral de uma decoração de ambiente, ou seja, a Cenografia passou a ser uma arte da organização do palco e do espaço teatral, devendo ser útil, eficaz e funcional, além de servir como instrumento à encenação e não uma ornamentação. Para o Teatro, a Cenografia deixa de ser um elemento meramente ilustrativo, para tornar-se um dispositivo visual que participa na comunicação ao público, ou seja, não

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apresentará apenas uma imagem que representa onde uma determinada ação ocorre. Haverá uma disposição e até mesmo uma proposição que provocará no expectador, interpretações sobre aquilo que está sendo encenado e o próprio ator poderá se utilizar deste cenário como apoio ou argumento a sua interpretação. Para o projeto de uma loja conceito, podemos aplicar esta definição ao observarmos dois exemplos de lojas a seguir. No exemplo da figura 3, percebemos uma disposição decorativa em seus elementos. Nota-se que há uma importância quanto à disposição dos elementos de maneira harmônica, mas não há historicidade. A escolha dos materiais e dos móveis visa demonstrar certo luxo ao ambiente, logo à relação do cliente se resume ao conforto que a loja oferece devido a uma boa solução arquitetônica.

Figura 03 – Croqui de loja comum Fonte: Keila R. Zeni

Já na loja da figura 4, percebemos numa análise superficial de identificação de Cenografia, que o cliente é convidado a interagir com o espaço a partir do momento em que se propõe a sensação de estar dentro de uma fábula, tal como o nome da loja. Aquilo que identificamos como elementos expositivos de uma loja comum, recebem um formato que envolve os clientes no universo surreal infantil, ou seja, a arara de roupas passou a ser um jacaré ou uma árvore, o cabideiro tornou-se um tamanduá, e assim por diante. A criança poderá criar novas histórias, brincar e até mesmo o adulto, poderá vivenciar sensações ao se deparar com este espaço.

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Figura 04 - Croqui inspirado na Loja Fábula Rio Fonte: Keila R. Zeni

A Cenografia, então, é parte importante de um espetáculo, pois conta a época em que se passa a história, o local e pelo cenário podemos até mesmo identificar a personalidade das personagens. Logo, quando pensamos em aspectos estéticos dessa relação entre Arquitetura de Interiores e Cenografia, torna-se fundamental provocar no cliente outras sensações e não somente oferecer um ambiente apenas decorativo. Após as definições dos aspectos anteriormente levantados, contempla-se a seguir, os dados referentes à Flagship Store Gaga´s Workshop e a análise dos mesmos à luz do referencial teórico.

Estudo de Caso A escolha pela loja Gaga´s Workshop em Nova Iorque, deu-se principalmente pelo fato de ter sido uma referência em projeto cenográfico e ainda por ter em sua equipe um cenógrafo brasileiro reconhecido internacionalmente, Eli Sudbrack. No Brasil também possuímos bons exemplos de Arquitetura integrada ao uso de Cenografia, como o projeto das Flagship Store Galeria Melissa e a Farm na Vila Madalena, ambas em São Paulo, assim como a loja Fábula, localizada no Rio de Janeiro. A loja Gaga´s Workshop foi idealizada para o período de Novembro de 2011 a Janeiro de 2012, numa montagem direcionada ao Natal. Um andar inteiro foi reservado na Flagship Store Barneys em Nova Iorque, a fim de expor produtos da grife da cantora Lady Gaga, reconhecida por contribuições extravagantes e diferentes à indústria musical e moda. Parte do

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valor das vendas destes produtos seria destinado a uma organização fundada pela própria cantora, que tem como objetivo promover projetos sociais. Logo na entrada (FIG.5) o cliente deverá ter a sensação de entrar no “mundo” da cantora, representado por um painel colorido criando a ilusão de caminhar para dentro de uma “Lady Gaga gigante” em forma de monstro.

Figura 05 – Croqui da fachada da Loja Gaga´s Workshop Fonte: Keila R. Zeni

A mesma intenção volta a se repetir no interior da loja (FIG.6). O cliente é convidado a interagir com o espaço a partir do momento em que se propõe Start here, ou seja, a indicação de um caminho a ser percorrido numa espécie de jogo que se inicia entre cliente e loja.

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Figura 06 – Croqui da entrada da Loja Gaga´s Workshop Fonte: Keila R. Zeni

As cores do ambiente são diversas: amarelo, laranja, vermelho, azul, verde, mas predominam o rosa claro para os pedestais de produtos e o preto e branco para piso, colunas e forro. Na composição geral, as cores, são bastante vivas e percebemos ainda que não claramente, que há uma intenção em fazer menção a uma figura feminina atriz ou ao próprio público feminino, ao se produzir um portal em forma de cabelo e uma boca representada com luzes de camarim. Da mesma forma que aqui identificamos a Cenografia, já percebemos a aplicação dos aspectos funcionais dado pela Arquitetura de Interiores, ao se descrever esta linha visual (Start Here) a ser percorrida a partir de um ponto focal (boca com luzes de camarim), ou seja, a loja aplica a circulação forçada. Além disso, conseguimos visualizar a preocupação em não criar áreas totalmente isoladas, permitindo dessa maneira com que o cliente tenha uma visão abrangente do restante da loja e a circulação com medidas próprias para acessibilidade. Dentre os conceitos elencados anteriormente, destacamos também, a vitrine como forte atrativo para consumidores. Neste projeto, as históricas vitrines da Barneys foram transformadas em telas com temas relacionando Lady Gaga e o Natal, na intenção de criar ambientes festivos mágicos e individuais. Para a criação dos cenários, as inspirações partiram da filmografia em Matilda, A Fantástica Fábrica de Chocolates e James e o Pêssego Gigante, que segundo a cantora buscam trazer uma mistura de diversão, arte e moda. Estes temas juntamente com a intenção de SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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representar a Oficina de brinquedos do Papai Noel, por meio da interpretação da cantora Lady Gaga, resultaram-se num espaço de magia com ares fantasmagóricos. Há oito estações na Gaga's Workshop, refletindo as categorias de produtos disponíveis para vendas, assim como um número de referências à própria Lady Gaga. As estações incluem: Candy Shop (Loja de Doces), Toy Shop (Loja de Brinquedos), Closet (para vestuário e acessórios), Library (Biblioteca – para livros, CDs, mídia e artigos de papelaria), Gallery (Galeria – para coleções e itens especiais), Jewelry (Joalheria), Boudoir (para doces e cosméticos) e Festas. Uma das referências à cantora foi localizada próxima a entrada numa espécie de estátua. Lady Gaga é reconhecida por utilizar unhas compridas em cortes inusitados e seus fãs chamados de “pequenos monstros”, características que quando misturadas, também ficam evidentes na Cenografia (FIG.7).

Figura 07- Croqui da estátua com garras da Loja Gaga´s Workshop Fonte: Keila R. Zeni

As cores e texturas utilizadas são releituras das usadas na tradicional Oficina do Papai Noel, fazendo dessa forma menção a um universo de doces.

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A disposição das roupas e demais objetos foi idealizada para integrar-se à Cenografia, de maneira que na relação visual do cliente ao produto, fará com que necessariamente ele se conecte com a história proposta. Em outro setor da loja, ao invés de um trenó, temos um trem que transporta produtos com embalagens que lembram doces e presentes (FIG.8), além da imagem da cantora representada por uma aranha com chapéu de maquinista, em substituição a figura do Papai Noel.

Figura 08 - Croqui do trem da Loja Gaga´s Workshop – Fonte: Keila R. Zeni

Podemos ainda observar o tratamento do piso, mantido neutro para sobressair os grandes elementos cenográficos. A iluminação foi trabalhada com spots refletores direcionados, resultando no destaque dos elementos dispostos e suprindo a necessidade de uma luz geral. Já no balcão do caixa e área de provadores manteve-se a disposição próxima a saída e com aspecto mais tradicional, apenas mantendo o destaque através de texturas e cores. Então, dessa forma, podemos observar que a Cenografia e Arquitetura de Interiores foram trabalhadas de maneira integrada na criação de um espaço dinâmico e atrativo, comprovando desta maneira, a boa relação e complementaridade entre essas duas áreas.

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Conclusão Podemos dizer que um dos pontos mais importantes para que haja a integração entre Arquitetura de Interiores e Cenografia, ao se projetar uma Loja Conceito, é criarmos uma relação de conflito ou uma história com o espaço a ser projetado, munindo a técnica sob o espaço, com significados. Ou seja, conceder ao espaço interior uma dramaturgia, tal como se dá a uma peça de teatro. Mas quando aliamos a arquitetura e a cenografia, não podemos nos esquecer da maior diferença em relação ao teatro, temos um espaço em que a cenografia interage diretamente com o expectador/cliente e ainda, interfere em suas ações. A arquitetura aliada à cenografia, então, difere-se também da decoração, pois quando se trata de cenografia num espaço arquitetônico, o expectador/cliente é convidado a vivenciar o tema proposto e não apenas identificá-lo. Ou seja, em uma loja apenas decorada teremos objetos que fazem menção a este tema e dispostos de maneira harmônica junto aos produtos, de forma que rapidamente identifica-se a proposta. Já quando pensamos nesta mesma loja com arquitetura aliada à cenografia, o cliente irá imergir neste ambiente, fazendo com que ele se sinta participando do tema, pois o espaço arquitetônico estará fundido em sua totalidade à cenografia e sincronizado ao contexto aplicado. O piso, as paredes, a iluminação, as gôndolas serão de materiais que remetem diretamente ao tema. Podemos ainda pensar nas cores, nas texturas, em algum perfume, em um som ambiente e talvez os próprios vendedores com roupas no estilo proposto. O cliente sente o espaço de maneira que torna-se possível se envolver emocionalmente com o ambiente, relacionando-o até mesmo com experiências pessoais e suas memórias. O papel da cenografia em uma loja conceito pode, então, influenciar diretamente o consumidor trazendo consigo uma história, que poderá ser relativo à cultura, questionamentos sociais, atualidades, o universo das artes, moda, enfim diversos temas que podem fazer com que o consumidor utilize-se da imaginação e possa transpor a mesma para a tridimensionalidade proposta, concretizando assim a dramaticidade. Torna-se importante aliar aspectos funcionais aos aspectos estéticos, de maneira que esta dramaturgia do espaço não interfira no funcionamento da loja. Deve-se atentar aos deslocamentos propostos aos clientes de maneira que estes venham a contribuir com a intenção da cenografia. Logo, para que a loja torne-se loja conceito e tenha seu espaço com aspectos da arquitetura e cenografia, é preciso instigar o cliente em todos os seus sentidos: visão, olfato,

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tato, audição; para que sua experiência dentro da loja seja imersiva e faça com que ele interaja com o produto, sentindo-se mais próximo de sua essência, sua história.

Referências: CHING, Francis D.K. Arquitetura de interiores ilustrada / Francis D.K. Chin, Corky Binggeli; tradução: Alexandre Salvaterra. - 3 ed. - Porto Alegre: Bookman, 2013. GAGA´S Workshop. Disponível em: <www.barneys.com/GaGa's-workshop>. Acesso em: 15/8/2014. GURGEL, Miriam. Projetando Espaços. Guia de Arquitetura de Interiores para áreas comerciais. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2010. MORGAN, Tony. Visual Merchandising - Vitrines e Interiores Comerciais. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, SL, 2011. NERO, Cyro Del. Máquina Para os Deuses - Anotações de um Cenógrafo e o Discurso da Cenografia. São Paulo: Senac, 2009. 384 p. PAVIS, Patrice. Dicionário de teatro. Trad. Maria Lucia Pereira e J. Guinsburg. São Paulo: Perspectiva, 2003. PARENTE, J. Varejo no Brasil. São Paulo: Altas, 2000. URSSI, Nelson José. A Linguagem Cenográfica. São Paulo, 2006. 122 p. Dissertação (Mestrado em Artes) – Universidade de São Paulo, Escola de Comunicações e Artes, São Paulo, 2006. SCHAFF, Adam. Introdução à Semântica. Coimbra: Almedina, 1968

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12. CENOGRAFIA APLICADA AO VITRINISMO Fernnanda Driessen45

Resumo: Este artigo apresenta uma visão da relação entre a cenografia e a prática do vitrinismo, mostrando como os conceitos utilizados na arte cênica são aplicados no momento da produção de vitrines para lojas de varejo. Inicialmente é feita uma análise das relações da cenografia com o espaço, tempo e questões de linguagem artística. Depois são apresentados exemplos de vitrines conceituais que ilustram o caráter cenográfico aplicado, juntamente com uma análise dos aspectos artísticos, conceituais e cênicos desta prática. Conclui-se que a relação estabelecida entre cenografia e vitrinismo é enriquecedora para as experiências de consumo do comércio varejista.

Palavras-chave: cenografia; cenografia aplicada; vitrinismo; vitrines conceituais.

Introdução Apesar de, em sua essência, a cenografia estar diretamente relacionada com a produção teatral, não se pode negar que os caminhos e as possibilidades de atuação de um cenógrafo hoje se ampliaram consideravelmente. Dentre os diversos campos de atuação possíveis na área de cenografia, o vitrinismo apresenta peculiaridades e características interessantes de serem analisadas. A forte concorrência do varejo tem impulsionado o mercado a buscar alternativas diferenciadas para atrair e cativar clientes: não se trata mais de simplesmente apresentar o produto ao consumidor, faz-se necessário despertar, ou até mesmo criar, um desejo que possa fazer com que este se sobressaia às demais ofertas de mercado. É neste ponto que a cenografia vem se tornando forte aliada dos trabalhos de vitrinismo em todo o mundo. Vitrines conceituais, apresentando ambientações, inovações tecnológicas, interações com os clientes e outras maneiras de criar sensações e emoções, ganham espaço no mercado de franchising e merchandising de varejo. Diante deste quadro, a idéia central deste artigo é investigar de que maneiras o trabalho cenográfico, em seu enfoque mais elaborado e conceitual, vem sendo aplicado à 45

Fernnanda Driessen é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). Especialista em Design de Interiores pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2010). É Arquiteta e Urbanista formada pela Universidade Federal do Paraná (2007). O presente artigo foi orientado pela profa. MSc. Nádia Moroz Luciani, da Universidade do Estado do Paraná – Campus II – Faculdade de Artes do Paraná. Email: ferdriessen@gmail.com SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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criação e concepção de vitrines. Depois de levantar conceitos que atribuem à cenografia o status de criação, pretende analisar alguns casos de vitrines a partir de preceitos cenográficos mais coerentes. Para isso foram escolhidos exemplos de vitrines de algumas marcas mundialmente reconhecidas pelo forte trabalho realizado na área de visual merchandising nas últimas décadas. O objetivo desta análise não é suscitar uma discussão de valores, polarizada por questões artísticas ou mercadológicas, mas considerar alguns conceitos e idéias que têm agregado valor criativo a produções que já vêm sendo desempenhadas por cenógrafos no âmbito do comércio varejista.

Conceitos de cenografia Mesmo assumindo diversas formas de manifestação e representação, evoluindo ou modificando-se de acordo com maneiras de pensar de diferentes épocas, a cenografia sempre foi um elemento constituinte da produção teatral. Das correntes mais simbólicas às mais abstratas, ela firma-se não apenas como técnica ou suporte decorativo para o texto, mas assume papel de criação artística no fazer teatral. A skênographia é, para os gregos, a arte de adornar o teatro e a decoração de pintura que resulta desta técnica. No Renascimento, a cenografia é a técnica que consiste em desenhar e pintar uma tela de fundo em perspectiva. No sentido moderno, é a ciência e a arte da organização do palco e do espaço teatral. É também, por metonímia, o próprio desejo, aquilo que resulta do trabalho do cenógrafo. Hoje, a palavra impõe-se cada vez mais em lugar de decoração, para ultrapassar a noção de ornamentação e de embalagem que ainda se prende, muitas vezes, à concepção obsoleta do teatro como decoração. A cenografia marca bem seu desejo de ser uma escritura no espaço tridimensional (ao qual seria mesmo preciso acrescentar a dimensão temporal), e não mais uma arte pictórica da tela pintada, como o teatro se contentou em ser até o naturalismo. A cena teatral não poderia ser considerada como a materialização de problemáticas indicações cênicas: ela se recusa a desempenhar o papel de “simples figurante” com relação a um texto preexistente e determinante. (PAVIS, 1999, p. 44-45)

A cenografia vem ampliando seus horizontes para além do contexto teatral e isso se dá por diversos motivos. O primeiro é por tratar diretamente da relação do objeto com o espaço; em seguida por assumir uma linguagem artística própria; e, por fim, por razões mercadológicas inerentes ou até mesmo pelo hibridismo natural dos nossos dias. Cinema, televisão, shows, exposições, carnaval, feiras, ambientação e vitrines comerciais são novos

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campos de atuação do cenógrafo, fenômeno que alguns autores denominam de cenografia aplicada (COHEN, 2007, p. 07). A autora utiliza ainda o termo cenografia aplicada para fazer uma distinção entre a produção artística teatral e o trabalho realizado para fins mercadológicos, respondendo à demanda de um cliente. Esta alternativa pode ser interessante como ferramenta didática, mas acaba por criar uma ruptura muito forte no meio híbrido e de difícil distinção de limites em que vivemos. Da mesma, forma, o cenógrafo Cyro Del Nero, em entrevista à Luciana Bueno (2007, p. 223), defende a idéia de que a cenografia não se restringe apenas ao teatro, mas que, quando feita com criatividade, com um discurso inovador e apaixonado, tudo pode ser considerado cenografia, desde estandes de feiras, eventos e até mesmo vitrines. Nesse sentido, parece ser interessante, levantar alguns conceitos trabalhados na cenografia teatral em sua essência como criação artística para ser possível analisar com maior discernimento o que vem sendo produzido nestas áreas paralelas afins.

Cenografia como forma de comunicação A cenografia passou a ser vista como uma maneira de traduzir um discurso, como um elemento a mais da cena capaz de comunicar ao espectador a mensagem teatral. Não é uma obra fechada ou isolada, mas uma linguagem que, em conjunto com iluminação, figurino, som etc., constitui um meio para o diálogo com o espectador. Diante da evolução da encenação, a Cenografia deixa de ser um elemento meramente ilustrativo, ou decorativo, para tornar-se um dispositivo visual que ganha presença e participação na comunicação ao público do argumento proposto pelo evento teatral, não apenas um lugar onde a ação se passa, mas como a relação proposta entre o texto, a ação e a recepção. (COHEN, 2007, p. 26)

A autora complementa esta ideia falando que: A cenografia é responsável por parte da expressão não-verbal da representação. Os elementos, uma vez reunidos, passam a fazer parte de um todo que dialoga e se comunica com a audiência, preservando sua individualidade narrativa e complementando-se uns aos outros. (COHEN, 2007, p. 27)

Este diálogo ainda deve levar em consideração que a mensagem é passada ao espectador, que recebe ou identifica tais códigos de acordo com sua própria bagagem cultural. Temos assim uma obra aberta, que passa a ser "preenchida pelo público a partir do que é fornecido pela obra, tanto pelos dados racionalmente identificáveis como pela contribuição

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objetiva e subjetiva da mente do observador: sua memória, intuição, fantasia, gosto, sensorialidade, etc" (MACHADO, 2006, p.08) Dentro do paradigma ligado ao processo de percepção, podemos observar diversos diretores e cenógrafos que exploram esta cogitação de que é o espectador que dá significado à obra de arte no ato de seu confronto com ela, através do embate entre o que é mostrado no palco e tudo que a sua mente e suas experiências de vida trazem consigo, projetando isto, de alguma forma, no objeto artístico. (MACHADO, 2006, p. 01)

A cenografia pode ser então entendida como uma maneira de materializar idéias e conceitos, uma forma direta e concreta de estabelecer um diálogo com o espectador.

Cenografia como linguagem artística Uma das questões mais polêmicas diante da conceituação do que é ou não cenografia está em sua relação com o contexto artístico e, consequentemente, seu distanciamento das demandas exclusivamente mercadológicas. Distante dessa discussão, o mais relevante para este estudo é entender o poder de criação artístico intrínseco à atividade cenográfica, esta qualidade que faz dela um meio de exteriorização e expressão de pensamentos ou ideais.

O cenógrafo como artista vivencia este processo, seja ele completo ou não, e certamente transparecerá no resultado de seu trabalho. Através da Cenografia enquanto linguagem artística, podemos expressar nossos pensamentos, reflexões e emoções, a medida que deixamos aberto para que os elementos significantes presentes na Cenografia possam ser interpretados pela audiência, não apresentados de forma fechada, como uma leitura única. (COHEN, 2007, p. 28)

O distanciamento da simples ornamentação ou cópia do real, ou ainda da pura e simples técnica de executar algo que seja entregue pronto por um texto ou um diretor, é que traz esse caráter único de obra de arte à cenografia. A autoria, o fato de querer dizer algo, informar ou provocar o espectador, configura a cenografia como meio de produção de uma linguagem artística.

A partir do final do século XIX e no início do século XX podemos constatar um deslocamento da referência da mímese da realidade como critério de criação e de apreciação artística para o interesse sobre a articulação da linguagem artística, para a visão da arte como algo independente da mímese, como algo em si. É, neste sentido, uma arte voltada mais para a própria arte do que para um modelo exterior a ela. O importante aqui, para o raciocínio a ser seguido, é que a preocupação com a linguagem artística se manifesta na obra de arte, centrando-se não mais no objeto real a ser representado, mas no objeto artístico, na sua articulação interna e na sua apresentação formal. (MACHADO, 2006, p. 02)

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Cenografia e a relação espaço e tempo A cenografia atua diretamente nas relações estabelecidas com o espaço, modificando e criando sensações a partir das intervenções nele estabelecidas. A compreensão acerca de um espaço, desenhar um espaço, ocupá-lo, a criação de elementos visuais neste espaço, sua composição, cor, luz, são atribuições que integram o processo de criação do cenógrafo, que os relaciona a partir de um argumento proposto à realização do acontecimento teatral. (COHEN, 2007, p. 30)

Por atuar diretamente na concepção e modificação de espaços, a cenografia, como dito anteriormente, muitas vezes tem seu limite permeado por áreas afins, como por exemplo a arquitetura. Silva diz que

Vulgarmente, a distinção entre cenografia e arquitetura está relacionada com a permanência no espaço e no tempo, com a dicotomia ficção/realidade, e com as relações interpessoais que o espaço permite que nele se desenvolvam. (SILVA, 2012, p. 129)

É importante acrescentar ainda que a cenografia é capaz de estabelecer uma relação com o tempo distinta de outras áreas, tanto pela duração da experiência estabelecida entre o espectador e a obra, como também pelas possibilidade cognitivas geradas na criação deste cenário. Enquanto a física nos limita a definir o conceito de espaço a partir de um evento concreto e não a eventos subjetivos como, por exemplo, percepções, lembranças, desejos, sensações, experiências, as Artes Cênicas nos conferem a possibilidade de manipular, de certa forma, esta ordem, para dizer e mostrar ao espectador, ainda que aparentemente, que um mesmo elemento possa ocupar dois lugares distintos, ou dimensões distintas simultaneamente, apresentar espaços e elementos que suscitem lembranças e sensações. Permite ainda situar um mesmo elemento em épocas tempos - diferentes e mais, apresentar consequências antes da causa, permite inclusive suspender o Tempo e suprimimir o Espaço. (COHEN, 2007 p.35)

A cenografia, vista como forma de expressão e criação artística que pretende comunicar determinada mensagem, pode ser explorada de maneira criativa e única em diversas formas. Seja em um palco ou em um evento, seja na conceituação de um ambiente construído ou na elaboração de uma vitrine, o que faz com que um projeto possa ser caracterizado como cenográfico é muito mais a conceituação por trás da sua criação ou sua execução do que a própria natureza da atividade desenvolvida. Os conceitos analisados até aqui servem como base para o entendimento da prática do vitrinismo da forma como ele vem sendo praticado por alguns profissionais. A vitrine tem sido explorada, nesse conceito, como maneira de representar uma idéia, de comunicar uma SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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mensagem e de, acima de tudo, mexer com as emoções daquele a quem ela é dada à contemplação.

A vitrina é uma manifestação discursiva que não se restringe apenas à comunicação; abrange também uma construção textual de um mundo no qual o produto passa a existir por se colocar em relação com os que o percebem. Constrói-se, pois, uma encenação geradora de significação em que a vitrine é um espaço que significa e que se faz por esse seu peculiar modo de existência. (DEMETRESCO, 2000, p. 13)

Vitrinismo O ato de expor as mercadorias para atrair a atenção dos clientes é uma prática bastante antiga, que foi sendo modificada pela evolução dos espaços destinado ao consumo. Essa atividade foi sendo aprimorada, aparecendo primeiramente às lojas e, mais tarde, os grandes estabelecimentos comerciais, como os mercados do Império Romano. Um dos mais grandiosos exemplos desses estabelecimentos foi o Mercado de Trajano, construído no século I, pelo arquiteto Apollodoro Damas. Este foi, na realidade, o primeiro "shopping center" da história. Localizado entre as colinas do Quirinal e do Capitólio, compreendida um conjunto de estabelecimentos, distribuídos em cinco andares. No térreo vendiam-se jóias, flores, frutas, facas e armas; no primeiro andar, vinho e óleo; no segundo e terceiro, os artigos das colônias, como especiarias, temperos e tecidos; no quarto, ficavam os escritórios públicos; e no quinto, peixes e crustáceos, em viveiros de água doce e do mar, totalizando cento e cinqüenta lojas. (DEMETRESCO, 1990, p. 12)

Mas foi no início do século XX que as vitrines começaram a ser utilizadas para contextualizar as mercadorias e, segundo Demetresco (1990), “artistas famosos, como Marcel Duchamp, André Breton e Salvador Dali, fizeram vitrinas na década de 30. Surgiram vitrinistas dedicadas e reconhecidas nos Estados Unidos, como Dana O`Clare e Tom Lee”. As vitrines, consideradas como o contato imediato e gratuito com o cliente, assumem um papel fundamental no planejamento do varejo. Parente (2000) ressalta que “as vitrines procuram não só apresentar uma amostra representativa do tipo de produtos que a loja oferece, mas também estimular que os consumidores entrem na loja.” Cabe ressaltar ainda o caráter cultural, artístico e antropológico da vitrine como retrato da sociedade no qual o indivíduo se espelha e inspira cotidianamente: As vitrinas são reflexos do contemporâneo, do urbano, das transformações que ocorrem na sociedade e no homem, as vitrinas “fabricam” uma realidade: a dos sonhos, a do consumo, a das identidades vendáveis, a da tradição. Fabricam e projetam aos transeuntes imagens, despertam sensações, desejo. Os manequins, retradutores das identidades de gênero, são muito mais do que suportes: dão vida às roupas, estabelecem as marcas de gênero no vestuário. Este, carregado de símbolos, às vezes é o menos importante. O olhar do observador à vitrina passa pela experiência do instante, do momento onde o seu cotidiano e universo simbólico e de SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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conhecimento entram em profusão e criam sentidos. O objetivo final da vitrina é que, dessa união de símbolos e referências, o desejo do consumo seja criado e satisfeito. O espaço (da loja, da vitrina, da rua, do shopping) ganha conotação de “espetáculo”. E o homem, “perdido” na multidão e cada vez mais individual (num movimento, mesmo imperceptível, de solidão), encontra-se de frente com uma construção midiática, cultural e econômica contemporânea de “sede e fome” por signos e significantes, na tentativa de representar a sua própria vida, o seu sentido de existir. (POLITANO, p. 05) .

É com este intuito de encantar e emocionar, de gerar identificação e causar sensações que vão além do simples fato de apresentar as qualidades estéticas e funcionais do produto, que alternativas para uma cenografia mais artística e elaborada vem sendo produzidas na área de vitrinismo conceitual.

Vitrines conceituais As vitrines, aqui chamadas de conceituais, são estruturas carregadas de conceitos e significados, pensadas como verdadeiros cenários, ora mais simbólicos e representativos, simulando realidades e criando cenas que geram identificação, ora mais abstratos e surrealistas, tirando partido de cores, formas e materiais que provocam diferentes sensações nos consumidores. Apesar da venda sempre ser o objetivo principal na exposição de qualquer produto, os objetos e a composição dessas vitrines estão impregnados de idéias e elementos conceituais que pretendem fortalecer a identificação da marca ou despertar emoções e sensações relacionadas a ela nos consumidores. O objetivo final dessas vitrines, então, é criar associações e critérios de identificação e valoração de produtos e marcas. A Arte Conceitual muda o sentido da arte, que agora não resulta dos objetos ou formas, mas das idéias e conceitos. Assim como as vitrinas que não se restringem a somente expor os objetos, mas na conceitualização deles na vida do consumidor. Os artistas, produtores de objetos de arte, tornaram-se manipuladores de signos e símbolos, que é exatamente o papel do vitrinista na construção de uma vitrina. E o espectador, contemplador estético, torna-se um leitor de mensagens, como o consumidor, que agora não só vê um produto na vitrina, como também lê todo discurso persuasivo inserido nela. (SILVA, 2007, p.22)

A venda continua em foco, mas o produto não é necessariamente o objeto central da vitrine. Com o objetivo de criar identificação com a marca, provocar sensações ou despertar emoções, são usadas temáticas e ambientações; cores, formas e texturas; enredos e narrativas que a tornam muito mais atraente e significativa.

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Em alguns casos pode-se observar, inclusive, a omissão total dos produtos destinados à venda na vitrine. Um exemplo desse fenômeno é a vitrine da Le Bon Marche, criada para Jean Paul Gautier (figura 01), na qual as roupas são substituídas por linhas horizontais que compõe junto com a posição dos manequins, um cenário dinâmico e conceitual. Nas figuras 02 e 03 pode-se observar que, mesmo trazendo pequena quantidade de produtos, estes são apenas suporte para a construção da cena em si. Com cores e formas fortes, trabalhando conceitos irreverentes e marcantes, estas vitrines atraem o olhar e, principalmente, a curiosidade dos clientes e transeuntes. Desta maneira, acabam atingindo, indiretamente, um dos seus principais objetivos: destacar-se das demais e estabelecer um diálogo conceitual e muito mais incisivo com o seu público alvo.

Figura 01 - Vitrine na Le Bon Marche Fonte: journaldesvitrines.com

Figura 02 - Vitrine da Lanvin Fonte: trendland.com

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Figura 03 - Vitrine da Anthropologie Fonte:www.motherearthliving.com

Para que esses propósitos sejam alcançados e, além disso, os objetivos de venda também possam ser contemplados, é necessário um profundo estudo do mercado e das ferramentas conceituais e formais a serem empregadas. Os valores culturais e sociais desse consumidor precisam ser analisados, levando em consideração o significado e a expressividade que materiais, cores e texturas podem assumir de acordo com a sua bagagem cultural e seu repertório. A esse respeito, Silva (2012) afirma que: O significado que o homem atribui a certos componentes da sua realidade nem sempre é processado de modo consciente, podendo ser imputado a fatores tão simples como uma cor, uma textura, uma forma, uma certa disposição espacial ou uma determinada iluminação. (SILVA, 2012, p. 131)

O contato do consumidor com a vitrine precisa ser uma experiência diferenciada e marcante para que determinado produto se destaque em meio a concorrência. O vitrinista é aquele que faz o consumidor experimentar com todos os poros o sabor do efêmero. Seu papel é, antes de tudo, saber mostrar o essencial, promovendo, no consumidor, ou um sorriso que se estampa em seu rosto, ao defrontar com a vitrina, ou, quem sabe, um gesto de reprovação em relação â cena descrita, mas jamais em relação à marca ou ao produto. (DEMETRESCO,1990, p.)

A cenografia aparece como um meio de fazer com que o contato do consumidor com produto se transforme numa experiência diferenciada, sensorialmente mais elaborada, atraindo sua atenção para determinado produto ou marca.

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Composições artísticas nas vitrines A complexidade e aperfeiçoamento estético aplicados à criação e concepção de vitrines permite estabelecer relações dessa atividade com as produções artísticas na área da cenografia teatral. Demetresco (2000, p. XX.) afirma que "a vitrina tem seu lado poético. Isso pode parecer contraditório, mas há, na criação do seu discurso, duas faces indissociáveis: aquela do utilitário, que visa a venda e aquela do estético, que visa a atração". Há ainda um fator histórico-cultural a ser considerado nessa qualificação artística das vitrines e em sua capacidade subjetiva de provocar atração e desejo: Historicamente, a vitrina foi o sustentáculo da arte no passado, principalmente nos museus: usava-se uma estrutura de vidro a fim de proteger a obra das “mãos” dos visitantes. O tocar era proibido e não havia interação física entre as partes; o vidro possibilitava o olhar e a admiração, mas jamais o contato. Como um objeto sagrado, a obra existia apenas aos olhos. Atualmente, as vitrinas comerciais ainda trabalham com esta temática: a criação do desejo, da busca pela aquisição. Ao contrário, podese tocar o objeto exposto: basta adentrar a loja (extensão da vitrina) e comprar o produto. A aquisição tende a se tornar um hábito: a “admiração” induz consumo constante pois a vitrina, como uma caixa de surpresas, sempre tem o que mostrar. Como o espaço da galeria de arte contemporânea e seu “fantasma errante”: o espectador, muitas vezes apto (não é uma condição fixa) ao novo e disposto a pensar sobre cada nova obra. (POLITANO, 2008, p. 2)

Em alguns exemplos de vitrine é possível perceber a criação de cenários ou verdadeiras instalações artísticas, cuja exploração de cores e materiais resultam em composições que até valorizam o produto, mas que acima de tudo, atraem a atenção do cliente com a mesma intensidade que uma obra de arte pode prender o olhar contemplativo de um observador. Uma ambientação em uma vitrina pode se utilizar dos sentidos do sujeito para construir e organizar esteticamente composições que podem ser atrativas a ele. Alguns elementos como luz, cor, movimento, favorecem a construção dessa imagem descentralizada do olhar do observador. Desta forma, essa imagem cria cenários espetaculares que convidam o espectador para ele “ir além” do que lhe é oferecido. (ZMYSLOWSKI, 2009, p.74)

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Figura 04 - Vitrine de natal da Anthropologie Fonte: thebwd.com

As figuras 04, 05 e 06, cuja composição de fundo criada assume uma posição de primeiro plano face à mercadoria exposta, demostram claramente esse recurso. O cliente, neste caso, se permite assumir um comportamento muito mais próximo ao de espectador ou apreciador de uma obra de arte do que o de consumidor em potencial. Esse apelo lhe confere ainda um status mais nobre, distanciando-o da esfera mundana do consumismo comercial para elevá-lo ao patamar das artes e da cultura.

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Figura 06 - Vitrine de Dries Van Noten Fonte: driesvannotenfr.blogspot.nl

Figura 07 - Vitrine de Dries Van Noten Fonte: driesvannotenfr.blogspot.nl

Encenações nas vitrines Por fim, cabe destacar o trabalho realizado por alguns vitrinistas que criam, para além de conceituações e simbolismos, composições e instalações artísticas, utilizando técnicas e conceitos de cenografia, cenas capazes de conseguir, em poucos segundos, transportar o espectador para um outro mundo, o mundo dos sonhos e dos desejos, da ilusão e da magia.

Podemos até compará-lo com um contador de histórias, que descreve minuciosamente todos os detalhes simbólicos da história para prender a atenção do espectador, e assim é com a vitrinista que mostra com detalhes na vitrina, histórias que simulam o real e que conquistam a atenção dos passantes em segundos. (SILVA, 2007, p. 25)

São estas representações que permitem ao vitrinista, mesmo que trabalhando no plano estático, narrar uma história, desenvolver um tema, transportar o espectador para uma situação que possa, de alguma maneira, despertar sentimentos ou sensações. é isso que aproxima sua atividade da cenografia teatral, pois assim como a arte cênica, “propõe a materialização momentânea de uma ilusão, uma imagem" (SILVA, 2012, p.129)

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Metamorfoseando-se em espaços bastante diversificados, do mágico ao lúdico, do sensual ao estático, etc., as vitrinas criam narrativas até mesmo inesperadas, e constituem espaços para descobertas informativas, culturais e estéticas, e é justamente nesse ponto que são estabelecidos diálogos entre produto e público. (DEMETRESCO, entrevistas, p.26)

Desta maneira, além de expor um produto, o vitrinista consegue criar e expor situações que transmitam ao consumidor o valor do objeto ou da marca. Ele pode ainda simular cenas que sugiram ou demonstrem a utilização do produto ou despertem sonhos e desejos por um estilo de vida que passa a ser vinculado com a aquisição daquele produto em especial. Um espaço cénico comunica com o seu utilizador, empregando personagens formais e linguagens conceptuais, num discurso coerente e de grande dimensão expressiva. A transmissão de uma ideia, inteligível ou sensorial, depende dessa mesma capacidade de expressão. Os elementos físicos estruturadores de um espaço cénico condicionam as características sensitivas que aí se geram, através dos significados que lhes atribuímos, consciente ou inconscientemente. Em conjunto, colaboram para a criação de um ambiente espacial, uma atmosfera muito particular que estimula reacções, persuade os sentidos e é capaz de produzir um significado estético. Em suma, a forma produz um significado que, por sua vez, inflama a emoção. (SILVA, 2012, p. 151)

É possível observar, nas figuras 08, 09 e 10, exemplos de vitrines cujas cenografias criadas demonstram o intuito de recriar cenas e transportar o consumidor à determinadas situações dramáticas e narrativas. É assim que o trabalho de vitrinismo aproxima-se da cenografia teatral, e o que se apresentava como um simples lugar para a exposição de produtos passa a ser o espaço de construção de encenações, materialização de sonhos, possibilidade da realização de desejos.

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Figura 08 - Vitrine da Berdgorf Goodman Fonte: beautifulwindowdisplays.blogspot.hu

Figura 09 - Vitrine de natal da Harrods Fonte: vogue.co.uk

Figura 10 - Vitrine da Dries Van der Noten Fonte: driesvannotenfr.blogspot.nl

Considerações finais A cenografia é uma arte que possibilita, por meio da transformação do espaço/tempo com cores, texturas, materiais, luz e a exposição de objetos, criar sensações e simular

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situações com o objetivo de contar determinada história e de transportar o espectador à outro universo ou realidade. Diante destes conceitos, é possível estabelecer um paralelo entre a cenografia teatral e o trabalho realizado em vitrines conceituais que, mesmo tendo em suas raízes originais o objetivo primordial de vender ou promover determinado produto, transportam seu foco principal para a produção de um cenário capaz de divulgar uma idéia, conceito ou marca. O uso da cor e da forma, a exploração do material e da textura, a dramaticidade da luz, a composição e o planejamento do espaço devem ser planejados, assim como em outras situações cênicas, a fim de possibilitar a comunicação imediata de um discurso a quem quer que passe pela frente da loja. O domínio da técnica e o entendimento da linguagem artística cenográfica torna-se, assim, indispensáveis para a atuação do vitrinista na produção do trabalho conceitual e diferenciado que o mercado altamente competitivo e dinâmico do varejo de hoje exige. Fica nítida a relação e aplicação da cenografia na prática do vitrinismo como forma de enriquecer esteticamente a experiência de consumo, possibilitando ao mesmo tempo maior identificação dos consumidores com as marcas apresentadas e a valorização e divulgação de seus produtos e conceitos.

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13. MAGIA TEATRAL EM ATRAÇÕES DE PARQUES TEMÁTICOS Juliana Luiza Choma46

Resumo: Este artigo tem como objetivo a compreensão da conexão entre os aspectos tecnológicos e cenográficos de atrações de parques temáticos como forma de criar no visitante uma experiência diferenciada de entretenimento. Através de levantamento bibliográfico e estudo de campo, utilizou-se o brinquedo The Haunted Mansion, localizado no parque Magic Kingdom (complexo Walt Disney World – Florida, Estados Unidos), como estudo de caso para levantamento de histórico, método e conceituação de projeto e resultado final apreendido pelo público. Palavras-chave: parques temáticos, cenografia, magia teatral, The Haunted Mansion.

Introdução Parques temáticos são locais de atração de público, em razão não somente da quantidade de brinquedos presentes, mas também da qualidade, adquirida principalmente com a união de tecnologia e ambientação. A interação entre esses dois aspectos, quando bem solucionada, cria no visitante certa magia teatral, inserindo-o em uma atmosfera que mistura realidade e ficção e torna a experiência da visitação próxima da sensação de estar imerso em um espetáculo teatral como coparticipante das ações. No caso específico dos parques do complexo de Orlando, Florida – Estados Unidos, referência no segmento, o visitante é inserido no contexto de filmes conhecidos pelo grande público, tornando a experiência ainda mais próxima de um universo familiar e justificando o sucesso dessa indústria de entretenimento. O Brasil está inserido nessa indústria com a maior parte de seus parques aquáticos, influenciado pelo clima local. No entanto, o interesse em estudar parques temáticos está no fato de os nossos se configurarem de modo distinto daqueles já citados: em geral há uma aparente priorização do aspecto tecnológico em detrimento do cenográfico, que, se fosse melhor explorado, poderia trazer contribuições para a experiência do público ao visitar esses locais. Utilizando-se de um modelo que é referência mundial, a ênfase deste trabalho é no estudo da ambientação das atrações dos parques da Walt Disney Company como forma de

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Juliana Luiza Choma é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). É Bacharel em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal do Paraná (2012). O presente artigo foi orientado pelo prof. Esp. Alfredo Gomes Filho. Revisão: Marjure Kosugi. E-mail: juhluch@gmail.com SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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contribuir para o cenário brasileiro nessa indústria. Tem-se como enfoque a conexão entre a tecnologia e a cenografia desses locais, desde seu histórico e conceituação até o resultado final apresentado ao visitante. O objeto de estudo, The Haunted Mansion, não por acaso é uma das atrações favoritas do público no parque Magic Kingdom: apresenta esse conceito de maneira fluida, de forma que ambos (tecnologia e cenografia) contribuem positivamente para o resultado final da ambientação do brinquedo. Para a realização desse estudo, foram utilizadas como metodologia a reunião de bibliografia a respeito da atração citada e a observação da realidade, a partir de visitas à The Haunted Mansion do parque Magic Kingdom realizadas em junho e novembro de 2013. Dessa maneira puderam ser comparados relatos de estudiosos e engenheiros da Walt Disney Company com a realidade, a fim de examinar mais a fundo a configuração do brinquedo, resultando em uma compreensão mais clara do modo que possivelmente os efeitos cenográficos presentes são realizados.

Parques temáticos norte-americanos Nos séculos XVII e XVIII as Fairs (ou feiras) movimentavam a vida das cidades dos Estados Unidos. Eram feiras temporárias que expunham itens de consumo e de interesse histórico, tendo aos poucos incorporado também outros atrativos ao público, como restaurantes e brinquedos. Essas atrações secundárias, no entanto, acabaram tornando-se para alguns o principal motivo para visitá-las, e a ideia de um local que reunisse apenas essas atrações parecia natural (MARLING, 1998). O florescimento desse tipo de parque, com atrações, e o fortalecimento do cinema, rádio e televisão causaram uma queda no interesse do público pelas Fairs, forçando uma reformulação na maneira como elas eram organizadas: o que antes deveria enaltecer uma visão do passado passou a projetar o futuro, com a inclusão da tecnologia: cidades futurísticas, materiais como nylon e acrílico, luz fluorescente e robôs foram incorporados às exposições, que passaram a utilizar ciência, tecnologia e cultura de massa para atrair o público (MARLING, 1998). O esforço, no entanto, não pareceu ter sucesso. No pós-guerra, o aumento dos cinemas drive-in e a mudança no gosto de entretenimento do público ainda traziam problemas a essa indústria. E foi durante esse período de declínio que, em 1955, Walter Elias Disney inaugurou a Disneyland, em Anhaheim, Califórnia (MARLING, 1998).

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Diante do cenário desfavorável, Disney acreditava que a solução para a conformação de seus parques seria o enfoque nas atrações e no gosto do público pela fantasia – e não pela tecnologia. O projeto deveria fazer com que o visitante experimentasse uma interação completa em seu entretenimento, e o conceito de exposição deveria ser abandonado: para ele, o diferencial de seus parques seria o controle, a participação ativa do visitante (MARLING, 1998; HORN, 2011). Influenciado por seu gosto pessoal em colecionar miniaturas e após participar da Railroad Fair de 1948, Disney entendeu que casas de bonecas e miniferrovias eram atrativos para as crianças e bons conceitos para seu projeto. As cidades-cenário que viu na feira o incentivaram a dividir seu parque em Lands interligadas por uma ferrovia e torná-lo um brinquedo gigante. Ou uma cidade em miniatura (MARLING, 1998; HENCH, 2009). Em 1955 Disney aplicava seus conceitos na Disneyland (Califórnia). E dezesseis anos mais tarde era inaugurado seu maior complexo de parques, o Walt Disney World, apresentando como porta de entrada o parque Magic Kingdom (HORN, 2011).

Ideais de projeto Disney Para Walt Disney, visitar um parque de diversões deveria ser uma experiência teatral ou um show. Seu objetivo era ter “magia” em todas as partes, fazendo com que o “mundo real” fosse esquecido ao entrar em um mundo de fantasia. Dessa forma, criou um método em que todas as necessidades básicas dos visitantes devem ser transformadas em atrações: brinquedos, serviços, empregados, transportes, restaurantes e lojas são elementos de design, e pensados como tal. O entorno de cada atração deve demonstrar a atmosfera pretendida por ela, auxiliado por uma paleta de cores rigorosas, que atrai e dá unidade a cada área, auxiliando o espectador no entendimento da história (HENCH, 2009; RHODES, 2009). Assim como em um filme ou peça teatral, os projetos de seus parques eram pensados em divisões, como cenas ou atos. A entrada, com a Main Street, é a introdução, que tem como atos as Lands: no Magic Kingdom, Adventureland (das aventuras tropicais); Frontierland (de características do velho-oeste); Liberty Square (da história dos Estados Unidos); Fantasyland (das histórias infantis) e Tomorrowland (que projeta o futuro) criam o enredo. Alguns elementos de design também resgatados do meio audiovisual são objetivos constantes nos projetos dos Imagineers (engenheiros da Walt Disney Company), seja ao criar novos parques, novas atrações ou atualizar os existentes. Entre eles, se destacam a perspectiva forçada (mudança de escala gradual dos objetos, que tende ao infinito), e o Cross-dissolve

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(dissolução de imagens evitando mudanças bruscas entre cenas). O Cross-dissolve é visualizado nos parques na transição entre Lands, entre atrações, e dentro de cada segmento de uma atração. Já a perspectiva forçada traz a diferença de escala necessária entre os elementos visuais para criar a ilusão de amplidão ou grandeza, como ocorre nos andares dos edifícios, em que janelas localizadas no primeiro pavimento são maiores que as do segundo e, consequentemente, do terceiro (HENCH, 2008).

Histórico da atração The Haunted Mansion Os primeiros sketches do que seria o Mickey Mouse Park surgiram em 1951. Neles, a ideia de uma área do parque em que haveria uma igreja, um cemitério e uma casa assombrada colina acima já trazia o conceito do que seria a The Haunted Mansion. Então, após o sucesso da Disneyland e sua consequente necessidade de expansão, o projeto da atração ganhou força (SURRELL, 2009). Os Imagineers Rolly Crump e Yale Gracey eram os encarregados da criação de efeitos especiais, baseando-se em técnicas do ilusionismo. Deve-se a eles os croquis e ideias iniciais da atração, que em um primeiro momento seria um tour a pé. Posteriormente, foram incluídos na equipe Claude Coats e Marc Davis, que se tornaram os responsáveis pelo projeto executado no Magic Kingdom (RHODES, 2009; SURRELL, 2009). Disney tinha uma visão clara do que desejava na The Haunted Mansion e participava ativamente do projeto. Por esse motivo, sua morte em 1966 o estagnou: a discussão entre a equipe era se o brinquedo deveria ser assustador, conforme Coats desejava, ou engraçado, como queria Davis. Conciliando as duas ideias, a solução foi aprovada: com alguma realidade assustadora, o brinquedo deveria ter toques de ironia. A unificação dos dois conceitos se daria por meio da trilha sonora, do sonoplasta X Atencio, com a canção Grim Grinning Ghosts. E, dessa forma, em 1969 era inaugurada a The Haunted Mansion na Disneyland (HORN, 2011; RHODES, 2009). Para comportar um maior número de visitantes, o conceito de tour a pé teve que ser revisto. Para os Imagineers, uma atração ride-through (com trilhos) seria mais eficiente. Porém, como muitos dos efeitos haviam sido elaborados para o público parado em locais prédeterminados, estabelecer que os visitantes ficassem em movimento seria um problema. Para solucioná-lo, foi utilizada uma criação até então recente da WED Enterprises (atualmente Walt Disney Imagineering), o Omnimover (conhecido na atração por Doom Buggy): uma cadeira, com uma proteção na parte das costas, que pode girar 360º conforme o que deseje ser

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visto, evitando que se olhe onde não é desejado. O conceito é similar a uma câmera no cinema, em que o foco é direcionado para o local ideal (SURRELL, 2009).

Conceitos do projeto Em razão da grande equipe designada para o projeto e de seu desenvolvimento com duração total de dez anos, a The Haunted Mansion adquiriu como característica a atemporalidade e a ausência de uma história linear. A atração é, na realidade, um conjunto de efeitos e pequenas histórias que têm como ponto em comum a ironia diante de assombrações. Embora não apresente uma única história, segundo Baxter (in: SURRELL, 2009, p. 34) a atração é ordenada de forma a possuir três atos: o primeiro se inicia no foyer, onde os visitantes vivenciam “atividades poltergeists” e os espíritos estão invisíveis; o segundo ocorre a partir de uma cena de sessão espírita, em uma sala circular onde a aparição dos fantasmas é conjurada; e o terceiro e último ato é a descida dos visitantes ao cemitério, terminando em uma grande festa de espíritos e cadáveres, além de fantasmas que pedem carona no Omnimover. Conforme cita Surrell (2009, p. 20), a maior parte dos efeitos criados por Gracey e Crump são truques de ilusionismo e mágica do século XIX, inspirados no livro The Boy Mechanic (Popular Mechanics) de 1913. A atmosfera também auxilia no impacto, como o fato da mansão possuir “personalidade” com a presença de olhos nas paredes e nos móveis; e também a utilização da tecnologia Audioanimatronics, inserida no projeto por Marc Davis, que na época criava a Tiki Room com pássaros robôs. Divisão interna da atração47 Fila Conforme o conceito de Cross-dissolve já citado, houve no projeto a preocupação em realizar uma transição gradual entre a Land Liberty Square (onde se localiza a atração) e a The Haunted Mansion. Essa transição é feita com a fila de espera: tradicionalmente um local tedioso e apenas funcional, ela ganha nos parques da Disney algum atrativo para entreter o público que pode ter que esperar por horas para entrar no brinquedo. Na atração em questão o visitante pode interagir com lápides e um órgão que tocam música (por meio de sensores de toque) e uma estante com livros com mecanismo para empurrá-los. 47

Para melhor compreensão da organização do brinquedo sugere-se a visualização do video: YOUTUBE (site), disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=h_UmFM77Foc>. Acesso em: 09 dez 2014 Para visualização de detalhes construtivos, observar: YOUTUBE (site), disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=xX2vAA8S-QI>. Acesso em: 09 dez 2014 SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Sala da Lareira Ao entrar na mansão o visitante passa por um corredor com baixa iluminação que o leva até uma sala escura, onde se consegue ver claramente apenas uma lareira, um lustre repleto de teia de aranha e o retrato de um homem distintamente vestido (o dono da mansão – Master Gracey). Nesse momento, enquanto as portas são fechadas, o Ghost Host apresenta-se: é ele quem irá guiá-lo do início ao fim da atração, como um narrador fantasma. Ao olhar atentamente para o retrato, percebe-se que a figura do homem começa a envelhecer e emagrecer, até que se torna um esqueleto. Esse efeito era inicialmente uma projeção em quadros: entende-se a partir do relato de Cancilla (2001, p. 6) que se tratava de uma tela emoldurada na qual era projetada a sequência de imagens que envelheciam. Um par de projetores fazia a transição de uma imagem à outra de forma gradual: enquanto uma se apagava em fade-out, a outra se acendia em fade-in. Atualmente o efeito foi substituído por uma transição digital única, possibilitada por um software mais avançado.

Sala Extensa Ao sair do primeiro cômodo, o visitante é encaminhado para uma das duas salas “gêmeas” octogonais de nome Stretching Room. Dividida horizontalmente ao meio, cada sala tem a metade inferior de suas paredes em imitação de madeira, e a superior em papel de parede listrado. Há gárgulas como castiçais rodeando toda a sala e quatro retratos de personagens que teriam morado na mansão antes de morrerem. A porta de entrada da sala, bem como a de saída, apresenta o mesmo acabamento das paredes, camuflando-se ao ser fechada, dando a impressão de que o cômodo não tem saída, além de não ter janelas. Assim que o Ghost Host retoma sua fala, a sala parece esticar verticalmente. Enquanto o teto se distancia do piso, os quadros também aparentam esticar – isso porque, segundo Baham (2010, p. 53), eles são feitos em tecido emborrachado pintado que se desenrola na medida em que a porção inferior de suas molduras, fixa na parede, desce. Após a sala atingir seu ponto máximo de verticalidade, o Ghost Host desafia os presentes a encontrarem uma saída. E adiciona: caso contrário, há sempre o “seu jeito”. É assim que se revela, através de um relâmpago, um corpo enforcado pendurado nas treliças acima do suposto forro. Após a revelação, há um blackout acompanhado de um grito de mulher. O efeito de aparição do corpo é realizado por uma tela fina pintada iluminada pela frente que inicialmente faz com que os visitantes a visualizem como o forro da sala. Essa

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ilusão é auxiliada pela mistura da pintura com outros elementos tridimensionais que simulam sancas. Quando a tela recebe iluminação pela parte de trás, como um relâmpago, o corpo revela-se. Também é interessante destacar nessa sala a presença de um sistema de áudio de efeito tridimensional. Com ele, o som é percebido de maneira espiralada, causando a sensação de que o Ghost Host está se movendo enquanto narra. Para ampliar a atmosfera assustadora, sons de madeira esticando e de bater de asas de morcegos são constantes enquanto a sala estica (BAHAM, 2010). A presença de duas Stretching Rooms espelhadas é justificada no projeto pela necessidade de acomodar um público maior. Enquanto uma sala recebe parte dos visitantes, a outra já os libera para a área de espera.

Área de Espera O visitante é encaminhado para a área de espera, onde embarca em seu Omnimover localizado em uma esteira. Nessa sala, os destaques são visuais: lustres com teias de aranha falsas, quadros empoeirados e as correntes que formam as filas com detalhes em formas de morcegos. A iluminação mantém-se em penumbra, como nas demais áreas do brinquedo.

Galeria de Retratos O Omnimover é guiado para um corredor contendo uma penteadeira com flores mortas e alguns quadros de retratos ao lado direito. No lado oposto, grandes janelas com cortinas empoeiradas permitem que relâmpagos que vêm de fora sejam vistos. Ao chegar perto dos retratos, percebe-se que os relâmpagos revelam o “lado sombrio” dos personagens retratados (um deles como esqueleto, outro como medusa, outro como navio assombrado). O que se entende a partir do relato de Cancilla (2001, p. 6) é que o efeito de luz é realizado por uma dupla projeção por trás, similar ao antigo efeito do retrato de Master Gracey: na primeira projeção, de base, o que se vê é a imagem de cada personagem retratado naturalmente. No momento em que ocorre o relâmpago é acionada a segunda projeção, que revela a “forma fantasmagórica” de cada personagem. Antes de 2007, quando a atração do Magic Kingdom recebeu melhorias, o recurso utilizado era outro: os retratos “seguiam” os visitantes com os olhos. Isso era atingido com uma técnica simples de recortar os olhos e inserir a íris em um plano mais profundo que o

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restante da imagem. Assim, ainda que ela estivesse estática, para os visitantes – que se movem na esteira – parecia se movimentar (BAHAM, 2010).

Biblioteca A biblioteca da mansão contém, além dos livros, um lustre com teias de aranha, uma escada, e nichos com bustos iluminados que parecem se virar aos poucos para acompanhar o visitante com o olhar. Logo à frente há uma poltrona, uma cadeira de balanço e uma mesa com um abajur e outros objetos. A maior parte dos livros é pintada em um painel, exceto aqueles que possuem maquinaria para se mover. A cadeira de balanço e a escada também apresentam mecanismo semelhante. O efeito dos bustos foi descoberto acidentalmente por Rolly Crump enquanto fazia estudos para outro brinquedo do parque, e trata-se de esculturas invertidas em fundo escuro: em material semitransparente, são iluminados por trás através de uma única fonte de luz, dando a aparência de uma pedra branca polida enquanto forma sombras que parecem se movimentar juntamente com as cabeças. O efeito é similar ao das antigas íris da sala anterior: como os bustos são profundos, os olhos do observador criam na mente uma imagem tridimensional irreal, em ilusão de ótica (SURRELL, 2009. p. 65; BAHAM, 2010. p. 59).

Figura 1: Esquema de percepção do busto invertido. Fonte: da autora, 2014.

Sala de Música O destaque da pequena sala de música é o piano, iluminado pelo que seria a luz do luar. Com um mecanismo que move as teclas para cima e para baixo, a cena é completada por

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uma projeção simples de iluminação, como uma sombra, que se movimenta como se um fantasma estivesse tocando o instrumento.

Escadaria Infinita Escadas sem início ou final definido, de lado ou invertidas, formam o cenário dessa sala. Com a ajuda de espelhos localizados nas paredes, conceito aparentemente inspirado em M.C. Escher, as escadas parecem tender ao infinito. Com uma iluminação azulada como a luz do luar, o que se vê são castiçais e pegadas brilhantes que tentam “subir” até mesmo as escadas que vêm do teto. O efeito pode ser realizado por uma simples projeção de pegadas que se acende em fade-in e apaga em fade-out.

Corredor sem fim O corredor infinito fica localizado à direita do observador, contendo à frente uma armadura que move os braços. O que se vê no corredor parecem ser infinitos lustres e portas, sem ser possível enxergar seu fim. Ao centro, um castiçal que se move para a esquerda e para a direita parece flutuar. O efeito é produzido por um espelho localizado no final do corredor (a 1,5 metro do castiçal), que o duplica. O castiçal, preso por cabos em maquinaria que o move, tem seu lado oposto pintado de preto, para diminuir seu reflexo no espelho. Telas finas à frente e atrás do objeto também auxiliam na diminuição do seu reflexo e dos observadores, como filtros, em conjunto com a penumbra do corredor e escuridão na área dos Doom Buggies. O efeito é finalizado com a utilização da perspectiva forçada, que amplifica a sensação de infinito (SURRELL, 2009; BAHAM, 2010).

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Figura 2: Esquema corredor infinito. 1- tela à frente do castiçal; 2- tela atrás do castiçal; 3- espelho. Fonte: da autora, 2014.

Funeral À esquerda, um corvo chama a atenção para um cenário com um caixão e diversas coroas de flores e vasos de flores mortas. Ao fundo, há uma grande janela de onde vem a baixa intensidade da luz do luar em uma paisagem nebulosa. Como tecnologia Audioanimatronic tem-se o corvo, que mexe suas asas, e o cadáver dentro do caixão, do qual só se vê as mãos que se movimentam para cima e para baixo como se tentassem abri-lo. Uma luz verde vindo da parte interna do caixão é o ponto mais iluminado da sala, em conjunto com algumas velas de luz de led.

Corredor das Portas Ouvem-se logo barulhos de batidas em portas e outros sons metalizados. O Omnimover se posiciona de costas para o fluxo do trilho e é possível ver maçanetas de portas, alças e batentes aparentemente se mexendo sozinhos, bem como portas que parecem respirar (com mecanismo que realiza movimento para frente e para trás). Muitos quadros, dispostos de maneira não convencional, além do papel de parede com olhos, aumentam o clima de mistério juntamente com uma corrente de ar gelado que é lançada nos observadores. Luzes que são possíveis de ver apenas através das frestas das portas e lustres antigos pendurados no teto completam o cenário.

Relógio do Avô

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Nesta sala, um relógio com 13 números é visto e ouvem-se suas 13 badaladas. O ponteiro das horas está parado no número 13, e o dos minutos gira em sentido anti-horário. Para completar, enquanto o visitante passa pela sala é possível visualizar uma única vez uma projeção, semelhante à da sala de música – como sombra, de uma garra que passa na frente da única fonte de luz que ilumina o relógio. O objeto, um relógio de madeira, tem como elemento de design sua semelhança com uma criatura demoníaca. Entalhes que lembram uma boca cheia de dentes localizam-se junto ao mostrador das horas.

Sessão Espírita Ouve-se uma voz de mulher (chamada Madame Leota) conjurando espécies de feitiços. Ao adentrar na nova sala, percebe-se que ela é mais ampla que as demais, sendo percorrida também de maneira diferenciada. Aqui o Omnimover percorre de modo circular, dando ênfase ao elemento central: uma mesa com algumas cadeiras, velas, cartas de tarô e uma bola de cristal flutuante. Dentro da bola, a cabeça de Madame Leota conjura os fantasmas a aparecerem. É o início do segundo ato. O efeito, conhecido por Leota Effect, é obtido com a união de três mulheres reais: o busto esculpido é de Leota Thomps, que recebe a projeção do rosto de Kim Irvine e a voz de Eleanor Audley. Na ocasião da abertura da atração, os Imagineers inseriram a bola de cristal como uma cabeça estática projetada, preenchida com um cabelo branco volumoso que tentava esconder as imperfeições e recebia a contraluz azulada para aumentar o efeito de transcendentalidade. No entanto, incomodava aos projetistas o fato de haver reflexos na bola de cristal causados pela projeção (BAHAM, 2010). Em 1980 o efeito foi revisado. A tecnologia patenteada pela então WED levava a projeção para dentro de uma cabeça semitransparente através de um cabo de fibra ótica. Para ajustar o ângulo correto da imagem projetada era utilizado um conjunto de lentes. Isso permitiu que a bola de cristal não ficasse mais estática, como antes, sendo inserido nela movimento para cima e para baixo. O reflexo não ocorria mais (BAHAM, 2010). Porém, em razão da projeção encontrar-se no lado oposto ao que se observava, a imagem tornara-se pálida. E, embora houvesse alguma correção de ângulo feito pelas lentes, o efeito não parecia convincente aos Imagineers, que o consideravam demasiado distorcido se visto pelas laterais. Assim, em 2001 foi retomada a ideia inicial de projeção externa e globo

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estático. Para solucionar o problema da reflexão, foram inseridas velas ao redor que causavam reflexos propositais no globo, que distraíam os visitantes do real problema (BAHAM, 2010). Na reformulação de 2007, a tecnologia permitiu que se voltasse ao conceito de projeção interna à cabeça, dessa vez com maior clareza e utilização da lente olho de peixe invertida, que permitem sensações mais realistas (BAHAM, 2010). Para preencher o restante da sala, instrumentos musicais coloridos, pintados com tinta específica para luz negra, parecem brilhar com a utilização dessa iluminação. Também eles são presos por linhas, dando a impressão de estarem flutuando. Invocadas por Madame Leota, as assombrações começam a se materializar na saída da sala, quando são projetados traços de luz nas paredes que parecem espíritos se movimentando (efeito adquirido com uma parte da parede falsa – de material semitransparente – que contém uma espécie de caixa atrás, pintada com tinta fosforescente, que é iluminada aos poucos) (DOOMBUGGIES, 2014).

Grande Salão Em um andar acima da cena é possível visualizar um grande cômodo, composto por sala de jantar, de estar e um espaço para dança. O Omnimover está onde poderia ser o mezanino da mansão. O que se vê é a materialização dos fantasmas. Em sua primeira aparição, fazem parte de uma festa de aniversário de morte: os primeiros chegam em um carro fúnebre; outros estão sentados à mesa, celebrando enquanto a aniversariante assopra as velas no bolo; alguns descansam nas poltronas; outros dançam em pares enquanto um fantasma toca um órgão de onde saem “caveiras-espírito”. Por fim, há fantasmas pendurados no lustre e saindo de seus próprios retratos pintados em quadros, formando um duelo de armas. É a partir da aniversariante que a cena se forma: ao assoprar as velas do bolo, os fantasmas desaparecem, e voltam a aparecer depois de alguns segundos. Aqui se observa o que se chama de Pepper’s Ghost Effect: efeito de ilusionismo utilizado no século XIX em teatros e shows que se aproveita de reflexos em vidros para simular fantasmas. Na atração, o Doom Buggy direcionado de frente para um vidro de difícil visualização faz com que o ângulo de observação seja de cima para baixo. Logo abaixo e atrás dos visitantes estão os Audioanimatronics em uma caixa preta, em posição espelhada, que quando são iluminados refletem no vidro e completam a cena. À frente da caixa preta, o que o observador pode ver é a sala vazia, com os móveis empoeirados e diversos objetos tridimensionais (pratos, talheres, toalhas, livros, flores, móveis...) (BAHAM, 2010).

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Os Audioanimatronics que dançam estão fixos em duas bases circulares: a primeira é da dimensão de cada casal, que gira rapidamente. A segunda comporta todos os casais, girando de modo mais lento, como se eles trocassem de posição no salão. Da mesma forma, é utilizado o mecanismo para as outras ações dos fantasmas: alguns saem dos retratos; outros balançam na cadeira de balanço; outros entram através do carro fúnebre. O figurino auxilia ainda mais na ilusão: é composto por tecidos leves, translúcidos e em tons pastéis, que dá movimento à cena. Nos corpos, a cor branca, acentuada no rosto para trazer expressão. O objetivo é criar um melhor efeito na presença de luz negra, refletindo os corpos o máximo possível (DOOMBUGGIES, 2014).

Figura 8: Corte esquemático do Grande Salão. Fonte: da autora, 2014.

Sótão O que se vê na nova cena são restos de presentes de casamento. O ambiente é composto por móveis empoeirados repletos de teia de aranha, flores mortas e muitos objetos como lamparinas, prataria, álbuns, caixas, instrumentos musicais e um bolo de casamento. Junto deles, há cinco quadros que retratam casais no dia do casamento, todos eles com a mesma mulher. Trata-se de Constance, que se casou cinco vezes para conseguir sua ascensão social. Para enfatizar o lado tragicômico da história, em que supostamente seus maridos foram decapitados, os quadros realizam o efeito de desaparecimento das cabeças dos maridos.

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Possivelmente, analisando os relatos de Cancilla (2001, p. 6), trata-se de uma projeção simples por trás que some em fade-out em meio ao restante da imagem, que é pintada em tela. A atmosfera sombria e melancólica é intensificada com o uso da iluminação azulada e da sonoplastia que imita batidas de coração. Ouve-se ainda a música Bridal Chorus, de Wagner. Para finalizar a cena, Constance espera os visitantes na saída. Enquanto fala sobre finais felizes de forma irônica, um machado é materializado em suas mãos. Percebe-se a reunião de efeitos em harmonia: o corpo não apresenta braços ou pernas, possibilitando maior sensação fantasmagórica; a utilização de um vestido esvoaçante em conjunto com ventiladores localizados no piso; a ausência de braços como solução para a materialização do machado, já que os braços e o objeto são projetados na “tela” criada pelo próprio véu do figurino; no rosto, o Leota Effect é utilizado de maneira estática. A luz azulada em conjunto com a luz negra intensifica a atmosfera no figurino branco e semitransparente da noiva fantasma (SURRELL, 2009; BAHAM, 2010).

Cemitério Ao sair por uma das janelas do sótão, o Doom Buggy inicia uma descida ao cemitério, onde ocorre uma festa de celebração de mortos-vivos como início do terceiro ato. Além do bosque de árvores mortas, o primeiro elemento que se nota são infinitos fantasmas que voam em direção ao céu. Segundo Surrell (2009, p. 89), trata-se de imagens projetadas em uma bola de espelhos que gira, o que resulta no surgimento de uma grande quantidade de espectros, réplicas da projeção inicial, projetados em telas. No bosque, além de flashes de relâmpagos, nota-se o zelador ao lado de seu cão, segurando um lampião com seus joelhos tremendo – maquinaria Audioanimatronic. A utilização de várias camadas de tela fina (como layers) em todo o cemitério dá maior profundidade à cena, além de causar a sensação de haver uma espécie de neblina no local (BAHAM, 2010). A sala é ainda mais ampla que a da Sessão Espírita, e com o efeito de perspectiva forçada parece ser infinita. Além dos layers, elementos como lápides e morros têm seu tamanho reduzido conforme se distanciam do trilho dos Doom Buggies, em ambos lados, sendo impossível encontrar o fundo da sala. Maquinaria simples faz com que as cabeças de alguns cadáveres levantem e abaixem em suas covas, enquanto outros tocam instrumentos

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musicais ao fundo ou brincam em gangorras. O figurino de alguns, em tecido elástico, cria um movimento mais intenso. Também deve-se ao figurino boa parte do auxílio em convencer o espectador de que se tratam de fantasmas: um casaco de material semelhante ao de capas de chuva, semitransparente, é utilizado em grande escala. Em alguns personagens, o esqueleto mecânico é revelado propositalmente, de forma difusa, embaixo da capa. Segundo Sweezey (1981, p. 1), a tecnologia Audioanimatronic utilizada é um sistema hidráulico associado a computadores que criam o mecanismo de movimento. O plástico translúcido é o preferido na utilização por se tratar de espíritos, mas em áreas motorizadas, como na cabeça, esse material fica mais opaco, tornando o “esqueleto” mais difuso. Embora a luz tenha grande importância na atração como um todo, é no cemitério que ela se destaca. A luz negra intensifica os figurinos translúcidos, sendo peça chave para a atmosfera: a contraluz de todos os props, árvores e construções são feitas com ela para fazer referência à luz do luar. Spotlights fechadas ou luz difusa são inseridas frontalmente aos fantasmas, ao mesmo tempo em que criam a diferenciação entre personagens vivos e mortos: os animais e o zelador são iluminados com luz branca fria em contraste ao azulado dos fantasmas e cadáveres. Compõem a cena ainda cinco bustos em mármore que cantam a música tema da atração. A ironia é enfatizada pelo segundo busto, que mesmo com o pescoço quebrado e a cabeça caída continua cantando. O efeito utilizado nos rostos é novamente o Leota Effect, mas de forma exagerada: para maior caricaturalidade as gravações foram feitas de modo que os atores poderiam mover apenas os músculos da face, deixando o restante do rosto e do corpo estáticos (SURRELL, 2009; BAHAM, 2010). A cena é concebida para não ser observada em sua totalidade, tal é a complexidade e quantidade de elementos visuais. Os personagens formam uma mistura de eras e origens diferentes, como alguns vikings, uma família real vitoriana, ingleses tomando chá ou uma múmia egípcia em um sarcófago.

Cripta Em uma cripta, os três fantasmas que acabaram se tornando símbolos fortes da mansão (Hitchhiking Ghosts) pedem carona no Omnimover do visitante. O figurino similar a uma capa de chuva com o esqueleto mecânico aparente é utilizado. Olhos esbugalhados e faces cadavéricas aumentam a ironia.

SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Espelhos O Doom Buggy é encaminhado para um corredor, onde gira e fica frente a frente com três espelhos enquanto se move. Neles, o visitante vê seu reflexo enquanto um dos três Hitchhiking Ghosts aparece para lhe fazer companhia. Em um dos efeitos, o fantasma intruso parece sentar acima do Doom Buggy, em outro deitar, enquanto faz truques variados, como por exemplo trocar a cabeça dos visitantes no reflexo do suposto espelho. Em seu livro, Baham (2010, p. 95) explica que o efeito é uma espécie de Pepper’s Ghost invertido: os “espelhos” são vidros que refletem o observador, enquanto uma projeção dentro de uma sala atrás do vidro se move e faz truques. A troca de cabeças, por exemplo, pode ser explicada por meio da filmagem em tempo real do visitante, também projetada no vidro.

Pequena Leota Para finalizar o brinquedo, um fantasma em miniatura, apelidado de Little Leota, se despede dos visitantes dentro da cripta com tijolos desgastados. Uma urna repleta de teia de aranha está ao seu lado. O efeito Leota é visto pela última vez, auxiliado pelo figurino semitransparente iluminado por luz negra e uso de ventiladores.

Saída Assim como a entrada, para os Imagineers a saída do brinquedo também é importante, e apresenta o Cross-dissolve. O projeto prevê a saída do visitante por uma espécie de túnel que vem da cripta e o leva ao andar de cima – a saída em nível do brinquedo. A iluminação é intensificada aos poucos, até que se chega à área externa iluminada pela luz natural.

Conclusões A atração The Haunted Mansion apresenta grande qualidade na união de efeitos tecnológicos e cenográficos voltados para o encantamento do público, e por esse motivo é – mesmo após cinco décadas – uma das atrações preferidas dos turistas que vão ao Magic Kingdom. Nota-se com esse estudo que, embora haja certos recursos de tecnologia avançada, em geral os efeitos são bastante acessíveis, de execução relativamente simples. A exceção fica por conta da tecnologia Audioanimatronic, patenteada pela Walt Disney Company, e do Leota Effect.

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Essas exceções, no entanto, merecem atenção: conforme Mine et al. (2012, p. 36) afirma, atrações de parques temáticos são planejadas para durarem de 10 a 20 anos e, ao analisar um brinquedo em operação há quase 50, como a The Haunted Mansion, deve-se ter em mente que algumas tecnologias são datadas e, devido a isso, encontrar peças de reposição em caso de necessidade pode ser um problema. A equipe também pode ter dificuldades, uma vez que designers e engenheiros novos podem não conhecer certas tecnologias que em uma determinada época eram comuns. Por esse motivo é necessário haver constantes reformulações em atrações clássicas, como foi feito com essa em questão. O alto custo de manutenção e projeto, além de pesquisas patenteadas e mantidas em segredo pela Walt Disney Company, poderiam nos levar a crer que seu modelo é único e insubstituível. Porém, tem-se visto cada vez mais parques brasileiros investindo em melhorias consideráveis em sua estrutura, alcançando bons níveis de satisfação de seus visitantes. É possível perceber com essa pesquisa que, embora haja certas tecnologias ainda distantes da realidade brasileira, um investimento maior no aspecto cenográfico de parques temáticos traria benefícios para a apreensão e inserção do público na realidade proposta e deveria ser prioritário, já que alguns dos efeitos visuais encontrados em atrações de sucesso, como a The Haunted Mansion, baseiam-se mais em soluções criativas de baixo custo do que em tecnologias avançadas. Podem-se citar como exemplo alguns recursos simples de ilusão de ótica, como os bustos invertidos e íris profundas que “seguem” os visitantes com o olhar; projeções em telas, utilizadas em abundância na atração, como revelação de elementos ocultos (através de relâmpagos) ou meio de reprodução de imagens utilizadas em grande quantidade (como os infinitos espectros do cemitério); e técnicas de ilusionismo clássicas, como o Pepper’s Ghost, que é a base para a sala mais comentada entre os fãs do brinquedo. Esses e outros recursos, de baixo orçamento, podem ser explorados nos parques temáticos com auxílio de outras áreas já de domínio no meio teatral e audiovisual, como a iluminação e figurino dos personagens presentes. Na The Haunted Hause, o uso excessivo de materiais como plásticos e tecidos esvoaçantes – em união com ventiladores; as cores em tons pastéis ou branca; a penumbra e a luz negra criam a atmosfera fantasmagórica ideal para a apreensão da magia teatral do brinquedo, dando o suporte necessário para os já citados artifícios visuais. O método de projeto, advindo do cinema, também é ponto de contribuição para a discussão: uma vez que os parques objetivam inserir o visitante em uma realidade cinematográfica, é interessante que seu plano diretor, método e divisão interna dos brinquedos

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tenham relação com essa realidade. O conceito torna-se mais forte e o visitante adquire um entendimento melhor, ainda que inconsciente, dessa fantasia. A atenção aos detalhes, desde a ambientação externa, até o início da atração (ainda nas filas) e sua saída é fator a ser destacado: o conceito de fade-in e fade-out evita transições bruscas de realidade e encaminha o espectador para dentro da atmosfera pretendida de modo gradual, sem que seja sentida de imediato. Isso torna clara a necessidade de um olhar diferenciado voltado para o aspecto cenográfico dos parques temáticos, de forma a trabalhar em conjunto com novas tecnologias – e não focando somente nelas – uma vez que alguns recursos simples pontuais são suficientes para a criação da magia teatral pretendida.

Referências: BAHAM, Jeff. An Unofficial History of Disney’s Haunted Mansion. ___: Doombuggies, 2010. CANCILLA, Dominick. Crouching Rumors, Hidden Mansion. The Spook, New York, n. 4, out. 2001. Disponível em: <http://www.doombuggies.com/media/misc/thespook-200110m.pdf>. Acesso em: 01.out.2014 DOOMBUGGIES (site). Disponível em: <http://www.doombuggies.com/>. Acesso em: 30.set.2014 HENCH, John. Designing Disney: imagineering and the art of the show. Charlotte: Baker & Taylor, CATS, 2009. HORN, Tom. Walt Disney World Resort: behind the scenes. In: Disney Parks: where dreams come true. Chicago: Lightship Entertainment, 2011. 1 videodisco (52 min) MARLING, Karal Ann (editor). Designing Disney’s Theme Parks: the architecture of reassurance. 1. Ed. Montréal: Flammarion, 1998. MINE, Mark et al. Projection-Based Augmented Reality in Disney Theme Parks. Computer, v. 45, n. 7, jul. 2012. Disponível em: <http://web.cs.wpi.edu/~gogo/courses/cs525A/papers/Mine_2012_ProjectionAR.pdf>. Acesso em: 04.dez.2014 RHODES, Mark. Magic Kingdom: imagineering the magic. Lake Buena Vista: Disney Theme Park Merchandise, 2009. 2 videodiscos (100 min) SURRELL, Jason. The Haunted Mansion: from the Magic Kingdom to the Movies. 2. ed. Lake Buena Vista: Disney Press, 2009.

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SWEEZEY, Charles. All that’s 3D is not holography: Disney World’s Haunted House. Holosphere, v. 10, n. 1, jan. 1981. Disponível em: <http://www.doombuggies.com/media_library_holosphere.php>. Acesso em: 04.dez.2014

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14. ESPAÇOS PÚBLICOS: UM POTENCIAL CULTURAL Anelise Bassani Gueri 48

Resumo: Este artigo apresenta-se como uma análise de pesquisas bibliográfica e analítica a partir de estudos dos espaços públicos e seus potenciais culturais, levando em consideração a visão da população sobre a “imagem da cidade”, bem como a fluxos urbanos e eventos culturais. Inclui acontecimentos históricos para esclarecer o diálogo inicial entre sociedade e espaço cultural. Utiliza-se de exemplos localizados no centro da cidade de Curitiba para elucidar o pensamento de potencialidade do lugar e questioná-los quanto às atuais utilizações em aspectos culturais, assim como sobre as influências políticas. Palavras-chave: Espaços públicos. Imagem da cidade. Eventos culturais. Curitiba.

Introdução Em meio a elementos estacionários de uma cidade, o ser humano guarda em sua memória imagens, formando com elas um mapeamento mental cheio de lembranças e significados. É sob esta premissa que Kevin Lynch desenvolveu algumas de suas ideias, que ele descreve livro A Imagem da Cidade. Em consonância com essas ideias e diante de observações cognitivas sobre alguns espaços específicos da cidade podemos compreender estes locais de diferentes formas, as quais serão citadas e descritas em seguida. O objetivo deste artigo é relacionar a comunicação e integração entre os espaços com seus repertórios culturais e históricos, os quais são realizados a partir de projetos de reestruturação e restauração dos espaços. Alguns exemplos das regiões centrais de Curitiba serão citados, como o Corredor Cultural – que se apresentava indissociável do evidente repertório de arte e cultura que é proposto pelos vários espaços culturais ao seu redor. Em síntese, a proposta consiste em relacionar a sociedade, os espaços correlatos do antigo Corredor Cultural e as propostas de eventos que propiciam avanços na área cultural nos espaços físicos existentes neste centro.

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Anelise Gueri é Especialista em Cenografia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (2014). Arquiteta Urbanista formada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2011). O presente artigo foi orientado pelo prof. Dr. Walter Lima Torres Neto, da Universidade Federal do Paraná. Revisão: Marjure Kosugi. E-mail: anelise.gueri@hotmail.com SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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Desenvolvimento Um dos pontos de partida para o desenvolvimento deste artigo é a necessidade imaginativa das pessoas, a percepção da sociedade sobre os espaços e sua correlação com os possíveis espaços com potenciais culturais. Ao olhar desatento da sociedade, que se encontra cheia de ocupações e preocupações diárias, poucas identificações sobre o espaço podem ser relevantes. Desta forma, é primordial ao entendimento desses elementos, que se estabelecem em uma relação, a qual é geralmente identificada por signos mentais.

A sociedade e suas relações com a cidade A mentalidade do ser humano se condiciona e se transforma em um préestabelecimento racional da percepção do indivíduo, quanto à direção das ruas e aos elementos construídos que a compõem, que estão ligados principalmente em associações que se faz com algum espaço da cidade. Esta é a “imagem da cidade” impregnada de lembranças e significados, que anteveem sempre sensações e as transformam em movimentos, certamente pouco perceptíveis a todos os cidadãos. “[...] nada é vivenciado em si mesmo, mas sempre em relação com seus arredores e com as sequências de elementos que a ele conduzem, bem como às lembranças de experiências passadas.” (LYNCH, 2006, p.1) Kevin Lynch (2006) entendeu esse sistema e percebeu que essa relação entre a população de uma cidade e seu traçado pode existir mutuamente, pois eles influenciam e são influenciados, baseados pela memória. Itinerários,

cruzamentos,

centros

urbanos,

elementos

independentes,

porém

coincidentes de um traçado urbano, constituem em um aglomerado que e tangencia um fluxo condicionante de população, que é atraído para certas tipologias constituintes e necessárias àquele espaço. São condicionantes da memória que, vinculados, têm por sua vez a performance quanto a reforçar espaços e signos, os quais carregam uma importância correlata, evidenciada também por Marc Augé, em Não Lugares: “[...] o itinerário que leva ate ele sinalizado por etapas e pontos fortes, compõe com ele um lugar “de sentido único”, um “espaço”, no sentido em que Michel de Couteau usa o termo.” (2012, p. 84) As cidades, elementos construídos, estão sempre em grande mudança, em reforço à trajetória do dia a dia desta circulação promovida pelos “códigos cotidianos”, signos mentais. É supondo que uma rotina diária proporcione a nós sempre os mesmos percursos, com os mesmos significados, que, em consequência, teríamos um ritmo de vida constante. Devido a

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certas tendências de movimento, comércio e estruturas no geral condicionam-se e preparamse de modo a se inserirem em um espaço de intensa lucratividade. E é diante de um sistema que muitas outras funcionalidades da cidade também a compõem, para que tudo possa se complementar. É perante um fluxo convergente, o qual surge pela narrativa dos usuários, que se inicia a “construção da cidade” determinada por certas zonas de confluência. Estes núcleos surgem devido às praticas cotidianas e aos repertórios de usos, que, por sua vez, proporcionam um aglomerado de interesses em comum. A interferência cria uma lógica de configuração, caracterizada como novos territórios e ambientes, espaços que relacionam sujeito e objeto sob uma dinâmica de correlações. A forma dinâmica da cidade habita o pensamento da população por meio do significado de alternativas imutáveis, e é desta forma que se constrói uma silhueta urbana de propriedade daqueles que a entendem e conseguem tirar partido favorável dela. Fortalecida pela polarização de certas funções urbanas, as quais conduzem a novos direcionamentos e padronizações, principalmente quanto a determinadas tipologias organizacionais do espaço, a hierarquia urbana se estabelece com maior propriedade em alguns espaços da cidade e proporciona uma transformação de suma importância no que diz respeito principalmente ao uso do solo destas regiões. Christaller, geógrafo alemão, perseverante no entendimento de condicionantes espaciais, questionava sobre essa influência dos espaços públicos, com o pensamento estruturante de que: “Para utilizar elementos construídos no tradicional de hierarquia urbana é importante considerar o conjunto de relações que influenciam o espaço publico.” (LIMA, 2007, p. 51) A partir da experiência e vivência pessoal de cada cidadão influenciado por interações sociais, somadas ao influxo externo de um contexto urbano, a experiência de uma hierarquia urbana pode ser um tanto perigosa. Entende-se como polarização segundo a lógica governamental, como exemplares de ações de desordem que se caracterizam como um modo de domínio, desintencionado ou não, do espaço. É neste momento em que, pela contenção de massas, há certamente uma resistência quanto ao espaço público, regido por ações governamentais. Por esse potencial gestor, que rege a resistência de elementos sob a hegemonia de um espaço, o processo de transformação torna-se mais determinante. Este contexto esteve presente em alguns dos textos-base de José Carreira, o qual intensifica sob seu modo de visão suas referências sempre relacionadas ao espectador de um teatro de rua.

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São os processos espaciais e as demandas do traçado urbano junto à sociedade, as quais dominam e são dominadas, que perpetuam sobre as emoções urbanas de escritos de Bruce Nauman em interpretações de Martin Peran; “[...] tornar-se um artista que interpreta os códigos hegemônicos (mobilidade impulsionada, segurança...) que organizam experiência de um espaço sujeito a várias narrativas ideológicas.” (PERAN, 2010, p. 4). E é por essa interpretação de repressão, que se condiciona a um certo gerenciamento do espaço, que por muitos passa desapercebido. Apesar de imaginarmos que essa inter-relação existe somente entre espaço, o homem e também as forças governamentais, juntamente com alguns outros fatores contribuem incisivamente para esse envolvimento. Devido a esse sistema de relações da atualidade é necessário que façamos uma reflexão sobre mudanças entre os estilos de vida e inserção de elementos comuns ao dia a dia – como televisores, acesso a músicas, internet, alimentação, que, neste tempo presente são essenciais –, pois consistem em mudanças na recepção primeira do ser humano, resultado do impacto de uma evolução tecnológica. Tais mudanças enraizadas possuem forte influência, quase que imediata pela dinâmica evolutiva que se procedem. Uma onda de pró-atividade se cria pela nova realidade citada anteriormente e se modifica principalmente pela intervenção de elementos, os quais em poucos anos alteram a cultura e a economia mundial, como consequência do sentimento e das relações recriadas, até mesmo com os espaços da cidade. Foi desta forma que Carreira identificou em seu texto Teatro de rua como apropriação da silhueta urbana: hibridismo e jogo no espaço inóspito (2001) esses sistemas de relações entre novas e antigas necessidades humanas, as quais podem impactar nas relações existentes entre o cidadão e a cidade.

Diálogo cultural entre cidadão e lugar urbano Em História da arte como história da cidade, Argan argumenta sobre a história do teatro e quanto foi perceptível o discernimento de que, com a evolução de recursos teatrais como a “caixa preta” e a iluminação cênica, o teatro deixou de ser de todos e passou a ser elitizado. Este teatro “Fina Flor” se desenvolveu com maior objetivo para exibir vestidos em camarotes, carruagens e, para muitos leigos no assunto, apenas para vislumbrar e cortejar a própria burguesia. E até hoje muito deste conceito de “alta sociedade teatral” permanece como um ideal desnecessário. Contudo, essa história teatral começou de forma bem diferente, em arenas abertas, anfiteatros enormes, com o intuito básico de atrair a população geral –

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assim como também a Commedia dell’arte atraiu para as ruas a atenção de pessoas no mercado. (ARGAN, 2006) Esse retrocesso quanto ao uso das ruas para apresentações e eventos, com domínio apenas da população de maior poder aquisitivo, principalmente dentro de um espaço físico fechado, desfavoreceu o diálogo de certas estruturas artísticas dominantes do lugar urbano, as quais teriam maior acesso e comunicação direta com as massas. Outras formas de relações entre o espaço da rua e a população também foram possíveis, como protestos políticos, festivais e eventos de grande porte, propícios e possíveis devido às relações de variedades qualitativas do uso do espaço público, diferentes pelas questões e relações do uso como rotineiras. As transformações de formas de usos sociais dos espaços da cidade, mediante interferência, mesmo que teatral, geram novos olhares, e até mesmo novas formas de perceber e compreender a cidade. A circulação cotidiana não é prodiga em propor encontros vinculantes. As performances artísticas atuam diretamente sobre esses elementos, estimulando novas posturas e relações, pois buscam rupturas do cotidiano. Interfere na trama complexa constituída por diversos elementos culturais e pelos procedimentos de circulação cotidiana. A fratura das rotinas é ponto chave da produção de sentidos que o espetáculo propõe, pois supõe outras formas de convivência, ainda que momentâneas. (CARREIRA, 2011, p. 4)

O diálogo entre a população e o lugar urbano propaga-se com o frequentar dos espaços, vivência diária constante de repertórios seguidos em fluxos dentro do traçado urbano. A convivência com os espaços torna o cidadão integrado à cidade como uma forma de relacionamento com o lugar, criando vínculos imaginativos. Tais zonas relacionais que permitem definir lugares, sob conceitos associativos no intrínseco mental da população, podem determinar aspectos de carácter artístico, lugares que se correlacionam por sua capacidade cultural. O que importa é que o espaço de uso público se ofereça como um meio de socialização e estímulo para a troca sobre múltiplos modos, em que ocorram interações normatizadas e ações comuns, em que se materializem modos de organização da sociabilidade específicos de grupos sócio culturais. (LIMA, 2007, p. 46)

O conceito referente ao apontamento de zonas ditas culturais, que permitem associações de permanência e convivência com determinadas estruturas, tende a novas SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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demandas que propiciam o surgimento de mais espaços culturais nas proximidades. Uma determinação com certeza intuitiva na qual a própria cidade se propõe. Muita desta atração possibilita o surgimento de novos espaços semelhantes naquele percurso, espaços que estão intimamente ligados e que se oferecem dentro deste limite social. Pela demanda há um crescimento dos mesmos elementos, que são determinantes, para uma homogeneidade e desenvolvimento daquele polo. Em resumo, é a identificação de pontos culturais importantes dentro do traçado urbano, o qual agrega valor ao desenvolvimento acelerado, ao mesmo tempo criando certa competitividade dentro daquele círculo de envolvimento cultural e criativo. Segundo Canclini, em Imaginários Culturais da Cidade: Conhecimentos/ Espetáculos/ Desconhecimentos (2014), a construção das cidades perdeu sua visão e foco geral e agora se estabelece de forma dinâmica potencializada principalmente pelas setorizações em fluxos relacionais com a economia, comunicações e turismo e eu diria também com relação cultural, sob polos de tendência. Em meio a essas tendências materializava-se uma organização social exclusiva de pessoas de grupos sociais culturalmente semelhantes. Essas tendências estão intrinsecamente ligadas à construção de valores, sob um aspecto de visão daquele espaço imaginário e seus lugares físicos. Alguns espaços, com o tempo, perdem seu conceito agregado de cultura. Não somente o tempo, como a falta de intenções políticas e de investimentos sobre o lugar, e também os novos usos, criam no imaginário social urbano certo medo, que interferem no fluxo urbano. Pensando sobre o aspecto de reestruturação de espaços públicos com potencial cultural e degradados faz-se necessária a reconstrução urbana que, como consequência recria valores perdidos. Intervenções públicas, geralmente realizadas por instituições do comércio e/ou pela própria prefeitura, com projetos urbanos, são consideradas ideias necessárias para agregar valor em áreas de “perda de função e socialização”, como a conceituação de “integradores de grupos sociais”. Espaços Públicos “Culturais” e Espetacularização Como já citado, alguns espaços urbanos estão sob repertórios de usos que são favoráveis a atividades culturais, e, exatamente por essa condição de receptividade e potencialidade cultural, surgem estratégias que possibilitariam a utilização destes espaços para a experimentação de eventos culturais, por parte dos órgãos públicos. São espaços que se caracterizam por um momento como um estado de significância para os cidadãos que se

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utilizam deste local, que, diante de uma nova significação e composição, se reelaboram em um novo “conceito imaginativo” daquele lugar. Em meio à ressignificação de usos dos espaços públicos, com objetivos aleatórios que não sejam a construção de novos “imaginativos da cidade”, os eventos intuitivamente acabam por compor também novas perspectivas relativas ao meio em que se sugerem, consequência do uso a que são impostos. Diante de uma política de imposições, alguns espaços públicos que possuem oferta cultural são expostos a um grupo marginalizado, o qual acaba por desagregar partes da cidade que nesse caso são expostas a ideais limitadores e condicionadores. É de fácil compreensão que o governo, ao mesmo tempo que se organiza e faz a população ocupar espaços na cidade, impulsiona a utilização dos eventos, mas cujo objetivo é o controle governamental. São tendências naturais de política de uma população com falta de cultura. A utilização dos espaços a partir de novas significâncias é uma preocupação governamental que coexiste e é relacionada principalmente com a manutenção do poder. E é também por esse motivo que são os espaços públicos os mais utilizados quando há manifestações. Adquirindo um papel rearticulador do espaço da cidade, as forças de poder governamental associam a ideia de eventos culturais à transformação de patrimônio cultural como apropriação de uma interação de domínio pela lógica de Cidade-Espetáculo, produto comercial de domesticação dessa população que se se vê abaixo da necessidade básica de cultura. Estamos transformando as cidades mediante o conhecimento e a cultura ou convertemos as cidades em espetáculo cultural sem modificar as desordens estruturais? A espetacularização do social existe desde há séculos (missas, desfiles, e outros ritos massivos), mas sua hipertrofia numa época de industrialização da cultura aumenta o risco de nos desviarmos da satisfação de necessidades sociais: no âmbito urbano, a redução da cidade a espetáculo se associa ao predomínio do marketing e à captação de investimentos sobre o sentido social dos bens materiais e simbólicos. (CANCLINI, 2005, p. 5)

Há muito tempo, mais precisamente desde o início do teatro primitivo, quando utilizavam esta técnica para celebrações, tais intervenções sociais já se compunham para o domínio da massificação, as quais tomam partido de um espaço através de elementos forçados, atualmente denominadas “Disneyficações” dos espaços. Estes exemplos que foram plantados não determinam um espaço cultural de identidade, pois transmitem uma falsa impressão cultural, porém, eles oferecem algum espaço

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cultural mesmo que incoerente, pensamento triste de necessidade básica quanto à cultura. Estamos diante de “[...] sintomas de uma civilização do simulacro que evidencia a lógica cultural do capitalismo avançado.” (Jamenson apud LIMA; MALEQUE, p. 38). Jameson com suas palavras nos permite pensar que a recorrente cultura a que somos propostos, pensando principalmente em espaços públicos, é decorrência de poucas condições interpretativas, com baixo investimento educacional e uma forma de controle político mascarado, permanente em países pouco desenvolvidos.

Melhorias dos Espaços: Corredor Cultural de Curitiba Nos ambientes urbanos da atualidade percebe-se que há uma busca constante por restauração, principalmente da composição urbana. Por muitas vezes tratam-se de estruturas urbanas esquecidas e degradadas pelo tempo, subutilizadas, onde se concentram prostituição, doenças e drogas, o que, ao mesmo tempo, afasta a população do fluxo do dia a dia, devido à ideia que se tem do local, que para muitos é de total insegurança. Estruturas recentes nascem e convivem com espaços antigos, morfologias que com o tempo devem ser restauradas para que permitam o fluxo natural dos cidadãos. O sentido da reestruturação de locais deve buscar integrar as formas do espaço e os processos sociais, como sentido mais importante. Em análise, estas reestruturações devem possibilitar contribuições aos espaços, reunidas sob transformações do lugar urbano, mas que não propiciem uma perda da história do espaço a ser também requalificado. A identidade cultural da cidade impõe-se sobre a morfologia urbana, em signos intuitivos que, por sua vez, são necessários e permanentes, mesmo que em lugares que recebam uma requalificação e/ou reestruturação.

Panos de preservação podem representar, para as cidades brasileiras, de uma só vez: melhoria na qualidade de vida urbana, crescimento da renda e do emprego nas cidades, construção da memória social e da identidade cultural – portanto, avanço social, cultural, econômico e fortalecimento da cidadania. (LIMA, 2007, p. 67)

Em Curitiba existem alguns exemplos quanto à reestruturação de espaços, como é o caso das ruas Riachuelo e São Francisco, no centro de Curitiba. Da mesma forma, também tinha sido pensado o projeto para o antes denominado Corredor Cultural. A região do Corredor Cultural era o espaço correlato entre o Prédio Histórico da Universidade Federal do Paraná, passando pela praça Santos Andrade e pelo Centro Cultural Teatro Guaíra, em direção SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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ao prédio da Reitoria, também da Universidade Federal do Paraná (Figura 01). Este corredor era definido não somente pela sua linha estruturante central, mas também pelo seu entorno e pelas correspondências culturais em sua proximidade, algumas das quais não existem mais.

N

CEP PP

PR TLS TJM

CM

TR

TB CCTG

BC

PSA

BdC

PH CSM

LEGENDA

CC

CSM Capela Santa

PSA

Praça Santos Andrade

Maria

CC

Caixa Cultural

CCTG

Centro Cultural Teatro Guaíra

BdC

Praça Bolso do Ciclista

TB

Teatro Barracão Encena

PH

Prédio Histórico Universidade Federal do Paraná

CEP Colégio Estadual do Paraná CM

Cia das Máscaras

Nova São Francisco

Nova Riachuelo

Corredor Cultural

PR

Prédio Reitoria Universidade Federal do Paraná

PP

BC

Bicicletaria Cultural

TJM

Teatro José Maria TR Santos

TLS

Passeio Público

Teatro Lala Schneider Teatro da Reitoria

Figura 1 – Mapa do Corredor Cultural e elementos circundantes. Fonte: autora

O Corredor Cultural foi um projeto realizado por meio da parceria entre a Prefeitura, a Universidade Federal e a FIEP – que possuía incentivos comerciais e, principalmente, interesses resguardados. A parcela da população referente aos estudantes universitários sentiuse enganada pelo apelo ao compromisso cultural, instaurado por meio de um exagerado marketing político, pouco voltado para o retorno para essa população, a qual efetivamente faz uso desse contexto. Utilizado como elemento de publicidade política para alguns deputados, e também desenvolvimento econômico do comércio local, o desenvolvimento cultural da região

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foi o último quesitos a ser levado em consideração. E, em consequência das divergências entre população e autoridades, o projeto do Corredor Cultural não foi aprovado na câmara. O crédito cultural instaurado para essa região do Corredor Cultural existe, a princípio, por todo um contexto cultural que coexiste sobre os elementos de grande influência deste espaço. O Prédio Histórico da Universidade Federal do Paraná, a Praça Santos Andrade e o Complexo do Teatro Guaíra situam-se estrategicamente encaixados no traçado urbano. Observando a partir de aspectos variados, nota-se nessa região que as ruas ao redor possibilitam uma convergência para este Corredor, acentuando o fluxo existente nesta área. A Praça Santos Andrade é um elemento muito importante, pois trata-se de um espaço livre de construções, uma praça de convivência, entre dois grandes elementos de referência na cidade – e também por esse motivo é um acentuador do fluxo. Esta praça é palco de grandes eventos culturais, shows, apresentações ao ar livre, assim como de manifestações, pois possui um conceito civil agregado como potencialidade. Este conceito civil é importante para identificar locais onde pode haver possíveis formações de massas, assim como pontos referenciais para encontros da população quando há organizações. Estes lugares são, em sua grande maioria, pontos importantes dentro do traçado urbano. Ao seu redor também existem espaços culturais que propiciaram certo avanço quanto à iniciativa cultural instaurada nesta região. Além dos locais já citados existem ainda: a Caixa Cultural, o Teatro Barracão Encena e a Bicicletaria Cultural. O estímulo cultural se deve, a princípio, pelo ponto de maior intuito cultural das proximidades, o Centro Cultural Teatro Guaíra que, por se tratar de uma construção antiga, assim como o Prédio Histórico da UFPR, agrega valor. A identidade dos espaços citados é construída por certa imaginabilidade que se cria pelas características físicas da cidade, principalmente do “Corredor Cultural” de forte impacto. É o recordar a respeito de um repertório de usos ligados à cultura, interesses em comum, que aperfeiçoa a dinâmica entre as relações dos espaços citados. Este é o conceito proposto pelo livro A Imagem da Cidade, que faz uma análise dos fluxos e convívio do que se vê no dia a dia (LYNCH, 2006). Sobretudo por características físicas e também acontecimentos nesses espaços da cidade, que, por ventura, instaurem-se como recordação daquele espaço na imaginação da população como repertórios de usos. Esses espaços foram palco de shows, apresentações de teatro e eventos como a Virada Cultural e o Festival de Teatro de Curitiba, que acabam por instaurar o significado destes espaços para a população presente.

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Sem dúvida alguma estas “referências mentais” são definidas por territórios de pertencimento, imagens que por sua definição física e simbólica de limites e zoneamentos formam uma relação entre o espaço da cidade e o cidadão, potencializada pela combinação de espaços culturais que estão à sua proximidade.

Considerações finais “A cidade favorece a arte, é a própria arte” (ARGAN, 2005, p. 1) foram palavras de Lewis Mumford, e descrevem o quanto a cidade pode de alguma forma se comunicar pela arte. A cidade é viva, cresce diante do olhar dos que a habitam e é fonte e produto artístico dos elementos da rua, assim como da comunidade. Ao desenvolver o pensamento sobre o espaço da cidade percebemos que a imagem da cidade condiciona muitos dos fluxos e habitats da população – alguns negligenciados passam a ser alvo de marginalidade e, por esse motivo, são pouco utilizados no dia a dia do cidadão. A busca por uma recuperação e requalificação destes espaços agrega e desenvolve aspectos que estavam perdidos antes da construção de “nova reputação”. Um exemplo existente na cidade de Curitiba foi a restauração e requalificação das ruas São Francisco e Riachuelo, as quais ganharam uma nova repaginada e elevaram principalmente os preços dos aluguéis da região. São ruas que ganharam um fluxo diário de pessoas, com uma mudança de público, devido à diminuição de aspectos negativos que existiam antes da requalificação, como a prostituição e a venda e consumo de drogas. Esta requalificação da região próxima ao Corredor Cultural, nas ruas São Francisco e Riachuelo, foi primordial para o desenvolvimento cultural da região. Analisando o crescimento quanto à relação cultural nesta localidade, pode-se identificar o surgimento recente de uma praça pública (Bolso do Ciclista) e da Bicicletaria Cultural. Há uma demanda cultural propícia a este espaço urbano, pois trata-se de uma região de grande acessibilidade, além de se estabelecer também e principalmente ao redor de dois campus universitários e um Centro Cultural (Teatro Guaíra). Este espaço urbano possui características propícias a eventos de grande porte, como a Virada Cultural e o Festival de Teatro de Curitiba. Esses eventos transformam o percurso diário do cidadão e ficam marcados na história e na memória das pessoas que utilizam o local, devido a uma diversidade que se propõe em comparação ao dia a dia. Os eventos culturais de grande porte crescem em larga escala no país e em Curitiba não poderia ser diferente. A necessidade de espaços urbanos que se adequem a estes eventos é

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analítica e restritiva. Obviamente o espaço denominado antigamente de Corredor Cultural e suas proximidades são ideais para estes eventos, pois possuem muitos referenciais culturais – ditados no texto anteriormente. O uso desses espaços públicos para eventos é, sem dúvida, um avanço para a cultura da população e um início para o desenvolvimento de uma educação cultural local, pois transgridem o dia a dia da população. Ao mesmo tempo em que existe a necessidade de afirmação deste espaço urbano, que é apontado como cultural, deve haver uma preocupação maior por parte dos órgãos públicos e das autoridades locais quanto à utilização destes espaços para eventos, para que possam abranger toda a classes da população de forma igualitária, sem envolver interesses políticos. Desta forma é possível entender que o desenvolvimento cultural de um espaço da cidade depende também do que a própria rua e o habitat oferecem e agregam à população, em meio a ideais culturais e aspectos que o próprio cidadão constrói.

Referências: ARGAN, G. C. História da arte como história da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 2005. AUGÉ, Marc. Não-lugares: introdução a uma antropologia da supermodernidade. Trad. Maria Lucia Pereira. 9ª ed. Campinas, SP: Papirus: 2012. CANCLINI, Nestor García. Imaginarios urbanos. Eudeba: Buenos Aires, 2005. CANCLINI, Nestor García. Imaginários Culturais da Cidade: Conhecimento/ Espetáculo/ Desconhecimento. Disponível em: <http://nestorgarciacanclini.net/index.php> Acesso em: 27 ago. 2014. CAMPAGNARO, Yuri Gabriel. Corredor Cultural de Curitiba: o que é?. Blog Fatos são teimosos. 09 nov. 2010. Disponível em: <http://fatossaoteimosos.blogspot.com.br/2010/11/ corredor-cultural-de-curitiba-o-que-e.html> Acesso em: 30 ago. 2014. CARDOSO, Ricardo José Brugger. Espaço cênico-espaço urbano – a relação entre os espaços das artes cênicas e os espaços públicos da cidade. Dissertação (Mestrado em Urbanismo). Programa de Pós-Graduação em Urbanismo, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2001. CARREIRA, André. Sobre um ator para um teatro que invade a cidade. Revista Moringa. João Pessoa, Vol. 2, n. 2, 13-26, jul./dez. de 2011.

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______. Ambiente, Fluxo e Dramaturgias da cidade – materiais do teatro de invasão. O Percevejo, Rio de Janeiro, n. 13, artigo 2, 2009. ______. Teatro de rua como apropriação da silhueta urbana: hibridismo e jogo no espaço inóspito. Trans/Form/Ação, vol. 24, n.1, Marília, SP, 2001. LIMA, Evelyn Furquim Werneck; MALEQUE, Miria Roseira. Espaço e cidade: conceitos e leituras. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007. LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 2006. PERAN, Martí. Espacios (practicados, ficticios e institucionales). 2010. Disponível em: <www.martiperan.net>. Acesso em: 27 ago. 2014.

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APÊNDICES

A) Ementas das disciplinas do II Curso de Especialização em Cenografia (2013-2014) 

História da cenografia e do lugar teatral (40 horas) Ementa: Introdução à história do teatro. Características da arquitetura cênica. Tipologias espaciais. Espaços abertos, fechados, a rua. Espaço cênico e lugar teatral – dimensões estruturais do espaço no teatro. Modificações do espaço teatral no século XX. Ismael Scheffler, UTFPR (Graduação em Bacharelado em Direção Teatral, Especialização, Mestrado e Doutorado em Teatro).

Sociedade e espaço teatral (20 horas) Ementa: Contextos culturais e a constituição dos espaços teatrais. Organizações sociais e econômicas como determinadoras do teatro. Relações entre ética e estética na escolha do espaço teatral. Walter Lima Torres Neto, UFPR (Graduação em Artes Cênicas com Habilitação em Interpretação e em Direção Teatral, Mestrado e Doutorado em Teatro – Artes do Espetáculo Teatro).

A modernização teatral e a cena contemporânea (20 horas) Ementa: O teatro no final do século XIX e o movimento de modernização da cena ocidental. Direção x Encenação. As vanguardas teatrais. Tendências do teatro contemporâneo. Walter Lima Torres Neto.

História das Artes Visuais (40 horas) Ementa: Principais manifestações artísticas e suas relações com o espaço, da Pré-história ao contexto contemporâneo. Pintura e representação do espaço. Escultura e espaço de apresentação. Happening, performance, instalação: espaço e tempo. Novas mídias e o espaço virtual. Simone Landal, UTFPR (Graduação em Desenho Industrial, Especialização em História da Arte e Mestrado em Comunicação e Linguagens).

Interdisciplinaridade artística contemporânea (20 horas) Ementa: Da “Arte Total” às dissoluções das fronteiras artísticas. Questões para a formação do artista na atualidade. Amábilis de Jesus da Silva, FAP (Graduação em Educação Artística, Especialização em Fundamentos Estéticos para a Arte-Educação e Mestrado em Teatro e Doutorado em Artes Cênicas).

Introdução à dramaturgia (20 horas) Ementa: Características do texto dramático. Gêneros literários. Gêneros teatrais. Teatro e poesia. O texto teatral na história do teatro. A dramaturgia no teatro grego clássico, no Renascimento, no Romantismo, no Naturalismo. O distanciamento brechtiano. O pós-dramático. Maurini de Souza, UTFPR (Graduação em Letras e Jornalismo, Mestrado em Letras e Doutorado em Linguística).

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Apropriação e memória da arquitetura (15 horas) Ementa: Simbologia e imaginário da arquitetura e da urbanidade. Dramaturgia do espaço. Teatro ambiental. André Carreira, UDESC (Graduação em Licenciatura em Educação Artística (Artes Plásticas) e Doutorado em Teatro).

Projetos e registros cenográficos (30 horas) Ementa: Plantas. Maquetes. Projetos. Registros. Processos de criação em cenografia. José da Silva Dias, UNIRIO e UFRJ (Graduação em Artes Cênicas, Especialização em Didática, Mestrado e Doutorado em Artes).

Composição visual em cenografia (30 horas) Ementa: Composição, conceitos e aplicações, em cenografia. Uso dos elementos estruturais: Ponto, Linha, Forma e Volume. Elementos intelectuais da composição: Equilíbrio, Proporção, Harmonia, Ritmo, Movimento, Unidade, Repetição Simples e Complexa, Fusão, Composição e Percepção Bi e Tridimensional. Percepção do Movimento. Eliane Betazzi Bizerril Seleme, UTFPR (Graduação em Desenho Industrial e Mestrado em Engenharia da Produção).

Atelier de criação plástica (40 horas) Ementa: Esboço. Perspectiva. Proporção. Estudo do claro, escuro e sombras. Estudo das cores. Volume. Texturas. Fotografia. Representação dinâmica. Criatividade. Ismael Scheffler e Ivone Terezinha de Castro, UTFPR (Graduação em Comunicação Visual e Mestrado em Tecnologia).

Atelier de materiais e técnicas cenográficas (40 horas) Ementa: Estudo de materiais aplicados à cenografia. Materiais estruturais. Materiais de revestimento. Pintura. Modelagem. Processos de criação e confecção. Alfredo Gomes Filho, Villa Hauer Cultural (Graduação em Teologia e Especialização em Cenografia).

Laboratório de experimentação espacial (20 horas) Ementa: O corpo no espaço. Percepção sensível do ambiente. Níveis do corpo e do espaço. O espaço dinâmico. O centro e a periferia. Dinâmica espacial das paixões. Ismael Scheffler.

Laboratório de iluminação cênica (30 horas) Ementa: A Iluminação Cênica como linguagem visual do Espetáculo. Conceitos e funções. Equipamentos de luz e fontes alternativas. Metodologia e Processo de Criação de um Projeto de Iluminação. Documentos da Luz: Mapa, Roteiro e Relação. Iluminação e projeções de imagens como cenografia. Nádia Luciani, FAP (Graduação em Comunicação Visual, com pesquisa de graduação em Design Teatral – Iluminação Cênica, Especialização em Design, Mestrado em Teatro).

Análise dramaturgia, cênica e cenográfica (60 horas) Ementa: Análise dramatúrgica. O texto teatral e a cenografia. Princípios de direção cênica. Direção e cenografia. Inter-relação dos elementos cênicos. Processos de criação. Análise dos elementos visuais da encenação. Ismael Scheffler, Ivone Terezinha de Castro e Maurini de Souza, UTFPR.

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Cenografia aplicada a exposições (20 horas) Ementa: Cenografia teatral e cenografia aplicada ao design de exposições. Conceituação, caracterização e histórico das exposições. Projetos em design de exposições. Simone Landal, UTFPR.

Metodologia da Pesquisa (25 horas) Ementa: Fundamentos da metodologia científica. Normas para elaboração de trabalhos acadêmicos. Elaboração de artigo científico. Fontes de Pesquisa. Métodos e técnicas de pesquisa. Projeto de pesquisa. Instrumentos de coleta de dados. Laíze Márcia Porto Alegre, UTFPR (Graduação em Desenho Industrial, Mestrado em Tecnologia e Doutorado em Educação).

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B) II Seminário de Cenografia 04 a 06 de dezembro de 2014 - Local: Universidade Tecnológica Federal do Paraná - Curitiba Programação: 04/12 - Miniauditório 19h30 - Lançamento do livro “Questões de cenografia I” (Editora Arte Final), com textos produzidos pelos alunos do I Curso de Especialização em Cenografia (turma 2009-2010), e organização dos professores Dr. Ismael Scheffler e Dra. Laíze Porto Alegre, e do catálogo digital da exposição “Maquetes cenográficas” (Editora da UTFPR), realizada no SESC Água Verde, em Curitiba, em agosto de 2014, durante a realização do Festival Palco Giratório, nesta cidade, com organização de Ismael Scheffler. 20h30 - Palestra e bate-papo “Formação em Cenografia”, professor Dr. Ismael Scheffler. A formação em cenografia no Brasil se dá por diferentes meios possuindo características distintas. Os cursos, oficinas ou práticas procuram instrumentalizar o profissional da cenografia para atuar neste campo em expansão. Além de um panorama mais amplo, também será abordado o projeto da nova edição do Curso de Especialização em Cenografia da UTFPR que terá início em 2015. Ismael Scheffler é Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Teatro da Universidade do Estado de Santa Catarina (2013), onde também concluiu o mestrado em Teatro (2004); é Especialista em Teatro (2001) e Bacharel em Artes Cênicas - Habilitação em Direção Teatral (1999) pela Faculdade de Artes do Paraná. Participou do Laboratório de Estudo do Movimento na Escola Internacional de Teatro Jacques Lecoq, em Paris (2010-2011). Como encenador, já dirigiu diversos espetáculos em espaços alternativos como Babel (20132014), A breve dança de Romeu e Julieta (2009), O Barba Azul e a filha do Barba Azul (2009) e Ubu rei (2008). É professor do Departamento de Extensão da Universidade Tecnológica Federal do Paraná desde 2007 e diretor do TUT - Grupo de Teatro da UTFPR. É professor e coordenador do Curso de Especialização em Cenografia da UTFPR.

05/12 - Miniauditório 19h30 - Palestra e bate-papo “Cenografia: ontem, hoje e manhã?”, cenógrafo Carlos Kur. A partir de sua ampla experiência no universo dos palcos, seja como cenógrafo, iluminador, figurinista ou consultor de arquitetura teatral, Carlos Kur abordará diversas questões refletindo sobre os rumos da cenografia e os desafios do cenógrafo na atualidade. Carlos Kur é natural de Montevidéu, Uruguai, estudou desenho e pintura na Escola de Belas Artes. Realizou seus primeiros trabalhos como cenógrafo, em 1963, no Teatro Solis e no Canal 5 e vários balés. Em 1967/68 ganhou uma bolsa de estudos do British Council, para um curso de aperfeiçoamento no Teatro Sadler's Wells, em Londres, nas áreas de cenário, figurino e iluminação. Em 1970, foi escolhido pela crítica uruguaia como melhor cenógrafo e pela criação na ópera I Pagliacci. No período de 1971 a 1977, realizou trabalhos como cenógrafo, figurinista e iluminador de óperas para a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA) e para a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Desde 1976 está vinculado ao Teatro Guaíra de CuritibaBrasil, onde fez cenários, figurinos e iluminação para balés e óperas. Em 1987 foi agraciado com uma bolsa de estudos pelo British Council, para participar do curso "Planejamento e Reformas de Teatros". Em Março de 2007 recebeu o "Prêmio Especial" do troféu "Gralha Azul" pelo seu trabalho como cenógrafo, figurinista, iluminador e professor considerando a sua relevante contribuição artística e técnica às Artes Cênicas do Paraná, e também pelo seu empenho na formação de gerações de técnicos e artistas cênicos. Através da Fundação Teatro Guaíra, tem prestado orientação aos teatros dos municípios paranaenses. Por muitos anos foi o Chefe da equipe Técnica do Teatro Guaíra.

06/12 - Sala C 105 10h - Mesas temáticas com apresentação de trabalhos de conclusão de curso dos alunos do II Curso de Especialização em Cenografia da UTFPR (turma 2013-2014). Mediação: professora Dra. Amábilis de Jesus da Silva (UNESPAR/FAP). SCHEFFLER, I.; LANDAL, S. (orgs.). Questões de cenografia II: cenografia no teatro e em outros contextos. Curitiba: Arte Final, 2016.


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C) Seminário de Design Cênico: elementos visuais e sonoros da cena Ismael Scheffler

O Seminário de Design Cênico: elementos visuais e sonoros da cena propôs um espaço para a reflexão, discussão e compartilhamento de pesquisas e experiências nacionais e internacionais nos campos da Cenografia, Iluminação Cênica, Figurino, Maquiagem Cênica, Sonoplastia, Direção de Arte e Arquitetura Teatral. Além de palestras, mesas redondas e debates, o Seminário de Design Cênico constituiu um fórum para a apresentação de pesquisas acadêmicas realizadas em cursos de graduação e pós-graduação em Teatro, Cinema, Arquitetura, Design, Produção Cênica e cursos afins cujos conceitos artísticos sejam (ou possam ser) aplicados em meios diversos. A formação acadêmica em Cenografia é prevista no Brasil desde 1965 (pelo Conselho Nacional de Teatro, que regulamentou com a Lei nº 464, três áreas de formação no ensino superior: Direção Teatral, Cenografia e professorado de Arte Dramática) e se estabeleceu como uma das habilitações de bacharelado em Artes Cênicas desde 1971 (Cenografia, Direção Teatral, Interpretação Teatral e Teoria do Teatro), porém, o país ainda carece de fóruns de discussões que fomentem o ensino e a pesquisa relacionados à Cenografia e demais elementos visuais e sonoros da cena. Algumas iniciativas têm sido propostas no Brasil e no exterior de forma a incentivar e colaborar com este campo de atuação artística e profissional. Neste sentido, o Seminário de Design Cênico pretendia contribuir para a construção de conhecimento na área, a gerar encontros, movimentos de troca de saberes e experiências. O Seminário de Design Cênico: elementos visuais e sonoros da cena fez parte do Programa de Extensão Desenvolvimento Cenográfico, contemplado com recursos do Edital ProExt 2013, do MEC/SESu. Foi realizado pelo TUT – Grupo de Teatro da UTFPR com a colaboração de professores da UTFPR, UFPR e FAP. Este evento teve como público alvo estudantes de graduação e de pós-graduação, professores, pesquisadores e artistas profissionais das diversas áreas do conhecimento que desenvolvem atividades relacionadas ao Design Cênico (cenografia, iluminação artística, maquiagem cênica, figurino, sonoplastia, direção de arte, arquitetura teatral e áreas afins). Foram previstas diferentes formas de participação: 1) como comunicador(a) oral – mediante inscrição prévia e aprovação de comunicação (com publicação de artigo nos anais do evento). Professores, pesquisadores, alunos de pósgraduação stricto senso e lato senso (com orientador), alunos de graduação somente com orientadores (Iniciação Científica ou de Pesquisas de Conclusão de Curso) ou coautoria com professor pesquisador – 12 participantes. 2) como ouvinte: estudantes de graduação e pós-graduação, docentes, artistas, comunidade interessada – 50 participantes. 3) como aluno de oficina: estudantes de graduação e pós-graduação, docentes, artistas, comunidade interessada.

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Programação: 1º dia de evento, 06 de novembro (quarta-feira): 16h às 19h – cadastramento 19h – Abertura: contou com a presença da diretora interina do campus Denise Buiar e da Diretora de Extensão da reitoria Laíze Márcia Porto Alegre, entre outros. 20h – Palestra 1: Jean-Guy Lecat (Paris, França) - “A simplicidade no teatro é muito sofisticada” (“La simplicité au théâtre est très sophistiqué”). Em francês com tradução de Nádia Luciani. 2º dia de evento, 07 de novembro (quinta-feira): 9h às 12h – Oficinas (inscrições específicas) 14h – Comunicações 16h30 – Mesa redonda 1: Terminologias possíveis: conceitos e definições para os elementos visuais e sonoros da cena - Mona Magalhães (RJ), Soraya Sugayama (PR), Luiz Fernando Pereira – LF (SC), Eduardo Tudella (BA). 19h30 – Palestra 2 e 3: Luciana Bueno (SP) “Direção de Arte. Imagem e Cena”; e Ary Giordani (SP) “O discurso sonoro e suas articulações: o áudio como elemento dramatúrgico”. 3º dia de evento, 08 de novembro (sexta-feira): 9h às 12h – Oficinas (inscrições específicas) 14h – Comunicações 16h30 – Mesa redonda 2: Formação em design cênico: experiências, possibilidades e perspectivas - Sávio de Araújo (UFRN), Ismael Scheffler (UTFPR), Nádia Luciani (FAP); Luiz Henrique da Silva e Sá (UNIRIO). 19h30 – Palestra 4 e 5: Mona Magalhães (RJ) “Processos e sentidos da maquiagem cênica”. Estava prevista a participação de Guilherme Bonfanti (SP), com o tema: “O processo de criação da luz no Teatro da Vertigem”, mas não pode ser realizada. 4º dia de evento, 09 de novembro (sábado): 9h às 12h – Oficinas (inscrições específicas) 14h – Mesa redonda 3: Organizações nacionais e internacionais em performance design – Nádia Luciani (PR), Rosane Muniz (SP), Aby Cohen (SP) e Jean-Guy Lecat (França). 16h às 17h – Encerramento As oficinas realizadas durante o evento foram:   

Oficina 1: Edifícios adaptados para teatros (9 horas) (Jean-Guy Lecat) – 16 participantes; Oficina 2: Cenografia para ballets e espetáculos de dança (3 horas) (Carlos Kur) – 14 participantes; Oficina 3: Estudos Cenográficos e Tecnologias da Cena: construindo uma abordagem multidisciplinar (3 horas) (José Sávio Oliveira de Araújo) – 19 participantes;

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   

Oficina 4: O figurinista na construção da visualidade da cena (3 horas) (Rosane Muniz) – 11 participantes; Oficina 5: Introdução a materiais cenográficos (3horas) (Alfredo Gomes Filho) – 12 participantes; Oficina 6: Direção de Arte Cênica: uma conversa sobre o processo de criação (3 horas) (Lu Bueno) – 27 participantes; Oficina 7: Noções Básicas para Introdução do Cálculo Luminotécnico (3 horas) (Cláudia de Bem) – 11 participantes.

As exposições realizadas durante o evento foram: - Performeios #2 - Núcleo de Arte e Tecnologia da Faculdade de Artes do Paraná. O Núcleo de Arte e Tecnologia – NATFAP, criado em 2010, reúne um grupo de artistas e pesquisadores da Faculdade de Artes do Paraná que tem como objetivo desenvolver produções artísticas e teóricas. Ao atuar em duas linhas de pesquisa, Semiótica e Processo de Criação e Crítica, procura compor um ambiente de inter-relação entre pesquisa científica e artística. Em conexão com a cultura contemporânea, o grupo de pesquisa apresenta suas produções artísticas e experimentais no evento Performeios #2. Os integrantes desse evento buscam desdobramentos cognitivos e estéticos no uso de: software para produção artística; estética de banco de dados; narrativa interativa; processo de criação da luz e na espacialização sonora.     

Obra: “desprogrAmandoprogrAmado” Autor: Luiz AntonioZahdi Salgado; Obra: Projeto de Iluminação para o Espetáculo Disparis (2010 e 2011) Autor: Nadia Moroz Luciani; Obra: TOUCH ME, 2013 Autor: Inara Vidal; Obra: Emoções Luminosas: Fragmento I - “Reflexos Mutantes” Autor: Cláudia de Bem; Obra: “Planetárias” Autor: Jack Holmer.

- Exposição de maquetes cenográficas. As maquetes foram confeccionadas por alunos do Curso de Especialização em Cenografia daUTFPR, sob orientação do professor Dr. José Dias (UNIRIO/ UFRJ). Foram quatro propostas de cenografia realista criadas em grupos a partir de quatro textos dramáticos diferentes. Incluía também fotografias, plantas e detalhamentos do desenho das maquetes. Organização:   

Coordenação Geral do Seminário: Ismael Scheffler (UTFPR). Comissão Organizadora do Seminário: Grupo de Desenvolvimento Cenográfico (UTFPR); Dáphene Zandoná (estagiária do TUT/ UTFPR); Nádia Luciani (LABIC/ FAP). Comitê científico: Dra. Amábilis de Jesus da Silva (FAP), Mestranda Nádia Luciani (FAP), MSc. Soraya Sugayama (UFPR), MSc. Ivone de Castro (UTFPR), Dr. Walter Lima Torres Neto (UFPR), Dr. Ismael Scheffler (UTFPR).

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D) Exposição Maquetes Cenográficas Ismael Scheffler

A exposição Maquetes cenográficas foi realizada no SESC Água Verde, em Curitiba, PR, de 13 a 30 de agosto de 2014, durante a realização do Festival Palco Giratório, nesta cidade. Atendendo a um convite do SESC-PR, Scheffler propõs esse tema para a exposição, incluindo diferentes trabalhos realizados no campo da Cenografia, desenvolvidos em duas diferentes frentes, durante 2013-2014, na Universidade Tecnológica Federal do Paraná, em Curitiba. A exposição apresentou trabalhos realizados pelos alunos do II Curso de Especialização em Cenografia (pós-graduação Lato Sensu) em três diferentes disciplinas: Atelier de criação plástica, ministrada pela professora Ivone de Castro, Composição visual em cenografia, pela professora Eliane Betazzi Bizerril Seleme e Projetos e registros cenográficos, pelo professor José Dias (UNIRIO/ UFRJ). Neste sentido, as maquetes cenográficas possuíam diferentes objetivos e tiveram diferentes propostas: uma maquete cenográfica como um exercício criativo rápido, elaborada a partir de um tema; diferentes propostas de cenografia elaboradas a partir de um mesmo texto teatral; maquetes para cenografias teatrais realistas. A exposição também trouxe diferentes elementos do processo de criação da cenografia do espetáculo “Babel”, criado em 2013 e apresentado em 2013 e 2014 por dois programas de extensão universitária da UTFPR, coordenados por mim, que trabalharam associados: o TUT (Grupo de Teatro da UTFPR, criado em 1972) e o PEDC (Programa de Extensão Desenvolvimento Cenográfico, realizado em 2013). O projeto expositivo foi desenvolvido por um grupo de alunas do II Curso de Especialização em Cenografia da UTFPR, servindo como um campo de extensão do aprendizado do curso: Virgínia Pitta, Anelise Gueri, Juliana Choma e Juliane Scoton. Coordenação, curadoria e direção de produção: Ismael Scheffler Recursos para a realização da exposição (impressões e pintura das paredes): SESC Água Verde. Gerente Executiva do Sesc Água Verde: Aquilla Maris Nicz; Produtora Cultural do Sesc Água Verde: Edilene Guzzoni; Equipe Sesc Água Verde: Ronaldo Bevilac Marcondes e Fausto Said Saad. O catálogo digital da exposição Maquetes Cenográficas pode ser acessado pela internet.

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