Itinerante Nº6

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!"#$%&#'( egundo alguns historiadores, fez-se contrabando na nossa fronteira terrestre desde a primeira metade do século XIII, sendo as populações da raia os principais atores desta atividade ilegal. Na maior parte dos casos, este contrabando era de subsistência, tornando-se em muitas regiões uma âncora de sobrevivência das populações, que transportavam para o outro lado da fronteira todo o tipo de mercadorias. Era o complemento possível a uma agricultura muito pobre e difícil. Já no Estado Novo, os perigosos “jogos do gato e do rato”, evitando os guardas-fiscais, do lado de cá, e os carabineiros, do lado de lá, jogavam-se essencialmente à volta do contrabando de café. Procuravam-se os percursos mais agrestes e as noites de temporal, o que tornava esta atividade muito exigente, para além de perigosa. Nesta Itinerante vai “ouvir” histórias e testemunhos de contrabandistas e guardas-fiscais e vai ficar a Conhecer melhor o sentir destas gentes da raia portuguesa que viveram, à volta do contrabando, momentos de esperança e de desespero, trágicos e divertidos, tristes e felizes. Momentos que até inspiraram poemas. Vai perceber porque é que, em tantos anos de perseguições e fugas, há a lastimar muito menos fins trágicos do que seria de esperar. E esta viagem no tempo vai fazê-la em várias mãos: de contrabandistas, de guardas-fiscais, de esposas, de mães e de filhos, cada uma contando a sua história, acrescentando o seu ponto de vista. E se ficar curioso e quiser saber ainda mais, selecionámos várias e variadas fontes de informação sobre este tema na já habitual rubrica “Estante”. Vai também encontrar 6 percursos pedestres à volta das fronteiras de norte a sul de Portugal continental, que lhe permitirão Caminhar e “respirar os ares” do contrabando. E quando for percorrê-los, tente imaginar as dificuldades que estas gentes encontravam nas suas caminhadas, cheias de carregos, em pisos difíceis e de noite, com medo, muitas vezes com mau tempo, sem botas nem blusões especiais, sem gore-tex, sem mochilas anatómicas... e surpreenda-se com a resistência necessária, tanto física como psicológica! Deixamos-lhe ainda, como sempre, ótimas sugestões para poder Conviver no final do passeio, à volta de agradáveis e saborosas surpresas gastronómicas. Contrabando: mais um tema incontornável para a sua coleção de pedestrianismo Itinerante!

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Nuno Gama Nunes

Editorial According to some historians smuggling has spread along our land borders since the first half of the 13th century having the border inhabitants as the main actors of this illegal activity. This type of smuggling was mostly a subsistence one and it became an anchor of the population’s survival in many regions. These people carried all kinds of goods to the other side of the border and that was the possible supplement to a very poor and difficult agriculture. During the dictatorship (“Estado Novo”) the dangerous games of “cat and mice”, avoiding the fiscal guards on our side of the border and the carabineers on the Spanish side, were played mostly around coffee smuggling. Smugglers chose the roughest routes and stormy nights thus making this activity very demanding and difficult. In this issue of Itinerante you’ll “listen” to stories and reports of smugglers and fiscal guards and you’ll get to know better the feelings of the people of the Portuguese border who lived moments of hope and despair, both tragic and funny , sad and happy because of smuggling. Some of these moments have even been the inspiration for poems. You’ll also understand why in so many years of persecutions and escapes, there are fewer tragic ends to regret than expected. And you´ll be led through this time travel by smugglers, fiscal guards, wives, mothers and children, each of them telling their sories and adding their point of view. If in the end you are curious and want to know more, we have selected some and varied sources of information about the theme in the usual “Bookcase” section. You’ll also find 6 pedestrian trails around the borders of Mainland Portugal from north to south, which will allow you to walk and “breathe the air” of smuggling. And when you walk these trails, try to imagine the difficulties that these people found in their walks carrying their loads on rough footpaths at night, afraid and often in harsh weather, without boots or special jackets, without gore-tex or anatomical backpacks... and be surprised by the endurance needed, both physical and psychological. As usual, we also give you good suggestions to socialize at the end of your walk around pleasant and tasty gastronomic surprises. Smuggling: another unavoidable theme for your collection of Itinerante pedestrianism. Nuno Gama Nunes


#*"#+! Propriedade e Edição: Itinerante - Divulgação Histórica e Cultural, crl. NIPC 508951500 Morada (Sede/Redacção): Rua Abranches Ferrão, 23-3º, 1600-296 Lisboa info@itinerante.pt www.itinerante.pt

MOMENTOS CAMINHEIROS

CONHECER OS 5 PILARES DO CONTRABANDO, NO ALENTEJO

ESTANTE

HISTÓRIAS "CONTRABANDÍSTICAS"

À CONVERSA COM JOSÉ MANUEL CAMPOS

A GUARDA ESQUECIDA por Custódio Duarte

Direcção: Nuno Gama Nunes Redacção: José Constantino Costa (coordenador CONHECER) - jose.costa@itinerante.pt Nuno Gama Nunes (coordenador CAMINHAR) - nuno.nunes@itinerante.pt Carlos Vaz (coordenador CONVIVER) - carlos.vaz@itinerante.pt Carlos Oliveira Duarte Vilar Miguel Ângelo (cartoon)

TESTEMUNHOS "CONTRABANDÍSTICOS"

EM TERRAS DO EXTREMO por José Constantino Costa

Tratamento de imagem: Luís Ribeiro - luis.ribeiro@itinerante.pt Tradução: Casimira Albuquerque Maria João Batalha Reis 4VSHYpnS +Vj½GE Joana Oliveira Susana Gama Web Design: CoreFactor - IT Consulting & Design

MOURA — TRÊS OLHARES

Impressão: 7-+ 7SGMIHEHI -RHYWXVMEP +Vj½GE Rua Pêro Escobar, 21 2680-574 Camarate Distribuição: Logista Portugal Cesodilivros

Registo ERC nº 125763 Depósito Legal nº 301328 / 09 ISSN nº 1647-4082

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A VIDA DO CONTRABANDO

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CONTRABANDO DE CALÇADO

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CARTOON

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poema de Rosa Dias

por Paulo Leitão Batista

Tiragem: 6.000 exemplares Periocidade: Quadrimestral

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A ÚLTIMA VIAGEM

um conto de João Carlos Campos

Publicidade: publicidade@itinerante.pt Assinaturas: assinaturas@itinerante.pt

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por Miguel Ângelo


CAMINHAR

50 52 54 55 59 63 67 71 75

NATUREZA + AVENTURA + GPS = GEOCACHING

LOCALIZAÇÃO DOS TRILHOS

INFORMAÇÕES SOBRE OS TRILHOS

DE TOURÉM A RANDIN

DE FÓIOS A NAVASFRIAS

DE SALVATERRA DO EXTREMO A ZARZA LA MAYOR

DE GALEGOS A LA FONTAÑERA

DE SOBRAL DA ADIÇA À FRONTEIRA

DE SANTANA DE CAMBAS À MINA DE S.DOMINGOS

CONVIVER

80 82 84 86 88 89

UMA BOA MESA NA SERRA DAS MESAS

UM PURO ALENTEJANO

POR UMA BOA CAÇA

NA TRILHA DA BOA GASTRONOMIA

CONTRABANDOS por Duarte Vilar

BLOCO DE NOTAS


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Amareleja – N 38º11' 52.3'' W 7º14' 03.6''


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!"!#$%"&' ()!*$+#*,"& por MARIA LETRA

)'-"#*,)'$"'".+" aminhar faz bem à saúde física e mental. Caminhar tira o stress. Caminhar dá boa disposição. Caminhar só traz benefícios! Hmmmm... caminhar não tem facetas negativas? Nem uma? Hmmmm... Aqui entre nós, que ninguém nos ouve, vamos hoje quebrar um tabu – “caminhar só traz benefícios” – e levar o leitor a passear pelo lado-negro-das-caminhadas! Vamos ser a poeira no olho do pedestrianismo, a areia na engrenagem do trekking, o Darth Vader dos caminheiros! Vamos ser pedestrianisticamente incorretos, a contracorrente do statu quo caminheiro! Para um neófito das caminhadas, aderir a um grupo de caminheiros é como voltar aos primeiros dias da escola primária: de repente tudo é novo, desde os “colegas” até aos “professores”, passando pelo “recreio” e pelas “habilidades” que uns vão querer mostrar e outros vão evitar mostrar não ter. Colegas de caminhada experientes e destemidos, um guia insensível às dificuldades dos caminheiros ou um percurso agreste podem ser fonte de problemas para um novo “aluno” mais frágil ou desajeitado, dando origem àquela que é conhecida como “síndrome do 1º dia de aulas”. A bondade da experiência que se possa vir a ter é temperada pela maior ou menor gentileza dos vários membros do grupo. Espera-se que, sendo adultos, tenham menor propensão a dizerem exatamente o que pensam sobre as (in)habilidades do estreante e, em princípio, possuam um maior grau de altruísmo e vontade de ajudar. Espera-se... No entanto, mesmo em GGGs – grupos de gente gentil –, vários são os problemas que podem ocorrer. A “síndrome do empecilho”, por exemplo, pode afetar um neófito inseguro se a pedadalada do grupo é mais poderosa do que a que ele pode suportar, provocando baixa autoestima e angústia. Outra condição grave, a “síndrome do encurralado”, pode ocorrer quando existe no grupo um picareta-falante com uma pedalada igual ou superior à do estreante; ingénuo e desconhecedor da “peça”, o novo caminheiro constitui um rechonchudo par de ouvidos a

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estrear! A inexistência de pontos de fuga é um alto fator de stress. Esta denominação – “síndrome do encurralado” – também pode ser usada, embora com menos propriedade, para caracterizar o estado de angústia que se apodera de um caminheiro “aflitinho” que, por um lado, tem que parar mas que, por outro lado, é incapaz de anunciar ao grupo a sua necessidade e, por isso, morre de medo de se perder do grupo caso decida parar. Muitos outros estados de corpo e de alma podem afetar negativamente os caminheiros mais ou menos experientes. Damos aqui relevo a dois, bastante comuns: a “síndrome Até-me-doem-os-olhos”, que afeta sobretudo os caminheiros destreinados que se envolvem em caminhadas fisicamente exigentes, e a “síndrome Não-fiz-mal-a-ninguém”, que denomina o estado de angústia que se apodera do estreante quando tudo na caminhada é percecionado como castigo – desde o cansaço extremo até à sensação de que o piquenique dos outros é muito melhor que o seu, passando pela convicção que o Manel lá do trabalho só o desafiou para a caminhada para se vingar de alguma coisa muito grave que não consegue vislumbrar. A terminar este passeio pelo lado-negro-das-caminhadas, alertamos ainda para algumas situações de maior especificidade, nomeadamente as que envolvem um grupo já nosso conhecido – os caminheiros fotógrafos – que, a bem dizer, são dos elementos mais perigosos de qualquer caminhada. Podemos ser atropelados por um fotógrafo-Vai-vem, podemo-nos perder do grupo quando vamos procurar um fotógrafo-Borboleta que se afastou ou se perdeu, ou podemos, ainda, esbarrar em fotógrafo-Emplastro e sermos esmagados pelos caminheiros seguintes. Muitas mais poderíamos aqui enumerar, mas o passeio já vai suficientemente negro... Uma pincelada de tons alegres para finalizar: apesar de todos os perigos que o statu quo do pedestrianismo costuma calar e dos quais nós, corajosamente, aqui revelámos parte, a esmagadora maioria dos aspirantes a caminheiros não se deixa amedrontar e repete alegremente...!


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a partir de textos e livros escritos por LUÍS FILIPE MAÇARICO

DOCUMENTOS ANTIGOS CONFIRMAM A EXISTÊNCIA SECULAR DO CONTRABANDO, PASSAGEM CLANDESTINA DE BENS E MERCADORIAS ENTRE DOIS PAÍSES, PARA EVITAR O PAGAMENTO DE TAXAS ALFANDEGÁRIAS. egundo Eusébio Medina Garcia (Contrabando En La Raya de Portugal, 2003), o contrabando era uma prática em toda a fronteira, desde finais do século XIV, usual no Minho e no Guadiana, que envolvia diversos setores da população e por vezes localidades inteiras. António Miguel Ascensão Nunes (Alcoutim Capital do Noroeste Algarvio. Subsídios para uma Monografia, 1985) refere que, em meados do século XV, Alcoutim serviu para alguns escravos atravessarem o grande rio do Sul até Espanha, não tendo os seus donos pago a dízima da lei. José Manuel Simão (A Nordeste de Todas as Histórias, 1999) afirma que o contrabando no Baixo Guadiana no século XVI assentava no comércio clandestino de gados para Castela. Entre os séculos XVI e XVIII há notícias de alguma conflitualidade,

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em Mourão, entre moradores fronteiriços, sendo a causa o descuido de pastores, cujas rezes não conheciam barreiras para a sua fome de prados. Terá sido a necessidade de uma fiscalização apertada que levou à nomeação de Pina Manique para superintendente geral dos contrabandos e descaminhos. Miguel Ángel Melón Jiménez, em Hacienda, comercio y contrabando en la frontera de Portugal, siglos XV-XVIII (1999) apresenta provas do contrabando ter atraído, no século XVIII, militares, religiosos e criadas de nobres, os quais buscavam no território português géneros com bastante aceitação no território espanhol, como musselinas, tecidos de algodão, vinho, aguardente e sal. Mas foi entre 1935 e 1960, nas zonas fronteiriças de Campo Maior, Elvas, Sobral da Adiça e Santana de Cambas que o contrabando irrompeu em larga escala.


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FOI ENTRE 1935 E 1960, NAS ZONAS FRONTEIRIÇAS DE CAMPO MAIOR, ELVAS, SOBRAL DA ADIÇA E SANTANA DE CAMBAS QUE O CONTRABANDO IRROMPEU EM LARGA ESCALA.

A MISÉRIA A pobreza e o desemprego que afligiam portugueses e espanhóis foram decisivos para o envolvimento de multidões de desfavorecidos no contrabando. Foi a miséria no Alentejo e a Guerra Civil espanhola que despoletaram um intenso vaivém dos dois lados da fronteira, em busca da sobrevivência. Segundo Francisco Neto, residente em Mértola e profundo conhecedor dos meandros do contrabando, chegaram a organizar-se na região grupos de sessenta homens carregados, para atravessar a fronteira. Café e ovos eram algumas das mercadorias levadas para Espanha enquanto a bombazina era trazida para Portugal. Indivíduos de todas as idades contrabandeavam para sobreviverem.

CAFÉ E OVOS ERAM ALGUMAS DAS MERCADORIAS LEVADAS PARA ESPANHA ENQUANTO A BOMBAZINA ERA TRAZIDA PARA PORTUGAL.

A GUARDA A Guarda-Fiscal e os carabineiros eram a outra face da mesma moeda. Procedendo a constantes perseguições, prisões e até a mortes – sabe-se que houve guardas fronteiriços que mataram contrabandistas, para garantirem o regresso, nem que fosse por castigo, ao Norte, de onde a maioria era oriunda –, zelavam para que os Estados taxassem as mercadorias. Mas sem o transporte ilegal de bens teriam a profissão ameaçada. Uns não existiam sem os outros... por isso, também se testemunharam atuações mais humanas por parte de alguns elementos policiais. Até houve contrabandistas que viraram guardas... e guardas que se tornaram contrabandistas!

OS RISCOS Contrabandear significava correr grandes riscos. O afogamento, na travessia de rios e ribeiras, durante o transporte noturno em noites e madrugadas invernosas de chuva e frio, aconteceu. Também havia o risco de se ser preso. E havia os tiros, por vezes certeiros. E havia a traição dos ameseiros, os denunciantes, que levavam ao abandono da carga, com receio de se ser apanhado. Atravessar rios e obstáculos policiais buscando a dignidade da côdea essencial, tentando sobreviver, resistindo às dificuldades, foi a solução de muita gente das terras raianas que se aventurou, comprometendo a própria vida. Os riscos corridos eram o preço do desespero; mas também da audácia.


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!"#$!%&!" '()$'*+&! por CUSTÓDIO DUARTE (Responsável pelo blogue TMGEGLSYVMpSW ¯ KYEVHE ½WGEP, que procura “manter viva a centenária Guarda Fiscal”)

Há um registo do ano de 1938, em que um guarda fiscal, recentemente admitido, se lamentava das contínuas noites ao relento, de ganhar menos que os seus colegas da Polícia e da GNR, mas, sobretudo, do profundo isolamento a que o serviço nos postos da fronteira o obrigava.

m termos genéricos, pode-se afirmar que a Guarda Fiscal, ções habitacionais, eram mais que indignas. As barracas eram feitas de durante os seus 107 anos de existência – desde a criação pedra e barro, sendo as portas de tábuas toscas de cofragem e o telhado em 1885, por um Governo de Fontes Pereira de Melo, até de colmo – palha de centeio malhado. As camas eram umas ‘tarimbas’ à sua extinção em 1993, pelo XII Governo Constitucional, arranjadas com uns paus. A água para bebermos tínhamos que a ir busliderado por Aníbal Cavaco e Silva –, foi o braço armado do car, com um cântaro de barro, a uma fonte ainda distante do posto.” Ministério das Finanças, particuA impossibilidade de se ausentarem da larmente da Alfândega Portuzona do posto, quer por motivo do rigoroso A PRINCIPAL MISSÃO DA GUARDA horário de serviço, quer por falta de caminhos guesa. Substituiu os guarda-barreiras que fiscalizavam as mercadorias à entrada das e meios de transporte, obrigava a que em torno FISCAL FOI SEMPRE EVITAR E cidades de Lisboa e Porto e foi a guardiã das REPRIMIR AS INFRAÇÕES FISCAIS de muitos destes postos isolados se instalasnossas fronteiras durante quase todo o sécuse uma pequena comunidade formada pelos lo XX. No âmbito das suas missões, viveu de guardas fiscais e suas famílias. Os guardas iam perto situações históricas delicadas, como a Guerra Civil de Espanha, a construindo nas horas de folga umas barracas com os materiais que entrada de refugiados da II Guerra, e a saída, “a salto”, pela fronteira de encontravam junto ao posto. Normalmente as paredes eram de terra milhares de portugueses que procuravam melhores condições de vida amassada e cobertas de colmo, noutros casos a terra era substituída por no estrangeiro. A seguir ao 25 de Abril de 1974, substituiu a PIDE/ pequenas pedras empilhadas. DGS no controlo de passageiros em todas as fronteiras. A alcunha de José Jorge prossegue o seu relato. “Era horrível! Os guardas casados “picachouriços”, com que sempre foram designados os guardas fiscais, tinham as mesmas condições. Recordo que a mulher de um colega, o fica a dever-se a uma sonda, um ferro estreito e pontiagudo, que estes João Sanches, teve de dar à luz numa dessas barracas, porque havia uma introduziam nos produtos a granel para verificar se havia algum produribeira próxima e quando chovia muito o caudal aumentava e ficávamos to de contrabando camuflado. The forgotten Guard A principal missão da Guarda Fiscal foi sempre evitar e reprimir as By Custódio Duarte infrações fiscais. Para evitar que as mercadorias fugissem ao pagamento (Author of the blog picachouriços – guarda fiscal that tries to “keep the centenary dos impostos aduaneiros, foram sendo criados dezenas e dezenas de Fiscal Guard alive”) postos fiscais junto da fronteira terrestre e marítima, muitos em lugares recônditos e de difícil acesso. Era, certamente, do serviço que tinha de Broadly speaking, we may say that the Fiscal Guard was the armed wing of the prestar num destes postos isolados que o jovem guarda fiscal se queixava. Ministry of Finance, especially of the Portuguese Customs during their 107 years of existence – from its establishment by the government of Fontes Pereira de Melo José Jorge dá-nos uma imagem de como era a vida num destes through to its extinction in 1993 by the XII Government leader Aníbal Cavaco Silva. postos, o posto fiscal da Foz dos Pardais, secção do Alandroal, por volta They replaced the guards that controlled the goods that entered the cities of Lisbon de 1960. “Só quem lá esteve é que pode avaliar aquilo que nós, guardas and Oporto and they guarded our borders for almost the whole 20th century. Within fiscais, sofremos. O posto era isolado e não havia qualquer caminho de the scope of their mission they went through delicate historical moments such as the Spanish Civil War, the entry of II World War refugees and the “a salto” emigration acesso numa distância de cerca de três quilómetros. Quanto às condi-

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incomunicáveis. Foi o meu amigo Sanches, pai do bebé, que teve de ser o parteiro e assistente da esposa, pois não conseguia sair dali devido à forte corrente da ribeira.” Este guarda reformado afirma, contudo, que sente muitas saudades desses tempos difíceis devido à muita camaradagem que existia entre os guardas fiscais. Para além destes postos completamente isolados, havia outros que se situavam dentro das localidades junto da fronteira. Nestes postos os guardas já podiam ter uma vida familiar mais condigna, havendo a possibilidade de alugarem casa e de os filhos frequentarem as escolas locais. Nestas povoações a convivência entre contrabandistas e guarda fiscais era, ao contrário do que se julga, normalmente pacífica. Num mesmo café poderiam estar a beber e a petiscar um guarda e um habitante que se dedicava ao contrabando. Cada um procurava que no calor do vinho e da conversa o outro se descuidasse e revelasse alguma informação importante. No fundo, “acertar” na hora e local por onde ia passar o contrabando, no caso dos guardas. Saber para que locais iam as patrulhas e onde eram montados os aguardos, no caso dos contrabandistas. António Lourenço, que fez serviço durante alguns anos no posto de Vale de Espinho, Sabugal, refere que havia um pacto de cavalheiros entre guardas e contrabandistas, que todos bem conheciam. Quando a Guarda apanhava alguém com contrabando gritava-se “larga!” ou

HAVIA UM PACTO DE CAVALHEIROS ENTRE GUARDAS E CONTRABANDISTAS, QUE TODOS BEM CONHECIAM. GRITAVA-SE “LARGA!” OU DAVAM-SE DOIS OU TRÊS TIROS PARA O AR E OS CONTRABANDISTAS DEVIAM DEIXAR A MERCADORIA E FUGIR, SEM QUE OS GUARDAS FOSSEM NO SEU ENCALÇO

davam-se dois ou três tiros para o ar. Os contrabandistas deviam deixar a mercadoria e fugir, sem que os guardas fossem no seu encalço. Os problemas, por vezes mortes, surgiam quando alguém quebrava esta regra de ouro. António Lourenço conta que o guarda que o acompanhou na primeira patrulha lhe disse: “Aqui, nunca se atira a matar por causa do contrabando, não há mercadoria nenhuma que valha a vida de uma pessoa”. Contrabandeava-se de tudo um pouco: ovos, calças de ganga, café, tabaco, caramelos, loiça pirex, café, azeite, sapatilhas, gado ou chumbo para cartuchos – “Era o que estava a dar mais lucro.” – explica António Lourenço. Sobre a emigração clandestina dos anos sessenta, não quer falar muito. “Há assuntos que é melhor não falar”. Mas aos poucos lá vai levantando um pouco o véu. “Nós não éramos cães de fila como os agentes da PIDE. Quem queria ‘dar o salto’ para o estrangeiro passava pelas zonas que nós controlávamos, em sítios ermos, fora das fronteiras oficiais.” António Bernardo, agora subchefe da PSP, conta que no ano de 1987 se apresentou na companhia de Elvas da Guarda Fiscal para estagiar. No dia seguinte foi colocado num posto da raia e as ordens eram para os três guardas provisórios irem, na companhia de um cabo do posto, montar um aguardo, durante três dias, junto à fronteira. A primeira tarefa que o cabo lhes deu foi arranjarem uns paus, uma espécie de cajados. Partiram uns ramos grossos de uns arbustos, arrancaram-lhes a folhagem maior, e lá seguiram por uma estrada de terra na direção da fronteira. O cabo escolheu o local do aguardo, um tufo de arbustos e de silvas, junto de uma ribeira que, naquela zona, fazia a fronteira com Espanha. De quando em vez, ouviam, ao longe, o som de motas de cross a grande velocidade. O cabo Abreu comentava: “Lá vai mais uma carga de café. Os gajos têm vigias que lhes dizem onde nós estamos e não passam por aqui”. Ao segundo dia de aguardo, já tinham o corpo repleto de borbulhas provocadas pelas picadas das melgas, e as sandes que lhes tinham dado como alimento estavam intragáveis. Contrabando, nada.


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PASSADO s cidades são um palimpsesto. As cidades escrevem-se no tempo e são a escrita do tempo. As cidades escrevem-se devagar, ao longo de séculos ou de milénios. Os séculos mudam-nas, apagam e reescrevem as suas páginas. Que são refeitas vezes sem conta. De dia e de noite, porque as cidades são, como as consoantes do alifato, solares e lunares. Os dias e as noites de Moura fazem parte dessa escrita, que nem sempre é linear. E que nunca é silenciosa. Os sítios não são um acaso da sorte ou do destino. Os primeiros a chegar foram, ao mesmo tempo, geólogos e geógrafos e arquitetos e urbanistas. Não sabiam que o eram, mas esse é o detalhe menos importante da história. Preferiram pontos altos e a proximidade dos rios, para se protegerem das ameaças que conheciam e, sobretudo, das que não conheciam. Moura nasce da água. No ponto mais alto da cidade, e em resultado de um milagre geológico, brota água. O facto, invulgar numa região marcada por prolongadas estiagens, é devidamente notado e celebrado em textos antigos. Foi essa a primeira justificação para aí se fixarem gentes. A isso se juntaram terrenos férteis e os metais, que consolidaram a riqueza do território de Moura ao longo de muitos séculos. A cidade viveu dentro das muralhas do castelo até ao século XIII. A partir daí, cresceu e foi alastrando a um ritmo certo e num desenho condicionado pelo relevo. Tudo o que ali se passou é igual, monotonamente igual, a todas as vilas e cidades do sul. Primeiro uma fortificação pré-romana, depois um castelo romano e medieval. De seguida a expansão por vários arrabaldes. O crescimento urbano é, em meados do século XVII, abraçado pelas muralhas da Restauração. Hão de durar dois séculos, até um novo crescimento e, de seguida, a chegada dos automóveis tornarem imprestáveis os muros que antes tinham sido garantia de sobrevivência. Fora dos antigos terrenos da cidade ficam, ou ficavam, os caminhos de ferro. Também eles passaram à história. As cidades são um reflexo do seu território. A prosperidade destes nelas se reflete. A escassez também. O ar senhorial de muitas ruas antigas de Moura é fruto de uma história recente. No século XIX, a agricultura permitiu a uma nova classe terra-tenente grandes investimen-

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por SANTIAGO MACIAS

tos. Nascem aí, e não em tempos mais recuados, os palacetes da cidade. Lanternins e azulejos, fachadas de ostentação, abóbadas e estucarias delicadas, tudo foi permitido para celebrar uma riqueza acabada de conquistar. Vale a pena olhar com atenção as ruas de Moura. As ruas das cidades contam-nos a sua história, e a vida de quem lá viveu. Os séculos sobrepõem-se e anulam-se, como na face de um velho palimpsesto. As casas mais antigas têm paredes em terra. Mas a cor da terra é coberta pelo véu da cal. E, assim, as paredes brancas aumentam a luz do dia e contrastam mais com a pele escura da noite. Cada troço de rua, cada esquina, cada porta nos conta uma história ou parte de uma história. Dentro de uma cidade esconde-se sempre outra, com o que ficou de tempos idos a ler-se, por vezes com dificuldade, por entre o que se cortou e o que se acrescentou ao longo dos séculos. Onde havia uma pequena rua exige-se agora uma passagem larga para circularem automóveis, onde estava o regato fez-se uma via rápida, onde se via uma muralha há agora um largo de acesso ao “centro histórico”. Em tempos, os viajantes reconheciam as cidades pelo perfil que se recortava no horizonte. A sombra escura do castelo que se desenhava ao longe era, muitas vezes, o único ponto de abrigo em território hostil. O desenho das sombras da noite de Moura não mudou em muitos séculos. À noite, mais que nunca, é preciso olhar a luz para ver as sombras. Quando nos afastamos para as ruas laterais, onde há sempre menos gente, as cidades parecem-nos mais velhas e gastas. Mas não é assim em todas as cidades e em todos os sítios, com os prédios antigos com rugas traçadas pelo calor e pelo frio ou pela secura do interior? Não é assim em todos os sítios que foram uma coisa e deixaram de o ser? Há casas onde viveu gente e agora não mora ninguém, o que faz delas apenas um conjunto de muros abandonados e a memória de glórias usadas e esquecidas. As cidades são isso, também. Envelhecimento da população, declínio do mundo agrícola, decrescimento demográfico. Também aqui o padrão de Moura repete o que temos em todo o interior raiano. Mais do que escrever sobre a história de um sítio, torna-se hoje crucial escrever ou ajudar a escrever o seu futuro. Desse desafio, e do seu eventual sucesso se ocuparão, um dia, outros historiadores.


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PRESENTE alar do hoje é pensar no ontem e refletir no amanhã, pois tudo está ligado, assim como todos estamos ligados por um matizado de encontros, desencontros, sentimentos, sonhos e paixões. A cultura é uma dessas paixões que é tão ancestral como a própria vida e dela somos parte. Paulo Coelho defende que quando uma coisa evolui, também evolui tudo à nossa volta e que quando procuramos ser melhores do que somos, tudo à nossa volta se torna melhor também. É este o rosto da cultura em Moura, cidade-princesa, sempre aberto a novas tendências, sempre desperto para diferentes perspetivas, mas sempre zeloso da sua identidade que nunca esquece. Aqui, a tradição mistura-se com a atualidade, a juventude com a senetude e todos têm acesso a múltiplas iniciativas que se realizam ao longo de todo o ano. Desde o canto, à dança, à música, ao teatro, à pintura, ao cinema, à joalharia, ao artesanato, entre outras formas de expressão artística, tudo é conjugado para que no quotidiano sejamos criadores de beleza. Esta imperiosa necessidade de expressão, própria do Ser Humano, tem, segundo Robert Gloton, pelo menos duas formas: o desejo de posse da beleza e o desejo de a fixar exteriormente. Moura exterioriza a sua interioridade e investe noutras interioridades, pois acredita que o FUTURO se constrói no presente, aprendendo a

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Para saber mais sobre Moura:

Obras editadas pela Câmara Municipal de Moura

por MARIA EUGÉNIA FERNANDES

amar e a aceitar os que veem o mundo de maneira diferente. Moura é uma cidade-plural que acredita nos jovens e nos seus olhos cheios de brilho, que acredita que a VONTADE é um tesouro a preservar e a transformar em CURIOSIDADE, em SONHO, em SABER! Ainda que o mundo desande e as leis que o regem nos desconcertem, cada um de nós encerra em si mesmo um valor imenso e único: a sua identidade, o testemunho cultural deixado pela sua terra. Moura congratula-se de passar esse testemunho de geração em geração, dando prioridade a um trabalho cooperativo, a uma homogeneidade de atuação e à criatividade. Porque o tempo tem asas de mudança, esta jovem cidade tem investido na cultura do quotidiano, do contemporâneo, abrindo portas a novas tendências estéticas e vários locais se têm transformado em palcos de entretenimento e diversão para todas as faixas etárias. Ao refletir no momento presente, esperamos sempre alcançar um futuro melhor. À nossa frente, e não atrás de nós, está o fabuloso encontro com os outros, com a arte, e cada passo, cada respiração, aproxima-nos desse irremediavelmente encontro. Sófocles disse: procura e encontrarás, pois o que não é procurado permanece para sempre perdido. Moura não é, definitivamente, uma cidade perdida.


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!"#$%%& por MIGUEL ÂNGELO


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&"$'#()"*"+(&$'#"*,-./ ,(%!"!01&, GEOCACHING E O CONTRABANDO Em sentido lato, as Rotas do Contrabando podem ser terrestres, aéreas ou marítimas, o que permite incluir os piratas e os corsários no que comummente chamamos de contrabandistas. Mas vamos “aterrar” e falar dos contrabandistas que passavam clandestinamente a “raia”, fronteira terrestre e fluvial entre Portugal e Espanha, uma das fronteiras mais antigas da Europa, com cerca de 1.200 quilómetros de extensão entre a foz do Minho a Norte e a foz do Guadiana a Sul. Tendo os dois povos vivido durante tantas décadas sob regimes autoritários e fechados ao resto do mundo, tendo-se atravessado períodos de guerra (Mundial e Civil de Espanha) e de grande pobreza, fome e emigração, é natural que a fronteira entre os dois países – que percorre muitos territórios pouco povoados e é, em grande parte do seu traçado, delimitada por obstáculos naturais (serras ou rios) – tenha inúmeros percursos de travessia utilizados, até há algumas décadas, por contrabandistas. Estes percursos, muitos deles de grande beleza, são agora percorridos por caminheiros e geocachers. Podemos encontrar semelhanças entre contrabandistas e geocachers: ambos andam por sítios inóspitos, de difícil acesso e conseguem orientar-se por lá; ambos têm por objetivo disfarçar o que estão a fazer. Mas as semelhanças param por aqui.

A tentativa de disfarçar a sua atividade tem objetivos muito diferentes: a ilegalidade do que faziam levava os contrabandistas a percorrerem as rotas clandestinamente fugindo às autoridades; a atitude furtiva dos geocachers nas proximidades e durante a procura das “caixinhas”, tem como objetivo preservar a segurança das mesmas e passarem despercebidos aos não “iniciados”.

A razão porque o fazem é também muito diferente. Os contrabandistas não o faziam por gosto, mas sim por uma questão de sobrevivência; os geocachers e caminheiros em geral fazem-no com gosto, pelo desafio, pelo contacto com a Natureza e pelo prazer da superação.

As condições em que o fazem são, seguramente, muito diferentes! Os contrabandistas percorriam caminhos agrestes, muitas vezes de noite e com mau tempo, sem vestuário nem calçado apropriados, orientando-se pelo conhecimento secular de caminhos do tempo dos romanos e de antigas rotas de peregrinação; os geocachers e caminheiros em geral estão bem equipados, podem escolher a hora e as condições climatéricas em que o fazem e orientam-se por GPS. Sendo este gosto pela aventura, pelas caminhadas e pelos percursos difíceis característico de muitos geocachers, é normal que existam muitas caches em zonas raianas, junto a marcos fronteiriços, vértices geodésicos, passagens naturais ou antigos abrigos das autoridades. Pode ler-se em algumas caches relacionadas com o tema do Contrabando, descrições como as seguintes:

“Esta cache levá-lo-á a uma das zonas de passagem dos contrabandistas de tempos passados. Eram não mais que pessoas da terra e dos povos vizinhos que se dedicavam ao contrabando como uma forma de subsistência. Muitos perderam as cargas, alguns perderam a vida e poucos ou nenhum enriqueceu. Os ‘calvários’ são marcos que assinalam locais onde algum deles foi abatido. Os ‘calvários’ também são locais onde perderam as cargas, seja por roubo, abandono ao fugir das autoridades ou confisco por parte destas. Estes ‘calvários apenas estão assinalados na memória coletiva do povo.” “Onde há raia há contrabando. E há também histórias de contrabando. Histórias contadas pelas pessoas que, no escuro da noite, seguiam por caminhos traçados e imaginados em direção à raia.”

“Afastadas dos centros urbanos, as populações raianas da área da Serra da Malcata e de toda a Raia Central, à semelhança de outras regiões fronteiriças, encontravam no contrabando a forma de vida que lhes garantia o sustento que dificilmente poderiam obter na agricultura tradicional ou noutro tipo de atividade local. Desde sempre estas populações conviveram, de forma pacífica, com os seus vizinhos espanhóis ignorando as orientações políticas dos governos de ambos os lados.

À naturalidade com que se cruzava e continua a cruzar a fronteira, não serão alheios os fatores históricos de comunhão de territórios entre Portugal e Espanha, como é o caso da região de Riba Côa cujos territórios foram arduamente disputados durante a época medieval.” Quando andar pela raia à procura das caches que aqui lhe propomos, lembre-se que por lá passaram, desde sempre, muitos homens e mulheres contrabandistas.

SÍMBOLOS QUE CARACTERIZAM O TAMANHO E O TIPO DAS CACHES E SEU SIGNIFICADO TAMANHOS DE CACHES (PARA TODAS AS CACHES QUE TENHAM UM RECIPIENTE FÍSICO): Micro – Caixas de rolos fotográficos de 35mm ou mais pequenas (menos de 100ml, aprox.), tipicamente contendo apenas o livro de visitas (logbook). Pequena (small) – Recipiente do tipo Tupperware com o tamanho aproximado de uma sanduíche ou similar (menos que 1L – comporta um livro de visitas e alguns itens para troca). Regular – Recipiente do tipo Tupperware ou caixas de munições. Grande (large) – Bidão de 20 litros ou maior.

TIPOS DE CACHES: Cache tradicional – Este é o tipo original de cache. Consiste, no mínimo, de um recipiente e de um livro de visitas. Se for uma cache pequena, regular ou grande (ver legenda de tamanhos de caches), poderá estar cheia de presentes, ou objetos para troca. Se for uma microcache então conterá somente o livro de visitas. As coordenadas publicadas na página de uma cache tradicional são as da sua localização exata. Multi-Cache – Semelhante à cache tradicional, mas é necessário visitar um ou mais pontos intermédios para determinar as coordenadas da cache final. Cache Mistério – O expoente máximo de todos os tipos de cache. Envolve normalmente a resolução prévia de complicados quebra-cabeças para determinar as coordenadas da cache. Em muitas caches deste tipo, as coordenadas publicadas não são as exatas, mas as de algum ponto de referência (que não deverá estar a mais de 2 ou 3 Km da localização real da cache). Caixa Postal Híbrida (Letterboxes) – É uma mistura de Caixa Postal e Geocache na mesma caixa. Têm um carimbo-assinatura e um livro de visitas e podem ou não ter objetos para troca. Devem envolver o uso de GPS como parte integral da busca, não podendo ser concebidas para serem encontradas usando apenas pistas. Cache Evento – São reuniões organizadas por geocachers, abertas a todos os geocachers. Um concerto de música ou um evento desportivo não são considerados Caches Evento porque os organizadores e o público alvo não são geocachers. EarthCache – Mantidas pela Sociedade Geológica da América, são caches com fins pedagógicos, que apresentam alguma particularidade geofísica única no terreno. Registar a visita a uma Earthcache requer que se cumpram os requisitos estabelecidos pelo seu dono, incluindo respostas a questões colocadas via e-mail, etc.


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CACHES NAS ZONAS DOS TRILHOS DESTA REVISTA

NOME TOURÉM

Tourém Alto do Pisco

Procure este símbolo nos mapas dos trilhos Itinerante

NÍVEL

NÍVEL

TIPO

DIFICULDADE

TERRENO

LINK

Multi Tradicional

2 1.5

2 2.5

http://coord.info/GC250AX http://coord.info/GC26NYQ

Tradicional Earthcache

2 1

2.5 2

http://coord.info/GC16JE9 http://coord.info/GC287JP

Multi Tradicional Tradicional Tradicional Tradicional Tradicional

3.5 2 2 1.5 1.5 1.5

4 3.5 4 2.5 2.5 1.5

http://coord.info/GC1JG90 http://coord.info/GC1QCZ0 http://coord.info/GC202R6 http://coord.info/GC1NAAK http://coord.info/GC1FM65 http://coord.info/GC2Q194

Tradicional

4

4.5

http://coord.info/GC1KTTK

Tradicional Tradicional Tradicional Tradicional Tradicional Tradicional Tradicional

1 2.5 3 4.5 2.5 1.5 2

1.5 4.5 3.5 5 3.5 1.5 1.5

http://coord.info/GC1JE9W http://coord.info/GC1H1X1 http://coord.info/GC1H0XH http://coord.info/GC1H95Z http://coord.info/GC1H0VR http://coord.info/GC2JTY9 http://coord.info/GC2JTYF

Tradicional Earthcache Tradicional Earthcache Multi

2 2.5 2 1 1.5

2.5 2.5 1.5 1.5 3.5

http://coord.info/GCC353 http://coord.info/GC1HFRT http://coord.info/GC1RGMN http://coord.info/GCNJ7E http://coord.info/GC2012

FÓIOS YACIN - Côa [Sabugal] Serra das Mesas/Sierra Granite Tables - Foios

SALVATERRA DO EXTREMO

Rota dos Abutres TORRE PORTUGUESA "Ka11" Moinho do Seco "Ka12" SALTO DA CABRA "Ka10" Penafiel em Espanha - MG01 AÇUDE FRONTEIRIÇO "Ka19"

GALEGOS Marvão - Porto Roque

SOBRAL DA ADIÇA

Ermida de São Pedro da Adiça [Sobral] Preguiça 369 metros (Ouro) [Sobral] Álamo 425 metros (Lince-Ibérico) [Sobral] Gruta da Adiça – Caverna [Sobral] Ficalho 522 metros (Serra d’Adiça) [Sobral] GF - Fronteira V.V. Ficalho - Rosal de la Frontera Rosal de la Frontera

SANTANA DE CAMBAS Apocalyptic Visions [Mértola] Alchemy 101 - DP/EC32 Caminho-de-ferro das Minas de S. Domingos S. Domingos Mine Earthcache - DP/PT/EC1 Uma Aventura Na Lagoa - I

Sites relacionados Site Oficial - http://www.geocaching.com Sites Portugueses - http://www.geopt.org e http://geocaching-pt.net WIKI - http://wiki.geocaching-pt.net Revista Portuguesa - http://www.gzportugal.pt Lojas - http://www.geocacherzone.pt e http://www.lojadogps.com FAQ Media - http://www.geocaching.com/articles/Brochures/footer/FAQ_Media.pdf


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!"#$!%&$'(") , *"+),-%!."+ ,"7-84

1

De Tourém a Randin

/0%"+

De Fóios a Navasfrias

2 3

+$!1$,2--$)*")23,-24"

De Salvaterra do Extremo a Zarza Mayor

4 9$!29"+

De Galegos a la Fontañera

5 +"6-$!)*$)$*%'$ :

De Sobral da Adiça à fronteira

+$5,$5$)*2)#$46$+

De Santana de Cambas à Mina de S.Domingos

6


71

CLASSIFICAÇÃO

/10

'PEWWM½GEpnS

7

Rating

ITINERANTE

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16,8 km 4h30 350 m Sobral da Adiça Não|No Não|No

!"#$%&' (%')(*+% '''''''

,-./'012'13435' 63/'172'834-5'

Mapas/Maps IGeoE: Folhas nº 524, 525

5


72

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Sobral da Adiça, freguesia de Moura, destaca-se pelo seu património natural, com paisagens de grande beleza, onde predominam os montados de azinho, e as serras da Adiça e de Ficalho, esta última fazendo fronteira a Sul com o concelho de Serpa. Este percurso circular desenvolve-se no ambiente típico da região alentejana, tendo o seu início na localidade de Sobral da Adiça, junto à Igreja Matriz. Passa-se pela ribeira e pela Praça de Touros, para se seguir por estradas de terra até junto à fronteira, que se percorre durante mais de 5 km. O caminho acompanha os marcos fronteiriços, com belas paisagens, umas vezes do lado português outras do lado espanhol. Passa-se pela antiga caseta dos carabineiros e pelo posto da Guarda-Fiscal, podendo-se tomar junto a este último o caminho que leva ao cimo da serra de Ficalho, com lindas vistas do alto dos seus 523m. A partir do posto, hoje destituído de funções fiscalizadoras e despromovido a “simples” monte alentejano, inicia-se o regresso por caminhos de azinheiras até ao ponto de origem. É um percurso muito bonito, sem grandes declives (se não se aventurar à subida da serra), não demasiado longo, sempre com piso fácil de estrada de terra, para se fazer com muito sossego e sem pressas – à boa maneira alentejana!

Sobral da Adiça is located in the Moura municipality and stands out due to its natural landscape of great beauty with its groves of holm-oaks and the Adiça and Ficalho mountains. The Ficalho mountain is the southern border with the municipality of Serpa. This circular walk unfolds through a typical landscape of the Alentejo region, starting at the village of Adiça near the parish church. We walk past the creek and the bullfight arena and continue on earthen tracks to the border, along which we walk for more than 5 km. The trail follows the border stones through a delightful scenery, sometimes on the Portuguese side and sometimes on the Spanish side of the border. We walk past the former casetas (cabins) of the carabineers and fiscal guards. Here we can take the path that goes to the top of the 532 meter Ficalho mountain, from where we can enjoy beautiful views. At the second caseta, no longer serving its former purpose and demoted to a “simple” Alentejo “monte” (typical property) we begin walking back through groves of holm-oaks to the starting point. It is a beautiful trail without steep tracks (unless you decide to climb the mountain), not too long and always on easy earthen ground – for an unhurried walk the good Alentejo way!

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O percurso inicia-se em Sobral da Adiça, junto à Igreja Matriz. Segue-se pela direita da Igreja, a descer pela rua de alcatrão, depois pela direita quando esta bifurca, seguindo-se pela rua Luis de Camões até à ribeira. Depois de atravessada a ribeira, segue-se à direita, passa-se pela direita da Praça de Touros e continua-se por caminho de terra, sempre a subir pelo montado alentejano, limitados por vedação. Segue-se por caminho que entronca à direita e à esquerda numa bifurcação, já perto da linha da fronteira, tomando-se o caminho menos marcado. Na linha da fronteira segue-se para a direita e acompanham-se terras espanholas, com diversos marcos fronteiriços ao longo do caminho, até ao local em que se atravessa a estrada de alcatrão, onde se situa a antiga caseta dos carabineiros espanhóis.

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Continua-se por estrada de terra, seguindo para a esquerda na bifurcação, para se continuar a acompanhar a linha da fronteira. Nesta zona, para além do montado, a paisagem de solo xistoso com muitas estevas e também alguns estevões faz-nos recordar a zona da serra, com o alto de Ficalho ao longe. Pouco depois chega-se ao antigo posto da Guarda-Fiscal de Vale de Grou. Aqui pode-se fazer um desvio para a subida ao alto da serra de Ficalho. Nesse caso, segue-se à esquerda e depois à direita no alcatrão. Logo depois da passagem pelo Monte de Vale do Grou, segue-se por caminho de terra à esquerda que vai sempre a subir, com forte inclinação no final, em zona de mato mediterrânico, até ao cimo, a 523m. Segue-se para a direita (direção Norte), por caminho muito bonito, depois para a esquerda na bifurcação e direita após um poço antigo. Passa-se de seguida por duas linhas de água e chega-se à estrada de alcatrão, que se segue para a direita. Logo de seguida sai-se para a esquerda na primeira saída para estrada de terra. Sempre em frente, chega-se novamente a Sobral da Adiça.


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!"#$ Extrato da carta militar 1/25000 do Instituto GeogrĂĄfico do ExĂŠrcito


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IGREJA DE SOBRAL DA ADIÇA

A Igreja Matriz de Sobral da Adiça foi edificada em 1846, tendo sofrido obras de melhoramentos em 1874, com o contributo dos habitantes da povoação. O topónimo composto “Sobral da Adiça” tem um primeiro elemento que deriva do latim e que significa “terra de sobreiros” e um segundo elemento que se julga ter origem no árabe “ad-diça” (depois “Adiça”) com o significado “mina de ouro”. De facto, nesta freguesia ainda existem vestígios da existência de galerias subterrâneas de uma grande mina de ouro. The parish church of Sobral da Adiça was built in 1846 and underwent restoration works in 1874 with the participation of the village inhabitants. The compound name of “Sobral da Adiça” includes a first element that comes from a Latin expression meaning “land of cork-tree” and a second that is thought to be of Arab origin: “ad-diça” (later “Adiça”) that means “gold mine”.

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CASETA DOS CARABINEIROS

As casetas dos carabineiros espanhóis funcionavam como postos de vigia e fiscalização, junto à fronteira. Estes casebres, hoje quase todos em ruínas, fazem parte indissociável da história do contrabando e da paisagem fronteiriça. Esta caseta encontra-se junto a uma estrada secundária de acesso a Espanha, bem perto da fronteira de Vila Verde de Ficalho, que se situa entre a localidade com o mesmo nome e a espanhola Rosal de la Frontera. Um pouco mais à frente encontra-se o antigo Posto da Guarda-Fiscal de Vale de Grou, que está desativado e sem funções fiscalizadoras, sendo hoje um simples monte alentejano. The casetas of the Spanish carabineers worked as lookout and supervising posts near the border. These huts, almost all in ruins nowadays, are an intricate part of the history of smuggling and of the crossing of the border. This caseta is located close to a secondary road to Spain and near the border with Vila Verde de Ficalho, that lies between the village with the same name and the Spanish Rosal de la Frontera. Ahead lies the former post of the fiscal guard of Vale de Grou; it is not longer used for its former purpose and is nowadays an Alentejo “monte”.

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SERRA DE FICALHO

A Serra de Ficalho é uma das formações mais altas do Baixo Alentejo, situada na fronteira entre os concelhos de Moura e de Serpa. Do alto dos seus 523m de altitude podem-se avistar sítios muito distantes, tais como Beja, Barrancos, Monsaraz e a Barragem do Alqueva. A vegetação no topo da serra é bastante diferente dos montados que a circundam, com zonas de mato mediterrânico e diferentes espécies de orquídeas.

The Ficalho mountain is one of the highest systems in Baixo Alentejo and is located on the border of the municipalities of Moura and Serpa. From the top of its 523 meters we have a panoramic view of far away places such as Beja, Barrancos, Monsaraz and the Alqueva dam. The vegetation of the moutain top is very different from the groves of trees that surround it, with spots of Mediterranean undergrowth and different species of orchids.

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IGREJA MATRIZ MOURA

A igreja de S. João Baptista, classificada como Monumento Nacional, foi edificada nos inícios do século XVI, constituindo o melhor exemplar do estilo Manuelino existente no concelho. Tendo sofrido uma derrocada em 1708, o templo de três naves abobadadas foi reconstruído e reaberto ao culto em 1710. Há quase 50 anos deu-se a última obra de restauro. A área envolvente, onde se inclui o Castelo de Moura, o antigo Estabelecimento Termal e o Jardim Doutor Santiago, situada na zona mais alta de Moura, constitui a zona mais nobre da cidade, pelo importante valor patrimonial e cultural de que é detentora. O Castelo de Moura encontra-se edificado sobre um castro pré-romano, numa zona intensamente ocupada pelo homem. Com a classificação de Imóvel de Interesse Público, esta fortificação integra no seu recinto torres circulares e quadradas. Do período Islâmico chegou até nós uma torre de taipa sobranceira ao edifício da Biblioteca Municipal, que terá sido construída no século XI ou XII. Após a reconquista definitiva que data de 1232, D. Dinis ordenou a reconstrução do Castelo sobre as ruínas do antigo, datando dessa campanha de obras a construção da Torre de Menagem.

The S. João Baptista church, classified as national monument was built in the early sixteenth century and is the finest example of the Manueline style in the municipality. This church with its three naves with a vaulted ceiling collapsed in 1708 and was rebuilt and reopened in 1710. The last works of restoration took place almost 50 years ago. The surrounding area that includes the Moura castle, the old thermal building and the Doutor Santiago garden in the highest part of Moura is the noblest part of the town due to its important patrimonial and cultural values.


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!"#$%$&' ("!%)*%+%#,


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!"#$%&'("# )"#*+"# ,"-$%+!+.&" em perto do centro da pacata, arejada e branca cidade de Moura, localizada no Alentejo, a uma escassa dúzia de quilómetros do maior lago artificial da Europa – barragem de Alqueva –, no número 5 da rua que eterniza a revolução republicana de há um século atrás (rua 5 de Outubro), vamos poder encontrar o restaurante O Trilho. Situado no rés do chão de uma antiga casa senhorial dos inícios do século XX, O Trilho ocupa um espaço onde outrora se guardavam potes de azeite. As altas paredes brancas, com grossos arcos em ogiva encimados por brancos tetos em abóbada, também eles em forma ogival, preservam o peso da abastança que estas casas detiveram em tempos idos. A entrada da rua faz-se através de uma

!

antecâmara que precede a sala de refeição, e que permite algum resguardo da temperatura exterior. A contrastar com a alvura do espaço, praticamente desprovido de elementos decorativos, as madeiras de tons escuros nele utilizadas conferem-lhe um equilíbrio estético simples, proporcionando ao mesmo tempo um agradável ambiente familiar. É pena que as mesas não mostrem as luminosas toalhas de algodão aos quadrados amarelos e brancos que as cobrem, uma vez que sobre estas jazem as costumeiras toalhas de papel branco, a condizer com os guardanapos do mesmo material. Fora este aspeto com que não simpatizámos, a ementa com que a anfitriã D. Matilde nos acolhe é merecedora da nossa atenção. Não sendo extensa, a lista tem sido suficiente

para que o que aqui se confeciona tenha já granjeado algumas distinções, nomeadamente a do guia “Michelin”. Mas ainda mais importante do que esta menção, foram sem dúvida as elogiosas referências que nos chegaram por quem é da região e gosta de comer bem, esses sim!, os verdadeiros jurados que Tracking good cuisine Near the centre of the calm and white town of Moura, Alentejo, and a few kilometers from the largest artificial lake in Europe – the Alqueva dam –, we find the restaurant O Trilho at number 5 of the street that evokes the republican revolution of a century ago (rua 5 de Outubro). O Trilho is located on the ground floor of an old manor house of the early twentieth century, where olive oil containers were kept. The tall white walls with thick pointed arches surmounted by white arched roofs preserve the weight of affluence that these manors had in times past. In contrast with the whiteness of the room that is practically devoid of decorative elements, the dark wood that is used gives it a simple aesthetic balance that at the same time creates a pleasant familiar atmosphere. Although not long, the menu is sufficient for what is cooked here. The restaurant has been awarded some prizes, namely from the Michelin guide. Regarding the starters, there is a variety of cheeses, cuttlefish salad, mushrooms with eggs and liver with coriander. As to fish dishes, you can choose between codfish, shellfish bread stew and turbot. If there are sole filets with tomato rice, do not hesitate! In terms of meat dishes, the options are lamb, beef and pork. You can also try regional specialties such as lamb stew, roasted leg of lamb, stewed chick-peas and dog-fish soup. However, these dishes must be ordered in advance. The dessert list with a few traditional egg sweets and the wine list that is particularly focused on Alentejo wines are comprehensive enough for choosing right. The quick and helpful service was appreciated. Table booking is advised. This trail is well worth the walking.


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INFORMAÇÕES 'PEWWM½GEpnS -XMRIVERXI Itinerante Rating :

7/10

Restaurante O Trilho Rua 5 de Outubro, 5 7860-013 Moura fazem (e desfazem, se for caso disso) o nome de um restaurante. Começámos a nossa incursão por um bom queijo merendeira e um excelente paio que, por acaso, não constava na lista. Nesta são ainda de referir a salada de choco, os cogumelos com ovos e o fígado de coentrada. Nos peixes, as opções vão para o bacalhau (em cebolada, grelhado ou cozido – que era prato do dia), a açorda de marisco ou o cherne. No entanto, no nosso dia, havia também uns filetes de linguado com arroz de tomate que, pela surpresa causada, foi a escolha piscícola. E ainda bem! De uma frescura a qualquer prova, com um finíssimo e crocante polme de ovo envolvente, sem gordura excedente, acompanhado por arroz de tomate no ponto, a ficar na memória. Quanto às carnes, a escolha faz-se entre borrego (em costeletas), novilho (em bitoque ou bife) e porco (em bitoque, lombinho, costeletas, secretos ou presas).

Não podendo optar pelas especialidades (ensopado de borrego, perna de borrego no forno, cozido de grão ou sopa de cação) que têm que ser encomendadas antecipadamente, as presas de porco grelhadas foram a nossa escolha. Carne imaculada, com o portuguesíssimo acompanhamento triplo de salada, arroz branco e suculentas batatas fritas em palitos. Para sobremesa, indecisos entre a sericaia (ou sericá), com ou sem as deliciosas ameixas d’Elvas, um doce de amêndoa e a encharcada, decidimo-nos (em boa hora!) por esta última que, de tão deliciosa, nos tirou do sério! A carta de vinhos, privilegiando os vinhos alentejanos, é bastante para uma escolha acertada. O serviço despachado e atento mereceu a nossa atenção. É aconselhável reservar mesa. Este Trilho vale bem uma jornada.

Contactos / Contacts:

Telefone: +351 285 254 261 +351 938 899 086

Horário de Funcionamento/ Working Hours:

12h - 15h e 17h - 22h Encerra à 2.ª /Closed on mondays

Preço Médio / Average Price: !15,00 Pagamento / Payment:

Multibanco e Cartões de Crédito

Coordenadas GPS / Coordinates: N 37° 38' 36,7" W 7° 39' 27,3"


96

GRANDES TRILHOS DO MUNDO

Inca Trail: O rapaz da Coca-Cola por ANTÓNIO CRUZ apcruz@netcabo.pt

Se há algo que lamento, ao cabo destas andanças, é de não me recordar do nome daquele rapaz. Os povos dos Andes do Peru,de etnia maioritariamente Quechua e minoritariamente Aymara, não levam uma vida fácil. O rapaz cujo nome não me recordo era Quechua e aprendiz de carregador no famoso Caminho Inca que liga o quilómetro 82, contado a partir de Cusco, à cidade, outrora perdida, de Machu Picchu, em plena floresta das nuvens nos Andes Peruanos. Parte da história da cidadela, de como se perdeu e voltou a achar, é conhecida. Menos conhecida é a história dos descendentes dos Incas que hoje dependem dela para (sobre)viver. Os Quechuas não falam muito. Talvez por levarem a tal vida difícil, são reservados e de sorriso tímido. Não há razões para sorrir quando a única perspetiva de futuro passa por carregar dezenas de quilos de bagagens alheias por entre as lindíssimas montanhas no sopé das quais se teve o infortúnio de nascer. O rapaz cujo nome não me recordo parecia não poder escapar a esse destino. Com 17 anos, já ganhava o sustento no Caminho Inca, embora a nossa guia

António Cruz é um apaixonado por viagens de aventura, tendo percorrido a pé alguns dos mais belos trilhos de montanha do mundo, entre eles, o Caminho Inca até Machu Picchu, na Cordilheira dos Andes; o Circuito do Monte Branco, atravessando os Alpes Franceses, Suíços e Italianos; as Ilhas do Norte e do Sul da Nova Zelândia; e subido ao cume do Kilimanjaro, em África.

não o deixasse levar a mesma quantidade obscena de peso que os seus companheiros mais velhos desgraçadamente levavam às costas. Não sei por quem, soubemos que o rapaz faria 18 anos num dos quatro dias do Caminho. Chegando à fala com ele, concordámos todos que era uma data especial. Fizemos então a pergunta clássica sobre o que desejaria como prenda de aniversário se tivesse oportunidade de escolher. A esta distância, acho hoje a pergunta cruel em si, pois sabíamos que realisticamente não nos podia responder “uma motocicleta” ou, sequer, a respetiva “licença de condução”, como é provável que fizessem outros adolescentes da mesma idade, noutras latitudes. Ainda assim, a simplicidade da sua resposta foi desarmante: - “Uma cerveja. Si pudiera, una sirbisa”, disse-nos, envergonhado e misturando o seu Quechua natal com o pouco Castelhano que sabia. Explicou-nos depois, com dificuldade, que nunca tendo bebido uma cerveja, nem tão-pouco provado o seu sabor, esperara por aquele aniversário específico para o poder fazer pela primeira vez. Quando se afastou, sempre tímido, sensibilizados com o que ouvíramos, combinámos entre nós oferecer-lhe a dita bebida num bar que havia paredes meias com o acampamento do dia seguinte, o tal do seu aniversário.

Ao terceiro dia de caminho, fizemos assim uma coleta simbólica de nuevos soles (a moeda Peruana) entre todos e, dando-lhe os parabéns, dissemos-lhe que se destinavam à compra da bebida desejada, como forma de celebração. No final do dia, já abastecidos de líquidos retemperadores, procurámos saber se tinha gostado da sua primeira cerveja. Confessou-nos que não tinha tido coragem de a pedir no bar local. Lá nos disse, meio corado, que se tinha ficado somente por uma Coca-Cola... As histórias têm esta magnífica faculdade de escapar à antecipação que por vezes fazemos delas. No Caminho Inca, fui à procura da História construída por este povo dos Andes e regressei com uma história diferente, simples, bela, ainda que de certo modo triste, de um rapaz que, por aqueles dias, se via confinado às mesmas montanhas que os seus antepassados tinham utilizado para a expansão do império havia 600 anos. Ficámos contentes por saber, depois, que a nossa guia andava a insistir com a família do rapaz para que este não abandonasse os estudos e assim pudesse aspirar a uma outra vida, necessariamente melhor. Inca Trail. Fotografia de José Abrantes.


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