"Brinque e solte"

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Foto: Tiago Stracci

»Por: Janaína Quitério janaina@revistapescabrasil.com.br

Não se transmite só o gosto pela pesca. Transmite-se carinho e confiança, e me aproxima de meu filho, dando-lhe apoio nos momentos em que ele mais precisa.

— André Luiz C. Blasques, pai de Caio, sobre a propagação da paixão pela pesca de geração a geração

Yuri Q. Camargo, 5 anos, aprendendo a pescar no Pesqueiro Maeda – Itu (SP)

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Nem é preciso soltar o verbo. A imagem diz tudo: ao ouvir a pergunta, o rosto inteiro do menino de dez anos, Vinícius Peres Alberto, se abre num sorriso maroto. São os olhos brilhando que respondem: — A-do-ro! Todo fim de semana Vinícius pesca no Pesqueiro Maeda – Itu (SP) com seu pai. Chega sempre às oito da manhã e só recolhe as tralhas às seis da tarde. “Se eu não o chamo para almoçar, Vinícius fica direto na beira do pesqueiro”, relata o pai, Paulo Antônio Peres Alberto. É o pai quem leva a isca, mas o filho é quem monta, joga-a na água e, quando fisga o peixe, puxa-o para a beira. Certa vez, quem trouxe o peixe foi o pai. “Eu fisguei uma cachara listrada de 12 quilos e meio no final do dia, aqui no pesqueiro. Mas não consegui trazer, porque eu estava quase caindo n’água”, conta orgulhoso. E se não pegar nada? “Ah, eu fico meio assim”, responde encenando uma cara tristonha. “Mas, tenho que ficar orgulhoso mesmo assim, senão, o que posso fazer?”, conforma-se. O menino Vinícius pesca desde os seis anos de idade, quando ainda morava em Penápolis — interior de São Paulo. Já pescou no rio Tietê e no rio Grande. É o companheiro de seu pai, que pesca há 30 anos. “Desde a primeira vez que meu filho veio comigo ao pesqueiro ele fica fascinado”, anima-se Paulo Antônio. No rio Paranazão, pai e filho foram à procura de tucunaré. E nada. Agora, pescar tucunaré é o maior sonho de Vinícius. — Para você, o que é ser um grande pescador? Vinícius pensa, olha de espreita o anzol e arremata: “É ser paciente. Se não for paciente não pega nada mesmo”. Pesca Brasil l 90

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VinĂ­cius Peres Alberto, 10 anos. Para ele, ser um grande pescador ĂŠ ser paciente

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Blasques, pai de um pequeno pescador de Pescar é uma atividade esportiva sete anos. que melhora a destreza lúdica das crianças. Diverte, relaxa, aproxima pais e filhos, Como o filho, André começou a coloca a garotada em contato imediato com pescar quando ainda era diminuto. Hoje a natureza, desenvolve a parte motora da é a prova real de que a paixão pela pesca criança, disciplina-a e, ainda, ensina o signi- é transmitida de geração a geração. De ficado desta enorme palavra: perseverança. filho-pescador cresceu para pai-pescador. A pesca esportiva, além de todos os atribu- “Não se transmite só o gosto pela pesca. tos citados, traz a consciência ecológica. Transmite-se carinho e confiança, e me aproxima de meu filho, dando-lhe apoio Para o analista ambiental do PNDPA (Programa Nacional de Desenvolvi- nos momentos em que ele mais precisa”, reflete o pai-pescador. mento da Pesca Amadora, liAssim, o pai compreende gado ao Ibama) Michel Lopes Nas oficinas infantis que pescar também é um Machado, a consciência do realizadas pelo PNDPA em programa de família. pesque e solte já se expressa todo o Brasil, os animadores de forma natural nas crian Qual o pai ou a mãe perguntam às crianças qual ças. Nas oficinas infantis — pescadores — que não o papel do pescador coscirealizadas pelo PNDPA em sente orgulho ao acomente e o que fazer para que todo o Brasil, os animadores panhar o filho nas peso lazer da pesca não seja perguntam às crianças qual o carias? “A gente explica extinto. Quase sempre a papel do pescador consciente para eles que a pesca é resposta está na ponta da e o que fazer para que o lazer coisa séria, mas também língua: soltar os peixes — da pesca não seja extinto. é uma brincadeira. Na os pequeninos e os grandes Quase sempre a resposta vida tem que ter esportambém. está na ponta da língua: tividade, bom humor, soltar os peixes — os pequetem que ser uma pessoa ninos e os grandes também. positiva. Não se ganha sempre. O importante é participar e fazer O significado da pesca infantil vai boas amizades. É de tudo isso que vamos mais além. Pescar ensina às crianças que a vida é formada por desafios. Mostra, ainda, precisar para que continuemos praticando que é preciso buscar os objetivos, não ape- a pesca esportiva”. O recado do pai André Luiz Blasques está dado. nas esperá-los. É o que diz André Luiz C.

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Fotos: Tiago

A noite que antecede a pescaria é intensa de alegria. Eufórica. Enquanto não chega amanhã, a criança não cabe dentro de si. — Ô pai, que horas a gente vai? O que a gente vai levar para pescar? “Nossa senhora, os filhos não deixam a gente sossegado!”, bota a mão na cabeça Paulo Antônio Peres Alberto, pai de Vinícius, mais em tom de diversão do que de lamento. O menino Caio Zurlo Blasques, filho de André Luiz C. Blasques, arruma as tralhas com o pai no dia anterior, discute sobre qual varinha usar, sobre como arrumar as malas etc. É aquela bagunça. Já Gustavo Biguetti Veronezi, de 11 anos, quase não dorme: “Lá em Pereira Barreto (interior de São Paulo, onde tem o rio Tietê), eu dormi meia-noite e acordei às cinco da manhã. Tudo isso é vontade de pescar, vale a pena”. Gustavo só fica triste nas pescarias quando se esquece de levar algum material de pesca. É tão divertido que, por ele, ficaria até de madrugada pescando. No Pesqueiro Maeda, outras crianças-pescadoras chamaram-no para brincar no playground. A resposta foi rápida: — Acho que vou ficar pescando! O hobby de Gustavo perdura desde os três anos de idade, quando foi ao rio Paraguai – Mato Grosso pescar com o pai. A mãe ficou segurando o guarda-sol: “Ele tem uma paciência de Jó, coisa que não tenho. Gustavo fica olhando a boinha e percebe a fisgada na hora certa”, analisa a mãe, Evelise Biguetti Veronezi. O menino já está tão ambientado com a pescaria que, quando a vara bate, quase sempre acerta qual peixe é. “Depende da fisgada”. Dito e feito. Durante a entrevista, seu pai fisgou um peixe: “É um tambaqui ou pacu”, palpitou o pequeno pescador. Era um tambaqui!

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Gustavo Biguetti Veronezi, 11 anos, consegue identificar o peixe fisgado: “Depende da fisgada”. Na foto, segura um tambaqui.

Uni-duni-tê Caio Zurlo Blasques, sete anos, é o rei do bagre, mas se diverte pescando carpa. “Carpa é bonita. Tem a carpa-fedida, a carpa-cabeçuda...”, enumera. “Quando vou pescar, eu aprendo sobre peixe. Eu já conheço o pintado, o barbado, o redondo (pacu), a tilápia comilona e a tilápia não-comilona. A comilona come muito a minha isca, fica até goooooorda”, conta. Mais que em qualquer outra atividade, a criançada aprende nomes de peixes, suas características e modos de vida. É uma aula livre de ecologia. Pescar não tem idade para começar. Michel Lopes Machado, do PNDPA, recomenda que as crianças iniciem a prática do pesque e solte usando arremesso, a varinha de mão e o spincast — carretilha leve e de fácil manuseio, adequada para iniciantes. “Muitos pais optam por não começarem com isca artificial, devido à segurança, pois é preciso que a criança tenha um pouco de habilidade para evitar que ela pesque a si própria”, indica. Aprendendo, a garotada vai pegando mais jeito, ganhando mais desenvoltura e, em linha crescente, vai se envolvendo com a prática da pesca. Assim, a brincadeira é a isca para o futuro da pesca esportiva.

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“A pescaria mais legal aconteceu em outubro de 2007. Fomos pescar em Iguape — litoral sul de São Paulo — e, assim que começamos, pegamos uma corvina de dois quilos e meio. E um atrás do outro fisgamos robalos com mais de dois quilos. Pegamos 11 robalos, todos grandes. Eu estava nervoso porque eu só tinha pegado uns dois, e meu pai e o colega dele estavam pegando um monte. Então, eu estava com rai-va. Mesmo assim, fiquei trabalhando com a isca artificial. Até que minha vara bateu também. E foi o maior peixe fisgado: quase quatro quilos! Mais feliz, também fiquei mais ativo, e fui pegando mais...” Henrique Mitsuru Shigemoto, de 13 anos, pesca há 12, e já tem várias histórias para contar. A despeito da pouca idade, tem muitas preferências: gosta de pescar com isca artificial, fazer mosca de fly e considera

que o jump jig pega bem, ainda mais em pesqueiro. O peixe que mais gosta de fisgar é o tucunaré: “Em Panorama - SP, eu e meu colega pegamos 68 tucunarés das onze da manhã até as duas da tarde. Foram 68 né, pai?”, o menino parece duvidar dele mesmo. Mas o pai confirma com um sorriso. Agora, Henrique sonha em pescar merlin. Não só as histórias de pescaria são grandes. A consciência é maior ainda: “Um bom pescador é aquele que tem consciência do que está fazendo. Muitas vezes vamos ao pesqueiro e vemos pescador brigando por qualquer coisa. Ele vai pescar para se distrair e acaba passando nervoso. O bom pescador é aquele que está interagindo com a natureza. Claro, ser um bom pescador também é quando se pega bastante peixe. Mas não é porque não pegamos muitos peixes que não seremos bons.”

Henrique Mitsuru Shigemoto, 13 anos. Pesca há 12

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Foto: Tiago Stracci

Foto: Tiago Stracci

Foto: Maicon Bianchi

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