Faculdade Adventista da Bahia - http://www.adventista.edu.br Missão do SALT: Formar teólogos, pastores e líderes, combinando teoria e prática nas atividades de ensino, pesquisa e extensão, tendo a Bíblia como autoridade central da reflexão teológica, a fim de desenvolver habilidades para o cumprimento da missão evangelizadora da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Visão do SALT: Ser referencial de excelência em educação teológica, visando a formação de líderes que demonstrem competências espirituais e intelectuais para o exercício pleno da atividade eclesiástica e a proclamação do Evangelho de Jesus Cristo. Administração da Entidade Mantenedora (FADBA) Diretor Presidente: Geovani Queiroz Diretor Administrativo: Ivo Vasconcelos Diretor Secretário: André Henrique Dantas Administração Geral da FADBA Diretor: Juan Choque Fernández Diretor Acadêmico: Fabiano Leichsenring Silva Diretor Administrativo: Ilvo dos Santos Coutinho Administração Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia Diretor: Leonardo Godinho Nunes Coordenador de Graduação: Flávio da Silva Souza Coordenador de Pós-Graduação: Carlos Flávio Teixeira ESALT – Editora do SALT Editor: Isael S. S. Costa Editor Associado: Clacir Virmes Jr, Erick Wilson e Haroldo Magalhães. Conselho Editorial: Carlos Flávio Teixeira; Clacir Virmes Junior; Isael S. S. Costa; Fabiano Leichsenring Silva; Flávio da Silva Souza; Ilvo dos Santos Coutinho; Juan Choque Fernández; Leonardo Godinho Nunes. O conteúdo desta obra é de responsabilidade exclusiva de seu autor e não representa, necessariamente, o posicionamento dos editores, do SALT-FADBA e/ou sua Instituição mantenedora. A ESALT está sediada na FADBA, Cachoeira, BA.
Cachoeira-BA, 2017
A Entropia Genética e o Mistério do Genoma Título original: Genetic Entropy (4. ed.) 1ª edição em português – 2017 1.000 exemplares
Editor chefe: Isael S. S. Costa Editor associado: Clacir Virmes Junior Revisão técnica: Wellington dos Santos Silva Revisão: Clacir Virmes Junior Programação visual, capa e diagramação: João Carlos R. Souza (jc.mkt)
Todos os direitos reservados para a ESALT. Proibida a reprodução por quaisquer meios, salvo em breve citações, com indicação da fonte. Todo o texto, incluindo as citações, foi adaptado segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado em 1990, em vigor desde janeiro de 2009. Apoio: Geoscience Research Institute (grisda.org)
Ficha catalográfica elaborada por Uariton Boaventura (CRB 5/1587) S2243e
Sanford, John C. A entropia genética e o mistério do genoma / John C. Sanford; tradução de Matheus Cardoso. – Cachoeira: ESALT, 2017. 272 p. ISBN: 978-85-88818-30-9 1. Genética. 2. Genoma. 3. Evolucionismo - Axioma primário. I. Título. II. Cardoso, Matheus. CDD
576.549
SUMÁRIO prefácio prólogo
IV VIII
cap. 1 - O genoma é o livro da vida – de onde ele vem?
1
Fato rápido: o genoma é um manual de instruções.
cap. 2 - As mutações aleatórias são boas? Fato rápido: mutações aleatórias consistentemente destroem informações.
cap. 3 - Quanta mutação é ‘muita’?
13
32
Fato rápido: as taxas de mutação humana são muito altas.
cap. 4 - A todo-poderosa seleção ao resgate?
44
Fato rápido: as habilidades da seleção são bastante limitadas.
cap. 5 - Os problemas da seleção genômica podem ser solucionados?
63
Fato rápido: a seleção é incapaz de resgatar o genoma.
cap. 6 - Um olhar mais atento ao ruído
80
Fato rápido: os problemas são muito piores do que você imagina!
cap. 7 - Mecanismos de resgate artificial?
96
Fato rápido: “mecanismos de resgate” desenvolvidos falham no teste de realidade.
cap. 8 - Homem ao resgate?
109
Fato rápido: a eugenia não pode interromper a degeneração e a clonagem torna pior o problema da mutação.
cap. 9 - A seleção natural é capaz de criar? Fato rápido: a mutação/seleção é incapaz de criar sequer um único gene.
116
cap. 10 - A curva descendente é real?
137
Fato rápido: todas as evidências apontam para a deterioração humana.
cap. 11 - Resumo dos principais desenvolvimentos científicos recentes
150
Fato rápido: a defesa da entropia genética agora está muito mais robusta.
poslúdio - que esperança?
164
Fato rápido: existe esperança
apêndice 1
168
Uma ideologia profundamente arraigada.
apêndice 2
188
Quantos nucleotídeos podem estar sob seleção ao mesmo tempo?
apêndice 3
193
O fenômeno da unidade e o conceito de complexidade integrada
apêndice 4
199
A duplicação gênica e a poliploidia podem aumentar a informação genética?
apêndice 5
206
Três possíveis objeções
apêndice 6
216
Como a Academia Tem Respondido a Estes Achados?
Referências Glossário
222 235
recursos adicionais
247
sobre o
autor Dr. John Sanford tem sido professor na Universidade de Cornell por mais de 30 anos. Ele recebeu seu doutorado da Universidade de Wisconsin na área de enxerto e genética de plantas. Enquanto professor em Cornell, John treinou estudantes e conduziu pesquisa genética na Estação de Agricultura Experimental do Estado de Nova York em Geneva, NY. Em Cornell, John criou novas variedades de colheita usando enxertos convencionais e então tornou-se grandemente envolvido no novo campo emergente da engenharia genética de plantas. John publicou cerca de 100 artigos científicos e recebeu várias dezenas de patentes. Suas contribuições científicas mais significativas durante a primeira metade de sua carreira envolveram três invenções: o processo biolístico (“arma de gene”), a resistência patogênica derivada e a imunização genética. Uma grande parte das colheitas transgênicas (em termos de número e área cultivada) que crescem no mundo hoje foram geneticamente modificadas usando a tecnologia da arma de gene desenvolvida por John e seus colaboradores. João também começou dois empreendimentos biotécnicos derivados de sua pesquisa, a Biolistics, Inc., e a Sanford Scientific, Inc. John ainda trabalha em Cornell (Professor Associado Emérito), mas em grande parte aposentou-se da universidade e iniciou uma pequena organização sem fins lucrativos, a Feed My Sheep Foundation (FMS) [Fundação Apascenta Minhas Ovelhas].
Através da FMS, John conduziu pesquisa nas áreas de genética teórica e bioinformática pelos últimos 14 anos. Este livro representa as “primícias” destes esforços.
Dedicação e
agradecimentos
Eu sinto que só poderia escrever esse livro pela graça de Deus e reconheço e agradeço a Ele como o Doador de todas as boas dádivas. Este livro é dedicado à memória do Dr. Bob Hanneman, o orientador da minha dissertação de mestrado, que me encorajou em minha ciência e proveu um exemplo para mim sobre fé e piedade. Gostaria de agradecer a minha esposa, Helen, por seu apoio inabalável. Agradeço aos muitos cientistas que vieram antes de mim, que corajosamente questionaram o “Axioma Primário”. Agradecimentos especiais aos meus colegas cientistas que têm colaborado comigo durante a última década, fazendo pesquisa que fortemente valida todos os temas deste livro. Estes colegas incluem Walter ReMine, John Baumgardner, Wes Brewer, Paul Gibson, Rob Carter, Franzine Smith, Chase Nelson, Chris Rupe, e outros. Agradeço a Lloyd Hight e Chris Rupe pela arte deste livro.
J. C. Stanford
“Este livro foi escrito num estilo desafiador, mas acessível a não especialistas com um mínimo de familiaridade com a biologia, ao mesmo tempo que possui substância e documentação suficientes para fazer o biólogo mais altamente treinado repensar, de forma séria, o que sempre acreditou sobre o Axioma Primário. Em minha opinião, este livro merece ser lido por todos os biólogos profissionais e professores de biologia no mundo. Ele tem o potencial de mudar a perspectiva do mundo acadêmico de uma forma profunda”
Dr. John Baumgardner é um especialista em simulações numéricas complexas e trabalha há mais de 20 anos na Divisão Teórica do Laboratório Nacional de Los Alamos. PhD em geofísica pela Universidade da Califórnia em Los Angeles e mestre em Engenharia Eletrônica pela Universidade de Princeton.
prefรกcio Por Dr. John Baumgardner
Durante os últimos 50 anos, o empreendimento científico tem aberto as portas para um campo quase surrealista e liliputiano de indústrias de autorreplicação robótica, com componentes que giram a dezenas de milhares de rotações por minuto, endereçamento automatizado de encomendas, sistemas de transporte e distribuição, e complexos sistemas de monitoramento e controle. É claro que estamos falando sobre a área da biologia celular e molecular. Esse é um campo no qual dezenas de milhares de diferentes tipos de nanomáquinas sofisticadas realizam incríveis proezas químicas dentro da célula viva. Acima e além dessa complexidade celular está o domínio igualmente complexo do organismo, com trilhões de células trabalhando em coordenação surpreendente, e acima dele está o domínio do cérebro, com seus trilhões de conexões neurais. Ao ser confrontada essa complexidade assombrosa, uma pessoa reflexiva naturalmente pergunta: “Como tudo isso veio à existência?” A típica resposta a essa pergunta é o que o autor deste livro chama de “Axioma Primário”. A Entropia Genética e o Mistério do Genoma representa uma análise das bases fundamentais do Axioma Primário. Em particular, ele se concentra no software genético que especifica a surpreendente complexidade da vida. O autor assinala que, para os organismos superiores e, certamente, para os seres humanos, a extensão dessas especificações genéticas – denominadas genoma – é vasta. Não apenas o genoma é gigantesco, mas também extremamente complexo. Ele está repleto de circuitos e ramos, com genes que regulam outros genes, os quais regulam ainda outros genes. Em muitos casos, a mesma sequência de letras genéticas pode codificar mensagens totalmente diferentes, dependendo do contexto. “Como essa estrutura de informação tão surpreendente veio à existência?” é claramente uma importante pergunta. Mas o autor apresenta uma pergunta adicional: Como o genoma humano pode sequer ser conservado contra os efeitos degradantes dos bilhões de mutações deletérias que entram na população humana a cada geração? Quanto ao Axioma Primário, o autor reconhece que, como geneticista profissional, durante muitos anos não discerniu problemas graves em suas bases fundamentais. Ele confessa que, durante seus estudos de doutorado,
PREFÁCIO
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ele aceitou esse conceito principalmente por sua confiança nas autoridades científicas, e não por uma genuína compreensão pessoal. Neste ponto, ele acreditava que não tinha escolha – pensava que essa área abstrata e altamente matemática estava além de sua própria capacidade de análise crítica. Só muito mais tarde em sua carreira profissional ele tomou consciência de quão pouco realista e quão vulnerável à análise crítica eram os pressupostos cruciais sobre os quais repousa o Axioma Primário. O autor conclui que a maioria dos biólogos profissionais da atualidade estão em condição similar à dele no início de sua carreira. A maioria simplesmente não possui consciência dos problemas fundamentais com o Axioma. Isso ocorre porque os pressupostos fundamentais do Axioma não são examinados criticamente nos cursos de graduação, em livros didáticos de graduação, ou mesmo na literatura acadêmica. Os modelos conceituais que a genética populacional tem oferecido à comunidade científica (especialmente da área da biologia), apresentada sob a roupagem da elegância matemática, têm em seus fundamentos diversos pressupostos injustificáveis. O Axioma Primário, por sua vez, depende dessas premissas para o seu apoio. A maioria dos biólogos profissionais simplesmente não estão cientes desse estado de coisas. O campo da genética populacional trata em grande parte de modelos matemáticos que buscam descrever como as mutações são transmitidas de uma geração para a outra depois que surgem, e como afetam a sobrevivência de membros individuais de uma população em cada geração. A realidade desses modelos conceituais depende evidentemente, do realismo dos pressupostos sobre os quais são construídos. Neste livro, o autor apresenta a nítida falta de realismo de diversos dos pressupostos mais cruciais que têm sido aplicados nos últimos 80 anos. A maioria dos biólogos profissionais, como o autor durante a primeira parte de sua carreira profissional, baseia grande parte da sua confiança no Axioma Primária em alegações derivadas desses modelos conceituais que têm empregado observacionalmente pressupostos injustificáveis. A maioria dos biólogos atuais não tem conhecimento de que muitas alegações da genética populacional que aprenderam durante o curso de graduação não podem mais ser defendidas do ponto de vista científico. A maioria, portanto,
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A ENTROPIA GENÉTICA E O MISTÉRIO DO GENOMA
mal pode imaginar que quando premissas realistas são aplicadas, a genética populacional em realidade repudia o Axioma. A Entropia Genética e o Mistério do Genoma é uma brilhante análise crítica a respeito da irrealidade do Axioma Primário. Este livro foi escrito em estilo desafiador, mas acessível, compreensível por não especialistas que possuem conhecimentos elementares sobre genética e biologia. Ao mesmo tempo, esta obra apresenta rigor e documentação acadêmica suficientes para levar o biólogo mais qualificado a repensar seriamente o que provavelmente sempre aceitou sobre o Axioma Primário. Em minha opinião, este livro merece ser lido por todo biólogo profissional e professor de biologia. Para mim, ele tem o potencial de mudar a perspectiva do mundo acadêmico de maneira bastante profunda.
John Baumgardner
PhD em geofísica (Universidade da Califórnia em Los Angeles), trabalhou como pesquisador na Divisão Teórica do Laboratório Nacional de Los Alamos durante 20 anos. Ele também recebeu um mestrado em Engenharia Elétrica pela Universidade de Princeton, onde pela primeira vez teve contato com a teoria da informação e, posteriormente, com suas implicações para os sistemas biológicos. Ele é especialista em simulações numéricas e contribuiu no desenvolvimento do programa de computador Contador de Mendel (Mendel’s Accountant) – atualmente a simulação numérica mais realista do processo de mutação/seleção.
PREFÁCIO
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prólogo
Olhando em retrospecto, percebo que desperdicei grande parte da minha vida discutindo sobre questões que realmente não importam. Espero sinceramente que este livro de fato aborde assuntos que realmente importam. Parece-me que as perguntas fundamentais – quem somos? De onde viemos? Para onde estamos indo? – são de grande importância. Esse é o verdadeiro assunto deste livro. O pensamento moderno está centrado na premissa de que o ser humano é simplesmente produto de um processo natural desproposital (evolução não guiada). Essa doutrina amplamente ensinada, quando levada às suas implicações lógicas, nos conduz à crença de que somos apenas amontoados sem sentido de moléculas – e, em última análise, nada importa. Se falsa, essa doutrina é o sistema de pensamento mais insidioso e destrutivo já inventado pelo homem. No entanto, se for verdade, na melhor das hipóteses não tem sentido, como tudo o resto. Todo o sistema de pensamento que prevalece dentro da intelligentsia atual é construído sobre o fundamento ideológico da evolução darwiniana não dirigido e desproposital. O darwinismo moderno está fundamentalmente construído sobre o que vou denominar “o Axioma Primário”. O Axioma Primário é o conceito de que o ser humano é meramente o produto de mutações aleatórias combinadas à seleção natural. Dentro da academia de nossa sociedade, o Axioma Pri-
mário é ensinado universalmente e quase universalmente aceito. É o mantra repetido constantemente em cada campus universitário. Isto é muito difícil encontrar algum professor em qualquer campus universitário que sequer considere (ou, devo dizer, ouse) questionar o Axioma Primário. É por essa razão que a maioria esmagadora dos jovens que iniciam seus estudos com a crença de que há mais na vida do que meros elementos químicos perderá a fé quando estiver na faculdade. Creio que essa também é uma das causas dos comportamentos generalizados autodestrutivos e autodegradantes que vemos em nossa cultura. E se o Axioma Primário estiver errado? Se puder ser demonstrado que o Axioma Primário está equivocado, isso afetaria profundamente nossa cultura, e creio que afetaria profundamente milhões de vidas individuais. Isso poderia mudar a forma como pensamos sobre nós mesmos. Num período tardio de minha carreira, fiz algo que parecia impensável para um professor da Universidade Cornell. Comecei a questionar o Axioma Primário. Fiz isso com bastante receio e trepidação. Eu sabia que estaria em desacordo com a “vaca sagrada” mais importante que há dentro da academia moderna. Entre outras coisas, isso poderia até resultar em minha expulsão do mundo acadêmico. Embora eu tivesse alcançado considerável sucesso e notoriedade dentro da minha própria especialidade (genética aplicada), implicaria em sair da segurança do meu próprio pequeno nicho. Eu teria de começar a explorar questões muito amplas, incluindo aspectos de genética teórica que eu sempre tinha aceitado somente “pela fé”. Senti-me compelido a fazer tudo isso, mas devo confessar que eu esperava simplesmente me defrontar com uma parede de tijolos. Para minha própria perplexidade, gradualmente percebi que a “fortaleza aparentemente gigantesca e inexpugnável”, que fora construído em torno do Axioma Primário, em realidade é um castelo de cartas. O Axioma Primário é de fato uma teoria vulnerável. Na verdade, é essencialmente indefensável. Sua aparente invencibilidade deriva em grande parte de barulho, fumaça e espelhos. Grande parte do que mantém o Axioma em pé é uma fé quase uma mística que os “verdadeiros crentes” possuem na onipotência da seleção natural. Além disso, comecei a ver que essa fé profundamente
PRÓLOGO
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assentada na seleção natural é tipicamente associada a certo grau de comprometimento que só pode ser descrito como religioso. Comecei a perceber (novamente com trepidação) que eu poderia estar ofendendo a religião de um grande número de pessoas! Questionar o Axioma Primário exigia que eu reexaminasse virtualmente tudo o que eu pensava que sabia sobre genética. Esse foi o esforço intelectual mais difícil da minha vida. Padrões de pensamento profundamente arraigados só mudam muito lentamente (e, devo acrescentar, dolorosamente). O que experimentei eventualmente era uma completa reviravolta de minha compreensão anterior. Vários anos de luta pessoal resultaram numa convicção nova e muito profunda de que o Axioma Primário estava definitivamente equivocado. Mais importante ainda, fiquei convencido de que se poderia mostrar que o Axioma está equivocado a qualquer indivíduo racional e com mente aberta. Essa percepção era, ao mesmo tempo, estimulante e assustadora. Percebi que tinha a obrigação moral de desafiar a maior “vaca sagrada”, mas também percebi que ganharia o intenso desprezo da maioria dos meus colegas dentro da academia, para não mencionar oposição e ira muito intensas da elite científica. O que deveria fazer? Tornei-me convicto de que o Axioma Primário é insidioso no mais alto nível, tendo um impacto catastrófico em incontáveis vidas humanas. Além disso, cada forma de análise objetiva que realizei convenceu-me de que p Axioma é claramente falso. Portanto, agora, independentemente das consequências, eu tinha que dizer em alto e bom som: o imperador está nu! Convido o leitor a considerar meticulosamente esta importante questão. Você é realmente apenas um amontoado sem sentido de moléculas, o produto de nada além de mutações moleculares aleatórias e filtragem reprodutiva? Peço que você, ao ler este livro, envolva sua mente em torno de algo muito desafiador, mas também muito emocionante. Estou convencido de que, se você investir um esforço mental razoável e seguir alguns argumentos bastante simples, concluirá que o Axioma Primário é falso. Você pode imaginar alguma coisa mais radical ou mais libertadora? Na medida em que o Axioma
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A ENTROPIA GENÉTICA E O MISTÉRIO DO GENOMA
for demonstrado como falso, ele deve ter um impacto em sua própria vida e no mundo em geral. Por essa razão, atrevi-me a escrever este pequeno livro, que alguns receberão como traição blasfema e outros como revelação. Se o Axioma Primário estiver errado, há uma consequência surpreendente e muito prática. Quando submetido apenas a forças naturais, o genoma humano degenera inevitavelmente ao longo do tempo. Tal percepção deve ter mais do que apenas um significado intelectual ou histórico. Ela deve legitimamente nos levar a reconsiderar onde deveríamos colocar racionalmente nossa esperança para o futuro.
Atualização:
Desde que este livro foi escrito originalmente, inúmeras descobertas científicas dramáticas foram publicadas, todas as quais reforçam fortemente os temas centrais deste livro. Esses desdobramentos incluem a demonstração da natureza não linear do genoma, a natureza multifuncional de muitos dos nucleotídeos que compõem os genomas superiores, o fato de que o genoma codifica muito mais informação do que se pensava anteriormente, e o colapso da falácia de que muito do genoma humano é apenas “DNA lixo” ou “silencioso”. Acrescentei em destaque breves “Atualizações” sobre esses vários pontos no fim de vários capítulos. Também incluí o capítulo 11 que sumariza os principais desenvolvimentos científicos recentes.
PRÓLOGO
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A ENTROPIA GENÉTICA E O MISTÉRIO DO GENOMA
capítulo 1
o Genoma é o livro da vida. de onde ele vem? Fato rápido: o genoma é um manual de instruções
O genoma de um organismo é a soma total de todas as suas partes genéticas, incluindo todos os seus cromossomos, genes e nucleotídeos. Genoma é um manual de instruções que especifica uma determinada forma de vida. O genoma humano é um manual que instrui as células humanas a serem células humanas e o corpo humano a ser o corpo humano. Não existe sistema de informação concebido pelo homem que possa ao menos começar a ser comparado com o genoma mais simples em complexidade. A natureza complexa do genoma só pode ser apreciada quando come-
çamos a compreender quanta informação ele contém. Quando você monta o trenzinho vermelho que comprou para o seu filho como presente de Natal, há um livreto que lhe diz como juntar todas as peças. O tamanho do livreto é enganoso. Ele não contém todas as informações necessárias para a fabricação dos componentes, ou para a fabricação de aço, plástico e tinta. O manual de instruções completo seria realmente um volume bastante extenso. Se você compilar todos os manuais de instrução associados à produção de um automóvel moderno, encheria uma pequena biblioteca. Essa biblioteca seria muito grande se incluísse as informações necessárias para fabricar os componentes e para criar a as linhas de montagem. Da mesma forma, os manuais necessários O genoma humano para a criação de um avião de caça e toé um manual que dos os seus componentes, computadores instrui as células e linhas de montagem preencheriam uma humanas a serem biblioteca extremamente grande. Os macélulas humanas e o nuais necessários para construir um ônibus espacial e todos os seus componentes, corpo humano a ser bem como todos os seus sistemas de apoio o corpo humano. seria incrivelmente enorme! Contudo, a complexidade especificada mesmo da forma mais simples de vida é sem dúvida tão grande como a da nave espacial. Tente absorver o fato de que o salto na complexidade de uma bactéria até um ser humano é, sem dúvida, tão grande quanto o salto do pequeno trenzinho vermelho até um ônibus espacial. Simplesmente não há tecnologia existente que sirva de analogia adequada para a complexidade da vida humana. O genoma é o manual de instruções que codifica todas as informações necessárias para essa vida. Até aqui só começamos a descobrir a primeira dimensão desse livro da vida: uma sequência linear de quatro tipos de moléculas extremamente pequenas, chamadas nucleotídeos. Essas pequenas moléculas compõem os elementos individuais da estrutura em escada espiralada do DNA. Essas moléculas são as letras do código genético, e são representadas simbolicamente
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A ENTROPIA GENÉTICA E O MISTÉRIO DO GENOMA
como A, T, G e C. Essas letras são agrupadas como um texto linear. Elas não são apenas mostradas simbolicamente como letras, mas são literalmente as letras do nosso manual de instruções. Pequenas aglomerações dessas quatro letras moleculares compõem as palavras de nosso manual, que se combinam para formar genes (os capítulos do nosso manual), que se combinar para formar cromossomos (os volumes do nosso manual), que se combinam para formar o genoma inteiro (a biblioteca inteira). Um genoma humano completo consiste em dois conjuntos de 3 bilhões de letras individuais cada um. Só uma fração muito pequena dessa biblioteca genética é necessária para codificar diretamente as cerca de 100 mil proteínas humanas e o número incontável de moléculas funcionais de RNA encontradas dentro de nossas células. Cada uma dessas moléculas de proteínas e RNA são essencialmente máquinas em miniatura, cada uma com centenas de componentes e com sua própria complexidade, design e função requintadas. Mas a informação linear do genoma, equivalente a muitos conjuntos completos de uma grande enciclopédia, não é suficiente para explicar a complexidade da vida. Por mais extraordinária que seja toda essa informação linear, ela é meramente a primeira dimensão da complexidade que existe dentro do genoma. O genoma não é apenas uma simples sequência de letras que soletra uma série linear de instruções. Na verdade, ele incorpora diversos códigos lineares que se sobrepõem e constituem um sistema de informação extremamente sofisticado que incorpora o que é chamado de compressão de dados (veja o capítulo 9). Além das formas de informação genética múltiplas, sobrepostas, lineares e “linguísticas”, o genoma é repleto de inúmeros ganchos e ramos, como um programa de computador. Ele possui genes que regulam genes que regulam outros genes. Possui genes que captam mudanças no ambiente e, em seguida, instruem outros genes a reagir colocando em movimento complexas cascatas de eventos que então podem responder à sugestão ambiental. Alguns genes reorganizam-se ativamente, ou modificam e substituem outras sequências genéticas, basicamente alterando partes do manual de instruções.
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Por fim, existe suficiente evidência de que o DNA linear é capaz de se dobrar em estruturas de duas e três dimensões (como as proteínas e o RNA), e que esse dobramento provavelmente codifica níveis ainda mais elevados de informação. Dentro do típico núcleo não dividido, há razões para crer que possam existir arranjos de DNA tridimensionais fabulosamente complexos, cuja arquitetura 3-D controla funções biológicas mais elevadas. A questão é esta: o conjunto de instruções do genoma não é um arranjo simples, estático e linear de letras, mas uma disposição dinâmica, autorreguladora e multidimensional. Não existe sistema de informação humano que pode sequer começar a ser comparado a ele. Os níveis mais altos de complexidade genoma e interação do genoma provavelmente estão fora do alcance de nossa compreensão, mas podemos pelo menos reconhecer que esse nível de informação certamente existe. Assim, ao passo que a informação linear que há dentro do genoma humano seja limitada, a informação não linear obviamente deve ser muito, muito maior. Dada a insuperável complexidade da vida, isso necessariamente tem de ser verdade. Toda essa informação está contida num pacote genômico que, por sua vez, está contido dentro do núcleo de uma célula – um espaço muito menor que uma partícula de poeira. Cada corpo humano contém um aglomerado de células – mais de 100 trilhões –, e cada uma dessas células possui um conjunto de instruções e suas próprias funções altamente prescritas. O genoma humano não apenas especifica a complexidade de nossas células e de nosso corpo, mas também o funcionamento de nosso cérebro. A estrutura e organização de nosso cérebro envolve um nível de organização inteiramente além de nossa compreensão. À medida que reconhecemos as dimensões de ordem superior do genoma, creio que podemos concordar prontamente concordar com a conhecida declaração de Carl Sagan de que cada célula contém mais informações do que a Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos. De fato, a vida humana é mais complexa do que todas as tecnologias humanas combinadas. De onde veio toda essa informação e como ela pode ser mantida? Esse é o mistério do genoma.
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A ENTROPIA GENÉTICA E O MISTÉRIO DO GENOMA
A resposta padrão à origem da informação biológica é que a mutação e a seleção criaram toda a informação biológica. Essa é a base fundamental do da teoria neodarwiniana. Ela diz que todos os genomas (manuais de instrução) devem ter derivado de um genoma inicial simples por meio de uma longa série de mutações (“erros tipográficos”) e grande quantidade de seleção natural (“cópia diferencial”). Esse é o Axioma Primário da evolução biológica: a vida é vida porque mutações aleatórias em nível molecular são filtradas através de uma peneira reprodutora que atua sobre todo o organismo. O que é um axioma? Um axioma é um conceito que não é testável e é aceito pela “fé” porque parece evidentemente verdadeiro a todo ser racional. Com base nisso, é aceito como Verdade Absoluta. Neste livro, pretendo levar o leitor a fazer a pergunta: “Devemos aceitar o Axioma Primário atual?” Se o Axioma Primário puder ser demonstrado como equivocado, isso significaria que nossa compreensão atual da história da vida também está equivocada. Isso justificaria uma mudança de paradigma da maior magnitude (uma mudança de paradigma é uma mudança em uma ideia fundamental que anteriormente guiava o pensamento coletivo de um grupo), e nos permitiria reavaliar completamente muitos dos conceitos profundamente enraizados que moldam o pensamento moderno. É importante colocar o Axioma Primário numa moldura que seja honesta e também realista à nossa razão. Quero propor uma analogia honesta que caracterize com muita precisão o Axioma Primário atual. Minha analogia envolve a evolução dos meios de transporte, como descrito abaixo. Na analogia de nosso carrinho vermelho, o primeiro genoma primordial codificou as instruções de montagem do primeiro carrinho. Esse simples manual de instrução genômico foi copiado por um escriba mecânico invisível, para produzir mais manuais de instrução. Cada manual copiado foi usado para produzir um novo carrinho vermelho. No entanto, o escriba, sendo imperfeito, comete erros. Assim cada carrinho possui algumas diferenças. Cada carrinho tinha seu próprio manual de instruções exclusivo gravado em sua parte inferior. Quando os primeiros carrinhos foram descartados, seus manuais de instrução também foram jogados no lixo. Novas cópias dos manuais de instrução
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só podem ser copiados de maneira imperfeita a partir dos manuais de instrução da geração imediatamente anterior, pouco antes de serem descartados. Visto que a cópia das instruções era sequencial (em vez de usar o original), os erros se acumularam ao longo do tempo em cada manual, e os carrinhos resultantes começaram a mudar e variar. Os erros acumulados são, naturalmente, nossa analogia para as mutações. Você está apreensivo com essa imagem? Sem dúvida você percebe que estamos olhando para uma situação de deterioração. Informações estão sendo perdidas, instruções estão se degenerando, e os carrinhos sem dúvida estão perdendo a qualidade. Eventualmente, o sistema irá quebrar, o manual se tornará completamente ininteligível, e carrinhos viáveis se extinguirão. Examinaremos esse aspecto problemático da mutação mais detalhadamente nos capítulos 2 e 3. Neste ponto, apresentamos nosso herói, a seleção natural. A seleção natural é como um juiz ou agente de controle de qualidade que decide quais carrinhos são modelos adequados para serem copiados. A seleção natural, como o juiz, instrui o escriba a não copiar manuais a partir de carrinhos de qualidade inferior. Isso representa uma reprodução diferencial (peneiramento reprodutivo), mais conhecido como seleção. Mas é importante entender que nunca há uma seleção direta para boas instruções, apenas para bons carrinhos. Como veremos, isso é muito importante. As mutações são complexas e acontecem no nível molecular, mas a seleção só pode ser efetuada no nível de todo o organismo. O escriba e o juiz trabalham de forma totalmente independente. O escriba é praticamente cego, trabalha no nível das moléculas, e, tendo uma visão extremamente limitada, só consegue ver uma letra de cada vez enquanto está copiando. O juiz também é quase cego, mas é extremamente perspicaz. Ele nunca vê as letras do manual, ou mesmo os componentes individuais do carrinho. Ele só consegue ver o desempenho relativo de todo o carrinho. O escriba pode ser visto no início de uma linha de montagem robótica. Ele copia programas para os robôs de maneira cega e imperfeita, duplicando programas mais antigos, um bit binário de cada vez. O agente de controle de
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qualidade vê o desempenho dos carrinhos prontos e decide quais carrinhos são melhores do que outros. Os programas feitos a partir dos carrinhos que ele escolheu são então entregues ao escriba para a próxima rodada de cópia e montagem. Desta forma, muitos carrinhos defeituosos podem ser eliminados, e presumivelmente a maioria dos erros nas instruções podem ser eliminados. O mais entusiasmante é que alguns erros de ortografia raros podem resultar em carrinhos melhores, e assim o juiz pode instruir o escriba a preferir copiar essas instruções. O processo de evolução teve início! Vamos examinar agora a viabilidade do processo de seleção como mecanismo para aprimorar a informação genômica. A informação que está dentro do manual de instrução pode não apenas ser aprimorada pelo processo, mas também pode ser expandida. Se o escriba imperfeito ocasionalmente copia uma página extra (duplicada) fora do manual, podemos começar a acrescentar informações. Naturalmente, uma página duplicada em um manual de instrução não é realmente uma nova informação. De fato, isso invariavelmente irá confundir e interromper a leitura do manual. Mas, novamente, o juiz só permite a cópia de manuais de bons carrinhos. Portanto, as duplicações ruins presumivelmente podem ser eliminadas, e as duplicações inofensivas podem ser preservadas. Contudo, essas duplicações inofensivas também começarão a ter erros de cópia dentro delas, e alguns desses erros podem criar informação nova e útil, como instruções para novos componentes funcionais no carrinho. Com um pouco de imaginação, talvez possamos imaginar uma variedade de duplicações eventualmente evoluindo, por meio de erros ortográficos, e especificando algo totalmente novo, como um motor de combustão interna, ou asas, ou um sistema de navegação de computador a bordo. Assim, temos um cenário em que um carrinho vermelho pode, mediante uma série de erros tipográficos, evoluir a um automóvel, um avião ou mesmo um ônibus espacial. Mas essa analogia não ajuda muito, porque um ser humano é muito mais complexo do que um ônibus espacial. De fato, nosso fenoma (todo o corpo incluindo o cérebro) é imensamente mais complexo do que qualquer tecnologia conhecida. Talvez possamos nos aproximar da realidade se imaginar-
CAPÍTULO 1 - O GENOMA É O LIVRO DA VIDA. DE ONDE ELE VEM?
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mos nosso carrinho vermelho sendo transformado na fabulosa Nave Espacial Fenoma, dotada de motores de velocidade de dobra e tecnologia holográfica (Figura 1a-d). O Axioma Primário afirma que erros ortográficos e algumas cópias diferenciais podem explicar simultaneamente a biblioteca (o genoma) e a nave estelar (o fenoma) ilustrado na Figura 1d. Devemos nos perguntar: “Erros de ortografia e cópia realmente seriam capazes de produzir isso?” Uma compreensão correta de seleção é essencial para avaliar o mérito do Axioma Primário. Nenhuma inteligência está envolvida nesse cenário. O escriba é realmente apenas um conjunto complexo de máquinas moleculares destituídas de sentido que replicam cegamente o DNA. O juiz é apenas a tendência de alguns indivíduos reproduzirem mais do que outros. Muitas pessoas atribuem inconscientemente à seleção natural um tipo de inteligência sobrenatural. Mas seleção natural é apenas um termo para um processo cego e sem propósito no qual algumas coisas se reproduzem mais do que outras. É crucial entender que o escriba e o juiz não possuem habilidade de previsão nem inteligência. O QI combinado de ambos é igual a zero. Não é notável que o Axioma Primário da biologia alegue basicamente que erros tipográficos e um processo mínimo de cópia seletiva seja capaz de transformar um carrinho numa nave espacial na ausência de qualquer inteligência, propósito ou design? Você considera esse conceito plausível? A situação se torna ainda mais alarmante quando percebemos que a nave espacial não estava de forma alguma pré-especificada no Axioma Primário, nem mesmo na mente de Deus. Ela meramente “aconteceu” por acidente. A nave espacial é essencialmente apenas um carrinho mutante. Contudo, essa ilustração é a melhor analogia para descrever o Axioma Primário. A única fraqueza da analogia é que não há tecnologia humana que possa ser comparada à complexidade real da vida, e, assim, não existe um sistema de informação humano que possa ser comparado ao genoma humano. Toda essa analogia contrasta com a imagem falsa retratada por Dawkins (1986). O famoso argumento de Dawkins, construído em torno da frase “Parece-me que é como uma doninha”, envolvia uma mensagem pré-especificada sendo sistematicamente descoberta por meio de processo simplório
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equivalente aos jogos infantis “20 Perguntas” ou “Forca”. No modelo de Dawkins, tanto a frase quanto o método meticulosamente trabalhado e finamente sintonizado de descobri-lo foram inteligentemente projetados e premeditados. Além disso, seu esquema de seleção permitia a seleção direta de genótipo (erros ortográficos) em vez de fenótipo (desempenho do carrinho). Em suma, Dawkins propôs um simples programa de computador que começou com um simples conjunto de letras, tendo exatamente o mesmo número de caracteres que a frase “Parece-me que é como uma doninha”. Ele projetou seu programa para então começar a realizar mutações aleatórias (alterar) nas letras. Quando uma nova letra caía no lugar que formava a frase “Parece-me que é como uma doninha”, o programa selecionava a mensagem “aprimorada”. Obviamente, não demoraria muito para que um programa tão pequeno criasse a frase desejada. No entanto, mesmo para fazer com que esse simples programa funcionasse, Dawkins teve que projetar cuidadosamente a taxa de taxa de mutação e outros elementos para obter os resultados desejados. Esse programa supostamente provou que a evolução por meio de mutação e seleção é inevitável (não exigindo qualquer projeto inteligente). Obviamente, Dawkins usou um computador projetado inteligentemente, e então usou sua própria inteligência para projetar o programa, para otimizá-lo e até mesmo para projetar a frase pré-selecionada. Por muitas razões (ver Capítulo 9), o argumento de Dawkins não pode ser usado honestamente para defender o Axioma Primário (que não permite a atuação de qualquer inteligência, propósito ou premeditação, e não permite a seleção de erros ortográficos). Neste livro vamos examinar alguns aspectos básicos da genética e determinar se os fatos conhecidos sobre o genoma humano são compatíveis com o Axioma Primário. À medida que você ler, se chegar ao ponto no qual pensa que o Axioma Primário não é mais evidentemente verdadeiro para todas as partes razoáveis, então você deve sentir-se racionalmente compelido a rejeitá-lo como um axioma. Se o Axioma Primário não puder ser sustentado como axioma, ele deve ser tratado como uma hipótese não comprovada, sujeita à falsificação.
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Um notável livro foi publicado em 2013, intitulado Biological Information: New Perspectives. Esse livro atualização é uma compilação de trabalhos de pesquisa aprede 2014 sentados num simpósio realizado na Universidade Cornell (Marks et al., 2013). Essas pesquisas foram produzidas por 29 cientistas altamente qualificados que representam uma ampla gama de disciplinas científicas. Os 29 autores alcançaram um amplo consenso quanto à verdadeira natureza da informação biológica. A natureza dos sistemas de informação biológica é muito mais semelhante a um elaborado sistema de computador do que a um livro. O DNA é como o disco rígido da célula. Os milhões de moléculas de RNA e de proteína, e todas as suas interações, são como a memória ativa ou memória RAM da célula. Cada gene individual funciona como um programa de computador executável (de fato, existem vários programas por gene). Cada uma das moléculas de proteínas e de ARN dentro de uma célula é em si mesma um programa simples (algoritmo). O DNA, o RNA, as proteínas e inúmeras outras moléculas estão em constante comunicação uns com os outros – constituindo algo como um vasto sistema de internet dentro de cada célula. Usando técnicas de visualização de dados recentemente foi mostrado que os genomas superiores são extraordinariamente similares em estrutura a códigos de computador executáveis (Seaman, 2013). Figura 1a
alguma montagem requerida... Um carrinho vermelho não é informação, mas requer informação para especificar sua montagem. Um típico folheto de montagem não apresenta todas as informações necessárias para especificar a produção de um carrinho. Um manual de produção
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completo seria um livro muito substancial, especificando a produção de todos os componentes (rodas etc.) e todas as matérias-primas (aço, tinta, borracha).
Figura 1b
uma biblioteca de informação As instruções completas necessárias para especificar um automóvel moderno compreendem uma biblioteca substancial. Se a montagem fosse feita inteiramente por máquinas (sem a necessidade de “inteligência”), a informação, incluindo aquela necessária para criar e programar os robôs, seria enorme, compreendendo uma coleção fenomenal de livros.
Figura 1c
muitas camadas de informação O manual de instruções completo necessário para especificar um avião de caça, incluindo seus sistemas informáticos de bordo e todos os sistemas de fabricação e suporte inerentes à criação e manutenção de tal sistema, seria uma biblioteca gigantesca. Imagine as instruções se cada componente tivesse de ser feito roboticamente!
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Figura 1d
uma galáxia de informação
A biblioteca mostrada acima representa o genoma humano (toda nossa formação genética). A nave espacial representa o fenoma humano (todo o nosso corpo, incluindo o nosso cérebro). Não podemos realmente imaginar quão extensa a biblioteca teria que ser se devesse especificar o ficcional Nave Espacial Fenoma, completo com motores de velocidade de dobra e tecnologia holográfica. Não teria que ser muito maior do que a Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos? Contudo, podemos argumentar racionalmente que um ser humano é ainda mais complexo do que um hipotético Nave Espacial Fenoma. Que tipo de nave espacial poderia se reproduzir?
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capítulo 2
as mutações aleatórias são boas? Fato rápido: mutações aleatórias consistentemente destroem informações.
Mutações são erros tipográficos ocorridos no livro da vida. O assunto da mutação no genoma humano deve ser abordado com sensibilidade, porque as pessoas importam e pessoas são prejudicadas por mutações. O número de famílias afetadas por defeitos genéticos é tragicamente alta; então essa não é apenas uma questão de “estatísticas”. Uma doença genética, em seu sentido mais amplo, é catastrófica. Se incluímos todas as predisposições genéticas a todas as patologias, devemos concluir que todos nós somos altamente mutantes. Além disso, quase todas as famílias são afetadas pela tragédia do câncer, que é fundamentalmente o resultado de mutações dentro das células
de nosso corpo. Com efeito, as evidências crescentes indicam que o próprio envelhecimento se deve ao acúmulo de mutações dentro das células do nosso corpo. As mutações são uma fonte de implacável pesar. Na verdade, elas estão matando inexoravelmente cada um de nós. Assim, as mutações são mais do que apenas uma preocupação acadêmica. Podemos dizer que as mutações são boas? Quase todas as políticas de saúde buscam reduzir ou minimizar as mutações. A maioria dos regimes de saúde pessoal visam reduzir as mutações, reduzir o risco de câncer e outras doenças degenerativas. Como alguém pode ver as mutações como boas? No entanto, de acordo com o Axioma Primário, as mutações são boas porque produzem a variação e a diversidade que permitem que a seleção e evolução aconteçam, criando assim a informação necessária para a vida. Antes de avançarmos, precisamos compreender que existem M U TA Ç Õ E S S Ã O E R R O S dois tipos de variações: variação TIPOGRÁFICOS aleatória e variação projetada. A variação aleatória é o tipo de variaOCORRIDOS NO ção que vejo em meu carro com o LIVRO DA VIDA passar do tempo. Inclui ferrugem, batidas, arranhões e partes quebradas. Essas coisas criam variação nos carros; mas será que produzem carros melhores? Erros tipográficos melhoram realisticamente o trabalho de um aluno? Pedras atiradas podem melhorar uma casa de vidro? Além dos acidentes, existe outro tipo de variação, a variação projetada. Quando comprei meu carro, eu tinha muitas opções: a cor da pintura, o tipo de pneu, o tamanho do motor etc. Essas opções foram úteis para mim ao fazer minha escolha. Esses componentes variáveis projetados também me foram úteis para mim mais tarde. Acrescentei ou retirei várias opções, peças quebradas substituídas etc. Essas formas projetadas de variação são benéficas, sendo úteis para sustentar o meu carro, e são úteis até para melhorar o meu carro, dentro de limites. No entanto, tais variações, mesmo quando são inteligentemente projetadas, nunca transformarão meu carro em uma nave espacial.
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Parte do Axioma Primário é que toda a variação genética deve vir de mutações aleatórias, uma vez que a variação genética projetada não é permitida. No entanto, nesta era da engenharia genética, essa suposição axiomática claramente não é verdadeira (porque muitos organismos vivos contêm agora variações genéticas concebidas e projetadas pelo homem). Talvez esse simples fato possa abrir nossas mentes à possibilidade de variação genética projetada que precedeu o homem! Além do nosso compromisso ideológico com o Axioma Primário, podemos argumentar racionalmente que mutações aleatórias nunca são boas. Falando em termos de veículos, eles parecem ser as batidas e os arranhões da vida, em vez de peças sobressalentes. A natureza esmagadoramente deletéria das mutações pode ser vista pela incrível escassez de casos claros de mutações que criam informações. Deve-se entender que os cientistas têm uma rede sensível e extensa para detectar mutações que criam informações, e a maioria dos geneticistas estão mantendo seus olhos diligentemente abertos para eles o tempo todo. Isso tem sido verdade por cerca de cem anos. A sensibilidade dessa rede observacional é tal que se apenas uma mutação entre um milhão criasse sem ambiguidade novas informações (além do ajuste fino), a literatura estaria transbordando com relatos desse acontecimento. Mas ainda não estou convencido de que existe um único exemplo cristalino de uma mutação conhecida que inequivocamente tenha criado informações. Há certamente muitas mutações que têm sido descritas como benéficas, mas a maioria dessas mutações benéficas não criaram informações, mas sim as destruíram. Por exemplo, alguns de nós (como eu) veriam um alarme de carro quebrado como “benéfico”. Contudo, tais mudanças aleatórias, embora possam ser consideradas “desejáveis”, ainda representam uma quebra e não a criação de uma nova característica. A informação diminui. Esse é o caso real, por exemplo, em mutações cromossômicas que levam à resistência aos antibióticos por bactérias: as funções das células são rotineiramente perdidas. A bactéria resistente não evoluiu. Na verdade, ele faz digressões genéticas e é defeituoso. Tal estirpe mutante é rapidamente substituída por bactérias superiores e naturais logo que o antibiótico é removido. Outro exemplo seria o cão chihuahua sem pelos. Em calor extremo, a
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redução de tamanho e perda de cabelo podem ser adaptações úteis, mas isso envolve degeneração, não criação de novas informações. Em tais situações, embora a adaptação local esteja ocorrendo, a informação está sendo perdida, não adicionada. No entanto, o Axioma Primário ainda insiste que as mutações são boas e são os blocos de construção com os quais a evolução cria a abundância de informações atualmente existentes dentro do genoma. Deixe-nos continuar a examinar esse conceito mais de perto. A natureza da deterioração genética por meio de mutação pode ser vista facilmente usando nossa analogia de um manual de instruções. Por exemplo, uma linha única dentro de um manual de montagem de aviões a jato pode ser lida da seguinte forma:
Passo 6. Quando você tiver concluído o último passo, volte e repita o passo 5, até que a peça B tenha 10,004 mm de espessura. Então espere não menos de 3 horas antes de ir para a próxima etapa. Limitando-nos apenas a mutações pontuais simples (erros ortográficos), há três níveis possíveis de impacto nas instruções acima. Teoricamente, alguns erros ortográficos podem ter um impacto na mensagem (não encontro nenhum exemplo óbvio desse caso). A maioria dos erros de ortografia terá um efeito muito sutil sobre clareza ou a coerência da mensagem (isto é, erros ortográficos dentro de todas as porções não destacadas). Por último, algumas poucas alterações (dentro das áreas destacadas), terão o potencial de efeitos dramáticos (essencialmente letais). O que não está claro no exemplo acima é que erros ortográficos poderiam realmente melhorar as instruções para resultar em um melhor avião a jato. Embora tais mudanças sejam concebíveis, são improváveis, num nível que é difícil de descrever completamente. Quaisquer possíveis melhorias nas instruções resultantes de um erro ortográfico seriam esperadas como muito triviais (isto é, mudar o 4 para um 8, três lugares para a direita do decimal na espessura especificada). Esses tipos de mudanças na verdade não adicionam informações, mas apenas modulam, ou afinam o sistema. Deveria ser óbvio para qualquer pessoa racional que não podemos esperar
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que erros ortográficos resultem em um grande avanço na tecnologia de jato. Por exemplo, nenhum erro ortográfico na sentença acima vai criar um novo componente patenteável. Tais mudanças importantes, obviamente, exigem um projeto inteligente. Para cada erro ortográfico hipotético que poderia muito sutilmente melhorar (ou, mais precisamente, modular) o plano de um avião a jato, haveria uma multidão de erros de ortografia que seriam prejudiciais. As variações prejudiciais variam de alguns erros letais a um grande número de mudanças quase neutras no texto. A ilustração acima pode ser estendida para o genoma (veja a Figura 2). Há mais de 3 bilhões de locais potenciais de mutação no genoma humano. Apenas uma pequena fração destes, quando sofre uma mutação, terá um efeito significativo. No entanto, nenhuma das mutações potenciais pode ser conclusivamente demonstrada como tendo efeito zero. A grande maioria das posições nucleotídicas são consideradas locais “quase neutros”, como será visto mais claramente abaixo. Erros ortográficos nas instruções do manual da vida serão por vezes muito prejudiciais, mas na maioria dos casos eles serão apenas muito pouco deletérios. Nenhuma nova informação pode ser esperada, embora as informações existentes possam ser moduladas ou afinadas de forma limitada. A modulação biológica implicaria o ajuste dos “reóstatos” da célula. Por exemplo, é bem conhecido que as mutações podem ajustar a atividade de um promotor ou enzima, para cima ou para baixo. No entanto, quando usamos um reostato para escurecer uma luz, não estamos criando um novo circuito, nem estamos criando novas informações. Estamos apenas ajustando o sistema que já está presente, que foi, de fato, projetado para ser finamente ajustado. Acabei de afirmar que a esmagadora maioria das mutações devem ser quase neutras. Todos os geneticistas de populações concordariam, por muitas razões. Primeiro, isso pode ser visto pela natureza dos erros de qualquer linguagem escrita (como você pode imaginar por si mesmo alterando qualquer letra deste livro). Em segundo lugar, pode ser visto pelo número total de nucleotídeos. Em média, cada posição de nucleotídeo pode conter apenas uma parte em três bilhões do total de informações. Em terceiro lugar, pode ser visto a partir de inúmeros estudos sobre a mutação de sequências de codificação,
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promotores e intensificadores. Experimentalmente, podemos mostrar que a maioria das posições de nucleotídeos têm efeitos muito sutis em qualquer função celular, e apenas algumas mutações são “assassinos” reais da função gênica (lembre-se: qualquer função genética é apenas uma parte minúscula do sistema da célula inteira). Por fim, o impacto quase neutro da maioria dos nucleotídeos pode ser visto a partir do próprio papel sutil que os únicos nucleotídeos desempenham em padrões do genoma (preferências de códon, locais de ligação de nucleossomo, isocoros, diferenças composicionais de “palavra” entre espécies etc.). Esses padrões envolvem centenas de milhões de nucleotídeos que estão dispersos em todo o genoma. As posições de nucleotídeos individuais devem desenvolver um papel incomensuravelmente minúsculo na manutenção de todos esses padrões de genoma. Por mais infinitesimais que sejam esses efeitos, eles não são zero. Tais padrões existem porque cada nucleotídeo contribui para isso. Cada nucleotídeo ainda tem um impacto, e assim carrega a informação. Não importa como analisá-lo, veremos que a maioria das posições dos nucleotídeos devem ser quase neutras. Existem posições nucleotídicas verdadeiramente neutras? A verdadeira neutralidade nunca pode ser demonstrada experimentalmente (seria necessária uma sensibilidade infinita). Contudo, por razões que abordaremos mais tarde, alguns geneticistas têm estado ansiosos para minimizar o genoma e querem relegar a maior parte do genoma para o “DNA lixo”. As mutações em tal DNA são assumidas como sendo inteiramente neutras. Contudo, os resultados reais de pesquisa expandem continuamente o tamanho do genoma funcional, ao passo que o suposto DNA lixo continua encolhendo. Em apenas alguns anos, muitos geneticistas têm deixado de crer que menos de 3% do genoma total é funcional e passaram a crer que mais de 30% é funcional e as evidências mais recentes indicam que 80% ou mais é funcional (The ENCODE Project Consortium, 2012). À medida que o genoma funcional se expande, as mutações neutras encolhem. Além disso, existem fortes razões para crer que não existe nenhuma posição de nucleotídeo verdadeiramente neutra. Pela sua própria existência, uma posição de nucleotídeo ocupa espaço, afeta o espaçamento entre outros locais, e afeta coisas como composição de nucleotídeo regional, dobramento de DNA e liga-
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ção de nucleossomo. Se um nucleotídeo não carrega absolutamente nenhuma informação, é, por definição, levemente deletério, pois retarda a replicação celular e desperdiça energia. Assim como realmente não há letras verdadeiramente neutras numa enciclopédia, provavelmente não há nucleotídeo verdadeiramente neutro no genoma. Portanto, não há como alterar qualquer local sem algum efeito biológico, não importa o quão sutil. Enquanto a maioria dos locais é provavelmente quase-neutra, muito poucos, se houver algum, devem ser absolutamente neutros. Essa falácia de mutações absolutamente neutras é claramente refutada por Eyre-Walker e Keightley (2007). Nas palavras deles:
“[...] parece improvável que qualquer mutação seja verdadeiramente neutra no sentido de que não tenha efeito sobre a aptidão. Todas as mutações devem ter algum efeito, ainda que seja extremamente pequeno. No entanto, há uma espécie de mutações que podemos qualificar como efetivamente neutras. [...] Como tal, a definição de neutralidade é operacional e não funcional; ela depende se a seleção natural é efetiva sobre a mutação da população ou do contexto genômico no qual segrega, não apenas no efeito da mutação sobre a aptidão.” Então, como realmente se parece a verdadeira distribuição de todas as mutações? A Figura 3a mostra a visão ingênua da curva de mutações, em forma de sino, sendo metade das mutações benéficas e metade deletérias. É fácil prever progressos seletivos com tal distribuição de mutações. A seleção, evidentemente, favoreceria as boas mutações e eliminaria as más. De fato, se essa distribuição estiver correta, a evolução progressiva seria inevitável. Mas esse ponto de vista é claramente incorreto. Mutações benéficas são tão raras que normalmente não são mostrados em tais gráficos. A Figura 3b mostra uma visão mais realista da distribuição de mutações, variando de letal (-1) a neutra (0). Entretanto, isso ainda não é muito certo. Mutações são fortemente inclinadas em direção a valores neutros. Em outras palavras, a maioria das mutações são quase neutras, como discutimos acima. Como se parece a verdadeira distribuição das mutações? CAPÍTULO 2 - AS MUTAÇÕES GENÉTICAS SÃO BOAS?
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A Figura 3c é modificada e expandida a partir de Kimura (1979). Essa curva representa de maneira bastante próxima a verdadeira distribuição de mutações. Como pode ser visto a partir da curva de Kimura, a maioria das mutações são negativas, e se acumulam de maneira íngreme perto da marca zero. Elas são deletérias e esmagadoramente quase neutras. Kimura é conhecido por mostrar que há uma “zona de quase-neutralidade” (mostrada aqui como um quadro). Kimura denomina as mutações quase neutras de “efetivamente neutras”, significando que são tão sutis que não estão sujeitas à seleção. Contudo, podemos ver que Kimura não mostra nenhuma mutação como sendo absolutamente neutra. Sua curva se aproxima, mas não alcança, o ponto de impacto zero. O ponto de corte um tanto arbitrário de Kimura para o “não selecionável” (isto é, o tamanho de eu quadro) é calculado por Kimura como uma função de Ne (o número de indivíduos reprodutores dentro de um população.) É importante notar que o tamanho do quadro de Kimura, que ele calcula com base no tamanho da população, é apenas uma estimativa mínima da extensão das mutações efetivamente neutras. O tamanho real do quadro também deve ser ampliado por qualquer e por todos os fatores não genéticos que podem afetar a probabilidade reprodutiva. Como veremos no capítulo 6, esse fato aumenta de forma muito significativa o tamanho do quadro (ver Figura 9). Qualquer coisa que diminua a “taxa sinal/ruído” tornará proporcionalmente mais de um nucleotídeo do genoma não selecionável. A importância dos fatores não genéticos em termos de tornar proporcionalmente mais nucleotídeos não selecionáveis é reconhecido pelo conhecido geneticista Muller (Muller, 1964). Na figura de Kimura, ele não mostra nenhuma mutação à direita de zero – o número de mutações benéficas mostradas é zero. Ele obviamente considerava mutações benéficas tão raras que estão fora de consideração. Dada essa distribuição de mutações, alguém poderia naturalmente perguntar: “Como os teóricos são capazes de explicar o progresso evolutivo?” Isso é feito da seguinte maneira: tudo que está no “quadro quase neutro” é redefinido como sendo completamente neutro, e assim é descartado. Assume-se então que
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as mutações à esquerda do quadro quase neutro podem ser eliminadas completamente por meio da seleção natural. Tendo eliminado todas as mutações deletérias dessas duas maneiras, os teóricos estão livres para argumentar que não importa quão raras as mutações benéficas podem ser (à direita do quadro), deve haver tempo suficiente e suficiente poder de seleção para resgatá-las e usá-las como blocos construtores da evolução. Como veremos adiante, eles estão errados em todos os aspectos. As mutações no quadro não podem ser descartadas, as mutações à esquerda do quadro não podem ser todas necessariamente eliminados por seleção, e não há nem tempo nem poder de seleção para selecionar as mutações benéficas extremamente raras que possam ocorrer à direita do quadro quase neutro. Dado o papel fundamental que as mutações benéficas desempenham nos cenários evolutivos, fiquei perplexo sobre por que Kimura não os representou de qualquer forma em seu gráfico. Para ser justo, pensei em acrescentá-los no desenho. À medida em que ocorrem, a curva de distribuição para mutações benéficas deve ser uma imagem inversa das mutações deletérias. Assim como as mutações deletérias, a maioria esmagadora das mutações benéficas devem ser quase neutras, sobrecarregando-se em direção à marca neutra. Crow (1997) afirma claramente que esse fato óbvio. A esmagadora maioria das mutações benéficas deve ter efeitos muito leves (ver Apêndice 5 para mais detalhes). Contudo, visto que as mutações benéficas são tão raras em comparação com as mutações deletérias, a área delas e a área debaixo de sua curva também devem ser proporcionalmente menores. Tenho visto estimativas das taxas de mutações deletérias para benéficas que variam de mil a um milhão para um. As melhores estimativas parecem ser um milhão para um (Gerrish; Lenski, 1998). A taxa real de mutações benéficas é tão extremamente baixa que impede qualquer cálculo real (Bataillon, 2000; Elena et al., 1998). Portanto, não é possível desenhar uma curva suficientemente pequena para a direita de zero que represente quão raras essas mutações benéficas realmente são. Em lugar disso, coloquei um triângulo facilmente visível na imagem (Figura 3d). A Figura 3d é uma representação honesta e verdadeira da distribuição natural de mutações, exceto pelo fato de que é muito generosa em termos
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de mutações benéficas. O que é mais interessante sobre essa figura (e isto foi surpreendente para mim) é o reconhecimento de que essencialmente a extensão completa de todas as mutações benéficas hipotéticas está dentro da zona “efetivamente neutra” de Kimura. Isso significa que essencialmente todas as mutações benéficas (na medida em que acontecem) devem ser “não selecionáveis”. Assim, a seleção nunca poderia favorecer tais mutações benéficas, e elas derivam sistematicamente da população. Como veremos, há alguns raros benefícios que tem um efeito importante, mas eles são anomalias – exceções à regra. Eles são mostrados na Figura 3d como pequenas flechas à direita da “zona de não-seleção”. Dada a escala da figura, eles seriam invisíveis sem as flechas. A Figura 3d ilustra vividamente por que as mutações não podem resultar em ganho de informação. Como veremos mais claramente em capítulos posteriores, a seleção não pode tocar em nenhuma das mutações no quadro quase neutro. Portanto, o forte predomínio de mutações deletérias nesse quadro garante absolutamente a perda líquida de informação. Além disso, quando a taxa de mutação é alta e a taxa de reprodução é moderada ou baixa, a seleção não pode sequer eliminar todas as mutações à esquerda do quadro. Veremos que as restrições na seleção limitam ainda nossa capacidade de selecionar as mutações benéficas extremamente raras que podem estar à direita do quadro quase neutro. Tudo sobre a verdadeira distribuição dos genes argumenta contra as mutações que levam a um ganho de rede na informação como é necessário para avançar a evolução. Visto que as mutações benéficas são tão centrais para a viabilidade do Axioma Primário, preciso dizer um pouco mais sobre eles. Durante o século passado, foi investido grande esforço na tentativa de se usar a mutação para gerar variação útil. Isso foi especialmente verdadeiro em minha própria área, a reprodução de plantas. Quando foi descoberto que certas formas de radiação e determinados produtos químicos são poderosos agentes mutagênicos, milhões de plantas foram mutagenizadas e selecionadas para possíveis melhorias. Assumindo o Axioma Primário, parece óbvio que isso resultaria em rápida “evolução” de nossas lavouras. Por várias décadas, esse foi o impulso
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principal da pesquisa de melhoria de colheita. Várias mutações foram produzidas e rastreadas, representando coletivamente muitos bilhões de eventos de mutação. Foi produzido um grande número de plantas aberrantes pequenas, estéreis, doentes e deformadas. Contudo, todo esse esforço não resultou em quase nenhuma melhoria significativa da colheita. O esforço foi, em grande parte, um gigantesco fracasso e foi quase inteiramente abandonado. Por que esse enorme experimento de mutação/seleção falhou mesmo com inúmeros cientistas com doutorado trabalhando ao longo do processo? Porque mesmo com todas as bilhões de mutações não houve novas e significativas mutações benéficas. As várias exceções provam esse fato. O milho rico em fitatos é o exemplo mais notável de reprodução bem-sucedida de mutações. Esse milho de fitato baixo tem certas vantagens em termos de ração animal. O milho de fitato baixo foi criado pelo processo de mutagenização de milho e, em seguida, selecionando para onde a maquinaria genética que guia a produção de ácido fítico tinha sido danificada. Embora resultante o mutante possa ser desejado para uma finalidade agrícola específica, foi através de perda líquida de informação (como o alarme de um carro quebrado) e da perda de uma função biológica. A maioria dos outros exemplos de mutação bem-sucedida são encontrados na área de plantas ornamentais, onde anomalias disfuncionais se verificam originais e belas. Exemplos de mutações “úteis” dentro de plantas ornamentais incluem esterilidade, nanismo, manchas ou folhagem variegada, ou órgãos florais deformados. Se nenhuma mutação verdadeiramente positiva (resultando em ganho líquido de informações) poderia ser recuperada a partir desse vasto processo, por que pensamos que um processo idêntico, na ausência de qualquer inteligência condutora, seria mais frutífero na natureza? Contudo, os mesmos cientistas que falharam na mutação/seleção foram extremamente bem-sucedidos na melhoria das culturas quando abandoaram a mutação e, em vez disso, utilizaram os recursos naturais de variação já existentes dentro de cada espécie ou gênero de planta. Isso faria sentido se tal variação pré-existente não surgisse principalmente por meio de mutação, mas tenha surgido originalmente por meio de planejamento.
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Bergman (2004) analisou o tema das mutações benéficas. Entre outras coisas, ele realizou uma pesquisa de literatura mediante a plataforma Biological Abstracts e Medline. Ele encontrou 453.732 casos de “mutação”, mas apenas 186 mencionavam a palavra “benéfico” (cerca de 4 em 10.000). Quando essas 186 referências foram revistas, as mutações benéficas presumidas só foram benéficas em um sentido muito restrito e consistentemente envolviam mudanças de perda de função (perda de informação). Ele foi incapaz de encontrar um único exemplo de uma mutação que inequivocamente tenha criado novas informações. Embora seja quase universalmente aceito que mutações benéficas, produtoras de informação, devem ocorrer, essa crença parece estar baseada na aceitação não crítica do Axioma Primário, em vez de em evidências reais. Não duvido que existam mutações benéficas, mas é evidente que elas são extremamente raras – raras demais para a construção do genoma. Em conclusão, as mutações parecem ser esmagadoramente deletérias, e mesmo quando podem ser classificadas como benéficas em algum sentido específico, isso ainda é geralmente parte de uma desagregação global e erosão de informação. Como logo examinaremos mais detalhadamente, as mutações, mesmo quando combinadas com a seleção, geralmente não podem criar nova informação. Os tipos de variação criados pela mutação se assemelham mais aos golpes e arranhões da vida, e não podem ser vistos como peças de reposição da vida (peças de reposição são projetadas). As mutações são a base para o envelhecimento dos indivíduos, e neste exato momento estão nos conduzindo à morte, tanto a sua quanto a minha. A menos que a seleção possa de alguma forma interromper a erosão da informação no genoma humano, as mutações não só levarão à nossa morte pessoal, mas levarão à morte de nossa espécie. Veremos em breve que para prevenir a degeneração genômica contínua, a seleção natural deve ser capaz de efetivamente selecionar contra números extremamente grandes de mutações nucleotídicas quase neutras.
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Uma das coisas que este livro mostra é que a evolução futura requer uma taxa muito elevada de mutações benéficas, e estas devem ser suficientemente impactantes para ser selecionáveis. Essas atualização mutações benéficas poderiam ser extremamente de 2014 comuns? A lógica simples impede isso, assim como a maioria das observações científicas ao longo de muitas décadas. A lógica nos diz que a informação genética representa especificações, as quais são inerentemente específicas, e mutações aleatórias destroem a especificidade – elas destroem sistematicamente qualquer informação útil. No entanto, existem alguns casos isolados os quais alega-se que determinados experimentos laboratoriais mostram taxas notavelmente elevadas de mutação benéfica. Meus colegas e eu refutamos efetivamente essas alegações em uma publicação científica recente (veja Montañez et al., 2013). A chave para compreender essas alegações de abundantes mutações benéficas de alto impacto é que grande parte (até 50%) de qualquer genoma microbiano consiste em “genes just-in-case” que precisam ser regulados com precisão. As mutações aleatórias são boas? Esses genes são cruciais no mundo real, conferindo tolerância diversas condições específicas de tensão. Mas em condições artificiais e estáveis de laboratório, tais genes são apenas pesos mortos. Quebrar ou excluir esses genes não essenciais com frequência economiza energia e permite um crescimento mais rápido no ambiente de laboratório. Do mesmo modo, interromper a regulação normal pode ser vantajosa no ambiente artificial. Sob essas condições artificiais, podem surgir muitas mutações “benéficas” que envolvem perda de informação, perda de função e degeneração genética (como desmontar um carro para uma corrida). Descrever tais mutações como “benéficas” é realmente incorreto – na verdade, elas representam uma “degeneração adaptativa”. Isso é visto no famoso experimento de longo prazo Escherichia coli, desenvolvido por Lenski e sua equipe (Barrick et al., 2009; Lenski, 2011). E. coli realmente se adaptou a determinado ambiente artificial, e num meio artificial específico poderia crescer um pouco mais rápido. Mas quando as mutações “benéficas” permitidas foram analisadas, todas elas envolveram CAPÍTULO 2 - AS MUTAÇÕES GENÉTICAS SÃO BOAS?
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eventos de perda de função (genes quebrados ou promotores quebrados). O tamanho do genoma encolheu consistentemente. Isso é claramente como os genomas não são construídos, e está diretamente relacionado ao problema da degeneração genética. Mais recentemente, um artigo de Bataillon e Bailey (2014) examinou a distribuição dos efeitos de mutação. Em seu artigo, eles examinam especificamente a distribuição de mutações benéficas, e declaram: “Evidência experimental direta confirma previsões sobre a distribuição de efeitos de aptidão (DFE, na sigla em inglês) das mutações benéficas que favorecem distribuições grosso modo exponenciais, mas delimitadas à direita”. Em outras palavras, sua análise concorda com a minha – e suporta a Figura 3d. Eles continuam: “[...] estimativas sugerem consistentemente parâmetros de forma no domínio Weibull [...].” A distribuição do tipo Weibull é a distribuição que meus colegas e eu costumamos empregar em nossas simulações numéricas. Por fim, eles abordam a raridade de mutações benéficas dizendo: “A suposição convencional [...] é de que as populações estão muito próximas de sua melhor condição de aptidão, e, portanto, mutações benéficas são extremamente raras e podem ser ignoradas com segurança. Assim, na maioria dos casos, os pressupostos dos modelos utilizados não permitem efeitos de aptidão benéficos para ser estimados em absoluto. [...] No entanto, mutações benéficas não são tão raras que não possam ser detectadas quando procuradas em experimentos de evolução, e, dependendo do ambiente particular de seleção, mutações benéficas podem ser bastante numerosas. [...] Pode-se argumentar que esses dados representam DFE de populações extremamente desajustadas, importante apenas no ambiente artificial do laboratório.” Esses autores compreendem claramente que mutações benéficas são anomalias extremamente raras. No quadro geral, as mutações destroem sistematicamente a informação biológica.
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A ENTROPIA GENÉTICA E O MISTÉRIO DO GENOMA
Figura 2
A natureza da informação genética...
O genoma é visto como uma matriz linear de letras: A, T, C, G. O genoma real é 3 milhões de vezes maior do que a sequência mostrada acima. Para ver apenas metade de seu próprio genoma, você teria que ver 10 nucleotídeos por segundo, durante 40 horas por semana, por 40 anos! A aparente simplicidade desse sistema linguístico é enganosa. Um genoma mais elevado, quase certamente deve compreender uma grande quantidade de compressão de dados (veja o Capítulo 9), bem como uma grande quantidade de informação não linear. Com exceção de certas porções curtas, não podemos ver o genoma como simplesmente um texto linear, como um livro. Grande parte do conteúdo da informação provavelmente é encontrada em estruturas tridimensionais, como é o caso das proteínas entrelaçadas.
CAPÍTULO 2 - AS MUTAÇÕES GENÉTICAS SÃO BOAS?
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Mutação – distribuição normal?
A distribuição dos efeitos mutacionais sobre a aptidão – a visão ingênua.
Frequência
Figura 3a
Efeito de Mutação
A visão ingênua das mutações consistiria numa distribuição em forma de sino, com metade de todas as mutações mostrando efeitos deletérios sobre a aptidão (esquerda do centro), e metade mostrando efeitos positivos sobre a aptidão (direita do centro). Com tal distribuição seria fácil imaginar a seleção removendo mutações ruins e corrigindo mutações boas, resultando inevitavelmente em progresso evolutivo. No entanto, sabemos que esse é um quadro falso.
Frequência
Mutação – distribuição truncada?
Figura 3b
Efeitos mutacionais sobre a aptidão – quase nunca benéficas.
Efeito de Mutação
Os especialistas em genética populacional sabem que essencialmente todas as mutações são deletérias, e que as mutações que têm efeitos positivos
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A ENTROPIA GENÉTICA E O MISTÉRIO DO GENOMA
sobre a aptidão física são tão raras a ponto de serem excluídas de tais diagramas de distribuição. Isso cria grandes problemas para a teoria da evolução. Mas essa imagem ainda é muito otimista.
Frequência
Distribuição de Kimura?
“Zona de Não Seleção Efeito de Mutação
Figura 3c
Efeitos mutacionais – efeitos danosos normalmente m u i t o l e v e s – i nv i s í v e l p a r a a s e l e ç ã o n a t u r a l . Os especialistas em genética populacional sabem que as mutações são fortemente inclinadas para a neutralidade. Assim como num manual de instruções, alguns erros ortográficos serão letais, mas a maioria será quase inofensiva. As mutações quase neutras criam os maiores problemas para a teoria evolutiva. Este diagrama é adaptado de uma figura de Kimura (1979). Kimura é conhecido por mostrar que a maioria das mutações são quase neutras e, portanto, não estão sujeitas à seleção. A “zona de não seleção” de Kimura é indicada pelo quadro. A forma geral dessa curva é importante, mas a natureza matemática precisa dessa curva não é. Embora Ohta creia que a distribuição da mutação seja exponencial, Kimura pensa que é uma distribuição “gama” (Kimura, 1979). No CAPÍTULO 2 - AS MUTAÇÕES GENÉTICAS SÃO BOAS?
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entanto, independentemente de qual formulação matemática específica descreva melhor a distribuição natural de efeitos de mutação, todos eles se aproximam do quadro acima. Para seu possível interesse, os geneticistas concordam que a frequência de doenças mutações altamente deletérias é quase zero (não mostradas, fora do gráfico), enquanto as mutações “menores” são de frequência intermediária (isto é, a porção esquerda do gráfico e fora do gráfico). Acredita-se que as mutações menores excedam em número às mutações principais em cerca de 10-50 vezes (Crow, 1997), mas as quase neutras superam em número os dois.
Frequência
Distribuição correta!
“Zona de Não Seleção Efeito de Mutação
Figura 3d
Efeitos mutacionais – raras mutações benéficas realmente acontecem, mas são geralmente não-selecionáveis. A figura de Kimura (3c) ainda não está completa. Para completar a figura, de fato devemos mostrar onde as mutações benéficas ocorreriam, visto que elas são fundamentais para a teoria evolutiva. A distribuição delas consistiria numa imagem inversa da curva de Kimura, mas reduzida em alcance e escala,
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por um fator em algum lugar entre dez mil e um milhão. Devido à escala desse diagrama, não posso desenhar essa parte da mutação distribuição por ser muito pequena, de modo que, em vez disso, é mostrado um triângulo relativamente grande. Mesmo com mutações benéficas extremamente exageradas, torna-se óbvio que essencialmente todas as mutações benéficas cairão dentro da “zona de não seleção” de Kimura. Esse quadro completo, que está correto, torna a evolução progressiva em nível genômico virtualmente impossível.
CAPÍTULO 2 - AS MUTAÇÕES GENÉTICAS SÃO BOAS?
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capítulo 3
Quanta mutação é ‘muita’? Fato rápido: as taxas de mutação humana são muito altas.
Durante muitas décadas, os geneticistas têm se preocupado com a mutação na população humana (Muller, 1950; Crow, 1997). Quando essas preocupações surgiram pela primeira vez, elas estavam baseadas numa taxa estimada de mutação deletéria de 0,12 a 0,30 mutações por pessoa por geração (Morton, Crow e Muller, 1956). Desde essa época, persistem sérias preocupações com o acúmulo de mutações nos seres humanos, levando a uma alta “carga genética” e a uma população em degeneração. Também tem havido uma crença de longa data de que se a taxa de mutações deletérias se aproximar de uma mutação deletéria por pessoa por geração, a deterioração genética a longo prazo seria uma certeza (Muller, 1950). Isso seria lógico, uma vez que a seleção deve eliminar as mutações tão rapidamente quanto estão ocorrendo. Precisamos evitar a reprodução de indivíduos mutantes, mas também deixar o suficiente para procriar e produzir a próxima geração. Por esse pensamento,
mutações deletérias no homem devem ser mantidas abaixo de uma mutação por cada três filhos se a seleção deve eliminar todas as mutações e ainda permitir que a população reproduza. Isso ocorre porque as taxas de fertilidade global são agora menores que três crianças para cada dois adultos, de modo que apenas uma criança em três poderia teoricamente ser eliminada seletivamente. Para essas razões, os geneticistas têm estado naturalmente muito ansiosos para descobrir qual é a real taxa de mutação humana. Uma das descobertas mais surpreendentes no mundo da genética é de que a taxa de mutação humana (apenas dentro de nossas células) está na variação de 75-175 substituições nucleotídeas (erros ortográficos) por pessoa a cada geração (Nachman e Crowell, 2000; Kondrashov, 2002; Xue et al., 2009; Lynch, 2010; Campbell e Eichler, 2013). Esses números elevados são agora amplamente aceitos dentro comunidade da genética. Além disso, o Dr. Kondrashov, autor da publicação definitiva atual, indicou-me que 100 era apenas a sua estimativa mais baixa. Ele acredita que a taxa real de mutações pontuais (erros de ortografia) por pessoa pode chegar a 300 (comunicação pessoal). Mesmo a estimativa mais baixa, 75, é um número incrível, com profundas implicações. Quando um estudo anterior revelou que a taxa de mutação humana poderia ser 30, o autor altamente reconhecido desse estudo concluiu que tal número teria profundas implicações para a teoria da evolução (Neel et al., 1986). Mesmo que assumamos que uma fração muito significativa do genoma seja lixo neutro perfeito, isso ainda significaria que muitas novas mutações deletérias estão ocorrendo por pessoa a cada geração. Então cada um de nós é um mutante, muitas vezes! Que tipo de esquema de seleção poderia eventualmente parar esse tipo de perda de informação? Como veremos, dados esses números, não há um método realista para interromper a degeneração genômica. Uma vez que a porção do genoma que é verdadeiramente funcional está aumentando rapidamente, o número de mutações reconhecidas como sendo realmente deletérias também está aumentando rapidamente. Se o genoma provar ser maioritariamente ou inteiramente funcional, então cada uma dessas 75-100 mutações por pessoa é realmente prejudicial. Porque as estimativas de taxa de mutação têm grandes margens de erro, para o restante
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deste livro eu apenas usarei 100 como uma estimativa conservadora da taxa de mutação humana. Contudo, este número é muito conservador, porque ele considera apenas mutações pontuais (substituições de letra). Este número não inclui os muitos outros tipos de mutações comuns, incluindo mutações repetidas em tandem, deleções, inserções, duplicações, translocações, inversões, conversões e mutações mitocondriais. Para avaliar a extensão dessa subestimação do problema da mutação, devemos primeiro considerar os tipos de mutação que estão fora das contagens de mutações pontuais normais. Então precisamos considerar que porção do genoma inteiro é verdadeiramente funcional. Dentro de cada célula estão subestruturas chamadas mitocôndrias, que têm seu próprio pequeno genoma interno (cerca de 16.500 nucleotídeos), que é herdado apenas através da mãe. No entanto, porque o genoma mitocondrial é altamente poliploide (centenas de cópias por célula), e porque a taxa de mutação mitocondrial é extremamente elevada, ainda existe um grande número de mutações que devem ser eliminadas a cada geração para interromper a degeneração. A taxa de mutação mitocondrial humana é estimada em cerca de 2,5 mutações por local de nucleotídeo a cada milhão de anos (Parsons et al., 1997). Assumindo um tempo de geração de 25 anos e um tamanho do genoma mitocondrial de 16.500, isso se aproxima de uma mutação mitocondrial por pessoa a cada geração dentro da linha celular reprodutora. Mutações mitocondriais, apenas por si só, podem colocar-nos no limite teórico da eliminação seletiva. Mesmo que a taxa de mutação seja apenas de 0,1 por pessoa, uma parcela muito significativa (10%) da população humana, a cada geração, apenas para deter a degeneração genética mitocondrial. No entanto, isso ainda permite que as 100-300 mutações nucleares por pessoa por geração se acumular de maneira inabalável. As altas taxas de mutação mitocondrial são problemáticas em termos de seleção (Capítulos 4 e 5), devido a uma falta de recombinação (“Catraca de Muller”; Muller, 1964), e um efetivo tamanho menor da população (somente as mulheres passam esse DNA, de modo que a seleção só pode ser aplicada a metade da população). As regiões de mutação mais rápida do genoma humano estão dentro das
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regiões muito dinâmicas do DNA microssatélite. Essas regiões singulares desenvolvem mutações a taxas quase um milhão de vezes acima do normal, e não estão incluídas nas estimativas normais de taxa de mutação. Mas essas sequências têm um impacto biológico, e suas mutações resultam em muitas doenças genéticas graves (Sutherland, Richards, 1995). Estima-se que para cada ponto de mutação “regular”, provavelmente há pelo menos uma mutação microssatélite (Ellegren, 2000). Isso poderia duplicar o número de mutações por pessoa a cada geração de 100 para 200. Além de mutações pontuais nucleares, mutações mitocondriais e mutações microssatélite, há uma grande variedade de mutações cromossômicas mais severas geralmente chamadas de “macromutações”. Estas incluem eliminações e inserções. De acordo com Kondrashov (2002), tais mutações, quando combinadas, acrescentam quatro macromutações por cada 100 mutações pontuais. Essa estimativa aparece considerar apenas a menor das macromutações, e exclui as inserções/eliminações que afetam regiões maiores de DNA. Apesar de poder haver relativamente poucas mutações (um A S R E G I Õ E S D E M U TA Ç Ã O mínimo de 4 por pessoa a cada MAIS RÁPIDA DO GENOMA geração), essas mutações “imH U M A N O E S TÃ O D E N T R O portantes” irão inquestionavelDAS REGIÕES MUITO mente causar muito mais dano DINÂMICAS DO DNA genômico, e assim demandaria maior prioridade se estivesse M I C R O S S AT É L I T E sendo concebido um esquema de seleção para degeneração genômica. As macromutações podem afetar nucleotídeos – de um a um milhão – mesmo que possamos acidentalmente excluir uma letra, uma palavra ou mesmo um capítulo inteiro deste livro. Acredita-se que essas relativamente pequenas macromutações causem dez vezes mais divergência de sequência do que todas as mutações pontuais combinadas (Britten, 2002; Anzai, 2003). Isso aumenta o número de mutações entre 204-212 mutações por pessoa a cada geração. Mas se nos basearmos no fato de que as macromutações podem alterar três a dez vezes mais nucleotídeos
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do que todas as mutações pontuais combinadas, nosso registro final de alterações de nucleotídeos por pessoa é muito alta. Esses números são alucinantes! No entanto, mesmo esses números ainda podem ser muito baixos. Ainda não consideramos inversões e translocações. Além disso, os teóricos da evolução estão invocando taxas elevadas de conversão intergênica, o que novamente poderia dobrar esses números. Vamos lembrar que no início deste capítulo, onde nós aprendemos que o conhecido geneticista Muller considerou que uma taxa de mutação humana de 0,5 por pessoa ou mais alto sentenciara a humanidade a uma rápida degeneração genética. Embora não conheçamos a taxa de mutação humana precisa, existem evidências de que há muito mais de 1.000 alterações de nucleotídeos em cada pessoa a cada geração (veja a Tabela 1). De todas essas mutações, que percentagem é verdadeiramente neutra? Nos últimos anos tem havido uma mudança dramática na funcionalidade percebida da maioria dos componentes do genoma. O conceito “DNA lixo” está desaparecendo rapidamente (Slack, 2006). Na verdade, é o “lixo“ (DNA que não codifica proteínas) que parece ser a chave para codificar a complexidade biológica (Taft, Mattick, 2003). O estudo desenvolvido por Taft e Mattick sugere fortemente que quanto mais “lixo” um organismo possui, mais avançado é o organismo. Então, as mutações dentro do DNA “lixo” dificilmente podem ser consideradas neutras. Em 2005 já estava estabelecido que mais de 50% do genoma humano é transcrito em RNA (Johnson et al., 2005). Pelo menos metade desse DNA parece ser transcrito em ambas as direções (Yelin et al., 2003). Portanto, todo esse DNA não é apenas funcional, mas grande parte dele é duplamente funcional. Embora apenas uma pequena fração do genoma codifique diretamente para proteínas, cada sequência codificadora de proteínas está dentro de outras sequências funcionais que regulam a expressão de tais proteínas. Isso inclui promotores, intensificadores, íntrons, sequências líderes, sequências finais e sequências que afetam a dobra regional e a arquitetura do DNA. Não creio que qualquer biólogo sério atualmente considere os íntrons (que compreendem a maior parte de uma típica região gênica) como “lixo” verdadeira-
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mente neutro. De fato, muitas das sequências mais fortemente conservadas (essenciais e invariantes) conhecidas são encontradas dentro de íntrons (Bejerano et al., 2004). Enquanto uma típica sequência de codificação de proteínas típica pode ter apenas 3 mil nucleotídeos de comprimento ou menos, o gene típico que controla a expressão dessa proteína pode estar na gama de 50 mil nucleotídeos de comprimento. Uma vez que existem mais de 20.000 genes codificadores de proteínas (as estimativas variam muito), se incluirmos todos os seus nucleotídeos associados (50 mil por gene), os verdadeiros genes completos poderiam facilmente representar mais de 1,5 bilhão de nucleotídeos. Isso equivale à metade do genoma. Além disso, uma nova classe de genes foi descoberta que não codificam proteínas, mas codificam RNAs funcionais. Esses genes escaparam ao reconhecimento em pesquisas de computador por sequências de codificação de proteínas, e, portanto, têm sido ignorados como genes verdadeiros. Mas eles são genes verdadeiros, e provavelmente constituem uma grande parte do genoma (Mattick, 2001; Dennis, 2002; Storz, 2002). Eles estão sendo descobertos dentro de regiões de DNA que anteriormente eram descartadas como lixo. Além disso, dois estudos independentes mostraram uma extensa sequência de funcionalidade dentro das grandes regiões entre genes (Koop, Hood, 1994; Shabalina et al., 2001). Essas regiões também eram anteriormente consideradas como lixo. Pseudogenes, antes considerados genes duplicados mortos, recentemente demonstraram ser funcionais (Hirotsune et al., 2003; Lee, 2003). Os pseudogenes parecem ter sido projetados para tornar reguladoras as moléculas de ARN (ver Chen et al., 2004), em vez das proteínas, de modo que não são “fósseis mortos”. Como discutirei em mais detalhes, parece que existem diversas funções celulares para os muitos “genes egoístas”, às vezes chamados de “sequências de DNA parasitas” (também denominados “elementos transponíveis”). Esses elementos parecem ter funções múltiplas e extremamente importantes dentro da célula, incluindo o controle do cromossomo (Hakimi et al., 2002) e reparo do DNA (Morrish et al., 2002). O DNA repetitivo, incluindo o DNA satélite, durante muito tempo considerado “lixo”, mostrou-se ser essencial para a função do genoma, e compreendem estruturas genômicas essenciais tais como centrômeros e telômeros (Shapiro
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e Sternberg, 2005). Por último, existem padrões estruturais fundamentais do genoma, que permeiam virtualmente todas as porções do genoma, tais como isocoros (áreas ricas em GC; Vinogradov, 2003), padrões de “palavra” que cobrem todo o genoma (Karlin, 1998) e locais de ligação de nucleossomo (Tachida, 1990; Segal et al., 2006). Esses padrões que cobrem o genoma parecem cruciais à função da célula, e sugerem funcionalidade em todo o genoma. Por exemplo, a ligação a nucleossomo (crucial para a estrutura cromossômica e regulação genética) parece ser especificada por padrões de dinucleotídeo que se repetem a cada 10 nucleotídeos (Sandman et al., 2000). Assim, um quinto do genoma pode ser funcional e essencial apenas para a finalidade de especificar locais de ligação de nucleossomo (Tachida, 1990). É cada vez mais evidente que a maior parte ou todo o genoma é funcional. Portanto, a maioria ou todas as mutações no genoma devem ser deletérias. O número de 100 mutações por pessoa representa uma perda de apenas uma fração minúscula da informação total em nosso vasto genoma. Contudo, o impacto real de uma taxa de mutação tão elevada será o nível da população, e é expressa principalmente com a passagem de tempo. Como existem mais de 7 bilhões de pessoas no mundo, e cada pessoa adicionou uma média de 100 novas mutações à população global, nossa geração por si só acrescentou cerca de 700 bilhões de novas mutações para a raça humana. Se nos lembrarmos de que há apenas três bilhões de posições nucleotídicas no genoma humano, veremos que em nossa vida houve cerca de 200 mutações para cada posição de nucleotídeo dentro do genoma. Portanto, cada possível mutação pontual que poderia acontecer ao genoma aconteceu muitas vezes apenas durante a nossa vida. Por causa do tamanho atual da população, a humanidade está sendo inundada agora por mutações como nunca antes na história. As consequências da maioria dessas mutações não são sentidas imediatamente, mas vai se manifestar nas próximas gerações. Como veremos, não existe um esquema de seleção que possa reverter o dano que tem sido feito durante nossa própria geração, mesmo que outras mutações possam ser interrompidas. Nenhuma quantidade de seleção pode impedir que um número significativo dessas mutações se aprofunde
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mais na população e, consequentemente, causar danos genéticos permanentes. No entanto, a geração de nossos filhos acrescentará ainda mais mutações novas, seguido por inúmeras outras. Esse processo degenerativo continuará no futuro previsível. Estamos em um escorregador descendente que não pode ser interrompido. Quando a seleção é incapaz de conter a perda de informação devido às mutações, surge uma situação chamada “catástrofe de erro”. Se não for rapidamente corrigida, essa situação leva à eventual morte das espécies – extinção! Em seus estágios finais, a degeneração genômica conduz à diminuição da fertilidade, o que restringe a seleção adicional (a seleção sempre requer um excedente populacional, alguns dos quais podem ser eliminados a cada geração). A endogamia e a deriva genética assumem o controle rapidamente, acabando rapidamente com a população. O processo é uma espiral descendente irreversível. Esse estágio avançado de degeneração genômica é chamada de “colapso mutacional” (Bernardes, 1996). O colapso mutacional é reconhecida como uma ameaça a todas as espécies em perigo de hoje. O mesmo processo parece potencialmente uma ameaça teórica para a humanidade. O que pode pará-lo?
atualização de 2008
Em junho de 2007, um grande consórcio internacional de cientistas especialistas no genoma (sob o nome ENCODE) publicou suas descobertas em um conjunto de 29 artigos acadêmicos. Essas descobertas surpreenderam a comunidade genética (Kapranov et al., 2007). Eles mostram que o genoma humano é muito mais complexo do que esperado, e que essencialmente todo o genoma é transcrito – a maioria deles em ambas as direções. Eles concluem que a maioria dos nucleotídeos não são apenas funcionais, mas polifuncionais, com múltiplos papéis. Isso significa que a funcionalidade do genoma excede 100% (a maioria das duas vertentes do DNA são funcionais). À luz disso, neCAPÍTULO 3 - QUANTA MUTAÇÃO É ‘MUITA’?
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nhuma mutação deve ser considerada “perfeitamente neutras”, e essencialmente todas as mutações devem ser consideradas deletérias. Isso significa que a taxa real de mutação deletéria no homem é nada menos que impressionante – bem mais de 100 mutações por pessoa a cada geração. Isso é mais do que duas ordens de magnitude do que era anteriormente considerada possível. Desde a edição de 2008 deste livro, Xue et al. (2009) e Lynch (2010) confirmaram que a taxa de mutação humana é extremamente alta – em média, 100 novas mutações por pessoa a cada geração. Lynch argumenta que quase todo o genoma humano é “DNA lixo”, de modo que quase todas as mutações são inofensivas. No entanto, Lynch conclui que o problema da acumulação de mutações no homem é grave (veja o Apêndice 1).
atualização de 2014
A análise mais recente e completa da taxa de mutação da linha germinal humana é encontrada numa publicação recente de Campbell e Eichler (2013). A tabela 1 desse artigo resume os achados de numerosos estudos envolvendo taxas de mutação humana. Algumas das estimativas nessa tabela envolveram apenas uma única família, e por isso não são muito confiáveis. Usando os seis estudos mais amplos que envolveram pelo menos 20 famílias, a taxa média de mutação pontual foi de 1,56 x 10-8 por nucleotídeo, por gameta, a cada geração. Isso se traduz em 93,6 mutações por nascimento. No entanto, os autores afirmam que esse é apenas um limite inferior. Eles acrescentam que esses estudos excluíram as porções mais mutáveis do genoma. Os autores afirmam: “[...] é importante notar que todos esses estudos envolvem filtragem substancial de variantes para remover positivos falsos e muitas vezes excluem regiões altamente repetitivas do genoma. [...] Estudos de sequenciação direcionada
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de exomas ou outras regiões relataram taxas de mutação mais elevadas. [...]” Além disso, a maioria das mutações de nucleotídeos mutacionais não são devidas às mutações pontuais (veja abaixo). Portanto, 100 mutações por pessoa a cada geração permanece uma estimativa bastante conservadora da taxa de mutação humana. E quanto aos outros tipos de mutação? Os mesmos autores apontam que além das mutações pontuais, existem muitos tipos de rompimentos mutacionais maiores do genoma. Estes incluem mutações de microssatélites, mutações nas repetições centroméricas, inserção e eliminação centroméricas (indels) e mutações de variantes de número de cópias (CNVs). Eles não mencionam mutações mitocondriais, inversões, translocações ou conversões. Os autores desta última revisão confirmam que as macromutações são de longe a maior fonte de divergência e degeneração genômica. Por exemplo, eles mostram que as mutações CNV sozinhas representam 16.000 a 50.000 bases por mudanças por nascimento. Da mesma forma, mostram que as taxas de inserções e eliminações (indels) são maiores do que se pensava anteriormente. Considerando que anteriormente pensava-se que os indels eram apenas 6% tão frequentes quanto as mutações pontuais, estimativas mais recentes sugerem que esse número deve ser próximo de 10% ou mesmo 20%, e que esse número aumentará à medida que os métodos de sequência forem aperfeiçoados. Portanto, pode haver 20 novos indels por nascimento. Como os indels envolvem múltiplos nucleotídeos por evento, e podem envolver milhares ou mesmo milhões de nucleotídeos por evento, pode-se esperar que os indels mudem milhares de nucleotídeos por pessoa a cada geração. Wells (2013) revisou exaustivamente a literatura recente, que mostra que a maior parte do genoma é funcional, o que significa que mutações deletérias no homem devem ser no mínimo de 100 por pessoa a cada geração. Isso é fortemente apoiado pelo extenso relatório final do projeto Encode (The ENCODE Project Consortium, 2012). Existem muitos tipos de mutações, e cada um age como fontes de mudança genética. Infelizmente, cada classe de mutação resulta em uma perda líquida de informação. A mutação mitocondrial é a menos significativa fonte
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de mutação humana. Produz menos de uma nova mutação por pessoa. No entanto, mesmo uma fração de uma mutação mitocondrial por pessoa levou um evolucionista a comentar: “Devemos aumentar nossa atenção à questão mais ampla de como (ou se) os organismos podem tolerar, no sentido da evolução, um sistema genético com tal elevada carga mutacional” (Howell et al., 1996). Agora, considere todos os tipos de mutação combinados!
Tabela 1. Muitos tipos de mutações – resultando em uma taxa, notavelmente, alta de mutação humana.
As estimativas da taxa de mutação mitocondrial variam, mas podem aproximar-se de 0,5 por pessoa (Parsons et al., 1997; Carter, R., 2007). b Kondroshov (2002), Xue (2009), Lynch (2010), Campbell e Eichler (2013). c As estimativas normais de substituições de nucleotídeos não incluem pontos mutacionais como microssatélites. Taxas de mutação de microssatélites foram estimadas como aproximadamente iguais às taxas de mutações pontuais. a
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Kondrashov (2002) estimou que uma combinação entre eliminações e inserções ocorre numa taxa combinada de cerca de 4-12% das mutações pontuais, ou cerca de 2-6% cada. No entanto, ele parecia limitar sua estimativa apenas a eliminações, de modo que o número real pode ser maior. Campbell e Eichler (2013) sugerem que os indels podem ser 3 vezes mais frequentes do que a estimativa de Kondrashov. Porque as deleções e inserções podem ser muito grandes, acredita-se que o seu efeito total é 3-10 vezes maior do que todas as mutações pontuais combinadas em termos de nucleotídeos totais alterados. f A taxa real de rearranjos cromossômicos é desconhecida. Premissas evolutivas sobre a recente divergência entre o chimpanzé e o homem requerem altas taxas de tais mudanças. Essas mudanças podem afetar o DNA, e, desta forma, para que o cenário evolutivo atue, muitos milhares de nucleotídeos, em média, devem se mover dessa forma a cada geração. g A taxa real de conversão é desconhecida, mas as premissas evolutivas exigem taxas extremamente elevadas de conversão de genes entre diferentes loci – muitos milhares por pessoa a cada geração. h O número total de mutações só pode ser estimado de forma muito grosseira, mas deve estar bastante claro que o número de todos os tipos de novas mutações, incluindo conversões, deve ser mais de 1.000 por pessoa. Essas mutações, que incluem muitas macromutações, devem mudar claramente muitos milhares de nucleotídeos por pessoa a cada geração. d,e
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capítulo 4
A todo-poderosa seleção ao resgate? Fato rápido: as habilidades da seleção são bastante limitadas
O consenso entre os especialistas em genética humana é de que, atualmente, a raça humana está geneticamente se degenerando devido ao rápido acúmulo de mutações e à pressão da seleção natural relaxada (Crow, 1997; Lynch, 2010). Esses geneticistas percebem que atualmente há uma acumulação líquida de mutações na população e que isso está ocorrendo de forma muito maior do que se pensava anteriormente. Os geneticistas concordam amplamente que essas mutações são essencialmente neutras ou prejudiciais (se houver benéficos, eles são considerados tão raros a ponto de serem totalmente excluídos da consideração). Consequentemente, eles percebem que a informação genética está atualmente sendo perdida, o que deve eventual-
mente resultar em redução da aptidão para nossa espécie. Acredita-se que esse declínio na aptidão está ocorrendo em 1-2% por geração (Crow, 1997) (ver Figura 4) e pode ser tão alto quanto 5% (Lynch, 2010). Tudo isso está acontecendo no nível genético, embora os avanços médicos e técnicos estejam aumentando nosso período de vida média no nível social. Assim, os geneticistas provavelmente concordariam que a seleção deve eventualmente ser aumentada se quisermos interromper a degeneração genética. No entanto, não há essencialmente nenhuma declaração pública para esse efeito – imagine as profundas consequências políticas de tais declarações. Esse reconhecido problema levanta uma questão interessante: Quanta seleção seria necessária para interromper completamente a degeneração genética? Ou talvez a pergunta realmente deveria ser esta: Tal degeneração pode ser interrompida? Para muitas pessoas, incluindo muitos biólogos, a seleção atua como uma varinha mágica. Parece não haver limites para o que ela pode realizar. Essa perspectiva extremamente ingênua quanto à seleção natural é bastante difundida. Mesmo como geneticista de plantas, eu tinha uma concepção irrealista de como a seleção realmente opera na natureza, e tinha uma ideia muito ingênua sobre como a seleção poderia trabalhar no nível de todo o genoma. Em geral, os únicos cientistas que analisam seriamente o que a seleção é capaz de fazer no nível genômico são os especialistas em genética populacional (um grupo muito pequeno e especializado). A genética populacional é um campo extremamente teórico e matemático. Os matemáticos teóricos são completamente compelidos por seus axiomas (premissas), sobre as quais eles constroem seu trabalho. Todo o campo da genética populacional foi desenvolvido por um grupo pequeno e unido de pessoas que se comprometeram completa e radicalmente com o Axioma Primário. Hoje, esse ainda é um campo muito pequeno, ainda povoado exclusivamente por “verdadeiros crentes” no Axioma Primário. Essas pessoas são extremamente capazes, mas estão total e incondicionalmente vinculadas com o Axioma Primário. Em geral, outros biólogos nem sequer compreendem o trabalho deles, e aceitam suas conclusões por “fé”. No entanto, são os próprios especialistas em genética de populações que
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têm exposto algumas das limitações mais profundas da seleção natural (veja Apêndice 1). Pelo fato de que a seleção natural não é uma varinha mágica, mas é um fenômeno muito real, ela tem capacidades muito reais e limitações muito reais. Ela não é todo-poderosa.
O problema mais básico
A P R I N C E S A E O PA R A D O X O N U C L E O T Í D I C O
A seleção natural possui um problema fundamental. Ele envolve o gigantesco abismo que existe entre a mudança genotípica (uma mutação molecular) e a seleção fenotípica (no nível do organismo inteiro). É preciso haver uma seleção de bilhões de diferenças genéticas quase infinitamente sutis e complexas no nível molecular. Mas isso só pode ser feito controlando a reprodução ao nível de todo o organismo. Quando a natureza seleciona a favor ou contra um indivíduo dentro de uma população, ela tem que aceitar ou A RAÇA HUMANA rejeitar um conjunto completo de E S TÁ G E N E T I C A M E N T E 6 bilhões de nucleotídeos – tudo de uma só vez! É pegar todas as letras SE DEGENERANDO em todo o livro, ou não levar nenhuma. Na verdade, a natureza (seleção natural) nunca vê os nucleotídeos individuais. Ela vê o organismo como um todo. Ela nunca tem o luxo de ver, ou selecionar qualquer nucleotídeo particular. Começamos a ver que é exigido um grande salto de fé para crer que ao selecionar ou rejeitar um organismo como um todo, a natureza pode controlar com precisão o destino de bilhões de erros ortográficos individuais dentro de uma população. O problema da mudança genotípica versus seleção fenotípica é muito parecido com o problema da história infantil “A princesa e a ervilha”. O caráter real da princesa é descoberto pelo fato de que ela não consegue dormir porque, mesmo através de 13 colchões, ela sente uma ervilha debaixo de sua cama. As crianças são entretidas por essa história porque é muito boba. Sendo
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ou não da realeza, ninguém consegue sentir uma ervilha através de 13 colchões! Mas o problema genético é uma situação muito mais difícil. Nossa princesa (a seleção natural) basicamente precisa ler extensos livros escritos em braile através de um conjunto de colchões, a fim de identificar com precisão os livros que possuem menos erros neles. É um grande conto de fadas, mas quem acreditaria que esse é o processo subjacente que explica a vida? Todo esse problema pode ser chamado de “A princesa e o paradoxo nucleotídico”, ilustrado na Figura 5. Para ser justo, existem algumas mutações que têm um efeito muito maior que uma única letra de braile, em nosso exemplo. Algumas mutações raras têm profundos efeitos biológicos, agindo mais como uma bola de boliche sob o colchão. A seleção natural contra esses tipos de mutações é evidente. Mas as mutações da bola de boliche (semiletal) são extremamente raras, e tais nucleotídeos carregam apenas uma minúscula quantidade de informação total no genoma. A maioria da informação no genoma é transportada por nucleotídeos cujos efeitos são realmente muito mais sutis do que o braile. É a origem e a manutenção de todos aqueles nucleotídeos que estamos tentando entender. A essência desse paradoxo é que a Mãe Natureza (seleção natural) tem de escrever o livro da vida e continuamente revisar o livro, sem jamais ver quaisquer de suas letras. Em termos mais técnicos – a seleção é baseada no fenótipo, não no genótipo. O abismo entre moléculas e todo o organismo é profundo. Parte dessa diferença envolve o tamanho. Se formássemos um nucleotídeo do tamanho de uma ervilha, uma princesa tamanho proporcional teria mais de 15 quilômetros de altura. Além disso, entre um nucleotídeo e um organismo individual há muitos diferentes níveis de organização. Por exemplo, um único nucleotídeo pode afetar a transcrição específica de um gene, que pode então afetar o processamento de mRNA, que pode efetuar a abundância de uma dada enzima, que pode então afetar determinada via metabólica, o que pode afetar a divisão de uma célula, que pode então afetar um determinado tecido, que pode afetar todo o organismo, o que pode afetar a probabilidade de reprodução, que pode afetar a possibilidade de que essa mutação seja passada para a pró-
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xima geração. Grandes quantidades de incerteza e diluição são adicionadas a cada nível organizacional, resultando em aumento maciço de “ruído” e perda de resolução. Deve haver uma correlação extremamente pequena entre qualquer nucleotídeo (uma única molécula) e a probabilidade de um organismo inteiro ter sucesso reprodutivo. O nucleotídeo e o organismo são literalmente mundos separados. Nossa princesa (a seleção natural no nível de todo o organismo) tem de perceber diferenças que estão apenas acima do nível atômico. Geralmente, não vemos pixels individuais em nossa televisão. Por isso, imagine a dificuldade de tentar selecionar um televisor específico na loja tentando avaliar a qualidade de cada pixel separado, a olho nu, em todos os vários televisores disponíveis. Mas é muito pior do que isso. Num sistema biológico, estamos falando de pixels dentro de pixels dentro de pixels dentro de pixels. Estamos falando de uma longa cadeia de eventos que separa o efeito direto de um dado nucleotídeo e consequências muito remotas ao nível de todo o organismo. Há uma diluição logarítmica em cada passo. Em cada nível existe uma perda de resolução e correspondência na ordem de magnitude. É como medir o impacto do bater de asas de uma borboleta num sistema de furacões a quilômetros de distância. Assemelha-se um pouco a tentar selecionar um soldado com base no desempenho de seu exército. Toda essa imagem é completamente despropositada! No entanto, essa é a essência do Axioma Primário. Ele vê um genoma humano (6 bilhões de nucleotídeos) e imagina que cada unidade é selecionada (ou não) individualmente, meramente com base numa quantidade limitada de peneiramento reprodutivo ao nível de todo o organismo. Como veremos, isso é impossível. Para compreender melhor a natureza da “Princesa e o paradoxo nucleotídico”, vamos imaginar um novo método de melhorar os livros didáticos. Comece com um livro de química do ensino médio e considere que é equivalente a um genoma bacteriano simples. Vamos agora começar a introduzir erros ortográficos aleatórios, duplicações e eliminações. Cada aluno, em todo o país, receberá um livro-texto ligeiramente diferente, contendo seu próprio conjunto de erros aleatórios (aproximadamente 100 erros novos por texto). No final do ano, vamos testar todos os alunos, e só guardaremos os livros dos alunos
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com as cem melhores pontuações. Esses textos serão utilizados para a próxima rodada de cópia, que irá introduzir novos “erros”, e assim por diante. Podemos esperar ver uma melhoria contínua dos livros didáticos? Por que não? Esperamos ver uma melhoria contínua das notas médias dos alunos? Por que não? A maioria de nós percebe que, no exemplo acima, essencialmente nenhum dos erros de ortografia no livro-texto será benéfico. Mais importante, não haverá correlação significativa entre as diferenças sutis nos livros escolares e a nota de um aluno. Por que não? Porque cada livro é igualmente falho, e as diferenças entre os textos são sutis demais para serem significativas à luz de todo o resto. O que quero dizer com “todo o resto”? Quero dizer que a nota de um aluno será determinada por muitas outras variáveis, incluindo diferentes habilidades pessoais e situações pessoais (professores, salas de aula, colegas, motivação, vida familiar, vida romântica, falta de sono, “má sorte” etc.). Todos esses outros fatores (que chamarei de ruídos) substituirão o efeito de umas poucas falhas ortográficas no livro. Se o aluno obtiver uma nota alta no teste, não é porque seu texto tivesse um pouco menos de erros, mas principalmente por todas as outras razões diversas. O que acontecerá se esse ciclo de mutação/seleção continuar? Os textos, obviamente, se corromperão ao longo do tempo, e as pontuações médias dos alunos acabarão também por diminuir. Contudo, esse absurdo sistema de mutação/seleção é uma aproximação muito razoável do Axioma Primário da biologia. Obviamente, não conseguirá melhorar ou mesmo manter as notas por inúmeras razões. A razão mais fundamental pela qual esse tipo de seleção falha é a relação incrivelmente fraca entre as letras individuais do texto e o desempenho do aluno. A correlação será basicamente zero. Portanto, esta é uma excelente ilustração da “Princesa e o paradoxo nucleotídico”. Se esse cenário parece absurdo para você, tente entender mais uma coisa: o Axioma Primário afirma que esse mesmo sistema de mutação/seleção é realmente o que escreveu todo o livro de química em primeiro lugar. Não houve qualquer agente inteligente atuando como autor ou mesmo como editor. O problema da “Princesa e o paradoxo nucleotídico” torna-se ainda maior quando entendemos o fenômeno da homeostase. A homeostase é o fenôme-
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no natural em que todos os seres vivos se autorregulam à medida que as circunstâncias mudam. Um bom exemplo seria animais de sangue quente em um clima frio. A homeostase resulta de uma rede extremamente complexa de sensores e reguladores dentro de cada célula. Embora seja demasiado complexa para explicar aqui, é universalmente aceito que ela é tanto operacional como altamente eficaz em todos os sistemas de vida. O fenômeno da homeostase pode ser comparado a um colchão autoajustável. Se uma bola de tênis é colocada sob esse colchão, ele se ajustará automaticamente mediante inúmeros mecanismos mecânicos complexos para nivelar efetivamente a superfície de dormir. Mas na biologia real, é assemelha-se mais a 13 colchões autoajustáveis, um em cima do outro (a homeostase opera em todos os níveis da organização biológica). Isso torna as coisas muito mais difíceis para nossa princesa, que precisa sentir a ervilha (isto, é o braile) através dos colchões. Quando os princípios genéticos de Gregor Mendel foram “redescobertos”, quase 50 anos depois de Darwin, os geneticistas perceberam que deve haver um grande número de unidades hereditárias segregando dentro de uma população. Eles também logo perceberam que tinham um problema se o número das unidades hereditárias fosse muito grande. Embora não falassem dele como tal, era essencialmente o que estou chamando de “A princesa e o paradoxo nucleotídico”. Os primeiros especialistas em genética populacional, que eram todos darwinistas comprometidos filosoficamente, perceberam que tinham que conceber uma maneira de superar “A Princesa e o paradoxo nucleotídico” a fim que a teoria darwiniana se parecesse geneticamente viável1. Assim, muito habilmente, eles transferiram a unidade de seleção do organismo como um todo à unidade genética (isto é, o gene ou nucleotídeo). Para tanto, eles tiveram de redefinir uma população como sendo nada mais do que um “pool (estoque) genético”. Desta forma, eles poderiam operar ao nível do nucleotídeo dentro do pool genético, e não realmente no indivíduo.
1. “Haldane [...] pretendia, [...] assim como Fisher [...] e Wright [...] dissipar a crença de que o mendelismo matou o darwinismo. [...] Fisher, Haldane e Wright, então, sintetizaram quantitativamente a herança mendeliana e a seleção natural na ciência da genética populacional” (Provine, 1971).
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Cada nucleotídeo pode ser visualizado como sendo independentemente selecionado para, ou contra, ou nenhum dos dois. Isso tornou muito fácil imaginar quase qualquer cenário de seleção evolutiva, não importa quão complexa seja a situação biológica. E isso removeu efetivamente os colchões sob a princesa, como se ela pudesse de repente sentir cada ervilha, e pudesse até mesmo ler cada letra de braile diretamente. Essa foi uma maneira incrivelmente eficaz para ofuscar todo o problema. De fato, o darwinismo teria morrido muito naturalmente neste momento, se não fosse essa importante criação intelectual (Provine, 1971). Há um sério problema com a redefinição do problema desta maneira – a nova imagem é categoricamente falsa. As populações não são, mesmo remotamente, semelhantes a um pool genético, e a seleção nunca se refere a nucleotídeos individuais. Para justificar esse novo quadro radical da vida, os teóricos tiveram de assumir axiomaticamente diversos conceitos que reconhecidos como claramente falsos. Por exemplo, eles tinham que assumir que todas as unidades genéticas poderiam ser classificadas de forma independente para que cada nucleotídeo fosse herdado independentemente, como se não existissem blocos de ligação genética (totalmente falsos). Da mesma forma, eles tiveram que assumir a ausência de epistasia, como se não houvesse interações entre nucleotídeos (totalmente falso). Eles também assumiram tamanhos de população basicamente infinitos (obviamente falso). Geralmente eles assumiam de maneira implícita tempo ilimitado para a seleção (obviamente falso). Finalmente, eles geralmente assumiam a capacidade de selecionar números ilimitados de traços simultaneamente (o que mostraremos ser falso). Desde o início da teoria genética populacional, muitas suposições não realistas e não razoáveis foram necessárias para tornar o modelo sequer viável. Sobre esse fundamento equivocado foram construídos os pilares teóricos da moderna genética populacional. Os modelos não combinavam com a realidade biológica, mas esses acadêmicos tinham uma incrível aura de autoridade intelectual, seus argumentos eram muito abstratos, e eles usavam formulações altamente matemáticas que poderiam efetivamente intimidar a maioria dos biólogos. Além disso, a maioria dos biólogos também eram darwinistas co-
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metidos e, assim, estavam em acordo filosófico com os geneticistas. Eles foram mais do que satisfeitos com os rumos, mesmo que a história não fizesse muito sentido. Na verdade, os primeiros especialistas em genética de populações rapidamente se tornaram os idolatrados “queridinhos da ciência”. Lembro-me de minhas aulas de biologia populacional, e minha própria aquiescência ingênua e humilde em aceitar a redefinição muito natural de vida como “pool genético”. Lembro-me de não entender completamente, mas presumia que o problema estivesse apenas comigo (embora todos os outros alunos da minha turma parecessem ter o mesmo problema). Visto que eu sabia que a evolução era verdadeira, não importava realmente se eu não fosse suficientemente inteligente para de fato assimilar a ideia de vida como pools de nucleotídeos. Se os gurus da genética populacional estavam dizendo que isso era verdadeiro, quem era eu para discutir? Mesmo que suas premissas fossem falsas (tais como sortimento independente de nucleotídeos), as conclusões deviam, sem dúvida, ser verdadeiras – elas eram geniais! Embora eu fosse realmente um dos alunos mais críticos, aceitei a “Princesa e a história do nucleotídeo” basicamente sem qualquer resistência. Qual é a realidade biológica, além da ideologia? A realidade é que a seleção atua no nível do organismo, não no nível do nucleotídeo (Crow e Kimura, 1970, p. 173). Os genes humanos nunca existem em “pools”. Eles existem em grandes aglomerados dentro de pessoas reais. Cada nucleotídeo está intimamente associado a todos os outros nucleotídeos dentro de uma determinada pessoa, e só são selecionados ou rejeitado como um conjunto de 6 bilhões. O fenômeno da ligação é profundo e extenso, como veremos. Nenhum nucleotídeo é herdado de forma independente. Cada nucleotídeo está intimamente ligado aos nucleotídeos circundantes, mesmo que cada letra desta página esteja especificamente associada a uma palavra específica, sentença, parágrafo e capítulo. Este livro não foi produzido por um sistema seletivo, como uma máquina de fenda gigante onde cada letra é selecionada aleatoriamente e independentemente. Cada carta foi colocada dentro de algo maior, como parte de uma palavra específica, uma frase, um parágrafo e um capítulo. Isso também é verdade em relação aos nucleotídeos. Eles só existem e têm significado
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no contexto de outros nucleotídeos (que é o que chamamos de epistasia). Sabemos agora que os nucleotídeos humanos existem em grandes aglomerados ou blocos ligados, variando em tamanho de 10 mil a um milhão. Esses blocos de ligação são herdados como uma única unidade e nunca se rompem. Isso anula totalmente uma das hipóteses dos teóricos, de que cada nucleotídeo pode ser visto como uma unidade individualmente selecionável. Uma vez que o modelo de genética populacional da vida (como pools genéticos) é categoricamente falso, a “Princesa e o paradoxo nucleotídico” permanece inteiramente não resolvido. Isso deveria ser um enorme embaraço para todo o campo da população genética. Num nível prático, isso significa que a seleção natural nunca pode criar mesmo moderadamente longas sequências de especificações nucleotídicas. Não só a “Princesa e o paradoxo nucleotídico” não estão resolvidos, mas agora sabemos que o problema é muito pior do que os primeiros especialistas de genética de populações poderiam ter imaginado. Sabemos hoje que o tamanho e a complexidade do genoma (a extensão dos livros em braile) são vastos, que a homeostase (a espessura dos colchões) é extensa, e que há muitos mais níveis de organização (número de colchões) que separa o genótipo do fenótipo. Teremos que esperar até o capítulo 6 para compreender o problema do “ruído” biológico (veremos que os próprios colchões estão cheios de caroços do tamanho de uma ervilha). Então deveremos ser capazes de ver que a “Princesa e o paradoxo nucleotídico” é um obstáculo para o progresso. O Axioma Primário falha nesse nível primeiro e mais básico. Qualquer criança deve ser capaz de vê-lo, embora muitos adultos “muito bem instruídos” para vê-lo. No entanto, o paradoxo da “Princesa e o nucleotídeo” é apenas o começo dos problemas do Axioma Primário. Para fins de discussão adicional, e para o resto deste livro, estarei satisfeito em dar aos teóricos seu modelo de vida como “pool genético” e a ideia de seleção no nível de Nucleotídeos. Concordo em fazer isso porque, como veremos, há muitos outros problemas que desacreditam totalmente o Axioma Primário. O fato é que a “Princesa e o paradoxo nucleotídico” é, em si mesmo, base suficiente para rejeitar o Axioma Primário (veja o Apêndice 3).
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Três problemas específicos da seleção A fim de compreender as questões básicas da seleção genômica (que em breve se tornará bastante complexa), vamos analisar essa questão usando um simples exemplo. Imagine uma única mutação pontual que tenha se acumulado na população humana, de modo que 50% de todas as pessoas carregam essa mutação. Que tipo de seleção é necessária para eliminar essa mutação, e quais são os fatores críticos? Para simplificar, assumiremos que a mutação é dominante (quase todas as mutações são recessivas, o que torna a seleção muito mais difícil). À primeira vista, o problema parece facilmente resolvido. Poderíamos eliminar todos esses mutantes em uma geração se pudéssemos 1) perder 50% da população reprodutora; 2) se pudéssemos identificar claramente a pessoa portadora da mutação, e se 3) pudéssemos impedir que 100% dos portadores realizem um acasalamento reprodutivo. Então, quais são os problemas?
1. Custo de seleção. O problema do “custo de seleção” foi o primei-
ro descrito por Haldane (1957), e posteriormente validado e expandido por Kimura e Ohta (1971) e Kimura (1983). Ele foi esclarecido adicionalmente por ReMine (1993, 2005). Toda seleção envolve um custo biológico, o que significa que a seleção deve remover (“gastar”) parte da população reprodutora. Essa é a essência da seleção! No exemplo mencionado, devemos perguntar: Podemos realmente nos dar ao luxo despender 50% da humanidade, impedindo que metade das pessoas se reproduzam, para que possamos fazer progressos rápidos e seletivos? Dado os níveis de fertilidade da humanidade (globalmente, menos de 3 crianças para cada 2 adultos), se eliminarmos 50% de nossa população com o objetivo de seleção, o tamanho da população será reduzido em 25%. Obviamente, cada casal de adultos precisa ter pelo menos duas crianças reprodutoras para manter o tamanho da população. Além disso, nem todas as crianças se reproduzem(por razões como morte acidental, escolha pessoal etc.). Portanto, consideravelmente mais de duas crianças para cada dois adul-
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tos são necessárias para manter a população viável. Dada nossa baixa fertilidade, se três crianças para dois adultos foram necessárias para a continuidade da população, a seleção zero seria possível. Por essas razões, menos de uma criança em cada três está disponível para ser “gasta” para finalidades de seleção. Haldane (1957) acreditava que apenas 10% de uma típica população humana natural poderia ser usada de maneira realista para finalidades de seleção. Se 50% da população foi removida para fins de seleção a cada geração, a população humana diminuirá rapidamente, eventualmente levando à nossa extinção. Portanto, no exemplo acima, a eliminação de todos os indivíduos mutantes em uma geração não é razoável. No entanto, fazendo essa mesma quantidade de seleção em duas gerações pode ser razoável, pois apenas 25% da população seria gasta para seleção, por geração. O objetivo dessa ilustração simples é mostrar que embora a seleção atue, há limites claros em termos de quão intensa é nossa seleção pode ser, e devemos entender que todos os eventos possuem um custo biológico. Isso se torna uma questão significativa quando é realizada uma seleção contra muitas mutações diferentes simultaneamente. Para a população humana, torna-se claro que a parte máxima da nossa população que pode ser “gasta” para todas as finalidades de seleção é consideravelmente inferior a 33% e, segundo Haldane, pode estar realisticamente na faixa de 10%. Em contraste, no período em que trabalhava com reprodução de plantas 58 na Universidade de Cornell, eu poderia facilmente “gastar” (eliminar) 99% das minhas populações reprodutoras para fins de seleção por causa da extrema fertilidade das plantas. O conceito de “custo de seleção” é tão importante que preciso dizer mais sobre isso. A taxa normal de reprodução de uma espécie deve, obviamente, ser pelo menos dois filhos para cada dois adultos, ou a espécie rapidamente se extingue. No entanto, cada espécie precisa de muito mais reprodução do que isso apenas para sobreviver. Um excesso de população é necessário para “financiar” muitas coisas, genéticas e não genéticas. Por exemplo, há um enorme elemento aleatório para o sucesso da reprodução. Muitos indivíduos de uma população morrem ou se reproduzem por razões que não têm nada a ver com a genética. Ser atingido por um caminhão ou morto em uma guerra tem muito
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pouco a ver com a “aptidão” genética de uma pessoa. Esse custo de morte aleatória é absoluto, e deve ser “pago” antes mesmo de considerarmos a seleção. Em algumas espécies, esse custo pode ser de 50% ou mais da população total. Nesses casos, precisamos de pelo menos quatro filhos para dois adultos apenas para evitar a extinção. Mas neste momento, a seleção ainda não começou. Quando realmente consideramos os fatores genéticos que determinam o sucesso reprodutivo, existem características genéticas significativas que não são passadas para a prole. Estes componentes genéticos não são “hereditários”. Por exemplo, muitos genes funcionam bem em certas combinações, mas são indesejáveis por si mesmos (isso seria verdadeiro quer houvesse heterose ou epistasia). A seleção de tais combinações realmente é uma “seleção falsa”, porque não faz bem algum à prole. As combinações de genes estão quebradas na meiose e não são transmitidas. No entanto, essa “falsa seleção” ainda deve ser paga, exigindo ainda mais reprodução. E ainda não começamos a pagar pela seleção “real”! A seleção real pode assumir várias formas: seleção estabilizadora, seleção sexual, seleção progressiva etc. Cada forma de seleção tem um custo reprodutivo. Todos os custos reprodutivos são aditivos, e todos os custos devem ser pagos. Os custos totais de reprodução nunca devem exceder o potencial reprodutivo real de uma espécie. Somente se uma espécie for suficientemente fértil, e houver suficiente excedente de população para financiar todos os outros custos, qualquer tipo de seleção torna-se viável. Em outras palavras, a seleção só é possível na medida em que houver excesso de população residual, depois de todos os outros custos terem sido pagos. A seleção pode ser comparada aos gastos discricionários para uma família em um orçamento apertado. A questão sempre se resume a: “Podemos pagar?” A aptidão (funcionalidade biológica total) na verdade é o traço real sobre o qual a seleção natural sempre atua, e esse traço é realmente muito mal herdado. Isso vai contra o pensamento popular. De acordo com Kimura, a aptidão tem baixa herdabilidade, talvez tão baixa quanto 0,004 (Kimura, 1983, p. 3031). O conceito de herdabilidade é tratado com mais detalhes no capítulo 6. Por ora é suficiente saber que a baixa herdabilidade significa que fatores ambientais são muito mais importantes do que fatores genéticos para determinar
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quem parece “superior”. Para Kimura, dizer que a aptidão geral tem uma herdabilidade muito pobre é um reconhecimento surpreendente! Significa que mesmo com uma pressão de seleção intensa, quase toda a população excedente acaba sendo “gasta” para remover variações não hereditárias, e, assim, a maior parte da eliminação reprodutiva é improdutiva. Em outras palavras, a seleção para aptidão geral tem impacto mínimo sobre a aparência da próxima geração. A declaração de Kimura implica que apenas uma pequena fracção da população excedentária está verdadeiramente disponível para pagar a eliminação das mutações (que é exatamente o que tenho dito). Apesar desse fato muito importante, serei extremamente generoso por agora e atribuirei todos os “dólares de seleção” disponíveis (população excedente) à eliminação de mutações. Salvo especificação em contrário, assumirei que a toda a população excedentária é dedicada exclusivamente à seleção para remoção de mutações. No entanto, o leitor precisa entender que, na realidade, apenas uma fração muito pequena do excedente de qualquer população pode ser honestamente distribuída para a eliminação da mutação (veja Capítulo 6, Figura 8a-c). Creio que um dos erros mais fundamentais cometidos pelos teóricos, à medida que desenvolvem seus vários cenários, é ignorar o custo seletivo. Eles gastam seus dólares de seleção como um adolescente com um cartão de crédito. Especulam como se houvesse sempre uma população excedente infinitamente grande. Sendo que os teóricos geralmente não são compelidos por limites de custos realistas, em suas mentes imaginam que podem “financiar” qualquer número de cenários de seleção simultânea. Eles podem projetar um cenário de seleção sobre outro. Isso me lembra dos antigos filmes de faroeste em que o cowboy disparava dezenas de vezes sem recarregar, ou como Legolas, em O Senhor dos Anéis, que nunca fica sem flechas! No entanto, esses filmes são fantasia, e os cineastas são livres para reivindicar “licença artística”. Os teóricos genéticos não possuem licença artística e devem ser responsáveis pela forma como gastam os seus dólares de seleção, assim como um contador deve ser responsabilizado para onde o dinheiro vai. Deveria ser designado aos teóricos um número realista de dólares baseados na realidade reprodutiva de uma determinada espécie. Eles deveriam então “gastar” essa parte de sua po-
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pulação excedente sobriamente, e sem qualquer despesa deficitária. Se esse princípio fosse honestamente empregado, haveria expectativas muito menores sobre o que seleção pode realmente fazer.
2. Reconhecer mutações obscuras (“invisíveis”). Se você quer
selecionar um mutante, deve ser capaz de identificá-lo dentro da população. Mas não podemos identificar os portadores de uma mutação pontual típica para além do rastreio de toda a população usando testes de DNA muito caros. Apenas os pontos de mutações extremamente raros, que ocasionam deformidades físicas grosseiras, podem ser identificados a nível prático. Para a maioria das mutações pontuais individuais, mesmo que sejam destrutivos e resultem em perda de informação, são tão sutis que são essencialmente “invisíveis”. Eles não produzem um efeito distinto ou reconhecível. Para selecionar artificialmente contra uma mutação pontual típica, seria necessário fazer uma dispendiosa análise de laboratório para cada pessoa no planeta, e isso é completamente impraticável. Portanto, podemos ver que existem problemas fundamentais em termos de identificação de indivíduos “bons” versus “maus” para seleção. Obviamente, ao se considerar milhões de mutações simultaneamente, esse problema torna-se incompreensível. Imagine alguém que deseja comprar uma enciclopédia, sabendo que cada conjunto de volumes tem sua própria coleção original de milhares de erros ortográficos. Você poderia realisticamente ficar lá na livraria e classificar todos esses volumes com a expectativa de encontrar o conjunto menos “corrompido”? Dados dois conjuntos, cada um dos quais contém seu próprio conjunto de 10 mil erros ortográficos, como você escolheria qual conjunto tem os piores erros? A escolha seria totalmente arbitrária! Essa questão de um grande número de mutações silenciosas ou “quase neutras” foi reconhecida pela primeira vez por Kimura (1968) e Ohta (1973, 1974, 1992, 2002), e suas implicações foram exploradas por Kondrashov (1995).
3. Eliminação sistemática da reprodução. O custo da seleção e
das mutações “silenciosas” é um problema gigantesco. O desafio torna-se ain-
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da maior quando se trata de impedir indivíduos mutantes de se acasalarem. Em nenhum lugar deste planeta existe um sistema social que pode controlar a reprodução humana com alta precisão. O exemplo mais infame dessa tentativa ocorreu na Alemanha nazista sob Hitler. Mas esse experimento falhou catastroficamente. Práticas de paternidade planejada e controle de natalidade, embora eficazes em reduzir o tamanho médio da família, não têm sido eficazes em eliminar mutações. Na maioria dos casos, o acasalamento humano e a reprodução permanecem essencialmente aleatórios, com exceção dos casos muito raros em que mutações resultam em defeitos genéticos muito pronunciados. A partir de nossa modesta ilustração acima, devemos concluir que não estamos em posição prática para selecionar artificialmente mesmo um ponto de mutação dentro da população humana. Essa é uma notícia muito séria. Quando passamos a considerar mutações múltiplas, os problemas aumentam exponencialmente. Mesmo se pudéssemos identificar todos os portadores de numerosas mutações, e pudéssemos efetivamente impedir todos eles de se acasalarem, mais cedo ou mais tarde nos defrontaríamos com o problema de custo seletivo, porque quando tentamos selecionar simultaneamente contra múltiplas mutações nos deparamos com os problemas inerentes com um tamanho de uma população em rápida diminuição. Então começamos a ver que a seleção não é tão fácil como pensávamos! Mesmo o cenário mais simples de seleção requer vários fatores importantes: 1) manutenção de tamanho da população; 2) identificação clara de mutantes; e 3) exclusão eficaz dos mutantes da população reprodutora. Como veremos mais claramente no próximo capítulo, quando considerarmos todas as mutações simultaneamente, cada um desses três requisitos torna-se completamente impossível. Se a seleção natural falha em eliminar uma mutação típica pontual, pode a seleção natural trazer algum socorro? Depois de considerar esses problemas, uma possível conclusão pode ser a de não tomar nenhuma ação e deixar que a natureza faça isso por nós. O problema é que a seleção natural, como a seleção artificial, envolve exatamente os mesmos problemas. A seleção natural, por causa do custo da seleção, não pode selecionar contra muitas mutações
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simultaneamente, ou então a seleção se tornará totalmente ineficaz ou resultará numa diminuição rápida do tamanho da população (ou ambos). Além disso, a seleção natural precisa reconhecer inúmeras mutações essencialmente invisíveis. Finalmente, a seleção natural precisa ser capaz de excluir de algum modo multidões de mutações da população reprodutora, simultaneamente, o que é logisticamente impossível por causa da interferência da seleção. Esses impedimentos muito reais à seleção natural limitarão o que podemos realisticamente esperar que a seleção natural realize. De fato, a seleção artificial é vastamente superior do que a seleção natural. A seleção artificial é baseada em truncamento artificial (eliminação completa) de todos os “inaptos”. A seleção natural é baseada na “seleção probabilística”, que meramente reduzem a probabilidade de que os inaptos serão excluídos (eliminação incompleta – alguns inaptos ainda sobreviverão). A seleção genética ainda funciona. Por favor, não entenda mal aonde vou com isso. Não estou dizendo que a seleção não funciona, porque, em nível limitado, ela certamente o faz! Minha carreira como reprodutor de plantas envolveu o uso da seleção artificial. Meus colegas e eu fomos capazes de produzir variedades vegetais e animais que têm importância fundamental para a agricultura moderna. Quando mais tarde me envolvi na engenharia genética de plantas, rotineiramente usamos técnicas de seleção para recuperar plantas transgênicas (geneticamente modificadas). Da mesma forma, a seleção natural eliminou as piores mutações humanas. Se não tivesse feito isso, a raça humana teria se degenerado há muito tempo e não estaríamos aqui para discutir este assunto. Mas tanto a seleção natural quanto a artificial têm alcances operacionais muito limitados, e nenhum possui o poder onipotente muitas vezes atribuído a eles. A seleção não é uma varinha mágica. Embora eu concorde com entusiasmo que a seleção pode moldar alguns genes, argumento que nenhuma forma de seleção é capaz de manter (e muito menos criar!) genomas superiores. A forma mais simples de resumir tudo isso é o seguinte: A seleção pode às vezes funcionar no nível de certos genes, mas falha sistematicamente no quadro geral - no nível genômico.
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Aptidão
Aptidão em declínio (1% por geração) (0,99n)
Gerações (n)
Figura 4
as consequências da entropia genética
De acordo com o Dr. Crow (1997), a aptidão da raça humana está degenerando atualmente em 1-2% por geração devido ao acúmulo de mutações. Um declínio de 1% na aptidão por geração (começando com uma aptidão de 1) é mostrado para uma população humana hipotética durante um período de 300 gerações (6 mil anos). Esse tipo de perda progressiva da aptidão claramente conduz à degeneração dramática da raça humana dentro do tempo histórico.
CAPÍTULO 4 - A TODO-PODEROSA SELEÇÃO AO RESGATE?
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Figura 5
A Princesa e o Paradoxo Nucleotídico.
O Axioma Primário requer que a seleção natural, que ocorre no nível de um indivíduo (a princesa), deve reconhecer bilhões de efeitos nucleotídicos individuais que só existem no nível molecular (as ervilhas). Separar a princesa e os nucleotídeos é um grande abismo. Esse abismo existe em parte devido à separação em escala (para imaginar isso, tente perceber que se um nucleotídeo for do tamanho de uma ervilha, um corpo humano teria mais de 15 quilômetros de altura). Esse abismo envolve também a separação por nível de organização (há pelo menos uma dezena de níveis de organização biológica entre um nucleotídeo e um ser humano). Nenhum nucleotídeo afeta diretamente o corpo humano, mas somente através de um elaborado labirinto de sistemas aninhados. Assim, os colchões entre a princesa e o nucleotídeo são muitos, e eles são muito espessos. Para tornar as coisas ainda piores, o mecanismo de autocorreção da vida (chamado homeostase) opera em todos os níveis biológicos, silenciando efeitos nucleotídicos, mesmo quando as modernas tecnologias de cancelamento de som anulam o ruído. Para nossa analogia, teríamos de incorporar máquinas internas de “autocorreção” de alta tecnologia em cada colchão. Mas temos de acrescentar mais uma dimensão à nossa analogia para torná-la preciso. O Axioma Primário não apenas pede à princesa que sinta se houver uma única ervilha debaixo de sua pilha de colchões. Através desses colchões ela deve “sentir” enciclopédias escritas em solavancos de braile do tamanho de uma molécula, e decidir quais os volumes têm o menor número de erros.
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capítulo 5
Os problemas da seleção genômica podem ser solucionados? Fato rápido: a seleção é incapaz de resgatar o genoma
Começamos o último capítulo considerando os problemas associados com a seleção de uma única mutação dentro de uma população humana. Tradicionalmente, os geneticistas têm estudado o problema das mutações simplesmente considerando uma mutação de cada vez. Foi então amplamente assumido que o que funciona para uma mutação pode ser estendido para se aplicar a todas as mutações. Mas essa é uma extrapolação sem sentido! É como dizer que se eu puder pagar um carro, posso pagar qualquer valor, ou se consigo fazer malabarismos com três bolas, consigo fazer malabarismos com 300. Estamos argumentando que os problemas realmente difíceis não são vistos com genes simples ou com nucleotídeos isolados, mas surgem quando consideramos todas as unidades genéticas combinadas (todo o genoma). Para
entender o que é necessário para impedir a degeneração genômica, devemos considerar o problema de mutação no nível genômico, e devemos implementar o que estou chamando de “seleção genômica”. Existem 3 bilhões de posições nucleotídicas, cada uma com duas cópias no genoma, e, assim, há 6 bilhões de possíveis mutações pontuais (erros ortográficos). As profundas dificuldades de fazer o trabalho de mutação/seleção no nível genômico só foi reconhecido no passado por alguns geneticistas à frente de seu tempo (por exemplo, Haldane, Muller, Kimura, Kondrashov), mas todo o pegajoso problema tem repetidamente sido varrido pra debaixo do tapete. Isso acontece porque ele cria problemas intransponíveis para a teoria evolucionista. Nas últimas décadas, aprendemos que o genoma funcional é muito maior e mais complexo do que se predisse. Aprendemos que a taxa de mutação humana é muito maior do que anteriormente se pensava ser possível. Estamos aprendendo que a porcentagem real de mutações que são verdadeiramente neutras está firmemente diminuindo e a porcentagem HERDAMOS UMA que realmente adiciona informação é M U LT I D Ã O D E extremamente pequeno. Assim, não apenas a taxa de mutação é muito M U TA Ç Õ E S D E N O S S O S alta – mas quase todas as mutações PROGENITORES são deletérias. Por todas estas razões, não podemos ignorar o problema da degeneração genômica e devemos perguntar: “Pode a seleção genômica resolver o problema?” O ponto principal é que virtualmente cada um de nós é extremamente mutante. Esse processo de mutação destrutiva já tem acontecido por um bom tempo. Além das cerca de 100 mutações novas que cada um adicionou ao pool de genes humano, herdamos uma multidão de mutações de nossos progenitores. Para colocar o problema da seleção genômica na perspectiva correta, temos de tomar o problema da seleção colocado no início do último capítulo (por um único ponto de mutação num sítio nucleotídico único) e multiplicar este problema por pelo menos um bilhão. Você pode começar a ver que a
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seleção contra mutações no nível genômico são fundamentalmente diferentes de nossa primeira ilustração onde apenas estávamos selecionando contra uma única mutação?
1. Custo da seleção. O fato de que todas as pessoas são mutantes
torna a seleção muito mais difícil. Se tivéssemos de selecionar contra todas as mutações, ninguém poderia se reproduzir, resultando em extinção instantânea! Obviamente, essa estratégia de seleção gera um custo reprodutivo muito alto. É amplamente reconhecido que cada um de nós herda milhares de mutações deletérias. Carregamos muitos trilhões de mutações deletérias coletivamente como população. No entanto, para tornar o problema mais fácil, vamos limitar nossa atenção apenas às 600 bilhões de novas mutações que entraram no pool de genes humanos dentro de nossa geração. Como não podemos simplesmente selecionar contra “mutantes”, teremos que selecionar entre indivíduos que são “mais mutantes” versus aqueles que são “menos mutantes”. Como veremos, reconhecer “mais mutantes” versus “menos mutantes” é um enorme problema em si mesmo. E toda essa seleção deve custar-nos consideravelmente menos de 33% da população por geração se quisermos sobreviver. Deixe-me tentar ilustrar a extensão do problema de custo associado com a seleção contra 600 bilhões de mutações. Se tivermos uma população de 7 bilhões de pessoas, então, no máximo, apenas um terço delas poderia ser “eliminada” (impedida de ter filhos). Isso equivale a mais de 2 bilhões de pessoas. Tente imaginar isso. Esse pensamento deve ser suficiente para fazer tremer até o eugenista mais sangue-frio. No entanto, de que serviria essa medida draconiana? Impedir 2 bilhões de pessoas de se acasalar só eliminaria 100 x 2 bilhões = 200 bilhões de novas mutações. Isso ainda deixaria 400 bilhões de novas mutações como a recém-adicionada carga genética para a próxima geração! Mesmo assumindo que dois terços das mutações restantes são perfeitamente neutras, ainda temos 133 bilhões de mutações deletérias adicionadas à população. Não podemos nos livrar de mutações suficientes e ainda manter o tamanho da população. Mesmo que dois terços das mutações sejam neutras, e na adição dobremos a intensidade da seleção (embora certamente não
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possamos “gastar” dois terços da nossa população), ainda deixaria 67 bilhões de novas mutações deletérias para a próxima geração. O custo da seleção claramente limita quantas mutações podemos eliminar por geração, e a taxa de mutação conhecida para os seres humanos é muito alta para ser combatida por qualquer nível de seleção. Portanto, as mutações continuarão a se acumular, e as espécies devem degenerar. Você percebe que o custo da seleção é um problema bastante incompreensível quando visto no nível genômico?
2. Mutações obscuras ou “invisíveis”. Surpreendentemente,
quando lidamos com a seleção, as mutações letais e quase letais não são o problema real, pelo menos não do ponto de vista de toda a população. Essas mutações são raras e auto-eliminadoras. Do mesmo modo, mutações absolutamente neutras não importam, se é que existem. São as mutações menores que causam o maior dano, especialmente dentro de pequenos períodos de tempo (Kimura, Ohta, 1971, p. 53). A seleção deve impedir o acúmulo de pequenas mutações, ou a espécie rapidamente vai se deteriorar e a aptidão declinar. No entanto, mesmo se a pudesse manter pequenas mutações sob controle, ela parece ser impotente para interromper o acúmulo da classe mais abundante, as mutações quase neutras. Portanto, os genomas mais elevados eventualmente vão se degenerar a longo prazo, com ou sem a seleção. a) Mutações quase neutras. As mutações quase neutras têm efeitos infinitesimalmente pequenos no genoma como um todo. Mutações em todas as posições de nucleotídeos quase neutros são automaticamente sujeitos à deriva aleatória, o que significa que são essencialmente imunes à seleção. Seus efeitos de aptidão são tão minúsculos que são mascarados até mesmo pelas flutuações mais leves, ou ruído, no sistema biológico (Kimura, 1968, 1983; Kimura, Ohta, 1971). Essas são as mutações mais abundantes, como mostrado no “quadro quase neutro” na Figura 3d. Uma vez que a maioria das mutações devem ser quase neutras, e uma vez que são tão sutis a ponto de evitar ser selecionadas, por que elas são importantes? Elas importam porque esses locais de nucleotídeos contêm informações, e sua mutação contribui
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para a erosão da informação. Coletivamente, os nucleotídeos quase neutros devem corresponder à maioria das informações no genoma. Isso é tão verdadeiro quanto o fato de que todas as letras aparentemente insignificantes nesse livro coletivamente adicionam uma mensagem clara. Se começarmos com uma mensagem escrita complexa e muito longa (uma enciclopédia, por exemplo), e começarmos a introduzir erros tipográficos, a maioria dos erros só terão um efeito extremamente trivial sobre a mensagem como um todo. Individualmente eles são bastante insignificantes. Mas se esse processo não for interrompido, a mensagem eventualmente vai se corromper, e depois se perderá completamente. Um exemplo alternativo seria a ferrugem de um carro. Em um carro, podemos reparar o capô, substituir os pneus e corrigir as cavidades (à semelhança da seleção de mutações grandes e pequenas), mas não podemos interromper o processo de ferrugem, que está acontecendo em um átomo de cada vez (à semelhança das mutações quase neutras). Cada átomo de ferro que se oxida parece perfeitamente insignificante, mas através de todo o carro, o processo é certo e mortal. Um terceiro exemplo seria o envelhecimento de nossos corpos. Podemos reparar dentes, fazer cirurgias plásticas, e mesmo substituir o coração. Mas é o envelhecimento das células individuais (principalmente devido a mutações) que coloca uma limitação específica em nosso período de vida. Isso é verdade ainda que cada célula individual seja trivial e inteiramente dispensável. Assim como o corpo humano se “oxida” devido a incontáveis erros (todos eles em si mesmos insignificantes), o genoma humano também deve estar “enferrujando” devido a mutações quase neutras. Nenhum esquema de seleção pode interromper esse processo. Essa é a essência do problema da mutação quase neutra. Todo esse problema levou um proeminente geneticista populacional a escrever um artigo intitulado “Por que não morremos 100 vezes?” (Kondrashov, 1995). O problema da não-selecionalidade de mutações quase neutras é muito real. Uma população grande e homogênea em um ambiente homogêneo (por exemplo, uma típica cultura bacteriana) é mais resistente à deriva genética, porque vê muito menos ruído e experimenta uma seleção muito mais eficiente. Essas populações costumam ter genomas mais simples, menos mutações
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por genoma e muito menos interações intergênicas. Além disso, elas existem em grande número e têm taxas de reprodução muito elevadas. Mais importante ainda, cada célula está sujeita à seleção, independentemente, em cada divisão celular. A seleção em tais sistemas é mais eficaz, mais precisa e pode ter maior resolução. Isso significa que em bactérias, uma proporção do genoma é quase neutra e não selecionável. Isso acontece porque os teóricos normalmente preferem usar exemplos microbianos. Infelizmente, mamíferos (como nós) não têm as vantagens listadas acima. Estamos sujeitos a altos níveis de ruído reprodutivo. Temos um genoma grande, mutação elevada, níveis elevados de interação gênica, e restrições na seleção. É por isso que a proporção de mutações que são virtualmente “não selecionáveis” deve ser muito grande no homem, e a frequência de tais mutações dentro da população deve ser totalmente controlada por deriva genética aleatória. Todas essas posições nucleotídicas sofrerão mutações livremente, e todas as informações codificadas por eles irá degenerar ao longo do tempo. b) Limiar de seleção para muitas mutações menores. As mutações menores, por definição, têm um efeito pequeno sobre o potencial reprodutivo. Essas são as mutações à esquerda do quadro quase neutro na Figura 3d. Embora os reprodutores de animais e de plantas possam ter dificuldade em ver essas mudanças, a seleção natural (que é realmente apenas outra forma de se referir à reprodução diferencial) geralmente pode “vê-las”, uma vez que afetam a probabilidade reprodutiva por definição. Além disso, os efeitos dessas mutações são parcialmente aditivos; por isso, a seleção natural pode selecionar numerosos mutantes menores simultaneamente. De fato, a maneira como a seleção natural funciona é muito elegante e parece estabilizar a vida, o que, de outro modo, seria se deterioraria muito rapidamente. É realmente um sistema projetado de maneira muito notável. Contudo, a seleção de mutações menores possui limitações significativas. A eliminação ordenada de mutações menores é seriamente interrompida pelo ruído. A seleção natural deve ver os mutantes como uma probabilidade reprodutiva. Mas a natureza pode ter dificuldade em ver pequenas mutações. Isso
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ocorre porque as diferenças na aptidão reprodutiva causada por pequenas mutações são muito sutis, enquanto os efeitos de outros fatores podem ser muito grandes. É semelhante a tentar ver as ondulações produzidas por um seixo jogado em um mar tempestuoso. Todas as outras variáveis que afetam a reprodução, quando combinadas, vão interferir significativamente na seleção natural contra qualquer pequena mutação. Por exemplo, uma alta taxa de morte acidental numa população irá substituir e obscurecer os efeitos sutis da mutações. Da mesma forma, a seleção de mutações letais e quase letais (que deve automaticamente ter precedência) irá substituir os efeitos mais sutis de pequenas mutações. O fato de que a maioria das mutações são recessiva mascara drasticamente seus efeitos negativos de aptidão, e dificulta muito a seleção contra eles. Da mesma forma, todas as interações entre os genes (“epistasia”) vai interferir com a eliminação seletiva de pequenas mutações. Em populações menores, a natureza aleatória da recombinação sexual (segregações de cromossomos e uniões de gametas são aleatórios e, portanto, flutuam) pode rotineiramente substituir a seleção. Esses efeitos causam o fenômeno da deriva genética. A deriva genética tem sido extensivamente estudada, e é amplamente conhecido que ela pode substituir a seleção contra todas as mutações graves em pequenas populações. Criadores de plantas como eu sabem que todos os efeitos alheios na reprodução vão interferir com a seleção efetiva. A abundância de uma única mutação numa população tende a derivar aleatoriamente e tornar-se imune à seleção sempre que o efeito líquido de todos os outros fatores combinados tiver um maior efeito sobre a probabilidade reprodutiva do que o próprio nucleotídeo. Para colocar a questão em termos mais familiares, a seleção para efeitos genéticos muito sutis é como tentar ouvir um sussurro em um quarto barulhento. Sussurros suaves, mensagens complexas e altos ruídos de fundo contribuem para a perda da mensagem. A seleção contra uma mutação menor funciona melhor quando seu efeito de aptidão ainda é moderadamente alta, e onde há um mínimo ruído biológico. Apesar dessas limitações significativas, a seleção para um número de mutações menores ainda funciona. Felizmente ela funciona nesse nível, caso contrário não estaríamos aqui!
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Embora a seleção possa definitivamente trabalhar para inúmeras mutações menores, à medida que o número desses mutantes aumenta, cada efeito de aptidão do mutante torna-se cada vez menos significativo em termos de probabilidade reprodutiva. À medida que o número de mutações menores aumenta, os efeitos de mutação individuais tornam-se cada vez menos significativos, e a eficácia da seleção para cada um move-se rumo a zero. Kimura (1983) alude a isso. Demonstro esse fato matematicamente no Apêndice 2, e os resultados são apresentados em Figuras 6ae 6b. Cada vez que adicionamos outro traço que precisa ser selecionada, a pressão seletiva máxima que pode ser aplicada a cada característica individualmente deve declinar. À medida que aumenta o número dos traços submetidos à seleção, a eficiência de cada característica rapidamente se aproxima de zero, e o tempo para alcançar o objetivo seletivo se aproxima do infinito. De acordo com meus cálculos (veja Apêndice 2), para uma população como a nossa, o número máximo de mutações que poderiam ser selecionadas para aproximadamente 700. Kimura (1983, p. 30) alude ao mesmo problema, e, embora não apresente seus cálculos, ele afirma que apenas 138 locais podem ser selecionados simultaneamente, mesmo numa população com pressão de seleção total muito intensa (50% de eliminação) e eliminação seletiva muito fraca por característica (s = 0,01). Tentar selecionar simultaneamente contra centenas de mutações devem claramente leva à cessação do progresso seletivo. Mesmo em uma pequena população humana, milhões de mutações estão surgindo a cada geração e devem ser eliminadas. Dentro do cenário geral, precisamos realmente selecionar contra bilhões, não centenas, de mutações. Mesmo no caso muito limitado selecionar apenas algumas centenas de mutações, embora seja teoricamente possível fazer isso, é digno de nota ressaltar que tal seleção diluída por característica afeta grandemente a taxa de progresso, que essencialmente leva a uma paralisação. À medida que o número dos loci sob seleção aumenta, a taxa de progresso seletivo (por traço) retarda muito rapidamente, aproximando-se de zero. A taxa resultante de mudança genética seria glacial na melhor das hipóteses, exigindo centenas de, ilhares de gerações de seleção para afetar significativamente esse número muito limitado de posições nucleotídicas.
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Em certo sentido, à medida que selecionamos mutações menores, cada mutação torna-se um ruído para os outros. À distância, uma sala cheia de sussurros está cheia de ruído e desprovida de informações líquidas. Enquanto cada efeito de mutação se torna cada vez menos significativa, seu sussurro individual se torna mais suave, e assim o problema de superar o ruído piora. Até sob as melhores condições de seleção, cada indivíduo sussurrou uma mensagem que não pode ser discernida. O efeito de qualquer dado mutante torna-se totalmente insignificante à luz de todos os outros fatores reprodutivos. Neste ponto limiar, a mutação torna-se eficientemente neutro, e toda a seleção cessa abruptamente. À medida que selecionamos mais mutações pequenas, devemos sempre atingir um ponto limiar em que a seleção deve, em grande parte, romper. Acima de certo número, todas as mutações menores devem tornar-se não selecionáveis, quando as condições são ideais e o ruído é mínimo. A seleção simultânea contra muitas mutações menores deve levar ao progresso seletivo zero, e a deriva genética assume o controle. Em essência, selecionar muitas mutações menores simultaneamente faz com que todas se comportem como quase neutras, conforme descrito na seção acima. Vamos mostrar isso agora usando simulações numéricas (veja o Capítulo 11). Haldane (1957) e Kimura (1983, p. 26) concordam que não é possível selecionar simultaneamente um grande número de traços devido ao custo de seleção. Essa simples realidade torna a seleção genômica virtualmente impossível.
3. Eliminação reprodutiva. Vimos que não podemos interromper a degeneração genômica por causa do elevado número de mutações que estão ocorrendo na população humana e o custo reprodutivo proibitivo de eliminar cada um. Ainda mais, aprendemos que não podemos interromper a degeneração genômica porque a maioria das mutações são quase neutras e seus efeitos são obscurecidos e essencialmente indetectáveis acima do ruído biológico. Isso os torna imunes à seleção e sujeitos apenas à deriva e à degeneração. Além disso, aprendemos que se tentamos selecionar contra muitas mutações secundárias simultaneamente, elas efetivamente se tornam quase neutras.
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Elas também se tornam não selecionáveis e sujeitas a uma deriva aleatória. Por último, gostaria de argumentar que não podemos interromper a degeneração genética porque não podemos compelir efetivamente a eliminação reprodutiva de grandes números de mutantes simultaneamente, por razões logísticas. Denominei esse problema interferência na seleção. Esse problema não tem sido suficientemente abordado, mas é simplesmente reconhecido como um fator que interfere na seleção (Haldane, 1957; Lynch, Conery, Burger, 1995; Kondrashov, 1995). Ao tentar seleções simultâneas de dezenas de milhares – ou milhões – de mutantes diferentes no genoma, o problema da interferência de seleção torna-se absolutamente esmagador. A interferência de seleção ocorre quando a seleção de um traço interfere com a seleção para outro traço. Por exemplo, um traço desejável será rotineiramente encontrado juntamente com uma característica indesejável individual. Selecionar contra o traço indesejável significa automaticamente que você também está inadvertidamente selecionando contra o traço desejável associado (devemos aceitar ou rejeitar a totalidade da pessoa). Essa associação entre traços pode ser muito estreita (ambos os traços codificados pelo mesmo gene, ou dois genes lado a lado no mesmo cromossomo), ou a associação pode ser frouxa (dois genes em algum lugar dentro de um indivíduo). Mesmo se as mutações estiverem frouxamente associadas no indivíduo, os dois traços ainda estão ligados para essa única geração. Qualquer mutante deve estar sempre temporariamente ligado a milhares de outros mutantes em cada indivíduo e em cada geração. Portanto, a seleção nunca pode operar numa dada mutação em isolamento. Selecionar qualquer mutação benéfica sempre multiplicará automaticamente uma série de mutações deletérias relacionadas. O problema é inescapável. Para ilustrar isso, imaginemos selecionar entre dois indivíduos em uma população. Pelo fato de que os genes são extraídos do mesmo “pool genético”, quaisquer dois indivíduos terão aproximadamente o mesmo número de mutações, e esses dois conjuntos de mutações terão aproximadamente o mesmo efeito deletério líquido. Ao contrastar duas dessas pessoas para descobrir quem está mais apto, podemos descobrir que cada uma tem cerca de
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10 mil mutações diferentes; por isso, há 20 mil diferenças entre eles. Cada uma terá cerca de 10 mil unidades gênicas “ruins” (mutações) e cerca de 10 mil unidades gênicas “boas” (nucleotídeos não mutantes). Devido à média, a diferença real em aptidão genética entre eles será pequena e dependerá apenas de algumas diferenças nucleotídicas de grande impacto. Quem será de fato reprodutivamente favorecido? Devido ao seu elevado grau de similaridade na aptidão genética, o sucesso reprodutivo dependerá mais de fatores aleatórios de sorte e ruído do que da verdadeira aptidão genética. Mas mesmo se o “melhor” indivíduo for favorecido na reprodução, quase não será feito progresso seletivo. O indivíduo que é favorecido possui tantas mutações quanto o indivíduo rejeitado. Teremos selecionado 10 mil mutações em um indivíduo, mas ao mesmo tempo teremos multiplicado outras 10 mil mutações no outro indivíduo. Quase toda a seleção é cancelada; 10 mil passos para a frente e 10 mil passos para trás. O único ganho líquido é para aqueles poucos genes “importantes” que realmente fizeram a diferença real na aptidão. Em genomas superiores, a seleção só pode ser eficaz para um número limitado de diferenças nucleotídicas “significativas”. A vasta maioria das mutações será menor ou quase neutra, cancelará as demais, e será não selecionável. No nível genômico, mesmo se pudéssemos ter controle perfeito sobre a reprodução de indivíduos, ainda não conseguiríamos impedir efetivamente a propagação do vasto volume de mutações deletérias. Esse problema, até onde é de meu conhecimento, não foi devidamente abordada por outros autores, embora seja frequentemente mencionado por geneticistas populacionais.
4. Interferência de seleção devido à ligação física. A forma mais
óbvia e extrema de interferência de seleção é quando existe uma estreita ligação física entre mutações benéficas e deletérias. Isso resulta num problema irreconciliável referido como “Catraca de Muller”. Um dos requisitos mais óbvios da seleção é a capacidade de separar mutações boas e ruins. Isso é não é possível quando as mutações boas e ruins estão fisicamente ligadas. Essencialmente, todo o genoma existe em grandes blocos de ligação (Tishkoff; Verrelli, 2003), portanto esse problema se aplica a praticamente a cada bloco
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constituinte do genoma. Se voltarmos à Figura 3d, poderemos ver que as mutações são esmagadoramente deletérias, mas deve haver algumas mutações benéficas extremamente raras. Essas mutações benéficas muito raras podem parecer deixar uma esperança de evolução à frente, mas essa esperança não seria racional, porque esses beneficiários serão esmagadoramente quase neutras (e, portanto, não selecionáveis) e porque as mutações deletérias sempre superam as benéficas. Pelo fato de que esses raros beneficiários ainda estão nesse gráfico, eles parecem oferecer um vislumbre de esperança para o esperançoso. O problema da ligação física anula aqueles beneficiários do nosso gráfico (Figura 7). Isso deve eliminar completamente qualquer vestígio de esperança para a evolução. Dentro de qualquer unidade física de ligação, deve existir, em média, milhares de mutações deletérias acumuladas antes que surja a primeira mutação benéfica. Portanto, nunca surgirá em qualquer tempo nem mesmo um único grupo de ligação simples dentro do genoma inteiro que possa experimentar realisticamente um ganho líquido de informação. Cada mutação benéfica seria sempre inseparavelmente ligada a um grande número de mutações deletérias. Isso pode ser visualizado graficamente (Figura 7). Na Figura 3d, mapeamos a distribuição dos efeitos de mutações simples. Podemos fazer a mesma coisa em termos dos efeitos mutacionais dos aglomerados ligados de mutações. Como esses aglomerados nunca se separam, o efeito de qualquer conjunto de mutações será herdado como se fosse uma única mutação, e o efeito de qualquer grupo de mutação seria simplesmente o efeito líquido de todas as suas mutações componentes. Por este tempo, pelo menos duas mutações por bloco de ligação terão se acumulado, e quase todas as mutações benéficas terão sido canceladas por uma mutação deletéria ligada. Neste ponto, a distribuição já mostrará essencialmente blocos de ligação zero com um ganho líquido de informação (veja Figura 7). Para ilustrar ainda mais esse ponto, se apenas uma mutação em um milhão for benéfica, a probabilidade de um par de mutações com ambos tendo um efeito benéfico líquido torna-se demasiado pequeno para se considerar (10 -12). Quanto mais tempo passa, o número médio de mutações por grupo de ligação aumentará de tal modo que a perda líquida
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de informações por grupo de ligação aumentará, e o desaparecimento total dos grupos de ligação de ganho líquido se aproximará rapidamente da certeza absoluta. O genoma humano é um composto de cerca de 100 mil a 200 mil blocos de ligação. Com base na lógica mencionada acima, podemos saber com elevado nível de certeza que cada um desses “blocos de construção” está se deteriorando. Com base em inúmeras linhas de evidência independentes, somos compelidos a concluir que o problema da degeneração genômica humana é real. Embora a seleção seja essencial para retardar a degeneração, nenhuma forma de seleção pode realmente interrompê-la. Não aprecio esse pensamento mais do que aprecio o pensamento de que todas as pessoas devem morrer. A extinção do genoma humano parece ser tão determinada e determinística quanto a extinção das estrelas, a morte dos organismos, e a perda de calor do universo.
atualização de 2008
Em 2006, foi publicado um artigo que mostra que a operação da “Catraca de Muller” deveria teoricamente ser letal para a raça humana dentro de uma escala de tempo evolutiva. Isso é especialmente importante porque o autor considerou apenas uma única unidade de ligação – o cromossomo mitocondrial. Mas esse é apenas um dos cerca de 200 mil grupos de ligação do genoma humano, de modo que o autor subestimou o problema de ligação no homem por um fator de aproximadamente 200 mil (Loewe, 2006).
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Intensidade de Seleção
Intensidade de seleção (c) vs. número de traços (n) Modelo aditivo (C = n x c = 0,25)
Figura 6a
Interferência de seleção. Número de variáveis gênicas
A seleção envolve sempre um custo reprodutivo (C), significando que alguns indivíduos não podem se reproduzir. O custo total de seleção deve ser menor que o excesso de reprodução de uma espécie, ou a população encolherá e enfrentará a extinção. À medida que mais traços estão sob seleção (n), o custo total atribuível a cada característica (c) deve diminuir rapidamente, de forma que o custo total não exceda o potencial reprodutivo da população. Para visualizar o problema do limiar de seleção, tracei a intensidade máximo de seleção permissível por característica (c) contra o número de traços sob seleção (n), para uma população que pode perder 25% dos seus indivíduos para a eliminação de mutações (C = 0,25). Como pode ser visto, a pressão de seleção permissível por traço despenca muito rapidamente à medida que o número de traços aumenta. As pressões de seleção obviamente se aproximarão de cero muito rapidamente, e um ponto limiar será atingido onde cada característica é efetivamente neutra. Essa curva é baseada em um modelo aditivo, seguindo a fórmula C = n x c (veja Apêndice 2). O Apêndice 2 mostra que resultados quase idênticos são observados fazendo a mesma análise usando o modelo multiplicativo.
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Intensidade de Seleção
Intensidade de Seleção vs. # unidades gênicas – (C = 0,50, 0,99) (aditivo)
Número de variáveis gênicas
Figura 6b
Interferência de seleção para populações extremamente férteis.
Mesmo que assumamos uma população humana extremamente fértil, de modo que 50% das pessoas podem ser eliminadas seletivamente de cada geração (C = 0,5), não reduz significativamente o problema mostrado na Figura 6a. Mesmo para espécies férteis, tais como
plantas, onde C pode ser 0,99 (100 descendentes por planta), o problema do limiar de seleção ainda é muito real. Selecionar muitos traços simultaneamente diminui a eficiência de seleção para cada característica individual, até que a seleção chegue a um ponto em que esteja ineficaz. Essas curvas seguem a fórmula aditiva: C = nxc. Os problemas de seleção genômica podem ser resolvidos?
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Frequência
Mutações simples vs. Agrupadas
Efeito de mutação líquida
Figura 7
As mutações surgem em aglomerados (clusters) fisicamente ligados. Os aglomerados de mutação serão sempre 100% deletérios. Na Figura 3d, vimos que a distribuição de mutações individuais é neutra, e que, embora existam muitas mutações deletérias, estão desaparecendo poucas mutações benéficas. Essas raras unidades benéficas desaparecem quando analisamos mutações como elas realmente ocorrem dentro de aglomerados fisicamente ligados. A distribuição efetiva dos efeitos das mutações (a curva de distribuição sombreada), será fortemente desviada à esquerda quando comparada com mutações individuais. Qualquer aglomerado de mutação ligado será herdado como uma única unidade genética, e o efeito dessa mutação será simplesmen-
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te o efeito líquido de todas as suas mutações constituintes. O efeito de aptidão de qualquer aglomerado pode ser calculado como o efeito médio de suas mutações individuais vezes o número de mutações dentro desse aglomerado. Qualquer benéfico raro será rapidamente cancelado com alto nível de certeza. Uma vez que a grande maioria das mutações são deletérias, cada grupo de mutação terá um efeito cada vez mais negativo sobre a geração. No momento em que há apenas duas mutações por grupo de ligação, quase todas as mutações benéficas terão sido canceladas pelo menos por uma mutação deletéria ligada. À medida que mais mutações surgem nesse cluster, o efeito líquido será cada vez mais deletério (movendo progressivamente a distribuição da aptidão do aglomerado para a esquerda na figura da página anterior).
CAPÍTULO 5 - OS PROBLEMAS DA SELEÇÃO GENÔMICA PODEM SER SOLUCIONADOS?
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capítulo 6
Um olhar mais atento ao ruído Fato rápido: os problemas são muito piores do que você imagina!
Se você quisesse receber uma mensagem de rádio, você precisaria limitar a quantidade de “ruído”, ou estática. Se houver um forte sinal de interferência, a mensagem será perdida. É por essa razão que os governos podem “bloquear” programas de rádio que não querem que seu povo ouça. Da mesma forma, se os governos não regulam a frequência permitida para cada estação de rádio, as estações logo se tornam ruidosas entre si. A estática do rádio pode surgir de muitas fontes: outras estações de rádio, raios solares, radiação cósmica, ondas de rádio sendo refletidas pela cobertura das nuvens, motores elétricos correndo no bairro, walkie-talkies etc. Independentemente da fonte, o ruído resulta em perda de informação.
Um sinal muito fraco é facilmente destruído por qualquer quantidade de ruído. Quanto mais fraco o sinal e quanto maior o ruído, mais certa é a perda de informação. Uma baixa relação sinal/ruído sempre assegura a perda de informação. Quando recebemos um sinal mais ruidoso, a amplificação não nos ajuda. Aumentar o volume do seu rádio não ajudar a superar a estática. Acabamos amplificando a estática tanto quanto o sinal. Para garantir uma perda mínima de informação, deve haver uma relação sinal/ruído favorável. A razão pela qual a maioria dos nucleotídeos deve ser indetectável é por causa de proporções consistentemente baixas de sinal para ruído. Da mesma forma, a razão pela qual não podemos selecionar muitos nucleotídeos simultaneamente são relações cada vez menores entre sinal e ruído. De fato, uma das principais razões pelas quais a seleção não pode salvar o geUM SINAL MUITO noma é o barulho difundido. FRACO É FACILMENTE Quando aplicamos a seleção ao genoma inteiro, a relação sinal/ DESTRUÍDO POR ruído rapidamente se aproxima QUALQUER QUANTIDADE de zero. Consequentemente, o DE RUÍDO ruído supera os efeitos dos nucleotídeos individuais no quadro geral. Essa é a principal razão pela qual a seleção funciona no nível do gene, mas falha no nível do genoma. Em genética, a relação sinal/ruído é muitas vezes expressa em termos de “herdabilidade”. A herdabilidade é a importante diferença entre genótipo e fenótipo. Se uma característica tem alta herdabilidade, a maior parte da variação observada para esse traço é geneticamente hereditária, e é fácil de ser selecionada. A essência desse conceito de herdabilidade é simplesmente a proporção de variação hereditária versus não hereditária. A variação não hereditária se deve em grande parte à variação dentro de um ambiente individual do organismo, e é a fonte do ruído fenotípico. Assim, um valor de herdabilidade genética para uma característica é essencialmente equivalente a uma relação sinal/ruído. Por exemplo, qualquer diferença observada na inteligência de duas
CAPÍTULO 6 - UM OLHAR MAIS ATENTO AO RUÍDO
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pessoas será em parte devida às diferenças genéticas que podem ser passadas do pai para a criança, e em parte devido ao ambiente (isto é, nutrição, qualidade de formação etc.). Assim, a inteligência é determinada em parte pela natureza (capacidades herdadas), e em parte pela criação (características não herdada). Isso é igualmente verdadeiro para altura, velocidade, peso etc. Em certo sentido, a herdabilidade pode ser entendida como um reflexo da relação entre natureza e criação. Quando a herdabilidade é “1” para uma característica, aquele traço é 100% hereditário (por exemplo, tipo sanguíneo), e não é afetado absolutamente pelo ambiente. Se a herdabilidade é “0” para uma característica, essa característica não é herdada; é de natureza inteiramente ambiental (por exemplo, uma tatuagem). Um traço simples, como a altura, é geralmente bastante herdável (h² = 0,3). Isso significa especificamente que, para tal característica, 30% da variação fenotípica é variação hereditária (selecionável). Infelizmente, para traços muito complexos, como aptidão, os valores de herdabilidade são baixos (tão baixos quanto 0,004), e podem aproximar-se de zero (Kimura, 1983, p. 30-31). Isso ocorre porque a aptidão total combina todos os diferentes tipos de ruído de todos os diferentes aspectos do indivíduo e seus ambientes. Os estudos de Merila e Shelton (2000), e Kruuk et al. (2000), confirmam que os valores de herdabilidade para adaptação total são tipicamente pequenos demais para medir em populações naturais. Eles também mostram que tais valores baixos de herdabilidade são em grande parte devidos a interferência de fatores de ruído não herdáveis. Historicamente, se assumiu que valores de herdabilidade quase zero acontecia porque a seleção era tão extremamente eficiente que não havia variação genética em tais populações – portanto sem variação hereditária. Essa visão inocente não é mais viável – sabemos que formas de vida mais altas têm taxas de mutação muito altas e que a seleção falha em eliminar um grande espectro de mutações deletérias, assegurando alta variação genética. Isso também nasceu de estudos sem contagem molecular que mostram que populações naturais são tipicamente bem diversas geneticamente. Não é falta de variação genética, mas ruídos biológicos ubíquos que fazem com que os valores de herdabilidade adaptativa frequentemente sejam
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muito baixos para medir. Quando Kimura diz que a hereditariedade da aptidão é geralmente muito baixa, isso dignifica que quase toda a variação para a aptidão individual se deve a efeitos não herdáveis (não selecionáveis). Assim, quase toda a seleção para aptidão será desperdiçada. A baixa herdabilidade significa que eliminar fenótipos ruins por meio da seleção contribui muito pouco para realmente eliminar os maus genótipos. Considere as sementes caindo de uma árvore. Algumas sementes cairão em solo fértil, ideal para crescimento. Mas a maioria das sementes cairá em locais demasiado secos, muito molhados, com muitas ervas daninhas, muita sombra, com alta densidade populacional etc. O resultado será uma grande diversidade na saúde e no vigor das árvores resultantes, e grandes diferenças em sua sobrevivência e reprodução. Mas quase toda essa “seleção natural para o mais apto” será realmente apenas seleção para o mais sortudo, não o geneticamente superior. Assim, na maioria das situações naturais, a maior variação fenotípica na aptidão só se deve a ruído não genéticos, e terá muito pouco a ver com diferenças hereditárias. Isso é o que queremos dizer com baixa herdabilidade. A baixa herdabilidade em grande parte neutraliza a eficácia da seleção. Como um automóvel que possui um motor de corrida, mas uma transmissão quebrada, pode haver inúmeras seleções acontecendo, mas quase nenhum progresso genético. Vamos considerar adicionalmente o que está envolvido na variação não hereditária para a aptidão, fazendo referência à Figura 8a. A maior fonte de variação fenotípica é devido a diferentes indivíduos sendo expostos a diferentes ambientes. Obviamente, a variação no ambiente pode criar grandes diferenças entre os fenótipos individuais. Estima-se frequentemente que cerca de 50% de toda a variação fenotípica se deve meramente à variação ambiental. Se uma planta está crescendo melhor do que outra planta no mesmo campo, há uma alta probabilidade de que está crescendo melhor apenas porque está localizada num ponto mais favorável do solo. Esse aspecto da variação fenotípica É mostrada no setor 1 da Figura 8a. Esse tipo de variação interfere fortemente na seleção efetiva por meio da adição de ruído não hereditário e pela diminuição da relação sinal/ruído.
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A segunda maior parte da variação fenotípica é chamada de interação “ambiente-por-genótipo”. Estima-se frequentemente que representa cerca de 25% de toda a variação fenotípica. Dadas duas plantas no campo, se mudarmos o meio ambiente irrigando o campo, a água adicional pode ser boa para uma planta, mas ruim para outras, dependendo do seu genótipo. Esse tipo de variação não é consistentemente herdável. Como a variação ambiental, esse aspecto de variação fenotípica aumenta o ruído e interfere na seleção. Isso é mostrado como o setor 2 do gráfico em formato de pizza. A terceira maior parte da variação fenotípica é uma variação genética não hereditária. Isso pode soar como uma contradição, mas não é. Grande parte da variação genética se deve a fatores que não são transmitidos consistentemente de geração em geração. Esses fatores incluem efeitos epigenéticos (setor 3), efeitos epistáticos (4), efeitos de dominância (5) e efeitos genéticos sujeitos à seleção cíclica (6). Resumindo, a maior parte da variação genética não é hereditária, pelo menos não de forma linear e selecionável. A única fração de variação genética que é hereditária (e, portanto, potencialmente selecionável) é o que é chamado de variação genética aditiva (setor 7). Simplificando, a variação genética aditiva é onde um dado traço (ou nucleotídeo) é inequivocamente e consistentemente melhor que um traço alternativo (nucleotídeo) dentro da população. Para um traço complexo, como a aptidão, esse tipo de variação genética aditiva constitui uma parte muito pequena da variação fenotípica total. E se Kimura está correto ao afirmar que a capacidade de herdabilidade pode ser tão baixa quanto 0,004, então 0,4% de tal variação fenotípica seria selecionável. Isso representa uma relação sinal/ ruído de cerca de 1:250. Uma maneira de expressar isso é que 99,6% da seleção fenotípica para aptidão será inteiramente desperdiçado. Isso explica por que a seleção simples para a aptidão fenotípica total pode resultar em quase nenhum ganho genético. Se temos um traço, como a aptidão, que tem baixa herdabilidade (Figura 8a), e temos uma espécie de baixa fertilidade como o homem (Figura 8b), podemos ver que apenas uma pequena parte de uma população pode ser usada para a seleção efetiva (Figura 8c). Se pudermos eliminar seletivamente
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apenas cerca de 16,7% de uma população, e se somente 0,4% dessa seleção é realmente efetiva, então apenas 0,07% dessa população pode ser empregada para a eliminação seletiva verdadeiramente eficaz. Em outras palavras, menos de 1 pessoa em 1.000 está disponível para a eliminação eficaz de todas as mutações deletérias e para a fixação efetiva de quaisquer mutações benéficas possíveis. A herdabilidade para um único traço, como a aptidão total, pode ser notavelmente pequena, mas a herdabilidade de um nucleotídeo típico é infinitamente menor. Consideremos a herdabilidade de uma mutação de um único nucleotídeo, uma aplicação heterodoxa, mas útil do conceito de hereditariedade. O “sinal” (isto é, o valor hereditário de aptidão aditiva de um tal nucleotídeo) é inerentemente muito pequeno para ser medido. Mas o “ruído” é astronômico. É o efeito combinado de todos os componentes não herdáveis da variação mais os efeitos de todas as outras posições nucleotídicas segregantes! Numa população típica, há milhões de outros nucleotídeos. Assim, o efeito de um único nucleotídeo se perderá constantemente em um oceano de ruído, com relações sinal/ruído sendo consistentemente menos de um para um milhão. A herdabilidade de tal nucleotídeo não é significativamente diferente de zero, o que explica por que a maioria dos nucleotídeos são inerentemente não selecionáveis e devem ser denominados quase neutros pela definição de Kimura (e Ohta) (veja Capítulo 2). Outra fonte importante de ruído é a seleção de probabilidade, não seleção de limiar. Como criador de plantas eu registraria centenas de plantas quanto ao seu fenótipo (rendimento, vigor, resistência à doença etc.), e então as classificaria da melhor à pior. Eu decidiria a fração da população que desejasse eliminar, desenhando uma linha através da posição no nível desejado e manteria apenas aquelas plantas que estiverem acima da marca. Isso é chamado de “seleção de truncamento” e é usado por criadores porque é especialmente eficaz. Contudo, esse tipo de seleção nunca acontece na natureza. A seleção natural é sempre baseada apenas na probabilidade. A natureza não tabula cada membro de uma população de algum fictício “valor de aptidão total” com base no desempenho fenotípico de todos os traços combinados.
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A natureza não classifica então todos os indivíduos. Por fim, a natureza não desenha uma linha e elimina todos os indivíduos que estão abaixo dessa linha. Em vez disso, os indivíduos inferiores fenotipicamente têm simplesmente uma probabilidade ligeiramente menor de reprodução do que as outras. Muitas vezes, por acaso, o indivíduo inferior se reproduz, e o indivíduo superior não. De fato, existe apenas um modesto coeficiente de correlação que relaciona a superioridade fenotípica com o sucesso reprodutivo. Quanto mais reprodutivo for o ruído (isto é, sobrevivência/acasalamento aleatório), mais fraca se torna a correlação, e menos certo se torna que um indivíduo superior seja realmente favorecido na reprodução. Se desqualificarmos realisticamente todos os tipos de seleção de truncamento do modelo evolutivo, o resultado é a adição de um novo nível de ruído, o que reduz ainda mais a eficácia da seleção. A impotência geral da verdadeira seleção natural (seleção de probabilidade) pode ser facilmente ilustrada. Imagine uma população de camarões nadando em massa, e uma baleia vem e engole metade da população em uma mordida. Esse é um exemplo de sobrevivência do mais apto entre os camarões? Havia uma classificação precisa da maioria dos que se encaixam no menos adequado, seguida de um tipo de seleção? Alternativamente, imagine uma grande massa de ovos de rã em um rio. Um grande número de ovos é comido pelos peixes, mesmo antes de ser chocados. Um grande número de girinos é apanhado por pássaros, um barco é lançado e esmaga algumas centenas mais, e muitos outros são varridos por uma cachoeira. Muitos girinos adultos são enterrados em um banco de lama que posteriormente é removido por uma operação de dragagem, e a maior parte dos adultos sobreviventes são apanhados por mais predadores. Quase toda a eliminação foi aleatória. Mais uma vez, estamos vendo a sobrevivência dos mais sortudos. Então, onde está a classificação sistemática por fenótipo? Está em grande parte ausente! Há um enorme elemento de ruído, não apenas em determinar quem tem o melhor fenótipo, mas também em termos de sobrevivência e reprodução diferenciais. O ruído afeta o sucesso reprodutivo, apesar do fenótipo, e esse ruído é superior e está acima do ruído que consideramos na seção sobre herdabilidade. Assim sendo, nunca devemos modelar a seleção do truncamento em qualquer
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cenário honesto de seleção. Além disso, devemos usar honestamente um coeficiente de correlação relativamente baixo ao calcular a probabilidade de que um fenótipo superior irá se reproduzir. Talvez 50% da falha reprodutiva seja independente do fenótipo (Figura 8b). Há um terceiro nível de ruído genético chamado de amostragem genética. Essa é a variação estatística associada a pequenos tamanhos populacionais. Se você atirar uma moeda muitas vezes, irá previsivelmente obter cerca de 50% caras e 50% coroas. No entanto, se você jogar a moeda apenas 10 vezes, há uma boa chance de que você não terá 50/50. A frequência de cada resultado possível é prontamente predita usando-se gráficos de probabilidade. Esse mesmo tipo de variação estatística ocorre quando um gene ou nucleotídeo está segregando dentro de uma população. As segregações genéticas tendem a ser altamente previsíveis em populações maiores, mas vão flutuar muito significativamente em populações menores, assim como os resultados de uma série de lançamentos de moedas. Tais flutuações estatísticas resultam no que é chamado de deriva genética. Isso significa que as frequências dos genes podem mudar independentemente da presença ou ausência de seleção. Esse simples elemento de probabilidade de frequências genéticas flutuantes é bem estudado. Tradicionalmente, os geneticistas populacionais têm lidado com o ruído genético apenas ao nível deste último tipo de ruído, a amostragem gamética (flutuações de probabilidade), que é muito sensível ao tamanho populacional. A deriva genética aleatória é muito forte e pode se sobrepor aos efeitos de mutações até mesmo de mutações substanciais em populações pequenas. É por isso que as populações de espécies ameaçadas de extinção estão especialmente sujeitas ao que é chamado de colapso mutacional. Em populações pequenas, a seleção é largamente suspensa. É com base na amostragem gamética que Kimura definiu suas mutações quase neutras. É por essa mesma razão que Kimura calculou o tamanho de seu quadro de não seleção (Figura 3d) como uma função simples do tamanho populacional (aproximadamente 1/2N). É muito atraente para o teórico genético limitar a consideração do ruído apenas à amostragem gamética. Isso porque é possível convenientemente
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fazer com que o ruído da amostragem dos gametas desapareça em grande parte simplesmente imaginando populações maiores. Ao mesmo tempo, o teórico pode “mandar embora” a própria seleção periodicamente, invocando episódios de alto ruído associados a pequenos gargalos populacionais (por exemplo, a teoria “Fora da África”). A amostragem gamética é apenas uma pequena parte do ruído genético total, e os outros dois aspectos importantes do ruído genético (ruídos que afetam o fenótipo e o sucesso na reprodução) são apenas parcialmente diminuídos em grandes populações. Não podemos “mandar embora” o barulho invocando tamanhos populacionais maiores. O ruído sempre está presente, e é muito mais elevado do que normalmente reconhecido pelos geneticistas populacionais. De fato, populações muito grandes invariavelmente intensificam o ruído. Isto se deve em parte à subestrutura da população (muitas subpopulações menores, cada uma com suas próprias flutuações de amostragem gamética). É também porque as populações maiores se estendem sobre uma escala mais vasta de ambientes, tornando-se sujeitas a uma variação ambiental ainda maior. O grande tamanho populacional não reduz os elementos aleatórios de reprodução, nem reduz o mascaramento fenotípico do genótipo. O ruído sempre permanece como uma severa restrição à seleção natural. Sob condições artificiais, criadores de plantas e animais são capazes de selecionar com muito sucesso um número limitado de traços. Eles têm feito isso empregando planejamento inteligente para minimizar deliberadamente o ruído. Têm usado técnicas de bloqueio, replicação, análise estatística, seleção de truncamento e ambientes altamente controlados. A seleção natural não faz nada disso. É, por definição, um processo cego e descontrolado, sujeito ao ruído sem restrições e a flutuações aleatórias ilimitadas. Quais são as consequências genéticas de todo esse ruído? Quando percebemos que altos níveis de ruído genético são inevitáveis, vemos que não podemos afastar a caixa de não seleção da Figura 3d, nem sequer invocando maiores tamanhos populacionais. À medida que viemos a perceber que há dois níveis inteiros de ruído acima e além da amostragem gamética, percebemos que a caixa deve ser corrigida (veja Figura 9). A caixa de não seleção de
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Kimura deve ser expandida significativamente, com base na correlação imperfeita entre genótipo e fenótipo, e com base na correlação imperfeita entre fenótipo e sucesso reprodutivo. O resultado dessas duas correlações imperfeitas é que o número de posições nucleotídicas quase neutras (não selecionáveis) é maior do que normalmente percebido, e sua abundância não é estritamente dependente do tamanho da população. O pequeno tamanho da população certamente agrava o problema do ruído, mas o grande tamanho da população não pode eliminar esse problema (para discussão mais detalhada, veja o Apêndice 5). A existência generalizada de ruído genético grave amplifica virtualmente todos os meus argumentos anteriores sobre os limites da seleção. A caixa de não seleção de Kimura torna-se maior (Figura 9) porque, de outra forma, o número de mutações menores torna-se quase-neutra e não selecionável. O problema do limiar de seleção, em que a seleção simultânea de muitos traços resulta em uma completa cessação do progresso, acontecerá muito mais cedo por causa dos altos níveis de ruído. Por último, o problema do ruído resultará em que a maior parte dos “dólares de seleção” serão completamente desperdiçados (Figuras 8a-c). Isso aumenta muito o custo real da seleção, e aumenta muito os limites reais que o “custo” coloca sobre qualquer cenário de seleção. Para obter uma compreensão mais intuitiva do problema do ruído, podemos retornar a algumas de nossas analogias visuais. Em termos da evolução do nosso carrinho vermelho, tente imaginar uma situação em que o desempenho do carrinho foi influenciado muito mais por erros do trabalhador na linha de montagem do que pelos erros tipográficos no manual de montagem. Você percebe que o agente de controle de qualidade estaria desperdiçando seu tempo e recursos selecionando variações “não herdáveis”? em termos de nossa princesa, o problema do ruído é como ter inúmeros caroços do tamanho de uma ervilha em seus colchões. Isso não aumentaria o problema dela? Em termos de nosso livro de química, o problema é semelhante a não ter a maioria dos tipos do livro passados para o próximo ciclo de impressão. Isso reduziria ainda mais a correlação já bastante pequena entre os erros e o desempenho dos alunos. Em todos esses exemplos, quando acrescentamos
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qualquer nível razoável de ruído, esses cenários já absurdos apenas tornam-se ainda mais impossíveis! O falecido Stephen Jay Gould, como Kimura, argumentou contra o ponto de vista da seleção estrita da evolução. Em termos de sobrevivência de espécies inteiras, ele reconheceu a importância de desastres naturais, da “sobrevivência do mais sortudo” e do ruído. O que Gould e Kimura parecem não ter percebido é que, se o ruído rotineiramente substitui a seleção, a evolução a longo prazo é impossível e garante a degeneração genética e a eventual extinção.
atualização de 2014
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Desde as primeiras edições deste livro, meus colegas e eu temos desenvolvidos estudos detalhados sobre o papel do ruído em limitar a eficácia da seleção natural. Utilizamos o programa Contador de Mendel (Mendel’s Accountant) para fazer estudos de simulações numéricas. Temos demonstrado que níveis realistas de ruído biológico aumentam dramaticamente o tamanho da zona de não seleção de Kimura. A zona de não seleção aumenta em largura em aproximadamente 1000 vezes, tanto para mutações deletérias como benéficas. Geneticistas de população que não levam em conta os efeitos profundos do ruído estão enganando a si mesmos e seus leitores. Veja Gibson et al. (2013), e Sanford et al. (2013).
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Fontes de variações fenotípicas para “aptidão” 5
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Figura 8a
A fonte primária de variação feFontes de variação fenotípinotípica é a variação (setor 1). Essa ca. variação não é hereditária, e interfere na seleção. A segunda fonte principal de variação é a interação do ambiente com o genótipo (2). Essa variação também não é hereditária, e interfere na seleção. Dentro do componente genético da variação, há variação devido a: epigenética (3), epistasia (4) e dominância (5). Nenhum desses componentes genéticos é hereditário, e todos eles interferem na verdadeira seleção de longo prazo. Por último, existem outros componentes que de outro modo seriam selecionáveis, mas “neutralizados”, quer por processos homeostáticos ou por elementos como a seleção cíclica (6). Todos esses componentes não herdáveis são responsáveis pela maior parte da variação fenotípica. Isso deixa a variação genética aditiva como um componente insignificante da variação fenotípica (7). Para um traço fenotípico muito geral, como a aptidão reprodutiva, a variação aditiva pode representar menos de 1% da variação fenotípica total (Kimura, 1983, p. 30-31). Em outras palavras, mais de 99% de qualquer eliminação seletiva baseada na superioridade fenotípica é totalmente desperdiçada. Toda variação que não se deve à CAPÍTULO 6 - UM OLHAR MAIS ATENTO AO RUÍDO
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variação genética aditiva realmente funciona muito poderosamente contra a seleção efetiva.
Porcentagem de pessoas disponíveis para remoção seletiva
Figura 8b
Quantas pessoas podem ser seletivamente eliminadas?
Apenas uma proporção limitada de qualquer população (o excedente populacional) pode ser eliminada seletivamente. Dada a atual taxa global de reprodução (três filhos por casal), dois terços de todas as crianças devem se reproduzir por substituição simples. Isso deixa, no máximo, um terço das crianças disponíveis para a eliminação seletiva da reprodução. No entanto, uma fração significativa (talvez metade) do excedente da população não reproduz por causas inteiramente aleatórias como guerra, acidentes e escolha, que não têm nada a ver com o fenótipo. Assim, apenas cerca de um sexto (16,7%) da população humana está realmente disponível para qualquer potencial eliminação. Isso está de acordo com a estimativa de Haldane de que apenas 10% de uma população humana está realmente disponível para seleção.
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Porcentagem de pessoas disponíveis para remoção seletiva por “aptidão”
Figura 8c
Quantas pessoas que foram seletivamente removidas eram realmente melhores geneticamente? A eliminação seletiva dentro de populações humanas com base na aptidão fenotípica (um traço muito geral) tem uma efetividade que se aproxima de zero. Isso é visto quando combinamos as Figuras 8a e 8b. Dos 16,7% da população humana teoricamente disponíveis para remoção seletiva com base em menos de 0,4% de tal remoção resultará em qualquer efeito herdável sobre gerações futuras. Isso significa menos de 0,1% (16,7% x 0,4% = 0,07%) da população total estaria disponível para seleção efetiva. Essa é uma fração muito pequena para ser representada com precisão nesse tipo de gráfico. Em certo sentido, isso significa que menos de uma pessoa em mil pode ser removida por eliminação verdadeiramente efetiva, seletiva e reprodutiva. Mesmo que alguém como Hitler “assassinasse” tantos seres humanos fenotipicamente “inferiores” quanto fosse possível a cada geração, isso resultaria em progressos seletivos insignificantes para algo tão geral como “aptidão”. Essa conclusão é uma extensão lógica de baixas taxas de fecundidade humana e a herdabilidade extremamente pobre de um traço tão complexo quanto a aptidão (Kimura, 1983, p. 30-31).
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Frequência
O ruído aumenta o “quadro de não seleção”
Efeito de Mutação
Figura 9
Níveis realistas de ruído biológico expandem consideravelmente a “zona de não seleção” de Kimura
O quadro de não seleção de Kimura, como mostrado na Figura 3d, se baseia em uma estimativa mínima de ruído (isto é, apenas aquele atribuível à amostragem de gametas). Esse é o modelo quase neutro clássico, mas essa visão não reconhece todas as fontes de ruído. Portanto, o quadro clássico de Kimura não é muito pequeno. Precisamos primeiro expandir nosso quadro de não seleção por causa da herdabilidade insignificante, que surge da correlação imperfeita entre genótipo e fenótipo (mais de 99% da variação fenotípica pode ser não hereditária [Figura 8a]). Precisamos então expandir nosso quadro de não seleção para considerar a correlação imperfeita entre a superioridade do fenótipo e o sucesso reprodutivo que surge dos aspectos aleatórios da reprodução (Figura 8b). Essas são as principais fontes de ruído. Quando considera-
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mos todas as fontes de ruído, percebemos que o verdadeiro “quadro de não seleção” é amplo, e que não pode ser descartado simplesmente invocando populações grandes.
CAPÍTULO 6 - UM OLHAR MAIS ATENTO AO RUÍDO
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capítulo 7
Mecanismos de resgate artificial? Fato rápido: “mecanismos de resgate” desenvolvidos falham no teste de realidade.
A informação líquida dentro do genoma está aumentando ou diminuindo? Podemos, na melhor das hipóteses, balançar as mãos enquanto especulamos sobre como a seleção pode sintetizar novas informações. Isso é inerentemente hipotético. Em certo sentido, essa se torna uma questão filosófica, e não é realmente objeto de análise científica. Argumentos fortes podem ser apresentados contra a mutação/seleção criar novas informações, mas os teóricos sempre podem especular o contrário (é muito difícil provar que algo nunca pode acontecer). No entanto, creio que o aspecto “declinante” do genoma está sujeito a análise científica real. É por essa razão que me concentrei no assunto da degradação de informação. Creio que está sujeito a uma análise concreta. Tal análise argumenta de forma convincente que a informação líquida deve ser declinante. Se isso for
verdade, mesmo se puder ser mostrado que há casos específicos em que novas informações poderiam ser sintetizadas por meio de mutação/seleção, isso ainda não teria sentido, uma vez que novas informações rapidamente começarão a degenerar novamente. A direção da rede ainda seria declinante, e os genomas complexos nunca poderiam surgir espontaneamente. Se o genoma está realmente degenerando, essa é má notícia para o futuro da raça humana a longo prazo. Também é uma má notícia para teoria da evolução. Se a mutação/seleção não puder preservar a informação já existente dentro do genoma, é difícil imaginar como poderia, em primeiro lugar, criar toda essa informação! Não podemos racionalmente falar de construção do genoma quando há uma perda líquida de informação a cada geração! Deter a degeneração é apenas uma pequena etapa de pré-requisito antes que a questão muito mais difícil da construção de informação possa ser razoavelmente aberta para discussão (veja o capítulo 9). Nas últimas décadas, a preocupação com a taxa de mutação vem crescendo entre os geneticistas, uma vez que se tornou cada vez mais claro que a taxa de mutações deletérias deve ser muito maior do que uma pessoa por geração (Neel et al., 1986). Uma forma de os teóricos desconsiderarem esse proS E O G E N O M A E S TÁ blema tem sido afirmar que a maior REALMENTE DEGENERANDO, parte do DNA, na verdade, é não informação, daí a maioria das mutaE S S A É M Á N O T Í C I A PA R A ções serem de efeito perfeitamente O FUTURO DA RAÇA neutro. Por essa lógica, se a taxa HUMANA A LONGO PRAZO. real de substituição de nucleotídeos for de 10 por pessoa e, em seguida, definir-se 98% do genoma como DNA lixo, a taxa de mutação eficaz deve ser apenas 0,2 por pessoa. Assim, o número normalmente citado na mídia e nos livros didáticos seria 0,2, e não 10. No entanto, como a taxa conhecida de mutação tem aumentado, e como a porcentagem reconhecida de DNA funcional tem vindo a aumentar, mesmo esse raciocínio não conseguiu explicar o problema da degeneração genética. Neste ponto, dois “mecanismos de escape”
CAPÍTULO 7 - MECANISMOS DE RESGATE ARTIFICIAL?
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primários foram inventados na esperança de resgatar a teoria neodarwiniana. O primeiro mecanismo pode ser chamado de “mecanismo de contagem de mutações”, e o segundo, “mecanismo de epistasia sinérgica”.
O mecanismo de contagem de mutações O Dr. Crow (1997) popularizou um argumento desenvolvido pela primeira vez por Muller. Crow reconheceu que em qualquer população quando a taxa de mutações deletérias se aproxima de 1 por indivíduo, tais mutações devem começar a se acumular, e a aptidão populacional deve diminuir. No entanto, como o número total de mutações acumuladas por pessoa torna-se bastante grande, ele percebeu que alguns indivíduos teriam significativamente mais mutações do que outras (devido ao acaso). Ele propôs que, centrando a seleção contra esses indivíduos, alguém poderia varrer um número desproporcional de mutações. A consequência seria que mais mutações na população seriam eliminadas a um menor “custo” para a população (cf. Apêndice 1). Eventualmente, o número de mutantes por pessoa poderia então ser estabilizado, e o declínio na aptidão diminuiria. O mecanismo proposto por Crow pode ser chamado de “mecanismo de contagem de mutações” (MCM), porque exige que a natureza conte as mutações de cada indivíduo e, em seguida, concentre toda a seleção contra os indivíduos de alta contagem de mutações. Como mencionado anteriormente, todos nós somos altamente mutantes; assim, a seleção deve estar entre indivíduos “mais mutantes” e indivíduos “menos mutantes”. Há duas maneiras de decidir. A primeira, de menor importância, é a pergunta: “Quem possui mais mutações?” A segunda, de importância primária, é a pergunta: “Quem possui as piores mutações?” O modelo descrito por Crow considera apenas a primeira, ignorando a última. O modelo de Crow é uma construção imaginária evidentemente projetada para obscurecer um grande problema teórico. Sendo que cada um de nós é composto de genes que representam uma amostragem mais ou menos aleatória do “pool genético” humano, cada um de nós deveria ter quase o mesmo número total de mutações acumuladas
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por pessoa. A diferença real no número total de mutações entre duas pessoas será bastante trivial, representando apenas a amostragem de variações (isto é, variações menores da média da população). Sabemos disso porque essas mutações vêm se acumulando e se misturando dentro do “pool genético” por muitas gerações. Tais mutações têm crescido de maneira muito abundante, e a contagem de mutação deve ser bastante homogênea. Assim, a “contagem de mutações” será uma variável muito menor em termos de diferenças na aptidão entre os indivíduos. As diferenças genéticas na aptidão que vemos entre os seres humanos não são devidas ao número de mutações de um indivíduo. Em vez disso, diferenças substanciais na aptidão se devem aos efeitos específicos de relativamente poucas diferenças genéticas de alto impacto. Apenas uma pequena mutação pode ofuscar os efeitos de milhares de mutações quase neutras. Uma pessoa pode ter milhares de mutações menos do que outra, mas apenas uma mutação específica ainda pode fazer essa pessoa muito menos apta. Portanto, a ideia de contar o número total de mutações por indivíduo e, em seguida, selecionar indivíduos de alta contagem, não é um mecanismo razoável para se livrar das mutações. Esse conceito parece ter sido inventado como um artifício matemático para tentar racionalizar como se livrar de mais mutações, usando menos custo de seleção. Embora esse processo possa estar operando em uma extensão muito limitada na natureza, claramente não é o que está geralmente acontecendo. O mecanismo de contagem de mutações agora foi rigorosamente falsificado por meio de experimentos de simulação numérica (Brewer et al., 2013a). Dado qualquer configuração de parâmetros que seja remotamente realista biologicamente, a contagem de mutações por indivíduo aumenta linearmente ao longo do tempo, e a aptidão declina continuamente (Figura 10a).
O mecanismo de epistasia sinérgica O segundo mecanismo de resgate é o “mecanismo de epistasia sinérgica”. Esse mecanismo é muito semelhante ao mecanismo de contagem de muta-
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ções pelo fato de que essa seleção é artificialmente focada contra indivíduos com alto índice de mutação. No entanto, o mecanismo é mais complicado, e presume que, como as mutações deletérias se acumulam, as mutações amplificam o efeito deletério dos outros (é isso que significa “epistasia sinérgica”). Isso logicamente deveria acelerar a degeneração genética. Contudo, alguns imaginam que, como o dano mutacional ao genoma acelera, a seleção pode de alguma forma tornar-se mais efetiva, sendo mais especificamente dirigida contra indivíduos com maior número de mutações. O mecanismo de epistasia sinérgica tem toda a aparência de ofuscação deliberada. A terminologia extravagante é frequentemente usada para esconder um problema. Epistasia sinérgica significa que as mutações interagem tanto que várias mutações causam mais dano coletivamente do que seria previsível com base nos seus efeitos individuais. Esse tipo de interação entre mutações pode acontecer, mas é a exceção da regra – todos os geneticistas concordam que normalmente as mutações interagem ou aditivamente ou multiplicativamente. Não há razão para pensar que num nível genômico o modo primário de interação entre as mutações poderia envolver epistasia sinérgica. Pelo menos um artigo proveu evidência experimental contra a epistasia sinérgica generalizada (Elena e Lenski, 1997). Na medida em que há uma quantidade substancial de epistasia sinérgica acontecendo, isso torna a situação genética pior, não melhor. Sempre soubemos que as unidades gênicas interagem e sabemos que tal epistasia é um enorme impedimento para a seleção efetiva. Este fato é normalmente ignorado pela maioria dos geneticistas porque os cenários de seleção tornam-se irremediavelmente complexos e inoperantes a menos que tais interações sejam convenientemente postas de lado. Mas agora, quando as interações genéticas podem ser usadas para nublar o problema da catástrofe errática, a versão modificada do conceito é convenientemente trazida à tona e usada de uma maneira extremamente difusa e vaga, como uma cortina de fumaça. Mas olhemos através da fumaça. Se mutações múltiplas realmente se combinam para criar dano de uma maneira ascendente e não-linear, a catástrofe errática aconteceria muito antes e as populações se espiralariam fora de controle e num colapso mutacional muito mais rápido. Nós já estaríamos ex-
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tintos! Estamos olhando para um “truque de mãos” conceitual que claramente não se aplica ao mundo real e que visa apenas apoiar o Axioma Primário. O mecanismo de epistasia sinérgica já foi formalmente falseado usando-se experiências de simulação numérica (Baumgardner et al., 2013). O que se vê é que mesmo quando há forte epistasia sinérgica, não se consegue controlar o acúmulo de mutações deletérias. Em vez disso, ele causa degeneração genética acelerada e rápida extinção – assim como a lógica sugere (veja a Figura 10b). Os dois principais mecanismos de escape que os teóricos têm tradicionalmente usado para resgatar o Axioma Primário são artificiais, criados, e são profundamente irrealistas biologicamente. Ambos foram rigorosamente falseados (Brewer et al., 2013a; Baumgardner et al., 2013). A lógica e meticulosos experimentos de simulação numérica mostram que a maioria das mutações deletérias devem escapar da seleção purificadora. Isso leva a um aumento linear no número de mutações ao longo do tempo e a um declínio contínuo na aptidão. Esse fato tem sido extensivamente documentado por meio simulações numéricas de biologicamente realistas (Gibson et al., 2013). Da mesma forma, a maioria das mutações benéficas escapam à seleção positiva, exceto por uns poucos benefícios muito raros que têm alto impacto (Sanford et al., 2013). Esses benefícios isolados de alto impacto permitem episódios adaptativos, mas essas raras anomalias ocorrem mesmo quando o restante do genoma está passando por degeneração sistemática. Neste momento, devemos ver claramente que o Axioma Primário não é “inerentemente verdadeiro”, nem é “óbvio” para todas as partes, pelo que é muito claro que deve ser rejeitado como axioma. Além disso, o que resta, a “Hipótese Primária” (a mutação/seleção pode criar e manter genomas), não possui qualquer apoio! De fato, múltiplas linhas de evidência indicam que a “Hipótese Primária” é claramente falsa e deve ser rejeitada.
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Três estudos recentes alegam ter resolvido o problema da taxa de alta mutação (Lesecque et al., 2012; Charlesworth, 2013; e Qui et al., 2014). Conforme mostrado abaixo, essas alegações não a t u a l i z a ç ã o são confiáveis. Além disso, nenhum desses estudos d e 2 0 1 4 aborda o problema muito mais profundo das mutações quase neutras, que são mutações com efeitos de aptidão abaixo da seleção limiar – que devem se acumular sem limites. Mesmo que esses autores pudessem resolver o problema da elevada taxa de mutações, o problema da mutação quase-neutra ainda resultaria em entropia genética. O artigo de Qui et al. envolveu simulações numéricas muito semelhantes ao nosso próprio trabalho. No entanto, as simulações numéricas não produzem resultados a menos que as configurações de parâmetros realistas sejam usadas. Sua análise assumiu a seleção de truncamento artificial, hereditariedade perfeita e zero ruído biológico. Esse conjunto de configurações de parâmetros expressa de maneira distorcida a realidade biológica. Com base em nossas próprias análises, sabemos que essa combinação de configurações produzirá um limite de seleção que é aproximadamente mil vezes mais baixo (em comparação com a seleção de probabilidade natural). Esses autores combinaram tais configurações irrealistas com uma taxa irreal de mutação benéfica (10%). O resultado foi que a maioria das mutações deletérias foram eliminadas por seleção de truncamento rigorosa e, então, pequenas mutações benéficas poderiam ser ampliadas para contrabalançar as mutações deletérias que ainda se acumulam. Se eles voltassem e examinassem a contagem de mutações em seu experimento, estamos seguros de que as mutações deletérias ainda superariam em número as mutações benéficas. Se fizéssemos uma simulação numérica que falseasse a realidade biológica e eliminasse o problema da mutação, usaríamos exatamente a mesma configurações de parâmetros que eles usaram. Mas essas configurações de parâmetros não refletem a realidade biológica. Para ser honesto, esses autores precisam voltar e fazer o mesmos
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experimentos com configurações realistas (isto é, usando a seleção de probabilidade e uma taxa muito mais baixa de benefícios). Isso deve produzir resultados muito semelhante às nossas próprias simulações, validando a realidade da entropia genética. Os dois artigos, de Charlesworth e de Lesecque et al., iniciam estabelecendo claramente que os geneticistas de populações realmente têm um grande problema teórico associado à acumulação de mutação deletéria. Eles tentaram resolver esse problema. Infelizmente formularam o problema no contexto dos tradicionais cálculos de “carga genética” que estão mal correlacionados com a realidade e que exigem uma longa lista de hipóteses simplistas irrealistas. Ambos os artigos seguem a longa tradição de tentar forçar a dinâmica de populações complexas em algumas fórmulas algébricas simplificadas em excesso. Seus artigos realmente não explicam como a seleção pode eliminar mutações deletérias tão rapidamente como se acumulam. Em vez disso, eles evitam o problema principal (acumulação de dano genético) obstruindo deliberadamente as definições de aptidão, efeitos de mutação e seleção. Desta forma, o problema da entropia genética parece desaparecer na resultante ambiguidade. Os dois artigos recorrem ao conceito biologicamente irrealista de “seleção suave” (que é mais bem nomeado como “mutação suave”), que foi desenvolvido há três décadas por Wallace. Ele queria lidar com o problema tradicional da “carga genética” (um conceito semelhante à entropia genética, porém mais limitado), e então criou um modelo de realidade extremamente irreal. Em seu mundo imaginário, a aptidão populacional é fixa (dependendo apenas dos recursos ecológicos disponíveis), e mutações deletérias não envolvem perdas objetivas de função – só afetam a posição competitiva relativa dentro da população atual (ou seja, seleção sexual). Esses dois pressupostos fundamentais (aptidão fixa e efeitos mutacionais que são apenas relativos) são categoricamente falsos. É nesse fundamento ilusório que Wallace baseou seus argumentos há três décadas, e os autores atuais se baseiam em seus cálculos. Para se obter uma ideia da falta de realidade do que é alegado, a “seleção suave” assume: 1) que a aptidão populacional é fixa, sendo constante,
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independentemente das mutações acumuladas; 2) que todas as mutações são apenas “relativas” (neutras em termos de funcionalidade biológica total), e não causam danos genéticos objetivos; e 3) que todas as mutações só afetam a posição social (por exemplo, a seleção sexual). O artigo de Lesecque et al. explica os seus pressupostos: a) o número de mutações por indivíduo é estático e conhecido (U/s); b) a frequência média de mutação é estática e conhecida (u/s); c) todas as mutações são totalmente selecionáveis e todos têm o (s) efeito (s) de aptidão idêntico. Eles também não assumem nenhuma ligação e apenas interações de mutação multiplicativa. Esses tipos de modelos não possuem correspondência com o mundo biológico real. O modelo de seleção suave pretendia ser uma tela de fumaça quando foi criado por Wallace. A seleção suave ainda está sendo usada como tela de fumaça desses autores hoje. A “seleção suave” desvia a atenção da dura realidade de acumular danos genéticos. Em alguns casos raros, esse tipo de seleção suave acontece por certos traços isolados. Por exemplo, numa cultura onde o cabelo loiro é preferido, pessoas loiras podem reproduzir mais do que morenas. Neste caso acumular mutações que afetam a cor do cabelo obviamente não ameaça a extinção das espécies. Casos isolados de seleção suave não tem relação com o problema da degeneração genética que afeta todo o genoma e a necessidade de quantidades maciças de seleção purificadora. Esses autores precisam saber que a seleção “dura” (real) é necessária para lidar com a acumulação de mutações deletérias. Eles estão usando a abstração matemática para criar um mundo de “faz-de-conta” onde a degeneração genética nem mesmo é viável. Estão usando truques conceituais, não para resolver um problema, mas para escondê-lo. Eles parecem estar empenhados em resgatar o Axioma Primário a qualquer custo. A óbvia não realidade desses modelos recentes deixa claro que o campo está desesperado e fazendo todo o possível para manter seus pressupostos.
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Figura 10a
Experimentos de simulação numérica testam a validade do “mecanismo de contagem de mutações” (MCM). De Brewer et al., 2013a. Acúmulo médio de mutações por indivíduo (superior) e o histórico de aptidão (inferior) para três experimentos MCM. A aptidão fenotípica dependia unicamente da contagem de mutações, ou seja, todas as mutações tinham o mesmo efeito (-0,001), e nenhum ruído ambiental foi adicionado. Modos de seleção eram a) seleção perfeita de truncamento; b) seleção de probabilidade perfeita e c) seleção de truncamento, mas sem recombinação sexual. Dada a seleção de probabilidade realista (traços longos), as mutações foram acumuladas em taxa constante e a aptidão declinou conCAPÍTULO 7 - MECANISMOS DE RESGATE ARTIFICIAL?
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tinuamente, ao ponto de extinção. O mesmo foi observado com a seleção de truncamento artificial (quando assumida a reprodução assexuada). No entanto, a contagem de mutações e a aptidão estabilizou-se rapidamente quando a seleção de truncamento foi combinada com efeitos de aptidão uniforme de todas as mutações, devido ao efeito MCM. O MCM funciona, mas apenas em condições extremamente não realistas. Qualquer nível de realismo biológico aboliu o efeito MCM, levando a um contínuo declínio genético. Qualquer um dos seguintes irá inativar este dispositivo altamente artificial: A) uma distribuição de efeito mutação natural (incluindo quase neutras), ou b) Seleção de probabilidade, ou c) reprodução assexuada. A seleção de probabilidade é o que acontece na natureza, enquanto a seleção de truncamento é o que acontece na criação artificial. Tudo isso mostra que o MCM não é operacional sob condições realistas e só pode operar sob circunstâncias muito artificiais (Brewer et al., 2013a).
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Figura 10b
Experimentos de simulação numérica testam a validade do “mecanismo de epistasia sinérgica”
De Baumgardner et al., 2013. Acúmulo média de mutações por histórico individual (superior) e histórico de aptidão (inferior) para quatro experimentos de epistasia sinérgica (SE, na sigla em inglês). Todos os quatro experimentos empregaram pressões de seleção extremamente exagerados e interações de SE extremamente exageradas. Os quatro experimentos envolveram: (1) nenhum efeito SE, (2) efeitos SE que assumem que todas as interações não são vinculadas, (3) efeitos SE de interações vinculadas e não vinculadas e (4) efeitos SE, assumindo que todas as interações são não vinculadas, mas com um CAPÍTULO 7 - MECANISMOS DE RESGATE ARTIFICIAL?
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fator de escala três vezes maior. Todos os casos aplicaram a seleção de truncamento, hereditariedade genotípica perfeita e uma fertilidade de 2,0 (o que implica que 50% da prole em cada geração são selecionados para fora). Mesmo sob essas condições ideais, o mecanismo SE não fez nada para interromper o acúmulo de mutações, mas apenas o declínio da aptidão acelerada. Se o mecanismo SE foi efetivo, a contagem de mutações por indivíduo teria parado de aumentar e a aptidão teria parado de diminuir (Baumgardner et al., 2013).
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capítulo 8
Homem ao resgate? Fato rápido: a eugenia não pode interromper a degeneração e a clonagem torna pior o problema da mutação.
A maioria dos geneticistas bem informados reconheceria que os seres humanos têm um problema com a degeneração genética do genoma devido à seleção relaxada. Eles provavelmente reconheceriam que esse problema se estende a muitas outras espécies e certamente a espécies ameaçadas de extinção. Eles provavelmente reconhecerão também as dificuldades teóricas de estabelecer um regime de seleção eficaz para interromper os danos genéticos dentro da população humana. Porém, muitos salientariam também que o processo de degeneração genética é gradual. Com apenas um declínio de 1-2% na aptidão por geração, eles podem dizer que o problema não é urgente. Embora
seja verdade que as consequências finais das mutações de hoje não serão sentidas durante muitas gerações, é igualmente verdade que o tempo necessário para deter a degeneração genética, se possível, seria agora. Como o problema torna-se mais avançado, o dano genético ficará à nossa frente, com um potencial de situação de fuga (colapso) em desenvolvimento. Os hedonistas perguntariam: “E daí?” Mas para aqueles idealistas que depositam todas as suas esperanças na sobrevivência e no avanço da raça, isso deve ser de grande importância. Eles voltam os olhos esperançosos para a ciência e a tecnologia. A intervenção humana é capaz de triunfar sobre a ameaça? A natureza da degeneração genética é tal que o dano acumulado é inerentemente difundido por todo o genoma. Ele não pode ser tratado com um gene de cada vez. Deveria, portanto, ser óbvio que a precisão do tipo laser da engenharia genética não tem nada a oferecer. Contudo, poderíamos razoavelmente perguntar se a seleção artificial, ou a capacidade emergente de clonar seres humanos, não pode resolver o problema.
Eugenia ao resgate? A percepção geral de que o homem está degenerando é encontrada em toda a literatura antiga e moderna. Todas as culturas têm lendas sobre “homens de antigamente” que eram inteligentes, poderosos e longevos. O livro de Darwin, Sobre a Origem das Espécies por Meio da Seleção Natural, ou a preservação de raças favorecidas na luta pela vida, introduziu a ideia de que uma seleção forte e contínua poderia interromper essa tendência degenerativa percebida. Ele apontou os esforços humanos na reprodução animal e vegetal como evidência. Em seu livro A Ascendência do Homem, Darwin foi mais longe, alegando que há a necessidade de raças “superiores” (isto é, a raça branca) para substituir as raças “inferiores”. Isso conduziu ao racismo moderno, que alcançou seu auge na Alemanha de Hitler. Antes da Segunda Guerra Mundial, muitas nações, incluindo os Estados Unidos, tinham programas de eugenia dirigidos pelo governo. Esses programas incluíam a esterilização forçada da promoção “imprópria” e agressiva do aborto/controle da fertilidade para as
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classes inferiores. Desde o tempo De Darwin, essencialmente todos os seus seguidores foram convictos eugenistas, e têm defendido a melhoria genética da raça humano. Quando eu era um evolucionista, também era um eugenista convicto. Os filósofos e cientistas que criaram a moderna “teoria sintética” da evolução eram uniformemente eugenistas. No entanto, após os horrores da Segunda Guerra Mundial, essencialmente todas as discussões abertas sobre a eugenia foram discretamente colocadas de lado. À luz de um genoma em deterioração, a eugenia deve ser reexaminada? Infelizmente, isso já está acontecendo, mas não é moralmente nem cientificamente defensável. A tese deste livro não pode logicamente ser usado para apoiar a eugenia, mas argumenta fortemente contra ela. A visão do eugenista é uma ilusão insidiosa. Nenhuma forma de seleção pode deter a degeneração genômica; isso inclui a seleção artificial. Tentar aumentar artificialmente a intensidade global seria física, social e politicamente impossível. Somente um “poder de elite” impenetrável, mundial e autoritário poderia ditar os padrões de seleção, decidir quem poderia e quem não poderia se reproduzir. Mesmo se um tal plano insidioso pudesse efetivamente ser implementado, ele não iria parar a degeneração genômica. Qualquer potencial “progresso” genético seria trivial, e não seria suficiente para compensar a degeneração geral do genoma. “Inferioridade” versus “superioridade” é uma característica ambígua e muito mal herdada, e é amplamente influenciado por fatores não genéticos (ambientais) (veja o capítulo 6). A seleção para qualquer característica não genética resulta em progresso seletivo zero. Até a seleção de traços mais “hereditários” seria ineficaz, por causa de todos os argumentos genéticos que acabei de apresentar. “Aptidão” é um termo muito geral, e é afetado por inúmeros genes, a maioria dos quais são menores ou quase neutros. Como estamos discutindo, a seleção só pode atuar sobre um punhado de genes “significativos”. É verdade que poderíamos selecionar artificialmente praticamente qualquer humano para tornar as pessoas mais altas ou mais baixas, mais claras ou mais escuras, mais gordas ou mais magras. Mas não podemos selecionar efetivamente pessoas superiores, o que inerentemente envolve milhares de genes e milhões de nucleotídeos, bem como uma quantidade razoável de subjetividade.
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Qualquer possível benefício da seleção aprimorada ou artificial no homem seria uma ligeira melhoria de um número muito limitado de traços muito específicos. Mas o genoma ainda estaria “enferrujando” na mesma velocidade total. O custo da eugenia seria uma perturbação em custo social e moral em nível catastrófico. A eugenia foi um conceito racista em seu início, e sempre foi impulsionado pelo Axioma Primário. A eugenia não é geneticamente sólida. Além disso, está estreitamente ligada ao governo autoritário, à filosofia elitista, à supressão dos direitos pessoais e à violação da dignidade humana. A eugenia não pode nos resgatar da degeneração genômica. Se buscássemos tolamente salvaria o genoma dessa maneira, quem então nos salvaria dos eugenistas?
Clonagem ao resgate? Clonar um ser humano significa tomar uma célula de um indivíduo maduro (presumivelmente superior) e usar essa célula para produzir uma ou mais cópias desse indivíduo. A consequência da clonagem teria profundas consequências genéticas. Quando eu ainda era evolucionista e estava muito preocupado com a degeneração genética do homem, acreditava ingenuamente que a clonagem poderia ser a resposta. Eu esperava que a clonagem pudesse interromper a degeneração genômica e mesmo permitir uma rápida melhoria da população humana. Na genética vegetal, quando uma espécie é facilmente propagada, a seleção por meio da clonagem é o meio mais seguro e rápido para melhorar a população. Dado esse conhecimento, talvez seja surpreendente que a seleção clonal para o homem não tenha sido mais vigorosamente defendida. No entanto, mesmo com os problemas morais e sociais da clonagem, o melhor cenário para a clonagem envolveria apenas ganhos a curto prazo e garantiria degeneração a longo prazo. Um tema tácito deste livro é que o que já é conhecido sobre populações clonais também se aplica a populações sexuais. A prova de que todas as populações clonais devem degenerar geneticamente foi primeiramente mostrada por Muller, e tem sido designada “Catraca de Muller” (Muller, 1964;
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Felsenstein, 1974). Dentro de qualquer linha clonal, as mutações se acumularão ao longo do tempo. Mesmo a seleção dentro de uma linha clonal para os melhores subclones não interrompem o declínio. A “Catraca” só funciona de uma maneira, e toda a mudança deve ser para baixo. Cada divisão celular acrescenta mutações, e não há nenhum mecanismo para retirar mutações. Ainda que permitindo algumas mutações benéficas, cada mutante benéfico sempre está ligado a muitas mutações mais deletérias. Dentro de clones, não há nenhum mecanismo para romper esse vínculo entre mutações benéficas raras e mutações deletérias abundantes. Os mutantes deletérios sempre crescerão em número mais rápido do que os beneficiários, e sempre arrastarão qualquer beneficiários com eles para baixo. É I M P O S S Í V E L M A N T E R U M Assim sendo, a informação líquida deve G E N O M A G R A N D E I N A LT E sempre diminuir. Repetindo, isso se apliRADO, MESMO DENTRO DE ca até mesmo aos melhores sub-clones, UM CLONE! mais altamente selecionados. A certeza da degeneração genômica em populações clonais é bem conhecida entre os geneticistas. A razão pela qual ainda existem muitas populações de plantas (e alguns animais) parece refletir o fato de que ainda não houve tempo suficiente para essas populações degenerarem até o ponto de extinção. Experimentos preliminares de clonagem animal indicam a clonagem de animais não podem sequer produzir ganhos genéticos de curto prazo. Animais clonados apresentam rotineiramente danos genéticos imediatos e graves. Por que isso acontece? Animais clonados rotineiramente exibem dano mutacional como se estivessem “pré-envelhecidos” (Hochedlinger et al., 2004). Provavelmente existem múltiplas razões para isso (genética e epigenética), mas uma das principais razões envolve o fato de que as mutações continuam a ocorrer dentro de células somáticas. As células reprodutivas normais são “projetadas” para sofrer a menor divisão celular possível entre gerações, minimizando assim a acumulação de mutações por geração. É para essas células reprodutivas que temos a estimativa mínima de “apenas” 100 mutações pontuais por pes-
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soa a cada geração. Para células somáticas (pelo menos para as células estaminais de divisão contínua), o número das divisões celulares é muito maior do que na linha germinativa, e, assim, a taxa de mutação também deve ser muito mais elevada (aumentando com a idade). À medida que crescemos e começamos a envelhecer, cada célula de nosso corpo torna-se geneticamente mais mutante e mais “única”. É impossível manter um genoma grande inalterado, mesmo dentro de um clone! Novas mutações ocorrem em cada célula, à razão de aproximadamente uma mutação a cada divisão celular. Portanto, essencialmente cada célula de nosso corpo é única. Por essas razões, cada clone humano será sempre inferior à “fonte individual” madura de que foram clonados. Tal clone será, de certo modo, pré-envelhecido, tendo a carga mutacional original do indivíduo-fonte mais a carga mutacional acumulada durante o período de crescimento e envelhecimento. Devido às muitas divisões celulares durante o desenvolvimento somático e a manutenção de células estaminais, um clone humano será aproximadamente comparável, em termos de degeneração, aos indivíduos de muitas gerações sexuais no futuro. Neste sentido, tal clone é como uma prefiguração de onde a espécie está indo. Está indo para baixo, não para cima (Figura 11). Existem fortes argumentos morais, sociais e genéticos contra a clonagem. A clonagem pode ser vista como uma forma altamente tecnológica de eugenia, com todos os seus problemas técnicos e morais. A eugenia em geral, e a clonagem em particular, definitivamente não são soluções para a degeneração genômica.
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Figura 11
Degeneração do genoma, degeneração do homem e degeneração da humanidade
Experimentamos em nível pessoal, e vemos tudo isso ao nosso redor. É a “entropia genética”, e não há nada que o homem possa fazer para detê-lo. Isso é biologicamente inevitável. É por isso que as espécies se extinguem e é por isso que todos nós estamos individualmente no processo de morrer.
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capítulo 9
A seleção natural é capaz de criar? Fato rápido: a mutação/seleção é incapaz de criar sequer um único gene.
Examinamos o problema da degeneração genômica e descobrimos que as mutações deletérias ocorrem a uma taxa muito alta. A seleção natural só pode eliminar as piores mutações, enquanto todo o restante se acumula – como a ferrugem em um carro. As mutações benéficas em outros pontos do genoma podem compensar essa erosão contínua e sistemática da informação genética? A resposta é que as mutações benéficas são muito raras, e também muito sutis para acompanhar a erosão implacável e sistemática de informação. Isso é cuidadosamente documentado por Sanford et al. (2013) e Montañez et al. (2013). É muito fácil destruir sistematicamente a informação, mas, além da operação de inteligência, é muito difícil (possivelmente impossível) criar informação.
Esse problema anula toda a esperança para a evolução direta de todo o genoma. No entanto, algumas características limitadas ainda podem ser aprimoradas por meio de mutação/seleção. Quão limitada é essa mutação/seleção progressiva (“criativa”)? Neste momento deveria estar claro que erros de ortografia aleatórios em um manual de instruções nunca poderiam dar origem a um componente de avião (digamos, uma parte em alumínio moldado), o que resultou em um desempenho significativamente aprimorado de um avião a jato. Nem mesmo com um número ilimitado de ensaios de voo/falhas e um orçamento ilimitado. Então é certamente razoável fazer a pergunta biológica paralela: “Poderia a mutação/seleção criar um único gene funcional a partir do zero?” Um gene é como um livro, um capítulo de livro ou um programa executável – e consiste minimamente em um conjunto de texto com 1000 caracteres. A mutação/seleção não pode criar um único gene por causa da enorme preponderância de mutações deletérias, mesmo dentro do contexto de um único gene. A informação líquida sempre deve continuar em declínio, mesmo dentro de um único gene ou bloco de ligação. Mesmo que um gene seja estabelecido a 50%, as mutações deletérias degradariam a metade completa do gene muito mais rápido que os benéficos poderiam criar a metade que falta do gene. No entanto, para compreender melhor os limites da seleção, deixe-nos por um momento eliminar todas as mutações deletérias e apenas considerar as mutações benéficas. Poderia a mutação/seleção criar um gene novo e funcional?
1. Definindo nossa primeira mutação desejável. O primeiro problema que encontramos na tentativa de criar um novo gene por meio de mutação/seleção é definir nossa primeira mutação benéfica. Por si só, nenhum nucleotídeo particular (A, T, C ou G) tem mais valor do que qualquer outro, assim como nenhuma letra no alfabeto tem qualquer significado particular fora do contexto de outras letras. Portanto, a seleção para qualquer nucleotídeo individual nunca pode ocorrer exceto no contexto dos nucleotídeos circundantes (e, de fato, dentro do contexto de todo o genoma). Uma mudança de uma única letra dentro de uma palavra ou de um capítulo só pode ser avaliada no
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contexto do bloco circundante de texto. Isso nos leva a um excelente exemplo do princípio da “complexidade irredutível”. Na verdade, é a complexidade irredutível em seu nível mais fundamental. Imediatamente descobrimos que temos um paradoxo. Para criar uma nova função, vamos precisar selecionar nossa primeira mutação benéfica, mas só podemos definir o valor desse novo nucleotídeo em relação a seus companheiros e teremos de mudar a maioria desses companheiros também! Criamos um caminho circular para nós mesmos. Vamos continuar a destruir o “contexto” que estamos tentando construir. Esse problema da inter-relação fundamental de nucleotídeos é chamado de epistasia. A verdadeira epistasia é essencialmente infinitamente complexa, e praticamente impossível de analisar, razão pela qual os geneticistas sempre convenientemente o têm ignorado. Tal complexidade desconcertante é exatamente por que a linguagem (incluindo A M U TA Ç Ã O / S E L E Ç Ã O a linguagem genética e a informação NÃO PODE CRIAR UM genética) jamais pode ser produto do ÚNICO GENE SEQUER! acaso, mas requer um planejamento inteligente. O genoma é literalmente um livro, escrito literalmente num idioma, e sequências curtas são literalmente frases. Ter letras aleatórias formando uma única sentença significativa, por acidente, exigiria mais tentativas (mais tempo), do que o histórico da terra pode fornecer (ou seja, “parece que é como se uma doninha” levasse 2728 tentativas - isto é 10 seguido de 40 zeros). O mesmo é válido para todas as cadeias funcionais de nucleotídeos. Se houver mais de uma dúzia de nucleotídeos em uma sequência funcional, sabemos que realisticamente eles nunca ”cairão no lugar”. Isso tem sido demonstrado matematicamente vez após vez. Mas, como veremos em seguida, nem sequer tal sequência surge aleatoriamente um nucleotídeo de cada vez. Um “conceito” pré-existente é necessário como uma estrutura sobre a qual uma sentença ou uma sequência funcional deve ser construída. Tal conceito só pode existir dentro da mente do autor. A partir da primeira mutação, temos um problema fundamental, mesmo na tentativa de definir o que a primeira mutação bené-
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fica desejada deve ser!
2. Esperando pela primeira mutação. Presume-se que a evolução
humana ocorreu em uma pequena população de indivíduos. Por quanto tempo temos que esperar que isso aconteça? Evidentemente, a evolução humana ocorreu em uma pequena população de cerca de 10 mil indivíduos. A taxa de mutação para qualquer dado nucleotídeo, por pessoa a cada geração, é extremamente pequena (aproximadamente uma mutação por 30 milhões de indivíduos, para um determinado sítio nucleotídico). Dentro de uma população de 10.000 pessoas, seria preciso esperar 3.000 gerações (pelo menos 60.000 anos) para esperar que um nucleotídeo específico sofresse uma mutação. Mas em duas de cada três vezes, ele irá mutar para o nucleotídeo “errado”. Assim, obter uma mutação desejada num local específico tomará três vezes mais tempo, ou pelo menos 180 mil anos. Uma vez que a mutação ocorreu, ela se fixou (de modo que todos os indivíduos da população terão duas cópias dele). Sendo que as novas mutações são tão raras dentro da população, elas têm uma probabilidade extremamente grande de ser perdidas da população devido à deriva genética aleatória. Somente se a mutação é dominante e tem um benefício muito distinto, a seleção terá qualquer chance razoável de salvá-lo da eliminação aleatória por meio da deriva. De acordo com os geneticistas populacionais, além da seleção, em uma população de 10 mil, nosso novo mutante terá apenas uma chance em 20 mil (o número total de nucleotídeos não mutantes presentes na população) de não ser perdido por deriva. Mesmo com algum nível modesto de seleção operando, há uma probabilidade de perda aleatória, especialmente se o mutante for recessivo ou fracamente expresso (na verdade, sabemos que quase todas as mutações benéficas serão recessivas e quase neutras). Portanto, mesmo uma mutação benéfica será perdida aleatoriamente devido à deriva genética na maioria das vezes. Para argumentar, digamos que um mutante fracamente benéfico seja perdido em 99 de 100 vezes. Portanto, uma mutação suavemente benéfica típica deve acontecer cerca de 100 vezes antes que seja “incorporado” à população. Então, em média, em uma população de 10.000 indivíduos, teríamos que esperar 180.000 x 100 = 18 milhões de anos para estabilizar nossa primeira mutação benéfica
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desejada, para começar a construir nosso novo e hipotético gene. Portanto, se considerarmos o tempo que supostamente evoluímos de criaturas semelhantes a chimpanzés (6 milhões de anos), não haveria tempo suficiente para esperar realisticamente que nossa primeira mutação desejada fosse fixada na localização genômica onde o nosso gene necessário esperançosamente surgirá. Uma grande quantidade de mutações surgirá durante 18 milhões de anos, mas apenas uma vez esse nucleotídeo específico será mutado para um novo nucleotídeo específico - de forma que não se perca por deriva genética.
3. Esperando pelas outras mutações. Após a nossa primeira mu-
tação ter sido encontrado (o que eventualmente será corrigido), precisamos repetir esse processo para todos os outros nucleotídeos que codificam nosso gene esperado. Um gene tem uma extensão mínima de mil nucleotídeos (isso, na verdade, é 50 vezes mais generoso, visto que estou ignorando todos os elementos reguladores e íntrons). Assim, se esse processo fosse direto, linear e sequencial, levaria cerca de 18 milhões de anos x 1.000 = 18 bilhões de anos para criar o menor gene possível. Esse é aproximadamente o tempo desde o Big Bang! Portanto, é um entendimento grosseiro dizer que a raridade das mutações desejadas limita a taxa de evolução. Na realidade, nucleotídeos únicos não carregam qualquer informação por si mesmos e não podem ser seletivamente favorecidos. Informação especificada requer muitos caracteres (minimamente, uma sentença ou sequência textual similar é necessária). Como qualquer mensagem, uma mensagem genética que especifica alguma função vital requer muitos nucleotídeos para alcançar seu “limiar funcional”. Limiar funcional é o número mínimo de caracteres (ou nucleotídeos) necessários para transmitir uma mensagem significativa. Abaixo do limiar funcional, letras individuais ou nucleotídeos não têm benefício e não podem ser favorecidos pela seleção. Isso significa que realisticamente, aguardando que o tempo seja muito, muito mais longo – porque nenhuma seleção pode acontecer até que a sequência mínima de nucleotídeos se acomode por acaso. Se o limite funcional para a seleção é de 12 ou mais nucleotídeos, o tempo de espera em nossa população humana hipotética torna-se centenas de bilhões de anos.
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4. Esperando o “dilema de Haldane”. Uma vez que a primeira mutação destinada a se fixar dentro da população finalmente ocorreu, ela precisa de tempo para se submeter à amplificação seletiva. Uma nova mutação em uma população de 10 mil pessoas existe apenas como um nucleotídeo entre 20 mil alternativas (há 20 mil nucleotídeos naquele local, em toda a população). O nucleotídeo mutante deve “crescer” gradualmente dentro da população, quer devido à deriva ou devido à seleção natural. Em breve, pode haver duas cópias do mutante, então quatro, depois 100 e, eventualmente, 20 mil. Quanto tempo leva esse processo? Para mutações dominantes, assumindo forte seleção unidirecional, o mutante poderia crescer dentro da população a uma taxa de 10% por geração. Nessa taxa muito alta, ainda levaria cerca de 105 gerações (2.100 anos) para aumentar de 1 para 20 mil cópias (1.1105 = 20.000). No entanto, a fixação da mutação demora muito mais tempo porque a seleção é geralmente muito fraca, e a maioria das mutações são recessivas e muito sutis. Quando a mutação é recessiva, ou quando a seleção não é consistentemente unidirecional ou forte, esse cálculo é muito mais complexo, mas é óbvio que o processo de fixação seria dramaticamente mais lento. Por exemplo, uma mutação recessiva inteiramente benéfica, mesmo se pudesse aumentar a aptidão em até 1%, requer pelo menos 100 mil gerações (2 milhões de anos) para ser fixado (Patterson, 1999).Haldane (1957) calculou que seria necessário (em média) 300 gerações (> 6.000 anos) para selecionar uma única nova mutação a fixação, dado o que considerava uma mistura “razoável” de mutações recessivas e dominantes. A seleção nessa taxa é tão lenta que é essencialmente o mesmo que nenhuma seleção. Esse problema tem sido classicamente chamado de “dilema de Haldane”. A essa taxa de seleção, poderíamos fixar apenas mil mutações benéficas de nucleotídeos dentro do genoma inteiro no tempo desde que supostamente evoluímos dos símios (6 milhões de anos). Esse simples fato foi confirmado independentemente por Crow e Kimura (1970) e ReMine (1993, 2005) e mais recentemente por Rupe e Sanford (2013). Além disso, a natureza da seleção é tal que a seleção de um nucleotídeo reduz nossa capacidade de selecionar outros nucleotídeos (interferência de seleção). Além disso, a natureza da seleção é tal que a seleção
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de um nucleotídeo reduz nossa capacidade de selecionar outros nucleotídeos (interferência de seleção). Por este motivo, a seleção simultânea de muitas mutações fracas e benéficas é em grande parte ineficaz. À primeira vista, o cálculo acima parece sugerir que alguém poderia pelo menos ser capaz de selecionar para a criação de um pequeno gene (de até mil nucleotídeos) no tempo desde que nós alegadamente divergimos dos símios. Há duas razões pelas quais isso não é verdade. Em primeiro lugar, os cálculos de Haldane foram apenas para mutações não ligadas e independentes. A seleção para mil mutações específicas e adjacentes não poderia acontecer em 6 milhões de anos porque essa sequência específica de mutações adjacentes (para criar uma cadeia de 1000 letras) não pode acontecer em 6 milhões de anos, porque essa sequência específica de mutações adjacentes nunca surgirá, nem mesmo após trilhões de anos (veja os cálculos acima). Não se pode selecionar uma cadeia de letras que nunca acontecido. Em segundo lugar, a grande maioria dos nucleotídeos de um gene são quase neutros e não pode ser selecionada de forma alguma – não em qualquer período de tempo. A linha inferior do dilema de Haldane é a seleção para corrigir novas mutações benéficas que ocorrem a velocidades glaciais, e quanto mais nucleotídeos sob seleção, mais lento é o progresso. Isso limita severamente a seleção progressiva. Dentro de prazos evolutivos razoáveis, só podemos selecionar um número extremamente limitado de nucleotídeos não ligados. Nos últimos 6 milhões de anos, a seleção poderia fixar no máximo mil mutações benéficas não ligadas, criando menos informações novas do que nesta página de texto. Não há nenhuma maneira que uma quantidade tão pequena de informações pudesse transformar um símio em humano.
5. Esperando a recombinação. Sendo que espécies sexuais (como
o homem) podem mesclar mutações, pode-se pensar que todas as mutações necessárias para um novo gene podem ser capazes de ocorrer simultaneamente em diferentes indivíduos dentro da população, e então todas as mutações desejáveis poderiam ser “unidas em conjunto” através de recombinação. Isso significaria que as mutações não teriam de ocorrer sequencialmente,
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reduzindo assim o tempo necessário para criar o gene esperado (para que possamos precisar de menos de bilhões de anos). Existem dois problemas com isso. Primeiro, quando examinamos o genoma humano, consistentemente ele existe em grandes blocos (20.000-40.000 nucleotídeos) dentro dos quais não ocorreu recombinação desde a origem do homem (Gabriel et al., 2002; Tishkoff; Verrelli, 2003). Isso significa que praticamente nenhum embaralhamento significativo está ocorrendo no nível de cadeias nucleotídicas locais. Apenas grandes blocos de DNA (do tamanho de genes) estão sendo misturados. Para esclarecer ainda mais, nenhum embaralhamento real de nucleotídeos está acontecendo! Em segundo lugar, mesmo se houvesse nucleotídeos eficazes se mesclando, a possibilidade de obter todos os mutantes dentro da população para embaralhar em nossa sequência esperada de mil é tão astronomicamente remota e então todo esse embaralhamento separaria tais sequências mais rápido do que poderia criá-las. Embaralhamento extensivo das sequências requereria ainda mais tempo do que é necessário para a abordagem sequencial. Se houve realmente um tipo de nível de embaralhamento nucleotídeo que pudesse criar um novo gene dessa maneira, ele seria separado de novo pelo mesmo embaralhamento nucleotídeo extensivo bem na próxima geração. No pôquer, não é provável que um jogador receba um royal flush. Se alguém recebeu, quais são as chances de ele então receber a mesma mão depois de as cartas serem reembaralhadas? A recombinação não ajuda a criar uma sequência nucleotídica de 1,000.
6. Vales infinitos da aptidão. Os evolucionistas concordam que a criação de um novo gene requer muita experimentação. Durante a fase de construção do desenvolvimento de um novo gene, temos de esperar um período de tempo em que a experiência reduz a aptidão de uma espécie. Esse é um vale da aptidão. Um gene incompleto não é nem benéfico nem neutro. Será deletério. Em certo sentido, a espécie tem de piorar antes que possa ficar melhor. É fácil imaginar uma espécie sobreviver vales de aptidão se eles são breves e raros. Os vales profundos da aptidão provavelmente conduzem à extinção. A ra-
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ridade de boas mutações em combinação com o dilema de Haldane deveria criar vales de aptidão indefinidamente longos e profundos. A contínua inovação evolutiva tornaria o declínio da aptidão de uma espécie sem fim. A vida seria apenas um vale da aptidão em cima de outro. A super-rodovia da evolução estaria sempre em construção, e a aptidão total estaria sempre em declínio, em vez de aumentar. O conceito de uma espécie que passa por um vales de aptidão faz sentido evolutivo somente quando se consideram traços individuais. No entanto, quando se considera todo o genoma, o conceito de vales de aptidão indefinidamente numerosos e indefinidamente longos argumenta fortemente contra o cenário da evolução.
7. DNA polidefinido. A maioria das sequências de DNA são polifuncionais e, assim, também devem ser polidefinidos. Isso significa que sequências de DNA têm significado em vários níveis diferentes (polifuncionais) e cada nível de significado limita possíveis mudanças futuras (polidefinido). Por exemplo, imagine uma frase que tenha uma mensagem muito específica em sua forma normal, mas com uma mensagem igualmente coerente quando lida para trás. Agora vamos supor que ela também tem uma terceira mensagem ao ler cada outra carta, e uma quarta mensagem quando um programa de criptografia simples é usado para traduzir. Tal mensagem seria polifuncional e poli-limitada. Sabemos que erros ortográficos em uma frase normal geralmente não melhoram a mensagem, mas pelo menos isso seria possível. No entanto, uma mensagem polifuncional é fascinante, pelo fato de que não pode ser melhorada. Ela só pode deteriorar (veja a Figura 12). Qualquer falha de ortografia que possivelmente poderia melhorar a forma normal da sentença será prejudicial para os outros níveis de informação. Qualquer alteração no todo diminuirá a informação total com certeza quase absoluta. Meus colegas e eu demonstramos isso matematicamente em um artigo recente (Montañez et al., 2013). Há abundante evidência de que a maioria das sequências de DNA são polifuncionais, e são, portanto, polidefinidos. Esse fato foi demonstrado extensivamente por Trifonov (1989). Por exemplo, a maioria das sequências de codificação humana codificam para dois RNAs diferentes que são lidos em 124 |
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sentidos opostos (isto é, ambas as cadeias de DNA são transcritas; Yelin et al., 2003). Algumas sequências codificam para diferentes proteínas, dependendo de onde a tradução é iniciada e onde a leitura começa (isto é, proteínas de leitura). Algumas sequências codificam para diferentes proteínas com base em emenda alternativa de mRNA. Algumas sequências servem múltiplas funções simultaneamente (isto é, como uma sequência codificadora de proteína e como um promotor transcricional interno). Algumas sequências codificam tanto para uma região codificadora de proteína quanto para uma região de ligação. Elementos Alu e origens de replicação podem ser encontrados dentro de promotores funcionais e dentro de exons. Basicamente todas as sequências de DNA são restringidas por isocoros (conteúdo GC regional), conteúdo “palavra” (perfis específicos de espécies Di-, tri- e tetra-nucleotídeos) e ligação de locais de ligação de nucleossomos (porque todo o DNA deve se condensar). A condensação seletiva é claramente implicada na regulação de genes, e a ligação de nucleossomo seletivo é controlada por padrões de sequência de DNA específicos que devem permear todo o genoma. Por fim, provavelmente todas as sequências também afetam o espaçamento geral e a dobra do DNA/arquitetura, que é claramente uma sequência dependente. Para explicar a quantidade incrível de informação que de alguma forma deve ser embalada no genoma (dada a extrema complexidade da vida), realmente temos que assumir que há níveis ainda maiores de organização e informações criptografadas dentro do genoma. Por exemplo, sabemos que existe outro nível completo de organização no nível epigenético (Gibbs, 2003). Parece também haver uma organização extensiva, dependente da sequência e tridimensional dentro dos cromossomos e no núcleo inteiro (Manuelidis, 1990; Gardiner, 1995; Flam, 1994). Trifonov (1989) mostrou que provavelmente todas as sequências do genoma criptografam vários códigos (até 12). Em ciência da computação, esse tipo de compressão de dados só pode resultar do nível mais alto de informação e resulta na densidade de informação máxima. Esses níveis mais elevados de organização genômica/conteúdo de informação multiplicam grandemente o problema do DNA polidefinido. Cada nucleotídeo interage com muitos outros nucleotídeos, e tudo no genoma parece ser dependente do contexto. O
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problema do DNA difundido, do tamanho do genoma e polidefinido parece absolutamente esmagador para a teoria evolutiva. Alterar qualquer coisa parece potencialmente mudar tudo! A natureza polidefinida do DNA serve como forte evidência de que os genomas superiores não podem evoluir por meio de mutação/seleção exceto em um nível trivial. Logicamente, todos os DNAs polidefinidos tem de ser planejados.
8. Complexidade irredutível. O problema da complexidade irredutível foi brilhantemente apresentado por Behe (1996). Ele ilustrou o conceito de complexidade irredutível em vários sistemas que têm componentes múltiplos, tais como um projeto de ratoeira, que requer partes independentes, ou um flagelo com talvez 10-20 componentes. Sua ideia é que cada parte não tem valor exceto dentro do contexto de toda a unidade funcional, e assim os sistemas irredutíveis têm de se reunir de uma só vez, e não pode surgir uma peça de cada vez. No caso de uma ratoeira, todas as peças podem ter sido colocadas uma próxima da outra na bancada do inventor, mas não se juntaram por acaso, ou por qualquer progressão evolutiva realista. Eles se uniram como síntese, simultaneamente, na mente do inventor. É no domínio da mente que a profunda complexidade se une e manifesta a funcionalidade integrada. Em nosso exemplo da evolução da tecnologia de transporte, a primeira melhoria mais simples que poderíamos imaginar poderia ser a ocorrência de erros ortográficos que converteriam o nosso carrinho vermelho em um triciclo azul. É fácil imaginar um erro ortográfico que possa levar o código de tinta a ser alterado (embora a tinta azul tenha de estar já disponível e codificada). Da mesma forma, um erro de ortografia poderia certamente levar uma roda a cair. No entanto, um carrinho de três rodas não é um triciclo; é um carrinho quebrado. Converter um carrinho em um triciclo exigiria uma revisão extensiva no manual de instruções e mudanças radicais na maioria dos componentes. Não haveria etapas intermédias funcionais para realizar essas mudanças complexas e, portanto, nenhuma perspectiva para o nosso agente de controle de qualidade ajudar seletivamente o processo longitudinalmente. Na verdade, ele estaria selecionando contra todos os nossos erros ortográficos e mudanças 126 |
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desejadas. Assim, a combinação correta de erros ortográficos teria de surgir simultaneamente por acaso, tudo ao mesmo tempo, o que nunca aconteceria. Obviamente, um triciclo só poderia surgir de um carrinho por meio de uma extensa reformulação do desenho e uma reescrita completa do manual de instruções (veja Figura 13). Embora um carrinho ou um triciclo possa ter dezenas de componentes, mesmo a proteína mais simples é muito mais complexa, tendo centenas de componentes e alcançando um nível de complexidade irredutível profundamente maior do que o ilustrado por nossa analogia do carrinho. Como o número de componentes de um projeto aumenta linearmente, o número de interações (daí a complexidade) aumenta exponencialmente. Complexas como as proteínas são, subjacente a cada proteína está um sistema genético compreendendo níveis ainda mais elevados de complexidade irredutível. A maquinaria molecular subjacente à codificação, transcrição e tradução de uma proteína é fenomenal. Ignorando todas as outras proteínas acessórias envolvidas, apenas o desenho da sequência de DNA/RNA é incompreensível. Embora uma proteína simples tenha algumas poucas centenas de componentes, o gene subjacente que produz tem milhares de componentes. Todas essas peças estão interagindo e definindo-se mutuamente. Cada nucleotídeo tem significado apenas no contexto de todos os outros. Cada nucleotídeo é polifuncional, interagindo com muitos outros nucleotídeos. A sequência de DNA define a estrutura da cromatina 3-D regional, a ligação de proteína local, o desenrolamento, a transcrição, e também define uma ou mais sequências de RNA. A sequência de RNA define a estabilidade do RNA, a ligação variável de RNA, o processamento de RNA, o transporte de RNA, a eficiência da transcrição e a sequência proteica. Quando consideramos a complexidade total de um gene, incluindo seus elementos regulatórios e arquitetônicos, um único gene tem cerca de 50.000 componentes. Presumivelmente, isso é mais que o número de componentes encontrados em um automóvel moderno. No entanto, um único gene é apenas uma mancha microscópica de complexidade no universo da complexidade irredutível compreendendo uma única célula. A própria vida é a essência
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da complexidade irredutível, razão pela qual nem sequer podemos começar a pensar em criar a vida a partir do zero. A vida é formada camada sobre camada de complexidade irredutível. Nossos melhores fluxogramas bioquímicos, dos quais nos orgulhamos tanto, são apenas caricaturas infantis da verdadeira complexidade biológica, pois isso é algo que nem sequer podemos compreender. É um tributo à mente do homem que começamos a entender como um único gene funciona, e que agora podemos projetar e construir genes artificiais muito pequenos. Mas ainda não podemos projetar um novo gene para uma proteína nova e desconhecida, que poderia integrar-se na complexidade de uma forma de vida superior. Se não conseguimos fazer isso, por que pensaríamos que mutações aleatórias, combinadas com uma quantidade muito limitada de peneiramento reprodutivo, esta poderia ser realizada? Para o interesse do leitor, o Apêndice 3 expande a ideia de complexidade irredutível com o conceito de Complexidade Integrada.
9. Quase todas as mutações benéficas devem ser quase neutras. Já discutimos amplamente a dificuldade de selecionar contra mutações
prejudiciais quase neutras, e esse problema é reconhecido de má vontade pela maioria dos geneticistas. Contudo, há outro lado importante para esse problema que nunca ouvi ser reconhecido. Como já discutimos na Figura 3d, o problema da quase-neutralidade é muito mais grave para mutações benéficas do que para mutações deletérias. Essencialmente cada mutação benéfica deve cair dentro da “zona de não seleção” de Kimura. Todas essas mutações nunca podem ser selecionadas. Esse problema multiplica todos os problemas que já esbocei acima. Nosso novo gene esperado terá certamente alguns nucleotídeos que têm efeitos maiores. Por exemplo, os que especificam o local ativo de uma enzima. Mas tais nucleotídeos só podem ter efeitos importantes dentro do contexto de toda a proteína e da sequência completa do gene. Toda a proteína/gene é construída principalmente com componentes que individualmente têm apenas um pequeno impacto sobre toda a unidade, e têm apenas um impacto minúsculo sobre a aptidão do indivíduo inteiro. Em combinação, esses nucleotídeos contêm a maioria das informações contidas dentro do
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gene. Sem eles, os “nucleotídeos importantes” não têm sentido. Contudo, eles são todos individualmente não selecionáveis. Então, como podemos estabelecê-los e mantê-los em seus respectivos lugares durante a construção do gene? A resposta é, obviamente, que simplesmente não podemos. E, além dessas “massas insignificantes” de nucleotídeos, tampouco a elite de “nucleotídeos importantes” pode ser selecionada. Por causa do problema quase neutro, não podemos nem chegar à primeira base em termos de construir nosso esperado novo gene. Todo o novo gene é definido pelos quase neutros, mas não há como colocá-los ou mantê-los no lugar. A natureza quase-neutra das mutações benéficas é uma forte evidência de que cada gene teve de ser planejado, e que simplesmente não há uma maneira concebível de construir um gene por meio de um nucleotídeo de cada vez através da seleção.
10. Colocando mutações ruins de volta na imagem. Consi-
deramos brevemente uma variedade de fortes argumentos sobre por que a mutação/seleção progressiva deve ser muito limitada em seu escopo. Esses argumentos excluíram temporariamente todas as mutações deletérias. Contudo, na realidade, a seleção progressiva deve ocorrer no mundo real, onde as mutações deletérias compensam as mutações benéficas em talvez um milhão para um. Para sermos honestos, deve agora reintroduzir mutações deletérias. a) A Catraca de Muller – Como mencionei anteriormente, quando estudamos o genoma humano, vemos que grandes blocos de DNA não têm essencialmente nenhuma evidência histórica de recombinação (Gabriel et al. 2002; Tishkoff; Verrelli, 2003). A recombinação parece ser principalmente entre genes, e não entre nucleotídeos. Assim, dentro de qualquer sequência de genes limitada não existe essencialmente nenhuma recombinação. Qualquer bloco de DNA que não tem recombinação está sujeito à “Catraca de Muller” (Muller, 1964; Loewe, 2006). Isso significa que as mutações boas e as mutações ruins não podem ser separadas. Visto que sabemos que as mutações ruins excedem esmagadoramente as boas, podemos ter certeza de que qualquer trecho de DNA deve se deteriorar. As hordas de mutações sempre arrastam as raras mutações boas para baixo com eles. Enquanto estamos à espera de uma mutação
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benéfica rara, as mutações estão se acumulando em toda a região. Mesmo se pudéssemos ter sucesso em acumular talvez uma centena de mutações “boas” dentro de uma região, e esperássemos que viesse a próxima, começaríamos a ver muitas de nossas mutações boas começarem a se tornar ruins. O tempo é nosso inimigo nesta situação. Quanto mais tempo, menos informação. A Catraca de Muller matará um novo gene muito antes de ele tomar formar. b) Custo seletivo demais – Nos capítulos anteriores discutimos o custo da seleção. O dilema de Haldane considera apenas a seleção progressiva. Mas só podemos nos dar ao luxo de “reservar” a seleção progressiva para mutações benéficas depois de pagarmos todos os outros custos reprodutivos, incluindo todos os custos associados à eliminação de mutações ruins. Como já vimos, há tantas mutações ruins que não podemos sequer pagar o custo reprodutivo de eliminá-los. Uma vez que não podemos permitir interromper a deterioração, obviamente não deixamos mais nada para financiar a seleção progressiva. Há apenas uma maneira de contornar isso. A curto prazo, podemos financiar a seleção progressiva para um número muito limitado de traços se tomarmos emprestados “dólares de seleção” de nossa luta de longo prazo contra mutações ruins. Entretanto, precisamos entender que qualquer progresso a curto prazo em termos de mutações benéficas específicas é pago por uma deterioração genômica mais rápida no resto do genoma. c) Mutação não aleatória – Como se verifica, as mutações não são inteiramente aleatórias. Isso pode nos ajudar a criar novos genes? Não, isso torna o nosso problema muito pior! Por exemplo, agora sabemos que algumas doses de nucleotídeos são muito mais mutáveis do que outros (“hotspots”, “pontos quentes”), e que certos nucleotídeos são favorecidos em substituições. Hotspots mutacionais nos darão o mutante que queremos mais rápido naquela localização, mas, enquanto esperamos pelas mutações complementares dentro dos “pontos frios”, os hotspots continuarão a voltar a mutar. Somos forçados a resselecionar nossas boas mutações dentro dos hotspots, enquanto esperamos até mesmo que a primeira boa mutação ocorra dentro dos hotspots. Isso torna as coisas piores, ao invés de melhores. Quanto maior a tendência de mutar para um determinado nucleotídeo (digamos T), isso nos ajudará em
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posições onde T é desejado, mas vai nos atrasar para baixo sempre que G, C ou A for desejado. Portanto, em 75% do tempo o viés em direção a mutações T irá desacelerar o progresso de seleção. A “mutação não aleatória” soa bem a partir do ponto de vista da informação de construção, mas não estamos falando sobre a não aleatoriedade do design. Em vez disso, estamos falando de um tipo de não aleatoriedade que (ironicamente) é antitético à construção da informação. d) A extinção tanto da linhagem humana quanto dos chimpanzés – Apesar de termos temporariamente suspendido a consideração de mutações deletérias, é justo notar que, uma vez que o tempo hipotético quando os humanos e os chimpanzés divergiram, os geneticistas acreditam que muitos milhares de mutações deletérias devem ter se fixado através da deriva genética (Kondrashov, 1995; Crow, 1997; Eyre-Walker e Keightley, 1999; Higgins e Lynch, 2001). A conclusão lógica é que temos significantemente degenerado de nossos ancestrais símios. O poder desta lógica é avassalador. De fato, sabemos que homem e chimpanzé diferem em mais de 150 milhões de posições nucleotídicas (Britten, 2002), devido a pelo menos 40 milhões de fixações de mutação hipotéticas. Portanto, se assumimos que o homem evoluiu de uma criatura parecida com o chimpanzé, durante este processo deve ter havido cerca de 20 milhões de fixações nucleotídicas dentro tanto das linhagens humana quanto da dos chimpanzés, mas a seleção natural teria apenas selecionado 1,000 delas. Todo o resto teria de ter sido fixado através da deriva aleatória, resultando em milhões de substituições deletérias quase neutras. O resultado? Um máximo de 1,000 fixações benéficas e milhões de fixações deletérias. Isso não apenas nos tornaria inferiores aos nossos ancestrais chimpanzés; em 6 milhões de anos isso teria obviamente nos matado! Revisamos evidências convincentes de que, mesmo quando ignorando as mutações deletérias, a mutação/seleção não pode criar um único gene dentro da escala de tempo evolutiva humana. Quando mutações deletérias são fatoradas de volta, vemos que a mutação/seleção não pode criar um único gene, nunca. Essa é uma evidência esmagadora contra o Axioma Primário. Em minha opinião, isso constitui o que é essencialmente uma prova lógica de que o Axioma Primário é falso. CAPÍTULO 9 - A SELEÇÃO NATURAL É CAPAZ DE CRIAR?
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Em conclusão, o genoma deve ter sido planejado, e não pode ter evoluído. Contudo, todos sabemos que a microevolução (seleção adaptativa) realmente acontece. Como isso pode ser possível? Para usar a terminologia de nossos primeiros capítulos, as mutações são as batidas, os arranhões e as partes quebradas da vida. Portanto, creio que a variação mais útil deve ser projetada. Quando vemos a seleção adaptativa ocorrendo, geralmente estamos testemunhando a segregação e a recombinação de variantes de genes úteis e os componentes de genes que foram projetados para segregar e recombinar em primeiro lugar. Normalmente não estamos vendo o resultado de mutações aleatórias, que são consistentemente deletérias. A seleção opera para eliminar as piores mutações, enquanto favorecendo os recombinantes e segregantes mais desejáveis de variação projetada. Por exemplo, um único casal humano, se contiver heterozigosidade projetada e funcional em apenas uma pequena fração de seus nucleotídeos, produziria (via recombinação e segregação) uma gama essencialmente ilimitada de diversidade útil. É sobre esse tipo de diversidade projetada que a seleção natural pode agir com mais eficácia. É de se esperar que todas essas variantes foram criadas dentro de grupos de ligação úteis e têm origem em frequências alélicas elevadas. Por exemplo, no caso de um único casal humano, poderia haver apenas quatro conjuntos iniciais de cromossomos, de modo que todas as frequências nucleotídicas iniciais seriam pelo menos 25%. Grupos funcionais de ligação e frequência alélica elevada permitem uma resposta muito rápida à seleção e, por conseguinte, adaptação local. Como um baralho de cartas ordenado, a informação líquida em um cenário desse tipo seria maior no início, mas a diversidade seria maior somente depois de serem muito embaralhadas. Exceto no início, nenhuma nova informação seria necessária.
Atualização de 2008
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Em 2007, Michael Behe publicou seu segundo livro The Edge of Evolution. Enquanto seu primeiro livro estava baseado em grande parte em
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considerações teóricas, este novo livro analisa grandes quantidades de dados moleculares associados a três microrganismos de importância (o vírus da Aids, o patógeno da malária e a bactéria E. coli). Esses sistemas são conhecidos por ser altamente mutáveis e sofrerem números elevados de ciclos de seleção, e são citados como poderosos exemplos de “sistemas evolutivos”. Behe mostra que, embora esses organismos se adaptem rapidamente a novas condições externas, não inovam novas funções internas. Mesmo dentro desses “sistemas evolutivos ideais”, o tipo de mudança documentada representa apenas “ajuste fino”, não verdadeira inovação. Apesar de os cientistas terem acompanhado esses sistemas de modelo ao longo de um vasto número de ciclos reprodutivos (muito mais do que poderia ocorrer até mesmo através do “tempo profundo” para os organismos superiores), todas as alterações observadas foram meramente “medidas de tampão”. Behe demonstra poderosamente que o Axioma Primário não pode criar complexidade irredutível mesmo no nível mais simples. O novo livro de Behe foi duramente atacado, mas os novos dados recentes validaram sua análise (veja http://www.evolutionnews. org/2014/07/so_michael_behe087901.html).
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Figura 12
Informação polidefinida e DNA polidefinido Como trocadilhos, palíndromos e outros quebra-cabeças de palavras, o DNA contém letras, palavras e frases. Tais sequências só podem surgir por planejamento muito cuidadoso. Uma vez que eles são criados, não podem ser “mutados” para se tornarem melhores. Um excelente exemplo é a frase latina polifuncional cuidadosamente elaborada mostrada acima (veja Ohno; Yomo, 1991). Esse antigo palíndromo (que remonta a 79 d.C.) pode ser traduzido como: “AREPO, O SEMEADOR, MANTÉM COM DESTREZA AS RODAS.” Ele tem o mesmo significado, lido de quatro maneiras diferentes: esquerda para a direita, de cima para baixo, e começando na parte inferior direita, de baixo para cima, da direita para a esquerda. Qualquer simples mudança de letra nesse sistema destrói todas as quatro mensagens simultaneamente (todas as quatro das quais passam a ser as mesmas nesse exemplo). Similarmente, um palíndromo simples seria: ROMA ME TEM AMOR, em que se lê o mesmo para a frente ou para trás. Qualquer alteração de letra destrói ambas as mensagens. Um exemplo simples de uma palavra polifuncional seria LIVE2, que para trás é EVIL3. Mudar LIVE em HIVE pode ser desejável, mas transforma MAL, que tem 2. N. do T.: “Viver”, em inglês. 3. N. do T.: “Mal”, em inglês.
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um significado, em EVIH, que é sem sentido. Assim, essa palavra de significado duplo, como os outros exemplos acima, é polidefinida, precisamente porque é polifuncional.
Figura 13
Complexidade irredutível Em nosso exemplo do carrinho vermelho, a melhoria mais simples que se poderia imaginar seria alguns erros ortográficos que converteriam o nosso carrinho vermelho em um triciclo azul. Esse passo evolutivo aparentemente pequeno nunca poderia acontecer por acaso, porque requer a criação de muitos componentes novos, cada um dos quais representa “complexidade”. Não é difícil imaginar um erro de ortografia que mudaria o código de pintura ou faria com que uma roda caia. No entanto, fazer um triciclo operacional que realmente funcione requer uma extensa reestruturação da maioria dos com-
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ponentes. Apenas um novo componente – o aparelho de pedal – ilustra isso. A criação de um pedal para nosso carrinho vermelho não poderia surgir a partir de alguns erros ortográficos. Vários capítulos inteiramente novos no manual seriam necessários para manufaturar e montar os vários componentes. Mas o novo aparelho de pedal ainda não funciona sem um lugar para sentar e um lugar para as pernas! Obviamente, a deterioração do manual de montagem de um carrinho através de erros ortográficos (mesmo com a ajuda de nosso agente de controle de qualidade) nunca poderia resultar em um novo triciclo azul e brilhante. Ele só poderia levar a um carrinho quebrado, em condição precária.
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capítulo 10
A curva descendente é real? Fato rápido: todas as evidências apontam para a deterioração humana.
A natureza da informação e a analogia corretamente formulada do genoma como manual de instruções, considerando as mutações como erros de processamento de palavras, nos ajudam a ver que o genoma está se deteriorando. Essa conclusão do senso comum é apoiada pela teoria da informação (Gitt, 1997; Gitt et al., 2013). A natureza muito consistente das mutações de erodir a informação nos ajuda a ver que o genoma deve se deteriorar. A alta taxa de mutação humana indica que o homem deve estar se deteriorando. O custo proibitivo de selecionar um número elevado de mutações indica simultaneamente que o homem deve estar se deteriorando. Os problemas das mutações quase neutras, da interferência de seleção, tudo indicam que o homem
deve estar se deteriorando. Simulações numéricas de ponta estão agora mostrando TODAS AS EVIDÊNCIAS conclusivamente que devemos estar nos deA P O N TA M PA R A A teriorando (Sanford et al., 2007b; Gibson et DETERIORAÇÃO al., 2013). HUMANA! Voltando à Figura 4, podemos ver com o que entropia genética se parece – ela é uma curva clássica de decaimento biológico. Essa figura traça a degeneração genética humana ao longo de vários milhares de anos, assumindo uma taxa de declínio de aptidão de 1% por geração – como tem sido defendido por Crow (1997). De acordo com o estudo mais recente realizado por Lynch (2010), a taxa real de declínio provavelmente é muito maior – possivelmente, 5% a cada geração. Curvas semelhantes de declínio de aptidão são vistas em vários lugares neste livro (Figuras 4, 10a, 10b, 14, 15, 16). Algumas delas são simplesmente baseadas na teoria genética, outras o são com base em simulações numéricas, outras baseadas em dados, e finalmente há aquelas baseadas em dados históricos. Mas todas mostram a mesma curva básica – uma clara curva de decomposição biológica. Elas são unânimes. Dados os pressupostos profundamente enraizados sobre a ubiquidade do progresso da evolução, parece difícil acreditar que esse tipo de rápida degeneração genética poderia ser possível. No entanto, nos últimos 60 anos, os maiores especialistas do campo da genética populacional expressaram repetidamente sérias reservas, essencialmente perguntando: “Como a teoria genética pode excluir honestamente esse tipo de evolução reversa?” (veja Apêndice 1). Com base em seu trabalho, passei mais de uma década de estudo, desenvolvendo a compreensão nessa área. Provavelmente, tenho estudado o problema específico da entropia genética mais do que qualquer outro cientista. Minha pesquisa inclui uma análise meticulosa de como os processos de mutação e seleção efetivamente operam, combinados com lógica simples e formulação matemática. Mais importante, durante a última década, meus colegas e eu desenvolvemos a mais avançada programação de simulação numérica que modela, de modo realista, o processo de mutação/seleção. Nosso programa
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de simulação numérica leva em conta, simultaneamente e de forma abrangente, todos os fatores biológicos relevantes que afetam a mutação/seleção. Pelo fato de que atualmente podemos fazer simulações numéricas biologicamente realistas, podemos realmente ver como se desenrola o processo do acúmulo de mutações (veja Capítulo 11). Este estudo revela muito claramente que a entropia genética é um problema muito real e é muito mais grave do que os geneticistas de população anteriores admitiram. Simulações numéricas realistas mostram consistentemente uma curva biológica de decaimento quase idêntica ao declínio teórico da aptidão da Figura 4. A trajetória de aptidão é consistentemente descendente – não ascendente. Além de todas essas evidências, existe atualmente poderosa evidência biológica de entropia genética em vírus de RNA, como o vírus da gripe (Figura 15). As três estirpes da gripe que causaram grandes as pandemias humanas no século 20 mostraram evidências de virulência decrescente correlacionada com o acúmulo de mutação. Durante décadas, os biólogos evolucionistas insistiram, em nível filosófico, que a seleção natural é a força contrária à entropia em sistemas biológicos, e deve ser capaz de reverter a degeneração biológica. No entanto, todos os melhores estudos contradizem essa premissa filosófica. A entropia mutacional parece ser tão forte, especialmente dentro de grandes genomas, que a seleção não deve ser capaz de revertê-la. Isso torna inevitável a extinção eventual de tais genomas (a menos que haja alguma contra-força fora da seleção a ser descoberta). Denomino esse problema fundamental de Entropia Genética. Essa não é uma premissa axiomática, mas uma conclusão lógica derivada de análise cuidadosa de como o processo de mutação / seleção realmente opera. Se a mutação/seleção não pode prevenir a degeneração do genoma, então o Axioma Primário está errado. Não é apenas implausível. Não é apenas improvável. É absolutamente equivocado. Não é apenas um falso axioma. É uma hipótese sem apoio e desacreditada, e pode ser rejeitada com convicção. A mutação/seleção não pode interromper a perda de informação genômica, muito menos criar o genoma! Por quê? Porque a seleção ocorre no nível do organismo inteiro. Ela não pode interromper a perda de informação (que é
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incomensuravelmente complexa) devido à mutação, e está acontecendo no nível molecular. É como tentar corrigir um computador com um martelo. A complexidade microscópica do computador torna o martelo em grande parte irrelevante. Da mesma forma, a complexidade microscópica da mutação genômica torna a seleção ao nível de todo o indivíduo em grande parte irrelevante. Em nosso primeiro capítulo, consideramos um cenário estreitamente análogo, onde tentamos promover a tecnologia de transporte. Propomos usar um “escriba” robótico, quase-cego, que introduz erros nos manuais de instruções no início da fábrica de carros. Em seguida, adicionamos um “juiz” robótico, quase-cego, que faz o controle de qualidade na outra extremidade da linha de montagem. Nenhum ser humano jamais entra na fábrica. Perguntamos: “Os carros que saem da linha de montagem se tornarão progressivamente melhores ou piores?” Os carros evoluirão para naves espaciais? Tudo o que temos considerado deve tornar a resposta óbvia. Os carros não evoluirão para naves espaciais. Na verdade, eles vão se tornar progressivamente carros inferiores. O robô de controle de qualidade pode, na melhor das hipóteses, atrasar o inevitável fracasso do negócio. Mais tempo ajuda nesse cenário? Não, tempo infinito apenas nos daria uma certeza infinita de que o sistema falhou. Mas nossa fábrica não possui tempo infinito nem recursos infinitos. A vida real é como um negócio, e deve continuamente “pagar todos os custos” ou sair do negócio (morrer). Apesar de grandes quantidades de condicionamento mental do público pelas instituições educacionais, creio que a maioria das pessoas ainda vê instintivamente que a acumulação inevitável de erros ortográficos dentro de manuais de montagem não pode transformar um carro em uma nave espacial. Nosso agente de controle de qualidade nunca, jamais verá um carro divergente que tem um motor de foguete, não importa quanto tempo ele espere, nem quantos erros ortográficos ocorram no manual. Isso se deve à probabilidade e ao problema da complexidade irredutível, descrito por Behe (1996). Mesmo que o juiz tenha visto um carro divergente com um foguete, ele teria que rejeitá-lo porque um carro com um foguete ainda não é um meio de transporte
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melhor. Nosso juiz (seleção natural) possui um Q.I. de zero, possui visão zero, e não tem nenhum conceito do que poderia ser uma nave espacial. Portanto, não tem nenhuma concepção das mudanças necessárias para tornar um carro mais parecido com uma nave espacial, e jamais selecionaria esses desvios. O único caminho possível que ele poderia selecionar para obter uma nave espacial seria selecionando carros melhores, o que é claramente paradoxal. Mesmo que o nosso juiz pudesse começar a escolher os carros mais “parecidos com espaçonaves” (a maioria, ele enfaticamente não pode), levaria um número de erros de ortografia astronomicamente tão grande para criar uma nave espacial funcional que seria essencialmente uma eternidade. Mas lembre-se” a nossa fábrica de automóveis não pode se dar ao luxo de esperar para sempre. Ela tem que pagar suas contas hoje. De fato, aqueles carros que pudessem ser mais “parecidos com espaçonaves” também seriam menos “parecidos com carros”. Em outras palavras, eles seriam produtos disfuncionais, análogos às monstruosidades biológicas. A falência aguarda qualquer uma dessas empresas comerciais. Uma análise cuidadosa, em muitos níveis, revela consistentemente que o Axioma é absolutamente errado. Será que você se importaria em investir suas economias de vida em uma nova empresa que decidiu usar o esquema de fabricação de mutação/seleção? Seus promotores dizem que será tudo robótico. Nenhum agente humano será necessário na fábrica, e nos asseguram que a empresa produzirá produtos cada vez melhores. Lembre-se: não estamos falando sobre um programa financiado de pesquisa e desenvolvimento. Estamos falando sobre geração de receita, linha de montagem de crescimento! Algum comprador? Eu certamente descartaria isso como uma fraude. Apesar de brilhantes panfletos e endossos VIP, sabemos que qualquer esquema desse tipo poderia apenas deteriorar os carros, e nunca poderia produzir uma nova espaçonave revolucionária. Se o genoma está se deteriorando, nossa espécie está degenerando. Parece haver um paralelo entre o envelhecimento de uma espécie e o envelhecimento de um indivíduo. Ambos parecem envolver a acumulação progressiva de mutações. As mutações acumulam-se tanto dentro de nossas linhas celulares reprodutivas quanto das linhas celulares do nosso corpo. De qualquer
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forma, os erros ortográficos se acumulam até que um limite seja alcançado, quando as coisas começarem rapidamente a desmoronar. Isso resulta em um intervalo maior para a vida útil. A expectativa de vida humana atualmente tem uma média de cerca de 70 anos, com um máximo próximo de 120. No entanto, quando primos de primeiro grau se casam, seus filhos têm uma grande redução da expectativa de vida. Por que isso acontece? Porque a endogamia expõe os erros genéticos dentro do genoma (mutações recessivas) que ainda não tiveram tempo de “vir à superfície”. A endogamia é como uma espreitadela de onde estamos indo geneticamente como espécie. A redução da expectativa de vida de crianças endogâmicas reflete o envelhecimento geral do genoma e revela o reservatório oculto de dano genético (mutação recessiva) que tem se acumulado. Se todos esses danos genéticos fossem expostos repentinamente (se todos fôssemos perfeitamente consanguíneos e homozigóticos), isso seria perfeitamente letal. Todos nós estaríamos mortos. Nossa espécie se extinguiria imediatamente. Os danos genéticos resultam no envelhecimento, e o envelhecimento diminui o período de vida. Isso é verdade para os indivíduos e para a população. A Bíblia registra um tempo limitado quando as pessoas tinham vidas extremamente longas, e quando a endogamia era inteiramente benigna. Na verdade, as expectativas de vida registradas no livro de Gênesis parecem inacreditáveis. De acordo com a Bíblia, no início, as pessoas rotineiramente viviam mais de 900 anos de idade! Atualmente, isso parece absurdo. Mas nossa perspectiva e nosso entendimento são muito limitados. Ainda não sabemos por que a maioria dos mamíferos têm período de vida máximo de menos de 20, enquanto o homem é de cerca de 120 anos. Mesmo os chimpanzés têm uma expectativa de vida máxima inferior à do homem. No entanto, pelo menos sabemos isto: a mutação está claramente envolvida no envelhecimento. Assim, se inicialmente não houvesse mutações, você não esperaria que a idade humana máxima fosse muito mais longa? Nessa perspectiva, além das mutações, as idades humanas de centenas de anos não seriam tão disparatadas. Elas seriam lógicas. Na verdade, por que morreríamos mais cedo? O trabalho de um matemático e um teólogo apresenta alguns dados fas-
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cinantes (Holladay; Watt, 2001). O estudo deles compara o tempo de vida dos primeiros personagens bíblicos com quantos anos eles nasceram depois do patriarca Noé. Esses dados bíblicos (registrados há milhares de anos) claramente revela uma curva de decaimento. Essa curva só pode ser descrita como biológica. Meus colegas e eu fizemos uma análise mais completa, produzindo resultados mais marcantes (Figura 16). Essa tendência inesperada nos dados bíblicos é incrível. Somos forçados a concluir que o escritor de Gênesis ou registrou fielmente um decrescimento exponencial de vidas humanas ou criou os dados usando um sofisticado modelo matemático. Criar esses dados exigiria um conhecimento avançado de matemática, bem como um forte desejo de mostrar uma decadência exponencial. Mas sem o conhecimento da genética (descoberta no século 19) e da mutação (descoberta no século 20), por que o autor de Gênesis teria desejado mostrar uma curva de decaimento biológico? Não parece razoável atribuir esses dados a uma elaborada fraude da Idade do Bronze. A conclusão mais racional é que os dados são reais, e que expectativa de vida humana já foi de centenas de anos, mas decaiu progressivamente até os valores atuais. A explicação mais óbvia para tal decrescimento de vida, à luz de todas as discussões acima, seria a deterioração genética devido ao acúmulo de mutação. A curva descendente é especialmente acentuada nas primeiras gerações, sugerindo que pode ter ocorrido uma taxa de mutação substancialmente elevada naquele momento. Meus colegas e eu temos realizado milhares de simulações numéricas para melhor compreender a degeneração genética em populações humanas. Usando as taxas de mutação conhecidas e outras configurações de parâmetros biologicamente razoáveis, constantemente vemos o seguinte: a) as mutações mais prejudiciais não são seletivamente eliminadas, e assim elas se acumulam linearmente e sem limites; b) mutações benéficas são por demais raras e geralmente muito sutis para compensar significativamente as mutações deletérias acumuladas; c) a aptidão declina continuamente, manifestando uma curva biológica de decaimento que segue uma trajetória muito semelhante aos dados bíblicos mostrados na Figura 16.
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Muitas linhas de evidência indicam que a curva descendente é muito real. Estamos morrendo – como indivíduos e como espécies. O Axioma Primário está equivocado. À parte da intervenção inteligente, as informações sempre se deterioram. À parte de algumas contra-forças muito mais eficazes do que a seleção natural, os genomas se deterioraram. A vida não está subindo, progredindo, mas descendo. A seleção não cria informações e, na melhor das hipóteses, pode apenas diminuir a sua deterioração. A teoria da informação indica claramente que as informações e os sistemas de informação só surgem através de meios inteligentes e são preservados apenas pela inteligência (Gitt, 1997). Computadores e programas de computador não surgem espontaneamente; eles são cuidadosamente projetados. Mesmo vírus de computador, contrariamente à percepção popular, não surgem espontaneamente; eles são cuidadosamente e maliciosamente concebidos. O surgimento da internet criou um vasto experimento para ver se as informações podem se organizar por si mesmas. E agora sabemos que não. Tudo o que acontece na internet, mesmo aquilo que é ruim, é projetado. É a natureza fundamental da informação se deteriorar. Essa realidade se reflete ao nosso redor, a partir da ilustração da sala cheia de sussurros, de sistemas envolvendo cadeias de comando, até a quebra rotineira de nossos sistemas de computador. O motivo pelo qual nossos sistemas de informação não se deterioram ainda mais rapidamente se deve aos sistemas elaborados e inteligentemente concebidos, criados para estabilizar e preservar essa informação. No entanto, mesmo os melhores sistemas de informação, além da manutenção inteligente e da intervenção contínua da inteligência, sempre entrarão em colapso. Tipicamente, computadores se transformam em lixo dentro de 5 a 10 anos. Os sistemas genéticos de vida podem ser vistos como sistemas de informação inteligentemente projetados, e a seleção natural pode ser vista como um mecanismo de estabilização inteligentemente projetado. Mesmo que esses sistemas demonstrem ser soberbamente projetados, eles ainda estão se deteriorando, à parte da intervenção inteligente de seu projetista. Qual é o mistério do genoma? Sua própria existência é o seu misté-
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rio. Informação e complexidade que superam a compreensão humana são programadas num espaço menor que uma partícula invisível de poeira. A mutação/seleção não pode sequer começar a explicar isso. Deve ficar muito claro que nosso genoma não poderia ter surgido espontaneamente. A única
O termo entropia tem vários usos. Estou usando o termo entropia como é mais comumente usaatualização do, isto é, a tendência universal para que as coisas de 2008 se desgastarem ou degradarem à parte da intervenção inteligente. Entropia genética significa especificamente entropia como se aplica ao genoma. Ela reflete a tendência inerente para que os genomas se deteriorem ao longo do tempo à parte de intervenção inteligente. A entropia genética está diretamente relacionada à entropia física, como esse termo é usado formalmente por engenheiros e físicos. As mutações são resultado de a entropia física se manifestar no nível molecular. Isso se deve a forças atômicas aleatórias e à operação imperfeita das “nanomáquinas” que afetam a replicação do DNA e o reparo do DNA. A própria seleção natural pode ser vista como um tipo de aparelho mecânico que reduz a entropia mutacional filtrando certas mutações. Como todas as máquinas, a biomaquinaria afeta a replicação do DNA, o reparo do DNA e a eliminação seletiva – tudo operando a menos de 100% de eficiência (a ineficiência mecânica é uma medida de entropia). Portanto, a entropia tradicional, em seu sentido mais formal, está na raiz da “entropia mutacional” e da “ineficiência de seleção”, e juntas, estão na raiz da entropia genética. O termo “entropia de Shannon” é usado por alguns para confundir a questão da entropia genética. A entropia de Shannon é um termo lamentável e enganoso que foi cunhado para se referir a certas propriedades estatísticas de informações potenciais. É uma forma de medir o “valor surpresa” de uma letra dentro de uma sequência de letras. Qualquer padrão de repetição simples CAPÍTULO 10 - A CURVA DESCENDENTE É REAL?
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reduz o valor de entropia de Shannon da cadeia. Um alto valor de informação Shannon pode refletir um conjunto aleatório de cartas ou um poema cuidadosamente escrito! Em outras palavras, os valores elevados de entropia de Shannon podem refletir tanto o planejamento inteligente ou o caos aleatório. Não é um termo útil no contexto desta discussão. A alta entropia de Shannon meramente diz: “Simplesmente não há um padrão de repetição aqui.” É um termo usado em um sentido muito limitado e específico e não é aplicado de forma produtiva aos sistemas de informação biológica. Só pode ser usado para deliberadamente ofuscar nossa compreensão do genoma e seu decaimento. O próprio Shannon advertiu contra a aplicação de sua terminologia a sistemas biológicos.
Figura 14
Simulação numérica biologicamente realista do processo de mutação/seleção dentro da população humana.
alternativa razoável a um genoma espontâneo é um genoma projetado. Não é um mistério incrível – digno de nossa reflexão? Esta simulação numérica emprega uma taxa de mutação de 100, um tamanho populacional de 10.000, e assume um “DNA lixo” mínimo. É assumido que uma mutação em mil foi benéfica. Acima,
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é mostrada a contagem de mutações por indivíduo ao longo do tempo é mostrado. Abaixo, é mostrado o declínio em aptidão em relação à população inicial. No eixo esquerdo é mostrada a aptidão, enquanto o tempo (gerações) é apresentado ao longo do eixo inferior (200 gerações, aproximadamente 4 mil a 6 mil anos). Reduzir a taxa de mutação pela metade ou o tamanho crescente da população dez vezes não muda fundamentalmente a trajetória observada. A trajetória mostrada neste experimento de simulação numérica é notavelmente semelhante às Figuras 4, 10a, 10b, 15 e 16. A área sombreada reflete o desvio padrão da condição
Figura 15
Dados biológicos reais, mostrando o acúmulo de mutações e o declínio de aptidão no vírus da gripe humana física da população. Acima: o gráfico mostra o acúmulo de mutações dentro da estirpe de H1N1, após a pandemia de 1918 (mais de 10% do genoma viral sofreu mutações) (Carter e Sanford, 2012). Abaixo: este gráfico ilustra a patogenicidade (isto é, aptidão) da estirpe de H1N1 (linha contínua), bem como as outras duas estirpes da gripe
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causadoras de pandemia (linhas tracejadas), durante o último século (de Simonsen, et al., 1998). Todas as três estirpes (H1N1, H2N2 e H3N2) apresentam declínio exponencial. A versão humana de H1N1 aparentemente foi extinto em 2009. Figura cortesia do Dr. Rob Carter. Quando os períodos de vida dos personagens bíblicos são comparados com o tempo para as gerações depois de Noé, vemos um declínio dramático na expectativa de vida com uma forte aparência de uma curva de
Figura 16 Tempo de vida humana na história inicial, como registrado na Bíblia.
decaimento biológico. Enquadrar os dados na “linha de melhor ajuste” revela uma curva exponencial seguindo a fórmula y = 1064.7x0,766. A curva se ajusta muito bem aos dados, com um coeficiente de determinação de 0,96 (1,0 se-
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ria um ajuste perfeito). Parece altamente improvável que esses dados bíblicos possam ter resultado de uma fabricação antiga. A curva é muito consistente com o conceito de degeneração genômica causada pelo acúmulo de mutações. A curva é muito semelhante às curvas teóricas mostradas nas Figuras 4, 10a, 10b, 14 e os dados biológicos na Figura 15. Para mais informações sobre esta análise dos patriarcas e suas idades, veja LogosRA.org (artigo intitulado “Genetic Entropy recorded in the Bible?“).
Desde a primeira publicação deste livro, em 2005, tem havido numerosas descobertas científicas que apoiam fortemente a tese deste livro. Esses novos desenvolvimentos científicos indicam que o problema da entropia genética é profundo, e que o Axioma Primário não é mais defensável. Algumas dessas evidências vêm de outras pesquisas, mas a maioria das evidências vem da pesquisa que tenho realizado em colaboração com uma equipe de cientistas. Abordei esses novos desenvolvimentos científicos em capítulos anteriores, mas agora pretendo reunir todos os novos desenvolvimentos num só capítulo.
N O VA S E V I D Ê N C I A S E X P E R I M E N TA I S D E M E U S COLABORADORES E EU
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capítulo 11
Resumo dos principais desenvolvimentos científicos recentes Fato rápido: a defesa da entropia genética agora está muito mais robusta.
1. Validação da Entropia Genética usando simulação numérica: Nos últimos 10 anos, meus colegas e eu desenvolvemos o programa de simulação numérica mais avançado do mundo para estudar o processo de mutação/ seleção (Sanford et al., 2007a, 2007b; Sanford e Nelson, 2012). Esse programa de simulação biologicamente realista (Contador de Mendel [Mendel’s Accountant]) tem sido usado para realizar uma série de experimentos empíricos que confirmam fortemente todas as conclusões logicamente deduzidas deste livro. O programa de Mendel simula fielmente uma população virtual biologicamen-
te realista, e cria uma matriz biologicamente realista de mutações que são acrescentadas a indivíduos de cada geração. Mendel então simula de maneira realista a recombinação, reprodução e geração de progênie. Entre a progênie, uma fração especificada é selecionada com base na aptidão, e o processo é repetido geração após geração. Todas as circunstâncias relevantes (variáveis) que afetam a eficiência da seleção e o acúmulo de mutação podem ser especificadas pelo usuário do programa. Mendel não é programado para produzir qualquer resultado específico – ele simplesmente simula o processo de mutação/seleção como os biólogos entendem que ele opera na natureza. O resultado de qualquer experimento de simulação específico depende das circunstâncias biológicas exatas que o usuário especifica. Usando qualquer conjunto de circunstâncias biologicamente razoáveis, é vista a entropia genética (isto é, a acumulação de mutações deletérias contínuas e o subsequente declínio de aptidão). A evolução futura só é observada usando configurações biologicamente muito pouco realistas. a) A maioria das mutações deletérias se acumulam de maneira ilimitada. Quando o Mendel é usado para fazer experimentos de simulação que empregam configurações biologicamente razoáveis, revela consistentemente o seguinte: a) Somente as piores mutações são efetivamente selecionadas, enquanto o restante (aproximadamente 90%) se acumulam a uma taxa notavelmente constante (Gibson et al., 2013); b) Existe um “limiar de seleção” mensurável no qual a seleção se torna ineficaz para mutações deletérias de baixo impacto (Gibson et al., 2013); c) Todo e qualquer tipo de ruído biológico e genético resulta em um aumento no limiar de seleção observado, de modo que cada vez mais as mutações deletérias se acumulam (Gibson et al., 2013). b) Mutações benéficas, em sua maior parte, não conseguem amplificar. Em relação às mutações benéficas, as experiências de simulação do Mendel mostram consistentemente o seguinte: a) Existe também um “limiar de seleção” mensurável para mutações benéficas, em que a seleção torna-se ineficaz para as mutações de baixo impacto (Sanford et al., 2013); b) Todo e qualquer tipo de ruído biológico e genético causa um aumento no limiar de seleção
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observado para mutações benéficas, de modo que cada vez mais mutações benéficas não sejam amplificadas seletivamente (Sanford et al., 2013); c) Em configurações realistas, mais de 98% das mutações benéficas não são amplificadas (Sanford et al, 2013); d) As mutações benéficas raras de alto impacto são fortemente amplificadas por seleção e vão à fixação rápida, mas, quando isso acontece, ela interfere fortemente com a seleção de benefícios mais fracos. Isso leva a um limiar de seleção mais alto e a um número menor de mutações benéficas totais sendo corrigidas. A aptidão sempre diminui, exceto quando são fornecidas altas taxas de mutações benéficas, e onde são incluídos benefícios benéficos de alto impacto. Mesmo tendo em conta um fornecimento generoso e contínuo de mutações benéficas combinadas com uma seleção muito intensa, a proporção de mutações boas a ruins que se acumulam não é revertida. Isso resulta em redução contínua no tamanho do genoma funcional (o número de mutações deletérias acumuladas sempre excede os benéficos). Dado tempo suficiente, isso deve invariavelmente a levar à extinção (Sanford et al., 2013). c) Invalidação dos dois principais “dispositivos de resgate”. Em resposta ao problema bem estabelecido (mas geralmente não mencionado) da acumulação de mutações deletérias, dois mecanismos de resgate têm sido invocados (veja Capítulo 7). Sem um mecanismo de resgate eficaz, o Axioma Primário não pode ser sustentado. O primeiro mecanismo de resgate é o mecanismo de contagem de mutações (MCM). O conceito diz respeito a direcionar a seleção natural para que ela atue com base no número de mutações deletérias por indivíduo (e não com base na aptidão física). Isso requer uma seleção artificialmente forte focada nesses indivíduos com um pouco mais de mutações deletérias que as outras pessoas. A chave para este mecanismo de resgate é simples – ela assume artificial e arbitrariamente que todas as mutações são essencialmente iguais em seus efeitos deletérios. Convenientemente, usando esta construção mental artificial, mutações quase neutras são eliminadas, e o problema da mutação quase-neutra desaparece. Este modelo nem se parece remotamente com a realidade. O mecanismo requer que a natureza alinhe todos os indivíduos,
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conte suas mutações e, com alta precisão, selecione os indivíduos de maior contagem. Isso simplesmente não acontece. Nossa equipe investigou este mecanismo de maneira bastante detalhada, usando experimentos de simulação numérica. Mesmo que todas as mutações sejam tornadas de igual efeito (obviamente isso não é verdade na natureza), nossas simulações numéricas mostram claramente que o MCM falha completamente sempre que a seleção de probabilidade realista é operacional. Isso é relatado em uma publicação científica recente (Brewer et al., 2013a). Veja a figura 10a. O mecanismo de resgate MCM já foi invalidado com um alto grau de certeza, e, honestamente, não pode mais ser invocado. Artigos recentes que alegam ter resolvido o problema de uma taxa de mutação humana de alto nível parecem estar estabelecendo de forma involuntáriacondições que permitem a ativação do mecanismo de contagem artificial de mutações (veja Capítulo 7). Este efeito é um artefato de modelos por demais simplificados, e desaparecem instantaneamente sob condições realistas. O segundo mecanismo de resgate é o mecanismo de epistasia sinérgica (SE). Este mecanismo de resgate é semelhante ao primeiro, mas envolve mais ofuscação e ginástica mental (veja Capítulo 7). Novamente, a seleção é focada em indivíduos com maior número de mutações, em comparação com os outros indivíduos. Não se supõe que as mutações tenham efeitos iguais. Em vez disso, cada mutação individual torna-se cada vez mais prejudicial à medida que aumenta a contagem de mutações do indivíduo. Espera-se que isso efetivamente amplie a seleção contra indivíduos de alta contagem de mutações. Este tipo de interação imaginária entre as mutações é chamado de “epistasia sinérgica”. É bem sabido que este não é geralmente como as mutações interagem. Este termo sofisticado é invocado por geneticistas populacionais com o único objetivo de tentar criar um mecanismo de resgate alternativo que possa parecer crível. Realizamos extensas experiências de simulação numérica para ver se esse mecanismo artificial realmente funciona. Mesmo usando as configurações mais generosas, o mecanismo de resgate sinérgico da epistasia não consegue interromper o acúmulo de mutação deletéria. Em vez de diminuir o declínio da aptidão, esse mecanismo realmente acelera a degeneração e a
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extinção (como é esperado logicamente, e como previsto nas edições anteriores deste livro). Isso é relatado em uma publicação científica recente (Baumgardner et al., 2013). Veja a Figura 10b. Este segundo mecanismo de resgate também foi invalidado com um alto grau de certeza e não pode mais ser honestamente invocado. Não há outros mecanismos de resgate críveis propostos – tornando o Axioma Primário inteiramente indefensável. d) Invalidação de Avida. O programa chamado Avida foi desenvolvido com o objetivo de demonstrar a “evolução digital”. Tem sido alegado que esse programa mostra que os sistemas de mutação/seleção podem gerar novas informações dentro de um contexto virtual. Avida não é uma simulação numérica, mas uma simulação de jogo de computador que pode criar e selecionar aleatoriamente elementos variantes de comandos do computador. Isso tem paralelos óbvios com a evolução e é dito que prova a validade do Axioma Primário. À primeira vista, experiências usando Avida parecem contrariar o que as simulações contábeis de Mendel revelam. Por esta razão, comparamos e contrastamos estes dois programas de computador. Comparado ao Contador de Mendel (Mendel’s Accountant), que é a simulação mais realista biologicamente do processo de mutação/seleção desenvolvido até hoje, Avida nem sequer é remotamente fiel à realidade biológica. A característica artificial mais importante de Avida é a natureza de seu sistema seletivo de recompensa/penalidade. Uma única “mudança mutacional” que está determinada a ser benéfica dentro da Avida, está programado a dobrar a taxa de reprodução instantaneamente (“aptidão” de Avida). Uma única mudança mutacional que é definida como deletéria é programada para reduzir instantaneamente a taxa de reprodução pela metade. Quando há múltiplas mutações, as recompensas/penalidades da Avida aumentam de forma multiplicativa. Dadas essas recompensas/penas grosseiramente exageradas, que são de ordens de grandeza muito altas, a seleção dentro da Avida é extremamente eficaz. Apenas um punhado de mudanças mutacionais favoráveis podem ampliar a aptidão um milhão de vezes. Curiosamente, quando são atribuídas ao Mendel recompensas/penas seletivas semelhantes, a mesma evo-
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lução explosiva é vista, resultando na amplificação da aptidão por mais de um milhão de vezes. Ambos os programas mostram uma evolução explosiva quando dado esses tipos de configurações extremamente irrealistas. Mas essas configurações não coincidem com a realidade, e tais aumentos de aptidão explosivos nunca foram vistos no campo biológico. Quando as configurações de Avida são modificadas para refletir recompensas/penalidades seletivas biologicamente realistas- imediatamente não há evolução direta (Nelson e Sanford, 2011). Nem uma única mutação benéfica é selecionada. Nenhum bit binário de informação é criado. Então, o que acontece ao iniciar uma população Avida usando as configurações padrão (recompensa e penalidades extremamente grandes) – e, depois, ajustamos as configurações para serem biologicamente realistas? Usando as configurações irrealistas, podemos amplificar todas as possíveis mutações benéficas e eliminar todas as possíveis mutações deletérias. O resultado é que a aptidão rapidamente aumenta mais de um milhão de vezes. Quando as configurações são ajustadas para serem realistas, todas as funções ganhas são rapidamente perdidas. Isto é essencialmente equivalente à extinção – a “informação” recém-criada é revertida para zero. Surpreendentemente, Mendel e Avida comprovam a realidade da entropia genética sempre que se aplicam configurações biologicamente realistas. Isso é relatado em duas publicações científicas distintas (Nelson e Sanford, 2011; Nelson e Sanford, 2013). Quando as configurações biologicamente realistas são usadas, Avida afirma a realidade da entropia genética. Avida realmente neutraliza o Axioma Primário. e) Validação do “Dilema de Haldane”. Na década de 1950, logo após o descobrimento do DNA, um importante geneticista populacional (um dos criadores do Axioma Primário) percebeu que havia um problema. Haldane viu que, mesmo que houvesse um suprimento abundante e contínuo de mutações benéficas, a seleção natural deve ser muito limitada em sua capacidade de ampliação dessas mutações até o ponto onde elas são “fixadas” dentro de uma população considerável. Ele calculou que para uma população de mamíferos, como o ser humano, dado um tamanho populacional evolutivo de 10.000, apenas cerca de 1.000 mutações bené-
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ficas poderiam ser seletivamente fixadas dentro de 6 milhões de anos (esse é o tempo estimado atual para os símios evoluírem para humanos). À luz dos dados genômicos, agora sabemos que o genoma humano é profundamente diferente dos símios. Seriam necessárias que dezenas ou mesmo centenas de milhões de mutações benéficas surgissem e se fixassem durante este período de tempo. Esse cenário exigiria cerca de 1.000 fixações benéficas independentes por geração. Haldane disse que isso era impossível; ele estimou que na melhor das hipóteses deve haver apenas cerca de 1 fixação a cada 300 gerações. Este problema veio a ser conhecido como “Dilema de Haldane”. Ele foi amplamente investigado por Walter ReMine, que usou uma formulação matemática inteiramente independente do problema e chegou exatamente às mesmas conclusões (ReMine, 2005). Temos usado uma terceira abordagem do problema, empregando experimentos de simulação numérica. Nossos experimentos validam fortemente o trabalho de Haldane e ReMine. Vemos que, dependendo das configurações específicas, apenas algumas centenas a alguns milhares de fixações seletivas podem ocorrer de forma realista durante 300 mil gerações humanas (cerca de 6 milhões de anos) (Rupe e Sanford, 2013). Estamos muito confiantes de que nossos experimentos de simulação numérica são a melhor maneira de entender esse problema. Entre Haldane, ReMine e nosso próprio trabalho, o assunto está claramente resolvido. Isso significa que a história da evolução do símio para homem não é sequer remotamente viável. f) Pesquisa em andamento. Temos experimentos de simulação numérica em curso que continuam a estabelecer a realidade da entropia genética e o colapso do Axioma Primário. O trabalho em curso trará clareza em relação a várias questões importantes. Nossa pesquisa mostra que existe um insuperável “problema de tempo de espera” para a criação de conjuntos específicos de nucleotídeos (a informação não exige apenas letras, mas requer cordas específicas de letras, comparáveis a orações). Nosso trabalho também mostra que existe uma “interferência de seleção” forte e quantificável, que limita ainda mais a seleção potencial de muitas mutações benéficas simultaneamente. Também mostraremos em breve que o acúmulo de mutações deletérias que são recessivas, acontecendo
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em milhões de pontos em todo o genoma, deve levar a uma crise de aptidão extrema. Como tais mutações derivam para frequências elevadas, os homozigotos começam a surgir e contribuem para uma carga genética letal. Por fim, em breve mostraremos que a seleção do grupo não pode explicar o comportamento altruísta. Todas essas experiências de simulação empírica produziram (e continuam a produzir) resultados que foram previstos nas edições anteriores deste livro. Isso mostra que a lógica deste livro é sólida e preditiva. As experiências de simulação numérica sempre validaram todas as deduções lógicas descritas neste livro (Baumgardner et al., 2008; Baumgardner et al., 2013; Brewer et al., 2013a; Brewer et al., 2013b; Gibson et al., 2013; ; Nelson e Sanford, 2013; Rupe e Sanford, 2013; Sanford et al., 2007a; Sanford et al., 2007b; Sanford et al., 2008; Sanford e Nelson, 2012; Sanford et al., 2013). A simulação numérica abrangente do processo de mutação/seleção deve revolucionar o campo da genética populacional. Pela primeira vez, podemos realmente ver como o processo de mutação/seleção se desenrola, em relação a qualquer conjunto específico de condições. Não estamos mais limitados a formulações matemáticas abstratas com base em muitas camadas de suposições simplificadoras não razoáveis. Essa crescente percepção deve eventualmente transformar o campo da genética populacional em seu âmago. Para citar outro grupo de pesquisa que realizou uma abrangente simulação numérica do processo de mutação/seleção (Qui et al., 2014):
“A modelagem computacional de processos genéticos pode ser considerada um ramo avançado de autômatos celulares, nomeado por Wolfram [...] “como um novo tipo de ciência”. [...] Wolfram demonstrou que qualquer sistema de elementos interagindo cria padrões dentro de seus arranjos, que são difíceis de prever matematicamente, mas suficientemente simples para serem reproduzidos e estudados computacionalmente”. Isso é exatamente o que vimos em nosso próprio estudo numérico. O CAPÍTULO 11 - RESUMO DOS PRINCIPAIS DESENVOLVIMENTOS CIENTÍFICOS RECENTES
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“quadro completo” da genética populacional não pode ser respondido até que paremos de tentar transformar sistemas de população biológica complexos e dinâmico em fórmulas matemáticas por demais simplificadas. Somente através de uma simulação numérica abrangente podemos trazer clareza para as grandes questões. Toda a área precisa de um novo começo.
2. Validação da Entropia Genética em populações reais: Experimentos de simulação numérica precisam concordar com observações biológicas do mundo real. Isso é difícil de documentar, porque a entropia genética só deve se manifestar claramente após muitas gerações. Esse é, obviamente, um problema quando falamos de organismos de vida longa como os mamíferos, nos quais um experimento de entropia genética teria que durar minimamente muitas centenas de anos. Mesmo em bactérias isso geralmente é verdade, porque, embora elas tenham tempos de geração baixos, também possuem taxas de mutação muito baixas por geração. Para esperar ver evidências de entropia genética dentro de um cenário biológico, é necessário um organismo que possua um tempo de geração curto e uma taxa de mutação relativamente alta. Os vírus de ARN são perfeitamente adequados para esse fim. a) Documentação da degeneração genética da linhagem da gripe H1N1. Documentamos a degeneração da entropia genética dentro da estirpe humana do vírus da gripe que causou a grande pandemia de 1918 (Carter e Sanford, 2012). Antes de examinar a evidência histórica da degeneração genética do genoma viral, realizaram-se experimentos preliminares de simulação numérica. O Contador de Mendel (Mendel’s Accountant) foi usado para modelar a acumulação de mutação em um hipotético vírus de RNA semelhante ao vírus da gripe (Brewer et al., 2013b). Esses experimentos de simulação numérica inicial indicaram fortemente que os vírus de ARN devem acumular rapidamente mutações deletérias a uma taxa constante, fazendo com que o vírus desapareça e se extingue em um prazo razoavelmente curto. Nesta base, prevemos que esse mesmo padrão seria evidente para a estirpe do vírus da gripe H1N1 humana. A gripe H1N1 entrou na população humana há cerca de 100 anos e, em sua primeira pandemia, causou a morte de 50 a 100 milhões de pessoas. As
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amostras de vírus H1N1 foram coletadas ao longo das décadas, e todos esses genomas foram sequenciados na última década. Dado o genoma reconstruído da estirpe original de 1918, conseguimos comparar a estirpe original com todos os genótipos subsequentes, permitindo-nos testar a nossa previsão analisando o acúmulo de mutações nesta estirpe viral ao longo do século passado (Carter e Sanford, 2012). O resultado dessa análise é um acúmulo de mutações muito rápido e notavelmente constante. O aumento das mutações correlacionou-se fortemente com uma “aptidão” contínua (patogenicidade), levando a um eventual desaparecimento da estirpe em 2009 (depois de mais de 10% do genoma viral terem mutado). Estes resultados estão resumidos na Figura 15. Estes resultados notáveis simultaneamente validam a realidade da entropia em uma população biológica real e validam a confiabilidade do Contador de Mendel (Mendel’s Accountant) para prever com precisão a degeneração genética de uma população biológica real. b) Reexame do experimento de Lenski envolvendo bactéria Escherichia coli Desde 1988, Lenski e colegas têm desenvolvido uma experiência a longo prazo destinada a documentar a evolução do E. Bactéria de coli dentro de um ambiente de tubo de ensaio (Barrick et al., 2009; Lenski, 2011). Várias décadas é um tempo muito curto – embora mais de 50 mil ciclos de divisão celular tenham ocorrido. A alegação de que essa experiência de alguma forma envolve “tempo profundo” ou reflete a macroevolução não é precisa nem razoável. Durante um período de algumas décadas, uma estirpe de bactéria E. coli tornou-se ligeiramente mais bem adaptada a um meio nutritivo artificial. Isso não é inesperado ou notável de qualquer forma, mas simplesmente reflete o ajuste fino. Ainda é o mesmo tipo de bactéria: E. coli. Pelo fato de que o experimento de Lenski só funcionou por uma fração do tempo em relação ao H1N1, e pelo fato de que a taxa de mutação por nucleotídeo em bactérias é pelo menos mil vezes menor do que em relação ao vírus da gripe, a população da gripe reflete muito melhor um “tempo profundo” do as populações bacterianas de Lenski. Nas populações de Lenski, algumas centenas de mutações foram acumuladas por célula, enquanto na população da gripe cerca de 2.000 mutações se acu-
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mularam por partícula viral. Mais de 10% do genoma viral sofreu mutações, enquanto a mudança no genoma bacteriano foi trivial (algumas centenas de mutações dentro de um genoma de mais de 4 milhões de pares de bases). O experimento de Lenski precisa durar muitos séculos antes que possamos esperar ver manifestações extremas de entropia genética observadas no vírus H1N1. No entanto, quando visto de maneira mais atenta, os próprios dados de Lenski ainda revelam evidências claras de degeneração genética (Rupe e Sanford, em preparação). Quando examinamos as mudanças genéticas específicas que permitiram a adaptação ao ambiente artificial, vemos em todos os casos que a adaptação foi realizada por meio de mutações de perda de função ou perda de regulação (e, portanto, perda de informação). Como mais da metade do genoma de E. coli envolve funções não relevantes para o ambiente artificial estático da experiência de Lenski, o silenciamento desses genes temporariamente “dispensáveis” e a eliminação de todas as funções não relevantes continuarão indefinidamente até o genoma bacteriano ser despojado de sua funcionalidade mínima. Isso deve demorar vários séculos. Desta forma, a eficiência energética máxima será realizada, permitindo que as bactérias (devido ao seu genoma funcional bastante reduzido) cresçam à velocidade máxima dentro do ambiente artificial fixo. Mas essa não é uma evolução progressiva. É degeneração adaptativa, ou evolução redutora – realmente uma forma de entropia genética. As estirpes “evolutivas” estão degenerando em direção ao ponto em que elas só podem crescer em um ambiente específico, extremamente limitado e totalmente artificial. Na realidade, essas estirpes estão cada vez mais incapacitadas e serão cada vez mais impróprias para sobreviver no mundo real. Enquanto um punhado de mutações de perda de função demonstraram aumentar a adaptação ao ambiente artificial, estas são muito superadas em número por outras mutações que estão se acumulando incessantemente, além da seleção, e que não têm efeito visível. Muito razoavelmente, a maioria destes pode ser assumida como mutações quase neutras que são ligeiramente prejudiciais. Ao longo de centenas de anos, as estirpes de bactérias “evolutivas” de Lenski devem, logicamente, se extinguir (se puderem
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ser mantidas no ambiente artificial por muito tempo). As mutações deletérias quase neutras inevitavelmente levarão o genoma bacteriano a “enferrujar” (Gibson et al., 2013; Sanford et al., 2013).
3. Outras linhas de pesquisa, de meus colaboradores e minhas, apoiando a tese deste livro. a) Códigos sobrepostos. Há agora forte evidência de que, dentro de um determinado trecho de DNA genômico, existem várias mensagens sobrepostas. Isso é semelhante a obter um e-mail, obter dele informações úteis, e depois descobrir que parte dele, quando lida para trás, tinha outra mensagem útil; finalmente, ao ler todas as outras letras em outra parte, recebemos uma terceira mensagem sobreposta com informação útil. Agora sabemos que mais da metade do genoma humano pode ser lido “para trás”, bem como “para a frente”. Determinado gene produz, grosso modo, sete transcrições sobrepostas, tendo diferentes posições de início e paragem. As transcrições resultantes são então empalhadas diferencialmente, de modo que qualquer transcrição pode dar origem a muitas proteínas possíveis. Mostramos que esses tipos de códigos sobrepostos afetam profundamente a probabilidade de ocorrência de mutações realmente benéficas. A maioria das mutações “benéficas”, embora possam melhorar uma mensagem, irão interromper uma ou mais mensagens sobrepostas. Tais mutações não são verdadeiramente benéficas, mas são, na melhor das hipóteses, ambíguas e benéficas. À luz disso, os biólogos devem ajustar suas taxas estimadas de mutações benéficas para baixo de forma muito dramática (Montañez et Al., 2013). Mutações que são inequivocamente benéficas, e também impactante o suficiente para ser selecionáveis, são extremamente raras. b) Invalidação do “Teorema de Fisher”. Estamos agora em preparando uma publicação que refuta formalmente o “Teorema Fundamental da Seleção Natural” de Fisher. Esse teorema foi fundamental para estabelecer a teoria neodarwiniana. O principal erro de Fisher foi sua crença de que o efeito líquido das mutações seria neutro. Ele pensava que as mutações benéficas poderiam ser tão comuns e tão impactantes como as
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mutações deletérias. Naquela época, não se compreendia que os genes contêm informações, tal como um manual de instruções, e que as mutações são erros tipográficos aleatórios dentro dessas instruções. Portanto, Fisher não compreendeu que novas mutações devem ser esmagadoramente prejudiciais e que quaisquer possíveis erros benéficos que possam surgir terão, em geral, um benefício muito pequeno. Como o efeito líquido da mutação é negativo, a premissa central de Fisher estava equivocada, invalidando toda a sua tese. O teorema de Fisher não é aplicável à biologia do mundo real. Isso significa que uma das primeiras e mais fundamentais pedras angulares da teoria neodarwiniana é demonstravelmente falsa.
N O VA S E V I D Ê N C I A S D E O U T R O S C I E N T I S TA S 1. O livro “Biological Information – New Perspectives” é a mais importante publicação recente que anuncia o colapso da teoria neodarwiniana. Esse livro é o processo de um recente simpósio realizado na Universidade Cornell e contém os resultados da pesquisa de 29 cientistas qualificados. Esses autores, que representam muitas disciplinas científicas diferentes, estão em consenso de que o Axioma Primário não pode explicar a origem dos genomas ou a origem de qualquer outro tipo de sistemas de informação biológica nas células vivas (Marks et al., 2013). Veja Sanford (2014) para uma sinopse das pesquisas. 2. Os resultados de ENCODE (2007, 2012) são o produto da pesquisa biológica convencional do mais alto nível. ENCODE, o equivalente biológico do programa de pesquisa espacial da NASA, incorpora os resultados da pesquisa coletiva de centenas de renomados cientistas. ENCODE narra o colapso do paradigma do “DNA lixo”. Evidência esmagadora é apresentada mostrando que a maior parte do genoma humano é funcional. Isso significa que a maioria das mutações humanas não são neutras, mas prejudiciais. Essa é outra evidência poderosa que anuncia a morte do Axioma Primário. ENCODE também mostra que existem códigos sobrepostos extensivamente, o que significa inequivocamente que as mutações benéficas devem ser extremamente raras. Tudo isso significa que há muito mais informa-
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ções que precisam ser explicadas, e muito menos potencial para ser explicado pelo Axioma Primário. 3. Outro estudo importante confirma que o genoma humano está se degenerando rapidamente. Um artigo recente de Lynch (2010), detalha a natureza das mutações humanas e a subsequente manifestação da entropia genética dentro do genoma humano. O autor reconhece a gravidade desse problema, embora considere que a maior parte do genoma seja constituído de DNA lixo (veja Apêndice 1).
HÁ UMA ESPERANÇA. Como você permaneceu tão diligentemente comigo ao longo de todo o caminho deste livro, e agora chegou ao seu fim, provavelmente você não se sentirá ofendido se eu sair do que tem sido uma discussão estritamente científica e entrar no campo filosófico. Quero lhe apresentar humildemente minhas próprias conclusões pessoais a respeito de onde está a esperança para o genoma humano. Quando eu era jovem, aceitei o fato de que algum dia iria morrer, e que todas as pessoas que eu amava iriam morrer. Aceitei esse fato, mas, para dizer o mínimo, ele roubou minha alegria. Aprendi que ainda havia uma esperança: que o mundo estava ficando melhor. A ciência estava progredindo. A cultura
nota do autor
Quando escrevi a primeira edição deste livro, não poderia ter imaginado que em menos de uma década se materializaria tanta evidência apoiando todos os aspectos da minha tese. Considero isso incrível e sóbrio.
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Poslúdio Que esperança?
estava progredindo. Até mesmo a humanidade estava melhor. Através de nossos esforços, poderíamos tornar o mundo um lugar melhor. Através da evolução, poderíamos evoluir para algo melhor. Através do progresso, poderíamos eventualmente derrotar a própria morte. Possivelmente algum dia poderíamos inverter a deterioração do universo! Minha esperança pessoal era que pudesse de alguma forma contribuir para tal progresso. Creio que essa esperança básica foi compartilhada, em grande medida, por toda a minha geração4. Hoje creio que essa era uma falsa esperança. Ainda acredito que devemos nos aplicar diligentemente para tornar este um “mundo melhor” e a ser administradores responsáveis do mundo que nos foi dado. Mas vejo nossos esforços como uma ação de retenção, na melhor das hipóteses. Embora a ciência possa razoavelmente ter a esperança de prolongar a vida, ela é incapaz de derrotar a morte. A deterioração é certa. Nossos corpos, nossa espécie e nosso mundo estão todos morrendo. Simplesmente não está em nosso poder interromper esse processo fundamental. Isso não é evidente quando olhamos ao nosso redor? Então, onde está a esperança? Se o genoma humano está se deteriorando irreversivelmente, devemos olhar além da evolução para ter uma esperança para o futuro. Um dos meus colegas que revisaram este livro me disse que a mensagem desta obra é aterrorizante e deprimente. Ele sugeriu que talvez eu seja um pouco semelhante a um comissário a bordo do Titanic, espalhando alegremente a notícia de que o navio está afundando. Mas isso não é correto. Eu odeio as consequências da entropia (a deterioração). Odeio vê-lo em meu próprio corpo, na saúde de meus entes queridos, e na deformidade de um bebê recém-nascido. Acho tudo absolutamente horrível, mas também absolutamente inegável. Certamente um verdadeiro comissário de bordo no Titanic teria a responsabilidade de informar as pessoas de que o navio estava afun4. Kimura, 1976: “Vamos nos contentar em nos preservar como um esplêndido exemplo de fósseis vivos nesta minúscula partícula do universo? Ou tentaremos, com todas as nossas forças, nos aprimorar para nos tornarmos super-homens, e alcançar formas ainda mais elevadas, expandindo-nos pelo universo, e mostrando que a vida, afinal de contas, não é um episódio sem sentido?” POSLÚDIO
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dando, ainda que algumas pessoas pudessem odiá-lo por isso. Sinto que estou nessa posição. Pessoas responsáveis devem ser gratas por conhecer as más notícias, de maneira que eles possam responder construtivamente a elas. Se estamos colocando toda a nossa esperança em um navio afundando, não seria conveniente reconhecer isso e abandonar a falsa esperança? É somente à luz disso que podemos avaliar as más notícias. Somente à luz das más notícias podemos realmente apreciar as boas notícias de que existe um bote salva-vidas. Mesmo que não possamos criar a vida, não podemos derrotar a morte. No entanto, reivindico que existe Alguém que criou a vida e que projetou o genoma. Não sei como Ele fez isso, mas de alguma forma Ele certamente criou o hardware, e certamente deve ter escrito o software original. Ele é chamado o Autor da Vida (Atos 3:15). Creio que o Autor da Vida tem o poder de derrotar a morte e a deterioração. Creio que essas são as boas novas. É minha crença pessoal que Jesus é a esperança para o genoma humano, é nossa esperança. Creio que, à parte dele, não há esperança. Ele nos deu a vida no princípio; então pode nos dar uma nova vida hoje. Ele fez o céu e a Terra no princípio, de modo que pode fazer um novo céu e uma nova Terra no futuro. Pelo fato de que Ele ressuscitou dos mortos, nós podemos ser libertados da morte, mesmo a morte que já nos envolve. Nessas profundas e simples verdades, creio que há uma verdadeira esperança. Eu acredito que essa esperança é inabalável, porque acredito que ela está fundamentada naquele que é eterno. É uma esperança que tem resistido aos ataques do tempo e à corrupção da religião. É uma esperança dada livremente a qualquer um que a receber hoje. Humildemente apresento a você este paradigma alternativo para sua consideração – Jesus é nossa única e verdadeira esperança.
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A declaração acima vem de um antigo darwinista, mas não me recordo da fonte. A natureza ubíqua da filosofia subjacente a essa afirmação torna sua fonte irrelevante. Poderia ter vindo de praticamente qualquer darwinista. Na verdade, há 15 anos eu mesmo poderia ter dito isso. Mais de 100 anos depois que foi feita a “declaração de fé” acima, o Axioma ainda cativa as mentes e lealdades da maioria dos cientistas. Isso é especialmente verdadeiro entre os geneticistas. No entanto, quando olhamos para inúmeras citações de alguns dos mais proeminentes geneticistas populacionais que já existiram, parece que o compromisso deles com o Axioma Primário não se baseia em evidências, mas é fundamentalmente um compromisso ideológico. Repetidamente, suas próprias análises detalhadas vão contra o Axioma. Eles parecem permanecer ligados ao Axioma, não à luz de suas evidências, mas apesar de suas evidências. Daí que precisam continuamente explicar por que o Axioma pode ir contra o senso comum e seus próprios dados e ainda deve ser considerado axiomaticamente verdadeiro. Todas as citações a seguir são de importantes geneticistas evolucionistas (com exceção de Hoyle, que era um proeminente físico). Considero esses cientistas altamente competentes, mas defendo que eles construíram seu trabalho (talvez suas próprias vidas?) sobre um falso axioma. Tenho extraído declarações específicas de seus estudos, que não refletem sua própria filosofia, mas que apontam para os problemas que estou levantando. Poucos geneticistas hoje escolheriam discutir abertamente as fraquezas da teoria da mutação/seleção. Na verdade, suspeito que a maioria dos geneticistas nunca considerou seriamente tais fraquezas (embora eu esteja ciente de numerosos céticos que escolhem permanecer em silêncio). A maioria dos geneticistas nunca questionou o Axioma Primário. Isso porque sempre o aceitaram pela fé como axiomaticamente verdadeiro, como no passado eu mesmo o fiz. Então eles nem se preocuparam em examinar a extensão dos problemas com a mente aberta ou com o coração aberto. Cada estudo, cada trabalho, parece ser projetado para fazer a teoria funcionar. É impressionante o compromisso ideológico com o Axioma Primário entre os geneticistas. Entretanto, entre alguns (creio que os que possuem fé mais segura no Axioma) tem ha-
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Apêndice 1
Uma ideologia profundamente arraigada “É evidente que o poder onipotente da seleção natural pode fazer todas as coisas, explicar todas as coisas [...].”
vido um reconhecimento aberto de problemas específicos. Esses problemas específicos reconhecidos, quando combinados, argumentam poderosamente contra o Axioma Primário. As seguintes citações ilustram isso (todas as ênfases abaixo são minhas).
O TEMOR DE MULLER
Muller, H. J. 1950. Our load of mutations. Amer. J. Human Genetics 2:111176. “Isso significaria um amontoamento sempre crescente de genes mutantes. [...] A deterioração em formas completamente irreconhecíveis, diferindo caoticamente de um indivíduo da população para outro [...] seria, no final, muito mais fácil e mais sensível para fabricar um homem completo novamente, a partir de matérias-primas apropriadamente escolhidas, em vez de tentar moldar na forma humana aquelas relíquias que permaneceram. Todos eles iriam diferir desordenadamente uns dos outros, e cada um deles apresentaria uma série inteira dos mais intricados problemas de pesquisa. [...] Se então os 20% eliminados falhassem involuntariamente, [...] os restantes 80%, embora tivessem conseguido se reproduzir iriam diferir da imundície condenada, mas ligeiramente [...] praticamente todos teriam falhas em condições primitivas. [...] É muito difícil estimar a taxa de variação genética do processo degenerativo genético” (p. 146-147). “A aberta possibilidade de que a deterioração resultante do presente relaxamento da seleção pode, afinal, ser muito mais rápido do comumente imaginado. [...] É evidente que a taxa natural de mutação do homem é tão alta, e sua taxa natural de reprodução tão baixa, que uma margem não muito grande é deixada para seleção. [...] Se u tem o valor mínimo de 0,1, [...] uma taxa reprodutiva média de 2,4 crianças por indivíduo seria necessário [...] sem tomar qualquer consideração de todas as mortes e falhas para reproduzir por causas não genéticas. [...] Torna-se perfeitamente evidente que o número atual de filhos por casal não pode ser grande o suficiente para permitir que a seleção acompanhe o ritmo de uma taxa de mutação de 0.1. [..] Se, para piorar as coisas, u deve ser de algo próximo de 0,5, [...] nossas práticas reprodutivas atuais
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estariam completamente fora das exigências humanas” (p. 149-150). Até o momento desta redação, o Dr. Muller é o único geneticista populacional a receber o Prêmio Nobel. Muller calculou que a taxa de fertilidade humana da época (1950 não) poderia lidar com uma taxa de mutação de 0,1. Desde então, descobrimos que a taxa de mutação é pelo menos mil vezes maior do que ele pensava. Além disso, as taxas de fertilidade diminuíram acentuadamente. “A carga genética atual é séria [...]. Aumentando-a em apenas 25% [...] seria uma questão de grave consequência, enquanto sua duplicação seria calamitosa. [...] Se u deve subir acima de 0,5, o valor de eliminação necessária [...] seria, como vimos, maior do que a taxa de reprodução efetiva até mesmo do homem primitivo teria permitido. [...] A composição genética se deterioraria continuamente, enquanto a população, entretanto, diminuiria em número, até o ponto de desaparecimento.” Muller concluiu que se a taxa de mutação era tão alta como 0,5, o homem primitivo não poderia ter evoluído. Ele teria se deteriorado e extinguido. Mas as taxas de mutação conhecidas são aproximadamente 200 vezes maiores que isso! “Em muitas nações civilizadas, a taxa de natalidade é reduzida a uma média de não mais do que dois por família. A taxa de mutação superior, para além da qual o equilíbrio é impossível, deve ser muito mais baixa do que 0,5 e, como vimos, talvez menor do que 0,1, mesmo que a seleção devesse receber pleno escopo” (p. 155). “Se postulássemos agora que as condições da elevada taxa de mutação, baixa taxa de natalidade, [...] seria muito problemático saber se essa declínio seria eventualmente detido” (p. 156). Se estabelecemos o esquema de seleção mais severo, os níveis de fecundidade modernos não seriam altos o suficiente para deter a deterioração genética se as taxas de mutação fossem tão elevadas quanto 0,5. Desde 1950, descobrimos que nossas taxas de mutação real são 100-300! Além disso, as taxas de fertilidade diminuíram acentuadamente.
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DILEMA DE HALDANE 524.
J.B.S. Haldane. 1957. The cost of natural selection. J. Genetics 55: 511-
“É bem conhecido que os reprodutores encontram dificuldade em selecionar simultaneamente todas as qualidades desejadas em um estoque. [...] Neste trabalho buscarei tornar quantitativa a afirmação bastante óbvia de que a seleção natural não pode ocorrer com grande intensidade para um número de caracteres de uma vez.” “Duvido que tais intensidades de seleção tenham sido comuns no decurso da evolução. Penso que n = 300 (300 gerações), o que daria I = 0,1 (10% de eliminação seletiva total na população), é uma figura provável.” “Se duas espécies diferem em 1.000 loci, e a taxa média de substituição de gene, como foi sugerido, é de um por 300 gerações, tomará pelo menos 300.000 gerações (6 milhões de anos).” “Mesmo a escala de tempo geológica é muito curta para que tais processos prossigam em relação a milhares de loci. [...] Pode essa lentidão ser evitada selecionando vários genes por vez? Duvido.” “O número de mortes necessárias para garantir a substituição por seleção de um gene [...] é cerca de 30 vezes o número de organismos em uma geração. [...] O tempo médio gasto para cada substituição do gene é de cerca de 300 gerações.” “Estou convencido de que argumentos quantitativos do tipo aqui promovidos deverão desempenhar um papel em todas as futuras discussões a respeito da evolução.” Haldane foi o primeiro a reconhecer que havia um custo para a seleção que limitava o que poderia realisticamente ser esperado para acontecer. Ele não percebeu que seu pensamento criaria grandes problemas para a teoria da evolução. Ele calculou que, no homem, levaria 6 milhões de anos para corrigir apenas 1.000 mutações (assumindo 20 anos por geração). Naquela época, ele não poderia saber que o número de unidades genéticas reais é de 3 bilhões, e que pelo menos 1 milhão de novas mutações entrariam em qualquer população pré-humana hipotética de cada geração, a maioria das quais exigiria
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seleção. Homem e chimpanzé diferem em pelo menos 150 milhões de nucleotídeos, representando pelo menos 40 milhões de mutações hipotéticas (Britten, 2002). Se o homem evoluiu de um símio, havia pelo menos 20 milhões de mutações fixas dentro da linhagem humana (40 milhões dividido por 2), mas a seleção natural só poderia ter selecionado 1.000 desses. Todo o resto teria sido corrigido por uma deriva aleatória, criando milhões de mutações deletérias quase neutras. Isso não apenas nos faria inferiores aos ancestrais símios, mas certamente nos teria matado. Desde o trabalho de Haldane, tem havido repetidos esforços para varrer o dilema para debaixo do tapete, mas o problema ainda é exatamente o mesmo. ReMine (1993, 2005) revisou extensivamente o problema e analisou-o utilizando uma formulação matemática completamente diferente, obtendo resultados idênticos. Rupe e Sanford (2013), resolveram de forma conclusiva o assunto e validaram o dilema de Haldane usando experimentos de simulação numérica.
C AT R A C A D E M U L L E R
Muller, H. J. 1964. The relation of recombination to mutational advance. Mutation Research 1:2-9. “Existe um nível de vantagem, no entanto, que é muito pequeno para ser efetivamente aproveitado pela seleção, sua voz sendo perdida no barulho, por assim dizer. Esse nível diferiria grandemente sob diferentes circunstâncias (genéticas, ecológicas etc.), mas esse é um assunto que ainda que foi submetido a poucas análises [...] embora merecedoras disso.” Muller antecipou o problema das mutações quase neutras, mas deixou de ver os profundos problemas que eles criam para a teoria da evolução. Ele percebeu que muitas circunstâncias diversas (não apenas o tamanho da população) amplificam esse problema. “Pode parecer que uma espécie sem recombinação estaria [...] sujeita à degeneração genética. [...] Podemos pensar que esse seja o caso. [...] Contudo, essa conclusão, que foi erroneamente apresentada pelo presente autor num resumo recente, só é válida para a conceituação artificial, [...] não obstante [...] uma população assexuada incorpora uma espécie de mecanismo de Catraca,
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de modo que [...] as linhas se tornam mais pesadamente carregadas com mutação.” Quão extremamente reticente Muller foi em reconhecer o próprio problema que logo veio a levar o seu nome (“Catraca de Muller”)! Durante toda a sua carreira, Muller teve uma profunda preocupação com a mutação induzida pela deterioração genética humana e foi um dos principais defensores da eugenia. No entanto, mesmo que quisesse alertar o público sobre o problema da deterioração, ele parecia ser extremamente cuidadoso para não fazer quaisquer declarações que pudessem prejudicar a “certeza” da teoria da evolução (aparentemente isso refletia o conceito no qual ele colocou sua maior lealdade). Suas declarações sobre o problema da deterioração genética dentro de espécies assexuadas (pelas quais se tornou famoso) são tão cautelosamente redigidas que dificilmente pode discernir sua mensagem. Muller argumentou que sua “Catraca” tinha apenas uma relevância limitada porque ele pensava que as mutações eram extremamente raras. Portanto, ele pensava que cada mutação pode ser tratada como uma unidade discreta e distintamente selecionável e eliminada uma de cada vez. Sabemos agora que as mutações são numerosas e difusas, frustrando qualquer possível mecanismo de eliminação “uma a uma”. Se combinarmos o reconhecimento de Muller de mutações quase neutras (isto é, não selecionáveis), com seu reconhecimento do avanço mutacional, vemos que nenhum sistema de seleção pode interromper a Catraca de Muller, mesmo em espécies sexuais. Em espécies assexuadas, cada clone deve se tornar cada vez mais mutante. Mesmo que selecionemos o melhor clone na população e o multipliquemos, os subclones serão mais mutantes do que o clone inicial. Portanto, a informação só pode degenerar. É um processo unidirecional (catracado). Cada geração nova, a contagem média de mutações por organismo será maior do que na geração anterior. Ironicamente, devemos perceber que isso não é apenas verdadeiro em espécies assexuadas. Também é verdade em espécies sexuais. A “catraca” funciona porque cada mutação benéfica rara é fisicamente ligada a uma série de mutações deletérias. A seleção não pode separar os poucos bons dos muitos ruins, porque eles estão em
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grandes blocos de ligação. Eles não podem ser separados. Portanto, cada parte do genoma (cada bloco de ligação) deve degenerar individualmente devido à catraca de Muller.
DILEMA DE KIMURA
Kimura, M. 1968. Evolutionary rate at the molecular level. Nature 217:624626. “[...] Na história evolutiva dos mamíferos, a substituição de nucleotídeos foi tão rápida que, em média, um par de nucleotídeos foi substituído na população aproximadamente a cada dois anos. Essa figura está em nítido contraste com a estimativa bem conhecida de Haldane [...] [de que] um novo alelo pode ser substituído numa população a cada 300 gerações. [...] A taxa de uma substituição a cada dois anos [...] A carga substitucional torna-se tão grande que nenhuma espécie de mamíferos poderia tolerá-la. [...] Isso nos leva à conclusão bastante surpreendente [...] [de que] a taxa de mutação por geração para mutações neutras equivale a aproximadamente [...] quatro por zigoto.” A estimativa de Kimura da taxa de mutação real foi 25-100 vezes mais baixa. Mas é surpreendente como facilmente os teóricos da evolução podem acomodar quaisquer novos dados. Eles parecem ter um modelo infinitamente flexível, permitindo contínuos e ilimitados desenvolvimentos/revisões de seus muitos cenários.
Kimura, M. 1983. The Neutral Theory of Molecular Evolution. Cambridge University Press, p. 26. “Essa fórmula mostra que, em comparação com a fórmula de Haldane, o custo é cerca de duas vezes maior [...] sob o pressuposto de que a maioria das substituições de mutações no nível molecular são realizadas por seleção. [...] Para manter o mesmo número de população e executar substituições mutantes [...] cada pai deve deixar [...] 3,27 milhões de descendentes para sobreviver e se reproduzir. Esse foi o principal argumento usado quando apresentei a hipótese da evolução molecular por meio da mutação neutra-deriva aleatória.” Kimura percebeu que Haldane estava correto, que a seleção deve ocorrer
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de maneira extremamente lenta e que só pode afetar um número limitado de mutações simultâneas. Kimura percebeu que todos os evolucionistas de sua época estavam evocando demais a seleção para muitos loci, levando a custos absurdos (por exemplo, a necessidade de mais de 3 milhões de descendentes selecionados para cada adulto!). Ele desenvolveu sua teoria neutra em resposta a esse problema evolutivo esmagador. Paradoxalmente, sua teoria o levou a crer que a maioria das mutações não são selecionáveis e, portanto, a maior parte das informações genéticas devem ser irrelevantes, e a maior parte da evolução deve ser independente da seleção! Pelo fato de que estava totalmente comprometido com o Axioma Primário, Kimura aparentemente nunca considerou a possibilidade de que seus argumentos de custo poderiam ser usados racionalmente para argumentar contra a própria validade do Axioma.
PERCEPÇÃO DE NEEL
J.V. Neel, et al. 1986. The rate with which spontaneous mutation alters the electrophoretic mobility of polypeptides. PNAS 83:389-393. “Taxas de gametas para mutações pontuais [...] na ordem de 30 por geração [...]. As implicações de mutações dessa magnitude para a genética populacional e a teoria evolutiva são profundas. A primeira resposta de muitos geneticistas populacionais é sugerir que a maioria destes ocorre em no DNA ‘silencioso’ e não são de real significado biológico. Infelizmente, para essa linha de raciocínio [...] a quantidade de DNA silencioso está encolhendo constantemente. A questão de como nossa espécie acomoda essa taxa de mutação é fundamental para o pensamento evolutivo.”
P E R G U N TA D E K O N D R A S H O V
A.S. Kondrashov. 1995. Contamination of the genome by very slightly deleterious mutations: Why have we not died 100 times over? J. Theor. Biol. 175:583-594. “Tachida (1990) concluiu que as mutações deletérias muito leves que prejudicam apenas uma função – sua interação com os nucleossomos – podem levar a uma carga de mutação muito alta”.
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“Lande (1994) e Lynch et al. (1994) [...] concluiu [...] que as mutações deletérias muito leves podem rapidamente conduzir a população à extinção.” “A seleção simultânea de muitas mutações pode levar ao declínio de Ne e facilitar a extinção (Li 1987; Lynch et al., 1984)”. “Interpreto os resultados em termos de todo o genoma e mostro, em acordo com Tachida (1990), que as mutações deletérias muito leves podem causar uma carga de mutação tão elevada, mesmo quando Ne = 106-107 [...] que condições sob as quais a carga pode ser paradoxalmente alta são bastante realistas.” “A carga pode tornar-se excessiva mesmo quando U<1 [...] como minha análise sugere – contaminação por mutações deletérias muito leves implica uma carga excessiva, levando ao paradoxo de carga de mutação estocástica.” “Processos de seleção em diferentes locais interferem uns com os outros.” “[...] porque o paradoxo de carga de mutação estocástica parece real – ele requer uma resolução.” “Chetverikov (1926) assumiu que a contaminação mutacional de uma espécie aumenta com o tempo, levando talvez à sua eventual extinção.” “Acumulação de mutações deletérias muito leves em uma linhagem [...] age como uma bomba de tempo. [...] A existência de linhagens de vertebrados [...] deve ser limitada a 106-107 gerações.” Se o Dr. Kondrashov acreditasse em seus próprios dados, ele concluiria que o Axioma Primário está errado e que os genomas devem se deteriorar. Em vez disso, ele eventualmente apela à “epistasia sinérgica” para afastar os problemas que caracterizou tão brilhantemente.
C O L A P S O M U TA C I O N A L D E LY N C H E T A L .
M. Lynch, J. Conery, and R. Burger. 1995. Mutation accumulation and the extinction of small populations. The American Naturalist 146:489- 518. “À medida que as mutações deletérias se acumulam pela fixação, há uma declínio gradual na viabilidade média dos indivíduos. [...] A taxa de reprodução é menor [...] precipita uma interação sinérgica entre a deriva genética aleatória e o acúmulo de mutação, que chamamos de fusão mutacional. [...] O
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comprimento da fase de fusão é geralmente bastante curto.” “Estes resultados sugerem que, por razões genéticas apenas, é improvável que as populações sexuais com tamanhos populacionais efetivos menores de 100 indivíduos persistam por mais de algumas centenas de gerações, especialmente se a fecundidade for relativamente baixa.” “Nossos resultados não fornecem evidências para a existência de um tamanho limiar da população para além do qual uma população é completamente invulnerável a uma fusão mutacional.” “As mutações simultaneamente segregantes interferem na eliminação de uns dos outros por seleção natural.” Lynch et al. entendem que a deterioração genética é um fator importante para todas as espécies atualmente ameaçadas de extinção. Eles reconhecem abertamente o problema da interferência de seleção, mas eles não conseguem explicar que o mesmo seria verdadeiro para a maioria das extinções passadas e que o processo básico de extinção por degeneração genômica deve se aplicar logicamente a todos os genomas superiores.
DESAFIO DE HOWELL
Howell et al. 1996. Evolution of human mtDNA. How rapid does the human mitochondrial genome evolve? A. J. Hum. Genet. 59: 501-509. “Devemos aumentar nossa atenção para a questão mais ampla de como (ou se) os organismos podem tolerar, no sentido de evolução, um sistema genético com uma carga mutacional tão alta.” O desafio de Howell para nós baseia-se em seus próprios dados, os quais sugerem que a taxa de mutação apenas dentro do genoma mitocondrial pode estar aproximando-se de uma mutação por pessoa a cada geração. Ele está certo. Somente 0,1-1,0 mutações mitocondriais por pessoa criam problemas insuperáveis para a teoria da evolução. Mas isso não é nada comparado com as centenas de mutações ocorrendo simultaneamente dentro dos outros cromossomos.
P R E O C U PA Ç Õ E S D E C R O W
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Crow, J. F. 1997. The high spontaneous mutation rate: is it a health risk? PNAS 94:8380-8386. “O impacto global do processo de mutação deve ser deletério. [...] A mutação típica é muito leve. Geralmente não tem nenhum efeito evidente, mas aparece como uma pequena morte em viabilidade ou fertilidade. [...] Cada mutação leva, em última instância, a uma ‘morte genética’. [...] Certamente seria uma carga excessiva para a população humana [...] então temos um problema.” “Há uma saída. [...] Por escolha judiciosa, várias mutações podem ser colhidas na mesma vítima. [...] Todos os indivíduos com mais de um certo número de mutações são eliminados. [...] Evidentemente, [...] a seleção natural não alinha indivíduos e remove todos aqueles com mais de um certo número de mutações. [...] A irrealidade desse modelo evitou durante muitos anos que eu o considerasse como um caminho que a população lida com uma alta taxa de mutação. [...] Embora a seleção de truncamento é totalmente irrealista, a seleção de quase-truncamento é razoável.” “Parece claro que, nos últimos séculos, mutações nocivas têm se acumulado. [...] A diminuição na viabilidade no acúmulo da mutação é de cerca de 1-2% por geração. [...] Se a guerra ou a fome forçarem nossos descendentes a uma vida de Idade da Pedra terão de se contentar com todos os problemas que seus antepassados da Idade da Pedra tiveram, além de mutações que se acumularam durante esse intervalo. [...] As melhorias ambientais significam que a sobrevivência média e a fertilidade são apenas ligeiramente prejudicadas pela mutação. [...] Considero a acumulação de mutações como um problema. É algo semelhante a uma bomba populacional, mas com um fusível muito mais longo.” O Dr. Crow reconhece os problemas evolutivos fundamentais criados pela descoberta de altas taxas de mutação, mas tenta descartá-los usando um modelo teórico muito irrealista envolvendo uma seleção muito artificial baseada na contagem de mutações. Se esse esquema de seleção artificial emprega ou não o truncamento ou o “quase truncamento” é uma questão que não faz diferença. Ele continua a reconhecer que a humanidade deve agora ser gene-
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ticamente inferior aos nossos ancestrais da Idade da Pedra. Essa é uma notável confissão sobre a realidade da degeneração genômica. O Dr. Crow também comenta sobre a natureza inerentemente deletéria das mutações:
J.F. Crow. 1958. Genetic effects of radiation. Bulletin of the Atomic Scientists 14:19-20. “Mesmo se não tivéssemos muitos dados sobre esse ponto, poderíamos ainda ter certeza absoluta de que as mutações normalmente seriam prejudiciais. Porque uma mutação é uma mudança aleatória de um corpo vivo altamente organizado, de funcionamento razoavelmente suave. Uma alteração aleatória no sistema altamente integrado de processos químicos que constituem a vida é quase certo que vai prejudicá-lo – assim como um intercâmbio aleatório de conexões em um aparelho de televisão não é susceptível de melhorar a imagem.”
O GRANDE QUADRO DE HOYLE
F. Hoyle. 1999. Mathematics of Evolution. Acorn Enterprises, LLC, Memphis, TN. (note: unlike the others quoted here, Dr. Hoyle was not a geneticist, but a highly distinguished theoretical mathematician and physicist). “O processo de envelhecimento mostra, na verdade, que as declarações que se ouve com frequência, no sentido de que a teoria darwinista é tão óbvia quanto a Terra girando ao redor do Sol, são expressões de quase incrível ingenuidade ou são enganosas. [...] Com evidências tão difundidas de senescência no mundo que nos rodeia, ainda parece surpreendente que muitas pessoas achem ‘óbvio’ que o sistema biológico como um todo deve ser dirigido na direção oposta.” “O melhor que a seleção natural pode fazer, sujeita a um ambiente específico, é manter as mutações deletérias em cheque. Quando o ambiente não está fixo, há uma lenta erosão genética a qual, no entanto, a seleção não pode impedir.” “A seleção natural não pode anular mutações deletérias se elas forem pequenas, e durante um longo tempo um grande número de pequenas desvanAPÊNDICE
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tagens escalam a uma desvantagem séria. Essa incapacidade a longo prazo da seleção natural para preservar a integridade do material genético estabelece um limite para sua vida útil.”
D E T E R I O R A Ç Ã O D E E Y R E - WA L K E R / K E I G H T L E Y
A. Eyre-Walker and P. Keightley. 1999. High genomic deleterious mutation rates in Hominids. Nature 397:344-347. “Sob pressupostos conservadores, estimamos que uma média de 4,2 mutações de alteração de aminoácido por diploide a cada geração ocorrem na linhagem humana.” “Perto do limite superior tolerável por uma espécie como os seres humanos, [...] um grande número de mutações ligeiramente deletérias pode ter-se fixado em linhagens hominídeas. [...] É difícil explicar como as populações humanas poderiam ter sobrevivido [...]. Uma alta taxa de mutação deletéria (U >>1) é paradoxal em uma espécie com baixa taxa reprodutiva. [...] Se uma fração significativa de novas mutações é ligeiramente deletéria, elas podem se acumular, [...] levando a um declínio gradual na aptidão.” “A taxa de mutações deletérias parece ser tão elevada em seres humanos e em nossos parentes próximos que é duvidoso que tais espécies pudessem sobreviver.” “O nível de restrição nas sequências de codificação da proteína hominídea é muito baixo, cerca de metade de todas as novas mutações não sinônimas parecem ter sido aceitas. [...] Se novas mutações deletérias estão se acumulando neste momento, isso poderia ter consequências prejudiciais para a saúde humana.” Esses autores ainda estão subestimando a extensão do problema da mutação. Eles consideram apenas as mutações dentro da porção do genoma codificadora de proteína. O genoma funcional é 10-30 vezes maior do que isso. Mesmo com essas estimativas mais baixas, eles reconhecem um problema e concluem que muitas mutações deletérias têm se acumulado durante a evolução humana, e provavelmente ainda estão se acumulando. Isso não demonstra claramente que estamos de fato deteriorando e não evoluindo?
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N A C H M A N E O PA R A D O X O D E C R O W E L L
Nachman M. W.; Crowell S. L. Estimate of the mutation rate per nucleotide in humans. Genetics 156: 297-304. 2000. “O genoma diploide humano [...] cerca de 175 novas mutações por geração. A alta taxa de mutação deletéria em seres humanos apresenta um paradoxo. Se as mutações interagem multiplicativamente, a carga genética associada com uma U tão alta seria intolerável em espécies com uma taxa baixa de reprodução [...] para U = 3, a aptidão média é reduzida a 0,05, ou em outras palavras, cada fêmea precisaria produzir 40 filhos por 2 para sobreviver e manter o tamanho da população. Isso pressupõe que toda mortalidade se deve à seleção [...] assim, o número real de descendentes necessários para manter um tamanho de população constante é provavelmente maior.” De acordo com Kondrashov, U (novas mutações deletérias por pessoa) na verdade é 10-30 vezes mais alta do que esses autores afirmam (eles assumem que 97% do genoma é sucata silenciosa). Além disso, sabemos que, na realidade, apenas uma pequena fração da mortalidade total pode ser atribuída à seleção. Apesar de suas premissas irrealistas, esses autores ainda reconhecem um problema fundamental. No entanto, eles eventualmente descartam tudo evocando a “epistasia sinérgica”.
H I G G I N S E LY N C H – M A I S C O L A P S O
Higgins, K.; Lynch, M. Metapopulation extinction caused by mutation accumulation PNAS 98:2.928-2.933. 2001. “Aqui mostramos que a estrutura de metapopulação, a perda ou fragmentação de hábitat e a estocasticidade ambiental podem acelerar muito a acumulação de mutações levemente deletérias [...] a tal ponto de que até grandes metapopulações podem estar em risco de extinção.” “Mutações ligeiramente deletérias podem criar consideravelmente maiores cargas mutacionais [...] porque individualmente elas são quase invisíveis para a seleção natural, embora causando uma redução cumulativa na viabilidade populacional.” “Descobrimos que a acumulação de novas mutações levemente deletérias altera fundamentalmente a escala do tempo de extinção, [...] causando a APÊNDICE
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extinção de populações que seriam consideradas seguras com base apenas na demografia.” “Sob flutuações ambientais síncronas, a aceleração de extinção causada pelo acúmulo de mutações é impressionante. [...] Sem mutação, a extinção é de 2 mil gerações. [...] Com o acúmulo de mutações, o tempo de extinção é apenas ligeiramente superior a cem gerações.” “Para uma metapopulação em hábitat desfragmentado, mutações levemente deletérias são mais prejudiciais do que mutações altamente deletérias. [...] Apenas como no caso de grande capacidade de suporte, os efeitos mutacionais leves são os mais prejudiciais, causando tempo mínimo para a extinção.” “O trabalho inicial sugeriu [...] que o acúmulo de mutações deletérias pode ameaçar pequenas populações isoladas. [...] Mostramos que o acúmulo de mutações deletérias também pode ser uma ameaça significativa para metapopulações. [...] O declínio é repentino, mas a própria extinção demora algum tempo para ocorrer. A metapopulação pode ser invariável em escalas intermediárias ou de longo prazo, embora aparecendo saudável em escalas curto de tempo.” Higgins e Lynch apresentam uma forte defesa em favor da deterioração genômica como um problema geral para todos os mamíferos e para todas as populações animais semelhantes. Eles salientam que os danos genéticos atualmente existentes podem assegurar a eventual extinção, mesmo que demore algum tempo para ocorrer. Entretanto, as espécies podem ainda parecer saudáveis e viáveis. Isso é possível no caso do homem? A fertilidade humana e a contagem de espermatozoides agora estão declinando dramaticamente (Carlsen et al., 1992). Muitas nações agora estão enfrentando crescimento populacional negativo, provavelmente devido a causas não genéticas. Mas não é concebível que pudéssemos estar nos estágios iniciais da fusão mutacional?
NÚMEROS DE KONDRASHOV
Kondrashov, S. Direct estimates of human per nucleotide mutation rates at 20 loci causing Mendelian diseases. Human Mutation 21:12-27. 2002.
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“O número total de novas mutações por genoma humano diploide por geração é de cerca de 100. [...] Pelo menos 10% desses são prejudiciais. [...] A análise da variabilidade humana sugere que uma pessoa normal carrega milhares de alelos deletérios.” Desde esse trabalho, o Dr. Kondrashov indicou-me por comunicação pessoal que 100 era apenas uma estimativa mais baixa e que 300 é sua estimativa mais alta. Ele também me indicou que agora acredita que até 30% das mutações podem ser deletérias. Isso significa que, de sua perspectiva, “U” (mutações deletérias por pessoa a cada geração) seria 30-90. Isso é 100 vezes mais alto do que teria sido previamente considerado possível. No final, ele descarta todo o problema com “epistasia sinérgica” e “seleção de truncamento”.
LIMITE DE LOEWE
Loewe, L. 2006. Quantifying the genomic decay paradox due to Muller’s ratchet in human mitochondrial DNA. Genet. Res. 87:133-159. “Uma gama surpreendentemente grande de combinações de parâmetros biologicamente realistas devem ter levado à extinção da linha evolutiva que conduz os seres humanos dentro de 20 milhões de anos.” O limite de extinção da Loewe baseia-se apenas nos danos associados com o genoma mitocondrial, mas o genoma completo é 200 mil vezes maior!
Ú LT I M A A N Á L I S E D E LY N C H
Lynch, M. 2010. Rate, molecular spectrum, and consequences of human mutation. PNAS 107 (3): 961-968. “A partir dos resultados atuais, inferimos que um gameta humano médio adquire aproximadamente 38 mutações de substituição de base de novo, aproximadamente três pequenas inserções/deleções na sequência complexa e aproximadamente uma mutação entrançada ... assim é provável que no nível diploide um recém-nascido médio adquire um total de 50 a 100 novas mutações, um pequeno subconjunto do qual deve ser deletério”. O trabalho do Dr. Lynch confirma a análise de outros, de que a taxa de mutação humana é aproximadamente 50-100 mutações por indivíduo (isto é,
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25-50 por gameta). Se todos os tipos de mutação em todo o genoma forem considerados, 50-100 é ainda muito baixo. Mais importante, não é mais razoável assumir que a maioria das mutações são perfeitamente neutras. A maioria das mutações deve ser levemente deletéria – (isto é, quase neutras) veja a próxima citação. “A vasta maioria das mutações pontuais residem fora das regiões de codificação (na ordem de 40 por gameta) e é provável que a maioria delas terá bem menos efeitos adaptativos, com médias quase certamente <<10-2.” Se há 40 novas mutações por gameta que não afetam a codificação proteica, então há 80 novas mutações como essa por nascimento. O Dr. Lynch está reconhecendo que estas são principalmente NÃO neutras, mas são levemente deletérias. “... apesar de haver considerável incerteza nos números anteriores, é difícil escapar à conclusão de que a redução adaptativa por geração devida a mutação recorrente é pelo menos 1% em humanos e muito possivelmente tão alta quanto 5% ... no decurso de dois séculos (aproximadamente seis gerações), as consequências devem provavelmente tornar-se sérias, particularmente se as atividades humanas causam um aumento na própria taxa de mutação (pelos níveis crescentes de mutagênicos ambientais).” As taxas de mutação podem já ser maiores do que as estimativas do Dr. Lynch (mesmo sem contar um possível aumento nos mutagênicos), porque: a) sua análise exclui as partes do genoma que são mais sujeitas a mutação; e b) porque ele assume que quase todas as mutações estão dentro do “DNA lixo” e assim não são deletérias. “Sem uma redução na transmissão da linha germinal de mutações deletérias, os fenótipos ruins dos residentes em nações industrializadas devem provavelmente ser diferentes em apenas dois ou três séculos, com significativa incapacitação nos níveis morfológicos, fisiológicos e neurobiológicos.” Como esse livro mostra, a degeneração genética que o Dr. Lynch está documentando não pode ser parada pelo aumento da intensidade de seleção. É assim porque a taxa de mutação é bem mais alta, porque a seleção natural é bem mais ineficiente e a maioria das mutações deletérias são quase neutras e
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assim são imunes à seleção. Além disso, reconhecer a importância das mutações em nossas células reprodutivas, o Dr. Lynch destaca que as mutações no resto do nosso corpo estão rapidamente se acumulando – causando envelhecimento. Ao chegarmos aos 60, temos dezenas de milhares de novas mutações por célula. É isso que limita nossa expectativa de vida e não se pode esperar que nenhum avanço médico pare a acumulação mutacional contínua em virtualmente cada célula do nosso corpo.
A C I Ê N C I A D E P O N TA R E V E L A Q U E O G E N O M A H U M A N O T E M U M A D E N S I D A D E D E I N F O R M A Ç Ã O I N C R I V E L M E N T E A LTA .
The ENCODE Consortium, 2012 An integrated encyclopedia of DNA elements in the human genome. Nature 489: 57-74.
O projeto ENCODE durou cerca de 10 anos e custou aproximadamente 400 milhões de dólares. Envolveu 442 cientistas de todo o mundo e resultou num número enorme de publicações em várias revistas científicas. A publicação sumária chave saiu na revista Nature e incluiu as seguintes declarações: “Estes dados nos permitem atribuir funções bioquímicas a 80% do genoma, em particular fora das regiões de codificação proteica bem estudadas.” “Muitas das variantes não-codificadas em sequências genômicas individuais estão em regiões funcionais anotadas pelo ENCODE; este número é pelo menos tão grande quanto aqueles que estão em genes proteicos de codificação.” “Os elementos identificados recentemente também mostram uma correspondência estatística nas variantes sequenciais ligadas a doença humana e podem, portanto, guiar a interpretação dessa variação.” “Polimorfismos de nucleotídeo único (PNUs) associados à doença por GWAS5 são enriquecidos com elementos funcionais não codificados, com uma 5. N. E.: Genome-wide association study (estudo de associação do genoma completo) APÊNDICE
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maioria residindo em ou perto de regiões definidas pelo ENCODE que estão fora dos genes proteicos de codificação. Em muitos casos, os fenótipos de doença podem ser associados com um tipo de célula específica ou fator de transcrição.” Num vídeo da Nature relacionado, o diretor do Projeto ENCODE foi entrevistado pelo editor da Nature (vídeo intitulado “Voices of Enconde” [Vozes do Projeto ENCODE]. Disponível em: http://nature.com/ENCODE). Dr. Ewan Birney: “É provável que 80 por cento irá a 100 por cento ... Esta metáfora do lixo não é tão útil ... É muito difícil superar a densidade de informação. Penso que antes as pessoas pensavam que o genoma era como um lugar bem organizado com estes genes que tinham tipos de lugares discretos e uma bem discreta e calma coreografia, mas não é bem isso o que os dados dizem. Os dados dizem que é como uma selva de coisas lá, coisas que pensávamos que entendíamos e ainda assim é muito, muito mais complexo. E lugares do genoma que pensávamos que eram completamente silenciosos e são repletos de vida, repletos de coisas acontecendo...” Editor da Nature: “A genética humana tem nos dito um bocado sobre que áreas do genoma estão associados a doença humana. A frustração tem sido que muitas dessas áreas estão em partes não codificadas do genoma. Estas são partes do genoma sobre as quais conhecemos, até agora, muito pouco e é exatamente aí que o projeto ENCODE entra.”
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DEFINIÇÃO DE C E c O custo seletivo total (C) para uma população é aquela fração da população que não é permitida reproduzir a fim de alcançar toda a seleção. No nível mais simples, vamos supor que a fração da população contra a qual é selecionada é C, e que essa fracção produz zero descendentes. O restante (1-C) é a parte da população selecionada e que pode reproduzir à taxa normal. Diferentes espécies podem pagar diferentes custos seletivos. Por exemplo, uma espécie vegetal pode produzir cem sementes por planta. Tal espécie pode ter recursos para ter um valor C de 0,99. Isso significa que 99% das mudas podem ser selecionadas, e a população ainda pode se reproduzir plenamente. No caso do homem, a taxa atual de fertilidade humana é aproximadamente três crianças para cada dois adultos. Assim, na população humana, apenas um filho dos três pode ser selecionado enquanto o tamanho da população é mantido. No homem, o custo seletivo deve ser inferior a 1/3 da população e C não deve exceder a 0,33. Na realidade, mesmo esse custo é muito alto. Isso ocorre porque há muitos indivíduos que não conseguem reproduzir por razões não genéticas (morte acidental, escolha etc.). Não podemos saber com que frequência a falha reprodutiva se deve a efeitos não genéticos, mas certamente é muito grande. Uma estimativa realista de custo seletivo na humanidade deve ser inferior a 25%, provavelmente próximo de 10%. Para ser generoso, podemos assumir que C pode ser tão alta quanto 0,25. Para determinar limites teóricos superiores para o homem, podemos assumir uma população humana irrealisticamente fértil em que C = 0,50 (metade das crianças são eliminadas da população reprodutora por razões genéticas a cada geração). O custo por traço (c) é a parte da população eliminada devido à presença de uma característica específica (ou nucleotídeo). Se estivermos selecionando uma determinada característica (ou nucleotídeo), precisamos decidir quão fortemente vamos selecioná-la. Em outras palavras, quanto da população total estamos dispostos a eliminar para melhorar esse traço? A parte da população eliminada para essa característica é o custo seletivo (c) para essa característica, e representa a “pressão de seleção” para esse traço. Por exemplo, se 10% da população é eliminada para afetar determinada característica, então para
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Quantos nucleotídeos podem estar sob seleção ao mesmo tempo? Quantos traços ou nucleotídeos podem ser selecionados simultaneamente numa dada população reprodutora? Essa é uma questão muito importante, e que não foi realmente abordada adequadamente antes. Ela é relevante para a reprodução artificial, a biologia populacional e teoria evolutiva. A questão pode ser tratada numa base matemática.
essa característica c = 0,10. Se c = 0,01, então 1% de uma população é impedido de reproduzir para afetar esse traço.
MODELO ADITIVO O modelo mais simples de compreender é o modelo aditivo. Aqui assumimos que a seleção é aditiva e que a seleção para todos os traços é implementada simultaneamente. Por exemplo, se pudéssemos eliminar 25 indivíduos de uma população de 100, poderíamos eliminar simultaneamente um indivíduo para afetar um traço e assim poderíamos afetar 25 traços diferentes (ou 25 nucleotídeos). A formulação geral seria a seguinte. O custo total da população (C) seria a soma de todos os custos para cada característica ou nucleotídeo (c). Então C = c1 + c2 + c3 ... cn, onde “n” é o número de traços. Assumindo que a pressão de seleção em cada característica é a mesma, então C = N x c. No caso em que a pressão de seleção por característica é de 0,001 (1 indivíduo é eliminado de 1000, para afetar um determinado traço), e onde o custo total de seleção é limitado a 25% da população, então 0,25 = n x 0,001. Assim, nesse caso, o número máximo de traços que podem ser selecionados é 250. No entanto, em tal caso, mesmo que 250 traços pudessem estar sob seleção, a pressão de seleção por traço seria extremamente pequena, resultando em pouco ou nenhum progresso seletivo ao longo do tempo. O progresso seletivo aproxima-se de zero muito rapidamente, à medida que cada vez mais características são colocadas sob seleção (veja Figura 6a).
M O D E L O M U LT I P L I C AT I V O O modelo multiplicativo é mais realista e ligeiramente mais complexo do que o modelo aditivo. Nesse modelo há primeiramente a seleção para um traço (ou nucleotídeo) e então o que resta da população é submetido à seleção para a próxima característica (ou nucleotídeo). A seleção é sequencial, em vez de simultânea. Após uma rodada de seleção, o restante da população é matematicamente 1-c. Se existem duas características que se desejamos selecionar, então multiplicamos o restante de cada, (1-c) x (1-c), e em seguida subtraímos de 1 para ver o custo total de seleção. Por exemplo, se eliminarmos APÊNDICE
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10% de uma população para um traço e 10% do restante para um segundo traço, nosso custo total é 1 - [(1-0.1) x (1-0.1)] = 0,19. Em outras palavras, 81% da população continua a se reproduzir após a seleção para esses dois traços. Para muitos (n) traços sob seleção, assumindo que cada traço sofre aproximadamente a mesma intensidade de seleção, a equação pode ser generalizada para C = 1- (1-c)n. Quando eu apresentei o número de traços sob seleção contra a intensidade de seleção máxima permitida por traço, assumindo um modelo multiplicativo e C = 0,25 (25% de uma população humana pode ser eliminado para todos os fins seletivos). A forma da curva é essencialmente idêntica ao modelo aditivo. Como o número dos traços sob seleção aumenta, a pressão de seleção permissível por traço diminui exponencialmente, aproximando-se rapidamente de zero. Esse padrão básico não se altera mesmo quando a população é extremamente fértil (Figura 6c). Se pudéssemos assumir uma população humana extremamente fértil (C = 0,5), a seleção permissível por característica cai muito rapidamente à medida que “n” aumenta. Mesmo considerando uma espécie extremamente fértil, como uma planta produtora de sementes em que C pode ser tão elevada quanto 0,99, as pressões seletivas máximas admissíveis tornam-se muito pequenas quando há mais de 1000 traços (nucleotídeos) sob seleção (veja a figura 6b). O que significam essas pequenas pressões de seleção? À medida que a pressão de seleção para um traço aproxima-se de zero, o progresso também se aproxima de zero, e o tempo para alterar um traço através de abordagens de seleção se aproxima do infinito. À medida que o progresso seletivo tende a ser infinitamente pequeno e infinitamente lento, percebemos que temos um problema. Isso ocorre porque mutações estão inundando constantemente uma população em taxas elevadas. Não temos “tempo profundo” para remediar nosso problema de degeneração. Precisamos eliminar as mutações tão rapidamente quanto elas surgem, ou as mutações se incorporam na população devido à deriva e à fixação. Ainda mais significativamente, à medida que as pressões de seleção permitidas ficam muito pequenas, em algum ponto efetivo a seleção verdadeiramente para. Isso se deve ao fenômeno de “ruído”
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e à deriva genética. Um ponto sempre será alcançado quando a seleção para completamente, dependendo do tamanho da população e da quantidade total de “ruído” associado com a reprodução. O limite exato em que a seleção pausa completamente é um pouco difusa. No entanto, algum senso comum pode ajudar a colocar essa questão em perspectiva. Um sistema de seleção para determinado traço que não pode sequer remover um indivíduo de uma população reprodutora de 1000 é certamente suspeito! Isso corresponde a um custo de seleção para esse traço de 0,001. Considerando o alto nível de ruído nas populações humanas, quando o custo de seleção é menor que 0,001, a seleção efetiva para esse traço pode cessar completamente. Outra maneira de dizer isso é a seguinte: em uma população de 1000 pessoas, se não nos é permitido remover até uma pessoa (inteira) para afetar um dado traço, a seleção para esse traço efetivamente parou e a deriva aleatória provavelmente é operacional. Utilizando o ponto de corte de 0,001 e o modelo aditivo, podemos calcular e selecionar maximamente apenas 500 traços (nucleotídeos) numa população humana realista e apenas 990 traços numa população humana idealizada (extremamente fértil)6 (veja Tabela 2). Mas o que sabemos sobre as taxas de mutação humana indica que precisamos selecionar milhões de posições de nucleotídeos a cada geração, a fim de interromper a deterioração genômica! O quebra-cabeça de como reconhecer o design (planejamento) inteligente tem vindo à tona. Sempre houve um reconhecimento intuitivo de design na natureza. Essa é a perspectiva lógica padrão. Na medida em que algumas pessoas desejam rejeitar o óbvio, o design foi explicitamente proclamado ao longo das Escrituras judaico-cristãs (Gênesis a Apocalipse). Mais tarde, o design foi defendido por essencialmente todos os “fundadores” da ciência, Copérnico, Bacon, Newton, Pasteur, Maxwell, Faraday, Kelvin, entre outros. Pa6. Kimura alude ao mesmo problema. Mesmo que ele não apresente seus cálculos, afirma que apenas 138 lugares podem ser selecionados simultaneamente quando C = 0,50 e s = 0,01 (Kimura, 1983, p. 30). APÊNDICE
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ley (1802) foi o primeiro a apresentar o argumento da complexidade como evidência de design. Esse conceito foi refinado mais recentemente por Behe (1996) no argumento da complexidade irredutível. O argumento da complexidade foi ainda mais elaborado nos dois argumentos relacionados, o da teoria da informação (Gitt, 1997; Gitt et al., 2013) e o da complexidade especificada (Demski, 1998). No entanto, creio que ainda há pelo menos um diagnóstico mais útil de design, o fenômeno da Unidade, que surge como resultado da complexidade integrada. Um diagnóstico de design é a integração abrangente de um grande número de componentes, que é o que estou denominando Complexidade Integrada. Ela é subjacente ao fenômeno natural facilmente reconhecível da Unidade. Unidade é uma realidade objetiva. A unidade é prontamente reconhecida por qualquer pessoa racional, e não é meramente subjetiva. A unidade é, portanto, uma análise científica. A unidade surge através da integração abrangente de muitas partes. Um quebra-cabeça tem unidade. Um pilha de areia não. Um jato de combate é composto de milhares de componentes e inúmeros átomos, mas possui Unidade de função e forma. Isso é o que o torna facilmente reconhecível como um produto de design. Ele existe como uma unidade simples integrada, acima e além de todos os seus componentes. Em sua versão original, em estado não deteriorado, cada componente tem um propósito e um lugar, e cada parte é perfeitamente integrada com todo o resto. Apesar de seus inúmeros componentes, o jato existe em um estado não plural. Essa é a essência do termo “unidade” (unicidade). Não dizemos: “Veja todos aqueles pedaços de metal e plástico.” Dizemos: “Veja aquele avião.” Não é nem remotamente adequado dizer que um avião é mais do que
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ApĂŞndice 3
O fenĂ´meno da unidade e o conceito de complexidade integrada
a soma de suas partes. Um jato é uma nova realidade existente em um nível totalmente diferente de qualquer de suas partes. Ele pode voar; as peças não podem. De maneira semelhante, é tolo dizer que uma nave espacial é mais do que um monte de metal. Também é tolo dizer que a vida é mais do que a soma de suas partes. Essas são declarações baixas. Podemos da mesma forma dizer que há mais de uma gota de água no mar. Essas coisas são tão grosseiramente óbvias, que não podemos sequer justificar dizer-lhes audivelmente, a menos que estejamos conversando com alguém em transe. Um ser humano contém mais de 100 trilhões de células. Mas não somos 100 trilhões de células. Repito: não é isso o que somos. Cada um de nós é realmente uma entidade singular, unida em forma, função e ser. Somos a integração quase perfeita de inúmeros componentes e, como tais, formamos um novo nível de realidade. A separação de nossa existência como pessoas – à parte de nossas moléculas – é maravilhosamente profunda e infantilmente óbvia. Somente um profundo sono espiritual e intelectual poderia nos cegar a essa realidade. Precisamos acordar desesperadamente. Quando despertamos para a realidade da unidade, também despertamos para a realidade da beleza. Começamos a perceber que o que chamamos de “beleza” é simplesmente o reconhecimento da unidade abrangente das coisas projetadas. À luz disso, a beleza não é meramente subjetiva. Nessa nova luz, a beleza, como unidade, pode ser vista como uma realidade verdadeiramente objetiva e concreta7. Em seus momentos mais poéticos, os cientistas às vezes se referem à beleza da unidade como elegância. Elegância é um design que é tão extraordinário e maravilhoso que cada detalhe, cada aspecto, se une perfeitamente para definir algo novo – um todo completamente integrado. A unidade pode ser vista como a ausência surpreendente de pontas soltas ou bordas desgastadas. Por exemplo, no homem, cada célula tem seu lugar e função, de modo 7. O oposto da beleza é a feiura. Quero sugerir que a feiura também é uma realidade objetiva. Ela é a corrupção do design, o estrago da unidade. É por isso que uma verruga pode ser objetivamente considerada feia. É por isso que o envelhecimento é um processo que torna feio. É por isso que carros enferrujados, deformidade biológica, guerras e mentiras são todos verdadeiramente feios.
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a especificar integridade, ou completude. O perfil humano, como o perfil de um lustroso avião a jato, proclama elegância de forma e unidade de propósito. Quero apresentar a ideia de que a unidade é a base concreta e objetiva para o que chamamos de beleza. Creio que é também um diagnóstico inconfundível para o design de nível muito alto. A incrível unidade de um corpo humano (nosso fenoma) deve ser óbvia a qualquer pessoa pensante que esteja remotamente familiarizada com a biologia. Quando vemos um ser humano, não pensamos: “Veja todas aquelas células e tecidos.” Vemos uma entidade singular – uma pessoa. O que isso sugere sobre o genoma humano? O genoma é a base presumida subjacente à unidade do fenômeno. Por incrível que pareça, a maioria dos geneticistas modernos vê o genoma como sendo essencialmente uma pilha desunida de nucleotídeos. Todos os nossos genomas coletivos são considerados apenas um “pool de genes”. Essa é a própria antítese da unidade. O genoma é visto como uma vasta exibição de moléculas, em grande parte acidentais e quase inteiramente aleatórias. Cada nucleotídeo supostamente surgiu e está “evoluindo” (ou derivando) independentemente. Todo esse padrão de pensamento (isto é, o homem é apenas um amontoado de moléculas) é denominado reducionismo. O típico geneticista moderno vê o genoma como primariamente um “DNA lixo”, dentro do qual estão inseridos um milhão de “genes egoístas” parasitas (eles também reconhecem que há alguns bits reais de informação – algumas dezenas de milhares de genes). É amplamente assumido que cada gene egoísta tem sua própria agenda egoísta, propagando-se à custa do todo. Como isso poderia ser verdade? À luz da segunda lei da termodinâmica, parece possível que a incrível unidade e ordem do fenômeno surjam inteiramente de um genoma fragmentado e caótico? Racionalmente, se a ordem e unidade do fenômeno deriva do genoma, então não deve o genoma ser mais complexo e mais integrado do que o fenoma? Imagine entrar na nave intergaláctica Fenoma. Você passa por portas com as palavras: “Sala de máquinas de velocidade de dobra” e “Holodeck”. Então você vê uma porta com estas palavras: “Escritório do arquiteto sênior e enge-
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nheiro chefe”. Você abre a porta e vê um escritório que é uma completa bagunça. Papéis estão espalhados por toda parte, há cheiro de comida podre, e a tela do computador está quebrada. Em pé sobre uma mesa estão dois chimpanzés brigando por uma banana. Você seria tão ingênuo a ponto de acreditar que estava olhando para o arquiteto sênior e para o engenheiro-chefe da Nave Espacial Fenoma? Você realmente acha que a Nave Espacial Fenoma poderia ter sido criado e mantido por meio desse escritório, em sua condição caótica? No entanto, essa é a visão moderna do genoma! Esse é o paradigma predominante sobre a própria natureza do genoma e descreve o relacionamento mestre estúpido-gênio escravo entre genoma e fenoma. À luz disso, não devemos reavaliar criticamente nossa visão do genoma? Não é hora de uma mudança de paradigma? Se a Complexidade Integrada é realmente um diagnóstico de design, e se o genoma realmente foi projetado originalmente, poderíamos prever que o genoma deve mostrar evidências extensivas de integração e unidade. Deveríamos ser capazes de descobrir muitos níveis de unidade de forma e função dentro do genoma. Creio que isso está começando a acontecer agora. Prevejo que isso será visto cada vez mais nos próximos anos, à medida que desvendarmos os padrões elaborados e multidimensionais existentes dentro do genoma. Prevejo que quando compreendermos melhor o genoma, veremos integração e unidade em todos os níveis. Mas também prevejo que veremos cada vez mais evidências de deterioração e corrupção do design original, uma vez que a mutação é degenerativa e a seleção não pode impedir a degeneração mutacional. O genoma está claramente experimentando uma enorme quantidade de mudança devido às nossas altas taxas de mutação. Mas parece-me que o que estamos vendo é uma mudança totalmente “inclinada”. Tal mudança aleatória não pode ser a origem da Complexidade Integrada. Unidade (complexidade integrada abrangente) simplesmente não pode ser construída por meio de um erro de cada vez (como o corpo principal deste livro demonstra claramente). A profunda unidade da vida expõe o reducionismo ao que realmente é: um tipo de cegueira espiritual. O reducionismo é simplesmente uma profunda ignorância da unidade que é auto-evidente ao nosso redor. Mais especifica-
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mente, o Axioma, com seus “pools genéticos” e a evolução independente de nucleotídeos, é apenas um reducionismo extremo aplicado à biologia. Assim, é inerentemente inválido. Em certo sentido, ele torna todos os argumentos desse livro desnecessários. É minha convicção pessoal que, mesmo à parte dos argumentos genéticos apresentados neste livro, o Axioma Primário é invalidado simplesmente pela realidade onipresente do fenômeno da Unidade.
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Em oposição à tese principal deste livro, alguns argumentam que a duplicação é a chave para entender como a informação genética pode aumentar espontaneamente. Certamente é verdade que duplicações ocorrem espontaneamente em todos os sistemas genéticos. A duplicação é uma forma de mutação, e o tamanho de uma duplicação pode ser muito pequeno (um ou apenas alguns nucleotídeos) ou muito grande (um cromossomo ou todos os cromossomos são duplicados). Quando um cromossomo é duplicado, é chamado aneuploidia; quando todos os cromossomos são dobrados, é chamado poliploidia. Tal como acontece com os erros de processamento de texto, uma única letra pode ser duplicada, uma única palavra pode ser duplicada, todo um capítulo pode ser duplicado, um livro inteiro pode ser duplicado, ou toda a biblioteca pode ser duplicada. A questão é: “Essas duplicações criam novas informações?” See repiiito uma leeetra, ela appprimora minha fraaase? Se eu repetir minha frase, estou acrescentando informações? Se eu repetir minha frase, estou acrescentando informações? Se eu repetir minha frase, estou acrescentando informações? Se esta página ocorreu uma segunda vez neste livro, o livro seria melhor? Se cada página deste livro foi escrita em duplicata, você aprenderia o dobro? Obviamente, todos esses tipos de duplicações são deletérios, independentemente da escala. Eles não aumentam a comunicação e, obviamente, a prejudicam. Como alguém poderia pensar que esse tipo de duplicação é um método realista para a ampliação espontânea de informações úteis? A resposta claro, é que essas pessoas imaginam combinar duplicação mutacional com seleção todo-poderosa. Mas dedicamos a maior parte deste livro para mostrar que embora a seleção possa reduzir a velocidade da perda mutacional de informação, não pode interrompê-la. Mais enfaticamente, a seleção não pode reverter essa perda. Deve estar evidente agora, se você leu este livro, que quase todas as duplicações serão deletérias e quase neutras, assim como todos os tipos de mutação. Isso significa que a seleção só será capaz de eliminar as piores duplicações. O restante se acumulará implacavelmente, e gradualmente destruirá o genoma. A observação biológica apoia essa visão de senso comum da duplicação?
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A duplicação gênica e a poliploidia podem aumentar a informação genética?
Enfaticamente, sim! Consideremos a população humana. Há algum humano poliploide? Claro que não. Duplicar todos os genomas humanos é absolutamente letal. Existem humanos aneuploides? Sim, há – um número significativo de pessoas tem uma cópia a mais de um cromossomo. Esses indivíduos têm mais informações? Enfaticamente, não. Embora a aneuploidia seja totalmente letal para cromossomos maiores, uma cópia dos menores cromossomos humanos nem sempre é letal. Tragicamente, os indivíduos que têm esse tipo de “informação extra” exibem anormalidades genéticas. O exemplo mais comum disso é a Síndrome de Down, que resulta de uma cópia extra do cromossomo 21. Há inúmeras duplicidades e inserções menores que também é demonstrado que causam doenças genéticas. Atualmente, deve ser óbvio que a maioria das duplicações serão deletérias e quase neutras, como todos os outros tipos de mutação. É amplamente reconhecido que a duplicação, seja dentro de um texto escrito ou dentro do genoma vivo, destrói a informação. Raras exceções podem ser encontradas onde uma duplicação é benéfica de alguma forma menor (possivelmente resultando em algum “ajuste fino”), mas isso não muda o fato de que duplicações aleatórias destroem a informação. Nesse aspecto, duplicações são exatamente como os outros tipos de mutações. Depois de um determinado gene ter acumulado mutações deletérias durante tempo, está em um estado parcialmente degenerado. Se esse gene for então duplicado, as mutações deletérias são duplicadas com ele. Essa duplicação de alguma forma vai desacelerar o processo de degeneração? Obviamente não! Após consideração cuidadosa, podemos ver que uma vez que há uma cópia duplicada de um gene, ambas as cópias vão se deteriorar mais rapidamente do que antes. Por que isso acontece? Porque cada um deles teria uma cópia de backup, e a seleção se tornaria relaxada para ambas as cópias. Afirma-se frequentemente que, após uma duplicação de genes, uma cópia do gene poderia então permanecer inalterada enquanto a outra poderia estar livre para desenvolver uma nova função. Mas nenhum desses eventos é realmente viável. Ambas as cópias vão se deteriorar a taxas aproximadamente iguais devido à acumulação de quase neutros, como temos visto. Nem podem permane-
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cer inalterados. Além disso, a conversão genética deve, em tese, passar continuamente por contaminação cruzada, tanto a chamada “cópia não mutável” quanto a chamada “cópia em evolução”. As conversões de genes também devem teoricamente permitir que mutações dentro de cada gene saltem para a outra cópia, o que deve efetivamente aumentar a taxa de mutação para ambas as cópias. Isso claramente também vai acelerar a deterioração. Em resumo, genes duplicados devem claramente contribuir para a deterioração acelerada mútua devido ao acúmulo acelerado de mutações, e devido à mutação codificando por meio de conversão gênica. Como se isso não bastasse, o capítulo 9 mostra claramente como é irrazoável a especulação de que uma cópia do gene é susceptível de evoluir uma nova função, enquanto ambas as cópias estão irrevogavelmente se deteriorando. E quanto às plantas poliploides? Tem sido alegado que, uma vez que algumas plantas são poliploides (com o dobro do número normal de cromossomos), isso prova que a duplicação deve ser benéfica e deve aumentar a informação. A poliploidia foi minha especial área de estudo para minha tese de doutorado. Curiosamente, faz uma grande diferença como surge a poliploidia. Se as células somáticas (corpo) forem tratadas com o produto químico chamado colquicina, a divisão celular é interrompida, resultando em dobro do cromossoma, mas não nova informação. As plantas que resultam são quase sempre atrofiadas, morfologicamente distorcidas e estéreis. A razão para isso deve ser óbvia. As plantas devem gastar o dobro de energia para produzir o dobro de DNA, mas sem novas informações genéticas. O núcleo é duas vezes maior, alterando a forma adequada das células e o tamanho da célula. Na verdade, as plantas têm realmente menos informação do que antes, porque muito da informação que controla a regulação genética depende do número da cópia do gene. Perda de controle regulatório é perda de informação. É por essa mesma razão que um cromossomo a mais causa a síndrome de Down. Milhares de genes tornam-se indevidamente regulados por causa do cromossomo extra. Se a poliploidização somática é consistentemente deletéria, por que há plantas poliploides afinal (por exemplo, batatas)? A razão é que a poliploidia pode surgir por um processo diferente chamado “poliploidização sexual”. Isso
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acontece quando um esperma não reduzido se une com um óvulo não reduzido. Nesse caso especial, todas as informações dentro dos dois pais são combinadas no descendente, e pode haver um ganho líquido de informação dentro desse único indivíduo. Mas não há mais informação total dentro da população. A informação dentro dos dois pais foi simplesmente agrupada. Em tal caso, estamos vendo o agrupamento de informações, mas não qualquer nova informação. Em um organismo diploide, pode haver duas versões do mesmo gene. Em tal diploide heterozigoto, se uma versão gênica é um mutante disfuncional e a outra é um gene não mutante funcional, este último pode agir como uma cópia backup do primeiro. A diploidia pode assim ser vista como um sistema de backup projetado em antecipação do problema da mutação. Por outro lado, a evolução não pode antecipar nada, e assim podemos concluir muito razoavelmente que ela nunca deve produzir sistemas de apoio. A poliploidia sexual essencialmente duplica a heterozigosidade potencial, pelo que pode haver até quatro versões do mesmo gene dentro do mesmo indivíduo. Tal sistema, assim, possui um backup duplo. Como os quatro computadores redundantes usados no ônibus espacial, pode haver até três alelos mutantes em um determinado lócus, mas enquanto o quarto ainda é funcional, a planta está bem. Assim, a poliploidia não fornece uma forma de aumentar nova informação, mas ilustra a importância da redundância de genes como um sistema de backup projetado para efetivamente desacelerar a deterioração. O custo de tais sistemas é que a seleção não pode remover mutações quase tão eficientemente; assim, a deterioração de longo prazo é ainda mais certa. Em alguns casos especiais, os níveis adicionais de apoio genético dentro de um poliploide podem compensar os problemas de regulação gênica interrompida e a redução da fertilidade, resultando em um tipo de ganho líquido. Mas esse “ganho líquido” é descrito com mais exatidão como uma redução líquida na taxa de deterioração. E quanto a genes duplicados e famílias de genes? Se ter múltiplas versões de genes pode explicar a utilidade da diploidia e da poliploidia, também pode explicar a utilidade de cópias redundantes de um dado gene em diferentes locais dentro do genoma. Normalmente, quando uma versão redundante de
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um gene é vista dentro de outra parte do genoma, é simplesmente assumido pelos teóricos que ele deve ter surgido por uma antiga duplicação de genes. Com frequência eles adicionam a presunção geral de divergência mutacional subsequente. Mas tudo isso se baseia em inferências teóricas, não em observações. Se um gene é redundante dentro do genoma, tal redundância poderia logicamente ser entendida como tendo uma função concebida, tal como backup de gene ou regulação de genes complexos. A ideia de que meramente duplicar um gene pode ser benéfico é biologicamente ingênua. Sim, é possível que uma duplicação de genes poderia aumentar a expressão desse gene. Na verdade, isso às vezes é visto. Mas simplesmente aumentar a expressão de um gene é geralmente deletério (a expressão de gene deve ser precisamente regulada por sistemas moleculares elaborados e finamente ajustados). Além disso, a duplicação é uma forma notavelmente ineficiente de alcançar tal crescente expressão de genes. Como a evolução poderia ser tão consistentemente ineficaz? Por último, duplicações reais de genes não só bagunçam sua própria expressão, mas rotineiramente bagunçam a expressão de outros genes. Muito de minha própria carreira foi dedicada à produção de plantas produzidas geneticamente. A indústria e a academia gastaram mais de um bilhão de dólares nesse empreendimento. O que foi descoberto rapidamente é que as múltiplas inserções genéticas consistentemente dão origem a níveis de expressão mais baixos do que inserções de um único gene. Além disso, as inserções múltiplas foram consistentemente menos estáveis em sua expressão (você percebe que a regulação de genes é muito mais complexa?). Adicionalmente, uma grande porcentagem de todas as plantas transgênicas exibiu outros defeitos genéticos devidos ao efeito disruptivo do DNA extra que é inserido aleatoriamente em locais específicos dentro do genoma. Uma vez que o genoma tem uma arquitetura funcional e altamente específica, qualquer duplicação ou inserção deve logicamente tender a perturbar essa arquitetura. Esse é exatamente o fenômeno que os geneticistas de plantas vêm observando. A noção de duplicação genética como forma de “desenvolver nova informação” tem se estabelecido firmemente dentro da comunidade evolutiva.
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Creio que isso em parte se deve ao fato de que muitos pensam: “Isso deve ser verdade! De que outra forma a evolução teria ocorrido?” Acredito também que quando um mantra é repetido o suficiente, ele assume a aparência de verdade inatacável. Mas uma análise cuidadosa do que informação realmente é, e de como ela surge, combinada com uma dose de bom senso, deve revelar-nos que duplicações aleatórias são consistentemente ruins. É minha opinião pessoal que a “evolução por meio de duplicações aleatórias” é, em sua maioria, uma premissa filosófica, em vez de uma observação cientificamente defensável. Creio que, embora soe bastante sofisticado e respeitável, não resiste a uma avaliação honesta e crítica.
O B J E Ç Ã O 1 : MUTAÇÕES MEGABENÉFICAS Se houvesse mutações raras ocasionais com um efeito profundamente benéfico, tais mutações poderiam compensar todos os efeitos nocivos acumulando mutações deletérias. Isso poderia interromper a deterioração. Por exemplo, talvez uma única substituição de nucleotídeos poderia aumentar o conteúdo de informação do genoma em 1%. Isso neutralizaria efetivamente a mutação (ou mesmo a deleção) de 1% do genoma funcional. Nessa situação hipotética, essa única mutação pontual poderia criar tanta informação quanto a que poderia estar contida em 30 milhões de locais nucleotídicos. Dessa forma, algumas mutações megabenéficas poderiam teoricamente neutralizar milhões de mutações pontuais deletérias.
R E S P O S TA À O B J E Ç Ã O O CENÁRIO ACIMA FALHA POR QUATRO MOTIVOS: a. O modelo reducionista do genoma é que o genoma consiste basicamente num amontoado de genes e nucleotídeos, em que cada gene ou nucleotídeo age em grande parte de forma aditiva. Em tal modelo, essencialmente toda a informação deve ser construída um pouco tempo, como a construção de uma pilha de areia, um grão de cada vez. Isso é verdadeiro mesmo no caso especial de grandes duplicações de DNA. Uma região duplicada não acrescenta novas informações até que mutações pontuais sejam
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de alguma forma incorporadas em um nucleotídeo de cada vez. O teórico reducionista pode subestimar a importância das interações e sinergias, mas, na realidade, ele sabe que a única maneira de escalar o “Monte Improvável” é através de uma série muito longa de etapas infinitamente pequenas. Podemos nos perguntar, racionalmente: “Que tipo de melhorias poderíamos esperar através de erros ortográficos dentro de um manual de montagem do avião a jato?” Obviamente, qualquer aprimoramento que surgisse nunca envolveria grandes incrementos de melhoria. Na melhor das hipóteses, envolveria refinamentos muito sutis. No
O aspecto mais crucial do genoma é que ele carrega uma enorme quantidade de informação funcional. É lamentável que a informação genética funcional tenha sido confundida com “informação Shannon”. A maneira mais simples de esclarecer essa confusão é explicar que a informação de Shannon lida com informações potenciais, enquanto a informação genômica lida com verdadeira informação funcional. Se você comprar um jogo de palavras cruzadas, ele virá com um conjunto de letras. Essas letras representam determinada quantidade de informação potencial. Se você enviar uma mensagem a um amigo com essas letras, elas então representarão informações funcionais. Se você comprar um segundo jogo de palavras cruzadas, você terá duplicado suas informações potenciais. Mas você ainda não criou nenhuma informação funcional adicional (o que requer a ordenação inteligente das novas letras). É útil notar que informação funcional é o que é comunicado através da linguagem. A informação de Shannon se aplica apenas a informação potencial (que conjunto de letras eu tenho?), e sempre assume um código informativo linear, unidimensional. Shannon desenvolveu seus métodos estatísticos para sistemas de comunicação eletrônica (quantos bits eletrônicos posso enviar por um fio?), e ele declarou explicitamente que seus conceitos não deveriam ser aplicados aos sistemas de informação biológica funcional.
nota do autor
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Apêndice 5
Três possíveis objeções Há três objecções possíveis à tese deste livro que quero abordar neste apêndice. Essas questões não são tratadas no corpo deste livro porque estão relacionadas a leitores com conhecimento científico mais avançado, e prejudicaria a legibilidade geral do texto principal.
âmago do Axioma Primário está a lenta melhoria incremental. Sob o Axioma Primário, poderíamos dizer com segurança que um “pool genético” só pode ser preenchido com informações de uma gota minúscula por vez. b. Em um genoma com 3 bilhões de unidades de informação, a média de mutações benéficas só deve aumentar a informação por aproximadamente uma parte em 3 bilhões. Sim, alguns beneficiários terão mais benefícios que outros, criando uma distribuição natural, mas é inteiramente irrazoável acreditar que qualquer mutação pontual benéfica poderia adicionar tanta informação quanto, digamos, 30 milhões de nucleotídeos funcionais. Alguns podem objetar a este ponto da seguinte forma: “Certamente existem mutações deletérias letais. Nestes casos, uma única mutação pontual pode anular efetivamente 3 bilhões de unidades em formação. Com justiça, não é verdade que o recíproco deve ser verdade em relação às mutações benéficas? A mutação benéfica máxima não deve ser igual a 3 bilhões de unidades de informação?” Essa linha de pensamento leva-nos de volta ao ponto de vista ingênuo e em “forma de curva simétrica de sino” a respeito da mutação. Mas sabemos que essa visão é universalmente rejeitada. Por quê? A extrema assimetria dos efeitos mutacionais tem a ver com o fato de que alguém está tentando subir o “Monte Improvável”. Sim, é concebível que um erro possa fazer com que você tropeça colina acima, mas apenas por alguns metros. Você nunca tropeçará em direção à subida por centenas ou milhares de quilômetros. No entanto, um único erro pode levá-lo a cair para baixo distâncias muito substanciais. De fato, enquanto escala o Monte Improvável, você poderia facilmente mergulhar uma distância muito grande – a uma morte instantânea. Da mesma forma, se você está construindo um castelo de cartas, as falhas são muito fáceis, e muitas vezes são muito catastróficas, mas você só pode acrescentar uma carta de cada vez. De forma muito semelhante, as alterações mutacionais são profundamente assimétricas. c. O conceito de usar algumas mutações megabenéficas para
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substituir a informação que sendo perdida em milhões de outros locais nucleotídicos não é racional e leva a conclusões absurdas. Por essa lógica, apenas 100 mutações megabenéficas, cada uma das quais pode aumentar a informação em 1%, poderia substituir todo o genoma. Poderíamos eliminar todas as 3 bilhões de bases dentro do genoma e substituí-lo por um genoma composto apenas por aquelas 100 nucleotídeos altamente benéficos. De fato, se pudéssemos conceber uma mutação que duplica a informação (a imagem espelhada de uma mutação), todo o restante do genoma poderia então ser eliminado. Ainda teríamos uma aptidão de 1,0, mas com base em um genoma de apenas um nucleotídeo! O mecanismo de substituição de alguns megabenéficos para milhões de outros locais que carregam informação que são simultaneamente deteriorados pela mutação resultaria em um tamanho efetivo do genoma que estava encolhendo continuamente e rapidamente. Isso é obviamente impossível. Seria como tentar melhorar um livro subtraindo mil letras para cada nova letra adicionada. Os exemplos frequentemente citados de aparentes “mutações megabenéficas” são muito enganosas. Por exemplo, consideremos a resistência a antibióticos em bactérias, a espessura de peles em cães, e as mutações homeobox na mosca da fruta. Mutações cromossômicas dentro de bactérias que conferem resistência aos antibióticos parecem ser mutações megabenéficas. Na presença de um antibiótico, a estirpe mutante sobrevive, enquanto as outras bactérias morrem. Assim, a aptidão não foi meramente dobrada relativamente às outras bactérias, mas aumentou infinitamente, indo de zero para um! Se você pegar um cão Samoyedo (ártico) e colocá-lo em um deserto muito quente, ele vai morrer. Uma mutação para “sem pelos” permitirá uma adaptação ao calor extremo, para que o cão possa viver. A aptidão novamente aumentou de zero para um, o que é um aumento infinitamente grande!
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Certamente os dois exemplos acima são de “mutações megabenéficas” em termos de adaptação a um ambiente específico. Mas ambas são mutações de perda de função que reduz a informação líquida dentro do genoma. Em termos de conteúdo de informação, ambas são mutações ainda deletérias. Quase todos os exemplos do que parecem ser mutações megabenéficas envolvem apenas a adaptação a um novo ambiente. Esse é apenas um tipo de ajuste fino. Não é construção do genoma. A natureza dramática desses tipos de mudanças não ocorre porque o organismo “avançou” de qualquer maneira real, mas é só porque tudo o mais morreu! É somente em comparação com os concorrentes mortos que o mutante é visto como “melhorado”. Esses tipos de mutações não aumentam as informações nem criam mais complexidade especificada, nem criam de qualquer maneira uma forma mais elevada de vida. Lamentavelmente, os evolucionistas têm tratado dois fenômenos diferentes, a adaptação a ambientes e a evolução de formas de vida mais elevadas, como se fossem a mesma coisa. Não precisamos ser gênios para ver que essas são questões diferentes. A adaptação pode ser realizada rotineiramente por perda de informação ou mesmo deterioração de desenvolvimento (perda de órgãos). No entanto, o desenvolvimento de formas de vida mais elevadas (representando uma complexidade mais especificada) requer sempre grande aumento na informação. Há uma classe especial de mutações que podem afetar profundamente o desenvolvimento de um organismo: as mutações que surgem dentro do que é chamado de genes “homeobox”. Essas mutações podem causar rearranjos brutos de órgãos. Por exemplo, uma mutação pode converter as antenas de um inseto em uma perna, ou podem fazer com que uma mosca tenha quatro asas em vez de duas. Essas mutações certamente qualificam-se como megamutações. Tais mudanças drásticas na forma corporal, decorrentes de mutações simples, têm entusiasmado muitos evolucionistas. Esse tipo de mutação criou um novo campo de especulação chamado “EvoDevo” (desenvolvimento evolutivo). Presume-se amplamente que esse tipo de mutação fornece o Axioma Primário com mutações macro benéficas, podendo permitir saltos evolutivos (grandes saltos para a frente).
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É, de fato, concebível que as macro alterações causadas por mutações homeobox às vezes possam ser benéficas. É até mesmo concebível que às vezes podem ser benéficas de forma substancial. Mas quantas vezes seria realista que isso acontecesse, e essas mutações pontuais realmente poderiam neutralizar a deterioração alastrada pelo genoma? Em termos de um manual de avião a jato, um único erro de ortografia pode converter o comando “repetir loop três vezes” para “repetir loop 33 vezes”. Ou um erro de ortografia pode converter o comando “atacar conjunto 21 na seção A” para “atacar conjunto 21 na seção Z”. Esses erros tipográficos podem resultar em mudanças profundas na forma do avião, mas algum dia seriam benéficos? Se fossem benéficos, poderiam compensar efetivamente a perda de informações de milhões de outros erros de ortografia que estão agindo para deteriorar todos os outros componentes do avião? Podemos teoricamente reconhecer que as mutações homeobox ocasionalmente são úteis em alguns aspectos. No entanto, os exemplos reais são de fato profundamente deletérios. A antena-perna na mosca é realmente apenas uma monstruosidade; ela não age como uma antena nem como uma perna. A mosca com o conjunto adicional de asas não pode usá-las (não estão ligados aos músculos ou nervos). Esses apêndices inúteis só interferem no funcionamento do par normal de asas, e as moscas mutantes mal podem voar. Deve ser óbvio que algumas mudanças dentro de qualquer manual de instruções produzirão aberrações dentro do produto acabado. Mas isso de alguma forma apoiaria a ideia de que as mutações megabenéficas estão acontecendo? Isso poderia sugerir que tal macro mutação poderia aumentar as informações genômicas totais em até 1% (30 milhões de nucleotídeos no homem)? Poderia sugerir que tal mutação poderia neutralizar os efeitos degenerativos de milhões de mutações acontecendo em todo o resto do genoma? Obviamente não! Em conclusão, no tocante a ajudar a sustentar o Axioma Primário, as mutações megabenéficas não podem ser invocadas.
O B J E Ç Ã O 2 – O RUÍDO PODE SER CALCULADO EM MÉDIA
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Se uma população é essencialmente infinita em tamanho, e é perfeitamente homogênea, se o “ruído” é constante e uniforme, e se houver tempo ilimitado, todos os efeitos de ruído acabarão tendo sua média calculada, e assim mesmo os quase neutros podem ser submetidos à seleção. Nessas condições, é concebível que a seleção natural poderia eventualmente interromper a degeneração.
R E S P O S TA À O B J E Ç Ã O Nenhum desses requisitos básicos para eliminar o ruído, conforme listados acima, são encontradas sempre na natureza. a. O tamanho da população nunca é infinito, e no caso do homem, o tamanho da população só se tornou substancial no último vários milhares de anos. Os evolucionistas assumem um tamanho populacional evolutivo eficaz para a humanidade de 10 mil. Essa pequena população nunca teria existido como um pool genético homogêneo, mas teria existido apenas como subpopulações isoladas, talvez 100 tribos, cada uma com cerca de 100 indivíduos. A seleção natural teria Limitado à competição dentro de cada tribo. Sob essas condições, não poderia haver uma média significativa de ruído. b. O ruído nunca é uniforme. Em particular, o ruído ambiental é altamente inconsistente tanto espacial como temporalmente. Para determinada região, a fonte mais importante de ruído não genético pode resultar de extremos climáticos, mas para uma tribo em outra região pode ser uma doença. Para muitas gerações, a variação nutricional pode ser a principal fonte de seleção perturbando o ruído, seguida por ciclos de doença ou de guerra. Nessas condições, não haverá média de ruído. c. À medida que a aptidão diminui devido à acumulação de mutações, o próprio background genômico estará mudando. Em referência à seleção para um determinado nucleotídeo, haverá
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progressivamente mais ruído de todas as outras mutações segregantes que estão se acumulando. Embora alguns aspectos do ruído ambiental estarão em escala com a aptidão (diminuindo assim proporcionalmente o declínio da aptidão), alguns aspectos do ruído ambiental não estarão em escala com a aptidão; por exemplo, o ruído devido a desastres naturais. Este último tipo de ruído, que não diminui junto com o declínio da aptidão, se tornará progressivamente mais disruptivo à medida que a seleção como aptidão declina. O aumento contínuo do ruído não pode ser neutralizado efetivamente pela média do ruído. d. Quando o ruído é alto, a seleção torna-se amplamente neutralizada, resultando em rápida e catastrófica acumulação de mutações. Dada nossa baixa fertilidade e alta taxa de mutação, há tempo para que a média efetiva de ruído funcione antes de extinção. A média do ruído, na medida em que está a acontecer, exige um grande número de eventos de seleção antes que possa haver uma média significativa. Sendo que a hipotética população humana evolutiva teria sido pequena, a única forma de ter um grande número de eventos seria ter a mesma média em muitas gerações. No entanto, muito antes a média de ruído poder ajudar a refinar o processo, a população humana ficaria extinta (talvez mesmo antes de mil gerações). A aptidão atingiria o zero muito antes que o equilíbrio mutacional pudesse ser alcançado. O ruído média, mesmo que esteja realmente acontecendo, não parece ser suficiente para interromper o processo de deterioração em breve para interromper a catástrofe de erro e extinção.
O B J E Ç Ã O 3 – A FALHA DO AXIOMA PRIMÁRIO NÃO É UM DESAFIO SÉRIO AO PENSAMENTO EVOLUCIONISTA. O que importa se o Axioma Primário é fatalmente falho e essencialmente falsificado? O Axioma Primário é apenas um dos numerosos mecanismos da evolução, e por isso não é crucial para a teoria evolutiva. Os pesquisadores da
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evolução precisam apenas de mais tempo e mais algum financiamento para exercitar os poucos “torcedores menores” em suas várias teorias.
R E S P O S TA À O B J E Ç Ã O Essa posição consiste em controle de dano e é claramente falsa. a. Existe apenas um mecanismo evolutivo, a saber, a mutação/seleção (o Axioma Primário). Não há um mecanismo alternativo viável para a geração de genomas. É falso dizer que a mutação/seleção é apenas um dos vários mecanismos de evolução. Há vários tipos de mutações e existem vários tipos de seleção, mas ainda assim existe apenas um mecanismo evolutivo básico (mutação/seleção). A morte do Axioma Primário deixa a teoria evolutiva sem qualquer mecanismo viável. Sem um mecanismo naturalista, a evolução não é significativamente diferente de qualquer religião baseada na fé. b. O único conceito verdadeiramente inovador de Darwin foi a ideia de que a força criativa primária na natureza pode ser a seleção natural. No entanto, ele não tinha nenhum conceito de genética ou mutação e, portanto, não tinha nenhuma concepção do que estava realmente sendo “selecionado”. Assim, ele desconhecia completamente todos os problemas abordados neste livro. Sua visão geral, de que a seleção natural poderia explicar todos os aspectos da biologia, era simplesmente uma posição filosófica defendida vigorosamente. Só muito depois os neodarwinianos sintetizaram genética, a mutação e a seleção, criando o campo da Genética de Populações. Somente então o darwinismo assumiu a aparência da ciência real. Desde então, a mutação/seleção tem sido, e ainda permanece, o eixo que mantém unidos todos os aspectos do pensamento darwinista. c. A deterioração é a antítese precisa da teoria evolutiva. Portanto, a realidade da Entropia Genética é positivamente fatal ao
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darwinismo. Muitas pessoas afirmam que o conceito de design inteligente não pode ser abordado cientificamente, e é apenas uma questão de fé. No entanto, é evidente que na biologia a “hipótese nula” do design inteligente é mutação/seleção. Todos nós sabemos que refutar uma hipótese nula implica em apoiar fortemente a Hipótese. Portanto, qualquer evidência científica que demonstre que a mutação/seleção não pode criar ou preservar genomas é uma evidência científica sólida do design inteligente.
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O LIVRO – ENTROPIA GENÉTICA E O MISTÉRIO DO GENOMA Quando eu publiquei este livro pela primeira vez, nove anos atrás, eu estava mudando para uma nova área de especialização (população genética). Eu era um novo membro indesejável neste clube relativamente exclusivo. Pedi a várias pessoas da área para examinar criticamente meu livro antes de sua publicação – mas eles nem mesmo responderam, assim tive de seguir em frente com a publicação com o mínimo de resposta crítica. Nove anos se passaram desde a primeira edição de Entropia Genética e o Mistério do Genoma. Como o livro foi avaliado? Dada sua natureza técnica, este livro foi relativamente bem lido e bem aclamado nos círculos conservadores. Tenho que acreditar que muitos biólogos evolucionistas também o leram – uma vez que que é uma das principais obras que abertamente desafia seu paradigma de maneira significativa. Ouvi alguma refutação séria às conclusões do livro? De cientistas da área que estão qualificados para responder – apenas ouvi um silêncio ensurdecedor. Isso é verdade mesmo apesar de eu polidamente solicitar um retorno imparcial, após enviar cópias de cortesia deste livro e meus artigos científicos relacionados. Os cientistas relevantes, mesmo aqueles que estavam previamente dispostos a dialogar comigo até certo ponto, nem mesmo responderão a uma consulta amigável. Isso é muito difícil para eu entender, uma vez que a ciência só pode avançar através do diálogo aberto e honesto. Estou ciente de que alguns blogues darwinistas deram alguma resposta – primariamente recorrendo a insultos pessoais e xingamentos. Contudo, até onde sei não houve sérias refutações. Certamente não ouvi qualquer resposta científica de pessoas respeitadas da área. Num único caso, um blogueiro fora do campo da biologia fez um longo e mordaz ataque, mas seus argumentos eram pobremente informados e suas declarações foram apropriadamente abordadas dentro da blogosfera. A comunidade acadêmica recebeu esse livro, junto com minhas outras publicações científicas nos últimos 10 anos, com hostil silêncio. Perguntei a um bom amigo que lesse este livro e que também era um geneticista e evolucionista comprometido: “Por que eles não se ocupam com meus argumentos?” Sua resposta foi surpreendente e simples: “Eles não têm respostas”.
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ApĂŞndice 6
Como a Academia Tem Respondido a Estes Achados?
Creio que ele esteja correto. Porque eu deveria ficar surpreso que eles não tenham respostas? Muitos deles têm silenciosamente reconhecido em seus próprios artigos todos os problemas que esbocei. A maioria dos principais geneticistas populacionais que vieram antes de mim reconheceram a validade básica dos problemas que abordo neste livro (veja o Apêndice 1). Estou certo de que os líderes atuais da área entendem e privadamente reconhecem os problemas que estou abordando. A única razão que posso ver, com relação a porque eles se fechariam para o diálogo aberto, é que eles gostariam de tratar destes mesmos problemas teóricos fundamentais como se eles fossem segredos comerciais – não para diálogo aberto e não para consideração pública. Se isso for verdade, espero que eles falhem em proteger estes “segredos comerciais”. A verdadeira ciência não pode ter vacas sagradas – nem mesmo a teoria neodarwiniana. Espero que os profundos problemas associados a teoria neodarwiniana sejam trazidos à luz e que eles sejam examinados de maneira honesta e aberta. Em suma, depois de seus primeiros 9 anos, este livro permanece basicamente ileso e não requer nenhuma retratação ou pedido de desculpas significativo. De fato, os desenvolvimentos científicos subsequentes durante este tempo têm grandemente fortalecido a tese deste livro. Meus maiores constrangimentos, até agora, tem sido os erros tipográficos e ortográficos. Meu maior desapontamento tem sido o silêncio, a fuga e a censura que tem sido surpreendentemente efetiva em suprimir um exame honesto e aberto dos profundos problemas associados com a teoria neodarwiniana.
O P R O G R A M A – C O N TA D O R D E M E N D E L O Contador de Mendel (Mendel’s Accountant) é a primeira simulação numérica biologicamente realista e abrangente para a área que estuda o processo de mutação/seleção. É uma ferramenta poderosa tanto para o ensino quanto para explorar questões de pesquisa que seriam inacessíveis de outra foram na área da genética populacional. Por mais de 8 anos, a área tem se recusado a testar, empregar ou mesmo conhecer a existência dessa importante nova ferramenta. Ainda assim, o programa Mendel é hoje a mais potente ferramenta
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para abordar as grandes questões da genética populacional. Por que uma área ignoraria deliberadamente uma importante nova ferramenta para seu próprio avanço? No presente caso parece óbvio. Primeiro, os desenvolvedores da nova tecnologia são considerados “politicamente incorretos” – eles são na maioria cristãos ortodoxos. Cristãos crentes são os “leprosos” dentro da comunidade acadêmica ocidental. A academia ocidental suspende seus apreciados padrões de tolerância, liberdade acadêmica, revisão por pares imparcial e padrões simples de cortesia e jogo limpo – quando isso atinge essa minoria especialmente desprezada. É muito claro que se certas pessoas “politicamente incorretas” forem autores numa publicação, essa publicação pode ser rejeitada ou ignorada sem justificativa. Obviamente, não é assim que a ciência supostamente trabalha. Isso não acontece se o autor é ateu, muçulmano, hindu, wiccano ou acredita em Gaia ou em alienígenas. Mesmo os cristãos teologicamente liberais são frequentemente aceitáveis na academia ocidental – contanto que eles queiram saudar o mecanismo darwiniano. O que estamos vendo é um tipo bem específico de intolerância, que é não oficialmente sancionada na maioria das universidades e que é exclusivamente direcionada contra cientistas e estudantes que são cristãos ortodoxos. É muito interessante ponderar por que isso está acontecendo e por que a maior parte das pessoas na academia se recusam a se levantar contra isso. Acredito que uma segunda razão porque a área está escolhendo ignorar esta poderosa nova ferramenta de pesquisa é porque o resultado das simulações numéricas de ponta é embaraçoso para a maioria daqueles que atua na área. Eles gostariam desesperadamente de ignorar a evidência nova, que está mostrando que seu imperador está nu. Eles estão embaraçados e bravos porque eles deveriam ter visto isso antes, exceto que eles estavam cegos pelo poder do “pensamento de grupo”. Eles também estavam cegos pela idolatria de certos “grandes homens” que na realidade eram exatamente como o resto de nós – falhos. O resultado do programa Mendel empírica e cientificamente mostra que a teoria neodarwiniana não funciona. Parece que muitos na área de genética populacional têm deliberadamente escondido este simples fato da comunidade
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científica mais ampla. Se é assim, a ciência tem sido deliberadamente atrasada – presumivelmente porque tantas pessoas comprometeram suas carreiras, suas próprias identidades, defendendo um paradigma ideológico moribundo vindo o século 19. Minha esperança é que alguém na área terá a integridade pessoal e profissional de libertar-se da multidão e iniciar um diálogo aberto, honesto sobre todas estas questões. Se meu desafio ao Axioma Primário está equivocado, que meus colegas me mostrem meu erro e eu me retratarei da minha posição. Se eles não podem me mostrar onde estou errado em todas estas muitas questões – então eles precisam aberta e honestamente reconhecer que há sérios problemas com o paradigma agora dominante.
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A d a p t a ç ã o – Os organismos interagem com o seu ambiente externo, e as mutações podem afetar essa interação. Tais mutações podem afetar a adaptação a um ambiente, tornando a interação melhor ou pior. As mutações adaptativas fornecem os melhores exemplos de mutações, e a seleção para tais mutações é a base para o que é chamado de “microevolução”. Contudo, a maior parte das informações dentro de um genoma não é relevante para a adaptação ambiental, mas controla o maravilhosamente complexo funcionamento interno de um sistema vivo.
A j u s t e r e p r o d u t i vo – Defino esse termo como o produto de “valor fenotípico” (aptidão fenotípica) e “ruído reprodutivo”. O ruído reprodutivo surge porque o sucesso real na reprodução não é determinado apenas pela funcionalidade biológica, mas também por fatores reprodutivos. Portanto, a aptidão fenotípica e a aptidão são correlacionadas, mas não idênticos. A força da correlação entre o valor do fenótipo e a aptidão reprodutiva depende do esquema de seleção utilizado. O truncamento artificial produzirá uma correlação mais alta possível, enquanto irá produzir a menor correlação. O que estou chamando de “aptidão reprodutiva” às vezes é chamada de “aptidão darwiniana” ou “aptidão wrightiana”, em referência a Sewell Wright, o primeiro a formular matematicamente a “aptidão darwiniana”.
A l e l o m u t a n t e – Todas as cópias derivadas de uma mutação inicial transmitida de geração em geração. Um dado alelo mutante pode aumentar ou diminuir em frequência dentro de uma população. Se um alelo mutante atinge uma frequência de 1,0, atingiu a fixação (todos os indivíduos da população têm duas cópias da mutação. Não são deixados alelos não mutantes).
A x i o m a P r i m á r i o – A crença fundacional subjacente a todo pensamento darwinista é que essa mutação mais a seleção natural pode explicar todos os aspectos da vida. Outro termo para isso é a teoria neodarwiniana. C a r g a g e n é t i c a – A carga genética de uma população consiste em todas
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as mutações deletérias presentes nessa população. Quando a carga genética está aumentando continuamente, uma população está próxima de uma catástrofe.
C a t á s t r o f e d e e r r o – A situação biológica em que mutações prejudiciais estão se acumulando mais rápido do que a seleção pode removê-los, levando a um declínio contínuo líquido em aptidão a cada geração. A menos que invertida, a catástrofe de erro leva à extinção de uma população.
C a t r a c a d e M u l l e r – A única maneira de se livrar de mutações deletérias é manter cromossomos inteiros que são “não contaminados” por mutações. Como cada cromossomo está recebendo muitas novas mutações, a única esperança realista para alcançar isso é sistematicamente unir as porções não contaminadas de cromossomos correspondentes. Isso pode parecer concebível porque a emenda (recombinação) realmente ocorre, e a seleção pode favorecer fortemente os cromossomas recombinantes “purificados”. Contudo, Muller mostrou que isso não pode acontecer realisticamente porque a recombinação é muito imperfeita; não ocorre dentro de blocos de ligação, mas apenas entre eles. Visto que mutações ligeiramente deletérias se acumulam em todos os blocos de ligação, não há mecanismo para purificar os cromossomos. Trocar um bloco de ligação para outro simplesmente substitui um conjunto de mutações por outro. Ainda que se uma mutação muito benéfica ocorre dentro de um determinado bloco de ligação, está irrevogavelmente ligada a todas as mutações deletérias que já estão nesse bloco, e assim seu benefício é negado. Portanto, a mudança genética tem um “mecanismo de Catraca” de tal forma que o dano genético não é reversível.
C o l a p s o m u t a c i o n a l – A fase final da catástrofe de erro. À medida que a aptidão de uma população declina continuamente, a fertilidade eventualmente começa a diminuir. Quando há menos descendentes por fêmea, há menos população disponível para a remoção seletiva de mutações deletérias acumuladas. Este conduz à aceleração do declínio da aptidão, o que leva a acelerar o
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declínio da fertilidade e, portanto, cada vez menos seleção. Esta fase final de degeneração leva a um rápido colapso da população e extinção súbita.
C o m p l e x i d a d e i n t e g r a d a – A complexidade perfeitamente integrada resulta em Unidade. A integração perfeita surge quando cada peça de um quebra-cabeça é montada em qualquer outra peça, sem peças faltantes e sem pontas soltas. Nem “co-opção” nem “pré-adaptação” podem explicar esse tipo de perfeição (ambos os mecanismos produzem arranjos mal construídos). A seleção natural carece da resolução quase infinita necessária para explicar esse tipo de perfeição. É uma pilha de lixo no complexo, mas não integrada. No entanto, quebra-cabeças montados e aviões a jato funcionando manifestam Complexidade Integrada. C o n t a d o r d e M e n d e l ( M e n d e l’ s A c c o u n t a n t ) – Uma simulação de programa de computador avançado que realisticamente se modela como os genomas mudam ao longo do tempo em resposta à mutação/seleção.
C r o m o s s o m o – A maioria dos genomas é dividida em subunidades chamadas cromossomos. Estes são como volumes dentro de uma enciclopédia. Cada cromossomo humano tem milhões de nucleotídeos e milhares de genes.
C u s t o d a s e l e ç ã o – O custo da seleção é o fracasso dos indivíduos em se reproduzir. Para que a seleção funcione, alguns indivíduos devem sub-reproduzir. Esse custo pode ser suspenso temporariamente enquanto uma população cresce continuamente (todos podem se reproduzir, mas alguns mais do que outros), mas no tempo profundo, o crescimento populacional deve ser meramente episódico por necessidade.
D e r i va g e n é t i c a – Pelo fato de que cada nova geração surge por uma amostragem de gametas produzidos a partir da geração anterior, o erro de amostragem aleatória fará com que todos os alelos aumentem a diminuição da frequência. Essa deriva genética é o resultado inevitável de segregação men-
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deliana e amostragem gamética aleatória. A deriva é especialmente forte em populações pequenas, e tende a negar a seleção. A seleção é essencialmente neutralizada em populações pequenas (exceto seleção contra mutações quase letais), e alelos são rapidamente perdidos ou fixados aleatoriamente, independentemente de seu efeito de aptidão.
D i l e m a d e H a l d a n e – O famoso geneticista Haldane analisou o custo da seleção e verificou que, mesmo tendo em conta um fornecimento estável de mutações benéficas selecionáveis, a taxa de tais mutações pode ser seletivamente fixada é extremamente lenta (300 gerações por mutação fixa). Isso significa que a evolução impraticável mesmo dentro de prazos geológicos. Esse problema tem sido confirmado por outros.
D N A p o l i f u n c i o n a l – É cada vez mais claro que existem padrões funcionais múltiplos, sobrepostos, dentro de genomas superiores. Isso significa que muitos nucleotídeos não têm uma função, mas na verdade têm várias funções (como uma letra num jogo de palavras cruzadas pode ser parte de duas palavras). O DNA polifuncional é interessante porque é polidefinido e é severamente limitado em termos de quaisquer mutações benéficas potenciais.
E f e i t o d e a p t i d ã o d e m u t a ç ã o – O efeito biológico de uma mutação. Os efeitos de adaptação da mutação podem ser positivos ou negativos, grandes ou pequenos. O efeito da mutação é expresso como a alteração relativa na funcionalidade biológica total de um indivíduo, causada por uma mudança no valor do genótipo de um indivíduo. Uma mutação deletéria com um efeito de aptidão de -0,01 diminui o valor do genótipo de um indivíduo por 1%. Um por cento da informação genômica é perdida. A funcionalidade total biológica é reduzida em 1%. Outra maneira de dizer isso é que tal mutação diminui a aptidão genotípica em 1%. Essas são apenas formas alternativas de descrever o efeito biológico de uma mutação. O efeito da mutação é independente da variação ambiental (ruído fenotípico) e os aspectos aleatórios da reprodução (ruído reprodutivo). O efeito de mutação é semelhante, mas não idêntica ao
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conceito tradicional de um coeficiente de seleção (ver Sanford et al., 2007a).
E n t r o p i a – Em seu uso mais geral ou comum, entropia é a tendência universal para que as coisas se deteriorem à parte da intervenção inteligente. A entropia é por vezes definida como a “tendência para que a coisa vá da ordem à desordem”. É também descrita como a “tendência para que a energia passe de formas úteis a inúteis”. Também é descrita como a “incapacidade das máquinas de operar a 100% de eficiência”. Ela também é chamada de “seta do tempo” ou “vetor do universo”, porque a entropia sempre aumenta no quadro geral. Einstein a considerava a força mais importante do universo, e a experimentos pessoalmente todos os dias de nossa vida.
E n t r o p i a d e S h a n n o n – Uma medida estatística de complexidade (“não simplicidade”). Essa estatística ajuda a definir os limites inferiores do potencial em formação. Uma sequência alfabética de letras (a, b, c...) tem baixa entropia de Shannon, porque a sequência é fixa e previsível. Isso limita a quantidade de informações que ele carrega. Assim, baixa entropia de Shannon significa potencial de informação limitada. O mesmo conjunto de letras pode se tornar “complexo” ao ser reordenado. Organizá-los numa mensagem útil que comunica algo aumenta a entropia de Shannon, mas o mesmo acontece com as letras. No primeiro caso, verdadeira informação funcional é criada (através da inteligência). No segundo caso, ainda há apenas informações potenciais (um conjunto de letras). Portanto, o aumento da entropia de Shannon não deve ser confundido com o aumento da informação funcional. Informações verdadeiras têm alta entropia de Shannon, mas também o lixo informacional.
E n t r o p i a g e n é t i c a – Esse é um princípio biológico fundamental. À parte da intervenção inteligente, a informação genômica funcional dentro de organismos vivos livres (excluindo vírus) deve diminuir consistentemente. Como todos os outros aspectos do mundo em que vivemos, o “vetor natural” dentro do reino biológico está a deterioração, com desordem consistentemente aumentando ao longo do tempo.
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E p i s t a s i a – As diferentes mutações que afetam o mesmo traço frequentemente interagem, e, quando isso acontece, é chamado de epistasia. Uma mutação deletéria pode ser mais ou menos deletéria dependendo da ausência ou presença de outras mutações. Tal epistasia cria interferência na seleção. Os geneticistas reconhecem que a epistasia é importante, mas assumem que as interações negativas largamente cancelam uns aos outros.
E p i s t a s i a s i n é r g i c a – O termo epistasia sinérgica é normalmente usado apenas na tentativa de racionalizar como os genomas podem ser impedidos de se deteriorar continuamente. O conceito básico é que a epistasia (interação) entre mutações é consistentemente negativa. Portanto, à medida que as mutações se acumulam, cada nova mutação tem um efeito deletério de aptidão média cada vez maior. Isso é exatamente o oposto do modelo genético da população multiplicativa padrão, em que cada mutação tem cada vez menos efeito (um ou ambos os modelos devem estar errados). O modelo de epistasia sinérgica é extremamente artificial e biologicamente não realista. Mesmo se aceitarmos o modelo, pode-se mostrar que esse mecanismo falha em interromper a deterioração quando a ligação e a interação entre mutações e não mutações também são levadas em conta.
F e n o m a – Um organismo funcional completo, combinando todos os aspectos de seu genótipo e fenótipo. A expressão externa de todas as informações de um genoma dentro de um ambiente específico.
F e n ó t i p o – A manifestação real biologicamente funcional individual. O fenótipo é afetado tanto pelo genótipo quanto por fatores ambientais que cercam o indivíduo. Genótipo e fenótipo estão correlacionados, mas não são idênticos.
F r e q u ê n c i a d o a l e l o m u t a n t e – A fração de todos os alelos a um lócus particular (para diploides equivale a dobrar o tamanho da população) que são
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a forma mutante. Se houver duas cópias de uma mutação numa população diploide de cem, a frequência dos alelos mutantes é de 1% e a frequência do alelo não mutante é de 99%.
G e n e – Uma unidade biologicamente funcional dentro de um cromossoma. Os genes são constituídos por milhares ou mesmo milhões de nucleotídeos. Estes são análogos aos capítulos de um livro. Um gene humano típico é polifuncional, codificando muitos RNAs diferentes e várias formas de proteínas. Os genes são regulados por máquinas muito complexas, incluindo sequências de DNA muito além das fronteiras do gene.
G e n o m a – Todo o conteúdo genético de um organismo. Este inclui todo o DNA, todos os genes e todos os cromossomos. O genoma funcional é todo o genoma físico, exceto quaisquer porções que sejam biologicamente irrelevantes (sem informações funcionais e efeito biológico zero). G e n ó t i p o – Um genótipo é uma versão pessoal do genoma. É um conjunto específico de alelos genéticos, presentes em um indivíduo específico dentro de uma população específica. Valor do genótipo – O valor do genótipo pode ser visto como o valor total do conteúdo de informação do genoma de um indivíduo. É essa parte de uma funcionalidade biológica total do indivíduo especificada pelo genoma do indivíduo. O valor do genótipo é diferente do fenótipo devido a fatores ambientais (ruído fenotípico), que também afeta a funcionalidade biológica de um indivíduo. A extensão que uma determinada mutação muda o valor genotípico é uma função de seu efeito específico da aptidão da mutação. O valor do genótipo pode ser usado como sendo sinônimo do termo “aptidão genotípica”.
H e r d a b i l i d a d e – Uma medida tradicional da relação sinal/ruído como se aplica à seleção. Especificamente, é a variância hereditária dividida pela variância total. A variância total combina variação (sinal) e variação não herdável (ruído). O ruído não herdável inclui toda a variação devida aos efeitos
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ambientais, efeitos do ambiente por genótipo, efeitos epistáticos e efeitos de dominância.
I n f o r m a ç ã o d e S h a n n o n – Uma medida estatística de potencial em formação. Mais letras e mais tipos de letras aumentam informações potenciais. No entanto, a menos que as letras sejam colocadas numa sequência específica e significativa, sempre haverá zero informação funcional, e nada pode ser comunicado. Embaralhando as mensagens de uma mensagem coerente, mantemos a mesma quantidade de informações potenciais, mas eliminamos todas as informações funcionais (reais). I n f o r m a ç ã o f u n c i o n a l – Quando usamos a palavra informação no sentido comum da palavra, estamos falando de informação funcional. A informação funcional comunica algo, e para um fim específico. A compressão de dados nos permite comunicar mais informações funcionais usando menos números ou caracteres. I n t e r f e r ê n c i a d e s e l e ç ã o – O fenômeno onde a seleção para um traço em uma população confunde a seleção para outro traço na mesma população.
L i g a ç ã o g e n é t i c a – Um cromossomo é uma molécula linear um pouco semelhante a uma mensagem de texto muito longa. Correspondentes pares de cromossomos podem trocar blocos de informações, como duas mensagens de texto podem trocar seus últimos parágrafos. Esse tipo de troca de informações é limitado a grandes blocos de DNA. Parágrafos inteiros são trocados. As palavras ou letras individuais normalmente não são trocadas. Dentro de um bloco de ligação (parágrafo), todas as letras e palavras estão fisicamente unidas e nunca separadas. A ligação humana típica em bloco é de cerca de 20 mil nucleotídeos. Eles são essencialmente indivisíveis e, portanto, herdadas como uma única unidade.
L ó c u s m u t a n t e – A localização de uma mutação, em termos de sua posi-
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ção dentro de um bloco de ligação, dentro de um cromossoma. M u t a ç ã o – Qualquer alteração no genoma que não estava presente anteriormente. Mudanças mutacionais são diretamente análogas aos erros de processamento de palavras que surgem na cópia de um texto. Pode haver substituições, deleções, inserções, duplicações, inversões etc.
M u t a ç ã o / c a d e i a d e s e l e ç ã o – No mundo biológico real, essa é a cadeia de eventos que liga um evento mutacional a um evento de seleção. Uma mutação afeta um bloco de ligação, que afeta um cromossomo, o qual afeta um genótipo, o qual afeta um fenótipo, o qual afeta a aptidão reprodutiva de um indivíduo, o qual afeta a transmissão da mutação para a próxima geração. Há ruído biológico em cada elo nessa cadeia, e assim cada ligação deste está associada a uma correlação imperfeita.
N u c l e o t í d e o s – Os nucleotídeos são as quatro moléculas diferentes que constituem os “degraus” na escada do DNA. Eles são tipicamente representados como A, T, C e G. Muitos nucleotídeos são polifuncionais, afetando vários processos biológicos simultaneamente.
P o o l g e n é t i c o – O conceito abstrato de um pool genético não tem correspondência com a realidade. Genes (alelos, nucleotídeos) nunca estão livremente misturados com outros, mas só existem em organismos vivos, no contexto de blocos de ligação específicos dentro de cromossomos. O conceito de um pool genético às vezes é útil quando precisamos de uma imagem mental de diferentes alelos aumentando ou diminuindo independentemente dentro de uma população. P o p u l a ç ã o – Um grupo de indivíduos que se cruzam entre si é uma população. O tamanho da população é o número de indivíduos reprodutores. Q u a d r o d e K i m u r a – Muller percebeu que mutações que tinham muito efeitos pequenos da aptidão seriam não selecionáveis. Kimura formalizou esse
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princípio matematicamente e descreveu um limiar onde os efeitos mutacionais se tornariam “efetivamente neutros” (isto é, não selecionáveis). Kimura argumentou que a maioria das mutações estaria nessa classe e que o princípio de “efetivamente neutro” se aplica igualmente bem tanto a mutações benéficas quanto a deletérias. Em efeitos mutacionais de aptidão, pode-se imaginar uma zona (ou “quadro”) envolvendo mutações verdadeiramente neutras (aquelas com efeito zero). Quanto maior é ruído não hereditário que existe dentro de um sistema genético, maior o quadro “sem seleção”. Kimura apontou que o tamanho da população ajuda a definir o tamanho dessa zona de não seleção (pequenas populações têm mais ruído devido à amostragem gamética). No entanto, o tamanho dessa zona de não seleção também é afetada por muitos outros tipos de ruído, incluindo os ruídos ambientais e reprodutivos. Em genomas grandes, a maioria das mutações devem cair dentro do quadro de não seleção de Kimura.
S e l e ç ã o – A seleção pode ser vista como reprodução diferencial, onde alguns indivíduos se reproduzem menos do que outros. Alguns indivíduos são diferencialmente excluídos de contribuir para a próxima geração. A menos que haja uma população excedentária (isto é, fertilidade), a seleção não pode acontecer sem o encolhimento do tamanho da população devido à não reprodução de indivíduos. S e l e ç ã o d e t ru n c a m e n t o – Quando os criadores de plantas ou animais usam a seleção artificial, eles tipicamente usam a seleção do truncamento. Os melhores indivíduos são selecionados com certeza e os piores são excluídos com certeza. Essa forma de seleção não é normalmente operacional na natureza. Em casos especiais, onde há morte quase certa para todos, com exceção de alguns genótipos bem definidos (isto é, a resistência em bactérias), episódios de seleção de truncamento podem acontecer na natureza. Essa é uma forma muito forte de seleção, mas as populações naturais poderiam sobreviver a episódios raros de uma seleção tão rigorosa porque ela está associada a taxas extremamente altas de mortalidade.
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S e l e ç ã o n a t u r a l – A seleção natural é a tendência natural para indivíduos menos biologicamente funcionais dentro de uma população para reproduzir menos do que aqueles que são mais funcionais. Quando indivíduos com mais função reproduzem, muitas vezes é chamado de “sobrevivência do mais apto”, mas seria mais bem chamado de “reprodução do mais apto”. Na natureza há também uma grande quantidade de aleatoriedade para a reprodução. Esse importante princípio pode ser denominado “sobrevivência (reprodução) do mais sortudo”. Porque ambos os princípios são operacionais em natureza, os indivíduos mais aptos têm apenas uma probabilidade ligeiramente mais alta de reprodução e podem ser excluídos da reprodução devido a eventos aleatórios. Esse tipo natural de seleção também é chamado “seleção de probabilidade”. É uma forma muito ineficaz de seleção (veja Seleção de truncamento).
Va l o r d o f e n ó t i p o – A funcionalidade biológica real de um indivíduo em relação a outros indivíduos na população, determinada pela combinação de efeitos genotípicos e efeitos ambientais, é chamado de “valor fenotípico”. É o que a seleção realmente atende. É o que a natureza realmente vê. O valor do fenótipo é sinônimo dos termos “aptidão fenotípica” ou “aptidão biológica”, tal como refletido pelo uso desses termos entre os biólogos. Contudo, o conceito de valor fenótipo (aptidão fenotípica) é distinto do que os geneticistas populacionais definiriam formalmente como “aptidão”. Para maior clareza, usaremos o termo aptidão reprodutiva para se referir à definição de aptidão do geneticista populacional, que é distinta de aptidão fenotípica.
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recursos adicionais
C O N TA D O R D E M E N D E L ( M E N D E L’ S A C C O U N TA N T ) A lógica simples descrita neste livro refuta fortemente a teoria neodarwiniana. No entanto, o Axioma primário está tão profundamente enraizado nas mentes das pessoas que alguns exigirão evidências além de uma análise lógica direta. Mas, além da lógica, como podemos testar objetivamente e empiricamente a teoria neodarwiniana para a satisfação de pessoas pensantes? Existe apenas um método empírico e definitivo para analisar objetivamente a teoria neodarwiniana. Esse método é chamado de “simulação numérica”. Em populações reais, milhões de mutações estão se segregando simultaneamente. Isso torna o processo de mutação/seleção incrivelmente complexo. Devido a essa complexidade, a única maneira de entender o processo é rastrear de forma sistemática todas as mutações que ocorrem dentro de uma população (da mesma forma que um contador usa uma planilha para rastrear cada transação financeira em uma grande corporação). Esta é a essência do que é chamado de “simulação numérica”. Quando aplicado a sistemas genéticos, a simulação numérica pode ser denominada “contabilidade genética”. O software Mendel’s Accountant (Contador de Mendel) foi desenvolvido para esse fim. É o primeiro programa de simulação numérica abrangente e biologicamente realista para a genética populacional. Este novo programa é
uma poderosa ferramenta de pesquisa e ensino. Quando qualquer conjunto razoável de parâmetros biológicos é utilizado, o Contador de Mendel fornece evidências empíricas esmagadoras de que os genomas degeneram ao longo do tempo e que todas as falhas aparentes inerentes à teoria genética evolutiva são reais. Isso efetivamente falsifica o Axioma Primário com certo grau de certeza que deve satisfazer qualquer pessoa de mentalidade aberta. O Contador de Mendel é um programa que pode ser executado usando um Mac ou PC. Pode ser baixado, juntamente com uma descrição detalhada e um conjunto de instruções, gratuitamente em http://mendelsaccountant.info.
I N F O R M A Ç Ã O B I O L Ó G I C A - N O VA S P E R S P E C T I VA S O novo livro Biological Information – New Perspectives (Informações Biológicas - Novas Perspectivas) é uma leitura obrigatória para qualquer pessoa interessada em novas evidências convincentes contra a teoria neodarwiniana. Está disponível na Amazon.com, mas também está disponível a um custo muito mais baixo no BINP.org. Seus capítulos individuais também estão disponíveis gratuitamente (worldscientific.com). O folheto Biological Information - New Perspectives a Synopsis é uma sinopse muito mais curta e acessível dos procedimentos. Está disponível gratuitamente em PDF no BINP.org. A mesma sinopse está disponível no formato Kindle na Amazon.com.
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