Revista T - alguns artigos

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PORTEFÓLIO T magazine Entrevista Armindo Araújo Reportagem Festival Sudoeste tmn Perfil Kanye West Roteiro Golegã Entrevista Aurea Roteiro Aveiro Entrevista/Perfil André Carrilho Reportagem de viagem Méribel & Courchevel Perfil/Entrevista Zé Diogo Quintela


tendências

I design I DECERTO não lhe parecerá estranho se começarmos por noticiar que a Porsche foi distinguida com três “iF Product Design Awards” – os chamados “Óscares do Design”. Porém, se acrescentarmos que os galardões premeiam um relógio, uma linha de mobiliário de cozinha e um telemóvel, aí talvez se questione: «Então mas não estávamos a falar de automóveis?». Pois bem, muito para além dos automóveis, que contribuíram para o seu inquestionável estatuto de culto, a marca alemã assenta toda a criação num conceito mais transversal: linguagem de design clara e funcional, cuidada selecção de materiais e um exigente processo de fabrico, combinando tradição artesanal com o recurso à mais avançada tecnologia. Foi com estes

PORSCHE P’9521 Preço: €399,90 iF Product Design Award 2008 Câmara de 3,2MPX Ecrã AMOLED rotativo de 2,2” Sensor de impressão digital Cartão de memória de 2GB Disponível em www.tmn.pt Mais informações: www.mobileporschedesign.com

O PREMIADO P’9521 distingue-se dos demais telemóveis por diversos motivos. Começando pelo elementar: o corpo é feito de uma só peça de alumínio, com um ecrã talhado em vidro mineral. O formato, assente num rectângulo de vértices suaves, mantém-se fiel à linguagem de design da marca: não há uma única linha supérflua no seu traçado. O visor pode ser rodado até 180º, facilitando o uso como câmara ou a visualização de imagens no ecrã de 2,2 polegadas. Mas a “pièce de résistance” é o sensor de impressão digital incorporado, que faz o tradicional PIN parecer uma burocracia obsoleta. Em alternativa, este “scanner” pode ainda funcionar como sistema de marcação rápida (mediante a atribuição da impressão de cada dedo a um número guardado na agenda) ou como protecção do acesso a certas áreas do telefone.

NA PONTA DOS DEDOS

Preço: €549,90 Câmara de 5MPX GPS e A-GPS (Wayfinder) Wi-fi Ecrã táctil de 2,8” AMOLED Sensor de impressão digital Cartão de memória de 2GB Disponível em www.tmn.pt Mais informações: www.mobileporschedesign.com

JULHO , AGOSTO

DOIS TELEMÓVEIS COM ASSINATURA DE CULTO.

PORSCHE P’9522

JULHO , AGOSTO

2009

PORSCHE

princípios que Ferdinand Alexander Porsche, neto do fundador da insígnia, criou o Porsche Design Studio em 1972. Dos estiradores do atelier saíram já os mais diversos objectos: de relógios a botões de punho, passando por malas de viagem, mobiliário, torneiras ou maquinaria de apoio à medicina. E telemóveis, também, em parceria com a Sagem.

O SEU sucessor, o P’9522, também vem equipado com esta maravilha. Fabricado à mão, em formato de barra, apresenta uma câmara de 5MPX e um ecrã táctil AMOLED (que combina maior nitidez, melhor leitura quando exposto à luz solar e menor consumo de energia) de 2,8 polegadas complementado por um teclado numérico. Este ícone de estilo direcciona as suas atenções para o capítulo multimédia e para uma panóplia de opções de conectividade, Internet de alta velocidade, GPS e aplicações de produtividade.n

2009

PERSONALIDADE

O SENSOR DE IMPRESSÃO DIGITAL INCORPORADO FAZ O TRADICIONAL PIN PARECER UMA BUROCRACIA OBSOLETA.

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tendências

I design I DECERTO não lhe parecerá estranho se começarmos por noticiar que a Porsche foi distinguida com três “iF Product Design Awards” – os chamados “Óscares do Design”. Porém, se acrescentarmos que os galardões premeiam um relógio, uma linha de mobiliário de cozinha e um telemóvel, aí talvez se questione: «Então mas não estávamos a falar de automóveis?». Pois bem, muito para além dos automóveis, que contribuíram para o seu inquestionável estatuto de culto, a marca alemã assenta toda a criação num conceito mais transversal: linguagem de design clara e funcional, cuidada selecção de materiais e um exigente processo de fabrico, combinando tradição artesanal com o recurso à mais avançada tecnologia. Foi com estes

PORSCHE P’9521 Preço: €399,90 iF Product Design Award 2008 Câmara de 3,2MPX Ecrã AMOLED rotativo de 2,2” Sensor de impressão digital Cartão de memória de 2GB Disponível em www.tmn.pt Mais informações: www.mobileporschedesign.com

O PREMIADO P’9521 distingue-se dos demais telemóveis por diversos motivos. Começando pelo elementar: o corpo é feito de uma só peça de alumínio, com um ecrã talhado em vidro mineral. O formato, assente num rectângulo de vértices suaves, mantém-se fiel à linguagem de design da marca: não há uma única linha supérflua no seu traçado. O visor pode ser rodado até 180º, facilitando o uso como câmara ou a visualização de imagens no ecrã de 2,2 polegadas. Mas a “pièce de résistance” é o sensor de impressão digital incorporado, que faz o tradicional PIN parecer uma burocracia obsoleta. Em alternativa, este “scanner” pode ainda funcionar como sistema de marcação rápida (mediante a atribuição da impressão de cada dedo a um número guardado na agenda) ou como protecção do acesso a certas áreas do telefone.

NA PONTA DOS DEDOS

Preço: €549,90 Câmara de 5MPX GPS e A-GPS (Wayfinder) Wi-fi Ecrã táctil de 2,8” AMOLED Sensor de impressão digital Cartão de memória de 2GB Disponível em www.tmn.pt Mais informações: www.mobileporschedesign.com

JULHO , AGOSTO

DOIS TELEMÓVEIS COM ASSINATURA DE CULTO.

PORSCHE P’9522

JULHO , AGOSTO

2009

PORSCHE

princípios que Ferdinand Alexander Porsche, neto do fundador da insígnia, criou o Porsche Design Studio em 1972. Dos estiradores do atelier saíram já os mais diversos objectos: de relógios a botões de punho, passando por malas de viagem, mobiliário, torneiras ou maquinaria de apoio à medicina. E telemóveis, também, em parceria com a Sagem.

O SEU sucessor, o P’9522, também vem equipado com esta maravilha. Fabricado à mão, em formato de barra, apresenta uma câmara de 5MPX e um ecrã táctil AMOLED (que combina maior nitidez, melhor leitura quando exposto à luz solar e menor consumo de energia) de 2,8 polegadas complementado por um teclado numérico. Este ícone de estilo direcciona as suas atenções para o capítulo multimédia e para uma panóplia de opções de conectividade, Internet de alta velocidade, GPS e aplicações de produtividade.n

2009

PERSONALIDADE

O SENSOR DE IMPRESSÃO DIGITAL INCORPORADO FAZ O TRADICIONAL PIN PARECER UMA BUROCRACIA OBSOLETA.

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directo

I automobilismo I

ARMINDO

ARAUJO AS CORRIDAS DE UM PILOTO QUE NÃO ESTÁ HABITUADO A PERDER .

O PRIVILEGIO

DE GANHAR TEXTO JOÃO MESTRE FOTOGRAFIA PAULO SOUSA COELHO

AGOSTO, SETEMBRO

2009

F

14

ala sempre no plural, como quem reconhece que não é só a si que deve os bons resultados obtidos. Armindo Araújo começou pelas motos, chegando a vencer o Troféu KTM 250cc (1999). Em 2000, foi assistir ao rali de Santo Tirso e a sua vida mudou: trocou as duas rodas pelos automóveis e, logo no seu primeiro rali, terminou em 2º lugar. Nesse ano de estreia, sagrou-se campeão nacional. Tinha 23 anos. «As coisas até poderiam ter corrido melhor, se eu tivesse começado mais cedo», desabafa o piloto da Dream Team TMN. A verdade é que, desde então, venceu todas as competições nacionais em que participou. Em 2007, subiu a fasquia, ao entrar para o Campeonato Mundial de Ralis, na classe Produção (PWRC). Dias antes do arranque da sua terceira época no PWRC, fomos a Santo Tirso entrevistá-lo no seu «quartel-general». «A qualquer momento podemos ser campeões do mundo», afiança, com serenidade. A uma prova do final da temporada, Armindo está em segundo lugar, numa luta acesa pelo título. Será que é desta?


directo

I automobilismo I

ARMINDO

ARAUJO AS CORRIDAS DE UM PILOTO QUE NÃO ESTÁ HABITUADO A PERDER .

O PRIVILEGIO

DE GANHAR TEXTO JOÃO MESTRE FOTOGRAFIA PAULO SOUSA COELHO

AGOSTO, SETEMBRO

2009

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14

ala sempre no plural, como quem reconhece que não é só a si que deve os bons resultados obtidos. Armindo Araújo começou pelas motos, chegando a vencer o Troféu KTM 250cc (1999). Em 2000, foi assistir ao rali de Santo Tirso e a sua vida mudou: trocou as duas rodas pelos automóveis e, logo no seu primeiro rali, terminou em 2º lugar. Nesse ano de estreia, sagrou-se campeão nacional. Tinha 23 anos. «As coisas até poderiam ter corrido melhor, se eu tivesse começado mais cedo», desabafa o piloto da Dream Team TMN. A verdade é que, desde então, venceu todas as competições nacionais em que participou. Em 2007, subiu a fasquia, ao entrar para o Campeonato Mundial de Ralis, na classe Produção (PWRC). Dias antes do arranque da sua terceira época no PWRC, fomos a Santo Tirso entrevistá-lo no seu «quartel-general». «A qualquer momento podemos ser campeões do mundo», afiança, com serenidade. A uma prova do final da temporada, Armindo está em segundo lugar, numa luta acesa pelo título. Será que é desta?


directo I automobilismo I

Como se sentiu quando con-

AGOSTO, SETEMBRO

2009

quistou a sua primeira vitória?

22

Foi muito saboroso. Foi no segundo rali. Tinha alugado outro carro e, como não o conhecia, experimentei-o uns quilómetros antes de a prova começar. Consegui vencer os pilotos que já estavam habituados ao campeonato, que conheciam bem as corridas. Eu era o novato. Ter ganho fez os patrocinadores olharem para mim de outra maneira. Como foi a adaptação a um evento mundial como o PWRC?

O Mundial de Produção está inserido no Mundial de Ralis, junto com os WRC, que são protótipos, muito resistentes e sofisticados. Nós andamos num “Grupo N”, um carro de série com algumas alterações. O certo é que nós passamos pelos mesmos sítios onde os outros passam e temos três dias de corrida. São provas muito longas e duras, onde este tipo de carro sofre muito. Temos de ter alguma sorte e conhecer bem as corridas, porque estamos a falar dos melhores pilotos do

Em 2008, planeava atacar o título mundial. O que correu mal?

No Campeonato do Mundo, acontecem tantos problemas… Um exemplo: em 2006, o campeão do mundo foi o Nasser Al-Attiyah e, em 2008, com o mesmo tipo de carro, no mesmo grupo, com os mesmos adversários, não conseguiu fazer um ponto sequer. Os resultados são muito voláteis. No grupo dos sete, oito primeiros, qualquer um pode ser campeão. Já tivemos muitos azares, mas estamos com cada vez mais experiência. A qualquer momento podemos ser campeões.

Dakar incluído?

Quem sabe? São provas que exigem outra experiência…

Exactamente. Lá não é a rapidez pura que faz a diferença. Conta a experiência, a equipa onde estamos inseridos. E muito espírito de sacrifício. Se essa hora chegar, teremos de ter outra postura na corrida. Qual é a receita para um bom piloto de ralis?

O rali é mais uma corrida de “sprint”, mais curta, portanto podemos ser muito mais explosivos no tempo que fazemos. Uma prova como o Dakar é mais de “endurance”. Mas, neste momento, ainda estou na fase do “sprint”, da explosão. Quem são os seus ídolos?

Aprendi que devo dizer que vou fazer o meu melhor, que vou trabalhar muito, e o resultado pode ser o primeiro, segundo, quarto, quinto ou o sexto lugar, não sei. Depende dos problemas que tivermos. Mas se me perguntar se tenho velocidade suficiente para ser campeão do mundo, respondo que sim.

O Ayrton Senna e, actualmente, o Sebastien Loeb, que está a fazer uma carreira fantástica no Campeonato do Mundo de Ralis. Contudo, na posição em que estou, comecei a avaliar o porquê de muitas coisas – nunca tirando o mérito a estas duas pessoas, o certo é que tiveram as equipas certas, estavam no sítio certo à hora certa. É preciso criar todo um conjunto de factores para que tudo corra bem.

Em termos de futuro, qual é o

Qual foi o pior momento da sua

É esse o objectivo para este ano?

seu grande objectivo?

Chegar a uma grande equipa oficial do Mundial de Ralis (WRC) e ser campeão mundial absoluto. E fora do rali, ambiciona brilhar em alguma outra disciplina do desporto automóvel?

Mais tarde, não digo não à passagem para o todo-o-terreno. Já lá fiz algumas participações. Quem

carreira?

Ainda não tive um pior momento na minha carreira. Estive sempre com as equipas certas, os patrocinadores certos, nos campeonatos de que mais gosto. Nunca tive nenhum acidente grave. Não posso apontar nada a não ser pequenas desistências. Tenho sido um privilegiado.

Já lhe aconteceu dar por si a conduzir em estrada como se estivesse em competição?

Não. Sou criticado pelos meus amigos por andar excessivamente devagar. Quando tinha 18-19 anos, claro que fiz as minhas «habilidades». Algumas bastante irresponsáveis, até. Mas, hoje em dia, a

minha postura é completamente oposta. A adrenalina de conduzir depressa é no sítio certo: nos ralis. Quando não está a treinar ou a competir, o que é que faz?

Estou com o meu filho, que tem um ano. É ele que me carrega as baterias – embora de noite mas descarregue muitas vezes. n

DREAM TEAM TMN Armindo Araújo, patrocinado pela tmn desde 2007, integra a Dream Team TMN, uma sólida equipa de jovens e promissores atletas portugueses com provas dadas a nível internacional: Bernardo Sousa e Álvaro Parente, no automobilismo; Michelle Larcher de Brito, no ténis; Tiago Pires, no surf; Francisco Lobato, na vela; e Hélder Rodrigues e Ruben Faria, no todo-o-terreno.

2009

“TIVE A PRIMEIRA MOTA AOS SEIS ANOS. DESDE MIÚDO QUE GOSTAVA DE MOTAS, AUTOMÓVEIS, BICICLETAS. NA MESMA ALTURA, APRENDI A CONDUZIR NO CARRO DA MINHA AVÓ.”

sabe se, depois dos ralis, não haverão umas participações ou uma permanência no campeonato de todo-o-terreno?

AGOSTO, SETEMBRO

CEDO SE APRENDE O OFÍCIO

mundo. Temos feito boas corridas, mas, por algum motivo, as coisas não têm corrido como queríamos. Temos rodado dentro dos cinco primeiros lugares e fazemos parte do lote de potenciais vencedores. Estamos a lutar por um lugar na frente do Campeonato do Mundo. A nossa hora vai chegar.

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directo I automobilismo I

Como se sentiu quando con-

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2009

quistou a sua primeira vitória?

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Foi muito saboroso. Foi no segundo rali. Tinha alugado outro carro e, como não o conhecia, experimentei-o uns quilómetros antes de a prova começar. Consegui vencer os pilotos que já estavam habituados ao campeonato, que conheciam bem as corridas. Eu era o novato. Ter ganho fez os patrocinadores olharem para mim de outra maneira. Como foi a adaptação a um evento mundial como o PWRC?

O Mundial de Produção está inserido no Mundial de Ralis, junto com os WRC, que são protótipos, muito resistentes e sofisticados. Nós andamos num “Grupo N”, um carro de série com algumas alterações. O certo é que nós passamos pelos mesmos sítios onde os outros passam e temos três dias de corrida. São provas muito longas e duras, onde este tipo de carro sofre muito. Temos de ter alguma sorte e conhecer bem as corridas, porque estamos a falar dos melhores pilotos do

Em 2008, planeava atacar o título mundial. O que correu mal?

No Campeonato do Mundo, acontecem tantos problemas… Um exemplo: em 2006, o campeão do mundo foi o Nasser Al-Attiyah e, em 2008, com o mesmo tipo de carro, no mesmo grupo, com os mesmos adversários, não conseguiu fazer um ponto sequer. Os resultados são muito voláteis. No grupo dos sete, oito primeiros, qualquer um pode ser campeão. Já tivemos muitos azares, mas estamos com cada vez mais experiência. A qualquer momento podemos ser campeões.

Dakar incluído?

Quem sabe? São provas que exigem outra experiência…

Exactamente. Lá não é a rapidez pura que faz a diferença. Conta a experiência, a equipa onde estamos inseridos. E muito espírito de sacrifício. Se essa hora chegar, teremos de ter outra postura na corrida. Qual é a receita para um bom piloto de ralis?

O rali é mais uma corrida de “sprint”, mais curta, portanto podemos ser muito mais explosivos no tempo que fazemos. Uma prova como o Dakar é mais de “endurance”. Mas, neste momento, ainda estou na fase do “sprint”, da explosão. Quem são os seus ídolos?

Aprendi que devo dizer que vou fazer o meu melhor, que vou trabalhar muito, e o resultado pode ser o primeiro, segundo, quarto, quinto ou o sexto lugar, não sei. Depende dos problemas que tivermos. Mas se me perguntar se tenho velocidade suficiente para ser campeão do mundo, respondo que sim.

O Ayrton Senna e, actualmente, o Sebastien Loeb, que está a fazer uma carreira fantástica no Campeonato do Mundo de Ralis. Contudo, na posição em que estou, comecei a avaliar o porquê de muitas coisas – nunca tirando o mérito a estas duas pessoas, o certo é que tiveram as equipas certas, estavam no sítio certo à hora certa. É preciso criar todo um conjunto de factores para que tudo corra bem.

Em termos de futuro, qual é o

Qual foi o pior momento da sua

É esse o objectivo para este ano?

seu grande objectivo?

Chegar a uma grande equipa oficial do Mundial de Ralis (WRC) e ser campeão mundial absoluto. E fora do rali, ambiciona brilhar em alguma outra disciplina do desporto automóvel?

Mais tarde, não digo não à passagem para o todo-o-terreno. Já lá fiz algumas participações. Quem

carreira?

Ainda não tive um pior momento na minha carreira. Estive sempre com as equipas certas, os patrocinadores certos, nos campeonatos de que mais gosto. Nunca tive nenhum acidente grave. Não posso apontar nada a não ser pequenas desistências. Tenho sido um privilegiado.

Já lhe aconteceu dar por si a conduzir em estrada como se estivesse em competição?

Não. Sou criticado pelos meus amigos por andar excessivamente devagar. Quando tinha 18-19 anos, claro que fiz as minhas «habilidades». Algumas bastante irresponsáveis, até. Mas, hoje em dia, a

minha postura é completamente oposta. A adrenalina de conduzir depressa é no sítio certo: nos ralis. Quando não está a treinar ou a competir, o que é que faz?

Estou com o meu filho, que tem um ano. É ele que me carrega as baterias – embora de noite mas descarregue muitas vezes. n

DREAM TEAM TMN Armindo Araújo, patrocinado pela tmn desde 2007, integra a Dream Team TMN, uma sólida equipa de jovens e promissores atletas portugueses com provas dadas a nível internacional: Bernardo Sousa e Álvaro Parente, no automobilismo; Michelle Larcher de Brito, no ténis; Tiago Pires, no surf; Francisco Lobato, na vela; e Hélder Rodrigues e Ruben Faria, no todo-o-terreno.

2009

“TIVE A PRIMEIRA MOTA AOS SEIS ANOS. DESDE MIÚDO QUE GOSTAVA DE MOTAS, AUTOMÓVEIS, BICICLETAS. NA MESMA ALTURA, APRENDI A CONDUZIR NO CARRO DA MINHA AVÓ.”

sabe se, depois dos ralis, não haverão umas participações ou uma permanência no campeonato de todo-o-terreno?

AGOSTO, SETEMBRO

CEDO SE APRENDE O OFÍCIO

mundo. Temos feito boas corridas, mas, por algum motivo, as coisas não têm corrido como queríamos. Temos rodado dentro dos cinco primeiros lugares e fazemos parte do lote de potenciais vencedores. Estamos a lutar por um lugar na frente do Campeonato do Mundo. A nossa hora vai chegar.

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directo I automobilismo I

Aprendeu primeiro a andar de mota ou a conduzir um carro?

Penso que foi de mota. Tive a primeira [uma Graziella, mini-mota italiana de inícios dos anos 70] aos seis anos. Desde miúdo que gostava de motas, automóveis, bicicletas. Na mesma altura, aprendi a conduzir no carro da minha avó. E o primeiro carro, foi com que idade?

Aos 14 anos. Eu e um amigo comprámos um a meias para fazer umas brincadeiras. Ainda me lembro: era um Mini preto. Já não o tenho, infelizmente. Acho que foi destruído numa das nossas brincadeiras. O que lhe passa pela cabeça quando está quase a começar uma prova?

Com os anos, o nervosismo vai passando. Agora, acima de tudo, temos uma enorme responsabilidade. Temos de nos concentrar. O meu pensamento é conseguir uma boa afinação do carro e dialogar ao máximo com o meu engenheiro para termos um carro o mais “performante” possível. Tem alguma superstição antes de entrar em prova?

Costumo dizer que a minha grande superstição é não ser supersticioso. Nunca quis estar agarrado a nada que, num dia que eu não tivesse esse amuleto ou não fizesse esse determinado ritual, me pusesse a pensar: «não fiz aquilo!»… O que poderia pôr muita coisa em causa. Está com o Miguel Ramalho desde

AGOSTO, SETEMBRO

2009

2001. Não será para dar sorte…

14

O Miguel Ramalho é um navegador muito profissional. Já tinha muita experiência quando começou comigo. No primeiro ano, corri com um amigo de escola. Mas depois, por afazeres profissionais,

1977. Armindo José Salgado da Silva Araújo nasceu, no Porto, a 1 de Setembro. Cedo demonstrou grande interesse pelos desportos motorizados. Aos 6 anos, recebe uma mini-mota de presente e aprende rapidamente a conduzir no Mercedes da avó. Aos 14, compra o seu primeiro carro, a meias com um amigo: um Mini. 1995. Torna-se vice-campeão nacional de motociclismo, na classe 50cc. No ano seguinte, termina em terceiro lugar na Classe Júnior Consagrados, em 125cc. Em 1999, vence o Troféu KTM 250cc. 2000. Depois de assistir ao Rali de Santo Tirso, decide aventurar-se no mundo dos ralis. Estreia-se na prova seguinte, em Fafe, com um segundo lugar. Termina a temporada com cinco vitórias, dois segundos lugares e o título de campeão nacional de Promoção. 2001. Vence o Troféu Citröen Saxo, com quatro vitórias em seis provas. É convidado para a equipa oficial da Citröen. Em 2002, sagra-se campeão nacional de ralis na classe F3 e, nos anos seguintes, torna-se tetra-campeão nacional absoluto de ralis (2003, 2004, 2005 e 2006). Em 2005, passa a ser piloto oficial da Mitsubishi.

SEGUIR EM FRENTE

“SOU APOIADO PELAS MELHORES EMPRESAS NACIONAIS. É SINAL DE RECONHECIMENTO. TODOS OS ELEMENTOS ESTÃO REUNIDOS PARA EU CONTINUAR A CORRER SEM PENSAR SEQUER EM PARAR.”


directo I automobilismo I

Aprendeu primeiro a andar de mota ou a conduzir um carro?

Penso que foi de mota. Tive a primeira [uma Graziella, mini-mota italiana de inícios dos anos 70] aos seis anos. Desde miúdo que gostava de motas, automóveis, bicicletas. Na mesma altura, aprendi a conduzir no carro da minha avó. E o primeiro carro, foi com que idade?

Aos 14 anos. Eu e um amigo comprámos um a meias para fazer umas brincadeiras. Ainda me lembro: era um Mini preto. Já não o tenho, infelizmente. Acho que foi destruído numa das nossas brincadeiras. O que lhe passa pela cabeça quando está quase a começar uma prova?

Com os anos, o nervosismo vai passando. Agora, acima de tudo, temos uma enorme responsabilidade. Temos de nos concentrar. O meu pensamento é conseguir uma boa afinação do carro e dialogar ao máximo com o meu engenheiro para termos um carro o mais “performante” possível. Tem alguma superstição antes de entrar em prova?

Costumo dizer que a minha grande superstição é não ser supersticioso. Nunca quis estar agarrado a nada que, num dia que eu não tivesse esse amuleto ou não fizesse esse determinado ritual, me pusesse a pensar: «não fiz aquilo!»… O que poderia pôr muita coisa em causa. Está com o Miguel Ramalho desde

AGOSTO, SETEMBRO

2009

2001. Não será para dar sorte…

14

O Miguel Ramalho é um navegador muito profissional. Já tinha muita experiência quando começou comigo. No primeiro ano, corri com um amigo de escola. Mas depois, por afazeres profissionais,

1977. Armindo José Salgado da Silva Araújo nasceu, no Porto, a 1 de Setembro. Cedo demonstrou grande interesse pelos desportos motorizados. Aos 6 anos, recebe uma mini-mota de presente e aprende rapidamente a conduzir no Mercedes da avó. Aos 14, compra o seu primeiro carro, a meias com um amigo: um Mini. 1995. Torna-se vice-campeão nacional de motociclismo, na classe 50cc. No ano seguinte, termina em terceiro lugar na Classe Júnior Consagrados, em 125cc. Em 1999, vence o Troféu KTM 250cc. 2000. Depois de assistir ao Rali de Santo Tirso, decide aventurar-se no mundo dos ralis. Estreia-se na prova seguinte, em Fafe, com um segundo lugar. Termina a temporada com cinco vitórias, dois segundos lugares e o título de campeão nacional de Promoção. 2001. Vence o Troféu Citröen Saxo, com quatro vitórias em seis provas. É convidado para a equipa oficial da Citröen. Em 2002, sagra-se campeão nacional de ralis na classe F3 e, nos anos seguintes, torna-se tetra-campeão nacional absoluto de ralis (2003, 2004, 2005 e 2006). Em 2005, passa a ser piloto oficial da Mitsubishi.

SEGUIR EM FRENTE

“SOU APOIADO PELAS MELHORES EMPRESAS NACIONAIS. É SINAL DE RECONHECIMENTO. TODOS OS ELEMENTOS ESTÃO REUNIDOS PARA EU CONTINUAR A CORRER SEM PENSAR SEQUER EM PARAR.”


OBJECTIVO FUTURO

“CHEGAR A UMA GRANDE EQUIPA OFICIAL DO MUNDIAL DE RALIS (WRC) E SER CAMPEÃO MUNDIAL ABSOLUTO.”

directo I automobilismo I

ele decidiu parar com esta aventura. Optei por contratar um navegador bem rodado no campeonato nacional. Foi quando conheci o Miguel. Entretanto, construímos uma grande amizade. Espero acabar a minha carreira com ele. Antes de ser piloto profissional, o que é que fazia?

Frequentava o curso de Relações Internacionais, na Universidade Lusíada do Porto, e ajudava os meus pais nas empresas [na área dos têxteis]. No momento em que entrei para uma equipa oficial, vi que tinha de tomar opções e decidi que a prioridade seria os automóveis. Embora eu acompanhe os negócios das empresas, não ocupo cargos de responsabilidade para estar totalmente focado nas minhas corridas, nos meus patrocinadores.

Vê esse negócio de família como uma possibilidade para o final da carreira?

Neste momento, não penso muito no assunto. Mas, no dia em que deixar de correr, será uma forte opção. Até que idade pensa competir?

Enquanto me sentir motivado e com vontade, e enquanto achar que posso dar resultados a quem investe em mim. Em segundo lugar, enquanto tiver apoios e as pessoas acreditarem no meu valor. Sou apoiado pelas melhores empresas nacionais (entre elas, a tmn) e por uma marca. É sinal de reconhecimento, de que estou a trabalhar bem. Todos os elementos estão reunidos para eu continuar a correr sem pensar sequer em parar. Ainda se lembra da sua estreia na competição automóvel?

Lembro-me perfeitamente. Foi no

Rali de Fafe, num carro bastante antigo, alugado a uma pessoa amiga. Cheguei ao último troço empatado à milésima com o piloto que acabou por ganhar. Uma pessoa minha amiga estava tão preocupada que eu tivesse um acidente que, à entrada do último troço, me disse: «Estás em quarto lugar, a 20 e tal segundos do terceiro, e o que está atrás de ti está a 30 e tal segundos, portanto agora é só levar o carro até ao fim». E eu disse ao navegador: «Podemos ir sem notas, já não é preciso atacar». E chegámos ao fim. Perdi o rali por dois ou três segundos. Podia ter vencido. Mas compreendo a posição das pessoas que estavam comigo, porque realmente não tinha apoios. Era mesmo uma aventura. Foi uma experiência fantástica.

2007. Depois de ganhar tudo o que havia para ganhar em competições portuguesas, parte para as provas internacionais, mantendo-se como piloto da Mitsubishi. Estreia-se no Campeonato Mundial de Ralis, classe Produção, com um quarto lugar no gélido Rali da Suécia, dando logo nas vistas como o «melhor piloto não-nórdico». Termina a época na 14ª posição.

2008 Alcança, na sua segunda época no PWRC, o primeiro pódio, com um terceiro lugar no Rali da Acrópole, na Grécia – uma das suas provas favoritas. Termina a temporada no oitavo posto.

18

2009

a temporada com um quarto lugar no trabalhoso Rali da Noruega, alcança um segundo lugar no Rali do Chipre e conquista o seu primeiro triunfo no PWRC no Rali de Portugal. Com isto, atinge o meio da época no topo da classificação geral. Termina as duas provas seguintes (Itália e Grécia) em 3º lugar, caindo para o segundo lugar da tabela, a apenas quatro pontos do líder. A decisão fica adiada para a última prova da temporada, o Rali do País de Gales, disputada entre 23 e 25 de Outubro. Se vencer, será o segundo piloto português a triunfar no PWRC – o primeiro foi Rui Madeira, em 1995.

AGOSTO, SETEMBRO

AGOSTO, SETEMBRO

2009

2009. Depois de começar

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OBJECTIVO FUTURO

“CHEGAR A UMA GRANDE EQUIPA OFICIAL DO MUNDIAL DE RALIS (WRC) E SER CAMPEÃO MUNDIAL ABSOLUTO.”

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ele decidiu parar com esta aventura. Optei por contratar um navegador bem rodado no campeonato nacional. Foi quando conheci o Miguel. Entretanto, construímos uma grande amizade. Espero acabar a minha carreira com ele. Antes de ser piloto profissional, o que é que fazia?

Frequentava o curso de Relações Internacionais, na Universidade Lusíada do Porto, e ajudava os meus pais nas empresas [na área dos têxteis]. No momento em que entrei para uma equipa oficial, vi que tinha de tomar opções e decidi que a prioridade seria os automóveis. Embora eu acompanhe os negócios das empresas, não ocupo cargos de responsabilidade para estar totalmente focado nas minhas corridas, nos meus patrocinadores.

Vê esse negócio de família como uma possibilidade para o final da carreira?

Neste momento, não penso muito no assunto. Mas, no dia em que deixar de correr, será uma forte opção. Até que idade pensa competir?

Enquanto me sentir motivado e com vontade, e enquanto achar que posso dar resultados a quem investe em mim. Em segundo lugar, enquanto tiver apoios e as pessoas acreditarem no meu valor. Sou apoiado pelas melhores empresas nacionais (entre elas, a tmn) e por uma marca. É sinal de reconhecimento, de que estou a trabalhar bem. Todos os elementos estão reunidos para eu continuar a correr sem pensar sequer em parar. Ainda se lembra da sua estreia na competição automóvel?

Lembro-me perfeitamente. Foi no

Rali de Fafe, num carro bastante antigo, alugado a uma pessoa amiga. Cheguei ao último troço empatado à milésima com o piloto que acabou por ganhar. Uma pessoa minha amiga estava tão preocupada que eu tivesse um acidente que, à entrada do último troço, me disse: «Estás em quarto lugar, a 20 e tal segundos do terceiro, e o que está atrás de ti está a 30 e tal segundos, portanto agora é só levar o carro até ao fim». E eu disse ao navegador: «Podemos ir sem notas, já não é preciso atacar». E chegámos ao fim. Perdi o rali por dois ou três segundos. Podia ter vencido. Mas compreendo a posição das pessoas que estavam comigo, porque realmente não tinha apoios. Era mesmo uma aventura. Foi uma experiência fantástica.

2007. Depois de ganhar tudo o que havia para ganhar em competições portuguesas, parte para as provas internacionais, mantendo-se como piloto da Mitsubishi. Estreia-se no Campeonato Mundial de Ralis, classe Produção, com um quarto lugar no gélido Rali da Suécia, dando logo nas vistas como o «melhor piloto não-nórdico». Termina a época na 14ª posição.

2008 Alcança, na sua segunda época no PWRC, o primeiro pódio, com um terceiro lugar no Rali da Acrópole, na Grécia – uma das suas provas favoritas. Termina a temporada no oitavo posto.

18

2009

a temporada com um quarto lugar no trabalhoso Rali da Noruega, alcança um segundo lugar no Rali do Chipre e conquista o seu primeiro triunfo no PWRC no Rali de Portugal. Com isto, atinge o meio da época no topo da classificação geral. Termina as duas provas seguintes (Itália e Grécia) em 3º lugar, caindo para o segundo lugar da tabela, a apenas quatro pontos do líder. A decisão fica adiada para a última prova da temporada, o Rali do País de Gales, disputada entre 23 e 25 de Outubro. Se vencer, será o segundo piloto português a triunfar no PWRC – o primeiro foi Rui Madeira, em 1995.

AGOSTO, SETEMBRO

AGOSTO, SETEMBRO

2009

2009. Depois de começar

19


acontecimento

I sudoeste tmn I

FESTIVAL

SW TMN TEXTO JOテグ MESTRE

26

FOTOGRAFIA RICARDO BENTO

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

2007

Quatro dias, cinco palcos e 140 mil espectadores depois: memテウria de um Sudoeste que bateu todos os recordes.

2007

O ANO DA MAIORIDADE

27

THE NATIONAL


acontecimento

I sudoeste tmn I

FESTIVAL

SW TMN TEXTO JOテグ MESTRE

26

FOTOGRAFIA RICARDO BENTO

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

2007

Quatro dias, cinco palcos e 140 mil espectadores depois: memテウria de um Sudoeste que bateu todos os recordes.

2007

O ANO DA MAIORIDADE

27

THE NATIONAL


MÚSICA, EXPERIÊNCIAS E MUITO MAIS.

28

DATA ROCK

JAMES

2007

SOLDIERS OF JAH ARMY

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

2007

DEZ ANOS é já uma idade considerável. Não será de todo arriscado dizer que o Sudoeste atingiu a maturidade enquanto evento, tornando-se numa das paragens obrigatórias do calendário estival português. Já lá vai uma década desde aqueles inéditos dias de Agosto em que uma herdade alentejana se transformava num “Woodstock” à portuguesa e recebia, entre outros, Marilyn Manson, Blur e Suede. Nesta que foi a sua décima primeira edição, o festival não necessitou de recorrer a nomes tão sonantes nem a artistas tão “mainstreamers” como noutros anos para garantir uma esmagadora adesão em termos de público. Talvez seja pela mística, talvez pelo ambiente, mas a verdade é que, apesar do seco calor alentejano e das nuvens de pó que são já uma imagem de marca do evento, a afluência de público foi mais que muita, situando-se na ordem dos 35 mil espectadores diários. Na soma dos quatro dias, a Herdade da Casa Branca registou 140 mil entradas, mais 30 mil que em 2006 e um recorde absoluto. Este foi, possivelmente, o Sudoeste com mais «tá-se bem» por metro quadrado – o reggae foi rei e senhor no cartaz dos quatro dias, não só pela presença do «príncipe» Damien Marley (que, a par de Manu Chao, polarizou as atenções do primeiro dia) no recinto principal, mas também pelo palco Positive Vibes, especializado em «servir» copiosas doses do descontraído – mas não destituído – género musical. Porventura, terá sido essa dominante «boa onda» que motivou uma maior afluência de famílias, o que traduz uma certa desmistificação da carga de hedonismo desregrado frequentemente associada aos festivais de Verão. A lusofonia foi outra das grandes apostas do cartaz deste ano – praticamente metade das sete dezenas de actuações tiveram como língua franca o português. Vindo, não só de Portugal, mas também de Cabo Verde, de Angola e do Brasil. Entre outros, estiveram ao (bom) serviço da língua de Camões Sérgio Godinho, Sam The Kid e Gilberto Gil, todos eles senhores de actuações irrepreensíveis.

29 SAM THE KID (TOPO) BURAKA SOM SISTEMA (CENTRO) RAZORLIGHT (DESTAQUE)


MÚSICA, EXPERIÊNCIAS E MUITO MAIS.

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DATA ROCK

JAMES

2007

SOLDIERS OF JAH ARMY

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

2007

DEZ ANOS é já uma idade considerável. Não será de todo arriscado dizer que o Sudoeste atingiu a maturidade enquanto evento, tornando-se numa das paragens obrigatórias do calendário estival português. Já lá vai uma década desde aqueles inéditos dias de Agosto em que uma herdade alentejana se transformava num “Woodstock” à portuguesa e recebia, entre outros, Marilyn Manson, Blur e Suede. Nesta que foi a sua décima primeira edição, o festival não necessitou de recorrer a nomes tão sonantes nem a artistas tão “mainstreamers” como noutros anos para garantir uma esmagadora adesão em termos de público. Talvez seja pela mística, talvez pelo ambiente, mas a verdade é que, apesar do seco calor alentejano e das nuvens de pó que são já uma imagem de marca do evento, a afluência de público foi mais que muita, situando-se na ordem dos 35 mil espectadores diários. Na soma dos quatro dias, a Herdade da Casa Branca registou 140 mil entradas, mais 30 mil que em 2006 e um recorde absoluto. Este foi, possivelmente, o Sudoeste com mais «tá-se bem» por metro quadrado – o reggae foi rei e senhor no cartaz dos quatro dias, não só pela presença do «príncipe» Damien Marley (que, a par de Manu Chao, polarizou as atenções do primeiro dia) no recinto principal, mas também pelo palco Positive Vibes, especializado em «servir» copiosas doses do descontraído – mas não destituído – género musical. Porventura, terá sido essa dominante «boa onda» que motivou uma maior afluência de famílias, o que traduz uma certa desmistificação da carga de hedonismo desregrado frequentemente associada aos festivais de Verão. A lusofonia foi outra das grandes apostas do cartaz deste ano – praticamente metade das sete dezenas de actuações tiveram como língua franca o português. Vindo, não só de Portugal, mas também de Cabo Verde, de Angola e do Brasil. Entre outros, estiveram ao (bom) serviço da língua de Camões Sérgio Godinho, Sam The Kid e Gilberto Gil, todos eles senhores de actuações irrepreensíveis.

29 SAM THE KID (TOPO) BURAKA SOM SISTEMA (CENTRO) RAZORLIGHT (DESTAQUE)


acontecimento I sudoeste tmn I

30

o ponto de vista), são só alguns exemplos. Mas a «barraquinha» mais concorrida desta «feira popular» foi, sem dúvida, o “bungee cart”. Fosse a que horas fosse, o stand patrocinado pela TMN era atacado por intermináveis filas de corajosos que ansiavam pela experiência de cair a uma altura de 50 metros dentro de um Smart (suspenso por elásticos, claro). A dada altura, quase que era esquecida a elementar razão de se estar naquele sítio, àquelas horas: a música, que, todos os anos, transforma a pacata Zambujeira do Mar em capital do país por quatro dias. E a vontade de viver o maior festival de Verão em solo nacional, que, no ano em que assinalou o seu décimo aniversário, atingiu a maioridade, afirmando-se como uma marca de referência do Verão português.

UM CARTAZ DIFERENTE

NESTA QUE FOI A SUA DÉCIMA PRIMEIRA EDIÇÃO, O FESTIVAL NÃO NECESSITOU DE RECORRER A NOMES TÃO SONANTES NEM A ARTISTAS TÃO “MAINSTREAMERS” COMO NOUTROS ANOS PARA GARANTIR UMA ESMAGADORA ADESÃO EM TERMOS DE PÚBLICO.

2007

Para além dos cinco espaços musicais, todos com propósitos diferentes – o Palco TMN, com os nomes mais sonantes; o Planeta Sudoeste, com os mais alternativos; o Positive Vibes, dedicado ao reggae; a Tenda Parariso, voltada para a comédia e as artes performativas; e a Music Box, dada à dance music – a atenção do público era também disputada por um sem-número de atracções paralelas. É tendência corrente transformar estes eventos em verdadeiros parques temáticos e o Sudoeste não poupou esforços no que respeita a manter entretidos os festivaleiros: o serviço de duches em jeito de linha de lavagem de automóveis, as corridas de comboios a pedais, as massagens à borla e os duelos de percussão (ou algazarras de batucada, conforme

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

2007

A MÍSTICA, O AMBIENTE, O «TÁ-SE BEM».

31


acontecimento I sudoeste tmn I

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o ponto de vista), são só alguns exemplos. Mas a «barraquinha» mais concorrida desta «feira popular» foi, sem dúvida, o “bungee cart”. Fosse a que horas fosse, o stand patrocinado pela TMN era atacado por intermináveis filas de corajosos que ansiavam pela experiência de cair a uma altura de 50 metros dentro de um Smart (suspenso por elásticos, claro). A dada altura, quase que era esquecida a elementar razão de se estar naquele sítio, àquelas horas: a música, que, todos os anos, transforma a pacata Zambujeira do Mar em capital do país por quatro dias. E a vontade de viver o maior festival de Verão em solo nacional, que, no ano em que assinalou o seu décimo aniversário, atingiu a maioridade, afirmando-se como uma marca de referência do Verão português.

UM CARTAZ DIFERENTE

NESTA QUE FOI A SUA DÉCIMA PRIMEIRA EDIÇÃO, O FESTIVAL NÃO NECESSITOU DE RECORRER A NOMES TÃO SONANTES NEM A ARTISTAS TÃO “MAINSTREAMERS” COMO NOUTROS ANOS PARA GARANTIR UMA ESMAGADORA ADESÃO EM TERMOS DE PÚBLICO.

2007

Para além dos cinco espaços musicais, todos com propósitos diferentes – o Palco TMN, com os nomes mais sonantes; o Planeta Sudoeste, com os mais alternativos; o Positive Vibes, dedicado ao reggae; a Tenda Parariso, voltada para a comédia e as artes performativas; e a Music Box, dada à dance music – a atenção do público era também disputada por um sem-número de atracções paralelas. É tendência corrente transformar estes eventos em verdadeiros parques temáticos e o Sudoeste não poupou esforços no que respeita a manter entretidos os festivaleiros: o serviço de duches em jeito de linha de lavagem de automóveis, as corridas de comboios a pedais, as massagens à borla e os duelos de percussão (ou algazarras de batucada, conforme

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

2007

A MÍSTICA, O AMBIENTE, O «TÁ-SE BEM».

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acontecimento I sudoeste tmn I

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

2007

SUDOESTE EM NÚMEROS

32

Ao longo destes 10 anos, passaram pelo Sudoeste mais de 300 artistas e DJ’s. Presentes em 5 edições, os Da Weasel são a banda que mais vezes pisou este palco. Os Placebo, que o fizeram 3 vezes, são a banda internacional mais assídua. Tudo isto se não se contar com o DJ Rui Vargas, que deu música aos festivaleiros em todas as (11) edições. Ao todo, o evento chamou à Zambujeira do Mar 1,2 milhões de pessoas – em média, 110.00 entradas por ano. 2007 foi o ano de maior afluência, com cerca de 150.000 pessoas – 18% delas (isto é: 25.000) proveniente de Espanha. E, segundo as autoridades locais, tem um impacto de 10 milhões de euros na economia do concelho de Odemira (fonte: DN). Os bilhetes, que em 1997 custavam 6000 escudos (cerca de 30 €), custam agora 70 € (com oferta de idêntico valor em chamadas TMN).

úti l

UMA MARCA DE REFERÊNCIA DO VERÃO.

Ponha as músicas do Sudoeste tmn a tocar no seu telemóvel. Toques reais, “waiting rings” e mp3 de Buraka Som Sistema, Cypress Hill, Damian Marley, Groove Armada, I’m From Barcelona, Phoenix, Sam The Kid, Sérgio Godinho, Vanessa da Mata e WrayGunn, entre outros, disponíveis em www.tmn.pt.


acontecimento I sudoeste tmn I

NOVE MBRO , DE ZE MBRO

2007

SUDOESTE EM NÚMEROS

32

Ao longo destes 10 anos, passaram pelo Sudoeste mais de 300 artistas e DJ’s. Presentes em 5 edições, os Da Weasel são a banda que mais vezes pisou este palco. Os Placebo, que o fizeram 3 vezes, são a banda internacional mais assídua. Tudo isto se não se contar com o DJ Rui Vargas, que deu música aos festivaleiros em todas as (11) edições. Ao todo, o evento chamou à Zambujeira do Mar 1,2 milhões de pessoas – em média, 110.00 entradas por ano. 2007 foi o ano de maior afluência, com cerca de 150.000 pessoas – 18% delas (isto é: 25.000) proveniente de Espanha. E, segundo as autoridades locais, tem um impacto de 10 milhões de euros na economia do concelho de Odemira (fonte: DN). Os bilhetes, que em 1997 custavam 6000 escudos (cerca de 30 €), custam agora 70 € (com oferta de idêntico valor em chamadas TMN).

úti l

UMA MARCA DE REFERÊNCIA DO VERÃO.

Ponha as músicas do Sudoeste tmn a tocar no seu telemóvel. Toques reais, “waiting rings” e mp3 de Buraka Som Sistema, Cypress Hill, Damian Marley, Groove Armada, I’m From Barcelona, Phoenix, Sam The Kid, Sérgio Godinho, Vanessa da Mata e WrayGunn, entre outros, disponíveis em www.tmn.pt.


I música I

AGOSTO , OUTUBRO

28

«O meu plano é tornar-me o maior artista desta geração», garante o “rapper” que, a 5 de agosto, sobe ao palco do Sudoeste tmn. Polémico, arrogante,

diligente. Será este o futuro rei da pop?

KANYE WEST DE OLHO NO TRONO TEXTO JOÃO MESTRE

2011

2011

Mais de doze milhões de discos vendidos, 14 “Grammy Awards” na prateleira e quatro álbuns entre os 100 melhores da primeira década do século XXI, segundo a “Rolling Stone”.

AGOSTO , OUTUBRO

retrato

29

© CORBIS OUTLINE / VMI


I música I

AGOSTO , OUTUBRO

28

«O meu plano é tornar-me o maior artista desta geração», garante o “rapper” que, a 5 de agosto, sobe ao palco do Sudoeste tmn. Polémico, arrogante,

diligente. Será este o futuro rei da pop?

KANYE WEST DE OLHO NO TRONO TEXTO JOÃO MESTRE

2011

2011

Mais de doze milhões de discos vendidos, 14 “Grammy Awards” na prateleira e quatro álbuns entre os 100 melhores da primeira década do século XXI, segundo a “Rolling Stone”.

AGOSTO , OUTUBRO

retrato

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© CORBIS OUTLINE / VMI


retrato I música I

O DISCO DE ESTREIA ‘THE COLLEGE DROPOUT’ FOI CONSIDERADO “O ÁLBUM DE RAP MAIS IMPORTANTE DO NOVO SÉCULO” PELA ‘TIME’.

AGOSTO , OUTUBRO

2011

A

notícia caiu como uma bomba. Em julho de 2009, um mês após a morte de Michael Jackson, o “website” de entretenimento AceShowbizz.com jurava a pés juntos que Kanye West queria ser o novo rei da pop, atribuindo-lhe frases como «É muito triste ele ter partido, mas abre-se o caminho para um novo rei da pop e estou interessado em ficar com o lugar.» Ou «Primeiro foi o Elvis, depois o Michael, e agora, no século XXI, é altura de ser o Kanye a reinar.» Era tudo mentira, afinal. Desmentida pelo próprio numa mensagem publicada em maiúsculas no seu blogue: «Sinto-me mal por ter feito as pessoas acreditarem que eu seria capaz de dizer algo tão despropositado. Assusta-me pensar em que mais irão acreditar.» A verdade é que ninguém ficou (demasiado) boquiaberto com as alegadas declarações. Afinal, estamos perante o artista que se comparou a Picasso, aos Beatles e a Marvin Gaye, e que em 2004 abandonou a cerimónia dos

American Music Awards, após perder o prémio de “Artista Revelação” para a cantora de “country” Gretchen Wilson. «Fui, sem dúvida, roubado. Fui o melhor novo artista deste ano.» Ou que afirmou, numa conferência de imprensa em Singapura, «Sempre que atuo penso: o meu plano é tornar-me o maior artista desta geração». Há uma linha ténue entre a arrogância pura e simples e a arrogância de quem sabe. E Kanye West tem a lição bem estudada – prova disso está em cada disco que lança (e são já cinco em nome próprio, com o sexto prometido para breve), invariavelmente elogiado pela crítica e bem-sucedido nas tabelas de vendas. Enquanto não chega o novo álbum (nem o aguardado “Watch the Throne”, registo a duas vozes, com Jay-Z), Kanye faz-se representar nos “tops” com “My Beautiful Dark Twisted Fantasy”, lançado em novembro de 2010 e já certificado com platina por vendas superiores a um milhão de cópias nos Estados Unidos. É certo que ainda tem um longo caminho a percorrer até alcançar os números de “Late Registration” (2005), galardoado com tripla platina. No entanto, segundo o “website” MetaCritic.com (que

compila a opinião dos críticos de referência e faz a média das classificações numa escala de zero a 100), “…Twisted Fantasy” mereceu a pontuação mais alta da sua discografia, com uma média de 94. Nos habituais balanços de fim de ano, foi considerado o melhor disco de 2010 por nada menos do que 22 publicações de referência – um primeiro lugar absoluto, uns furos acima das nove citações de “The Suburbs”, dos Arcade Fire –, incluindo revistas como a “Rolling Stone”, a “Billboard” ou a “Time”, que já lhe havia dado honras de capa sob o título «O homem mais inteligente da música pop» e o incluiu no lote das personalidades mais influentes de 2005 e 2010. Não foi só pelos seus doze milhões de álbuns vendidos. Quando abre a boca, West tem uma vasta audiência a ouvi-lo. Seja quando apela ao boicote à indústria de diamantes, quando se mobiliza contra a discriminação de homossexuais no hip-hop ou quando, na ressaca da devastação do furacão Katrina, aponta o dedo a George W. Bush pela tardia resposta das autoridades, afirmando, em direto e perante milhões de telespectadores, que o então presidente «não quer saber dos negros». Anos mais tarde,

Bush revelou que o episódio foi um dos «momentos mais revoltantes» da sua presidência. É esse o poder de Kanye West. (pronuncia-se “Ká-ni-ei”) Omari West nasceu em Atlanta, numa família de classe média, filho do fotógrafo Ray West, ex-partidário do movimento Panteras Negras, e Donda West, professora universitária. Aos 3 anos, os pais divorciaram-se e a mãe leva-o para Chicago. Frequenta boas escolas, em permanente contacto com as artes plásticas e a música. Aos 10, vive um ano na China, quando a sua mãe é convidada para lecionar na Universidade de Nanjing. Os verões, esses eram passados com o pai, que recorda como «os outros miúdos troçavam de Kanye, chamavam-lhe “China boy”». Nos anos de liceu, acrescenta a “Rolling Stone”, era gozado por usar aparelho e por ter «dentes do tamanho de chicletes». Em entrevista à “Time Out London”, Kanye recorda a infância de forma «ligeiramente» diferente: «Sempre fui seguido pelos outros miúdos, desde o infantário. A professora dizia que eu era um líder nato.» Cedo se apaixonou pelo hip-hop e pelo imaginário de rebeldia que o género musical privilegia. Queria ser “rapper” e produtor. Os pais fizeram o seu papel: convenceram-no antes a prosseguir os estudos e ir para a universidade. Frequentou ainda um ano do curso de inglês, mas não ficou freguês. Convenceu a mãe de que não precisava de estudar mais – afinal, dizia, tinha vivido toda a sua vida com uma professora. Iria experimentar o seu sonho durante um ano e depois logo se veria. Para pagar a sua parte da renda (uma das condições KANYE

útil > A 5 de agosto, dia em que sobem aos diversos palcos do Sudoeste tmn Clã, dEUS, Marcelo Camelo e Patrice, entre outros, todas as atenções se centram no espetáculo de Kanye West, uma megaprodução que promete deixar muita gente de boca aberta, tal como aconteceu no festival californiano de Coachella. «Foi muito difícil trazê-lo mas conseguimos. Acho que a partir de agora se vai passar a chamar Kanye Sudoeste», explica o promotor do evento, Luís Montez, em tom de brincadeira. > Ponha o Kanye West a cantar no seu telemóvel. Envie SMS para o 12700 com o código 18444 para ter “Runaway” como “waiting ring” (preço: €1,60, com subscrição mensal de €0,99).

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D.R.


retrato I música I

O DISCO DE ESTREIA ‘THE COLLEGE DROPOUT’ FOI CONSIDERADO “O ÁLBUM DE RAP MAIS IMPORTANTE DO NOVO SÉCULO” PELA ‘TIME’.

AGOSTO , OUTUBRO

2011

A

notícia caiu como uma bomba. Em julho de 2009, um mês após a morte de Michael Jackson, o “website” de entretenimento AceShowbizz.com jurava a pés juntos que Kanye West queria ser o novo rei da pop, atribuindo-lhe frases como «É muito triste ele ter partido, mas abre-se o caminho para um novo rei da pop e estou interessado em ficar com o lugar.» Ou «Primeiro foi o Elvis, depois o Michael, e agora, no século XXI, é altura de ser o Kanye a reinar.» Era tudo mentira, afinal. Desmentida pelo próprio numa mensagem publicada em maiúsculas no seu blogue: «Sinto-me mal por ter feito as pessoas acreditarem que eu seria capaz de dizer algo tão despropositado. Assusta-me pensar em que mais irão acreditar.» A verdade é que ninguém ficou (demasiado) boquiaberto com as alegadas declarações. Afinal, estamos perante o artista que se comparou a Picasso, aos Beatles e a Marvin Gaye, e que em 2004 abandonou a cerimónia dos

American Music Awards, após perder o prémio de “Artista Revelação” para a cantora de “country” Gretchen Wilson. «Fui, sem dúvida, roubado. Fui o melhor novo artista deste ano.» Ou que afirmou, numa conferência de imprensa em Singapura, «Sempre que atuo penso: o meu plano é tornar-me o maior artista desta geração». Há uma linha ténue entre a arrogância pura e simples e a arrogância de quem sabe. E Kanye West tem a lição bem estudada – prova disso está em cada disco que lança (e são já cinco em nome próprio, com o sexto prometido para breve), invariavelmente elogiado pela crítica e bem-sucedido nas tabelas de vendas. Enquanto não chega o novo álbum (nem o aguardado “Watch the Throne”, registo a duas vozes, com Jay-Z), Kanye faz-se representar nos “tops” com “My Beautiful Dark Twisted Fantasy”, lançado em novembro de 2010 e já certificado com platina por vendas superiores a um milhão de cópias nos Estados Unidos. É certo que ainda tem um longo caminho a percorrer até alcançar os números de “Late Registration” (2005), galardoado com tripla platina. No entanto, segundo o “website” MetaCritic.com (que

compila a opinião dos críticos de referência e faz a média das classificações numa escala de zero a 100), “…Twisted Fantasy” mereceu a pontuação mais alta da sua discografia, com uma média de 94. Nos habituais balanços de fim de ano, foi considerado o melhor disco de 2010 por nada menos do que 22 publicações de referência – um primeiro lugar absoluto, uns furos acima das nove citações de “The Suburbs”, dos Arcade Fire –, incluindo revistas como a “Rolling Stone”, a “Billboard” ou a “Time”, que já lhe havia dado honras de capa sob o título «O homem mais inteligente da música pop» e o incluiu no lote das personalidades mais influentes de 2005 e 2010. Não foi só pelos seus doze milhões de álbuns vendidos. Quando abre a boca, West tem uma vasta audiência a ouvi-lo. Seja quando apela ao boicote à indústria de diamantes, quando se mobiliza contra a discriminação de homossexuais no hip-hop ou quando, na ressaca da devastação do furacão Katrina, aponta o dedo a George W. Bush pela tardia resposta das autoridades, afirmando, em direto e perante milhões de telespectadores, que o então presidente «não quer saber dos negros». Anos mais tarde,

Bush revelou que o episódio foi um dos «momentos mais revoltantes» da sua presidência. É esse o poder de Kanye West. (pronuncia-se “Ká-ni-ei”) Omari West nasceu em Atlanta, numa família de classe média, filho do fotógrafo Ray West, ex-partidário do movimento Panteras Negras, e Donda West, professora universitária. Aos 3 anos, os pais divorciaram-se e a mãe leva-o para Chicago. Frequenta boas escolas, em permanente contacto com as artes plásticas e a música. Aos 10, vive um ano na China, quando a sua mãe é convidada para lecionar na Universidade de Nanjing. Os verões, esses eram passados com o pai, que recorda como «os outros miúdos troçavam de Kanye, chamavam-lhe “China boy”». Nos anos de liceu, acrescenta a “Rolling Stone”, era gozado por usar aparelho e por ter «dentes do tamanho de chicletes». Em entrevista à “Time Out London”, Kanye recorda a infância de forma «ligeiramente» diferente: «Sempre fui seguido pelos outros miúdos, desde o infantário. A professora dizia que eu era um líder nato.» Cedo se apaixonou pelo hip-hop e pelo imaginário de rebeldia que o género musical privilegia. Queria ser “rapper” e produtor. Os pais fizeram o seu papel: convenceram-no antes a prosseguir os estudos e ir para a universidade. Frequentou ainda um ano do curso de inglês, mas não ficou freguês. Convenceu a mãe de que não precisava de estudar mais – afinal, dizia, tinha vivido toda a sua vida com uma professora. Iria experimentar o seu sonho durante um ano e depois logo se veria. Para pagar a sua parte da renda (uma das condições KANYE

útil > A 5 de agosto, dia em que sobem aos diversos palcos do Sudoeste tmn Clã, dEUS, Marcelo Camelo e Patrice, entre outros, todas as atenções se centram no espetáculo de Kanye West, uma megaprodução que promete deixar muita gente de boca aberta, tal como aconteceu no festival californiano de Coachella. «Foi muito difícil trazê-lo mas conseguimos. Acho que a partir de agora se vai passar a chamar Kanye Sudoeste», explica o promotor do evento, Luís Montez, em tom de brincadeira. > Ponha o Kanye West a cantar no seu telemóvel. Envie SMS para o 12700 com o código 18444 para ter “Runaway” como “waiting ring” (preço: €1,60, com subscrição mensal de €0,99).

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D.R.


1977. Nasce, a 8 de junho, em Atlanta. Aos 3 anos, após o divórcio dos pais, muda-se para Chicago com a mãe. Estudou em boas escolas, teve aulas de música e de artes plásticas e chegou a frequentar a universidade. Mas o apelo do hip-hop falou mais alto: aos 19 anos, desistiu do curso e dedicou-se à carreira de produtor.

KANYE IMPÔS-SE ATÉ NO MODO DE VESTIR, NUMA ALTURA DOMINADA PELO ‘LOOK’ DE GUETO. do acordo), arranjou emprego como operador de telemarketing. À noite, trabalhava a criar batidas para outros “rappers”. Não precisou de esperar muito até conseguir o primeiro biscate a sério, para o “MC” de Chicago Gravity, que lhe rendeu oito mil dólares. Estava no bom caminho. Produziu, depois, uma série considerável de nomes de segunda linha do hip-hop norte-americano, como Jermaine Dupri, Foxy Brown ou Goodie Mob, até que, com o virar do século, encontra a sua rampa de lançamento: a respeitada editora Roc-A-Fella, de Jay-Z, onde lhe é dada a oportunidade de ouro de produzir algumas das faixas de “Blueprint”, o novo álbum do seu «patrão», que acabaria por se tornar um ponto de viragem para ambos. Com a carreira de produtor lançada, virou-se para o desafio número dois: gravar o seu próprio disco. Primeiro tentou na casa que o conhecia. Não ficaram convencidos. Afinal, Kanye tinha ar de tudo menos de “rapper”. «Ele usava pólos cor-de-rosa com o colarinho levantado e “mocassins” Gucci», recorda Damon Dash, então CEO da editora. Isto numa altura em que o rap era, acima de tudo, música de rua, de gueto, e se vestia de calças largas, camisolas de basquete e sapatilhas do tamanho de cacilheiros. Bateu a outras portas, mas todas lhe foram fechadas na

AGOSTO , OUTUBRO

2011

2004. O seu ar pouco “street” não lhe facilita a vida quando envereda pela carreira de “rapper”. Após muitos nãos, consegue convencer a Roc-A-Fella. Em fevereiro, edita “The College Dropout”; dois meses depois, é disco de platina por vendas superiores a um milhão de cópias (em junho, chega à dupla platina). Vence dois “Grammies”.

cara. Por fim, a Roc-A-Fella lá pôs de lado o preconceito contra “rappers” «betinhos» e, embora a medo, apostou em Kanye. “The College Dropout” viu a luz do dia em fevereiro de 2004. Vendeu 441 mil cópias na primeira semana, estreando-se no segundo lugar da “Billboard”. Pôs o decano Darryl McDaniels (Run-DMC) e o ator-cantor Jamie Foxx de novo a ouvir hip-hop. Valeu-lhe nove nomeações e dois “Grammies”: “Melhor Álbum de Rap” e “Melhor Canção Rap” (“Jesus Walks”). A “Rolling Stone” atribuiu-lhe a décima posição no “ranking” dos melhores discos dos anos 2000. E a “Time” elegeu-o um dos 100 melhores de sempre, classificando-o como «o álbum de rap mais inteligente, engraçado e importante do novo século.» A partir daí, Kanye West «só» teve de manter a fasquia elevada. Em menos de uma década, os objetivos que traçara no início da carreira – «chegar a disco de ouro ou platina, ter canções universalmente respeitadas e alguma influência no panorama cultural, mudar a sonoridade da música e inspirar novos artistas a trilharem o seu próprio caminho» – foram todos cumpridos. «Se eu dissesse que não tinha já feito tudo isso, estaria a dar-vos aquela “tanga” da falsa modéstia hollywoodesca.» O que se segue? O céu costuma ser o limite. E o trono continua vago. n

2005. Lança “Late Registration”, que lhe vale um “Brit”, três “Grammies” e a tripla platina. Seguem-se “Graduation” (2007; três “Grammies”, dois “American Music Awards” e um “Brit”) e “808’s & Heartbreak” (2008; um “Brit”). Entre 2008 e 2010 recebe outros cinco “Grammies”, a título de colaborações. 2009. Kanye conquistou lugar cativo nas várias listas dos discos do ano desde a estreia. Em dezembro de 2009, a “Rolling Stone” incluiu todo o seu catálogo na tabela dos 100 álbuns da década: “808’s…” (63º), “Graduation” (45º), “Late Registration” (40º) e “The College Dropout” (10º). 2010. “My Beautiful Dark Twisted Fantasy” é o quinto registo de estúdio deste «super-homem capaz de deixar meio mundo de queixo caído e a outra metade a esfalfar-se para arranjar argumentos para o facto de o queixo não cair como aos demais», escrevia, no “Ípsilon”, o crítico Mário Lopes, que o considerou disco do ano – tal como fizeram a “Spin”, a “Time” ou a “Rolling Stone”.

2011

2000. Surge a oportunidade de trabalhar para a Roc-AFella, editora de Jay-Z, onde dá nas vistas pelo bom ouvido musical e pela ética de trabalho. Colabora em vários álbuns de sucesso, entre eles “The Diary of Alicia Keys”, que lhe vale o “Grammy” de “Melhor Canção R&B”.

AGOSTO , OUTUBRO

retrato I música I

33

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D.R.

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1977. Nasce, a 8 de junho, em Atlanta. Aos 3 anos, após o divórcio dos pais, muda-se para Chicago com a mãe. Estudou em boas escolas, teve aulas de música e de artes plásticas e chegou a frequentar a universidade. Mas o apelo do hip-hop falou mais alto: aos 19 anos, desistiu do curso e dedicou-se à carreira de produtor.

KANYE IMPÔS-SE ATÉ NO MODO DE VESTIR, NUMA ALTURA DOMINADA PELO ‘LOOK’ DE GUETO. do acordo), arranjou emprego como operador de telemarketing. À noite, trabalhava a criar batidas para outros “rappers”. Não precisou de esperar muito até conseguir o primeiro biscate a sério, para o “MC” de Chicago Gravity, que lhe rendeu oito mil dólares. Estava no bom caminho. Produziu, depois, uma série considerável de nomes de segunda linha do hip-hop norte-americano, como Jermaine Dupri, Foxy Brown ou Goodie Mob, até que, com o virar do século, encontra a sua rampa de lançamento: a respeitada editora Roc-A-Fella, de Jay-Z, onde lhe é dada a oportunidade de ouro de produzir algumas das faixas de “Blueprint”, o novo álbum do seu «patrão», que acabaria por se tornar um ponto de viragem para ambos. Com a carreira de produtor lançada, virou-se para o desafio número dois: gravar o seu próprio disco. Primeiro tentou na casa que o conhecia. Não ficaram convencidos. Afinal, Kanye tinha ar de tudo menos de “rapper”. «Ele usava pólos cor-de-rosa com o colarinho levantado e “mocassins” Gucci», recorda Damon Dash, então CEO da editora. Isto numa altura em que o rap era, acima de tudo, música de rua, de gueto, e se vestia de calças largas, camisolas de basquete e sapatilhas do tamanho de cacilheiros. Bateu a outras portas, mas todas lhe foram fechadas na

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2011

2004. O seu ar pouco “street” não lhe facilita a vida quando envereda pela carreira de “rapper”. Após muitos nãos, consegue convencer a Roc-A-Fella. Em fevereiro, edita “The College Dropout”; dois meses depois, é disco de platina por vendas superiores a um milhão de cópias (em junho, chega à dupla platina). Vence dois “Grammies”.

cara. Por fim, a Roc-A-Fella lá pôs de lado o preconceito contra “rappers” «betinhos» e, embora a medo, apostou em Kanye. “The College Dropout” viu a luz do dia em fevereiro de 2004. Vendeu 441 mil cópias na primeira semana, estreando-se no segundo lugar da “Billboard”. Pôs o decano Darryl McDaniels (Run-DMC) e o ator-cantor Jamie Foxx de novo a ouvir hip-hop. Valeu-lhe nove nomeações e dois “Grammies”: “Melhor Álbum de Rap” e “Melhor Canção Rap” (“Jesus Walks”). A “Rolling Stone” atribuiu-lhe a décima posição no “ranking” dos melhores discos dos anos 2000. E a “Time” elegeu-o um dos 100 melhores de sempre, classificando-o como «o álbum de rap mais inteligente, engraçado e importante do novo século.» A partir daí, Kanye West «só» teve de manter a fasquia elevada. Em menos de uma década, os objetivos que traçara no início da carreira – «chegar a disco de ouro ou platina, ter canções universalmente respeitadas e alguma influência no panorama cultural, mudar a sonoridade da música e inspirar novos artistas a trilharem o seu próprio caminho» – foram todos cumpridos. «Se eu dissesse que não tinha já feito tudo isso, estaria a dar-vos aquela “tanga” da falsa modéstia hollywoodesca.» O que se segue? O céu costuma ser o limite. E o trono continua vago. n

2005. Lança “Late Registration”, que lhe vale um “Brit”, três “Grammies” e a tripla platina. Seguem-se “Graduation” (2007; três “Grammies”, dois “American Music Awards” e um “Brit”) e “808’s & Heartbreak” (2008; um “Brit”). Entre 2008 e 2010 recebe outros cinco “Grammies”, a título de colaborações. 2009. Kanye conquistou lugar cativo nas várias listas dos discos do ano desde a estreia. Em dezembro de 2009, a “Rolling Stone” incluiu todo o seu catálogo na tabela dos 100 álbuns da década: “808’s…” (63º), “Graduation” (45º), “Late Registration” (40º) e “The College Dropout” (10º). 2010. “My Beautiful Dark Twisted Fantasy” é o quinto registo de estúdio deste «super-homem capaz de deixar meio mundo de queixo caído e a outra metade a esfalfar-se para arranjar argumentos para o facto de o queixo não cair como aos demais», escrevia, no “Ípsilon”, o crítico Mário Lopes, que o considerou disco do ano – tal como fizeram a “Spin”, a “Time” ou a “Rolling Stone”.

2011

2000. Surge a oportunidade de trabalhar para a Roc-AFella, editora de Jay-Z, onde dá nas vistas pelo bom ouvido musical e pela ética de trabalho. Colabora em vários álbuns de sucesso, entre eles “The Diary of Alicia Keys”, que lhe vale o “Grammy” de “Melhor Canção R&B”.

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D.R.

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I ribatejo I

HOTEL LUSITANO.

RAÇA E RAZÃO

2008

A TRADIÇÃO EQUESTRE E A LEZÍRIA SEM FIM, DE

MARÇO , ABRIL

BRAÇO DADO COM A DESCONTRACÇÃO E O LUXUOSO CONFORTO DE UMA GOLEGÃ DE CHARME. TEXTO JOÃO MESTRE I FOTOGRAFIA PAULO SOUSA COELHO / EVASÕES

104

RESTAURANTE HOTEL LUSITANO. Pratos sofisticados com alma lusitana é a promessa deste restaurante com carta assinada pelo chefe José Avillez. Existe também um bar e uma esplanada, para um lanche ou uma sossegada tarde de leitura. T: 249979170

PURO SPA. Este espaço de bem-estar integrado no Hotel Lusitano conta com três salas de tratamento, onde a água tem um papel preponderante. Uma verdadeira viagem dos sentidos. W: www.hotellusitano.com HOTEL LUSITANO

2008

GOLEGÃ

É INEVITÁVEL: fale-se na Golegã e, por atacado, vêm à conversa os cavalos. E a feira de Novembro, que, por dez dias, traz um novo pulsar às pacatas ruas da vila ribatejana. Dizia-se, até, que a razão para visitar a “Capital do Cavalo” era, única e simplesmente, a secular feira. Ora, foi (também) para dar à Golegã motivo para uma visita fora de época que nasceu o Hotel Lusitano, o primeiro e único de charme em terras de Vale do Tejo. Instalado numa típica casa ribatejana de inícios do século XX – a que foi acrescida uma Ala Nova, de traço contemporâneo –, o Lusitano é já um dos mais apetecidos de Portugal, reco mendado, logo no seu ano de estreia, pelo respeitado guia Condé Nast Johansens. Para além do evidente bom gosto dos seus interiores e dos confortos «quase caseiros» dos seus aposentos, este retiro no coração da lezíria tem dois outros motivos de grande interesse. Um deles, o mais recente, é o Puro Spa, cujo cardápio propõe, entre outros mimos, a Cabine de Flutuação, uma experiência única de relaxamento em água de elevada salinidade, que provoca a flutuação natural, como se se estivesse no Mar Morto. A boa mesa é outro forte argumento a favor do Lusitano. O restaurante do hotel apresenta um menu imaginado por José Avillez e executado (e actualizado) pelo “chef” Paulo Costa, cujo currículo inclui, a título de exemplo, os lisboetas Bica do Sapato e Eleven. A inspiração é ribatejana – como denuncia a variedade de torricados no capítulo das entradas – com um toque de cozinha de autor (perdão,

Um hotel de charme com 24 quartos, em pleno coração do Ribatejo, bem no centro da vila. Tem parcerias com a Escola Equestre Lusitanus para actividades diversas. W: www.hotellusitano.com

MARÇO , ABRIL

lifestyle

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HOTEL LUSITANO


I ribatejo I

HOTEL LUSITANO.

RAÇA E RAZÃO

2008

A TRADIÇÃO EQUESTRE E A LEZÍRIA SEM FIM, DE

MARÇO , ABRIL

BRAÇO DADO COM A DESCONTRACÇÃO E O LUXUOSO CONFORTO DE UMA GOLEGÃ DE CHARME. TEXTO JOÃO MESTRE I FOTOGRAFIA PAULO SOUSA COELHO / EVASÕES

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RESTAURANTE HOTEL LUSITANO. Pratos sofisticados com alma lusitana é a promessa deste restaurante com carta assinada pelo chefe José Avillez. Existe também um bar e uma esplanada, para um lanche ou uma sossegada tarde de leitura. T: 249979170

PURO SPA. Este espaço de bem-estar integrado no Hotel Lusitano conta com três salas de tratamento, onde a água tem um papel preponderante. Uma verdadeira viagem dos sentidos. W: www.hotellusitano.com HOTEL LUSITANO

2008

GOLEGÃ

É INEVITÁVEL: fale-se na Golegã e, por atacado, vêm à conversa os cavalos. E a feira de Novembro, que, por dez dias, traz um novo pulsar às pacatas ruas da vila ribatejana. Dizia-se, até, que a razão para visitar a “Capital do Cavalo” era, única e simplesmente, a secular feira. Ora, foi (também) para dar à Golegã motivo para uma visita fora de época que nasceu o Hotel Lusitano, o primeiro e único de charme em terras de Vale do Tejo. Instalado numa típica casa ribatejana de inícios do século XX – a que foi acrescida uma Ala Nova, de traço contemporâneo –, o Lusitano é já um dos mais apetecidos de Portugal, reco mendado, logo no seu ano de estreia, pelo respeitado guia Condé Nast Johansens. Para além do evidente bom gosto dos seus interiores e dos confortos «quase caseiros» dos seus aposentos, este retiro no coração da lezíria tem dois outros motivos de grande interesse. Um deles, o mais recente, é o Puro Spa, cujo cardápio propõe, entre outros mimos, a Cabine de Flutuação, uma experiência única de relaxamento em água de elevada salinidade, que provoca a flutuação natural, como se se estivesse no Mar Morto. A boa mesa é outro forte argumento a favor do Lusitano. O restaurante do hotel apresenta um menu imaginado por José Avillez e executado (e actualizado) pelo “chef” Paulo Costa, cujo currículo inclui, a título de exemplo, os lisboetas Bica do Sapato e Eleven. A inspiração é ribatejana – como denuncia a variedade de torricados no capítulo das entradas – com um toque de cozinha de autor (perdão,

Um hotel de charme com 24 quartos, em pleno coração do Ribatejo, bem no centro da vila. Tem parcerias com a Escola Equestre Lusitanus para actividades diversas. W: www.hotellusitano.com

MARÇO , ABRIL

lifestyle

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HOTEL LUSITANO


lifestyle

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FEIRA NACIONAL DO CAVALO A SECULAR FEIRA DECORRE, ESTE ANO, ENTRE 7 E 16 DE NOVEMBRO. PARA ALÉM DO CAVALO LUSITANO, O VERDADEIRO PROTAGONISTA DESTA GRANDE FESTA, CELEBRA-SE O SÃO MARTINHO, COMO ATESTA O CHEIRO A VINHO NOVO E A CASTANHAS ASSADAS. (WWW.HORSEFAIRLUSITANO.ORG)

2008

autores), exemplificada pelo “sushi da Golegã” – trouxinhas de beringela e courgete grelhadas, recheadas de pato confitado. Acima de tudo, o Lusitano prova que a sofisticação também sobrevive fora das grandes metrópoles e sem grandes artifícios ou pretensiosismos. A Golegã é daquelas terras que não esquece a sua identidade – trá-la, aliás, orgulhosamente ao peito, como um emblema. Será, discutivelmente, a mais ribatejana vila do Ribatejo – e o espírito que se vive durante a Feira do Cavalo comprova-o. Fazendo jus ao epíteto de “Capital do Cavalo”, a vila continua a fazer da multissecular feira (que este ano se realizar entre 7 e 16 de Novembro) uma montra do que de mais genuíno e castiço há no Ribatejo, naquele Ribatejo que nunca se esqueceu de onde veio e para onde (não) quer ir.

MARÇO , ABRIL

MARÇO , ABRIL

2008

RESTAURANTE DO HOTEL LUSITANO

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lifestyle

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FEIRA NACIONAL DO CAVALO A SECULAR FEIRA DECORRE, ESTE ANO, ENTRE 7 E 16 DE NOVEMBRO. PARA ALÉM DO CAVALO LUSITANO, O VERDADEIRO PROTAGONISTA DESTA GRANDE FESTA, CELEBRA-SE O SÃO MARTINHO, COMO ATESTA O CHEIRO A VINHO NOVO E A CASTANHAS ASSADAS. (WWW.HORSEFAIRLUSITANO.ORG)

2008

autores), exemplificada pelo “sushi da Golegã” – trouxinhas de beringela e courgete grelhadas, recheadas de pato confitado. Acima de tudo, o Lusitano prova que a sofisticação também sobrevive fora das grandes metrópoles e sem grandes artifícios ou pretensiosismos. A Golegã é daquelas terras que não esquece a sua identidade – trá-la, aliás, orgulhosamente ao peito, como um emblema. Será, discutivelmente, a mais ribatejana vila do Ribatejo – e o espírito que se vive durante a Feira do Cavalo comprova-o. Fazendo jus ao epíteto de “Capital do Cavalo”, a vila continua a fazer da multissecular feira (que este ano se realizar entre 7 e 16 de Novembro) uma montra do que de mais genuíno e castiço há no Ribatejo, naquele Ribatejo que nunca se esqueceu de onde veio e para onde (não) quer ir.

MARÇO , ABRIL

MARÇO , ABRIL

2008

RESTAURANTE DO HOTEL LUSITANO

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direto

I música I

DISCO DE PLATINA, GLOBO DE OURO E DIGRESSÃO NACIONAL. TUDO EM MENOS DE UM ANO. AGORA, A CANTORA-REVELAÇÃO PENSA JÁ NUM SEGUNDO DISCO. MAS NÃO SÓ.

ESTADO DE ALMA TEXTO JOÃO MESTRE I FOTOGRAFIA LUIS DE BARROS

14

2011 AGOSTO, OUTUBRO

AGOSTO, OUTUBRO

2011

Q

uando pensava em ser atriz, um amigo desviou-a para o «bom caminho»: Rui Ribeiro ficou tão impressionado com a pujança e a maturidade da voz de Aurea que resolveu compor-lhe uma canção à medida – de imedia to gravada e enviada à produtora Blim Records. A resposta apareceu em forma de convite para gravar um disco. O resto é história; uma história das que raramente acontecem, e que em poucas palavras se resume a «sucesso merecido». E repentino. «Tem sido uma série de boas surpresas, mas tenho uma equipa espetacular atrás de mim. E tenho muito que lhes agradecer.» Agradecida mas não deslumbrada, Aurea reconhece que é um grande privilégio ter chegado onde chegou e sabe que manter-se fiel a si própria é parte do segredo.

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direto

I música I

DISCO DE PLATINA, GLOBO DE OURO E DIGRESSÃO NACIONAL. TUDO EM MENOS DE UM ANO. AGORA, A CANTORA-REVELAÇÃO PENSA JÁ NUM SEGUNDO DISCO. MAS NÃO SÓ.

ESTADO DE ALMA TEXTO JOÃO MESTRE I FOTOGRAFIA LUIS DE BARROS

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2011 AGOSTO, OUTUBRO

AGOSTO, OUTUBRO

2011

Q

uando pensava em ser atriz, um amigo desviou-a para o «bom caminho»: Rui Ribeiro ficou tão impressionado com a pujança e a maturidade da voz de Aurea que resolveu compor-lhe uma canção à medida – de imedia to gravada e enviada à produtora Blim Records. A resposta apareceu em forma de convite para gravar um disco. O resto é história; uma história das que raramente acontecem, e que em poucas palavras se resume a «sucesso merecido». E repentino. «Tem sido uma série de boas surpresas, mas tenho uma equipa espetacular atrás de mim. E tenho muito que lhes agradecer.» Agradecida mas não deslumbrada, Aurea reconhece que é um grande privilégio ter chegado onde chegou e sabe que manter-se fiel a si própria é parte do segredo.

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direto I música I

1987. Áurea Sousa

AUREA (2010)

nasce a 7 de setembro, em Santiago do Cacém. Era ainda pequena quando a família se muda para Silves. Cresce numa casa de músicos – o pai toca e canta fado, a mãe é «envergonhada» mas tem «uma voz lindíssima» e o irmão é guitarrista.

Álbum disponível no serviço

AGOSTO, OUTUBRO

2011

2003. Aos 15 anos,

16

Ponha a Aurea a dar música a quem lhe liga. Para ter estes temas como “waiting ring”, envie SMS para o 12700, acompanhado do respectivo código: “Busy (For Me)” (18634), “Love Me Tender” (18576), “Okay Alright” (18697). Preço: €1,60, com subscrição mensal de €0,99.

participa num “casting” para o concurso televisivo “Ídolos”, em Beja, mas não passa da ronda inicial.

2005. Na hora de escolher um curso, opta por Estudos Teatrais, na Universidade de Évora.

com a «personagem» que está no palco?

O que gostava de lhes responder agora?

Nada. Não guarda ressentimentos…

Não, porque sou a mesma pessoa. Não gosto de inventar personagens nem de assumir outros papéis: quando vou para o palco sou eu, dou muito de mim. E, claro, interpreto os temas à minha maneira. Gosto muito de ser eu própria e é algo que defendo desde o princípio: não vou deixar de sê-lo por nada.

Que ideia! Não! Adorei a experiência, adorei o “casting” com os outros concorrentes. O meu irmão foi comigo, tocou guitarra, cantámos, fizemos amigos. Guardo muito boas recordações desse dia.

A sua carreira não começa pelo

Não sei. Parei no último ano, já faltava pouco. Mas neste momento não faz sentido regressar à universidade. Até porque não dá.

habitual «sempre sonhei com isto». Foi a iniciativa do seu amigo, o músico/compositor Rui Ribeiro, que despoletou tudo?

Foi isso mesmo. Sempre gostei de cantar mas nunca pensei que o meu futuro fosse ser cantora. Lembro-me de estar num concerto da Mariza e pensar «Como será estar ali em cima? E ter todas estas pessoas a cantar as nossas músicas?». Mas pensar a sério na possibilidade de fazê-lo profissionalmente? Nunca. Pensei tirar o meu curso, tal como os meus pais me educaram, e fazer tudo certinho. Aos 15 anos concorreu ao “Ídolos”. Como foi a experiência?

Os meus amigos sabiam que eu gostava de cantar e insistiram comigo, «Olha lá, Aurea, vai haver um programa para novos cantores, porque não participas?» E eu «Eh, não sei!». Andei num impasse até que decidi: «OK, vou fazer o “casting”». Fi-lo muito naturalmente, sem pretensões nenhumas. Foi giro. Lembra-se do que o júri lhe disse?

Não gostaram. Já tinham uma ideia do que queriam: um artista feito, um artista completo. E eu era muito miudinha. Não tinha os requisitos necessários para ser o «ídolo nacional».

Quando trocou o teatro pela música congelou a matrícula. Pensa voltar?

E quando terminar este ciclo de concertos?

Quem sabe? São talentos que se podem complementar…

Sim… Há o caso da Lúcia Moniz, que faz muito bem as duas coisas. Para ser sincera, não sei se vou sentir necessidade disso. Fui para Teatro meio à toa, sem grandes expectativas, e acabei por apaixonar-me pelo curso, pela representação. Mas, de momento, limito-me a ser espectadora. Onde aprendeu a cantar?

A minha mãe diz que eu em pequenina, mal falava, já cantarolava. Mesmo sem saber a letra. Lembro-me de cantar músicas em inglês sem saber o que estava a dizer – ouvia o que a cantora dizia e tentava imitar. Acho que é uma coisa que nasceu comigo e foi evoluindo com o tempo. Lembra-se da primeira vez que pisou um palco?

Foi no jardim-escola. Desatei a chorar [risos]. E quando pisou um grande palco pela primeira vez?

Num concerto dos “Morangos com Açúcar”, no Pavilhão Atlântico. Fiz dois duetos e cantei o “Okay

2011

“QUANDO VOU PARA O PALCO SOU EU. GOSTO MUITO DE SER EU PRÓPRIA E É ALGO QUE DEFENDO DESDE O PRINCÍPIO: NÃO VOU DEIXAR DE SÊ-LO POR NADA.”

pria, não confundir a pessoa

AGOSTO, OUTUBRO

SINCERIDADE ACIMA DE TUDO

É difícil manter-se fiel a si pró-

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direto I música I

1987. Áurea Sousa

AUREA (2010)

nasce a 7 de setembro, em Santiago do Cacém. Era ainda pequena quando a família se muda para Silves. Cresce numa casa de músicos – o pai toca e canta fado, a mãe é «envergonhada» mas tem «uma voz lindíssima» e o irmão é guitarrista.

Álbum disponível no serviço

AGOSTO, OUTUBRO

2011

2003. Aos 15 anos,

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Ponha a Aurea a dar música a quem lhe liga. Para ter estes temas como “waiting ring”, envie SMS para o 12700, acompanhado do respectivo código: “Busy (For Me)” (18634), “Love Me Tender” (18576), “Okay Alright” (18697). Preço: €1,60, com subscrição mensal de €0,99.

participa num “casting” para o concurso televisivo “Ídolos”, em Beja, mas não passa da ronda inicial.

2005. Na hora de escolher um curso, opta por Estudos Teatrais, na Universidade de Évora.

com a «personagem» que está no palco?

O que gostava de lhes responder agora?

Nada. Não guarda ressentimentos…

Não, porque sou a mesma pessoa. Não gosto de inventar personagens nem de assumir outros papéis: quando vou para o palco sou eu, dou muito de mim. E, claro, interpreto os temas à minha maneira. Gosto muito de ser eu própria e é algo que defendo desde o princípio: não vou deixar de sê-lo por nada.

Que ideia! Não! Adorei a experiência, adorei o “casting” com os outros concorrentes. O meu irmão foi comigo, tocou guitarra, cantámos, fizemos amigos. Guardo muito boas recordações desse dia.

A sua carreira não começa pelo

Não sei. Parei no último ano, já faltava pouco. Mas neste momento não faz sentido regressar à universidade. Até porque não dá.

habitual «sempre sonhei com isto». Foi a iniciativa do seu amigo, o músico/compositor Rui Ribeiro, que despoletou tudo?

Foi isso mesmo. Sempre gostei de cantar mas nunca pensei que o meu futuro fosse ser cantora. Lembro-me de estar num concerto da Mariza e pensar «Como será estar ali em cima? E ter todas estas pessoas a cantar as nossas músicas?». Mas pensar a sério na possibilidade de fazê-lo profissionalmente? Nunca. Pensei tirar o meu curso, tal como os meus pais me educaram, e fazer tudo certinho. Aos 15 anos concorreu ao “Ídolos”. Como foi a experiência?

Os meus amigos sabiam que eu gostava de cantar e insistiram comigo, «Olha lá, Aurea, vai haver um programa para novos cantores, porque não participas?» E eu «Eh, não sei!». Andei num impasse até que decidi: «OK, vou fazer o “casting”». Fi-lo muito naturalmente, sem pretensões nenhumas. Foi giro. Lembra-se do que o júri lhe disse?

Não gostaram. Já tinham uma ideia do que queriam: um artista feito, um artista completo. E eu era muito miudinha. Não tinha os requisitos necessários para ser o «ídolo nacional».

Quando trocou o teatro pela música congelou a matrícula. Pensa voltar?

E quando terminar este ciclo de concertos?

Quem sabe? São talentos que se podem complementar…

Sim… Há o caso da Lúcia Moniz, que faz muito bem as duas coisas. Para ser sincera, não sei se vou sentir necessidade disso. Fui para Teatro meio à toa, sem grandes expectativas, e acabei por apaixonar-me pelo curso, pela representação. Mas, de momento, limito-me a ser espectadora. Onde aprendeu a cantar?

A minha mãe diz que eu em pequenina, mal falava, já cantarolava. Mesmo sem saber a letra. Lembro-me de cantar músicas em inglês sem saber o que estava a dizer – ouvia o que a cantora dizia e tentava imitar. Acho que é uma coisa que nasceu comigo e foi evoluindo com o tempo. Lembra-se da primeira vez que pisou um palco?

Foi no jardim-escola. Desatei a chorar [risos]. E quando pisou um grande palco pela primeira vez?

Num concerto dos “Morangos com Açúcar”, no Pavilhão Atlântico. Fiz dois duetos e cantei o “Okay

2011

“QUANDO VOU PARA O PALCO SOU EU. GOSTO MUITO DE SER EU PRÓPRIA E É ALGO QUE DEFENDO DESDE O PRINCÍPIO: NÃO VOU DEIXAR DE SÊ-LO POR NADA.”

pria, não confundir a pessoa

AGOSTO, OUTUBRO

SINCERIDADE ACIMA DE TUDO

É difícil manter-se fiel a si pró-

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Imaginava que seria mais difícil?

Muito mais difícil. Antes de pisar o palco, sim, foi realmente complicado. A primeira música foi o “No One”, da Alicia Keys, em dueto com o [Paulo] Vintém. Eu não cantava na primeira parte, então fiquei a olhar para o público e a pensar «O que vou fazer? Vais conseguir, Aurea? Está aqui tanta gente…» O certo é que, quando chegou a minha vez de entrar, saiu tudo automaticamente. Na altura estava já a gravar o disco?

Ainda não estava pronto. A partir da gravação do “Okay Alright” em estúdio apercebemo-nos de que algo tinha mudado naquele tempo todo. Decidiu-se então fazer o “Busy”, para experimentar este novo registo. E resultou muito bem. A partir daí começámos a gravar o disco. Faz sentido classificá-lo como “soul”?

É uma mistura muito grande. Pode dizer-se que, na sua maioria, será “soul”. Mas estão lá mais coisas misturadas – não gosto de etiquetá-lo com um só estilo. Prefiro que as pessoas ouçam e julguem por si próprias. Mas são inevitáveis as comparações com esta ou aquela artista. Isso incomoda-a?

Não. O que faço não é uma coisa nova. É costume as pessoas compararem com o que já existe. Revê-se mais na “soul” clássica ou na nova?

Gosto muito da clássica – gostaria que o próximo trabalho fosse mais “rough”, mais “old school”. Mas também gosto da “neo soul”, da Joss Stone, por exemplo. Adoro o trabalho dela, é uma das minhas maiores influências atuais. Quando começou o processo de gravação, tinha ideia de como queria que o disco soasse?

Não! [risos]

E quando o ouviu pela primeira

2008. O músico (e colega

vez: estava lá tudo o que queria?

de universidade) Rui Ribeiro fica tão impressionado com a sua voz que lhe compõe um tema. Gravam-no e enviam-no para a produtora Blim Records, de Mem Martins, que responde com o convite para a gravação de um disco. A matrícula na universidade é congelada para Áurea se dedicar ao projecto a tempo inteiro.

Na altura, sim. Foi uma sensação de realização com 43 minutos de duração. Mas, com o tempo, o disco nunca fica exatamente como queremos. Ouvi-o uma semana ou duas depois de ter saído e pensei: «Teria gravado “isto” de maneira completamente diferente. E “aqui” tinha feito outra coisa!» Vai-se acrescentando sempre qualquer coisa, há sempre um defeito que gostaríamos de alterar. O que espera estar a fazer

2008. O tema “Okay

daqui a um ano?

Alright” entra no alinhamento da banda sonora da série “Morangos com Açúcar”. E Aurea (o acento caíra, entretanto, para simplificar) é convidada para cantar no espetáculo “Morangos ao Vivo”, no Pavilhão Atlântico, o seu «batismo de fogo» em grandes palcos.

Espero estar a trabalhar no segundo disco. Ando já a pensar nele, mas, com os concertos, não há tempo para muita coisa. Vou tentando aproveitar todo o tempinho livre. Está a compor?

Não. Ainda não vou compor – falta-me a maturidade… Toca algum instrumento?

Não, é outra coisa penso em fazer: aprender um instrumento e um pouco de teoria musical para me situar. Quem sabe isso não me puxe também para começar a compor... Se um dia gravar um disco de versões, que temas não podem

2009. Em simultâneo com a gravação do álbum, canta com uma banda de “covers” num bar de Lisboa para ganhar experiência em palco.

faltar?

Adoro o “Natural Woman”, da Aretha Franklin. E o “Try Me”, do James Brown. “Man’s World”, também do James Brown… Há tantos temas, é complicado escolher. Quando tive de decidir as versões para tocar em concerto, fiz uma lista de temas [faz um gesto na mesa, do tamanho de uma folha A4] que gostaria de cantar, mas só pude escolher dois… Ao cantar músicas de outros sente-as como suas?

Sim, acabo por me identificar com elas. No momento em que as interpreto são minhas. Tenho o máximo respeito por quem as compôs e pelo intérprete original, mas na altura tento dar o máximo para interpretá-las à minha maneira. n

2010. “Aurea”, disco de estreia, é lançado a 27 de setembro. Grava uma versão do clássico de Elvis Presley “Love Me Tender” para a edição portuguesa da banda sonora do espetáculo do Cirque du Soleil “Viva Elvis”. 2011. Quatro meses após o lançamento, “Aurea” atinge o topo da tabela de vendas e a marca de ouro; um mês depois, é disco de platina. Recebe o prémio “Personalidade Feminina de 2010” na área de música, pela revista “Lux”, e o Globo de Ouro de “Melhor Intérprete Individual”.

2011

Alright”. Foi uma grande prova de fogo. Estava tão nervosa… Mas correu muito bem – descobri uma força interior que nunca pensei que tivesse.

AGOSTO, OUTUBRO

direto I música I

19


Imaginava que seria mais difícil?

Muito mais difícil. Antes de pisar o palco, sim, foi realmente complicado. A primeira música foi o “No One”, da Alicia Keys, em dueto com o [Paulo] Vintém. Eu não cantava na primeira parte, então fiquei a olhar para o público e a pensar «O que vou fazer? Vais conseguir, Aurea? Está aqui tanta gente…» O certo é que, quando chegou a minha vez de entrar, saiu tudo automaticamente. Na altura estava já a gravar o disco?

Ainda não estava pronto. A partir da gravação do “Okay Alright” em estúdio apercebemo-nos de que algo tinha mudado naquele tempo todo. Decidiu-se então fazer o “Busy”, para experimentar este novo registo. E resultou muito bem. A partir daí começámos a gravar o disco. Faz sentido classificá-lo como “soul”?

É uma mistura muito grande. Pode dizer-se que, na sua maioria, será “soul”. Mas estão lá mais coisas misturadas – não gosto de etiquetá-lo com um só estilo. Prefiro que as pessoas ouçam e julguem por si próprias. Mas são inevitáveis as comparações com esta ou aquela artista. Isso incomoda-a?

Não. O que faço não é uma coisa nova. É costume as pessoas compararem com o que já existe. Revê-se mais na “soul” clássica ou na nova?

Gosto muito da clássica – gostaria que o próximo trabalho fosse mais “rough”, mais “old school”. Mas também gosto da “neo soul”, da Joss Stone, por exemplo. Adoro o trabalho dela, é uma das minhas maiores influências atuais. Quando começou o processo de gravação, tinha ideia de como queria que o disco soasse?

Não! [risos]

E quando o ouviu pela primeira

2008. O músico (e colega

vez: estava lá tudo o que queria?

de universidade) Rui Ribeiro fica tão impressionado com a sua voz que lhe compõe um tema. Gravam-no e enviam-no para a produtora Blim Records, de Mem Martins, que responde com o convite para a gravação de um disco. A matrícula na universidade é congelada para Áurea se dedicar ao projecto a tempo inteiro.

Na altura, sim. Foi uma sensação de realização com 43 minutos de duração. Mas, com o tempo, o disco nunca fica exatamente como queremos. Ouvi-o uma semana ou duas depois de ter saído e pensei: «Teria gravado “isto” de maneira completamente diferente. E “aqui” tinha feito outra coisa!» Vai-se acrescentando sempre qualquer coisa, há sempre um defeito que gostaríamos de alterar. O que espera estar a fazer

2008. O tema “Okay

daqui a um ano?

Alright” entra no alinhamento da banda sonora da série “Morangos com Açúcar”. E Aurea (o acento caíra, entretanto, para simplificar) é convidada para cantar no espetáculo “Morangos ao Vivo”, no Pavilhão Atlântico, o seu «batismo de fogo» em grandes palcos.

Espero estar a trabalhar no segundo disco. Ando já a pensar nele, mas, com os concertos, não há tempo para muita coisa. Vou tentando aproveitar todo o tempinho livre. Está a compor?

Não. Ainda não vou compor – falta-me a maturidade… Toca algum instrumento?

Não, é outra coisa penso em fazer: aprender um instrumento e um pouco de teoria musical para me situar. Quem sabe isso não me puxe também para começar a compor... Se um dia gravar um disco de versões, que temas não podem

2009. Em simultâneo com a gravação do álbum, canta com uma banda de “covers” num bar de Lisboa para ganhar experiência em palco.

faltar?

Adoro o “Natural Woman”, da Aretha Franklin. E o “Try Me”, do James Brown. “Man’s World”, também do James Brown… Há tantos temas, é complicado escolher. Quando tive de decidir as versões para tocar em concerto, fiz uma lista de temas [faz um gesto na mesa, do tamanho de uma folha A4] que gostaria de cantar, mas só pude escolher dois… Ao cantar músicas de outros sente-as como suas?

Sim, acabo por me identificar com elas. No momento em que as interpreto são minhas. Tenho o máximo respeito por quem as compôs e pelo intérprete original, mas na altura tento dar o máximo para interpretá-las à minha maneira. n

2010. “Aurea”, disco de estreia, é lançado a 27 de setembro. Grava uma versão do clássico de Elvis Presley “Love Me Tender” para a edição portuguesa da banda sonora do espetáculo do Cirque du Soleil “Viva Elvis”. 2011. Quatro meses após o lançamento, “Aurea” atinge o topo da tabela de vendas e a marca de ouro; um mês depois, é disco de platina. Recebe o prémio “Personalidade Feminina de 2010” na área de música, pela revista “Lux”, e o Globo de Ouro de “Melhor Intérprete Individual”.

2011

Alright”. Foi uma grande prova de fogo. Estava tão nervosa… Mas correu muito bem – descobri uma força interior que nunca pensei que tivesse.

AGOSTO, OUTUBRO

direto I música I

19


I aveiro I

ARTES NOVAS

DESCARTEMOS AS COMPARAÇÕES: NÃO HÁ OUTRA CIDADE ASSIM EM PORTUGAL. EIS ALGUNS MOTIVOS PARA (RE)DESCOBRI-LA.

TEXTO JOÃO MESTRE

FEVEREIRO , MARÇO

2009

FOTOGRAFIA CONSTANTINO LEITE / EVASÕES

98

RESTAURANTE MERCADO DO PEIXE

MERCADO DO PEIXE.

HOTEL MELIÁ RIA.

CENTRO CIÊNCIA VIVA.

Uma referência na boa mesa aveirense, dedicado, como o nome indica, à «carne do mar». T: 234383511

Um hotel de design arrojado, debruçado sobre o Lago da Fonte Nova, no coração da cidade. A lista de comodidades inclui Wellness Center e o Restaurante do Lago. W: www.solmelia.com

Um museu que é também uma «fábrica» de conhecimento, onde a experimentação científica está ao alcance de todos os visitantes. W: www.fabrica.cienciaviva.ua.pt

2009

AVEIRO

OS COGNOMES são mais do que muitos. Houve uma altura em que parecia mais apelativo chamar-lhe «Veneza Portuguesa» do que dá-la a conhecer pelos seus inimitáveis traços de identidade: as salinas, os barcos moliceiros, as barricas de ovos-moles, a culinária com sabor a mar. Agora (aliás, em Março de 2008), Aveiro acumulou outro «título», o de cidade da Arte Nova, ao tornar-se na primeira (e única) representante nacional na Réseau Art Nouveau, um clube restrito que inclui Barcelona, Budapeste, Havana e Viena (www.artnouveaunet.eu). Que sirva, então, de pretexto para um passeio junto aos canais, com o Largo do Rossio como ponto de partida. As águas do Canal Central reflectem alguns dos melhores exemplares desta traça arquitectónica de inícios do século XX. E a figura de proa dessa «nova» cara de Aveiro é a Casa Major Pessoa (R. Barbosa Magalhães, 9), em vias de ser convertida no Museu de Arte Nova – com uma casa de chá “Belle Époque” incluída. Do lado de lá do canal, no local da antiga Companhia Aveirense de Moagens, encontra-se o Centro Ciência Viva, face visível de outra vocação recente da cidade: a científica. Uma visita obrigatória para mentes curiosas de todas as idades. Mas retome-se o pulsar do Beira-Mar, esse pitoresco bairro que em anos recentes voltou à vida e se transformou no núcleo boémio da cidade. A pensar já na hora do jantar, marque-se mesa no Mercado do Peixe, o restaurante mais recomendado das redondezas, situado no topo do centenário mercado que lhe dá nome. Tem vista privilegiada para o Canal dos Botirões e é exemplar nos pratos de pescado fresco, nas caldeiradas e nas cataplanas. Quem procurar novas interpretações

FEVEREIRO , MARÇO

lifestyle

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I aveiro I

ARTES NOVAS

DESCARTEMOS AS COMPARAÇÕES: NÃO HÁ OUTRA CIDADE ASSIM EM PORTUGAL. EIS ALGUNS MOTIVOS PARA (RE)DESCOBRI-LA.

TEXTO JOÃO MESTRE

FEVEREIRO , MARÇO

2009

FOTOGRAFIA CONSTANTINO LEITE / EVASÕES

98

RESTAURANTE MERCADO DO PEIXE

MERCADO DO PEIXE.

HOTEL MELIÁ RIA.

CENTRO CIÊNCIA VIVA.

Uma referência na boa mesa aveirense, dedicado, como o nome indica, à «carne do mar». T: 234383511

Um hotel de design arrojado, debruçado sobre o Lago da Fonte Nova, no coração da cidade. A lista de comodidades inclui Wellness Center e o Restaurante do Lago. W: www.solmelia.com

Um museu que é também uma «fábrica» de conhecimento, onde a experimentação científica está ao alcance de todos os visitantes. W: www.fabrica.cienciaviva.ua.pt

2009

AVEIRO

OS COGNOMES são mais do que muitos. Houve uma altura em que parecia mais apelativo chamar-lhe «Veneza Portuguesa» do que dá-la a conhecer pelos seus inimitáveis traços de identidade: as salinas, os barcos moliceiros, as barricas de ovos-moles, a culinária com sabor a mar. Agora (aliás, em Março de 2008), Aveiro acumulou outro «título», o de cidade da Arte Nova, ao tornar-se na primeira (e única) representante nacional na Réseau Art Nouveau, um clube restrito que inclui Barcelona, Budapeste, Havana e Viena (www.artnouveaunet.eu). Que sirva, então, de pretexto para um passeio junto aos canais, com o Largo do Rossio como ponto de partida. As águas do Canal Central reflectem alguns dos melhores exemplares desta traça arquitectónica de inícios do século XX. E a figura de proa dessa «nova» cara de Aveiro é a Casa Major Pessoa (R. Barbosa Magalhães, 9), em vias de ser convertida no Museu de Arte Nova – com uma casa de chá “Belle Époque” incluída. Do lado de lá do canal, no local da antiga Companhia Aveirense de Moagens, encontra-se o Centro Ciência Viva, face visível de outra vocação recente da cidade: a científica. Uma visita obrigatória para mentes curiosas de todas as idades. Mas retome-se o pulsar do Beira-Mar, esse pitoresco bairro que em anos recentes voltou à vida e se transformou no núcleo boémio da cidade. A pensar já na hora do jantar, marque-se mesa no Mercado do Peixe, o restaurante mais recomendado das redondezas, situado no topo do centenário mercado que lhe dá nome. Tem vista privilegiada para o Canal dos Botirões e é exemplar nos pratos de pescado fresco, nas caldeiradas e nas cataplanas. Quem procurar novas interpretações

FEVEREIRO , MARÇO

lifestyle

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BOTIRÃO

lifestyle I aveiro I

AVEIRO EM CLUBE RESTRITO EM MARÇO DE 2008, AVEIRO ACUMULOU OUTRO «TÍTULO», O DE CIDADE DA ARTE NOVA, AO TORNAR-SE NA PRIMEIRA (E ÚNICA) REPRESENTANTE NACIONAL NA RÉSEAU ART NOUVEAU, UMA REDE QUE INCLUI, ENTRE OUTRAS, BARCELONA, BRUXELAS, BUDAPESTE, HAVANA E VIENA.

CENTRO CIÊNCIA VIVA

ARTE NOVA.

FEVEREIRO , MARÇO

2009

Entre 1904 e 1920, as famílias abastadas de Aveiro aderiram em massa à moda arquitectónica então em vigor por toda a Europa, como demonstra ção do seu poderio. Volvido um século, é uma das novas caras da cidade. O roteiro começa no Largo do Rossio. W: www.aveiro.co.pt/ roteiros.aspx

100

HOTEL MELIÁ RIA

HOTEL MELIÁ RIA

ARTE NOVA NA AV. LOURENÇO PEIXINHO

para os paladares tradicionais (com o peixe sempre em primeiro plano) deverá rumar ao Cais da Fonte Nova e experimentar o restaurante do Lago, do Hotel Meliá Ria. Chegada a noite, o epicentro da movida estudantil é a Praça do Peixe. Nas imediações, contudo, também há onde viver a noite sem excesso de «espírito académico». No Botirão, por exemplo, um “wine bar” que recria o velho espírito de

taberna. Ou no Clandestino, o bar alternativo mais “in” de Aveiro, no número 35 da Tenente Resende. Isto sem esquecer o Mercado Negro, que é, em simultâneo, um espaço cultural e um centro comercial “indie”, instalado num dos tais edifícios “art nouveau” junto ao Canal Central. Os fundadores definem-no como «um espaço em constante transformação». Escolheram a cidade certa.


BOTIRÃO

lifestyle I aveiro I

AVEIRO EM CLUBE RESTRITO EM MARÇO DE 2008, AVEIRO ACUMULOU OUTRO «TÍTULO», O DE CIDADE DA ARTE NOVA, AO TORNAR-SE NA PRIMEIRA (E ÚNICA) REPRESENTANTE NACIONAL NA RÉSEAU ART NOUVEAU, UMA REDE QUE INCLUI, ENTRE OUTRAS, BARCELONA, BRUXELAS, BUDAPESTE, HAVANA E VIENA.

CENTRO CIÊNCIA VIVA

ARTE NOVA.

FEVEREIRO , MARÇO

2009

Entre 1904 e 1920, as famílias abastadas de Aveiro aderiram em massa à moda arquitectónica então em vigor por toda a Europa, como demonstra ção do seu poderio. Volvido um século, é uma das novas caras da cidade. O roteiro começa no Largo do Rossio. W: www.aveiro.co.pt/ roteiros.aspx

100

HOTEL MELIÁ RIA

HOTEL MELIÁ RIA

ARTE NOVA NA AV. LOURENÇO PEIXINHO

para os paladares tradicionais (com o peixe sempre em primeiro plano) deverá rumar ao Cais da Fonte Nova e experimentar o restaurante do Lago, do Hotel Meliá Ria. Chegada a noite, o epicentro da movida estudantil é a Praça do Peixe. Nas imediações, contudo, também há onde viver a noite sem excesso de «espírito académico». No Botirão, por exemplo, um “wine bar” que recria o velho espírito de

taberna. Ou no Clandestino, o bar alternativo mais “in” de Aveiro, no número 35 da Tenente Resende. Isto sem esquecer o Mercado Negro, que é, em simultâneo, um espaço cultural e um centro comercial “indie”, instalado num dos tais edifícios “art nouveau” junto ao Canal Central. Os fundadores definem-no como «um espaço em constante transformação». Escolheram a cidade certa.


traço

I ilustração I

ANDRÉ CARRILHO A ARTE DE TRABALHAR PARA O BONECO Caricaturista, ilustrador, cartunista, realizador de animação, vj, designer gráfico.

As caras de um “self made man” que não alinha em discursos derrotistas.

80

só queria desenhar. Mas nunca acreditou que isso pudesse vir a ser uma profissão a tempo inteiro. «No meu tempo, devia-se tirar um curso, ter um emprego numa empresa, fazer carreira», explica. Entretanto, pára para se interrogar, rindo: «acho que já posso dizer “no meu tempo”…?» André Carrilho nasceu em 1974, na Amadora. Começou por desenhar apenas para os amigos e

família. Divertia-se a caricaturá-los. A dada altura, a mãe muda-se para Macau e o jovem André acompanha-a. É lá que faz o 12º ano. E é lá que, por influência de colegas de escola, se aventura nos meandros da Comunicação Social. «Como é um meio muito pequeno, toda a gente se conhece. Tive a sorte de me darem algum espaço no jornal “Ponto Final”.» Já não se lembra com

exactidão do primeiro desenho que publicou. Tem, porém, a certeza do primeiro que vendeu: «a caricatura do Rocha Vieira, que era, então, o Governador de Macau». Hoje, aos 34 anos, André Carrilho é o ilustrador português com maior visibilidade fora de portas e um dos mais requisitados a nível internacional. Já publicou no “New York Times”, na “Vanity Fair”, na “Harper’s Magazine”

JANEIRO, FEVEREIRO, MARÇO

JANEIRO, FEVEREIRO, MARÇO

2007

AO PRINCÍPIO,

2007

TEXTO JOÃO MESTRE I FOTOGRAFIA PEDRO LOUREIRO

81


traço

I ilustração I

ANDRÉ CARRILHO A ARTE DE TRABALHAR PARA O BONECO Caricaturista, ilustrador, cartunista, realizador de animação, vj, designer gráfico.

As caras de um “self made man” que não alinha em discursos derrotistas.

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só queria desenhar. Mas nunca acreditou que isso pudesse vir a ser uma profissão a tempo inteiro. «No meu tempo, devia-se tirar um curso, ter um emprego numa empresa, fazer carreira», explica. Entretanto, pára para se interrogar, rindo: «acho que já posso dizer “no meu tempo”…?» André Carrilho nasceu em 1974, na Amadora. Começou por desenhar apenas para os amigos e

família. Divertia-se a caricaturá-los. A dada altura, a mãe muda-se para Macau e o jovem André acompanha-a. É lá que faz o 12º ano. E é lá que, por influência de colegas de escola, se aventura nos meandros da Comunicação Social. «Como é um meio muito pequeno, toda a gente se conhece. Tive a sorte de me darem algum espaço no jornal “Ponto Final”.» Já não se lembra com

exactidão do primeiro desenho que publicou. Tem, porém, a certeza do primeiro que vendeu: «a caricatura do Rocha Vieira, que era, então, o Governador de Macau». Hoje, aos 34 anos, André Carrilho é o ilustrador português com maior visibilidade fora de portas e um dos mais requisitados a nível internacional. Já publicou no “New York Times”, na “Vanity Fair”, na “Harper’s Magazine”

JANEIRO, FEVEREIRO, MARÇO

JANEIRO, FEVEREIRO, MARÇO

2007

AO PRINCÍPIO,

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TEXTO JOÃO MESTRE I FOTOGRAFIA PEDRO LOUREIRO

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traço I ilustração I

“O

JANEIRO, FEVEREIRO, MARÇO

2007

SEGREDO DO MEU SUCESSO? É UMA MISTURA DE OPORTUNIDADE, CONTEXTO E SORTE... E CAPACIDADE DE VER, BOA INTUIÇÃO.”

82

(EUA); na “Independent on Sunday”, na “Word” (Inglaterra); no “El País”, no “El Mundo” (Espanha); no “Courier International” (França); e no “Neue Zürcher Zeitung” (Suíça). Isto para além do “Diário de Notícias”, do “Independente”, do “Público", do “Diário Económico” e do “Expresso”. E de trabalhos de ilustração para diversas editoras, entre elas a nova-iorquina Random House. Surpreendentemente, André confessa-se pouco empenhado na procura de trabalho. «Como já tenho tanto trabalho e não tenho capacidade para fazer mais, interessa-me muito mais ter duas ou três contas fixas e ter tempo livre para me dedicar ao VJing, à animação e a outras coisas que não me dão tanto dinheiro mas que gosto de ir fazendo.» Entre essas «outras coisas», encontra-se a banda desenhada, a sua «primeira paixão». Houve até (quem diria?) um longo período

da sua vida em que desprezava a ilustração. «Sempre achei mais piada a contar histórias», confessa. A ideia, essa, já anda a germiná-la – «tenho na minha cabeça uns cinco álbuns». Porém, é um trabalho moroso: «para fazer um álbum, preciso, pelo menos, de um ano». Não quer, no entanto, «morrer sem lançar um». SENTAMO-NOS

a conversar numa esplanada do Chiado, interrompidos, de tempo a tempo, pela ruidosa passagem de um eléctrico. Pergunto-lhe pelo segredo do seu sucesso. «O segredo do meu sucesso? É uma mistura de oportunidade, contexto e sorte.» À receita acrescenta, depois de uma breve paragem para pensar, «capacidade de ver… tenho uma boa intuição para apanhar as alturas em que é preciso fazer uma jogada». Comecemos pela sorte: em 2001, André Carrilho é convidado por

HONRAS.


traço I ilustração I

“O

JANEIRO, FEVEREIRO, MARÇO

2007

SEGREDO DO MEU SUCESSO? É UMA MISTURA DE OPORTUNIDADE, CONTEXTO E SORTE... E CAPACIDADE DE VER, BOA INTUIÇÃO.”

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(EUA); na “Independent on Sunday”, na “Word” (Inglaterra); no “El País”, no “El Mundo” (Espanha); no “Courier International” (França); e no “Neue Zürcher Zeitung” (Suíça). Isto para além do “Diário de Notícias”, do “Independente”, do “Público", do “Diário Económico” e do “Expresso”. E de trabalhos de ilustração para diversas editoras, entre elas a nova-iorquina Random House. Surpreendentemente, André confessa-se pouco empenhado na procura de trabalho. «Como já tenho tanto trabalho e não tenho capacidade para fazer mais, interessa-me muito mais ter duas ou três contas fixas e ter tempo livre para me dedicar ao VJing, à animação e a outras coisas que não me dão tanto dinheiro mas que gosto de ir fazendo.» Entre essas «outras coisas», encontra-se a banda desenhada, a sua «primeira paixão». Houve até (quem diria?) um longo período

da sua vida em que desprezava a ilustração. «Sempre achei mais piada a contar histórias», confessa. A ideia, essa, já anda a germiná-la – «tenho na minha cabeça uns cinco álbuns». Porém, é um trabalho moroso: «para fazer um álbum, preciso, pelo menos, de um ano». Não quer, no entanto, «morrer sem lançar um». SENTAMO-NOS

a conversar numa esplanada do Chiado, interrompidos, de tempo a tempo, pela ruidosa passagem de um eléctrico. Pergunto-lhe pelo segredo do seu sucesso. «O segredo do meu sucesso? É uma mistura de oportunidade, contexto e sorte.» À receita acrescenta, depois de uma breve paragem para pensar, «capacidade de ver… tenho uma boa intuição para apanhar as alturas em que é preciso fazer uma jogada». Comecemos pela sorte: em 2001, André Carrilho é convidado por

HONRAS.


Jorge Silva, director de arte do “Público”, a colaborar no suplemento “Mil Folhas”. Sem o saber, é inscrito pelo próprio Jorge Silva no concurso da Society for News Design. Ganhou o Prémio de Ouro pelo seu portefólio individual. Isso bastou para despoletar a carreira internacional do jovem ilustrador. «Quando o Jorge Silva foi lá para receber o prémio…» Interrompo-o: «o André não foi receber o prémio?». A resposta: «não tinha

suplemento de domingo do “The Independent”, cuja directora gráfica integrava o júri do concurso. Recordo-me de ter lido, numa citação do próprio André, que, se não tivesse começado em Portugal, «nunca teria chegado aos jornais internacionais». Soa quase a contra-senso, já que o discurso habitual é precisamente o inverso. Não resisto a pedir explicações. «Em Portugal, não estamos no centro de nada, estamos equidistantes de tudo o resto».

camente aquilo que já viram.» Essa liberdade teve, porém, de ser conquistada: «ao publicar lá fora, ganhei alguma tolerância cá». Não podia ser só facilidades… era ir para Arquitectura. «Não conseguia arranjar profissões que fossem de desenhar» e a Arquitectura acabava por ser uma espécie de mal menor, «era a coisa mais próxima». Entretanto, repara que alguns dos caricaturistas que mais

A SUA PRIMEIRA

PORTUGAL, HOUVE TRÊS CRIADORES QUE FORAM SEMINAIS E ESTÃO AO MAIS ALTO NÍVEL MUNDIAL: O RAFAEL BORDALO PINHEIRO, O STUART CARVALHAIS E O ABEL MANTA.” Completa, depois da passagem de um eléctrico: «temos referências equidistantes de tudo: dos ingleses, dos franceses, dos americanos, dos japoneses». Nos Estados Unidos, por exemplo, «as pessoas são muito mais formatadas, há especializações para tudo», ao passo que, em Portugal, «somos os “desenrascas”, fazemos de tudo um pouco». E reforça: «acho que, se não fosse português, nunca tinha chegado a trabalhar para os sítios onde trabalho». Mas há mais: como em Portugal «havia pouca gente a fazer isto, uma pessoa tem possibilidade de progressão no próprio meio». Outra vantagem de trabalhar cá: «tenho mais liberdade de movimentos. Lá fora, querem especifi-

admirava trabalhavam em publicidade ou design. Descobriu, então, o Design Gráfico, «um curso relativamente recente» que frequentou, regressado de Macau, no Instituto Superior de Belas Artes de Lisboa. No meio tempo, foi fazendo alguns trabalhos de ilustração. E abriu um “atelier” com o ilustrador/designer Luís Lázaro. Apercebem-se, porém, de que estão «mais talhados para a criação pessoal, pura e dura». E aqui entra a tal boa intuição de que André falava: «comecei a descobrir que o meu talento específico de caricatura não era coisa fácil de encontrar e que era valorizado no mercado». Pergunto-lhe quando é que se apercebeu de que iria ser essa a sua profissão. A resposta,

JANEIRO, FEVEREIRO, MARÇO

dinheiro para ir lá, porque, além da viagem e da estadia em Nova Iorque, tinha de pagar 400 dólares para entrar na cerimónia». Valeu-lhe a ida de Jorge Silva. «Dei-lhe um portefólio para ele entregar a quem achasse mais adequado.» Entregou-o ao “New York Times”. Passados três meses, André é convidado a desenhar para o suplemento “Book Review”, onde acaba por fazer algumas capas. Entrava, assim, para um dos espaços de ilustração mais cobiçados dos Estados Unidos. «A partir do momento em que se publica num sítio desses, há muita gente que repara em nós». E assim aconteceu, de facto. Em simultâneo, Carrilho é exposto ao “Independent on Sunday”,

2007

“EM

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Jorge Silva, director de arte do “Público”, a colaborar no suplemento “Mil Folhas”. Sem o saber, é inscrito pelo próprio Jorge Silva no concurso da Society for News Design. Ganhou o Prémio de Ouro pelo seu portefólio individual. Isso bastou para despoletar a carreira internacional do jovem ilustrador. «Quando o Jorge Silva foi lá para receber o prémio…» Interrompo-o: «o André não foi receber o prémio?». A resposta: «não tinha

suplemento de domingo do “The Independent”, cuja directora gráfica integrava o júri do concurso. Recordo-me de ter lido, numa citação do próprio André, que, se não tivesse começado em Portugal, «nunca teria chegado aos jornais internacionais». Soa quase a contra-senso, já que o discurso habitual é precisamente o inverso. Não resisto a pedir explicações. «Em Portugal, não estamos no centro de nada, estamos equidistantes de tudo o resto».

camente aquilo que já viram.» Essa liberdade teve, porém, de ser conquistada: «ao publicar lá fora, ganhei alguma tolerância cá». Não podia ser só facilidades… era ir para Arquitectura. «Não conseguia arranjar profissões que fossem de desenhar» e a Arquitectura acabava por ser uma espécie de mal menor, «era a coisa mais próxima». Entretanto, repara que alguns dos caricaturistas que mais

A SUA PRIMEIRA

PORTUGAL, HOUVE TRÊS CRIADORES QUE FORAM SEMINAIS E ESTÃO AO MAIS ALTO NÍVEL MUNDIAL: O RAFAEL BORDALO PINHEIRO, O STUART CARVALHAIS E O ABEL MANTA.” Completa, depois da passagem de um eléctrico: «temos referências equidistantes de tudo: dos ingleses, dos franceses, dos americanos, dos japoneses». Nos Estados Unidos, por exemplo, «as pessoas são muito mais formatadas, há especializações para tudo», ao passo que, em Portugal, «somos os “desenrascas”, fazemos de tudo um pouco». E reforça: «acho que, se não fosse português, nunca tinha chegado a trabalhar para os sítios onde trabalho». Mas há mais: como em Portugal «havia pouca gente a fazer isto, uma pessoa tem possibilidade de progressão no próprio meio». Outra vantagem de trabalhar cá: «tenho mais liberdade de movimentos. Lá fora, querem especifi-

admirava trabalhavam em publicidade ou design. Descobriu, então, o Design Gráfico, «um curso relativamente recente» que frequentou, regressado de Macau, no Instituto Superior de Belas Artes de Lisboa. No meio tempo, foi fazendo alguns trabalhos de ilustração. E abriu um “atelier” com o ilustrador/designer Luís Lázaro. Apercebem-se, porém, de que estão «mais talhados para a criação pessoal, pura e dura». E aqui entra a tal boa intuição de que André falava: «comecei a descobrir que o meu talento específico de caricatura não era coisa fácil de encontrar e que era valorizado no mercado». Pergunto-lhe quando é que se apercebeu de que iria ser essa a sua profissão. A resposta,

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dinheiro para ir lá, porque, além da viagem e da estadia em Nova Iorque, tinha de pagar 400 dólares para entrar na cerimónia». Valeu-lhe a ida de Jorge Silva. «Dei-lhe um portefólio para ele entregar a quem achasse mais adequado.» Entregou-o ao “New York Times”. Passados três meses, André é convidado a desenhar para o suplemento “Book Review”, onde acaba por fazer algumas capas. Entrava, assim, para um dos espaços de ilustração mais cobiçados dos Estados Unidos. «A partir do momento em que se publica num sítio desses, há muita gente que repara em nós». E assim aconteceu, de facto. Em simultâneo, Carrilho é exposto ao “Independent on Sunday”,

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vem dos próprios temas que lhe são dados. E também do cinema, da literatura, da pintura, de tudo excepto a própria ilustração. «Um mestre de animação russo dizia aos alunos que se deve ir buscar inspiração a todas as outras áreas excepto àquela onde a gente trabalha.» As referências do mundo da ilustração, contudo, são muitas. Os seus ídolos são, em boa parte, portugueses. «Não é nacionalismo bacoco; ter no nosso meio pessoas que fazem coisas que temos em alta conta é muito importante.» Na hora de eleger a sua maior referência, aponta Abel Manta, «porque quando conhecemos alguém com aquela qualidade e vemos que é português, também nos apercebemos de que é possível fazermos qualquer coisa.» Adiantando um pouco mais a conversa, André acaba por apontar uma tríade de “mestres”: «em Portugal, houve três criadores que foram seminais e estão ao mais alto nível mundial: o Rafael Bordalo Pinheiro, o Stuart Carvalhais e o Abel Manta». Depois refere também os contemporâneos (e seus amigos) Nuno Saraiva, Luís Lázaro e Cristina Sampaio. E recorda o tempo em que coleccionava as caricaturas de António (“Expresso”), Vasco (“Público”) e Cid (“Independente”). Acrescenta ainda que «temos muitos mais que também foram muito bons, mas não os conhecemos, porque pouca gente presta atenção a estas coisas». É tudo «uma questão de cultura, de educação, das próprias escolas», advoga. E, aí, assume-se «muito crítico das universidades e do

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A INSPIRAÇÃO

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ensino das artes em Portugal», que classifica de «um bocado deficiente». Adiante-se que o curso de Design Gráfico nunca chegou a ser terminado. «Desisti… naquela altura, fazer ilustração e usar um computador era sacrilégio», graceja. Peço-lhe, sem sucesso, para definir o seu traço. «Não faço ideia» é a primeira resposta. Passado outro eléctrico, elabora um pouco – «procuro dar alguma noção de fluidez e movimento a desenhos estáticos». Ainda tenta avançar a descrição – «se calhar, procuro fazer um realismo abstracto». Entretanto, recua – «mas não definiria assim» – e ri-se. «Não sei, não sei como definir.» Se lhe perguntarmos quem é a sua «vítima» favorita, responde, com pena, que gostaria que António Guterres ainda estivesse em cena. Salienta, porém, que o que mais gosta é de caricaturar escritores. «Se eu tiver de fazer a caricatura de uma modelo», exemplifica, «só tenho acesso a fotografias normalizadas, onde há um esforço por eliminar defeitos e irregularidades – e é nisso que a gente pega, as especificidades». Houve até uma vez («uma única vez», garante) em que, após sete desenhos, sete tentativas, teve de dizer ao cliente que desistia. «Era uma cara normal», justifica-se - «normalmente, são pessoas bonitas, que não têm nada de assimétrico». É por isso que prefere os escritores, «porque temos acesso a fotografias que são “mais” eles, são mais “as pessoas”». mais alto da sua carreira, aponta em tom jocoso, foi quando um trabalho seu chegou ao Parlamento. «Ainda ontem, estava a arrumar o “atelier” e encontrei O PONTO

MORADAS. André nasceu a 26/07/1974, na Amadora. Aos 10 anos, mudou-se para Lisboa, onde estudou até ao 11º ano. Entretanto, a sua mãe, arquitecta do IGAPHE, é transferida para Macau. É lá que faz o 12º ano. Passado um ano, regressa a Lisboa (onde reside actualmente) e ingressa no curso de Design Gráfico nas Belas Artes. Que não chega a concluir, por descontentamento. EM PAPEL. Para além dos trabalhos para jornais e revistas, publicados em Inglaterra, EUA, Espanha, Suíça e França, ilustrou também diversos livros, tanto em Portugal como no estrangeiro. Em 2007, lançou, em nome próprio, a colectânea “O Rosto do Alpinista” e ilustrou o livro “O Vírus da Vida”, do músico/escritor JP Simões. «Gosto mais do objecto livro, porque o livro fica, enquanto que a ilustração em si é efémera», afirma.

OUTRAS ARTES. Em 2007, estreia-se na animação, com a curta “Jantar em Lisboa”, aplaudida em festivais de todo o mundo. Actualmente, sonha com a realização de uma longa-metragem «capaz de rivalizar com o que de melhor se faz na animação». E sonha também em lançar um álbum de banda desenhada. Não será, porém, a sua primeira aventura na 9ª Arte: em 2003, lançou a colectânea de histórias curtas “Em Lume Brando”.

essa imagem: o Telmo Correia a segurar um desenho meu na Assembleia da República e a dizer que era um escândalo». Que desenho era esse? «Quando o Bagão Félix estava a reformular a Lei do Trabalho, fi-lo no corpo de um cão, aos pés de um patrão», sendo que «o patrão tinha charuto e era gordo». «A grande polémica», conta, claramente divertido com a situação, «foi que os patrões não eram gordos nem fumavam charuto, mas o facto é que perceberam que era um patrão». Passado mais um eléctrico, continua: «quando se faz uma imagem dessas, há que lidar com clichés colectivos». E a censura, André? «Não gosto de falar de censura.» Ou melhor, é mais «uma questão de gosto» do que «uma questão de moral ou ética». «É preciso testar», explica. «Testo os limites daquilo que posso fazer: a experiência está em fazer um desenho que seja aceite mas que seja pertinente e vá ao fundo da questão.» Um «jogo» que acaba por considerar divertido. «Até gosto de trabalhar dentro de um espaço confinado», afirma, sublinhando que isso o obriga a «usar alguma agilidade para fazer um desenho interessante». Enquanto trabalha no seu “atelier”, em Lisboa, André Carrilho convive com dezenas de desenhos de sua autoria, que preenchem as paredes e restantes espaços livres. «São a minha porta, o meu meio de comunicação para o mundo exterior», afirma. «Sou uma pessoa introvertida, um bocado tímida, e assim convivo com a ideia que as pessoas têm de mim e do meu trabalho.» O que, na sua opinião, acaba por ser uma forma de se conhecer melhor a si próprio. André Carrilho, apresento-lhe o André Carrilho.

“ACHO QUE, SE NÃO FOSSE PORTUGUÊS, NUNCA TINHA CHEGADO A TRABALHAR PARA OS SÍTIOS ONDE TRABALHO”

JANEIRO, FEVEREIRO, MARÇO

rida: «quando vi que estava a ganhar mais dinheiro com a ilustração do que com o design».

2007

traço I ilustração I

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vem dos próprios temas que lhe são dados. E também do cinema, da literatura, da pintura, de tudo excepto a própria ilustração. «Um mestre de animação russo dizia aos alunos que se deve ir buscar inspiração a todas as outras áreas excepto àquela onde a gente trabalha.» As referências do mundo da ilustração, contudo, são muitas. Os seus ídolos são, em boa parte, portugueses. «Não é nacionalismo bacoco; ter no nosso meio pessoas que fazem coisas que temos em alta conta é muito importante.» Na hora de eleger a sua maior referência, aponta Abel Manta, «porque quando conhecemos alguém com aquela qualidade e vemos que é português, também nos apercebemos de que é possível fazermos qualquer coisa.» Adiantando um pouco mais a conversa, André acaba por apontar uma tríade de “mestres”: «em Portugal, houve três criadores que foram seminais e estão ao mais alto nível mundial: o Rafael Bordalo Pinheiro, o Stuart Carvalhais e o Abel Manta». Depois refere também os contemporâneos (e seus amigos) Nuno Saraiva, Luís Lázaro e Cristina Sampaio. E recorda o tempo em que coleccionava as caricaturas de António (“Expresso”), Vasco (“Público”) e Cid (“Independente”). Acrescenta ainda que «temos muitos mais que também foram muito bons, mas não os conhecemos, porque pouca gente presta atenção a estas coisas». É tudo «uma questão de cultura, de educação, das próprias escolas», advoga. E, aí, assume-se «muito crítico das universidades e do

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ensino das artes em Portugal», que classifica de «um bocado deficiente». Adiante-se que o curso de Design Gráfico nunca chegou a ser terminado. «Desisti… naquela altura, fazer ilustração e usar um computador era sacrilégio», graceja. Peço-lhe, sem sucesso, para definir o seu traço. «Não faço ideia» é a primeira resposta. Passado outro eléctrico, elabora um pouco – «procuro dar alguma noção de fluidez e movimento a desenhos estáticos». Ainda tenta avançar a descrição – «se calhar, procuro fazer um realismo abstracto». Entretanto, recua – «mas não definiria assim» – e ri-se. «Não sei, não sei como definir.» Se lhe perguntarmos quem é a sua «vítima» favorita, responde, com pena, que gostaria que António Guterres ainda estivesse em cena. Salienta, porém, que o que mais gosta é de caricaturar escritores. «Se eu tiver de fazer a caricatura de uma modelo», exemplifica, «só tenho acesso a fotografias normalizadas, onde há um esforço por eliminar defeitos e irregularidades – e é nisso que a gente pega, as especificidades». Houve até uma vez («uma única vez», garante) em que, após sete desenhos, sete tentativas, teve de dizer ao cliente que desistia. «Era uma cara normal», justifica-se - «normalmente, são pessoas bonitas, que não têm nada de assimétrico». É por isso que prefere os escritores, «porque temos acesso a fotografias que são “mais” eles, são mais “as pessoas”». mais alto da sua carreira, aponta em tom jocoso, foi quando um trabalho seu chegou ao Parlamento. «Ainda ontem, estava a arrumar o “atelier” e encontrei O PONTO

MORADAS. André nasceu a 26/07/1974, na Amadora. Aos 10 anos, mudou-se para Lisboa, onde estudou até ao 11º ano. Entretanto, a sua mãe, arquitecta do IGAPHE, é transferida para Macau. É lá que faz o 12º ano. Passado um ano, regressa a Lisboa (onde reside actualmente) e ingressa no curso de Design Gráfico nas Belas Artes. Que não chega a concluir, por descontentamento. EM PAPEL. Para além dos trabalhos para jornais e revistas, publicados em Inglaterra, EUA, Espanha, Suíça e França, ilustrou também diversos livros, tanto em Portugal como no estrangeiro. Em 2007, lançou, em nome próprio, a colectânea “O Rosto do Alpinista” e ilustrou o livro “O Vírus da Vida”, do músico/escritor JP Simões. «Gosto mais do objecto livro, porque o livro fica, enquanto que a ilustração em si é efémera», afirma.

OUTRAS ARTES. Em 2007, estreia-se na animação, com a curta “Jantar em Lisboa”, aplaudida em festivais de todo o mundo. Actualmente, sonha com a realização de uma longa-metragem «capaz de rivalizar com o que de melhor se faz na animação». E sonha também em lançar um álbum de banda desenhada. Não será, porém, a sua primeira aventura na 9ª Arte: em 2003, lançou a colectânea de histórias curtas “Em Lume Brando”.

essa imagem: o Telmo Correia a segurar um desenho meu na Assembleia da República e a dizer que era um escândalo». Que desenho era esse? «Quando o Bagão Félix estava a reformular a Lei do Trabalho, fi-lo no corpo de um cão, aos pés de um patrão», sendo que «o patrão tinha charuto e era gordo». «A grande polémica», conta, claramente divertido com a situação, «foi que os patrões não eram gordos nem fumavam charuto, mas o facto é que perceberam que era um patrão». Passado mais um eléctrico, continua: «quando se faz uma imagem dessas, há que lidar com clichés colectivos». E a censura, André? «Não gosto de falar de censura.» Ou melhor, é mais «uma questão de gosto» do que «uma questão de moral ou ética». «É preciso testar», explica. «Testo os limites daquilo que posso fazer: a experiência está em fazer um desenho que seja aceite mas que seja pertinente e vá ao fundo da questão.» Um «jogo» que acaba por considerar divertido. «Até gosto de trabalhar dentro de um espaço confinado», afirma, sublinhando que isso o obriga a «usar alguma agilidade para fazer um desenho interessante». Enquanto trabalha no seu “atelier”, em Lisboa, André Carrilho convive com dezenas de desenhos de sua autoria, que preenchem as paredes e restantes espaços livres. «São a minha porta, o meu meio de comunicação para o mundo exterior», afirma. «Sou uma pessoa introvertida, um bocado tímida, e assim convivo com a ideia que as pessoas têm de mim e do meu trabalho.» O que, na sua opinião, acaba por ser uma forma de se conhecer melhor a si próprio. André Carrilho, apresento-lhe o André Carrilho.

“ACHO QUE, SE NÃO FOSSE PORTUGUÊS, NUNCA TINHA CHEGADO A TRABALHAR PARA OS SÍTIOS ONDE TRABALHO”

JANEIRO, FEVEREIRO, MARÇO

rida: «quando vi que estava a ganhar mais dinheiro com a ilustração do que com o design».

2007

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44

DIAS EM BRANCO COURCHEVEL & MÉRIBEL

TEXTO JOÃO MESTRE I FOTOGRAFIA YVES CALLEWAERT / VOLTA AO MUNDO

O luxo e o “glamour” de alta montanha lado a lado com as emoções fortes dos chamados «desportos brancos». Tudo isto com acesso ao domínio dos «Três Vales», um dos maiores do mundo.

2009

I alpes franceses I

NOVEMBRO , DEZEMBRO

NOVEMBRO , DEZEMBRO

2009

destino

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DIAS EM BRANCO COURCHEVEL & MÉRIBEL

TEXTO JOÃO MESTRE I FOTOGRAFIA YVES CALLEWAERT / VOLTA AO MUNDO

O luxo e o “glamour” de alta montanha lado a lado com as emoções fortes dos chamados «desportos brancos». Tudo isto com acesso ao domínio dos «Três Vales», um dos maiores do mundo.

2009

I alpes franceses I

NOVEMBRO , DEZEMBRO

NOVEMBRO , DEZEMBRO

2009

destino

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destino I alpes franceses I

Ù DE TOPO.

46

É UM DOS MAIORES DO MUNDO E OFERECE DESAFIOS À MEDIDA DE CADA UM, COM MAIS DE 300 PISTAS BALIZADAS E 600 QUILÓMETROS DE DESCIDAS.

2009

× ESCOLHA. O DOMÍNIO ESQUIÁVEL DOS «TRÊS VALES»

NOVEMBRO , DEZEMBRO

NOVEMBRO , DEZEMBRO

2009

NA ALTIVEZ DOS SEUS 2738 METROS, O PICO SAULIRE CONTEMPLA COURCHEVEL E MÉRIBEL. ANTES DO REGRESSO ÀS PISTAS, REGALA-SE A VISTA NO RESTAURANTE LE PANORAMIC, CUJO NOME NÃO DEIXA MARGEM PARA DÚVIDAS.

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destino I alpes franceses I

Ù DE TOPO.

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É UM DOS MAIORES DO MUNDO E OFERECE DESAFIOS À MEDIDA DE CADA UM, COM MAIS DE 300 PISTAS BALIZADAS E 600 QUILÓMETROS DE DESCIDAS.

2009

× ESCOLHA. O DOMÍNIO ESQUIÁVEL DOS «TRÊS VALES»

NOVEMBRO , DEZEMBRO

NOVEMBRO , DEZEMBRO

2009

NA ALTIVEZ DOS SEUS 2738 METROS, O PICO SAULIRE CONTEMPLA COURCHEVEL E MÉRIBEL. ANTES DO REGRESSO ÀS PISTAS, REGALA-SE A VISTA NO RESTAURANTE LE PANORAMIC, CUJO NOME NÃO DEIXA MARGEM PARA DÚVIDAS.

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FRANÇA

destino I alpes franceses I SUÍÇA

LYON Avoriaz Chamonix COURCHEVEL

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ITÁLIA

MÉRIBEL

NICE

PARIS

FRANÇA LYON

TURIM MILÃO NICE

MADRID BARCELONA

ROMA

uma estrela, o La Table du Kilimandjaro (do Hotel Kilimandjaro, na Route de l’Altiport) e o Le Farçon (em La Tania, a pouco mais de três quilómetros do centro de Courchevel), o único que não fica na secção 1850. Isto não significa que seja necessário vender os esquis para pagar um jantar. Basta descer um pouco em altiSIM, O ESQUI É REI. tude e encontrará onde reconfortar o MAS HÁ OUTRAS estômago e repor MODALIDADES as energias depois DISPONÍVEIS. COMO de um dia de «trabalho duro» OS PASSEIOS DE nas pistas. A cozinTRENÓ PUXADO ha “savoyarde” é particularmente POR CÃES. rica nesse campo. Há os pan-alpinos conceituada instituição interna“raclette” e “fondue savoyarde”, cional da boa mesa. Courchevel onde o queijo é figura domiarrebatou seis, atribuídas a quanante. E há a localíssima “tartitro restaurantes: o Le Chabichou flette”, um substancial gratinae o Le Bateau Ivre, ambos com do de batata, cebola, fiambre e duas estrelas (e ambos na Rue queijo “Reblochon” – também des Chenus, a menos de 100 especialidade regional, de metros de distância), e, com origem protegida.

“DESLIZES” PARA TODOS OS GOSTOS

EM PISTA. As cores medem a escala de dificuldade das pistas: do fácil (verde) ao muito difícil (preto), com o azul e o vermelho de permeio. Em Courchevel, há 15 pistas verdes, 31 azuis, 35 vermelhas e 9 pretas (“forfait” 6 dias: €190; www.courchevel.com). Méribel tem 73 pistas, 9 verdes, 34 azuis, 23 vermelhas e 7 pretas (“forfait” 6 dias: €187; www.meribel.net). Nos «Três Vales», das 330 pistas balizadas, 43 são verdes, 129 azuis, 125 vermelhas e 33 pretas (“forfait” 6 dias: €232;www.s3v.com). TEMPERATURA. No tempo de Lindsay e Chappis, era com “Genépi” que se aquecia o corpo. Esta aguardente regional continua a ser uma opção para repor a temperatura – mas há sempre o reconfortante chocolate quente, como o do Le Tremplin, em Courchevel 1850 (em frente ao posto de turismo).

2009

George Orwell lançava “O Triunfo dos Porcos” e a cerimónia de entrega dos Óscares era pela primeira vez transmitida na rádio, a II Guerra Mundial chegava ao fim. Após cinco anos encarcerado num campo nazi, o arquitecto francês Laurent Chappis regressava à pátria. Tinha então 30 anos e, debaixo do braço, trazia o projecto – desenvolvido no período de cativeiro – para a criação de uma estância de esqui na região hoje conhecida como «Os Três Vales». Acontece que o projecto encaixava no desígnio, assumido pelo Conselho da Sabóia, de dar à população algo para se distrair dos ainda recentes horrores da guerra. Passado um ano, já o arquitecto estava no terreno, a trabalhar na construção de uma «estância de esqui para o povo» – a mesma que se havia de tornar o destino de eleição dos ricos e famosos quando o frio chega à Europa. Chappis estava longe de prevê-lo... E daí, talvez não estivesse assim tão distraído: como que estratificada em pirâmide, Courchevel foi desenhada em quatro secções, baptizadas segundo a sua cota de altitude, 1300, 1550, 1650 e 1850, sendo que a escala de luxo e “glamour” aumenta proporcionalmente. Entre outros títulos não-oficiais, Courchevel é conhecida como «Saint-Tropez do Inverno», com as pistas a tomar o lugar das praias. Como tal, o nível de vida leva o respectivo «tributo»: um café facilmente custa quatro euros e uma refeição para duas pessoas atinge, sem grandes

luxos, a barreira dos 100 euros. Vinhos à parte, claro. Praticamente tudo na estância alpina gravita em torno do «topo de gama». São as lojas, das mesmas marcas que emprestam “glamour” às ruas de Milão ou de Nova Iorque – Hermès, Prada, Dior. São os hotéis, que, excluindo Paris, somam a maior oferta de luxo de toda a França – e, de acordo com um folheto do turismo local, detêm o recorde de maior número de estrelas por metro quadrado. (Falando só na oferta de topo, são seis os hotéis de cinco estrelas, outros três em vias de e 10 de quatro estrelas – todos na cota 1850; a vista tem o seu preço.) E, claro, a juntar a estas, há as estrelas do Guia Michelin, essa

AGOSTO , SETEMBRO

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2009

1945. No mesmo ano em que

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FRANÇA

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LYON Avoriaz Chamonix COURCHEVEL

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ITÁLIA

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NICE

PARIS

FRANÇA LYON

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MADRID BARCELONA

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uma estrela, o La Table du Kilimandjaro (do Hotel Kilimandjaro, na Route de l’Altiport) e o Le Farçon (em La Tania, a pouco mais de três quilómetros do centro de Courchevel), o único que não fica na secção 1850. Isto não significa que seja necessário vender os esquis para pagar um jantar. Basta descer um pouco em altiSIM, O ESQUI É REI. tude e encontrará onde reconfortar o MAS HÁ OUTRAS estômago e repor MODALIDADES as energias depois DISPONÍVEIS. COMO de um dia de «trabalho duro» OS PASSEIOS DE nas pistas. A cozinTRENÓ PUXADO ha “savoyarde” é particularmente POR CÃES. rica nesse campo. Há os pan-alpinos conceituada instituição interna“raclette” e “fondue savoyarde”, cional da boa mesa. Courchevel onde o queijo é figura domiarrebatou seis, atribuídas a quanante. E há a localíssima “tartitro restaurantes: o Le Chabichou flette”, um substancial gratinae o Le Bateau Ivre, ambos com do de batata, cebola, fiambre e duas estrelas (e ambos na Rue queijo “Reblochon” – também des Chenus, a menos de 100 especialidade regional, de metros de distância), e, com origem protegida.

“DESLIZES” PARA TODOS OS GOSTOS

EM PISTA. As cores medem a escala de dificuldade das pistas: do fácil (verde) ao muito difícil (preto), com o azul e o vermelho de permeio. Em Courchevel, há 15 pistas verdes, 31 azuis, 35 vermelhas e 9 pretas (“forfait” 6 dias: €190; www.courchevel.com). Méribel tem 73 pistas, 9 verdes, 34 azuis, 23 vermelhas e 7 pretas (“forfait” 6 dias: €187; www.meribel.net). Nos «Três Vales», das 330 pistas balizadas, 43 são verdes, 129 azuis, 125 vermelhas e 33 pretas (“forfait” 6 dias: €232;www.s3v.com). TEMPERATURA. No tempo de Lindsay e Chappis, era com “Genépi” que se aquecia o corpo. Esta aguardente regional continua a ser uma opção para repor a temperatura – mas há sempre o reconfortante chocolate quente, como o do Le Tremplin, em Courchevel 1850 (em frente ao posto de turismo).

2009

George Orwell lançava “O Triunfo dos Porcos” e a cerimónia de entrega dos Óscares era pela primeira vez transmitida na rádio, a II Guerra Mundial chegava ao fim. Após cinco anos encarcerado num campo nazi, o arquitecto francês Laurent Chappis regressava à pátria. Tinha então 30 anos e, debaixo do braço, trazia o projecto – desenvolvido no período de cativeiro – para a criação de uma estância de esqui na região hoje conhecida como «Os Três Vales». Acontece que o projecto encaixava no desígnio, assumido pelo Conselho da Sabóia, de dar à população algo para se distrair dos ainda recentes horrores da guerra. Passado um ano, já o arquitecto estava no terreno, a trabalhar na construção de uma «estância de esqui para o povo» – a mesma que se havia de tornar o destino de eleição dos ricos e famosos quando o frio chega à Europa. Chappis estava longe de prevê-lo... E daí, talvez não estivesse assim tão distraído: como que estratificada em pirâmide, Courchevel foi desenhada em quatro secções, baptizadas segundo a sua cota de altitude, 1300, 1550, 1650 e 1850, sendo que a escala de luxo e “glamour” aumenta proporcionalmente. Entre outros títulos não-oficiais, Courchevel é conhecida como «Saint-Tropez do Inverno», com as pistas a tomar o lugar das praias. Como tal, o nível de vida leva o respectivo «tributo»: um café facilmente custa quatro euros e uma refeição para duas pessoas atinge, sem grandes

luxos, a barreira dos 100 euros. Vinhos à parte, claro. Praticamente tudo na estância alpina gravita em torno do «topo de gama». São as lojas, das mesmas marcas que emprestam “glamour” às ruas de Milão ou de Nova Iorque – Hermès, Prada, Dior. São os hotéis, que, excluindo Paris, somam a maior oferta de luxo de toda a França – e, de acordo com um folheto do turismo local, detêm o recorde de maior número de estrelas por metro quadrado. (Falando só na oferta de topo, são seis os hotéis de cinco estrelas, outros três em vias de e 10 de quatro estrelas – todos na cota 1850; a vista tem o seu preço.) E, claro, a juntar a estas, há as estrelas do Guia Michelin, essa

AGOSTO , SETEMBRO

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2009

1945. No mesmo ano em que

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útil Preço de Roaming tmn na Croácia (clientes pós-pagos/pré-pagos) Chamada para Portugal ou Croácia: €2,04/€2,083 p/min. Chamada para outros países: €2,70 p/min. Chamada recebida: €0,792/€0,793 p/min. Chamada de dados: €0,352 p/100KB Envio de SMS: €0,48/€0,644 p/SMS SMS recebidos: gratuitos

Méribel, La Tania, St-Martin-de-Belleville, Les Menuires, Orelle e Val Thorens. Com um só “forfait”, o esquiador tem acesso a 600 quilómetros de pistas marcadas, correspondentes a uma área esquiável de 40 mil hectares. Nem com um passe para toda a temporada conseguirá alguém trilhar estas 330 pistas. E não é pelo tempo gasto na fila para os meios mecânicos – a capacidade de transporte ascende aos 263 mil utilizadores por hora.

O DIÁRIO BRITÂNICO “The Times”

instalou-se na região oito anos antes de Laurent Chappis. O major britânico deixou-se encantar pelo vale de Les Allues, onde viu o terreno ideal para uma estância de esqui. A construção – coisa inédita na época – obedeceu a um rígido rol de normas, criado pelo próprio Lindsay, privilegiando os métodos, os traçados e os materiais tradicionais. A estância de Méribel fica por detrás do pico Saulire, que observa Courchevel do sudoeste. Não se pense, porém, que é «já ali» – e o preço da corrida de táxi de um lado ao outro recorda a série de curvas e contracurvas que separam as estâncias vizinhas. Pode não ter a sumptuosidade de Courchevel – talvez porque já existia antes do esqui e de Lindsay –, para não falar na velha questão dos preços. Nas casas, predomina a madeira, o formato “chalet” e o aconchego de uma lareira quando a noite cai. Por muito regulamentada que seja a construção, acabam sempre por nascer os inevitáveis blocos de apartamentos – aqui, porém, estão circunscritos ao sector mais recente, Mottaret, no topo da estância, a 1750 metros de altitude. Méribel Village e Méribel ficam na cota dos 1400 e 1450, respectivamente.

Com 150 quilómetros de pistas balizadas – e abundante território virgem para o «fora de pista» -, estão garantidas umas férias à prova de tédio. Um aviso: se em Courchevel as pistas se assemelham a auto-estradas, aqui parecem-se mais com caminhos corta-fogo, talhados na floresta densa, o que se pode revelar uma experiência algo complicada para os menos experimentados. Seja como for, há sempre os tais 40 mil hectares dos «Três Vales». Desafios à medida de cada um é prato forte deste enorme manto branco.

COMO IR. Os aeroportos internacionais mais próximos (com ligações a Lisboa e Porto) são Lyon e Genebra, ambos a cerca de duas horas de qualquer uma das estâncias. Voos a partir de €51, ida e volta (www.easyjet.com). Quem não quiser perder tempo no “transfer” tem à sua disposição o serviço de héli-táxi (www.courchevelhelicopter.com), que encurta a duração do percurso para 30 minutos.

2009

PETER LINDSAY

AGOSTO , SETEMBRO

aponta Courchevel como uma das 10 melhores estâncias do mundo para não-esquiadores. Não custa compreender porquê. Com tanta oferta de requinte e conforto, há até quem diga que é um destino para quem prefere o “après-ski” ao esqui propriamente dito. Não será tanto assim. Manu Gaidet, tricampeão mundial de “freeride”, garante que «é o melhor local do mundo para a modalidade». É claro que estamos a falar da vertente mais radical dos desportos de Inverno, em que não há pistas balizadas nem meios mecânicos para chegar ao topo – e, aí, os mais afoitos têm à sua disposição algo como 10 mil hectares de neve pura por desbravar. Mas, mesmo no que toca às vertentes menos extremas, as opções são excelentes: 90 pistas, metade delas de dificuldade elevada, 42% da área coberta por canhões de neve artificial e capacidade para transporte de 70 mil esquiadores por hora. Por si só, Courchevel reúne uma oferta respeitável em qualquer lado do mundo. Não é tudo: as possibilidades aumentam exponencialmente se tomarmos em conta o domínio dos «Três Vales», um dos maiores do mundo, que engloba também as estâncias vizinhas de Brides-les-Bains,

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útil Preço de Roaming tmn na Croácia (clientes pós-pagos/pré-pagos) Chamada para Portugal ou Croácia: €2,04/€2,083 p/min. Chamada para outros países: €2,70 p/min. Chamada recebida: €0,792/€0,793 p/min. Chamada de dados: €0,352 p/100KB Envio de SMS: €0,48/€0,644 p/SMS SMS recebidos: gratuitos

Méribel, La Tania, St-Martin-de-Belleville, Les Menuires, Orelle e Val Thorens. Com um só “forfait”, o esquiador tem acesso a 600 quilómetros de pistas marcadas, correspondentes a uma área esquiável de 40 mil hectares. Nem com um passe para toda a temporada conseguirá alguém trilhar estas 330 pistas. E não é pelo tempo gasto na fila para os meios mecânicos – a capacidade de transporte ascende aos 263 mil utilizadores por hora.

O DIÁRIO BRITÂNICO “The Times”

instalou-se na região oito anos antes de Laurent Chappis. O major britânico deixou-se encantar pelo vale de Les Allues, onde viu o terreno ideal para uma estância de esqui. A construção – coisa inédita na época – obedeceu a um rígido rol de normas, criado pelo próprio Lindsay, privilegiando os métodos, os traçados e os materiais tradicionais. A estância de Méribel fica por detrás do pico Saulire, que observa Courchevel do sudoeste. Não se pense, porém, que é «já ali» – e o preço da corrida de táxi de um lado ao outro recorda a série de curvas e contracurvas que separam as estâncias vizinhas. Pode não ter a sumptuosidade de Courchevel – talvez porque já existia antes do esqui e de Lindsay –, para não falar na velha questão dos preços. Nas casas, predomina a madeira, o formato “chalet” e o aconchego de uma lareira quando a noite cai. Por muito regulamentada que seja a construção, acabam sempre por nascer os inevitáveis blocos de apartamentos – aqui, porém, estão circunscritos ao sector mais recente, Mottaret, no topo da estância, a 1750 metros de altitude. Méribel Village e Méribel ficam na cota dos 1400 e 1450, respectivamente.

Com 150 quilómetros de pistas balizadas – e abundante território virgem para o «fora de pista» -, estão garantidas umas férias à prova de tédio. Um aviso: se em Courchevel as pistas se assemelham a auto-estradas, aqui parecem-se mais com caminhos corta-fogo, talhados na floresta densa, o que se pode revelar uma experiência algo complicada para os menos experimentados. Seja como for, há sempre os tais 40 mil hectares dos «Três Vales». Desafios à medida de cada um é prato forte deste enorme manto branco.

COMO IR. Os aeroportos internacionais mais próximos (com ligações a Lisboa e Porto) são Lyon e Genebra, ambos a cerca de duas horas de qualquer uma das estâncias. Voos a partir de €51, ida e volta (www.easyjet.com). Quem não quiser perder tempo no “transfer” tem à sua disposição o serviço de héli-táxi (www.courchevelhelicopter.com), que encurta a duração do percurso para 30 minutos.

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PETER LINDSAY

AGOSTO , SETEMBRO

aponta Courchevel como uma das 10 melhores estâncias do mundo para não-esquiadores. Não custa compreender porquê. Com tanta oferta de requinte e conforto, há até quem diga que é um destino para quem prefere o “après-ski” ao esqui propriamente dito. Não será tanto assim. Manu Gaidet, tricampeão mundial de “freeride”, garante que «é o melhor local do mundo para a modalidade». É claro que estamos a falar da vertente mais radical dos desportos de Inverno, em que não há pistas balizadas nem meios mecânicos para chegar ao topo – e, aí, os mais afoitos têm à sua disposição algo como 10 mil hectares de neve pura por desbravar. Mas, mesmo no que toca às vertentes menos extremas, as opções são excelentes: 90 pistas, metade delas de dificuldade elevada, 42% da área coberta por canhões de neve artificial e capacidade para transporte de 70 mil esquiadores por hora. Por si só, Courchevel reúne uma oferta respeitável em qualquer lado do mundo. Não é tudo: as possibilidades aumentam exponencialmente se tomarmos em conta o domínio dos «Três Vales», um dos maiores do mundo, que engloba também as estâncias vizinhas de Brides-les-Bains,

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Ù BOA MESA.

2009

PÓS-ESQUI. QUANDO A NOITE CAI, HÁ QUEM SE DEITE CEDO PARA APROVEITAR O RAIAR DO DIA SEGUINTE. E HÁ QUEM PREFIRA GASTAR AS ENERGIAS NÃO DESPENDIDAS EM PISTA. COURCHEVEL É ASSIM MESMO: METADE ESQUI, METADE “APRÈS-SKI”.

MAIO , JUNHO

AGOSTO , SETEMBRO

52

×

2009

SEJA NO MAIS LUXUOSO RESTAURANTE DE HOTEL OU NA MAIS SINGELA “BRASSERIE”, EM ALTA MONTANHA DEFENDE-SE A ARTE DE BEM COMER. O LE BLANCHOT (MÉRIBEL) E O LA VIA FERRATA (COURCHEVEL) SÃO DISSO EXEMPLO.

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Ù BOA MESA.

2009

PÓS-ESQUI. QUANDO A NOITE CAI, HÁ QUEM SE DEITE CEDO PARA APROVEITAR O RAIAR DO DIA SEGUINTE. E HÁ QUEM PREFIRA GASTAR AS ENERGIAS NÃO DESPENDIDAS EM PISTA. COURCHEVEL É ASSIM MESMO: METADE ESQUI, METADE “APRÈS-SKI”.

MAIO , JUNHO

AGOSTO , SETEMBRO

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2009

SEJA NO MAIS LUXUOSO RESTAURANTE DE HOTEL OU NA MAIS SINGELA “BRASSERIE”, EM ALTA MONTANHA DEFENDE-SE A ARTE DE BEM COMER. O LE BLANCHOT (MÉRIBEL) E O LA VIA FERRATA (COURCHEVEL) SÃO DISSO EXEMPLO.

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destino I alpes franceses I

DANNY SILVA.

2009

2009 AGOSTO , SETEMBRO

54

ALTITUDE. HABITUADO AO RELEVO POUCO ACENTUADO DA FINLÂNDIA (E DO RIBATEJO, ONDE CRESCEU), DANNY SILVA FICOU IMPRESSIONADO COM A ALTITUDE, A INCLINAÇÃO E A IMENSIDÃO DESTAS MONTANHAS A PERDER DE VISTA. «UMA PANORÂMICA DESLUMBRANTE», RECORDA.

AGOSTO , SETEMBRO

me impressionou da primeira vez que estive em Méribel e em Courchevel foi a altitude: montanhas e mais montanhas cobertas de neve, uma panorâmica deslumbrante! Estas estâncias, na verdade, oferecem mais ao adepto de “snowboard” ou de esqui alpino. Pessoalmente, gosto mais da região durante o Verão, para fazer ciclismo e “roller ski” – é também um período mais calmo. No Inverno há mais confusão turística e os preços são inflacionados. Para praticar, prefiro as estâncias vizinhas de Clusaz, a norte, ou St-Veran, a sul, mais apropriadas ao esqui de fundo. Este ano, com a preparação específica para as Olimpíadas de Inverno de 2010, em Vancouver, e tendo de reduzir despesas, não posso regressar, mas se pudesse ia já amanhã. O esqui na região é brutal. Aliás, nem só o esqui: o visitante desfruta de delícias gastronómicas, paisagens naturais e muito mais. Vuokatti, na Finlândia, onde vivo e treino desde 2006, oferece um pouco de tudo para o esqui de fundo, entre subidas e descidas. Nos Alpes, como se está na alta montanha, é mais subir do que descer. Mas isto, naturalmente, é um ponto (muito) positivo para o esqui alpino, com “drops” são enormes e longos. A minha estância preferida nos Alpes Franceses é St-Veran, considerada a aldeia mais alta da Europa (2100m). Dispõe de pistas com menos gente, uma tranquilidade extraordinária e uma paisagem incrível. Bom local para treino em altitude! Aos praticantes do esqui de fundo, aconselho também Vercors ou La Clusaz, as estâncias preferidas dos grandes atletas franceses. n AQUILO QUE MAIS

O único atleta português presente nos Jogos Olímpicos de Inverno de 2006, em Turim, repete a proeza para o ano, em Vancouver, no Canadá. Danny Silva já garantiu os «mínimos» em esqui de fundo – que está para o esqui como a maratona para o atletismo, por oposição ao esqui alpino, uma prova de “sprint” –, modalidade a que se dedicou «a cem por cento há cerca de seis anos». Nascido em New Jersey, em 1973, cedo veio viver para Almeirim. Passou por França, onde trabalhou numa multinacional (curiosamente ou não, uma das suas funções passava por testar esquis), e desde 2006 que vive em Vuokatti, no norte da Finlândia. «Trabalho para um instituto desportivo dedicado às modalidades de neve, nomeadamente as nórdicas – esqui de fundo, combinado nórdico e salto». Através deste instituto, concluiu o curso superior de terapeuta. Danny Silva mantém actualizado o seu website pessoal: http://almadesportiva.tripod.com

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destino I alpes franceses I

DANNY SILVA.

2009

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ALTITUDE. HABITUADO AO RELEVO POUCO ACENTUADO DA FINLÂNDIA (E DO RIBATEJO, ONDE CRESCEU), DANNY SILVA FICOU IMPRESSIONADO COM A ALTITUDE, A INCLINAÇÃO E A IMENSIDÃO DESTAS MONTANHAS A PERDER DE VISTA. «UMA PANORÂMICA DESLUMBRANTE», RECORDA.

AGOSTO , SETEMBRO

me impressionou da primeira vez que estive em Méribel e em Courchevel foi a altitude: montanhas e mais montanhas cobertas de neve, uma panorâmica deslumbrante! Estas estâncias, na verdade, oferecem mais ao adepto de “snowboard” ou de esqui alpino. Pessoalmente, gosto mais da região durante o Verão, para fazer ciclismo e “roller ski” – é também um período mais calmo. No Inverno há mais confusão turística e os preços são inflacionados. Para praticar, prefiro as estâncias vizinhas de Clusaz, a norte, ou St-Veran, a sul, mais apropriadas ao esqui de fundo. Este ano, com a preparação específica para as Olimpíadas de Inverno de 2010, em Vancouver, e tendo de reduzir despesas, não posso regressar, mas se pudesse ia já amanhã. O esqui na região é brutal. Aliás, nem só o esqui: o visitante desfruta de delícias gastronómicas, paisagens naturais e muito mais. Vuokatti, na Finlândia, onde vivo e treino desde 2006, oferece um pouco de tudo para o esqui de fundo, entre subidas e descidas. Nos Alpes, como se está na alta montanha, é mais subir do que descer. Mas isto, naturalmente, é um ponto (muito) positivo para o esqui alpino, com “drops” são enormes e longos. A minha estância preferida nos Alpes Franceses é St-Veran, considerada a aldeia mais alta da Europa (2100m). Dispõe de pistas com menos gente, uma tranquilidade extraordinária e uma paisagem incrível. Bom local para treino em altitude! Aos praticantes do esqui de fundo, aconselho também Vercors ou La Clusaz, as estâncias preferidas dos grandes atletas franceses. n AQUILO QUE MAIS

O único atleta português presente nos Jogos Olímpicos de Inverno de 2006, em Turim, repete a proeza para o ano, em Vancouver, no Canadá. Danny Silva já garantiu os «mínimos» em esqui de fundo – que está para o esqui como a maratona para o atletismo, por oposição ao esqui alpino, uma prova de “sprint” –, modalidade a que se dedicou «a cem por cento há cerca de seis anos». Nascido em New Jersey, em 1973, cedo veio viver para Almeirim. Passou por França, onde trabalhou numa multinacional (curiosamente ou não, uma das suas funções passava por testar esquis), e desde 2006 que vive em Vuokatti, no norte da Finlândia. «Trabalho para um instituto desportivo dedicado às modalidades de neve, nomeadamente as nórdicas – esqui de fundo, combinado nórdico e salto». Através deste instituto, concluiu o curso superior de terapeuta. Danny Silva mantém actualizado o seu website pessoal: http://almadesportiva.tripod.com

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o outro lado

Z TEXTO JOÃO MESTRE I FOTOGRAFIA PEDRO LOUREIRO

A MÚSICA DO ACASO

MARÇO, ABRIL

Vimo-lo a passar música no Sudoeste tmn e partimos logo do princípio de que também é DJ. Zé explica ´ é que meter discos porque de vez em quando não faz dele um DJ.

2008

é

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o outro lado

Z TEXTO JOÃO MESTRE I FOTOGRAFIA PEDRO LOUREIRO

A MÚSICA DO ACASO

MARÇO, ABRIL

Vimo-lo a passar música no Sudoeste tmn e partimos logo do princípio de que também é DJ. Zé explica ´ é que meter discos porque de vez em quando não faz dele um DJ.

2008

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o outro lado I zé diogo quintela I

z

ambujeira do Mar, 2 de Agosto de 2008. No palco principal do festival Sudoeste tmn, Manu Chao «incendiava» a plateia, 37.000 almas ao rubro. Entretanto, e apesar da contagiante actuação do franco-latino, começou a notar-se, ainda o concerto ia a meio, alguma movimentação rumo ao palco secundário. O motivo: acabara de entrar em cena a dupla 2 DJs do C******. Isto é: o jornalista Nuno Miguel Guedes e o humorista Zé Diogo Quintela, que, perante uma audiência convicta de que iria assistir a umas quantas tiradas espirituosas ao bom estilo do Gato Fedorento, «defenderam a ideia do não DJ até à exaustão» – citando o Diário de Notícias de dois dias depois. Questionado sobre a sua carreira de

Foram raras as vezes em que o fez que não puramente por amizade. Porquê a Zambujeira, então? «Pelo irrecusável que é, por exemplo, pôr os Wham!, no Sudoeste», responde. «Irrecusável e irresponsável.»

«FORA

DO GATO FEDORENTO sou

uma pessoa normal, faço o mesmo que toda a gente faz quando não trabalha». Perante o convite para esta entrevista, ficou, ao início, de pé atrás. «Não acho que mereça a atenção do público. É muito maçador», acrescenta. A questão, porém, é que, sem fazer grande esforço, Zé Diogo é capaz de improvisar três ou quatro piadas de situação no curto espaço de tempo que dura esta sessão fotográfica. E a verdade é que, até para uma

Bjorn Lomborg. No que respeita a música, afirma que perde «mais tempo a ler fofocas sobre os músicos do que sobre música propriamente dita». Outro dos seus passatempos favoritos é ver televisão. «É isso que o ajuda a relaxar, a esquecer as preocupações do dia-a-dia?», pergunto. «Ajuda a descansar; não ajuda a esquecer nada, porque eu assento tudo em agendas e telemóvel». Por falar em telemóvel: usa «um Nokia qualquer», que «era o mais barato, dentro dos que tinham as funções de que precisava». O seu «favorito do momento», assegura, como quem diz que essa é a menor das suas preocupações. Viro a agulha para outro lado, indagando se se preocupa muito com o

VINIL, CD, MP3 OU CASSETE? «TANTO FAZ.

CONSIGO SEMPRE RISCAR TUDO. APOSTO QUE TAMBÉM CONSIGO RISCAR UM MP3». DJ («se é uma carreira, foi um “flop”», antecipa), Zé Diogo começa por estabelecer um ponto prévio: «eu não sou DJ; sou, quando muito, um “mete discos”; não misturo, não crio “batidas”, ou lá o que é». Dito isto, avança com uma explicação: «foi a maneira que encontrei para ouvir a música de que gosto à noite. Normalmente, ninguém a punha.» E que música é essa? Talvez Beach Boys, Bee Gees, Beatles, Abba, Jeff Buckley, Weezer, Rufus Wainright, Dave Matthews, alguns dos seus artistas favoritos. Este «metimento de discos» não foi um exclusivo do festival alentejano: «pus música algumas vezes, mas sempre em discotecas de amigos».

pergunta simples (ou talvez não tão simples assim) como «quem é o Zé Diogo Quintela quando não está a fazer ninguém rir?», a resposta vem temperada com o sentido de humor que lhe conhecemos: «o Zé Diogo (eu) é a mesma pessoa quando tenta fazer alguém rir (trabalho) ou quando tenta cozinhar (não é trabalho, mas também faz rir)». Cozinha, portanto, não é o seu forte. «E ninguém gosta que eu cozinhe», adianta. Comer, no entanto, é um dos seus “hobbies”. E ler, também. Philip Roth, Evelyn Waughn e Miguel Esteves Cardoso são os seus autores de eleição. E, de momento, vai a meio de “Calma! (Cool it)”, do «ambientalista céptico» dinamarquês

vestuário do dia-a-dia e se se considera uma “fashion victim”. «Acho que a moda é que é a minha vítima.» Acessório favorito, tem? «Uso algumas t-shirts de que gosto até rasgar». Voltando à música. Se fosse para uma ilha deserta com gira-discos e electricidade, Zé Diogo Quintela levaria “Pet Sounds”, dos Beach Boys, “Crash”, da Dave Matthews Band, “Grace”, de Jeff Buckley”, um “best of” dos a-ha e «o disco com as músicas da claque do Sporting». Seria, sem dúvida, um náufrago com um grande sentido de humor, sentado na sua ilha deserta a ouvir «só eu sei porque não fico em casa». Entre o vinil, o CD, o mp3 ou a obsoleta cassete,


o outro lado I zé diogo quintela I

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ambujeira do Mar, 2 de Agosto de 2008. No palco principal do festival Sudoeste tmn, Manu Chao «incendiava» a plateia, 37.000 almas ao rubro. Entretanto, e apesar da contagiante actuação do franco-latino, começou a notar-se, ainda o concerto ia a meio, alguma movimentação rumo ao palco secundário. O motivo: acabara de entrar em cena a dupla 2 DJs do C******. Isto é: o jornalista Nuno Miguel Guedes e o humorista Zé Diogo Quintela, que, perante uma audiência convicta de que iria assistir a umas quantas tiradas espirituosas ao bom estilo do Gato Fedorento, «defenderam a ideia do não DJ até à exaustão» – citando o Diário de Notícias de dois dias depois. Questionado sobre a sua carreira de

Foram raras as vezes em que o fez que não puramente por amizade. Porquê a Zambujeira, então? «Pelo irrecusável que é, por exemplo, pôr os Wham!, no Sudoeste», responde. «Irrecusável e irresponsável.»

«FORA

DO GATO FEDORENTO sou

uma pessoa normal, faço o mesmo que toda a gente faz quando não trabalha». Perante o convite para esta entrevista, ficou, ao início, de pé atrás. «Não acho que mereça a atenção do público. É muito maçador», acrescenta. A questão, porém, é que, sem fazer grande esforço, Zé Diogo é capaz de improvisar três ou quatro piadas de situação no curto espaço de tempo que dura esta sessão fotográfica. E a verdade é que, até para uma

Bjorn Lomborg. No que respeita a música, afirma que perde «mais tempo a ler fofocas sobre os músicos do que sobre música propriamente dita». Outro dos seus passatempos favoritos é ver televisão. «É isso que o ajuda a relaxar, a esquecer as preocupações do dia-a-dia?», pergunto. «Ajuda a descansar; não ajuda a esquecer nada, porque eu assento tudo em agendas e telemóvel». Por falar em telemóvel: usa «um Nokia qualquer», que «era o mais barato, dentro dos que tinham as funções de que precisava». O seu «favorito do momento», assegura, como quem diz que essa é a menor das suas preocupações. Viro a agulha para outro lado, indagando se se preocupa muito com o

VINIL, CD, MP3 OU CASSETE? «TANTO FAZ.

CONSIGO SEMPRE RISCAR TUDO. APOSTO QUE TAMBÉM CONSIGO RISCAR UM MP3». DJ («se é uma carreira, foi um “flop”», antecipa), Zé Diogo começa por estabelecer um ponto prévio: «eu não sou DJ; sou, quando muito, um “mete discos”; não misturo, não crio “batidas”, ou lá o que é». Dito isto, avança com uma explicação: «foi a maneira que encontrei para ouvir a música de que gosto à noite. Normalmente, ninguém a punha.» E que música é essa? Talvez Beach Boys, Bee Gees, Beatles, Abba, Jeff Buckley, Weezer, Rufus Wainright, Dave Matthews, alguns dos seus artistas favoritos. Este «metimento de discos» não foi um exclusivo do festival alentejano: «pus música algumas vezes, mas sempre em discotecas de amigos».

pergunta simples (ou talvez não tão simples assim) como «quem é o Zé Diogo Quintela quando não está a fazer ninguém rir?», a resposta vem temperada com o sentido de humor que lhe conhecemos: «o Zé Diogo (eu) é a mesma pessoa quando tenta fazer alguém rir (trabalho) ou quando tenta cozinhar (não é trabalho, mas também faz rir)». Cozinha, portanto, não é o seu forte. «E ninguém gosta que eu cozinhe», adianta. Comer, no entanto, é um dos seus “hobbies”. E ler, também. Philip Roth, Evelyn Waughn e Miguel Esteves Cardoso são os seus autores de eleição. E, de momento, vai a meio de “Calma! (Cool it)”, do «ambientalista céptico» dinamarquês

vestuário do dia-a-dia e se se considera uma “fashion victim”. «Acho que a moda é que é a minha vítima.» Acessório favorito, tem? «Uso algumas t-shirts de que gosto até rasgar». Voltando à música. Se fosse para uma ilha deserta com gira-discos e electricidade, Zé Diogo Quintela levaria “Pet Sounds”, dos Beach Boys, “Crash”, da Dave Matthews Band, “Grace”, de Jeff Buckley”, um “best of” dos a-ha e «o disco com as músicas da claque do Sporting». Seria, sem dúvida, um náufrago com um grande sentido de humor, sentado na sua ilha deserta a ouvir «só eu sei porque não fico em casa». Entre o vinil, o CD, o mp3 ou a obsoleta cassete,


o outro lado I zé diogo quintela I

tanto lhe faz: «consigo sempre riscar tudo». E afirma-o orgulhosamente, como se dominasse uma arte perdida: «aposto até que também consigo riscar um mp3». Quando o seu Sporting joga em Alvalade, Zé Diogo é daqueles que não ficam em casa: «tenho lá lugar cativo». E gosta de, todas as semanas, jogar a sua futebolada. Há seis meses, começou também a aprender ténis, outra das suas modalidades favoritas. Até aos 23 anos, foi ainda jogador federado de rugby. Agora só vê.

Z é

A PROPÓSITO... Que tal foi a experiência do Gato Fedorento ao vivo?

Boa. Mas ainda bem que terminou. Qual de vós os quatro é mais engraçado?

São os três muito engraçados, cada qual à sua maneira. Tem um “sketch” favorito?

Gosto muito do «tsunami de informáticos». E do «javardolas que fala francês». Que frase do Gato Fedorento lhe dizem mais quando o encontram na rua?

«Falam, falam…» Que pergunta já não suporta que lhe façam em entrevistas?

Se é angustiante tentar ter piada e não saber se se vai conseguir. Qual é a sua opinião sobre o estado do humor em Portugal?

Está bom, com muita variedade. Se não fosse humorista, o que seria?

Não faço ideia.

MARÇO, ABRIL

2008

Onde é que não se vê daqui a 20 anos?

38

A trabalhar.

EMBORA NÃO SEJA fã da saga Star

Trek, foi no papel de tripulante intergaláctico, ao serviço das campanhas do Meo, que o público português o viu durante este Verão. Porém, longe da ribalta, preparava-se já o aguardado “Zé Carlos”, programa que marca o regresso da trupe Gato Fedorento à SIC. Nestes dias que correm, os quatro humoristas continuam extremamente ocupados, entre reuniões e gravações. Ainda assim, apesar do ritmo de trabalho, Zé Diogo vai conseguindo tirar uns dias de férias. «Bastantes, felizmente.» Não consegue, contudo, despir por completo a pele de humorista e lá acaba por fazer rir quem estiver consigo. «É a mesma coisa que perguntar ao um jornalista se, no seu tempo livre, não faz perguntas». Mesmo no pouco tempo que estivemos com ele, soltou-se a risota por diversas vezes – nossa, entenda-se; porque Zé Diogo consegue lançar a sua piada cirúrgica e manter a cara séria, como se não fosse nada com ele. Falava-se de férias. Gosta de viajar, desde que «para não muito longe ou muito incivilizado». Londres é a sua cidade de eleição – e é lá que fica o seu museu preferido, a National Gallery. Em termos de países, elege os Estados Unidos. O essencial é

que sejam férias de «não fazer nada». «Na praia», por exemplo. E o hotel pode ser um qualquer, «desde que a cama seja grande».

DESCONVERSAS

SOLTAS [TEATRO] Já foi ver o Ricardo

«TRABALHAR

COM os meus ami-

gos.» É aquilo que mais lhe agrada na vida de humorista. As câmaras não o põem nervoso. O que o incomoda mesmo são as «estreias em palco» – recordando os tempos em que o Gato Fedorento andou a fazer espectáculos ao vivo. Mas tudo tem um lado positivo: «o fim dessas estreias», um alívio que aponta como o melhor momento da sua carreira. O palco, depreendo, não será o seu lugar. Até porque nem se considera actor. Ou melhor: vê-se antes como um argumentista que teve de se tornar actor. Os maus momentos, ultrapassa-os «esperando que acabem». E os bons, comemora-os «com um lauto jantar». Confesso que desconhecia essa palavra. Lauto. «Abundante», fiquei a saber. Está-se sempre a aprender… Aliás: «conhecimento razoável da língua» é, para si, uma das duas características essenciais de um humorista. A outra é «bom poder de observação». Uma espreitadela, ainda que superficial, ao trabalho do Gato Fedorento corrobora a fórmula. Será essa, talvez, a receita para o estrondoso sucesso dos seus “sketches” – que, logo no dia seguinte à sua transmissão televisiva, enriquecem o léxico quotidiano de milhares (milhões, talvez) de portugueses com as suas frases-chave. Exemplo clássico disso é a «tranquilidade» de Paulo Bento. Ou «o homem a quem parece que aconteceu não sei quê», que também trouxe novo protagonismo à palavra «incólume». Lá que falam, falam…, é verdade. Mas, mais que não seja, ensinam-nos umas quantas palavras caras, enquanto vão castigando os costumes e, com isso, nos fazem rir.

Araújo Pereira, em “Como fazer coisas com as palavras”?

Sim. O que achou?

Acho que ele fica muito melhor careca. [ARTE] Tem uma corrente ou um artista favorito?

Não tenho artista favorito. [Gosto de] qualquer corrente, desde que seja gira. Mas em princípio prefiro quadros em que pintam dentro das linhas. [GASTRONOMIA] Que tipo de culinária prefere?

A farta. [AUTOMÓVEIS] Que carro usa no seu dia-a-dia?

O meu. Mas ando pouco. [DESAFIOS] Quais os seus principais desafios para o futuro?

Ter dinheiro suficiente para não me preocupar que a crise afecte a minha família. [MODA] Considera-se uma “fashion victim”?

Acho que a moda é que é minha vítima.


o outro lado I zé diogo quintela I

tanto lhe faz: «consigo sempre riscar tudo». E afirma-o orgulhosamente, como se dominasse uma arte perdida: «aposto até que também consigo riscar um mp3». Quando o seu Sporting joga em Alvalade, Zé Diogo é daqueles que não ficam em casa: «tenho lá lugar cativo». E gosta de, todas as semanas, jogar a sua futebolada. Há seis meses, começou também a aprender ténis, outra das suas modalidades favoritas. Até aos 23 anos, foi ainda jogador federado de rugby. Agora só vê.

Z é

A PROPÓSITO... Que tal foi a experiência do Gato Fedorento ao vivo?

Boa. Mas ainda bem que terminou. Qual de vós os quatro é mais engraçado?

São os três muito engraçados, cada qual à sua maneira. Tem um “sketch” favorito?

Gosto muito do «tsunami de informáticos». E do «javardolas que fala francês». Que frase do Gato Fedorento lhe dizem mais quando o encontram na rua?

«Falam, falam…» Que pergunta já não suporta que lhe façam em entrevistas?

Se é angustiante tentar ter piada e não saber se se vai conseguir. Qual é a sua opinião sobre o estado do humor em Portugal?

Está bom, com muita variedade. Se não fosse humorista, o que seria?

Não faço ideia.

MARÇO, ABRIL

2008

Onde é que não se vê daqui a 20 anos?

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A trabalhar.

EMBORA NÃO SEJA fã da saga Star

Trek, foi no papel de tripulante intergaláctico, ao serviço das campanhas do Meo, que o público português o viu durante este Verão. Porém, longe da ribalta, preparava-se já o aguardado “Zé Carlos”, programa que marca o regresso da trupe Gato Fedorento à SIC. Nestes dias que correm, os quatro humoristas continuam extremamente ocupados, entre reuniões e gravações. Ainda assim, apesar do ritmo de trabalho, Zé Diogo vai conseguindo tirar uns dias de férias. «Bastantes, felizmente.» Não consegue, contudo, despir por completo a pele de humorista e lá acaba por fazer rir quem estiver consigo. «É a mesma coisa que perguntar ao um jornalista se, no seu tempo livre, não faz perguntas». Mesmo no pouco tempo que estivemos com ele, soltou-se a risota por diversas vezes – nossa, entenda-se; porque Zé Diogo consegue lançar a sua piada cirúrgica e manter a cara séria, como se não fosse nada com ele. Falava-se de férias. Gosta de viajar, desde que «para não muito longe ou muito incivilizado». Londres é a sua cidade de eleição – e é lá que fica o seu museu preferido, a National Gallery. Em termos de países, elege os Estados Unidos. O essencial é

que sejam férias de «não fazer nada». «Na praia», por exemplo. E o hotel pode ser um qualquer, «desde que a cama seja grande».

DESCONVERSAS

SOLTAS [TEATRO] Já foi ver o Ricardo

«TRABALHAR

COM os meus ami-

gos.» É aquilo que mais lhe agrada na vida de humorista. As câmaras não o põem nervoso. O que o incomoda mesmo são as «estreias em palco» – recordando os tempos em que o Gato Fedorento andou a fazer espectáculos ao vivo. Mas tudo tem um lado positivo: «o fim dessas estreias», um alívio que aponta como o melhor momento da sua carreira. O palco, depreendo, não será o seu lugar. Até porque nem se considera actor. Ou melhor: vê-se antes como um argumentista que teve de se tornar actor. Os maus momentos, ultrapassa-os «esperando que acabem». E os bons, comemora-os «com um lauto jantar». Confesso que desconhecia essa palavra. Lauto. «Abundante», fiquei a saber. Está-se sempre a aprender… Aliás: «conhecimento razoável da língua» é, para si, uma das duas características essenciais de um humorista. A outra é «bom poder de observação». Uma espreitadela, ainda que superficial, ao trabalho do Gato Fedorento corrobora a fórmula. Será essa, talvez, a receita para o estrondoso sucesso dos seus “sketches” – que, logo no dia seguinte à sua transmissão televisiva, enriquecem o léxico quotidiano de milhares (milhões, talvez) de portugueses com as suas frases-chave. Exemplo clássico disso é a «tranquilidade» de Paulo Bento. Ou «o homem a quem parece que aconteceu não sei quê», que também trouxe novo protagonismo à palavra «incólume». Lá que falam, falam…, é verdade. Mas, mais que não seja, ensinam-nos umas quantas palavras caras, enquanto vão castigando os costumes e, com isso, nos fazem rir.

Araújo Pereira, em “Como fazer coisas com as palavras”?

Sim. O que achou?

Acho que ele fica muito melhor careca. [ARTE] Tem uma corrente ou um artista favorito?

Não tenho artista favorito. [Gosto de] qualquer corrente, desde que seja gira. Mas em princípio prefiro quadros em que pintam dentro das linhas. [GASTRONOMIA] Que tipo de culinária prefere?

A farta. [AUTOMÓVEIS] Que carro usa no seu dia-a-dia?

O meu. Mas ando pouco. [DESAFIOS] Quais os seus principais desafios para o futuro?

Ter dinheiro suficiente para não me preocupar que a crise afecte a minha família. [MODA] Considera-se uma “fashion victim”?

Acho que a moda é que é minha vítima.


PORTEFÓLIO T magazine Entrevista Armindo Araújo Reportagem Festival Sudoeste tmn Perfil Kanye West Roteiro Golegã Entrevista Aurea Roteiro Aveiro Entrevista/Perfil André Carrilho Reportagem de viagem Méribel & Courchevel Perfil/Entrevista Zé Diogo Quintela


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