Itajaí, junho de 2015
Leitura
Itajaí em
C quadrinhos
A cidade é cenário para uma história de suspense, totalmente produzida por um itajaiense
Gabriel Elias da Silva
E
u e meus amigos estávamos sentados na sala de aula, numa quinta-feira à noite, decidindo como faríamos um programa de entrevistas na rádio no outro dia, já que o nosso entrevistado tinha nos abandonado na véspera da gravação. Num momento sem criatividade, eu olhava o
facebook em busca de uma boa pauta para a nossa entrevista, e não apenas uma boa pauta, mas um bom entrevistado que estivesse disposto a marcar uma entrevista da noite para o dia, e comparecer na Univali para o programa. Acho que saiu até fumaça da minha cabeça quando eu me lembrei do lançamento de uma história
em quadrinhos escrita por um itajaiense. A HQ estava sendo lançado naquela hora, no Teatro Municipal de Itajaí. Eu já perdi as contas de quantas aventuras eu passei com meus amigos neste um ano de faculdade: até carro de polícia a gente já perseguiu para ter uma boa história para contar. Decidimos então procurar
Juliano, o itajaiense que estava lançando Lama, uma história em quadrinhos ambientada em Itajaí, mas não na Itajaí que conhecemos hoje, uma Itajaí um pouco menos movimentada e com nada de asfalto: Itajaí nos 60. As histórias em quadrinhos fizeram parte da infância de muitos de nós, os jovens desta geração. No Brasil, começaram a ser produzidas no século 19 e, atualmente, existem histórias para crianças e histórias para adultos. Juliano
“
meio de uma multidão, sentado diante de uma mesa e canetas, e uma taça de champagne ao seu lado, Juliano sorria para fotos e dava autógrafos. Simpático e simples, com um bom papo e gírias de surfista, Juliano recebeu nosso grupo e, além de autografar o livro que comprei dele, aceitou nossa proposta de vir até a Univali e nos conceder a entrevista, contando o passado, passando pelo presente e indo até o futuro.
Imagens: divulgação
Eu estou aprendendo constantemente, então esse foi o estudo, e estou esperando as criticas para melhorar aquilo que eu deixei a desejar Juliano Andrade Silva
Andrade Silva é um destes criadores de histórias em quadrinhos para adultos. Todo o texto e os desenhos do livro foram feitos por ele. Chegamos ao Teatro Municipal de Itajaí com a missão de conhecer Juliano e o seu trabalho e, quem sabe, convidá-lo para uma entrevista. E deu certo. No
Cobaia
04
Itajaí na lama O nome, Lama, faz referência à lama do mangue de Itajaí, além de ter tudo a ver com a situação que o personagem principal do livro passa: “O nosso jornalista vai
Itajaí, junho de 2015
e começou a ler uma revista cheia de desenhos. Juliano se interessou pelos desenhos e ficou impressionado com o que via. Algum tempo depois a mãe dele já estava comprando papel pardo em metro para Juliano desenhar. Ele passava horas deitado em cima do papel, rabiscando. Foi assim que surgiu um desenhista. Ele desenhava Ex-man e Thundercats. Além de surfar e desenhar, Juliano dedicou um tempo de sua vida ao Jornalismo. Ele é quase formado, mas abandonou o curso para trabalhar com desenhos. “Já trabalhei com tatuagem, eu tive
Foto: reprodução Facebook
investigando uma história e vai descobrindo que é cada vez mais sórdida e vai se afundando cada vez mais nessa lama”, conta Juliano. Esse jornalista não é um jornalista qualquer, fruto da imaginação de Juliano. Esse jornalista na verdade é uma homenagem ao já falecido jornalista Renato Mannes, amigo de Juliano. Juliano diz que até agora não descobriu se desenha bem, ainda está aprendendo. Mas ele começou a desenhar em torno dos 5 anos de idade. A história é interessante: um pedreiro estava trabalhando na casa de Juliano, quando tirou a marmita, um café e pão,
Juliano, no lançamento do livro, sorrindo para fotos com amigos, familiares e pessoas que queriam conhecer o seu trabalho
um estúdio de tatuagem durante dois anos. Depois trabalhei com estampas, desenhando estampas, na Colcci, na MCD, e na DIMY, depois parti para os quadrinhos. Fui para uma escola de quadrinhos que é especializada nisso, a Impacto Quadrinhos, em São Paulo, que hoje em dia se chama Instituto dos Quadrinhos. Lá que eu comecei a aprender a desenhar mesmo, porque o meu autodidatismo chegou só num certo nível. É muito difícil conseguir desenvolver o teu trabalho se tu não buscar uma informação, um conhecimento. Treino também, disciplina, isso é muito necessário”, explica. Na área jornalística os interesses de Juliano eram a análise social, antropologia, sociologia. Ele diz que escreve bem, mas o que ele realmente gosta de fazer é desenhar. Ano passado Juliano foi vencedor do Prêmio Fluir de desenho, onde ele fez uma composição de uma onda com o Canto do Morcego, em Itajaí. A ideia para escrever o livro, inicialmente, pode parecer um pouco estranha, mas depois começa a fazer sentido. Ele estava assistindo ao filme Coração Satânico, de Alan Parker. O filme é um suspense policial, ambientado nos anos 60. Juliano diz que a arquitetura do lugar é bem parecida com a arquitetura de Itajaí. Foi aí que ele pensou: “Vou fazer um projeto pra Lei de Incentivo à Cultura, desenhando os prédios antigos de Itajaí nos anos 60. Eu curto desenhar preto e branco. Combina, né, fazer alguma coisa dos anos 60 em preto e branco, eu acho que tem tudo a ver. Eu busquei isso, busquei dar essa entonação para a história”. Desde o início da produção, com as pesquisas de como era a cidade naquela época, até o dia do lançamento, passando pela escrita do roteiro e os desenhos, foi um ano e meio dedicado ao livro. Os desenhos foram feitos no papel, depois escaneados e clareados no
05
photoshop. Tudo em preto e branco. Durante esse tempo, Juliano trabalhava no caixa do Clube Itamirim durante a tarde e a noite, e desenhava durante a manhã e um pedaço da tarde. “Nesse tempo todo eu só trabalhei, domingo eu só descansava. Esse foi o problema, é estressante, é cansativo”, desabafa. Mas, quando Juliano pensava em desistir, ele teve o apoio da família, que fez tudo isso acontecer. Juliano agradece o apoio e diz que se não tivesse sido isso, Lama não teria acontecido. “É difícil tomar uma decisão assim de chegar e agora eu vou me largar nisso, eu vou passar um ano internado nesse processo.
A capa do livro
Volta e meia eu falava: eu vou largar tudo, eu vou abandonar. E eles diziam: não cara, como que tu vai abandonar agora? Agora que ta no finzinho? Toca a ficha. Foi esse apoio moral, esse incentivo, que me fez chegar até o final com esse trabalho”. Já pensando no próximo, Juliano tem boas ideias e está fazendo uma pesquisa com lendas urbanas, e vai juntar todas elas para uma próxima história em quadrinhos. No momento ele espera as críticas: “Eu estou aprendendo constantemente, então esse foi o estudo, e estou esperando as criticas para melhorar aquilo que eu deixei a desejar”.