Primeira Mão Junho 2018

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nº 150 junho/2018

OCUPAÇÕES URBANAS

Moradia, um direito de todos p. 04

Congo: cultura capixaba cantada em verso e prosa p. 22

No cyberbullying a ofensa é virtual, mas o sofrimento p. 36 é real


PRIMEIRA EDITORIAL MÃO A

cultura faz parte da vida de todo ser humano, um fenômeno que inclui conhecimento, arte, crenças, lei, moral, costumes, hábitos e aptidões adquiridos pelas pessoas. A cultura é, no entanto, algo que está sempre em desenvolvimento, afinal, ela é influenciada por novas maneiras de pensar e de ver o mundo. Essa edição conta um pouco da cultura no Espírito Santo, representada por suas bandas de Congo, seus novos escritores e pelos artistas das ruas que colorem as ruas das cidades com o grafite. A terceira revolução tecnológica está batendo na porta dessa geração, que com cada vez mais acesso à internet estão reinventando as relações – seja para o bem, seja para o mal. Essa é a proposta de discussão nesta edição da revista Primeira Mão, com reportagens dinâmicas e debates atuais envolvendo as relações humanas com as novas tecnologias. Mude seus conceitos sobre padrões sociais ao saber mais sobre as histórias chocantes de vítimas de cyberbullying; saiba como educar a nova geração para receber as novas tecnologias; exerça seu poder de voto com mais consciência utilizando aplicativos; e junte forças para salvar o meio ambiente com tecnologias convencionais e sociais. Além de abraçar as novas tecnologias e entender a importância da cultura, a Primeira Mão se propõe a discutir um tema muito importante para o momento social que vivemos: direitos humanos. A revista leva um novo olhar para questões de extrema importância social, como a situação dos moradores de rua, o trabalho infantil, a luta LGBT e também para as ocupações urbanas. As reportagens desta edição trazem um olhar humanizado e informativo e buscam compreender e investigar a nossa realidade. Nesta terceira edição da Revista Primeira Mão, os estudantes do 6º período de Jornalismo da Ufes se despedem do projeto, deixando sua marca e identidade nessa etapa de aprendizado da dinâmica jornalística, com a sensação de dever cumprido. A revista foi não somente um lugar de aprendizado profissional mas um espaço onde foi possível adquirir conhecimentos para a vida.

Turma do 6º período de Comunicação Social - Jornalismo

fb.com/primeiramao

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jornal1mao@gmail.com

@revistaprimeiramao


DIREITOS HUMANOS p. 04-09

Pode entrar, aqui é o meu lar

p. 10-14

Trabalho infantil na mira da erradicação

p. 15-18

Invisíveis aos olhos da sociedade

p. 19-21

CULTURA p. 22-26

Congo capixaba: misticismo, fé e cultura

p. 27-28

Grafite: arte que dá cor e vida às ruas da cidade

p. 29-35

Espírito Santo: Riqueza em forma de arte

TECNOLOGIA p. 36-39

ELES me perseguem: A violência virtual na forma de Cyberbullying

p. 40-42

Da telinha do celular para Brasília

p. 43-46

Tecnologia a favor do meio ambiente

Orgulho e Preconceito: a tragetória dos direitos LGBT no Brasil Foto: Thais Marchesi

Primeira Mão é uma revista laboratório, produzida pelos alunos do 6º período do curso de Comunicação Social/Jornalismo, da Universidade Federal do Espírito Santo. Av. Fernando Ferrari, 514, Goiabeiras | Vitória - ES CEP 29075-910 jornal1mao@gmail.com. Ano XXVII, número 150. Semestre 2018/1 Reportagem e edição: Ana Luisa Monteiro Angelo Parrela Bruna Pereira Camila Nascimento Carolina Moreira

Danielle Gonçalves Eliza Frizzera Gessica Lopes Henrique Andreão Izabela Bellumat Paulo Marcos

Richele Ribeiro Silvia Fonseca Thais Marchesi Thaisa Côrtes Edição de arte: Thais Marchesi

Professor Orientador: Rafael Bellan Diagramação: Bruna Pereira, Carolina Moreira, Eliza Frizzera, Henrique Andreão, Richele Ribeiro

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DIREITOS HUMANOS

Pode entrar, aqui é o meu lar

Com a crescente do déficit habitacional, prédios são ocupados no Centro de Vitória e escancaram a problemática da falta de moradia e a necessidade de um lar.

Foto: Thaisa Côrtes

Thaísa Côrtes

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O antigo Edifício Ada, hoje Ocupação Carolina Maria de Jesus

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“Escrevo a miséria e a vida infausta dos favelados. Eu era revoltada, não acreditava em ninguém. Odiava os políticos e os patrões, porque o meu sonho era escrever e o pobre não pode ter ideal nobre. Eu sabia que ia angariar inimigos, porque ninguém está habituado a esse tipo de literatura. Seja o que Deus quiser. Eu escrevi a realidade”. Palavras de Carolina Maria de Jesus. Favelada, negra e catadora de papel.

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Palavras contidas no livro “Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada”, lançado em 1960 e que transformou Carolina em revelação literária naquele ano: sua obra foi traduzida em 16 idiomas e levada a mais de 40 países. Carolina de Jesus se faz presente hoje, mesmo depois de 41 anos de sua morte. Presente no Centro de Vitória, na Avenida Jerônimo Monteiro, mais especificamente. Presente em nome e ideal. Presente no

edifício Ada, ocupado desde outubro de 2017 por 30 famílias. O antigo Ada, que há sete anos estava abandonado, é hoje a “Ocupação Carolina Maria de Jesus”. “A gente deu esse nome, assim como a da ocupação Chico Prego, pelo peso histórico que eles têm. Uma forma de homenagear e inspirar a luta”, revela Lucas Martins, integrante das Brigadas Populares, organização que participa da coordenação da ocupação.


DIREITOS HUMANOS “ANTES EDIFÍCIO ADA, HOJE OCUPAÇÃO CAROLINA MARIA DE JESUS” Prédio azul de nove andares, localizado na Praça Manoel Silvino Monjardim, próximo à Avenida Jerônimo Monteiro, no Centro de Vitória. É o endereço da “Ocupação Carolina Maria de Jesus”. Antes conhecido como Edifício ADA, o prédio estava desocupado e sem qualquer destinação social há mais de sete anos, segundo Lucas Martins. “O ADA é um prédio privado. Ele já foi há muito tempo cedido para o Governo Federal e para o Procon. Depois de um tempo, os governos começaram a construir seus próprios prédios e ele ficou abandonado e sujeito à especulação imobiliária. Estava há mais de sete anos desocupado e abandonado”, conta Lucas.

No Estado, os dados trazidos pelo Instituto Jones dos Santos Neves, vinculado à Secretaria de Economia e Planejamento (SEP), em 2017, apontam um déficit habitacional de 74.170 famílias, sendo que 47,6% (35.352 famílias) delas são da Microrregião Metropolitana da Grande Vitória. Dessas famílias, quase a maioria do déficit está relacionado ao ônus excessivo com aluguel (49,03%). Para a professora Maria Helena Elpidio, do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Espírito Santo e pesquisadora nas áreas de território e questões urbanas, a luta pela moradia é mais do que legítima. “A luta pela moradia sempre foi uma das lutas mais legítimas em todo o processo de construção do capitalismo. A moradia é um direito humano fundamental e essas lutas não são só legítimas, como necessárias para tentar diminuir um pouco a disparidade da desigualdade que é o modo

de produção da cidade”, defende a pesquisadora. Atualmente, o Centro de Vitória possui mais de 60 imóveis vazios, segundo a Associação de Moradores do Centro de Vitória, a AMACentro. Desses, o Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM) possui 4 ocupações: Resistência Urbana (na Rua Loren Reno, ao lado do antigo Colégio Batista do Centro); Chico Prego (Edifício Santa Cecília, no Parque Moscoso); uma ocupação ainda sem nome (prédio atrás da ocupação Carolina de Jesus); e, Carolina Maria de Jesus (ao lado da sede administrativa da Defensoria Pública). Tá vendo aquele edifício, moço? A letra “Cidadão” de Zé Geraldo narra a saga de um eu-lírico que não pode usufruir das obras por ele construídas, além disso, aponta alguns problemas sociais tão comuns no Brasil. E um em especial, a falta de moradia. “A habitação é uma necessidade, é mais que um

direito”, lembra a professora de Arquitetura e Urbanismo da Ufes, Clara Luiza Miranda. “Ninguém consegue fazer nada se não tem um lugar para voltar. Não consegue trabalhar, criar os filhos ou cuidar de si mesmo, se não tem um canto para se recolher e se proteger”, diz. Há cinco meses na ocupação Carolina Maria de Jesus, o desempregado Luiz Medeiros, de 50 anos, nunca antes havia morado em um local que não precisasse pagar pelo aluguel. “As dificuldades de quem tem que pagar aluguel na cidade acabaram me trazendo até aqui. O desemprego bateu e passei a não conseguir arcar com esse compromisso”, lembra. No fim do mês, Luiz tinha que desembolsar uma quantia aproximada de R$680 para pagar o aluguel, a água e a luz, mesmo desempregado. “A sensação de você estar morando em um lugar e não pagar o aluguel é muito boa. Sem comparação de você ser pressionado, sabendo que está desempregado PRI MEI RA

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Foto: Thaisa Côrtes

DIREITOS HUMANOS

Desempregado e sem condições de pagar aluguel, Luiz Medeiros aceitou convite da amiga Ivonete e foi morar na ocupação

e vai ter que aparecer com o dinheiro a cada trinta dias. O mês mal-mal começa e já finaliza”, conta o ocupante. O problema vivido por Luiz era a realidade de Wilson Marinho e sua família. Os altos custos com o aluguel fizeram com que conhecesse o movimento de ocupação e viesse para o Carolina. Antes, em Vila Garrido, Vila Velha, Wilson tinha que desembolsar uma quantia considerável do seu salário como segurança para pagar a casa em que morava com a mulher e os três filhos. “Eu cheguei primeiro, há três meses, e minha família está no processo de mudança. A nossa vinda foi por causa do aluguel, não estava conseguindo pagar”, relata Wilson. O ônus excessivo com o aluguel atinge 32.568 fa-

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mílias só na Grande Vitória. O encargo é um dos componentes que auxiliam no cálculo do déficit habitacional e, quando acrescido ao desemprego, potencializa a questão da falta de moradia. Foi um tempo de aflição De acordo com o IBGE, nos três primeiros meses de 2018, o Brasil tinha 13,4 milhões de pessoas desempregadas. Os jovens são os que mais sofrem com a falta de oportunidades e passaram a ocupar postos de menor qualidade. A proporção de pessoas de 16 a 29 anos em trabalhos formais caiu de 60,3% para 58,4%, de 2014 para 2016, respectivamente, segundo o IBGE. Bruna dos Santos tem 27 anos. Morou em São Conrado, Vila Velha,

e devido aos problemas trazidos pela chuva acabou se mudando para o Centro de Vitória, e pagou aluguel por um tempo. Bruna é artista, Mc no grupo Melanina Capixaba e trabalha também como tranceira. Autônoma e com preocupação do aluguel, conheceu o movimento de ocupação. “Fiquei sabendo do movimento de ocupações e vi que a galera estava precisando de um fortalecimento, de pessoas que pudessem somar na causa das moradias. Resolvemos participar da ocupação, a convite também de alguns amigos que já faziam parte e que são do pólo cultural de Vitória”, conta. Bruna estava na casa da coordenadora da Ocupação , Carolina Maria de Jesus”


DIREITOS HUMANOS Ivonete Nunes da Silva e conversavam sobre currículos, pois precisava atualizar o seu para conseguir um emprego. “A gente tem um pouco mais de facilidade por morar no Centro agora, mas ainda vejo que a questão do trabalho, em si, tem poucas vagas na região. Isso em relação à quantidade de pessoas desempregadas que tem aqui no meu prédio”.

nova. Um filho ficou com o ex-marido e o outro, o mais velho, conseguiu uma sala no mesmo prédio da mãe. Definir a importância de se ter um lugar para morar é, segundo a professora Maria Helena Elpidio, associar-se à própria dimensão humana. “Desde o mais elementar, como o direito ao descanso e ao banho à questão de que isso reproduz um conjunto de valores. O sentido da moradia, enquanto direito fundamental humano, precisa estar assegurado numa sociedade, porque se não é a barbárie”, afirma. Além disso, a professora Elpidio explica que a função social da moradia urbana é garantir a habitação, o usufruto das pessoas. “Ele fechado não está cumprindo a sua função social, mas sim uma função de especulação, ainda que seja um prédio público”.

Foto: Thaisa Côrtes

E nem posso olhar para o prédio O desemprego é uma realidade entre as famílias que lá ocupam. “As pessoas aqui são reais. Estão não por afronta, mas sim por necessidade e precisando de uma moradia”, lembra Bruna. Uma dessas pessoas reais é a Ivonete. Virou coordenadora da ocupação e tem em suas mãos o trabalho de ajudar as demais famílias e junto a elas, co-

locar ordem nos oito andares da Carolina de Jesus. “Sempre trabalhei como encarregada de limpeza, hoje eu sou autônoma. Morava no bairro da Penha, na casa que era cedida pelo meu ex-cunhado”, assim Ivonete começa contar a sua história, enquanto recebe os vizinhos e prepara um bolo em seu apartamento, ao lado da filha Débora. “Ele nunca me pediu a casa diretamente, mas ouvia dizer que queria reformar para alugar. Tive que procurar um lugar pra mim, mas só achava aluguel acima dos R$500 e não dava. Acabei conhecendo a ocupação através de uma amiga, que está no Chico Prego. Conversei com o Lucas e hoje estou aqui”, narra a coordenadora da Carolina de Jesus. Ivonete mora no primeiro andar da ocupação junto com a filha mais

Ivonete Nunes, coordenadora da ocupação Carolina Maria de Jesus com a filha Débora Silva PRI MEI RA

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DIREITOS HUMANOS salário mínimo, seja prioridade nesse tipo de ação”, explica a pesquisadora. De um prédio vazio e sem funcionalidade, o antigo Ada é hoje o lar dessas famílias. Elas prezam pela organização e o ambiente tranquilo que conseguiram e mantém ao longo desses sete meses. Do lar e cuidando dos filhos Danilo e Danielle, Bianca Campos de Jesus está desde o início da ocupação. Ela divide duas salas com o ex-marido Reinaldo Barbosa, com quem mantém a amizade, o respeito e o anseio por uma moradia. “São sete meses aqui já. Morar no Carolina é tranquilo, além das facilidades de estar no Centro da Cidade, a convivência com os vizinhos é boa e é tudo muito bem organizado” . “O vazio urbano coexiste com os moradores que habitam o centro”, afirma presidente da AMACentro. A Associação de Moradores do Centro de Vitória (AMACentro), realizou o levantamento de pontos desocupados no bairro e transformou esses dados em um mapa onde informa os locais exatos dos mais de 60 imóveis vazios. Para o presidente da AMACentro Everton Martins esses locais geram a sensação de esvaziamento e de insegurança. “O vazio urbano coexiste com os moradores que habitam o centro. E, além disso, tem-se a imagem de um centro vazio e a sensação de inseguranBianca, os filhos e o ex-marido em harmonia na ocupação ça e de abandono”, conta.

Foto: Thaisa Côrtes

Que eu ajudei a fazer Para além das questões do desemprego e dos gastos com aluguel, há ainda uma outra realidade: a dificuldade de conquistar a casa própria. “A lógica que se tem hoje é a lógica privatizante. É uma lógica que tem privilegiado, sobretudo, o setor privado e financeiro de habitação”, esclarece Maria Helena Elpidio. E mesmo com os programas habitacionais, como o do Governo Federal “Minha Casa, Minha Vida”, que deveriam auxiliar na compra da casa própria e diminuir o déficit habitacional, viu-se o contrário, segundo a professora Clara Luiza Miranda. “Como ação para diminuir o déficit, ele aumentou, porque os empresários ao invés de construir

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para a classe mais baixa, eles não conseguiram fazer as unidades, alegando que não tinham lucro. Então, essas pessoas tiveram que ocupar regiões cada vez mais distantes, pois não estavam conseguindo pagar nem os aluguéis dessas áreas”, garante Clara. Para a professora Maria Helena, uma das formas de tentar mudar essa realidade é que haja de fato um processo de ocupação efetiva desses prédios. “O poder público tem que se mobilizar para garantir condições, inclusive de segurança, para não acontecer o que aconteceu em São Paulo. Não é só dar funcionalidade a esses prédios vazios, mas garantir que de fato o direito de habitação social e o público que nada ganha ou que ganha até um


DIREITOS HUMANOS Os problemas listados são, segundo Everton, causados pelo próprio poder público que estimulou o esvaziamento do Centro da capital por meio de processos de urbanização e que o movimento de moradia no bairro ajuda a chamar a atenção para esses locais. “O movimento mostra ao poder público que existe um déficit habitacional e que existem imóveis que poderiam ter essa destinação. Entretanto, as pessoas preferem mantê-los vazios do que dar uma função a eles”, expõe Éverton. A luta pela Moradia e a Lei Há quem pensa que ocupar um prédio vazio e sem função social é um ato de vandalismo e que se faz, na verdade, uma invasão de patrimônio. Mas, o que poucos sabem é que o Direito à Moradia é garantido por lei. Segundo Verônica Be-

VOCÊ SABIA? Segundo a advogada e Diretora de Direitos Humanos da OAB-ES Verônica Bezerra, o Estado tem a responsabilidade em garantir o Direito à Moradia digna a todos e a todas. “É indiscutível. Não se trata de concessão, mas dever do Estado, dado que é Direito”, afirma. zerra, advogada e Diretora de Direitos Humanos da OAB-ES, o Direito à Moradia foi inserido no rol dos Direitos Sociais da Constituição Federal de 1988, por meio da Emenda 26/2000. “Mas antes disso, o direito à moradia digna foi reconhecido e implantado como pressuposto para a dignidade da pessoa humana, desde 1948, com o advento da Declaração Universal dos Direitos Humanos, pela ONU”, explica. E, de acordo com a pesquisadora Ana Helena Elpidio, a questão de ocupar prédios vazios “fere a

espinha dorsal de pensar que a moradia se constitui como base da propriedade privada capitalista”. Isso se dá, pois: “A lógica que se tem hoje é a privatizante, e não a de uma política habitacional de interesse social”. A moradia, contudo, deve ser um lugar primordial a todos e todas. “A moradia, mais que tudo, deve ser o lugar de sossego, onde cada homem e cada mulher, deve repousar seu espírito, com dignidade e paz. Isso se traduz o que é o cumprimento de um Direito”, garante Verônica.

“A Comissão de Direitos Humanos da OAB ES, quando acionada, acompanha os casos de ocupações, no sentido de primar para que não haja violações de Direitos Humanos, o que concerne ao enfrentamento com as forças policiais; e ainda, quando for o caso, monitorar o deslinde de cada situação, quando existem desdobramentos como: prisões, criminalizações ou perseguições”, Verônica Bezerra explica como a Comissão de Direitos Humanos da OAB-ES atua quando acontece uma ocupação.

Foto: Thaisa Côrtes

Comissão de Direitos Humanos OAB-ES e as ocupações urbanas

Débora Silva mostra orgulhosa a biblioteca que tem na ocupação PRI MEI RA

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DIREITOS HUMANOS

Trabalho infantil na mira da erradicação

Junho é o mês dedicado ao debate sobre o trabalho infantil, o foco é a prevenção e eliminação dessa prática Richele Ribeiro

Realidade A aposentada Lucia Vieira foi uma vítima do trabalho infantil no passado. Após perder a mãe, aos sete anos, a menina ficou aos cuidados dos irmãos. Desde então, passou a trabalhar nos afazeres domésticos e na lavoura de café para “ajudar” em casa. Semianalfabeta, Lucia estudou apenas até o segundo ano do ensino fundamental. “Meus irmãos não viam necessidade em se estudar. Ti-

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nha que ajudar em casa e ficava muito cansada”, afirma. Mãe de oito filhos, todos eles trabalharam na infância. “A gente passava necessidades em casa. Eles viam aquilo e queriam ajudar de alguma forma”, conta. Dos oito filhos, apenas uma tem ensino superior e hoje é pedagoga. Selma Vieira, a mais velha dos filhos começou a trabalhar aos catorze anos. Uma

amiga da família precisava de uma doméstica. “Minha mãe achou que lá eu poderia estudar, teria uma vida melhor”. Saindo de Linhares, norte do estado, onde morava a família, a garota foi para São Paulo. Longe de casa, não pôde estudar, e trabalhava o dia todo. “Eram raros os momentos em que eu podia parar um pouco o serviço”, relata. Do dinheiro que ganhava, enviava

Foto: Richele Ribeiro

Toda criança tem direito ao não trabalho. Essa é uma das resoluções de órgãos e convenções de proteção à criança e ao adolescente. Porém, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), esta não é uma realidade para 2,7 milhões de crianças e adolescentes (5 a 17 anos) no Brasil. No país, a partir dos 14 anos, o adolescente pode exercer atividade remunerada na condição de aprendiz, em horário que não conflite com a escola. Caso seja trabalho noturno, perigoso, insalubre ou atividades da lista TIP (piores formas de trabalho infantil), a proibição se estende aos 18 anos incompletos.

Cerca de 2,7 milhões de crianças e adolescentes, entre 5 e 17 anos, trabalham no país.


DIREITOS HUMANOS Mitos A sociedade propaga mitos em relação a exploração infantil. É o que diz a magistrada do Tribunal Regional do Trabalho 17ª região e gestora regional de combate ao trabalho infantil, Suzane Schulz Ribeiro. “O trabalho de exploração e trabalho precoce traz um sentimento de não pertencimento, de marginalidade e exclusão social.” Melhor trabalhar do que roubar, trabalho forma caráter e é bom que ajuda em casa. Essas são algumas das coisas faladas para naturalizar o trabalho precoce. “A naturalização invisibiliza o problema. O trabalho dignifica desde que seja realizado em idade adequada. O que forma caráter é a escola e o lar.

Você sabia? O governo do Estado do Espírito Santo sancionou, em 2017, a lei 10.755 instituindo o “Junho Vermelho”. O intuito é dedicar o mês ao debate sobre trabalho infantil, para prevenção e eliminação desta prática. Junho foi escolhido por celebrar, no dia 12, o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil.

Vetor: FreePik

Temos que desconstruir esses mitos “, ressalta a magistrada. As piores formas de trabalho infantil A Convenção 182 (Convenção sobre Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e Ação Imediata para sua Eliminação), foi instituída em 1999 durante uma reunião em Genebra, na Suíça. Organizada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), a intenção era debater questões, visando a proibição e eliminação do trabalho infantil. Na ocasião, foram desenvolvidos alguns tópicos, que mais tarde deram origem a Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil, mais conhecida como Lista TIP. A lista define as atividades que mais oferecem riscos à saúde, ao desenvolvimento e à moral das crianças e adolescentes. Entre elas, estão o trabalho nas ruas, em carvoarias e lixões, na agricultura, com exposição a agrotóxicos e o trabalho doméstico. Em 2008, utilizando como base a Convenção, a lista TIP foi ratificada no Brasil, definindo 93 piores formas de trabalho infantil. É também utilizada como forma de combate a exploração em países como Argentina e Bolívia, com 14 e 20 formas listadas, respectivamente. Um levantamento feito pelo Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) do Ministério da Saúde, mostrou que entre 2007 e 2017, 40.849 crianças e adolescentes sofreram

Marcos internacionais de direitos humanos sobre trabalho infantil

1948

Declaração Universal dos Direitos Humanos.

1966

Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.

1969

Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

1973

Convenção sobre a Idade Mínima para Admissão ao Emprego (n. 138), adotada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).

1989

Convenção Sobre os Direitos da Criança.

1999

Convenção sobre as Piores Formas de Trabalho Infantil (n. 182) adotada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) .

Vetor: FreePik

grande parte para a família.

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DIREITOS HUMANOS acidentes de trabalho, 24.654 de forma grave. Os dados ainda apontam que 236 morreram no mesmo período. Espírito Santo Segundo dados da Rede Peteca - Chega de trabalho infantil (projeto que busca a promoção dos direitos da criança e do adolescente e a erradicação do trabalho infantil no país), 47.378 mil crianças e adolescentes trabalham no estado. Desses, a maioria (29,4%) no setor de agricultura e pecuária. O levantamento usa como base Pesquisa nacional por amostra de domicílios (Pnad) e O trabalho infantil nos principais grupamentos de atividades econômicas do Brasil, elaborada pelo Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação

Números do trabalho infantil no Brasil

TOTAL DE PESSOAS OCUPADAS COM 5 A 17 ANOS:

0 - 101.410 101.411 - 202.820 202.821 - 304.230 304.231 - 405.640

NO ESPÍRITO SANTO:

47.378

do Trabalho Infantil (FNPETI). “O trabalho infantil tira a criança da escola e causa um déficit de aprendiza-

gem. Isso impacta no futuro deste indivíduo e reforça um ciclo de pobreza”, afirma Suzane Schulz Ribeiro.

Espírito Santo POPULAÇÃO TOTAL DO ESTADO: 3.938.764* TOTAL NA FAIXA DOS 5 AOS 17 ANOS:

753.211

OCUPADOS DE 5 A 17 ANOS: 47.378 PERCENTUAL DE OCUPAD O S EM RELAÇÃO À POPULAÇÃO DE 5 A 17 ANOS: 6,29%

GRUPO DE ATIVIDADES Agricultura, pecuária, silvicultura, pesca e apicultura Comércio e reparação Serviços de alojamento, alimentação, transporte, financeiros e imobiliário Indústria de transformação, extração mineral, petróleo, gás, elecricidade e água Administração pública, educação, saúde, serviços sociais, coletivos e pessoais Construção Serviços domésticos

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Ações de combate O Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil é uma dessas estratégias de combate. Criado 1994, o Fórum têm como membros outros 27 fóruns estaduais de prevenção e erradicação do trabalho infantil, representantes do governo federal, dos trabalhadores, dos empregadores, entidades da sociedade civil (ONGs), do sistema de Justiça e organismos internacionais (OIT e UNICEF). A organização, assim como outras iniciativas do setor público e privado, faz parte de uma rede de esforços nacionais para eliminar o trabalho precoce no Brasil. Este ano, em homenagem ao Dia de Combate ao Trabalho Infantil (12/6), o fórum está promovendo a campanha “Não proteger a criança é condenar o futuro”. No estado, o projeto têm como membro o Feapeti - Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção do Trabalhador Adolescente do Espírito Santo. O fórum estadual realiza ações como a exposição itinerante, “Um mundo sem trabalho infantil”, que passou por terminais terminais rodoviários e shoppings da Grande Vitória e pelo TRT-ES. Em parceria com o MPT-ES e o TRT-ES, a intenção é estabelecer uma proximidade com a população, provocando uma sensibilização sobre o tema. Outra ação que visa conscientizar a população é a série de HQs, MPT em Quadrinhos. Desenvolvida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT-ES), e inserida no Feapeti. A

revista busca dialogar de uma forma lúdica e é distribuída nas escolas durante as ações contra a exploração infantil. Os direitos das crianças é tema recorrente na série, e o trabalho infantil está entre os assuntos mais tratados nas publicações. “As piores formas de trabalho infantil”, “ O estatuto da criança e do adolescente”, “Trabalho infantil doméstico” e “Trabalho Infantil: Mitos e verdades”, já foram temáticas abordadas. Na busca pelo fim da exploração do trabalho infantil, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) criaram, em 2013, o Programa Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil. O projeto está inserido em todos os estados do país, onde são indicados pelos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) gestores regionais do trabalho infantil para promoverem ações de combate a exploração. Estas ações são realizadas em escolas e com os profissionais que atuam diretamente com as vítimas, como conselheiros tutelares. “Tentamos mostrar para a sociedade os aspectos

Imagem: FNPETI

DIREITOS HUMANOS Lema da Campanha de 2018 do FNPETI pelo Dia Mundial e Nacional contra o Trabalho Infantil.

prejudiciais do trabalho precoce por meio da conscientização. Ela precisa entender que a exploração do trabalho infantil é uma violência”, afirma a gestora regional, Suzane Schulz Ribeiro. Em combate a exploração sexual e relação de trabalho ilícito, a Polícia Rodoviária Federal (PRF), em parceria com Organização Internacional do Trabalho, Childhood Brasil, Ministério dos Direitos Humanos, Ministério do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho, criaram o Projeto Mapear. A exploração sexual, que entra na lista das piores formas de trabalho infantil como “trabalho com exposição a abusos físicos, psicológicos ou sexuais”, é combatida através de um mapeamento de pontos vulneráveis realizado nas rodovias federais brasileiras.

MPT em Quadrinhos A série MPT em Quadrinhos trata de forma lúdica de temas acerca das relações trabalhistas. Entre eles, o trabalho infantil.

Acesse as edições: mptemquadrinhos.com.br PRI MEI RA

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DIREITOS HUMANOS PROJETO MAPEAR Relatório de

2017/2018

divulgado pela Polícia

Rodoviária Federal identificou 2.487 pontos de exploração sexual infantil nas rodovias federais do país.

Denúncias De acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT-ES), nos últimos cinco anos, foram realizadas cerca de 558 denúncias de trabalho infantil. Elas podem ser realizadas de forma anônima, pessoalmente, por telefone, pelo site ou através do Disque 100. Segundo o órgão, “trabalhos informais” como em feiras livres, engraxate, vendedor de amendoim ou balas, a exploração sexual comercial e o trabalho doméstico infantil (podendo ser na própria cada da criança ou em casas de terceiros) são mais difíceis de receberem denúncias ou fiscalizações.

Foto: Richele Ribeiro

De acordo com o relatório de 2017/2018 divulgado pela PRF, foram identificados 2.487 pontos de exploração sexual nas rodovias federais. A intenção do projeto é que a partir dos dados das ações, sejam realizadas estudos e políticas públicas de combate a esta prática. Segundo informações do MPT-ES, há necessidade de sensibilizar, debater e dar destaque à questão. As ações visam a prevenção e erradicação do trabalho infantil com foco especial na educação e estímulo a sociedade na luta em defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes.

Principais normas nacionais relacionadas ao trabalho infantil

1988

Constituição Federal, Artigos 227, 208 .

1990

Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) .

1996

Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).

2000

Lei da Aprendizagem .

2002

decreto 4.134 Promulga a Convenção nº 138 e a Recomendação nº 146 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Idade Mínima de Admissão ao Emprego.

2008

decreto 6481 Regulamenta alguns artigos da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que trata da proibição das piores formas de trabalho infantil e ação imediata para sua eliminação. Exposição no TRT-ES em prol da erradicação do trabalho infantil.

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DIREITOS HUMANOS

Invisíveis aos olhos da sociedade

Gentileza de grupos de voluntários modifica a vida de pessoas em situação de rua Carolina Moreira

ruas da Região Metropolitana, segundo informações das prefeituras locais. O espírito de solidariedade em ajudar o próximo e dar assistência a quem precisa é o que move grupos e voluntários na Grande Vitória. Eles promovem ações de distribuição de alimentos, agasalhos, roupas de frio e muitas vezes simplesmente apenas se dispõem a conversar com as pessoas que se encontram em situação de rua. “Sempre uso aquele ditado ‘Fazer o bem, sem olhar a quem’, temos que fazer o bem ao próximo, independente de quem seja. Vejo que os moradores de rua são excluídos, a gente

ouve bastante ‘Vocês estão alimentando marginal’, mas a gente não olha pra isso”, destaca Kelvim Amaral, criador do Grupo Ajude o Próximo (GAP). O grupo surgiu da iniciativa de Kelvim e dois amigos. Eles atuam desde setembro de 2014 nas ruas do centro de Vitória e nas redondezas, ajudando pessoas em situação de rua. Durante esses quatro anos, o projeto cresceu e hoje tem em torno de trinta voluntários, juntos pelo objetivo de reintegrar pessoas em situação de rua ao convívio social e com isso, ajudá-los a recuperar a autoestima e dignidade.

Foto: Romildo Neves

No Brasil mais de 100 mil pessoas vivem nas ruas, é o que mostra um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com base nos dados de 2015. Das 101.854 pessoas em situação de rua, 40,1% estavam em municípios com mais de 900 mil habitantes e 77,02% habitavam municípios com mais de 100 mil pessoas. Já nos municípios menores, com até 10 mil habitantes, a porcentagem era bem menor: apenas 6,63%. Já na Grande Vitória, o número de pessoas em situação de rua aumentou nos últimos anos. Atualmente são ao todo 1.047 pessoas que vivem nas

Voluntários distribuem café da manhã para pessoas em situação de rua, no centro de Vitória

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Foto: Romildo Neves

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Voluntários do Grupo Ajude o Próximo distribuindo café da manhã no centro de Vitória.

“Vejo muitas pessoas que vieram de outro estado pra cá em busca de emprego, já encontrei com pessoas que foram rejeitadas pela família por causa da opção sexual. Drogas e bebida é o que a gente mais nota, mas nós deixamos o vício da pessoa de lado e focamos no ser humano”, afirmou Kelvim sobre a realidade diária das ruas. O servidor público Marcos Mendonça participa do grupo há dois meses. Nos domingos pela manhã, ele leva sua filha de 16 anos para percorrer o centro de Vitória, com o grupo, para que ela possa entender e ajudar pessoas que vivem em uma realidade muito oposta a dela. Mendonça vê a ação do grupo como uma forma de fazer com que a população de rua se sinta acolhida. “Só de estar próximo de pessoas de outros ciclos, faz com que eles se sintam importantes. Já ouvi muitas declarações de que a sociedade

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os trata como lixo e quando o grupo chega com pão, com o café e com uma conversa eles já se sentem melhores. Só de você dar uma oportunidade da pessoa se sentir amada, de ter uma pessoa se importando com ela, isso já faz bem”, garante Marcos. Para dar visibilidade e provocar reflexão nas redes sociais através de relatos e histórias de pessoas que se encontram em situação de rua, o Vix Invisível, projeto já consagrado em São Paulo e Rio de Janeiro, surgiu no Espírito Santo com o apoio de três amigos: Davi Holz, Rafael Magalhães e Artur Colli. “A ideia inicial do projeto era ajudar os invisíveis da sociedade, os invisíveis não são só os moradores de rua, são aqueles marginalizados em geral. Durante as ações, fizemos relatos de moradores de rua, flanelinhas, ambulantes e garotas de programa também”, destaca Davi. O projeto está parado

há alguns meses, mas o Vix Invisível disponibilizou no site o mapeamento, com o local onde dorme cada pessoa que passou pelo programa em situação de rua. “A nossa idéia era ser uma ponte entre a população e os moradores de rua”, frisou. Para o voluntário do Grupo Ajude o Próximo (GAP) Romildo Neves uma das maiores dificuldades é lidar com as pessoas em volta, que não entendem a função do grupo. “Alguns moradores vão contra a nossa abordagem de distribuir alimentos, volta e meia a gente encontra moradores da Grande Vitória que falam que estamos alimentando vagabundo”, destacou. Durante esses quatro anos ajudando pessoas em situação de rua, Romildo destaca o que as pessoas em situação de rua sofrem com uma realidade difícil e lidam com a rejeição. “A gente encontra pessoas


DIREITOS HUMANOS vam as pessoas a viverem nas ruas. Os mais abordados são: alcoolismo e/ou uso de drogas (35,5%), perda de emprego (29,8%) e conflitos familiares (29,1%). Apesar dos dados serem da década passada, Dorival e sua companheira que preferiu não revelar o nome, ainda hoje reafirmam esses percentuais. Aos 44 anos, Dorival veio da Bahia em busca de uma oportunidade no Espírito Santo e há dois anos mora na rua. “A minha história é muito sofrida, eu nem gosto de contar. Eu saí muito novo de casa e sempre foi sofrimento, só de lembrar que eu tenho uma mãe e que tem muito tempo que não vejo, é muito sofrimento”, lamenta. A companheira de Dorival veio da Bahia trabalhar na capital do estado, foi roubada e hoje vive em situação de rua. “Eu tô aqui nesses altos e baixos, são os

piores dias da minha vida. É triste você deitar e acordar de madrugada embaixo de chuva, e tá correndo risco de vida, na rua eu não tenho um pingo de segurança, é muito triste. Eu já acordei com gente me batendo”, enfatiza em tom emocionado. Conhecer histórias e encontrar pessoas em situação de rua não é difícil, basta andar pelas ruas e praças das grandes capitais do Brasil. Sônia é garota de programa, chegou às 5 da manhã na Vila Rubim, em Vitória em busca de programas, ao ser questionada sobre as dificuldades da vida, enfatizou: tudo é uma dificuldade. “Eu tô desempregada há muito tempo, não tenho muito o que comer em casa e o único jeito que arrumei, foi fazer vida. Agora são 9 da manhã e ainda não apareceu nenhum cliente, eu fico preocupada e ainda nem sei se vou conseguir almoçar”, disse.

Foto: Carolina Moreira

que vem pra Vitória em busca de um emprego, chegam aqui e batem com a cara na porta e não conseguem voltar para a sua cidade depois”, relata. O portuário Fernando Hott é voluntário há quatro meses e destacou a importância de levar um pouco de incentivo a pessoas em situação de rua. “A gente não sabe quais são os problemas reais delas, as pessoas sabem somente julgar do ponto de vista confortável de dentro de casa, mas quando vem pra rua e conhece a realidade acaba tentando não julgar, porque a gente não sabe o que levou a pessoa a essa situação e suas reais necessidades”, conta. Uma pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua foi realizada pelo Ministério do Desenvolvimento Social entre os anos de 2007 e 2008 com a intenção de quantificar e qualificar os fatores que le-

Sônia à espera de programa no centro de Vitória PRI MEI RA

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Foto: Romildo Neves


DIREITOS HUMANOS

Orgulho e preconceito: a trajetória dos direitos LGBT no Brasil

Apesar de diversas bandeiras ligadas ao grupo terem saído do papel nos últimos anos, ainda é crescente a violência contra a população LGBT no Brasil Silvia Fonseca

Apenas em 2017, 445 LGBTs morreram no país vítimas da violência, sendo 387 assassinatos e 58 suicídios. O dado, que consta em levantamento realizado pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), mostra uma realidade alarmante, um aumento de 30% nas mortes em relação ao ano anterior. Esse número equivale a uma morte a cada 19 horas. Somente no Espírito Santo, foram mortos 17 LGBTs em 2017, colocando o ES no topo dos estados que mais matam essa minoria na região sudeste por milhão de habitantes. Porém, apesar dos números alarmantes, ainda não há uma lei

Foto: Paradagaysp.org.br

Celebrar o orgulho e protestar contra o preconceito. Esse é o objetivo de um dos maiores eventos que celebram a diversidade em todo o mundo, a Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, que atualmente reúne cerca de 3 milhões de pessoas. Porém, quando a primeira parada aconteceu na Avenida Paulista, em 1997, a situação era bem diferente, quase nenhum direito era garantido. Desde então muitos avanços sociais, políticos e jurídicos aconteceram na busca dos direitos para os LGBTs. Mas ainda falta um aspecto muito importante da luta: as garantias legislativas.

Parada LGBT em São Paulo recebe 3 milhões de participantes anualmente

que criminalize a homofobia “Até hoje a homofobia não é crime. Mas o atual projeto projeto de Lei do Estatuto da Diversidade Sexual vem para mudar essa realidade”, afirma a advogada Rovena Amorim, especialista em Direitos Humanos e LGBTs. O projeto de lei n° 134, de 2018, mais conhecido Estatuto da Diversidade Sexual, começou a tramitar no Senado Federal no mês de março deste ano. Ele propõe não só a criminalização da discriminação de LGBTs como muitas outras pautas que focam na obtenção de direitos básicos para as minorias sexuais. Dentre as propostas que constam no estatuto, podemos citar o direito ao casamento homoafetivo e cotas para transgêneros e transexuais no serviço público. O projeto de lei agora está na Comissão de Transparência do Senado e ainda irá passar pelas comissões de Constituição e Justiça, Educação e de Assuntos Sociais, antes de ir para o plenário da Casa. Sendo aprovado, segue para a Câmara. Uma das principais pautas LGBTs, o reconhecimento PRI MEI RA

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DIREITOS HUMANOS do casamento homoafetivo, já existe segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), órgão que reconheceu a legitimidade desse tipo de união desde 2011. Mas para essa determinação se tornar um direito adquirido e assegurado é preciso que se transforme em lei. “Enquanto não estiverem configuradas como leis, essas decisões ainda podem ser amplamente contestadas. Por isso que é importante a criação do Estatuto. Para garantir definitivamente esses direitos básicos às pessoas LGBTs” aponta Amorim. Outros direitos, apesar de não terem alcançado o almejado posto de lei, estão garantidas por outra estrutura do legislativo, o decreto. Esse é o caso do decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016, que dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública. Otto Valentim foi uma das pessoas que fez uso dessa determinação do legislativo em 2018, dois anos após a publicação. “O nome social foi algo muito importante na minha vida. Me libertei de tudo ligado ao meu antigo nome. Consegui começar uma vida nova”. Valentim foi um dos primeiros a utilizar a nova forma de efetivar a mudança de nome, diretamente no cartório. Para ele, que já havia pensado em realizar a mudança anos antes, mas desistiu pelas dificuldades do processo, a conquista é muito positiva. “Facilitou muito, principalmente para quem não tinha condições

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de pagar o processo antigo, que era o meu caso”. Outro direito amplamente comemorado pelo público LGBT é a possibilidade da realização de cirurgias de redesignação sexual pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O SUS oferta, não só os procedimentos como acompanhamento ambulatorial, que inclui uma equipe de médicos e psicólogos. Lucca Najar, ativista do movimento LGBT e transexual, conta que, apesar de prover uma boa assistência ao paciente transexual em relação a questões cirúrgicas, ainda há uma grande dificuldade em encontrar esses centros especializados. “O SUS apenas disponibiliza atendimento especializado para LGBTs em 11 cidades. Já a cirurgia, só é feita em quatro capitais. Quem mora fora dos grandes centros não têm esse direito garantido da mesma forma”, afirma Najar. Proteção, união ou adoção Apesar de o Brasil constar no grupo seleto de países que garantem direitos à comunidade LGBT, segundo dados de organizações não-gover-

namentais, ele ainda é um dos países com maior nível de violência contra minorias sexuais, tanto física quanto verbal e psicológica. Como o Brasil não tem leis específicas que combatem a homofobia, esse tipo de violência é registrado em outros tipos de crimes, como discriminação, injúria ou agressão, por exemplo. Por isso há uma grande dificuldade de obter dados sobre essa parcela da população sendo vitimizada. A associação Transgender Europe é uma dessas organizações, ela coloca o Brasil como um dos países com o maior número de assassinatos de transexuais em números relativos no mundo, porém, é preciso considerar que o relatório não conta com dados de países importantes, com leis severas contra LGBTs. Segundo levantamento do Grupo Gay da Bahia (GGB), que se propõe a fazer um mapa da homofobia do Brasil, 445 LGBTs morreram por causas violentas no Brasil, somente no ano de 2017. Já no primeiro quadrimestre de 2018, as mortes chegam ao número alar-

Direitos LGBT e criminalização (2017)


DIREITOS HUMANOS mante de 153, cinco delas no estado do Espírito Santo. A pesquisa foi feita com base em notícias publicadas em veículos de imprensa, por isso, esse número pode ser ainda maior. Principalmente em áreas onde não há grande presença da imprensa, ou em casos que o fator de orientação sexual não é apontado como o motivo, ou o motivo não é descrito no texto. O levantamento mapeia as mortes por localidade, idade, orientação sexual. Entre as mortes catalogadas, é possível observar que o maior número envolve a população transexual, seguida por pouca diferença dos homosexuais masculinos. Somente em 2017, o Disque 100, serviço oferecido para receber denúncias relacionadas à violações dos direitos humanos, recebeu um total de 1.720 ligações sobre violações de direitos

humanos de pessoas LGBT. Entre estas denúncias, 193 foram de homicídios. O número é 127% maior que o registrado em 2016, que foi de 85 denúncias para relatar essa violação. Os dados são do Ministério dos Direitos Humanos, que administra o serviço. Marcelo (nome fictício) e seu namorado foram agredidos enquanto estavam saindo de uma festa LGBT em Belo Horizonte. “Jogaram bebida em mim, me socaram e arrancaram meus cabelos. Fiquei sem reação.”, conta o jovem de 21 anos, que recorreu ao Disque 100 após sofrer um caso de violência por ser gay e drag queen. Ele ainda relata que não houve nenhum prosseguimento da denúncia e o crime continua impune. Um dos casos mais emblemáticos da violência contra minorias sexuais nos últimos tempos, foi a execução da estudante transexual

da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) Matheusa Passareli, que era militante dos direitos LGBT. Ela foi assassinada ao sair de uma festa no Rio de Janeiro, no dia 29 de abril. A suspeita é que ela tenha sido queimada. Por uma mídia mais inclusiva A violência contra a população LGBT não se restringe apenas ao ataque físico, no geral é também uma ofensa que acontece no âmbito moral. Muitas vezes quem profere esse discurso de ódio contra LGBTs é a própria mídia responsável por denunciar esses casos. Com o objetivo de contribuir para a diminuição de preconceitos e ajudar a população a entender melhor a comunidade LGBT, a Aliança Nacional LGBTI+ e a Rede Gay Latino lançaram, no mês de maio, o Manual de Comunicação LGBTI+, voltado para os profissionais de mídia. Em pronunciamento no lançamento do manual, Julian Rodrigues, membro da Aliança e da coordenação do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), destaca que é a criação do manual é importante, não só pela defesa das bandeiras de minorias sexuais, como é uma importante ferramenta na luta pelo fortalecimento da democracia. O manual combate os discursos de ódio, seu lema sintetiza sua missão: substitua o preconceito por informação correta. “O papel do manual é ajudar os profissionais e os veículos a fazerem um bom jornalismo, uma boa comunicação que respeite as pessoas”, ressalta Julian. PRI MEI RA

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CULTURA

Congo Capixaba: misticismo, fé e cultura

Amores da Lua, que canta a cultura capixaba em verso e prosa, é a mais antiga e famosa banda de congo da cidade de Vitória

Foto: arquivo da banda

Paulo Marcos Loyola

Barco Palermo, símbolo da festa de São Benedito representa o navio negreiro que naufragou na costa capixaba

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Em 1856, diz a lenda que um navio negreiro de nome Palermo naufragou na costa do Espírito Santo, restando 25 escravos que se salvaram agarrados ao mastro que se desligou do barco. Os escravos, amontoados no convés, rezavam à São Benedito, pedindo por um milagre que os salvasse. O santo fez então com que o mastro central se descolasse de seu casco, tombando soPRI MEI RA

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bre a embarcação. Os negros se agarram a ele e, flutuando sobre as ondas, conseguiram chegar salvos a praia. De acordo com a Associação de Bandas de Congo da Serra, a partir do ano seguinte ao naufrágio, os sobreviventes instituíram a representação do feito milagroso em louvor ao santo. A tradição se espalhou pelo estado, obedecendo a um calendário anual de louvor

ao santo em um belo espetáculo de dança e música. Ivonete José Figueira, que há 10 anos faz parte da Banda de Congo Amores da Lua, relata que o congo do Espírito Santo é uma tradição de louvor a São Benedito, São Sebastião e Nossa Senhora da Penha, unindo elementos de origem negra, indígena e cristã. “O Congo, apesar de usar tambor, bumbo, casaca e outros instrumentos, não tem


e pela devoção, que transmitem seus conhecimentos para as novas gerações”. Aissa ressalta que o fato do Espírito Santo reconhecer a importância das bandas de congo como parte constituinte do patrimônio firma o compromisso por parte do Estado de preservar este bem cultural através de Planos de Salvaguarda, isto é, da criação e/ ou manutenção de políticas públicas para manutenção desta tradição. “O Registro das Bandas de Congo como Patrimônio Cultural é um documento mais do que simbólico, é um instrumento de luta política, do qual os mestres, lideranças, grupos e congueiros devem se apropriar, para reivindicar políticas perante às instituições públicas, para manutenção do seu patrimônio cultural”, manifestou. A banda Amores da Lua é hoje a maior marca cultural da região da Grande Maruípe, o grupo recebe convites para se apresentar em vários lugares. Nesse ano, foi à Aparecida do Norte em São Paulo, com recursos próprios. “Temos festejos o ano todo. Interagimos com outras bandas, na capital e interior

Dona Ivonete:devoção a São Benedito

como Fundão, Timbuí, Nova Almeida, Serra Sede, Regência e Linhares, somos bem aceitos pela nossa comunidade e por onde passamos”, contou o atual mestre de congo da banda Ricardo Sales. Apesar disso, a banda de congo não fica livre do preconceito. “Muitas vezes somos discriminados”, contou o mestre. Além da falta de entendimento da população sobre o significado do congo, as bandas de congo do Espírito Santo sofrem com a falta de apoio municipal, estadual e federal. “O que mais me entristece é que o congo é tombado como patrimônio histórico, mas não temos apoio de ninguém, somos um povo esquecido”, desabafou Ricardo.

Foto: Ricardo Sales

relação com nenhuma religião africana. É, na verdade, uma tradição ligada aos santos da Igreja Católica”, afirmou ela. Em 20 de novembro de 2014, a Secretaria de Cultura do Estado do Espírito Santo (Secult) reconheceu o congo capixaba como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado, tendo em vista o levantamento que está sendo realizado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) para o mapeamento do Congo do Espírito Santo e da Congada de Minas Gerais para sua inscrição como Patrimônio de Cultura Imaterial em âmbito federal. Para a doutora em Comunicação e Cultura Aissa Afonso Guimarães, que atua no campo do patrimônio cultural imaterial brasileiro com ênfase nas artes populares, as bandas de congo no Espírito Santo se assemelham em relação à devoção, ritual, mito fundador, formação e elementos constitutivos, como: instrumentos; jongos/cantos; danças; estandartes e outros. “Os grupos são formados, em sua maioria, por familiares e comunitários, envolvidos por laços de pertencimento

Foto: arquivo da banda

CULTURA

Banda de Congo Amores da Lua

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Mestre Ricardo Sales,ladeado pela rainha e princesa do congo

bou. Coube a Ricardo a unificação do grupo e a reconstrução do barco de São Benedito que havia sido destruído pelo grupo dissidente. O mestre contou com apoio e ajuda financeira dos pais, amigos e alguns familiares para reconstrução. “Não podia deixar essa tradição acabar”, relatou emocionado. Hoje, com 32 anos, Ricardo é o mestre de congo mais novo entre todas as bandas do estado. “Em janeiro de 2013 colocamos novamente a banda na

rua, nosso grupo é composto por mais de 35 membros entre conquistas, dançarinas, rainha e princesas”, contou. Desde que assumiu, o mestre Ricardo buscou se apresentar em escolas e universidades, entendendo que o Congo precisa ser divulgado, a fim de manter viva a tradição. Também destacou a importância de lutar contra o preconceito que a vida urbana e moderna têm sobre a cultura tradicional e sobre as expressões religiosas não ortodoxas. Foto: Arquivo da banda

Amores da Lua Na cidade de Vitória, tem-se o registro de três bandas de congo, sendo a Amores da Lua a mais antiga delas. Foi fundada pelo Mestre Alarico de Azevedo e sua esposa Dona Cecília Rosa Azevedo em 30 de março de 1945, no antigo bairro de Mulembá, hoje Santa Martha, na região da Grande Maruípe. Quando o fundador da banda morreu, o seu genro Mestre Reginaldo Barbosa Sales, assumiu o comando junto com sua esposa, Dona Maria deLourdes de Azevedo Sales. Reginaldo, com o falecimento de sua esposa, em 2012, decidiu se afastar da banda, passando o comando para o seu filho Rui Sales. Rui também não pôde assumir por restrições médicas e repassou o comando para seu filho Ricardo, então com 28 anos. Por alguns membros não concordarem que o jovem assumisse o controle do grupo devido a pouca idade, iniciou-se uma disputa familiar pelo controle da banda. A banda por pouco não aca-

Foto: Arquivo Ricardo

CULTURA

Apresentação em escolas para manter viva a tradição do congo

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Sou religião, sou dança. Sou cultura, sou arte. Sou Europa, sou África. Não tenho cor, tenho raça. Sou lenda, Sou verdade sou raiz sem vaidade. Festa Cristã ou Pagã, desse cenário eu faço parte. Sou moqueca, não sou peixada. Muito prazer, Eu sou o Congo capixaba. Paulo Marcos


Festa de São Benedito A festa de São Benedito é realizada em quatro etapas: cortada, puxada, fincada e retirada do mastro. A puxada e fincada, que são os pontos principais da festa, acontece no dia 25 de dezembro, quando a banda sai da casa de um morador onde o mastro fica escondido. Isso faz parte de um ritual para o pagamento de promessa que a pessoa faz ao santo. “Somente o mestre sabe em qual casa o pau está escondido. O esconderijo só é revelado para os fiéis no dia do evento”, explica o secretário da banda José Luiz Fraga. Os festejos se encerram com a cerimônia de retirada, que acontece no domingo de páscoa. Ao lado de uma réplica do navio “Palermo”, que é carregado por devotos do santo católicos. A multidão de fiéis aguarda a chegada da procissão que traz consigo um dos principais símbolos dos festejos, um mastro de madeira todo pintado. Ele é então colocado pelos fiéis no “navio”. Depois a multidão segue atrás da banda e do navio “Palermo” em

Procissão dos devotos de São Benedito pelas ruas de Vitória.

Patrimônio imaterial O Conselho Estadual de Cultura (CEC) aprovou com o registro do Congo do Espírito Santo como Patrimônio Imaterial do Estado. Hoje existem 67 grupos de congo concentrados de Anchieta até Linhares, com número expressivo nos municípios da Grande Vitória. Esse registro possibilita a identificação, o reconhecimento e a proteção do Congodo Espírito Santo

procissão pelas principais ruas e avenidas da Grande Maruípe, até à igreja de São Benedito. É lá que acontece o momento mais bonito e emocionante da festa, a aguardada fincada do mastro. Após o ritual, há uma queima de fogos nos arredores da Igreja que enfeita o céu de Vitória. José Luiz Fraga conta que praticamente

nasceu dentro do congo. “Eu tenho o congo na minha vida desde menino, fui criado com minha avó em Serra Sede, onde a cultura do conguista é muito forte.” José lamenta que a cultura das bandas de congo sejam tão pouco estudadas, assim como a precariedade em que os conguistas têm de viver para dar continuidade às tradições.

São Benedito

Foto: Arquivo da banda

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Foto: Ricardo Sales

CULTURA

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Puxada do mastro de São Benedito

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São Benedito é um santo católico que, segundo algumas versões de sua história, nasceu na Sicília, sul da Itália, em 1524, em seio de família descendente de africanos. Era muito procurado pelo povo, que desejava ouvir seus conselhos e pedir-lhe orações. Seus irmãos o consideravam iluminado pelo Espírito Santo, pois fazia muitas profecias. No Brasil, ele é tradicionalmente venerado pelos negros, que relacionam o período de escravidão e a origem africana do santo com o seu próprio passado de escravidão e suas raízes africanas.


CULTURA

Grafite: arte que dá cor e vida às ruas da cidade

Censurado em alguns estados e incentivado em outros, o grafite luta pelo reconhecimento da sociedade. Danielle Gonçalves

“O grafite está na rua, você não vai sair pela rua andando de olho fechado. É uma maneira de interagir com a cidade, de se fazer presente”. Em maio de 2011, a então presidente da república, Dilma Rousseff, sancionou a Lei de 9.605/1998, que descriminaliza o ato de grafitar. A nova regulamentação, porém, trouxe como ressalva que o grafite seja feito apenas com o consentimento do responsável pelo local e realizado com o objetivo de valorizar o patrimônio público ou privado mediante manifestação artística. A determinação também tornou os órgãos governamentais responsáveis pela preservação e conservação do patrimônio

Foto: Ana Luiza Monteiro

“A cidade parece que não foi feita para pessoas, parece que foi feita para carros e robôs, mantendo uma rotina diária, que é ir e voltar do trabalho e uma ou duas vezes ao ano fazer alguma coisa diferente”. É assim que o grafiteiro Matheus Cintra, que assina como Monk, de 22 anos, enxerga o movimento das cidades atuais. O grafite é a forma que ele encontra de quebrar esse ciclo e deixar registrado algo bonito nas ruas da cidade. O grafite tem seus primeiros registros oficiais como um movimento de protesto. Hoje é um dos pilares principais da arte de rua. Monk explica que o grafite é a melhor forma de protestar algo, de mostrar que algo está errado.

O grafite é a forma que Monk encontra de deixar registrado algo bonito nas ruas da cidade.

histórico e artístico nacional. A penalidade para quem não segue as determinações impostas pela lei pode variar de três meses a um ano, além da aplicação de multa. Na cidade do Rio de Janeiro, o decreto de lei municipal nº 38307 permite a arte de rua em espaços públicos do município. O decreto diz levar em consideração o crescimento da arte de grafitar e a ascendência dos artistas de rua. A proposta foi criar uma parceria da prefeitura com os artistas, além do espaço de divulgação da arte na internet, o #StreetArtRio, com fotos e localização dos grafites espalhados pela cidade. Em contrapartida, em janeiro de 2017, na cidade de São Paulo, o prefeito João Doria mandou pintar de cinza um dos mais conhecidos murais de grafite da cidade, na Avenida 23 de Maio, ação parte do projeto “São Paulo, Cidade Linda”. A ação gerou comoção nas redes sociais e fora delas, principalmente no cenário cultural da cidade, levando o secretário de cultura André Sturm a anunciar que seriam refeitos novos grafites, com artistas selecionados pela prefeitura e material de trabalho doado pela gestão. PRI MEI RA

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CULTURA teressei mais pelas letras, os estilos de cada uma. Hoje minha essência são as letras”. O reconhecimento da arte urbana é difícil, afinal, as obras são expostas nas ruas. Monk brincou ao falar do assunto: “ser grafiteiro é muito doido, você é conhecido sem ninguém te conhecer, porque como está na rua, todo mundo que passar vai ver. Mas as pessoas não fazem ideia do que o artista passou para colocar o nome dele ali”. A arte O conceito de beleza é algo subjetivo e estudado tanto por artistas quanto por filósofos. Monk contou um pouco da sua visão em relação a arte de rua e beleza. “As pessoas tentam separar grafite de pichação, mas no fim

é tudo a mesma coisa. Nos anos 80, não tinha essa separação, era tudo uma coisa só, era tudo grafite. Quem sou eu para falar o que é feio e o que é bonito, o mal das pessoas hoje é achar que todo mundo é crítico de arte e não é assim, as pessoas não dão valor para a arte de rua porque não está em um museu”, questiona. Já para Handerson, os grafites são intervenções urbanas com temas políticos, religiosos, sociais e muitos outros. “O grafite, por ser uma arte ilegal e legal ao mesmo tempo, consegue transmitir exatamente o que o artista urbano quer passar. Pode ser com letras, personagens, abstrações, 3D, pichação, etc. Porque independente de feio ou bonito, tudo é grafite”, manifesta. Foto: Ana Luiza Monteiro

O Começo e o reconhecimento Monk contou como foi o seu começo como grafiteiro e suas principais dificuldades. “No começo é muito difícil porque eu via os trabalhos na rua e me identificava, porém, não sabia como fazer e tentava imaginar como aquilo tomava forma. Eu fui pesquisando e comecei a pintar com um amigo, ele me passou o pouco que sabia. Depois disso, comecei a caminhar com minhas próprias pernas e conhecer muita gente boa nisso”, relata. Já o começo do grafiteiro Handerson Pereira da Silva, de 27 anos, foi diferente. Ele contou nunca ter se interessado por desenhos, mas o grafite o ajudou a ter noção de desenho. “Quando eu vi, já estava rabiscando. Me in-

Os primeiros registros oficiais do grafite foram como um movimento de protesto.

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CULTURA

Espírito Santo: riqueza em forma de arte

O artista plástico Caio Cruz, a atriz Dana Oliver e o grupo de Rap Melanina MCs mostram o seu lugar no cenário cultural capixaba e o caminho que percorreram até ele. Foto: Acervo pessoal do artista

Ana Luisa Monteiro Vale

Caio começou a criar e a pintar após ter sido diagnosticado com depressão

Caio Cruz. 24, artista plástico Ele saiu de Afonso Cláudio, sua cidade natal, para estudar música. Caio se graduou em piano erudito pela Faculdade de Música do Espírito Santo até que precisou decidir qual caminho seguir: o da música ou o das artes plásticas. “Dei vazão às vontades da minha alma que já estava impregnada no desenho e no mundo das artes plásticas”, lembrou. Aos 13 anos, Caio fez aula de pintura durante um ano em sua cidade, pintando paisagens e conhecendo os materiais. Na adolescência, focou em fazer caricaturas e

nos estudos do piano. Aos 19 anos, foi diagnosticado com depressão. “Eu me sentia muito deslocado, um artista numa cidade pequena ele se sente enclausurado”, contou. Ao se fechar em um mundo só seu, Caio começou a ver imagens em seus pensamentos, sentiu que pela primeira vez a arte queria sair de sua mente. “Eu pintava por pintar, nunca tinha tido aquela coisa de sentimento, eu precisava de uma ponte para me ligar ao verdadeiro sentido da arte, e a depressão foi essa ponte”. Perturbado pelas imagens em sua mente, Caio começou a criar e a pintar.

Ainda há quem ache que cultura no Espírito Santo se resume às belezas naturais e centros históricos. Um grande engano. Para falar de cultura, não dá para não mencionar os artistas que compõem o cenário cultural do Espírito Santo. São eles que movimentam os espaços artísticos do estado e dão vida à arte capixaba. Mas nem tudo é fácil, a estrada que caminha um artista pode ser cheia de pedras. A Primeira Mão buscou alguns deles para conhecer suas histórias.

Com uma temática mais surreal, teve como referência artistas como René Magritte, Frida Kahlo e Salvador Dali. Assim, criou sua primeira exposição chamada No Divã exposta em 2014 e 2015 na Grande Vitória. “Ai começou minha carreira de fato”. O trabalho de Caio tem como foco os problemas do homem contemporâneo, sofrimento alheio e próprio, a questão do preconceito, com o desejo de dar voz às minorias. Pinturas Proibidas, sua última exposição, nasceu de um impulso de revolta. Uma obra de Caio foi vetada em uma exposição em 2017 por PRI MEI RA

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um projeto de lei aprovado na Câmara dos Deputados que proibia nudez em exposições de arte. Diante disso, o artista criou a exposição para informar o público sobre o conceito da arte erótica, do nu artístico e da grande diferença que existem entre esses dois mundos e a pornografia. “Minha exposição é um grito contra essa onda de conservadorismo extremo que tem assolado o Espírito Santo e o Brasil inteiro”, desabafou. Além de trabalhar em seu ateliê pessoal, Caio divide um espaço com uma amiga no Shopping Norte Sul em Jardim Camburi, também é professor da Celga (Praia do Canto), da Arte a Cia (Santa Lucia) e dá aula em domicílios. O artista contou que as pessoas o procuram para se livrar de algo ruim dentro delas, como estresse, solidão, depressão, procurando a arte como remédio.

Foto: Acervo pessoal do artista

CULTURA

Nascida de um impulso de revolta, a exposição Pinturas Proibidas foi criada para informar o público sobre arte erótica

“Como eu já tive essa relação de remédio e arte lá no passado, eu consigo atender esse público com maestria e me identifico bastante”. Quais são as suas influências na arte? Desde criança eu sempre fui encantado com Monet, minha mãe tinha um livro para crianças sobre

O que te inspira a fazer suas pinturas?

Foto: Acervo pessoal do artista

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ele e eu ficava viajando naquele livro, então a pincelada do artista me inspirou muito. Para temas eu gosto muito do Magritte, da Frida Kahlo, da escultora Maria Rubinke, que trabalha temas bem polêmicos relacionados à infância, Lucian Freud, Nicola Samori, que tem uma atmosfera bem sombria em sua obra e, claro, meu ídolo Edward Hopper, um artista que pintava a solidão das pessoas.

Na Mostra Peito Aberto, Caio retratou mulheres mastectomizadas em virtude do câncer de mama.

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O que me inspira é algo que ainda não sei o nome, mas até hoje o que sempre me inspirou foi o sentimento de dor, de tristeza e eu experimentei há pouco o sentimento da raiva e revolta. Poucas vezes o amor ou a alegria me inspirou, a minha impressão é que as mais bela obras de arte foram construídas quando os artistas estavam vivendo seus piores momentos e o que me inspira é isso: situações contrárias ao bem-estar humano.


CULTURA Foto: Sander Calmon

O mercado de arte no Brasil é favorável ou deficiente? O mercado é deficiente sim. Estamos em um país em que a arte é extremamente perigosa porque ela faz as pessoas pensarem e nós sabemos que é muito mais fácil para as autoridades ter um país onde as pessoas sejam burras. A arte faz as pessoas refletirem sobre muitas coisas, então é claro que a arte vai ser desvalorizada aqui no Brasil. Acho que falta conhecimento por parte da população e um amadurecimento.

Foto: Acervo pessoal do artista

Eu sempre procuro informar o público, eu gosto sempre de dar uma aula nas minhas exposições, eu gosto de trazer reflexões à tona sobre o tema que estou trabalhando, fazer mesas redondas junto com a exposição para fomentar o tema da minha exposição, esses são meus maiores objetivos. Além disso, tenho também uma necessidade muito grande de expurgar sentimentos, eu acho que a minha pintura existe pra eu não me arruinar como pessoa, é uma necessidade que eu te-

nho muito grande de pintar.

Caio conta que todos os dias tem o foco de chegar ao seu limite.

O que você espera para o futuro? Todos os dias quando eu abro os olhos eu tenho um foco e meu foco é chegar ao meu limite. O que eu posso estar fazendo como artista eu vou estar fazendo, eu não ligo muito para rótulos nem para nome, eu quero continuar fazendo o que eu gosto de fazer e se isso está repercutindo, ótimo. Mas o trabalho está acontecendo e estou sempre tentando chegar ao meu limite como artista. Foto: Acervo pessoal do artista

O que você procura mostrar quando decide fazer um novo projeto?

Em Mostre-me sua dor, Caio buscou trazer à tona angústias próprias do ser contemporâneo

Como foi começar a carreira no ES? Eu tive muita dificuldade porque eu estava no começo da carreira e era desconhecido. Mas tive um pouco de sorte porque dentro das artes visuais eu trabalho com

muitas linguagens, tem a caricatura, tem o desenho realista, eu sou professor de cinco cursos diferentes no mundo da arte, trabalho também com exposições, então eu sempre busquei atirar para todos os lados e isso fez com que eu crescesse muito rápido.

Rhino on umbrella, de 2015, foi uma das primeiras obras de Caio, com temática surrealista

Redes sociais Site: https://caiocruz93. wixsite.com/caiocruz Instagram: @caiocruzartist PRI MEI RA

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CULTURA

Ela nasceu em Ipatinga (MG) e com oito anos mudou-se para Aracruz com a família. Foi lá que Dana Oliver participou de sua primeira apresentação de teatro, interpretando Narizinho do Sítio do Pica-Pau Amarelo. “Eu sempre tive vontade de fazer teatro desde que eu me entendo por gente”, conta. Após a peça, entrou em uma oficina de teatro proposta por Rodrigo Paouto, um diretor de teatro de São Paulo que tinha chegado na cidade. Hoje, Dana trabalha junto com Paouto há 15 anos e o considera seu mestre. O grupo de teatro que Dana participava em Aracruz mudou-se para Vitória para continuar os estudos, formando o grupo capixaba Iá Pocô. E foi assim que Dana mudou-se para a capital. Dana trabalhou durante um tempo em um cerimonial como recreadora. Durante o trabalho, tinha um momento de contar histórias para as crianças. “Eu fui, comecei a contar histórias ali, gostei daquilo e nunca mais parei”. Hoje ela tem uma empresa de recreação infantil, focada no resgate das brincadeiras antigas, inclusive contar histórias, a Vão Brincar. “Eu comecei a produzir contação de histórias e foi a forma que eu encontrei de levar minha arte, o meu trabalho e somar com o meu amor pelas crianças”, revelou. Recentemente, um projeto idealizado por Dana foi responsável por um grande

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Foto: Rodrigo Paouto

Dana Oliver. 30, atriz, produtora e contadora de histórias

Dana procura mostrar com seu trabalho que é possível sonhos se realizarem

marco em sua carreira. O espetáculo O Quintal de Histórias tem levado muitos capixabas a contemplar o mundo da teatro. Como referência, a artista usou histórias e canções que ouvia de sua mãe quando era criança. O espetáculo foi apresentado no dia 26 de maio no Teatro Sesc Glória em Vitória. “Foi uma grande riqueza meu trabalho alcançar esse nível. Eu tinha imaginado me apresentar em praças, não tinha pensado que iria parar num palco”. Em O Quintal de Histórias, Dana vive um passarinho dono de um quintal que tem como missão contar as histórias que ouvia quando todos moravam ali. O espetáculo mistura ludicidade e encanto, com musicalidade que dá ritmo às cantigas, além de interagir com o público com brincadeiras. “Com a dimensão do espetáculo, eu pude explorar mais aspectos da peça, como corpo, voz e foi muito bem reconhecido isso, o trabalho foi muito elogiado pelos analistas do Aldeia (mostra local de artes cênicas) e eu

fiquei muito feliz”, explana. Apesar do sucesso que esse projeto trouxe à Dana, o caminho até ele não foi fácil. Uma característica que é carimbada na vida de um artista é a falta de incentivo e não é diferente no Espírito Santo. Apesar dos editais que o Governo do Estado lança para apoiar financeiramente artistas capixabas, nem todos os grupos partilham dessa contribuição. Quando o grupo de teatro de Dana se mudou para a capital, foram morar juntos em república, cada um deles deixando família e emprego para seguir a estrada do teatro. “Não foi fácil, não é fácil trabalhar com teatro, ser artista. Passamos muitas dificuldades, de ficar sem dinheiro, de faltar comida. Quando produzíamos espetáculos, o dinheiro saia do bolso de todo mundo, não tínhamos apoio nenhum”. Hoje Dana procura mostrar com seu trabalho que quando há força de vontade, nenhum obstáculo é suficiente para atrapalhar, que é possível sonhos se realizarem.


CULTURA Foto: Ângelo Parrella

O que significa arte para você? Arte para mim é a capacidade que você tem de se reinventar, de expressar as suas emoções. A arte é livre, não tem regras, é aquilo que você pensa, aquilo que você quer ser. A arte é vida pra mim, a arte é tudo. Como é a sua relação com o público?

Dana descobriu seu talento em contar histórias trabalhando em um cerimonial como recreadora

O que você espera para o futuro? Eu quero continuar tocando as pessoas com minha arte, fazer o meu trabalho bem feito e ser uma lembrança boa na vida das pessoas que me assistiram, que seja algo inesquecível e que possa ser contado para outro alguém. Eu es-

pero mais visibilidade artística, mais reconhecimento e que eu nunca deixe de fazer minha arte, meu teatro, contar histórias. Vou contar histórias pra sempre. Redes sociais Facebook: Dana Oliver Email: danaolliveroliverdana@gmail.com

Foto: Ângelo Parrella

Se não existir público, não tem sentido a nossa profissão. Eu respeito muito o público e fico muito grata. Para nós atores, artistas, receber os aplausos do público, ver a casa cheia na nossa apresentação é muito gratificante, é saber que estamos no caminho certo. O maior objetivo do meu trabalho é tocar as pessoas, quando vejo que foi bem realizado, que eu consegui atingir isso, eu fico muito feliz, é uma satisfação enorme.

Em O Quintal de Histórias, Dana vive um passarinho que tem como missão contar histórias

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CULTURA Melanina MCs. grupo feminino de Rap Quatro mulheres e um objetivo: fazer um Rap que represente a classe feminina e suas vivências. Afari, Geeh, Lola e Mary Jane formam o grupo de Rap capixaba Melanina MCs. Com suas singularidades, passam a mensagem de empoderamento, auto-estima, transformação social e representatividade. “Falamos sobre ser mulher, o que pensamos, precisamos e achamos do mundo e do sistema em que somos a fragilidade e a fortaleza”, contou Afari. A primeira formação do grupo aconteceu em 2012, quando Lola e Mary Jane que já se conheciam se uniram a Geeh, que atuava como MC solo no cenário do Hip-Hop. Em 2014, Afari, que era MC e frequentava os shows do grupo, foi convidada a fazer parte do Melanina MCs, formando o grupo que são hoje. “Até hoje estamos juntas trabalhando e fazendo arte por onde passamos”, comemora Geeh. Em janeiro deste ano, Melanina MCs lançou o seu álbum de estreia intitulado Sistema Feminino. O álbum conta com dez músicas sobre temas em torno do cotidiano das MCs, expondo os desafios diários que as mulheres, principalmente negras, precisam enfrentar para viver em sociedade. O disco teve participações de vários artistas como Henrique Paoli (André Prando), Fepaschoal, Morena (Solveris), Budah,

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Gabriela Deptulski (My Magical Glowing Lens) e outros. “Nosso álbum representa um novo ciclo do grupo, veio para fortalecer nossa identidade cultural e feminina. Está sendo gratificante apresentar esse trabalho que está fazendo com que muitas pessoas se identifiquem com os sons e ele se propague por si só”, afirmou Mary Jane. Em abril, o grupo cruzou as fronteiras do Espírito Santo para levar o Rap capixaba a nível nacional. O álbum Sistema Feminino foi apresentado no Sesc Vila Mariana em São Paulo. “Foi maravilhoso a recepção e o carinho das pessoas. O show foi num formato que inseriu mais diálogos com o público para que conhecessem um pouco de nós e do nosso trabalho e entendessem a mensagem do álbum”, comentou Lola. A falta de incentivo e reconhecimento, porém, é um desafio para Melanina MCs, que precisam enfrentar

o mercado musical no Espírito Santo de forma autônoma e independente. “Tentamos sempre enfrentar essas barreiras apresentando nosso trabalho em todos os meios possíveis de comunicação”, relataram. Algumas mulheres têm aberto portas para a visibilidade feminina no cenário do Hip-Hop no Brasil, como Karol Conka e Flora Matos. Para o grupo, a ascensão dessas mulheres tem um peso imenso para que as produções femininas permaneçam com força no mercado. Assim como a música Sulicídio, de Baco Exu do Blues, que denuncia o cenário do Rap no Brasil ser concentrado na região de Rio de Janeiro e São Paulo. “Esse som é importante por ter aberto a mente não só dos produtores das grandes capitais, mas do próprio público que começou a respeitar e acompanhar os artistas locais de suas regiões, principalmente do Nordeste”, afirmou Afari.

Afari, Geeh, Lola e Mary Jane passam a mensagem de empoderamento, auto-estima, transformação social e representatividade através do Rap


CULTURA Quais são as principais influências de vocês? Nossas mães e avós musicalmente são Negra li, Camila CDD, Clara Lima, Elza Soares, Gabilonya, Lauryn Hill, Flora Matos, Sandra de Sá, Lady Lashurr, Eva Diva Rap, Karol Conka e muitas outras mulheres maravilhosas desse universo de infinitas possibilidades musicais. O Rap sempre esteve presente na vida de vocês ou foi algo que surgiu para dar voz ao que vocês queriam transmitir? O

Rap sempre fez parte de nossas vidas, mesmo antes de nos entendermos como MCs já ouvíamos e nos identificávamos com o gênero. Como é fazer parte de um pequeno nicho do Rap que existe aqui no ES e como se sentem fazendo crescer o público capixaba que curte Rap? É muito bom. Embora pequeno, existem grandes talentos e destaques atuais no cenário capixaba. Nos sentimos muito realizadas e felizes de poder contribuir e propagar a nossa cultura a esse público que só vem aumentando a cada dia. Quais parcerias vocês fizeram na música e quais foram as mais marcantes? Tivemos a oportunidade e felicidade de fazer uns sons com a participação de várias(os) artistas que repre-

“Eu vejo vidas que se perdem na favela Eu vejo vidas que dão o sangue por ela E quanto falta pra isso tudo melhorar? Quanto mais falta pra valorizar esse lugar?” Trecho cantado por Lola

sentam muito no universo musical. Foram diferentes gêneros que enriqueceram grandiosamente nosso trabalho, como Carol Navarro, Anna Tréa, Thaysa Pizzolato, Gabriela Deptulski, Morena, Budah, Henrique Paoli, Fepaschoal e Dj Jone Bl que contribuíram desde as vozes até os instrumentais e arranjos. Trabalhar com cada um deles foi magnífico, pois possuem suas particularidades especiais que somaram para chegar nesse resultado incrível, por isso consideramos todos os momentos muito marcantes. No que a banda está trabalhando no momento? As meninas do Melanina participam de trabalhos fora do grupo também, como é isso?

Estamos trabalhando em projetos para o lançamento de um vídeoclipe até o fim do ano. Em projetos paralelos ao grupo, cada uma tem alguns trabalhos em execução, como Feat’s, filmes e projetos culturais, que vem também para fortalecer a nossa atuação no cenário. Quais novidades podemos esperar para 2018? Vem videoclipes por aí, começando por um gravado no Rap Box (grande canal do YouTube produtor de Rap nacional) que estará no ar no mês de junho e outros que iniciaremos as gravações no próximo mês (julho). Para conferir o trabalho do grupo, basta acessar através do YouTube, Spotify, Deezer, Apple Music e no SoundCloud. PRI MEI RA

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TECNOLOGIA

ELES me perseguem: A violência virtual na forma de Cyberbullying Como o surgimento da internet deu ao bullying nova forma e mais força para ferir pessoas que são diferentes Ângelo Parrella

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O caso de Larissa é um deles. Ela ficou tão traumatizada e aborrecida com a situação que chegou a rasgar fotos guardadas por não se sentir bem com a antiga forma de seus dentes. “Eu não gostava de tirar foto por causa do meu sorriso. Eu não gostava da minha aparência quando criança e até hoje não me recordo bem”.

Já a empresária Tanachy Permanhani de 25 anos, conta que, quando adolescente, pintou o cabelo e, por receber diversas represálias de colegas, teve vontade de tomar medidas drásticas. “Porque era moda, fiz uma mecha, então ELES começaram a me chamar de mico-leão-dourado. Por isso, eu tive vontade Arte: Lydia Spinassé

“Meus dentes da frente sempre foram grandes e por isso, na escola, ELES sempre me chamavam de ‘retro-escavadeira’, ‘Mônica’, ‘dentuça”. A estudante de Artes Plásticas Larissa Pereira recorda as duras palavras que ouvia diariamente na escola. Para ela, tudo isso ia passar quando ela ‘consertasse’ seus dentes, mas ela relata que não foi assim que aconteceu. “Depois que coloquei aparelho os comentários só foram trocados para ‘boca metálica’ ou coisas do gênero”, recorda. Segundo dados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) de 2015, no Brasil, um em cada dez estudantes sofrem agressões físicas ou psicológicas, o conhecido bullying, na escola. Essa forma de agressão pode se manifestar de diversas formas, seja a pessoa se tornando alvo de piadas e boatos maldosos ou até mesmo sendo excluída propositalmente pelos colegas. Esses acontecimentos quase sempre deixam cicatrizes na memória e até mesmo no corpo.

Apesar do bullying ser frequente no ambiente escolar, o ambiente virtual tem potencializado esse tipo de agressão.


TECNOLOGIA ty no Brasil em 2015 aponta que 66% das crianças e adolescentes já presenciou casos de agressões em redes sociais e que cerca de 21% já sofreram cyberbullying. Mas afinal, quem são ELES? Drago explica que toda criança e adolescente é um possível agressor. “O ato de praticar agressões, seja ela física ou psicológica, vem do adulto. O ser humano aprende o que vê nos seus pares, e os adultos são os pares que ensinam como as crianças e

adolescentes devem se comportar. Nós criamos o preconceito e ensinamos a ter preconceito. O adulto cria o bullying e a criança se apropria dessa linguagem”, explica. Diferente do que muitos pensam o bullying não é um abuso que acontece somente de um indivíduo para outro. Quando alguém presencia a agressão, mas não faz nada, se torna um participante passivo do ato. “Quando falamos de bullying, principalmente na internet, a existência dos

Fonte: Nethics Educação Digital

de raspar minha cabeça”. A moça relembra que estava na época de querer namorar e que esses comentários agressivos a faziam se sentir horrível. “Toda vez que eu chegava na escola era isso”. Apesar de o bullying ser frequente no ambiente escolar, o ambiente virtual tem servido como uma nova plataforma para esse tipo de agressão, deixando principalmente sequelas psicológicas, que são as menos visíveis, como explica o professor do mestrado e doutorado em Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Rogério Drago. “O ambiente virtual não só potencializa como também estimula a prática do bullying. O bombardeio de padrões de beleza na rede é um exemplo. O fato da pessoa não ser o padrão já é motivo para que ela sofra esse abuso”. Agora, o que era um tormento momentâneo na escola e que acabava no final de semana, tem se perpetuado durante 24 horas na rede. Essa aflição sem fim que o cyberbullying (bullying na internet) provoca faz com que as crianças e os adolescentes humilhados na rede não sintam segurança de si. Apesar do ambiente virtual ser público, o cyberbullying, na maioria das vezes, é praticado de forma não aberta para todos. Em outras palavras, somente um grupo de indivíduos sabe da existência dessa agressão. Um bom exemplo são os grupos de Whatsapp, Facebook, mensagens diretas e e-mails coletivos. Uma pesquisa feita pela Intel Securi-

Cartaz conscientizando sobre o cyberbullying PRI MEI RA

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TECNOLOGIA espectadores é muito importante, pois ajuda a agressão a se perpetuar”, relata o professor. Diana Prince* tem 14 anos e que relata o cyberbullying gordofóbico que sofreu. “Quando eu tinha 9 anos passei por uma fase difícil e descontava a ansiedade na comida, aí acabei engordando. Eu sofri principalmente na escola”. Ela conta que os comentários em relação ao seu peso eram constantes, mas nunca soube o que fazer em relação a isso. “ELES me enviavam cartas, desenhos e até mensagens me atacando. Eu chorava bastante pois isso me machucava profundamente”.

Diana conta que seus colegas de classe se organizaram pelo Whatsapp para agredi-la. Ela se lembra de forma trágica o momento em que o cyberbullying saiu da rede e se manifestou fisicamente. “ELES me encurralaram no canto da sala e começaram a gritar ofensas contra mim. Por causa disso eu passei a não gostar do meu corpo e forçar vômito, na tentativa de perder peso”. Outro caso que choca bastante é o da adolescente de 13 anos, Bárbara Gordon*. A pré-adolescente relata que apesar de ter acontecido há algum tempo, ainda é uma ferida aberta, pois a afeta até hoje.

“ELES criaram um grupo no Whatsapp e me perseguiram até o início de 2017”, relata Bárbara Gordon.

Foto: Freepik

*A imagem é meramente ilustrativa e não retrata a real vítima.

“Eu comecei a sofrer bullying no 1º ano da creche e continuei sofrendo até o 6° ano. Em 2016 fui muito agredida via celular, ELES criaram um grupo no Whatsapp e me perseguiram até o início de 2017”. Bárbara conta que era ofendida por palavras de baixo calão, e que o terror aumentou quando descobriram que ela tinha depressão. “Começaram a falar coisas do tipo ‘por que não se mata logo? Faria um favor a humanidade’”. Além disso, por se sentir acuada pela situação, ela diz ter pensando seriamente em tomar medidas extremas. “Eu pensei em cometer suicídio”, conta a pré-adolescente. A menina de somente


TECNOLOGIA atentos aos casos de agressões feitas, principalmente, na internet. Isso porque, pelo agressor achar que está no anonimato, acaba facilitando o cometimento desse crime”, afirma o investigador. O fato de alguém já ter praticado bullying ou cyberbullying não significa que tudo está perdido. A história da adolescente de 15 anos, Carol Danvers*, é um exemplo de quem se arrepende de ter praticado cyberbullying com uma colega de classe. “Quando eu e mais uma amiga resolvemos criar um perfil falso no Twitter para fazer comentários maldosos sobre uma colega, nós não pensamos. A verdade é que eu não sei o motivo de eu ter feito [o cyberbullying], mas eu não faria outra vez”. A menina conta que o pior não foi a punição que recebeu em casa, mas sim ver a colega sofrendo. “Hoje, ela me perdoou, mas não é mais a mesma coisa”, revela.

É importante destacar que a conscientização contra o bullying é essencial na hora de criar um ambiente, seja ele virtual ou não, menos agressivo. Colocar-se no lugar do outro e entender as consequências do cyberbullying é primeiro passo para combate-lo. Pensando nisso, a Polícia Civil do ES realiza palestras em escolas, intituladas de Internet Segura. O intuito é alertar sobre a luta contra o cyberbullying e os cuidados na hora de utilizar à internet. Quem sofreu ou sofre com bullying deve entrar em contato com a Polícia Civil pelo número 197 e realizar denúncia. *Todas as fontes que não quiseram se identificar receberam o nome fictício de heroínas dos quadrinhos, uma homenagem a essas guerreiras que passaram pelo bullying e hoje contam suas histórias.

Foto: Freepik

13 anos diz ainda sentir o peso dessas declarações de ódio. “Não superei muito e também não procurei ajuda, mas aprendi a lidar e a ignorar. Ainda tenho depressão, alguns dias fico melhor e em outros piores, mas vivo”. O bullying é crime previsto no Código Penal com pena prevista de detenção de um a três anos mais a multa. Se o crime ocorrer em ambiente escolar, a pena será aumentada em 50%, se for em ambiente virtual, a pena será aumentada em dois terços. No caso de menores de idade, os envolvidos são encaminhados para o Conselho Tutelar. O Chefe de Investigação da Polícia Civil do Espírito Santo (PCES), Hércules de Nadai Aranda, explica que o bullying é encarado na lei como um crime contra honra, podendo ser cometido por qualquer tipo de pessoa. “Nós da inteligência da Polícia Civil estamos sempre

O bullying é crime previsto no Código Penal com pena de detenção de um a três anos e multa PRI MEI RA

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TECNOLOGIA

Da telinha do celular para Brasília

Novas tecnologias permitem maior participação dos cidadãos na fiscalização de políticos Henrique Andreão

Alguns toques na tela do celular e plim! Aparece a ficha do político, com processos abertos, julgados e investigações. O combate à corrupção agora fica mais forte com os aplicativos e programas de computador que ajudam o cidadão a escolher um candidato de confiança na hora do voto, e até a fiscalizar os gastos dos políticos. Há pouco tempo, o brasileiro deveria ficar atento aos noticiários na televisão e na imprensa para descobrir as ilegalidades que o poder público praticava. Entretanto, esses aplicativos trazem uma mudança significativa nesse processo: agora o eleitor consegue exercer um papel essencial na fiscalização, além de acompanhar

facilmente os processos judiciais envolvendo políticos. Ferramentas disponíveis O projeto “Serenata de amor” é uma ferramenta que utiliza a inteligência artificial (IA) para fiscalizar os gastos públicos de deputados federais e senadores. “Rosie” é IA utilizada no projeto que analisa os gastos reembolsados pela Cota para Exercício da Atividade Parlamentar (CEAP). Ela identifica casos suspeitos e divulga para que a população questione o político. Segundo dados do site do projeto, já foram encontrados mais de 8 mil e 200 reembolsos suspeitos, que totalizam um total de 3,6 milhões de reais. O “Vigie Aqui”, projeto lançado pelo site Reclame

Aqui, também é uma ótima opção para o cidadão conhecer melhor os políticos. A iniciativa oferece um plug-in (programa de computador que adiciona funções específicas a outro programa maior) para navegador, que grifa de roxo os nomes de políticos condenados, processados ou investigados. O Vigie Aqui também possui um app para celular, “Detector de ficha de político”, que trabalha com reconhecimento facial: você tira uma foto do político e o app o identifica, mostrando a ficha processual dele. Por enquanto, a ferramenta tem 81 senadores, 513 deputados federais, 27 governadores, o presidente, cinco ex-presidentes e um ex-vice-presidente na base de dados.

O CEAP é uma cota de reembolso que os parlamentares têm disponível mensalmente. Em tese, o CEAP deveria ser utilizado para cobrir gastos relativos ao exercício da atividade política do parlamentar, mas o que acontece é um abuso por parte dos políticos. Para citar alguns exemplos, segundo dados do “Serenata de Amor”, alguns parlamentares já pediram reembolso de 13 refeições feitas no mesmo dia; outro já foi reembolsado por uma refeição de 6.200 reais; e um parlamentar já teve reembolso por consumo de bebida alcoólica em Las Vegas, nos Estados Unidos.

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Vetores: FlatIcon

O QUE É CEAP?


TECNOLOGIA APLICATIVOS

Para o publicitário Igor Pascale, esses aplicativos para fiscalização podem ajudar muito na escolha e acompanhamento de políticos. “Com mais acesso e com canais e conteúdos adaptados às novas formas de consumo, incluindo as das gerações mais jovens, acredito que teremos mais capacidade fiscalizadora, propiciando mais poder de controle e decisão na hora do voto”, afirma. Pascale se mostra favorável a essas iniciativas e conta que provavelmente irá usar essas ferramentas futuramente. “No meu caso, apesar de privilegiar agendas que vão ao encontro dos meus ideais, a todo momento estou fiscalizando processos e condutas daqueles que dizem o que eu quero ouvir”, relata. O publicitário considera que essas novas ferramentas podem impactar no envolvimento da sociedade no processo democrático. “Obviamente, não acredito que isso venha a ser uma cultura generalizada à massa eleitoral, porém, acredito que paulatinamente esse comportamento será absorvido pelas novas gerações”, opina. A estudante de direito

Twitter:

“A Transparência Brasil foca sua atuação na busca pela integridade do poder público”

Site:

Foto: Henrique Andreão

Play Store:

Transparência

Reconhecimento facial utilizado para facilitar a fiscalização de políticos.

Larissa Balbi enxerga o cenário político com bastante descrença, mas acredita que esses aplicativos podem ajudar em mudanças. “Eu utilizaria esses aplicativos. Eu já acesso o Transparência Brasil. Acho que é muito importante você saber quais são os gastos do político que foi eleito para te representar. Quanto maior a espera, mais caro nos fica. Existem muitos gastos desnecessários, como o auxílio paletó. A gente vê placas de obras com valores exorbitantes e as obras não saem. Pra quem foi esse dinheiro? Fica aí a interrogação”, afirma.

Foto: Henrique Andreão

“Vigie Aqui é uma que destaca, em qualquer site, os nomes de políticos com pendências na Justiça”

Serenata de Amor “Um projeto aberto que usa ciência de dados com a finalidade de fiscalizar gastos públicos e compartilhar as informações de forma acessível a qualquer pessoa”

Larissa Balbi

Foto: Arquivo pessoal

Vigie Aqui

Igor Pascale PRI MEI RA

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TECNOLOGIA político moderno, principalmente por causa do tempo. “O papel dessas tecnologias da comunicação e informação é essencial para o desenvolvimento dos movimentos e para o acompanhamento do cidadão. Hoje, as pessoas têm uma vida muito corrida com demandas de trabalho, estudo, etc, e as tecnologias permitem esse acompanhamento”, aponta. Segundo o professor, a participação dos cidadãos no processo político é fundamental para a construção do processo democrático. ”Quanto mais intensa é a participação do cidadão nos assuntos públicos, melhor é a qualidade de vida. Eu vejo claramente que um dos problemas que temos nesse campo da corrupção é que nós, cidadãos, abandonamos a arena pú-

blica”, explica Simões. Esse abandono, de acordo com professor, contribuiu para a atual situação de crise no sistema político com a ocorrência da corrupção em grande escala. Simões ressalta também que essas tecnologias não devem ser usadas apenas nas épocas de eleições. É necessário que o povo participe ativamente nessa fiscalização dos poderes públicos. “Temos que nos conscientizar que o processo político, do ponto de vista da ação e do interesse do cidadão, não é o voto. O voto é uma parte disso. As tecnologias também nos permitem um maior e mais rápido acompanhamento e participação do processo público, sem ficarmos presos apenas nas eleições”, destaca.

Foto: Henrique Andreão

Impacto na política O professor Rafael Cláudio Simões, mestre em História, membro fundador e atual secretário de relações institucionais da ONG Transparência Capixaba, enxerga de forma positiva essas ferramentas tecnológicas que atuam contra a corrupção. “Vemos essas mudanças com muita expectativa, já que passos significativos foram dados. Esses aplicativos permitem uma maior participação do povo. Agora, com essas tecnologias, eu posso pressionar muito mais facilmente o meu deputado. São instrumentos que permitem um acompanhamento de forma muito mais célere e facilitada”, afirma. Para o secretário, essas novas tecnologias são fundamentais no processo

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O professor Rafael Cláudio Simões vê as ferramentas tecnologicas que atuam contra a corrupção com muita expectativa.

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TECNOLOGIA

Tecnologia a favor do meio ambiente

A tecnologia que antes parecia ser inimiga do meio ambiente, hoje pode ser considerada uma aliada cada vez mais forte na luta pela preservação Eliza Frizzera

O tema ambiental está cada vez mais frequente em diversas pautas do mundo inteiro, e para ajudar nessa luta, muitas cidades procuram se adequar aos desenvolvimentos tecnológicos. Essas inovações sustentáveis procuram trazer melhorias e novidades aos usuários, ao mesmo tempo em que preserva o meio ambiente. No Espírito Santo, uma dessas inovações saiu da Assembleia Legislativa do Estado, e contou com a participação de parlamentares e servidores da Casa. O projeto chamado Ales Digital, lançado em abril deste ano, consiste na implantação de processo eletrônico nos trâmites das áreas legislativa e administrativa da Casa, descartando o uso de papeis dos processos legislativos, que passarão a ser completamente virtualizados a partir do dia 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente. Com a estimativa de preservar até 40 árvores por ano, o autor do projeto, deputado Marcelo Santos, também espera a economia de gastos com papeis na Assembleia. “Qualquer forma de contribuição é importante. Creio que todos possuem essa responsabilidade de cuidar e preservar ”, conta o deputado.

Uma em cada cinco espécies de árvores do mundo são encontradas em terras brasileiras, fazendo com que o país tenha, além do privilégio de abrigar essas espécies, a enorme responsabilidade de preservá-las, o que, na realidade, não acontece da melhor maneira. Possuindo um histórico nada favorável em relação aos cuidados e a preservação ambiental, o país conseguiu apresentar nos últimos anos uma queda de 12% de áreas desma-

tadas na Amazônia, o que já é considerado algo a ser comemorado. De acordo com a pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o número de áreas desmatadas saiu de 7.893km² para 6.947 km2 no período de agosto de 2016 a julho de 2017. Os responsáveis ainda fizeram questão de comparar os dados de 2017 com os de 2004 quando o desmatamento medido foi de mais de 25.000 km2. A poluição também é PRI MEI RA

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TECNOLOGIA ga às concessionárias brasileiras, alguns motoristas optam por utilizar seus carros de forma mais sustentável trocando o uso do combustível tradicional, pelo GNV (Gás natural veicular). É o caso do comerciante Michel Gonçalves, que comprou um carro movido a gás para uso profissional e pessoal, segundo ele, a diferença entre a gasolina e o gás é muito grande. “Já tinha ouvido falar que o uso de gás nos veículos ajuda a prevenir a poluição, isso foi um incentivo para minha escolha, mas percebi que, além disso, o gás trouxe muitas outras vantagens, como a economia no abastecimento, que foi muita”, contou o motorista. No ambiente urbano, o uso adequado deste combustível, se comparado com os combustíveis tradicionais, podem reduzir as emissões de monóxido de carbono (CO)

Sabão feito por dona Dilma

em 76%, de óxidos de nitrogênio (NOx) em 84%, e de hidrocarbonetos pesados (CnHm) em 88%, praticamente eliminando as emissões de benzeno e formaldeídos, que são substâncias cancerígenas. Os avanços tecnológicos permitem também que a ajuda aconteça dentro de casa. O professor Jorge Santos, é uma dessas pessoas, ele aderiu o uso da energia

Foto: George Santos

um ponto importante que chama a atenção para a falta de cuidados dentro das cidades, e os métodos para evitar que o caos seja maior são frequentemente estudados. Um desses métodos que não se encontra em evidência no mercado é o uso de carros elétricos. No Brasil, essa inovação ainda está no estágio inicial, por isso não existem tantos modelos disponíveis nas concessionárias, mas há previsão de futuros lançamentos até o ano que vem. Os carros elétricos contribuem de forma direta para preservação do meio ambiente, pois funcionam a base da energia recarregável através de suas baterias, dessa forma, não emitem gases como o CO², que é um dos principais vilões do clima no mundo. Enquanto a inovação dos carros elétricos não che-

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George e o teto de energia solar

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“Sempre tive muita dó de pensar que o óleo descartado pudesse ir para o canal e poluir mais o meio ambiente, que já é tão prejudicado” Dilma Mendonça


TECNOLOGIA solar em sua casa. “Eu economizo nos gastos com a energia, e consigo dar mais qualidade de vida para minha família e ao meio ambiente. Acho que todos deveriam pensar na possibilidade de colocar em sua casa também”, diz o professor. A energia solar é limpa e renovável, ou seja, nunca acaba, apresenta também muitas vantagens para o meio ambiente e saúde das pessoas, pois não gera emissão de gases poluentes ou outros tipos de resíduos. É também uma excelente fonte de energia em locais não atendidos por outras fontes de energia, possuindo um baixo custo manutenção dos equipamentos usados. A cada dia que passa, são criados novos avanços

que procuram aliar tecnologia à preservação ambiental. Já existem várias inovações que vão de encontro com sustentabilidade e que são fáceis de serem encontradas e utilizadas, outras ainda se encontram em fase inicial, esperando apenas o sinal verde para se propagar nas infinitas regiões do mundo. Todos podem contribuir Não é necessário esperar somente os avanços tecnológicos para contribuir com a preservação. Existem diversas ideias baratas, fáceis e caseiras que também ajudam nessa luta. Uma dessas ideias foi adotada pela dona de casa, Dilma Mendonça, que reutiliza o óleo de cozinha para fazer sabão. Esse método evita

que o resíduo seja despejado na natureza. “Sempre tive muito dó de pensar que o óleo descartado pudesse ir para o canal e poluir mais o meio ambiente, que já é tão prejudicado”, explica Dilma. Não é preciso aprender a fabricar o produto, o consumidor consciente também tem a alternativa de doar – ou mesmo vender – o óleo usado para instituições, empresas ou pessoas como a dona de casa, que se encarregam de reutilizar o produto. “Tenho vizinhos que me doam o óleo usado, e às vezes até me pagam para fazer o sabão com o material que me doaram, outros já me pediram para ensinar a fabricar, e hoje também adotaram essa maneira de reutilização”, conta a aposentada.

COMO USAR ÓLEO DE COZINHA PARA FAZER SABÃO Material utilizado – 5 litros de óleo comestível usado – 2 litros de água (coloque para ferver) – 200 ml de amaciante – 1 Kg de soda cáustica em escama (NaOH) Passo-a-passo 1- Coloque a soda em escamas no fundo do balde cuidadosamente. 2- Coloque, com cuidado, a água fervendo. Mexa até diluir todas as escamas da soda. 3- Adicione o óleo cuidadosamente. Mexa. 4- Adicione o amaciante. Mexa novamente. 5- Mexa até formar uma mistura homogênea. 6- Jogue a mistura em uma fôrma e espere secar bastante. 7- Corte as barras e pronto! Quanto mais o sabão curtir, melhor ele fica. Todo cuidado é pouco. A soda, em contato com a pele, poderá causar queimaduras. Portanto, adote procedimentos de segurança como uso de luvas, óculos de segurança e tenha à mão materiais de primeiros socorros em caso de acidentes.

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