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Terror em Brasília é resultado da Lava Jato, que pariu Bolsonaro

Tutmés Airan afirma que ódio não aceita que democracia é governo da maioria

ODILON RIOS

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Especial para o EXTRA

Para o desembargador do Tribunal de Justiça Tutmés Airan, os efeitos da Operação Lava Jato (subvertendo o devido processo legal) mais o estímulo ao ódio à política, aos políticos e às instituições que representam a democracia são motivos para que o mundo assistisse, em 8 de janeiro, a destruição de prédios públicos na Praça dos Três Poderes em Brasília.

Em 2018, no rastro do lavajatismo, o deputado federal Jair Bolsonaro se elegeu presidente da República, escorado no discurso da antipolítica, apesar dele e dos filhos viverem da e na política há décadas. A “mamata” foi associada ao PT, assim como a decadência dos serviços públicos, impulsionando argumentos simplistas como a privatização. Se não funciona bem ou se os políticos são “sujos”, vende-se o patrimônio para o setor privado fazer a “limpeza”, porque o mercado não tolera corrupção.

O escândalo das Lojas Americanas e o rombo bilionário nas finanças comprovam que isso é conversa para boi dormir.

“Eu tenho absoluta convicção de que a Lava Jato pariu o bolsonarismo. Sem a Lava Jato não existiria o bolsonarismo. Foi uma operação profundamente antidemocrática, assim como está claro sobre o que é o bolsonarismo, que usa a mentira como arma de atuação política. Saímos da tolerância e do respeito, entramos na era da intolerância e no ódio”, diz Airan.

O lavajatismo nasceu dentro da própria justiça. Por anos, o exjuiz Sérgio Moro ocupou a posição de um justiceiro, aos poucos desconstruído, implacável com alguns e ameno para outros. Na campa- nha presidencial de 2018, foi sondado para ser ministro da Justiça e Segurança Pública. Quando Bolsonaro venceu, deixou a toga. Rompeu com o então presidente, virou candidato ao Palácio do Planalto e, sem decolar, disputou (e ganhou) uma vaga ao Senado pelo Paraná, onde nasceu.

“Eu diria que não foi o Poder Judiciário quem se bolsonarizou, mas setores da Justiça. Eles se encantaram com o discurso profundamente moralista e que surfava num mar de enorme apoio popular. Juízes são pessoas e se deixam pressionar, impressionar e até se apaixonar. Hoje uma grande parte das pessoas que apoiavam a Lava Jato faz autocrítica. E neste momento de resistência democrática percebeu-se que a Lava Jato, parindo o bolsonarismo, queria destruir a democracia”, analisa o desembargador, também ex-presidente do Tribunal de Justiça.

E após anos ocupando lados divergentes, Executivo, Legislativo e Judiciário foram obrigados a alinharem respostas aos atos de terrorismo de 8 de janeiro. Pela primeira vez em anos, estão sentados na mesma mesa. Somente assim foi possível identificar e prender golpistas e também seguir adiante om as investigações sobre os financiadores do quebraquebra em Brasília.

“O Poder Judiciário, sobretudo o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral, desempenham um importante papel neste momento e, ao mesmo tempo, despertam o ódio dos setores bolsonaristas. Por que? Porque a democracia tem regras básicas. A primeira: é o governo da maioria. A segunda: meios consensuais para expressar as divergências. Como eu expresso minha divergência ou insatisfação? Abdican- do do uso da violência. E foi exatamente o contrário de tudo isso que assistimos”, analisa Tutmés Airan.

“Por isso os setores do Judiciário que se encantaram com todo este discurso da Lava Jato e do bolsonarismo enfrentaram uma contradição absoluta: como um juiz, fiador da ordem democrática, comprometido com as lições do Iluminismo, estaria ao lado de quem nega a ordem democrática? A história mostra que a democracia brasileira é como uma planta: tem de ser cuidada, regada, fortalecida. E nós, do Judiciário, temos responsabilidade”.

Tutmés Airan é coordenador de Direitos Humanos do TJ de Ala- goas. E foi testemunha, como todos nós, do imponderável: presos por atentarem contra a democracia exigindo direitos humanos nas celas, algo tão atacado por eles.

“Eu fico feliz porque mostra o acerto da nossa posição de defesa dos direitos humanos. Que valem para qualquer pessoa, inclusive para os golpistas. Eles devem ser processados? Devem. Devem ser penalizados? Lógico. Respeitando todos os direitos que eles têm. Pena que essas pessoas vão aprender sobre direitos humanos da pior maneira, sofrendo na própria pele. Poderia ser de outra maneira, mas escolheram a dor. Quem sabe não passem a defender os direitos humanos. A dor ensina”, conclui.

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