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O voo da borboleta amarela

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Em quem acreditar?

Em quem acreditar?

levou, e de ter cultivado grandes amores, nem sempre correspondidos, Rubem Braga carregava um ar melancólico. O filme, de certo modo, capturou essa atmosfera triste que cercava o cronista.

Mendes Vanildo

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Em breve, seremos brindados com o lançamento, no Brasil, do documentário ‘O Voo da Borboleta Amarela’, sobre a vida e obra do escritor e jornalista Rubem Braga (1913-1990), o maior cronista brasileiro do século XX.

É mais uma criação da dupla incansável formada pelos jornalistas e cineastas Jorge Oliveira (na direção) e Ana Maria Rocha (produção executiva).

Lançado no final do ano passado em Portugal, onde mora o casal atualmente, o filme foi vencedor do Festival de Cinema de Língua Portuguesa (Festin 2022), um dos mais prestigiados da Europa, na categoria Documentário.

Jorge, de quem sou amigo há mais de 40 anos (caramba, o tempo voa), veio para o Brasil lançar o filme e colocá-lo no circuito de festivais. Mas o acaso lhe pregou uma peça.

Depois de exibir sua performance de ‘vovô do surfe’ na praia de Barra de São Miguel, Alagoas, onde tem casa de veraneio, ele sofreu um acidente vascular cerebral, há pouco mais de um mês, o que retardou a programação.

Corajoso como um matador de cangaceiros, Jorge está superando com incrível sucesso as sequelas da doença e retomando as providências para lançamento de ‘O Voo da Borboleta Amarela’.

Está tão bem que até está produzindo documentário sobre o próprio AVC, com depoimentos de médicos e profissionais que cuidam de vítimas desse terrível evento.

Vi o filme. Começa com um idoso encomendando e pagando à vista as despesas de um funeral. Negócio fechado, o agente funerário pergunta onde está o cadáver para iniciar os trabalhos. A resposta é desconcertante:

- O cadáver sou eu.

O espetador pode trancar o sorriso, porque não se trata de comédia. Também não é drama. O roteiro é a manifestação da vida na sua mais trivial normalidade.

Apesar da vida frenética e intensa que

É como um samba canção da era Bossa Nova, assinado por Vinícius de Moraes. ‘Pra fazer um samba com beleza/É preciso um bocado de tristeza/Senão, não se faz um samba não’.

Natural de Cachoeiro do Itapemirim, Rubem Braga publicou mais de 15 mil crônicas na imprensa brasileira.

Quase sempre com abordagem de temas fortuitos e aleatórios, muitas vezes descolados da realidade factual, como o singelo voo de uma borboleta amarela no emaranhado urbano da grande cidade.

Com seu estilo único, Rubem Braga é considerado o criador da crônica literária.

Voltando ao Jorge, é realmente um cabra da peste, que encara a vida com faca nos dentes e mãos nervosas quando se trata de combater fascistas e seus filhotes tupiniquins. Mas conserva coração de menino no aconchego do lar e no afeto aos chegados.

Além de jornalista e cineasta, com vários prêmios nacionais e internacionais, Jorge é escritor, com sete títulos publicados, e marqueteiro político, à frente da empresa de vídeo JCV. Em todos os campos onde atua, conserva a alma de repórter, ganhador de dois Prêmios Esso.

De férias na terrinha, a Joyce e eu estivemos com o casal há duas semanas na casa de praia. Pude constatar que o camarada Jorge, alagoano de Maceió, recupera-se bem, cercado por amigos e o carinho da família.

Um bom repórter, do tipo que caça notícia como cão perdigueiro, precisa reunir três características básicas: ser curioso, exercitar a dúvida de forma metódica, sistemática, cartesiana mesmo, e saber contar uma história.

O Jorge domina bem todos os fundamentos de repórter. Some-se a isso a clareza no texto, o espírito crítico, muita coragem e uma pitada de sorte, que costuma cair no colo de quem acorda mais cedo, mantém todos os sentidos em alerta, e se recolhe mais tarde.

SINOPSE DO FILME

Um bom repórter, do tipo que caça notícia como cão perdigueiro, precisa reunir três características básicas: ser curioso, exercitar a dúvida de forma metódica, sistemática, cartesiana mesmo, e saber contar uma história.

As mais de 15 mil crônicas publicadas por Rubem Braga deram novo status a este gênero literário e por isto ele é considerado o maior cronista do país.

O Voo da Borboleta Amarela, dirigido por Jorge Oliveira, é um documentário que mostra o escritor capixaba em várias fases de sua vida por meio de suas próprias crônicas.

O filme utiliza cenas de dramaturgia para recompor episódios da vida do cronista representado por três atores em idades diferentes, desde os 76 anos quando morreu, passando pelos 50 e 30 anos, período em que atuou como jornalista e foi correspondente da 2ª Guerra Mundial, até a adolescência, quando publicou sua primeira crônica em Cachoeiro do Itapemirim.

As memórias do escritor são revistas e contempladas através da janela da fazenda de sua infância, sempre com textos escritos por ele mesmo. No Rio de Janeiro, quatro atores declamam as crônicas ‘Ai de Ti Copacabana’ e ‘O Voo da Borboleta Amarela’, que dá nome ao filme.

Na cidade de Braga, uma música de Dorival Caymmi, grande amigo de Rubem, é interpretada por uma fadista em homenagem à família do cronista que adotou o nome da cidade como sobrenome, quando veio de Portugal.

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