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Pesquisadora encoraja mulher a denunciar violência obstétrica
from Edição 1212
Segundo Bruna Pimentel, agressão pode ocorrer tanto na gestação quanto no parto
MARIA SALÉSIA sallesiaramos18@gmail.com
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Mãe de três filhos e vítima de violência obstétrica em dois partos, Bruna Pimentel, bacharel em Direito, graduanda em criminologia e correspondente jurídica, desenvolveu um artigo científico encorajando as mulheres a denunciarem a violência obstétrica sofrida dentro das unidades de saúde. Para ela, trata-se de uma violência de gênero e as mulheres, muitas vezes, não sabem os seus direitos.
Bruna esclarece que esse tipo de agressão pode ser caracterizado tanto durante a gestação quanto na hora do parto. Além do que, também há violência obstétrica no momento da assistência em casos de aborto, principalmente no induzido.
O artigo sobre violência obstétrica no Brasil foi escrito com objetivo de esclarecer e informar as mulheres sobre este crime. “Quando negado atendimento à mulher, quando é imposto qualquer tipo de dificuldade onde se faz o pré-natal, quando são feitos comentários humilhantes, desrespeitosos referente a cor ou classe social da mulher, sua escolaridade, a quantidade de filhos que ela tem, tudo isso é considerado uma violência obstétrica”, diz.
A profissional afirma que violência obstétrica pode se iniciar na recepção da maternidade por parte dos profissionais de atendimento. E exemplifica ao classificar dessa forma a falta de atenção quando a paciente chega com muita dor, a demora em prestar assistência. “Acontecem situações de mulheres terem seus filhos na recepção e corredor por falta de atendimento e isso é considerado violência obstétrica”, afirma.
Também é considerada violência obstétrica quando os profissionais não permitem que a gestante seja acompanhada por quem escolheu, embora exista uma lei que garanta esse direito. “O hospital não pode intervir nessa escolha. Pode ser homem ou mulher, parente ou não”, esclarece. Da mesma forma, alguns procedimentos são considerados violência obstétrica. Um deles é o toque no canal vaginal para checar se há abertura adequada para a saída do bebê. “Mesmo com tantas contrações, dores e outros incômodos, a mulher ainda tem que se dispor a ser tocada por diversas vezes, escutar palavras impróprias, desrespeitosas contra ela e até o acompanhante. A violência obstétrica é muito além do que a gente imagina”, garante a pesquisadora.
No momento do pré-parto as violências mais corriqueiras são moral, psicológica e verbal. Comentários como “quando foi fazer não chorou” ou “no próximo ano eu te encontro aqui”, são exemplos. A exposição da mulher a multiprofissionais sem seu consentimento, referências pejorativas a vida sexual dela com abuso verbal e constrangimento, todos são exemplos de violência de cunho sexual.
A advogada também lembra que muitas maternidades ainda utilizam medicamentos, como a ocitocina, que acelera as contrações no trabalho de parto, mesmo com a recomendação contrária da Organização Mundial de Saúde (OMS). Outro problema verificado de forma corriqueira é a restrição de alimentos, embora não haja respaldo científico para manter a mulher em jejum absoluto, caso o trabalho de parto esteja fluindo de forma saudável. “Se o parto não for de alta complexidade, com gestação saudável, não há porque deixar essa mulher de jejum absoluto”, comenta.
A pesquisadora citou duas manobras que são feitas na gestante, também banidas pela OMS, tendo em vista que são agressivas e podem acarretar problemas de saúde. São considerados procedimentos violentos, a episiotomia, uma sutura que é feita entre a vagina e o ânus quando a passagem para o bebê é pequena e a manobra de kristeller, onde a técnica utilizada para acelerar o trabalho de parto é fazer pressão sobre o útero da mulher, diminuindo o período expulsivo. Apesar do uso, a técnica expõe mãe e bebê a riscos.
Maternidade
“Essa manobra já foi banida, não pode mais ser realizada nas maternidades porque a mulher pode ter costelas fraturadas, hematomas no corpo, prejudicar o bebê, ser machucada. Mesmo assim ainda é realizado por alguns profissionais”, informa.
Muitas mulheres quando sofrem aborto induzido ou espontâneo, também sofrem violência obstétrica. No induzido, principalmente, a violência é mais constante. “Podemos correlacionar a violência obstétrica ao direito da autonomia. Os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, principalmente no momento do parto, onde ocorre grande violência do direito. Ao violar a autonomia das mulheres, está sendo ferido o direito da dignidade da pessoa humana, citado na constituição federal do artigo 1º parágrafo 3º. A mulher perde sua autonomia, perde seus direitos sexuais e reprodutivos no momento do parto, onde ela está ali da maneira que os profissionais de saúde querem que elas estejam”.
Bruna Pimentel sofreu na pele, no corpo e na alma este tipo de violência por duas vezes e em duas maternidades de Maceió. Perdeu a autonomia do corpo, sofreu violência verbal, psicológica, moral, onde realizaram procedimentos invasivos e que tem consequência porque refletem não só no físico quanto psicológico, traumatizando. “O motivo do artigo científico é mostrar na área do Direito que nós mulheres temos o direito de denunciar a violência obstétrica na Defensoria Pública. Se a mulher sofreu esse crime, ela pode registrar a denúncia informando a maternidade, os fatos que ocorreram. É um direito que assiste”, ensinou.
“O Estado tem o dever de manter e fiscalizar o órgão de saúde, mas na prática não acontece. Muitas vezes a mulher não denuncia porque não sabe seus direitos”, afirmou.
Estudo aponta que 50% das mulheres entrevistadas sofreram violência obstétrica
Bruna Pimentel realizou enquete com 150 mulheres sobre o assunto e o resultado não foi nada animador. Ao ser questionada sobre o que é violência obstétrica, 37% disseram que sabia; 56% afirmaram que já ouviu falar, mas não sabe nada sobre o assunto e 7% nunca ouviu falar. Quando pergunta era se “você sabe quais os tipos de violência obstétrica”, 30% responderam sim; 39% que algumas e 31% que não tenho ideia. Quando quer saber se já sofreu ou conhece alguém que sofreu violência obstétrica, 50% já disse que sofreu; 30% nunca e 20% conhece alguém que sofreu.