Versão dos Jornalistas 160

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Leis que afetam o

jornalismo De decretos defasados a Propostas de Emenda à Constituição que aguardam votação durante anos, o legislativo brasileiro nem sempre está de acordo com as demandas da categoria. Em reportagem especial, veja os principais temas em discussão. Página central

Fotos: Douglas Roehrs / SINDJORS

PUBLICAÇÃO DO SINDICATO DOS JORNALISTAS PROFISSIONAIS DO RS ANO 25 – Nº 160 – MAIO DE 2017

PERFIL

Com 30 anos de profissão, Renato Dornelles vive sua melhor fase com sucesso no cinema REPRESÁLIA

HUMOR

Meio ano após revindicação por melhorias, Record RS demite 11 funcionários

Chargistas expõem sua visão sobre o golpe que destituiu Dilma da Presidência da República

Página 2

Contracapa

Páginas 6 e 7


EDITORIAL

Defesa incansável da obrigatoriedade do diploma

D

errubada em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009, a obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo é uma das lutas travadas pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS (SINDJORS). Conforme bem lembra o diretor de redação do jornal Correio do Povo, Telmo Flor, a presença de profissionais formados nas redações proporcionou uma melhoria evidente não só nos aspectos técnicos, de linguagem, de texto, como também e especialmente no âmbito da ética. Por mais que o ministro do STF Gilmar Mendes, relator da queda da necessidade do diploma, diga que notícias inverídicas são grave desvio da conduta que não encontram solução na formação em curso superior, acreditamos no oposto. As faculdades de comunicação são necessárias para prepararem profissionais de maneira técnica, ética e humanística. Propõem um rumo a ser seguido pelos estudantes, proporcionando as primei-

ras noções de tudo que implica o fazer jornalístico. Atualmente, duas Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que determinam a necessidade do diploma para exercer a profissão estão paradas no Congresso. A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e os sindicatos de jornalistas fazem campanhas em defesa do diploma e de outros avanços necessários para a categoria. “Pela importância do compromisso ético para a qualidade do jornalismo, não basta a exigência do diploma, mesmo que ela seja fundamental, é preciso também outros elementos da regulamentação da profissão, como a criação do Conselho Federal de Jornalistas, para a fiscalização do exercício profissional”, afirma a presidenta da FENAJ, Maria José Braga. Todavia, após o golpe contra a democracia e o ataque aos direitos dos trabalhadores ocorridos no país, somam-se a essas lutas outras muitas. Há a necessidade mais urgente de frear os

planos do governo de Michel Temer, que pretende acabar com a aposentadoria e precarizar as relações de trabalho. Temer, o golpista, representa os desejos da elite empresarial brasileira e sacia suas necessidades sacrificando o povo brasileiro. O governo atual é criminoso em todos os sentidos possíveis. De natureza ilegítima e de ética tão ou mais combalida do que a de gestões anteriores, mata a população mais necessitada ao lhes arrancar direitos. Por isso, o SINDJORS, assim como outras lideranças sindicais, luta pelos trabalhadores. Reforça a necessidade de um emprego digno e de uma aposentadoria compatível para todos, sem deixar de lado questões como a obrigatoriedade do diploma, tema da reportagem principal desta edição, que também traz o perfil do jornalista Renato Dornelles e os principais acontecimentos de abril.

REPRESÁLIA

Record RS demite a conta-gotas funcionários que paralisaram Passado meio ano da paralisação de funcionários da TV Record RS, nem todas as consequências do ato são positivas. Conforme ex-funcionários, 11 entre os profissionais que se manifestaram foram, aos poucos, demitidos da empresa – o mais recente no último dia 17 de abril. À época, com repercussão nacional do movimento, a diretoria da emissora atendeu quase todas as reivindicações, que incluíam pedidos como o fim do assédio moral e escala de folgas em feriados. “No jornalismo, de todas as substituições, nenhuma o motivo foi por causa disso”, afirma o diretor de Jornalismo da Record RS, Rodrigo Falcão, ao argumentar sobre as demissões. “Por mais que a empresa tente justificar as demissões como parte de um novo projeto, ao menos

parcela dessas demissões é claramente uma perseguição aos profissionais que tiveram coragem de mostrar práticas inadequadas e cotidianas na empresa”, desabafa o presidente do SINDJORS, Milton Simas. PEDIDOS PENDENTES Representantes dos sindicatos dos Jornalistas Profissionais do RS e dos Radialistas foram recebidos pelo presidente da Record RS, Reinaldo Gilli, no dia 21 de outubro do ano passado, para ter um retorno das reivindicações apresentadas pelos funcionários quatro dias antes. Na ocasião, Gilli informou, por exemplo, que o rancho do mês passaria a ser concedido para todos os trabalhadores, desde que não se tenha falta

Versão dos Jornalistas é uma publicação do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul Rua dos Andradas, 1270, 13º andar, sala 133 Centro Histórico – Porto Alegre/RS – CEP 90020-008 Fones: (51) 3226-0664 | 3228.8146 | 3226.1735 www.jornalistasrs.org – web@jornalistasrs.org

FILIADO

Edição: André Simas Pereira e Márcia Fernanda Martins Edição executiva e reportagem: Douglas Roehrs Edição de fotografia: Robinson Luiz Estrásulas Projeto gráfico: Gilson Camargo Diagramação: Laura Santos Rocha Impressão: Gráfica Pioneiro Tiragem: 3 mil exemplares Diretoria Presidente – Milton Siles Simas Júnior 1ª Vice-presidenta – Laura Eliane Lagranha Santos Rocha 2º Vice-presidente – Elson Sempé Pedroso 1º Secretário – Jorge Luiz Correa da Silva 2ª Secretária – Márcia de Lima Carvalho 1º Tesoureiro – Robinson Luiz Estrásulas 2º Tesoureiro – Renato Bohusch 1º Suplente – Gabriel Gonçalves Ribeiro

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sem justificativa no mês em curso; organizaria um cronograma para concessão de férias, respeitando as demandas de serviços e de funcionários, assim como uma escala de folgas em feriados; e comprometeu-se a ampliar o número de funcionários na área de limpeza. Alguns pontos importantes, todavia, estão pendentes. A questão da mudança de registro de cinegrafista para repórter cinematográfico, por exemplo, seria discutida com os sindicatos no mês de novembro, algo que nunca ocorreu. Procurado pelo Sindicato dos Jornalistas durante vários dias, o presidente da Record RS não foi encontrado por telefone e tampouco respondeu o pedido feito por email conforme solicitado pela equipe administrativa.

Conselho Fiscal Celso Augusto Schroder, Vera Daisy Barcellos Costa, Adroaldo Bauer Spíndola Corrêa, Clóvis Victória Junior, Dolcimar Luiz da Silva e Nilza do Carmo Scotti Diretoria Geral André Luiz Simas Pereira, Carla Rosane Pacheco Seabra, Eduardo Silveira, Gilson Verani Freitas de Camargo, Guilherme Fernandes de Oliveira, Márcia Fernanda Peçanha Martins, Marco Alexandre Bocardi, Maria Alcívia Gonçalves da Silveira, Mateus Campos de Azevedo, Paulo Gilberto Alves de Azevedo, Pedro Guilherme Dreher, Pedro Luiz da Silveira Osório, Roberto Carlos Dias, Silvia Fernandes e Thaís Vieira Bretanha Comissão de Ética Moisés dos Santos Mendes, Cristiane Finger Costa, Flavio Antonio Camargo Porcello, Antônio Carlos Hohlfeldt, José Maria Rodrigues Nunes, Jeanice Dias Ramos, Carlos Henrique Esquivel Bastos, Neusa Maria Bongiovanni Ribeiro, Marcos Emilio Santuário e Julieta Margarida Amaral

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SINDICATO

Conferência discute ações em defesa ao SUS

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Conferência Livre de Comunicação em Saúde, que teve como tema Saúde das Mulheres e Democracia, ocorreu no dia 7 de abril, na Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Realizada no Dia Mundial da Saúde e Dia Nacional dos Jornalistas, a atividade reuniu cerca de 150 pessoas e trouxe como principal ponto de discussão a formação de uma rede de ações de comunicação para a defesa do Sistema Único de Saúde (SUS). “O SUS está ameaçado no atual governo. Estamos fazendo uma contraposição ao discurso negativo da mídia hegemônica”, destacou a presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (COMDIM/POA), Vera Daisy Barcellos, na mesa de abertura. “Estamos vendo ataques às políticas públicas, entre elas o Sistema Único de Saúde”, afirmou o presidente do Sindicato dos Enfermeiros do Rio Grande do Sul (SERGS), Estêvão Finger. Segundo ele, os profissionais da saúde têm o dever de dialogar com a sociedade e procurar os veículos de comunicação alternativos para mostrar o lado positivo e necessário do SUS, já que a maioria da população é pautada pela mídia tradicional, que tem interesse na privatização da saúde. Além de Vera Daisy e Finger, participaram da abertura do evento a diretora da Escola de Enfermagem da UFRGS, Gisela Maria Souto de Moura; a representante da Federação dos Empregados em Estabelecimentos de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul (FEESSERS), Margarete Resmini; e o presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS (SINDJORS), Milton Simas. “Foi um

trabalho intenso nos últimos dias, que demonstrou unidade dos movimentos sociais”, reforçou Simas, sobre a organização da conferência. As palestrantes foram Neusa Heizelmann, enfermeira do Coletivo Feminino Plural; Cristiane Famer Rocha, docente na Escola de Enfermagem da UFRGS; Nelci Dias da Silva, enfermeira e conselheira do Coren-RS; Mariana Sales, jornalista de Salvador; Renata Pekelman, médica do Grupo Hospitalar Conceição; Inara Claro, jornalista da FEESSERS; Gilmara Gil, jornalista da Sociedade Brasileira de Coluna; e Neusa Ribeiro, jornalista e docente da Feevale. A partir deste encontro, surgiram encaminhamentos que foram aprovados na I Conferência Nacional Livre de Comunicação em Saúde, realizada pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) entre os dias 18 a 20 de abril, em Brasília, no Distrito Federal. ENTIDADES APOIADORAS Participaram da construção da edição gaúcha: Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS (SINDJORS), através do seu Núcleo de Gênero e Diversidade; Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (COMDIM/POA); Observatório da Violência Obstétrica no Brasil (projeto de extensão da UFRGS); Regional da Rede Feminista de Saúde; Sempre Mulher Instituto de Pesquisa e Intervenção sobre Relações Raciais Regional RS; Coletivo Feminino Plural; Sindicato dos Enfermeiros do Rio Grande do Sul (SERGS); Conselho Regional de Enfermagem (Coren-RS); e Federação dos Empregados em Estabelecimentos de Saúde do Estado do Rio Grande do Sul (FEESSERS).

SINDJORS na abertura do ano letivo na Urcamp A Delegacia Regional de Bagé esteve presente na abertura oficial do ano letivo do curso de Jornalismo da Universidade da Região da Campanha (Urcamp). O delegado Gilberto Bombardieri e o diretor do SINDJORS Mateus Azevedo conversaram com os estudantes, no dia 12 de abril, sobre conjuntura social e política e exercício da profissão. A entidade fez parte do evento a convite do coordenador do curso, Glauber Pereira. Foto: Divulgação

Grupo debateu o exercício da profissão

Balanço financeiro de 2016 é aprovado

Fotos: Douglas Roehrs / SINDJORS

Assembleia foi realizada na sede da ACEG

A prestação de contas de 2016 foi apresentada pelo Sindicato em assembleia realizada no dia 4 de abril, na sede da Associação dos Cronistas Esportivos Gaúchos (ACEG), localizada na Rua dos Andradas, 1270 – 13º andar, em Porto Alegre. Após o detalhamento da receita e das despesas, a categoria aprovou o balanço, que já havia sido avaliado e tinha parecer favorável do Conselho Fiscal. A assembleia para apreciação do tema segue as diretrizes do estatuto, que determina sua realização anualmente. A presidenta do COMDIM/POA, Vera Daisy Barcellos, alertou que o SUS está em perigo no governo atual

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ESPECIAL

Legislação: reflexos na vida Atualmente, duas Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que objetivam a retomada da exigência do diploma para exercer a profissão de jornalista estão paradas no Congresso aguardando votação. Também tramita um projeto que pede o fim de taxas para a importação de equipamentos fotográficos para profissionais da área. Além disso, a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e sindicatos pedem a atualização de decretos que regulamentam atividades desenvolvidas por profissionais de comunicação.

Q

uando o ministro Gilmar Mendes votou a favor da queda da obrigatoriedade do diploma de jornalismo para exercer a profissão, no dia 17 de junho de 2009, argumentou que as notícias inverídicas são grave desvio da conduta que não encontram solução na formação em curso superior. Também disse que o decreto-lei 972/69, que regulamenta a profissão, foi instituído no regime militar e tinha clara finalidade de afastar do jornalismo intelectuais contrários ao regime. Mendes, relator do caso, teve seu voto acompanhado por outros sete ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Único a votar a favor do diploma, Marco Aurélio Mello alegou que as técnicas para entrevistar, editar ou reportar são necessárias para a formação do profissional. “O jornalista deve ter uma formação básica que viabilize a atividade profissional, que repercute na vida dos cidadãos em geral”, ressaltou. Menos de um mês após a decisão, o deputado Paulo Pimenta (PT/RS) apresentou a PEC 386/2009, que “altera dispositivos da Constituição Federal para estabelecer a necessidade de curso superior em Jornalismo para o exercício da profissão”. A matéria, no entanto, nunca chegou a ser apreciada em sessão da Câmara dos Deputados. “Hoje, depois de anos de luta e muita discussão, já temos um ambiente aqui dentro da Câmara favorável à aprovação”, avalia Pimenta (leia a entrevista ao lado). Seu conteúdo se assemelha ao da PEC 206/2012, uma proposição do senador Antonio Carlos Valadares (PSB/SE) feita três anos mais tarde. O texto teve parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, em 2013. Com sua aprovação no Senado Federal, foi enviado para a Câmara, onde nunca foi apreciado. Como tem caráter terminativo, ou seja, necessita apenas votação no plenário e não passagem por Comissão Especial, tornou-se o centro das atenções para quem é favorável ao retorno da obrigatoriedade do diploma. “A formação de nível superior em Jornalismo foi um divisor de águas na qualificação da imprensa brasileira. Basta ir aos arquivos históricos dos jornais e revistas para verificar facilmente a diferença abissal de qualidade que o advento das faculdades de Jornalismo e da presença de jornalistas diplomados nas redações gerou. Esta melhoria é evidente não só nos aspectos técnicos, de linguagem, de texto, como também e especialmente no âmbito da ética”, opina o diretor de redação do jornal Correio do Povo, Telmo Ricardo Borges Flor.

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Para o profissional, o argumento de Mendes de que a necessidade de diploma foi instituída no regime militar e tinha clara finalidade de afastar do jornalismo intelectuais contrários ao regime, ao ser utilizado durante a votação em 2009, é anacrônico e desconectado da realidade e do cotidiano das redações e do fazer jornalístico. Conforme ele, o impacto do fim da exigência de curso superior é reduzido nos veículos mais tradicionais, visto a virtual exigência de diplomação para o acesso à absoluta maioria das vagas. As diretrizes gerais do Correio do Povo para qualquer função, por exemplo, determinam a escolha de profissionais qualificados e com a formação adequada ao melhor desempenho de suas funções, o que pressupõe, para funções jornalísticas, a formação superior na área. “No entanto, creio que a proliferação na internet de sites, blogs etc. baseados na disseminação dos chamados fake news ou de outros enfoques irresponsáveis, mas pretensamente jornalísticos, é uma evidência de quanto a falsificação ganha espaço em ambientes descomprometidos com o exercício regular e adequado do jornalismo como profissão”, enfatiza. Defensora da regulamentação da profissão de jorFotos: Agência Câmara

Deputado Paulo Pimenta é autor de uma das PECs

nalista e da exigência de formação de nível superior específica em Jornalismo como um dos pilares dessa normatização, a FENAJ acredita que o jornalismo é uma das atividades essenciais para a vida democrática e o seu exercício requer conhecimentos teóricos e técnicos, além do compromisso ético. “Pela importância do compromisso ético para a qualidade do jornalismo, não basta a exigência do diploma, mesmo que ela seja fundamental, é preciso também outros elementos da regulamentação da profissão, como a criação do Conselho Federal de Jornalistas, para a fiscalização do exercício profissional”, afirma Maria José Braga. OUTROS TEMAS EM DISCUSSÃO A retomada do diploma como indispensável para o exercício da profissão não é o único assunto legislativo que interessa aos profissionais de comunicação. Outros temas também afetam diretamente o jornalismo, como a necessidade de curso em Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) para ser locutor e produtor de rádio e televisão. O curso técnico de 800 horas, que tem fiscalização do Ministério da Educação (MEC), habilita para funções como entrevistador, noticiarista, anunciador, apresentador e narrador ou comentarista esportivo. Na visão da FENAJ, apresentadores de programas jornalísticos de rádio e de televisão estão exercendo uma atividade de jornalista. Conforme Maria José, a legislação profissional, que está em vigor apesar da derrubada da exigência do diploma, não cita muitas funções exercidas atualmente pelos jornalistas. Um exemplo é a função de assessor de imprensa. “Apesar de não estar na legislação, os jornalistas atuam como assessores de imprensa e têm suas habilidades e competências reconhecidas”, comenta a presidenta. “É por isso que, além de defender a PEC do Diploma, a FENAJ luta também por uma atualização da regulamentação profissional, que, por coerência, será encaminhada depois do restabelecimento da exigência da formação de nível superior específica em Jornalismo para o exercício profissional”, diz Maria José. Para o assessor jurídico do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS (SINDJORS), Antônio Carlos Porto Jr., a necessidade de curso para locutor e produtor, regra proveniente da lei 6.615/78, é polêmica e possivelmente seja objeto de enfrentamento jurídico.

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Fotos: Douglas Roehrs / SINDJORS

a dos jornalistas

ISENÇÃO EM IMPORTAÇÕES Apresentado pelo deputado Rodrigo Maia (DEM/ RJ), o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 141/2015 dispõe sobre a isenção de impostos e de contribuições na importação de equipamentos e materiais para uso exclusivo de fotógrafo, repórter fotográfico e cinematográfico, cinegrafista e operador de câmera. Com limite de R$ 50 mil na compra de produtos, a proposta estabelece isenção do Imposto de Importação, do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), do PIS/Pasep e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) para os equipamentos importados que não tenham similar nacional. “A isenção de impostos para importação de equipamentos não é uma coisa nova e existe no Brasil para diversos segmentos. A FENAJ entende que os profissionais jornalistas também devem ser beneficiados”, afirma Maria José. Entendimento semelhante ao de Porto Jr.: “É preciso dar um tratamento equânime a situações semelhantes”. No texto de apresentação do PLC, Maia argumenta que o Projeto de Lei implica renúncia de receita. Entretanto, em contrapartida, estimula as atividades profissionais de fotógrafos e cinegrafistas, incentivando uma profissão importante e que muitas vezes é preterida. Atualmente, a matéria está sob análise na Comissão de Assuntos Econômicos (Secretaria de Apoio à Comissão de Assuntos Econômicos), com relatoria da senadora Kátia Abreu (PMDB/TO). Caso o projeto seja aprovado, haverá uma série de exigências para se obter o benefício, como a comprovação do exercício da profissão e a declaração de falta de equipamento similar no país.

“O jornalista é ignorado pelo próprio sistema de mídia” O deputado Paulo Pimenta, formado em jornalismo pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e autor de uma das PECs que propõem a retomada da necessidade do diploma, concedeu entrevista ao Versão. Confira os principais pontos: A PEC de sua autoria segue parada há anos no Congresso. Há alguma previsão de que seja votada? Ela está pronta para ser votada em plenário pela Câmara dos Deputados. A FENAJ e os sindicatos continuam fazendo um trabalho importante de mobilização junto às lideranças no Congresso, mas precisamos ter todas as garantias de que teremos os votos necessários para a aprovação. Lembrando que para aprovação de uma PEC são necessários 308 votos, ou seja, um quórum elevado. Portanto, de nada adiantaria termos nos antecipado para colocar essa proposta em votação sem que tivéssemos os votos necessários. Hoje, depois de anos de luta e muita discussão, já temos um ambiente aqui dentro da Câmara favorável à aprovação da PEC. Como o deputado vê o lobby feito pelos representantes de veículos de comunicação para que não seja aprovada nenhuma das duas PECs? Atuam de maneira velada, mas detêm muito poder de influência. Sabemos que todas as vezes que

há possibilidade da PEC dos Jornalistas entrar em pauta, eles se mobilizam. O que os jornalistas podem fazer além para ajudar a pressionar a Casa e, consequentemente, levar adiante a PEC? Participar das atividades dos sindicatos e pressionarem os deputados para que a matéria seja pautada. Precisam usar os espaços que possuem, de diálogo com a população, para alertar sobre os prejuízos para a sociedade de um jornalismo feito sem visão crítica, parcial, que passa a ter um único fim, atender interesses políticos e econômicos de pequenos grupos financeiramente poderosos em nosso país. O jornalista é valorizado no país? O jornalista é ignorado pelo próprio sistema de mídia. Por exemplo, manifestações de jornalistas nunca são retratadas na mídia. Sob esse aspecto, ele é um ser invisível. O fim do diploma de Jornalismo demonstra que os jornalistas não são valorizados em nosso país. O fim do diploma sempre foi uma demanda dos patrões para enfraquecer ainda mais o jornalista nas relações de trabalho. E o STF, absurdamente, aceitou essa reivindicação de meia dúzia de empresários que controlam o oligopólio das comunicações no Brasil.

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PERFIL RENATO DORNELLES

Foto: Douglas Roehrs / SINDJORS

Repórter contra a criminalização da pobreza Renatinho em frente ao prédio do Grupo RBS, sede dos jornais Zero Hora e Diário Gaúcho, onde trabalha desde que se formou em jornalismo, na década de 1980

Aos 52 anos de idade e 30 de jornalismo, Renato Dornelles vive o momento de maior reconhecimento profissional até então. Além de repórter especial e colunista do Diário Gaúcho, acabou de lançar Central, documentário baseado no livro-reportagem Falange Gaúcha, de sua autoria, e prepara uma continuação da obra impressa. Entre um compromisso e outro, Renatinho concedeu entrevista aos jornalistas André Pereira, Clóvis Victória Jr., Douglas Roehrs, Laura Santos Rocha, Márcia Fernanda Martins e Milton Simas, em mesaredonda na sede do SINDJORS. 6

N

o prefácio do livro-reportagem Falange Gaúcha, de Renato Dornelles, o jornalista e advogado Cláudio Brito diz que ser jornalista é jeito, estado, consciência e sentimento, e Renatinho é desses profissionais. Jornalista por índole. Repórter o tempo inteiro, difícil vê-lo sem um bloco de notas e uma caneta, vendo, ouvindo, perguntando, anotando. O texto é de 2008, época que a obra foi lançada pela RBS Publicações. No entanto, segue atual. Renatinho, como é conhecido pelos amigos, segue mais ativo do que nunca. Além do seu trabalho como repórter especial da editoria de segurança dos jornais Zero Hora e Diário Gaúcho, e colunista deste, recém lançou o longa-metragem Central, que codirigiu ao lado de Tatiana Sager e roteirizou, premiado como melhor documentário do Prêmio Nacional de Direitos Humanos e do Festival de Língua Portuguesa – Portugal, e prepara uma continuação para o Falange Gaúcha. “Em nenhum momento da minha carreira meu trabalho foi tão reconhecido”, comemora Renatinho. O livro e o filme giram em torno do crime organizado no Rio Grande do Sul e o Presídio Central, que está encravado na encosta do Morro da Polícia, em Porto Alegre, e é considerado um dos mais perigosos do país. Como mostrado nas obras, o local deteriora-se com o passar do tempo e há décadas diferentes governos prometem fechá-lo, algo que não foi levado adiante. Enquanto segue de pé, é como se fosse uma chaga aberta – vítima do descaso do Estado, superlotado e dominado por facções. O crítico do portal AdoroCinema, Bruno Carmelo, ressalta que o filme, exibido no 44º Festival de

Cinema de Gramado, no ano passado, “revela um sistema corrompido, no qual os detentos são os verdadeiros dirigentes enquanto o governo e a Brigada Militar fecham os olhos a tal funcionamento, porque custa pouco ao Estado e traz lucros consideráveis. Mas talvez a principal contribuição do projeto seja mostrar de que maneira os crimes efetuados dentro da prisão refletem na vida de toda a sociedade fora do cárcere”. O olhar crítico evidenciado pelo texto de Carmelo é uma marca de Renatinho, que sempre demonstrou preocupação com quem é vítima da estigmatização que existe. “Pra sociedade de modo geral, o inimigo é o pobre. Há a criminalização da pobreza”, lastima. UM BAIXINHO EM CAMPO Renatinho nasceu no dia 15 de maio de 1964 e cresceu no bairro Cavalhada, zona sul de Porto Alegre, numa época em que, segundo ele, existia de fato infância. Na adolescência, o filho do Hélio e da Neusa, penúltimo de cinco irmãos, ia para as festas no centro da cidade e voltava a pé na madrugada – isso quando resolvia deixar os livros um pouco de lado. “Eu era meio caxias, gostava muito de estudar”, confessa. Apesar de ser de uma família de músicos, não levava jeito para a coisa. “Não tinha talento e tive que escrever sobre samba”, brinca o pai de Renata, 24, que se formará em breve em Jornalismo, e Bernardo, 9, avó das pequenas Manoela, 7, e Bruna, 1. Antes de estudar na Faculdade de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio

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Grande do Sul (PUCRS), entre os anos de 1982 e 1986, tentou um lugar na profissão dos sonhos de toda a meninada do bairro: jogador de futebol. Queria fazer parte da equipe do Internacional, time do coração, e atuou como lateral direito na escolinha, dos 12 aos 16 anos. Acabou, entretanto, tendo de aposentar as chuteiras por um problema sem solução. Não crescia. A estatura, felizmente, não era empecilho algum para o desejo de contar histórias. Após se formar, foi admitido no jornal Zero Hora, onde passou a escrever nos setores de polícia e carnaval. “Azul de um lado e vermelho de outro”, revela o colorado torcedor da azul e branco, Bambas da Orgia. Conforme conta, começou a atuar numa época de transição dentro do jornalismo policial. Com o fim da ditadura, o foco dado aos perseguidos políticos expandiu-se para os presos comuns. Denúncias de violação de direitos humanos se intensificaram e, hoje, na visão do profissional, a atuação da polícia melhorou. O ingresso de delegadas mulheres também contribuiu para uma atuação mais humana. Renatinho ficou no jornal até 1999. Quando o Grupo RBS decidiu investir num impresso mais popular, passou para a equipe do Diário Gaúcho. Também foi militante da luta sindical, inclusive sendo presidente do SINDJORS em 1995.

ARI, da Associação Riograndense de Imprensa, em 2007 –, não foi o mais difícil de ser feito. Refugiados do Tráfico, série de reportagens publicada no Diário Gaúcho no ano passado, exigiu mais coragem e enfrentamento de adversidades. Para conseguir falar com uma das fontes, que passou a ser perseguida depois de ter testemunhado na Justiça contra os mandantes do tráfico, recebeu ligações de diferentes números, marcaram de se encontrar em Alvorada e foram fazer a entrevista em Viamão – tudo para despistar criminosos. Renatinho, entretanto, faz questão de ressaltar que a violência é minoria nas comunidades e que a imprensa precisa ter uma visão da questão social. “Faço jornalismo com seriedade e acho que isso eles entendem”, justifica ao nunca ter sido atacado pelo que escreve no exercício da profissão. “A gente tenta ver a história das pessoas, não dizer que o cara é bandido e pronto”, emenda. Ele mesmo já viveu em uma comunidade onde era preciso mandar as crianças para baixo da cama após escutar tiros de bala perdida. Os menores tinham que ser treinados para saber o que fazer nos casos de violência. “Estas gerações, com muitos órfãos, sem perspectivas, acostumam-se com a brutalização do crime”, lastima.

VOZ PARA O POVO Por mais que Falange Gaúcha seja o trabalho de maior repercussão – inclusive venceu o Prêmio

PANELA DE PRESSÃO Renatinho afirma nunca ter sido vítima de racismo no trabalho, mas destaca que há poucos pro-

fissionais negros nos meios de comunicação. “Já houve mais do que há hoje nas redações”, constata. De modo geral, na sociedade, ele enxerga a questão racial como uma enorme panela de pressão, na qual é preciso dar uma “frouxadinha” na válvula para ela não explodir. Ou seja, poucas pessoas negras, por diferentes motivos, ganham um tratamento não preconceituoso. “Digo que sou uma minoria que saiu da panela, mas o grosso tá lá dentro”, resume. Apesar de não ser alvo direto de preconceito, é enfático: “A partir do momento que algum negro é discriminado, todos são discriminados”. SOMOS SUAS TESTEMUNHAS “Após oito horas no jornal, chego em casa e vou escrever. Na época do filme, fiquei oito meses em ilha de edição. Não estou pensando em parar”, fala Renatinho, empolgado, numa sintonia perfeita com as palavras escritas por Cláudio Brito: “O sucesso vem sempre encharcado de suor. No jornalismo, então, nem se fala. É resultado de anos de vigílias, plantões, muita leitura, relacionamento com as fontes, dedicação ao trabalho sem olhar para o relógio, muitas decepções, estudo constante, revoluções tecnológicas, conquistas e perdas de espaço, mudanças promissoras, permanências confortáveis e outras nem tanto. O Renato encharcou-se de suor para chegar até aqui. E ainda vai muito adiante sua caminhada, vendo, ouvindo, perguntando e escrevendo. Nós, seus leitores, seremos testemunhas.”

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HUMOR

Os traรงos do golpe

A visรฃo dos chargistas Augusto Bier, Celso Schrรถder, Edgar Vasques, Leandro Bierhals e Santiago Abreu sobre o impeachment de Dilma Rousseff, um ano apรณs o afastamento da presidenta.


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