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Curitiba, maio de 2011
Sob o signo do abandono
Divulgação
Falta de segurança no centro e “mocós” fazem com que a população escolha outros lugares para morar p. 6 e 7 Osvaldo Soares
Alexsandro Teixeira
Jornal-laboratório do Curso de Jornalismo da Facinter • Ano III • Número 11 • Curitiba, maio de 2011
Uma dupla que encantou o Brasil “As mocinhas da
Poeta curitibano das Gerais Divulgação
Um bate papo descontraído com Geraldo Magela, contista e poeta heterogêneo
cidade são bonitas e dançam bem.” A história da fonte que homenageia Nhô Belarmino e Nhá Gabriela
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EDITORIAL
ARTIGO
Ao leitor
Os demônios do IML
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sta edição do Marco Zero revela índices que mostram que está crescendo a quantidade de pessoas que optam por trocar a comodidade do centro da cidade por bairros residenciais que, segundo estatísticas, são mais seguros. Reportagem mostra a quantidade enorme de imóveis abandonados no centro, muitos dos quais são usados para tráfico e drogas e abrigo de viciados, e aponta quais as soluções propostas para acabar com os chamados “mocós”. Além do abandono de imóveis no centro da cidade, esta edição confere o descaso público com o IML, que, depois de quatro meses de um escândalo e com uma nova diretoria, continua com atendimento precário à comunidade. Também nesta edição, uma entrevista com Michael Genofre, pai da menina Rachel, encontrada morta na Rodoferroviária de Curitiba em uma mala, há quase três anos, um mistério que ainda não teve solução. Ele fala sobre sobre a região onde a menina desapareceu e quais as atitudes que a polícia tomou para desvendar o caso. Veja ainda uma matéria sobre os perigos a que estão expostos, no centro da capital, os idosos, principal alvo de assaltantes e delinquentes, e o desrespeito aos mais velhos no transporte público, que os obriga a passar por situações humilhantes e embaraçosas. Assim está o Marco Zero deste mês, como o número desta edição: 11, mais que 10! Variado e com muito cont,eúdo, preparado especialmente para você! Boa Leitura!
Expediente O jornal Marco Zero é uma publicação feita pelos alunos do Curso de Jornalismo da Faculdade Internacional de Curitiba (Facinter) Coordenador do Curso de Comunicação Social: Tomás Eon Barreiros Professores Responsáveis: Roberto Nicolato Tomás Eon Barreiros Editores: Andressa Maltaca João Gabriel Pereira Natali Carlini Priscilla da Costa Suzayne Machado Diagramação: André Halmata (7º período) Edno Junior (7º período) Facinter: Rua do Rosário, 147 CEP 80010-110 • Curitiba-PR E-mail: assessoriajr@grupouninter.com.br Telefones: 2102-7953 e 2102-7954. Errata: Devido a problemas de fechamento, a página 11 da edição de número 10 do jornal Marco Zero apresentou incorreções na diagramação. O título da crônica de Alexsandro Ribeiro, que ficou encoberto, é “Mendigos qualificados”.
tregue a um cemitério para que sejam feitas as despedidas. Mas, então, o Não apenas de escândalos na ataúde não traz os restos mortais corAssembleia Legislativa vive o notici- retos! O cadáver não era o esperado! ário sensacionalista do estado. Outra Sim, houve uma troca. das polêmicas atuais é a que envolve O IML se equivocou e colocou o Instituto Médico Legal (IML), situado o “presunto” errado no “pão” errado! na Av. Visconde de Guarapuava, no “Meu Deus, onde estará meu filho(a)”, centro de Curitiba. Instituído no Paraná desespera-se a mãe. Àquela altura, em setembro de 1899 e subordinado o corpo de sua eterna criança talvez à Secretaria de Estado da Segurança esteja entulhado junto a dezenas de Pública, o IML é teoricamente respon- outros desconhecidos, dentro de uma sável por serviços como necropsia, câmara frigorífica, tal qual pedaços de exames laboratoriais, embalsamentos vitelo. Seu sangue, misturado a difee testes de conjunção carnal e sanida- rentes tipos e tons, jaz absorvido por de física e mental. um vulgar pano de chão, torcido ao O órgão também abriga um mu- encharcar-se. seu, atraente para acadêmicos das áreOu seja, na realidade, seus glóas de Medicina, Enfermagem e Direito, bulos brancos e vermelhos podem entre outras. Evidentemente, o recolhi- estar navegando na rede pluvial da mento e a organização de cadáveres cidade. Ela pode estar sem cabeça ou também são incumbências do IML. membros, não necessariamente pela Não é uma tarefa simples. A atu- gravidade do acidente, mas porque ação do Instituto deve seu cadáver foi jogado Não importa. Em para dentro da grande ser a mais ilibada e séria possível. Não se trata geladeira. Isso, claro, se meio à angústia, apenas de ossos, sannão há muito que o corpo estiver realmengue e vísceras amarfa- ser feito, a não ser te lá! Por quanto tempo nhados, mas de espíritos terá que aguardar uma providenciar um que um dia ocuparam família enlutada e, agora, funeral um corpo. Alguém que aterrorizada com tamaestava conosco, porém, nha desestruturação? agora, não deixou mais do que lemO exemplo acima poderia ter sido branças e saudades. extraído de um livro do escritor russo Estamos nos referindo a seme- Fiodor Dostoievski. Entretanto, é o mais lhantes, muitas vezes ceifados pela puro retrato da lamentável administraviolência, esse galopante alazão do ção que conduziu o Instituto Médico Apocalipse, um cavalo agourento Legal à atual decadência. responsável por interromper planos, No começo de abril, o portal IG alimentar vinganças e sustentar me- Paraná divulgou que uma mãe precilancolias. sou esperar quatro meses para conseOh, aquele jovem estudante, guir enterrar seu filho, devido a suposou aquela bela menina... Quanto vi- tos problemas com o exame de DNA. gor, quanta mocidade, quanto talento! Essa senhora certamente está enfrenQuantos pais, mães, tios, avós não tando um sufocante vexame, somado estiveram esperançosos por um futuro à incrível dor proporcionada pela morpromissor para seus rebentos? Entre- te de um herdeiro. tanto, tudo o que veem agora é um corQuatro meses, vejam só... Cerpo inerte dilacerado em um logradouro ca de 120 dias chorando pelo filho e qualquer! Talvez um acidente de trân- sequer podendo imaginar como deposito, bala perdida, briga ou estupro? sitar o que sobrou do rapaz, tudo pelo Não importa. Em meio à angús- circo mambembe e de mau gosto no tia, não há muito que ser feito, a não qual o IML se transformou. ser providenciar um funeral. A dor é inAlgo precisa ser feito urgentetensa. A perda, irreparável. Os sonhos, mente. Que a nova direção do Instituto esmigalhados por uma fatalidade. A possa contornar habilmente a situafamília reza junto ao caixão. Ele será ção. A comunidade curitibana pede aberto pela última vez antes de ser en- socorro.
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Boca no trombone!
André Vinícius
Você acha que o novo biarticulado vai ajudar a “desafogar” o trânsito de Curitiba? Suzayne Machado “Não, porque na verdade ele só vai transportar um maior número de pessoas, mas o trânsito continuará.” Mauricío Ricardo, 30, promotor de eventos “Não, a desafogar não, mas creio que pelo menos irá transportar com mais comodidade os passageiros. E é claro que com uma comodidade merecida, porque o valor da passagem de ônibus está absurdo.” Isaias da Silva Machado, 28, terapeuta ocupacional “Sim. Não por completo, é claro, mas pelo novo biarticulado ser bem maior e por consequência transportar mais pessoas, talvez a frota de ônibus menores diminua, e com isso o trânsito em horário de pico passe a ser mais acelerado.” Paloma Souza Manfroy, 22, estudante de Pedagogia “Não, porque o trânsito de Curitiba já esta caótico, não cabe mais veículo nenhum nas ruas, principalmente em horário de pico, e a cidade ainda recebe um ônibus maior. Para mim, vai piorar.” Guilherme Reis, 26, taxista “Não, acredito que não vai resolver muito. Não que a ideia do novo biarticulado seja ruim, mas é que Curitiba não é uma cidade projetada para um número grande de veículos, principalmente de um ligeirão.” Mirian Izidoro Torres, 35, ambientalista “Sim, pelo menos em boa parte. A cidade de Curitiba estava mesmo precisando de um novo veículo de impacto e de maior conforto.” Joanna Glasly, 20, estudante de Ciências Contábeis
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Curitiba, maio de 2011
PERFIL
Poeta curitibano das Gerais
Geraldo Magela fala sobre sua atividade literária e comenta o mercado para a poesia na capital paranaense
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Osvaldo Soares
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Osvaldo Soares
oração de poeta e cara de menino. Assim é o contista e poeta Geraldo Magela, mineiro radicado em Curitiba há mais de 36 anos, vindo da cidade de Bocaiúva, no Vale do Jequitinhonha, interior de Minas Gerais. Magela, como é conhecido entre a classe artística e os poetas curitibanos, define sua poesia como uma bandeira de lirismo e indignação de doce acidez, da literatura do cordel ao bordel, e do erudito ao popular (poesia heterogênea). Ele se autodefine um agitador cultural. Além de fazer poesias, é responsável pela casa de literatura “Miguel de Cervantes”, na Praça da Espanha. Magela faz parte da vanguarda Geraldo Magela: “O jornalismo cultural em Curitiba acabou. Não há sutilezas, não há amabilidades...” de poetas curitibanos, junto com seus amigos já falecidos Paulo Leminski, bus, nas idas e vindas. Depois, passo reunidos... Sangra Sil, Grupo do Solda, Retamozzo, Roberto e Marcos Marcos Prado, Rubens Sossela e ou- as poesias para o papel. Prado, Tadeu, Peninha, Bira e outros. tros. Nesta entrevista, Magela fala da Como foi sua amizade com Esse grupo agitava naquela época de poesia no Paraná e do amigo Paulo Leminski? 70 para 80. Depois, veio a “Casa do Leminski, entre vários assuntos. Em 1983, lancei um livro com Poeta”, com 123 poetas, em que cada Quando começou a fazer po- tema africano. A apresentação foi em um publicava sua próprias poesias. Pohomenagem à consciência negra, ao etas também do Grupo Controvérsia, esia? Nasci no meio literário, minha 13 de Maio. Paulo entrou junto nessa Leopoldo, Edival Perrini e outros... mãe era professora do meio rural em história porque ele sentiu, encontrou A poesia no Paraná vai indo Minas. Ela lia livros, contava histórias, o lado negro dele, da sua mãe Áurea e meu avô era repentista. Assim, fui Mendes, que era descendente de ne- bem? Acredito que vai bem. Por enconduzido para a poesia. Fui militar gros. Ele, Paulo, se dizia que era negro polaco. Escrevíamos juntos para quanto, ninguém reclamou. Tem esna Força Aérea e como telefonista critor de poesia que vende mandava recados em um programa o já extinto jornal Correio de rádio em Curitiba (na Rádio Inde- de Notícias e assim come- “Porque Rio é Rio, esse gênero, principalmenpendência). Fazia poemas no ar para çou nossa amizade. Eu Sampa é Sampa, te os dos grupos da Rua os ouvintes. Me inspirava em Tagore, me inspirei nos seus prie Curitiba é ver XV de Novembro, como o Epopéia.Tem gosto para poeta persa que falava de mulheres, meiros livros, depois fiz a navio...” obra ‘Se Metamorfose”, todo tipo de poesia. amores e canções. de poemas concretos, em Quais seus poetas favoritos? Qual sua inspiração ao fazer homenagem ao Leminski. Mais tarde, articulamos a Casa do Poeta, junto Manoel de Barros, Carlos Drumpoesia? Publiquei meu livro em 1982. com alguns amigos de boteco. Paulo mond de Andrade, João Cabral de Me inspira o cotidiano, os problemas tinha um grande respeito pela minha Melo Neto, Manoel Bandeira, Wittido ser humano, suas vivências e até a pessoa, me considerava um irmão seu. man, Ezra Pound e Florbela Spanca. vida de uma borboleta, que dura tão Para mim, foi um pai que me ensinou São poetas com que tenho mais afipouco, do primeiro momento à trans- muito sobre literatura e poesia... A nidades. formação. Lagarta, casulo e borboleta amizade se deu até sua morte lá no Você lançou 110 títulos de váe depois morre. Um flash de luz, hai- Nossa Senhora das Graças, onde até rios autores. Como isso aconteceu? kai. Escrevo em formas academicis- doei sangue para ele. A própria necessidade de fazer tas, desprezo regras dominantes, não Como era a vanguarda poética livros. Sai mais barata a divulgação. me preocupo com acertos. Às vezes, Fica por conta de cada autor. Eu criei banalizo poemas, uma forma poética de Curitiba? Na década de 70, eu e Paulo Le- a minha editora, chamada Alternativa, medieval, e trago a poesia para o modernismo. Sou fiel, tenho meu estilo minski tínhamos antologias publica- para ajudar os poetas que não tinham próprio, escrevo o que sinto, escrevo das junto com vários poetas. A “Sala condições de fazer uma edição míniindo para o trabalho, dentro do ôni- 17”, por exemplo. Eram 17 poetas ma de 500 exemplares. Já publiquei
livro de umbanda, romances, poemas, crônicas, e de todas as vertentes literárias de autores independentes. Como é o mercado literário de poesia em Curitiba? Já foi mais fechado. Atualmente, está se abrindo, com as feiras literárias, bienal do livro... Mesmo assim, a dificuldade aqui ainda existe, devido a uma certa autofagia... O jornalismo cultural acabou. Era bom quando tínhamos Maria Adélia, do jornal O Estado do Paraná, do Almanaque, o Zé Carlos Correia Leite, da Folha de Londrina... Hoje, nem no Caderno G da Gazeta você consegue o corpo oito, ou rodapé para divulgar um livro sequer. É muito fechado o espaço. E assim vai ficar invisível! Não há sutilezas, não há amabilidades. Mas o poeta põe o livro debaixo do braço e vai à luta. É um paradigma, pois lá fora você consegue vender muito bem. Quais seus novos projetos? Estou publicando minicontos, livros infantis, textos literários nos bairros, nos banheiros públicos, o projeto Árvore do Livro, poesias nos campos e estádios de futebol e conscientizando a criança desde cedo sobre a importância da leitura. Eu e mais dez autores acabamos de escrever “Brisa é Você”, e Dalton Trevisan fez boas críticas ao livro. Quem é quem na poesia curitibana? Luiz Leprevost, Alexandre França, Ivan J. Santana, Tadeu, a Alice que não está aqui... Porque Rio é Rio, Sampa é Sampa, e Curitiba é ver navio... E outros poetas viraram contistas. Como sua ideia do “Papel Higiênico Literário Poético” foi parar na Espanha? Na época, lancei 500 rolos de “Papel Higiênico Poético”. Virou souvenir, e eram vendidos na feira do Largo da Ordem para os turistas, que acabaram levando para a Europa. Eu não patenteei a ideia. Amigos que lá estiveram mandam recados dizendo que a minha ideia está sendo copiada e feita pelos gringos lá fora. Daquela época, tenho gravações, entrevistas que dei em canais de TV e recortes de jornais.
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TRILHAS DO TEMPO
Uma dupla que encantou o Brasil
Discografia de Nhô Belarmino e Nhá Gabriela Divulgação
“As mocinhas da cidade são bonitas e dançam bem. Dancei uma vez com uma moreninha, já fiquei querendo bem... E o sol já vai entrando, e a saudade vem atrás...” Saudade é a palavra que define o sentimento de Jonas Barbosa Neto, de 60 anos, aposentado que viveu nos tempos áureos de Nhô Belarmino e Nhâ Gabriela. “Eu sinto saudades dos bailes de antigamente, em que eu tirava uma dama para dançar e não tinha essa violência de hoje”, lembra. Jonas conheceu os cantores pessoalmente e disse que não perdia nenhum baile no Clube do Ahu de Baixo. “Eles faziam serestas e se apresentavam junto com o Zé Pequeno, que tocava a sanfona Fonte traz foto da dupla caipira paranaense e a letra de sua canção mais célebre para eles. Isso faz parte do folclore do Em 1996, foi inaugurada a fon- Fernando Canalli e é composta por Paraná”, conta Jonas. Salvador Graciano e sua esposa te que homenageia os cantores, que colunas com pinhões nos capitéis Julia Alves iniciaram suas apresenta- recebeu o nome de “As mocinhas da que fazem a moldura dos quadros de ções no início de 1940. Conhecidos cidade”, em referência a uma das mais azulejos que trazem a letra da música nacionalmente como Nhô Berlarmi- conhecidas músicas da dupla de músi- “Mocinhas da Cidade”. A última apresentação da dupla no e Nhá Gabriela, a dupla de músi- ca caipira do Paraná. aconteceu em 1984, na comemoração Cravada no cenca sertaneja de raiz tro de Curitiba, entre do 60º aniversário da Rádio Clube Pacompunha e cantava “Eles faziam músicas que tradu- apresentações gratuitas a Rua Cruz Machado ranaense. Logo depois dessa apresentação, Nho Berlarmino faleceu. ziam os sentimentos nos bairros para o povo e a Alameda Cabral, a Se, nas palavras do escritor Guihomenagem não pasdo caipira brasileiro. de baixa renda. Eram marães Rosa, “as pessoas não morrem, sa despercebida pelas Eles falavam a linguamuito conhecidos, pessoas que transi- ficam encantadas”, pode-se dizer que, gem do povo simples e todos cantavam as tam por ali e causa para muitos paranaenses, essa frase do interior e faziam muita nostalgia nos faz muito sentido, afinal, já se passao público gargalhar músicas deles” ram 27 anos da última apresentação fãs da dupla. com as cenas de hu“O público gos- de Nhô Belarmino e Nhá Gabriela e, mor que interpretavam. Eram divertidos quando faziam tava de ouvir as músicas do Berlarmi- mesmo assim, a dupla continua etergraça e levavam o povo às lágrimas no e da Gabriela”, diz o aposentado nizada nas lembranças e no coração quando cantavam com maestria as Milton Santos, de 65 anos. “Eles fa- da população de Curitiba. composições sentimentais. Foram ziam apresentações gratuitas nos bairros para o povo de baixa renda. Eram verdadeiros e grandes artistas. muito conhecidos, e todos cantavam as músicas deles”, recorda Santos. “A única música que nunca foi regravada foi O passarinho prisioneiro, dessa eu gostava demais”. “As mocinhas da cidade” foi a música que perpetuou culturalmente a dupla de música caipira mais famosa do Paraná, Nhô Berlarmino e Nhá Gabriela. Outra fã da dupla, Lucia Helena Ayabe, de 56 anos, voluntária do Programa Comunidade Escola, recorda os tempos antigos: “Sinto saudades de antigamente, de quando eu era menina. Existiam valores morais, e as amizades tinham mais valor”. A fonte traz desenhos do artista Jonas Barbosa Neto: saudade dos bailes antigos Juliana Morelli
Juliana Morelli
Juliana Morelli
Juliana Morelli
Fonte na Rua Cruz Machado homenageia artistas da música caipira do Paraná
Curitiba, maio de 2011
Nhá Gabriela e Nhô Belarmino
1963 - Brasil querido/Minha saudade • RCA Camden Cam 1963 - Valentão/Tormento de amor • RCA Camden Cam 1962 - Sou feliz/Mulher de rua • RCA Camden Cam 1962 - Pedido ao vento/Seresta de amor • RCA Camden Cam 1961 - Cachaça com limão/Briga de amor • RCA Camden Cam 1961 - Brincando com oito baixos/ Sorriso de criança • RCA Camden Cam 1961 - Peito vazio/Meu sofrimento • RCA Camden Can • 78 1961 - Recordando o sul/Tudo certo • RCA Camden Cam • 78 1960 - Baile na fazenda/Música para quadrilha • RCA Victor 1960 - Ilha branca/Rainha do pecado • RCA Camden Cam 1960 - Dançando descalço/Pau de sabugueiro • RCA Camden Cam 1959 - Mocinhas da cidade/Paranaguá • RCA Victor 1959 - Sanfoneiro de Curitiba/Caprichosa • RCA Victor Divulgação
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COTIDIANO
“Tudo mudou na minha vida” Michael Genofre, pai da menina Rachel, conta como superou a trágica morte da filha Arquivo pessoal
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Ronaldo Freitas
o mês de novembro de 2011, serão completados três anos de uma tragédia que comoveu a cidade de Curitiba e ganhou repercussão nacional: o assassinato de Rachel Lobo Genofre. A menina de nove anos de idade desapareceu na saída do Instituto de Educação Professor Erasmo Pillotto, no centro da cidade, no dia três de novembro de 2008, e foi encontrada morta dois dias depois, na rodoferroviária. A polícia ainda não elucidou o caso. O drama foi um golpe na vida de Michael Genofre. “Se não fosse o apoio de amigos, não saberia qual rumo tomaria na vida após a morte da minha filha”, diz. Genofre é ex-diretor da União Paranaense dos Estudantes (UPE) e ex-dirigente estadual da União da Juventude Socialista (UJS-PR). Cursou Filosofia e Secretariado Executivo e está prestes a concluir a graduação em Relações Internacionais pela Faculdade Internacional de Curitiba (Facinter). Na época da morte da filha, Genofre era separado de Maria Cristina Lobo Vieira, mãe de Rachel. A reportagem do jornal Marco Zero entrevistou Michel Genofre. Na conversa, ele revelou seu drama póstragédia e a reação da família e comentou o trabalho da polícia no caso. Quase três anos após a tragédia, o que mudou na sua vida? Praticamente mudou minha vida, toda ela. Mudei de emprego e, se não fossem meus amigos e os colegas de faculdade, eu teria abandonado os estudos. Mudei o número de telefone. Quase me mudei de cidade. Enfim, mudou tudo. Como a família reagiu e se reestruturou após a tragédia? No momento do desaparecimento, nos mobilizamos. Aos poucos, inúmeros amigos foram unindo forças para fazer buscas que varreram todo o centro de Curitiba e o bairro da Vila Guaíra (onde ela morava com a mãe). Após praticamente dois dias
A menina Rachel, morta em 2008, com o pai Michael Genofre: caso provocou comoção em Curitiba
de buscas, houve o pior telefonema de minha vida: era um policial militar confirmando tê-la encontrado na rodoviária. Neste momento, pavor. De minha casa até o IML, eu torcia para que nada que o policial havia relatado por telefone fosse confirmado. Porém, confirmou-se tudo. E a reação de vocês? Daquele momento em diante, creio que toda a família entrou em uma espécie de letargia. Eu praticamente assisti ao ano de 2009 passar. Fui voltando a confiar nos amigos na medida em que os exames de DNA e a investigação iam, um a um, descartando-os como suspeitos. Apegueime aos estudos, ao trabalho, à religião e ao movimento político de juventude, e isso ajudou a mudar os ares e ter foco em continuar seguindo a vida. “O assassino não terá outra vitória”, pensava eu quando queria desistir de tudo. Até hoje, busco não lembrar dos acontecimentos. Tento olhar para o ocorrido como se fosse um acidente e não a mostruosidade que foi. A mis-
são de minha filha na Terra se encerrou, mas a minha não. O que você acha do trabalho da polícia no caso? O trabalho da polícia, em um primeiro momento, foi confuso, e essa confusão certamente atrapalhou um pouco. Talvez pelo impacto do crime, talvez pela ausência de inúmeros aspectos técnicos, até que a investigação caísse em mãos da delegada Vanessa, muita coisa não funcionou nada bem. Muita coisa ainda se confundiu devido ao forte assédio da imprensa diante do caso chocante, que teve repercussão internacional. De lá para cá, a investigação foi mais eficiente. Muitos pedófilos foram reconhecidos, e inúmeras crianças deixaram de ser violentadas devido a uma série de denúncias encorajadas após a repercussão da morte da minha menina. Além disso, durante um bom tempo, a polícia conseguiu cruzar dados e assim prender outros foragidos molestadores de crianças. Ao mesmo tempo em que a investigação sobre o assassinato de mi-
nha filha avança a passos lentos, uma série de outros casos foram solucionados indiretamente a passos rápidos. Qual seu recado para pais que, diariamente, estão sujeitos a ver esse ato se repetir com seus filhos? É importante esclarecer uma coisa: não há lugar seguro enquanto nossas escolas forem tratadas como são. Minha filha desapareceu em um raio de dois quarteirões da escola dela (o Instituto de Educação Prof. Erasmo Pilotto), e voltando lá ao longo desses três anos vejo que continua sem a menor mudança no que diz respeito à segurança daquelas crianças. A rua continua muito próxima do portão da escola, e nenhum motorista respeita e cuida para que crianças não sejam atropeladas. Continua tendo o acesso absolutamente facilitado a estranhos. Segue uma confusão no horário de saída das crianças, e não há nenhum policiamento mais preparado (e olha que naquela época havia um posto policial praticamente do lado da escola, na praça Osório). E a escola continua lavando as mãos a partir do momento em que o sinal de saída bate. O recado para os pais não poderia ser outro, senão: diante de qualquer coisa estranha, denuncie, faça barulho. Não deixe que a violência atinja as crianças. Ao saber de algo, denuncie! Disque 100 e ajude para que a impunidade não seja a maior arma contra nossas crianças. Arquivo pessoal
O assassinato de Rachel ainda não foi elucidado
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Curitiba, maio de 2011
VIOLÊNCIA
Quem ama surra? Alexsandro Teixeira
Segunda pesquisa, a cada sete segundos, uma mulher é agredida em seu próprio lar
Faltam abrigos para vítimas da violência doméstica Janile da Silva Ramos
Natanael Chimendes
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m 2002, Maria da Penha Maia Fernandes recebia a notícia de que seu marido e agressor fora declarado preso pelo Estado Brasileiro. Dois anos depois, Michele conhecia seu futuro namorado e agressor. Casos como o último podem estar acontecendo neste exato momento. Várias mulheres brasileiras devem estar conhecendo seus futuros agressores, achando que estão encontraram o príncipe encantado. Os números são tão assustadores que somente um dado já registra que o Brasil é o país que mais sofre com a violência doméstica: a cada 7 segundos, uma mulher é agredida em seu próprio lar, informa pesquisa da Fundação Perseu Abramo. A coragem de Maria da Penha transformaram seu nome na lei mais recente e importante de combate à violência contra a mulher. Sua história foi relatada no livro “Sobrevivi, posso contar”, na qual ela mesma narra as agressões e os dias de angústia na espera de medidas a serem tomadas contra seu marido, o colombiano Heredia Viveiros. As agressões foram constantes durante todo o período em que Maria da Penha ficou casada com Viveiros. No começo, ela não se atrevia a pedir separação, justamente pelo medo de ser mais agredida. Em 1983, seu marido atirou em suas costas, deixando-a paraplégica. O agressor alegou à polícia que os tiros foram disparados numa tentativa de assalto à sua casa. Mas a separação só veio duas semanas depois, quando Viveiros tentou eletrocutar sua esposa durante o banho. Junto com as agressões, Maria sofria ameaças para assinar papéis entregando bens ao marido, e também foi quase convencida a fazer um seguro de vida. Nos de-
poimentos que se seguiram, ela apurou que o marido era bígamo e tinha um filho. Vinte anos após o crime, com a ajuda de um instrumento internacional, o agressor foi preso, e novas medidas foram tomadas acerca de casos como o dele. Já o caso de Michele é um pouco diferente. Ela começou a namorar um traficante de drogas, mesmo tendo ciência disso. Logo no início da relação, as agressões foram surgindo, desde um tapa na cara a apertos no braço e no pescoço. “Ele tinha muito ciúme”, diz a agredida. “Se saíamos para um lugar e qualquer um olhasse para mim, logo ele ia em cima do cara e brigava, e quando chegávamos em casa ele me agredia.” Ela não o denunciava, alegando que o rapaz prometia melhorar, mesmo vigiando os passos dela constantemente. Certa vez, a agressão foi tão forte que ela desmaiou, foi para o hospital, mentiu que tinha sofrido um assalto e foi liberada. A separação aconteceu quando ela sugeriu ter feito um boletim de ocorrência policial, ameaçando que, se ele fosse atrás dela, iria contar tudo e o denunciaria. O jovem sumiu, ficou com medo. Hoje, ela soube que ele está casado com outra, tem um filho e não está mais agressivo. “Acho que foi o filho”, diz a jovem para explicar a tranquilidade atual do agressor. Essas situações são tão adversas e ao mesmo tempo tão semelhantes que fica difícil avaliar a eficiência da Lei Maria da Penha, criada depois do caso. Mesmo com toda a persistência de Maria da Penha, casos como da Michele continuam acontecendo. “Ele prometia largar a função de traficante”, dizia a moça, “e eu acreditava, mesmo ele sendo doente por mim e me batendo todo dia”. Michele, no entanto, hoje aconselha: “Uma pessoa que te bate não te ama. Não fique presa ao sentimento, se valorize.”
A lei Maria da Penha, sancionada no chegava alcoolizado e sem motivo nedia 7 de agosto de 2007, descreve como nhum quebrava as coisas dentro de casa. violência doméstica todos os tipos de Um dia, ele parecia estar drogado e maagressão que existem no seio de uma re- tou meu cachorrinho”, conta. Ela proculação familiar e garante que a vítima deve rou a Delegacia da Mulher, onde prestou receber o apoio e a proteção necessários. queixa e conheceu histórias parecidas De acordo com a Sociedade Mun- com a dela que a incentivaram a continudial da Vitimologia, o Brasil é campeão ar lutando. Segundo a vítima, a maioria em violência doméstica em um ranking das mulheres acaba não denunciando os de 54 países. Segundo a entidade, a cada agressores por medo, e muitas também 16 segundos, uma mulher é agredida por dependem dos maridos para o sustento seu companheiro, e cerca de 70% das da família, acabando por se submeterem mulheres assassinadas foram vítimas às agressões por não terem condições de seus próprios maridos. Uma pesquisa financeiras de se manterem sozinhas. De acordo com a assistente social do feita pelo instituto Avon-Ibope revela que Conselho Regional de a sociedade brasileira não aceita conviver “Ele chegava alcoolizado Serviço Social do Pacom a violência, e 55% e sem motivo nenhum raná (Cress-PR) Elda Lilian da Cruz Corrêa, da população afirmam quebrava as coisas as vítimas de violência conhecer uma mulher dentro de casa. Um doméstica podem proque já sofreu algum tipo curar qualquer hospital de violência doméstica. dia, ele parecia estar Entre 2008 e 2009, o drogado e matou meu que atenda casos de emergência. No caso conhecimento sobre a cachorrinho” de violência psicológica lei Maria da Penha teve ou patrimonial, podem um aumento de 68% para 78%, mas o número de pessoas que ir diretamente à delegacia. Outra opção, não confia na proteção jurídica garantida segundo a assistente social, é procurar o Centro de Referência de Assistência pela lei ainda é grande. Segundo a advogada Clarice Ma- Social (Cras) mais próximo. “Em vários ria Dal Comune, que trabalha com pro- municípios, toda a atenção à questão da cessos civis, “a lei Maria da Penha, na violência está sendo dada pelos centros prática, não funciona como deveria”. Um de referência Cras e Creas”. Nesses lodos motivos, segundo ela, é a falta de es- cais, existem assistentes sociais prontas trutura da sociedade brasileira para dar para ajudar as vítimas. Em Curitiba, existe hoje apenas um abrigo e segurança às vítimas. As penas para o agressor variam de três meses a abrigo para mulheres em situação de petrês anos de reclusão, de acordo com a rigo. Nele, atualmente, não é desenvolgravidade da agressão, e é inafiançável. vido nenhum trabalho social, pois a finaApesar disso, a dificuldade de manter o lidade do local, por enquanto, é apenas agressor preso ainda é grande, pois, se proteger as vítimas que estão sob risco não for preso em flagrante, deve haver de vida. Segundo a coordenadora do Protestemunhas e provas para que seja dada continuidade ao processo. O grande pro- grama Mulher de Verdade de Curitiba, blema, de acordo com a advogada, é que Hedi Muraro, as mulheres são encamiem muitos casos não há testemunhas, e nhadas aos abrigos de proteção juntamente com seus filhos e recebem todo o não é possível fazer uma investigação. Uma jovem agredida, que prefere apoio necessário para que se reintegrem não se identificar, conta que o ex-marido à sociedade. Dentre os serviços forneciera muito ciumento, e suas agressões dos pelas entidades de assistência, estão começaram de forma verbal e com apri- os processos judiciais, tanto de divórcio sionamento. Aconteciam geralmente nos como o encaminhamento do processo finais de semana, quando ele bebia: “Ele criminal de agressão.
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Curitiba, maio de 2011
EDUCAÇÃO
Cabe no Bolso
Obras da Casa do Estudante Universitário, que já estavam atrasadas, agora estão completamente paradas
EXPOSIÇÃO FOTOGRÁFICA
Mil dias de reformas na CEU Gabriel Sestrem
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uem caminha nas dependências que estão em reforma da Casa do Estudante Universitário do Paraná (CEU-PR), localizada no centro de Curitiba, tem motivos de sobra para preocupar-se com a situação dos moradores. O cenário é de abandono. Entulhos por todos os lados, mesas, materiais de construção civil e latas de cerveja e refrigerante estão espalhados pelos ambientes da casa. Se meses atrás os moradores da casa reclamavam do barulho das máquinas em função da reforma do local, hoje o problema é outro. A obra, que teve início em 2008 com previsão inicial para conclusão em dez meses, está completamente parada. Segundo o presidente da CEUPR, Antônio Marcos dos Santos, no final do ano passado, a prefeitura prorrogou o prazo para a conclusão das obras, estabelecendo 31 de março como data limite. “Quando se encerrou o prazo estabelecido, alegaram que tomariam medidas com relação à empresa contratada para concluir as obras. Como a administração, provisão de recursos e fiscalização dos trabalhos cabem à prefeitura, os moradores somente acompanham e cobram a conclusão das obras”, diz Santos. Após a reforma, o prédio inaugurado em 1956, que hoje abriga cerca de 200 estudantes, teria sua capacidade dobrada, oferecendo mais 230 vagas e recebendo melhorias em toda sua estrutura. No entanto, além do completo abandono das obras, os moradores reclamam da qualidade do material utilizado nos trabalhos. O estudante Luiz Carlos Tenório, que também é membro do Conselho Administrativo da casa, afirma que os materiais empregados nas obras não são dos melhores. “Quem vê de fora acaba criando uma imagem ruim da casa. Além das obras em estado de abandono, o que já foi reformado também não teve uma qualidade boa. Já percebemos problemas no encanamento, nos banheiros e na fiação”, reclama. O drama de quem depende da casa é grande. Enquanto alguns moradores desconfiam que mendigos e
A fotógrafa britânica Maureen Bisilliat expõe material de suas viagens no Museu Oscar Niemeyer
Prédios da Casa do Estudante Universitário do Paraná estão em estado precário
usuários de drogas passem a noite no local, outros afirmam que já aconteceram arrombamentos de salas que abrigavam os materiais utilizados na obra. Em um dos prédios, até mesmo um “buraco” de elevador aberto pode ser encontrado, representando perigo para os moradores. Além de tudo, atualmente, 20 alunos vivem improvisadamente no alojamento do prédio, em condições precárias, sem terem sequer móveis para guardar seus pertences. A série de complicações, que já duram três anos, também se reflete na convivência cotidiana dos alunos. “Tudo isso prejudica a vida dos moradores, a começar pela convivência, estudos, e até mesmo a área financeira, atrapalhando a qualidade de vida. E a única
coisa a fazer é correr atrás de medidas preventivas para sustentar a casa”, lamenta Tenório. Com poucos recursos na mão, os moradores se uniram para uma manifestação no dia 1º de abril, “Dia da Mentira”, logo após o encerramento do prazo prorrogado. O protesto teve como objetivo chamar a atenção das autoridades públicas e da empreiteira contratada para a execução das obras, além de destacar suspeitas de superfaturamento e desrespeito às leis trabalhistas. “A manifestação foi feita por iniciativa dos próprios moradores. Isso atrai a atenção de todos para o problema e ajuda quem necessita da casa em boas condições”, afirma Tenório.
Gabriel Sestrem
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Antônio dos Santos, presidente da CEU-PR, em frente a um dos prédios com as obras paradas
Até 31 de julho, o Museu Oscar Niemeyer abriga Maureen Bisilliat: Fotografias. A exposição reúne mais de 250 imagens editadas e selecionadas pela própria fotógrafa britânica, um acervo com registros de paisagens, pessoas e contextos típicos do interior do Brasil, como os índios do Xingu, além de viagens a países como Bolívia, China e Japão. Fixada no Brasil desde 1957, Maureen Bisilliat trabalhou para a Editora Abril entre 1964 e 1972, fotografando para várias publicações, entre elas a revista Realidade. A britânica é autora de livros de fotografia inspirados em grandes escritores brasileiros, como João Guimarães Rosa, Euclides da Cunha e João Cabral de Melo Neto.
Fonte: www.guiadasemana.com.br
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Curitiba, maio de 2011
Do centro ao abandono ESPECIAL
Área considerada nobre em Curitiba, o centro da cidade passa por um processo de esvaziamento habitacional e comercial, com imóveis abandonados e os chamados mocós Fotos e textos Alexsandro Teixeira Ribeiro esmo com Ruas da Cidadania em praticamente todos os bairros e shoppings e centros comerciais espalhados pela cidade, muitas pessoas preferem ir ao centro para resolver algum assunto relacionado a documentos ou fazer compras. A facilidade de acesso e a concentração de lojas, consultórios médicos, serviços e entidades do governo deveriam tornar a região uma das preferidas na busca pela moradia. No entanto, não é isso o que acontece. Segundo uma pesquisa realizada pela Associação Comercial do Paraná (ACP), 54% dos entrevistados que trabalham do centro não gostariam de morar na mesma região, mesmo que tivessem a oportunidade. O centro de Curitiba é o quinto bairro com maior oferta de imóveis novos e um dos que apresentam a menor disponibilidade de unidades à venda na cidade, conforme pesquisa realizada pela Associação dos Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário do Paraná (Ademi-PR) com dados referentes ao primeiro trimestre deste ano. Apesar da falta de imóveis à venda, a região central representou 7% do mercado imobiliário em Curitiba neste primeiro semestre, com dez novos empreendimentos totalizando 1.569 unidades, em sua maioria residenciais. No mercado de locações e venda de imóveis usados, o Centro permanece nos primeiros lugares em números de ofertas. Para venda de imóveis usados, segundo dados do Instituto Paranaense de Pesquisa e Desenvolvimento do Mercado Imobiliário e Condominal (Inpespar), a área central de Curitiba está em terceiro lugar na lista de bairros com maior número de ofertas, totalizando 744 imóveis à venda. Já para locação, o Centro assume o primeiro lugar, com 1.017 imóveis comerciais e residenciais. Somam-se às ofertas o número de evasões do comércio e de habitantes do centro, que de 37.086 em 1980 passaram para 31.623 em 2000, numa redução de 15% no número de moradores em duas décadas, segundo dados do Ins-
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Há mais de 23 anos em estado de abandono, imóvel na Rua Ubaldino do Amaral já foi cena de crime
tituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc). Um dos motivos da evasão habitacional e comercial do centro é a falta de segurança. De acordo com a pesquisa da ACP, 28% dos entrevistados não gostariam de morar no centro por esse motivo. A mesma pesquisa aponta que 40% dos comerciantes consideram as ruas do centro mais perigosas das 18 às 20 horas, e 36% após às 22 horas. A estudante de direito Adriane Alves Domingos trocou um apartamento no centro de Curitiba por outro no Pinheiro em busca de mais segurança. Antes moradora da Rua XV, Adriana afirma que se sente mais segura e confortável agora. “Como estudo à noite, e o centro é mais vazio nessa hora, sempre me senti insegura. Já fui até seguida no caminho de casa”, afirma. Para a estudante, por estar mais perto do trabalho, de bancos, comércios e serviços, ela voltaria morar no Centro. No entanto, pelo conforto e segurança, prefere atualmente um bairro
mais distante. “Não me importo em pegar ônibus e demorar um pouco mais para chegar no serviço e na faculdade. Enfrentar 20 ou 30 minutos do trânsito vale a maior segurança que tenho agora”, justifica Adriane. De acordo com o diretor de fiscalização da Secretaria de Urbanismo, José Luiz de Mello Filippetto, a evasão no centro da cidade é um processo pelo qual todas as grandes cidades passam. “O que compete ao município é implantar políticas públicas para trazer a população novamente para a cidade. É o que a Lei de Zonamento de 2000, a Lei 9.800, propiciou. A partir deste ano, a Lei de Zoneamento aumenta o potencial construtivo dos lotes para edificações residenciais para trazer a população ao centro. Esse é um problema das grandes cidade, e não tem como escapar. A menos que os municípios tomem uma decisão antecipada”, afirma Filippetto. Porém, Curitiba demorou para revisar sua Lei de Zoneamento. “Levou-se 25 anos para a revisão da nossa última Lei de
Zoneamento, houve um espaço muito grande. Se tivéssemos feito uma revisão antecipada, poderíamos ter constatado esse problema antes e tentado reverter isso”, lamenta.
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Mocós são pontos de drogas ESPECIAL
Dos 142 imóveis ocupados irregularmente em Curitiba, 26% estão no centro da cidade
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lém dos inúmeros imóveis novos e usados para venda e locação devido à evasão comercial e habitacional, o centro de Curitiba conta com outros fatores que realçam a imagem de bairro inseguro e desabitado: os vazios urbanos e mocós. A capital paranaense conta atualmente com 56,3 mil imóveis desocupados, sendo que 142 estão ocupados irregularmente, servindo de ponto de consumo de drogas. Destes, 26% estão no centro, de acordo com levantamento da Secretaria Municipal de Urbanismo (SMU). Segundo o diretor de fiscalização da Secretaria de Urbanismo, José Luiz de Mello Filippetto, os mocós estão, em sua maioria, vinculados a duas situações que dificultam a regularização do imóvel: massa falida e processo de inventário. “O mocó é uma das situações de mais difícil solução aqui no Departamento de Fiscalização. A massa falida está amarrada a um síndico que, para fazer qualquer investimento, tem que ter autorização judicial, e o Judiciário só autoriza pagamentos para questões trabalhistas. O síndico da massa falida fica amarrado para fazer qualquer coisa nesses imóveis. No inventário, é a mesma coisa. Quando há um ou dois inventariantes, é mais
Percentual de solução para imóveis que viram mocós chega a menos de 1%, afirma Filippetto
fácil, o difícil é quando são mais e quando não há consenso entre os familiares. O mocó é um problema complicado de administração”, conta Filippetto. Por falta de funcionários no departamento, José Luiz Filippetto afirma que a atuação da prefeitura é corretiva e não preventiva. “Infelizmente, atuamos após a reclamação, não temos um número suficiente para fazer uma fiscalização preventiva, chegar na hora ou antes de o problema aconte-
cer”, lamenta. Quando notificada, fesa. Na nossa legislação municipal, a SMU localiza o proprietário e existem duas instâncias, isso retarda aplica notificações e multas. “O a ação fiscal. O volume de defesas e que temos como força são noti- recursos é grande. Em torno de 70% ficações, autos de infração e, em dos notificados recorrem, mesmo último caso, o município investe sabendo que não há o que fazer. no imóvel lacrando-o. Mas, para O percentual de correções chegar nisso, temos que passar chega a menos de 1%”. Apesar do por todos os ritos baixo número de a que a lei nos obriFilippet“O mocó é uma das correções, ga. Devemos notito acredita na multa ficar, multar duas situações de mais como possível sovezes, publicar em difícil solução aqui lução: “As multas, edital, para daí irem um momento no Departamento ou outro, terão que mos no local e lacrarmos”, explica. de Fiscalização” ser pagas, caso conA multa cobrada trário, se não entrar pela prefeitura é de o dinheiro no caixa R$ 1.370 e, em caso de reincidên- da prefeitura, a multa será inscrita cia, dobra-se o valor. em dívida ativa, acarretando posSegundo o diretor da fiscali- terior ação judicial, chegando em zação da Secretaria de Urbanismo, última instância até à penhora de apesar da atuação da prefeitura, o bens. O município pode se apronúmero de soluções é baixo, devi- priar do imóvel. A grande maioria do aos trâmites legais: “Temos um acha que multa de prefeitura não problema legal que é o direito à de- dá em nada”.
Mais de 20 anos de abandono Um dos casos de imóveis abandonados sem solução até agora é o do casarão na Rua Ubaldino do Amaral, próximo à Praça do Expedicionário. Por causa de um imbróglio judicial resultante de inventário e falta de acordo entre os herdeiros, o imóvel está abandonado há mais de 20 anos, conforme afirma Valter Correa da Silva, de 82 anos, morador do prédio residencial ao lado do imóvel vazio. “Desde que vim morar aqui, há 23 anos, não tem ninguém na casa. Não sabemos quem é o dono. Ali vive cheio de pessoas bebendo, usando drogas. Já veio polícia, jornalista, de tudo. Na semana passada, veio a polícia, botou fogo e mandou as pessoas embora, fizeram um rapa, mas já fizeram coisas parecidas em outras vezes”, reclama Silva. O imóvel abandonado, que incomoda moradores e comerciantes, já foi cena de crime. Em julho de 2008, uma moradora de rua foi mor-
“Desde que vim morar aqui, há 23 anos, não tem ninguém na casa”, comenta Correa
ta a tijoladas no casarão. “Já mataram gente lá dentro. Na época, eu descia de ônibus perto. Uma moça com um bebê de colo pediu minha ajuda dizendo que alguém queria matá-la. Dei o dinheiro do ônibus para ela. No outro dia, quando vim trabalhar, tinha um carro do IML e um da polícia na frente do imóvel, tinham matado a moça”, conta uma comerciante da região que não quis se identificar. De acordo com ela, a loja em que trabalha foi assaltada duas vezes em
abril por pessoas que dormem na casa abandonada da Rua Ubaldino do Amaral. “Chegou a um ponto em que não dá mais, é muito pedinte e assalto. Eles [os mendigos] são agressivos quando a gente não dá algo. Tive que tirar o jardim daqui da frente e as árvores, porque juntava muita sujeira, roupa velha, garrafas e cachimbo de crack. Até camisinha jogavam aqui na frente. Todos os dias, limpávamos, para no outro dia aparecer tudo novamente”, desabafa. A comerciante afirma, no entanto, que na segunda quinzena de maio os mendigos e ocupantes do imóvel vazio sumiram, após ação da polícia que os despejou. “Na semana passada, os policiais despejaram as famílias que estavam na casa, queimaram as coisas que ficaram, mas não sei se resolveu, porque já vi alguns passarem por aqui. Agora deu uma amenizada. Minha esperança é que o dono da casa faça alguma coisa”, afirma. (ATR)
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ESPECIAL
Moradias poderiam ter uso social Legislação prevê destinação de imóveis para uso social, mas possibilidade quase não é aplicada
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ma das soluções para acabar com os imóveis abandonados e promover o aumento da população no centro da cidade é a aplicação da moradia com interesse social, ou seja, a apropriação dos imóveis pelo Município, Estado ou União, com a instalação de lares de abrigo ou condomínios de baixa renda. Curitiba sofre um déficit habitacional. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o déficit na grande Curitiba, que abrange a capital e a região metropolitana, é de 63 Hoshino defende política de uso de imóveis vazios mil residências, o que quase pode ser sanado com os 56,3 mil imóveis aban- terem problemas na justiça, existe uma outra quantidade de terra urbana que donados na cidade. A solução está ao alcance do go- serve só como reserva de mercado à verno, conforme afirma o assessor da especulação imobiliária. O Estatuto da organização Terra de Direitos, Thiago Cidade e a Constituição impõem ao pode Azevedo Pinheiro Hoshino. “Em- der público o dever de agir na coação bora exista a alegação de que boa parte desses abusos. Um dos instrumentos dos imóveis vazios no centro da cidade possíveis é o IPTU progressivo, que tenham alguns entraves jurídicos, se o em Curitiba é pouco ou nada aplicado. poder Judiciário aplicasse melhor ou Se existe um imóvel não utilizado ou com mais intensidade o princípio da subutilizado, você obriga o proprietáfunção social da propriedade, com cer- rio a dar a ele uma destinação por meio teza, esses imóveis poderiam receber da majoração periódica da alíquota do destinação mais adequada”, argumen- tributo. Depois de cinco anos, se ele ta Hoshino. Para ele, o imóvel deve não atender às exigências do municíatender à função social acima de tudo. pio, o imóvel pode ser desapropriado, “Se fôssemos pensar no que significam por meio de indenização, não se trata esses vazios urbanos para atendimen- de um confisco”, explica. Por outro lado, segundo o assessor to do déficit habitacional, existe uma questão para além simplesmente do do Terra de Direitos, as ações de revitaespaço, que é a qualidade urbanística lização da área central de Curitiba realizadas pelo poder da terra no cenpúblico podem tro. Quando dis“Com certeza, esses tornar-se perigocutimos os vazios imóveis poderiam ser sas quando assuurbanos na persmem um viés de pectiva do direito destinados de forma “higienização soà moradia, o que mais adequada”, diz cial” com relação nós, que aderimos aos moradores em à plataforma poThiago Hoshino situação de rua lítica da reforma ou aos de baixa urbana, buscamos pautar é que em primeiro lugar toda renda. “Os movimentos sociais temem propriedade tem que obedecer à fun- esses programas de revitalizações, que ção social. Esse é um imperativo que sempre são pensados por e para deterestá na Constituição de 1988 e que foi minados grupos. Por detrás do discurso regulamentado pelo Estatuto das Cida- de revitalização, há uma certa tensão, um objetivo de limpeza social. Um dos des”, defende o assessor. De acordo com Hoshino, o Es- passo da revitalização é remover as pestatuto das Cidades prevê vários meca- soas em situação de rua, ou os trabalhanismos que o Estado pode utilizar na dores sexuais, expulsando essas pessoas solução do problema dos domicílios e não as realocando em habitações adeociosos contra a especulação imobi- quadas”, alerta Hosino. Lutar pelo direito à moradia no cenliária, como, por exemplo, o aumento progressivo do Imposto Predial e Ter- tro da cidade é uma das missões do Terra ritorial Urbano (IPTU). “Em boa parte de Direitos, conforme Hoshino. “O que desses imóveis que o poder público diz defendemos é a viabilidade de se pensar a
afirma Fanini. “Não é só a questão do estacionamento, mas também a circulação. Não há como gerar áreas de estacionamento compatível com a demanda gerada pelo acesso ao imóvel. A não ser que se faça uma demolição completa, o que implica ter uma capacidade econômica elevada e total falta de bom senso para destruir toda a cidade, toda a história, para reconstrui-la para o uso do automóvel”, alega Fanini. Para ele, a única solução à evasão seria a melhoria do transporte público. “Só pode ser revertida a partir do momento que se amplie a facilidade de acesso, e não é por automóvel. Os limites do sistema viário estão postos, as vias são essas, e não há como ampliar. Só há uma Pensar a acessibilidade Para o engenheiro civil e presiden- maneira: por meio de uma modalidade te do Sindicato dos Engenheiros no de transporte que seja atrativa ao usuário do automóvel, Estado do Paraná (Senge-PR), a “A evasão só pode ser ou seja, que não seja a modalidaevasão comercial revertida a partir do de dos excluídos e habitacional do centro poderia momento que se amplie do automóvel, como é agora o ser sanada com a facilidade de acesso” sistema curitibaa reestruturação no, no qual usa o do transporte afirma Fanini transporte coletipúblico curitibavo quem não tem no. De acordo com Fanini, a densidade demográfica recursos. Quando criarmos um sistema na área central de Curitiba deu-se, his- de qualidade para atrair um passageiro toricamente, pelo acesso ao bairro e a universal, e não um cativo por questões serviços. Hoje, a falta de acessibilidade econômicas, o centro voltará a ter a viacarreta o processo contrário. “O que talidade que teve, assim como o centro deu origem à alta densidade no centro? de grandes capitais que têm o sistema Que manifestação é essa? É resultado metroviário e de transporte públicos de um efeito que tem como causa o efetivo”. Fanini alerta que o processo de alto índice de acessibilidade no centro decadência continuará, caso não seja da cidade, que é para onde convergem todas as estruturas viárias, onde há o pensada uma mudança estrutural no maior número de linhas de transporte modelo de acessibilidade urbana em público. Em busca de acessibilidade é Curitiba. “As pessoas de maior poder que se forma uma alta densidade. Essa aquisitivo não vêm mais ao centro fadensidade no centro, por causa de escri- zer compras, vão ao shopping, onde tórios instalados em prédios com altura podem ir de carro. O comércio do elevada, deu-se exatamente por causa centro começa a morrer. Precisamos da acessibilidade que tinha o centro, de um sistema de transporte de massa tanto pelo transporte público quanto de velocidade e qualidade, ou seja, um pelo automóvel. A mesma acessibilida- sistema metroviário e de veículos leves de tem surtido efeito contrário agora: a sobre trilhos (VLT). O ônibus não é falta de acessibilidade, principalmente atrativo. Um metrô na via de substituipara o automóvel, está fazendo com ção do eixo Norte-Sul não vai resolver que esses usos deixem de ser viáveis, sozinho o problema. Ajuda, mas não e esses usos para escritórios clínicas e resolve. Seriam necessárias no mínimo outros escritórios vão para outras ave- quatro linhas diametrais passando pela nidas e artérias que facilitem acesso e cidade e mais algumas linhas circulares para aumentar a acessibilidade e a atraestacionamento”, comenta. Repensar os imóveis com vistas tividade do Centro. Ou seja, precisaa incluir ou ampliar áreas de estacio- mos de uma abordagem estrutural para namento não é a solução mais viável, o centro de Curitiba”, defende. habitação de interesse social também no centro da cidade. O questionamento é: por que mandar sempre os pobres para desbravar o espaço, em um lugar onde não existem equipamentos públicos, nem infraestrutura? Se o direito à cidade fosse considerado como um todo, e a função social da propriedade urbana fosse o norte das políticas públicas e da atuação do poder Judiciário na resolução desses conflitos, e não o direito individual da propriedade absoluto, certamente teríamos um avanço enorme para uma renovação do papel desses vazios urbanos num projeto mais amplo de reforma urbana”, defende Hoshino.
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Dos tropeiros ao agito do centro ESPECIAL
Quem são as pessoas que moram na área central de Curitiba e quais as vantagens oferecidas pela região Divulgação
Da Curitiba antiga, das carroças e dos bondes, pouca coisa restou
região com menor número de crianças na cidade. Um quarto dos uem viu a antiga vila, moradores situa-se na faixa etária os tropeiros por ali pas- de 20 a 29 anos, o maior índice da sando, a calmaria, ruas de cidade. O centro também bate o terra, nem em sonhos proféticos recorde de pessoas idosas acima imaginaria no que esse lugar se tor- dos 70 anos: o índice é de 9,8%, naria. A vila se tornou cidade. A ci- enquanto no restante da cidade é de 3,6%. Karen dade, capital. Veículos Raquel é uma das Um quarto dos modernos ocupam o lugar que antes era moradores situa-se jovens habitantes do de Curitiba. dos cavalos na cidade na faixa etária de centro Ela tem 25 anos e é com maior número 20 a 29 anos professora de Artes. de automóveis por Para ela, os jovens habitante no Brasil. Onde havia o comércio pequeno e que moram no centro optam pela simples, uma infinidade de lojas e facilidade e praticidade. “Os jovens bancos se misturam a outros tipos que conheço que moram aqui no de comércio. Onde havia calma- centro estudam ou trabalham por ria, há milhares de pessoas num aqui. Podemos fazer tudo a pé e ritmo sempre acelerado. O centro ganhamos tempo por não termos de Curitiba, berço do surgimento que atravessar a cidade” explica. Segundo o soda cidade, mudou. O O número de ciólogo José Afonso mercado imobiliário Oliveira, os idosos avançou muito. habitantes por O perfil dos mo- domicílio no centro que moram na região normalmente têm radores dessa região é de 2,4. No restante imóveis próprios. é bem específico. da cidade, é de 3 Para ele, os filhos dos Segundo a pesquisa idosos se casam e Perfil Imobiliário realizada pela Gazeta do Povo em vão para os bairros, mas eles per2010, o número de habitantes por manecem por laços emocionais ou domicílio na região central é de 2,4. por facilidade. “Se você mora há décadas em um local, não mudará No restante da cidade, é de 3. Outra diferença é a idade bem sem um motivo maior que o laço delimitada dos moradores. É a criado”, afirma Oliveira. Jeferson Turbay
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Divulgação
O centro ganhou densidade populacional e muitos arranha-céus foram erguidos na região
Uma região que se renova A revitalização do Centro de Curitiba tem sido trabalhada já faz alguns anos. Passos importantes foram dados. Incentivos como redução de impostos tem sido adotados desde 2009 para que novos moradores e escritórios possam se instalar na região, trazendo mais vida à cidade. Alguns espaços também foram revitalizados, como a Rua Riachuelo. A dona da Farmácia Homeopática Paranaense, que fica na esquina das ruas Riachulo e Treze de Maio, Alanir Turbay Braga. diz que a rua melhorou bastante com a revitalização. “Algumas coisas ainda têm que ser melhoradas, mas já temos uma rua mais bonita, mais iluminada, e já vemos pessoas diferentes por aqui. É bom para o comércio e melhor para quem mora aqui”, afirma. Vantagens e desvantagens O funcionário público Guilherme Hasse trocou Santa Felicidade pelo centro. Para ele, as vantagens são a facili-
dade para ir ao trabalho, economizando em combustível, e a vida do centro. Porém, segundo Hasse, no sábado à tarde, por exemplo, o centro morre. “Nessa hora, quando acaba o horário comercial, o movimento vai para os bairros, e o centro dá uma boa esfriada”, comenta. Hasse também aponta como um problema os congestionamentos em dias de semana no centro de Curitiba. “Eu trabalho próximo, mas se por algum motivo tiver que ir para outro lugar de carro, inevitavelmente, na volta pegarei congestionamento”, lamenta. A funcionária pública e professora Tânia Solange da Silva diz que uma vantagem invisível é a história por trás de cada prédio, de cada rua: “Para mim, é lindo o centro, o romantismo em saber que por aqui tanta história já foi construída”. No centro, há diversos prédios históricos, alguns inclusive tombados pelo Patrimônio Histórico.
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ESPECIAL
Idosos são as maiores vítimas de deliquentes em Curitiba Luana Almeida Alessandra Stilli
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Claudia Bilobran
Envelhecer com dignidade é direito de todas as pessoas, mas, muitas vezes não é isso que acontece
m portas de bancos, calçadas, no centro da cidade, os idosos acabam sendo os maiores lesados por jovens delinquentes. E eles também têm sido grandes vítimas de golpes por telefones, por serem mais frágeis. Os bandidos dizem ter sequestrado um parente próximo, e, muitas vezes, acontece de a vítima pagar um resgate, na hora do desespero, para não ter seu parente executado. Geralmente, esse tipo de extorsão é combinada dentro de presídios. Mas o que realmente impressiona quando se fala em violência contra os idosos é a violência doméstica. Frequentemente, eles acabam sendo vítima de covardia de familiares e amigos e geralmente não podem se defender por não terem mais tanta força nos braços e pernas. Já se tornou comum ouvir que netos agrediram os avós por terem negado dinheiro para drogas ou para noitadas. Até os filhos acabam cometendo esses delitos. A dona de um asilo em Curitiba, Maria Alzira, Idosos em praça de Curitiba: a legislação garante às pessoas de mais de 60 anos direitos que nem sempre são respeitados de 47 anos, conta uma história difícil de acreditar. Na manhã de uma rial. A Constituição Federal diz que é ano que passa, 650 mil idosos são in- lotados e mesmo assim poucas pesquarta-feira, ela abriu seu portão e obrigação dos filhos darem assistên- corporados à população. Atualmente, soas darem seus lugares nos assenos brasileiros com idade igual ou su- tos. “Uma mulher que percebeu miencontrou uma caixa de papelão fe- cia aos pais. Há também casos de maus tratos perior a 60 anos somavam 15 milhões nha dificuldade em me segurar pediu chada. Quando abriu a caixa, veio a nos asilos e entidades que atendem de habitantes. A participação no total para uma mocinha ao lado ceder seu surpresa: dentro dela, havia sido deixado ali, por seu filho, um homem de idosos. Nesses casos, eles se sentem da população nacional dobrou nos úl- lugar para mim; acho que ela não sós, sem poderem se timos 50 anos, passando de 4%, em gostou”, conta Valda. Eles disseram idade avançada. Maconhecer o Estatuto do Idoso e que ria o acolheu, mas Quando abriu a caixa, defender e também 1940, para 9% em 2002. sem terem alguém A queda nas taxas de fecundi- procuram se atualizar sempre que foi atrás da família veio a surpresa: para defendê-los. A dade e mortalidade infantil, a me- há alguma leia nova. João afirma que de José Rivaldo, 87 anos, o senhor abandentro dela, havia orientação é que as lhoria nas condições de saneamento sempre que precisou do seu carro as vítimas procurem e infraestrutura básica e os avanços vagas de estacionamento de idosos donado dentro de uma caixa de pape- sido deixado ali um delegacias especia- da medicina e da tecnologia são os estavam livres. Defendeu também as lizadas no atendi- principais determinantes do proces- filas e caixas prioritários nos bancos lão. “Quando olhei homem de idade mento aos idosos. so de envelhecimento da população e supermercados. aquela caixa, acabei avançada O administrador de redes José Delegacias comuns brasileira, cujos contornos tornaramme emocionando, também registram se mais nítidos nos últimos 20 anos. Antonio Fernandes, de 23 anos, afirpois me perguntei como uma pessoa poderia fazer aqui- denúncias contra familiares e institui- Uma pessoa é considerada idosa com ma que quando vai ao centro de ônibus sempre cede lugar a idosos e pes60 anos ou mais. lo provavelmente com um familiar”, ções que abrigam idosos. soas com crianças de colo. “Eu tenho Os aposentados Valda Souza relata inconformada. Desrespeito nos ônibus Gazaniga e João Gazaniga, seu ma- educação e consciência de que um Existem também filhos que doSegundo a terapeuta ocupacional rido, de 81 e 83 anos, respectiva- dia eu também serei idoso. As pessopam seus pais idosos para tomar dinheiro, deixam-nos passar fome, sem Elcyana Carvalho, o envelhecimen- mente, utilizam o transporte público as devem ter o mínimo de educação e cuidados, sem os remédios necessá- to populacional é, hoje, um relevante quase todos os dias. Eles acham um consideração pelos mais velhos. Imarios. Isso se chama abandono mate- fenômeno mundial. No Brasil, a cada absurdo os ônibus estarem sempre gina se fossem os próprios avós?”
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ESPECIAL
Os idosos e os perigos das ruas
Uma árdua jornada
Desníveis das calçadas de Curitiba complicam caminhada e tornam os tombos ainda mais graves para pessoas com dificuldades de locomoção
Polliana Bianchini
Juliani Flyssak Claudia Bilobran
A idade chega, e o corpo percebe. estrear uma moradia voltada aos idosos Os cabelos ficam brancos e caem. As do sexo masculino. Há três meses, rerugas chegam para ficar. Está na cara! side na nova casa, que, segundo ele, é Não só o corpo sente, o coração dos ido- a coisa mais linda. “É bem pintada e sos reflete cada experiência vivida. As organizada. Lá você não vê sujeira”, alegrias e decepções dos diversos momen- diz com entusiasmo. Osmar fuma bastante. “Esse é tos pelos quais eles passaram deixaram marcas. Muitas delas boas e nostál- o meu único vício. Detesto bebidas, e gicas, já outras, nem tão agradáveis lá ninguém pode entrar embriagado”. assim, capazes de alterar os previstos Osmar também não costuma sair após escurecer. “Hoje em dia, não é igual a ciclos da vida. Osmar Souza, um senhor de 63 antigamente. Hoje tem muitos probleanos, é o exemplo de uma pessoa que mas nas ruas. Não saio à noite de jeito teve a sua vida modificada de um ins- nenhum. Fico na minha”, conta. O novo lar fica no bairro Mercês, tante para outro. Natural de Florianópolis, mudou-se para Curitiba quando na rua Júlio Perneta, 259. Duas moças completou 11 anos. Veio na companhia se revezam para dar assistência à casa de seus pais, o militar Fernando Souza e aos senhores. Cada quarto possui um e a dona de casa Zulmira Maria Sou- banheiro e tem espaço para duas pessoas. O local é equipado za. Começou a tra“Hoje em dia, não é com entrada eletrônica balhar ainda jovem como padeiro e antes igual a antigamente. e garante conforto e segurança aos idosos. disso foi também caHoje tem muitos melô. Casou-se quanproblemas nas ruas. No próximo mês, a moradia receberá mais do tinha 22 anos. Não saio à noite de três integrantes. Era apaixonado pela jeito nenhum. Fico Mesmo com as mulher, com quem pessoas ao redor, Osteve três filhos em um na minha” mar, após tanta trisrelacionamento de 17 anos. Depois de casado, adquiriu uma teza, prefere ficar na solidão. No fundo casa em São José dos Pinhais, onde vi- dos seus olhos, os mesmos que fotografavia com a família. Lá, investiu na pro- ram o pior momento de sua vida, podefissão de taxista e chegou a trocar de se notar que é uma pessoa boa e sozinha. Questionado sobre o que gostaria carro por três vezes. O ano de 1986 foi o divisor de de ganhar no próximo Natal, responde águas na vida de Osmar. Foi quando rapidamente: “Quero um par de tênis se surpreendeu ao flagrar a mulher com novos. O meu está muito velhinho”. Daqui para frente, ele espera receoutro homem. O mundo dele desabou. Saiu de casa, deixando o imóvel para a ber a sua aposentadoria, após completar ex-companheira e os filhos, que ficaram 65 anos, em maio de 2012. Enquanto isso, se vira fazendo pequenos trabaao lado da mãe. Desde então, sua vida nunca mais lhos nas ruas para conseguir moedas e foi a mesma. Passou por alguns abri- comprar o seu cigarro barato. “Já tive gos até se instalar na Casa dos Irmãos várias coisas e hoje, o que tenho?”, deToca de Assis. Esse centro de apoio que sabafa consternado. Osmar guarda seus documentos abriga pessoas de diversas idades fica na rua Visconde do Rio Branco, em com cuidado, mas, por incrível que paCuritiba, e serviu de lar para Osmar reça, o que exibe com intenso brilho no olhar é a certidão de casamento, muito durante anos difíceis de sua vida. bem conservada dentro de sua organizada carteira. Em cada expressão de Nova vida Recentemente, a visita de um pa- Osmar estão impregnadas as marcas dre à Toca de Assis mudou mais uma de uma vida repleta de lembranças e vez a vida de Osmar. O padre selecio- emoções. “Vivo sozinho. Quero viver a nou quatro senhores (inclusive ele) para vida tranquilo, na minha”.
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Em Curitiba, as ruas continuam sen- lembra de onde estava. Tenho medo de do um grande perigo para os pedestres. que isso possa acontecer de novo.” As ruas ficam cada vez mais traiçoMães se preocupam quando os filhos saem, pois os acidentes acontecem em eiras para essa parte da população que todos os lugares. Mas as pessoas mais não tem mais tanto equilíbrio devido à velhas são as que mais sofrem, principal- idade. Muitos motoristas também não comente quando andam em ruas movimen- operam. “Tem vezes que eles andam em tadas, mesmo o calçadão da XV de No- alta velocidade e não se importam com vembro. “As pessoas sequer olham para quem pode estar atravessando a rua. Se o pior acontece, eles o lado e vão dando falam que não têm culcotoveladas e empur“É difícil encontrar A faixa de pedesrões. Isso machuca, alguém que nos ajude. pa. tres é feita para eles ainda mais eu, que já Já caí na calçada por pararem, mas nem tenho 68 anos”, reclaisso eles respeitam”, ma Tereza Vieira Holtz. causa da péssima queixa-se Tereza. As calçadas não condição delas”, De acordo com a são confortáveis, não diz Romilda Stand aposentada Romilda apenas para quem é Stand, de 78 anos, a mais velho: mulheres preocupação e o resde todas as idades reclamam. Os desníveis são o que mais incomoda. “Às vezes, peito com os idosos nas ruas curitibanas acontece de a gente estar andando e tro- quase não existe. “É difícil encontrar alpeçar. Por muito pouco, não caímos”, diz guém que nos ajude. Já caí na calçada por causa da péssima condição delas, e Tereza Holtz. Ela também afirma que já levou al- só depois de alguns minutos um moço guns tombos. “Tempos atrás, eu estava veio me ajudar. Na maioria das vezes, andando, tropecei e caí. Uma moça me as pessoas veem que necessitamos de ajudou a levantar. Quando levantei, tive ajuda, mas fingem que não é com eles”, que esperar alguns segundos para me afirma indignada.
MARCO ZERO
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Curitiba, maio de 2011
HISTÓRIA
Consigo um emprego se A mentira mais bem tenho uma tatuagem? sucedida da história
N
o mundo dos negócios, quem opta por fixar permanentemente desenhos ou frases no corpo nem sempre é bem visto profissionalmente. Essas pessoas são muitas vezes tidas como desinteressadas pelo trabalho e acabam não recebendo a credibilidade que merecem, mesmo quando são extremamente capazes e competentes. Um exemplo desse tipo de discriminação é a professora de inglês Carolina de Bortoli, que admitiu ter tido problemas para lecionar em várias escolas devido às sete tatuagens e quatro piercings espalhados pelo corpo: “Em meu estágio supervisionado da faculdade, fui ‘convidada a me retirar’ da escola pelo diretor por causa das tatuagens, e no meu trabalho atual me taxam como a loirinha louca”, conta sorrindo. O diretor de uma escola de orientação religiosa em Curitiba, Magdiel Gonzalez, deixa claro que, ao contratar um funcionário, a preferência é por quem não tem tatuagens. Caso o pretendente à vaga tenha a pele marcada por desenhos permanentes, será eliminado imediatamente da lista de possíveis contratações, já que faz parte das normas da escola não ter cabelos compridos, usar brincos ou piercings ou possuir tatuagens. Em contrapartida, Coreolano Neto, que trabalha no setor jurídico do Banco do Brasil e contrata estagiários, prefere escolhê-los pela capacidade e demonstração de interesse para ocupar a vaga que eles apresentam ao candidatarem-se ao cargo. Coreolano afirma que o preconceito maior que as pessoas tatuadas enfrentam profissionalmente é proveniente de funcionários “mais antigos”, que estão acostumados com um “estilo militar”, sinônimo de ordem e seriedade: cabelo curto, penteado, barba feita, roupas passadas e bem cortadas. “Os mais tradicionalistas aqui do banco acham que pessoas com tatuagens não são aptas à ocupação do cargo, pois não passam seriedade e compromisso com o serviço que estão fazendo aos clientes”, explica. Na Antiguidade Encontradas por pesquisadores
Larissa Corumbá
Divulgação
Larissa Corumbá
Eliaquim Junior
Coreolano Neto: sem preconceitos com tatuagem
americanos, múmias datadas de mais de cinco mil anos já apresentavam o corpo marcado por desenhos definitivos. Essas figuras eram representações de fatos marcantes que haviam acontecido durante suas vidas, tais como a chegada da vida adulta, rituais, vencimento de batalhas e assim por diante. Nas primeiras décadas depois de Cristo, foi a vez de os primeiros seguidores de Jesus Cristo se identificarem como grupo religioso, gravando na pele o peixe, símbolo da sua ideologia, a cruz na qual seu mestre havia se sacrificado em prol da humanidade ou a sigla IHS (sigla em latim de “Jesus, salvador dos homens”). Contudo, no final da Idade Moderna, a tatuagem virou símbolo de marginalidade, já que essa prática havia se tornado comum dentro de prisões com a intenção de identificar os criminosos pelos delitos cometidos ou orientação sexual, ou somente com a intenção de marcar na pele desenhos que servissem como amuletos que trariam sorte e proteção à vida dos detentos. Foi somente a partir da década de 1960, com o advento de manifestações artísticas com origens ligadas aos movimentos de vanguardas do início do século XX, que a tatuagem tornouse contemporaneamente um símbolo de arte. O tatuador Fajioni, do estúdio Dragão Tattoo, alega que o público de tatuagem e piercing é distinto e garante já ter tatuado juízes, advogados e dentistas. Embora o preconceito com tatuados ainda exista no mercado de trabalho, salienta: “A nossa clientela não se preocupa muito quanto ao local das tatuagens, pois sabem que estão fazendo um trabalho artístico, e não uma marca de cadeia”.
A senhora Joslin afirmou: “Quando o locutor disse: abandonem a cidade, peguei o meu filho nos braços e precipitei-me, pela escada abaixo...”. Já Joseph Hendley disse que todos caíram de joelhos, e a família rezou. Esses são apenas dois de centenas de depoimentos ouvidos pela polícia para dimensionar o caos que se instalou nos Estados Unidos depois da transmissão da radiodramatização do romance “Guerra dos Mundos”, de H. G. Wells, apresentado por Orson Welles e pelo grupo de teatro Mercury Theatre na noite de noite de 30 de outubro de 1938. Aquela véspera de Halloween ficou conhecida como a maior mentira da história, que, a princípio, não teve o propósito de enganar ninguém, nem de causar pânico, apenas entreter os ouvintes da rádio CBS. É difícil saber o porquê da histeria coletiva, uma vez que a emissora já havia apresentado antes adaptações de peças como “Drácula”, de Bram Stoker, e “A ilha do Tesouro”, de Robert Louis Stevenson, e o jovem Orson Welles já era conhecido pelo trabalho no teatro, mas o fato é que ela aconteceu. Parece que, no entanto, nem todos ouviram os avisos e a publicidade da emissora sobre a radiodramatização. Na adaptação produzida por Welles e proposta pelo Mercury Theatre, após a previsão do tempo, houve uma interrupção na transmissão, e em seguida a locução avisou: “A CBS interrompe seu programa para anunciar aos ouvintes que um meteoro de grandes dimensões caiu em Grovers Hill, no Estado de Nova Jersey.” A partir disso, os primeiros 30 minutos do programa foram apresentados em forma de boletins jornalísticos, o que levou muitos ouvintes desavisados a pensar que, realmente, Nova Iorque e Nova Jersey, estavam sendo invadidas por marcianos. Além da locução, a dramatização também lançou mão de um “enviado especial” do programa que retratou aos espectadores a descoberta de um cilindro de metal, uma nave espacial, e seres gigantescos com tentáculos que entraram em confronto com a polícia, enquanto o repórter narrava a morte de dezenas de pessoas. O público também ouviu a morte do
enviado especial vitimado por raios vindos da nave. A dramatização de Welles inventou também entrevistas com autoridades, e um ator se fazendo passar por secretário de Estado alertou os ouvintes de que as pessoas deveriam sacrificar a própria vida para que os humanos prevalecessem na Terra. Somando-se tudo isso ao relato da chegada de novas naves invasoras em Manhattan, foi mais que suficiente para gerar o caos, e o desespero se instalou entre a população. Não foi possível medir os resultados que a falsa invasão causou. Há relatos de pessoas que preferiram o suicídio à aniquilação pelos alienígenas. Durante a transmissão, a CBS recebeu as primeiras notícias de que a população estava histérica, porém, o diretor da estação de rádio não interrompeu a transmissão. Somente após um gás mortífero ser lançado pelos alienígenas e atingir até mesmo os prédios mais altos da cidade, e o locutor do programa ser morto pelos invasores, a transmissão chegou ao fim. Após segundos de silêncio, outro locutor volta ao ar para dizer: “Vocês acabaram de ouvir a primeira parte de uma irradiação de Orson Welles, que radiodramatizou A Guerra dos Mundos, do famoso escritor inglês H. G. Wells”. Relatos afirmam que a polícia e os bombeiros tiveram uma dificuldade enorme em convencer as pessoas de que não havia nenhuma invasão acontecendo, e nos meses seguintes Welles e a CBS foram processados em centenas de ações judiciais em busca de indenização, porém, nenhuma delas foi bem sucedida. A transmissão de Welles pode ser considerada uma das mentiras mais convincentes de todos os tempos.
MARCO ZERO
Curitiba, maio de 2011
CRÔNICA
Nerd
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TÁ NA WEB Andrey Takahashi
(apaixonado ao quadrado)
Diego Gianni Chama-se Albert Copérnico. Sua mãe o chama de “Al”, e os amigos... não, não tem amigos. Tem, isso sim, um cérebro gigantesco, um contraste com seu corpo miúdo. Sexo? Para ele, uma parte de algum relatório a ser preenchido. Dependendo do ângulo de visão (analisando as variáveis, prismas e tudo o mais), Albert com certeza é um ser humano lindo. À sua maneira, claro. Quando “Al” se apaixonou (deixem-me pegar a intimidade materna e também chamá-lo assim), pensou que alguma coisa estava muito errada com ele. – Meus níveis de serotonina e dopamina estão altos, e eu nem comi chocolate hoje! – estranhou ele. A resposta para seu enigmático teorema tinha nome: Jamile. Seu órgão de musculatura estriada cardíaca (vulgo coração) bombeava mais intensamente quando Jamile (ah, Jamile...) estava próxima de Al. Quando Jamile sorria, Al ficava de tal maneira que não conseguia disfarçar. Jamile notou: – O que você tem, Al? (Ela também o chamava assim, o que muito o agradava). – Estou com dispnéia. – Quê? – Falta de ar. Al sabia explicar tudo. Devorava os livros sem ter congestão e não se recordava de nenhum tempo da sua vida (considerando que o tempo exista) em que tivesse ficado sem encontrar uma solução. Isso até conhecer Jamile. E ele tentou se declarar. – Sua pele e temperamento combinados criam em mim uma conexão de atratividade. – Quê? Al não conseguia simplificar o que estava sentindo, nem mesmo conseguiria definir. Era um nerd, não um poeta. – Como conquistar Jamile? – perguntou-se Al, sem cabeça para resolver uma equação que faria as pessoas escovarem os dentes com o dobro de
eficácia em metade do tempo. “Talvez”, refletiu Al, “o velho método de flores e bombons, por mais simplista e recheado de obviedades que possa parecer, seja a linha de desenvolvimento mais precisa”. Chamou Jamile para um canto e, novamente, tentou dizer o que estava sentindo do fundo de seu órgão nobre de bombear o sangue. – Jamile... – Diz, Al... Al pigarreou, limpou com a manga da camisa uma gota de suor de sua testa (em quantidade normal, o que descartava nele uma possível febre cística que poderia ter herdado geneticamente de seu progenitor) e revelou a Jamile seus mais cândidos sentimentos. Repito, à maneira dele. – Jamile... – Sim...? – Quando... Quando Isaac Newton apresentou sua teoria em que a luz podia ser considerada como um feixe de partículas emitidas por uma fonte de luz que atingia o olho e estimulava a visão, talvez estivesse... apaixonado. Jamile olhou para ele sem entender. – Como? – perguntou. – Você tem luz própria, Jamile. Ela sorriu e compreendeu tudo, porque se há uma linguagem universal é a do amor. Al não precisava ter dito nada, estava escrito em seus olhos que ele estava apaixonado, e ela sabia disso há muito tempo. – Não... não sei se estou conseguindo me fazer entender... – gaguejou ele. – Não seja estúpido, Al – disse ela com um sorriso. Ela lhe beijou a boca e foi embora, deixando o gênio nas nuvens. De noite, ao abrir a janela de seu quarto, Al olhou para o céu e, como sempre, olhou para as esferas autogravitantes de gás ionizado que, esta noite em especial, pela primeira vez chamaria de estrelas, como convém a qualquer pessoa apaixonada. Dormiu com um sorriso bobo no rosto.
Requião e sua aposentadoria Mais uma trapalhada do agora senador Roberto Requião (PMDBPR). Questionado por um repórter da Rádio Bandeirantes, Victor Boyadijan, se abriria mão da aposentadoria como ex-governador do Paraná, Requião se irritou com a pergunta e tomou o gravador das mãos do jornalista e ainda deletou toda a matéria. Pelo Twitter, justificou sua atitude dizendo: “Acabo de ficar com o gravador de um provocador engraçadinho. Numa boa, vou deletá-lo”. Será que ele não aceitaria numa boa que o povo que paga sua aposentadoria deletasse os R$ 24.000,00 que ele recebe?
Mais dinheiro para o Lanterna Verde Divulgação
Essa vem direto de Hollywood. A produtora do filme Lanterna Verde, baseado numa história em quadrinhos de mesmo nome, teve que adotar medidas urgentes para cumprir o prazo de lançar o filme até junho. Segundo a revista especializada em cinema Variety, a Warner Bros. desembolsou mais US$ 9 milhões e contratou novas empresas de efeitos especiais. Oficialmente, o problema não é admitido, e o vice-presidente de efeitos visuais Chris de Faria disse: “Tentamos acrescentar coisas para deixar o filme melhor até o último instante. Isso não significa que estamos arriscando o filme até o último instante”. O bom é que Hollywood tem dinheiro de sobra e com certeza US$ 9 milhões não irão fazer falta, claro, se o filme for bem quando estrear.
Adriano pisa com o pé operado em shopping Do mundo do futebol, uma notícia bombástica. O novo reforço do Corinthians foi visto passeando por um shopping no Rio de Janeiro. Adriano se recupera de um rompimento no tendão de Aquiles, o que fez adiar em cinco meses sua estreia. O passeio mostrou que o atacante não está seguindo à risca as recomendações do time paulista. Adriano foi visto com uma espécie de bengala e vestindo bota no pé lesionado, mas o usou como apoio. Cartão vermelho para o atacante. Desse jeito, ele nunca vai estrear no Corinthians para substituir Ronaldo Fenômeno. Pelo menos em questão de peso, não vai ser difícil.
MARCO ZERO
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Curitiba, maio de 2011
ENSAIO FOTOGRÁFICO
Na mesma praça,
no mesmo banco
Textos e fotos: Larissa Glass
C
uritiba é conhecida por sua diversidade de praças e parques. No final da tarde, são um ótimo convite para curtir com os amigos, namorar, levar as crianças para brincar, parar para bater um papo, descansar ou apenas cortar caminho para casa. Cheias de charme, as praças ganham vida com o corre-corre dos moradores e turistas que circulam por elas e também com a presença daqueles que as desfrutam por alguns minutos.