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JORNAL-LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO UNINTER - ANO VII- NÚMERO 48 – CURITIBA, JUNHO DE 2016

Grafita Agência Experimental

O direito de votar em debate

Voto facultativo ou voto obrigatório. Qual seria a melhor opção para um país em crise política como o Brasil? págs. 6 e 7

Foto:Jeniffer Jesus

Divulgação

Divulgação

Saiba quem foi Lala Schneider, a primeira dama do teatro parananaense

pág. 10

págs. 8 e 9

págs. 3

Viaje com Vânia e descubra que, para estar na direção de um ônibus, não precisa ser homem

Feira do poeta completa 35 anos reunindo artistas no Largo da Ordem, em Curitiba


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Número 48– Junho de 2016

OPINIÃO Ao leitor

Equipe Marco Zero

O Marco Zero

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Expediente

Na Praça Tiradentes, bem em frente à Catedral, está o Marco Zero de Curitiba, que oficialmente é tido como o local onde nasceu a cidade, além de ser o ponto de marcação de medidas de distâncias de Curitiba em relação a outros municípios. Ao jornal Marco Zero foi concedido este nome, por conter notícias e reportagens voltadas para o público da região central da capital paranaense.

1o lugar 3 01 |2 MAR CO ZERO

Um basta à cultura do estupro Camila Toledo

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma em cada cinco mulheres de até 18 anos já foi vítima de estupro ou abuso sexual. O termo “cultura do estupro” veio à tona após a repercussão do caso de estupro coletivo contra uma adolescente de 16 anos, no Rio de Janeiro. Desde então, nos últimos meses notícias de abuso sexual contra mulheres tomaram conta dos noticiários no Brasil, chegando até na mídia internacional. Mas o que é cultura do estupro? É um contexto no qual o estupro é espalhado e normalizado devido a atitudes sociais sobre gênero e sexualidade. Sendo assim, estupro é a prática não consensual do sexo de uma das partes, imposto por violência ou ameaça de qualquer natureza, envolvendo penetração ou não. Mesmo que muitos argumentem dizendo que a cultura do estu- mais da metade das vitimas de pro não existe, ela existe sim. Isso estupro do Brasil tem menos de se comprova com inúmeras dados 13 anos. levantados sobre a violência seNa noite de domingo (19), uma xual contra a mulher. mulher de 40 anos foi esDe acordo com o A cada tuprada e assaltada no Fórum Brasileiro de onze ponto de ônibus por um Segurança Pública, homem armado. A musomente ano passa- minutos lher estava com sua filha do foram registrados ocorre um de 9 anos e chegou a ser 47,6 mil casos no Bralevada para casa pelo hocaso de sil, o que corresponmem para que entregasse de a um ocorrência estupro no seus pertences. No Piauí, a cada 11 minutos. A Brasil em menos de um mês Central de Atendiforam registrados mais mento à Mulher inde três casos de estupros dicou mais de 76 mil denúncias, coletivos. O último foi contra uma somente ano passado e neste ano a mulher de 21 anos, que estaria deviolência contra a mulher cresceu sacordada e teve imagens do ato para 44,7%. divulgadas nas redes sociais. Além de dados, temos muiTais crimes ocorrem há muitos exemplos de que a violência to tempo. O Brasil ainda possui sexual contra o gênero femini- uma cultura patriarcal, onde o hono é enorme. Uma criança de mem é o mais importante e o que 12 anos era estuprada pelo pró- pode fazer tudo, inclusive usar prio pai em sua casa e o caso o corpo alheio contra a vontade se tornou conhecido quando a do mesmo. Essa mesma cultura menina tomou coragem e en- proporcionou o machismo, que tregou uma carta à mãe, onde hierarquiza o homem a tal ponto contava dos abusos que vinham em que a vítima é acusade de ser acontecendo há muito tempo. O culpada pelo abuso que sofreu. pai da criança foi preso na terça No caso do estupro coletivo, no feira (21). Segundo o Instituto Rio e Janeiro e em tantos outros, de Pesquisas Aplicadas (Ipea), é possível perceber essa atitude. O jornal Marco Zero é uma publicação feita pelos alunos do Curso de Jornalismo do Centro Universitário Internacional Uninter Coordenador do Curso de Jornalismo: Guilherme Carvalho Professor responsável: Roberto Nicolato

Diagramação: Luiz Rocha Thaisa Oliveira Projeto Gráfico: Cíntia Silva e Letícia Ferreira

Grafita Agência Experimental

Nesta edição, a equipe do Marco Zero traz até você uma série de reportagens muito interessantes. Você é a favor ou contra o voto obrigatório? Saiba mais sobre esse assunto, na reportagem especial, e que é alvo de discussão até o hoje. Outro destaque é o perfil da dama do teatro paranaense, a atriz Lala Schneider. Ela já realizou trabalhos na televisão e no cinema e hoje é considerada uma das cinco melhores atrizes do Brasil. E que tal pegar uma carona com Vânia Costa? Veja uma entrevista realizada com a motorista de ônibus de Curitiba, que conta um pouco de como é o seu dia-a-dia. Você costuma julgar as prostitutas? Profissionais do sexo contam os desafios da profissão e os motivos que as levaram a esse ramo.

Camila Toledo

O que você acha do Uber em Curitiba? Você utilizaria esse serviço? “Eu acho injusto, pois não pagam impostos ao Estado como os taxistas. Não é correto com Janete quem já está na Tavares, praça há muito recepcionista tempo. Então, eu não utilizaria esse serviço.”

Começando com a ridicularizarão e humilhação sofrida pela adolescente ao ter imagens do estupro divulgadas nas redes sociais. Como também os ataques recebidos na internet, culpando a adolescente pelo crime e até mesmo buscando coisas da vida da garota para justificar o crime. As pessoas estão indignadas e, com isso, movimentos estão sendo registrados em todo o Brasil contra a cultura do estupro. Em Curitiba, centenas de pessoas se reuniram na Praça Santos Andrade, no centro, no dia 22 do mês passado. No mesmo mês protestos também aconteceram em Porto Alegre, Londrina, Rio de Janeiro e Brasília. Todos foram em forma de protesto contra o abuso sexual contra a mulher. Afirmar que a cultura do estupro não existe e que tudo não passa de “mimimi” é de extrema ignorância. Dados, estatísticas e denúncias feitas todos os dias por mulheres são a principal prova da existência disso. O estupro contra uma mulher é um problema de todos, é um problema social e ignorar tal prática colabora para a normalização desse tipo de crime. Estupro é crime e não é culpa da vítima.

“Não acho correto, mesmo que tenha poucas diferenças entre o táxi e o Uber, porque eles não pagam Jair Oliveira, impostos, não motorista seguem as mesmas regras que os taxistas têm que seguir. Eu realmente não usaria.”

“Eu acho que é muito perigoso. Prefiro serviços mais seguros que me passem mais segurança Amanda Stall, e uma garantia maquiadora de retorno caso eu precise. Por esses motivos não optaria pelo Uber.”

“Não acho certo, pois não é bem estruturado como os táxis, que pagam sua licença. Eu David Stall, não utilizaria, metalúrigico não só pela falta de estrutura, mas também porque é perigoso.”

Uninter - Campus Tiradentes Rua Saldanha Marinho, 131 80410-150 |Centro- Curitiba PR E-mail comunicacaosocial@uninter.com

Telefones 2102-3377 e 2102-3380.

Gilcimar Santos, consultor de negócios

“Eu apoio, pois é mais alternativo e, desde que tudo seja certo, eu sou a favor. E sim, eu usaria esse serviço.”


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PERFIL

A primeira-dama do teatro paranaense Lala Schneider foi eleita uma das cinco melhores atrizes do Brasil, atuando em teatro, cinema e televisão, além de trabalhar como diretora e professora acervo pessoal

acervo pessoal

Camila Toledo

Letícia Oliveira

“Ela era uma escola ambulante. Respirava e transmitia arte, talento, brilho e principalmente defendendo sempre o comprometimento que a pessoa deve ter ao assumir uma profissão de artista, não esquecendo nunca das palavras trabalho, humildade e generosidade, isso traduz o grande brilho, carisma e talento de Lala Schneider.”, diz o atual diretor geral do Teatro Lala Schneider, antigo aluno e grande amigo da atriz, Rogério Bozza. No dia 23 de abril de 1926 nascia a eterna atriz Lala Schineider. O símbolo do teatro paranaense nasceu em Irati, e seu amor pelo Paraná a impediu de ir para outro lugar, escolhendo permanecer e viver em Curitiba. A atriz, que ficou conhecida como a primeira-dama do teatro no Paraná, começou no teatro amador na década de 1950, e com seu carisma e profissionalismo não demorou muito a se tornar uma grande referência nacional. Além do grande talento como atriz, Lala também trabalhou como diretora e professora de interpretação. Bozza comenta como Lala era exigente e rigorosa, mas como ensinava o amor pela arte, sem ser

Atuação em “Mistério de Curitiba”, 1989 agressiva ou ofender e humilhar. de Amor” (1990), “Felicidade” E cita uma das frases que a gran- (1991) e na minissérie “Tereza de professora de teatro e da vida Batista” (1992). A atriz também foi lhes dizia: “Antes de existir o ator uma das fundadoras do Teatro de existe o ser humano, que deve ser Comédia de Curitiba. respeitado e cada um tem seu ritCom talento e coragem, vimo próprio para se desenvolver”. veu do teatro a vida toda. Uma atriz que ousou e rompeu estereótipos do teatro paranaense, assim se tornando umas das meSua primeira peça foi “O Polhores atrizes do país. der do Amor”, no Teatro Sesi, onde Além de seu profissionalistrabalhou no setor administrativo mo, a atriz encantava a todos até se aposentar. Foram 52 anos de com sua generosidade, humildade e seu “espírito de criança”, carreira, com 99 peças, nove filme que divertia o ambiente de grae oito novelas como “Lua Cheia

Uma vida ao teatro

acervo pessoal

Rogério Bozza Diretor geral do Teatro Lala

bano Cayo Vieira, para um calendário de atrizes paranaenses destacadas, interpretando personagens femininas da dramaturgia mundial e do diretor João Luiz Fiani, que inaugurou seu teatro em Curitiba e o nomeou de F Teatro Lala Schneider. Foi no dia 28 de fevereiro de 2007, aos 80 anos, que a voz da atriz se calou, deixando um grande vazio na cultura paranaense e nos corações de seus fãs, mas a imagem da mulher guerreira e ativa permanecerá para sempre. acervo pessoal

Peça de teatro “Compra-se um marido”, diretor Waldemar Silva, 1952

“Ela era uma escola ambulante. Respirava e transmitia arte, talento, brilho e principalmente defendendo sempre o comprometimento que a pessoa deve ter ao assumir uma profissão de artista...”

vação. O amor que Lala sentia pelo teatro era visível em cada encenação e em pequenos detalhes, como gestos e expressões faciais. A atriz construiu sua história no teatro e deixou uma grande marca de sua passagem. Foi homenageada inúmeras vezes, dentre elas com a Medalha Comemorativa dos 50 anos do Guairinha, que é uma homenagem para artistas e personalidades que fizeram história no teatro paranaense, e na exposição “Heroínas”, do fotógrafo curiti-

“O exercício”, encenado no ano de 1977


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EDUCAÇÃO

Cotas para negros ainda causam polêmica Defensores acreditam que a medida é uma maneira de saldar uma dívida social

de Souza

Em meados do século XX, era muito comum nos Estados Unidos práticas racistas contra os negros. Em meio à discriminação, nascia o Partido Pantera Negra, criado por Huey Newton e Bobby Seale, na cidade de Oakland, na Califórnia. O partido tinha como objetivo patrulhar os guetos negros para proteger os moradores da violência da polícia. Os Panteras Negras propunham que todos os negros deveriam ter armas, pois eram submetidos a atos de violência e brutalidade policial constantemente. Também deveriam ser isentos do pagamento de impostos para um país “branco”. Outra ideia defendida pelo partido é que os negros deveriam ser indenizados por conta da exploração sofrida por séculos, desde tempos da escravidão. Com o passar dos anos, os Panteras Negras conseguram projeção nacional. Eram realizadas ações assistenciais, como por exemplo a criação de escolas comunitárias, distribuição de alimentação e a criação de centros médicos para atender a comunidade negra no país.. Ao longo do tempo em muitos países onde houve escravidão ou algum tipo de discriminação contra os negros, há tentativas de “pagamentos de dívidas históricas” e as cotas para negros ingressarem em uma Universidade tem sido uma delas. Tal medida vem sendo aplicada em diferentes países desde 1960 a fim de diminuir as desigualdades socioeconômicas inter-raciais. No Brasil, as cotas raciais foram criadas nos anos 2000 e, segundo dados do IBGE, o percentual de negros no ensino superior passou de 10,2% no ano de 2001 para 35,8% no ano de 2011. De acordo com o site G1, de 59 universidades federais do país, 25 têm algum tipo de cota racial para estudantes negros, pardos e/ou índios. Isso corresponde a 42,3% do total das instituições. A primeira instituição de ensino a implementar as cotas raciais em vestibulares foi a Universidade de Brasília, em 2004. Quando implantou tal sistema a UNB se valia de

“As cotas não são esmolas”

Foto: Maria Laura

Ana Elize

uma comissão para avaliar o fenótipo de cada candidato por uma fotografia, determinando quem era branco ou negro. A Universidade Federal do Paraná reserva 20% das vagas para estudantes que possuam traços fenotípicos que os caracterizem como negros ou pardos. A estudante de Jornalismo, Letícia de Campos Costa, se diz a favor de Cotas para pessoas negras na Universidade. Em sua opinião, toda a polemica em torno desse assunto é devido a falta de conhecimento histórico, e o preconceito que ainda existe no país. Ela ainda comenta que as cotas raciais é uma forma de integrar as pessoas na sociedade. Diz que “a discriminação vem de pessoas de mente pequena. Gosto de acreditar que elas são minoria e que com o passar do tempo os negros ocuparão cada vez maiores cargos. A integração só vai aumentar”. Dados do MEC referentes a Apesar das cotas, os lunos negros ainda são minoria nas universidades brasileiras 2014 informam que os negros são maioria nos financiamentos do Fies (50,07%) e nas bolsas do Prouni (52,10%). Pesquisas do MEC refeA socióloga Regina Reinert reproduzido, muitas vezes, até fato de que as cotas, ao serem rentes ao ano de 2014 informam que fala, em entrevista ao jornal inconscientemente. A sociedade ações afirmativas corroborariam os negros são maioria nas bolsas do Marco Zero sobre a importan- brasileira é inegavelmente ra- para diminuir o preconceito e Prouni (52,10%) e financiamentos cia das cotas raciais nas uni- cista e a democracia racial é um o distanciamento do negro aos do Fies (50,07%). versidades brasileiras. Segundo mito. Einstein dizia que é mais postos chaves na sociedade, O estudante Elias Damon se diz ela, a sociedade tem uma dívida fácil desintegrar um átomo que tanto profissional quanto indicontra o sistema de cotas pois na vidualmente. Acabaria, também, histórica para com os negros e um preconceito. opnião dele “todos têm a mesma com o ciclo vicioso da não eno sistema visa reparar o quanto capacidade de pensar e raciocinar, Qual é a sua opinião sobre Cotrada do negro em cursos consiantes essa situação. não é só a escola, os professores e o tas raciais? (Não só de pessoas ambiente que faz uma pessoa, é ne- Muitos argumentos a favor negras, mas também para ín- derados de prestígio que seriam ocupados por negros melhores cessário a pessoa querer ser um bom das cotas raciais alegam que dios). classificados. Até porque, ao aluno, mesmo tendo dificuldades, elas são necessárias por quesEm primeiro lugar tem que contrário do que muitos pensam, basta se dedicar mais - em qualquer tão de dívida histórica com os ficar bem claro que cotas não os negros prestam, sim, vestibuárea da vida - , não adianta estar na negros. Esse argumento é vásão esmolas, são medidas utili- lar. Fora o fato de que as cotas melhor escola com os melhores pro- lido? zadas pelos governos em época são constitucionais e, por isso, é fessores, morar no melhor bairro, na Sim, plenamente. Após 300 de grande desiquilíbrio social. obrigação do Estado fazer com melhor cidade, no melhor estado, no anos de escravidão servindo à Nenhuma cota deve ser vista que a Constituição seja cummelhor país, e não querer estudar, se um sistema econômico a popucomo intenção de ferir direi- prida. (art. 3º da CF). Os pondedicar ao máximo.” lação negra simplesmente foi tos, muito pelo contrário, todas tos negativos, ao meu ver não largada à margem da sociedade, têm caráter de justiça social, de existem. Existem aqueles que Gosto de acreditar sem que nenhuma política públi- igualdade jurídica. A partir des- apontam serem as cotas motivo ca o integrasse na sua liberdade. se ponto, entendo que quem é de racismo e discriminação mas, que com o passar A integração do negro só se deu contra só pode ser oriundo das não, dizer que o negro será disno sistema de trabalho enquanto classes mais abastadas e não criminado pelo sistema de cotas do tempo os escravo, enquanto força de tra- conscientizadas que se acostu- é uma falácia: o negro já é disnegros ocuparão balho gratuita. Esse erro social, maram com o privilégio de ter criminado, com ou sem cotas. cada vez maiores moral e jurídico deve ser repara- universidade só para seus pares Para você, as cotas raciais dedo o quanto antes. e, portanto, negam qualquer alcargos. vem ser uma medida paliativa teração no status quo. Isto posLeticia Costa As cotas ainda são um as- to, quero deixar bem claro que ou permanente? As cotas são medidas paliasunto polêmico hoje em dia. quem levanta bandeira contra as Para você que fatores corrobo- cotas sociais, quaisquer que se- tivas. Nenhuma delas tem caram para que isto ainda jam, deveria antes, levantar ban- ráter permanente. São políticas ocorra? deira contra a brutal desigualda- públicas de médio prazo até que se garanta que as futuras geraA ignorância advinda do de social desse país. ções negras tenham um outro desconhecimento histórico que também fundamenta a mente Se você pudesse elencar pontos patamar para começar a disputa desprovida de consciência críti- positivos e negativos das cotas social no mercado de trabalho. Até lá não estamos credenciados ca. O preconceito nunca é auto- raciais quais seriam? Os pontos positivos estão no a falar em mérito. -pensado, antes, é assimilado e


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ESPECIAL

O direito de votar em

Em virtude de 2016 ser um ano eleitoral, o Marco Zero publica, a partir desta edição, uma série de m

AS ELEIÇÕES E A MÍDIA

Laura Weiss

Rhodrigo Deda

O voto é obrigatório e secreto desde a Constituição de 1934, que estabeleceu diversas mudanças políticas

mentação de uma reforma política, ou pelo menos, a tentativa dela. Há um consenso internacional na literatura, nos meios políticos e na própria mídia de que o Brasil é uma democracia, apesar de não haver um conceito único e definitivo de que ela seja. Temos graus elevados de liberdade de expressão e organização, essa atual situação é resultado de uma série de acontecimentos na história de nosso país. Segundo o mestre em ciência política e professor do Centro UniverLaura Weiss

Quando falamos em voto fica difícil não trazermos à luz das discussões o período eleitoral. O acesso aos resultados e as informações sobre o período das eleições fica por conta da mídia que faz a cobertura. Mas afinal de contas, a cobertura jornalística pode influenciar nos resultados de uma eleição? O ano 1989, por exemplo, foi palco de uma reviravolta nas eleições quando a TV Globo realizou a transmissão do debate entre Fernando Collor de Melo e Luiz Inácio Lula da Silva, que resultou numa virada do resultado daquela eleição. Esse fato é usado até os dias de hoje para discutir o papel da mídia. O jornalista e advogado Rhodrigo Deda acredita que a imprensa é livre na transmissão das eleições e atribui a dificuldade dos meios de comunicação em fazer com que as pessoas gostem das pautas trabalhadas pelos jornalistas e que discutam sobre o assunto. “Hoje, o que a gente vê é um debate muito raso nas redes sociais, as pessoas não leem notícia, leem praticamente títulos e gravatas das notícias e saem disparando impropriedades contra as outras pessoas”, destaca Deda. Além da mídia, as pesquisas de opinião também são responsáveis por contribuir com as escolhas do eleitorado e com a própria mídia na divulgação de informações.

Laura Weiss

Laura Weiss

Com uma democracia recente, a reforma política no Brasil é um assunto permanente que gera debates e a obrigatoriedade do voto é uma das pautas discutidas. Em junho de 2015, 311 deputados federais rejeitaram proposta apresentada na Câmara para tornar o voto facultativo, enquanto 134 se colocaram a favor. Quase um ano antes do tema ser proposto, em maio de 2014, pesquisa realizada pelo Datafolha para saber o posicionamento do eleitor em relação às eleições mostrou que 57% da população entre 18 e 70 anos disseram que não votariam caso o ato fosse opcional, maior porcentagem desde 1989, quando foi realizada a primeira consulta pelo instituto. A dificuldade em debater sobre política muitas vezes se torna grande, pois a maior parte dos termos e expressões utilizados nesta área não são esclarecidos para a população. Até agora, no pequeno trecho deste texto, já foram utilizadas expressões como reforma política e voto facultativo, mas você sabe o que significa cada um deles? Ao buscar uma “tradução“ simplificada de reforma política se descobre que ela é nada mais que um conjunto de propostas de emendas constitucionais da legislação eleitoral, com o objetivo de melhorar o sistema de eleições em nosso país. Mas será que o significado do termo para por aí? Doutor em sociologia política, o professor da Universidade Federal do Paraná, Rodrigo Horochovski, conta que o objetivo desse tipo de reforma é justamente as mudanças, para alterar de maneira considerável como se organizam as eleições e como os votos se tornam mandatos. Quem propõe uma reforma em geral está descontente com o sistema e acredita que mudanças podem corrigir os aspectos que considera negativo, explica. O voto facultativo, ou seja, o eleitor votar apenas se optar por isso, se encaixa dentro de uma das mudanças que podem ocorrer dentro de uma reforma política. Atualmente, ir às urnas é obrigatório no Brasil. Todos os cidadãos de 18 a 70 anos devem ser cadastrados com o título de eleitor, escolher seus candidatos e comparecer no dia da eleição para votar. Mas, se a situação se tornar descontente aos brasileiros, pode ser exigida a imple-

Pedro Medeiros: “Obrigatoriedade do voto serviu para popularizar minimamente a experiência democrática brasileira”

sitário Uninter, Pedro Medeiros, a de votar faz parte da vida política do transição democrática brasileira foi cidadão, mas por que existem pesbastante peculiar. De 1974 a 1989, soas que se pudessem optariam por foram 15 anos de mudanças e fatos não fazê-lo? Uma das conclusões a que contam desde a Lei da Anistia, que se pode chegar é que a não obrireformulação do sistema partidá- gatoriedade desejada se trata da fuga rio e as eleições diretas, chegando ao autoritarismo do regime eleitoral. na política que conhecemos hoje. Todavia as consequênApós os anos 1990 houve a conso- cias da não obrigatoriedade do voto lidação das instituições democráti- ainda preocupam. O Congresso cas, “permitinNacional é o do a troca de “Outra possibilidade, órgão institupartidos no po- embora remota, é a de cional capaz der e até mesde tomar essa mo a eleição a questão ser resolvida medida por de presidentes pela via judicial, com meio de aprode esquerda, de uma algum ator legitimado vação sem qualquer reforma. Por ameaça à insti- apresentando uma não se tratar tucionalidade. Ação Direta de de algo tão Esperamos que simples é que assim continue Inconstitucionalidade os debates até 2018”, res- (ADI) para o Supremo se estendem. salva Medeinão Tribunal Federal (STF)” Embora ros. acredite que O voto fa- - Rodrigo Horochovski o voto faculcultativo tem tativo seja a sido discutido tanto no Congresso melhor saída, Horochovski apreNacional quanto pela opinião pú- senta uma outra mudança que pode blica. Os argumentos favoráveis e ser feita para que o voto deixe de ser contrários são vários, contudo, o obrigatório. “Outra possibilidade, enfoque que todos esses argumen- embora remota, é o de a questão ser tos parecem dar giros em torno da resolvida pela via judicial, com alconstrução política do país, especi- gum ator legitimado apresentando ficamente das pessoas. O exercício uma Ação Direta de Inconstitucio-


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m debate

O QUE ACHAM OS CURITIBANOS?

matérias sobre temas políticos de interesse da sociedade

Laura Weiss

“Resolver a questão judicialmente”. Possibilidade encontrada por Rodrigo Horochovski para o voto facultativo.

ral em relação ao período imperial, tornando a política definitivamente um jogo das elites e para as elites. Nesse sentido, a instituição da obrigatoriedade do voto (a partir de 1932) serviu para popularizar minimamente a experiência democrática brasileira”, explica Medeiros. Uma das preocupações hoje, quanto a esse tipo de possibilidade, é justamente a centralização do poder de voto às elites, mais uma vez. O sistema eleitoral vigente no pais, atualmente, assegura que os votos sejam livres, ou seja, cada cidadão tem o direito de ir até as urnas sem imposições que restrinjam aos mais providos de educação o voto, embora a ida até o local de votação em dias e hora marcados seja considerado uma obrigação. Há um consenso sobre a faculdade do voto como uma das saídas para “boicotar” ou protestar contra o sistema político do país. Mas, afinal de contas, quais seriam as vantagens e desvantagens? O quadro abaixo representa os principais argumentos favoráveis à sua obrigatoriedade e faculdade de acordo com a Consultoria Legislativa do Senado Federal. Ainda de acordo com Horochovski, o voto facultativo seria uma forma de dar maior liberdade às pessoas e o meio pelo qual supostamente o eleitor teria o perfil de uma pessoa mais informada, apesar de reconhecer que esta informação dificilmente conseguiria aprovação. Sobre o risco que se corre, Horochovski argumenta que abdicar da participação expressa no voto, ainda que mínima, é reduzir o poder de pressão sobre os políticos e suas deci-

Laura Weiss

nalidade (ADI) para o Supremo Tribunal Federal (STF) e os ministros acatando algo nesse sentido, mas acho difícil de acontecer”, argumenta o professor. Além da construção de uma sociedade política que pode ser deixada de lado com o voto facultativo, a abstenção eleitoral também vem à luz dos argumentos. No cenário político, essa privação diz respeito à negação das escolhas políticas, ou seja, as pessoas se recusam a votar, tornando-se passivas quanto à contribuição política. Esse tipo de comportamento eleitoral descreve o nascimento do Brasil republicano. Na época, a ideia era melhorar a qualidade do voto ao instaurá-lo como facultativo e a necessidade de escolarização para o alistamento eleitoral. Sobre essa medida, Pedro Medeiros discute que houve uma importante mudança a partir desse período. “O efeito foi o de diminuir drasticamente a participação eleito-

Marcos Souza. “Multa para quem falta às eleições é de até 10% do salário mínimo”.

sões. Além dos argumentos já apresentados, uma possível participação facultativa do eleitorado resultaria, na visão de alguns especialistas, o declínio no percentual de votantes a cada eleição. Segundo o artigo 14, parágrafo 1º da Constituição Federal de 1988, o alistamento eleitoral e o voto são obrigatórios para brasileiros maiores de dezoito anos, e facultativos apenas para analfabetos, maiores de setenta anos e os jovens maiores de dezesseis, mas menores de dezoito anos. De acordo com o advogado Marcos Souza, professor de Direito da Uninter, existem algumas punições quanto à negação do exercício do voto previstas por lei, inclusive financeira. “A multa pelo Código Eleitoral é de até 10 % do salário mínimo”, ressalta Souza. O especialista ainda ressalta que o eleitor que não vota, mas se justifica em um prazo de até trinta dias, estará cumprido com a legalidade. Passado esse pra-

Obrigatório

Facultativo

a) o voto é um poder-dever; b) a maioria dos eleitores participa do processo eleitoral; c) o exercício do voto é fator de educação política do eleitor; d) o atual estágio da democracia brasileira ainda não permite a adoção do voto facultativo; e) a tradição brasileira e latino-americana é pelo voto obrigatório; f) a obrigatoriedade do voto não constitui ônus para o País, e o constrangimento ao eleitor é mínimo

a) o voto é um direito e não um dever; b) o voto facultativo é adotado por todos os países desenvolvidos e de tradição democrática; c) o voto facultativo melhora a qualidade do pleito eleitoral d) a participação eleitoral da maioria em virtude do voto obrigatório é um mito; e) é ilusão acreditar que o voto obrigatório possa gerar cidadãos politicamente evoluídos; f) o atual estágio político brasileiro não é propício ao voto facultativo;

Principais argumentos utilizados para defender o voto obrigatório e o voto facultativo

A capital paranaense é considerada por muitas pessoas como uma cidade-teste. Em que sentido? Os curitibanos diversas vezes são escolhidos para receber em primeira mão os lançamentos e produtos de diferentes marcas. Isso acontece pelo nível de exigência existente aqui. É comum ouvir “se você quer lançar um produto o traga pra Curitiba, se fizer sucesso aqui, vai dar certo no resto do país”. Mas e no caso da política? Será que os curitibanos também são exigentes e críticos em relação ao voto facultativo? Para saber se o posicionamento é a favor ou contra, nada melhor do que perguntar a alguns cidadãos da cidade. Isabelle Bastos, 17 anos, estudante “Eu acho que se o voto não fosse obrigatório, talvez as pessoas não votassem sem pensar, porque infelizmente hoje a maioria das pessoas vota em qualquer candidato porque elas precisam votar em alguém, literalmente por obrigação. Acredito que o voto facultativo funcionaria como uma reflexão, só iria até as urnas quem realmente gosta e se interessa por política. Eu, por exemplo, gosto bastante, tanto que se tivesse uma eleição hoje, eu iria votar, mesmo o voto sendo facultativo para a minha idade”. Roberto Martinho Leite, 61 anos, autônomo “Eu sou contra. O povo passa o dia, a semana, o ano e a vida reclamando dos políticos, dizendo que não sabe em quem votar, qual o melhor candidato a escolher, mas é nesses momentos e nessas discussões que o povo para pra pensar em política. Vocês acham que se o voto não fosse obrigatório as pessoas iriam pensar nesse assunto? Não iam. Assim, do jeito que está, elas são obrigadas a pensar”. Orlando Schnneider, 67 anos, alfaiate “Política é sempre um assunto complicado de se discutir. As pessoas não se interessam, não buscam, não estudam, e claro, isso acaba gerando um grupo de eleitores desmerecidos. Isso porque eles não merecem ter a oportunidade de votar e mudar o país. Como pensar em reforma política, se não começarmos pelo voto facultativo? Só deve votar quem quer votar, quem gosta e entende o que está fazendo”. Fernanda Scorsin Oliveira, 30 anos, vendedora “Eu acho que o voto facultativo seria uma boa ideia sim. Talvez desse jeito melhorasse a questão de políticos corruptos, pessoas com má intenções e disfarces bem feitos. Esses políticos são eleitos por pessoas que muitas vezes não tem capacidade, ou nunca tiveram oportunidade de estudar e compreender de verdade o que esses candidatos estão propondo, até quem estuda muitas vezes não entende, imagina quem não teve essas chances e precisa votar de qualquer jeito”. Adalton Sutil, 48 anos, professor “O voto facultativo acabaria tornando as eleições muito segmentadas. Votaria apenas quem teve instrução o suficiente para compreender o que realmente é eleger uma pessoa para tomar conta do nosso país. E se nós vivemos em uma democracia, todos devem ter o direito de votar”. zo, deve-se pagar multa de até 10% do valor do salário mínimo, que hoje corresponderia ao equivalente a mais ou menos R$ 70. Os eleitores que não votam, não justificam e ainda assim não pagam a multa estipulada sofrem punições maiores, tais como a perda do documento de título de eleitor e passaporte. Além disso, a pessoa não pode ter acesso a recursos como financiamento com a Caixa Econômica e de concursos públicos.

O MODELO INTERNACIONAL Os defensores do voto facultativo como instrumento de uma “real democracia” sustentam como um dos argumentos o modelo internacional de voto, ou seja, baseiam-se

no sistema político de outros países em que se tem por regra o voto facultativo. De acordo com informações divulgadas pelo Instituto Internacional para Democracia e Assistência Eleitoral (Idea), votar é obrigatório em 31 países, como é o caso do Brasil. Ainda de acordo com a instituição, o número de votos brancos e nulos em países que o tornam obrigatório é maior. Nos EUA, por exemplo, além do sistema facultativo vigente, o modelo baseado no bipartidarismo explica o sucesso político para a participação das pessoas nos dias de eleição. Esse modelo não se aplicaria aqui no Brasil de acordo com Medeiros. “Um sistema baseado na alternância entre dois partidos ‘achataria’, diminuiria a legitimidade do sistema político como um todo”, conclui o professor.


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CIDADE

Uma viagem na companhia

Apesar da grande minoria de mulheres na direção é possível encontrar aquelas que se preocupam c Diego Gangas

O ônibus se aproxima do ponto, para, abre as portas, e as pessoas que formavam uma pequena fila começam a entrar. Depois que a última entra, me aproximo da porta e digo: Oi, Vânia, tudo bem? - Tudo! E você? Tudo bem. Posso te acompanhar na sua rotina de trabalho? - Pode, vamos. O encontro já havia sido combinado no dia anterior, quando Vânia terminava sua jornada de trabalho na praça Rui Barbosa, no centro de Curitiba, e se preparava para ir embora: Moça, você é motorista de ônibus? - Sou. Eu estou fazendo uma reportagem sobre mulheres que trabalham dirigindo ônibus, posso conversar com você sobre a sua profissão? - Pode, mas você vai ter que ir conversando comigo até aquele ponto porque eu tenho que pegar um ônibus que sai dez para a uma! Olho no relógio, e são vinte para a uma da tarde. Tudo bem. Você pode me dizer por que decidiu trabalhar como motorista de ônibus? - Porque é algo que me fascina! Amo carregar as pessoas e entregá-las com segurança... É praticamente impossível tirar uma boa história de alguém em apenas dez minutos, mas lá fui eu caminhando ao lado de Vânia Costa Pereira e tentando anotar suas

respostas em um bloco de papel. Caminhada que foi o suficiente para perceber o quanto aquela mulher era importante para sua profissão, e o quanto sua profissão era importante para ela. Sendo assim sugeri: Então posso acompanhar a sua rotina de trabalho amanhã, para conversar melhor com você? - Pode. Mas vem num horário bom, às 9h17 que é mais tranquilo. No dia seguinte, pouco antes das 9h17, sou o primeiro da fila no ponto quando o ônibus Fazendinha se aproxima, e a rotina de trabalho da motorista de 39 anos se refaz, dessa vez comigo, para conhecer como é para uma mulher ter uma profissão que ainda pode ser vista como sendo masculina e que ainda é dominada pelos homens. De acordo com a URBS (Urbanização de Curitiba), empresa responsável pelo transporte público, Curitiba e região metropolitana têm atualmente 72 mulheres que trabalham como motorista no transporte coletivo, enquanto os homens somam 3.532. Vânia passa protetor solar no rosto e começa a responder minhas perguntas, não sem antes me avisar: - Aí quando você chegar no terminal tem que passar a catraca. Ou seja, o passeio ao lado da motorista não sairia de graça. Ontem você me falou sobre o seu prazer em dirigir, como é essa relação com os passageiros? - Ah! A gente gosta de poder ajudar, faz o melhor que a gente pode, não é Gení? Olho para trás e vejo a simpática cobradora, com sorriso tímido que balança a cabeça concordando com a colega. Divulgação

- Ela é minha cobradora, diz Vânia. Gení sai em vantagem nos números, em Curitiba e região, 1.636 mulheres trabalham como cobradora, enquanto os homens são 1.696, o que não diminui em nada o preconceito que ainda existe com as mulheres nestas funções. - Teve um caso com um passageiro. Ele deu com a mão, e quando viu que era uma mulher que estava dirigindo começou a fazer sinal que não queria mais entrar. Ou, caso de alguém que me disse: moça, tive que dar um “corte” no cidadão na fila, porque ele disse que não queria entrar no ônibus porque quem estava dirigindo era uma mulher. Sobre o preconceito por parte dos colegas de trabalho, a motorista conta que tem os que são muito gentis, mas outros acabam dificultando o serviço: - Tem motorista que não dá a passagem para você ultrapassar, te olha com indiferença... isso tem bastante. E você acha que isso acontece por quê? - Eu acho que eles pensam que a gente está ocupando o lugar deles. Um lugar que sempre foi deles. E se a gente está aqui é porque a gente conquistou isso. Nós conquistamos. Se nós temos os direitos nos dias atuais, é porque elas [as mulheres] lutaram e conseguiram. Curitiba teve sua primeira mulher motorista em 2005, já se vão dez anos da presença feminina nesta profissão. Enquanto me seguro no ferro do ônibus com uma mão e a outra tenho ocupada com o celular que grava a conversa, ouço atentamente a mulher que com seus óculos de sol encobre parte do rosto, mas que, com seu discurso, se mostra consciente e segura do papel da mulher e de seus direitos. - Se a gente olhar para trás e ver que antes a mulher não podia votar... não podia usar saia... De repente a conversa é interrompida por um senhor de chapéu panamá que entra no ônibus, estende o braço, e oferece uma bala à Vânia. - Obrigada! Esse é meu pas-

sageiro fiel, ele sempre vai com a - Você tem que vir para o lado, gente, comenta. para eu poder ver o espelho, soliE as cantadas existem? Per- cita. gunto eu. Olhar para o espelho é impor- Não! [responde enfática]. Não tante não apenas quando estamos é o meu caso, eu não dou bola, até ao volante no trânsito. Olhar para para não gerar comentário. A gen- o espelho é importante para não te que trabalha como motorista e esquecermos quem somos, no que até como cobradora é mal vista. Aí nos transformamos, e o que queretem quem mos ser. Viver olha como em socieda“Teve um caso com se a gente de pede isso, fosse dife- um passageiro. Ele deu que nos enrente. xerguemos, e com a mão, e quando Vânia que possamos fala com a viu que era uma mulher olhar o outro. convicção que estava dirigindo Diva Olie a expeveira, 82, apocomeçou a fazer sinal sentada, não riência de quem tra- que não queria mais está no Fabalha há entrar zendinha que quase oito Vânia conduz. anos diri- - Vânia Costa Pereira, Ela aguarda Motorista de ônibus gindo ônino ponto do bus. Está Vila Rosinha, prestes a completar quatro anos na praça Rui Barbosa. É uma tarem transporte coletivo pela Ex- de ensolarada, uma das últimas do presso Azul e outros quatro para inverno de 2015. a empresa Rimatur, além de mais Conversando com ela, pergunquatro como cobradora. to o que acha de uma mulher ser Um som de apito indica que motorista de ônibus. o ônibus vai entrar em funciona- Hipernomal, mulher pode famento e as portas se fecham. zer tudo que o homem faz, responPosso continuar aqui? Pergun- de com tranquilidade. to eu, na entrada da porta dianteira. - Eu entrei no Rosinha [ôni-


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Diego Gangas

de Vânia

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de ônibus coletivos, com seus passageiros Divulgação

bus], e era uma mulher que estava dirigindo, eu acho que elas são mais cuidadosas. Priscila Raposo, 21, recepcionista, também aguarda a mesma condução e encara o tema com naturalidade. - Pra mim é indiferente, é uma profissão como qualquer outra, só tem que ver se ganha o mesmo que o homem. Vânia é levada por desafios. Já dirigiu caminhão, fez a “escolinha”, nome dado ao curso preparatório para conduzir os coletivos de Curitiba e região, para ter o prazer e a realização de sentar, nem que fosse por uma semana, na cadeira de condutora. Voz firme, segurança nas palavras, equilibra com desenvoltura a atenção entre a conversa e o trânsito. Nós temos uma mulher presidente e cada vez mais as mulheres estão em diferentes profissões, como é para você essa conquista de espaço? - Ah, pra mim é um privilégio. Cada mulher que sobe um degrau não importando qual a profissão, é uma vitória pra todas. Sou a favor das mulheres em tudo, falo que eu fecho com elas em qualquer coisa que for diferente.

Passo a observar Vânia pelo retrovisor e ela prossegue: - É uma vitória, quantas mulheres não morreram para garantir os nossos direitos. Morreram na fábrica durante a revolução francesa... industrial... não lembro agora. Não tem problema não se lembrar em que momento da história o fato aconteceu. O que importa é saber e reconhecer quem lutou pela liberdade que temos hoje. Em 1857, em Nova Iorque, operárias de uma fábrica de tecido fizeram uma grande greve para reivindicar melhores condições como redução de 16 para dez horas de trabalho e melhores salários como os dos homens. Para reprimir os protestos as operárias foram trancadas no local de trabalho e incendiadas. Marlene Ferreira, 40, há três anos trabalha como motorista e também teve sua trajetória iniciada como cobradora. Faz a linha Independência/CIC, entre o terminal Fazendinha e a Cidade Industrial de Curitiba. É daquelas pessoas que conversa estampando um sorriso no rosto. Um sorriso heroico. Marlene mora na Fazenda Rio Grande, região metropolitana da capital paranaense. Sai às 3h20 da madrugada, para começar a jorna- Motorista Vânia Costa Pereira em frente ao ônibus Fazendinha da às 4h57 e seguir até 12h50. De respostas curtas, ela dispara todos desçam de igual maneira. Sua preocupação e atenção é alegremente às minhas perguntas: Tem com a colega Gení uma congeral. Por que dirigir ônibus? fiança que nem sempre se encontra - Quando entra uma mulher - Sempre gostei de dirigir. em outras duplas de condutores e com criança de colo eu espero ela E o que você mais gosta? cobradores. Gení é considerada a sentar. Se ninguém der lugar eu - De conhecer novas pessoas. amiga, a irmã menor. pergunto: Gení, tem lugar pra ela Indagada sobre as situações de Quando a gente fecha a porsentar? Se ela não sentar eu não preconceito: ta, fecha no sinal deles [cobrador]. “puxo” o carro. Se pra você com - Hoje mesmo aconteceu. Não Quando ela [Gení] dá o sinal pra a mochila já é difícil se segurar, estava no ponto e um cara queria mim, eu nem imagina uma mulher com criança que eu parasse. Me xingou “Porque é algo que me olho, fecho ou bebê. na fé. Agora A prova dos nove acontece e, de tudo quanfascina! Amo carregar tem cobrador eis que surge uma senhora idosa. to é nome! que quando Vânia pergunta: E o que as pessoas e entregádá o sinal, - Tem lugar pra ela Gení? precisa para las com segurança...” tem que olhar A colega responde que sim. ser motorisno espelho, Qual seu sentimento com todas - Vânia Costa Pereira, ta? confirmar. essas pessoas que você transporta - Precisa Motorista de ônibus A cada todos os dias? ser corajosa! parada me encolho para que os - Um rapaz da empresa disse Eu tenho 1,55m de altura, imagina passageiros tenham espaço e pasuma coisa: o médico estuda cinco tomar conta de um ônibus desse sem a roleta. anos para cuidar de uma vida, e a tamanho!? Deixa sua mochila ali, diz gente, quantas vidas não carrega? Preocupada com os passageiros, Vânia espera que o idoso entre Vânia para mim, indicando a parte Imagina o tamanho da responsabicom segurança no coletivo e que da frente do veículo. lidade.

A personalidade e o envolvimento da motorista com o que faz me deixa pensando em quem é Vânia além da condutora que se mostra cordial. Mãe de um jovem de 21 anos que também caminha para ser condutor, a moradora de Campo Largo, não tem e não dirige carro, quem dirige é o namorado. A paixão está mesmo nos veículos grandes, o cuidado está nas pequenas coisas, na cordialidade, na atenção que o próximo precisa na rotina diária. O ônibus chega ao seu destino, o terminal do Fazendinha. Pego minha mochila, agradeço a Vânia e Gení, pago minha passagem. Sou o último a descer. As portas do ônibus se fecham. E o sentimento que fica é de que as portas das oportunidades se abram para mais Vânias e mais Genis.


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CULTURA

Curitiba volta a respirar pura poesia

Feira do Poeta completa 35 anos e continua sendo palco de grandes eventos não confiava no seu potencial. “Quando você começa a escrever, você não acredita naquilo Jesus que está escrevendo.”, conta. Até que um dia conheceu um crítico de poesia e pediu-lhe que Bruna avaliasse seu trabalho. “Falou: Cabreira Nossa por que você não tá fazendo uma performance no TUC “Ela estava estatelada so- (Teatro Universitário de Curitibre o piso. O sapato de salto ba)? Você tem todo um tipo de alto a um metro de distância. poeta”, conta Luiz. Não é somente escritores paraDas pernas abertas, encobertas pela renda preta, escorria um fi- naenses que veem a Feira do Poeta lete de sangue. A mulher estava como um local de referência para menstruada ou alguém já havia a literatura. Segundo Brizola, vem autores de outros estados lançaabusado do corpo morto?” O texto intitulado “Calça- rem livros no espaço. “Temos uma da na Chuva”, de Regina Célia arma poderosa chamada FaceBostulim, chama atenção dos book. Esse facebook pega o Brasil visitantes e frequentadores da inteiro.”, afirma Luiz. O número Feira do Poeta, pela riqueza de de visitantes é em média de 900 suas palavras. Ele foi impresso e pessoas, com uma grande maioria colado em uma das antigas má- que visita o local aos domingos, quinas tipográficas doadas pela pois há lançamento de obras e Fundepar em 1982. O primeiro outros eventos. Os valores variam livro publicado através desse entre 20 e 50 reais. A maioria desses livros, era método de impressão foi Fruta Essência, de João Roberto Alca- produzida no próprio espaço, onde se localiza a feira, através rá, na década de 80. A Feira do Poeta, localizada de máquinas tipográficas, doano Largo da Ordem, completou das há alguns anos, manuseadas pelos mesmos. 35 anos e é Antigamente, a referência na ferramenta de iminfluência da Foi uma mistura pressão era utililiteratura pa- de poetas antigos zada somente aos ranaense. Tordomingos, quando nou-se ponto com os novos era transportada de encontro na Luiz Carlos Brizola para o Largo da cidade, pois Ordem. serve como Geraldo Magela afirma que inspiração e incentivo aos poetas novatos e veteranos. O local, atualmente as máquinas tipográque hoje ainda abriga algumas ficas não estão sendo usadas pela de suas obras literárias produzi- falta de um profissional capacitadas ali mesmo, já foi e ainda é do para manuseá-las. “Falta tipópalco de grandes eventos e pro- grafo, mas elas funcionam”, diz Magela. duções artísticas. Aos poucos a feira foi morrendo, Após a reabertura da Feira do Poeta, os grandes nomes da resultando em seu fechamento no ano literatura paranaense continuam de 2006. A reabertura aconteceu em sendo frequentadores ativos do 29/03/2015. Mas, para reassumirem o local, como Regina Bostulim e endereço atual da feira, foi necessário Luis Ronconi . “Foi uma mistu- que Marcos Cordiolli, presidente da ra de poetas antigos com os no- Fundação Cultural, falasse com o vos”, relata Luiz Carlos Brizola. chefe da Guarda Municipal, pois o Um desses veteranos é Geraldo local estava servindo como ponto Magela, que hoje coordena jun- estratégico para os mesmos. E detamente com Brizola a adminis- pois disso renasceu a Feira do Poeta, trazendo-a de volta como um cartão tração do espaço. Luiz Carlos Brizola, antes postal da cultura em nossa cidade. de trabalhar na Feira do Poeta, tinha outro cargo na Fundação Cultural. “Até que um dia um cara passou, chefe da Fundação A Feira do Poeta funciona de Cultural, e me viu chorando. O terça a sexta, das 9h às 17h30, e que tá chorando aí Brizola? Ah conta com um programa espeé que eu não aguento mais tá cial na rádio CBN,transmitido aqui cara, parado”, afirma Briem dois domingos por mês. A zola. Foi transferido para outro feira leva três poetas para falar setor, assim se envolvendo no sobre seus repertórios. meio. Começou a escrever mas

Serviço

Foto:Jeniffer Jesus

Jeniffer

O veterano Luiz Carlos Brizola, um dos fundadores e coordenadores da Feira do Poeta.

Ilustração:Freepik

Antigos locais usados pela Feira do Poeta até a reabertura

Outros projetos que deram certo Na área da literatura, a Fundação Cultural conta também com o Sarau Popular, criada por Marcos Cordiolli. Ela é realizada aos sábados, na qual há visitas em comunidades carentes, para apresentação de poetas, juntamente com cantores, contador de histórias, tocador de viola e outras apresentações culturais. Outros projetos criados são: Cutucando Inspiração e Escritibas na Rua. Cada um desses projetos conta com o apoio da coordenação da Feira do Poeta,que auxilia na divulgação e organização desses encontros, e convida todos esses artistas a participarem e deixarem sua marca na história da cultura de Curitiba.

Poesia e ousadia no rolo de papel higiênico O veterano Geraldo Magela, que é poeta e escritor, na década de 80 inovou com uma ideia totalmente fora do contexto, quando decidiu publicar suas poesias em rolos de papel higiênico, gerando assim um grande sucesso e alvoroço entre o meio literário da capital. Foram ao todo 500 rolos de papel impressos manualmente em máquinas de tipografia, compreendendo 10 metros de papel , e que levaram aproximadamentre seis meses para ficarem prontos e disponíveis para quem se interessasse em curtir a produção criativa de Geraldo Magela. Ele desenrolava o rolo para poder escrever, confirme explicou. “Esticava e depois enrolava de novo”, conta o autor. “Ficou famoso, foi para os Estados Unidos e Espanha. Roubaram minha ideia na Espanha”, afirma Magela. Cada rolo de poesia em papel higiênico era comercializado por um valor que na época era bem considerável, cerca de 300 mil cruzeiros, número esse que hoje equivale a mais ou menos R$ 109 reais.


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RESENHA O FADO ENCANTADO DE PORTUGAL

@TÁ NA WEB Divulgação

Thaisa Oliveira

Hitler nos dias de hoje

Saúde com Drauzio Varella Divulgação

Muito conhecido por suas aparições no programa Fantástico, na Rede Globo, poucas pessoas sabem que o médico e escritor Drauzio Varella tem um site com todo tipo de informação sobre saúde e bem-estar . Além de muitas dicas, Drauzio consegue explicar de forma clara, objetiva e sucinta o funcionamento do corpo humano e como algumas doenças agem. O site contém matérias sobre doenças e sintomas, partes do corpo humano e como funcionam, entrevistas em vídeo e um editorial específico para cada tipo de público: Mulher, Homem, Criança, Envelhecimento, Sexualidade e Planos de Saúde. Confira no site: http://drauziovarella.com.br/

URBS ItiBus 3 Perdeu o horário do seu ônibus? Quer saber o saldo e o histórico do seu cartão transporte? Precisa comparar rotas de ônibus ou saber quais ônibus passam em uma região? Acesse o site criado pela URBS e você terá todas essas informações. O ItiBus 3 proporciona itinerários de praticamente todas as linhas de Curitiba e algumas de região metropolitana, além de ter acesso à todas as informações sobre o seu cartão transporte e ver a localização atual do seu ônibus e onde ele para ao longo do trajeto. Confira em: http://www.urbs.curitiba.pr.gov. br/mobile/itibus

Luiz Eduardo

dos por mim. Sonhei que te contava esta hisVirgília tória de amor entre um príncipe e Serra uma plebeia do século XIV durante o final do feudalismo português, e antes da expulsão dos mouros e Acordei à meia noite, a sonhar das Grandes Navegações. Amor contigo, caro colega, e neste desva- proibido e o enterro de Inês viva rio, sonhei que estava a contar-te o declarado pelo Rei de Portugal, D. Romeu e Julieta português: D. Pe- Afonso IV, e pai do jovem e apaidro I de Portugal e Inês de Castro, o xonadíssimo Pedro. Inês morre coberta por terras sábias de São José fado encantado de Portugal. Li esta história há tanto tempo, dos Matosinhos, a lamentar a perda que já vai completar a maioridade de seu grande amor. Pedro, por sua da sua existência em meu imaginá- vez, fez que a dona do seu coração rio de indiazinha tupiniquim. Fado apaixonado e galante fosse coroada sua rainha posencantado que tumamente e pelo fora contado em Sonhei que te seu devotado amor. versos por poetas contava esta O jovem Rei pormuito melhores do tuguês, jamais esque eu: Camões, história de amor Bocage e Ante- entre um príncipe queceu o seu amor e faleceu, permaro de Quental, só necendo viúva a para te deixar a e uma plebeia cuidar de seu reino salivar e interes- do século XIV feudal e à espera sado na história durante o final das saudosas caque vou lhe conrícias de sua amatar. Meu primeiro do feudalismo da Inês. E, muitos contato com este português, e anos depois, a sua fado fora nas aulas de uma professora antes da expulsão Inês o recebeu de braços abertos na de literatura portu- dos mouros e cripta do mosteiguesa, lá nos meus ro de Alcobaça, na tempos revolucio- das Grandes mesma cidade em nários e reacioná- Navegações. que fora enterrado rios na centenária Universidade. Tempos multidisci- pelo seu sogro, D. Afonso IV. Local plinares fora da sala de aula e mui- onde ambos são lembrados e visitato chatos dentro dela. Tenho certe- dos nos tempos republicanos lusos za de que aprendi mais convivendo de hoje em dia. Assim espero caro colega, ter com colegas de outras graduações do que ouvindo abobrinhas no anfi- elucidado nestas primeiras horas teatro. Este foi o único contato aca- do Dia de Reis, as suas dúvidas e dêmico que tive com o escrever de o porquê que considero este fato da além-mar: no restante, ando meio história portuguesa o Romeu e Juautodidata e por indicações amigas; lieta real que percorreu os tempos sendo que já li Florbela Espanca, até chegar a esta noite, em que soFernando Pessoa e José Saramago, nhei que te contava esta linda histópara citar alguns dos mais idolatra- ria de amor.

Divulgação

O Romeu e Julieta português: D. Pedro I de Portugal e Inês de Castro

Já imaginou como seria se Hitler aparecesse em pleno século XXI? O que ele pensaria da tecnologia dos dias de hoje, da era da internet e dos selfies? Como as pessoas reagiriam ao encontrá-lo hoje em dia? Trarariam ele mal pelos crimes que cometeu? Denunciariam e o levariam para a prisão ou seria tratado como uma celebridade? É o que o filme Ele está de volta buscou retratar. Ao caracterizar o ator Oliver Masucci como Adolf Hitler e gravar cenas escondidas do ator andando pela cidade como tal, Oliver ficou estarrecido ao ver que a população o tratava com muita simpatia. Você pode checar tudo isso em diversos sites que divulgam filmes online.


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ENSAIO FOTOGRÁFICO

Um cantinho japonês ao sol Bruno Souza

Felipe Boiczuck

Pela lei da física, um lugar está longe ou está perto, sendo impossível acontecer as duas coisas ao mesmo tempo. Entretanto, o sol a quilômetros de distância da terra consegue unir dois lugares muito distantes e ao mesmo tempo deixá-los perto. Dois lugares com pessoas, culturas e história diferentes: a terra do sol nascente e Curitiba, onde “dos filhos deste solo és mãe gentil.”


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