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Endividamento bate recorde
Cartão de crédito é o principal vilão
Cada vez mais, famílias se endividam para manter itens básicos de consumo têm dificultado a vida daqueles que buscam quitar essas dívidas.
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Oendividamento das famílias bateu recorde em 2022, com parcela de 77,9% de famílias se declarando endividadas, de acordo com a pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) anual divulgada em janeiro de 2023 pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Esse levantamento não é o único a alertar sobre o número de inadimplentes no Brasil.
Segundo a pesquisa realizada pela Serasa Experian, cerca de 66,6 milhões de pessoas estavam em situação de inadimplência em julho de 2022. Além disso, o levantamento realizado pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) apontou que 39,71% (64,2 milhões de pessoas) dos brasileiros estavam negativados em setembro de 2022.
Nesse cenário, completa a receita para o endividamento um vilão já bastante conhecido, o cartão de crédito. O Banco Central divulgou levantamento que aponta que o cartão de crédito representa 30% das dívidas de pessoa física junto às instituições financeiras. O alto índice de endividamento atribuído aos cartões de crédito vem carregando uma nova denominação criada por especialistas da área, a creditocracia.
Segundo a economista e Doutora em Políticas Públicas Pollyanna Rodrigues, o fenômeno conhecido como creditocracia ocorre quando a população precisa pegar recursos emprestados para fazer frente às suas necessidades básicas.
Significa que a população perdeu poder de compra e não consegue comprar o mínimo para sua sobrevivência com o salário que possui. Deste modo, recorre a empréstimos e financiamentos.
O aumento do endividamento e da inadimplência para garantir as necessidades básicas se intensificou devido à queda do poder de compra da população ocasionado pelo aumento da inflação.
“Acredito que esse fenômeno deve ser olhado de perto, principalmente pelas políticas públicas. Se os preços estão subindo e os salários não estão acompanhando, a população precisa se endividar para fazer frente a necessidades básicas”, diz.
Na visão da especialista, a resolução de questões relacionados a crédito e ao endividamento da população são de responsabilidade do estado. A atuação do governo é de grande relevância para que não haja um desequilíbrio econômico.
“No Brasil, faltam mecanismos de educação financeira para a população. As pessoas não têm noção de matemática financeira básica, de como funciona a taxa de juros no Brasil, riscos do crédito”.
Além disso, ela destaca que é importante também disciplinar a oferta do crédito com o objetivo de evitar que parte da população agrave ainda mais sua situação financeira. que levam os consumidores a uma interpretação errada em relação ao crédito”, explica.
Tanto as instituições de financiamento públicas quanto as privadas podem atuar na renegociação das dívidas, de forma não abusiva, com taxas menores, e com valores que caibam dentro do orçamento.
Entre as razões para os altos números estão a crise política e econômica que perdura no Brasil há anos, juntamente com os problemas econômicos frutos da pandemia, que em todo o mundo
Pollyanna comenta que o endividamento em si não seria um problema de primeira magnitude, visto que quando compramos algo parcelado com o cartão de crédito, estamos nos tornando “endividados”. O real problema é quando não se consegue cumprir o compromisso com essa dívida, alcançando o caráter de inadimplente, o que leva à desestruturação da organização financeira.
“Quando digo isso, não quero dizer limitar, mas fiscalizar as ofertas de crédito abusivas
A perspectiva é que neste ano a economia apresente dificuldades. Como explica Pollyanna Rodrigues, se as famílias estão endividadas, elas terão dificuldade de comprar novos itens, inclusive, para a alimentação básica. “Com restrição de demanda, caso os produtores continuem a produzir normalmente, haverá excesso de oferta. Então, os produtores devem diminuir a produção, desacelerando a economia” alerta.
Filme escolhido para representar o Brasil, Marte Um ficou fora da disputa
Por mais um ano, o Brasil ficou de fora na corrida pelo Oscar. O filme Marte Um, de Gabriel Martins, foi o indicado brasileiro na tentativa de chegar ao prêmio mais cobiçado do cinema, mas não foi o escolhido. A Academia preferiu, como representante sulamericano, os vizinhos argentinos pelo filme Argentina, 1985.
Mesmo fora da lista do Oscar, a produção do cineasta mineiro teve grande repercussão em território nacional. Escolhido como melhor longa-metragem em 2022, pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine), Marte Um conta a história de uma família negra que vive na periferia de Contagem, Região Metropolitana de Belo Horizonte, após um presidente de extrema-direita ser eleito no país.
A não escolha do longa pela Academia não choca quem conhece o histórico do cinema brasileiro na premiação internacional. Desde sua primeira indicação em 1963, com O Pagador de Promessas, escrito e dirigido por Anselmo Duarte, o Brasil fez aparições diretas e indiretas no Oscar. Nos anos 90, o cinema nacional retornou ao prêmio após o filme de Duarte, e levou três indicações na categoria de melhor filme internacional com O Quatrilho, de Fábio Barreto (1996), O Que internacional. O filme que mesmo ante à polêmicas de bastidores, retrata vidas negras periféricas e explora a violência das comunidades, foi recebido com olhares diferentes antes e depois de fazer sucesso nos EUA. Como comenta o cineasta Aleques Eiterer, formado pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e mestrando na mesma área pelo Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina
É Isso, Companheiro?, de Bruno Barreto (1998), e Central do Brasil, de Walter Salles (1999).
Universidade de São Paulo (PROLAM-USP): “A questão Oscar não é tão importante quanto já foi, mas ainda acredito na benção do colonizador.”
As escolhas de indicações do Oscar são feitas pelo comitê da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, que de alguns anos para cá vêm passando por uma reformulação. Por muito tempo, a bancada do Oscar foi composta majoritariamente por homens brancos estadunidenses, isso claro, sempre teve influência direta nos filmes, diretores, atores e atrizes escolhidos.
O filme Aquarius (2016), dirigido por Kleber Mendonça Filho e estrelado por Sônia Braga, chegou a ser cogitado pela imprensa e crítica especializada, como um forte concorrente sulamericano para arrebatar uma estatueta do Oscar. Bem recebido
Um dos filmes brasileiros mais reconhecidos internacionalmente, Cidade de Deus (2002), de Fernando Meirelles, teve uma história conturbada envolvendo o Oscar. Mesmo após grande repercussão na América Latina, o longa não foi selecionado para nenhuma categoria em 2003, o que causou um grande rebuliço na época. No entanto, em uma situação incomum, a produção de Meirelles foi indicada no ano seguinte, 2004, quando emplacou nos Estados Unidos e na Europa. Cidade de Deus concorreu nas categorias melhor diretor, melhor roteiro adaptado, melhor edição e fotografia, mas acabou não superando os concorrentes.
O caso de Cidade de Deus gera reflexão quando falamos do Brasil no cenário cinematográfico também pela crítica internacional e vencedor do César 2017 — considerado o Oscar francês — , Aquarius não chegou nem a ser indicado pelo governo brasileiro para ser o representante do país. Veio à tona um período depois, que o filme nunca esteve elegível ao Oscar, por descaso de sua produtora norte-americana, que deixou de preencher os documentos de inscrição.
Movido por uma pressão externa e interna sobre a falta de representatividade, a Academia decidiu por uma reformulação em 2022, anunciando um novo quadro de membros composto por 683 pessoas. Segundo o Filme B, maior portal sobre o mercado de cinema no Brasil, dos novos membros, 41% são pessoas negras e 46%, mulheres. Além disso, foram adicionados uma lista de convidados de diferentes países. A lista conta com grandes nomes brasileiros, como o ator Selton Melo, a diretora Anna Muylaert e o diretor Alê Abreu, que já concorreu ao Oscar com a animação nacional O Menino e o Mundo (2013).
Fato é que o problema de aceitação de uma produção brasileira não é uma particularidade do exterior. As barreiras estão enraizadas e começam antes mesmo de sair do país. Além do histórico de baixo incentivo da cinematografia no Brasil tanto no quesito produto e consumo, quanto nas questões orçamentais, os filmes que conseguem sair do papel, muitas vezes, esbarram nos próprios órgãos do governo em casos de censura, boicote e negligência. diretor, levantaram placas contra o impeachment da então presidenta, Dilma Rousseff. O protesto acarretou uma série de reações e uma proposta de boicote com a justificativa de que os envolvidos no filme estariam se beneficiando de verbas estatais.
O cinema brasileiro é entrelaçado com a cultura e muitas vezes usado como um cenário representativo da nossa sociedade. Mesmo em um país diversificado, assim como em Hollywood, grande parte das histórias são contadas e protagonizadas por homens brancos. No Brasil, cinema e política andam lado a lado, e isso pode causar desconforto para muita gente. A sociedade também precisa estar disposta a mergulhar em novas narrativas.
“Acredito que seja hora de as pessoas contarem suas próprias histórias, em vez de homem branco cis contar suas histórias (por elas). Chegou a hora de sermos protagonistas, nós como LGBTQIA+ e pessoas negras”, destaca Eiterer.
Outro caso notório é o de Marighella (2021). Dirigido por Wagner Moura, o longa estreou apenas quatro anos depois de sua filmagem. Um dos principais motivos foi um embate travado com a Agência Nacional do Cinema (Ancine) que recusou dois pedidos de comercialização da obra. Sucesso no Festival de Berlim, o filme que conta a história de Carlos Marighella, escritor, político e guerrilheiro, sofreu uma onda de avaliações negativas na Internet Movie Database, um dos sites mais famosos de cinema no mundo todo.
Retomando a história de Aquarius, o filme de Mendonça mesmo antes de ser exibido no Brasil, sofreu boicote após o elenco do filme realizar um protesto político no Festival de Cannes, em maio de 2016, na França. Na ocasião, atores e atrizes acompanhados pelo
O cinema não se trata apenas de méritos e deméritos. O Oscar não deixa de ser uma representação em grande escala do que se passa na indústria brasileira. Assim como no Brasil, em Hollywood, os critérios ideológicos também são um impasse, e isso impede nosso país de protagonizar no lugar mais alto e prestigiado do cinema. De Aquarius à Marighella, enquanto o Brasil não resolver suas próprias questões dentro da cinematografia, as barreiras para o parâmetro internacional que já são grandes, se tornam ainda maiores.
Vencedores latinos no Oscar
Os sul-americanos já provaram que podem ser sucesso fora do continente. Em 1986, o filme argentino A História Oficial (1985) foi o primeiro longa-metragem latino a levar um Oscar. Vencedor na categoria melhor filme estrangeiro, a obra do diretor Luis Puenzo se passa em um cenário pós-Guerra Suja, e começou a ser gravada durante o último ano da ditadura militar na Argentina. Por esse motivo, parte de sua produção aconteceu de forma sigilosa. Além do Oscar, também saiu vencedor em outros grandes prêmios como o Globo do Ouro, o Festival de Cannes e o Festival de Berlim.
No ano de 2010, a Argentina voltou a figurar na maior premiação do cinema com O Segredo dos seus Olhos (2009). Assim como o primeiro argentino a vencer uma estatueta, o filme dirigido por José Juan Campanella também venceu como melhor produção estrangeira e possui como tema a ditadura e política do país.
Exemplo mais recente, o filme Uma Mulher Fantástica (2017), fala sobre Marina, uma mulher transsexual que trabalha como garçonete e luta contra o preconceito dos familiares de seu ex-parceiro enquanto busca o seu sonho de ser cantora e performer. Escrito e dirigido por Sebastián Lelio, o filme levou o Oscar de melhor filme estrangeiro em 2018 e foi um sucesso de crítica. Essa foi a primeira produção na história protagonizada por uma pessoa transgênero a levar um prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.
Diferente dos países da América do Sul, o México está mais acostumado a figurar no alto escalão do cinema. Casa de diretores renomados como Guillermo Del Toro, Alfonso Cuarón e Alejandro Iñárritu, os mexicanos praticamente dominaram a categoria de melhor direção nas premiações entre 2013 e 2018. Em 2019, o filme Roma (2018) de Cuarón, estrelado pela atriz mexicana Yalitza Aparicio, garantiu 10 indicações ao Oscar e levou 3 estatuetas: melhor diretor, melhor fotografia e melhor filme estrangeiro. Muito elogiado pela crítica, Roma se passa no México e retrata a vida de Cleo, uma empregada doméstica de uma família classe média dos anos 70.