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Casa do Douro: Aprovados os diplomas do PS, PCP e BE para reinstitucionalização

Criada em 1931 como Federação Sindical dos Viticultores do Douro, a Casa do Douro (CD) tem vivido, ao longo da sua história, vários altos e baixos. Depois de passar para a gestão privada em 2014, durante o Governo de Pedro Passos Coelho, a instituição regressa agora ao domínio público.

No total foram três os Diplomas (PS, PCP e BE), apresentados na Assembleia da República com vista à restauração da Casa do Duro como instituição pública. Os documentos foram aprovados com os votos favoráveis de PS, PCP, BE, PAN e Livre, contando ainda com a abstenção do PSD e os votos contra da IL e CHEGA.

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Durante o debate, que decorreu no dia 23 de março, os partidos de esquerda defenderam que a instituição deveria regressar ao estatuto público com inscrição obrigatória, algo que a direita vê como "uma violação do direito de associação e o regresso ao passado, ao tempo do Estado Novo".

Em 2020, entrou em vigor a lei que a reinstitucionalizou a CD como associação pública de inscrição obrigatória. Em 2021, o Tribunal Constitucional apontou inconstitucionalidades à lei, nomeadamente, uma insuficiência na definição de competências de natureza pública.

Os diplomas, agora apresentados e aprovados, partem do trabalho já anteriormente realizado e que envolveu o BE, o PS, o PCP e Os Verdes, e acrescentam à CD competências de natureza pública, nomeadamente o cadastro das parcelas de vinho da Região Demarcada do Douro, a distribuição anual do benefício a cada produtor, a promoção dos vinhos da região ou ações de fiscalização relativas à cultura da vinha e produção de vinho.

Os três projetos de lei defendem também a entrega à CD do imóvel que é a sua sede, localizado na cidade do Peso da Régua, distrito de Vila Real, anulando a inscrição da sede à entidade que venceu o concurso para a gestão privada da instituição.

Com a atribuição das competências mencionadas à CD, resta ainda perceber que competências ficarão na mão do IVDP, assim como o financiamento da instituição após a sua reinstitucionalização.

Em declarações ao nosso jornal Agostinho Santa, deputado do Partido Socialista, confessou estar "satisfeito" com o resultado obtido.

"Ter conseguido fazer o que foi feito em prol da restauração da Casa do Douro como entidade pública era a razão essencial do meu mandato como deputado na Assembleia da República.

Era Presidente da Comissão Administrativa do Património da Casa do Douro e aceitei o desafio de ser deputado porque estando em Lisboa poderia ser mais fácil cuidar que este desígnio, da região e do país, pudesse ser atingido. Acredito que tudo isto seja em prol dos interesses da Região Demarcada do Douro e dos pequenos e médios viticultores. Esta é uma região que tem futuro e merece que todos nós lhe dediquemos tudo aquilo que possamos em termos das funções que exercemos".

Por outro lado, Artur Soveral Andrade, deputado do PSD que se absteve, tal como toda a bancada laranja, revelou-se também "satisfeito" pela mudança de sentido de voto da sua bancada, sublinhando que "é uma porta que fica aberta para a discussão do diploma na especialidade, algo que se votássemos contra não iria acontecer". "Com a abstenção fica o sinal que estamos disponíveis para corrigir alguns pontos na proposta de lei que foi apresentada, foi um trabalho duro que fiz com os meus colegas de partido porque acredito que o desfecho também possa ser diferente. Consegui contribuir para que o partido mudasse o seu sentido de voto, amarrar o PSD a negociar o documento em vez de o rejeitar é para mim uma satisfação.

Com este voto o que dizemos é que queremos avançar com este processo, mas que achamos que a lei ainda precisa de alguns ajustes, especialmente quanto ao financiamento, garantindo que não há acréscimo de encargos para os produtores, e uma definição do que será o papel do IVDP".

Contudo, o deputado social democrata assume que esta posição lhe trouxe alguns danos reputacionais na região, visto que no território a posição é de aprovação da reinstitucionalização da Casa do Douro.

Já Agostinho Santa saúda esta aproxima- ção do PSD ao PS, sublinhando que o importante é o trabalho que os dois partidos podem fazer em prol da região.

"Em vez de estarmos a olhar para trás, nesta altura é importante olhar para o futuro e ver o que conseguimos fazer.

A nossa grande pedra de toque deve ser estar em prol da região e dos seus médios e pequenos produtores, a partir daí há certamente entendimentos diferentes e haverá algum aprimoramento da própria legislação que está a ser preparada.

O importante é que é fundamental encontrar uma solução estável e consistente. Essa solução deve ser a interpretação da vontade política que existe na região e que é patente na posição da CIM Douro, órgão onde estão representados os dois maiores partidos portugueses.

É importante que o PSD se tenha aproximado da posição do PS, é mais fácil esse entendimento para aquilo que temos que fazer em seguida. Este poderá ser também um sinal para o próprio Presidente da República, a partir do momento que a lei já supriu as falhas indicadas pelo Tribunal Constitucional, não ter funções efetivamente públicas, e agora com esta aproximação do PSD à nossa posição começa a ter ele próprio alguns sinais que as pessoas na região e os partidos se entendem, não se sentido na obrigação de fazer subir a lei ao Tribunal Constitucional".

O financiamento da nova Casa do Douro é uma das maiores preocupações reveladas pelo autarca reguense, José Manuel Gonçalves, à nossa reportagem.

"Não podemos transformar este diploma em mais uma taxa ou mais um imposto para os viticultores que já são muito so- brecarregados com isso. O funcionamento da futura associação Casa Douro deve derivar daquilo que já são as taxas que neste momento se paga para o IVDP. Para nós isto é uma situação clara. Não vamos admitir que os viticultores tenham mais um imposto para pagar. Se queremos a inscrição obrigatória tem de haver a responsabilidade política de não onerar os viticultores com mais uma taxa.

Há duas situações aqui. Uma é irmos buscar uma percentagem das taxas que o IVDP cobra e a outra é através dos serviços públicos que passarão para a Casa do Douro e que naturalmente também terão de ser remunerados.

Temos uma associação que tem património que vai dar para cobrir as dívidas e ainda há um remanescente muito significativo".

A situação futura do IVDP é outra questão que tem levantado alguma discussão na região e no setor.

Para José Manuel Gonçalves, esta discussão requer um rápido e cabal esclarecimento sobre o papel que o Instituto terá no futuro.

"Não me parece bem que nós estejamos aqui a discutir diplomas sem que em paralelo não se discuta já o que é que vai sair do IVDP e que vai ser assumido pela Casa do Douro.

Este é o momento para reorganizar todo o setor da lavoura duriense e entre os quais também a criação de autonomias administrativa e financeira do próprio IVDP fixando cá todas as taxas que ele recebe no licenciamento e não estando sujeita às cativações que acontecem. Neste momento devemos ter cerca de nove ou dez milhões de valor financeiro cativado e que está no Ministério das Finanças, esse dinheiro foi pago para prestar um serviço e neste momento o serviço não está a ser prestado porque o dinheiro está cativo".

Para Agostinho Santa a situação do IVDP está clara e as duas instituições terão que trabalhar em conjunto, cada uma com as suas obrigações.

"O papel do IVDP continuará a ser de um Instituto Público. Tendo a Casa do Douro que ser dotada de funções públicas, assume competências que estavam radicadas no IVDP, até porque essas competências se referem a uma das partes da fileira e deve ser a própria a assumi-las.

É evidente que as duas instituições terão que dialogar e trabalhar juntas, é assim que funciona. O IVDP não perderá aquilo que é essencial como instituto público, apesar do muito que se vai dizendo por aí. No fundo as competências que pertencem à produção ficarão na Casa do Douro, as restantes mantém-se no IVDP".

O diploma que reinstitucionaliza a Casa do Douro será agora debatido na especialidade e após aprovação será remetido para o Presidente da República que o poderá promulgar, vetar ou enviar para o Tribunal Constitucional. ○

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