Bolacha eterno Ele está em um momento de folga. Coisa rara. Aos sábados e domingos, quando não
está jogando pelo Riopardense, time que disputa a Série A2 – Divisão de Acesso do Campeonato Gaúcho, joga por lazer. Nasceu para jogar! Foi difícil encontrá-lo. Foi difícil conciliar os horários. Seu tempo era restrito, das 14h às 15h, e apenas nas terças-feiras. Em uma tarde fria de outono, lá estava Bolacha, de banho tomado, com o cabelo arrumado, cheio de gel e amarrado com uma espécie de meia calça. “É bom ser lembrado por coisas boas. Em que posso te ajudar?”, diz.
O ponto alto da sua carreira, mal sabia na época, foi na passagem dos 17 para os 18 anos. Dos 28 meninos que buscavam uma vaga no time principal do Mogi Mirim, apenas um obteve êxito. Após três meses atuando como profissional, o menino magricelo e franzino, como é possível ver na foto do time, conquistou seu primeiro título na "segundona", ou divisão de acesso, como preferirem. Em 1995 o centroavante sentia a emoção do seu primeiro - e único - título, de fato. Outros vieram, mas como segundo, terceiro colocado. Marcio, o filho do meio dos três que seu Amarinho Fiuza Maia e dona Santa Geneci Ramos Maia tiveram, é conhecido por todos como Bolacha. Apelido que herdou ainda quando era pequeno. Ele fazia parte da escolinha de futebol do colégio Dom Bosco, em Porto Alegre, onde nasceu, estudou e morou até a pré adolescência. Bolacha estudava no turno da manhã e o irmão mais velho estudava no turno da tarde. Tinham que cuidar do irmão caçula, já que Santa Geneci saia cedo de casa para trabalhar na Central de Integração de Distribuição da Souza Cruz, em Porto Alegre. "A grana era curta. Minha mãe penou muito", diz ele, olhando para o chão. Seus olhos traziam a dor de uma infância difícil, uma infância em que ele não tinha tempo e, as vezes, condições para almoçar. Arroz, feijão, carne? Eram alimentos de luxo e não faziam parte das refeições de Marcio. Todo dia, ao sair da aula, por volta das 12h, Bolacha ia até a parada encontrar a mãe, que lhe entregava um pacote de bolacha amanteigado, as vezes, um pacote de bolacha de água e sal, para variar. Esse era o seu almoço! "Até eu voltar para casa, no fim da tarde, aquela era a minha refeição", conta. A mãe nunca deixou que passassem fome, mas também não podia dar muito para os seus filhos. "Eu sei que até hoje minha mãe sente culpa pela infância complicada que tivemos, mas eu me orgulho e reconheço todo o esforço com que ela se dedicou para nós." Sentado no banco da parada, ele comia as bolachas com muita vontade, como se agradecesse por ter o que comer. E agradecia. O professor da escolinha, do qual ele não se recorda o nome, o encontrava todos os dias na parada em frente ao colégio, comendo. Daí surgiu o apelido; o professor começou a chamá-lo de "bolacha", e o apelido ficou. Até hoje. "Tem vezes que me chamam pelo nome e eu não entendo", brinca ele, no seu primeiro sorriso até aqui.