Goiânia, 2016
Educação com o Cristo Copyright© 2016 by FEEGO 1ª edição Autoria: Marcus De Mario Coordenação editorial e revisão: Ivana Raisky e Fátima Salvo Projeto gráfico/capa/diagramação: Juliano Pimenta Fagundes Imagem da capa: FEEGO/ Luzia Emos Foto do autor: acervo FEEGO/ finalização: Daniela Alves Direitos autorais gentilmente cedidos à Federação Espírita do Estado de Goiás. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP M295e
Mario, Marcus De. Educação com o Cristo / Marcus de Mario. - 1. ed. - Goiânia : FEEGO, 2016. 408 p. ISBN:978-85-60182-42-8 1. Educação. 2. Filosofia. 3. Espiritismo. I. Título. CDU: 37:133.9
DIREITOS RESERVADOS - É proibida a reprodução total ou parcial da obra, de qualquer forma ou por qualquer meio sem a autorização prévia e por escrito do autor. A violação dos Direitos Autorais (Lei N° 610/98) é crime estabelecido pelo Artigo 48 do Código Penal. Impresso no Brasil Printed in Brazil 2016 FEDERAÇÃO ESPÍRITA DO ESTADO DE GOIÁS – FEEGO Rua 1133 nº 40 - Setor Marista - Goiânia-GO CEP: 74.180-120 - Fone: (62) 3281-5114/3281-0200 www.feego.org.br
Educar com Jesus A educação da alma é a alma da educação”. André Luiz Conduta Espírita, psicografia de Francisco Cândido Xavier Jesus, modelo e guia da Humanidade é o educador por excelência. A História da Humanidade divide-se em A.C (antes de Cristo) e D.C (Depois de Cristo). A profundidade dos conceitos exarados há mais de dois milênios contrasta com a simplicidade dos meios utilizados: conversas informais, parábolas sobre os acontecimentos cotidianos, atenção aos discípulos. As orientações do Rabi da Galileia, num caldeamento milenar, tem por objetivo claro o consenso
da moralidade com respeito à diversidade espiritual e cultural de indivíduos e coletividades. Neste particular contribui imensamente o Espiritismo ao codificar o conhecimento humano em três vertentes ricas em possibilidades – filosofia- ciênciareligião – às quais o acesso mais seguro é a Educação. Convidamos Marcus de Mario, também educador, para traçar uma análise minuciosa dos caminhos da Educação nas escolas, lares, segmentos religiosos, sociais, com ênfase na missão educadora do Espiritismo. O resultado de suas pesquisas e reflexões está enfeixado neste livro, contribuindo para nortear as tarefas de educadores e pais na condução de crianças e jovens sob seus cuidados. O surpreendente é que as lições aqui registradas também podem ser aplicadas na autoeducação em qualquer estágio da vida. Apreciemos. A Editora
O autor
Marcus De Mario é palestrante, escritor, educador, consultor de empresas e escolas, radicado no Rio de Janeiro/RJ. Profere palestras e ministra treinamentos e seminários em todo o Brasil. Fundador da Escola do Sentimento, proposta para uma escola dinâmica, transformadora, ética e participativa, tendo por base o trabalho desenvolvido por Pestalozzi (Mestre de Allan Kardec) e as modernas conceituações e experiências pedagógicas representadas por Freinet, Paulo Freire e José Pacheco com a Escola da Ponte (Portugal). Para conhecer esta
inovadora ideia acesse http://www.educacaomoral. org/ibem/escola-do-sentimento/ Profissionalmente, atua ainda em Gestão Humanizada, Liderança Espiritualizada, Pedagogia da Sensibilidade, Relacionamento Interpessoal, Afetividade e Convivência, Educação do Espírito, Humanização do Ambiente Corporativo, entre outros. Suas teses e artigos estão expostos na revista ReConstruir e no blog Análise e Crítica. Autor de vários livros espíritas ou não, todos eles com foco nos valores morais, de publicação independente ou por editoras. Na FEEGO estreou em 2015 com Nunca Perca a Esperança, lições de ânimo curtas, e agora nos brinda com esta rica obra.
“Hoje, como outrora, na organização social em decadência, Jesus avança no mundo, restaurando a esperança e a fraternidade, para que o santuário do amor seja reconstituído em seus legítimos fundamentos”. Emmanuel (Ave, Cristo! - psicografia de Francisco Cândido Xavier.)
Sumário Introdução ............................................................................................ 13 01 – A Alma ......................................................................................... 25 02 – Semelhanças Físicas e Morais ..................................................... 39 03 – Ideias Inatas ................................................................................. 59 04 – União da Alma com o Corpo ...................................................... 77 05 – Faculdades Morais e Intelectuais ................................................ 97 06 – Da Infância .................................................................................. 115 07 – Da Adolescência ........................................................................... 133 08 – Missão dos Pais ............................................................................ 151 09 – O Mestre ....................................................................................... 173 10 – O Bem e o Mal ............................................................................. 189 11 – A Educação ................................................................................... 201 12 – Desenvolvimento Cognitivo e Emocional ................................... 213 13 – Progresso Moral ........................................................................... 227 14 – Os Males Sociais e a Educação .................................................... 243 15 – Educação e Senso Crítico ............................................................. 261 16 – Natureza Moral do Homem ....................................................... 271 17 – Educação Moral ........................................................................... 283 18 – Amor Materno e Filial ................................................................ 297 19 – A Educação Moral no Combate ao Egoísmo ............................... 309 20 – A Arte de Formar o Caráter ........................................................ 323 21 – Educação Contra o Preconceito ................................................... 337 22 – Felicidade e Futuro ...................................................................... 347 23 – Uma Nova Era para a Humanidade ......................................... 359 24 – Jesus, Mestre dos Mestres ............................................................. 369 Conclusão .............................................................................................. 385
Introdução
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eriam o ensinamentos de Jesus exarados no Evangelho e os mecanismos da reencarnação alguma influência na educação formal? E na educação do espírito, qual a importância de ambos? Respostas para tais questionamentos é o que se procurará no estudo que ora apresentamos. O Livro dos Espíritos, lançado em abril de 1857, enfeixa os ensinos dos Espíritos Superiores ditados através de diversos médiuns, segundo pesquisa e organização do ilustre pedagogo francês Hippolyte Leon Denizard Rivail, que assinou a obra com o pseudônimo Allan Kardec Constitui, seguramente, um marco no processo civilizatório da sociedade humana. Com ele temos lançada a pedra fundamental da crença firmada na lógica por meio de fatos irrefutáveis que comprovam a existência de Deus, a imortalidade da alma, a reencarnação, a comunicabilidade
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entre as dimensões terrena e espiritual e a inexorabilidade da evolução como maestrina das leis cósmicas. O Livro dos Espíritos é uma obra de luz perene, divisor de águas na história do conhecimento humano. Projeta-se muito além do século dezenove, pois escaneia a alma humana, a criação divina e todo processo evolutivo dos seres. Mescla, como não poderia deixar de ser, a realidade espiritual do além-morte com a realidade terrena. Vida infinita e existência temporária num só concerto, melodia intraduzível por palavras do pobre vocabulário humano. E a educação? Que tem O Livro dos Espíritos com essa área do conhecimento humano? Os mais afoitos, percorrendo as matérias que compõem seu conteúdo, por não encontrarem a palavra educação em seu índice, dirão: nada! Entretanto, o nada não existe! Tudo é vida, e uma obra que desvenda os segredos divinos e os princípios da vida imortal não poderia escapar a íntimas ligações com o processo educacional do ser. Por isso, o próprio Espiritismo é doutrina de educação, ou seja, conjunto de princípios que formam um todo filosófico com sua consequente aplicação. Essa filosofia está em toda a obra codificada por Kardec, em especial no livro que elegemos para nortear este estudo.
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Nossa pretensão é a de apresentar pesquisa realizada no amplo conteúdo de O Livro dos Espíritos para destacar as questões relacionadas mais diretamente com a educação, com comentários elucidativos e propostas práticas de aplicação tanto no lar quanto na escola. Cada página de O Livro dos Espíritos é um universo próprio; cada pergunta, com sua resposta, é um sistema sideral; cada comentário de Allan Kardec é uma galtáxia de conhecimentos. Essas as razões do rico manancial da literatura espírita, desdobrando incessantemente os conteúdos da obra básica, erguendo paulatinamente o edifício da vida plena, imorredoura, que a todos destina à perfeição. É, principalmente do século dezenove, que se erguem vozes clamando pelo melhor entendimento da educação como único caminho para salvar o homem do egoísmo e do orgulho. E os Espíritos Superiores, conjugando vozes com Allan Kardec, conclamam ser a educação moral o único remédio eficaz contra essas chagas da humanidade, erguendo o Espiritismo como o maior adversário do materialismo. Entretanto, o quadro histórico humano ainda não reflete na totalidade essa luz magnífica.
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Já escrevia, no início de 1920, o apóstolo espírita Léon Denis, em sua magistral obra O Problema do Ser, do Destino e da Dor: “Uma dolorosa observação surpreende o observador no ocaso da vida. Resulta também, mais pungente, das impressões sentidas em seu giro pelo espaço. Reconhece ele, então que, se o ensino ministrado pelas instituições humanas, em geral – religiões, escolas, universidades – nos faz conhecer muitas coisas supérfluas, em compensação quase nada ensina do que mais precisamos conhecer para encaminhamento da existência terrestre e preparação para o Além”. São palavras que precisam encontrar terra fértil em todas as almas, mas que infelizmente ainda não conseguiram na maioria das pessoas o meio propício para florescer. Continuamos a priorizar o ensino em detrimento da educação, e ensino que não trabalha o essencial, pois ensinamos muitas coisas supérfluas e sem explicar para que servem, deixando em segundo plano a formação do caráter, o desenvolvimento das virtudes, a correção das más tendências, a humanização do ser. Até no meio de formação dos professores encontramos quem não saiba o que é filosofia da edu-
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cação, o que é pedagogia e, por incrível que pareça, desconhece o que seja educação e para que serve. As faculdades de pedagogia são muitas vezes terreno estéril onde o saber ocupa diminuto espaço, perdido entre testes, seminários, provas, estudos teóricos e quase nada do que é verdadeiramente necessário para formar-se convenientemente um educador. Mas isso é pedir demais, pois se muito mal formam professores, quanto mais querermos que formem educadores. Então, uma espécie de ciclo vicioso surge: geração após geração se perde nos emaranhados acadêmicos e na prática social, acarretando males significativos para o homem e a humanidade. Com o Espiritismo acordamos para a verdade da alma imortal, do Espírito que continua sobrevivente à morte do corpo físico e retorna em várias existências através da reencarnação. Tais informações abalam os alicerces do pensamento humano e reescrevem os parâmetros da educação. Conjuguem-se essas informações com a realidade do amor universal, e temos estabelecido um único caminho para uma nova vida: a educação moral. Nas páginas luminescentes de O Livro dos Espíritos, em diálogos vivos e comentários translúcidos, encontramos roteiro pedagógico de validade universal
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antecipando-se no tempo às pesquisas da Psicologia, da Antropologia, da Sociologia, da Pedagogia e de tantas outras ciências. Estas comprovam, por vezes a contragosto, as verdades sobre a vida espiritual que o Espiritismo proclama e estuda desde a metade do século dezenove, estudo esse feito com seriedade e baseado em fatos exaustivamente pesquisados, não apenas por espíritas, mas cientistas ligados a instituições de renome. E quanto à educação, a doutrina espírita é só teoria? Se fosse, ainda assim teria grande importância, mas ela desdobra-se em práticas pedagógicas de real valor e que foram colocadas em ação, com excelentes resultados, desde o lançamento de O Livro dos Espíritos. Citemos alguns exemplos acontecidos em terras brasileiras. O primeiro exemplo, e pioneiro, é o Colégio Allan Kardec, fundado por Eurípedes Barsanulfo no ano de 1906, na cidade de Sacramento, Minas Gerais. O segundo exemplo, também muito fértil, é a Fundação Pestalozzi, em Franca, São Paulo, criada por Thomaz Novelino. Não poderíamos deixar de destacar o exemplo de Anália Franco, espalhando escolas entre o final do século dezenove e o início do século vinte, através da Associação Feminina Beneficente e
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Instrutiva em São Paulo; e ainda o trabalho pioneiro de Ney Lobo à frente do Instituto Educacional Lins de Vasconcellos, em Curitiba, Paraná; a fundação, construção e funcionamento do Instituto Espírita de Educação, em São Paulo, capital, obra idealizada por Pedro de Camargo, Herculano Pires, Ary Lex e outros. Citemos igualmente a realização de vários congressos educacionais espíritas entre as décadas de 1940 e 1970, retomados a partir de 2004 pela educadora Dora Incontri, com a realização dos Congressos Brasileiros de Pedagogia Espírita. E, como fazemos um registro histórico, não podemos deixar de falar da fundação e publicação da revista Educação Espírita, em 1970, por José Herculano Pires, e também da publicação da Revista Pedagógica Espírita, edição do Instituto de Difusão Espírita de Araras, estado de São Paulo, tendo à frente o educador Walter Oliveira Alves. Naturalmente existem outras experiências prodigalizadas pelo movimento espírita brasileiro, como, por exemplo, as da Evangelização Espírita InfantoJuvenil que ocorre nos Centros Espíritas, e institutos de educação mantidos por entidades espíritas, mas não é nossa intenção fazer esforço histórico minu-
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cioso. Apontamos alguns registros que são suficientes para mostrar que educação na visão espírita não é apenas teoria, é também repleta de ricas e valorosas vivências. Um futuro grandioso nos espera, mas sabemos que esse amanhã será frutificação do hoje, do presente, estando em nossas mãos, muito mais do que supomos, o destino da humanidade, destino esse feliz ou infeliz, pois os Espíritos não podem fazer por nós, cabendo-lhes o papel de orientação, mas não o de construção, de execução. Eles são os engenheiros siderais, nós somos a equipe de trabalho que concretiza na realidade terrena o planejamento celestial. Ouçamos a voz do mestre Allan Kardec, fazendo eco às vozes dos Espíritos Superiores, que por sua vez traduzem na linguagem humana a voz incomparável da luz do mundo, do modelo e guia de todos os seres humanos, Jesus Cristo: coloquemo-nos como servidores humildes do Mestre de todos os mestres, educando-nos para melhor educarmos nossos irmãos em humanidade, tendo em vista que a imortalidade da alma conjugada com a reencarnação nos levará à perfeição. Sabemos que essa caminhada, para ser acelerada, é dependente da prática do bem
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e do amor, o que só conseguimos na medida em que praticamos conosco a educação moral, sempre ela, a nos dizer que ninguém chega ao Pai se antes não estiver educado, e quem, com autoridade, nos pode ensinar isso e ao mesmo tempo servir de exemplo, senão ele, Jesus? Por tudo isso nos debruçamos nas páginas de O Livro dos Espíritos para delas extrair o sumo do pensamento espírita sobre a educação, trabalhando para entregar à humanidade a grande tese do Espiritismo: a educação moral do ser imortal.
Nota Utilizamos para as transcrições de O Livro dos Espíritos a 8ª edição da FEESP, março de 1995, tradução e notas de José Herculano Pires.
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1 A alma Espiritismo – Alma – Influência da matéria
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que é a alma? Qual o conceito de ser integral entendido pelo Espiritismo? Responder essas perguntas é essencial e Allan Kardec, na introdução de O Livro dos Espíritos, desenvolveu com maestria o assunto, definindo muito bem termos e significados. Mas antes de definirmos a alma, iniciemos pela compreensão do Espiritismo, ou Doutrina Espírita, conforme entende Kardec. Espiritismo Encontramos no primeiro item da Introdução: “A Doutrina Espírita ou o Espiritismo tem por princípio as relações do mundo material com os Espíritos ou seres do mundo invisível. Os adeptos do Espiritismo serão os espíritas, ou, se o quiserem, os espiritistas”.
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Então, tudo o que se relaciona com a existência do mundo espiritual e do mundo material é objeto de estudo do Espiritismo, inserindo-se aqui a inter-relação entre esses dois planos da vida. Na obra O Que é o Espiritismo, lançada posteriormente, Allan Kardec, no preâmbulo, amplia a definição, afirmando: “O Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma doutrina filosófica. Como ciência prática ele consiste nas relações que se estabelecem entre nós e os espíritos; como filosofia, compreende todas as consequências morais que dimanam dessas mesmas relações”. Por ser ciência e filosofia, e ao mesmo tempo religião pelo estudo das consequências de ordem moral da vida após a morte, do intercâmbio entre vivos e mortos, da reencarnação, da existência de Deus, da lei de evolução, percebe-se que o Espiritismo é muito profundo e requer bastante estudo. Essa profundidade, porém, não é exclusiva de mestres e doutores, pelo contrário, é aberta a toda pessoa que tenha boa vontade em querer saber o que é a Doutrina Espírita. Para que possamos abranger com inteireza o Espiritismo, atentemos para as explicações de José Her-
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culano Pires no primeiro capítulo de sua obra Curso Dinâmico de Espiritismo: “Doutrina complexa, que abrange todo o campo do conhecimento, apresenta-se enquadrada na sequência epistemológica de: a) Ciência – como pesquisa dos chamados fenômenos paranormais, dotada de métodos próprios, específicos e adequados ao objeto que investiga, tendo dado origem a todas as ciências do paranormal. b) Filosofia – como interpretação da natureza dos fenômenos e reformulação da concepção do mundo e de toda a realidade segundo as novas descobertas científicas. c) “Religião – como consequência das conclusões filosóficas, baseadas nas provas da sobrevivência humana após a morte e nas ligações históricas e genésicas do Cristianismo com o Espiritismo”. O termo Epistemologia (epistemológico) significa doutrina que trata da origem, do alcance e da justificação do conhecimento, por isso também definida como conjunto das teorias do conhecimento humano, o que se aplica perfeitamente ao Espiritismo. Alma Ao avançarmos no texto do Codificador em O Livro dos Espíritos, encontramos no segundo item que
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compõe a Introdução a primeira definição de alma, quando Kardec comenta as principais ideias existentes sobre a mesma, ficando com a ideia espiritualista, conforme suas palavras: “Segundo outros, enfim, a alma é um ser moral, distinto, independente da matéria e que conserva a sua individualidade após a morte. Esta concepção é incontestavelmente a mais comum, porque sob um nome ou outro a ideia desse ser que sobrevive ao corpo se encontra em estado de crença instintiva, e independente de qualquer ensinança, entre todos os povos, qualquer que seja o seu grau de civilização. Essa doutrina, para a qual a alma é causa e não efeito, é a dos espiritualistas”. Entendamos essa concepção espiritualista sobre o ser. Se a alma é um ser distinto que sobrevive à morte do corpo, isso quer dizer que todos nós, seres humanos, somos almas momentaneamente encarnadas num corpo biológico, portanto, as chamadas almas do outro mundo nada mais são do que os próprios seres humanos desprovidos do corpo orgânico. Não existem seres distintos – corpo e alma – como muitas pessoas pensam, existem almas, ou Espíritos, que se revestem durante a existência material de um corpo perecível que a morte desagrega e faz retornar seus elementos à natureza.
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Note-se que na definição espiritualista a alma conserva sempre sua individualidade, que independe do corpo biológico. Assim, quem pensa é a alma e não o cérebro, que não passa de instrumento do ser imortal. Pois bem, ainda no segundo item da Introdução da obra básica do Espiritismo, comenta Allan Kardec: “Seja como for, há um fato incontestável, – pois resulta da observação, – e é que os seres orgânicos possuem uma força íntima que produz o fenômeno da vida, enquanto essa força existe; que a vida material é comum a todos os seres orgânicos, e que ela independe da inteligência e do pensamento; que a inteligência e o pensamento são faculdades próprias de certas espécies orgânicas; enfim, que entre as espécies orgânicas dotadas de inteligência e pensamento, há uma, dotada de um senso moral especial, que lhe dá incontestável superioridade perante as outras, e que é a espécie humana”. Depreendemos dessa afirmativa que a vida orgânica é sustentável por si mesma, sem necessidade de haver inteligência e pensamento presentes, isso porque ela é fomentada pelo princípio vital, ou fluido vital, sobre o qual não nos estenderemos por não ser objetivo desta obra. Entre todas as espécies orgânicas
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sobressai a espécie humana, não apenas por ter maior capacidade intelectual, mas por ser a única dotada de senso moral que lhe caracteriza a individuação, que lhe faz racional e ao mesmo tempo controla seu desenvolvimento emocional. Subtraída do corpo pelo fenômeno da morte, a alma conserva seus aprendizados, suas ideias, suas conquistas, enfim tudo o que lhe caracteriza individualmente, pois nada disso pertence ao corpo físico. O pesquisador Gabriel Delanne, em sua obra A Alma é Imortal, enfatiza o papel científico do Espiritismo na elucidação sobre a alma, quando, ainda na introdução de seu precioso livro, que tem como subtítulo “Demonstração Experimental da Imortalidade”, informa que: “A ciência espírita se apresenta, provando que a alma não é uma entidade ideal, uma substância imaterial sem extensão e sim que é provida de um corpo sutil, onde se registram os fenômenos da vida mental e a que foi dado o nome de perispírito. Assim como, no homem vivo, importa distinguir do espírito a matéria que o incorpora, também não se deve confundir o perispírito com a alma. O eu pensante é inteiramente distinto do seu envoltório e não se poderia identificar com este, do mesmo modo que a veste não se identifica com o corpo físico. Todavia, entre
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o espírito e o perispírito existem as mais estreitas conexões, porquanto são inseparáveis um do outro”. Como ciência de observação, o Espiritismo parte não apenas do pensamento filosófico lógico, mas dos fatos, para remontar à origem, estudando os fenômenos de aparição e manifestação da alma para descobrir sua realidade além da matéria. Toda criança é uma alma, ou Espírito, que está encarnada, e que já teve outras encarnações e haverá de continuar viva após a morte do corpo. Mais que uma revolução epistemológica, essa informação é uma revolução pedagógica que haverá de transformar o pensamento educacional ainda vigente. Influência da matéria Estabelecida a definição de alma, e sabedores que todos nós, seres humanos, somos uma alma encarnada, temos uma consequência lógica disso, e que Kardec muito bem esclarece no item seis da Introdução de O Livro dos Espíritos: “O Espírito encarnado está sob a influência da matéria. O homem que supera essa influência, pela elevação e purificação de sua alma, aproxima-se dos bons Espíritos com os
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quais estará um dia. Aquele que se deixa dominar pelas más paixões e põe todas as suas alegrias na satisfação dos apetites grosseiros aproxima-se dos Espíritos impuros, dando preponderância à natureza animal”. Conseguir dar o voo da alma através do desapego das coisas materiais significa purificar-se, ou seja, colocar em primeira ordem as coisas do espírito, tudo o que é ligado às virtudes, pois somente isso acompanha a alma no seu retorno ao mundo espiritual. Portanto, quando olharmos para uma criança lembremos que estamos olhando para uma alma imortal que já teve outras existências corporais, que já esteve encarnada em época e situação diversa da atual, e que traz em si sua própria história evolutiva, os progressos que já fez, as paixões que ainda carrega, o grau de desenvolvimento alcançado de suas virtudes. É um ser complexo dotado de intrincado psiquismo e de senso moral único que vão desabrochando conforme o corpo biológico se desenvolve e permite a melhor manifestação dessa alma. O filósofo e educador Rudolf Steiner, pai da Pedagogia Waldorf e da Filosofia Antroposófica, que desenvolveu o que ele denominava Ciência Espiritual, afirma:
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“Quem quiser conhecer a essência do homem em desenvolvimento deverá partir de uma observação da natureza oculta do ser humano em geral”. Essa natureza oculta ele designa como o “eu”, a alma que se manifesta através da consciência, que por sua vez se desenvolve através das encarnações e se manifesta através de vários corpos, e não apenas o físico, pois considera a existência de corpos espirituais. Tudo integrado num mesmo ser que transcende a matéria. Não se espantem os leitores por trazermos um pensador e educador espiritualista cuja base está assentada nas pesquisas teosóficas sobre o homem. Não vamos fazer comparações com o pensamento espírita, mas sim aproximações, e quem pode dizer que Steiner estava errado? As escolas baseadas em seu pensamento e metodologia estão espalhadas pelo mundo, dando resultados bem positivos na educação das crianças. Outro valoroso educador, defensor da alma, é Sathya Sai Baba, cuja formação indo-budista fez com que lançasse para o mundo a Educação em Valores Humanos, sintetizada nos princípios da verdade, da
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retidão, da paz, da não violência e do amor divino, num projeto que tem por base o ser humano como alma imortal reencarnante e com destino à perfeição espiritual. Carismático e muito dedicado à educação das novas gerações, era conhecido por sua compaixão, sabedoria e generosidade, características das almas elevadas. Citemos, igualmente, o educador Walter Oliveira Alves, extraindo do capítulo 6 de seu livro Educação do Espírito, a seguinte elucidação a respeito do progresso do Espírito na encarnação: “Embora a forma física do futuro reencarnante possa depender dos cromossomos paternos e maternos, temos que levar em conta o próprio espírito que reencarna trazendo consigo toda a bagagem evolutiva que conquistou nos milênios afora. Herdamos o corpo físico que nós mesmos ajudamos a construir nos milênios passados e trazemos nossa bagagem milenária que se manifesta gradualmente, conforme o desenvolvimento dos órgãos”. Depois do raciocínio lógico de Kardec, da vertente educadora espiritualista e da realidade reencarnatória, mostrando o que verdadeiramente somos,
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nosso olhar sobre a educação não pode mais ser o mesmo, e nossa prática pedagógica não pode mais desconsiderar quem realmente somos.
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