BITTENCOURT SAMPAIO
Bittencourt Sampaio - Nebulosa Radiante Copyright© 2016 by FEES 1ª edição Autoria: Antonio Cesar Perri de Carvalho, César Cristino, Gilberto Campista Guarino, Hilário Silva, Maurilourdes Ramos, Silvan Aragão Almeida e Zeus Wantuil. Organização: Silvan Aragão Revisão: Lídia Melo Projeto gráfico/capa/diagramação: Juliano Pimenta Fagundes Imagem da capa: Napoleão Figueiredo, Óleo em Tela. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP A447b
Almeida, Silvan Aragão Bittencourt Sampaio – nebulosa radiante/ Silvan Aragão Almeida. – Aracaju: Federação Espírita do Estado de Sergipe. 70p. 21 cm., il. P&B. 1. Biografia 2. Literatura Espírita I. Título II. Silvan Aragão Almeida III. Assunto CDD 929
Catalogação – Claudia Stocker – CRB 5/1202 DIREITOS RESERVADOS - É proibida a reprodução total ou parcial da obra, de qualquer forma ou por qualquer meio sem a autorização prévia e por escrito do autor. A violação dos Direitos Autorais (Lei N° 610/98) é crime estabelecido pelo Artigo 48 do Código Penal. Impresso no Brasil Printed in Brazil 2016 FEDERAÇÃO ESPÍRITA DO ESTADO DE SERGIPE – FEES Rua José Mesquita Neto, 21 - Bairro Inácio Barbosa - CEP: 49041-030 Aracaju - SE - Fone: (79) 3249-2896 www.fees.org.br
Organizador: Silvan AragĂŁo
BITTENCOURT SAMPAIO Nebulosa Radiante
2016, Aracaju
PREFÁCIO
C
om muita honra recebemos o convite da presidente da Federação Espírita do Estado de Sergipe, Muarilourdes Ramos Oliveira, para redigirmos esta página, pois a figura do ilustre sergipano Francisco Leite de Bittencourt Sampaio (1834-1895) suscita-nos respeito e admiração. Por ocasião dos 180 anos de nascimento de Bittencourt Sampaio registramos a efeméride com artigo na revista Reformador1 e estimulamos o fraternal tributo ao nobre vulto efetivada na Sede Histórica da Federação Espírita Brasileira, no Rio Janeiro2. Na oportunidade, conhecemos Silvan Aragão Almeida, dirigente do Grupo da Fraternidade Espírita Bittencourt Sampaio, de Aracaju, que compareceu ao evento representando o Estado natal do homenageado. Bittencourt Sampaio é um espírito de escol. Atuou como jurisconsulto, magistrado, político, jornalista, literato e espírita vinculado a grupos que originaram a FEB. Com sua notoriedade no cenário social e político, Bittencourt atuava na seara espírita de maneira simples e dedicada, inclusive como médium. Nesta condição atuou como receitis1 CARVALHO, Antonio Cesar Perri. Bittencourt Sampaio e a Epopéia do Evangelho Reformador. Nº 2.219, fevereiro de 2014, p.78-81. 2
Comemorações dos 130 da FEB. Reformador. Nº 2.220, março de 2014, p.183.
ta de homeopatia no “Grupo Confúcio”, no Rio de Janeiro, entidade que integrava a diretoria desde 2/8/18733. Relata Antônio Luís Saião, em 1878: “[...] Bittencourt dava remédios aos pobres desenganados pelos médicos, tornou-se ele o médico de nossa família, com tal êxito que as moléstias, as mais insignificantes como as mais complicadas, foram sempre combatidas com o mesmo esplêndido resultado, o que foi presenciado até por alguns médicos, nossos íntimos amigos4.” Bezerra Menezes, como encarnado e médico, relata na sua obra - A loucura sob novo prisma -, os estudos de casos que realizou, recorrendo a reuniões com participação de figuras notáveis como o médium Frederico Pereira da Silva Júnior, Pedro Richard, Antônio Luís Saião, Francisco Leite Bittencourt Sampaio, e outros companheiros da história do Espiritismo5. Os compromissos espíritas de Bittencourt se desenvolveram também na Sociedade Acadêmica Deus, Cristo e Caridade, da qual foi um dos fundadores em 1885, e nos seus desdobramentos como “Grupo do Saião”, destinado ao estudo e prática dos Evangelhos, e depois no “Grupo Ismael”, alteração de designação que ocorreu quando este se integrou à Federação Espírita Brasileira (fundada em 2/1/1884). Ali ele atuou como médium para receber belas e instrutivas mensagens de Espíritos Superiores6. 3
Ibid., item 1.
4
Idem.
MENEZES, Adolfo Bezerra. A loucura sob novo prisma. Cap. II. Rio de Janeiro: FEB. 1946. 5
6
Ibid., item 1.
Um fato histórico marcante ocorreu nos idos de 1882, publicou o livro A Divina Epopéia de João Evangelista. Esta obra pioneira somente veio a ser editada pela FEB no ano de 1938, com o título de A Divina Epopéia. Trata-se de uma reprodução do Evangelho de João, em versos decassílabos, de rara beleza e grandiosidade. Relata a obra de João Evangelista em versos heróicos. Justifica a trasladação do quarto Evangelho para a poesia, em virtude da perfeição e harmonia encontradas na linguagem do Evangelista. De início, Bittencourt considera “O Evangelista apóstolo do amor foi o maior poeta da antiguidade depois de Job, de Salomão e David”, e, comenta os objetivos do livro: “[...] mostrar-lhes que não se vive tão somente do pão material levou-me nos dias santificados ao estudo dos Evangelhos, escrevendo ora o próprio texto em linguagem ao alcance de todos, ora traduzindo em verso o que mais me parecia adaptar-se à índole e ao ritmo do nosso endecassílabo”. [...] Transladando para versos heróicos o Evangelho segundo S. João, não tive outro fim senão o de elevar a Deus o meu espírito, [...] Escutai as palavras do Evangelho, a boa nova, que o discípulo amado por ordem de Jesus ditou aos homens7”. Bittencourt Sampaio divide o livro em: Advertência, em prosa; Introdução, em versos decassílabos; 21 Cantos, que seriam os capítulos do Evangelho de João; e, as Notas aos Cantos. De nossa parte, em que pese a admiração que nutrimos pelo autor, destacamos apenas alguns versos da SAMPAIO, F.L.Bittencourt. A divina epopéia. 5ª Ed. Rio de Janeiro: FEB, 2003, p. 9-23. 2003. 7
Introdução e dos Cantos, omitindo as interpretações do autor, registradas nas Notas. Compreendemos o contexto sociológico e religioso do Brasil do século XIX, época em que o autor redigiu a obra, e, com todo respeito ao dedicado seareiro temos precauções doutrinárias quanto a algumas interpretações de Bittencourt sobre o Cristo. Eis alguns trechos: “Há muito que na terra esteve o Mestre, Apontando o caminho à humanidade, Ensinando o amor que a Deus nos leva. De novo apedrejado ele o seria, Se de novo voltasse agora ao mundo, Por entre os fariseus da nova espécie. o0o [...] Renascido pela água e pelo espírito. O que nasceu da carne é carne, e espírito O que nasceu do espírito. Não fiques Maravilhado de eu dizer que importa Nasceres outra vez. Assopra o espírito Onde quer que se ache e a voz lhe ouves; Porém donde ele vem, tu não o sabes, Nem para onde ele vai: assim na terra, Assim é todo aquele que é nascido Do espírito8.”
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Ibid., item 7.
A obra mediúnica de Francisco Cândido Xavier traz referências à figura respeitável de Bittencourt Sampaio em Crônicas de Além Túmulo, Voltei, e Instruções psicofônicas. Nesta última obra, há uma belíssima página do nobre Espírito, intitulada “O Cristo está no leme”, onde conclui: “Cristo ontem, Cristo hoje, Cristo amanhã!...9” Fraternalmente nos irmanamos aos esforços de registro da Federação Espírita do Estado de Sergipe, com a merecida homenagem a Francisco Leite de Bittencourt Sampaio, sergipano que brilhou de forma radiante na então Capital do Brasil. Brasília, abril de 2016. Antonio Cesar Perri de Carvalho Ex-presidente da FEB (interino e efetivo, de 2012 a 2015)
Xavier, Francisco Cândido. Espíritos diversos. Instruções psicofônicas. Cap.64. Brasília: FEB. 2013. 9
INTRODUÇÃO
O
Grupo da Fraternidade Espírita Bittencourt Sampaio, fundado em Aracaju (SE) no dia 03 de janeiro de 1984, homenageou o seu Mentor Espiritual com uma Semana de eventos, de 08 a 14 de outubro de 1995, quando do centenário de sua desencarnação. Um dos eventos foi a elaboração, e posterior distribuição com os Membros do Grupo, de uma apostila contendo biografias, poesias, artigos etc, do homenageado. Aquela coletânea serviu de base a esse singelo livro. Se fôssemos compilar tudo que temos em mãos, sobre Bittencourt Sampaio, no mínimo triplicaríamos o volume dessa obra e fugiríamos do seu objetivo. Foi-nos muito difícil selecionar apenas uma parte do material de que dispomos. E não temos tudo. Inclusive tivemos que deixar de fora a letra da música “Quem Sabe?”, por ele composta e musicada pelo célebre Carlos Gomes, seu amigo, e sucesso nacional por muitas décadas. Para quem não se lembra, uma “palhinha”: “Tão longe de mim distante, Onde irá, onde irá teu pensamento...” Esse novo ensejo deve-se à realização do VI Con-
gresso Espírita do Estado de Sergipe, que o tem por Patrono Espiritual. Na Primeira Parte, transcreveremos (em modo itálico) a biografia elaborada por Zêus Wantuil, publicada no livro Grandes Espíritas do Brasil, edição FEB, incluindo, nos momentos oportunos, mais informações e/ou notas em caractere comum e, em seguida, partes do artigo intitulado “Bittencourt Sampaio em 3 Instantâneos Poéticos”, de Gilberto Campista Guarino, publicado em O Reformador, FEB, em março de 1975, porque repleto de preciosas informações sobre a personalidade do nosso homenageado. Na Segunda Parte, traremos dele uma pequena mostra de imagens, poesias, mensagens, episódios e informações que atestam a sua elevação espiritual.
Silvan Aragão Almeida
SUMÁRIO PRIMEIRA PARTE I – Bittencourt Sampaio, por Zeus Wantuil
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II – Bittencourt Sampaio em 3 instantâneos poéticos, de Gilberto Campista Guarino
41
SEGUNDA PARTE I - Fotografias
49
II - Poesias
51
III - Mensagens
53
IV - Episódios
59
V - Espírito de Luz
63
VI - Instituições
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PRIMEIRA PARTE
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I - BITTENCOURT SAMPAIO Por Zeus Wantuil 10
F
rancisco Leite de Bittencourt Sampaio, filho de um negociante português de mesmo nome e de D. Maria Sant’Ana Leite Sampaio, nasceu em Laranjeiras, localidade da então província de Sergipe, no dia 1º de Fevereiro de 1834, e desencarnou no Rio de Janeiro a 10 de Outubro de 1895. Laranjeiras dista 19 km de Aracaju e hoje possui cerca de 30.000 habitantes. Cidade tombada pelo IPHAN, na época do Império abrigou a aristocracia açucareira da Província e de 1841 a 1851 foi considerada o maior centro cultural e artístico de Sergipe. Desde 1996 realiza, sempre na segunda semana de janeiro, um Festival de Arte. Antônio Lucena, em um artigo sobre Bittencourt Sampaio no Boletim SEI – Serviço Espírita de Informação, nº 1296, de 30/01/1993, escreveu que ele iniciou seus estudos na cidade natal. Nasceu em 1924 e desencarnou em 2011. Farmacêutico, dirigente da FEB, pesquisador do Espiritismo, biógrafo de Kardec e de muitos espíritas brasileiros. 10
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Bittencourt Sampaio
Na Revista “O Seareiro”, de janeiro de 2010, editada pelo Núcleo de Estudos Espíritas Amor e Esperança, de Diadema - SP, referindo-se ao menino Bittencourt Sampaio, consta que “Sua inteligência superava à das outras crianças do mesmo período escolar. Aprendeu a ler muito cedo e a formar trovas elogiadas pelos professores, pelo cabedal de conhecimento que as ilustravam, no sentido poético e de teor educativo. Jovem e muito afoito nos estudos, Bittencourt Sampaio não perdia seu tempo com os devaneios dos amigos da mesma idade. Enquanto esses queriam diversão, ele se debruçava sobre os livros de Direito, de temas políticos, de Jornalismo e de todos os assuntos que se referissem à Arte com todos os seus objetivos: músicas eruditas, teatro lírico com peças bem estruturadas, óperas de compositores famosos; enfim esse era o mundo que o atraía e ocupava seu campo mental”. Bittencourt Sampaio casou com Ana Juliêta em 19.07.1861, e teve três filhos11. Foi jurisconsulto, magistrado, político, alto funcionário público, jornalista, literato, renomado poeta lírico e excelente médium espírita. Tendo principiado seus estudos de Direito na Faculdade do Recife, continuou-os na Academia de S. Paulo (atual Faculdade de Direito), fazendo parte da turma de Bento Luís de Oliveira Lisboa, Manoel Alves de Araújo, Eleutério da Silva
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Vide capitulo I da Segunda Parte deste livro.
23 Prado e outros nomes notáveis da política e da jurisprudência brasileiras. Interrompeu, em 1856, o seu curso acadêmico para acudir os conterrâneos enfermos, por ocasião da epidemia de cólera-morbo. Por esses serviços, a que se entregou desinteressadamente, foi condecorado pelo Governo Imperial com a Ordem da Rosa, que não aceitou por incompatível com suas ideias políticas. Quando ele interrompeu a faculdade para socorrer conterrâneos a cerca de 1.500 milhas náuticas de distância, que demandavam vários dias de navio, mesmo sem ser da área da saúde, deu mostras do notório sentimento cristão que possuía, já aos 22 anos de idade, muito antes de conhecer o Espiritismo. Talvez não tenha aceitado a Comenda porque já tinha ideias liberais, que mais tarde o fizeram ingressar no Partido Liberal, oposição ao Partido Monarquista, ou talvez não fosse chegado a honrarias, porque humilde de coração. Sobre essa belíssima atitude, voltemos à “O Seareiro” (op.cit): “Bittencourt Sampaio buscava, através da fé, forças para ajudar os médicos que, pela precariedade dos recursos medicinais, procuravam manter a higiene. Era aí, no princípio energético, através da água, que Bittencourt buscava, junto a Deus, o auxílio de que precisava. Ele não sabia explicar, mas sentia que suas mãos ficavam diferentes, ao tocar num recipiente com água. Até a mediunidade de cura começara a aflorar, além de sua facilidade poética e do carisma pessoal. Durante todo o tempo da epidemia, ele não parou. Os médicos ficaram admirados pelo quanto representava
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Bittencourt Sampaio
um filete de água que Bittencourt deixava correr pelas faces dos doentes, quando muitos se curavam. Ele só agradecia a Deus, em preces ditas em voz alta, para que todos pudessem crer num poder supremo que ultrapassava a ciência médica. Passado o período epidêmico da ‘cólera-morbo’, o governo imperial quis condecorá-lo com a ‘Ordem da Rosa’, mas Bittencourt Sampaio recusou essa condecoração porque dizia ele, aos colegas, que fizera esse trabalho como voluntário de uma Ordem pertencente a Deus e não a partido político algum. Este ato se espalhou por toda a Faculdade de Direito, que lhe fizeram uma surpresa entre os estudantes e professores com um discurso de ‘Honra ao Mérito’ que também ficou só em palavras, porque Bittencourt Sampaio não aceitou medalha nem coisa alguma material que lhe fosse entregue, dizendo, em agradecimento, que Deus já lhe havia dado a maior ‘honra’, em ter ajudado com a sobrevivência de muitos e a dele próprio”. Bastante querido pelos seus colegas, colaborou na revista “O Guaianá” (1856), dos estudantes de Direito, e em outras publicações literárias de S. Paulo, como em “A Legenda”, nos “Ensinos Literários” do Ateneu Paulistano, na “Revista Mensal do Ensaio Filosófico Paulistano”, no “Correio Paulistano”, etc. Armindo Guaraná, que também biografou Bittencourt Sampaio (Dicionário Bio-bibliográfico Sergipano), acrescenta as seguintes publicações no Rio de Janeiro: “Revista Popular”, “Revista Brasileira”, “Cruzeiro”, “Gazeta da Tarde” e “A República”.
25 O ilustre jornalista, político e historiador professor Dr. Almeida Nogueira, que o conheceu de perto, deixou-nos, em rápidas pinceladas, esta descrição de sua figura12: “Alto, louro, pálido, olhos azuis, encovados e muito expressivos, cabelos crescidos e atirados para trás, descobrindo-lhe a fronte iluminada pelo talento e pela inspiração. Fisionomia romântica e extremamente simpática.” N’ “O Kalidoscópio”, jornal acadêmico de 1860, publicação do Instituto Acadêmico Paulista, um estudante, que se assinava Sandoval, assim retratou Bittencourt Sampaio aos 16 de Maio de 1860: “Contam que Buffon não escrevia uma só das admiráveis páginas da ‘História dos Animais’, sem que estivesse de casaca bordada, e chapéu de pasta ao lado; o Sr. Bittencourt Sampaio não rima uma quadra, sem que tenha invergado sua casaca azul, de botões amarelos, e um boné da mesma fazenda na cabeça. O Hino ao Sol foi escrito assim, sob os auspícios dos heroicos botões amarelos da casaca azul. “Ele começa uma poesia: ― se lhe falta um termo para completar um verso, atira a pena, e vai passear. “Ainda não é tempo” ― diz, muito senhor de si. Ele já sabe o que lhe vai pelo espírito e pelo papel, quando a inspiração o subjuga. Ao terminar a Ode à Liberdade, às seis horas da tarde, de 7 de Setembro de 1857, tremia que nem vara verde. Se quiseram ouvi-la, foi preciso que um dos amigos presentes lh’a arrebatasse das mãos. 12 NOGUEIRA, J.L. de Almeida. A Academia de S. Paulo ― Tradições e Reminiscências ― Estudantes, Estudantões e Estudantadas. Quinta Série, S. Paulo, 1908.
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Bittencourt Sampaio
“Era então bem restrito o número de seus íntimos. Destes só me lembra o Sr. Tavares Bastos. Conversava-se sobre arte, discutiam-se as teorias dos contrastes de Vitor Hugo, bebia-se champagne, assentavam-se as bases do futuro literário da Pátria, e fumava-se um cigarro de Campinas, no meio de bons ditos e dos propósitos sisudos. A já citada revista “O Seareiro” corrobora com essas informações quando assinala que “Bittencourt Sampaio era afável com todos, mas de poucos amigos. Sua conversação não agradava aos jovens e ele não encontrava assuntos porque o seu interesse era discutir os contrastes nas teorias de Victor Hugo, o futuro literário tão precário, para ele, no Brasil, as ideias de George Sand e seus escritos. O único amigo que acompanhava seus ideais, a respeito da poesia, música etc. era o senhor Tavares Bastos”. “Enquanto isso, as casuarinas sussurravam, e abriam aquelas boas-noites, que o poeta depois cantou num metro delicado, numa canção de extasiar. “E esses tempos não voltam mais... “Às vezes some-se. Ninguém sabe dele. Em casa não está. O que anda fazendo aquele doido? Perguntam os seus íntimos. Ora, o que anda fazendo? Anda sonhando, conversando com a Natureza, fazendo devaneios, e tudo isso com tanta habilidade e paixão, como a George Sand fazia seus doces ao forno, nas horas que não trabalhava em Lélia, ou na Indiana. “Não visita a muita gente. Vai pouco ao espetáculo. Mas, ama a conversação, como ama as mulheres e as flores, e a poe-
27 sia e a música. Toca violão, e canta lundus da Bahia: é uma das suas boas horas”. Declara Spencer Vampré13 que Bitencourt Sampaio se celebrizou na Academia de Direito não pelos seus versos ingênuos e bucólicos, mas pelo hino ― “A Mocidade Acadêmica”, “cujos acentos entusiásticos, e arrojadas hipérboles, não parecem condizer com um sereno e risonho contemplador da Natureza”. E continua Vampré: “Escreveu a música, verdadeiramente inspirada, do Hino Acadêmico, o gênio de Carlos Gomes, que assim legou á mocidade do Brasil uma das suas mais emocionantes criações. Quem quer que tenha percorrido, estudante, os sombrios corredores do velho Convento de S. Francisco14, ouve, sempre, com redobrada emoção, as estrofes cheias de fé, e a música cheia de arrancos heroicos, do “Hino Acadêmico.” Nas obras já citadas em nota, de Spencer Vampré (vol. I, págs. 461-2) e de Almeida Nogueira (Quinta Série, págs. 190-5), os nossos leitores poderão tomar conhecimento da letra da música desse hino. No youtube digite “A Mocidade Acadêmica” e aparecerá um vídeo com um coral cantando o “Hino Acadêmico”. Bacharelando-se em 1859, Bittencourt Sampaio exerceu a promotoria pública em Itabaiana e Laranjeiras, em 18601861, trabalhando ainda como inspetor do distrito literário na primeira dessas comarcas. Em Março de 1861, retirou-se da Província de Sergipe, vindo para a antiga Corte do Rio de VAMPRÉ, Spencer. Memórias para a História da Academia de São Paulo. Vol 1, Livraria Acadêmica, São Paulo, 1924. 13
14
Onde, então, funcionava a Academia de Direito de S. Paulo - Nota da Editora.
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Bittencourt Sampaio
Janeiro, onde abriu banca de advogado, que frequentou por muitos anos. Por essa época, o jornalista, crítico e ensaísta fluminense José Joaquim Pessanha Póvoa conheceu Bittencourt Sampaio na república de Macedo Soares, situada na rua do Olvidor, e onde se reuniam, por vezes, os estudantes de Direito, entre eles Belizário S. de Souza, Melo Matos, G. Pinto Moreira, afinal, ‘a boêmia literária daquele quarteirão latino’. E eis como Peçanha Póvoa se refere ao primoroso artista de “Flores Silvestres15”: “Sempre cheio de alegrias íntimas, simpático, traquinas como um colegial em hora de recreio, de casaca azul de botões amarelos, chapéu branco, luvas e calçado parisienses, ora em passeio pelos arrebaldes, ora nos teatros ou em diversas reuniões de estudantes, era estimado o seu coração justamente recompensado na lealdade com que servia aos seus amigos (...).” E, mais adiante, lembrava ainda: “Era a alegria da casa, o iniciador de divertimentos úteis, de saraus literários e musicais. Não esperdiçava seus talentos no emprego de horas consagradas à crápula dos lupanares, no assassino regaço das camélias. Nunca amesquiou a sua individualidade, nem aviltou sua inteligência.” Na sessão fúnebre celebrada, em 1858, em homenagem ao Dr. Gabriel José Rodrigues dos Santos, lente catedrático da Academia de Direito, profunda sensação apoderou-se de todo o auditório quando, ao assomar à tribuna, Bittencourt Sampaio recitou comovente poesia, iniciada pelo tocante quarteto: 15
PÓVOA, Pessanha. Anos Acadêmicos. S. Paulo (1860-1869), Rio de Janeiro, 1870.
29 Morte! Palavra que traduz mistério! Sombra nas trevas a vagar perdida! Pálido círio de clarões funéreo! Negro fantasma que abraça à vida! Esta quadra – diz-nos Armindo Guaraná – por muito tempo serviu de epígrafe às noticias fúnebres e aos discursos necrológicos. Quem desejar se aprofundar mais, Armindo Guaraná escreveu que: “Além dos autores já referidos escreveram sobre seus dotes literários e suas obras ― Salvador de Mendonça na “Revista Popular”, Pessanha Povoa nos “Annos Acadêmicos”, Inocêncio da Silva no “Dicionário Bibliográfico Portuguez”, Eunapio-Deiró no “Jornal Bibliográphico Brasileiro”, Valentim Magalhães nas “Notas à margem”, senador Octaviano Rosa, Joaquim Serra e outros entre os quaes o próprio filho, seu homonymo, no “Almanach Popular Brasileiro”, de Pelotas, para o anno de 1902”. Militando na política, filiou-se ao partido liberal. Eleito, pela sua Província, deputado à Assembleia Geral Legislativa, nas legislaturas de 1864-1866 e 1867-1870, foi, nesse último período, Presidente do Espírito Santo, nomeado por carta imperial de 29 de Setembro de 1867, cargo que exerceu até 26 de Abril de 1868, para voltar ao desempenho do mandato legislativo na Corte. Em 1870, abraçando as ideias republicanas, desligou-se do partido a que pertencia e fez-se ardoroso propagandista da República. Nessa qualidade, assinou, ao lado de Saldanha
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Bittencourt Sampaio
da Gama, Quintino Bocayuva e outros, o célebre Manifesto de 3 de Dezembro de 1870, que tão larga repercussão teve, tornando-se importantíssimo documento histórico. Como político, colaborou ativamente em “A Reforma”, órgão do Partido Liberal da Corte, e em algumas folhas mais, entre elas “A Republica”, da qual era um dos redatores. Com Aristides Lobo, Alfredo Pinto, Pompílio de Albuquerque e outros, foi um dos fundadores do Partido Republicano Federal, em 12 de Janeiro de 1873. O Manifesto Republicano foi uma declaração publicada no Rio de Janeiro por sessenta intelectuais, membros dissidentes do Partido Liberal, e representou o marco simbólico do início da campanha contra a monarquia no país. Esse documento reuniu e divulgou as medidas que seriam adotadas com a implantação de um governo republicano e federalista. “O Seareiro” (op.cit), informa: “Bittencourt Sampaio foi muito respeitado, como jornalista e político, pela elevação, sinceridade e cumpridor de seus ideais, deixando claro seus feitos como gostava de se defender, dizendo que a política que exercia era em defesa dos mais fracos e não a de se associar aos corruptores e aproveitadores do poder. Com alta moral, característica de seu estilo de vida, ninguém se opunha a seu mandato”. Jornalista, não só era reputado pelo brilho de seus artigos, mas também, grandemente respeitado pela elevação, sinceridade e firmeza com que sustentava e defendia seus ideais políticos.
31 Proclamada a República, foi comissionado para inventariar todos os papéis existentes na Câmara dos Deputados, cargo que deixou para exercer o de redator dos debates na Assembléia Constituinte, em 1890. Foi o primeiro administrador da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro a gozar do titulo oficial de Diretor, já que até ao fim do Império os titulares a dirigiam como “bibliotecários”. Nomeado a 12 de Dezembro de 1889, empossou-se dois dias depois, tendo exercido o cargo até 15 de Outubro de 1892. Entre os poetas de sua geração, destacou-se tanto, que Silvio Romero disse a seu respeito16: “Em Bittencourt Sampaio predomina o lirismo local, tradicionalista, campesino, popular. Por este lado é um dos melhores poetas do Brasil; é mais natural e espontâneo do que Dias carneiro, Trajano Galvão e Bruno Seabra, e é mais elevado e artístico do que Juvenal Galeno. Rivaliza com Joaquim Serra e Melo Moraes Filho.” Elogiando as verdadeiras jóias de “Flores Silvestres”, Silvio Romero salientou: “Há nelas duas qualidades de composições: as de inspiração local e sertaneja e as de inspiração mais geral. Numas e noutras os dotes principais do poeta são ― a melodia do verso, a graciosidade que o faz primar em pequenos quadros, e certa nostalgia pelas cenas, pela vida simples, fácil, descuidada das regiões sertanejas e campesinas.” No “Compêndio da História da Literatura Brasileira” (1906), de Silvio Romero e João Ribeiro, de novo é enaltecida, ROMERO, Silvio. História da Literatura Brasileira. 2ª edição melhorada pelo Autor, tomo II, Rio de Janeiro, 1903. 16
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nas paginas 221 a 223, a obra poética de Bittencourt Sampaio. Macedo Soares, por sua vez, num estudo crítico, lhe deu, entre os líricos brasileiros, o primeiro lugar, logo depois de Gonçalves Dias. Citemos algumas das principais obras, em prosa e verso, que lhe granjearam tão elevada reputação como prosador e poeta em que desde cedo se patenteara o “filósofo idealista”: Harmonias Brasileiras – Poesias de Bittencourt Sampaio, Macedo Soares e Salvador de Mendonça, publicadas em S. Paulo, 1859; Flores Silvestres; Lamartinianas (tradução de poesias de Lamartine); Poemas da Escravidão (versos originais e tradução de versos de Longfellow); A Bela Sara (tradução das “Orientais”, de Victor Hugo); A nau da liberdade (poema épico); Hiawatha (versos); Cartas de Além Túmulo (publicadas no “Cruzeiro” e na “Gazeta da Tarde” do Rio de Janeiro); Nossa Senhora da Piedade (legenda publicada no “Monitor Católico”); Dicionário da Língua Indígena; além de inéditos. Armindo Guaraná acrescenta “Relatório” com que foi aberta a sessão extraordinária da Assembleia Legislativa Provincial do ano de 1868. Valentim Magalhães disse, a propósito dos “Poemas da Escravidão”, que Bittencourt Sampaio “foi um dos mais admiráveis talentos da nossa literatura no período de transição; dir-se-ia que conhecia os segredos das supremas tristezas humanas e foi o representante dedicado da escola criada por Goeth, Byron...”. Reveladores de inteligência superior e invulgar, de uma cultura vastíssima e de uma alma que já dos páramos espirituais descera enamorada dos sublimados ideais que inspiram
33 as grandes e imorredouras obras, os trabalhos que vimos de mencionar, muitos deles, senão todos, dignos de figurar nas seletas que os estudantes manuseiam nas escolas. Entretanto, a relação acima não se acha completa, pois que um deixamos intencionalmente de incluir ali, para realçá-lo, porque, dentre todos, é o que, ao nosso ver, mais avulta, não somente pelo fulgor inexcedível da forma, como, sobretudo, pela originalidade do assunto cuja altitude imprime à obra valor inestimável. Aludimos à sua “A Divina Epopeia de João Evangelista” (Rio de Janeiro, Tipografia Nacional, 1882), única, cremos, no gênero, em todo o mundo. Dos que compõem a presente geração de espíritas, poucos hão de ser, provavelmente, os que saibam o que seja essa Divina Epopéia, cumprindo-nos, portanto, dizer-lhe que é o quarto Evangelho, o de João, posto em versos decassílabos, soltos, metro empregado sempre nas composições épicas, por ser sem dúvida o que melhor lhes imprime a grandiosidade que as deve caracterizar e que sobreleva na obra a que aludimos. E não é tudo: essa composição poética ele a completou, escrevendo para o volume uma segunda parte, em prosa, na qual o que em cada um dos cantos se contém é explicado à luz da Revelação Espírita, precedidas tais explicações de longa “Prefação”, onde exuberantemente explanada se acha a questão da divindade de Jesus. Salientou Almeida Nogueira que, ”quanto ao merecimento literário da obra, foi objeto de justa admiração da crítica a felicidade com que o poeta reproduziu em belos versos o texto quase literal da epopéia do discípulo amado.”
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Armindo Guaraná, no seu “Dicionário Bio-Bibliográfico Sergipano”, escreveu que A Divina Epopéia “é talvez a melhor obra deste autor”. Colaborou em vários jornais e revistas de São Paulo e do Rio, havendo nessas cidades ruas como o nome de Bittencourt Sampaio. Do Rio, podemos citar, afora as publicações já relacionadas aqui, a “Revista Popular”, a “Revista Brasileira”, “O Cruzeiro”, a “Gazeta da Tarde”, etc. Segundo, ainda, “O Seareiro” (op.cit), “Apesar de toda essa integração com a advocacia, os meios políticos, literários, o que se sabe é que Bittencourt não era indiferente à Doutrina Espírita. Pelo contrário, aos poucos, ele foi assimilando a ideia religiosa, desde que notara a mediunidade de cura. Ao ingressar na política, teve vários encontros com o então vereador e médico Dr. Bezerra de Menezes. Em 1878, quando o também advogado Dr. Antônio Luis Sayão, recebeu das mãos do médium Bittencourt Sampaio, uma porção medicamentosa, isto é: dois frascos que foram preenchidos com água e gotas de tinturas homeopáticas, que vieram a salvar sua esposa de uma doença incurável aos olhos da Medicina, atendendo a tantos outros chamamentos mediúnicos, Bittencourt passou a se dedicar com mais atenção ao Espiritismo, estudando a base kardequiana. O próprio Sayão, após esse fato ocorrido com sua esposa, passou a frequentar o grupo onde Bittencourt trabalhou durante anos, com o nome “Deus, Cristo e Caridade”. E depois, por divergências entre os colaboradores, quando foi dissolvido esse
35 grupo, Sayão junto com Bittencourt fundou o “Grupo dos Humildes”. Não se sabe quando ele entrou para o Espiritismo, mas a 2 de Agosto de 1873 já fazia parte da Diretoria do “Grupo Confúcio”, primeira sociedade espírita surgida em terras cariocas. Lá desenvolveu sua mediunidade receitista, curando muitos doentes com remédios homeopatas. Assinala Almeida Nogueira que Bittencourt Sampaio foi atraído pelo Espiritismo pelos fenômenos, assunto este que ele estudou profundamente, mas foi a parte moral que mais impressionou o poetafilósofo. “Confúcio” era o pseudônimo de um Espírito da equipe de Ismael, protetor espiritual do Brasil, e o Grupo teria sido fundado sobre a inspiração daquela falange de benfeitores. Bittencourt Sampaio fez parte da diretoria já no seu primeiro ano de atividades. Nesse Grupo, o Confúcio e Kardec deram comunicação. Foi nele que se originou o lema “Deus, Cristo e Caridade” e, em 1875, foi fundada a Revista Espírita do Brasil e traduzidas obras da Codificação Espírita. No livro “Brasil Coração do Mundo Pátria do Evangelho”, o Espírito Humberto de Campos, pela psicografia de Chico Xavier, no capítulo XXIII, assinala que “Nem todos os espiritistas modernos conhecem o fecundo labor daqueles humildes arroteadores dos terrenos inférteis da sociedade humana. A realidade é que eles lutaram denodadamente contra a opinião hostil do tempo, contra o anátema, o insulto e o ridículo e, sobretudo, contra as ondas reacionárias
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das trevas do mundo invisível, para levantarem bem alto a bandeira de Ismael, como manancial de luz para todos os espíritos e de conforto para todos os corações...”. E Humberto de Campos assinala: “... onde militavam espíritas lúcidos e sábios como Bittencourt Sampaio, que abandonara os fulgores enganosos da sua elevada posição na literatura e na política para se apegar às claridades do ideal cristão...” O Grupo durou apenas três anos, mas os mensageiros de Ismael, protetor espiritual do Brasil, triunfaram da discórdia que o destruiu e fundaram a Sociedade de Estudos Espíritas Deus, Cristo e Caridade. Jurandir Borges de Souza, no Prefácio do Livro “No Oásis de Ismael”, se refere a essa instituição pelo nome de “Sociedade Deus, Cristo e Caridade”. As divergências giravam entre os aspectos científico e religioso da Doutrina. Em 1877 um grupo se separou daquela Sociedade e fundou a Congregação Espírita Anjo Ismael e, no ano seguinte, outro grupo constituiu o Grupo Espírita Caridade. Em 1879 aquela Sociedade de Estudos deu lugar à Sociedade Acadêmica Deus, Cristo e Caridade, atendendo à orientação da ala “cientificista”. Aquelas divergências deram, ainda, origem a uma terceira instituição, o Grupo (ou Sociedade) Espírita Fraternidade, posteriormente alterado para “Sociedade Psicológica Fraternidade”. Funda, em 1876, a “Sociedade de Estudos Espíritas Deus, Cristo e Caridade”, presidindo-lhe os trabalhos, nos quais era parte importante o estudo dos Evangelhos à luz do Espiritismo.
37 Quando da passagem dos 180 anos de nascimento de Bittencourt Sampaio, o pesquisador Oceano Vieira de Melo apresentou, na Rádio Emmanuel (https://soundclod.com/ radioemannuel/cultura-espirita-programa), um programa especial em homenagem ao destacado pioneiro do Espiritismo no Brasil, no qual entrevistou o Sr. César Perri, então Presidente da Federação Espírita Brasileira, e o Sr. Jorge Damas Martins, escritor e historiador que se especializou na vida de Bezerra de Menezes e na história do Espiritismo no Brasil do fim do século XIX e início do XX. Segundo o Sr. Jorge Damas, Bittencourt Sampaio coordenava um grupo de estudo do Evangelho, do qual fazia parte Bezerra de Menezes, Sayão, dentre outros, os quais se diziam discípulos de Bittencourt Sampaio, que “conhecia o Evangelho de cor.” Fundado, em 1880, o “Grupo Espírita Fraternidade”, a ele Bittencourt Sampaio também empresta sua valiosa colaboração. Humberto de Campos se refere a essa instituição com o nome de Sociedade Espírita Fraternidade. O respeitável vulto do Espiritismo Cristão no Brasil, Dr. Antônio Luís Saião, que se convertera graças à mediunidade curadora de Bittencourt Sampaio, reúne então os médiuns da referida sociedade no “Grupo Ismael”, por ele criado e até hoje existente, e ali Bittencourt Sampaio se constituiu num dos intermediários de belas e instrutivas mensagens de Espíritos Superiores. Originariamente, o Saião fundara o “Grupo dos Humil-
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des”, juntamente com Bittencourt Sampaio, Frederico Pereira Júnior, João Gonçalves e outros. Depois foi que o “Grupo dos Humildes” se transformou no “Grupo de Estudos Evangélicos do Anjo Ismael” (6 de junho de 1880), ou, simplesmente “Grupo Ismael”, que veio a integrar-se na Federação Espírita Brasileira - FEB, fundada em 1º de janeiro de 1884. Em 17 de agosto de 1885 a FEB iniciou um ciclo de conferências públicas tendo sido Bittencourt Sampaio um de seus destacados oradores. Quando do falecimento de José Bonifácio, o Moço, em 26-10-1886, choraram a sua morte os mais belos talentos da época: Machado de Assis, Valentim Magalhães e Bittencourt Sampaio, entre os poetas, Rui Barbosa, entre os prosadores. Bittencourt escreveu esses versos de espírita: Sim! Ele entrou, de bênçãos radiante, Pelo portão de luz da eternidade, Qual águia, que, dos céus na imensidade, Livre revoa, tão de nós distante! Declara o “Reformador” de 15 de Outubro de 1895, que Bittencourt “se preparava para escrever a Divina Tragédia do Gólgota, quando, fruto maduro, foi colhido pela mão do celeste jardineiro”. Depois de sua desencarnação, o Espírito de Bittencourt Sampaio escreveu, pelo médium Frederico Junior, as seguintes obras: “Jesus Perante a Cristandade”, “De Jesus para as Crianças”, e “Do Calvário ao Apocalipse”.
39 Segundo Antônio Lucena, as psicografias ocorreram no Grupo Ismael, da FEB. O livro “Jesus Perante a Cristandade” é de 1898 e traznos preciosas informações sobre Jesus e sobre as deturpações que a Igreja Católica imprimiu às suas mensagens. Do Prefácio, destacamos o seguinte trecho, bastante elucidativo do conteúdo: “Sim; porque, há vinte séculos, pregada a sua doutrina, selada com o seu precioso sangue, os povos da Terra ainda não conhecem o verdadeiro Jesus, ainda não conhecem a sua verdadeira doutrina, ainda não praticam os seus verdadeiros ensinamentos; porque aqueles que tomaram sobre os seus ombros a tarefa de fazê-lo conhecido da humanidade segregaram-no, fecharam-no em sombras espessas de erros e de crimes, de sorte que o manso Cordeiro, o Divino Filho de Deus não pode ser visto pelos seus irmãos da Terra, nem a sua doce e persuasiva palavra pode penetrar as consciências fechadas, trancadas pela mão dos que deviam ser os primeiros a lhes darem toda a expansão, fazendo-as compreender toda a sua verdade.” O livro “Do Calvário ao Apocalipse” é de 1907 e trata da vida dos Apóstolos após a crucificação de Jesus até ao desdobramento de João, no seu exilio em Patmos. Quanto ao livro “De Jesus para as Crianças”, conseguimos apurar que fora psicografado pelo médium Frederico da Silva Júnior (1858-1914) e que a Federação Espírita Brasileira, preocupada com a formação moral da criança, o editou em 1901. Segundo o já citado historiador Jorge Damas,
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não era um livro apenas para as crianças físicas, mas para todo aquele que se assemelhasse a uma criança, conforme palavras de Jesus: “Deixai vim a mim os pequeninos...”, referindo-se aos puros de coração. É dele também a informação que o livro faz um apanhado desde Moisés e os Dez Mandamentos até à mensagem de amor de Jesus. Tais, em ligeiro e imperfeito escorço, a personalidade humana e a individualidade espiritual daquele que se chamou, entre nós, Francisco Leite de Bittencourt Sampaio e que, desde quando volveu à vida de Espírito livre, se constituiu, entre os eleitos do Senhor, guia indefeso, protetor caridoso e clarividente orientador da Federação Espírita Brasileira, que nunca deixou de lhe sentir o braço potente a ampará-la, nos momentos difíceis ou graves, que bastas vezes tem ela atravessado, no transcurso da sua existência de quase um século. Encerremos com mais um trecho da revista “O Seareiro” (op.cit): “ No dia 10 de outubro de 1895, ele vem a desencarnar no Rio de Janeiro. Mas, como todos aqueles que conseguem desempenhar as missões que lhes são atribuídas durante a reencarnação, logo que retornou à pátria espiritual, continuou a tarefa, através da mediunidade. E, pelo médium Frederico Junior, encontrou Bittencourt afinidades cristãs e trouxe três obras literárias que foram editadas pela FEB: ‘Jesus perante a Cristandade’, em 1897. Em 1901, Frederico Junior recebeu: ‘De Jesus para as Crianças’ e, em 1907: ‘Do Calvário ao Apocalipse’. Todas essas obras passaram pelas mãos dos críticos que conheciam perfeitamente o estilo incomparável de Bittencourt Sampaio e não houve dúvida alguma: eram autênticas.
41 Isso se deu porque Frederico Junior era um homem simples, sem conhecimento algum de gramática, operário, homem do povo, mas temente a Deus e responsável pelos trabalhos que executava no ‘Grupo Espírita Fraternidade’, no Rio de Janeiro”.