A INDEPENDÊNCIA DAS TREZE COLÔNIAS INGLESAS DA AMÉRICA DO NORTE: A REVOLUÇÃO AMERICANA (1776)
1. Durante o século XVII a Inglaterra foi abalada por revoluções e lutas político-religiosas que assinalaram a crise do absolutismo monárquico. Grupos de puritanos ingleses, perseguidos por suas idéias políticas (antiabsolutistas) e por suas crenças religiosas (protestantes calvinistas), foram obrigados a abandonar a Inglaterra, fixando-se na costa leste da América do Norte, onde fundaram as primeiras colônias. A colonização inglesa nessa região foi facilitada pela decadência da Espanha, que, concentrando-se no eixo México – Peru, abandonara aqueles territórios, inicialmente integrantes de seu império americano. 1.1. As 13 colônias surgiram no território situado entre o oceano Atlântico e os montes Apalaches. Ao Norte, na região conhecida como Nova Inglaterra, o clima era temperado, semelhante ao europeu, propiciando apenas o cultivo de produtos agrícolas também existentes na Inglaterra. Ali realizouse uma colonização de povoamento, cujas principais características foram: • • •
o desenvolvimento de uma agricultura de subsistência, com base na pequena propriedade familiar (granjas) e no trabalho livre; o surgimento de cidades na costa leste (Boston, Filadélfia, Nova Iorque), cuja economia se baseava em indústrias manufatureiras e no comércio marítimo, realizado com as demais colônias do sul, com a América Central e com a África; a realização de um contrabando sistemático com as Antilhas, a despeito da proibição oficial das autoridades inglesas.
1.2. Em conseqüência desses fatores, estruturou-se nas colônias do norte uma economia voltada “para dentro”, baseada no mercado consumidor interno e com reduzidas exportações para a Inglaterra. A sociedade, por sua vez, era formada por uma camada média de agricultores granjeiros e por uma rica burguesia de industriais e comerciantes. 1.3. Ao sul, numa região de clima subtropical, desenvolveu-se uma colonização de exploração cujas principais características eram: • • • •
o desenvolvimento de uma economia fundada na grande propriedade agrária (latifúndio); a monocultura, com a produção de itens agrícolas de clima subtropical (arroz, tabaco e algodão); a utilização de mão de obra escrava de origem africana; a exportação, com a produção voltada para o atendimento das necessidades do mercado externo. 1.4.1.Este sistema, a que se dá o nome de plantation, gerou uma economia voltada “para fora”, com reduzido mercado interno e dependente das exportações para a metrópole. A sociedade sulina, por sua vez, caracterizou-se pela inexistência da camadas médias e pela polaridade entre uma imensa massa de escravos e uma rica e poderosa aristocracia agrária.
1.5. As colônias eram governadas por representantes oriundos da Inglaterra e nomeados pelo rei. Em cada uma delas os governadores ingleses eram assessorados por uma assembléia eleita pelos próprios colonos e encarregada de votar os impostos e as taxas locais. As relações entre as colônias e a metrópole caracterizaram-se desde o início por ampla autonomia políticoadministrativa em relação à Inglaterra. A tentativa da metrópole de impor às colônias uma política monopolista, arrochando o pacto colonial, foi a causa determinante da eclosão da luta de independência, ocorrida no final do século XVIII. 2. AS CAUSAS DA INDEPENDÊNCIA:
2.1. Naquela época, as colônias já possuíam uma próspera economia baseada nas exportações de tabaco e anil, no comércio de peles, madeiras, farinha e peixe salgado, na produção de manufaturas, na fabricação de rum e no tráfico africano, enquanto sua população crescera para cerca de três milhões de habitantes. Agravara-se, contudo, o descontentamento da burguesia nortista e da aristocracia sulina, cujos interesses econômicos eram prejudicados pela política mercantilista da Inglaterra. 2.2. Entre os fatores responsáveis pela independência das 13 colônias, destacam-se: a Guerra dos Sete Anos, a política monopolística da Inglaterra e as idéias do Iluminismo. A Guerra dos Sete Anos (1756-1763) foi um conflito anglo-francês que levou a Inglaterra a impor pesadas medidas restritivas à economia das suas colônias na América, a fim de aumentar seus ganhos metropolitanos. A guerra travou-se na Europa e também na América, onde os colonos tiveram importante papel na luta “contra os franceses e os índios”. As vitórias obtidas contribuíram para dar formação militar e fortalecer a consciência política dos habitantes das colônias americanas. Não se pode esquecer que os colonos adquiriram experiência militar, o que mais tarde seria útil nas lutas contra a própria Inglaterra. 2.3. Em função da grave crise econômico-financeira que afetara a Grã-Bretanha, como resultado do prolongado conflito com a França e outros, o Parlamento decide abandonar a célebre “Política de Negligência Salutar”, que norteara a colonização inglesa na América do Norte, e com a qual – nunca é demais repetir – os colonos estavam acostumados. 2.4. Para resolver a questão financeira, a Coroa intensificou sua política monopolística colonial. Assim, através de leis restritivas, o governo britânico tenta recuperar, de uma certa forma o “tempo perdido”. 2.5. A Coroa impõe às 13 colônias uma série de novos impostos e aumentando a repressão sobre as práticas de contrabando, o que afetou gravemente as atividades econômicas coloniais. Sendo assim, a difusão das idéias liberais do Iluminismo proveniente da Europa, exerceu oportunamente grande influência na luta dos colonos contra a opressão metropolitana, uma vez que defendiam o respeito aos direitos naturais do ser humano, a inviolabilidade do contrato social e o direito à rebelião conta a tirania. A ideologia liberal era difundida entre as elites das 13 colônias através de inúmeros panfletos, dos quais o mais célebre foi o Senso Comum, escrito por Thomas Paine. 2.6. As Principais Medidas Adotadas Pela Inglaterra e Atritos que Provocaram a Independência. 2.6.1.
A Lei do Açúcar de 1764: esta lei, reduzia de seis para três pence o imposto sobre o melado estrangeiro, mas estabelecia impostos adicionais sobre o açúcar, artigos de luxo, vinho, café, seda, roupas brancas. Ora, desde 1733 havia lei semelhante, mas os impostos sobre os produtos perdiam-se na ineficiência das alfândegas inglesas nas colônias. O que irritava os colonos não era tanto a Lei do açúcar, mas a disposição da Inglaterra em fazê-la cumprir. Criou-se uma corte na Nova Escócia com jurisdição sobre todas as colônias da América para punir os que não cumprisse esta e outras leis. A Lei do açúcar procurava destruir uma tradição dos colonos da América: comprar o melaço para o comércio triangular onde ele fosse oferecido em melhores condições. Isso significava que a escolha nem sempre recaía sobre as ilhas inglesas do Caribe, mas sobre as possessões francesas. 2.6.2. A Lei da Moeda (1764) : proibia a emissão de papéis de crédito na colônia, que, até então, eram usados como moeda. O objetivo era restringir a autonomia das colônias. 2.6.3. Lei do Selo, 1765: incidia sobre todos os documentos legais, livros e jornais publicados. Esta medida atingia em particular os comerciantes, que organizaram o “Congresso da Lei do Selo”. Houve um movimento de boicote ao comércio inglês, que em 1765 decaiu em 600 mil libras. O Parlamento viu-se obrigado a abolir a odiosa lei. Os colonos haviam demonstrado sua força. A Inglaterra retrocedia para avançar mais, logo em seguida. 2.6.4. Atos Townshend 1767: O ministro da fazenda, Charles Townshend, decretou as medidas, que lançavam impostos sobre o vidro, corantes e chá. A Assembléia de Nova York foi
dissolvida por não cumprir a Lei de Hospedagem. Foram nomeados novos funcionários para reprimir o contrabando, bastante praticado nas colônias. Novos protestos que resultaram na revogação destas medidas. 2.6.5. O “Massacre de Boston”(1770) : um choque entre americanos e soldados ingleses tornaria as relações entre as duas partes muito difíceis. Protestando contra os soldados, um grupo de colonos havia atirado bolas de neve contra o quartel. O comandante, assustado, mandara os soldados defenderem o prédio. Os soldados acabaram disparando sobre os manifestantes. Morreram quatro habitantes de Boston. Era 5 de março de 1770. O “massacre de Boston”, como ficou conhecido, foi usado largamente como propaganda dos que eram adeptos da separação. 2.6.6. Incidente do Chá “The Boston Tea Party” (1773) : para favorecer a Companhia das Índias Orientais, que estavam à beira da falência, o governo britânico lhe concede o monopólio da venda do chá para as colônias americanas. A reação dos colonos foi, pelo menos original. Primeiro a população procurou substituir o chá pelo café e chocolate para escapar ao monopólio. Além disto, na noite de 16 de dezembro de 1773, 150 colonos, disfarçados de índios, atacaram três navios no porto de Boston e atiraram o chá ao mar. Era a “Boston Tea Party” (Festa do Chá de Boston). 2.6.7. Leis Intoleráveis e o I Congresso Continental de Filadélfia – Declaração de Direito dos Colonos: o The Boston Tea Party, provocou violenta represália do governo inglês. Foram decretadas várias leis que os americanos passaram a chamar de “leis Intoleráveis”. A mais conhecida delas interditava o porto de Boston até que fosse pago o prejuízo dado pelos colonos. A colônia de Massachusetts era transformada em colônia real, o que emprestava grandes poderes a seu governador. O direito de reuniões foi restringido. A Inglaterra demonstrava que não toleraria oposições a suas leis. As colônias reagiram à repressão da metrópole realizando em 1774 o Primeiro Congresso Continental da Filadélfia, que reuniu os representantes locais. O resultado do Congresso foi a publicação de uma declaração de Direitos, reafirmando a ilegalidade dos impostos, que não tinham sido previamente aprovados por representantes do povo, e decidido realizar um boicote comercial às mercadorias inglesas. 2.6.8. II Congresso Continental de Filadélfia: a reação inglesa ao I Congresso da Filadélfia foi ambígua. Ao mesmo tempo que houve tentativas de conceder maiores regalias aos colonos, foi aumentado o número de soldados na colônia. Este aumento da força militar acabou levando a um inevitável choque entre a s forças dos colonos e as inglesas. Em Lexington e Concord houve os primeiros choques armados. Em meio a este início de hostilidades reuniuse o Segundo Congresso da Filadélfia. Este Congresso acabaria reunindo todas as colônias, inclusive a resistente Geórgia. Inicialmente, o Congresso apenas renovou seus protestos junto ao rei, que acabou decidindo declarar as colônias em rebeldia. Nesse Congresso Tom Payne lançou o seu famoso panfleto, O Senso Comum, que se transformou numa prédeclaração de independência. Em 4 de julho de 1776 o II Congresso da Filadélfia, aprovou a Declaração de Independência, redigida por Thomas Jefferson. 3. A GUERRA DA INDEPENDÊNCIA: 3.1. Da Declaração de Independência até sua conquista efetiva em 1783 transcorreram oito anos de guerra entre os insurretos (rebeldes norte-americanos) e os “jaquetas vermelhas” (tropas inglesas). Os norte-americanos, comandados por um rico fazendeiro da Virgínia, George Washington, eram carentes de experiência militar, de armas e de dinheiro, e tinham de combater, a um tempo, três inimigos: as tropas inglesas, os “legalistas” (colonos fiéis à Inglaterra) e as tribos indígenas, que, expulsas de suas terras pelos colonos americanos, haviam se aliado aos ingleses. 3.2. Os dois primeiros anos de guerra se caracterizaram por várias derrotas dos norte-americanos diante das tropas da Inglaterra. Entretanto, a vitória conquistada em 1777 na batalha de Saratoga alterou o curso da guerra a favor dos insurgentes. A partir dessa vitória, a França passou a fornecer ajuda militar e financeira aos norte-americanos, com o objetivo de enfraquecer a Inglaterra e desforrar-se da derrota sofrida na Guerra dos Sete Anos. Um corpo de voluntários
franceses, comandado pelo marquês de La Fayette, deslocou-se para a América do Norte para lutara ao lado dos colonos rebeldes e, em 1781, as tropas franco-americanas, agora contando também com o auxílio espanhol, obtiveram uma vitória decisiva sobre os ingleses na batalha de Yorktown. 3.3. Em 1783 a Inglaterra assinou o Tratado de Paris reconhecendo a independência das 13 colônias, que incorporaram todos os territórios a leste do rio Mississipi. A guerra de independência custara aos norte-americanos cerca de 70 mil mortos, e aos ingleses, além de vidas humanas, a perda de possessões na África e nas Antilhas para a França, e da ilha de Minorca e da Flórida para a Espanha. 4. A FORMAÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS: 4.1. Logo após a independência, travou-se um amplo debate a respeito de qual deveria ser a organização política do primeiro Estado Livre da América. De um lado, estavam os republicanos, liderados por Thomas Jefferson e defensores de um poder central meramente simbólico e grande autonomia dos Estados; de outro estavam os federalistas, liderados por Hamilton e Washington, partidários do fortalecimento do poder central. 4.2. A Constituição dos Estados Unidos da América, promulgada em 1787, representou uma solução de compromissos entre as duas tendências ao instaurar no país uma república federativa presidencialista. O federalismo e o presidencialismo tornavam-se assim as duas principais características da primeira democracia moderna. O novo regime político estabeleceu o princípio da divisão, harmonia e independência dos três poderes, inspirado na teoria de Montesquieu. O poder legislativo caberia a um Congresso formado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado; o poder executivo seria exercido por um presidente eleito por sufrágio direto; o poder judiciário caberia à Suprema Corte de Justiça, encarregada de zelar pela constituição e de julgar a constitucionalidade das leis. 4.3. Em 1789 George Washington, o herói da guerra de independência, foi eleito o primeiro presidente dos Estados Unidos. A independência desse país produziu grandes conseqüências na história contemporânea. No Novo Mundo, contribuiu para acelerar a crise do sistema colonial e exerceu profunda influência na Conjuração Mineira e no processo de independência da América espanhola. No Velho Mundo, enfraqueceu momentaneamente o poderio colonial inglês e contribuiu para queda do absolutismo, influenciando a Revolução Francesa de 1789.