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SAMUEL BASTOS
NEURIVAN SOUSA
A poesia não usa venda nos olhos, antes cospe na cara pálida dos sonâmbulos as lepras e cegueiras que eles próprios carregam mas não admitem. Em “Cinelândia”, do poeta Paulo Rodrigues, a dinâmica da vida é um cinema em preto e branco, sob o play sistêmico do capitalismo selvagem, esse touch screen a erguer paradoxos, excluídos e demônios. Cada poema é um recorte dessa humanimaldade hollywoodiana, calçada sem ladrilhos onde o sangue dos oprimidos vocifera. Veja o poema Roliúde: sentava-se na esquina, / de costas pra rua. / a mesma camisa, / a mesma calça, / os mesmos sapatos. / era um homem / invisível. / catava feijão. / nunca ouviu falar / em mais-valia. / sonhou com um barranco, / na Serra Pelada. / curou-se da doença. / não do feijão. Como bem pontua o Prof. José Neres no prefácio intitulado “Palavras em movimento”, Paulo Rodrigues emprega uma linguagem concisa, quase cirúrgica, palavras e imagens com requintes de beleza e força poética ao explorar a temática social que atravessa toda a obra, ao mesmo tempo em que é bruta como a brita que os opressores atiram em nossas testas. É um livro que merece não só ser lido, mas também reconhecido pela crítica nesse tempo de engodo literário. A poesia de Paulo Rodrigues reverbera as nossas precariedades para além das páginas, para além das telas, para além dessa nossa Cinelândia arbitrária.
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