43 minute read

CARTAS À UNIVERSIDADE

DA CORAGEM

Sem ela, de pouco valem a vontade e as outras virtudes. Sendo necessária em todos os tempos, nesta era, de senso comum e falta de apego à procura e afirmação da verdade, a precisão dela é ingente. Constitui a alavanca para quebrar as amarras do conformismo e oportunismo, o acicate para correr o risco de ser personagem atípico nestes dias de demissão e entrega. Somente com o seu arrimo podemos estar verdadeiramente vivos, cultivar obrigações, memórias e sonhos, despejar chuva benfazeja na aridez axiológica, reacender a chama da espiritualidade e da sagração transcendente. É ela que permite avançar, ao colo da dor e nos braços da esperança, pelas plagas da inquietude cruciante, onde a vida respira em noites e dias de pasmo e em alvoradas de espanto. É dela que tem pavor a besta neoliberal, arrasadora do sentido da existência.

Advertisement

CARTAS À UNIVERSIDADE

“Todas as cartas de amor são / Ridículas. / Não seriam cartas de amor se não fossem / Ridículas./ Também escrevi em meu tempo cartas de amor,/ Como as outras, / Ridículas. / As cartas de amor, se há amor, / Têm de ser/ Ridículas. / Mas, afinal, / Só as criaturas que nunca escreveram / Cartas de amor/ É que são / Ridículas. / Quem me dera no tempo em que escrevia / Sem dar por isso/ Cartas de amor / Ridículas.” Álvaro de Campos

CARTA PRIMEIRA: POR CAUSA DO AMOR

Estou ciente de que não gostas de cartas. Desaprendeste de as escrever e ler. Aprecias mais os ‘papers’; estes não são exigentes no tocante à observância de regras gramaticais e de padrões estéticos, nem é preciso um vocabulário extenso para os redigir. Também sei que não aprecias os velhos. São uns chatos; citam nomes e livros antigos, e falam uma linguagem que te custa a entender. O pior é que fazem isto de propósito, pelo menos assim parece, para te chatear e causar fastio. Têm a mania de invocar coisas arcaicas e carcomidas pela poeira do tempo; nomeiam princípios, sentimentos e valores gastos e ultrapassados, sem préstimo para orientar o presente. O que é isso de ‘amizade’ e ‘fraternidade’, de ‘comunidade’ e ‘convivialidade’, de ‘partilha’, de ‘compromissos’ e ‘projetos comuns’?! Essa joça passou à história.

Mas não desisto de ti. Por muito que te sintas incomodada, vou enviar-te uma série de cartas de amor. Não te rias! Nós, os idosos, podemos perder a capacidade de realizar a função, mas amamos cada vez mais com os olhos e o coração. Devias até estar orgulhosa da nossa conduta, porquanto te honramos e não deixamos ficar mal. Sim, não negamos a ciência e a formação intelectual e racional, nem fazemos a apologia da ignorância. Por exemplo, nunca publiquei no Facebook textos a afirmar que o Covid-19 é invenção de interesses obscuros, e outras atoardas. Olha que isto não é de somenos importância. Devias encarar a hipótese de tirar o diploma e o lugar a gente ‘tua’ (mestres, doutores, professores e editores de revistas) que procede assim. Ela é fontela inquinada de descrédito, de desonra e vergonha para ti. Tu não te importas?! Não te abespinhes, pois, com as missivas que vou enviar. São uma prova do quanto te quero. Lê, com atenção, as palavras; não censures e deturpes a intenção que as inspira e determina.

CARTA SEGUNDA: AINDA EXISTE A UNIVERSIDADE?

Para início de conversa poderia invocar o famoso pregão de Ortega y Gasset (1883-1955): “Eu sou eu e as minhas circunstâncias; se as não salvo a elas, não me salvo a mim.” O ilustre pensador é autor de um livro que continua atualíssimo e te convinha ler: ‘Missão da Universidade’. Todavia, vou proceder a outra proclamação, aparentemente dissonante na forma, mas idêntica na substância: a universidade não tem que

salvar o mundo, tem que se salvar a ela! Porquê? Caiu e apodrece na teia que as circunstâncias lhe armaram. Enamorou-se delas e, assim, perde-se e ajuda a perder o entorno. A partir da década de 80 do século passado, o ensino superior entrou em crise profunda, ocasionada por agendas político-económicas. Os efeitos da dominação da economia pela finança e da política por ambas são assaz visíveis no campo académico. Chamemos as coisas pelo nome: o ultraliberalismo assentou arraiais na organização e orientação dos cursos, da investigação, da burocracia e de tudo. Na universidade tão bem avaliada pelos rankings e ufana de ‘start-ups’, ‘spin-offs’ e ‘patentes’, o livre debate de ideias (não o de ‘achismos’!) encontra-se desincentivado. Quem o cultivar torna-se marginal ao sistema, não é premiado. Desta forma, o ‘produtivismo’ é uma mistificação: multiplica o idêntico, oprime e tritura o diferente e divergente.[1] Ainda pode a universidade contemporânea ser chamada ‘Universidade’? Não, não pode; é uma escola técnica. É por isso que escrevo, em minúsculo, a letra inicial do teu nome. Vejo definhada a razão para continuar a usar a letra maiúscula.

Olha-te ao espelho, retira os cremes e vernizes, repara bem na tua figura. Seria bom, se sentisses vontade de fugir do que vês refletido na imagem, e agisses em conformidade. Percebes o que escrevi? Não precisas de ir ao dicionário; recorre ao saber que ainda resta dentro de ti. [1] Byung-Chul Han, no ensaio ‘A Expulsão do Outro’ (Editora Relógio D’Água), caracteriza assim o teor do produtivismo em voga na universidade: “A proliferação do idêntico faz-se passar por crescimento. Mas, a partir de um determinado momento, a produção já não é produtiva, mas destrutiva...”

CARTA TERCEIRA: HORA DA VERDADE

Este é o tempo perfeito para mostrares o que vales, para fazeres escolhas e dizeres qual é o teu lado. E para medir a confiança que pode ser investida em ti. Por duas razões: há uma densa circulação de fanatismo, manipulação e mentiras em curso; e não é pequena a onda de angústia, penúria e sofrimento que atinge a maioria das pessoas, acarretando perda da esperança em si mesmas, na sociedade e na democracia, no presente e futuro do país e do mundo. Porque não sais afoita a terreiro com assertivas e inequívocas declarações e tomadas de partido sobre os anseios que inquietam a Nação e a Humanidade? Não ouves o crepitar das labaredas? Não te assustam? Perdeste o pio? Dispões, pois, de uma oportunidade ideal para comprovar a tua valia. Mas para isso não servem subterfúgios, como o ‘decálogo’ divulgado pelos magníficos reitores, há algumas semanas. Aquilo é um ramalhete de floreados inócuos e despidos de autenticidade dos propósitos e desideratos. Ninguém de bom senso cai na esparrela de semelhantes jogos de ilusionismo. Porém teve um mérito: na tentativa de dissimular o desassossego, pô-lo a nu, embora contorne a questão do mal que te corrói as vísceras: preferes a ‘instrução’ e ‘funcionalização’ à ‘Formação’, abjuras e tomas esta por adversária dos teus intentos, desvairados no meu entender. Hoje fico por aqui. A missiva é curta, porém pletórica de recados, requerentes de tempo para ser mastigados e digeridos. Amanhã compensarei a contenção e poupança destas linhas. Prometo que não serei forreta.

CARTA QUARTA: DA NEGAÇÃO E TRAIÇÃO DAS OBRIGAÇÕES

Nos dias maus, volto-me para Deus e pergunto, como Florbela Espanca (1894-1930): “Diz-me, por que não nasci igual aos outros, sem dúvidas, sem desejos de impossível?” Nos dias bons, penso exatamente o contrário, coleciono inquietudes e desejos; gosto de me medir com o impossível, como diria Miguel Torga (1907-1995). Hoje é um dia bom: um dia igual aos outros, agitado por desafios morais. Pronuncio-os, num tom relativamente agreste, nada ponderado. Isso deve-se ao facto de não apreciar falinhas mansas, cumprimentos e salamaleques balofos, gente indiferente e hostil para os fracos, subserviente e lambe-botas dos fortes. Não contes comigo para te escrever louvaminhas candidatas a prémios e prebendas. Estou cada vez mais inclinado para o estilo maçador e panfletário. Que hei de fazer? Não consigo esquecer Immanuel Kant! Venho refrescar-te a memória, para ver se avivas a consciência. De tanto te deitares em cama alheia, esqueceste quem és. Talvez até nem reconheças a fisionomia, mesmo que seja espetada diante dos teus olhos. És um Narciso; não tiras a vista da água. Tens a incumbência de cultivar e elevar o nível intelectual da sociedade, bem como de supervisionar os caminhos seguidos por ela. Para tanto és, por definição, uma instituição livre, autónoma e independente, acima de qualquer tutela ideológica ou credo religioso. Hoje faltas clamorosamente a tal obrigação e abdicas do estatuto. Estás abaixo e acuada, domada e submissa, serventuária de corporações, interesses e lóbis ilegítimos. Falas a língua e usas os adereços que albardam e aparelham o mundo. Ademais, sendo poucos os académicos que excedem a permissão da lei, a maioria deles faz muito menos do que a axiologia e a ética exigem. Que nome se dá a isto, minha querida? Não sejas demasiado severa; aplica tão-somente os termos corretos para designar a involução. Presta atenção! Na história da universidade não são parcos os capítulos de negação e traição. Queres exemplos? A Universidade de Berlim, criada por Wilhelm von Humboldt (1767-1835) para servir de padrão da Universidade da Modernidade e para irradiar a luz da ‘Formação’ (Bildung), acomodou-se mais tarde no colo do nazismo e tornou-se um ninho parideiro de quadros nazis.

Também temos mazelas caseiras! O Marquês de Pombal decidiu, em 1763, abolir a distinção entre cristãos-novos e cristãos-velhos, acabar com práticas de estigmatização dos primeiros e ordenar a supressão das referências àquela diferenciação nos estatutos e livros de confrarias, concelhos municipais, ofícios públicos, escolas e da universidade. A decisão foi implementada, mas arrostou fortes protestos. Não maginas de quem foi um deles: da Universidade de Coimbra! O passado de traição das Universidades exige, pois, vigilância. Nas últimas décadas tens caminhado para um destino trágico. Cuidado, o hábito faz o monge! Porque não anulas e mudas de rumo?!

CARTA QUINTA: DO SER ‘POLITÉCNICO’

Venho falar-te das origens, esquecidas ou ignoradas. És herdeira da Escola ‘Politécnica’, avessa ao levantamento de muros entre a ciência e as artes. Estas fecundam aquela e tudo quanto é criação; e contribuem para derrubar a estultice, para ligar o inseparável, para mostrar a ciência incluída na ‘Politecnia’, na ‘Paideia’ e ‘Arété’. Tens noção do significado de ‘Politecnia’? No Renascimento e nos períodos áureos do Humanismo e do Iluminismo designava-se ‘politécnico’ o indivíduo que, fiel à etimologia do termo, cultivava uma pluralidade de ‘técnicas’ (com o sentido grego de ‘techné’): a anatomia, astronomia, caligrafia, filosofia, geologia, literatura, música, poesia, pintura, equitação, esgrima, dança, enfim, as artes performativas do espírito e do corpo. O sujeito ‘politécnico’ era amante do que está ínsito no conceito de ‘Universidade’: da beleza e da claridade, ativamente empenhado no aperfeiçoamento intelectual e moral, espiritual e corporal, de

sentimentos, atitudes e gestos nobres, universalista, liberto de preconceitos e aberto ao mundo, não murado psicológica e cognitivamente. Hoje o significado do vocábulo está adulterado. É prisioneiro da pobreza simbólica e da ‘tecnicização do mundo’, prenunciada por Martin Heidegger (‘Ser e Tempo’). Ambas montam e encorajam a besta da incultura, da frivolidade e da leviandade; o conjunto é a mais grave ameaça que se abate sobre a Universidade e a Humanidade. São configurações da ‘politecnia’ os formadores e os formandos? Pões as mãos no fogo pela totalidade? Imaginas-te um alfobre de cientistas e ‘inteligentes’. Deviam ser os mais espirituais e transparentes dos humanos, porquanto a inteligência não é matéria. Alguns são escuros, da cor do ‘pantrampismo’ e oportunismo. É mister que desconfiemos deles; não medem os estragos que causam. Seguem os cavaleiros de antanho, que usavam a espada apenas como adorno pendurado na cintura. Fazem o mesmo à palavra; mantêm-na guardada a sete chaves; jamais a empunham e brandem contra a iniquidade. Não gostas que te escarrapachem a verdade na cara: trocaste a formação de quadros ‘politécnicos’ pela diplomação de sujeitos incultos! Fazes de conta que não percebes: na ementa da casa o prato principal é a ‘instrução funcionalizante’. Estás em perda de estrelas no Guia Michelin! Por este andar, não demoras a ficar sem nenhuma. Quem te avisa…

CARTA SEXTA: NECESSIDADE DE EXAME GERAL

Precisas de fazer um exame geral ao estado da saúde intelectual. É urgente! A tecnociência tomou conta das nossas vidas, de um modo avassalador, a tal ponto que as luzes da cultura, da erudição e da poética, das ‘coisas vagas’ (no dizer de Paul Valéry), se vão apagando, pouco a pouco. Paira no ar o negrume das cinzas, do desalento e do pasmo. A Modernidade e o Iluminismo foram a enterrar; e está proibida qualquer forma de transcendência da realidade e banalidade quotidianas. Na universidade e noutras instâncias, agências e fundações de avaliação, de acreditação e financiamento dos docentes, dos cursos e da investigação, medram ambientes, visões, orientações e regulamentos desvalorizadores e penalizadores dos epistemólogos, dos intelectuais e pensadores. De todos os lados surgem conselhos e vozeirões a dizer aos académicos que, não obstante os gritos e pedidos de socorro oriundos do putrefacto estado do mundo, não devem entregar-se à busca da beleza e do encantamento, à denúncia e rejeição do grotesco. Regrides e aceitas, sem contestação, a imposição do credo único. Tornas-te trituradora da intelectualidade. O engessamento e a falta de respiração das ideias são evidentes. Há demasiada presunção e vanidade, e escassa inquietude; muita gente fechada na redoma das certezas, e pouca aberta à indagação e ao mistério. Ora, o Ser Humano desponta da noção de que pouco ou nada sabe, da visão de incompletude e finitude, da inatingível mas desafiante perfeição. E não é isto que hoje predomina no teu perímetro. Os avanços são assinaláveis no campo do conhecimento das coisas físicas, gerando um contentamento justificado, que devia ser temperado e sublimado. Olvidas que só o natural é passível de verificação empírica. O sagrado, sobrenatural, fantástico, sublime, magnífico, ‘divino’, isto é, o ‘superior’ escapa a tal avaliação; mas existe! E tu propendes a desconsiderá-lo; definha, a olhos vistos, a preocupação de enaltecer esse aspeto. Basta consultar os planos de estudo e o cardápio de objetivos e competências, ponderar a extensão e o peso das matérias atinentes, para registar o destrato e desfazer ilusões. Abandonaste, paulatinamente, essa frente. Apesar do avolumar dos alertas, não se vislumbram sinais de correção do caminho. A generalidade dos discursos oficiais e oficiosos não passa de mero exercício de retórica, estéril de consequências. O que diria Albert Einstein se voltasse ao teu palco? Para ele o sentido do misterioso era a mais profunda e sublime experiência do Ser Humano, e igualmente o princípio básico de todo o

empreendimento sério em arte e ciência. A ausência dessa experiência e da necessidade dela é típica de alguém, se não morto, pelo menos cego. Desculpa a franqueza e radicalidade do diagnóstico. Talvez assim te comovas e aceites a recomendação inicial desta missiva. Não deixes, enquanto é tempo, que as metástases alastrem no teu corpo. Parafraseando Lídia Jorge, não abandones ao relento a forma mais impressiva de falar para o interior daquilo a que, à falta de melhor designação, chamamos alma.

CARTA SÉTIMA: DIVÓRCIO DA TRANSCENDÊNCIA

Impeço a carta de hoje com uma citação de Marcel Proust (1871-1922): “A viagem da descoberta consiste não em achar novas paisagens, mas em ver com novos olhos.” És, por vocação, morada da Blimunda e do Sete-Sóis, estaleiro da Passarola e anfiteatro da metafísica. Porém esta transmutou-se; contenta-se com o desvão às escuras, sem curiosidade para captar a maravilha existente por detrás do empiricamente provado, e para cuja compreensão este podia abrir portas e funcionar como intermediário. Eis a deprimente conclusão: a autossatisfação e a soberba emparedaram a inquietação! Aquilo que apregoas e valorizas na avaliação dos méritos e labores dos teus membros expõe a vastidão da perda. Progrides, por um lado, e retrocedes, por outro. Não dás o justo lugar ao transcendente, ampliador da relevância e do significado, e conferidor de mais-valia ao transcendido, à boa, útil e ‘religiosa’ ciência que realizas e prescreve como Ser Humano e decente no relacionamento com os outros e o mundo. Para estares sob os holofotes, nas bocas e na ribalta do firmamento, abandonas o exigido e exigente cultivo da espiritualidade e intelectualidade. O que é um paradoxo e induz a queda na absurdidade e o resvalar para a inutilidade. Decretaste a morte da transcendência; o ‘Processo de Bolonha’ desfaz as dúvidas a esse respeito. Quando será que dirigentes e docentes vão confessar ‘mea culpa’? Os lídimos cientistas filiam a ciência na arte e casam ambas no esforço incessante de nos mostrar limitações e vulnerabilidades, de abeirar das impossibilidades, de encaminhar para o enriquecimento da estesia e da saudade daquilo que ansiamos, ou seja, para a celebração dionisíaca da vida. A Ciência, a Arte e a Poesia são irmãs-gémeas, pertencem à busca imaginativa, malgradro estarem ligadas a distintos domínios do conhecimento. Nenhuma é inferior ou vassala da outra. Os teoremas de Newton, a Vénus de Milo, os poemas de Fernando Pessoa e de outros vates cumprem a mesma missão. O fervor mercadológico não cede espaço a idílios, para ‘pensar fora da caixa’, cantar à chuva, pintar e exaltar o belo, denunciar a fealdade e injustiça. Contudo, precisamos da arte, como de oxigénio, de sol, de flores, frutos, músicas e danças. A ciência pode chegar além da pele, aos ossos e às entranhas, mas não determina a nossa essência. Hoje como sempre, a arte constitui fonte da ilusão e esta da felicidade; e é na aparência que se derramam a claridade e luminosidade capazes de balizar o Humano e de enraizar a ‘essência’. Pois é, tu devias ser um estádio olímpico com a pira prometeica sempre acesa. Ao invés, são mais os dias em que o clarão da razão está apagado e não vês a substância, sita por debaixo da aparência. Andas inebriada numa dança de fogos fátuos, que confundes com o arco-íris. Queres manter o fogo do espírito, mas falta-te e deitas fora a lenha para fazer essa fogueira. É isto que te compraz?!

CARTA OITAVA: NEM TUDO O QUE RELUZ É OURO!

Muito gostas da imitação e cópia simiescas da ‘novidade’, sobretudo a trazida de fora, não importando de onde! É um vício atávico. Não descansas enquanto não descartas o antigo. Achas que tudo o que reluz é ouro, mas não é.

Lê com atenção a avaliação de Delfim Santos (1907-1966), teu ex-aluno: “Nunca fui tão consciente da insuficiência da nossa Universidade como quando frequentei e trabalhei na Universidade de Viena, Berlim e Cambridge. Cheguei então à conclusão de que, relativamente às nossas, eram essas escolas paradoxalmente antiquadas, isto é, que nelas se conservava muito do que entre nós se destruíra e que valia muito mais do que a estrutura aparentemente renovadora imposta desde o século XVIII. Muito do que se destruiu terá que ser refeito, e destruído muito do que não merece conservar-se, embora mais moderno cronologicamente, mas antiquado relativamente aos valores humanos que a universidade tem por missão cultivar e favorecer.” Ficaste incomodada com o depoimento? Não é caso para isso; é antes para reinstalar o que indevidamente aboliste, efetuar uma limpeza e alijar a sujidade. Ser reconhecida aquém e alémfronteiras exige que entendas o significado do que és: uma instituição ‘semper reformanda’, nunca acabada. Presta atenção às palavras de Leon Tolstoi (1828-1910): “Se queres alcançar o universal, começa por pintar a tua aldeia.” Apetecia-me contar-te cenas ilustrativas da deplorável ‘pedagogia’ da intimidação, da censura e do amedrontamento, que ocorre nas tuas salas. Elas circulam por aí e não são raridade. Todavia, não estás disponível para as ler; sacodes a água do capote. Poupo-te ao desagrado e desconforto. Conheço de ginjeira os teus arcanos; nada em ti é surpreendente. Estamos em 2020, não em 1973! Vejo-te resignada, indiferente à advertência de Honoré de Balzac (1799-1850) de que “a resignação é um suicídio quotidiano.” Cuida da forma, da tua e da nossa, que é a ocupação principal da civilização. Acompanha os atletas de eleição, os meticulosos processos de treino que suportam, os ingentes trabalhos de Hércules em que se metem, para merecer o honroso selo de Homo Viator e Performator. ‘Forma-te’, refunda-te, substitui as roupas relhas e gastas, desbotadas e esmaecidas, deita-as fora, reveste-te de formas chamativas, pintadas com as cores da inconclusa procura do esplendor da Verdade. O teu edifício será então belo e resplandecente.

CARTA NONA: CUIDA DE HONRAR OS LEMAS FUNDADORES!

Acordei aziago, decidido a perturbar-te com a lembrança de umas quantas velharias. Para quê? Para não te entregares ao desleixo, seres ciosa de aprumo e asseio, poderes passear na rua sem receio de alvejamento com ovos estragados. “Libertas perfundet omnia luce – a liberdade ilumina todas as coisas.” Estás obrigada a este mandamento! Acresce o que foi estabelecido por Wilhelm von Humboldt: “Primado da verdade sobre a utilidade.” E aqueloutro inscrito na frontaria da Universidade de Heidelberg: “Ao espírito vivo.” Estes princípios e lemas estão moribundos, se é que não os enterraste já. Em seu lugar, salta aos olhos o seguinte: • Subjugação aos interesses ultraliberais e à lógica do mercado, acarretando perda de autonomia, burocratização, pauperização e proletarização dos docentes. • Substituição da ‘formação’ por instrução. • Abandono da visão humanista e da reflexão filosófica. • Menosprezo do pensamento e da razão. • Deslustre dos títulos e graus académicos, resultante do onzeneiro Processo de Bolonha: valem cada vez menos, cultural, social e economicamente. A dura realidade desdiz o engano ledo e quedo que persistes em difundir. Sim, perdeste o amor pelos tradicionais emblemas; estes não são mais intocáveis e caros. Obviamente, é reconfortante ler a divisa da Faculty of Education, Kasetsart University, Bangkok: “To educate graduate who are striven for intellectual competence and moral excelence – formar graduados que se esforcem por atingir competência intelectual e excelência moral.” Infelizmente, este é um distintivo do qual te afastas a passos largos.

Como sabes, o défice de seriedade moral supera e origina o financeiro; tende para uma desordem existencial, que convida a achar tudo ‘normal’ e a encolher os ombros. O investimento no progresso científico e tecnológico é de aplaudir. Mas precisamos, quiçá mais, de investir no progresso consciencial, cívico, ético, estético e comportamental. Não constitui isto um assunto estratégico? Não são da tua alçada a pronunciação sobre o tema e a intervenção no respetivo campo? Porque te manténs calada e ausente dele, como o diabo da cruz? Não desconheces qual é a doença do mundo; e não contribuis para a debelar pela raiz. Adoras os paliativos! Estes rendem chorudos dividendos e linhas de pesquisa que não se cansam de reproduzir o ululante e sobejamente conhecido. Destarte a enfermidade não sofre o mínimo abalo e prossegue a saga, e tu acumulas ganhos. És espertalhona! Não continues a atirar areia para os olhos e a poluir o ar com cantilenas de treta. O rei vai nu! Cresce o número dos que se apercebem disso e veem os teus podres à mostra. Não queres que os aponte? Ordenas que tome cicuta e abra as veias dos pulsos? Como se fosses Nero, e eu Séneca!

CARTA DÉCIMA: ONDE METESTE AS CAUSAS E UTOPIAS?

Albergas a representação intemporal da divina comédia. Os atores mudam. As causas caducam, outras surgem para preencher o vácuo e suscitar o empenhamento. Ora, pareces desinteressada de querer ser um habitat propício ao plantio de utopias iconoclastas, do cultural e humanisticamente sólido e duradoiro, do esteticamente belo e sublime, do eticamente edificante e irrepreensível. Subvertida pelo economês e financês, a ‘sabedoria’, que exalas, só retém o que não vale a pena. Desta forma coadjuvas na instauração da ‘idade das multidões’, obliteradora da individualidade, entendida como capacidade de julgamento racional. Sim, demites-te da formação de identidades e individualidades. Finges ignorar que não se herdam; são obra do caráter e das escolhas porfiadas e transpiradas entre as ofertas da caminhada, da sorte ou do acaso. Dedicas-te à produção em série de ‘mentalidades infantilizadas’ e ‘menorizadas’, de ‘subjetividades abstratas’, frágeis e ocas de conteúdo substancial e simbólico. Vendes gato por lebre, um amplo ror de promessas fantasiosas e delirantes; todos podem ser e ter a rodos o que queiram congeminar: astros e estrelas cintilantes, artistas, empresários, inovadores, investigadores etc., com sucesso pleno e garantido. A tara da ‘sucessoína’ deixa-os à mercê da manipulação sem escrúpulos. Podias e devias ser o local ideal de florescimento e frutificação do ‘Humanismo secular’, fundado na razão crítica, visando respostas para as questões humanas mais importantes e prementes. Porém faltas à obrigação; tens como infrene paixão as três pragas, que Friedrich Nietzsche (1844-1900) tanto deplorava na sua época: ‘Moment’ (momento), ‘Meinungen’(opiniões) e ‘Moden’ (modas). Vagueias ao sabor dessa epidemia, entregue a uma litania sintonizada com os cânones, as bulas, cantatas e receitas da doutrina neoliberal. Afinas pelo diapasão das estratégias de comunicação, que modelam as mentes para a abulia e aceitação passiva do que lhes é imposto. Estás convertida em ‘centro contabilístico’, em ‘empresa econometrista’ (hipermercado) do ‘hic et nunc’, de créditos e ‘saberes’ contáveis, efémeros, facilmente descartáveis e substituíveis, dispensadores das aulas e do estudo do livro. É precisa e fulminante a apreciação de Edgar Morin: a Universidade está a sofrer uma “pressão superadaptativa que força a conformar o ensino e a pesquisa às demandas económicas, técnicas, administrativas do momento, a se conformar aos últimos métodos, às últimas receitas no mercado, a reduzir o ensino geral, a marginalizar a cultura humanista. Ora, sempre na vida e na história, a superadaptação a condições dadas foi, não signo de vitalidade, mas anúncio de senilidade e morte, pela perda da substância inventiva e criadora.” Admito que os termos desta carta são excessivos e exagerados. O ‘excesso’é um dos traços do humano. E o exagero é germe e método de aprendizagem, mediante o choque que provoca. Não

CARTA DÉCIMA PRIMEIRA: NOÇÃO DA ‘FORMAÇÃO’ ADOTADA A toda a hora enches a boca e atroas os ouvidos com a propaganda de que ofereces uma ‘formação de excelência’. Estás mesmo convencida disso? Não é mais uma proclamação desmentida pelos factos? A aspiração de ‘formar’não é soterrada pela encomenda de ‘funcionalizar’? Que conceito de ‘formação’adotaste e consomes? Até um míope consegue enxergar! O lema ‘time is money’ invadiu e conspurcou o ‘locus’ universitário. Aceitaste ser estruturada para laborar em velocidade acelerada e fabricar, o mais rapidamente possível, ninhadas de quadros. Transformada em ‘escola-turbo’, encaras os estudantes como ‘sprinters’. Transmites-lhes o conhecimento e ‘cultura’ (?!) convenientes para a ‘ordem’ mercadológica vigente e não para a sua sólida formação humana. Deprecias o que tem fins para além do lucro e requer muito tempo. Cortas os laços entre cultura ou formação e política; a despolitização dos jovens está bem à vista, com sequelas terríveis para a sociedade. Digo sem papas na língua, a ‘formação’ em vigor é ‘hemiplégica’; arremeda a finalidade primeira da ‘Formação’: a autonomia, autodeterminação e emancipação do sujeito e o uso da razão (bitolas caras a Kant e outros Iluministas). A ‘Formação’ foi substituída por má instrução, prenhe de entendimento utilitarista, inspirada nos concursos televisivos, na banalidade e na perversa habituação à eliminação e exclusão. Vivemos em ‘dieta de formação’. Impera a ‘formação bulimista’, reflexo desta era volátil, inconstante e mesquinha, marcada por monolitismo, palidez e paralisia do pensamento, pela inépcia e inibição de questionar o real e os poderes factuais, de exercer e exercitar a consciência crítica, de ver e aceitar como familiar a Outridade, o diverso e estranho, de lobrigar contornos e pormenores. Enfim, não se respira o espírito da liberdade. Deste rápido sobrevoo extraio e ponho à tua consideração ‘perguntas inquietantes’: Que formação almejas para a jovem geração? Que projeção de Homem tens em mente? A tua opção é a ‘personalização’ ou a ‘reificação’, a ‘qualificação’ou a ‘degradação’ das pessoas a coisas, a entes moralmente irresponsáveis? Conformas-te ao rebaixamento a escola técnico-profissional? Não leves a mal, mas até duvido se percebes o interrogatório e sabes usar o raciocínio lógico para responder. Por conseguinte atrevo-me a dar-te explicações; são gratuitas! A ‘Formação’ subentende a capacidade para diferenciar, distinguir, qualificar, valorar coisas e factos. A ‘instrução’ vê tudo igual, como um alcoólico a quem todas as bebidas sabem ao mesmo, conquanto contenham álcool. A instrução instituída é uma contrafação, eivada de ‘anorexia ética’, precisamente o contrário do que este tempo carece como de pão para a boca. Daniel Goeudevert não podia ser mais incisivo na acusação: “A instrução (graduação académica) sem formação leva ao conhecimento sem consciência.” Julgas-te afrontada, mas é a verdade. Estamos a viver um período de ‘moral perdida’ e desmoralização. O mundo está sem bússola moral; o grito por socorro não ressoa dentro das tuas escolas. Porque é que não aderes a um modelo formativo voltado para acudir ao naufrágio? A versão de instrução, que praticas, quiçá sem dares conta, formata criaturas gordas e obesas de informações superficiais, magras e esqueléticas de lucidez, sabedoria, humanidade, inquietude e transcendência. Tudo isto se traduz em: • Esvaziamento do cerne humanista e iluminista da formação. • Animosidade contra a espiritualidade e a erudição. • Aprisionamento e imbecilização da mente. Afinal, o feitiço volta-se contra o feiticeiro: atinge em cheio a tua integridade. A sentença de Abel Salazar mantém a validade. Não sentes o soco no estômago? Perdão por me ter alongado em redundâncias; a didática autorizou a violação da regra!

Retomo a carta de ontem. Já ia longa; se lhe acrescentasse uma belga, poderias invocar um motivo para não a ler. Portanto, venho dar continuidade à conversa. Esta era parece apostada em impor a prevalência do ‘homo faber’ e ‘eficiens’ sobre todas as outras facetas do Humano. Os indivíduos nascem, crescem e são ‘educados’ como máquinas robotizadas. O tempo para a criatividade, espiritualidade, convivialidade e o ócio criativo experimenta uma acentuada recessão. E isto acontece até nas instituições ditas ‘melhores’ (como gostas de te classificar e gabar). Para te picar, recordo a afirmação de Mark Twain (1835-1910): “Para aqueles que têm apenas um martelo como ferramenta, todos os problemas parecem pregos.” Isto não te sussurra nada? A ‘instrução’, que patrocinas, promove o ‘recurso humano’ (que horrível designação!), exautora a Pessoa e favorece a obediência cega. Assegura o aplaudido e ‘recomendável’ entontecimento no interesse da ‘funcionalidade’. Logo, carecemos de uma ‘Formação’ que contrarie este envenenamento e danificação, e tenha como estrela de marear: • Ver o mundo com outros olhos. • Tomar decisões fundamentadas, assumir responsabilidade. • Questionar o sentido das coisas e dos factos. • Reforçar a substância da personalidade. • Capacitar a pessoa para estabelecer uma ordem consigo e com o mundo. • Fomentar a empatia, solidariedade e preocupação com a alteridade. • Firmar a paz com a Natureza. • Servir de fermento da coragem para dizer NÃO. • Encorajar a reclamar ‘matérias’ que elidam a indigência espiritual e estimulem o progresso intelectual e moral.

Necessitamos de uma ‘Formação’ que atenda a imploração de Eckhart von Hochheim (c. 1260 - c. 1327): ‘Deus, livrai-me de deus!’ Isto é, que livre dos deuses menores e rasteiros agora venerados. Claro, a formação humanista não é tudo; no vazio dela tudo é nada. O ‘achismo’, o ‘se calhar’ e a ‘obesidade mental’ sentam-se na tua mesa-de-jantar, e não medes as consequências. No teu seio há gente mais atafulhada de preconceitos do que hidratos de carbono, intoxicada de lugares-comuns, de estereótipos, juízos apressados, pensamentos tacanhos e slogans ao sabor da onda. Muitos opinam sobre tudo; não conhecem e tampouco sabem nada. A cultura é espezinhada. Sem ela não há ‘política’, comprometimento com o fado e devir da Pólis. Como afirmado em carta anterior, a despolitização da juventude é teia urdida para gerar a sociedade perdida. Há nisto exagero da minha parte? Não hesites em desmontar a injúria, em propiciar-me a oportunidade de emendar a mão. Serei lesto a expressar gratidão.

CARTA DÉCIMA TERCEIRA: DESAFIOS E REFLEXÕES IRRECUSÁVEIS

“Às instituições científicas cabe a responsabilidade pelo enriquecimento da cultura moral da nação”, proclamou Wilhelm von Humboldt. Não discordas, pois não?! Prepara-te então para o que vem.

Henri-Louis Bergson (1859-1941) disse o óbvio: “O olho vê apenas o que a mente está preparada para compreender.” A este lembrete junta-se o reparo de Bernardo Teixeira de Carvalho, escritor brasileiro: “A gente só enxerga o que está preparada para ver.”

Como não sentir desencanto com a miopia, que veiculas, com a cegueira face a um estilo de vida dominado pela obsessão da instantaneidade?! ‘Formar’ é, no dizer de Jean Guitton (1901-1999), tornar os indivíduos “mais aptos para a profissão de Homem”. Segundo o sociólogo Alain Touraine, o seu fito é o de preparar “indivíduos dissidentes”, que estranham e inquirem a sua cultura ideológica e buscam a transformação da situação. Por isso cabe interrogar-te: estás a formar os estudantes para a liberdade, a dignidade e a felicidade, traves-mestras da condição humana? Não andas a formatar, como escreveria Max Weber (1864-1920), “especialistas sem espírito, sensualistas sem coração”?! Tomo por boa e estimulante resposta o dito de Jules Renard (1864-1900): “O homem livre é aquele que não receia ir até ao fim da sua razão.“ Abusando da tua paciência, recomendo que atentes neste excerto das ‘Propostas do Serviço Nacional da Pastoral do Ensino Superior’, formuladas em Fátima em 27.03.2012: “Reiteramos a necessidade de não excluir do ensino a dimensão humana, ética e axiológica, porque corre-se o risco de um ensino exclusivamente técnico, perdendo a força ontológica do próprio ensino - ser superior no sentido crítico, intelectual e espiritual.” Entendes as ilações desta propositura? Se não ofereceres um ensino com elevado teor crítico, intelectual e espiritual, então ele não é ‘superior’; é inferior, e tu uma criatura do mesmo jaez! Não desprezes o agudo alerta do Papa Bento XVI, lançado no ‘Encontro com Jovens Professores Universitários’ (Madrid, 19.08.2011): “Às vezes pensa-se que a missão dum professor universitário seja hoje, exclusivamente, a de formar profissionais competentes e eficientes que satisfaçam as exigências laborais de cada período concreto. Diz-se também que a única coisa que se deve privilegiar, na presente conjuntura, é a capacitação meramente técnica. Sem dúvida, prospera na atualidade esta visão utilitarista da educação mesmo universitária, difundida especialmente a partir de âmbitos extrauniversitários. Contudo vós, que vivestes como eu a Universidade e que a viveis agora como docentes, sentis certamente o anseio de algo mais elevado que corresponda a todas as dimensões que constituem o homem. Como se sabe, quando a mera utilidade e o pragmatismo imediato se erigem como critério principal, os danos podem ser dramáticos: desde os abusos duma ciência que não reconhece limites para além de si mesma, até ao totalitarismo político que se reanima facilmente quando é eliminada toda a referência superior ao mero cálculo de poder. Ao invés, a genuína ideia de universidade é que nos preserva precisamente desta visão reducionista e distorcida do humano. Com efeito, a universidade foi, e deve continuar sendo, a casa onde se busca a verdade própria da pessoa humana.” Não ponho mais na carta de hoje. Ela leva matéria de sobra para te desafiar. Cuida de a ler várias vezes, da frente para trás e do final para o começo. Far-te-á bem, se a soberba não oprimir a humildade.

CARTA DÉCIMA QUARTA: ACORDA DA DORMÊNCIA!

Andas a diplomar papagaios, tagarelas e caixas-de-ressonância das aldrabices e onzenas ultraliberais. Duvidas disso? Então ouve o que falam, lê o que escrevem e observa o que fazem! É cria tua a súcia de vigaristas (políticos, economistas, magistrados, advogados, comentadores, jornalistas, etc.) que realiza negócios sujos, destrói bancos, enxameia e delapida a Nação. Não poucos alcoviteiros, caloteiros, farsantes, javardos e lapantins exibem diplomas concedidos por ti! Conheço de cor e salteado a máxima ‘quod natura non dat, Salamantica nos praestat’ ou ‘o que a família não dá, Coimbra não acrescenta’. Ela não iliba o fingimento e o lavar-as-mãos de Pilatos. Tens a estrita obrigação de habilitar e qualificar quadros propensos a abordar e lançar um olhar limpo e lúcido sobre as nojices do mundo. Não, não estou a colocar a fasquia num plano utópico! Respaldo-me em Michelangelo Buonarroti (1475-1564): “O nosso maior risco não é que as nossas aspirações sejam demasiado altas e não as consigamos concretizar, mas que sejam demasiado baixas e as alcancemos.” Não defendo o regresso do passado, nem pretendo carpir lágrimas por ele. Porém é necessário aprofundar e construir outra ‘ágora’. É imperiosa uma remissão discursiva e prática de normativos

cívicos, éticos e estéticos, que balizem a evolução do mundo e dos sujeitos e restrinjam a ‘subjugação técnica’, mercantilista e contabilística. Volto sempre ao tema da ‘Formação’. Não serve a que está em vigor. Se almejas ser um credível protagonista da mudança, opta por outra que interpele a realidade e indique patamares de excelsitude; e enraíze o apreço por obras supratemporais, inacabadas e permanentes. Quais os seus pilares? · Uma ‘revolução axiológica’ e ‘investida ética’, orientadas para a compaixão ou paixão pela Humanidade e pelo Outro, avessas ao estigma, à humilhação e à hipocrisia da caridade. • O reconhecimento da necessidade de ‘superação e transcendência’, de abertura e disponibilidade para a admiração, a altura, a contemplação, a espiritualidade, a ‘arte’, a criação, a estética, a excelência, a ‘performance’, o encantamento, o empolgamento, o espanto, o ilimitado, o integral, o sagrado, o supramundano. Tens o dever irrecusável de enfrentar os apologistas de um mercado desumanizado que te apouca e perverte, transforma paradigmas em ‘paradogmas’ e substitui a razão pela teologia e a lucidez pela aberração. É dificultosa e penosa a tarefa? Inspira-te no mineiro Guimarães Rosa (Grande Sertão: Veredas): “O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.” Não tens desassombro e arrojo para defrontar os reptos hodiernos? Pede auxílio a Millôr Fernandes (1923-2012): “Nunca tive medo, gente /Se onde há perigo /Alguém vai na minha frente.” À tua frente refulgem causas, ideais e princípios. Não os vês, tropeçaste no esquecimento. E olvidas que a ‘ambrosia’é o alimento dos deuses, e a ‘liberdade’ o sustento do Ser Humano. Isto não são penduricalhos! Os sujeitos livres não têm a consciência à venda, nem a boca afeita à mordaça. Atenta no testemunho do imperador Júlio César (101-44 a.C.): “Os cobardes morrem muitas vezes antes de morrerem de facto.” Apenas vive quem ousa viver contra a corrente. Estás viva de facto ou já morreste antecipadamente no conceito de quem te rodeia? Responde, por favor, sem manigâncias e rodeios!

CARTA DÉCIMA QUINTA: DO ‘MAGNÍFICO’ REITOR

Esta epístola é longa. Vais despender meia-hora na leitura. Será perda de tempo?! Não antecipes o desfecho e enfado; guarda-os para o final. In illo tempore, o dirigente máximo da Universidade era o Reitor, eleito por uma vasta assembleia, representativa de todos os corpos da academia. Agora a universidade tem o Conselho Geral (mais o Conselho de Curadores), integrado por conselheiros afins a senhores feudais; ele nomeia o reitor à maneira do CEO de uma empresa. O escolhido presta vassalagem a quem o escolhe; quiçá, pertence ao clã. Isto obriga-me a falar-te da espécie extinta, do seu perfil. Qual o intuito de mexer no passado e agitar a memória? Confio na tua perspicácia. Um Reitor é servidor incondicional da grei. Não encara os ‘hilotas’ como números de um ficheiro Excel, mirrados de alma e vontade. Não fala o linguajar pervertido (excelência, competitividade, eficiência, etc.), nem anseia controlar tudo e todos com o cetro de rei de um inferno burocrático. Se não estivesse com a Universidade, estaria ao serviço do quê e de quem? Acede ao cargo pela porta das causas intrínsecas, não para submeter a alma mater a ditames extrínsecos. Um Reitor lidera individualidades autênticas e frontais (é suposto que assim sejam os académicos). Evita que as divergências gerem conflitualidade e faz delas janelas abertas para ampliar os horizontes. Quer-se ‘magnífico’ na mestria do diálogo, das diferenças e da colegialidade, de maneira tão natural como é a de respirar. A Universidade é instituição amalgamada pela passagem dos tempos. Portanto espera-se que não confunda melhoria com mudança, que se solte da eventual ânsia reformista e deite fora a arrogante

tentação de mudar tudo. Ele é eleito para outro fim. Para que a comunidade académica escreva e adicione mais um capítulo feliz à história, e corporize, no mais alto grau, a aristocracia de valores de que é depositária. Isto só é possível com a mobilização e a valorização dos obreiros. O Reitor é primus inter pares. É em orquestra que se entretecem, tocam e cantam as peças, óperas e sinfonias da sublimidade.

‘Magnífico Reitor’ é uma personalidade sintonizada com a comunidade académica. Fala por ela e para fora dela, sobre as consumições da Sociedade e da Humanidade. É um ‘intelectual’ fidedigno, na aceção de Foucault, Bourdieu, Zygmunt Bauman e de tantos que os antecederam. Para isso não tem que dominar os autores clássicos, modernos e contemporâneos, embora tenha muitíssimo a ganhar e nada a perder com eles. Mas tem que beber nessa nascente e honrar o legado civilizacional e humanista, outorgado à Universidade. Para o ofício de Reitor são imprescindíveis convicções bem alicerçadas, para que o barco não ande ao sabor das marés. Dele exige-se que use o humilde ponto de interrogação, em vez das bazófias. Que elabore o relatório da Universidade não só com a enumeração de publicações e outras coisas (por mais relevantes que sejam), mas sobretudo com o modo como nela se vive: a harmonia, a justiça, o empenhamento e as relações humanas que nela reinam, a democracia que nela se pratica. Para tanto, ocupa-se com a criação de um clima de ‘honestidade alimentar’ e ‘elementar’, propício à frutificação da cultura do estar-bem, expressa pela prevalência da cooperação sobre a rivalidade, das atitudes morais sobre a imoralidade, da confiança e a emulação sobre a desconfiança e anulação do outro, da doação sobre a egolatria, da ação coletiva sobre o agir isolado, dos fins institucionais sobre as fixações individuais, do desenvolvimento sobre o arcaísmo, da realização pessoal sobre a falácia e frieza da eficácia. Um ‘Magnífico’ Reitor defende a autonomia e a independência da Universidade face a qualquer potentado, príncipe, magnata, igreja, seita ou corporação. Não para a fechar sobre si mesma, mas para observar o inalienável imperativo de intervir e agir na apologia do bem público. Defende-a dos agentes do empobrecimento espiritual e intelectual, da alienação e escravidão do espírito e da vida. Afirma-a como acrópole da ‘arété’. É pertinente sublinhar que a Universidade do Porto tem no logotipo a imagem de Minerva. Isto não é um ‘pormenor’! Pelo contrário, constitui um quadro de obrigações. Hegel (1770-1831) situa a função da filosofia no mito da coruja de Minerva, cujas asas abrem e levantam voo ao entardecer, ao lusco-fusco, quando a escuridão, o desespero e a desídia invadem a mente e o coração das pessoas. Logo, o magistério do Reitor tem que avocar e revigorar a missão de alumiar nas densas e medonhas noites de breu.

A universidade (com letra minúscula), para legitimar o uso da grafia maiúscula, precisa de repor um Reitor apto a ver a neblina e cerração em que vegeta, sensível à urgência de eleger outra via. Precisa de um Reitor dotado de verbo certeiro e possante, ao serviço da preservação da Universidade como entidade cuidadora da Comunidade Universal, obrigada a denunciar o aviltamento e descaso a que esta é sujeita. Um Reitor não nasce feito, nem vai pronto para a função. Faz-se, aprendendo a ser um genuíno ‘pontífice’, construtor de pontes que ponham pessoas e áreas em contacto, sem concessões às combinações e máscaras da falsidade. Fiel às insígnias da honorabilidade, pastoreia a academia com atitudes de desprendimento e simplicidade. Se assim atuar, encontrará a paga na satisfação do dever cumprido, conforme apontou Shakespeare (1564-1616): “Bem pago está quem por satisfeito se dá”.E como anunciou o Padre António Vieira (1608-1697) no Sermão da Terceira Quarta-Feira da Quaresma, pregado no ano de 1669: “Quem fez o que devia, devia o que fez: e ninguém espere paga de pagar o que deve. Se servi, se pelejei, se trabalhei, se venci, fiz o que devia ao rei, fiz o que devia à Pátria, fiz o que me devia a mim mesmo: e quem se desempenhou de tamanhas dívidas, não há de esperar outra paga.” Conheci vários Reitores ‘Magníficos’; e lidei de perto com alguns. Percebes de loiça? Eles eram porcelana da Vista Alegre! No entretanto foram ostracizados. O molde do fabrico está abandonado num vão de escada ou esquecido no poeirento e bafiento sótão de um museu. Se o trouxeres de volta, terás um ganho incalculável: receberás mil por um!

CARTA DÉCIMA SEXTA: SAUDADE DO FUTURO

A grande deusa lusíada é a saudade. Não do pretérito, mas do que há de vir. “O futuro é a aurora do passado”, proclamou Teixeira de Pascoaes (1877-1952). Para onde te levam os ventos desta era? Que fará de ti o grande escultor que é o tempo? Creio que continua a haver em ti bom senso; mas anda escondido, com medo do senso-comum. Não me sinto bem com o rumo que te impuseram e aceitas impavidamente, como se a rota seguida não tivesse nada de ruim. Não seria sensato abrirmos o Livro do Desassossego, mesmo sabendo que “há barcos para muitos portos, mas nenhum para a vida não doer”? Isto pede correspondência nas determinações e ações. São a qualidade, a alma, a paixão e a emoção dos professores que fazem a diferença na habilitação dos estudantes. Tais grandezas não se medem; sentem-se. Os números não servem para avaliar a função e a proficiência pedagógicas. Liberta-te da insensibilidade e insanidade dos burocratas, contabilistas e gestores que se instalaram na cabine do comando e matam, nos docentes, discentes e funcionários, os genes da dedicação, motivação, inovação e criatividade. Coloca no centro da agenda as questões do ensino e da formação. O balanço, por mais que desejasse, não logra ser risonho. Ele constitui o hemograma do inconformismo obrigatório e do pessimismo realista no tocante ao antes, ao agora e ao porvir. Recorro a Miguel Torga (Diário VII) para o fundamentar: “É fatal nesta pobre terra começarmos todos por ser revolucionários e acabarmos todos em académicos (…) Cada geração que chega vem, naturalmente, possessa de desígnios subversivos. Mas como daí a pouco tempo verifica que também ela não fez nada, que falhou, que envelheceu, acomoda-se e põe-se a justificar o que a princípio combatia. Mudam-se os sinais aos manifestos de outrora, e os ímpetos juvenis passam a mesuras senis.” Eis a descrição perfeita, tecida como luva, da atitude prevalecente numa larga fatia do povo universitário! Sócrates (ca. 469-399 a.C.), o filósofo da maiêutica, afirmou que não ensinamos nada a outrem; o melhor que conseguimos é tentar ensiná-lo a pensar. A isso acrescentou que a vida sem reflexão não vale a pena ser vivida. Sublinhe-se que uma vida refletida não é pera doce; é um fruto colhido por poucos. Essa tarefa dignificante da docência é impossível de ser cumprida por quem não sabe, nem gosta de pensar. Tal e qual como confiar à raposa a guarda do galinheiro! A aversão à reflexão, ao pensar e compreender, e a recusa em ver a forca, erguida à sua frente, são confrangedoras e fechadas à esperança de ressurreição. A academia inclina-se mais para a cumplicidade do silêncio e omissão do que para o protesto e intervenção. Não se afigura disponível para erguer o pendão das exigências e da responsabilização. Prefere ser distraída e entretida. O deixa-andar e a espera de um salvador expressam a conduta interiorizada. Para desgraça geral, a ‘coisa’ está feia, o céu carregado de nuvens e o sol encoberto. Não há luz no horizonte! Annah Arendt (1906-1975) acusa e corta com fio de espada: “Em nome de interesses pessoais muitos abdicam do pensamento crítico (…) Abdicar de pensar também é crime.” Os académicos estão obrigados à responsabilidade social. Porquê? Porque, assevera Noam Chomsky, têm condições para denunciar as maquinações, mentiras e intenções ocultas dos governantes e poderosos. Do que se trata? É deveras simples! Não devem imitar Mefistófeles, celebrar pactos com o diabo, renunciar a nobres sentimentos (amor, compaixão, solidariedade, tolerância), assistir quedos e mudos à incubação da serpente do mal, aceitar o exercício efémero do poder terreno e a danação eterna, a satisfação de ambições a qualquer preço, incluindo a queda nos tenebrosos abismos da perdição. Tinha atravessada na garganta esta espinha; acabei de a retirar. Alivei o coração e a alma, e desobriguei a consciência. Disse-te o que vejo, com toda a franqueza. Sinto-me apaziguado e tranquilo. Semeio as mágoas no vento de dezembro, para que as espalhe e delas floresçam camélias. Quem sabe, Jano trará um 2021 com cara auspiciosa!

CARTA FINAL: VOTOS DE DESPEDIDA

Chegou a hora de encerrar o namoro. Colocamo-lo entre parêntesis, por umas semanas; havemos de o retomar, quando o desejo seja irreprimível. A paixão cala-se, porém nunca morre; o mesmo não pode dizer a razão. Podia silenciar e lucrar com a cobardice; ao longo da carreira não fui capaz de adquirir essa competência. Como Florbela Espanca, “trago no olhar visões extraordinárias, de coisas que abracei de olhos fechados.” Isto compromete-me até ao tutano, não consente que atire para debaixo do tapete o aviso de Cornelius Castoriadis (1922-1997): “É preciso escolher: ou descansamos ou somos livres.” E muito menos o de Michel de Montaigne, 1533-1592): “A cobardia é mãe da crueldade.” Sabes o que te desejo? Que sejas ‘UniverCidade’, interveniente e com posições claras, partilhadas e públicas sobre as agruras e o destino da Pólis, da Cidade, da Sociedade e do Mundo. Queria que cumprisses o desígnio delineado por Raquel Varela: “Tempos houve em que a Igreja ocupava o lugar central das cidades. Hoje esse lugar é ocupado por um banco. Espero que um dia seja ocupado por uma universidade (…) A palavra escola tem a sua origem na palavra ócio, que para os gregos era o contrário de negócio. Ócio não era preguiça, era tempo de reflexão (…) Uma universidade – e este é o âmago da questão – não pode ser uma instituição que produz a formação da força de trabalho para o mercado. Ela é uma instituição de contrapoderes, seja à Igreja, ao Estado, aos partidos ou ao mercado. A sua função – temos que quebrar este tabu – não é adaptarse ‘ao que o mercado necessita’. O mercado, ou seja, a forma como hoje vivemos, produzimos e reproduzimos a sociedade, é que tem de vir com urgência à universidade para ser criticado, no lugar onde se produz conhecimento, onde se questiona o óbvio, onde se desafia, com coragem, o senso comum.” Vou concluir. Peço só mais um poucochinho da tua atenção! Moveu-me a intenção de discorrer à volta de assuntos multipolares, que se agigantam e ressoam, sobremaneira, no fundo das minhas apreensões. Perdi-me no trajeto da exposição, não atingi a meta da assertividade clarividente. Desculpa, remove o acessório e secundário, concentra-te no essencial e fundamental! Isto não é querer-te mal, pois não?! Continuo teimosamente enamorado de ti. És capaz de alcançar muito além e acima do lugar onde estás, do papel que andas a desempenhar. Lembrei-te os erros, porque são um tesouro; a confissão e a decantação deles acrescem o haver. Isso é propriedade de quem se reconhece falível e imperfeito. Tu existes para sobrepujar o chão, para iluminar a rasura com o clarão da altura. Fica bem, confortada e estimulada pelo avisado conselho de Marco Aurélio (121-180): “Nada de desgosto, nem de desânimo; se acabas de fracassar, recomeça.” E pelo suave remate de Álvaro de Campos: “Talvez, acabando, comeces…”

DO ANTICONFORMISMO OBRIGATÓRIO

Sim, a sociedade atual é muito melhor do que há 100 anos. Todavia, não esgotou a possibilidade e necessidade de ser melhorada. Sim, os humanos têm limitações inatas, mas também dispõem de aptidões de melhoria ilimitada do seu saber e conduta. Sim, o ‘paraíso’ capitalista trouxe acréscimo de bens; porém está pejado de agudos problemas, de indecências, indignidades e injustiças inaceitáveis. Sim, a democracia é o melhor de todos os regimes; contudo está longe de ter conseguido a configuração real correspondente ao ideal. Não é vaca sagrada ou entidade conclusa, fechada à discussão. Todas as suas instituições são aperfeiçoáveis.

Sim, ainda não logramos criar um modelo de organização e governo da comunidade que concretize, de maneira harmoniosa, as profundas aspirações da maioria dos cidadãos. Tudo isto é factual. Não podem, pois, calar-nos os poderes que intimam à conformação e omissão, a desistir de causas e utopias e de pugnar por mudanças e avanços, a aceitar e não interferir no curso ‘espontâneo’ do mundo. Foi essa a estratégia dos possidentes ao longo dos séculos. O progresso civilizacional não é dádiva deles; é uma conquista devida aos utópicos, persistentes e resistentes, aos que tiveram a lucidez e a coragem de afrontar os pregadores e senhores do imobilismo. Jesus de Nazaré nasceu e viveu em oposição à situação encontrada. A história não acabou. A Humanidade não atingiu o cume da perfeição. Hoje é apenas a alvorada de outro 'imperfeito' porvir, que legará aos vindouros uma infinidade de coisas por fazer.

This article is from: