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R O N A L D O C O S T A F E R N A N D E S

1 9 5 2 É de São Luís, nascido aqui em 1952, tendo se transferido para o Rio de Janeiro ainda criança. Em 1983, foi viver em Brasília e, de 1985 a 1995, morou na Venezuela, dirigindo, naquele país, o Centro de Estudos Brasileiros. A partir de 1995, esteve à frente da FUNARTE - Fundação Nacional de Arte, em Brasília, permanecendo no cargo até 2003. Atualmente, trabalha no Conselho Editorial do Senado Federal. Ficcionista, ensaísta e poeta, é Doutor em Literatura pela UnB. Na premiada carreira literária, ganhou o Prêmio Casas de las Américas com o romance O Morto Solidário, traduzido e publicado em Havana, Cuba, pela mesma Casa de las Américas e, no Brasil, pela editora Revan. Ganhou, entre outros, os prêmios de Revelação de Autor da APCA e o Guimarães Rosa. Na área do ensaio, publicou em 1996, pela editora Sette Letras, o livro O Narrador do romance, prêmio Austreségilo de Athayde, da UBE-RJ. No final de 97, Ronaldo publicou o romance Concerto para flauta e martelo, pela editora Revan, que foi finalista do prêmio Jabuti-98. No ano de 1998, saiu o livro de poesiasTerratreme livro que recebeu o Prêmio Bolsa de Literatura, pela Fundação Cultural do DF. Seus últimos livros de poesia ão: Terratreme (1998), Andarilho (2000) e Eterno Passageiro (2004). Em 2005, pela Ed. LGE, lança o romance O viúvo, que o crítico Adelto Gonçalves chamou “de uma das primeiras obras primas da literatura brasileira do séc. XXI”. Em 2007 lançou dois livros: Manual de Tortura (Esquina da Palavra, contos, 2007) e A Ideologia do personagem brasileiro (Editora da UnB, ensaio, 2007). Em 2009, sai A máquina das mãos, poemas, publicado pela 7Letras, que ganhou o Prêmio de Poesia 2010, da Academia Brasileira de Letras. Em dezembro de 2010 sai seu romance Um homem é muito pouco. Seu mais recente livro é Memória dos Porcos, de 2012.

A IMAGINAÇÃO DOS BASTARDOS

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270http://www.guesaerrante.com.br/2007/6/26/Pagina890.htm http://ronaldocostafernandes.blogspot.com.br/ http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/distrito_federal/ronaldo_costa_fernandes.html http://www.algumapoesia.com.br/poesia3/poesianet263.htm http://blog.7letras.com.br/2010/06/maquina-das-maos-ganha-premio-abl-de.html http://maranharte.blogspot.com.br/2012/08/opiniao-de-pedra-jomar-moraes_21.html http://baque-blogdogeraldolima.blogspot.com.br/2010/04/ronaldo-costa-fernandes-escritor_10.html http://www.yasni.com.br/costa+fernandes/busca+pessoas/ronaldo 271 http://www.jornaldepoesia.jor.br/rcfernandes.html#bio http://www.mallarmargens.com/2013/11/5-poemas-de-ronaldo-costa-fernandes.html http://www.andregiusti.com.br/site/ronaldo-costa-fernandes-outro-grande-poeta-maranhense/

não duvido da existência do hálito de Deus. Somos as raízes mortas cheirando a ferro, respirando o incenso do monóxido de carbono. As putas recolhem entre as pernas a espécie sutil de réptil seco de Johntex: o pânico feito de elástico, músculo e noite.

VESTIDO DE FERRO

Tudo teu é de ferro: bolsa, armário e escova de dente. Teu vestido de betume brilha um céu de gesso e espessura.

Os sapatos caminham léguas de carmim.

As lixas de unha limam a aspereza dos amores fugidios, estes amores de lama e rosa, que enferrujam na lixa no tempo.

Os carretéis de linha não bordam a vida, é de náilon tua costura do medo.

E, por fim, teus perfumes amargam a beleza fescenina de nunca atingir o clímax ou preferir a rigidez do aroma.

ANIMAL BARBADO

Este animal que se rasura como quem raspa a orelha do porco para a feijoada de fim de semana, este animal feroz e matutino, como um auto-retrato, como seus olhos 3 x 4, observa a paisagem da janela e do outro lado do vidro está ele mesmo, é ele a paisagem que envelhece cada vez que a freqüenta. Este homem ao espelho, gilete de martírios e angústias violáceas, barbeia seu minuto e sua morte, exasperada e afiada servidão, a consciência espumosa da pequena guilhotina.

OUTUBRO

Odeio as geladeiras que conservam corpos esquartejados;

as agendas que escrevem à mão o futuro. Os cães daqui de casa latem para o sol como os lobos para a lua. Não são duas faces da mesma moeda, mas as duas moedas da mesma face da vida.

Quero ser uno e dois, aprender com a disciplina dos becos, lá onde a saída é a entrada. Quero ser estático e andarilho, aprender com a disciplina dos rios que se movem sem sair do lugar.

O DESERTO

E vai o deserto comendo terra fértil alargando sua plantação de grãos, seu pasto de areia, sua colonização de secos, seu plantio de nada. Na vastidão igual do arenoso, erosão das águas e do vento, o deserto — qual mercúrio no rio — vai tomando o espírito e cobre de areia tudo: os móveis, a louça, as roupas — bate nas janelas com seu ô de casa farinheiro e, por fim, atinge o ânimo que se esmirra, granula-se, erode a avança a cada dia dois palmos de vazio que é a medida do pasmo e o metro dos absenteístas.

MECANICISMO

Oh, as lavouras mecânicas, fábricas de trigos, usinas de legumes, máquinas de frutas, a lavoura artificial dos que plantam como que rega um lírio de plástico.

AFOGADO

O mar, em sua ressaca, vive em eterno vômito. Cheio de algas e fantasia devolve o que não lhe pertence.

E guarda em si o peixe e o estômago embrulhado e não devolve o navio naufragado porque as embarcações são árvores de ferro

que a tragédia plantou. Em seus intestinos de água em ebulição só o náufrago ele rejeita porque o náufrago é uma outra caricatura mórbida de um peixe sem barbatana de um peixe sem guelra o afogado é um corpo estranho o afogado é, mesmo morto, a presen9a da terra na digestão salgada.

Tudo cabe no estômago de água do oceano, mas feroz e decidido se recusa a digerir o que é da terra e não pertence ao desvario piscoso das mares.

Assim também devolvo o afogado que não pertence á aquosa e uterina imaginação de ânfora plena de liquens e aflições de salitre nada que não faca parte do inconsciente marítimo dos meus prazeres submersos.

AS PUTAS

E Deus disse e ganharás a vida com o suor do teu rosto. Depois ficou pensativo e concluiu: não bem com o suor do rosto, mas com outros suores que mais tarde entenderás. Suores e gemidos de tal sorte excretados não do fundo da vagina mas dos grandes lábios que nada pronunciam lá onde nada se ouve como o eco do vazio

ou a cascata de um rio seco.

CANTO DO CASTIGO

Há dias que não consigo aprender minha pouca matéria. Só tenho um ano repetente, oclusivo, recorrente: o ano em que me reprovei. Já fui mais quando tinha menos corpo. Se o corpo se alonga, quem negará que a mente ganha gordura, extensão e músculos?

Não soube me podar, meus braços já não germinam. Não tenho mais primaveras, conto apenas o castigo. Sou o último da sala vazia. Escrever no quadro cada vez mais negro: Meu erro é um zero ao quadrado. Quando me fui buscar na escola,

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