ALL EM REVISTA, V. 5; n. 2, abril-junho - 2018

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ALL EM REVISTA REVISTA (ELETRÔNICA) DA ACADEMIA LUDOVICENSE DE LETRAS

EDITOR: LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Prefixo Editorial 917536

2018 – ANO DE GRAÇA ARANHA

NÚMERO ATUAL - V. 5, N. 2, 2018 – ABRIL A JUNHO SÃO LUIS – MARANHÃO


2014– ano de MARIA FIRMINA DOS REIS

2016 – ANO DE COELHO NETO

2015 – ano de MÁRIO MARTINS MEIRELES

2017 - ANO DE JOSUÉ MONTELO


A presente obra está sendo publicada sob a forma de coletânea de textos fornecidos voluntariamente por seus autores, com as devidas revisões de forma e conteúdo. Estas colaborações são de exclusiva responsabilidade dos autores sem compensação financeira, mas mantendo seus direitos autorais, segundo a legislação em vigor.

EXPEDIENTE ACADEMIA LUDOVICENSE DE LETRAS COMISSÃO DE PUBLICAÇÕES E EVENTO SANATIEL PEREIRA (PRESIDENTE) ANTONIO AÍLTON DILERCY ADLER CLORES HOLANDA CONSELHO EDITORIAL SANATIEL PEREIRA (PRESIDENTE) ANTONIO AÍLTON DILERCY ADLER

EDITOR Leopoldo Gil Dulcio Vaz Prefixo Editorial 917536 vazleopoldo@hotmail.com Rua Titânia, 88 – Recanto de Vinhais 65070-580 – São Luis – Maranhão (98) 3236-2076 # (98) 8119 1322 ENDEREÇO ACADEMIA LUDOVICENSE DE LETRAS Palácio Cristo Rei – UFMA / Sala do Memorial Gonçalves Dias Praça. Gonçalves Dias, 351 - Centro: São Luís - MA. CEP: 65042-240. TELEFONES: (98)3272-9651/9659

ALL EM REVISTA Revista (eletrônica) da Academia Ludovicense de Letras A Academia Ludovicense de Letras – ALL –, fundada em 10 de agosto de 2013, ―tem por finalidade o desenvolvimento e a difusão da cultura e da literatura ludovicense, a defesa das tradições literárias do Maranhão e, particularmente, de São Luís, a perpétua renovação e revitalização do legado da Atenas Brasileira, o culto às origens da cidade e à sua formação pelas letras, a valorização do vernáculo e o intercâmbio com os centros de atividades culturais do Maranhão, do Brasil e do exterior‖ (Art. 2º, do Estatuto Social). Em seu artigo 58, ―Além de outras que venham a ser criadas, constituem o rol permanente das publicações oficiais da Academia a Revista, os Perfis Acadêmicos e a Antologia.‖. Esta Revista, apresentada em formato eletrônico, destina-se à divulgação do fazer literário dos membros da Academia Ludovicense de Letras – ALL . Está dividida em sessões, que conterão os: DISCURSOS E PRONUNCIAMENTOS dos sócios da Instituição, e de literatos convidados, não pertencentes ao seu quadro social; ALL NA MÍDIA resgata as colaborações nas diversas mídias, quando identificados como membros da ALL; ARTIGOS, CRÔNICAS, OPINIÕES manifestas pelos membros da Academia; POESIAS de autoria de seus membros. Haverá uma sessão DE ICNOGRAFIA, registrandose as atividades da ALL, e aquelas em que seus membros tenham participado, assim como a divulgação de nosso CALENDÁRIO DE EVENTOS. Poderá, ainda, conter ASSUNTOS ADMINISTRATIVOS, referentes a questões estatutárias, regulamento, e avisos. As colaborações não poderão ultrapassar 30 laudas – formato A4, Times New Roman, em Word, espaço único, com ilustrações. Normas de publicação ABNT. Os contatos são feitos através de seu Editor, pelo endereço eletrônico vazleopoldo@hotmail.com

NOSSA CAPA: Escudo da ALL

Retrato de Graça Aranha


ALL EM REVISTA Revista (eletrônica) da Academia Ludovicense de Letras ENDEREÇO PARA CORRESPONDENCIA: EDITOR Leopoldo Gil Dulcio Vaz Prefixo Editorial 917536 vazleopoldo@hotmail.com Rua Titânia, 88 – Recanto de Vinhais 65070-580 – São Luis – Maranhão (98) 3236-2076 #

NUMEROS PUBLICADOS – ENDEREÇO ELETRONICO 2014 V.1, n. 1, 2014 (janeiro/março) http://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_volume_1_numero_1_ma V.1, n. 2, 2014 (abril/junho) http://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_volume_1_numero_2_ V.1, n. 3, 2014 (julho/setembro) http://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_vol_1__n_3__julho-_34d409e2ef5b18 V. 1, n. 4, 2014 (outubro a dezembro). http://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_vol._1__n._4__set./1?e=1453737/10958981

2015 V. 2, n. 1, 2015 (janeiro a março) http://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_vol._2__no V. 2, n. 2, 2015 (abril a junho). http://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_vol._2__no_ad17bb277a03b8 V. 2, n. 3, 2015 (julho a setembro) http://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_volume_2_numero_3_ V. 2, n. 4, 2015 (outubro a dezembro). http://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_volume_2__numero_4

2016 V.3, n.1, 2016 (janeiro a março) https://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_vol._3__no._1__ja?utm_source=conversion_success&utm_campaign=Transactional&utm_medium=email V.3, n.2, 2016 (abril a junho) http://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_volume_3__n__mero_?workerAddress=ec2-52-90-195118.compute-1.amazonaws.com


V.3, n.3, 2016 (julho a setembro) http://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_volume_3__numero_3?workerAddress=ec2-54-209-15202.compute-1.amazonaws.com V.3, n.4, 2016 (outubro a dezembro) https://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_volume_3__numero_4

2017 V.4, n.1, 2017 (janeiro-marรงo) https://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_volume_4__numero_1

V.4, n.2, 2017 (abril a junho) https://issuu.com/leovaz/docs/all_em_revista_-_volume_4__numero_2

V.4,n.3,2017 (julho a setembro) https://issuu.com/leovaz/docs/revista_all__n.4__v._3__julho-setem V.4,N4, 2017 (outubro a dezembro) https://issuu.com/leovaz/docs/revista_all__n.4__v.4__outubro-deze

2018 V.5, n. 1, 2018 (janeiro a marรงo) https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_8_-_maio__2018 V.5, n. 2, 2018 (abril a junho)


ACADEMIA LUDOVICENSE DE LETRAS Fundada em 10 de agosto de 2013 Registrada sob no. 48.091, de 09 de janeiro de 2014 – Cartório Cantuária de Azevedo CNPJ 20.598.877/0001-33

CHAPA 1 “MARIA FIRMINA” – BIÊNIO 2018 – 2019 MEMBROS DA DIRETORIA: ANTÔNIO JOSÉ NOBERTO DA SILVA – Presidente; ANA LUIZA ALMEIDA FERRO – Vice-Presidente; CLORES HOLANDA SILVA – Secretária-Geral DANIEL BLUME PEREIRA DE ALMEIDA – Primeiro Secretário; CERES COSTA FERNANDES – Segundo Secretário; OSMAR GOMES DOS SANTOS – Primeiro Tesoureiro; e, RAIMUNDO GOMES MEIRELES – Segundo Tesoureiro. CONSELHO FISCAL: ÁLVARO URUBATAN MELO; ARQUIMEDES VIEGAS VALE; e, SANATIEL DE JESUS PEREIRA. CONSELHO DOS DECANOS DECANO CONSELHEIRA CONSELHEIRO CONSELHEIRO CONSELHEIRO

ARTHUR ALMADA LIMA FILHO - 17.10.1929 MARIA THEREZA DE AZEVEDO NEVES – 12.11.1932 ANTÔNIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃO - 08.11.1934 ROQUE PIRES MACATRÃO - 13.11.1935 JOSÉ DE RIBAMAR FERNANDES - 30.01.1938

COMISSÃO DE PUBLICAÇÕES E EVENTO

SANATIEL PEREIRA (PRESIDENTE) ANTONIO AÍLTON DILERCY ADLER CLORES HOLANDA CONSELHO EDITORIAL

SANATIEL PEREIRA (PRESIDENTE) ANTONIO AÍLTON DILERCY ADLER

EDITOR DA ALL EM REVISTA LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

CADEIRA 21 Prefixo Editorial 917536


SUMÁRIO

COM A PALAVRA, o PRESIDENTE... AGENDA

3 8 14 15 15 18

NA BERLINDA

20

EXPEDIENTE SUMÁRIO

EFEMÉRIDES VAVÁ MELO CENTENÁRIO DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO JOÃO BATISTA ERICEIRA LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ CLEONES CARVALHO CUNHA DANIEL BLUME DE ALMEIDA

DANIEL BLUME DE ALMEIDA LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

21 22 23 24 25 26 28 35 50

O CURSO DE DIREITO DE SOUSÂNDRADE – O DA UNIVERSIDADE NOVA ATENAS FRAN PAXECO – VIDA E OBRA ANTONIO NOBERTO DILERCY ADLER

53 127 130

A MULHER MARIA FIRMINA DOS REIS: uma maranhense LINHA RETA POEMA SALTO ALTO SEDUÇÃO LIBERTAÇÃO PSICANALITICAMENTE FALANDO... JOÃO BATISTA ERICEIRA

147

DILERCY ARAGÃO ADLER

JOÃO BATISTA ERICEIRA O CENTENÁRIO DA FACULDADE DE DIREITO JOÃO BATISTA ERICEIRA A SALAMANCA DA RUA DO SOL

151 156

CLEONES CUNHA

158

APRESENTANTE: OSMAR GOMES DOS SANTOS - CADEIRA N.º 14 - PATRONO: ALUÍSIO DE AZEVEDO APRESENTADO: CLEONES CARVALHO CUNHA - CADEIRA N.º 07 - PATRONO: ANTÔNIO GONÇALVES DIAS DATA: 11 DE JUNHO DE 2018 CLEONES CUNHA DISCURSO DE POSSE PEDRO JORGE (BLOG) TUNTUENSE DESEMBARGADOR CLEONES CUNHA SE TORNA O MAIS NOVO IMORTAL ACADEMIA LUDOVICENSE DE LETRAS ANTONIO AILTON A TRAVESSIA DOS INFERNOS PATÊMICOS NA TRILOGIA DANTESCA DE NAURO MACHADO ANA LUIZA ALMEIDA FERRO BRUNO TOMÉ OSMAR GOMES

166

OSMAR GOMES

2018 – ANO DE GRAÇA ARANHA PALESTRA DO PROFESSOR FLAVIANO MENEZES DA COSTA APRESENTAÇÕES CULTURAIS

169 187 189 197 198 201 204 205


WILSON MARQUES GRAÇA ARANHA É O PATRONO DA FEIRA DO LIVRO DE SÃO LUÍS 2018 ARTIGOS, & CRONICAS, & CONTOS, & OPINIÕES CERES COSTA FERNANDES AS DORES DO CRESCIMENTO CERES COSTA FERNANDES AS CEM MIL VAQUINHAS LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ O DESCREDENCIAMENTO DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO FRENTE À LEGISLAÇÃO DE ENSINO – 1918/1941 LEOPOLD GIL DULCIO VAZ CARTAS AO MHARIO – ou O ENCALHE ou de Juazeiro a São Luis BRUNO TOMÉ OS JOVENS E AS SUAS HIPÓTESES CERES COSTA FERNANDES A GRAÇA PERDIDA E O ACHAMENTO DAS TRILHAS ANTÔNIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃO LAÇOS DE FAMÍLIA DILERCY ADLER O ABRIGO DE ORFEU – Livro de Paulo Rodrigues ANTÔNIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃO UM HOMEM DE VALOR CERES COSTA FERNANDES O SONHO DE RAFA CERES COSTA FERNANDES O CIRCO JARBAS NICOLAU CERES COSTA FERNANDES A MATERNIDADE PELO REVERSO OSMAR GOMES DOS SANTOS UM HOMEM ALÉM DO SEU TEMPO OSMAR GOMES DOS SANTOS PRISIONEIROS DA VIOLÊNCIA OSMAR GOMES DOS SANTOS A ETERNA SAUDADE CERES COSTA FERNANDES O DESAMOR CERES COSTA FERNANDES DUAS SENHORAS EM BUSCA DO PASSADO OSMAR GOMES DOS SANTOS SOMOS TODOS REAIS OSMAR GOMES DOS SANTOS O BRASIL PAROU ANTÔNIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃO LEMBRANÇAS DE UMA VIAGEM CERES COSTA FERNANDES DODÔ E AS ELEIÇÕES CERES COSTA FERNANDES VAMOS BRINCAR JOÃO BATISTA ERICEIRA A TENTAÇÃO AUTORITÁRIA FERNANDO BRAGA O TEATRO, A MAIS ANTIGA MANIFESTAÇÃO ARTÍSTICA CERES COSTA FERNANDES O DELICIOSO SÃO JOÃO INCORRETO OSMAR GOMES DOS SANTOS UM NOVO OLHAR SOBRE A BAIXADA MARANHENSE. JOÃO BATISTA ERICEIRA O PATRIOTISMO FUTEBOLÍSTICO JOÃO FRANCISCO BATALHA O ANIVERSÁRIO DE ARARI

211 212 213 214 215 221 241 244 245 246 247 249 250 252 254 255 257 259 261 262 264 266 268 269 270 271 273 275 276 278 280


JOÃO FRANCISCO BATALHA JOSÉ DA CUNHA D´EÇA POESIAS & POETAS

281 283

AYMORÉ ALVIM CONSELHOS PARA CHEGAR LA DIVAGANDO NO ZÊNITE FOI ASSIM O MÉDICO E O PACIENTE SACRAMENTUM HOC MAGNUM EST.

284

VIRIATO GASPAR O SÓ SOBRADO A RE-METIDA A MÃO NA ESCURIDÃO

290

JARDINEIRO - (Dedicado ao poeta José Ribamar Sousa dos Reis) LAVRADOR DE OUTONOS

292

JOÃO BATISTA DO LAGO

RICARDO LEÃO NOCAUTE PARTIDA COSMOS SIGNO

294

DILERCY ADLER ESPAÇO FEMININO COBRANÇA NECESSIDADE DE TI POESIA

296

FERNANDO BRAGA MAGMA COMPULSÃO O POETA MAIS QUE CONCRETO MEUS VERSOS

298

ANTONIO AÍLTON O TROCO II ₰

300

DANIEL BLUME ROLETA PAPEL DE PAREDE SANGUE A PROCURA

302

JOSÉ MARIA NASCIMENTO A PROCURA A PROSTITUTA O VALE VIDA COMUM JOÃOZINHO RIBEIRO LATIFÚNDIO

304

306

NATÉRCIA GARRIDO I. V. [por onde o tempo não passa] VI. VII.

307

CELSO BORGES PALAVRA ÁLIBI MILES DAVIS - UM CONCERTO MODERNO TESTAMENTO

308

FRANCK SANTOS VOOS ELES CAFÉ DA TARDE

310


O QUE QUERO NESSES DIAS (QUASE) MÁGICOS E BRANCOS? DILERCY ADLER SENTE O POEMA

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FRANCISCO TRIBUZI DOMINGO AUSÊNCIA O MUSEU E A PONTE OEMA LIMITADO PARA O POETA INFINITO

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BIOQUE MESITO A DOMÉSTICA CASA DAS INVENÇÕES PARTICULARES ETERNIDADE MÍNIMA VIOLETAS DANÇAM NO PLAYGROUND ESTUÁRIO POR UMA ANTOLOGIA LUDOVICENSE Leopoldo Gil Dulcio Vaz (Organizador) FERNANDO BRAGA CAVALEIRO SONETÁRIO DO QUIXOTE VENCEDOR’, DE ROSSINI CORRÊA LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ AO MEU MESTRE SEBASTIÃO: TAPERA-EVIRE NÃO!!! EUSSAUAP É O CORRETO!!! ANTONIO AÍLTON NOTAS SOBRE O TERNO - [A poesia de Daniel Blume no livro Resposta ao Terno] DILERCY ADLER RESPOSTA AO TERNO - Livro de Daniel Blume ANTONIO AÍLTON UM POEMA PARA HOJE FERNANDO BRAGA A DANÇA DAS LETRAS’ FERNANDO BRAGA O ROMANISTA ABELARDO SARAIVA DA CUNHA LOBO

316

319 320 322 331 333 337 341 343

LYGIA DE MOURA RASSI SEMEANDO EM SOLO FÉRTIL ESPAÇO FEMININO EXPIAÇÃO DELEITE O AMOR NO TEMPO COBRANÇA DESEJO DOCE VAZIO LEMBRANÇA DORIDA DIFÍCIL VERDADE TEUS OLHOS AZUIS PÔR-DO-SOL NO IATE CLUBE SAUDADE CUMPLICIDADE NOSSO AMOR INCONTESTÁVEL LUCIDEZ AO MEU AMOR SOLIDÃO AMARGA ROTINA CORPO E PRISÃO VERDADE E MENTIRA EUS MEUS TÉDIO PAZ FALA DE POETA PÊNDULO VIVO RITUAL SENTIDOS CARTÃO POSTAL SOLIDÃO TOMO I

345


TOMO II CONJUNÇÃO DA TUA PRESENÇA MERGULHO MERGULHO DE AMOR PRAIA DESERTA TUA AUSÊNCIA I TUA AUSÊNCIA II O TEU ABRAÇO SAUDADE NOSTALGIA MEU CÁLICE CHEIRO DE TERRA MOLHADA SÔFREGA FALA DO DESEJO SÚPLICA RENDIÇÃO INOLVIDÁVEL SAUDADE INQUIETAÇÃO A SEMPITERNA PASSAGEM DO TEMPO LAMENTO A OMISSÃO UM CERTO AMANTE O MEDO DA MORTE EU SOU PSICÓLOGA MISTURA DE PELE MESCLA DE PIEL DOR – ESFINGE PARTO RE- MIRANDO A VIDA DEVANE (ANDO) DESVANE(ANDO) AO MEU TRISTÃO DESEJO PÔR – DO –SOL EXALTAÇÃO AO AMOR LOUVOR AO BEIJO TELEGRAMA I TELEGRAMA II CALENDÁRIO EXANGUE VÔO PELO REPRIMIDO ORGIAS SOBREVIVENDO EU SIEMPRE A TUS PIES LA VIDA ES SOLO UM SUSPIRO AHOGADO CONTRASTES PALAVRAS INSONES – I PALAVRAS INSONES - II DESÉRTICO OÁSIS DIAGNÓSTICO KÓRKÉP O “PÃO- NOSSO” DE CADA DIA PONTEIRO PALMAS DO TEMPO PALMES DU TEMPS ARMÁRIO DE BRINQUEDO AMORES ATROPELAMENTO TARDE NUBLADA LÁGRIMAS PLANTANDO POEMAS CONTRA CAPA FERNANDO BRAGA ODORICO MENDES, O HERÓI DA ENEIDA JOABE ROCHA UM PASSEIO EM RECORTES SOBRE O LIVRO “ESCRITOS EM MIGALHAS”

384 386


FERNANDO BRAGA DE NASCIMENTO MORAIS, O VELHO, A MANOEL CAETANO BANDEIRA DE MELO FERNANDO BRAGA A POEMÁTICA DE DANIEL BLUME DIREITO & LITERATURA SERGIO VICTOR TAMER CLODOALDO CARDOSO E JOSÉ MARIA RAMOS MARTINS, duas personalidades da Educação Superior do Estado do Maranhão. OSMAR GOMES DOS SANTOS A DEMOCRÁTICA ARTE DE JULGAR SERGIO VICTOR TAMER O CENTENÁRIO DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO FRENTE À LEGISLAÇÃO DE ENSINO – 1918/1941 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ MEMÓRIA DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO - 1918-1941: OS INSPETORES FEDERAIS

389 392 394 395 400 401 404 425


COM A PALAVRA, O PRESIDENTE... Na presente década, após São Luís completar quatro séculos de fundação, vez por outra ouvimos falar no meio acadêmico que a capital maranhense está iniciando um novo ciclo de efervescência literária. A abertura de espaços congregativos como a AMEI – Associação Maranhense de Escritores Independentes, estabelecida em um ambiente diferenciado, a criação de academias de letras e de grupos de poesia, a multiplicação do conhecimento por meio eletrônico, especialmente por aplicativos e redes sociais, nos faz crer que o renascimento da ―Nova Atenas‖ é uma utopia possível. E não precisamos ir muito longe para fazermos tal constatação, basta folhearmos a presente edição da revista eletrônica da Academia Ludovicense de Letras para sentirmos um pouco da fervura literária. São mais de quatrocentas páginas onde o leitor encontrará os mais variados temas, a exemplo dos Cem anos da criação da Faculdade de Direito no Maranhão, o sesquicentenário de Graça Aranha, grandes eventos de lançamento de livros, a exemplo de Resposta ao terno, do confrade Daniel Blume, e de Lembranças e emoções, do confrade Osmar Gomes, a posse do confrade Cleones Cunha, além de muitos valorosos artigos, contos, crônicas e poesias, que proporcionarão uma gostosa viagem no tempo e no espaço. A constatação do noviço renascimento literário, no entanto, vem acompanhada de uma notícia nada agradável para os maranhenses divulgada no final deste mês de junho, a existência de dois municípios maranhenses na lista dos dez com menores índices de desenvolvimento do Brasil, sendo São Bento e Aldeias Altas, duas referências da literatura maranhense. O primeiro é berço de muitos importantes escritores, e o segundo é a terra natal do maior poeta brasileiro, Antonio Gonçalves Dias. A realidade nos mostra a necessidade de maior aproximação dos escritores com o público em geral e a urgência de administradores municipais que valorizem verdadeiramente aqueles que fazem as letras e tem capacidade de levar educação, conhecimento e ética aos munícipes. O momento de efervescência demanda-nos a necessidade de literatura um pouco mais crítica, pois só o conhecimento e a crítica justa e na medida darão o forte sopro na cortina de fumaça que impede a sociedade de olhar e entender claramente o ambiente. É pesquisando, escrevendo e multiplicando o conhecimento que faremos uma Nova Atenas, menos elitizada e mais popularizada, onde todos poderão participar intelectualmente com desenvolvimento da cidade, do estado e do país. Parabéns a todos os confrades e confreiras pela participação na revista. Parabéns Leopoldo Vaz por disponibilizar mais esta jóia. Boa leitura. Antonio Noberto


AGENDA EFEMÉRIDES 10 11 13 14 21 22 24 26 30 03 05 06 09 10 13 22 23 29 09 15 21

ABRIL 1967 – FALECIMENTO DE MANUEL VIRIATO CORRÊA BAIMA DO LAGO FILHO – VIRIATO CORRÊA – PATRONO DA CASDEIRA 24 1984 - NASCIMENTO DE ANDRÉ GONZALEZ CRUZ – FUNDADOR DA CADEIRA 11 1904 – FALECIMENTO DE DOMINGOS QUADROS BARBOSA ÁLVARES – PATRONO DA CADEIRA 23 1940 - NASCIMENTO DE ÁLVRO URUBATAN MELO – FUNDADOR DA CADEIRA 23 1857 – NASCIMENTO DE ALUISIO TANCREDO GONÇALVES DE AZEVEDO – PATRONO DA ADEIRA 14 1902 – FALECIMENTO DE JOAQUIM DE SOUSA ANDRADE – SOUSANDRADE – PATRONO DA CADEIRA 10 1808 – NASCIMENTO DE FRANCISCO SOTERO DOS REIS – PATRONO DA CADEIRA 4 1900 – NASCIMENTO DE ASTOLFO HENRIQUE DE BARROS SERRA – PATRONO DA CADEIRA 28 2000 – FALECIMENTO DE MARIA DE LOURDES ARGOLLO OLIVER – DILÚ MELO – PATRONA DA CADEIRA 29 1863 – FALECIMENTO DE JOÃO FRANCISCO LISBOA – PATRONO DA CADEIRA 5 1927 – FALECIMENTO DE JOSÉ RIBEIRO DO AMARAL – PATRONO DA CADEIRA 12 MAIO 1853 – NASCIMENTO DE JOSÉ RIBEIRO DO AMARAL – PATRONO DA CADEIRA 12 1859 – NASCIMENTO DE RAIMUNDO DA MOTA DE AZEVEDO CORREIA – RAIMUNDO CORREIA – PATRONO DA CADEIRA 15 1960 - NASCIMENTO DE PAULO ROBERTO MELO SOUSA – FUNDADOR DA CADEIRA 33 2011 – FALECIMENTO DE CARLOS DE LIMA – PATRONO DA CADEIRA 33 1940 – FALECIMENTO DE CATULO DA PAIXÃO CEASRENSE – PATRONO DA CADEIRA 17 1940 - NASCIMENTO DE AYMORÉ DE CASTRO ALVIM – FUNDADOR DA CADEIRA 16 1900 – NASCIMENTO DE ASTOLFO HENRIQUE DE BARROS SERRA PATRONO DA CADEIRA 28 1966 - NASCIMENTO DE ANA LUIZA ALMEIDA FERRO – FUNDADORA DA CADEIRA 31 1885 – NASCIMENTO DE RAIMUNDO CORRÊA DE ARAÚJO – PATRONO DA CADEIRA 26 JUNHO 1879 – FALECIMENTO DE CELSO TERTULIANO DA CUNHA MAGALHAES – CELSO MAGALHAES – PATRONO DA CADEIRA 11 1925 – NASCIMENTO DE JOÃO MIGUEL MOHANA – PATRONO DA CADEIRA 36 1868 – NASCIMENTO DE JOSÉ PEREIRA DA GRAÇA ARANHA – PATRONO DA CADEIRA 20


ASSEMBLÉIA GERAL DE 15 MAIO 2018 - PALÁCIO CRISTO REI


REFORÇANDO O COVITE PARA TODOS.

VOCÊS, MEUS AMIGOS, SÃO OS PRINCIPAIS RESPONSÁVEIS. SEM VOCÊS JAMAIS CHEGARIA A ESSE POSTO. GRATIDÃO ETERNA.


ÁLVARO MELO – VAVÁ O que falar de uma pessoa tão especial de um coração tão puro, só temos que agradecer esse ser que temos em nossas vidas. Pai te amamos!



NA BERLINDA


Acabo de receber exemplar Do livro editado pelo CF-OAB para celebrar o centenĂĄrio da Faculdade de Direito do MaranhĂŁo








Daniel blume O estado ma / oton lima / 14/04/2018



O ESTADO MA / COLUNA DO PH / 14/04/2018





Prestigiando o amigo e confrade do IAB nacional, Daniel Blume, na noite de autógrafos de seu livro ―Resposta ao terno‖. Sucesso!

Entrevista de Daniel Blume sobre poesia/poema/literatura/leitura/escrita e a força e o sentido de existir. Nessa entrevista, ele diz que pela poesia ele se permite expor a ternura escondida no terno. É... o advogado poeta e o poeta advogado é um homem de vida dupla, como ele também diz na entrevista. Tem lançamento de Resposta ao terno hoje, às 19:00, no Hotel Brisamar, Restaurante Leblon. Passando pra lembrar, convidar e reconvidar os amigos!

Entrevista com Daniel Blume, procurador, advogado, juiz e escritor - Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão Daniel Blume, advogado, procurador do Estado, juiz… al.ma.leg.br


Lanรงamento amanhรฃ. RESPOSTA AO TERNO - Dia: 10/04/2018 - Brisamar Hotel - Leblon Restaurante



LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ



REVISTA DO LEO REVISTA ELETRONICA EDITADA POR LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Prefixo Editorial 917536

NÚMERO ESPECIAL A FACULDADE DE DIREITO DO/NO MARANHÃO NO SEU CENTENÁRIO: 1918/2018 SÃO LUIS – MARANHÃO – MARÇO DE 2018

SUMÁRIO EXPEDIENTE EDITORIAL SUMÁRIO

2 3 5 PARTE I MEMÓRIA DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO – 1918/1941

INTRODUÇÃO FRAN PAXECO E A FUNDAÇÃO DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO CENTENÁRIO DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO: FALTAM TRÊS!!! A FUNDAÇÃO DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO O DESCREDENCIAMENTO DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO FRENTE À LEGISLAÇÃO DE ENSINO – 1918/1941 MEMÓRIA DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO - 1918-1941: OS INSPETORES FEDERAIS MEMÓRIA DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO: O PRÉ (19)41 PARTE II MEMÓRIA DA FACULDADE DE DIREITO DE SÃO LUIS - 1941/1966 O PÓS (19)41 – A FACULDADE DE DIREITO DE SÃO LUIS DA FACULDADE DE FILOSOFIA À SOCIEDADE MARANHENSE DE CULTURA SUPERIOR – SOMACS 1951/1956 DA SOMAC À UNIVERSIDADE (CATÓLICA) DO MARANHÃO – FUM: 1956/1966 – PARTE III OUTRAS MEMÓRIAS... JOÃO BATISTA ERICEIRA O CENTENÁRIO DA FACULDADE DE DIREITO ROSSINI CORRÊA MARANHENSES, GRAÇA ARANHA E IDEIAS JURÍDICAS E POLÍTICAS NO BRASIL

7 9 14 27 29 43 54 73 92 105 107 159 166 175 177 179


REVISTA DO LÉO REVISTA (ELETRONICA) EDITADA POR LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Prefixo Editorial 917536 EDUCAÇÃO FÍSICA, ESPORTES, LAZER & LITERATURA

SÃO LUIS – MARANHÃO NUMERO 7 – ABRIL DE 2018 SUMÁRIO EXPEDIENTE 2 EDITORIAL 3 SUMÁRIO 5 MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO FÍSICA, ESPORTES E LAZER 7 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ MANIFESTAÇÕES DO LÚDICO E DO MOVIMENTO NO MARANHÃO: COLÔNIA E IMPÉRIO 9 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ O ESPORTE, O LAZER E A EDUCAÇÃO FÍSICA COMO OBJETO DE ESTUDO DA HISTÓRIA 13 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ TRABALHO, TEMPO LIVRE E LAZER 21 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ LÚDICO, JOGO E ESPORTE 25 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ EDUCAÇÃO FÍSICA, ESPORTE E LAZER 29 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ MANIFESTAÇÕES DO LÚDICO E DO MOVIMENTO NO MARANHÃO 35 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ A CORRIDA ENTRE OS ÍNDIOS CANELAS 37 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES DO LÚDICO E DO MOVIMENTO NO MARANHÃO COLONIAL 41 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ “PERNAS PARA O AR QUE NINGUÉM É DE FERRO”: AS RECREAÇÕES NA SÃO LUÍS DO SÉCULO XIX 49 RAIMUNDO NONATO IRINEU MESQUITA DOS FESTIVAIS AOS JEMs... UM SONHO CONCRETIZADO A MUITAS MÃOS! 63 ATLAS DO ESPORTE NO MARANHÃO 65 KARATÊ 67 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ LEONARDO DE ARRUDA DELGADO NATAÇÃO 71 LEONARDO DE ARRUDA DELGADO NATAÇÃO EM BARRA DO CORDA 89 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ REMO 93 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ SURF BODYBOARDING 99 HÉLTON MOTA FERREIRA LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ SURF NA POROROCA 103 ARTIGOS, CRÔNICAS, DISCUSSÕES, OPINIÕES 111


LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ UMA HISTÓRIA DO FUTEBOL NO MARANHÃO – POR SEUS PROTAGONISTAS... 113 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ SOBRE A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO ( revisão) 127 NA(S) ACADEMIA(S) – LITERATURA LUDOVICENSE/MARANHENSE 133 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ A “DESCOBERTA” DO MARANHÃO 135 MHARIO LINCOLN OS DÉSPOTAS EM PELE DE CORDEIRO 167 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ BRUNO TOMÉ NA ACADEMIA LUDOVICENSE DE LETRAS – PH REVISTA 17/03/2018 168 LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ SAPO X ZULU – DEU ZULU 170 JUCEY SANTANA NOVA DIRETORIA DA FALMA 172


REVISTA DO LEO REVISTA ELETRONICA EDITADA POR LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Prefixo Editorial 917536

SÃO LUIS – MARANHÃO NUMERO 8 – MAIO - 2018 SUMÁRIO EXPEDIENTE

2

EDITORIAL

3

SUMÁRIO

5 MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO FÍSICA, ESPORTES E LAZER

NATAÇÃO PARA BEBÊS – Professora maranhense é referencia mundial - LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

6 7

ASPECTOS HISTÓRICOS DO ESPORTE E DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO MARANHÃO - LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

13

MANIFESTAÇÕES DO LÚDICO E DO MOVIMENTO NO MARANHÃO ´Leopoldo Gil Dulcio Vaz

25

O PLANEJAMENTO DO TREINAMENTO - PEDRO HERRERA

28 ATLAS DO ESPORTE NO MARANHÃO

35

MESTRES CAPOEIRA DO MARANHÃO – introdução – Leopoldo Gil Dulcio Vaz

36

LIVRO-ÁLBUM DOS MESTRES CAPOEIRAS – Proposta – Leopoldo Gil Dulcio Vaz

40

CAPOEIRA NO/DO MARANHÃO – Leopoldo Gil Dulcio Vaz

44

CAPOEIRAGEM NO/DO MARANHÃO – SÉCULO XXI – Leopoldo Gil Dulcio Vaz ARTIGOS, CRÔNICAS, DISCUSSÕES, OPINIÕES

126

A PROFISSÃO “EDUCAÇÃO FÍSICA” – INCLUI O CAPOEIRA - LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

127

É A EDUCAÇÃO FÍSICA UMA CIÊNCIA? - LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

134

VAMOS SALVAR OU “ESQUECER” A MEMÓRIA DOS JOGOS OLÍMPICOS DE 2016? - LAMARTINE DACOSTA

147

NA(S) ACADEMIA(S) – LITERATURA LUDOVICENSE/MARANHENSE

150

FLUTUANDO EM PAZ - (... no Dia Mundial das Águas) - EDMILSON SANCHES

151

CARTAS AO MHARIO – ou O ENCALHE ou de Juazeiro a São Luis – LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

158

CAVALEIRO SONETÁRIO DO QUIXOTE VENCEDOR’, DE ROSSINI CORRÊA - FERNANDO BRAGA

161

PE. JOÃO NO IHGM – PH REVISTA – 31/03/2018

163

POESIA MARANHENSE CONTEMPORÂNEA - LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

165

AO MEU MESTRE SEBASTIÃO: TAPERA-EVIRE NÃO!!! EUSSAUAP É O CORRETO!!! – LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

175

AS DORES DO CRESCIMENTO - CERES COSTA FERNANDES

184


O ESTADO MA – PH REVISTA – 18/04/2018


O ESTADO MA – 21/22 – 04 – 2018


O ESTADO MA – 25/04/2018 – alternativo





O IMPARCIAL – 1º MAIO 2018


http://cecgp.com.br/noticias/1955-o-curso-de-direito-de-sousandrade-o-da-universidade-nova-atenaspor-leopoldo-vaz

O CURSO DE DIREITO DE SOUSÂNDRADE – O DA UNIVERSIDADE NOVA ATENAS, por Leopoldo Vaz 07 de Maio de 2018

Durante este ano de 2018, comemora-se o Centenário da Instituição do Curso Jurídico no Maranhão a 28 de abril de 1918 com a fundação da Faculdade de Direito do Maranhão – iniciativa de Domingos Perdigão e de Fran Paxeco...

O CURSO DE DIREITO DE SOUSÂNDRADE – O DA UNIVERSIDADE NOVA ATENAS LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO MARANHÃO ACADEMIA LUDOVICENSE DE LETRAS Durante este ano de 2018, comemora-se o Centenário da Instituição do Curso Jurídico no Maranhão a 28 de abril de 1918 com a fundação da Faculdade de Direito do Maranhão – iniciativa de Domingos Perdigão e de Fran Paxeco -, como também é o inicio do ensino superior no Maranhão... Mas seguindo a velha citação de que São Luís já teve, houve uma iniciativa anterior, feita por Joaquim de Sousa Andrade, o Sousândrade... São Luís do Maranhão, à época, localizada em uma ilha geográfica, tornara-se uma ilha cultural. Era tão mais fácil ir à Europa do que ao Rio de Janeiro. Antes da Abolição da escravatura (1888), a elite era constituída por ricos fazendeiros; essas poderosas famílias maranhenses podiam manter suas ligações culturais com Portugal, mandando os filhos estudarem em Coimbra, o que contribuiu para a formação de uma elite cultural, um tipo de "intelligenzia" regional, composta de poetas, novelistas, dramaturgos,


oradores, teoristas, historiadores, publicistas e políticos a quem São Luís, seguindo a linha tradicional e romântica do século XIX, obcecada por comparações com o Velho Mundo deve o epíteto de "Atenas brasileira". É nesse ambiente que Joaquim de Sousa Andrade (Sousândrade) nasceu a 9 de julho de 1832, no município de Alcântara. Bacharel em Engenharia (1856) foi o primeiro brasileiro a obter esse título na Sorbonne, numa época em que era comum estudar Direito ou Medicina em Coimbra. Autor ―de ‗O Guesa errante‘, é considerado por Augusto e Haroldo de Campos um moderno, cinqüenta anos antes da "Semana de 22", tendo passado pela literatura do século XIX como um "terremoto clandestino". Sousândrade gostava de ensinar e estava sempre disposto a informar e instruir. Professor de Grego do "Liceu Maranhense", seu último grande projeto foi a fundação de uma universidade no Maranhão. Em 1890, quando elabora a primeira constituição republicana do Maranhão, insere em seu artigo 89 dispositivo sobre a criação de uma Universidade, que se chamaria "Atlântida". Vetado tal artigo, pretendeu levantar recursos, por meio de subscrição popular para levar adiante sua idéia, chegando a alugar o Palácio das Lágrimas para sua sede. Joaquim de Sousa Andrade – Sousândrade e Augusto O. Viveiro de Castro encaminharam, em 02 de julho de 1894, uma representação ao Senado requerendo a criação de um fundo universitário com os recursos provenientes do Canal do Arapapahy[1]. Referem-se à inclusão já no primeiro projeto de Constituição do Estado (de 3 de dezembro de 1890): [...] Se para a Faculdade de Direito, a qual achará entre nós distintos professores de bom caráter, pouco dispenderá a Universidade, além do edifício e do contrato de um professor para a nova cadeira de Direito Índico, o qual pediremos ao Chile, país único na América que tem a ciência da educação dos Naturais [...] Ainda neste ano de 1894, publica em "O Federalista", 18, 14 de julho, p. 2, artigo intitulado "Universidade de Atlântida"; a 25 aparece outro artigo ("O Federalista", 25, p. 2); a 26, um aviso ("O Federalista", p. 2) intitulado "Atlântida", sobre uma revista mensal da universidade, aviso este repetido nas edições de 30/07; 31/07; 01/08 e 06/08. [...] ―Logo que o patriótico congresso estadual, que por isso terá a benção da posteridade, haver decretado o Tesouro do Arapapahy aos primeiros fundos universitários, a comissão dará princípios aos reparos do antigo convento dos carmelitas, que já foi pedido em concessão ao governo da União para lá solenizarse a fundação da Universidade em 15 de novembro e que é também a data da inauguração do 1o. presidente eleito da República. Paço da Intendência, salão do juiz, 26 de junho de 1894.‖. (O FEDERALISTA, 26 de junho de 1894, p. 3). Entre julho e agosto de 1894, Sousândrade publica sob o título ―Atlântida‖ anúncio da revista mensal da Universidade de Atlântida. Em formato da Humboldt Library de New York, continha 24 páginas, 3 colunas e o primeiro número apareceu em 13 de novembro de 1894. Aceitava subscrição (assinatura), sendo publicados 8 números por ano. A sede provisória estava localizada em sua Quinta da Vitória. Informava, ainda, que o ―Senado Bahiano confirmara a causa da Universidade; aguardamos a sabedoria de nosso congresso‖. (O FEDERALISTA, 30/07 e 01/ a 06/08/1894, p. 3). Por essa mesma época, são publicados os Regulamentos da instrução Pública do Maranhão (O FEDERALISTA, 02, 03 de agosto de 1894) e o da Escola Normal (O FEDERALISTA, 06/08/1894). Em 21 de fevereiro de 1895, publica um aviso intitulado "Nova Atenas", anunciando a nova universidade ("O Federalista", p. 2): São pela imprensa convidados os membros do Directorio da Universidade a se reunirem no Paço Municipal ao meio dia, em 24, comemoração da Constituição da República. Os 12 eleitos à Inauguração de 25 de Dezembro p.p. são o cidadão Sousândrade, o Governador do Estado, o Presidente do Congresso, o Presidente do Superior Tribunal de Justiça, o Bispo Diocesano, o Inspetor da Instrução Pública, o Senador


Federal (o último eleito), o Cônsul do Chile, o Cônsul dos Estados Unidos, o Presidente da Associação Comercial, o Juiz seccional, o Diretor (Vigilante) da Escola Normal. O que não poder comparecer delegará seus poderes por escrito ou pelo telefone à horas dadas esprimindo a sua idéia e o seu voto. (O FEDERALISTA, 2122/02/1895, p. 3). É de se supor que da reunião de 24 de fevereiro, os membros do diretório da Universidade tenham deliberado sobre os cursos que seriam oferecidos e sobre o exame de admissão à Faculdade de Direito, conforme anúncio publicado em agosto: De acordo com os regulamentos em vigor até 1896, serão exigidos os seguintes exames para admissão à matrícula: Nas faculdades de direito (art. 430 do decreto n. 1232F, de 2 de janeiro de 1891, cit.): português, Frances, inglês, ou alemão (à vontade do candidato); latim; matemática elementar; geografia, especialmente do Brasil; história universal, especialmente do Brasil; física e química geral, estudo concreto; história natural, estudo concreto: (Do Diário Oficial de 18 de março de 1893, no. 74). O Directório‖. (O FEDERALISTA, 03, 05, 06, 07, 09, 10/08/1895). Em março, 4, outro aviso, intitulado "Nova Atenas", reproduzido nas edições de 05 e 06 de "O Federalista". A 18 desse mesmo mês recebe telegrama do Presidente Prudente de Moraes agradecendo-lhe a escolha para a presidência honorária da universidade. Em Abril volta a aparecer aviso ("Universidade", O Federalista, p. 2); em maio, 11, outro aviso intitulado "Universidade Nova Atenas"; em 31 de julho publica aviso sobre o currículo da "Universidade Nova Atenas". Consta que chegou a dar aulas, em sua Quinta da Vitória, transformada em sede de seu estabelecimento de ensino superior. Registra-se que as aulas foram iniciadas, na Quinta da Vitória, ministradas pelo próprio Sousândrade... Não se sabe até quando, e perdemos a oportunidade de termos um curso de Direito desde 1896... A 28 de abril de 1918, então, se dá a fundação da Faculdade de Direito do Maranhão, agora liderada por Domingos Perdigão e Fran Paxeco, depois de não ter logrado êxito no século XIX [2].

[1] O Canal de Arapaí visava diminuir a distancia e os riscos de se chegarem mercadorias à Ilha de São Luís, e foi concebido na gestão do Governador e capitão General João de Abreu Castelo Branco, que governou o Maranhão entre os anos de 1737 e 1747. O governador pediu a contribuição dos moradores e arrecadou “655$000 em dinheiro de pano de algodão, 280 alqueires de farinha e 60 negros escravos; com esse capital, iniciaram-se as obras. Decorridos 117 anos de seu planejamento e 116 anos do inicio das obras, foi abandonado, pelas mesmas razões que determinaram seu inicio: econômicas. Em 1865 havia um fundo de 560.000$000 improdutivos – capital – já há 17 anos. NOGUEIRA, Raimundo Cardoso; SARAIVA, José Cloves Verde. CANAL DE ARAPAPAÍ. São Luís, 2012. [2] BORRALHO, José Henrique de Paula. INSTITUTO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA DO MARANHÃO (IGHM): PATRIMÔNIO, MEMÓRIA E HISTÓRIA COMO PRINCÍPIOS DE PERPETUAÇÃO DA IMAGEM DE UM MARANHÃO GRANDIOSO. IN PATRIMONIO E MEMORIA, UNESP – FCLAs – CEDAP, v.7, n.1, p. 19-37, jun. 2011,





FRAN PAXECO – VIDA E OBRA1

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Professor de Educação Física; Mestre em Ciência da Informação Membro Fundador da Academia Ludovicense de Letras – Cadeira 21 Patrono: FRAN PAXECO Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão - Cadeira 40 Patrono: DUNSHEE DE ABRANCHES

O que nos motiva estar reunidos, nesta noite, neste templo da modernidade – o ‗shopping-center‘ – e neste local espaço dedicado à cultura literária maranhense, o espaço AMEI -, são as comemorações, neste ano de 2018, do Centenário de Fundação da Faculdade de Direito do Maranhão. Domingos Perdigão e Fran Paxeco se constituem os dois nomes responsáveis por esse fato... O Presidente da Academia Ludovicense de Letras pediu-me para festejar a memória do mais maranhense dos portugueses, Fran Paxeco, o patrono da cadeira que ocupo neste sodalício2. Quero ressaltar que, naquele momento em que chegou ao Brasil, em seu exílio voluntário, permanecendo por mais de 30 anos, dos quais mais de 20 no Maranhão, intercalados períodos de residência, vivíamos um momento de glorificação de uma tradição inventada, de uma herança francesa! Período de construção da identidade maranhense – 1

VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. ELOGIO AO PATRONO. Discurso de posse na cadeira 21, da Academia Ludovicense de Letras, em 30 de janeiro de 2014. VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. FRAN PAXECO E A FUNDAÇÃO DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO. In REVISTA DO LÉO, São Luis, NÚMERO ESPECIAL: A FACULDADE DE DIREITO DO/NO MARANHÃO NO SEU CENTENÁRIO: 1918/2018; SÃO LUIS – MARANHÃO – MARÇO DE 2018. Disponível em https://issuu.com/leovaz/docs/revista_do_leo_especial__faculdade_ VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. O LEGADO DE FRAN PAXECO. Palestra proferida na ACSDEMIA LUDOVICENSE DE LETRAS – ALL – no dia 19 de maio de 2018, na AMEI – Shopping São Luis. MACHADO, Maria Rosa Pacheco. FRAN PAXECO (1874-1952). Folder sobre a biografia de Fran Paxeco, escrito para a exposição sobre a vida e obra de Fran Paxeco, Galeria Municipal 11, 20/12/2014 a 08/03/2015. Setubal, Portugal, 2014 CUNHA BENTO, António. FRAN PAXECO – CONTRIBUTOS A UMA BIOGRAFIA. Palestra, apresentada em power-point, Setúbal, 20.12.2014, para a exposição sobre a vida e obra de Fran Paxeco, Galeria Municipal 11, 20/12/2014 a 08/03/2015. Setúbal, Portugal,. Enviada ao autor em 28 de abril de 2018, em correspondencia eletronica. ITAPARY FILHO, Joaquim Salles de Oliveira. BREVES NOTAS SOBRE FRAN PAXECO. Palestra realizada na data da abertura do II Feira do Livro de São Luís, Em 10 de outubro de 2008. VIEIRA DA LUZ, Joaquim. FRAN PAXECO E AS FIGURAS MARANHENSES. Rio de Janeiro: Livros de Portugal; Edições dois Mundos, 1957 http://www.academiamaranhense.org.br/manuel-francisco-pacheco/ https://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_Fran_Paxeco http://manuel-bernardinomachado.blogspot.com.br/2015/04/recordar-o-republicano-manuel-fran.html 2 Inicialmente Manuel Francisco Pacheco. O nome foi alterado oficialmente para Manuel Fran Paxeco. Cf. o Diário do Governo n.º 268, de 25 de Novembro de 1905. In CARVALHO, Marcos Antônio de. BEBENDO AÇAI, COMENDO BACALHAU: PERFIL E PRÁTICAS DA SOCIABILIDADE LUSA EM BELÉM DO PARÁ ENTRE FINAIS DO SÉCULO XIX E INÍCIO DO SÉCULO XX. Tese de doutoramento em História apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto como requisito para obtenção do


da maranhensidade –, e vem esse português a nos lembrar da nossa verdadeira herança: aquela advinda de Portugal! Contraditória essa (re)construção da Atenas brasileira, de uma raça formada por brancos – europeus de Portugal! -, índios, e negros, que nos singulariza perante o restante da Nação. Vem se juntar, Fran Paxeco, àquele grupo de jovens sonhadores, posto que poetas, escritores, jornalistas, que se autodenominavam ―Novos Atenienses‖3. Para todos os lugares, movimentos e intervenções que olharmos, surge esse setubalense como figura central: desde o ressuscitar de uma literatura herdeira daquele Grupo Maranhense, ao seu envolvimento com o ensino das camadas populares até o superior, de uma preocupação com a infância, com as relações comerciais entre o Brasil e Portugal. A instituição dos cursos superiores no Maranhão, em especial daquela pioneira Faculdade de Direito do Maranhão, que nos traz aqui, nesta noite, em que a ALL se integra às festividades do Centenário, honrando a memória desse maranhense que por um descuido geográfico, nasceu em Portugal. A contribuição de Fran Paxeco durante o interregno neo-ateniense foi, sem dúvida, exponencial. Ele representou simbolicamente o elo europeu aqui presente para reanimar energias combalidas. Em sua trajetória pela terra das palmeiras fundou uma obra ancilarmente ligada aos ”problemas maranhenses‖, cujo exemplar mais expressivo foi a ―Geografia do Maranhão‖, publicada em 1923, no contexto das comemorações da adesão do Maranhão à independência do Brasil.( MARTINS, 2002)4 Fran Paxeco5 - inicialmente Manuel Francisco Pacheco, alterado oficialmente para Manuel Fran Paxeco (Diário do Governo n.º 268, de 25 de Novembro de 1905)6 - nasceu em Setúbal7, no antigo Terreiro de São Caetano, freguesia de São Julião, a 09 de Março de 1874; faleceu em Lisboa a 17 de Setembro de 1952; foi um jornalista, escritor, diplomata e professsor português; cônsul de Portugal no Maranhão, no Pará, em Cardiff e em Liverpool8. título de Doutor em História. Orientação: Profa. Doutora Maria da Conceição Coelho de Meireles Pereira. 2011. http://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/63200/2/TESEDOUTMARCOSCARVALHO000161479.pdf 3 OS NOVOS ATENIENSES: A OFICINA DOS NOVOS & A RENASCENÇA LITERÁRIA Essa agremiação, instalada a 28 de julho de 1900, sob o patronato de Gonçalves Dias, por Francisco Serra, João Quadros e Astolfo Marques, foi a Oficina dos Novos, que ainda hoje se mantém nesta capital, e cuja direção ficou assim composta: Presidente, Francisco Serra; Vice-Presidente, Luís Carvalho; Secretário-Geral, Astolfo Marques; Tesoureiro, Monteiro de Sousa; 1º Secretário e Bibliotecário, Maranhão Sobrinho. (…) O seu quadro social, que se foi sucessivamente alargando, conta hoje 30 sócios efetivos, 40 sócios honorários e 51 sócios correspondentes. A Oficina fez-se representar na imprensa por um periódico: Os Novos, (…). Depois da publicação do primeiro número de Os Novos, isto é – a 16 de agosto de 1900, surgia na imprensa literária da terra, outro periódico – A Atualidade, – dirigido por Luís Carvalho e Henrique Fernandes, com a colaboração de Fran Paxeco, Damasceno Ferreira, Raimundo Santiago, Luís Serra, Maranhão Sobrinho, Viriato Correia, João Quadros e Agostinho Reis. Este último mantivera, anteriormente, outra folha literária, também de publicação periódica, em que haviam colaborado, I. Xavier de Carvalho e A. dos Reis Carvalho. No ano seguinte, isto é – em 1901, desligava-se da Oficina dos Novos, um grupo de moços, para ir fundar uma nova sociedade.: A Renascença Literária, representada logo na imprensa por um mensário – Renascença, que viveu de 1901 a 1902, redigido por I. Xavier de Carvalho, Nascimento Moraes, M. George Gromwell, Otávio Galvão, Rodrigues de Assunção, Leôncio Rodrigues, Leslie Tavares e Caetano Sousa. http://www.guesaerrante.com.br/2005/11/30/Pagina395.htm 4 MARTINS, Manoel de Jesus Barros. RACHADURAS SOLARESCAS E EPIGONISMOS PROVINCIANOS Sociedade e Cultura no Maranhão Neo-Ateniense: 1890-1930. Recife, 2002, Dissertação e Mestrado em História. 5 http://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_Fran_Paxeco 6 In CARVALHO, Marcos Antônio de. BEBENDO AÇAI, COMENDO BACALHAU: PERFIL E PRÁTICAS DA SOCIABILIDADE LUSA EM BELÉM DO PARÁ ENTRE FINAIS DO SÉCULO XIX E INÍCIO DO SÉCULO XX. Tese de doutoramento em História apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto como requisito para obtenção do título de Doutor em História. Orientação: Profa. Doutora Maria da Conceição Coelho de Meireles Pereira. 2011. http://repositorioaberto.up.pt/bitstream/10216/63200/2/TESEDOUTMARCOSCARVALHO000161479.pdf 7 Setúbal é uma cidade portuguesa, capital do distrito de Setúbal e sede de diocese, com 100 000 habitantes no seu perímetro urbano. Situa-se na sub-região de Área Metropolitana de Lisboa. https://pt.wikipedia.org/wiki/Set%C3%BAbal 8 http://www.wikiwand.com/pt/Manuel_Fran_Paxeco


Casa do Terreiro de São Caetano, em Setúbal, onde a 09 de março de 1874 nasceu Manoel Fran Paxeco VIEIRA DA LUZ, 1957, obra citada

Chegou a São Luís do Maranhão em 02 de Maio de 1900, sendo autor de diversas obras sobre temas de interesse para a região 9.

A mudança de nome era comum, àquela época, entre os portugueses que migravam para o Brasil. Segundo Cunha Bento (2018)10 e Machado (2018)11, entre os comerciantes, era comum àqueles que chegavam, e homônimos, terem que alterar os nomes, para não se confundirem. Possivelmente Fran Paxeco alterou seu nome, Manuel Francisco Pacheco para Manuel Fran Paxeco devido à uma nota publicada na Gazeta da Tarde, mencionando um caixeiro português; a nota foi publicada ao tempo do estabelecimento de Fran no Rio de Janeiro: 9

VIEIRA DA LUZ, 1957, obra citada. CUNHA BENTO, Antonio. In Correspondência Eletrônica com Leopoldo Gil Dulcio Vaz, abril de 2018, sobre notícia publicada em Gazeta da Tarde, 7 de outubro de 1900. 11 MACHADO, Maria Rosa Pacheco. In Correspondência Eletrônica com Leopoldo Gil Dulcio Vaz, abril de 2018, sobre notícia publicada em Gazeta da tarde, 7 de outubro de 1900. 10


v http://4.bp.blogspot.com/-u5aRpAZqaDc/VR7fGJceObI/AAAAAAAAs8A/1b7ZqfYQAl0/s1600/b.bmp


No dia de seu aniversário, 09 de março, comemorado naquele ano de 1922 – e ainda no Maranhão -, Mata Roma12 assim se manifestou, destacando as qualidades de coração que caracterizavam a personalidade de Fran Paxeco: "Um nove de março do século passado, decorria placidamente... E lá nas regiões sidéreas, no mais alto e delicioso éden, o criador, do seu trono mirífico, abençoava as criaturas. E todos os anjos e todas as virtudes e, todos os gênios, em coro harmonioso e divino, entoavam hinos ao Onisciente. E achavam-se ali o Amor, a Amizade, a Fé, a Esperança, a Caridade, a Moral, a Modéstia, o Trabalho, a Justiça todos os sublimes seres espirituais. E, à hora, destinada às preces cotidianas, soa a maviosa sineta, e todos se ajoelham em volta do Senhor, rendendo-lhe graças, queimando-lhe incenso. E o Senhor, lançando um olhar em redor, nota a ausência da Bondade. E pergunta por ela. E todos, que a tinham visto, havia pouco, se entreolham, admirados. E, reciprocamente, interrogam-se. E, à ordem do Senhor, saiu uma formosa legião de anjos a percorrer os mundos, em busca da tresmalhada. E foram e andaram muito. E desceram à terra. E correram países, passearam cidades, visitaram aldeias. E, quando na Europa, rumando para o sudoeste, foram dar com a fugitiva na bela Setúbal, no coração de um recém-nascido. E, ao intimá-la a famosa legião, ela disse: O meu solar é aqui... E os anjos voltaram sozinhos ao Senhor, e a Bondade continuou a viver no coração de Fran Paxeco. 13

Vejamos alguns aspectos de sua vida contada por sua neta, Rosa Machado14: Aos dezasseis dias do mez de Março de mil oitocentos setenta e quatro; ás quatro horas da tarde n‘esta Parochial Egreja de Nossa Senhora da Annunciada, Concelho de Setubal, Patriarchado de Lisboa baptizei solemnemente a Manuel, primeiro do nome, que nasceu a nove d‘este mesmo mez e anno, ás cinco cinco horas da manhã, n‘esta freguesia, filho legítimo de José Anastácio Pacheco, carpinteiro de carros e Carolina Augusta, naturaes d‘esta cidade e recebidos na freguesia de São Julião e moradores no rocio de São Caetano, neto paterno de Manuel Maria da Saúde Pacheco e Maria Rita, materno de Joaquim Gomes e Maria Rita; foi padrinho Francisco José Pereira, casado, proprietário, morador na Ponte de São Sebastião e madrinha Theresa de Jesus, solteira, moradora no Largo das Almas. E para constar se lavrou em duplicado este termo, que assigno. Era ut supra. O Parocho Encom.do Francisco Machado Araújo[?]15

12

JOSÉ MATA DE OLIVEIRA ROMA, um dos mais ilustre filho de Chapadinha nasceu em 23 de janeiro de 1896. Conhecido como Professor Mata Roma, bacharel em Direito pela faculdade de Direito do Maranhão, da qual mais tarde, foi professor de Direito Civil. http://herbertlago.blogspot.com.br/2008/05/mata-roma-o-tntalo-de-chapadinha.html 13 CUNHA BENTO, 2014, obra citada. 14 MACHADO, 2014, obra citada 15 CUNHA BENTO, 2014, obra citada


Igreja de N. S. da Anunciada de Setubal, na qual, em 16 de março de 1874, com oito dias, foi batizado VIEIRA DA LUZ, 1957, obra citada.

Filho de José Anastácio Pacheco e de Carolina Amélia Pacheco16, ficou sem pai aos sete anos. No primeiro dia do mes de setembro do anno de mil oitocentos e oitenta ás seis horas da manhã na casa numero doze, loja, da rua de São Caetano d‘esta freguesia de Nossa Senhora da Anunciada da cidade e concelho de Setubal, patriarchado de Lisboa, falleceu tendo recebido todos os sacramenttos da Egreja – José Anastácio Pacheco – de idade de trinta e tres annos, de profissão carpinteiro de carros, natural de Setubal, casado com Carolina Amélia, recebidos na freguesia de São Julião d‘esta cidade e parochianos d‘esta supradita freguesia da Annunciada, filho legitimo de Manuel Maria Pacheco e de Maria Rita Pacheco, também naturaes de Setubal, e recebidos também aqui n‘esta freguesia. Não fez testamento, deichou dois filhos menores, e foi sepultado no cemiterio publico d‘esta cidade. E para constar lavrei em duplicado este termo que assigno. Era ut supra. O Parocho encomendado Alberto Carlos Cotrim de Miranda.

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José Anastácio Pacheco (natural de Setúbal) casado com Carolina Amélia Pacheco pais de: Joaquim Pacheco ( natural de Setúbal) e de Manuel Francisco Pacheco - conhecido como Fran Paxeco * (natural de Setúbal); Joaquim Pacheco casado com Deolinda Baptista Pacheco e teve 4 filhos: Isabel; Óscar Paxeco (jornalista); Clóvis; Maria de Jesus. Esta última filha casou com António Sousa Franco ( Gouveia), formado em medicina, trabalhava num laboratório, sendo pois os pais de António Luciano Pacheco de Sousa Franco, que não teve filhos biológicos. Fran Paxeco, escritor, jornalista, diplomata, casou com Isabel Eugénia de Almeida Fernandes Paxeco (natural de S.Luis do Maranhão) e tiveram uma filha: Elza Fernandes Paxeco Machado (S. Luis do Maranhão ), que casou com José Pedro Machado (Faro ) e teve três filhos: Maria Helena, João Manuel e Maria Rosa Pacheco Machado (que sou eu, e tenho uma filha que se chama Inês...). A minha Mãe faleceu em 1989 e o meu Pai vai completar 90 anos no próximo mês de Novembro. MACHADO, Rosa, in https://geneall.net/en/forum/68924/prof-sousa-franco/


Para António Bento, deve haver lapso na idade, dado que, segundo o assento de casamento, em 20 de Abril de 1873, teria então 31 anos. 17 Fez os estudos primários em escola pública, no antigo Convento de São Francisco18; Concluidos os estudos primários, passou a estudar em colégio jesuita. Referindo-se a esta escola, anos mais tarde, deixará um testemunho pouco abonatório da sua passagem por ela:

O Rato‖, de 12Jul1891

FRAN PAXECO AOS 4 e aos 7 ANOS – Vieira da Luz, 195719 Depois, ingressa na Casa Pia de Lisboa20 - destinada aos órfãos de pai -, para prosseguir o ensino secundário, entre Novembro de 1883 e Outubro 1888. Voltou para Setúbal aos 14 anos, começando a trabalhar como ―escrevente‖ na Conservatória da Comarca de Setúbal, onde conheceu o diretor da ―Gazeta Satubense‖ - segundo ele, ―a Gazeta Setubalense foi, no período áureo, uma 17

CUNHA BENTO, 2014, obra citada. CONVENTO DE SÃO FRANCISCO: A Igreja e Convento de São Francisco - A primeira noticia sobre este convento dão conta do mesmo ter nascido em 1410, sendo naquele tempo propriedade da Ordem dos Frades Menores, Província dos Algarves. Esta foi provavelmente a primeira ordem religiosa a estabelecer-se em Setúbal. A sua construção deveu-se a D. Maria Anes Escolaris, filha de João Gonçalves Escolar, vedor da fazenda de D. Fernando senhora que ofertou o terreno e outros bens com a finalidade de contribuir para a sua edificação. A protecção ao Convento foi prosseguida pelo seu neto que reedificou a capela mor. Nesta construção de estilo renascentista com elementos decorativos barroco, esculpidos no frontispício da capela, há notícia de em 1619 ali se ter hospedado o rei Filipe III da Castela, aquando da sua visita a Setúbal.Passados anos, vamos encontrar as instalações do Convento bastante degradadas e, por isso, entre 1747 e 1749 ali são executados trabalhos de recuperação. Porém, em 1755, o violento terramoto que destruiu Lisboa, volta a danificar fortemente o convento. Em 1834, com a extinção das Ordens Religiosas os frades são daqui expulsos e o Estado toma posse destas instalações, vendendo-as posteriormente em hasta pública, acabando as mesmas por ser arrematadas por Joaquim O'Neil.O ano de 1840 chegou e veio encontrar o convento de novo já em ruínas, tendo então a família Tordales O'Neil mandado demolir a maior parte das instalações.Em 1874, Francisco José Pereira comprou o convento a João O'Neil e mandou-o reconstruir.Um ano depois de o ter adquirido, e já com algumas obras efectuadas, o edifício apresentava-se com melhor aspecto, pelo que o seu proprietário tratou de o vender, aos Padres da Companhia de Jesus que as concluíram, reedificando a igreja e adaptando o edifício para o estabelecimento de ensino. https://www.facebook.com/notes/amizades-de-inf%C3%A2ncia/convento-des%C3%A3o-francisco-set%C3%BAbal/273855106334620/ 19 VIEIRA DA LUZ, 1957, obra citada 20 A Casa Pia - formalmente CASA PIA DE LISBOA, é um organismo do Estado Português que tem por missão a promoção dos direitos e a proteção das crianças e dos jovens. Atualmente, a Casa Pia tem o estatuto de instituto público e funciona sob tutela do Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social. A instituição remonta à fundação da Real Casa Pia de Lisboa (Lisboa, 3 de julho de 1780), por Pina Manique, intendente-geral da Polícia sob o reinado de Maria I de Portugal. Destinava-se à educação de órfãos e à recuperação, através do trabalho, de mendigos e vadios. https://pt.wikipedia.org/wiki/Casa_Pia 18


escola de jornalistas e de artes gráficas. Uma grande parte dessedentou-se nessa fonte.‖ -, e aí inicia a sua carreira de jornalista: Começava assim a aventura intelectual de uma das mais instigantes personalidades da cultura lusobrasileira. Com pouco mais de vinte anos, Francisco Pacheco já exercia atividades regulares na imprensa de sua cidade natal e havia cumprido o serviço militar obrigatório, passando aos quadros da reserva do exército. (ITAPARY FILHO, 2008) 21 Aos 16 anos, funda ―O Elmano‖, em 6 de março de 1890, de que só saiu esse número, mas ressurgiu em 7 de março de 1893, e prolongou-se por bastantes anos: ―Num impulso juvenil, empreendemos a impressão do Elmano. Nasceu e morreu a 6 de Março de 1890. Foram tantas as picardias que, antes de vir para a rua, já resolvêramos morfinizá-lo.‖

Assentou praça como voluntário em 12 de maio de 1890. Ao se alistar, submete-se a ―exame de admissão‖22

• 21 22

ITAPARY FILHO, 2008, obra citada. CUNHA BENTO, 2014, obra citada.


Antònio Bento acredita que a carreira militar não terá sido uma fase brilhante da sua vida, apesar da rápida progressão. Ao fim de cinco meses era promovido a 1º Cabo e, passados mais quatro meses, era 2º - Sargento. A sua ideologia republicana aliada ao pendor ―revolucionário‖, não lhe facilitaram a vida. A folha de matrícula é reveladora do seu inconformismo: foi punido com detenções - ―por ser visto trajando à paisana‖, ―por faltar à formatura‖, ―por se ter dirigido a um camarada em termos inconvenientes‖ – e, por fim, a prisão por ―insubordinação e por ofensa, por meio de escripto a superior‖. Pena é que não se consiga localizar o processo que deu origem à sentença. 23 Promovido a 1º Cabo 24 de Outubro de 1890. ● Promovido a 2º Sargento em 16 de Fevereiro de 1891. ● Punido com 10 de detenção. ● Em 10 de Novembro de 1891 colocado na Companhia de Correcção nº 1. ● Recolheu ao Regimento de Infantaria nº 2 em 4 de Fevereiro de 1892. ● Preso para Conselho de Guerra em 30 de Janeiro de 1892. ● Solto em 6 de Dezembro de 1892, por efeito da sentença. ● Passou ao Regimento de Infantaria nº 2, em 14 de Dezembro de 1892. ● Passou à Reserva em 17 de Março de 1894. Foi domiciliar-se na freguesia de S. José, de Lisboa, 2º Bairro. ● Baixa em 12 de Maio de 1902. ● Reserva Territorial em 1919. Passando à reserva em 17 de março de 1894. Segundo deixou registado no opúsculo ―Pelo ministério dos estrangeiros‖, Pará, 1926, não faltaram os convites de oficiais seus superiores, graças, certamente, ao valor demonstrado24: o tenente coronel Rio de Carvalho, do último regimento referido, quis convencê-lo a permanecer nas 23 24

CUNHA BENTO, 2014, obra citada. CUNHA BENTO, 2014, obra citada.


fileiras, garantindo-lhe que obteria do ministro da guerra, o general Pimentel Pinto, a dispensa das suas faltas. Recusou a fineza. O capitão de fragata Nuno de Freitas Queriol, chefe de Gabinete de Hintze Ribeiro, insistiu para levá-lo como ajudante de ordens, para o distrito do Congo, de que estava nomeado governador. Fá-lo-ia promover a 1º sargento e a alferes. Também não aceitou esses obséquios, apesar de paupérrimo. E porquê? Porque desejava consagrar-se, de corpo e alma, livre das gargalheiras duma disciplina anacrônica, embora necessária, às ideias republicanas. Entrara no primeiro vinteno de existência. Ainda nas fileiras, foram motivo de uma ação criminal uns artigos republicanos, insertos na "A Liberdade Popular"25, semanário de Cantanhede. Orientava-o Albano Coutinho, sendo seu proprietário e redator Carvalho Neves. Esses artigos valeu-se-lhe uma ação criminal 26.. Ainda durante o Serviço Militar acentua a sua vertente de crítico de assuntos locais e de atualidade política, como acérrimo defensor dos ideais republicanos. São exemplos dessa atividade a colaboração em ―O Rato‖, na secção ―A Sério – Traços sobre Setúbal‖, sob o pseudónimo Flamino Nás, e na ―Liberdade Popular‖, de Cantanhede, onde lhe ―querelaram dois artigos entusiásticos‖, de que não se conseguiu, ainda, consultar nenhum exemplar, conforme informa António Bento 27. A propósito de ―O Rato‖, disse: “No intervalo, sustentámos, com Henrique de Santana, hoje professor da Escola Normal do Porto, O Rato,que pertendia ser humorístico.”.

―Sumiu-se‖ a 20 de Agosto de 189128.

Em 1 de Abril de 1894, assume um dos postos na redação política de "A Vanguarda"29, o mais independente e inflamado jornal da época, dirigida por Narciso Rebelo Alves Correa30. Teve como camaradas, aí, os drs. 25

Que durou de 14 de Junho a 4 de Outubro de 1891, conforme Cunha Bento, 2014, obra citada Ação essa que vem a provocar sua fuga de Portugal, vindo a ter no Brasil, para escapar à prisão; segundo Rosa Machado, não foram estes artigos que fizeram Fran Paxeco fugir de Portugal, mas sim o artigo da Vanguarda, publicada em Janeiro de 1895. 27 CUNHA BENTO, 2014, obra citada. 28 CUNHA BENTO, 2014, obra citada. 29 A Vanguarda / dir. Alves Corrêa. - A. 1, nº 1 (9 mar. 1891) - a. 21, nº 7627 (22 out. 1911). - Lisboa : Ellydio Analide da Costa, 1891-1911. - 52 cm. Biblioteca Nacional Digital – Portugal, disponível em http://purl.pt/14330 26


José Benevides e Fernando Martins de Carvalho, Faustino da Fonseca, Sousa Vieira, Carlos Calisto, França Borges, etc. Discute nesse jornal, entre outras questões, o esbulho de Quionga31, que o Tratado de Versalhes nos restituiu. Era também redator político dos hebdomadários ―A Montanha‖, de Trancoso, e ―O Cezimbrense‖, que representou, no congresso partidário de 1895.‖ Como nos diz em ―Pelo ministério dos estrangeiros‖ 32.

Promove em igual data, com seu querido condiscipulo Alfredo Serrano, o jubileu do soberbo lirico João de Deus33. Em Agosto e Setembro de 1894, publica em ―O Século‖ dois artigos intitulados ―A Cidade de Setúbal‖ e outro ―Bocage (Elmano Sadino)‖ 30

ANTÓNIO NARCISO REBELO DA SILVA ALVES CORREIA - Nasceu em Vila Real em 25 de Maio de 1860. Inicialmente desempenhou a profissão de farmacêutico, mas porque mostrou aptidões para a escrita, começa a colaborar nos jornais. Adopta então a profissão de jornalista e colaborou em inúmeras publicações periódicas, especialmente ligadas ao Partido Republicano. Destaca-se a sua colaboração na Folha do Povo, no Trinta, no Século, Os Debates, A Vanguarda e, finalmente, O País. Neste último jornal, foi o fundador em 1895 e dirigiu-o até à sua morte, provocada pela tuberculose, em 5 de Janeiro de 1900.Segundo o professor Oliveira Marques, foi iniciado na Maçonaria em 1882, na Loja Cavaleiros de Nemesis, em Lisboa, adoptando o nome simbólico de João Huss. [A. H. Oliveira Marques, Dicionário da Maçonaria Portuguesa, vol. I, Editorial Delta, Lisboa, 1986, col. 413.]Foi um jornalistas republicanos mais em destaque no seu tempo, envolvendo-se em várias polémicas, chegou a ser agredido e preso. 31 Em 1886, a Alemanha e Portugal tinham acordado no rio Rovuma como a fronteira oficial entre a então África Oriental Alemã (atual Tanzânia) e a colônia portuguesa de Moçambique. Em 1892, contudo, os alemães afirmaram que os portugueses não tinham nenhum direito na parte norte do cabo Delgado, a aproximadamente 32 quilômetros ao sul da foz do Rovuma. Em virtude disso, em 1894 a marinha alemã tomou Quionga, e as forças desse país ocuparam seu interior, forjando o que viria a ser chamado «triângulo Kionga» (uma área de cerca de 395 quilômetros quadrados). Na Primeira Guerra Mundial, esse território foi reanexado pelos portugueses, e nos termos do Tratado de Versalhes tornou-se a única aquisição territorial de Portugal nessa guerra. https://pt.wikipedia.org/wiki/Quionga . 32 CUNHA BENTO, 2014, obra citada. 33 João de Deus de Nogueira Ramos (São Bartolomeu de Messines, 8 de Março de 1830 — Lisboa, 11 de Janeiro de 1896), mais conhecido por João de Deus, foi um eminente poeta lírico e pedagogo, considerado à época o primeiro do seu tempo, e o proponente de um método de ensino da leitura, assente numa Cartilha Maternal por ele escrita, que teve grande aceitação popular, sendo ainda utilizado. Gozou de extraordinária popularidade, foi quase um culto, sendo ainda em vida objecto das mais variadas homenagens. Foi considerado o poeta do amor e encontra-se sepultado no Panteão Nacional da Igreja de https://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_de_Deus_de_Nogueira_Ramos Santa Engrácia, em Lisboa.


Por esta altura, Fran Paxeco envolve-se na primeira polémica da sua vida, com Francisco Paulino de Oliveira34. Diz-nos ele em ―Setúbal e as suas celebridades‖, Setúbal, 1930: ―«O Mez – chronica da vida setubalense» irrompe em Novembro-1894. Estamparam-se mais dois folículos em Dezembro-1894 e Janeiro-1895. Num deles chasqueou dum nosso artiguinho, inserto no Elmano. Ocupávamo-nos do excesso de largos irregulares em Setúbal. 35

34Escritor e poeta português, nasceu em 1864, em Setúbal, e morreu em1914, em São Paulo, no Brasil, país onde se exilou após a revolta de 31 dejaneiro de 1891 (tentativa de implantar a República em Portugal). Paulino de Oliveira, quando ainda morav a em Setúbal, foi jornalista em publicações republicanas. Já no Brasil, dedicou-se à poesia e literatura infantojuvenil, neste último caso em parceria com a mulher, a escritoraAna de Castro Osório. Nos seus primeiros anos de esc ritor usou o pseudónimo Anúplio de Oliveira. Ainda no Brasil, Paulino de Oliveira foi cônsul de Portugal em São Paulo,entre 1 911 e 1914. https://www.infopedia.pt/$paulino-de-oliveira 35 CUNHA BENTO, 2014, obra citada.


Em janeiro de 1895, ―A Vanguarda‖ publica artigo: ―O comando da 1ª Divisão militar‖, no qual se reverberam o rei D. Carlos36 e o general de brigada Antonio Abranches de Queirós, comandante das guardas municipais37. Pretendiam torná-lo substituto do general Moreira, no cargo de comandante daquela divisão. Esse artigo originou um grande alarido, foi considerado injurioso e o governo mandou processar Fran Paxeco (ALDEIA, 2006, BENTO, 2014) 38. 39

Volta a referir-se ao fato. Em 16 do mês citado, o suposto ofendido procura Alves Corrêa 40, na redação, e tenta agredi-lo.. No dia imediato, um irmão daquele ataca o diretor da Vanguarda, em pleno Teatro de S. Carlos…

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Carlos I (Lisboa, 28 de setembro de 1863 – Lisboa, 1 de fevereiro de 1908) foi o Rei de Portugal e Algarves de 1889 até ao seu assassinato. Era filho do rei Luís I de Portugal e sua esposa a princesa Maria Pia de Saboia. Nascido em Lisboa, foi cognominado "o Diplomata" (devido às múltiplas visitas que fez a Madrid, Paris e Londres, retribuídas com as visitas a Lisboa dos reis Afonso XIII de Espanha, Eduardo VII do Reino Unido, do imperador Guilherme II da Alemanha e do presidente da República Francesa Émile Loubet), "o Martirizado" e "o Mártir" (em virtude de ter morrido assassinado), ou O [3] Oceanógrafo (pela sua paixão pela oceanografia, partilhada com o pai e com o príncipe do Mónaco). https://pt.wikipedia.org/wiki/Carlos_I_de_Portugal Influenciado por ideias de renovação política e cultural que se alastravam em toda a Europa, difundindo-se em Portugal principalmente a partir de Coimbra, adepto de correntes de pensamento contrárias à monarquia decrépita, segundo Itapary Filho, 2008. 37 https://pt.wikipedia.org/wiki/Guarda_Nacional_Republicana 38 ALDEIA, João. Setubal na Rede. Disponível em http://www.setubalnarede.pt/content/index.php?action=articlesDetailFo&rec=7659, acessado em 16 de janeiro de 2014 39 CUNHA BENTO, 2014, obra citada. 40 http://arepublicano.blogspot.com.br/2010/10/vanguarda-dia-2-de-outubro-de-1910.html


As perseguições prosseguiram… Alves Corrêa desafia para um duelo o mais velho dos irmãos do imaginário ofendido.. Serviram de padrinhos os Drs. Magalhães de Lima e José Benevides. Mas o desafiado negou-se ao encontro. Alves Corrêa amedronta-se e pede a Fran Paxeco que se demita de ―A Vanguarda‖. 41

Segundo Bento (2014) 42, de seguida ―A Montanha‖ publica uma áspera narrativa do escândalo, em resultado do que lhe é instaurado um processo judicial. Diz ele referindo-se ao caso: ―A querela baseou-se em preadivinhadas injúrias à loura pessoa de sua majestade fidelíssima. O chinfrim promanou de hipotéticos agravos ao rubicundo comandante das augustas guardas municipais. Tudo reles e mesquinho, como vedes. O jornal acusado dá pelo nome de Montanha e penetra nas mercearias dos beirões penhascos de Trancoso; o indivíduo peado pelas justiças pseudodenominava-se em Brissos Calvão. O monarca chama-se Carlos Simão de Bragança, afora o restante; o general é conhecido por António Abranches Queiroz…‖ 41 42

CUNHA BENTO, 2014, obra citada. CUNHA BENTO, 2014, obra citada.


Ouvida a opinião de amigos advogados, foram unânimes: por se encontrar sujeito ao foro militar, incorria numa pena de um mínimo de cinco anos de prisão. O conselho foi: ―Arranje a mala e safe-se!‖. O processo, até agora, encontrado no Arquivo Histórico Militar resume-se a um conjunto de documentação relacionada com o aludido processo judicial. Trata-se de pedido do Tribunal de Trancoso às autoridades militares para envio de documentos autógrafos de Fran Paxeco, no sentido de ser identificada a letra do autor do escrito que deu origem ao processo. Presume-se, contudo, que os documentos enviados não terão sido aceites pelo Tribunal. Razão pela qual o processo, possivelmente, não terá tido continuidade43

Sujeito ao foro militar, no caráter de reservista, decide exilar-se dois meses mais tarde. Parte do terreiro do Paço a 28 de março de 1895, via Algarve, donde se transporta a Málaga, e dai ao Rio de Janeiro, onde chega em 8 de maio. 43

CUNHA BENTO, 2014, obra citada.


Em ― O Sangue Latino‖, Lisboa, 1897 44, faz-nos um relato pormenorizado da sua partida, em 28 de Março de 1895, para o exílio no Brasil;

Como ele mesmo narra: [...] roupas enlaçadas, livros cintados, sob o codinome de Viegas Guimarães, Francisco tomou o primeiro navio que lhe apareceu e rumou para a Espanha, donde, também sem perda de tempo, escapou rumo ao Brasil. Aportou no Rio de Janeiro a 8 de maio de 1895, com 21 anos de idade, e empregou-se no comércio. Com pouco tempo no Rio, em dezembro daquele ano, seria despedido do emprego por haver fundado um jornal chamado “A República Portuguesa”.

OLIVEIRA GOMES, 1898

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O Sangue Latino, de 1897 é, em parte, um livro de viagens, aonde Fran Paxeco vai retratando as terras por onde passou, e particularmente Sevilha. Mas é igualmente um livro de reflexão política sobre Portugal.46

―A Gazeta de Petrópolis‖, ed. 75 21/06/1898, ao comentar o aparecimento de ―Sangue Latino‖ 1897, nos traz um pouco das aventuras de Fran Paxeco, de sua fuga de Portugal: 44

CUNHA BENTO, 2014, obra citada. OLIVEIRA GOMES, Novas Literárias. In A GAZETA DE PETRÓPOLIS, ed. 75, 21/06/1898 46 ALDEIA, João. Setubal na Rede. Disponível em http://www.setubalnarede.pt/content/index.php?action=articlesDetailFo&rec=7659, acessado em 16 de janeiro de 2014 45


Do Algarve passa a Espanha, dá um salto a Ceuta, embarca em Málaga, no navio Provence, chegando ao Rio de Janeiro a 1 de Maio seguinte. Em 8 do mesmo mês está empregado na ―Casa Souto Maior‖.

OLIVEIRA GOMES, 1898

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Tomou parte dos atos comemorativos do centenário da morte de Basílio Gama48, prefaciando o seu poema ―Uruguai‖49 e foi um dos promotores da ―Nova Revista‖. 47

OLIVEIRA GOMES, Novas Literárias. In A GAZETA DE PETRÓPOLIS, ed. 75, 21/06/1898 JOSÉ BASÍLIO DA GAMA foi um poeta luso-brasileiro que escrevia sob o pseudônimo Termindo Sipílio. Célebre por seu poema épico O Uraguai, de 1769, e investido como patrono da cadeira 4 da Academia Brasileira de Letras. Wikipédia 49 O Uraguai é um poema épico escrito por Basílio da Gama em 1769, conta de forma romanceada a história da disputa entre jesuítas, índios (liderados por Sepé Tiaraju) e europeus (espanhóis e portugueses) nos Sete Povos das Missões, no Rio Grande do Sul. O poema épico trata da expedição mista de portugueses e espanhóis contra as missões jesuíticas para executar as cláusulas do Tratado de Madrid, em 1756. Tinha também o intuito de descrever o conflito entre ordenamento racional da Europa e o primitivismo do índio. Esse poema é também um marco na literatura brasileira representando uma quebra com o modelo clássico do poema épico. O Uraguai é composto por apenas cinco cantos (ao invés dos dez cantos de Os Lusíadas) e apresenta 1377 versos brancos (sem rima) e nenhuma estrofação. Outra característica que diferencia O Uraguai dos outros poemas épicos é o fato de narrar um episódio histórico muito recente. https://pt.wikipedia.org/wiki/O_Uraguai 48


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OLIVEIRA GOMES, 1898

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Nos principios de dezembro de 1895, parte para Belém do Pará, onde chega a 17. Nesse mesmo mês, sem perda de tempo, embarcou-se para o Pará, onde saltou a 17. Já em Belém, associou-se na publicação de um jornal intitulado “Folha do Norte”, cujo primeiro número sairia menos de um mês após a sua chegada, exatamente no dia 1º de janeiro de 1896. Fran Paxeco (Que passou a abreviar nome de Francisco e grafar o sobrenome com x) era um dos redatores. Em 96, 97 e 98 trabalhou em jornais daquela cidade, onde também organizou a biblioteca do Grêmio Português, lecionou em escolas privadas e, em março de 1898, expôs à venda o seu primeiro livro: “Sangue Latino”.

Neste jornal publica um conjunto de artigos sobre a descoberta do Brasil que gera viva polémica, ainda que consiga fazer prevalecer a sua versão. É também neste periódico que, a partir de 9 de Março de 1896, publica um conjunto de seis artigos sobre Bocage52. Trata-se de uma versão revista e melhorada do artigo que publicou inicialmente em ―O Século‖, de 16 de Setembro de 1894. 50

ADOLFO FERREIRA DOS SANTOS CAMINHA (Aracati, 29 de maio de 1867 — Rio de Janeiro, 1 de janeiro de 1897) foi um escritor brasileiro, um dos principais autores do Naturalismo no Brasil. Colabora também com a imprensa carioca, em jornais como Gazeta de Notícias e Jornal do Commercio, e funda o semanário, Nova Revista. Já tuberculoso, lança o último romance, Tentação, em 1896. Morre prematuramente no Rio de Janeiro, no dia 1º de janeiro de 1897, aos 29 anos.https://pt.wikipedia.org/wiki/Adolfo_Caminha 51 OLIVEIRA GOMES, Novas Literárias. In A GAZETA DE PETRÓPOLIS, ed. 75, 21/06/1898 52 Manuel Maria de Barbosa l'Hedois du Bocage (Setúbal, 15 de setembro de 1765 – Lisboa, Mercês, 21 de dezembro de 1805) [1] foi um poeta nacional português e, possivelmente, o maior representante do arcadismolusitano. Embora ícone deste


Colaborador da ―Folha do Norte‖, saindo em maio de 1896, e em junho organiza o catálogo da biblioteca do Gremio Litarário Portugues. Prefacia o libreto do ―Guarani‖, quando uma companhia ali apresentou essa opera, em 03 de dezembro de 1896. Dá aulas até 1897, que deixa para se tornar sócio solidário da papelaria Silva. Organiza homenagens a Mousinho de Albuquerque53, pelas vitórias contra os vátuas. Encontramos uma primeira referencia a Fran Paxeco – já assinalado assim seu nome – no jornal ―O Pará‖, edição de 18 de dezembro de 1897, como um dos responsáveis pela ―A Revista‖:

No Diário do Maranhão, edição de 31 de julho de 1897, era informado que Fran Paxeco assumira a direção do jornal amazonenses ―Diário de Notícias‖; e já em agosto, começa a polemica com Arthunio Vieira, exredator daquele jornal (Diário do Maranhão, 02 de agosto).

Em setembro (O Pará do dia 18) uma nota sobre o que se passava em ―Manaus‖, envolvendo novamente Arthunio Vieira e Fran Paxeco; tratava o colunista sobre a questão do Acre.

movimento literário, é uma figura inserida num período de transição do estilo clássico para o estilo romântico que terá forte [2] presença na literatura portuguesa do século XIX. Era primo em segundo grau do zoólogo José Vicente Barbosa du Bocage. https://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_Maria_Barbosa_du_Bocage 53 Joaquim Augusto Mouzinho de Albuquerque foi um oficial de cavalaria português que ganhou grande fama em Portugal por ter protagonizado a captura do imperador nguni Gungunhana em Chaimite e pela condução ... Wikipédia


Em A FEDERAÇÃO (08 outubro), órgão oficial do Partido Republicano Federal, e no Commercio do Amazonas (10/10) informa-se que o colaborador do Jornal Diário de Noticias encontrava-se enfermo.

No dia seguinte (em O Pará de 09 de outubro) novamente Arthunio Vieira assaca contra Fran Paxeco, em sua coluna ―Manaus‖ (publicada a 03 de outubro). Pertencia também, já a essa época, à ―Mina Litterária‖, grupo de jovens literatos conforme se depreende de noticia veiculada nesse mesmo jornal a 27/12/1897, em que se anunciava, além da ordem do dia, o lançamento de ―A Revista‖:

No ano seguinte, 1898, prosseguiam as reuniões literárias da Mina – e dos mineiros, como eram chamados seus membros (O Pará, 11/01/1898). Segundo o ―O Pará‖, de 19 de março de 1898, haveria a recepção aos novos associados; Fran Paxeco não se fez presente, justificando a ausência por achar-se adoentado. Membro da comunidade lusitana em Belém fazia parte da Comissão do Centenário Indiano, em comemoração aos 400 anos da descoberta do Caminho para as Índias. Foi Luciano Cordeiro, secretário perpétuo da Sociedade de Geografia de Lisboa, que o incitou a interessar a colônia nas comemorações do centenário indiano. Redigira já, em Julho daquele ano, o manifesto das associações portuguesas acerca desse fato histórico. Elegeram-no secretário-geral da comissão executiva.


Em março de 1898 (O Pará, 08/03) saia o segundo numero de A Revista, com a colaboração de Fran Paxeco, escrevendo sobre Teófilo Braga:


Na edição seguinte, aparece nota sobre seu aniversário e anunciado o lançamento de seu primeiro livro – Sangue Latino, no Pará

Em ―O Pará‖ edição de 19 de março de 1898, Fran Paxeco propõe a mudança de nome de ―Mina Literária‖ para ―Centro Litterário Paraense‖. E em 1898 principia a colaborar na ―Provincia do Pará‖ e publica ―O Álbum Amazônico‖. Em meados de Dezembro o jornal ―O Pará‖ noticia: É um facto innegável que o meio litterário augmenta progressivamente no Pará… Os livros são raros por que raro é também por enquanto o público que lê… ainda assim a publicação augmenta… Os srs. Alfredo Silva & Cª que se têm arvorado em paladinos da profusão da ideia tiveram a louvável lembrança de tentar a publicação de um revista… Junte-se à garantia de bom exito, [nomes dos colaboradores], os de Fran Paxeco e Alfredo Silva, directores litterario e thecnico da «Revista» e cada um de per si julgará se é ou não justificado o enthusiasmo que a publicação está despertando.‖ A revista tinha uma longa lista de colaboradores, citam-se, por exemplo, entre os portugueses: Teófilo Braga, Gomes Leal, Teixeira Bastos, Cândido de Figueiredo, Guerra Junqueiro, Magalhães de Lima, Manuel Maria Portela, ―e outros‖.

Ao que parece, terá sido nesta revista que Fran Paxeco assinou os primeiros artigos com o seu ―novo nome‖.


―Declaro que, desde o anno de 1897, residindo nessa data no Estado do Pará, República dos Estados Unidos do Brasil, mudei o nome de Manuel Francisco Pacheco, para o de Manuel Fran Paxeco, que de então para cá tenho adoptado em todos os actos publicos. O motivo desta alteração consistiu em existirem na cidade de Belém do Pará quatro pessoas com o nome Francisco Pacheco, exercendo uma delas a profissão de comerciante. E sendo praxe ali, quando appareciam negociantes com nomes eguaes, mudar o seu aquelle que surgia depois do já conhecido, tive que realizar essa transformação, ao entrar no commercio paraense. S. Luiz do Maranhão, 12 de outubro de 1905‖

Manteve-se o nosso ilustre conterrâneo na Direcção Literária da ―Revista‖ desde o nº 1 (Janeiro/1898) até ao nº 7 (Julho/1898), altura em que é anunciada a sua substituição ―visto retirar-se para a Europa o nosso confrade Fran Paxeco”. 54 Em ―O Pará‖ edição de 19 de março de 1898, Fran Paxeco propõe a mudança de nome de ―Mina Literária‖ para ―Centro Litterário Paraense‖. 54

CUNHA BENTO, 2014, obra citada.


Seu livro recebeu algumas críticas, desfavoráveis ao autor, como se vê na coluna Livros, de ―O Pará‖, edição de 20 de março de 1898, escrita por Arthunio Vieira55. Nessa mesma edição, na Coluna CATURRICES Ambrosio de Jesus e Paiva também o critica por querer mudar o nome da ―Mina Literrária‖; Fran Paxeco continuava nos quadros da Mina, participando ativamente de seus saraus, e pronunciado palestras, como se pode ver nesta nota de 05 de junho de 1898;

Em 1898, volta a Portugal e em 1899 já está no Brasil, a subir o Amazonas rumo a Manaus, onde é diretor do ―Diário de Notícias‖ e secretário-geral da Associação de Imprensa Amazonense (1900). Em 1899, em Manaus, é atacado pelo empaludismo. De volta a Belém do Pará escreve ―A Questão do Acre‖. O ―Diário do Maranhão‖, edição de 06 de março de 1899, dá-nos conta de Fran Paxeco residindo ainda em Belém, em reunião da Mina Literária, ao mesmo tempo em que são anunciados novos números de A Revista, com a colaboração de Fran Paxeco. 55

Arthunio Vieira, que foi redactor http://www.ceara.pro.br/cearenses/listapornomedetalhe.php?pid=33329

do

Jornal,

de

Fortaleza..



Em O Pará de 11 de fevereiro de 1899 consta que ainda residia em Belém, quando do lançamento do ―Álbum Amazônico‖, de autoria de Arthur Caccavoni, que teve a tradução do italiano para o português por conta de Fran Paxeco.

Na edição de O Pará de 03 de março, Emilio Zoilo ao comentar artigo sobre regras ortográficas do português refere-se ao estilo de escrita de Fran Paxeco.

No mês de abril, em O Pará edição do dia 18, é descrita mais uma reunião da Mina Literária, na qual Fran Paxeco teve ampla participação. As propostas de Fran Paxeco foram aceitas e encaminhadas através de oficio às autoridades; ele passou a fazer parte das comissões que se estavam formando, para se comemorar o


descobrimento do Brasil. Propunha ele que se desse o nome de Pedro Álvares Cabral a uma rua, ou a uma praça, em Belém do Pará; e mais, que fosse feito um congresso nacional comemorativo aos 400 anos do descobrimento.

Em 04 de maio, Fran Paxeco estava às voltas com os preparativos do Centenário do Descobrimento, ainda em Belém do Pará. O jornal ―Commercio do Amazonas‖ em sua edição de 21 de junho de 1889 publica uma crítica assinada por J. Brandão sobre o ―Sangue Latino‖, de Fran Paxeco

Deve-se ressaltar que Fran Paxeco tivera intensa participação na vida literária de Belém antes de assumir a função de redator do Diário de Notícias, em Manaus; esses artigos publicados em Manaus eram replicados em Belém pelo ―O Pará‖.


Em nova publicação (O Pará, 21 de outubro), Arthunio Vieira novamente se refere à Fran Paxeco, em sua coluna; embora datada de 15 de setembro, chega à redação d´O Pará somente a 20 de outubro (nota da redação). Nesta nova publicação, Arthunio refere-se ao fato de há um ano Fran Paxeco o substituir na redação do Diário de Noticias.


Não obstante os ataques entre os redatores do Diário de Notícias de Manaus – o atual (Fran Paxeco) e o ex (Arthunio) – vamos encontrar Fran Paxeco envolvido na constituição da Associação de Imprensa amazonense, atuando como secretário da assembléia de fundação (A FEDERAÇÃO, 07/11/1899).

No dia seguinte, uma nota sobre noticia publicada em outro jornal, envolvendo Fran Paxeco (A FEDERAÇÃO, 08/11); E a 10/11/1899, outra nota. O que teria havido? Segundo o jornal ―Commercio do Amazonas‖, edição de 07 de novembro de 1899 um funcionário da Casa Souza & Cia – Almeida Pimentel – tinha agredido a Fran Paxeco.


O motivo?

Em 20/12/1899, Fran Pacheco começa a escrever, em Manaus, notas sobre escritores e filósofos portugueses, e de brasileiros que se destacam em Portugal. A Pacotilha de 03 de janeiro de 1900 registra a publicação desses artigos:


Vai ao Rio de Janeiro onde colabora no ―O País‖ e em 2 de maio de 1900 chega a São Luis do Maranhão.(MACHADO, 2014) 56. Da chegada de Fran Paxeco ao Maranhão, Humberto de Campos faz referencia em sua obra ―Memórias Inacabadas‖57: ―Fran Paxeco, escritor português, discípulo e devoto de Teófilo Braga, chegara ao Maranhão, procedente de Manaus, onde o seu temperamento combativo lhe havia criado grandes e aborrecidas incompatibilidades. Idólatra do seu mestre saíra a defendê-lo de Sílvio Romero, que o acusara de gravíssima desonestidade literária. [...] Aportando ao Maranhão, Fran Paxeco viveu aí como na sua terra. São Luís era, aliás, por esse tempo, uma cidade portuguesa, e em que dominava, ainda, o reinol. O diretor de uma das folhas mais vibrantes da cidade era o português Manuel de Bittencourt. À frente do diário que defendia o Governo estadual, estava o português Carvalho Branco, a que o Partido oficial, reconhecido pelos serviços relevantíssimos que ele lhe prestara nos trabalhos de alistamento eleitoral, havia dado, numa recompensa expressiva, o privilégio para fabricar caixões de defunto. O comércio era, quase todo, português. De modo que, estabelecendo-se na capital 56

MACHADO, 2014, obra citada CAMPOS, Humberto de. MEMÓRIAS E MEMNÓRIAS INACABADAS. São Luis: Instituto Geia, 2009 SAMUEL, Rogel. Fran Paxeco segundo Humberto de Campos. In ENTRE-TEXTOS, publicado em 20/11/2011, disponível em http://www.45graus.com.br/fran-paxeco-segundo-humberto-de-campos,entre-textos,86963.html 57


maranhense, Fran Paxeco se sentia tão à vontade como se tivesse desembarcado no Porto ou em Lisboa. As vantagens que ele trazia, com a sua vivacidade e com o seu entusiasmo, justificavam, aliás, a cordialidade do acolhimento. Habituado a olhar o português como gente de casa, a mocidade maranhense, que saía do Liceu, e se iniciava nos cursos superiores fora do Estado, saudou Fran Paxeco à chegada, e proclamou-o um dos seus guias e mestres. E o hóspede se identificou de tal maneira com ela, que olvidou a sua condição de estrangeiro, e passou a participar da atividade social da terra generosa com uma solicitude bárbara, mas que era, em tudo, de uma sinceridade intensa e profunda. Miúdo e barbado, era, todo ele, nervos e cérebro. Mais tarde, tirou as barbas. ―Mas conservou inalteráveis o temperamento, o espírito e o coração, até o dia em que Portugal o removeu para Cardiff, como vice-cônsul, isto é, em um posto equivalente ao que o Brasil dera, ali, anos antes, a Aluísio Azevedo‖. Vindo do Rio de Janeiro, desembarca em São Luís, capital do Estado do Maranhão, em 2 de Maio de 1900. ● Em 28 de Julho seguinte, conjuntamente com outros escritores maranhenses, dá início a um movimento de renovação literária com o nome de ―Oficina dos Novos‖, tendo como Patrono o Poeta Gonçalves Dias. ● Na sequência do livro ―Uma esperteza – Os Cantos e os Contos populares do Brasil e o Sr. Teófilo Braga. Protesto‖, de Sílvio Romero, Fran Paxeco contestou ―de modo algo sacudido os doestos de um dos chefes da intelectualidade brasileira‖, assumindo a defesa de Teófilo Braga. Publica, então, ―O Sr. Sílvio Romero e a literatura portuguesa‖, S. Luís, 1900. A crítica foi-lhe bastante favorável e o próprio Sílvio Romero ao reeditar o seu livro ―eliminou quase tudo quanto lhe profligara”. ● Em 1901 apareceu a Revista do Norte, que contou desde o início com o trabalho de Fran Paxeco. Publica o primeiro artigo com o título ―O Porvir Brasileiro‖ , com os subtítulos: as finanças, a economia, o ensino e a política. Joaquim Vieira da Luz diz a propósito: ―Fran Paxeco não abordava os assuntos pela rama, analisáva-os sob todos os ângulos, penetrando-os a fundo.‖ ● Em 14 Agosto promoveu uma conferência em que abordou o assunto da ligação do caminhode-ferro entre São Luís e Caxias que viria a constituir o ponto de partida para a concretização daquele importante meio de desenvolvimento. Terminou aqui a primeira passagem de Fran Paxeco por São Luís do Maranhão. Na edição de 09 de julho de 1900 do ―Diário do Maranhão‖ aparece a ―estreia‖ de Fran Paxeco num evento literário em São Luis, na primeira palestra realizadas no salão do Centro Caixeiral, conforme anunciado. Presentes, Sousândrade, Pedro Nunes Leal, José Maria Correia de Frias, e o Major Sergio Vieira. Tomou a palavra o Sr. Firmino Saraiva, e após Antonio Lobo; a seguir Fran Paxeco fez seu pronunciamento; igual registro faz o jornal ―A Pacotilha‖


A palestra de Fran Paxeco repercutiu na imprensa maranhense, merecendo várias citações, elogiando a erudição do mesmo e a forma como expos seus pensamentos. Especial atenção que dedicou às senhoritas elegantes, presentes ao salão do Centro Caixeiral... A segunda palestra seria realizada a 12 de julho, tendo por tema O teatro brasileiro e Artur Azevedo. Na edição de 13 de julho de ―A Pacotilha‖ aparece longa crítica ao promunciamento de Fran Paxeco, com um resumo da mesma e elogiando sua erudição; em outra coluna parace o anuncio de uma revista da qual Fran Paxeco seria um dos responsáveis.

A segunda palestra seria realizada a 12 de julho, tendo por tema O teatro brasileiro e Artur Azevedo:

A Pacotilha aparece longa crítica ao pronunciamento de Fran Paxeco, com um resumo da mesma e elogiando sua erudição;

em outra coluna aparace o anuncio de uma revista da qual Fran Paxeco seria um dos responsáveis:

Nas edições de 25 e 28 de julho é anunciada nova palestra de Fran Paxeco nos mesmos salões, ocasião em que seria inaugurada um retrato de Teofilo Braga. Também bastante elogiada, como se vê nos jornais dos dias seguintes. Em ―A Pacotilha‖ de 31 de julho de 1900 aparece longo texto de Fran Paxeco rebatendo algumas criticas que recebera de sua palestra sobre Teofilo Braga... estava se iniciando, tal como em Manaus, debates através da imprensa sobre a participação de nosso biografado nas lides literárias...


Aparece novo anuncio de palestra, desta vez abordando a via e obra de ―Eça de Queiroz e o romace portugues‖ (Diário do Maranhão, 1º agosto 1900); também merecendo aplausos, por parte dos presentes e da imprensa. Fran Paxeco aparece entre doadores de livros à Biblioteca Pública Benedito Leite... A 7 de agosto aparece noticia de que Teofilo Braga, instado por Fran Paxeco, publicaria as obras completas de João Lisboa Na edição do Diário do Maranhão de 31 de agosto de 1900 um ―A.A‖.58 escreve que recebera correspondencia de Fran Paxeco enviada ‗de seu saudoso Maranhão‘ em que este comunicava que aproveitava o ócio da convalescença de molestia que há seis meses o acometia e, em São Luis, estava tão agradavel que pensava mesmo em lá permanecer: ―sou-me tão grato que estou quase que capaz de me deixar ficar aqui‖, escrevia. Mais, que aproveitando o tempo, estava a escrever um volume de 200 paginas sobre Silvio Romero e a literatura portuguesa. Se refe às palestras que vinha ministrando junto com ―um inteligente rapaz, o Antonio Lobo, Diretor da Biblioteca Pública‖:

Na sequência do livro ―Uma esperteza – Os Cantos e os Contos populares do Brasil e o Sr. Teófilo Braga. Protesto‖, de Sílvio Romero, Fran Paxeco contestou ―de modo algo sacudido os doestos de um dos chefes da intelectualidade brasileira‖, assumindo a defesa de Teófilo Braga. Publica, então, ―O Sr. Sílvio Romero e a literatura portuguesa‖, S. Luís, 1900. A crítica foi-lhe bastante favorável e o próprio Sílvio Romero ao reeditar o seu livro ―eliminou quase tudo quanto lhe profligara”.Em 29 de outubro é noticiado que Fran Paxexo estava de volta após viagem ao litoral do Norte. E a 14 de dezembro aparece o livro sobre Silvio Romero59: 58

Em correspondência eletrônica (13/12/2013), a Dra. Rosa Machado, neta de Fran Paxeco informa: “O AA que escreve sobre Vôvô julgo ser Alfredo de Assis (p 36). Davam-se muito bem; casou com uma prima de Vóvó, de nome Filomena. Faleceu com muita idade, e correspondia-se com minha Mãe e meu Pai.” 59 SÍLVIO VASCONCELOS DA SILVEIRA RAMOS ROMERO (Lagarto, 21 de abril de 1851 — Rio de Janeiro, 18 de junho de 1914) foi um advogado, jornalista, crítico literário, ensaísta, poeta, historiador, filósofo, cientista político, sociólogo, escritor, professor e político brasileiro. nasceu em Lagarto, em Sergipe, em 21 de abril de 1851. Cursou a Faculdade de Direito do Recife entre 1868 e 1873, diplomado em 1873, contemporâneo de Tobias Barreto.[1] Nos anos


Na edição de 31 de dezembro de 1900 do ―Diário do Maranhão‖, por ocasião das homenagens ao Coronel Manoel Dias Vieira que deixava a presidencia da Camara dos Vereadores, Fran Paxeco pede a palavra e ressalta que não estranhassem um estrangeiro falar naquela ocasião, mas se pronunciava para agradecer a acolhida que recebera do homenageado, quando chegara a São Luis. O que se nota que esses pronunciamentos nas mais diversas ocasiões, sejam homenagens, saraus literários, encontros, apareciam publicados na imprensa, em forma de livretos, e distribuidos aos mais diversos públicos, em especial encaminanhados aos jornais, que fazima a divulgação de que os mesmos estavam a disposição do grande público; Fran Paxeco começa a ter seus trabalhos publicados no Maranhão:

Fran Paxeco fixa-se mesmo em São Luis. Tendo vindo passar uma temporada, conforme ele mesmo afirma, para se restabelecer de doença, após seis meses na cidade já pensava em deixar-se ficar por aqui. Sua aceitação por parte dos intelectuais maranhenses, e os constantes convites para se pronunciar nos diversos eventos literários que ocorriam na cidade, constituiram motivo para tal. Em março de 1901 sai nota no Diário do Maranhão. Nesse ano, 1901, apareceu a Revista do Norte, que contou desde o início com o trabalho de Fran Paxeco. Publica o primeiro artigo com o título ―O Porvir Brasileiro‖ , com os subtítulos: as finanças, a economia, o ensino e a política. Joaquim Vieira da Luz diz a propósito: ―Fran Paxeco não abordava os assuntos pela rama, analisáva-os sob todos os ângulos, penetrando-os a fundo.‖ 1870 colaborou como crítico literário https://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%ADlvio_Romero

em

vários

periódicos pernambucanos e cariocas.


Nosso Patrono continuava a participar das mais variadas sociedades literárias que apareciam em São Luis – assim como colaboração nas revistas literárias, como exemplo a Revista do Norte - , conforme anuncio de mais uma palestra, desta vez na Associação Cívica Maranhense, durante posse de novos ‗funcionários‘ eleitos. Em 14 Agosto promoveu uma conferência em que abordou o assunto da ligação do caminho-de-ferro entre São Luís e Caxias que viria a constituir o ponto de partida para a concretização daquele importante meio de desenvolvimento. Em abril de 1902 Fran Paxeco publica uma serie de artigos – ―Comunicado: o catão Bethencourt‖60, sobre uma polemica surgida entre o ilustre – e vetusto – professor e Antonio Lobo61, na qual Fran saiu em defesa deste. Há inclusive, uma carta esclarecendo uma briga que houvera em um dos bondes da cidade, com agrassões mutuas, a qual Fran presenciara – sem se envolver. Em 26 de junho de 1902 é anunciado uma serie de artigos intitulados ―O Maranhão e seus recursos‖.

60

Sobre MANOEL DE BÉTHENCOURT, diz Dunshee de Abranches no livro de memórias O cativeiro, que “escandalizara a boêmia da terra, envergando calças de quadros largos, colete vermelho, gravata multicor, fraque de abas até a barriga das pernas, cartola ao lado da fronte, fumando dois charutos ao mesmo tempo, trazendo pendentes ao pescoço três monóculos e brandindo pelas ruas duas bengalas.” http://www.academiamaranhense.org.br/inacio-xavier-de-carvalho/ 61 Nasceu em São Luís, a 4 de julho de 1870, e faleceu na mesma cidade, a 24 de junho de 1916. Jornalista, poeta, romancista, professor, tradutor, publicista e polemista compulsivo. Dirigiu a Biblioteca Pública, o Liceu Maranhense e a Instrução Pública. Diretor d´ARevista do Norte (1901/1906), periódico ricamente ilustrado,e do jornal A Tarde(1915/1916); colaborou em diversos outros órgãos da imprensa maranhense. Antônio Lobo é, sem favor nenhum, uma das mais importantes figuras de sua geração. Amigo da mocidade, foi o principal agitador de idéias de seu tempo e o entusiasta da renovação mental do Maranhão. Um dos fundadores da Academia, onde, curiosamente, não teve papel relevante, ali instituiu a Cadeira Nº 14, patrocinada por Nina Rodrigues. http://www.academiamaranhense.org.br/antonio-francisco-leal-lobo/





Em Maio de 1904, dirige-se a Manaus, de onde parte, em Agosto, a convite do, então, Coronel Taumathurgo de Azevedo62, para o Alto Juruá, como seu Oficial de Gabinete, mesmo depois da recusa de se naturalizar para tal fim. Assiste, em 28 de Setembro de 1904, à fundação da cidade do Cruzeiro do Sul, e o seu nome figura na Ata da Fundação da Cidade, que foi depositada no monumento que ficou a assinalar o evento. As suas funções incluíam a Direção do ―Cruzeiro do Sul‖, órgão oficial da Prefeitura. Escreve a letra do hino de Cruzeiro do Sul.

Em junho de 1905, está em São Luis do Maranhão de férias, para visitar a noiva e os amigos, quando na volta, em outubro, é alvo de grandes perseguições por parte do novo prefeito, inimigo do anterior. O dr. Dr. Virgulino Alencar não entendeu uma resolução dada e anulou um contrato que classificou de clandestino e criminoso. Fran Paxeco toma-se como ofendido e solicita a sua exoneração, já que tinha sido ele que lavrara o dito, com a devida autorização do coronel, já de partida para o Rio de Janeiro. O novo prefeito diz-lhe que semelhantes qualificativos apenas se dirigiam ao ato de seu antecessor, mas Fran Paxeco acha que qualquer injuria feita àquele distinto brasileiro é como se fosse para si próprio. Nega-lhe a demissão e dois dias manda-o prender, instaura-lhe um processo, sendo julgado incorretamente. É sujeito a diversas sevicias inconcebíveis que provocam disturbios psiquicos graves, pelo que é internado no hospício de Manaus, em março de 1907. Os seus amigos de São Luis do Maranhão, procuram desfazer este equivoco publicando na Pacotilha e outros jornais o seu protesto pela injustiça que estava acontecendo em Juruá. São mais de 130 pessoas que subscrevem os artigos e, em simultaneo a colonia portruguesa do Maranhão faz chegar junto do Governo Federal, documento onde pede a reposição da verdade. Nessa luta foi muito importante o esforço e espirito coordenados de sua noiva, Isabel Eugênia de Almeida Fernandes, que consegue todo o apoio das amigas e seus familiares que a acompanham em toda a luta que vai encetar. É um fato invulgar para a época em que a familia tradicional com principios bastante rigidos vedava qualquer movimentação de donzelas sem acompanhamento de pai (já falecido) ou irmão (ausente no Rio de janeiro). Foi um belo e dignificante exemplo à mulher maranhense. 62 Gregório Taumaturgo Azevedo (Barras, 17 de novembro de 1853 — Rio de Janeiro, 29 de agosto de 1921) foi um político brasileiro. Filho de Manuel de Azevedo Moreira de Carvalho e de Angélica Florinda Moreira de Carvalho. Sentou praça no Exército aos 15 anos de idade, como segundo cadete do 1º Regimento de Cavalaria. Em 1870, ingressou na Escola Militar no Rio de Janeiro, então capital do Império, e em 1874, tornou-se alferes. Ao concluir o curso de engenharia militar, passou a servir nas fortalezas de Santa Cruz, da Laje e de São João. Em 1879, foi nomeado secretário da Comissão de Limites do Brasil com a Venezuela, chefiada pelo barão de Parima. Em 1883, voltou ao Rio de Janeiro e foi condecorado pelos governos do Brasil e da Venezuela. Já no posto de capitão de engenheiros serviu no Arquivo Militar, onde iniciou a confecção da Carta Geral das Fronteiras do Brasil. Em 1884, foi para o Amazonas como comandante-geral das fronteiras e inspetor de secas e fortificações. Algum tempo depois, foi enviado a Pernambuco como engenheiro da estrada de ferro entre Recife e Olinda e perito do prolongamento que ligava a capital à cidade de Petrolina. Nesse período ingressou na Faculdade de Direito do Recife. Foi governador do Piauí, de 26 de dezembro de 1889 a 4 de junho de 1890. Governou também o Amazonas, de 1 de setembro de 1891 a 27 de fevereiro de 1892. É fundador do Município de Cruzeiro do Sul no Acre. Faleceu na cidade do Rio de Janeiro, em 29 de agosto de 1921 aos 67 anos de idade. https://pt.wikipedia.org/wiki/Greg%C3%B3rio_Taumaturgo_de_Azevedo


Fran Paxeco em maio vai para o Rio de Janeiro tratar-se devidamente e passa pelo porto de São Luis muito doente e ainda preso. Em junho, o Supremo Tribunal Federal decide pela sua inocencia, responsabiliza os juízes e o prefeito é demitido. É libertado e processados os juízes.

Em 31 de Agosto de 1907, ainda em profunda melancolia, está de volta a São Luís do Maranhão para descansar e recuperar-se daquela armadilha. Dá início a uma intensa atividade cultural. Entre Janeiro e Setembro de 1908 profere várias conferências. A 10 de Agosto de 1908, a Oficina dos Novos, de que faz parte, funda a Academia Maranhense de Letras. A 10 de Dezembro de 1908, parte para a 2ª viagem a Portugal. A 21 de Março está em Setúbal, onde apadrinha um seu sobrinho. Por coincidência, ou não, um mês depois reúne na sua terra natal o Congresso Republicano. A 25 de Abril de 1909 está de volta a São Luís. Dá aulas, faz conferencias na Universidade Popular Maranhense. Continua a escrever na Pacotilha. A 8 de Setembro de 1910, casa com a sua noiva, a maranhense Isabel Eugénia de Almeida Fernandes passando a residir no casarão da família dela, na Rua da Palma nº 38, (hoje 360) onde também foi o Consulado de Portugal. Dá início a um período de grande calmira na sua atribulada vida. Menos de um ano depois é nomeado Cônsul de Portugal no Maranhão. Mantém a sua ligação ao jornalismo, passando a ser o Redator da Pacotilha.É professor no Liceu Maranhense, dando aulas de História Universal e do Brasil, Geografia e Francês.


Em 1911 funda, com vários maranhenses, o Centro Republicano Português; o Casino Maranhense e o Instituto de Assistência à Infância. A 24 de Agosto desse ano é nomeado Cônsul de Portugal no Maranhão por Teófilo Braga (Chefe do Governo Provisório da República Portuguesa). De Novembro de 1913 a Fevereiro de 1914 está no Rio de Janeiro, chamado pelo primeiro Embaixador de Portugal no Brasil, Bernardino Machado (1851-1944), para secretariá-lo. Em 1916, publica "Angola e os Alemães". Segue para Lisboa, aonde chega a 27 de Maio, para ocupar, entre outros cargos, o de secretário particular do Presidente da República, Bernardino Machado, mas continuando como Cônsul de Portugal no Maranhão (tinha sido promovido a Cônsul de 2ª classe em 4 de Julho de 1914). Aproveita para freqüentar a Academia de Ciências de Portugal e a Sociedade de Geografia, de que era sócio. Escreve "A Cortiça em Portugal". Exerce as funções de secretário da Comissão Portuguesa de Acção Económica contra o inimigo e da Comissão de Fomento da Exportação Portuguesa. Volta para S. Luís em Setembro de 1917, onde permanece até 1923. Em 1918, está envolvido com a criação da Câmara de Comércio: E continua as palestras na Universidade Popular

A FACULDADE DE DIREITO E O INSTITUTO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA – 1918

Ainda em 1918, foi o inspirador da Faculdade de Direito do Maranhão e, mais tarde, da Faculdade de Farmácia e Odontologia, do Instituto Ateniense, da Câmara Portuguesa do Comércio... Mário Meireles (1981; 1995), em ―O Ensino Superior no Maranhão‖ 63, afirma que as primeiras tentativas de instalação de cursos superiores no Maranhão surgiram pouco a pouco, a partir da adesão formal à República (18/11/1889), através de unidades isoladas, todas elas, de princípio, particulares, depois de desfazer-se o sonho, prematuro, do poeta Sousândrade. Ao longo da Primeira República (1889-1930), a Atenas Brasileira passa a ser incorporada por uma nova elite de intelectuais, que se auto-intitulavam ―novos atenienses‖. Este grupo de letrados sucessores dos atenienses do passado, reapropriaram-se do ideário da Atenas Brasileira como estratégia de obterem legitimação, consolidação e consagração. Eles vão se alicerçar a partir de uma nova perspectiva na estrutura do campo intelectual, atravessado por ideias e práticas modernizadoras e pela revitalização do cenário cultural maranhense. Esse 63

MEIRELES, Mário. O ensino superior do Maranhão; esboço histórico. In DEZ ESTUDOS HISTÓRICOS. São Luis: ALUMAR, 1995, p.. 45-94


legado dá-se por meio de um grupo de intelectuais, herdeiros dos patronos literatos maranhenses. (ROCHA, 2013, p. 5) 64. Na área cultural, surgiu em 1908 um movimento literário liderado pelos intelectuais: Antonio Lobo, Fran Paxeco e Domingos de Castro Perdigão que, na tentativa de manter a tradição de "Atenas do Brasil" para o Maranhão, criou a Academia Maranhense de Letras e, posteriormente, o Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (1926). Desta elite intelectual partiu a iniciativa de criação e implantação das primeiras instituições de ensino superior no Maranhão (BUZAR, 1982, grifos meus) 65, 66: Nesse sentido, Domingos de Castro Perdigão, integrante do movimento literário e diretor da Biblioteca Pública do Estado, tendo conhecimento da criação e funcionamento de escolas de nível superior em vários Estados brasileiros, não se conformava com o fato de São Luís, em sendo a Atenas Brasileira, não possuir uma instituição de ensino superior. A primeira escola superior isolada foi, de fato, a Faculdade de Direito do Maranhão, que desde 1908 trabalhava nesse sentido Domingos de Castro Perdigão: [...] com só, de inicio, o incentivo do então deputado federal, e depois Senador, José Euzébio Carvalho de Oliveira; e as dissensões e intransigências da estreita e intolerante política partidária estadual, que talvez tenha concorrido a que não conseguisse o apoio, que pleiteou e não obteve, do Governador Herculano Nina Parga (1814/18) e do Presidente do Tribunal de Justiça, Desembargador Lourenço Valente de Figueiredo (1913/18), não o descoroçoaram de todo, até que conquistou um forte e decisivo aliado na pessoa do Cônsul de Portugal no Maranhão, o escritor Fran Paxeco. (MEIRELES, 1981, grifos meus) 67. Joaquim Vieira da Luz (1957) 68, em seu monumental ―Fran Paxeco e outras figuras maranhenses‖, ao traçar a biografia de Domingos de Castro Perdigão também se refere ao fato de ele acalentar por muito tempo a idéia de criar uma Faculdade de Direito no Maranhão; transcreve a História da Faculdade, relatada pelo próprio biografado: Encontrava assim o desanimo por todos os lados. A esperança de melhores dias conservou no meu espírito essa idéia fixa, que só se tornou realizável com o regresso, em 1917, do ilustre cônsul de Portugal, Sr. Manoel Fran Paxeco. Ao despedir-se, um ano antes, perguntara-me em que parava o projeto da faculdade. Espírito iluminado e laborioso, decidido sempre a servir as causas úteis, trouxe a energia necessária para por em marcha este ideal. Não o procurei. Conhecedor do meu plano, interessou-se pelo mesmo e ali, na Biblioteca Pública, se 64

ROCHA, André Gusmão da. OS NOVOS ATENIENSES: Apropriação do imaginário da Atenas Brasileira na Primeira República. IN III SIMPÓSIO DE HISTÓRIA DO MARANHÃO OITOCENTISTA, São Luis, UEMA, 04 a 07 de junho de 2013. Ver também: MARTINS, Manoel Barros. OPERÁRIOS DA SAUDADE: OS NOVOS ATENIENSES E A INVENÇÃO DO MARANHÃO. São Luís: Edufma, 2006. http://www.nucleohumanidades.ufma.br/pastas/CHR/2005_2/antonio_barros_v3_n2.pdf. OLIVEIRA, Eduardo Gomes de. Os Novos Atenienses: saudade e poesia como invenção do Maranhão. CIÊNCIAS HUMANAS EM REVISTA São Luís, v. 5, número especial, junho 2007. Pp. 135-144, 2007. http://www.nucleohumanidades.ufma.br/pastas/CHR/2007_3/eduardo_oliveira_v5_ne.pdf. NASCIMENTO, Dorval do. Nosso céu não tem estrelas: O campo intelectual maranhense na Primeira República. ANAIS DO XXVI SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA – ANPUH – São Paulo, julho 2011. 2011. http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1307966101_ARQUIVO_TextoCompleto OCampoIntelectualMaranhensenaPrimeiraRepublica_SNH_2011_.pdf. 65 MEIRELES, Mário. O ensino superior do Maranhão; esboço histórico. In DEZ ESTUDOS HISTÓRICOS. São Luis: ALUMAR, 1995, p.. 45-94 66 BUZAR, Solange Silva. OS ESTÁGIOS SUPERVISIONADOS DO CURSO DE PEDAGOGIA DA UNIVERSIDADE FED ERAL DO MARANHÃO. Tese submetida como requisito parcial para obtenção do de Mestre em Educação. FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS grau INSTITUTO DE " ESTUDOS AVANÇADOS EM EDUCAÇÃO DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃO DE SISTEMAS EDUCACIONAIS Rio de Janeiro 1982. Disponível em https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/9338/000049166.pd 67 MEIRELES, Mário. O ENSINO SUPERIOR NO MARANHÃO. São Luis: UFMA, 1981 (Comemorativa do 15º aniversário de fundação da Universidade Federal do Maranhão). 68 VIEIRA DA LUZ, Joaquim. FRAN PAXECO E AS FIGURAS MARANHENSES. Rio de Janeiro: Livros de Portugal; Edições dois Mundos, 1957.


assentaram, num dia, as bases da nova instituição. (VIEIRA DA LUZ, 1957, p.. 42-43, grifos meus) Adelman Correa (2016)69 em seu festejado ‗Os meus dias de cadeia – origem e memória‘, edição de 1926, em seu discurso de colação de grau, orador da turma de 1923, ao falar do inicio da Faculdade de Direito do Maranhão, afirma que, desde 1908 Domingos Perdigão afagava o sonho realizado dez anos depois: [...] Domingos Perdigão nunca descrente de sua ideia, e sempre convicto da sua realização, esperava com perseverança momento que lhe fosse propício. Era que ele com olhar de retrospecto, com olhar que evo9cava os nossos vultos, continuava firme no propósito de trabalhar para a Athenas Brasileira também contasse no seio dela um estabelecimento de ensino superior. Em 1917, desdobram-se as suas esperanças. Vai ao encontro de Fran Paxeco, que regressara da Europa. Fran Paxeco infatigável, cheio de energias, dá o braço a Perdigão e põem mãos à obra, cujo edifício hoje vemos erguido na suntuosidade da sua grandeza. Trocam ambos eles dois, ideias sobre as bases da instituição, na Biblioteca Pública. Mais tarde, ainda eles mesmos e mais os doutores Antonio Lopes, Alfredo de Assis e José de Almeida Nunes, reunidos em comissão, naquele estabelecimento publico, deliberam de forma a que se efetuasse o projeto que já lhes prendia a atenção. De fato, a 28 de abril de 1918, numa assembléia em que tomavam parte diversas classes da nossa sociedade, e que teve lugar no salão de leitura da Biblioteca Pública, foi aprovada a criação da Faculdade de Direito coadjuvada por uma associação. Já outro espírito trabalhador e inteligente, que muito há concorrido para engrandecimento da Faculdade, havia aderido, o dr. Henrique José Couto [...](p. 245246, grifos meus). Solange Buzar (1982) 70 trás, segundo a Revista da Faculdade de Direito: A 12 de maio, segundo a Revista da Faculdade de Direito do Maranhão, realizou-se a primeira das sessões de congregação da Faculdade de Direito. Presidiu o dr. José Vianna Vaz secretariado pelo sr. Domingos de Castro Perdigão. Compareceram os professores Henrique José Couto, Godofredo Mendes Vianna, Alfredo de Assis, João Vieira, Filho, Luiz Carvalho, Carlos Augusto de Araujo de Souza Costa, João de Lemos Vianna, Carlos Humberto Reis, Alcides Jansen Serra Lima Pereira, Antonio Lopes da Cunha e José de Almeida Nunes. Lido o projeto do regimento interno, foi deliberado que, depois de revisto por uma comissão especial constituída pelos professores Henrique José Couto, Fran Paxeco, Alfredo de Assis, Luiz Carvalho e Antonio Lopes, fosse impresso para ser debatido por todos os membros do corpo docente. Houve duas outras congregações para analisar o Regimento Interno e nas quais pô-lo de acordo com as foi manifestado leis e decretos nas escolas oficiais, similares do país. Finalmente foi fundada a Faculdade de Direito do Maranhão, em 1 de julho de 1918, com o inicio das aulas do Curso Jurídico e Social, evento funcionamento que foi condignamente comemorado em sessão solene no Teatro São Luís, na qual foram prestadas publicas homenagens ao jurista Ruy Barbosa. (p. 15, grifo meu). Com o título ―PELO ENSINO SUPERIOR‖ aparece em ―A PACOTILHA‖ – edição de segunda feira, 29 de abril de 1918 – a realização, no dia 28 de abril de 1918, de uma reunião ocorrida na Biblioteca Pública Benedito Leite para se decidir se convinha fundar, nesta Capital, uma faculdade livre de direito. A iniciativa coube ao Diretor da Biblioteca Pública, Dr. Domingos de Castro Perdigão, cabendo ao então Secretário de Interior e Instrução o Dr. Henrique José Couto a presidência da reunião – em assembléia de fundação –; fizeram parte da mesa Alfredo de Assis e Fran Paxeco: Como noticiamos, realizou-se ontem, na Biblioteca Pública, uma numerosa e seleta reunião, para se decidir se convinha fundar, nesta capital, uma faculdade de direito. 69 70

CORREA, Adelman. OS MEUS DIAS DE CADEIA – origens e memória. 2 ed. São Luis: AML, 2016. BUZAR, obra citada, p. 15


O Sr. Domingos de Castro Perdigão, diretor daquele estabelecimento e autor da iniciativa propôs que presidisse o dr. Henrique José Couto, secretário do interior e de instrução, a quem ladearam os srs. Drs. Alfredo de Assis e Fran Paxeco. A Comissão foi assim constituída: Domingos de Castro Perdigão, Alfredo de Assis, Almeida Nunes, Antonio Lopes e Fran Paxeco. Foi apresentada, por Fran Paxeco, a minuta do estatuto da sociedade então constituída. A seguir, elegeu-se a Diretoria da agremiação: ARTUR BESERRA DE MENESES – Presidente; CÂNDIDO JOSÉ RIBEIRO - Vice-presidente; FRAN PAXECO e DOMINGOS PERDIGÃO Secretários. JOAQUIM ALVES JUNIOR - Tesoureiro. Em 1º de maio, os Diretores da Associação Incorporadora da Faculdade de Direito reuniram-se, tendo comparecido: Domingos Perdigão, Fran Paxeco, Alfredo de Assis, Almeida Nunes, Antonio Lopes. Fran Paxeco leu a proposta que o Dr. Tavares de Holanda fez sobre o fundo patrimonial, que será levada em consideração, quando a proposta de Estatuto for discutida. A seguir, passou-se a discussão de quais professores haveria para as 17 (dezessete) cadeiras dos cinco (5) anos da Faculdade, incluindo os substitutos das 8 (oito) sessões. A sociedade incorporadora manterá dois cursos (a) preparatório; (b) curso livre de direito. Para cada curso, haverá uma diretoria, que responde diretamente à agremiação mantenedora. Quanto ao curso Anexo – preparatório -, foi deliberado que funcionaria todos os dias úteis, das 15 às 18 horas, nas salas do Centro Português, situado na Praça João Lisboa, gentilmente cedidas pela Diretoria. Escolhidos os Professores das Cadeiras de: Latim – Arias Cruz; Inglês – Antonio Lopes da Cunha; Álgebra, Geometria, e Trigonometria – José de Abranches Moura; História Universal – Raimundo Lopes da Cunha; História do Brasil – Fran Paxeco; História natural – Carlos Cavalcante Fernandes71; Física – Genésio de Moraes Rego; Química – Carlos da Costa Nunes; Elementos de Lógica, Psicologia e História da Filosofia – Antonio Bona A direção da comissão da sociedade incorporadora é constituída pelos senhores Abranches Moura, Fran Paxeco, Genésio Rego, Almeida Nunes, Antonio Lopes, Arias Cruz (Padre), Antonio Bona, e Raimundo Lopes. Fran Paxeco, tendo de substituir o professor da cadeira de psicologia lógica e história da filosofia, do curso anexo, publica em A Pacotilha seu ―Pontos de Psicologia‖, utilizando-se da obra notável pedagogista de Gabriel Compayré72, feita para as escolas normais da França, e que satisfaz o programa de ensino. Dadas as explicações aos alunos, forneceu o sumário das dezoito lições contidas nas 278 páginas do livro Pyschologie, apliqueé á edication. Premiere partie – notions theóries73. Julgando prestáveis tais sumários, decidiu-se a publicá-lo em sua coluna (18/02/1919): Não nos sobre o tempo, agora, nem a Pacotilha nos proporciona espaço, pra discorrer sobre o que seja a psicologia. Contentemo-nos, por isso, em dizer que a palavra se extraiu do grego – psikhé, alma, e logos, tratado. É um termo por demais vago, o de alma. Esta, segundo o justo critério positivista, corporifica a síntese das faculdades afetivas, especulativas e ativas. Nada mais se apura, neste sentido, mesmo e refletindo nos capciosos argumentos dos infinitos dualistas que se embrenham no problema, através dos séculos, e que o gênio de Comte esclareceu naquela irretorquível definição. Resumindo: - a psicologia é a ciência da personalidade. – F.P. I – O fim da psicologia I. A psicologia tem por objetivo estudar os fatos internos que constituem a vida moral do homem, em contrate com a sua vida física. 71

Segundo Rosa Machado, em correspondência eletrônica, 15/05/2018, Carlos Cavalcante Fernandes é primo de minha Avó, Isabel Eugénia de Almeida Fernandes Paxeco, esposa de Fran Paxeco; é filho de José Ignacio Fernandes, um dos irmãos de Luis Manuel Fernandes, o meu bisavô, que chamou os irmãos para São Luís. 72 Jules-Gabriel Compayré, né à Albi (Tarn) le 2 janvier 1843 et mort à Paris le 24 février 1913, est un théoricien de la pédagogie et homme politique français. https://fr.wikipedia.org/wiki/Gabriel_Compayr%C3%A9 73 http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k651460 Psychologie appliquée à l'éducation. Notions théoriques / par Gabriel ... Psychologie appliquée à l'éducation. Notions théoriques / par Gabriel Compayré,... -- 1890-1889 --


II. A psicologia experimental é uma ciência de fatos. A psicologia racional é uma ciência metafísica, esforçando-se por ligar os fatos a um principio único – a alma, segundo os espiritualistas. III. A alma tem-se entendido, alternativamente, como um principio de permanência e de forma, nos minerais, de vida, nas plantas, de sensibilidade e de movimento, nos animais, como um principio de raciocínio, enfim, no homem. De dia pra dia, a palavra alma converteu-se em sinônimo de principio espiritual, que sente, pensa e quer. IV. O estudos dos fatos psicológicos aparta-se das conclusões que os filósofos admitem sobre a existência e a natureza da alma. V. (Os fatos psicológicos distinguem-se dos fatos fisiológicos: - 1º por serem de pronto conhecidos pela consciência; 2º por não serem, com o os outros, simples movimentos da matéria extensa); 3º porque podem não coexistir com os fenômenos fisiológicos. VI. Os fatos psicológicos interpenetram-se de semelhanças e diferenças que permitem classificá-los num certo numero de categorias ás quais chamamos faculdades da alma. Uma faculdade é apenas o conjunto dos estados de consciência da mesma espécie. VII. Destacam-se três séries de fatos psicológicos: - 1º os afetivos ou sensórios; 2º os fatos intelectuais; 3º os voluntários. Há, por conseqüência, três faculdades, - a sensibilidade, a inteligência e a vontade. VIII. É preciso acrescentar, a essas três faculdades essenciais, a atividade física. No que respeita aos fatos afetivos, devemos prendê-los, -, uns á sensibilidade material, outros á sensibilidade moral. II – A atividade física I. A atividade física é o poder de operar nos músculos, de produzir os movimentos do corpo. II. Antes de ser voluntária e consciente, a atividade física revela-se fatal e cega. Determinam-a causas obscuras e inconscientes, como as excitação dos centros nervosos, a hereditariedade, o instinto, etc. III. Os movimentos da criança mostram-se-nos espontâneos ou provocados. Quando inconscientes, constituem-se o que se denomina ações reflexas. Estas consistem numa excitação nervosa, seguida por uma contração muscular. Aquela excitação pode originar-se num impulso exterior ou num impulso espontâneo dos centros nervosos. IV. Os instintos são sistemas de ações reflexas. Os movimentos a que dão motivo dissemelhan-se dos demais movimentos espontâneos, porque os patenteiam com ordem e regra, tendendo a um fim, e divergem dos movimentos voluntários por se ignorar o alvo que visam. V. Os movimentos instintivos supõem, no entanto, uma certa representação dos meios a empregar, pra se atingir o objetivo: não se manifestam nem tão infalíveis, nem tão invariáveis, como pretendem alguns pensadores. VI. Na criança, produzem-se depressa, ás vezes, movimentos conscienciosos – os que derivam das emoções da sua sensibilidade. VII. Os movimentos intencionais e voluntários também se afirmam cedo: a vontade, por exemplo, exerce um certo papel na educação do andar. VIII. O habito intervém na atividade física, consoante se observa na escrita, na execução musical, etc. III – A sensibilidade física I. Os fatos sensórios são afetivos e os intelectuais são representativos. II. Os fatos sensitivos têm como antecedentes ora um fato fisiológico, ora um fato psicológico. No primeiro caso, chamam-se-lhes sensações, no segundo, sentimentos. As sensações formam a sensibilidade física; os sentimentos, a sensibilidade moral. III. As sensações localizam-se num órgão – a parte do corpo onde se dá o fato fisiológico que as precede. IV. Quer na sensação, quer no sentimento, encontram-se os elementos geradores da sensibilidade: - 1º o prazer e a mágoa; 2º as inclinações. V. O prazer supõe sempre uma inclinação previa, ou consciente ou inconsciente. O prazer é um pendor satisfeito; a magoa, um pendor contrariado.


VI. O prazer provem de uma atividade media, conforme a natureza, equivalendo as forças de que a pessoa dispõe. A dor dimana, seja da inação obrigatória, seja da ação excessiva. VII. A inclinação, no fundo, concretiza o amor do bem, a procura da conservação e do desenvolvimento do ser. VIII. As sensações ou comoções da sensibilidade física repartem-se em duas categorias: 1º os apetites; 2º os prazeres dos sentidos. Os apetites correspondem as diversas funções da vida organiza. Os prazeres dos sentidos são medianeiros entre a sensibilidade física e a sensibilidade moral. Fran Paxeco Fran Paxeco idealiza e organiza o Primeiro Congresso Pedagógico do Estado do Maranhão entre o final de 1919 e início de 1920: Por estes dias, reunidos em sessão pedagógica da Faculdade de Direito, o diplomata português Fran Paxeco, presidente administrativo do Instituto da Assistência à Infância, diretor-geral do jornal local ―A Pacotilha‖, professor da Faculdade de Direito no Estado do Maranhão e lenthe da Congregação do Lyceu Maranhense, propôs aos colegas bacharéis e docentes do Instituto Superior acima mencionado a realização de um Congresso Pedagógico para apresentar teses e reflexões sobre a instrução pública maranhense, suas limitações e possibilidades. (OLIVEIRA, 2012) 74. Nos Anais do 1º Congresso Pedagógico no Estado do Maranhão consta que no dia 18 de agosto de 1919, em reunião pedagógica presidida pelo vice-diretor desta Faculdade, o Dr. Henrique Couto, secretariado por Domingos de Castro Perdigão, os docentes Godofredo Viana, Manoel Jánsen Ferreira, António José Pereira Junior, António Lopes, Leôncio Rodrigues, Alcides Pereira, Costa Gomes, Lemos Viana, Abranches Moura, António Bona, Fabiano Vieira e Raimundo Lopes ouviram de Fran Paxeco o convite para realizarem um Congresso Pedagógico em fevereiro do ano vindouro (1920). A proposta foi aceita por unanimidade e imediatamente elegeram uma comissão organizadora, formada pelos drs. Godofredo Vianna, Fabiano Vieira, António Bóna, António Lopes e o próprio Fran Paxeco (MARANHÃO, 1922, citado por OLIVEIRA, 2012) 75 . A carta-circular datada de 12 de janeiro de 1920 expedida pela Comissão Organizadora, destinada às escolas oficiais, aos colégios particulares e demais interessados em participar e/ou inscrever trabalhos, apontou os ramos de educação adotados e abertos para o diálogo pedagógico. Foram eles: I – Educação Física [...] II – Educação Intelectual: [...] III – Educação técnica: [...] IV – Educação moral: [...] V – Educação Estética: [...] Teses especiais sobre: Faculdades, escolas de pedagogia, liceus. Educação vocacional. Atribuições pedagógicas e financeiras da União, dos estados e dos municípios. Organismos de técnicos, para superintender na escolha de horários, ortografia, livros, material, casas, etc. Estatística. Taxa escolar. Exames e promoções. Nomeação de 74

OLIVEIRA, Rosângela Silva. FRAN PAXECO, LENTHE DA REVITALIZAÇÃO PEDAGÓGICA MODERNA NO ESTADO DO MARANHÃO, ORGANIZADOR DO 1º CONGRESSO PEDAGÓGICO EM 1920. IX Congresso Luso-Brasileiro de História da Educação – Rituais, Espaços e Patrimónios Escolares, Lisboa, 12 a 15 de julho de 2012, ANAIS IX COLUBHE 2012. http://colubhe2012.ie.ul.pt/ , disponibilizado por Dra. Rosa Paxeco Machado através de correspondência eletrônica pessoal em 12/10/2012 http://sn125w.snt125.mail.live.com/default.aspx#n=1557179640&fid=1&fav=1&mid=4b2f82ba-1480-11e2-b36f00215ad9df80&fv=1 OLIVEIRA, R. S. Do contexto histórico às ideias pedagógicas predominantes na escola normal maranhense e no processo de formação das normalistas na Primeira República. DISSERTAÇÃO DE MESTRADO. Universidade Federal do Maranhão, 2004 75 Maranhão. Trabalhos do I Congresso Pedagógico. São Luis: Imprensa Oficial, 1922, in OLIVEIRA, 2012.


professores. Escolas móveis ou ambulante (primárias e agrícolas). Exposições e museus. Bibliotecas infantis. Código do ensino: leis, decretos e regulamentos. Construções. Colégios particulares. Equiparações. Artes e ofícios. Colônias correcionais. Intercâmbio de catedráticos das escolas superiores. (MARANHÃO, 1922 p. 4-5, citado por OLIVEIRA, 2012) 76,77. Logo a 1º de setembro, segunda-feira, eram convocados para reunião os drs. Alcides Pereira, Abranches, Fran Paxeco, Carlos Reis, Costa Gomes, da Comissão de Conferencias, Godofredo Viana, Fabiano Vieira, Antonio Lopes, e Antonio Bona, da Comissão Organizadora do Congresso pedagógico; deveria ser apresentado, na ocasião, as bases do programa deste congresso, indicando-se também o grupo dos quatro ou cinco primeiros conferentes. A 13 de setembro (A Pacotilha) anuncio de que as conferencias preparatórias do centenário da Independência teriam inicio, já no dia 20 próximo, com Fran Paxeco falando sobre ―o critério histórico‖, ligado à sua natural base geográfica. O dr. Carlos Reis, Secretário da comissão das conferencias do centenário envia oficio à Academia de Letras para se associarem à efeméride. E faz convite para a palestra que Fran Paxeco realizaria no dia 20, no Centro Português, sobre ―A Geografia e a História‖, fixando o papel que lhes compete, no vasto quadro dos conhecimentos humanos. Como também convida a comparecer as autoridades civis e militares, as corporações de classe, os professores e alunos da Faculdade de Direito. Realizada a palestra inicial da série que a faculdade de Direito, com a Academia Maranhense, Fran Paxeco discorreu sobre o tema a geografia e a história, consumindo perto de uma hora na leitura de seu ‗aperçu‘, a que se juntarão outros, nos quais versará sobre aqueles dois pontos, mas concretizando-os, acerca da península Luziberica, da America do Sul, do Brasil, e do Maranhão. O auditório, dos mais seletos, aplaudiu e abraçou Fran Paxeco. Em Janeiro de 1920, sai informe em jornal com o titulo de ―Dois Congressos‖ opina-se: As assembléias que a Sociedade Maranhense de Agricultura e a Faculdade de Direito do Maranhão tencionam levar avante, concretizam um vivo anseio de progredir, de se atingir um horizonte mais claro, onde se descortinem indícios de avanço. Os que se dedicam às questões do ensino, técnicos ou amadores, encontrarão no congresso pedagógico um meio acessível de trocar idéias, expondo os seus métodos, as suas práticas, os seus desejos. Uns discretarão sobre a psico-fisiologia das novas gerações, outros acerca das circunstancias a exigir nos prédios escolares, aqueloutros a respeito da monomania programática, quase sempre infecunda, ainda outros da cultura física, da intelectual, da ética, a cúpula de todo o bom sistema educativo. Predominará, porventura, nesses debates sugestivos, a nota das realizações, embora as teorias lhes sejam de ordinário, imprescindíveis. E dessa convergência de esforços talvez irradie um núcleo de princípios eficazes. Mas – primo, vivere... Todos aqueles que se interessam pelos problemas econômicos, inseparáveis dos pedagógicos, devem rejubilar-se com o desejo de acordar as iniciativas dos que nos fornecem o essencial à existência, dos que extraem da terra inexaurível as insondáveis riqueza que nos alimentam, fortalecendo a indústria e o comercio. Os campos maranhenses, antigos abastecedores, em gado e cereais, dos estados amazônicos e de alguns dos vizinhos sulistas, estorcem-se hoje entanguidos, faltos de estimulo remunerativo, trazido pela procura. Sentem-se abandonados por quem deles depende, em tudo e por tudo. E os seus impávidos arroteadores descrêem. Mas, tentando-os o sopro do messianismo, prega das almas cândidas, ao mínimo aceno, tal qual a um falacioso aguaceiro, no período funéreo da seca, logo se voltam, alegres, agradecidos, sem ter de quê. Deparam-se, ao congresso pedagógico e ao congresso dos lavradores, dois temas sintéticos, pilares dos restantes: - Num, o professor e o material. No outro, o braço e o transporte. Porque representam os alicerces do edifício a reconstruir. 76 77

Maranhão, 1922, in OLIVEIRA, 2012. OLIVEIRA, 2012, obra citada http://colubhe2012.ie.ul.pt/ OLIVEIRA, 2004, obra citada


Em 1920, diversas atividades realizadas, em São Luis e em Belém, pela passagem do natalício de Fran Paxeco. Por vários dias, os jornais noticiam as festividades que aquele ilustre professor recebeu da sociedade ludovicense, em especial de seus alunos da Faculdade de Direito. O discurso de Rubem Almeida: FRAN PAXECO Rubem Almeida, pelos alunos da Faculdade de Direito, pronunciou este discurso: Dentre as vozes que nesta noite aqui se conjugam, sr. Fran Paxeco, para em coro vos trazer o seu amigo saudar, há-de, por certo, a vossa bondade permitir que, sincero, me desobrigue da tarefa cometida, trazendo-vos também, com os mais efusivos prolfaças pela data feliz que em festa hoje decorre, os agradecimentos de uma das classes a que prestais o melhor do vosso trabalho e da vossa dedicação. Dispensando-me de considerar os outros empregos da vossa modelar atividade, para somente atender à vossa preciosissima ação no estabelecimento, vida e futuro da escola superior que a vós, em grande parete, vos fica devendo o estado, parece-me encontrar nesse afto razão de sobra para explicar, quando outras, que tendes, não tivesse, da homenagem espontanea que vos rendem os moços desta terra. É aque esse moços sentem, como todos, afinal, o valor do vosdso engenho pertinaz, quando posto ao serviço de quaisquer princípios. Quanto maiores os empecilhos, mais se esforça em vencê-los, quando mais profundos os desalewntos, tanto mais se empenha emj esperancá-los; e, assim, num conjugado magnífico de forças, sabeis, como poucos, levar avante os empreendimentos. Assim foi para a nossa Escola de Direito. Havia aspiração, havia boa vontade; faltava um condutor. Foste-lo vós. Metestes, decidido, ombros à empresa, iniciastes a viajem a que se antolhavam os mais difícies obstáculos, a tudo sorristes com o sorriso do homem que conhece as suas forças, e aqui vos tivemos triunfante, mostrando não haver utopia no ideal, simples questão, porém, de audácia, daquela audácia que, na vossa pessoa, reconheceu Teixeira bastos como o bastante para mnos dispensar de apresentações. Pois, como o prefaciador do vosso ―Sangue latino‖, mais ainda do que ele, quero dizer, julgo dispensar-nos ela, também, de longas e indiscretas considerações. Pelo que, honrado pela incumbencia aqui, feliz, me desobrigo, trazendo-nos, nestas frases laconicas, o saudar do corpo disciente da Faculdade de Direito, o qual faz questão de que vos reafirme, ainda uma vez, todo o seu contentamento pelo dia de hoje, e toda a sua duradoira gratidão e apoio, pelo muito que lhe haveis feito, como amigo, como irmão e como mestre. A 9 de março de 1922, aniversário de Fran Paxeco, diversas homenagens lhe foram prestadas, inclusive com uma edição inteira de A Pacotilha, ressaltando a sua contribuição para a cultura maranhense, e, em especial, a fundação da Faculdade de Direito


Na primeira fila, sentados, da esquerda para a direita: Djalma Sacramento, José Façanha, João Victor Ribeiro, FRAN PAXECO, Humberto Fontenelle, Francisco Mendes dos Reis e Fulgencio Pinto. Em pé, na 2ª fila: Castro e Silva, Ismael Hollanda, José Mata Roma, Zildo Maciel, Othon Mello, José Monteiro, Edison Brandão e Astrolabio Caldas. Na 3ª. Fila: Waldemiro Vianna, João Guilherme de Abreu, Raimundo Eugenio de Lima, Clemente Guedes, Octavio Bandeira de Melo e Arentino Ribeiro. Fonte: VIEIRA DA LUZ, 1957 O GRUPO É CONSTITUÍDO POR DIVERSOS ALUNOS DA PRIMEIRA TURMA DA FACULDADE DE DIRITO DO MARANHÃO. O ORIGINAL, QUE SE ENCONTRA EM PODER DA FAMÍLIA DE FRAN PAXECO, TRAZ A DEDICATÓRIA: “A FRAN PAXECO, O MESTRE, OFERTA DE SEUS DISCÍPULOS, SÃO LUIS, 26 DE MARÇO DE 1922

Dentre as homenagens que já recebera, em anos anteriores, foi conferido a Fran Paxeco titulo de professor honorário da Faculdade de Direito: ―Diversos jornais do Rio noticiaram com palavras elogiosas, o fato de haver a Faculdade de Direito do Maranhão conferido o título de seu professor honorário a Fran Paxeco‖.

Viera da Luz (1957)78 trás que Fran Paxeco, ilustre lusitano de Setúbal, por sua inteligência e cultura, adquiriu a qualidade de cidadão das letras maranhenses – foi um dos fundadores da Academia de Letras (1908) e do Instituto Histórico e Geográfico (1926), títulos que honrou a vida toda, exercendo infatigável atividade no Maranhão. A Faculdade de Direito teve, em Fran Paxeco, o elemento impulsionador, de ação decisiva para que se efetivasse sua fundação, conferiu-lhe o título de Professor Honorário. Teve em tão alta conta essa deferência que, sendo da Academia de Ciências de Portugal, da Sociedade de Geogrsfia de Lisboa, das Academias de Letras Maranhense, Piauiense e Alagoana, dos Institutos Históricos da Bahia, Pernambuco, Pará, Piauí e do Maranhão, das Associações de Imprensa do Pará e do Amazonas, ao publicar em Lisboa, em 1932, seu importante livro ―Portugal não é Ibérico‖, fez constar, no alto da página de rosto, simplesmente: FRAN PAXECO Prof. Honorário da Faculdade de Direito do Maranhão

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VIERA DA LUZ, Joaquim. FRAN PAXECO E AS FIGURAS MARANHENSES. Rio de Janeiro: Livros de Portugal, 1957, p. 100-101.


CONGREGAÇÃO – FONTE: ÁLBUM DO MARANHÃO 1923 A 27 de março de 1924 sai nota sobre convites que estavam circulando, para a solenidade de colação de grau, realizada dia 30 de março de 1924: Revestiu-se do máximo brilhantismo a cerimônia da colação do grau aos bacharelandos da primeira turma da Faculdade de Direito.

O INSTITUTO HISTÓRICO Ambos – Domingos Perdigão e Fran Paxeco - estão naquele grupo, capitaneado por Antonio Lopes da Cunha, que fundou o Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão: Em 1925, tomei a iniciativa de reunir alguns homens de boa vontade na livraria de Wilson Soares, expondo-lhes a minha ideia de se comemorar o centenário do nascimento de D. Pedro II


com a inauguração, nesta capital, de um Instituto de História e Geografia. Os que prestaram apoio à ideia foram: Justo Jansen, Ribeiro do Amaral, José Domingues, Barros e Vasconcelos, Domingos Perdigão, José Pedro Ribeiro, José Abranches de Moura, Arias Cruz, Wilson Soares e José Ferreira Gomes. Mais tarde incorporou-se a esse grupo João Braulino de Carvalho. Ausentes de S. Luís apoiaram calorosamente a ideia Raimundo Lopes, Fran Pacheco, Carlota Carvalho e Antonio Dias, que também foram considerados sócios fundadores do Instituto. (p. 110, grifos meus)79. Na Revista ―HISTÓRIA E GEOGRAFIA - Revista trimestral do Instituto de História e Geographia do Maranhão‖, anno I - 1926 – num. 1, julho a setembro, encontramos a primeira diretoria, assim formada: Dr. Justo Jansen Ferreira – presidente; Dr. José Domingues da Silva – vice-presidente; Dr. Antonio Lopes da Cunha – secretário-geral; Wilson da Silva Soares – tesoureiro; Ainda foram criadas as seguintes Comissões: de Geografia – José Domingues, Abranches de Moura, Justo Jansen; de História: Ribeiro do Amaral, B. Vasconcelos, Ferreira Gomes; de Bibliografia: Domingos Perdigão, Arias Cruz, José Pedro. Não foram preenchidas 13 vagas de sócio e de 13 de correspondentes. Como se observa, foram criadas 30 cadeiras de sócios efetivos e 30 de correspondentes. Após a nominação de cada sócio efetivo, há uma pequena biografia de cada um com sua produção científico-literária. Dos sócios correspondentes, a indicação do estado onde residem e indicação daqueles que são maranhenses. 80 Mas, já em 1918, mesmo ano de fundação de nossa Faculdade de Direito, e través de uma reportagem, onde se indagava onde ficava o Instituto de História e Geografia, dada a chegada de uma correspondência a ele destinado, ficamos sabendo da fundação – a segunda!!! De um Instituto dessa natureza no Maranhão. E Fran Paxeco estava à frente da iniciativa, junto com Domingos Perdigão e outros.81, 82

79

LOPES DA CUNHA, Antônio. Instituto histórico. In ESTUDOS DIVERSOS. São Luís: SIOGE, 1973. (in HISTÓRIA E GEOGRAFIA- REVISTA TRIMESTRAL DO INSTITUTO DE HISTÓRIA E GEOGRAPHIA DO MARANHÃO, São Luís, ano I, n. 1, julho/setembro, 1926, p. 55 a 59; Ver. Geo. E Hist., ano 2, n. 1, novembro de 1948, p. 148) 81 VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. QUANTOS ANOS, MESMO, DO IHGM? REVISTA IHGM n. 39, dezembro 2011, p. 81 http://issuu.com/leovaz/docs/revista_ihgm_39_-_dezembro_2011 82 in Jornal PACOTILHA, edição de 21 de dezembro de 1920. 80


Chamo atenção para a data de publicação: 21 de dezembro de 1920. Vamos ao outro texto, publicado no dia seguinte – 21 de dezembro de 1920 – no mesmo A PACOTILHA83:

O Sr. Simões da Silva – conforma noticia A PACOTILHA edição de 4 de abril de 1917, fora designado pelo IHGB a percorrer diversos estados para preparar o congresso americanista, providenciando a organização de comissões locais:

O Congresso Internacional de Americanistas realizou-se pela primeira vez em Nancy, França, de 18 de junho a 18 de julho de 1875. Iniciativa da Sociedade Americana da França, que o convocou em 25 de agosto de 1874. Desde então, tem sido celebrado.84 No Brasil, o primeiro aconteceu em 1922 – Rio de Janeiro; depois, em São Paulo, no ano de 1954; este ano, será na Espanha, em Salamanca... Reuniones del Congreso Internacional de Americanistas

83 84

Congreso

Lugar

Año

Congreso

Lugar

Año

I

Nancy, Francia

1875

XXXI

São Paulo, Brasil

1954

II

Luxemburgo

1877

XXXII

Copenhague, Dinamarca

1956

III

Bruselas, Bélgica

1879

XXXIII

San José, Costa Rica

1958

IV

Madrid, España

1881

XXXIV

Viena, Austria

1960

V

Copenhague, Dinamarca

1883

XXXV

Ciudad de México, México

1962

VI

Turín, Italia

1886

XXXVI

Barcelona-Sevilla, España

1964

VII

Berlín, Alemania

1888

XXXVII

Mar del Plata, Argentina

1966

VIII

París, Francia

1890

XXXVIII

Stuttgart-Múnich, Alemania

1968

IX

Huelva, España

1892

XXXIX

Lima, Perú

1970

X

Estocolmo, Suecia

1894

XL

Roma-Génova, Italia

1972

in Jornal PACOTILHA, edição de 21 de dezembro de 1920) https://es.wikipedia.org/wiki/Congreso_Internacional_de_Americanistas


XI

Ciudad de México, México

1895

XLI

Ciudad de México, México

1974

XII

París, Francia

1900

XLII

París, Francia

1976

XIII

Nueva York, Estados Unidos

1902

XLIII

Vancouver, Canadá

1979

XIV

Stuttgart, Alemania

1904

XLIV

Manchester, Inglaterra

1982

XV

Quebec, Canadá

1906

XLV

Bogotá, Colombia

1985

XVI

Viena, Austria

1908

XLVI

Ámsterdam, Países Bajos

1988

1910

XLVII

Nueva Orléans, Estados Unidos

1991

Buenos

Aires, Argentina

XVII Ciudad de México, México XVIII

Londres, Inglaterra

1912

XLVIII

Estocolmo-Upsala, Suecia

1994

XIX

Washington D.C., Estados Unidos

1915

IL

Quito, Ecuador

1997

XX

Río de Janeiro, Brasil

1922

L

Varsovia, Polonia

2000

1924

LI

Santiago de Chile, Chile

2003

La

Haya, Países

Bajos

XXI Gotemburgo, Suecia XXII

Roma, Italia

1926

LII

Sevilla, España

2006

XXIII

Nueva York, Estados Unidos

1928

LIII

Ciudad de México

2009

XXIV

Hamburgo, Alemania

1930

LIV

Viena, Austria

2012 7

XXV

La Plata, Argentina

1932

LV

San Salvador, El Salvador

2015

XXVI

Sevilla, España

1935

LVI

Salamanca, España

2018

Ciudad

de

México, México

XXVII

1939 Lima, Perú

XXVIII

París, Francia

1947

XXIX

Nueva York, Estados Unidos

1949

XXX

Cambridge, Inglaterra

1952

Fonte: https://es.wikipedia.org/wiki/Congreso_Internacional_de_Americanistas

A ideia de fundar-se um Instituto Histórico parte de Fran Paxeco, em reunião da Academia Maranhense de Letras, conforme consta de nota publicada em 12 de agosto de 1918, em O Jornal:

Também em ―A Pacotilha‖, edição de 13 de agosto daquele ano de 1918 refere-e a pronunciamentos na Academia Maranhense de Letras sobre a necessidade de ter-se instalado um Instituto Histórico:


Em 1919, o Instituto indicou seus representantes para o Congresso de Geografia:

O Jornal, 23 de agosto de 1919 Em ―O Diário de São Luis‖, edição de 23 de dezembro de 1920, há o seguinte comentário: [...] Fran Paxeco, secretário geral do Instituto Histórico aqui fundado pelo dr. Simões da Silva [...]:

Em 1921, o Instituto estava em pleno funcionamento, com o Sr. Viana Vaz na sua Presidência, conforme consta de nota de 6 de julho de 1921, em ―O Jornal‖:

A posse da nova diretoria, com o Dr. Viana Vaz à frente, se dera em 25 de janeiro de 1921, conforme noticia o ―Diário de São Luiz‖:


Logo a seguir, reuniram-se os seus membros para tratar da conferencia americanista (O Diário, 21 de fevereiro de 1921):

Em Março de 1920, assume a gerência interina do Consulado do Pará, para resolver a «Questão dos Poveiros» o que conseguiu com êxito. Em artigo publicado em O JORNAL, 1921, discorre sobre a Estrada de Ferro São Luis-Caxias, que tanto se empenhou na construção:

E em 1925, novamente o IHGM é fundado:


Nos jornais da época, como no caso do Jornal do Povo, edição de 17 de dezembro de 1926 há uma referencia às descobertas de galerias subterrâneas, encontradas nas escavações que se faziam nos terrenos da Prefeitura. Encontradas várias galerias, que apontavam a várias direções, e algumas ossadas e objetos feitos de osso. Pede-se a manifestação do Instituto Histórico... 1926, Antonio Lopes já havia fundado um novo IHGM... O Instituto fundado pelo Dr. Simões em 1918 ainda funcionava em 1921; quatro anos após, ocorre uma nova fundação, do Instituto de História e Geografia... o que aconteceu? Verifica-se que em todos estes acontecimentos, um nome, um homem, temos que ressaltar, pela sua participação, incentivo, iniciativa e execução: o de FRAN PAXECO, meu patrono nesta Academia de Letras... Do período em que esteve no Pará e no Amazonas, antes de vir para o Maranhão, remeto-os ao meu discurso de posse nesta casa de Maria Firmina dos Reis, assim como nos primeiros anos de suas estadias em São Luis... Primeiro ocupante da Cadeira 14 do IHGM, patroneada por Antonio Bernardino Pereira do Lago, o seu amor pelo Maranhão levou-o a recusar transferências para postos da carreira diplomática muito mais prestigiosos que o consulado de São Luís do Maranhão; de Novembro de 1913 a Fevereiro de 1914 está no Rio chamado pelo primeiro Embaixador de Portugal no Brasil, Bernardino Machado85 para o secretariar; em 1916 publica "Angola e os Alemães" e segue para Lisboa onde chega a 27 de Maio para ocupar entre outros cargos o de 85

Bernardino Luís Machado Guimarães (Rio de Janeiro, 28 de março de 1851 — Porto, 29 de abril de 1944) foi o terceiro e o oitavo presidente eleito da República Portuguesa. Foi presidente da República Portuguesa por duas vezes: primeiro, de 6 de Agosto de 1915 até 5 de Dezembro de 1917, quando Sidónio Pais, à frente de uma junta militar, dissolve o Congresso e o destitui, obrigando-o a abandonar o país; mais tarde, em 1925, volta à presidência da República para, um ano depois, voltar a ser destituído pela revolução militar de 28 de Maio de 1926, que instituirá a Ditadura Militar e abrirá caminho à instauração do Estado Novo. https://pt.wikipedia.org/wiki/Bernardino_Machado


secretário particular do Presidente da República, Bernardino Machado, mas continuando como cônsul de Portugal no Maranhão (tinha sido promovido a cônsul de 2ª classe em 4 de Julho de 1914); A 18 de Agosto de 1919, em reunião de professores da Faculdade de Direito do Maranhão, propõe a realização do Primeiro Congresso Pedagógico do Maranhão, o que veio a realizar-se no ano seguinte. Em 8, 28 e 31 de Janeiro de 1920, houve sessões preparatórias. A sessão inaugural teve lugar a 22 de Fevereiro. Em São Luis, no mês de agosto de 1922 recebe Sacadura Cabral, festejando a travessia aérea do Atlântico Sul; em 1923 o encontramos em Belém do Pará como cônsul, lugar que deixa em Junho de 1925, quando volta para Lisboa; em 1927 vai para Cardiff, desempenhar idênticas funções diplomáticas. Escreve "Portugal não é Ibérico". Faz parte da "South Wales Branch" da Ibero American Society, contribuindo para que o nome fosse mudado para "Hispanic and Portuguese Society". Com o cônsul do Brasil consegue abrir e manter no Technical College uma cadeira de língua portuguesa; No ano de 1933 está de volta a Lisboa, ocupando a Direcção Geral dos Serviços Centrais do Ministério dos Estrangeiros. A 24 de Novembro já está em Liverpool a cumprir mais uma missão diplomática onde se mantém até 1935, quando regressa a Portugal, de onde nunca mais saíu. É perseguido pelo Estado Novo, e o Ministério dos Negócios Estrangeiros nunca mais lhe atribuíu nenhuma missão diplomática (graças ao Secretário-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Teixeira de Sampayo, monárquico convicto), o que muito o fez sofrer. 1939, um AVC com graves sequelas: fica sem fala, sem poder escrever e paralítico, as suas grandes formas de comunicação como grande orador e escritor que era. A Biblioteca do Grémio Literário Português em Belém do Pará e a Praça do Comércio em São Luís do Maranhão têm o seu nome. O seu nome se encontra presente nas toponímias de Setúbal, de São Luís do Maranhão e de São Paulo. Foi fundador da Academia Maranhense de Letras, da Faculdade de Direito, da Universidade Popular, do Centro Republicano Português, do Instituto de Assistência à Infância, do Casino Maranhense, da Associação Cívica Maranhense, da Câmara Portuguesa do Comércio, da Oficina dos Novos, da Legião dos Atenienses, participou do revigoramento e reorganização da Associação Comercial do Maranhão, entre outros organismos, todas as iniciativas relevantes. Profere palestras literárias, cortejos e homenagens cívico-culturais, luta por modernos meios de transporte, pelo incentivo à agropecuária, pela criação de um parque industrial, pela melhoria dos serviços de saúde, pela urbanização da cidade. E tudo isso de par com atividades no magistério público e particular, com diuturna atuação na imprensa, com viagens e trabalhos na Amazônia, com a publicação de livros, com idas ao Rio de Janeiro e a Portugal.86

86

http://www.academiamaranhense.org.br/academicos/fundadores/05.php


Na imprensa maranhense deixou uma colaboração tão diversificada e ao mesmo tempo copiosa, que ainda hoje aguarda e reclama a seleção temática da qual resultarão seguidos volumes de interesse para o estudo da vida maranhense. Tais volumes viriam somar-se às obras maranhenses desse autor de vasta bibliografia que compreende assuntos tão variados quanto foram os campos de interesse de seus estudos: Algumas obras: O Uruguai, prefácio a este poema de Basílio da Gama. Rio de Janeiro, Livraria Clássica de Alves & Comp, 1895. O Guarani, proêmio ao libreto da ópera de Carlos Gomes. Belém-Pará, 1896. O Centenário Indiano, manifesto das associações portuguesas do Pará. Belém-Pará, 1897. O Sangue Latino. Lisboa, 1897. O Album Amazônico. Genova, 1898. Os escritores portuguezes: Teófilo Braga. Manaus, Tipografia do Diário de Noticias, 1899. Jubileu de João de Deus - folheto. Manaus, 1899. Os Escândalos do Amazonas. Manaus, 1900. A Questão do Acre, manifesto dos chefes acreanos. Belém-Pará, 1900. O Sr. Sílvio Romero e a literatura portugueza. São Luís do Maranhão, A. P. Ramos d'Almeida, 1900. Mensagem do Centro Caixeiral do Dr. Teófilo Braga. São Luís, 1900. Juiz sem Juízo, comédia de A. Bisson, versão com Antônio Lôbo. O Porvir Brasileiro (série de longos artigos em vários números d'A Revista do Norte). São Luís, 1901. O Maranhão e os Seus Recursos. São Luís do Maranhão, 1902. O Sonho de Tiradentes, peça num ato. São Luís do Maranhão, 1903. O Comércio maranhense, relatório da Associação Comercial do Maranhão. São Luís do Maranhão, 1903. Os interesses maranhenses. São Luís do Maranhão, A Revista do Norte, 1904, XXVIII. O Departamento do Juruá. Cruzeiro do Sul, 1906. A literatura portugueza na Idade Média: conferência. São Luís do Maranhão, Universidade Popular do Maranhão, 1909. O Maranhão: subsídios históricos e corográficos. São Luís do Maranhão, 1912. Portugal e a Renascença. São Luís do Maranhão, 1912. Os Braganças e a restauração. São Luís do Maranhão, Tipografia da Pacotilha, 1912. O Maranhão. São Luís do Maranhão, 1913. As normas ortográficas, na Revista da Academia Maranhense. São Luís do Maranhão, 1913. A Língua portuguesa, por Filipe Franco de Sá, organização e posfácio. São Luís do Maranhão, 1915. Angola e os alemães. Maranhão, 1916. O trabalho maranhense. São Luís do Maranhão, Imprensa Oficial, 1916. A escola de Coimbra e a dissolução do romantismo. Lisboa, Ventura Abrantes, 1917. A visão dos tempos. Coimbra, 1917. Teófilo no Brasil. Lisboa, Ventura Abrantes, 1917.


Visão dos tempos - epopeia da humanidade: conferência realizada em 21 de Fevereiro de 1917. Lisboa, Academia das Ciências de Portugal, 1917. Separata dos Trabalhos da Academia das Ciências de Portugal A cortiça em Portugal (resumo de informações do ministério dos estrangeiros). Lisboa, 1917. As normas ortográficas, in Revista da Academia Maranhense. São Luís do Maranhão, 1918. João Lisboa: livro comemorativo da inauguração da sua estátua contendo estudos críticos de vários autores (org. da Academia Maranhense). São Luís de Maranhão, Imprensa Oficial, 1918. Portugal e o equilíbrio europeu, conferência, na Pacotilha. São Luís do Maranhão, 1918 (I-XII). Portugal e o Maranhão, folheto. São Luís do Maranhão, 1919. O Pará e a colónia portuguesa, folheto. Belém do Pará, 1920. Geografia do Maranhão. São Luís do Maranhão, 1923. Trabalhos do congresso pedagógico do Maranhão. São Luís do Maranhão, 1923. Cartas de Teófilo Braga (com um definitivo trecho autobiográfico do mestre e duas "confissões" de Camilo) (prefácio e compilação). Lisboa, Tip. da Emp. Diário de Noticias, 1924. O Portugal primitivo, folheto. Belém do Pará, Tip. Grafarina, 1925. Sobre Teófilo Braga, genealogia, folheto. Belém do Pará, 1925. O século português (1415-1520), conferência longa, proferida na capital do Pará e publicada no País, do Rio de Janeiro. 1926. Setúbal e as suas celebridades. Lisboa, Sociedade Nacional de Tipografia, 1930/1931. Portugal não é ibérico (antelóquio de Teófilo Braga). Lisboa, Tipografia Tôrres, 1932. O poema do Amadis de Gaula, conferência lida em 10-11-1932, na Universidade de Cardiff. Coimbra, Coimbra Editora, 1934 (separata da Biblos). The intellectual relations between Portugal and Great Britain. Lisboa, Império, 1937. Casou com Isabel Eugénia de Almeida Fernandes, natural de São Luís do Maranhão, de quem teve uma filha, Elza Paxeco87, primeira senhora doutorada pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. 87

Elza Fernandes Paxeco Machado (São Luís, 6 de Janeiro de 1912 — Lisboa, 28 de Dezembro de 1989) foi professora, filóloga e escritora. Filha de Fran Paxeco, cônsul de Portugal no Maranhão, e de Isabel Eugénia de Almeida Fernandes Paxeco, casada com o filólogo português José Pedro Machado. Prima do jornalista Óscar Paxeco. Estudou no Brasil, na França, na Grã-Bretanha, nas Universidades de Gales, Londres e Lisboa os cursos de Filologia Românica e Germânica (em que foi aprovada com Honours Summa cum Laudes) e Língua e Literatura Inglesa (Master of Arts). Primeira senhora doutorada pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (1938), com aprovação por unanimidade, onde veio a ensinar, como leitora de francês, tendo leccionado igualmente as cadeiras de Literatura Francesa e de Língua e Literatura Inglesas. Estagiou no Liceu de Pedro Nunes em 1938-1939. Exerceu de Fevereiro de 1940 a Outubro de 1948, quando foi exonerada a seu pedido. Fez parte de júris de admissão ao Ministério dos Negócios Estrangeiros. Representou em Portugal a Associação das Academias Brasileiras de Letras, tendo sido eleita sócia correspondente da Academia Maranhense de Letras. Publicou com seu marido, José Pedro Machado, o Cancioneiro da Biblioteca Nacional, 1949-1964. Sócia Efectiva da Sociedade de Geografia de Lisboa, eleita em sessão de 27 de Fevereiro de 1964. Deixou colaboração dispersa por numerosas publicações nacionais e estrangeiras de entre as quais se destacam as revistas da Faculdade de Letras de Lisboa, Brasília, de Coimbra , Revista das Academias Brasileiras de Letras, do Rio de Janeiro, Revista de Portugal, Ocidente e outras. https://pt.wikipedia.org/wiki/Elza_Paxeco


FRAN PAXECO E SUA ESPOSA ISABEL Fonte: VIEIRA DA LUZ, Joaquim. FRAN PAXECO E OUTRAS FIGURAS MARANHENSES. Rio de Janeiro: Livros de Portugal, 1957. Associações científicas de que foi membro                    

Sociedade de Geografia de Lisboa; Sócio correspondente, admitido em 1 de Fevereiro de 1897. Academia Maranhense de Letras, de que foi sócio fundador; Academia Alagoana de Letras; (sócio correspondente); Academia Piauiense de Letras; (sócio correspondente); Société Académique d'Histoire Internationale; Medalha de Ouro. Paris, 27 de Junho de 1912. Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano; Sócio correspondente, eleito em 24 de Novembro de 1913. Academia de Ciências de Portugal; (sócio correspondente) eleito em 13 de Janeiro de 1915. Associação de Imprensa do Amazonas; Associação de Imprensa do Pará; Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas (São Paulo); Grémio Literário e Comercial Português, hoje, Grêmio Literário e Recreativo Português, Belém do Pará; Instituto Geográfico e Histórico da Bahia; Instituto Histórico e Geográfico do Pará; Sócio Honorário,eleito em 12 de Maio de 1920. Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão; Sócio correspondente, investido em 20 de Novembro de 1925. Liga Portuguesa de Repatriação; Belém do Pará: Sócio Benemérito, eleito em 26 de Junho de 1925. Sociedade Portuguesa Beneficente; Belém do Pará: Sócio Benfeitor, eleito em 26 de Março de 1925. Associação Dramática Recreativa e Beneficente; Belém do Pará: Sócio Beneficente, eleito em 5 de Julho de 1927. Instituto Histórico de Pernambuco; Instituto Histórico do Piauí; Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro.

Temos um diploma de mérito concedido a Fran Paxeco ―pela propaganda literária que tem feito a favor da Educação Física‖.


De suas idas e vindas, ao Rio de Janeiro, a Portugal, a Belém, ao Amazonas, sempre retornando a São Luis: - 1901, o encontramos como colaborador da ―Revista do Norte‖ e na ―Pacotilha‖; - 1902, convidado para sub-secretário da Associação Comercial do Maranhão; - 1903, organizou um Congresso Literário Luso-Brasileiro... - 1904, durante uma grande assembléia a 14 de agosto, é o responsável pelas discussões mais séries sobre a construção do Caminho de Ferro São Luis-Caxias – também é responsável pela sua construção... Em maio de 1904, vai para Manaus e de lá, para bom Alto Juruá, ai dirigindo o gabinete do Prefeito, dirigindo a Imprensa oficial e imprimia o semanário ―O Cruz euro do Sul‖, e em 1906, ―O departamento de Juruá‖ - 1905, está de volta a São Luis, para visitar a noiva e os amigos, retornando ao amazonas em outubro; 1907, maio, vai para o Rio de Janeiro, em tratamento de saúde, passando pelo porto de São Luis;retornando em agosto para descansar e se recuperar, pois estava em profunda melancolia, dado os acontecimentos ocorridos no amazonas, que redundaram em sua prisão. 1908, vai para Portugal, em dezembro, mas retornando a São Luis, já a 25 de abril de 1909. Aqui, dá aulas, faz conferencias na Universidade Popular Maranhense. Continua a escrever na ―Pacotilha‖. A 8 de setembro de 1910, casa com a sua amada, Isabel. - 1911, funda, com vários maranhenses, o Centro Republicano Português, o casino Maranhense, e o Instituto de Assistência à Infância. A 23 de agosto, é nomeado Cônsul de Portugal no Maranhão por Teófilo Braga. - 1913, novembro, até fevereiro de 1914, está no Rio de Janeiro; vai secretariar o 1º Embaixador de Portugal no Brasil, Bernardino Machado. - 1916, segue para Lisboa, indo ser secretário particular do Presidente da Republica, Bernardino Machado, mas continua como Cônsul de Portugal no Maranhão, promovido a Cônsul de 2ª Classe, em 14 de julho de 1914...; lá exerce várias funções e freqüenta as academias de ciências ; - 1917, setembro, está de volta à São Luis, onde permanece até 1923...


- 1918, foi o inspirador da faculdade de Direito do Maranhão, e como vimos, do Instituto de História e geografia 2.0; da Escola de Farmácia e de odontologia; do Instituto Ateniense; da Câmara Portuguesa do Comércio. - 1919, da Legião dos Atenienses; - 1920, do Congresso Pedagógico. Nesse ano vai a Belém resolver a ―Questão dos Poveiros‖, com êxito... - 1921, do Centro Acadêmico - 1922, da Liga Portuguesa de Repartições; da Escola de Belas Artes; - 1923, recebe o titulo de cidadão honorário de São Luis. Nesse ano vai para Belém, no mesmo posto de Cônsul de Portugal.

Senhores, Senhoras, Confrades Já tomei demais o tempo, e está se tornando cansativo... Reconheço... Agradeço a oportunidade, nobre Presidente, encerro aqui. Obrigado! CONTINUAÇÃO... APÓS DEIXAR O MARANHÃO...

Retorna à Belém do Pará pela terceira vez. Depois de ter cumprido os seus deveres de testamenteiro literário de Teófilo Braga, partiu para Belém a 22 de Março de 1924. Em Abril, promove a criação de uma Universidade Livre, no Grémio Literário e Comercial Português, com o objetivo de a cultura de ideias gerais, mediante conferências.


Presta colaboração e apoio à ativividade do Grémio Comercial, e promoveu a criação de um Curso de Contabilidade, onde deu aulas de Direito Comercial e Aduaneiro, Geografia Comercial, História do Comércio e ainda pagava do seu bolso a um professor do ensino primário. Em 21 de Novembro, é nomeado para integrar a ―Comissão Teófilo Braga‖. Faz a catalogação da Biblioteca do Grêmio que, mais tarde, em sua homenagem é denominada ―Biblioteca Fran Paxeco‖. Sócio efetivo do Grêmio é-lhe, sucessivamente, concedida a condição de ―Sócio Honorário‖, ―Sócio Benemérito‖ e ―Presidente de Honra‖. Forte apoiante do movimento Associativo, é admitido como sócio efetivo da Associação Dramática, Recreativa e Beficente É-lhe conferido o título de ―Sócio Benemérito ― da Sociedade Portuguesa Beneficente.

A revolução de 28 de Maio88 causa-lhe alguns dissabores e a colónia portuguesa divide-se no apoio e repúdio ao processo em curso. Por saberem que Fran Paxeco não seria um dos apoiantes, alguns (uma minoria) desferem-lhe, na imprensa, alguns ataques, mas a maioria sai em sua defesa e os ânimos sossegam. Assume as funções de Cônsul em Cardiff, em Setembro de 1928. Escreve Portugal não é Ibérico. Faz parte da "South Wales Branch" da Ibero American Society, contribuindo para que o nome fosse mudado para "Hispanic and Portuguese Society". Com o cônsul do Brasil consegue abrir e manter no Technical College uma cadeira de língua portuguesa Em 17 de Setembro de 1930 está em Setúbal, onde profere uma conferência intitulada ―Setúbal e a Província do Sado‖

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A Revolução de 28 de Maio de 1926, Golpe de 28 de Maio de 1926 ou Movimento de 28 de Maio de 1926, também conhecido pelos seus herdeiros do Estado Novo por Revolução Nacional, foi um pronunciamento militar de cariz nacionalista e antiparlamentar que pôs termo à Primeira República Portuguesa, levando à implantação da Ditadura Militar, depois autodenominada Ditadura Nacional e por fim transformada, após a aprovação da Constituição de 1933, em Estado Novo, regime que se manteve no poder em Portugal até à Revolução dos Cravos de 25 de Abril de 1974. A revolução começou em Braga, comandada pelo general Gomes da Costa, sendo seguida de imediato em outras cidades como Porto, Lisboa, Évora, Coimbra e Santarém. Consumado o triunfo do movimento, a 6 de Junho de 1926, na Avenida da Liberdade, em Lisboa, Gomes da Costa desfila à frente de 13 mil homens, sendo aclamado pelo povo da capital. https://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_de_28_de_Maio_de_1926


Informa-nos Cunha Bento (2014), que Fran Paxeco envia carta, de Cardiff, a Bernardino Machado, em 3 de Março de 1932, quando fala dos seus mais recentes trabalhos literários, entre os quais refere ―Setúbal e a província do Sado‖, em três volumes. Este trabalho não chegaria a ser editado, tendo-se perdido o original!

Em 24 de Março de 1933, o Diário de Governo anuncia a sua transferência para a Secretaria Geral, por ―urgente conveniência de serviço‖. Parte de Cardiff em Maio seguinte. Em 1 de Outubro de 1933 vem a Setúbal participar na inauguração da glorieta de Luísa Todi 89 89

LUÍSA TODI, nascida Luísa Rosa de Aguiar (Setúbal, 9 de Janeiro de 1753 — Lisboa, 1 de Outubro de 1833), foi uma cantora lírica portuguesa. Nascida na freguesia de Nossa Senhora da Anunciada, concelho de Setúbal, era filha de Manuel José de Aguiar (Lisboa, Conceição Nova (extinta), bap. 12 de Janeiro de 1710 - ?), professor de música e instrumentista, e de sua


Em 24 de Novembro de 1933 assume a sua última missão diplomática como Cônsul de Portugal em Liverpool, onde se mantém até Maio de 1935. Regressa a Lisboa de onde nunca mais saiu. Fran Paxeco participou, proferindo uma conferência, nas comemorações do dia de Bocage 90 – 15 de Setembro de 1935, como se pode verificar através desta fotografia da cerimónia que teve lugar no CineTeatro Luísa Todi.

O Estado Novo91 não lhe perdoou e, através do Secretário-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Teixeira de Sampaio, um monárquico de fortes convicções, não volta a atribuir-lhe outra missão mulher (Setúbal, Nossa Senhora da Anunciada, 4 de Setembro de 1745) Ana Joaquina de Almeida (Setúbal, Santa Maria da Graça, 19 de Fevereiro de 1726 - ?) e irmã mais nova de Cecília Rosa de Aguiar (23 de Agosto de 1746 - ?) e de Isabel Ifigénia de Aguiar (5 de Novembro de 1750 - ?), casada com Joaquim de Oliveira, em 1765 já se encontrava a viver em Lisboa. A sua mãe era filha de João de Almeida, sangrador, e de sua mulher Isabel da Esperança (filha de João da Frota e de sua mulher Luísa de Brito) e neta paterna por bastardia de Miguel Pessanha de Vasconcelos, da Casa da Quinta de Santo Estêvão das Areias, termo da Sé de Viseu (filho segundo do 8.º Senhor de Mossâmedes), e de Serafina de Almeida, "a Relojoeira", de Viseu. Luísa Todi, que tinha a capacidade invulgar de cantar com a maior perfeição e expressão em francês, inglês, italiano e alemão, é considerada a meio-soprano portuguesa mais célebre de todos os tempos. No seu Tratado da Melodia, Anton Reicha, considera Luísa Todi como «a cantora de todas as centúrias» melhor dizendo «uma cantora para a eternidade». https://pt.wikipedia.org/wiki/Lu%C3%ADsa_Todi 90

Manuel Maria de Barbosa l'Hedois du Bocage (Setúbal, 15 de setembro de 1765 – Lisboa, Mercês, 21 de dezembro de 1805) [1] foi um poeta nacional português e, possivelmente, o maior representante do arcadismolusitano. Embora ícone deste movimento literário, é uma figura inserida num período de transição do estilo clássico para o estilo romântico que terá forte [2] presença na literatura portuguesa do século XIX. Era primo em segundo grau do zoólogo José Vicente Barbosa du Bocage. Nascido em Setúbal às três horas da tarde de 15 de Setembro de 1765, falecido em Lisboa na manhã de 21 de Dezembro de 1805, era filho do bacharel José Luís Soares de Barbosa, juiz de fora, ouvidor, e depois advogado, e de D. Mariana Joaquina Xavier L'Hedois Lustoff du Bocage, cujo pai era o Almirante francês Gil Hedois du Bocage, que chegara a [2] Lisboa em 1704, para reorganizar a Marinha de Guerra Portuguesa. . Foi seu padrinho de baptismo Heytor Botelho de Moraes Sarmento, 4º Guarda-Mor do Sal de Setúbal, Senhor da Quinta das Machadas, Fidalgo da Casa Real. https://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_Maria_Barbosa_du_Bocage


diplomática. A pressão a que se achou submetido teve como epílogo um acidente vascular cerebral, em 1939, que o priva da fala, da escrita e totalmente dependente, ainda que consciente. Veio a falecer em 17 de Setembro de 1952. Em Setúbal: figura no triptíco de Luciano dos Santos, existente no Salão Nobre dos Paços do Concelho.

A antiga Rua Direita de Tróino, então chamada de Rua 25 de Março, passou a denominar-se Rua de Fran Paxeco, por deliberação da CMS, de 1 de Setembro de 1953. 91

Estado Novo foi o regime político autoritário, autocrata e corporativista de Estado que vigorou em Portugal durante 41 anos sem interrupção, desde a aprovação da Constituição de 1933 até ao seu derrube pela Revolução de 25 de Abril de 1974. Ao Estado Novo alguns historiadores também chamam de Segunda República Portuguesa, por exemplo a História de Portugal de José Hermano Saraiva e a obra homónima de Joaquim Veríssimo Serrão. No entanto, tal designação jamais foi assumida pelo regime Salazarista, bem como nunca foi aceite pelos fundadores da República saída da Revolução dos Cravos, visto que o Estado Novo, apesar de ter conservado a forma de governo republicana, nunca adotou a designação "II República", preferindo designar-se "Estado Novo". Dado o apoio inicial que o Estado Novo recebeu por parte de alguns monárquicos e integralistas, a questão do regime manteve-se em aberto até 1950-1951. Apesar da oposição das Forças Armadas e do Ministro da Defesa Santos Costa a uma mudança de regime, com a morte do Presidente Óscar Carmona em 1951, a restauração da Monarquia chegou a ser proposta por Mário de Figueiredo e Cancela de Abreu, verificando-se então uma decisiva oposição à mudança por parte de Salazar, Marcello Caetano e Albino dos Reis. A designação oficial de "Estado Novo", criada sobretudo por razões ideológicas e propagandísticas, serviu para assinalar a entrada num novo período político aberto pela Revolução de 28 de Maio de 1926 que ficou marcado por uma concepção presidencialista, autoritária e antiparlamentar do Estado. Nesse sentido, o Estado Novo encerrou o período do liberalismo em Portugal, abrangendo nele não só a Primeira República, como também o Constitucionalismo monárquico. Como regime político, o Estado Novo foi também chamado salazarismo, em referência a António de Oliveira Salazar, o seu fundador e líder. Salazar assumiu o cargo de Ministro das Finanças em 1928 e tornou-se, nessa função, uma figura preponderante no governo da Ditadura Militar, o que lhe valeu o epíteto de "Ditador das Finanças". Obtendo enorme sucesso num curto espaço de tempo, ficou posteriormente conhecido como o "Mago das Finanças". Ascendeu a Presidente do Conselho de Ministros em Julho de 1932 e esteve em funções até ao seu afastamento por doença em 1968, nunca chegando a ter conhecimento de que já não era o Presidente do Conselho de Ministros. A designação salazarismo reflete a circunstância de o Estado Novo se ter centrado na figura do "Chefe" Salazar e ter sido muito marcado pelo seu estilo pessoal de governação. Porém, o Estado Novo abrange também o período em que o sucessor de Salazar, Marcello Caetano, chefiou o governo (1968-1974). Caetano assumiu-se como "continuador" de Salazar mas, vários autores preferem autonomizar esse período do Estado Novo e falar de Marcelismo. Marcello Caetano ainda pretendeu rebatizar publicitariamente o regime ao designá-lo por Estado Social, "mobilizando uma retórica política adequada aos parâmetros desenvolvimentistas e simulando o resultado de um pacto social que, nos seus termos liberais, nunca existiu", mas a designação não se enraizou. Ao Estado Novo têm sido atribuídas as influências do maurrasianismo, do Integralismo Lusitano, da doutrina social da Igreja, bem como de alguns aspetos da doutrina e prática do Fascismo italiano, regime do qual adotou o modelo do Partido Único e, até certo ponto, do Corporativismo de Estado. A Ditadura Nacional (1926-1933) e o Estado Novo de Salazar e Marcello Caetano (1933-1974) foram, conjuntamente, o mais longo regime autoritário na Europa Ocidental durante o séc. XX, estendendo-se por um período de 48 anos. https://pt.wikipedia.org/wiki/Estado_Novo_(Portugal)


Assinaturas

1890

1894

1895

1905

Pseudônimos O Elmano‖ – 1890

O Rato‖ – 1891

A Montanha‖ – 1893

O Rato‖ – 1891

O Elmano‖ – 1893

―Pacotilha‖- 1901

1912



REVISTA DO LEO REVISTA ELETRONICA EDITADA POR LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Prefixo Editorial 917536

SÃO LUIS – MARANHÃO NUMERO 9 – JUNHO - 2018 SUMÁRIO EXPEDIENTE EDITORIAL SUMÁRIO MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO FÍSICA, ESPORTES E LAZER IDENTIDADES E CULTURAS REGIONAIS E LOCAIS - LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ O QUE É A CAPOEIRA? – Leopoldo Gil Dulcio Vaz CAPOEIRAGEM NO BRASIL - MARANHÃO E O "AGARRE MARAJOARA" – LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ FRAN PAXECO – UM DOS PROPUGNADORES DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO MARANHÃO - LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ ATLAS DO ESPORTE NO MARANHÃO JOGOS TRADICIONAIS INDIGENAS - Leopoldo Gil Dulcio Vaz JOGOS TRADICIONAIS E BRINCADEIRAS INFANTIS - LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ; REINALDO CONCEIÇÃO CRUZ REMO - Leopoldo Gil Dulcio Vaz LIVRO-ÁLBUM DOS MESTRES CAPOEIRAS MESTRE SAPO MESTRE ROBERVAL SEREJO MESTRE DINIZ MESTRE PATINHO O ENSINO DE MÚSICA EM ESCOLAS DE CAPOEIRA DE SÃO LUÍS – MA. - BOÁS, MÁRCIO ARAGÃO. O CAPOEIRA. POETA DAS EXPRESSÕES CORPORAIS - FÁBIO ALLEX ARTIGOS, CRÔNICAS, DISCUSSÕES, OPINIÕES A EVOLUÇÃO DO CONCEITO DO “ESPORTE” E OS SEUS VARIOS MODELOS - ANTONIO MUSSINO NA(S) ACADEMIA(S) – LITERATURA LUDOVICENSE/MARANHENSE O CURSO DE DIREITO DE SOUSÂNDRADE – O DA UNIVERSIDADE NOVA ATENAS - LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ O LEGADO DE FRAN PAXECO - LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ O ÚLTIMO CORTEJO DA RAINHA - RAMSSÉS DE SOUSA SILVA VERGONHA E RENÚNCIA – EDMILSON SANCHES CAFETEIRA – O VERDADEIRO CAMPEÃO DOS JEBS – JOSÉ DE OLIVEIRA ROMA

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NO PRELO...


ANTONIO NOBERTO O IMPARCIAL – 19/04/2018


Festa de comemoração ao Dia municipal dos agentes de limpeza


Daqui a pouco estarei na RĂĄdio AssemblĂŠia no programa "Hora Cultural" com Marcia Carvalho. Assistam.


DILERCY ADLER SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE MUJERES, ARTES PLÁSTICAS,LITERATURA Y DERECHOS HUMANOS 8 y 9 de março de 2018 Universidade de Salamanca- Espana. A MULHER MARIA FIRMINA DOS REIS: uma maranhense *Dilercy Aragão Adler 1 INTRODUÇÃO Falar sobre Maria Firmina não é uma tarefa fácil, considerando as condições objetivas da época em que ela viveu. Tempo pródigo em escassez de fontes de registros. Maria Firmina dos Reis nasceu em São Luís do Maranhão/Brasil;esse é um dado incontestável, porém outros dados da sua biografia deixam dúvidas e alguns foram refutados,com bases empesquisas recentes, em fontes primárias, encontrados no Arquivo Público do Estado do Maranhão (empreendida por mim, com a indicação da Profa. Mundinha Araújo). No tocante aos novos dados cita-se a seguir: A data de seu nascimento, até meados de 2017, todos os trabalhos publicados registravam 11 de outubro de 1825. No entanto, por meio dos documentos: Autos de Justificação do dia de nascimento de Maria Firmina dos Reis,datado de 25 de junho de 1847 (Câmara Eclesiástica/Episcopal, série 26, Caixa n. 114 -Documentoautos nº 4.171); da Certidão de Justificação de Batismo (Fundo Arquidiocese - Certidão de Justificação de Maria Firmina dos Reis - Livro 298 – fl. 44v) e do Livro de Baptismo (Fundo Arquidiocese Batismo de Maria Firmina dos Reis, Livro 116- fl. 182), ficou constatado que o seu nascimento, de fato, data de 11 de março de 1822. O primeiro documento, Autos de justificação do dia de nascimento de Maria Firmina dos Reis, datado de 25 de junho de 1847, Câmara Eclesiástica/Episcopal, série 26, Caixa n. 114 -Documento-autos nº 4.171, ano 1847 (12 fls. Frente e Verso), assim inicia: Diz Maria Firmina dos Reis, filha natural/ de Leonor Filippa dos Reis, que ela quer justificar por este Juiso que nasceo no dia 11 de Março do anno de 1822, e que só teve lugar o seu baptismo no dia 21 de Desembro de 1825, como mostra pelo documento junctos, por causa demolestia que então lhe sobreveio e privou serbaptisada antes; o que feito requer se julgue por sentencia, e que mande abrir novo assento por tt.o(ADLER, 2017, p. 59) (grifo meu). A solicitação se reporta ao livro de Baptismo de nº 116 que traz na Folha 182: Aos vinte e hum de dezembro de 1825 nesta freguezia de Nossa Senhora da Victória Igreja Cathedral da cidade do Maranhão baptizei e pus os santos oleos a Maria filha natural, de Leonor Felippa molata forra que foi escrava do Comendador Caetano Je. Teixei.ª forão Padrinhos o Tenente de Milícias João Nogueira de Souza e Nossa S enhora dos Remédios do que se fez este assento que assigneio (ADLER, 2017, p. 59), O processo inclui vários documentos, entre os quais: o auto lavrado pelo escrivão, o requerimento dela e o certificado dado pelo escrivão. No certificado dado pelo escrivão ele se reporta à certidão do batismo. A petição de Justificação do dia de nascimento foi deferida no dia 14 de julho de 1847, sendo aceita então a data de nascimento requerida,a de 11 de março de 1822 (grifo meu). Filiação: nos registros pesquisados consta o nome de João Pedro Esteves como seu pai, no entanto nenhum outro dado é colocado sobre ele, salvo que é negro. Assim, a sua origem e vida são totalmentes desconhecidas até hoje.A mãe de Maria firmina,Leonor Felippa dos Reis, em alguns trabalhos aparece como branca e de origem portuguesa. Nos documentos já referidos, está registrado: Maria filha natural, de Leonor Felippa molata forra que foi escrava do Comendador Caetano[...](ADLER, 2017, p.59).


A Certidão de Batismo de Maria Firmina coloca em evidência a condição social da sua mãe como mulata forra, tendo esta sido escrava do Comendador Caetano José Teixeira, um dos maiores negociantes do Maranhão na passagem do século XVIII ao XIX. Era português, dono de empresas que negociavam por todo o Império colonial português, sobretudo nas praças de São Luís, Belém, Lisboa, Porto e em Guiné, assim como nos outros domínios da África. Empregou 2.000 escravos, foi proprietário bem estabelecido na província, (Diário da Câmara dos Deputados a Assembleia Geral Legislativa do Império do Brasil. Rio de Janeiro: Typographia do Império, 1826 – 1829. P. 901). -Imagem: Maria Firmina não deixou nenhuma foto e o que existe em relação a umaréplica da sua imagem é um busto esculpido, em sua homenagem, por ocasião do sesquicentenário de seu nascimento, de autoria do artista plástico Flory Gama, construído à base de informações prestadas por vimarenses (os cidadãos da cidade de Guimarães, no estado do Maranhão, Brasil) que conviveram com ela, como Dona Nhazinha Goulart, criada pela romancista, na residência da Praça Luís Domingues, e Dona Eurídice Barbosa, que foi aluna de Maria Firmina na Escola Mista de Maçaricó. Em seu livro Maria Firmina: Fragmentos de uma vida, editado pelo Serviço de Imprensa e Obras Gráficas do Estado - SIOGE, no Maranhão, Nascimento Morais Filho (1975, p. 259) se refere aos traços físicos de Maria Firmina dos Reis, mencionando: [..] Rosto arredondado, cabelo crespo, grisalho, fino, curto, amarrado na altura da nuca; olhos castanho-escuros, nariz curto e grosso; lábios finos; mãos e pés pequenos; meã (1,58, pouco mais ou menos), morena. Aesse respeito, convém registrar que a imagem da Escritora Maria Benedita Câmara Bormann, conhecida pelo pseudônimo de Délia,é veiculada erroneamente como sendo de Maria Firmina dos Reis. Maria Benedita é, de fato, uma cronista, romancista, contista e jornalista que nasceu em 25 de novembro de 1853, na cidade de Porto Alegre/Rio Grande do Sul e faleceu em julho de 1895, no Rio de Janeiro/RJ. Ainda chama a atenção que aparece na maioria das pesquisas e trabalhos a mesma foto de Maria Benedita tanto para retratar ela própria, quanto Maria Firmina.

Maria Firmina dos Reis

Maria Benedita Câmara Bormann, (Délia)

Este é um dos maiores cuidados da Academia Ludovicense de Letras- ALL, hoje: desfazer esse inaceitável equívoco. A Academia Ludovicense de Letras (da cidade de São Luís, capital do Estado do Maranhão/Brasil), a escolheu como Patrona da Casa e, nesse contexto, há o empenho de empreender pesquisas com maior número de variáveis possíveis que elucidem o que diz respeito a essa ilustre escritora e mulher brasileira. 2. O MARANHÃO DE MARIA FIRMINA DOS REIS O entendimento de que as condições sociais objetivas, a partir, também, da posição social e econômica que um sujeito ocupa na sociedade o marcam, indelevelmente, nos leva a tangenciar sobre o Maranhão da época de Maria Firmina dos Reis. Segundo Ferreira (2008) apud Pereira Filho (2016), o Maranhão surgiu como unidade geográfica e política em 1534, quando a Coroa portuguesa dividiu o território brasileiro em 15 lotes que receberam a denominação de Capitanias Hereditárias, um resquício da cultura feudal. Posteriormente ocorreram mais seis divisões e somente em 1920 o Maranhão alcançou a atual conformação territorial (FERREIRA, 2008). O Maranhão teve um surgimento glorioso no cenário econômico da Colônia no século XVII, em plena vigência do Mercantilismo. Isso porque encontrava-se inserido no mercado internacional, desde a expulsão dos franceses, em 1615.


Em 1895, o Maranhão ocupava o segundo lugar entre os estados industriais à frente da Capital Federal, Rio de Janeiro, Bahia e São Paulo. O primeiro era o de Minas Gerais. Mas, uma série de fatores foi determinante para que não se firmasse como estado industrial a partir do século XX. Dentro do contexto histórico dabelle époque, a vida cultural no Maranhão ganhou em intensidade e expressividade. A literatura foi colocada em foco e grandes intelectuais e escritores se sobressaíram no cenário nacional. Nomes, como os de Gonçalves Dias, João Lisboa, Cândido Mendes, Odorico Mendes, Sousândrade, Humberto de Campos e outros constituíram aquilo que fez do Maranhão o grande cenário da poesia, da prosa e da produção jornalística no século XIX, o que levou a cidade de São Luís, hoje patrimônio cultural da humanidade, a ser agraciada com o título deAthenas Brasileira. Era comum os filhos das famílias abastadas estudarem na Europa, principalmente em Portugal, mas também nessa época,embora fosse reservada educação específica para as mulheres, esta não incluía estudos mais avançados. A participação das mulheres no mundo da escrita, e principalmente da escrita pública, era bastante reduzida no século XIX. A participação feminina naquilo que Henriques Leal intitulou Pantheon Maranhense (LEAL, 1987) era rara, visto que as mulheres passaram muito tempo sem acesso à educação e à possibilidade da escrita. No caso de Maria Firmina, as barreiras a serem transpostas eram recrudescidas, pois, enquanto os homens brancos e ricos iam para a Europa estudar nas melhores faculdades, até meados do século XIX, poucas eram as mulheres educadas formalmente. A educação para mulheres, ainda de forma precária, foi iniciada no período imperial, com a chegada da família real ao Brasil. A partir de então, segundo Lívia Menezes da Costa Molina, as mulheres começaram a moldar uma nova visão acerca do seu papel e passaram a materializar, nas artes, o instrumento de visibilidade do seu potencial e capacidade intelectuais. Vale salientar que a imprensa foi um importante veículo nesse processo; produções femininas começaram a ser publicadas na forma de artigos, crônicas e poesias, com o objetivo de contribuir para a superação da supremacia do pensamento preconceituoso dominante, ao qual eram submetidas. A ousadia da época pululava em temas revolucionários, abordando e defendendo direitos como o divórcio e também a abolição da escravidão. Neste último caso, libertando parte da população brasileira que ainda era considerada instrumento de trabalho, privada, portanto, da sua cidadania e de sua humanidade(ADLER 2014, p. 9). No caso de Maria Firmina, ela nunca saiu do Maranhão. LOBO, (2007, p.363), na sua Conclusão do Autorretrato de uma pioneira abolicionista expressa: Como Sousândrade, Maria Firmina dos Reis viveu deslocada do eixo de poder da Corte. Contudo, ela difere radicalmente daquele, que foi viajante dos grandes centros e do exterior, como Paris, Londres, Nova York e Rio de Janeiro, África e Américas. Ela não herdou terras, fazendas nem escravos. Passou a vida em Guimarães, com poucas travessias pela baía de São Marcos até São Luís. É um notável exemplo de abnegação e força de vontade de quem, vivendo numa pequena vila no interior maranhense, se dedicou à criação literária por meio da árdua profissão de professora pública primária. Adler (2014, p. 7) expressa ainda: A despeito da falta de todas essas condições elencadas, Maria Firmina não se atemorizou nem se recolheu; ousou continuar a externalizar e disponibilizar naquele tempo produções que pudessem ser valorizadas mais contundentemente, talvez em outros tempos... Assim a sua voz seria ouvida e o seu grito compartilhado com a força real com que tais obras foram produzidas! [...] Os crus dissabores que eu sofro são tantos, São tantos os prantos, que vivo a chorar, É tanta a agonia, tão lenta e sentida, Que rouba-me a vida, sem nunca acabar. [...] Não queiras a vida


Que eu sofro - levar, Resume tais dores Que podem matar. E eu as sofro todas, e nem sei Como posso existir! Vaga sombra entre os vivos, - mal podendo Meus pesares sentir." Excertos de: No Álbum de Uma Amiga In: CANTOS À BEIRA MAR, 1871. Isso posto, ratifica-se a ousadia e teimosia de uma mulher que, apesar da fragilidade e severas restrições impostas pelos ditames sociais de uma época, lutou não só pelo seu espaço, mas por liberdade dos segmentos oprimidos, nestes incluídos: a mulher, o negro, o índio e o economicamente pobre. 3VIDA E OBRA DE MARIA FIRMINA DOS REIS No tocante à vida e obra de Maria Firmina dos Reis, inicialmente aborda-se alguns traços da sua personalidade, de modo sucinto, e com a clareza de que são inferências com base nas leituras acerca da sua própria vida e da vida dos protagonistas das suas tramas, ou também das palavras que saltam dos seus poemas. Luiza Lobo, na coletânea SOBRE MARIA FIRMINA (2016, p.116), se refere a alguns dos traços dessa escritora revelados na sua escrita, os quais, segundo ela, retratam [...] toda a dimensão da sua melancolia devido a sua posição social e étnica fragilizada. Essa situação tornou-lhe impossível o casamento, por mais leitura que tivesse. [...] além da cor da pele, era desprovida de qualquer fortuna, era bastarda e ficou órfã de mãe. [...] O resgate da situação inferior da mulher é sempre mais árdua e delicada. Ainda segundo Lobo (2016, pp.110), a autora escreve também poemas em prosa ―Meditação‖, por exemplo, tem caráter ultrarromântico, traz traços de aproximação com a natureza e sabor confessional de diário. Nele revela uma melancolia doentia. Apresenta em seus escritos também algumas insinuações a suicídio, que não se consolidam pela forte formação religiosa. Morais Filho (1975, p. 259) igualmente também se refere aos traços morais de Maria Firmina dos Reis, evidenciando: [...] TRAÇOS MORAIS – A sua presença, na literatura, na arte e no magistério e as revelações do seu álbum fornecem-nos as linhas da sua fisionomia moral. Se não são bastantes para um retrato, são-no para um debuxo, ou como diriam os romanos: ―paucasedbona‖. No entanto, queremos avivar um traço do seu caráter, que lhe evidencia também o sentimento e a sua filosofia – liberdade, fraternidade e igualdade e que nos recorda o ―episódio do palanquim‖. Esse episódio me encanta porque demonstra sua sensibilidade e consciência política diz respeito ao dia em que ela foi receber o título de nomeação para exercer o cargo de Professora Régia, muito importante à época. Seus familiares queriam que fosse de palanquim (espécie de liteira em que as pessoas mais ricas se faziam transportar, conduzidas por escravos) ao que ela se recusou irrevogavelmente explicando: Negro não é animal para se andar montado nele. De forma inteligente e verdadeiramente cristã afirmava que a escravidão contradizia os princípios do cristianismo, que ensinava o homem a amar o próximo como a si mesmo (ADLER, 2014, p.12) (grifo meu).


Maria Firmina concorreu com duas candidatas ao cargo de professora de primeiras lettras do sexo feminino da Villa de Guimaraes,iniciando assim, a carreira como Mestra Régia aos 25 anos para a qual comprova a Portaria de Nomeação (Fundo Secretaria do Governo, Série: Portarias de Nomeação, Licença e Demissões: (1839-1914), Livro 1.561 (1.844-1.851- fls. 55 e 55V), A respeito da sua nomeação, conforme o que consta no Arquivo Público do Estado do Maranhão. Fundo Secretaria do Governo. Série Portarias de nomeações, licenças, demissões (1832 – 1914) Livro 1561 (18441851) fl. 55-55v, Despacho 13 de agosto de 1847 está registrado: Nomeação para professora de primeiras lettras do sexo feminino da Villa de Guimaraes Maria Firmina dos Reis O Doutor Joaquim Franco de Sá Oficial da Imperial Ordem da Rosa, Cavalheiro da de Christo, juiz de Direito da Câmara de Alcântara, deputado á Assembleia Geral Legislativa, e Presidente da Provincia do Maranhão por sua Majestade O Imperador a Quem Deus Guarde. Faço saber aos que este Alvará virem, que atendendo a que Maria Firmina dos Reis opositora á cadeira de primeiras lettras do sexo feminino da Villa de Guimaraes, se acha competentemente habilitada na forma da Lei de quinze de outubro de mil oitocentos e vinte e sete, tem por bem, em conformidade das leis em vigor provêla na serventia vitalícia da mencionada cadeira, que se acha vaga, havendo o ordenado annual que legalmente lhe competir. Mando por tanto a quem pertencer, que dando-lhe a posse desta cadeira, depois de prestar o juramento do objeto, a deixa servir e exercitar. Em firmeza de que lhe mandei passar o presente Alvará, que lhe servirá de título, indo por mim assignado e sellado com os sellos das Armas do Império, e se registrará. Dado nesta cidade de ―São‖ Luiz do Maranhão em dezesseis de agosto de mil oitocentos e quarenta e sete, vigésimo sexto da Independência e do Imperio. Augusto Cesar dos Reis Raiol as fez - E eu João RufinoMarques Oficial maior da Secretaria, no impedimento nesse sentido nesse sentido do Secretário e fez escrever e subscrever - Estava o Sello -Alvará = Estava o Sello – Alvará por/ que V. Ex.a há por bem prover a Maria Firmina dos Reis na serven-/ tia vitalicia da Cadeira de Primeiras lettras do sexo feminino da/ Villa de Guimaraes, como acima se declara ... (ADLER, 2017, pp. 60-61) (Grifo meu). Além de ser professora, aos 25 anos,ter publicado o primeiro romance, Úrsula (1859), tornando-se a primeira romancista, é, também, a única do século XIX. O conjunto da sua obra é de notável reconhecimento e bastante significativa, tanto em quantidade quanto em variedade de gêneros literários e vertentes das artes: romances, crônicas, contos, poesias, composições (letra e música), enigmas, epígrafes, folclores entre outras: Obras: Úrsula (romance, 1859), Gupeva (romance de temática indianista,1861), Cantos à beira-mar, (poesia, 1871), A escrava (conto antiescravista,1887), AntologiaPoética Parnaso Maranhense: coleção de poesias, editada por FlávioReimar y Antonio Marques Rodrigues.(1861); Publicações emjornaisliterários:Federalista,Pacotilha, Diário do Maranhão, A Revista Maranhense, O País, O Domingo, Porto Livre, O Jardim dos Maranhenses, SemanárioMaranhense, Eco da Juventude, Almanaque de Lembranças Brasileiras, A Verdadeira Marmota, Publicador Maranhense e A Imprensa;ComposiçõesMusicais: Auto de bumba-meu-boi. (letra e música), Valsa. Gonçalves Dias e música de MariaFirmina dos Reis ou (letra e música de MariaFirmina), Hino à Mocidade. (letra e música), Hino à liberdade dos escravos. (letra e música), Rosinha, valsa. (letra e música), Pastor estrela do oriente. (letra e música), Canto de recordação, ―à Praia de Cumã‖. (letra emúsica). Segundo Morais Filho (1975), a entrada oficial de Maria Firmina dos Reis na Literatura maranhense foi bem recepcionada pela imprensa maranhense com palavras de entusiasmo e estímulo à estreante.Argumenta que nessa perspectiva, [...] rompendo a cadeia dos preconceitos sociais que segregavam a mulher da vida intelectual, vinha contribuir com suas forças, seus sonhos e ideais para a criação da Literatura maranhense, para a presença maranhense na formação da Literatura Brasileira - ainda em


nossos dias o embrião de uma vida em laboriosa gestação (MORAIS FILHO, apud ADLER, 2014, p.12). Entretanto, ainda conforme esse autor, Maria Firmina foi vítima, posteriormente, de uma amnésia coletiva, ficando totalmente esquecidos o seu nome e a sua obra, mas, como a Fênix, ressurgiu também das cinzas (Morais Filho apud Adler, 2014, p.12). Apesar desse lamentável episódio da nossa historiografia literária, após longo período de hibernação, voltou ao cenário das letras, e as suas obras foram reveladas, (re)descobertas, trazidas à luz, pelas abençoadas mãos de Nascimento Morais Filho, maranhense e Horácio de Almeida, paraibano(ADLER, 2014). Em 1975 teve início uma nova fase na historiografia de Maria Firmina dos Reis, o marco que eu gostaria de intitular de o seu ano Rosa-de-Jericó. Essa rosa é também chamada de flor- da-ressurreição por sua impressionante capacidade de voltar à vida. As Rosas-de-Jericó podem ser transportadas por muitos quilômetros pelos ventos, vivendo secas, sem água, mesmo durante muito tempo e, ao encontrarem um lugar úmido, elas afundam raízes na terra e se abrem, voltando a verdejar! Vejo muitasemelhança entre Maria Firmina e a Rosa-de-Jericó. Esta permanece seca e fechada, aparentando estar totalmente sem vida por alguns meses, no entanto, basta algum contato com a umidade para ela estender suas folhas, espalhar suas sementes e retornar à vida, mostrando a sua beleza (http://www.icarabe.org/artigos/a-palestina-e-a-rosa-de-jerico). Adler (2017, p. 68) se refere a Nascimento de Morais Filho, como um Sankofa, pássaro africano de duas cabeças, uma cabeça voltada para o passado e outra para o futuro, que, segundo a filosofia africana, significa a volta ao passado para ressignificar o presente, dedicou-se, incansavelmente, para dar novo significado à Maria Firmina dos Reis como mulher, professora e como escritora, dando a ela o lugar que lhe é devido na literatura maranhense e brasileira. Conforme Morais Filho (1975), em São Luís, em 1975, ano do sesquicentenário de Maria Firmina, também foi criado um carimbo em sua homenagem, uma marca filatélica produzida pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, foi inaugurado o busto da escritora na Praça do Panteon, em São Luís, e publicada a edição fac-similar do romance Úrsula.Também foi criada em sua homenagem a Medalha de Honra ao Mérito, pela Prefeitura Municipal de São Luís; na Assembleia Legislativa do Estado foi instituído o dia 11 de outubro, como o Dia da Mulher Maranhense. Em Guimarães, também o ano de 1975 foi o marco do início de maiores homenagens a ela dedicada. Além do desfile em sua homenagem nesse ano, o Centro de Ensino Nossa Senhora da Assunção desde o ano de 2007 passou a promover a Semana Literária Maria Firmina dos Reis. Também o dia do aniversário de Maria Firmina foi instituído feriado Municipal e comemorado o Dia da Mulher Vimarense, entre outras homenagens. Na atualidade existe um desejo de consolidar a ressignificação da autora na historiografia maranhense e brasileira. Em São Luís, essamissão é capitaneada pela Academia Ludovicense de Letras juntamente com a cidade de Guimarães, onde ela viveu a maior parte de sua vida;onde, além de exercer a profissão de Mestra Régia, escreveu toda a sua obra. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Não há como ser refutada a grandiosidade da obra de Maria Firmina dos Reis. Embora a ALL tenha sido fundada 401 anos após a fundação da cidade de São Luís, talvez essa demora fosse em função da espera do tempo/destino do momento adequado para que Maria Firmina tivesse nela lugar de destaque. Às vezes me pergunto: Se tivesse sido fundada antes, seria ela a Patrona? Acredito que dificilmente. A ALL busca ocupar todos os espaços culturais locais, nacionais e internacionais, objetivando desenvolver e difundir a cultura e a literatura ludovicense, a defesa das tradições do Maranhão e, particularmente, de São Luís, também levando o nome de Maria Firmina dos Reis como missão precípua. Só me resta louvar Maria Firmina, que, a despeito de todas as condições e características adversas: mulata, pobre, bastarda, mulher, tudo isso em um Brasil escravocrata no século XIX, ainda assim, com os mais


admiráveis méritos se estabelece, reconhecidamente hoje, como uma das escritoras mais admiráveis de toda a literatura brasileira... (ADLER, 2014, p. 6). Destarte, a reparação está sendo feita! EU TE LOUVO SENHORA À Maria Firmina dos Reis Dilercy Adler Eu te louvo senhora pela agonia sentida que te tirou o prazer do gozo do corpo impondo agonia profunda doída mas que te fez renascer em palavras e versos de puro querer! Eu te louvo senhora pelos crus dissabores nesta vida sofridos ... [...] Eu te louvosenhora pelo teu imensurável amor à humanidade por tua luta incansável pela igualdade por tua excepcional dedicação materna aos filhos abandonados nesta terra pela vida pela história pela verdadeira e única humanidade! renasce agora - nesta horao gozo do corpo e da alma neste louvor que hoje a ti dedico e não há gozo maior que este gozo devolvido em palavras e versos desejos...fantasias... eternos perenes romanescamente femininos! Eu te louvo senhora agora nesta hora hoje e para sempre te louvarei também amém!


REFERÊNCIAS ADLER, Dilercy Aragão. ELOGIO à PATRONA MARIA FIRMINA DOS REIS: ontem, uma maranhense, hoje, uma missão de amor. São Luís: Academia Ludovicense de Letras, 2014. ______. MARIA FIRMINA DOS REIS: uma missão de amor. São Luís:Academia Ludovicense de Letras, 2017. Arquivo Público do Estado do Maranhão. Fundo: Arquidiocese do Maranhão – Autos da Câmara Eclesiástica/Episcopal. Série 26: Autos de justificação de Nascimento. Caixa n. 144 – Documentação/Autos n. 4171- ano 1847. Arquivo Público do Estado do Maranhão. Fundo Secretaria do Governo. Série Portarias de nomeações, licenças, demissões (1832 – 1914) Livro 1561 (1844-1851) fl. 55-55v Diário da Câmara dos Deputados a Assembleia Geral Legislativa do Império do Brasil. Rio de Janeiro: Typographia do Império, 1826 – 1829. GOMES, Antônio Agenor. Depoimento de Antônio Agenor Gomes para Dilercy Adler sobre o culto à memória de Maria Firmina dos Reis em Guimarães, São LuísMimeo, 2017. LOBO, Luiza Leite Bruno. CRÍTICA sem JUÍZO. Rio de Janeiro: Garamond, 2007. VAZ, Leopoldo Gil Dulcio e ADLER, Dilercy Aragão (Organizadores). SOBRE MARIA FIRMINA DOS REIS. São Luís: ALL, 2015. (http://www.icarabe.org/artigos/a-palestina-e-a-rosa-de-jerico).


De: Literatura Brasileira Centro de Estudios Brasileños <literaturabrasileira@usal.es> Enviado: segunda-feira, 16 de abril de 2018 04:42 Para: dilercy adler Assunto: Re: RESUMEN Y Curriculo Em nome do Comitê Científico, é com grande satisfação que comunico que sua proposta foi aceite para apresentação no I Congresso Internacional de Literatura Brasileira. Recordamos que a comunicação completa deverá ser enviada até o dia 14 de setembro de 2018 e deverá também realizar a inscrição e o correspondente pagamento antes dessa data, através do link http://fundacion.usal.es/es/congresos-y-reuniones-cientificas/congreso-internacional-de-literaturabrasilena-nelida-pinon-en-la-republica-de-los-suenos Congreso internacional de literatura brasileña "Nélida ... fundacion.usal.es Fundación General de la Universidad de Salamanca, entidad sin ánimo de lucro de la Universidad de Salamanca destinada: Promover acciones para la rehabilitación, conservación, fomento y difusión del patrimonio histórico de la Universidad de Salamanca.

Acompanhe também as demais novidades do congresso no facebook e no site: http://www.cebusal.es/icongreso-internacional-de-literatura-brasilena/ RESUMO MARIA FIRMINA DOS REIS E OS SEUS CANTOS À BEIRA - MAR E O CONTO INDIANISTA GUPEVA Parte-se de sucinta apresentação da primeira romancista brasileira, do estado do Maranhão, Maria Firmina dos Reis, incluindo a sua vasta produção em diferentes vertentes das artes. Colocam-se em evidência duas de suas obras que compõem uma única publicação: Cantos à beira-mar (poesia) e Gupeva (conto indianista), abordando-se desde as características peculiares daescrita firminiana até às inferências relativas as suas motivações retratadas no testemunho/interpretação próprias da escritora, atreladas às condições objetivas e subjetivas da sua época. Apresentam-se tambémreflexões acerca dos contornos temáticos dessas obras que, apesar de menos conhecidas, são muito importantes e ainda possibilitam o conhecimento de novos vieses da sua produção literária, desenvolvidas no contexto de ascensão do Romantismo. Palavras-chave:Maria Firmina dos Reis. Poesia. Conto RESUMEN MARIA FIRMINA DE LOS REYES Y SUS CANTOS A LA BEIRA - MAR Y EL CUENTO INDIANISTA GUPEVA Se parte de sucinta presentación de laprimera novelista brasileña, del estado de Maranhão, María Firmina de los Reyes, incluyendosu vasta producciónen diferentes vertientes de las artes. Se ponenen evidencia dos de sus obras que componen una única publicación: Cantos a labeiradel mar (poesía) y Gupeva (cuento indianista), abordando desde las características peculiares de la escritura firminiana hasta lasinferencias


relativas a sus motivaciones retratadas eneltestimonio/interpretaciónpropias de la escritora, atadas a las condiciones objetivas y subjetivas de su época. Se presentantambién reflexiones acerca de los contornos temáticos de esas obras que, a pesar de ser menos conocidas, sonmuy importantes y aúnposibilitanelconocimiento de nuevos sesgos de suproducciónliteraria, desarrolladasenel contexto de ascensodel Romanticismo. Palabras clave:María Firma de los Reyes. Poesía. Cuento


Entregando livros de e sobre Maria Firmina dos Reis (Cantos à beira-mar e Gupeva de MFR e o meu livro sobre ela: MFR: uma missão de amor) na Biblioteca da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.UFRGS, que indicou como leitura obrigatória para o vestibular o romance Úrsula, de MFR.

DIA DA MULHER MARANHENSE: aniversário de nascimento de Maria Firmina dos Reis, Patrona da Academia Ludovicense de Letras INTRODUÇÃO É uma honra para os membros da Academia Ludovicense de Letras - ALL terem a sua Patrona, Maria Firmina, como símbolo da mulher Maranhense. O dia 11 de março, aniversário de nascimento dessa ilustre escritora maranhense, é instituído por Lei como o ―Dia da Mulher Maranhense": A Lei nº 3.754, de 27 de maio de 1976. O Projeto de Lei é de autoria do Deputado Celso Coutinho, elaborado em 1975 e a Lei foi sancionada pelo Governador Nunes Freire, em 27 de maio de 1976 (era do conhecimento público que o nascimento de Maria Firmina era 11 de outubro de 1825). No entanto, por meio de pesquisas recentes (ADLER, 2017) foi confirmada a data de nascimento de Maria Firmina como sendo, de fato, 11 de março de 1822. A Presidente da Academia, à época, a Profa. Dra. Dilercy Adler, pesquisadora da vida e obra de Maria Firmina dos Reis buscou atualizar a data e, para tal, solicitou ao Deputado Eduardo Braide, que gentilmente atendeu ao pleito e, por meio da Lei nº 10.763, de 29 de dezembro de 2017 sancionada pelo Governador Flavio Dino foi alterado o art. 1º que trata da atualização da data para 11 de março.


Assim, em 2017 foi a última comemoração do aniversário de Marias Firmina no dia 11 de outubro e este ano configura marco importante, no sentido de que é comemorado, pela primeira vez, o aniversário de nascimento de Maria Firmina e o Dia da Mulher Maranhense, neste 11 de março de 2018.

CONTEXTO DA CRIAÇÃO DA LEI 1975 - ANO ROSA DE JERICÓ DE MARIA FIRMINA DOS REIS: ano de verdejar O ano de 1975, foi o ano de verdejar para Maria Firmina, o marco que eu intitulei (ADLER, 2017) de o seu ―ano Rosa de Jericó‖. Essa rosa é também chamada de flor - da - ressurreição por sua impressionante capacidade de voltar à vida. As Rosas de Jericó podem ser transportadas por muitos quilômetros pelos ventos, vivendo secas, sem água, mesmo durante muito tempo e, ao encontrarem um lugar úmido, elas afundam raízes na terra e se abrem, voltando a verdejar! Vejo muita semelhança entre Maria Firmina e a Rosa-de-Jericó, senão vejamos: a Rosa de Jericó, tem aparência frágil, mas, concomitantemente, demonstra consistente defesa diante da situação adversa, neste caso, ausência total de chuvas. Nesse período, as suas folhas caem, seus ramos se contraem e se curvam para o centro, adquirindo uma forma esférica, capaz de abrigar as sementes e protegê-las da aridez dos desertos. Mesmo frágil e ressequida, ela continua como ―peregrina‖, devido à quase inexistência das suas raízes, o que facilita o seu deslocamento, e, como ―viajante incansável‖, deixa-se levar pelo vento do deserto, que tem a força de arrancá-la do solo e arrastá-la por áreas distantes. Também nesse período, ela permanece seca e fechada, aparentando estar totalmente sem vida por alguns meses. No entanto, basta algum contato com a umidade para a Rosa-de-Jericó estender suas folhas, espalhar suas sementes e retornar à vida, mostrando a sua beleza. Ainda no tocante às gotas d‘água que deram a umidade necessária para Maria Firmina retornar ao cenário literário mostrando a sua beleza, Arlete Nogueira da Cruz, no seu livro Sal e Sol (2006) apud ADLER (2014), fundamentando-se no trabalho intelectual de Janilto Andrade, A Nação das Dobras da Ficção, explicita: [...]. Não fosse José Nascimento Morais Filho, o nosso Zé Morais, este contumaz andarilho de trilhas nunca antes percorridas, Maria Firmina dos Reis não teria vindo à luz. E quando ele a trouxe (no momento em que também a trazia o escritor paraibano Horácio de Almeida), lembro bem, foram alvo de zombarias em São Luís: Zé Morais, Maria Firmina e o seu livro Úrsula; muitos considerando que era de pouca serventia aquele achado e exagerada a relevância que Zé Morais dava à sua descoberta. Pelos daqui, Maria Firmina dos Reis deveria permanecer onde se achava: no limbo. E a sua obra sob o tapete (CRUZ, 2006, p.265).

No limbo.... Sob o tapete... Expressões que retratam não apenas rejeição, mas desprezo, o que não deixa de retratar a alienação e falta de humanidade no trato com as pessoas e suas obras por aqueles que se julgam donos do saber e da verdade ADLER (2014, p.6). Mas, antagonistamente, outros maranhenses, a exemplo de Josué Montello, reconhecem a importância de Maria Firmina. Montello escreve por ocasião do sesquicentenário de nascimento de Maria Firmina dos Reis um artigo intitulado A primeira Romancista Brasileira, que publicou no Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, em 11 de novembro de 1975 e na Revista de Cultura Brasileña, Madrid, Embajada de Brasil, 1976, jun., n. 41, p. 111-114. Confesso que não resisti ao desejo de transcrever, nesta comunicação pequeno trecho da sua primorosa referência à Maria Firmina e a Nascimento de Morais Filho. No referido texto, Josué Montello nomeia outro


maranhense, Antônio de Oliveira, juntamente com Nascimento de Morais Filho, como responsáveis pela ressurreição de Maria Firmina, e, desse modo, a eles se refere: [...] o primeiro falando em voz baixa como é do seu gosto e feitio e o segundo, falando alto ruidosamente, com uma garganta privilegiada, graças à qual, sem esforço, pode fazer-se ouvir no Largo do Carmo, em São Luís, à hora em que se cruzam os automóveis, misturando a estridência das suas buzinas e de seus canos de descarga ao sussurro do vento nas árvores da praça. Desta vez, ao que parece, Nascimento Morais Filho ergueu tão alto a voz retumbante que o país inteiro o escutou, na sua pregação em favor de Maria Firmina dos Reis. Há quase dois anos, ao encontrar-me com ele na calçada do velho prédio da Faculdade de Direito, na Capital maranhense, vi-o às voltas com originais da escritora. Andava a recompor-lhe o destino recatado, revolvendo manuscritos, consultando jornais antigos, esmiuçando almanaques e catálogos como a querer imitar Ulisses, que reanimava as sombras com uma gota de sangue. E a verdade é que, no dia de hoje Maria Firmina dos Reis de pretexto a estudos e discursos, e conquista, seu pequeno espaço na história do romance brasileiro – com um nome, uma obra, e a glória de ter sido pioneira.

Assim, Nascimento de Morais Filho, como um Sankofa, pássaro africano de duas cabeças, uma cabeça voltada para o passado e outra para o futuro, que, segundo a filosofia africana, significa a volta ao passado para ressignificar o presente, dedicou-se, incansavelmente, para dar novo significado à Maria Firmina dos Reis como mulher, como professora e como escritora, dando a ela o lugar que lhe é devido na literatura maranhense e brasileira. E ainda seguindo a máxima de Morais Filho, mais pessoas, instituições, cidades e estados brasileiros têm se dedicado a estudos e homenagens a Maria Firmina dos Reis. É constatado que o trabalho de pesquisa e resgate de Maria Firmina por Morais Filho, de fato resultou em muitos outros trabalhos acadêmicos. Renan Nascimento dá destaque para a tese sobre a romancista, defendida por Charles Martin na Universidade de Nova York. Eu cataloguei várias Monografias de Graduação, Dissertações de Mestrado, Teses de Doutorado sobre algum aspecto de sua vida ou obras. O romance Úrsula encontra-se entre os objetos de estudo mais analisados. Assim, em 1975, ano do sesquicentenário de Maria Firmina, em São Luís, foi publicada a edição fac-similar do seu romance Úrsula; inaugurado o busto da escritora na Praça do Panteon, em São Luís; foi criado um carimbo em sua homenagem, uma marca filatélica produzida pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos; na Assembleia Legislativa do Estado foi instituído o dia 11 de outubro, como Dia da Mulher Maranhense. Também foi criada em sua homenagem a Medalha de Honra ao Mérito, pela Prefeitura Municipal de São Luís. Em Guimarães, também o ano de 1975 foi o marco do início de maiores homenagens a ela dedicada. Além do desfile em sua homenagem naquele ano, o Centro de Ensino Nossa Senhora da Assunção, desde o ano de 2007, passou a promover a Semana Literária Maria Firmina dos Reis. Também o dia do seu aniversário foi instituído feriado Municipal e comemorado o ―Dia da Mulher Vimarense‖. No ano, próximo passado, 2017, foi inaugurada, pelo Governo do Estado do Maranhão e Prefeitura de São Luís, uma praça com o seu nome e ela foi escolhida para Patronear a Feira do Livro de São Luís- FeliS, deste ano, em sua 11ª edição, de 10 a 19 de novembro, que resultou numa grande repercussão local, nacional e internacional.


A Academia Ludovicense de Letras-ALL desde 2013, ano de sua fundação, incorporou-se a esse projeto de consolidar a ressignificação dessa incontestável precursora da cultura e educação maranhense/brasileira, colocando-a como Patrona da Academia, tendo consciência também de que há muito ainda por fazer e para conhecer Maria Firmina dos Reis, fortalecendo esse trabalho que denomino de Missão de amor. Em 2015, em comemoração ao seu aniversário de 190 anos, foram organizadas, por Dilercy Adler e Leopoldo Gil Dulcio Vaz duas antologias em sua homenagem: Cento e Noventa Poemas para Maria Firmina dos Reis e Sobre Maria Firmina dos Reis. A ALL busca ocupar todos os espaços culturais locais, nacionais e internacionais, objetivando desenvolver e difundir a cultura e a literatura ludovicense, a defesa das tradições do Maranhão e, particularmente, de São Luís, também levando o nome de Maria Firmina dos Reis como missão precípua. REFERÊNCIAS ADLER, Dilercy Aragão. ELOGIO à PATRONA MARIA FIRMINA DOS REIS: ontem, uma maranhense, hoje, uma missão de amor. São Luís: Academia Ludovicense de Letras, 2014. _____________. MARIA FIRMINA DOS REIS, uma missão de amor. São Luís: Academia Ludovicense de Letras, 2017. ADLER, Dilercy Aragão e VAZ, Leopoldo Gil Dulcio (Organizadores). CENTO E NOVENTA POEMAS PARA MARIA FIRMINA DOS REIS. São Luís: ALL, 2015. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, Josué Montrello. 1975, 11 de novembro. Revista de Cultura Brasileña, Madrid, Embajada de Brasil, Josué Montello 1976, jun., n. 41, p. 111-114. VAZ, Leopoldo Gil Dulcio e ADLER, Dilercy Aragão (Organizadores). SOBRE MARIA FIRMINA DOS REIS. São Luís: ALL, 2015.


O LIVRO ANEXO (SESSÃO LITERATURA LUDOVICENSE) E UM POEMA QUE EU FIZ EM RESPOSTA AO POEMA DA CURVA OSCAR NIEMEYER E MAIS ALGUNS POEMAS ABAIXO. ESPERO QUE EU NÃO TENHA EXAGERADO POEMA DA CURVA Oscar Niemeyer Não é o ângulo reto que me atrai, nem a linha reta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual, a curva que encontro nas montanhas do meu país, no curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher preferida. De curvas é feito todo o universo, o universo curvo de Einstein. (Niemeyer, Oscar, 2000, As Curvas do Tempo: as memórias de Oscar Niemeyer. Londres: Phaidon, ps. 169 e 70) fonte: Wikipedia Veja em vídeo no Youtube. Quando ouvi pela primeira vez Poema da Curva de Niemeyer fique encantada e fiz o poema LINHA RETA em homenagem a ele. LINHA RETA ( a Niemeyer) Eu admiro a linha reta ao pé da montanha por sobre o planalto também na asa delta em linha obliquamente ereta durante o seu vôo... eu me embeveço com as retas das longas estradas que também serpenteiam arrastando sonhos levando saudades deixando a esperança de rever breve breve o ser amado... eu mergulho irresponsavelmente


na linha reta do horizonte entre o mar e o céu entre o negro e o azul entre a vida e a morte entre o ódio e o amor do teu dicionário... eu me completo e me perco na linha reta do homem amado mas celebro minhas curvas que se entregam às retas complementando a mais bela figura geométrica!! Dilercy Adler In:DESABAFOS, FLORES DE PLÁSTICO, LIBIDOS E LICORES LIQUIDIFICADOS, 2008. POEMA Dilercy Adler No frio e pálido papel eu me debruço debulho irrefutavelmente tantos prantos quanto me custa! degusto lenta e prazerosamente todos os sabores que me devassam e afloram corpo e mente quantos licores! E o papel se enche transborda vida!!!

SALTO ALTO Dilercy Adler Sensualidade magnetismo fetiche erotismo... lá vai ela rua abaixo num ritmo compassado combinação poderosa sexo e salto salto alto!... lá vai ela rua abaixo exibe auto - estima alta simplesmente num salto salto alto de mulher que ri


que chora que se entrega que se desespera mas espera... e como sabe esperar!!! lá vai ela rua abaixo exageradamente sensual num magnetismo fetichizado eroticamente incrustado no seu salto alto salto alto de mulher mulher poderosa linda invensível libidinosa que se dá sem nenhum pudor só luxo luxúria mas acima de tudo incondicionalmente muito amor!... todo amor! só amor!!

SEDUÇÃO Dilercy Adler Sapato alto vermelho preto azul turquesa quanta beleza! sapato alto pés pequenos pernas torneadas quadris a balançar languidamente no ritmo do seu caminhar! bela cena de Eva a Maria Madalena que não merece censura ou outra pena qualquer é de fato uma bênção feminina feminíssima bênção à mulher... Sapato alto


vermelho preto azul turquesa quanta beleza! sucessão de sutilezas sutilezas de sedução só para chegar avassaladoramente ao coração masculino ao coração de todo e qualquer Adão!

LIBERTAÇÃO Dilercy Adler Aprisiono o verbo devoro a “carne” –pecado humanocerne do desejo tresloucado do fruto proibido insaciavelmente insano!... aprisiono a dor em amargas palavras algemadas –cárcere privadoesvaziada da linguagem erótica ... recrio liturgias procissões santos e rezas que se pretendem assépticos e no entanto mostram-se contagiam com os seus próprios venenos exoticamente tóxicos! aprisiono o amor no papel A4 que jaz na impressora do meu computador e digito tácita e indolentemente cada letra cada sílaba cada sentença


cada cicatriz intensa da vida que se expõe e ao se mostrar completamente nua sem qualquer reserva se ergue se levanta alça vôo ...se liberta... e me liberta também!!! PSICANALITICAMENTE FALANDO... Dilercy Adler Sob a máscara mal posta reconheço o que de fato preferia não rever! no fecho do ensaio domesticado esticado amenizo o dogmatismo estreito das razões da psique e do destino de todos os meus amores licores e libidos derramados sobre o frio asfalto da cidade freneticamente deserta de desejos de qualquer espécie! sob a máscara mal posta reconheço ...me reconheço... quando o que de fato preferia o que queria o que quero é mesmo não me ver! tudo isso hoje parece demasiadamente simples!...


JOÃO BATISTA ERICEIRA



REVISTA DO LEO REVISTA ELETRONICA EDITADA POR LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Prefixo Editorial 917536

NÚMERO ESPECIAL A FACULDADE DE DIREITO DO/NO MARANHÃO NO SEU CENTENÁRIO: 1918/2018 SÃO LUIS – MARANHÃO – MARÇO DE 2018 PARTE III OUTRAS MEMÓRIAS... JOÃO BATISTA ERICEIRA O CENTENÁRIO DA FACULDADE DE DIREITO

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O CENTENÁRIO DA FACULDADE DE DIREITO JOÃO BATISTA ERICEIRA Professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

A Faculdade de Direito do Maranhão completa cem anos de criação dia 28 de abril do ano corrente, computando-se o tempo da sua sucessora, a Faculdade de Direito de São Luís, posteriormente incorporada a Universidade Federal, em 1966, como Departamento Acadêmico. A efeméride reveste-se de elevado significado por testemunhar a materialização, ao longo de dez décadas, de projeto de capital importância para a política e a cultura do Estado. Associam-se às comemorações entidades representativas de nossa sociedade: os Conselhos Federal e Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil; o Tribunal de Justiça do Maranhão; a Universidade Federal do Maranhão; a Academia Maranhense de Letras; o Centro de Estudos Constitucionais e de Gestão Pública; a Universidade Estadual do Maranhão; a Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão; o Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão-IEMA, o Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão; a Escola de Formação de Governantes; o Centro Ignácio Rangel, a Academia Maranhense de Letras Jurídicas. Esta última instituição completará cento e dez anos. Criada em 1908, fruto do idealismo do mesmo grupo que concebeu a Faculdade de Direito e a Seccional da Ordem dos Advogados em 1932. Quando me indagam sobre o traço fundamental da Faculdade de Direito, não reluto em responder: o compromisso maior, desde a gênese é, além da realização da justiça, com as letras, a prosa, a poesia, as artes. E nada mais natural, pois o Direito é, por excelência, um produto cultural. Argamassado na velha


Roma passou pela península Ibérica até aportar na nossa São Luís. Na manhã de 28 de abril de 1918, segundo a ata lavrada por Domingos Perdigão, por iniciativa de Alfredo Assis Castro, Antônio Lopes da Cunha, José de Almeida Nunes e Manoel Fran Paxeco, e dele próprio, resolveu fundar-se a Faculdade de Direito. O ato foi presidido por Henrique de Couto, Secretário de Interior do Estado, que depois veio a dirigi-la de 1922 a 1934, dela afastando-se para exercer o mandato de deputado federal pelo Maranhão. Antes, exerceu vários cargos da Magistratura. Consta da ata que a iniciativa foi de Domingos Castro Perdigão, pai de Fernando Perdigão, que depois seria seu diretor. Ele recebeu merecida homenagem, por sugestão minha, o Fórum Universitário, em 1996, recebeu o seu nome. Na primeira atividade do Fórum, convidei para a palestra inaugural o escritor Josué Montello, amigo pessoal de Fernando Perdigão, que na ocasião contou vários casos ligados a vida do jurista. Cumpre reiterar, na ata fundacional da Faculdade há a preocupação com ―o renome de Atenas‖, o nome e a tradição que o Maranhão já conquistara no cenário brasileiro. A Faculdade de Direito do Maranhão nasceu, portanto, sob o signo do projeto ateniense. O vezo acadêmico está na sua semente, como consta do discurso em memória de Viana Vaz, o primeiro diretor, proferido pelo sucessor Henrique Couto, na noite de 6 de fevereiro de 1922. Verbis: ―quando um grupo de intelectuais, rompendo a apatia do meio, e suplantando o desdém de muitos, cogitou de fundar a Academia de Direito do Maranhão, foi logo apontando o nome do Dr. Vaz para diretor, como uma das condições de viabilizar o tentamen‖. O projeto fora encampado pelo Governo do Estado, e em seguida aprovado pelo Conselho de Ensino Superior em 1924. Os seus dirigentes integravam a liderança política e cultural do Estado. Suas colações de grau realizavam-se na Assembléia Legislativa, e tinham enorme repercussão, tal como o evento comemorativo da fundação dos cursos jurídicos no Brasil, celebrado com o cinqüentenário da vida literária de Ruy Barbosa. A solenidade ocorrida no Teatro São Luís (hoje, Arthur Azevedo), com a participação da Academia Maranhense de Letras, contou com o brilho oratório de Clodomir Cardoso, representando o corpo docente; de Alfredo de Assis, pela Academia; e do poeta Inácio Xavier de Carvalho, recitando ode de sua autoria sobre as festividades. O prédio da Rua do Sol, adquirido em 1923 dos herdeiros do poeta Inácio Xavier de Carvalho, com recursos da Associação Comercial e do Governo do Estado, depois seria identificado fisicamente com a História da Faculdade de Direito do Maranhão, que este ano celebraremos, desenvolvendo múltiplas atividades como: seminários, mostras fotográficas, outorga de medalhas, publicação de livros. A Seccional da OAB, por seu presidente Thiago Diaz, tem se empenhado na realização desse objetivo, afinal, muitos dos seus presidentes, só para lembrar alguns, foram professores, alunos, e diretores da Faculdade de Direito: João Hermógenes Matos, Newton Belo, Antenor Bogéa, José Ribamar Cunha Oliveira. O ano é curto para os preitos de gratidão que nós maranhenses tributaremos aos nossos maiores, que nos legaram tão caras tradições, muitas delas na área do Direito.


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O IMPARCIAL – 1º MAIO 2018


A SALAMANCA DA RUA DO SOL JOÃO BATISTA ERICEIRA Professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados Uma torrente de emoções positivas espalhou-se no auditório da Associação Comercial na noite do dia 28 de abril, na sessão de encerramento dos eventos comemorativos do Centenário da Faculdade de Direito do Maranhão. Ali, fechou-se o Seminário com dois painéis, um examinando o Centenário como projeto cultural cívico, jurídico, e de grande dimensão política, com as intervenções de José Rossini Campos do Couto Corrêa, Sérgio Victor Tamer, Dimas Salustiano da Silva, sob a coordenação do Conselheiro Seccional da OAB Roberto Gomes. O segundo painel abordou a política, o constitucionalismo e o espirito republicano, desenvolvido por Tiago Pádua, Renato Zerbini, Raquel Tiveron e Roberto Veloso, sob a coordenação de mesa de Thiago Diaz, Presidente da Seccional maranhense da OAB. Era o prosseguimento da programação aberta dia 25, com a exposição fotográfica, no vestíbulo do prédio da Seccional, contando a história da fundação, dos seus idealizadores, dos primeiros professores, movidos pela vontade de dotar o Maranhão de uma Escola de Direito. Os líderes, Domingos Perdigão e Fran Paxeco, receberam o nome das medalhas. A primeira outorgada pela Universidade Federal do Maranhão, a segunda pela Seccional da OAB do Maranhão. Convém assinalar que a Exposição se deveu ao empenho do professor Leopoldo Gil Dulcio Vaz, do padre João Dias Rezende Filho, e do Curador, Desembargador Cleones de Carvalho Cunha. O primeiro ato revestiu-se de elevado significado simbólico. A certificação da primeira turma de advogados especialistas em processo civil, expressou o compromisso da Escola Superior de Advocacia com a capacitação dos advogados do nosso Estado, Em seguida, o Diretor Tesoureiro do Conselho Federal, Antônio Oneildo Ferreira, proferiu a magna conferência sobre a ―Natureza Contramarjoritária da Advocacia‖, lançando livro sob o mesmo título. Dia 26, os trabalhos foram reiniciados com a notável conferência sobre a participação dos juristas no mundo literário, especialmente na Academia Brasileira de Letras, a cargo do advogado Fábio de Sousa Coutinho, o biógrafo de Lúcia Miguel Pereira, autora da melhor biografia do poeta Antônio Gonçalves Dias. Posteriormente, deu-se a exposição da professora Ana Paula Rocha Bonfim, sob a coordenação do professor José Rossini Campos do Couto Corrêa, examinando questões atuais sobre o ensino jurídico e sua relação com a advocacia. No dia 20, pela manhã, o Tribunal de Justiça realizou sessão solene em homenagem ao Centenário, à noite, o Instituto Histórico e Geográfico adotou semelhante procedimento. Dia 25 às 11 horas, por proposição do deputado Bira do Pindaré, a Assembleia Legislativa do Estado, também prestou o mesmo preito, assim como a Academia Maranhense de Letras. Várias instituições associaram-se para a elaboração da programação integrada, destacando-se a Ordem dos Advogados do Brasil; as universidades, federal e estadual; o Instituto de Educação Ciência e Tecnologia do Estado do Maranhão; a Academia Maranhense de Letras Jurídicas; o Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão e o CECGP. Dia 27, a Universidade Federal do Maranhão, sob a presidência da Reitora Nair Portela Coutinho, realizou a sessão no Teatro Artur Azevedo para a concessão da medalha Domingos Perdigão a docentes, discentes e funcionários administrativos. Grandes emoções estavam reservadas para a noite do dia 28 na Associação Comercial do Maranhão, com a entrega de diploma de mérito a Felipe Musssalém, seu presidente, pelo histórico papel desempenhado pela instituição, na criação e aquisição do prédio da Faculdade. Os professores, conselheiros da OAB, acadêmicos também foram contemplados com a honraria do mérito. Momento culminante deu-se com a outorga a neta de Fran Paxeco, Rosa Pacheco Machado, a medalha que leva o nome do seu avô, e a Domingos Aguirre Perdigão, neto de Domingos Perdigão, para receber a mesma comenda. Prova inequívoca que as boas obras alcançam a quem as pratica, aos seus descendentes, e a toda a


comunidade. Receberam a mesma comenda, Antônio Oneildo Ferreira, José Rossini Campos do Couto Corrêa, Thiago Diaz, Nair Portela Coutinho, e o signatário deste texto. Destacou-se também o lançamento do ―Livro do Centenário‖ organizado por Rossini Corrêa e Antônio Oneildo Ferreira. Integrado por contribuições de personalidades do Maranhão e do Brasil, incorpora textos relevantes para as ciências política e jurídica. O Diretor-Secretário da Academia Maranhense de Letras Jurídicas, Sergio Victor Tamer, fez também o lançamento da Revista da Academia alusiva ao Centenário e dos livros ―Temas Constitucionais‖ e ―Discursos Solenes‖, estes aditados pelo CECGP. Outras publicações foram anunciadas, destacando-se o livro da acadêmica Ana Luiza Almeida Ferro, intitulado ―Justiça em Kelsen e Direito em Luhmann‖, que mereceu a minha apresentação. Presente, o jurista e historiador Sálvio Dino, autor do livro ―A Faculdade de Direito do Maranhão (!9181941) ―, em que relata a sua importância para a cultura política e jurídica do nosso Estado, reivindicou o seu resgate, como patrimônio de nossa sociedade. No uso da tribuna, utilizando-se de retórica que o destacou no Tribunal do Júri, clamou pelo retorno da Velha Salamanca da Rua do Sol. Foram muitas as emoções.


CLEONES CUNHA


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POSSE NA ALL





APRESENTANTE: OSMAR GOMES DOS SANTOS CADEIRA N.º 14 PATRONO: ALUÍSIO TANCREDO GONÇALVES DE AZEVEDO APRESENTADO: CLEONES CARVALHO CUNHA CADEIRA N.º 07 PATRONO: ANTÔNIO GONÇALVES DIAS DATA: 11 DE JUNHO DE 2018 Ilustríssimo senhor Antônio José Noberto da Silva, digníssimo Presidente da Academia Ludovicense de Letras. Excelentíssimo senhor Desembargador José Joaquim Figueiredo dos Anjos, MD. Presidente do Tribunal de Justiça do Maranhão. Excelentíssimo senhor Dr. Carlos Brandão , Vice-Governador do Estado do Maranhão. Nas pessoas de quem saúdo todos os integrantes da mesa. Ilustres Acadêmicos, confreiras e confrades, autoridades presentes, familiares e convidados do homenageado. Estar nesta tribuna, em nome da nossa Academia Ludovicense de Letras, é uma honra muito grande, mas também um enorme desafio. Uma honra, porque muitas razões nos encorajam a estar aqui e por reconhecer a grandeza e importância deste sodalício para a cultura das letras em nossa Atenas Brasileira – querida São Luís, capital do Estado do Maranhão. Um desafio, porque as palavras têm limites muitas vezes aquém das pessoas sobre as quais a letra fala. Mas olhando a trajetória da ALL até aqui, em seus cinco anos de existência e semeadura, é preciso reconhecer, que esta tribuna, hoje, tem um sabor especial de boa colheita. A Academia Ludovicense de Letras está em festa. A chegada do Confrade Cleones Carvalho Cunha ao nosso meio – a quem desde já agradeço pela escolha de meu nome para recepcioná-lo – nos alegra e engrandece esta respeitada instituição. Esta noite, em especial, somos acalentados, mais uma vez, com a certeza de que estamos na direção de nossos propósitos e de que avançamos mais um passo neste sentido, pois esse sonho sonhado junto, pouco a pouco vai se transformando numa doce realidade. Cumpre-nos agora trazer para todos os presentes e para a honra e glória do nosso senhor Jesus Cristo, o confrade Cleones Carvalho Cunha, a quem tenho a honra e orgulho de apresentá-lo. Eis que no idos da década de 50, mais precisamente aos 10 de fevereiro de 1958, nasceu o primogênito do casal Astolfo Seabra e Maria Helena, que logo o batizaram com o nome de Cleones Carvalho Cunha. Quando ainda bem jovem, aos nove (9) anos de idade, os devaneios da vida o fez órfão de pai após um trágico acidente. Sua irmã mais nova, Stela, contava com apenas trinta e dois dias de nascimento. Era o destino. Que já naquela tenra idade rascunhava os desafios que estavam a ser enfrentados pelo pequeno Cleones. Como mais velho, recaiu sobre si a responsabilidade de ser uma referência para os seus quatro irmãos, Salete, Cleomar Tema, Kleber e Stela.


Mesmo com as dificuldades próprias da vida, Dona Maria Helena, administrando um pequeno comércio no lugarejo onde moravam teve as condições necessárias, por meio do apoio divino, para criar, sustentar e educar os seus filhos. O início da formação educacional do nosso confrade Cleones, se deu em um lugarejo de Tuntum, hoje já emancipado como Município de Santa Filomena. E tudo começou em uma capela coberta de palha, onde recebeu o carinho e orientação de sua primeira professora, sua Tia-Avó Lurdes Mourão, que logo nos primeiros dias, despertou naquele menino a vontade de conhecer o mundo exterior. Logo em seguida, Cleones deu início a sua formação religiosa, desta vez, na Cidade de Balsas, seguindo posteriormente para a cidade de Arari, na baixada ocidental maranhense, na companhia do Padre Clodomir, a quem foi apresentado pelo Frei Dionísio. Em seu crescimento religioso, o confrade Cleones seguiu para Fortaleza, passando um período em um seminário, de onde retornou no ano de 1974, desta vez para a cidade de São Luís. Nesta cidade, continuou seus estudos e logo depois prestou exame vestibular, sendo aprovado no Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão, início de sua maiores conquistas. Para ajudar na sua formação intelectual e nas despesas a que tinha necessidade, Cleones passou a exercer as atividades de professor no tradicional Colégio Santa Tereza. Também foi Sub-diretor-geral da Secretaria do Tribunal de Justiça do Maranhão e Diretor da Corregedoria Geral. Prosseguindo em sua caminhada glorificada de êxitos pela materialização de seus sonhos, foi posteriormente aprovado em primeiro lugar em concurso do Ministério Público do Maranhão, tendo exercido o seu mister na Comarca de Pindaré Mirim. Sempre perseverante, em 1985, Cleones foi aprovado em concurso público para docência superior na Universidade Federal do maranhão e num ato seguinte, em 1986, aprovado para o cargo de Juiz de Direito do Poder Judiciário maranhense, onde exerceu suas atividades em primeira entrância, nas comarcas de Vitorino Freire, São Bento, Coroatá e São Luís. Como magistrado da Comarca da Capital, exerceu as funções administrativas de Assessor da Presidência do Tribunal de Justiça, Corregedor Regional Eleitoral e Juiz Auxiliar da Corregedoria Geral da Justiça do Maranhão. Tal como o destino, e porque não dizer o Criador, havia rascunhado, em 10 de novembro de 1999, Cleones foi promovido por merecimento ao cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça do nosso Estado. Naquela casa foi Corregedor-Geral da Justiça, Corregedor-regional da Região Nordeste a serviço da Corregedoria Nacional de Justiça e também o seu presidente, cujo mandato, diga-se, coroado por uma gestão profícua e empreendedora. No campo acadêmico, Cleones é mestre em Direito Canônico pela Universidade Gregoriana do Rio de Janeiro e Bacharel em Teologia, pelo Instituto de Estudos Superiores do Maranhão/ Faculdade Católica do Maranhão. Foi Diretor da Escola Superior da magistratura do Maranhão por quatro anos. É membro da Sociedade Brasileira de Canonistas, da Academia maranhense de Letras Jurídicas e do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão. Com sua técnica e seu estilo, sua competência aguçada, como forma de compartilhar seus conhecimentos adquiridos, Cleones é autor das obras ―O Poder Judiciário do Maranhão – Subsídios para a História do Recrutamento de Juízes e da Organização Judiciária‖, lançado em 2002; ―Concurso da Magistratura Maranhense, provas de 1993, 1996, 1998 e 2002‖; ―Efeitos Civis do Casamento Religioso no Brasil‖; ―Código de Divisão e Organização Judiciária do Maranhão‖, que se tornou desde a sua primeira edição, em 2004, um marco para a Magistratura do Maranhão, sendo referência para estudantes e todos os operadores de Direito. Cleones é nascido na cidade de Tuntum, mas a sua trajetória profissional o fez ser merecedor dos títulos de cidadania dos Municípios de Coelho Neto, Santa Filomena, Presidente Dutra, Barra do Corda, Balsas e São Luís. Este último por Projeto de Decreto Legislativo de autoria do atual vice-presidente e Presidente eleito da Câmara Municipal de São Luís, vereador Osmar Filho.


Tudo isso, meu confrade Cleones, só foi possível pela fé que devotas em nosso senhor Jesus Cristo, pelo carinho, pelo apoio e companheirismo de sua amada Olinda, a quem rendo também todas as homenagens desta noite, e por todos de sua família a quem sempre demonstrou respeito e total atenção. Lembrando neste ato de seus doze sobrinhos: Patrícia, Marcos, Carlos, Maurício, Thalita, Rafael, Alexandre, Júlia, Felipe, Juliana, Gabriel e Carlos Augusto e, de forma toda especial, daqueles que igualmente amados estão mais próximos, como seu sobrinho-neto, Vinícius e as mais novas integrantes da família e sempre lembradas em suas palavras, Alice e Maitê. Para encerrar, como uma fervorosa louvação a Deus e parafraseando Noélio Duarte: ―Entre todos os valores Cultivados entre nós Há algo como uma voz Muito enfática a dizer: ―Cultive a educação, faça lazer, haja afeição; dê carinho, tudo aos seus Mas o maior valor Maior até que o amor é cultivar a Deus‖. Seja bem vindo confrade Cleones Carvalho Cunha, à Casa de Maria Firmina dos Reis, todos nós lhe recebemos de braços abertos. Muito obrigado.


ELOGIO AO PATRONO “Bendita a hora em que nasce um gênio, aqui, ali, além, que importa se for luz benéfica que esclareça e guie a humanidade? A esse outorga Deus parte dos seus atributos, e ordena-lhe que trabalhe e produza, e o mundo dá mais um passo para dentro do estado de progresso e da perfeição humana, impelido por essa nova força. [...] Admiro e venero a todos esses verdadeiros eleitos dos céus; mas tenho particular predileção pelo poeta. Para contemplarem-se os primores da arte plástica é força transportarmo-nos aos lugares onde são conservados, enquanto que a poesia, como a natureza, onde quer que estejamos nos dá a beber a ambrosia que em suas taças de ouro nos oferece, encantando-nos com as doces harmonias que nos embriagam o espírito. Na cabeceira do nosso leito de dor ou de prazer; no ermo dos desertos, na monotonia dos mares sem fim, na confusão das cidades, na hora do recolhimento, da aflição ou do desalento, encontramos à mão nosso livro predileto de versos que nos transmite ao espírito doces e inefáveis êxtases que nos fazem esquecer por momentos o mundo com seus enganos e atribulações‖92. Com esta oração de Antônio Henriques Leal da obra ―Vida de Gonçalves Dias‖, saúdo o Sr. Presidente da Academia Ludovicense de Letras, Dr. Antônio Noberto, aos confrades e confreiras da Casa de Maria Firmina dos Reis, e SAUDAÇÕES Senhoras, Senhores Bendita, pois, a hora em que nasceram Newton, Voltaire, Miquel‘Angelo, Rafhael, Ticiano, Shakspeare, Homero, Dante, Ariosto, Camões, Goethe, Victor Hugo, Lamartine, Fernando Pessoa, São Francisco de Assis (autor do "Cântico das Criaturas" - primeira poesia escrita em língua italiana, entre os anos de 1225 e 1226)93, São José de Anchieta (autor de "De Beata Virgine Dei Matre Maria", escrito na areia em 1563)94, Tomás de Aquino e Agostinho de Hipona, Miguel de Cervantes, Machado de Assis, Thomas Moro, Artur 92 LEAL, Antonio Henriques. Pantheon Maranhense: Ensaios bibliográphicos dos maranhenses illustres já falecidos. T. 3. Lisboa: Imprensa Nacional, 1874. p. 3-4. 93 in http://franciscanos.org.br/?page_id=3124 94 in http://santuariodeanchieta.com/artigo/linha-do-tempo.html


Azevedo, São João da Cruz, Pablo Neruda, Josué Montello! Bendita a hora em que nasceu Antônio Gonçalves Dias! Bendito também o Maranhão, sua terra natal! O Criador, com certeza, dotou esses homens de um poder maior, de grande magia criadora, capazes que foram de inebriar o espírito de gerações e gerações; de extasiar povos e nações; de embriagar almas de todas as raças, de alterar costumes, de enlevar criaturas com suas criações. Teria o Artista Divino cedido parte de sua divindade a esses escolhidos? A eles frágeis homens, de cuja natureza complexa, que mistura corpo e alma, mente e espírito, todos vis mortais como os mais obtusos humanos vivos? Por que os olhos dos vates veem mais que enxergamos? Por que suas mãos dominam as pedras mais brutas e frias? Por que do bico de suas penas brotam poemas e textos mágicos, os quais com sua beleza, harmonia e profundidade provocam catarse por séculos e séculos? A eles, tão humanos quanto somos, sujeitos às dores, às angústias, às labutas diárias, para ao final descerem à sepultura, ao alimento dos vermes ou dos peixes do mar bravio? O que povoa/povoava os sonhos desses mortais, para com tanto denodo e ousadia imitarem Aquele que vestiu os lírios dos campos das mais belas túnicas ainda que não fiassem? Com que rebeldia puderam tão brilhantes espíritos apoderarem-se de todo o esplendor, de toda a glória e encanto da criação, ao mesmo tempo dos suspiros, das dores, dos dilemas, dos sentimentos, da finitude do homem de ontem e de hoje? Eu não tenho as respostas. Quem as tiver, responda! Quis a sorte, honrosa sorte, que eu viesse hoje, aqui, neste momento, ocupar a cadeira patroneada por Antônio Gonçalves Dias, de cuja obra, devo confessar, eu somente conhecia os famosos Y-Juca-Pirama, o Canto do Piaga e Canção do Exílio, apesar de bastante representativo, um ínfimo, ante a grandiosidade da obra cantada / admirada / respeitada / enaltecida / louvada / proclamada / exaltada por Manoel Bandeira, Josué Montello, Machado de Assis, Antônio Henriques Leal e tantos outros. Quis a sorte, repito, que eu pudesse sorver agora na maturidade dos anos, com mais intimidade, o universo fantástico do conhecimento, das ideias, da ciência, da exaltação, da brasilidade, do indianismo, da paixão, emanadas da pena mágica do poeta que mais orgulha o Maranhão e o Brasil. É a Literatura a arte de Gonçalves Dias. Da Literatura, tem-se que é a arte verbal, cujo cinzel é a palavra, não a simples palavra, mas a palavra com conotação estética, vestida de funções, centrada na mensagem, com valor semântico e formal. É a linguagem plural ou ―obra aberta‖, como define Umberto Eco95, razão por que está intrincada às dimensões sociocultural, histórica e estética, nas quais se interpreta o mundo, o mundo do artista. Daí a dificuldade e a complexidade que encontrou este ora empossando da Academia Ludovicense de Letras para a louvação deste momento solene. Trabalhar apenas um texto da obra do poeta, com o esmero que essa dileta plateia merece? Certamente que a obra tem primazia sobre o autor, mas no caso específico de Gonçalves Dias, a vida do artista é de tal monta intrincada à sua obra, além naturalmente do fascínio e intimidade do cenário de suas vida e obra (O Maranhão e o Brasil), desculpem, pois, o emaranhado, embaraçado, entrelaçado, misturado de vida e obra de Gonçalves Dias, que lhes farei ouvir. Alberico Carneiro, no não prefácio do seu ―Ilha do Amor‖: ‖Gonçalves Dias e Ana Amélia‖, em texto metalinguístico, descontinuado, abarrotado de repetições ou reiterações, satírico e erótico, sem contemplar qualquer gênero da Literatura, como reconhece e declara o próprio autor, sobre o poeta de Caxias, opina: ...‖foi em vida tão inverossímil, é, paradoxalmente, verossímil‖. E mais, diz Alberico: Gonçalves Dias foi um Ulisses, que teve uma Penélope real, de sorte que seu melhor poema é a pulsação de sua própria vida‖96. Não ouso fazer crítica literária da obra de Gonçalves Dias, o autêntico propulsor da poesia americana. Nem poderia, por faltar-me gabarito que se aproxime ao de dezenas de analistas do mais alto nível, do Brasil, de Portugal e alhures. O poeta que foi, inclusive a alma, o mentor daquele grupo ilustre de maranhenses seus contemporâneos que deram a São Luís o cognome de Athenas Brasileira97, mais uma razão para desistência de tão pretensiosa aventura, a alguém que conhece suas próprias limitações. A mim, operário do Direito, juiz de ofício e de vocação, menino nascido no então povoado de Santa Filomena, do recém-criado Município de 95 ECO, Umberto. Obra aberta: Forma e indeterminação nas poéticas contemporâneas. 9. Ed. São Paulo: Perspectiva, 2003, p. 120. 96 CARNEIRO, Alberico. Ilha do Amor: Gonçalves Dias & Ana Amélias (sátira), São Luís: EDUFMA, 2013, p. 9. 97 FERRO, Ana Luiza Almeida. Mário Meirelles: historiador e poeta. Homenagem ao centenário de nascimento do patrono da Cadeira nº 31 da ALL: com textos inéditos. Curitiba: Juruá, 2015, p. 102.


Tuntum, lembrando, como costumo, que ali, pequena vila de uma única rua, sem água, sem energia elétrica, havia uma capela de palha, e um grande tesouro, a única professora, minha tia-avó, Lourdes Mourão, que me ensinou a sonhar, a pensar grande, daí por que, como os poetas, tive uma vontade imensa de colher estrelas. Hoje, neste momento, colho mais uma. Limito-me, destarte, a conclamar o êxtase, o enlevo, o fascínio ao emblemático poeta maranhense, que com sua arte sublime de tamanha magnitude, fez despertar neste humilde homem e servo da Justiça. Eis por que, também por isso, serei grato por toda a vida aos confrades e confreiras que hoje, no outono da minha existência, me permitiram provar/debruçar-me na fascinante arte da literatura e da vida gonçalvina. Acompanhemos, pois, a Antônio Gonçalves Dias, como bem diz o Doutor Henriques Leal: ... desde o berço até a sepultura, que acharemos em muitos dos seus versos o verdadeiro reflexo dos seus sentimentos, o cunho de sua individualidade dupla. Poeta objectivo e subjectivo inspira-se e canta, ora a natureza explendida e luxuosa do Brasil, porque as primeiras impressões que recebeu ao abrir os olhos à luz foram o aspecto das nossas brenhas com a sua solidão magestosa, imponente e sublime; ora suas próprias dores que o atormentavam, lhe despedaçavam o coração e perturbavam o espírito, vindo a desgraça por tantas vezes amargurar-lhe seus mais brilhantes triunfos e ridentes jubilos98. Senhoras e Senhores, Foi Gonçalves Dias, para a história das letras brasileiras, o maior legado, o maior poeta lírico, romântico, o nosso Werter, julga a mais percuciente crítica. ―Poeta nacional por excelência: ninguém lhe disputa na opulência da imaginação, no fino lavor dos versos, no conhecimento da natureza brasileira e dos seus costumes selvagens‖, são palavras de ninguém menos que Machado de Assis, o bruxo do Cosme Velho, epíteto daquele que, por sua obra, foi e é um dos maiores gênios literários nacionais de todos os tempos. Falando em nome da Academia Brasileira de Letras, por ocasião da inauguração do busto de Gonçalves Dias no Passeio Público do Rio de Janeiro, profetizou Machado: ―Canção do Exílio ensinara a Portugal nova lição da Língua de Camões.‖ E ―I Juca Pirama‖ seria ouvida enquanto existisse a língua que falamos, a língua dos nossos destinos‖99. Exaltar Gonçalves Dias? Entendê-lo? Biografá-lo? Não se afoita este ora acadêmico das letras ludovicenses, tamanha a complexidade da vida e obra do gênio nascido em terras caxienses, de origem mestiça, que como nos versos do próprio poeta: Cresceu; - qual cresce a planta em terra inculta Que ninguém educou; - a chuva apenas. [...] A infância leve, d'inocência rica. Viu belo o ar, e terra, e céus, e mares, Viu bela a natureza, como a noiva Sorrindo em breve dia de noivado! Então sentiu brotarem na sua alma Sonhos de puro amor, sonhos de glória; Sentiu no peito um mundo de esperanças, Sentiu a força em si - patente o mundo100. Veio ao mundo o primeiro grande poeta brasileiro no Sítio Boa Vista, Caxias, filho natural do comerciante português, João Manuel Gonçalves Dias, e da brasileira, Vicência Mendes Ferreira, concubina mestiça (índia/negra) ―de cor acobreada‖, a que não servia para casar. O ano era 1823. O dia, 10 de agosto. O Brasil, terra recém-independente, ainda que tal Independência tenha partido do Imperador Português (1822), 98 99 100

LEAL, Antonio Henriques. Ob, cit., p. 5. DE ASSIS, Machado. Relíquias da casa velha. São Paulo: Globo, 1997 p. 117-118 Miserrimus (Primeiros Cantos), 1846.


motivada pelos mais controversos propósitos. Apesar de solteiro, o lusitano que homiziara Vicência, ao resolver casar-se, elegeu jovem da sociedade local, a senhora Adelaide Ramos Almeida. Não olvidou João Manuel, apesar de inculto, da educação do filho, que a cada dia mostrava-se mais e mais vivo, travesso, inteligente, hábil, sedento de conhecimento. Demonstrou bem cedo o gosto pela leitura, a facilidade para a aprendizagem de línguas. Ainda em Caxias, estudou latim e francês. Aos 15 anos, após a morte do pai, segue para Portugal, iria cumprir o seu destino intelectual. ―Parti, dizendo adeus à minha infância, aos sítios que eu amei aos rostos caros...na incerteza cruel do meu destino‖101. O destino? Coimbra, que em seu seio gelado de um inverno sem folhas recebeu aquele ainda quase menino de coração apertado, mas que em brevíssimo espaço de tempo estava cercado de amigos e admiradores, dentre condiscípulos e mestres. A mesma Coimbra, que foi cenário dos triunfos acadêmicos do esperançoso menino do Maranhão. À Coimbra de Choupal, cidade lusa de sonhos e tradições, imortalizada pelos poetas, mostrou nosso conterrâneo mestiço o seu valor. De personalidade goetiana, como definido por Josué Montello, Gonçalves Dias como Goethe, não se contentando com a arte, buscou a técnica, e desta, partiu para a Ciência, tamanha era a ânsia de conhecimento e de criação, do Michelângelo maranhense, do da Vinci brasileiro, vez que chefiou comissão de engenheiros e naturalistas em expedição à Amazônia por determinação do Governo Imperial. Coordenaria os estudos etnográficos e redigiria a narrativa de viagem, numa prova de que a vocação literária coadunava-se com a científica. Malograda foi tal expedição. O poeta, porém, ainda que sem apoio financeiro do governo de então, continuou seus trabalhos. Veio ao Maranhão e daqui rumou para Belém e Manaus, viagem da qual resultaram observações, teorias, afirmações, relatórios, tudo com o maior rigor científico, a exemplo de ―Diário de Viagem ao Rio Negro‖ ou do ―Dicionário da Língua Tupi‖, publicado em Leipzig102. Ferdinand Wolf, no seu Le Brésil Litteraire, publicado na Berlim de 1863, tratando das poesias do nosso conterrâneo iluminado, enaltece-o, ou, melhor dizendo, lhe faz justiça, reconhecendo tamanha a grandeza das descrições das cenas e fenômenos da natureza em concepção ideal do colorido que só se veem nos trópicos. E, citando o ―Hino à Tempestade‖, comparou o poeta a um profeta índio. E justifica: ―pelas visões do transe, da insânia da guerra, da fé do poeta, ao entoar hinos, que nem aos pajés das mais diversas tribos foi dado entoar‖103. Quem seria capaz de tão bem desnudar a alma selvagem do indígena nacional, senão Gonçalves Dias, como o fez em ―Canção do Tamoio‖: Teu grito de guerra Retumbe aos ouvidos D´mínimos transidos Por vil comoção E tremam d‘ouvi-lo Pior que o sibilo Das setas ligeiras Pior que o trovão! (...) As armas ensaia Penetra na vida: Pesado ou guerrida Viver é lutar Se o duro combate Aos fracos abate Aos fortes, aos bravos Só pode exaltar. Ou em "O Canto do Piaga": 101 102 103

Saudades (Últimos Cantos), 1853. DIAS, Gonçalves. Gonçalves Dias na Amazônia. Relatórios e diário de viagem ao Rio Negro. Rio de Janeiro: ABL, 2002. WOLF, Ferdinand. Le Brésil Litteraire: histoire de la littérature brésilienne, 1867, p. 203.


O' Guerreiros da Taba sagrada, O' Guerreiros da Tribo Tupi, Falam Deuses nos cantos do Piaga, O' Guerreiros, meus cantos ouvi. [...] Não sabeis o que o monstro procura? Não sabeis a que vem, o que quer? Vem matar vossos bravos guerreiros, Vem roubar-vos a filha, a mulher! Além, muito além do amor não correspondido, da natureza virgem e bela do seu país – marcado triste e profundamente na sua canção de exilado, Gonçalves Dias cantou/homenageou/idealizou o indígena brasileiro, sentimento explicado talvez pelo sangue de Vicência em suas veias. O bacharel de Coimbra, o homem de letras, o dicionarista, o teatrólogo, o jornalista, o etnógrafo, o mestiço que encantou o Brasil e Portugal com sua poesia, agarrado à sua origem selvagem, muito se identificou com os verdadeiros nativos sul-americanos, afinal espírito tão nobre, tão superior, não encontrava nos poderosos de sua terra os ideais sonhados, ansiados, senão na pureza animal dos indígenas – seus ancestrais. Daí a arte daquela ave nascida nas selvas. Daí a pureza clássica do seu insuperável indianismo, como se vê na epopeia dos Timbiras. Ninguém mais nacional, ninguém mais índio, explicação do nativismo do meu patrono. Com efeito, avançando os limites então propostos pela literatura colonial, como bem noticia o Professor Doutor em Poética e Hermenêutica, Weberson Fernandes Grizoste, Gonçalves Dias desnudou o confronto até então existente entre os mundos do conquistador – representante da civilização (ou da bondade natural humana) – e dos índios – representantes da barbárie (ou da corporificação da maldade) –, porquanto evidenciou que, sob a justificativa dos conquistadores para ―salvar a terra, salvar a gente que nela habitava‖, tal como sugerido por Caminha em sua carta, em verdade: […] por trás desse salvamento e do combate à barbárie, praticou-se barbárie, em combate à injustiça, mataram-se homens, velhos, mulheres e crianças, em nome do cristianismo destruiuse, em combate ao paganismo, cometeram os mesmos sacrifícios humanos104. Não à toa, Lúcia Miguel Pereira, ícone da mais alta inteligência feminina nas letras, ao tratar da força da poesia do romântico e indianista Gonçalves Dias, destacou: ―Não lhe cabe a primazia da introdução dos índios na poesia brasileira. Antes dele já tinham celebrado Basílio da Gama e Santa Rita Durão, já os apontara Magalhães como tema aos poetas. A despeito, porém, dessa prioridade teórica do Visconde de Araguaia e puramente cronológica dos mineiros, teve razão Ronald de Carvalho ao ver em Gonçalves Dias o verdadeiro criador do indianismo. […] "No Uruguai e no Caramuru os índios aparecem em função dos brancos, como vítimas do sistema colonizador dos Jesuítas, ou como figurantes passivos e decorativos dos primeiros séculos da vida brasileira". ―Gonçalves Dias viu-os em si mesmos, na sua pureza específica de selvagens. Não representavam para ele um elemento poético, mas uma força poderosa em nossa formação. E o indianismo adquiriu assim uma significação nova, que escapou aos mineiros; tornou-se uma busca das nossas fontes e razões de vida, uma explicação da nossa índole, a voz da raça que deve e precisa ser ouvida‖. 104 GRIZOSTE, Weberson Fernandes. O reflexo anti-épico de Virgílio no indianismo de Gonçalves Dias, Dissertação de mestrado em Poética e Hermenêutica, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, 2009, p. 9.


―Há ainda outra razão para considerarmos Gonçalves Dias o verdadeiro fundador do indianismo – ou o fundador do verdadeiro indianismo: é que os mineiros, embora não totalmente destituídos de valor, não ficaram, não se incorporaram realmente ao nosso patrimônio cultural, aos nossos hábitos intelectuais. E Gonçalves Dias nos marcou profundamente, o que ele sentiu e disse tem influência, significação, importância‖ 105. E esse sentimento para com o índio, demonstrado em inúmeras obras, das quais fazem exemplo Y-JucaPirama, Canção do Tamoio, Canto do Piaga, O Gigante de Pedra, Marabá e Leito de Flores Vermelhas, fez do Patrono das Cadeiras nº 15 da Academia Brasileira de Letras e nº 9 da Academia Maranhense de Letras, Gonçalves Dias, o mais indianista dos indianistas! E foi com Os Timbiras, a Ilíada brasileira, que o ―indianismo atingiu seu apogeu‖, segundo reconhece e convence Manoel de Souza Pinto106. Ao narrar a história dos Povos Timbiras, evocando a sombra do selvagem guerreiro, versou nosso Gonçalves Dias: Os ritos semibárbaros dos Piagas, Cultores de Tupã, a terra virgem Donde como dum trono, enfim se abriram Da cruz de Cristo os piedosos braços; As festas, e batalhas mal sangradas Do povo Americano, agora extinto, Hei de cantar na lira.– Evoco a sombra Do selvagem guerreiro!... […] Agora inúteis setas, vão mostrando A marcha triste e os passos mal seguros De quem, na terra de seus pais, embalde Procura asilo, e foge o humano trato. Em Marabá, espelhou-se o poeta, viu-se a si mesmo na índia mestiça, rejeitada por sua tribo e pelo ―homem branco‖, ante a sua mestiçagem, afinal, também mestiço e objeto de preconceito 107... Ali , com orgulho exaltado da sua ascendência indígena, declama: Eu vivo sozinha; ninguém me procura! Acaso feitura Não sou de Tupá? Se algum dentre os homens de mim não se esconde, ―Tu és‖, me responde, ―Tu és Marabá!‖ Meus olhos são garços, são cor das safiras, Têm luz das estrelas, têm meigo brilhar; Imitam as nuvens de um céu anilado, As cores imitam das vagas do mar! [...] É alvo meu rosto da alvura dos lírios, Da cor das areias batidas do mar; As aves mais brancas, as conchas mais puras Não têm mais alvura, não têm mais brilhar108. 105 PEREIRA, Lúcia Miguel. 1901-1959. A vida de Gonçalves Dias/Lúcia Miguel Pereira. Contendo o Diário inédito da viagem de Gonçalves Dias ao Rio Negro, com 11 ilustrações fora do texto. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2016, p. 152-153. 106 SOUZA PINTO, Manuel de. O indianismo na poesia brasileira. Coimbra, 1928, p. 22. 107 CÂMARA, Yzy Maria Rabelo; CÂMARA, Yls Rabelo. O nacionalismo brasileiro e o indianismo em forma de poema: a exaltação do eu lírico feminino e do amor rechaçado em ‘Marabá’, de Gonçalves Dias. Revista Entrelaces. Ano VI. Nº 07, jan-jun. 2016, p.96. 108 CÂMARA, Yzy Maria Rabelo; CÂMARA, Yls Rabelo. Ob, cit., p.94-95


Y-Juca-Pirama, é verdadeira concepção épico-dramática que canta a tribo timbira e toda a sua bravura – a paixão demonstrada faz do índio um herói, na qual louva-lhe a honra e o caráter com desmedida paixão, quiçá justificada pelo sangue selvagem que lhe corre nas veias, já se disse. Daí o célebre verso, de quem sentia no peito e podia afiançar: MENINOS, EU VI! No meio das tabas de amenos verdores Cercadas de troncos – coberta de flores Alteiam-se os tetos da altiva nação São muitos seus filhos, nos ânimos fortes Temíveis na guerra, que em densas cortes Assombram das matas a imensa extensão. São rudes, severos, sedentos de glória, Já prélios incitam, já cantam vitórias, Já meigos atendem à voz dos cantos São todos timbiras, guerreiros valentes Seu nome lá voa na boca das gentes Condão de prodígios, de glória e temor! E, não mais nos decassílabos versos, dá voz ao guerreiro tupi aprisionado: Meu canto de morte Guerreiros, ouvi Sou filho das selvas Nas selvas cresci Guerreiros, descendo Da tribo tupi. Da tribo pujante, Que agora anda errante Por fado inconstante, Guerreiros, nasci: Sou bravo, sou forte, Sou filho do Norte; Meu canto de morte, Guerreiros, ouvi. Todavia, a despeito de o índio ser a principal figura de encantamento e admiração, Gonçalves Dias não esqueceu da do negro africano, para quem, embora mote menos exaltado, especialmente por limitarem-lhe as circunstâncias sociopolíticas da época, reconhecia-lhe como sujeito de sentimentos próprios. Nesse sentido, pertinentemente bem observou a Mestra em Estudos Literários, Culturais e Interartes pela Universidade do Porto, a Professora Renata Ribeiro Lima, ao atribuir a Gonçalves Dias grande avanço em termos literários e até científicos, pelo ―simples fato de assumir, naquela época, que o índio e o negro africano eram seres humanos iguais aos brancos ‗civilizados‘, com sentimentos e todo um universo‖.109 Isso porque, assevera ainda a Professora Renata Lima: Se por um lado, os ideais iluministas de igualdade já se encontravam difundidos, na prática, as discussões intelectuais (nas quais se baseavam muitas ações políticas), como as do Instituto Histórico e Geográfico, ainda questionavam a humanidade desses sujeitos e a sua ‗capacidade evolutiva‘. Para muitos, o índio estava fadado à extinção, e o negro, à servidão, por motivos naturais. Só depois de muito tempo é que essas minorias sociais foram adquirindo direitos, em lutas constantes que persistem até hoje. 109

LIMA, Renata Ribeiro. O papel do exílio na configuração do nacionalismo de Gonçalves Dias. IFMA, 2017, p. 27.


E canta, o nosso poeta, em "A Escrava": Oh! doce país de Congo Doces terras d′além-mar! Oh! dias de sol formoso! Oh! noites d′almo luar! Desertos de branca areia De vasta, imensa extensão, Onde livre corre a mente, Livre bate o coração! [...] Sofreu tormentos, porque tinha um peito, Qu′inda sentia; Mísera escrava! no sofrer cruento. Congo! dizia. No ponto, a professora Renata Lima continua: "Dessa forma, quando Dias escreve, ―A Escrava‖ [...] pode ser considerado um poeta de vanguarda. É possível ler, nesses versos, a afirmação, ainda necessária naquela época, de que a escrava ―tinha‖, realmente, ―um peito‖, uma subjetividade marcada pela identidade que lhe era aviltada. Tinha uma nação, o Congo, da qual fora expatriada"110. Daí concluir que Gonçalves Dias, ao denunciar as injustiças cometidas pelo Império, apesar de sustentado por ele, causou tensões verdadeiramente importantes com as suas obras. E ao assim fazer, especialmente sob o viés humanista, Gonçalves Dias revela um dos papéis mais importantes da Literatura – como bem advertem as Professoras Yzy Maria Rabelo Câmara e Yls Rabelo Câmara111 -: o de registrar, sob a forma de arte escrita, o momento histórico pelos quais passaram os povos indígena e africano, como se lhes testemunhasse silenciosamente o presente e o passado cristalizados em palavras como legado para o futuro. Tudo sem esquecer que, também por força da sua natureza humanística, o nosso bardo explorou com arte a melancólica sensibilidade europeia, a exemplo das rimas encontradas por espelho nas ―Sextilhas de Santo Antão‖, versos narrativos em cinco poemas, onde canta a Idade Média. Estaria o poeta negando com as Sextilhas a autonomia literária do seu país, a brasilidade dos seus versos? Ou ironizando e jogando por terra um passado lusitano de duvidosa glória? Para a maioria dos estudiosos e críticos literários, inclusive para Machado de Assis, pertencem as Sextilhas exclusivamente à Literatura Portuguesa. Lúcia Pereira, contudo, define-as, paradoxalmente, como uma face do nacionalismo de Gonçalves Dias. E advoga sua tese ao argumento de que ―os portugueses foram parte importante na formação brasileira e muito mais o foram ao tempo do poeta112. De ―Considerações sobre as Sextilhas de Gonçalves Dias‖, dos bancos da USP, tem-se do autor Vagner Camilo, que: ―As Sextilhas‖ retratam uma Nação velha, aborrido e triste. E Portugal estaria encarnado na figura nostálgica, ranheta e tardonha de um frei não lá muito santo, que supondo louvar, acaba ironicamente por desmistificar e expor ao ridículo a idealização de todo um passado de glórias lusitano‖ 113.

110 LIMA, Renata Ribeiro. Ob, cit., p. 27. 111 CÂMARA, Yzy Maria Rabelo; CÂMARA, Yls Rabelo. Ob, cit., p. 89. 112 PEREIRA, Lúcia Miguel. 1901-1959. Ob, cit., p. 150. 113 CAMILO, Vagner. Nos tempos de antão: considerações sobre as Sextilhas, de Gonçalves Dias. Revistas USP, São Paulo, nº 40, p. 105-113, dezembro/fevereiro 1998-99, p. 113.


Está exatamente no conflito e diversidade de leituras críticas a beleza e superioridade da arte literária. Quantas interpretações seriam possíveis? A argumentação científica da crítica/interpretação literária há de levar em conta a estética, a poética, a estilística, a retórica, as funções social e filosófica, tudo sob a ótica do autor e do leitor. Infinitas questões encerram o fenômeno literário, questionamentos garantidos que são pela própria Teoria da Literatura, esta mesma quase um gênero literário, dado a dissociabilidade entre a contemplação/análise da arte e a própria arte. O professor Rubem Almeida114 (para mim, quem melhor sintetiza a glória, merecida glória, de Gonçalves Dias), proferindo oração no dia 03 de novembro de 1962, diante da estátua de Gonçalves Dias, no Largo dos Remédios, na celebração ao 98º aniversário de sua morte, em homenagem dos maranhenses ao excelso cantor da gente brasileira, perguntava-se: O que é afinal o poeta senão aquele eleito, apto a sentir e interpretar, com inexcedível fidelidade, a natureza, que lhe é teatro, e o homem, que lhe é ator? Aquele no conceito de Leopardi, capaz de ―explorar o próprio peito‖, onde vêm repercutir todas as sensações, provindas do mundo exterior? Aquele que, em percuciente, penetrante trabalho introspectivo, sabe dissecar o próprio coração, escrínio de sentimentos e, nas fíbridas mais íntimas e recônditas, descobrir quanto de belo e puro, sagrado e exemplar, se contêm, para manifestá-lo aos outros? Aquele que sofre tanto por intrínseco à constituição dos viventes, quanto por incompreendido dos semelhantes, e do sofrimento orgânico e moral, faz seu culto, do qual, ao mesmo tempo, sacerdote e devoto, oficiante e crente ao mesmo tempo? Perguntava-se o professor maranhense, para ao final, glorificar o poeta: Glória a ti, excelso cantor da terra e gente brasileira, mirando, do alto de tua pétrea palmeira, o largo oceano que tanto enalteceste e, por isso, talvez, reconhecido, te guarda o corpo em túmulo inviolável! Glória a ti, vate sublime, que conquistaste para tua e nossa terra o título de ouro, que outra terra, jamais, tentará arrebatar-nos! Glória a ti, mameluco insigne, que exaltaste o valor de teus irmãos das selvas, na feição literária, até agora sem rival, primeira grande voz a erguer-se advogando a causa de uma raça oprimida, coberta de opróbrios, apodos e maldições!115 Todos os povos cantam o exílio em suas literaturas. Ninguém mais liricamente, contudo, cantou o exílio, a saudade melancólica, mas orgulhosa da Pátria, que Gonçalves Dias. ―Canção do Exílio‖, a mais parodiada das poesias nacionais, incorpora-se, terna e profundamente, à alma brasileira. Do patriota poema, dois versos foram tomados de empréstimo para compor o nosso Hino Nacional (Nossos bosques têm mais vida; Nossa vida mais amores). O velho Continente, com a elegância do seu desenvolvimento e maturidade, inclusive intelectual, com as letras de suas mais renomadas universidades, com a ciência e recursos terapêuticos (tão necessários ao poeta), nada lhe sobrepujava no coração às selvagens paisagens, os imensos palmeirais do seu Maranhão. Nos pinheiros europeus não cantava o sabiá! Escreveu o seu emblemático exílio aos 19 anos de idade às margens do Môndego. Seria uma premonição, um vaticínio sobre o próprio fim? Minha terra tem palmeiras Onde canta o sabiá As aves que aqui gorjeiam Não gorjeiam com lá Nosso céu tem mais estrelas Nossas várzeas têm mais flores Nossos bosques têm mais vida 114 Todos os anos, a cidade de São Luís comemorava, em romaria cívica à estátua do poeta na Praça Gonçalves Dias, o dia 03/11 como data consagrada a AS. Gonçalves Dias. 115 ALMEIDA, Rubem; MEIRELES, Mário. A glorificação de Gonçalves Dias. Edição comemorativa do transcurso do 98º aniversário de morte de Antônio Gonçalves Dias (1864-1962). Biblioteca Pública Benedito Leite, São Luís: 1962, p. 6.


Nossa vida mais amores [...] Não permita Deus que eu morra Sem que eu volte para lá Sem que desfrute os primores Que não encontro por cá Sem q‘inda aviste as palmeiras Onde canta o sabiá! Quer seja da experiência do exílio ou do retorno à terra natal, o nosso Maranhão, Gonçalves Dias constatou que o sentimento da expatriação forçada era universal. E sendo assim, através de suas obras, sensibilizou a todos quanto ao sofrimento impingido aos índios e aos escravos negros no Brasil. Afinal, conforme bem observado pela professora Renata Ribeiro Lima: [...] esses sujeitos foram, ambos, exilados; cada um à sua maneira: o primeiro, expulso do seu território, por violência, diásporas, doenças, etc; o segundo, trazido à força de sua terra no continente africano. Por meio da identificação com o eu lírico, o leitor ideal de Gonçalves Dias poderia compreender esses processos tão amplos e devastadores entre populações inteiras, entre tantas nações. Recorde-se que, para os índios, cada povo representa uma nação, razão pela qual aquilo que consideram seu território não corresponde aos limites geográficos colocados pelos brancos, tal como sugere o guerreiro Tupi em I-Juca-Pirama‖116. Foi Gonçalves Dias pioneiro na quebra ou menosprezo das regras de métrica em solo português. Não somente macula-as como o declara ao prefaciar seus ―Primeiros Cantos‖, ao traçar seu próprio perfil. A partir da consciência maior que possuía, vai na dianteira da concepção artística do Romantismo, verdadeira travessia poética, abandonando a rigidez da técnica para a espontaneidade da inspiração. Vieram a lume os simbólicos e respeitados ―Primeiros Cantos‖ em 1846, dando início, assim, ao prestígio literário do poeta e do Brasil.117 Ali, a alma e os sentimentos de Gonçalves Dias em poesia quase bibliográfica. Ali, as chamadas poesias americanas ou indianistas a contar toda a brasilidade do poeta. Tal conteúdo emocional e lírico, argumentativo, dramático, rítmico, divino, apaixonado, sublime da obra do Patrono desta cadeira, (que muito me honra e orgulha ocupar) já se impõe na publicação dos ―Primeiros Cantos‖ e conferem caráter nacional à Literatura brasileira, afinal, como declara o próprio poeta no prólogo de sua primeira publicação: Com a vida isolada que vivo, gosto de afastar os olhos de sobre a nossa arena política para ler em minha alma, reduzindo à linguagem harmoniosa e cadente o pensamento que me vem de improviso, e as ideias que em mim desperta a vista de uma paisagem ou do oceano - o aspecto enfim da natureza. Casar assim o pensamento com o sentimento - o coração com o entendimento - a ideia com a paixão - cobrir tudo isto com a imaginação, fundir tudo isto com a vida e com a natureza, purificar tudo com o sentimento da religião e da divindade, eis a Poesia a Poesia grande e santa - a Poesia como eu a compreendo sem a poder definir, como eu a sinto sem a poder traduzir.118 ―O apego a terra-berço, a vontade de regresso, não surgiram com a adversidade. Eram, antes de tudo, a continuidade natural de um sentimento de toda a vida‖, diz Jomar Moraes119, o nosso Jomar, um dos grandes biógrafos de Gonçalves Dias. Devotava o poeta comovente apego ao Maranhão, à sua Caxias, e demonstrouo inúmeras vezes, mormente em cartas aos amigos. Eram fortes e profundos os laços de afeto do poeta com 116 117 118 119

LIMA, Renata Ribeiro.Ob, cit., p.17. BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. 34 Ed. Cultrix, 1994, p.109. DIAS, Gonçalves. Primeiros Cantos, Rio de Janeiro, 1846. MORAES, Jomar. Gonçalves Dias: vida e obra, Alumar Cultura, 1998, p. 166-168.


o Maranhão, tanto que, ―embora dominando vastíssimos horizontes, jamais perdeu as referências de suas raízes.120 Dos amigos, João Lisboa, Sotero dos Reis, Gentil Braga, Teixeira Mendes, Nunes Leal, Henriques Leal, Teófilo Leal (cunhado de Ana Amélia), esses do Maranhão. Maranhão, Maranhão, por quem o coração do poeta chorou, a pena do poeta cantou, a alma do poeta suspirou, a obra do poeta enalteceu. Ninguém foi mais fiel aos amigos. Soube preservá-los além da morte. Decerto, entre todos, Teófilo foi o mais querido, o mais amado. Vale registrar as sílabas poéticas e vaticinadoras de ―Adeus aos meus amigos do Maranhão‖: Porém quando algum dia o colorido Das vivas ilusões, que inda conservo, Sem força esmorecer, — e as tão viçosas Esp′ranças, que eu educo, se afundarem Em mar de desenganos; — a desgraça Do naufrágio da vida há de arrojar-me A praia tão querida, que ora deixo, Tal parte o desterrado: um dia as vagas Hão de os seus restos rejeitar na praia, Donde tão novo se partira, e onde Procura a cinza fria achar jazigo. No amor pode ter sido (e foi) leviano, mas aquela alma sensível valorizou com denodo a amizade, à qual via como: ―A única paixão que caminha, segura e firme, em todos os tempos e circunstâncias por entre os vaivéns e temporais da vida - é a amizade. Nobre, pura e desinteressada, dedicada, sem nuvens que a empanem, sem zelos que a enegreçam; sem vicissitudes e alternativas que a depreciem, descorem ou matem, é entre todas, e só entre todas – a amizade. É a ilusão que se não desdoura, – o sonho que se realiza no bem; é a realidade nas aspirações para o infinito. Só não é imutável porque reverdece, progride e se enraíza cada vez mais com o tempo. O poder tem cortesãos, a riqueza, parasitas, a glória, aduladores: não são amigos‖121. Ao caro e saudoso amigo, Teófilo, ofereceu também seu último volume de poesias soltas, denominadas Últimos Cantos. E o motivo foi nobre, por que foi maior que o amor ao amigo, maior que a gratidão que lhe devotava (Os meus primeiros e últimos cantos são teus: o que sou, o que for, a ti o devo – a ti, ao teu nobre coração, que durante os melhores anos da juventude bateu constantemente ao meu lado). Queria perpetuar também nome e imagem de Teófilo, como o diz no mesmo oferecimento: Entrei na luta, e procurei disputar ao tempo uma fraca parcela da sua duração, não por amor do orgulho, nem por amor da glória; mas para que, depois da morte de ambos, uma só que fosse das minhas produções sobrenadasse no olvido, e por mais uma geração estendesse a memória tua e a minha. E os amigos lhe foram fiéis. É comovente o trabalho do Antônio Henriques Leal para preservar, para fazer justiça ao talento grandioso do amigo. Quanto desprendimento, quanto trabalho, quanta determinação para salvaguardar a obra do poeta. Em prólogo poético da publicação das obras póstumas de Gonçalves Dias, define-se Antônio Henriques como ―amigo e admirador do poeta, depositário de muitos dos seus segredos e projectos‖122, e objetiva só e tão-só prestar o merecido tributo ao eminente e célebre poeta, ao gênio transcendente. 120 121 122

MORAES, Jomar. Ob, cit., p. 168. DIAS, Gonçalves. Mano e Amigo do Coração [Teófilo]. Anais da Biblioteca Nacional, Vol. 84, 1964, p.143. LEAL, Antônio Henriques. Obras posthumas de A. Gonçalves Dias, Tomo I, 1868, p. VIII.


Impossível deixar sepultas as inéditas, inacabadas, mas não menos importantes partes da obra do protótipo do poeta maior, de essência divina, que cantou com beleza ímpar as agruras, os desgostos mais profundos, o desespero mais intenso e sombrio. Daquele que cantou a Pátria (sua pródiga natureza de floridas florestas); cantou o dono da terra por direito – o indígena, que espelha guerreiro, valente, herói, e o poder dos seus deuses, dos seus modelos; cantou o amor, porque amou, amou e mais amou. Como na estrofe de uma velha canção: a vida continua muito tempo depois de a vida desaparecer. E o poeta, do alto de sua consciência sobre o poder da arte, predisse: ―E o nosso nome voará de boca em boca – de pais e filhos – até as mais remotas gerações, e o esquecimento não prevalecerá contra ele‖123. Buscando inspiração no poeta inglês Alexander POPE, a confreira Ana Luíza Ferro, respaldada na generosidade do seu espírito, ao recepcionar-me no Instituto Histórico Geográfico do Maranhão, desejoume: ―As árvores, onde você se sentar, se ajuntarão para oferecer sombra: onde quer que você pise, as flores enrubescidas surgirão, e todas as coisas florescerão para onde você volver os olhos‖124. A que então faz jus o maior poeta nacional? Se a mim coube tamanho e pródigo presságio, confreira Ana Luíza, certamente Gonçalves Dias merece que o universo em sua plenitude curve-se e preserve infinitamente a beleza dos seus versos. Ninguém menos que Alexandre Herculano, grande nome da Literatura Portuguesa, por ocasião da publicação de ―Os Primeiros Cantos‖ (escritos em sua maioria quando Gonçalves Dias ainda estudava em Portugal), referiu-se ao poeta: ―Os primeiros cantos‖ são um belo livro. São inspirações de um grande poeta. A terra de Santa Cruz, que já conta outros no seu seio, pode abençoar mais um ilustre filho. O autor, não o conheço, mas deve ser muito jovem. Sem qualquer inocência, o último parágrafo do Futuro litterário de Portugal e do Brazil, é um recado para o autor dos Primeiros Cantos. Se estas poucas linhas, escriptas de abundancia de coração, passarem os mares, receba o autor dos Primeiros Cantos o testemunho sincero de sympathia, que a leitura do seu livro arrancou, que não o conhece, que provavelmente não o conhecerá nunca, e que não costuma nem dirigir aos outros elogios encomendados, nem pedi-los para si 125. De obra vasta e genial, em que pese a curta existência, 41 anos de vida atribulada, por que permeada de conflitos, traumas, recalques, dificuldades financeiras, moléstias físicas, além, é claro, do tempero indispensável: a sina do amor impossível. Sua misteriosa identidade, a que junta um português de Trás-osMontes a uma mestiça da terra brasilis – uma mulher de passagem, para usar e descartar, analfabeta, inferior para os costumes de então, quis o destino unir, ainda que tão-somente para os prazeres da carne, aquelas individualidades tão díspares, para dar à luz um grande poeta, apesar, ou por causa de, tantos ventos, tempestades, incertezas, sofrida herança psicológica. É Lúcia Miguel Pereira, por muitos considerada a mais completa biógrafa de Gonçalves Dias, no capítulo XII do ―A Vida de Gonçalves Dias! – Edição do Senado Federal126, quem, utilizando-se das cartas do poeta, em apurada pesquisa, faz-lhe contar as suas próprias dores ao dividir a alma e agruras da vida, que a par dos desgostos, as doenças lhe minaram o corpo. ―A sífilis, a tuberculose, a febre palustre (esta contraída no Ceará) eram, cada uma por si, suficientes para abater outro organismo, de fibra menos resistente do que o desse mestiço, que apesar de tudo não se rendia‖. Para Teófilo, escrevia o poeta depois de lamentar as dores e os males:..‖ apesar desse almanaque de coisas ruins, não te dê isso cuidado. Deus me deu vida para cem anos, e a prova é que, desde os quinze, a esbanjo tola, estúpida e insipidamente....‖127. 123 DIAS, Gonçalves. Carta a Teófilo. Anais da Biblioteca Nacional, Vol. 84, 1964, p. 278. 124 CUNHA, Cleones Carvalho; FERRO, Ana Luiza Almeida. Na casa de Antônio Lopes: posse na Cadeira nº 25 do Instituto Histórico Geográfico do Maranhão. São Luís: ESMAM, 2017, p. 21. 125 HERCULANO, Alexandre. Opúsculos. Tomo IX. Lisboa: Livraria Bertrand, s/d. Futuro litterario de Portugal e do Brazil. Por ocasião da leitura dos Primeiros Cantos: poesias do Sr. A. Gonçalves Dias. Revista Universal Lisbonense, 1847. Tomo 7, pag. 5. 126 PEREIRA, Lúcia Miguel. 1901-1959. Ob, cit., p. 405. 127 PEREIRA, Lúcia Miguel. 1901-1959. Ob, cit., p. 404.


Do sentimento maior do mito das letras brasileiras, de obra colossal e admirável, diz Josué Montello: ―os amores vão correr paralelos aos versos, na vida do poeta. Cada namoro, uma paixão, e cada paixão, um derramamento de lirismo‖128. Não foram poucas as mulheres que fizeram suspirar o coração do poeta. Mulheres do Brasil, de Portugal e de outras nações, mas ninguém como Ana Amélia, que trucidou o coração do poeta. Foi Ana Amélia a eterna musa. Para ela, ―Ainda uma vez Adeus‖. Ana Amélia! Ah Ana Amélia! Menina-moça, bem-nascida, criada e educada na São Luís portuguesa de então, cunhada do amigo Teófilo, arrebatou-lhe o coração. Fascinava-lhe a beleza daquela menina de olhos negros da Rua de Santana, para quem, em momento de platônico amor, escreveu ―Seus olhos‖, foram instantes de ventura e paz. Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros De vivo luzir Estrelas incertas, que as águas dormentes Do mar vão ferir; (...) Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros De vivo luzir São meigos infantes, gentis, engraçados Brincando a sorrir (...) Seus olhos tão negros, tão belos, tão puros Assim é que são Eu amo esses olhos que falam de amores Com tanta paixão. E a menina cresceu enquanto o poeta estava radicado no Rio de Janeiro, tornando-se ―a mulher mais encantadora com os annos, mais perigosa pelas seducções de suas fórmas já desenvolvidas e do espírito tão prendado e agudo‖129, a fada dos pensamentos do poeta, o amor que lhe queimava o peito, que lhe alegrava a alma, mas que lhe foi negado pelo preconceito da família de Ana Amélia contra a desdita da ilegitimidade, apesar de todos os dotes do poeta, apesar de todos os dotes intelectuais e morais. Deplorável e iníquio preconceito que fulminou de morte e transmudou-lhe a vida para uma passagem terrena de mágoas e infortúnios. De todo esse malfadado amor, ―Ainda uma vez adeus‖, que fez chorar Odorico Mendes, por que naqueles versos, além de brotar de cada palavra o sentimento do belo, apresentava uma dor ―quase real‖. ouco, aflição, a saciar-me D‘agravar minha ferida, Tomou-me tedio da vida, Passos da morte senti; . Mas quase no passo extremo, No ultimo arcar da esp‘rança, Tu me vieste á lembrança: Quis viver mais e vivi! O amor do poeta por sua musa do Maranhão foi/é cantado, reconhecido, invejado, desejado, suspirado por toda alma romântica. Teve tamanho alcance popular tal amor proibido, que se vê decantado/comentado/julgado desde os cordéis de rimas pobres a mais superior prosa poética de eruditos. Tamanho amor, impossível amor, para Gonçalves Dias, que seria capaz de por ele morrer, como poetizou em ―Se se morre de amor‖: Sentir, sem que se veja, 128 MONTELLO, Josué. Para conhecer melhor Gonçalves Dias: estudo introdutório e antologia. Edições Bloch: Rio de Janeiro, 1973. p. 13. 129 LEAL, Antonio Henriques. Ob, cit,. p. 99-100.


A quem se adora Compr‘ender, sem lhe ouvir, Seus pensamentos, Segui-la, sem poder fitar seus olhos, Amá-la, sem ousar dizer que amamos, E, temendo roçar os seus vestidos, Arder por afogá-la em mil abraços: Isso é amor, e desse amor se morre! Em mais uma missiva a Teófilo, declara o poeta – ao tempo em que a mão de Ana Amélia lhe foi negada, com a alma despedaçada, mas nobre e resignadamente: ―Desisto das minhas pretensões com uma condição – única, mas imprescritível – que D. A(na) A(mélia) não sofra por meu respeito, que não sofra de sua família, que não sofra na sua saúde: estou resignado: o contrário me levaria a algum ato que não seria fácil de atalhar-se por bem e menos por mal...‖130 Josué Montello testemunha, por ter ouvido de um seu mestre descendente de Ana Amélia – que a teria conhecido bem idosa, e dela ter ouvido mais de uma vez num suspiro de orgulho: ―meu filho, eu fui amada pelo maior poeta do Brasil‖.131 Teria Ana Amélia também amado o desditoso poeta? Conquanto fosse ―baixo e moreno, era Gonçalves Dias um tipo atraente. As mulheres tanto brasileiras quanto estrangeiras dobravam-se vencidas por seus encantos‖, cita Jomar132. Em que pese a nobreza do gênio, que alçou Gonçalves Dias aos mais altos dos altares, fazendo reis e plebeus lhe renderem as vênias do reconhecimento, não teve berço o poeta. Nascido, como já se disse, da miscigenação racial, lhe faltava sangue puro, condição agravada naquele Brasil-império preconceituoso, desigual e injusto, quiçá mais que ainda o é, fato que, por via de consequência, separou-o do seio materno, cujo pecado consistiu tão-somente na pele acobreada resultante do sangue misturado naqueles anos de círculo de ferro. E mais. O preconceito de sua origem mestiça, inferior, sobrepuja a nobreza do artista, a grandeza das ideias, a pureza do seu caráter, ao lhe ser negada a mão de Ana Amélia, o grande e infinito amor, a musa do artista. Para Ana Amélia, a inspiração de ―Ainda uma vez adeus‖, repete-se, onde a arte dignifica o sofrimento do coração do poeta: Enfim te vejo! - enfim posso, Curvado a teus pés, dizer-te, Que não cessei de querer-te, Pesar de quanto sofri. Muito penei! Cruas ânsias, Dos teus olhos afastado, Houveram-me acabrunhado A não lembrar-me de ti! II Dum mundo a outro impelido, Derramei os meus lamentos Nas surdas asas dos ventos, Do mar na crespa cerviz! Baldão, ludíbrio da sorte Em terra estranha, entre gente, Que alheios males não sente, Nem se condói do infeliz! 133 130 131 132 133

MORAES, Jomar. Ob, cit., p. 331 MONTELLO, Josué Ob,cit. p. 135-137. MORAES, Jomar. Ob, cit., p.107 Ainda uma vez Adeus (Novos Cantos), 1857.


Paixão, terrível paixão! Em carta a Teófilo, já referida, confidencia o poeta: ―Amava, mas não pensei que amava tanto. Acontecia comigo como quem pega em algum peso, e conhece que tem força para muito mais. Amava, mas podia amar mais e muito mais; amava, porém minha alma adormecida com a esperança que anteriormente me sorria, não estava toda ocupada; amava, mas o amor que eu tinha para o amor, que eu advinhava, que eu me conhecia capaz de sentir, - era o espaço em relação à imensidade, - o tempo em relação ao infinito...‖....Felizmente, não soube nem saberá nunca Ana Amélia com quanto extremo era amada: os acentos da paixão que ela me inspirou, mas que me não ouviu nunca, ficaram em minha alma e eu não os terei de repetir a mulher alguma‖134. Senhoras, senhores, De onde vem a sabedoria, quem dota os profetas da arte, onde se esconde a inspiração? Já em ―Canção do Exílio‖, Gonçalves Dias, reconhecendo sua pequenez humana, clama aos céus, pede clemência ao Todo Poderoso: ―Não permita Deus que eu morra Sem que eu volte para lá Sem que desfrute os primores Que não encontro por cá‖ Canta o céu e o inferno em ―A Vila Maldita – cidade de Deus‖: E Deus maldisse a terra criminosa Maldisse os homens dela Maldisse a cobardia dos escravos Dessa terra tão bela E muitos são os poemas de viés religioso ou com pinceladas de fé, onde Deus se revela na natureza, a quem o poeta pede socorro, confia-lhe seus desencantos, desalentos, saudades. Em ―A Viagem‖, compara o bem, o nobre a um templo sagrado, onde só Deus habita. Mas é em ―Meditação‖, prosa poética, escrita entre 1845 e 1846, que narra o conflito entre o Brasil colonial e o recém-independente, que o poeta, como na hermenêutica cristã, estabelece paralelos entre fatos bíblicos e a história do Brasil. Assim é que o extermínio dos índios e a escravidão dos negros assemelham-se ao martírio de Cristo no Novo Testamento ou ao sacrifício de Isaac, na Escritura Judaica135. Cilaine Cunha, professora de Literatura da USP, publicou interessante trabalho – A Meditação Bíblica de Gonçalves Dias, onde destaca a criação de figuras da imaginação do poeta que encarnam vida e morte, luz e treva, crença e dúvida, o que lhe comprovam o caráter humanístico e a ética cristã, ou o proselitismo político e a pregação religiosa136. Certo é que, consciente da responsabilidade do intelectual, o poeta rebela-se contra o estamento político e teme a herança maldita da cultura portuguesa. Para Lúcia Pereira, Gonçalves Dias sentia tanto Deus na criação – que seus poemas de louvor à natureza quase não se apartavam dos de cunho religioso. É que a natureza o conduzia a Deus, ao seu Deus, ao Deus dos cristãos. Oh como é grande Senhor Deus, que os mundos equilibra nos ares; que vai do abismo aos céus, que susta as iras do Pélago fremente...137 E mais: Ao Deus prodigioso. Hino de amar a criação, que soa Eternal, incessante, Da noite no remanso, no ruído Do dia cintilante! 134 135 136 137

DIAS, Gonçalves. Ob, cit., p.135-7 CUNHA, Cilaine Alves. A ‘Meditação’ bíblica de Gonçalves Dias. Revista Limiar. Vol. 03, nº 5, 1º semestre de 2016. CUNHA, Cilaine Alves. Ob. Cit. Ideia de Deus (Primeiros Cantos), 1846.


A morte, as aflições, o espaço, o tempo, O que é para o Senhor? Eterno, imenso, que lh‘importa a sanha Do tempo roedor? Como um raio de luz, percorre o espaço, E tudo nota e vê – O arqueiro, os mundos, o universo, o justo; E o homem que não crê. Em carta a Teófilo, registra o poeta para a posteridade: "Mas Deus - (sinceramente o digo - porque hoje - sou cristão). Deus secou as lágrimas dos meus olhos - para que estas caindo gôta a gôta sôbre o meu coração mo calcinassem"138 O cenário? O Rio de Janeiro de 1800. E, apesar da generosidade dos amigos, dos cuidados do sogro médico (pai de Olímpia, a esposa) e até do Imperador (que teria pedido a um amigo comum que o levasse para fora do Rio de Janeiro, cuja atmosfera pesava, sufocava, piorava) era preocupante o estado de saúde do poeta. Ainda foi Gonçalves Dias à Europa em busca de amenos climas. E de lá, doente, sem dinheiro, saudoso do Maranhão e dos amigos, embarca no Ville de Boulogne, quase moribundo, o único passageiro além dos fortes marinheiros. Passou 53 dias no mar, solitário, silencioso, contemplativo, piorando dia-a-dia, até que o Ville de Boulogne no Baixio de Atins, próximo a Guimarães, partiu-se ao meio. Era o dia 3 de novembro de 1864. Salvou-se toda a tripulação. Para o passageiro da agonia, cumpre-se o presságio da morte no mar, ―este mesmo mar que foi para Gonçalves Dias quase uma obsessão‖. E como diz Lúcia Miguel 139: ―Cumpria-se ali o destino do homem e do poeta‖. Mas nesse instante que me está marcado Em que desta prisão fugir para sempre Irei tão alto, ó mar, Que lá não chegue teu sonoro mugir‖140. Em seu último poema, Minha Terra, escrito antes de voltar ao Brasil na Paris de 1864, mais uma vez o poeta enobrece o Maranhão. "Quanto é grato em terra estranha Sob um céu menos querido, Entre feições estrangeiras, Ver um rosto conhecido; [...] Depois de girar no mundo Como barco em crespo mar, Amiga praia nos chama Lá no horizonte a brilhar. E vendo os vales e os montes E a pátria que Deus nos deu, Possamos dizer contentes: Tudo isto que vejo é meu! Meu este sol que me aclara, Minha esta brisa, estes céus: 138 139 140

DIAS, Gonçalves. Ob, cit., p. 35-36. PEREIRA, Lúcia Miguel. 1901-1959. Ob, cit., p.458 O Mar (Primeiros Cantos), 1846.


Estas praias, bosques, fontes, Eu os conheço - são meus!". À época do falecimento de Gonçalves Dias, Machado de Assis, mestiço como o poeta do Maranhão, a quem devotava profunda admiração, dedicou-lhe crônica no Diário do Rio de Janeiro, em 09/11/1864. Depois de escrita e revista, chegou a notícia da morte de Gonçalves Dias, o grande poeta dos Cantos e dos Timbiras; a poesia nacional, cobre-se, portanto, de luto. Era Gonçalves Dias o seu mais prezado filho, aquele que de mais louçania a cobriu. Morreu no mar – túmulo imenso para o talento do poeta. Só me resta espaço para aplaudir a ideia que se vai realizar na capital do ilustre poeta. Não é um monumento para o Maranhão, é um monumento para o Brasil. A Nação inteira deve concorrer para ele141. Pelo conjunto da obra (poesia / teatro / ciência / epistolografia, dicionário) do poeta maior, no Maranhão já se tributou honra / apreço / admiração / preito / gratidão / louvor, a exemplo dos maranhenses Teixeira Mendes, Raimundo Correia, Coelho Neto, Agostinho Reis, Vespasiano Ramos, e mais tantos e tantos homens de cabeça pensante, de almas sensíveis, de brilhantes ideias, de irretocável linguagem, que renderam memoráveis odes ao maior lírico nacional de todos os tempos, para honra do Maranhão e do Brasil. Não se omitiu também em homenagear o modelo de glória nacional que foi/é Gonçalves Dias, meu tio trisavô Monsenhor João Tolentino Guedelha Mourão - meu patrono na Cadeira 38 da Academia Maranhense de Letras Jurídicas –, o que muito me orgulha. E o fez em publicação coletiva da Biblioteca Benedito Leite, em 1904, quando da celebração do quadragésimo aniversário de morte do poeta, contribuindo com o seu verbo fácil e inteligente a não deixar perecer-lhe a obra, inclusive aconselhando aos moços: ―Fazei reviver a memória do nosso Gonçalves Dias e imitai-o no que for verdadeiramente belo e imperecível‖142. E mais concitava a alma gonçalvina, o meu ancestral: ―na memória dos maranhenses é que o poeta deverá viver. Quem ler os suavíssimos versos do imortal cantor dos timbiras, todos impregnados dos aromas das nossas florestas, não lhe recusará lugar eminente entre os modelos da literatura nacional‖....e jaz esquecido! a sua estátua na pitoresca praça de Nossa Senhora dos Remédios, beijadas pelas brisas do Anil e cortejada pelas palmeiras que ele cantara, mas bastará esta homenagem muda, representada no mármore da estátua? Eis por que somos gonçalvinos, Senhoras e senhores! E com muito orgulho ostentamos (e devemos) o gentílico, que se origina do maior mito das letras brasileiras, maranhense com muito prazer. Senhoras, Senhores, Antecedeu-me nesta Cadeira nº 7 da Casa Maria Firmina dos Reis, WILSON PIRES FERRO. Pai da nossa querida confreira ANA LUÍZA, homem de letras que amou e muito amou o Maranhão, a exemplo do meu, do dele, do nosso Patrono, WILSON PIRES é filho de João Meireles Ferro e Isabel Pires Chaves Ferro, nasceu em 30 de julho de 1936, na Cidade de Coroatá-MA, e faleceu em 20 de janeiro de 2014, nesta Cidade de São Luís. Formado em Contabilidade, possuía bacharelado e licenciatura em Geografia e História e era pós-graduado em Segurança e Desenvolvimento. Exerceu o magistério nos ensinos médio e superior, empregado do Banco do Brasil e da Universidade Federal do Maranhão, onde desempenhou cargos de coordenador do Curso de História, chefe do Departamento de Geografia e História, administrador do Campus Universitário, diretor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) e diretor do Centro de Estudos Básicos (CEB). Ainda na UFMA, WILSON PIRES igualmente exerceu o cargo de assessor na Reitoria, no período de 1983-1985. 141 142 p. 13.

Diário do Rio de Janeiro – 09/11/1864 (in Biblioteca Nacional Digital Brasil – Hemoroteca Digital Brasileira). MOURÃO. João Tolentino Guedelha. Glorificação de Gonçalves Dias. Biblioteca Pública Benedito Leite, São Luís: 1962,


Autor de vários livros, entre os quais dois de contos para a juventude, um de histórias infantis, um de poesias, contendo a série ―Históricas‖, desde o descobrimento do Brasil até a sua Independência, e um sobre diversos aspectos da história e das tradições ludovicenses, WILSON PIRES também foi autor de vários artigos do livro ―França Equinocial: uma história de 400 anos, em textos, imagens, transcrições e comentários‖, organizado por nosso presidente Antônio Noberto, além de ter colaborado com os jornais O Imparcial e Estado de Minas e O Estado do Maranhão. Foi agraciado com a medalha comemorativa do Jubileu de Prata da UFMA, em 1991, e a comenda Gonçalves Dias, em 2013. Além de membro da União Brasileira de Escritores (UBE), o professor, historiador, contista e poeta, WILSON PIRES FERRO COSTA igualmente foi membro fundador desta Academia Ludovicense de Letras. Viveu intensamente na ―SÃO LUÍS QUATROCENTONA‖, para quem fez ―VERSOS E ANVERSOS‖, compôs hinos e ―ODE À CAPITAL GONÇALVINA‖; admirava as ―HISTÓRICAS SÃO LUÍS E ALCÂNTARA‖, dede quando ―ERA PEQUENINO‖ até as ―SOMBRAS DA NOITE‖, ao morrer; participou da vida cultural dessa nossa ―FRANÇA EQUINOCIAL‖. Passou pela vida e deixou pegadas fortes, fossem eternizadas por suas obras, fossem nas mentes dos seus discípulos. Foi professor de vida proba e laboriosa, respeitado pelo caráter e conhecimento. Para concluir, pode-se dizer: a confreira Ana Luíza tem berço, e berço nobre! Senhor Presidente. Digníssimas autoridades. Confreiras e confrades. Queridos familiares e amigos, espero ter cumprido a contento a missão de apresentar-lhes, com as merecidas honras, meus patrono e antecessor na Cadeira nº 7 desta Academia Ludovicense de Letras. Imaginem um homem feliz! Sou eu neste momento. Eis que se realiza o que me parecia uma doce utopia! Muito obrigado!


TUNTUENSE DESEMBARGADOR CLEONES CUNHA SE TORNA O MAIS NOVO IMORTAL ACADEMIA LUDOVICENSE DE LETRAS Publicado em 13 de junho de 2018 por pjnoticias 3

O desembargador Cleones Cunha, corregedor e vice-presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE/MA), tomou posse na Academia Ludovicense de Letras, onde passa a ocupar a cadeira nº 7, patroneada pelo poeta caxiense Antonio Gonçalves Dias. A cerimônia de posse foi prestigiada pelo presidente do Tribunal de Justiça do Maranhão, desembargador Joaquim Figueiredo e pelo vice-governador Carlos Brandão. ―É motivo de orgulho para o Judiciário ter na Academia Ludovicense de Letras um membro com a cultura do desembargador Cleones Cunha. Estamos felizes com sua posse e viemos aqui abraçá-lo e comemorar este importante momento da sua carreira literária‖, frisou Joaquim Figueiredo. ―Parabenizo o amigo Cleones Cunha, que tomou posse na cadeira n° 7, nesta noite, patroneada por ninguém menos que o grande Gonçalves Dias, se tornando o mais novo imortal da Academia Ludovicense de Letras‖, disse o vice-governador Carlos Brandão. A posse ocorreu na Associação dos Magistrados do Maranhão (AMMA), com a presença de confrades da Academia Ludovicense de Letras, dos desembargadores Lourival Serejo (vice-presidente do TJMA) e Paulo Velten (diretor da ESMAM), juízes, vereador Osmar Filho (vice-presidente da Câmara Munidipal de São Luís), convidados e familiares do novo imortal. A mesa de honra foi composta pelo presidente do TJMA, desembargador Joaquim Figueiredo; Carlos Brandão (vice-governador); Luiz Gonzada Martins Coelho (procurador-geral de Justiça); João Batista Ericeira (presidente da Academia de Letras Jurídicas e diretor da Escola Superior da Advocacia); Ângelo Santos (presidente da Associação dos Magistrados); Dom João Kot (bispo de Zé Doca). O desembargador Cleones Cunha, adentrou ao recinto, acompanhado dos acadêmicos Leopoldo Vaz, Ceres Fernandes, Ana Luíza Ferro e Osmar Gomes.


―Vivo um momento de muita alegria, satisfação e felicidade. Meu ingresso na academia é mais uma conquista, uma grande realização na área literária‖, assinalou Cleones Cunha, cujo discurso de posse recebeu muitos elogios dos convidados pela eloquência e riquezas de detalhe nos trechos sobre a vida de Gonçalves Dias. O presidente da Academia Ludovicense de Letras, Antônio Norberto, disse que o ingresso do desembargador Cleones Cunha, vem somar junto aos outros confrades, com seu grande conhecimento. O acadêmico Osmar Gomes dos Santos fez a apresentação do novo imortal da Academia Ludovicense de Letras. ―O desembargador Cleones Carvalho Cunha é um ícone da magistratura do Maranhão, das carreiras jurídicas e das letras do Estado. Vem trazer um valor muito importante para nossa academia‖, disse Osmar Gomes. Fonte: Blog do Minard


Antonio Ailton Dia 28/04, na #AMEI- Associação Maranhense de Escritores Independentes: Palestra/conversa sobre a poesia de Nauro Machado. A intenção é apresentar a poesia e alguns de seus temas fundamentais. Todos estão convidados.

A TRAVESSIA DOS INFERNOS PATÊMICOS NA TRILOGIA DANTESCA DE NAURO MACHADO Antonio Aílton Santos Silva (PPGL/UFPE) Dentre os variados caminhos abertos pela literatura para tratar das mais diversas faces e dimensões do mal (e dos males), um dos mais fortes e expressivos tem sido o que se refere à própria condição do ser humano em si, como condição terrível, absurda, irremediável, apenas suportável: condição de imperfeição, de limitação ante a natureza e a sociedade, o tempo e o espaço, o desejo e a vontade de verdade, de conhecimento e mesmo de poder. Essa abordagem da literatura, segue especificamente as raízes dos despedaçamentos míticos e trágicos e da sua produtividade pelo compartilhamento patêmico (ou na exacerbação das paixões, o patético), e tem servido até mesmo como um dos fundamentos discursivos da chamada ―filosofia do trágico‖, desenvolvida a partir do século XIX. O sofrimento, o πάθος (pathos), é espetacularizado na tragédia grega como sofrimento desmesurado que causa ―compaixão‖, ―desolação‖, ―piedade‖ (eleos) e ―temor‖, ―espanto de tremor‖ (phobos), e considerado na Retórica de Aristóteles como afecção receptiva da persuasão ou uma das três fontes de que procedem as premissas dos argumentos (ethos, pathos e logos), e que imprimem confiança subjetiva ao raciocínio. O filósofo defende, ali, que ―as emoções [paixões, πάθη) são as causas que fazem alterar os seres humanos e introduzem mudanças nos seus juízos, na medida em que elas comportam dor e prazer‖ (ARISTÓTELES, 2005, p. 160). Esse pathos, como afecção e resultado dos conflitos existenciais deslocados para a experiência cotidiana estendida entre ser e linguagem, mundo e corpo, pode aparecer assim no intervalo entre o circunstante, o vivido ou a vivência histórica e os construtos ideiais; os desmantelamentos humanos e um impulso de continuidade de vida; o perene e o perecível, sendo perspectivado como irremediável, raiz de uma visão da


condição humana vista como absurda. Ou, por outro lado, instaurado na dor e angústia da própria cisão sentida pelo sujeito, que precisa construir uma habitação possível do ―mesmo‖ com o ―si‖, nas contradições que aparecem sorrateiras, à meialuz, intrometendo-se das fissuras mais sombrias e insuspeitas. É neste sentido, na atualização de sua compreensão e produtividade que este sentimento pode ser visto como motor de uma certa lírica. Nesse caso, o fenômeno trágico se funda antes filosoficamente, como uma ―categoria capaz de apresentar a situação do homem no mundo, a essência da condição humana, a dimensão fundamental da existência MACHADO, 2006, p. 42-43), isto é, numa tragicidade presente no mundo como choque ou contradição, que, conforme Peter Szondi (2004) – só para reportar alguns autores – em Schelling pode aparecer como o conflito da liberdade humana com o poder do mundo objetivo; em Hegel como dialética da eticidade entre o universal e o particular, amor e lei (Antígona), concebendo que a substância ética se manifesta como pathos individual e base da ação individual; em Goethe como oposição irreconciliável entre o que o homem precisa querer e o que não tem o direito de querer; e em Nietzsche, a conciliação entre os princípios da embriaguez, do despedaçamento dionisíaco, e o que se afirma no princípio da objetivação da aparência e da forma apolínea. A partir dessas considerações, é que se aborda nesse trabalho a sombria e passional obra Trindade Dantesca (2012), do poeta maranhense Nauro Machado. Nauro nasceu em 1935, em São Luís do Maranhão. Publicou seu primeiro livro, Campo sem Base, em 1958, e, desde então, tem dedicado sua vida à poesia alcançando número recorde de mais de 40 livros já publicados. Além de constar em importantes antologias nacionais e internacionais, é detentor de prêmios importantes, inclusive da Academia Brasileira de Letras (1999) por sua Antologia Poética e conjunto da obra, e da União Brasileira de Escritores (2000). Talvez a importância maior de sua obra seja antes por sua profundidade e densa contribuição à poesia e à língua portuguesa que por seu reconhecimento ou mesmo reconhecimento dessa obra. Nome parco nos compêndios gerais da literatura circulante, dado certo isolamento e talvez uma escritura não exatamente popular – na esteira de uma poesia visceral voltada para as zonas obscuras e os estertores da intimidade humana, ao pathos trágico de um eu oprimido e sufocado, dirse-ia amaldiçoado. Trindade Dantesca é o coroamento de uma trajetória, mas uma trajetória que começou/que foi ―parida‖ lá em 1957-58, e se manteve fiel a uma proposta inicial, solidificando-se no decorrer de toda uma vasta produção. Para a compreensão desse fenômeno, é importante reportar um poema antológico do primeiro livro de Nauro: O Parto1 Meu corpo está completo, o homem - não o poeta. Mas eu quero e é necessário que me sofra e me solidifique em poeta, que destrua desde já o supérfluo e o ilusório e me alucine na essência de mim e das coisas, para depois, feliz e sofrido, mas verdadeiro, trazer-me à tona do poema com um grito de alarma e de alarde: ser poeta é duro e dura e consome toda uma existência. Há nesse poema duas proposições (ou constatações) marcantes que se constituirão num ―prima motor‖ de toda sua obra: 1) ―Meu corpo está completo, o homem - não o poeta‖, isto é, uma fissura entre o homem (feito, completo) e o poeta (incompleto), e 2) ―ser poeta é duro e dura/ e consome toda/ uma existência‖, isto é, o sofrimento ou a dureza da condição mesma do poeta face à existência, uma vez que essa incompletude, apesar de num poema inicial parecer ou mesmo poder significar inexperiência, algo que com o tempo será aperfeiçoado, completado, é, na verdade um fardo a ser carregado, inexorável e insaciável, em relação à vida daquele que a carrega como destino ou como fardo. O poeta, sempre incompleto, recomeça a cada nova obra. Pode-se entender isto ao se considerar que o poeta está incompleto na medida em que sua falta ou sua falha compartilha de uma falta muito mais profunda, a


insatisfação, a incapacidade mesma da linguagem de expressar o mundo, ao se inscrever no intervalo, ruptura entre as palavras e as coisas. Trindade Dantesca torna-se coroamento ou canto simbólico de um percurso que atingiu seu ponto culminante na medida em que, se essas constatações vão se constituir ao longo dos anos como temática sempre reiterada, nesse livro, elas são dadas por definitivas: ―já acabado, enfim completo/ como resto que alguém cobra/pela soma do alfabeto/para fazer-me sem sobra, cubro a palavra, que é um feto/para fazerme Verbo e Obra‖ (TD2, p. 11). Essa ―completude‖ será alçada, a partir de então, para a condição de uma mítica do poeta, a condição sisífica do eterno recomeço proporcionado pela poesia agora reconhecida como completude eternamente renovável, a parir-se, a buscar-se continuamente, recomeço aqui simbolizado pela imagem do mar: ―E pelo mar renovado/apesar de além ser findo/findando e após começado/e a se afundar, de novo indo/como um submarino nado/que pelo fim vai subindo‖ (TD, p. 11). Desde aí, é preciso se entender essa mítica do eterno retornar já como trágica, porque se institui sobre o sonho da eternidade só possível de realização pelo poético, isto é, pela linguagem justamente daquele que traz seu peso para o destino do homem (de carregá-lo), sendo o próprio sonho de eternidade um sonho trágico do homem, inscrito no limite e na limitação de em sua própria cisão e já reconhecida fragmentariedade, conforme diz Unamuno (1996, p. 38,39): ―Não ser tudo e para sempre é como não ser; pelo menos ser todo eu, e sê-lo para sempre. (...) Ser sempre, ser sem fim! Sede de ser, sede de ser mais! Fome de Deus! Sede de amor eternizante e eterno! Ser sempre! Ser Deus‖. No livro, o poeta construirá, através de três passos, ou três cantos, a temática irradiada da condição marginalizada e oprimida do poeta e o exílio do eu, e para isso há uma insistente recorrência (ou reiteração) da ideia do duplo, instaurada na cisão homem/poeta, ―Verbo e Obra‖. O duplo, como imagem especular do sujeito cindido, é ―aquele que caminha ao lado‖, ―companheiro de estrada‖, ―eu – o outro‖, ―eu – dois em um‖, ―eu – o mesmo‖, ―a homonímia ou a semelhança, a proximidade estranha assinalada pelo ―eu‖ que levanta a questão da identidade‖ (BRUNEL, 2005, p. 261) Num primeiro momento, dada a força que ela representa, poder-se-ia admitir a ideia do duplo ou como o tema central do livro, ou como um mito reconstruído, o mito do duplo, mas este não é o fim último do que é discursivamente conduzido no texto, já que o que o que se irradia na estrutura profunda, ordena e constitui nos três cantos uma força lamentosa, imprecativa, pela condição de condenado daquele que produz poesia: aquele que dedicou sua vida a isso como sacerdócio, ao final não passa de um pária, um condenado aos infernos, pela sociedade instituída sobre valores materiais, sobre uma linguagem que não é a sua. O poeta, nesse lamento, é o expurgo, o nadificado, o solitário, o exilado, e o que lhe resta é a pátria desgraçada do exílio: ―Se é só exílio quando o fora/faz-se dentro a própria ausência/para quem consigo mora,/ estrangeiro em sua existência,/ sou a pátria do exílio agora,/nela andando em minha essência‖; ou, ainda: ―(...) se a matéria ainda em vida/desenovela um defunto,/para fiar no chão a dívida/de quem com ela vai junto/pelos trapos de um Rei Midas/trocando ouro por presunto‖ (TD, p. 101;102). Sabe-se que o poema de Dante possui a simetria do número três. Este número é simbólico para o catolicismo porque se relaciona às pessoas da Trindade divina – o Pai, o Filho e o Espírito Santo. São três partes do poema dantiano3: Inferno, Purgatório e Paraíso, a primeira um canto introdutório mais 33 cantos de jornada,e a segunda e terceira, cada uma com 33 cantos. São, portanto, 99 cantos de jornada e um introdutório, totalizando 100. Os lugares descritos em cada livro são representados como tendo cada um nove ciclos, perfazendo outro número múltiplo de três, 27. Todos os cantos são em terça rima, ou seja, formam um entrelaçado em que os dois versos externos rimam entre si e o central fica órfão, encontrando seu apoio nos dois versos externos do terceto seguinte, deixando o outro verso central órfão, e assim sucessivamente. Essa estrutura dá movimento à forma do poema, como se pode perceber nos versos seguintes: No meio do caminho de nossa vida, (A) eu me encontrei por uma selva escura (B) donde a direita via foi suprimida. (A) Quanto a dizer qual era, é coisa dura (B) esta selva selvagem e áspera e forte, (C) que sequer pensá-la é renovar loucura!(B) É tanto mais amarga quanto a morte; (C)


mas para tratar do bem que aí vi (D) direi disto outra coisa mais consorte.4 (C) (...) Nauro, por sua vez, não utiliza a terça rima na obra em questão, nem o decassílabo, como Dante, mas redondilhas em estrofes de seis versos. Pode-se justificadamente supor que essa estrutura formal deve-se a uma relação estabelecida com outro poeta além de Dante: Gonçalves Dias, cuja Canção do Exílio é reinterpretada por Nauro tanto no poema-epígrafe do livro [Canção do (D)Exílio], já publicado em Opus da Agonia, de 1986, quanto no terceiro canto do Trindade, Pátria do Exílio – Exílio este que, se é simbolizado na poesia destes dois, foi também real na vida de Dante, que por questões políticas foi exilado de Florença em 13025, cidade à qual não voltaria jamais. Assim, em primeira instância, a tríade sugere a Trindade. As três partes do livro de Nauro também se tornam extremamente significativas, na medida em que cada parte torna-se um corte ou um recorte, uma face do seu profundo lamento do eu cindido e oprimido. Se uma das marcas formas de Dante é a estrutura rigorosa de seu sua terça rima que se prolonga ou poderia prolongar-se ad infinitum (ABA BCB CDC...), Nauro parece transportar esse esquema ternário para a macroestrutura do Trindade, no sentido de que da cisão de dois nasce ou renasce um terceiro, um órfão, um exilado, uma semente anátema em busca da eternidade. Assim, se lê: ―como quem morre e após nasça/de um duplo em nada parido,/eu recomeçasse assas-/sino de mim só nascido,/já que tudo eterno passa/e nasce após, renascido‖ (TD, p. 110). Ora, esse dilaceramento do espelho parece ser transposto macroestruturalmente para os três cantos. E embora não se possa estabelecer uma relação simples ou maniqueísta (porque em todo duplo há alternância dialética e traços da alteridade), pode entender o Primeiro Canto, A Rocha e a Rosca, como tendo por centro o ―homem‖, o cidadão, cujo papel é o da ―casa do poeta/da linguagem‖ e que tem de assumir-se ante a sociedade como poeta, o Outro. O corpo físico desse homem é, então, o ―cavalo‖, a rocha perfurada, o mortal, o ―cadáver adiado que procria‖ desvalorizado socialmente em razão de sua ―improdutividade‖ material, mas que almejaria eternizar-se no poeta, ou dele depende para ultrapassarse – ―Que o cadáver que em mim sou/e do qual agora beiro/possa viver no fim ou/possa eternizar-se inteiro/nesta casa que lhe dou/como inquilino meeiro‖ (TD, p. 32). O Segundo Canto, Pão Maligno com Miolo de Rosas, tendo como centro o poeta, naquele papel do duplomonstro, às vezes apresentado como sádico, o inferno íntimo, porque é a causa da ―marginalização‖ do cidadão como ser ―improdutivo‖. É importante lembrar as análises de Pierre Brunel sobre esse problema do antagonismo entre o ―ser de desejo e o eu social‖. Este, que era também um traço muito presente na poesia romântica, mas que os estudos de Sigmund Freud retomam na poesia moderna, ao estudar o choque entre o ―sujeito de desejo‖ com a personalidade, imagem imposta pela sociedade, isto é, ―a imagem de um eu ajustado que se exige daquele que persegue certas ambições na sociedade‖ (BRUNEL, 2005, p. 276), que se estabelece sobre um conflito. O que Brunel diz da obra de Dostoievski, pode se aplicar neste caso: ―o duplo, visto como perseguidor, porque tem as qualidades exigidas para a vida social, ao passo que o original se põe ou se sente à margem‖ (BRUNEL, 2005, p. 276). É o que estes versos respaldam: ―Difamando o próprio sol,/dele próprio sujo e cego,/e cego e sujo ele, o pó,/ no caixão com que o carrego/para dá-lo inteiro aos vermes/ a quem servirá já servo,/já escravo de quem serviu, e é/mestre do chão em mim, meu verbo‖ (TD, p. 45) – onde se pode entender, que ―caixão‖ é metáfora da corporalidade chã, mortal, simbolicamente a ―casa‖ dessa linguagem que perfaz, na poesia, a existência simbólica do poeta. Por fim, Pátria do Exílio é a geografia do lugar não receptivo: repete-se aqui a imagem daquela República platônica em que o poeta é excluído. É lugar excludente em que tanto o cidadão (por sua opção da poesia) quanto o poeta se sentem deserdados, menosprezados, malgrado seja a terra escolhida para viver e morrer: ―Ó terra má, flor de antraz,/ mãe madrasta e meretriz,/ dando à minha alma sem paz/ o que eu tenho e nunca quis/ no corpo que ainda em mim jaz/pisando o chão de São Luís!‖ (TD, p. 107). Esta Pátria dantesca que o homem e o poeta desejam como Paraíso não se mostra e se desdobra senão como ora como Purgatório onde o ser está atolado, ora como Inferno – inferno de esquecimento e abandono onde o ser deságua, como habitação de mortos que o poeta carrega, como uma nau que desce o Estige: ―náufragos todos, mais náu-/ fragos que os rios e os oceanos, conduzo-os na minha nau,/ comigo indo em dias e anos,/até calá-los com a cal/no próprio pó dos humanos‖ (TD, p. 111).


Pode-se, então, considerar que Nauro reitera e aprofunda a ideia do corpo do homem habitado pela potência de sua própria deidade sombria, na imagem somática e sangrenta da pátria tenebrosa, a pátria que exila. Na orquestração final da obra, acentuam-se os elementos com a quais já vem trabalhando ao longo de toda a sua produção poética, o duplo como motivo recorrente e constatável em tantas obras, não como algo menor, mas como elemento determinante ou inexorável em sua poesia, que serve para orquestrar e re-velar a fissura maior, e sem a qual a primeira cisão talvez não existisse: a fissura irremediável entre poeta e a sociedade, que tem como resultante o exílio e desprezo da poesia. Por outro lado, é sobre a dor e a morte, sobre o que é dado como acabado ou completo que se constrói a mítica da eternização do poeta, do renascimento da poesia como fôlego da vida e do eterno retorno da revoltada escritura. A leitura de Trindade Dantesca, importante e sintetizadora obra aponta e verte-se para as profundidades do eu, enquanto ser cindido em si mesmo, enquanto ser exilado pelo social, que exila e ou é exilado, e que por ser amaldiçoado, sombriamente amaldiçoa (há portanto claro um vestígio das poéticas do insólito e da revolta, sombrias, dos conflitos, da poesia romântica e crepuscular que vai do norte-americano William Blake ao Decadentismo finissecular francês: Porque a poesia nasce e se fecunda dos incontáveis conflitos que explodem nas regiões – seu domínio – onde se estabelece o contato da alma e da linguagem: ela é, então, maldição, mas tenta também re-voltar sua maldição, contra a sociedade, contra a civilização, contra os homens, contra Deus, contra a linguagem, às vezes contra ela mesma. Os poetas malditos, segundo a célebre formula de Verlaine, tornam-se, porque são malditos, poetas que maldizem. (LEMAIRE, 1982, p. 9 – tradução minha e grifo/destaque)6 Como uma espiral de abismos, essa poesia se centra e entranha cada vez mais, nas reviravoltas existenciais, viscerais, da angústia e da morte – representação lírica de um pathos trágico, infernal do ser humano, de labor sisífico, cujos infinitos só se aprofundam para devassar o ―eu‖, para explorar um mundo (poético) construído sobre a representação da ruína e do sofrimento. Nisso, guardadas as devidas proporções entre os gêneros, lembrando o que Flávio Kothe (1987) fala sobre o rebaixamento/tragicidade do herói pode-se ter situação análoga a este: que quanto mais esse herói é degradado do sublime ou do divino, mas se eleva em sua humanidade. Funda-se assim uma possibilidade de compreensão desse empreendimento lírico como um redimensionamento da proposta do trágico clássico, cuja relação de ―alívio‖ se fundamenta não só da identificação, mas, na cisão entre o que é ―verossímil‖ e o que é ―verdadeiro‖, pelo limite entre arte e vida real. O trágico agora o é, espantosamente, porque aparece como terrificantemente real nesse discurso: é o que é, não o que ―pode ser‖. E assim sendo, o espetáculo desta poesia mediando a conjunção conflituosa do homem-poeta e da linguagem apostrófica-imprecativa ao espaço das suas vivências, torna-se o espetáculo irônico do próprio real poeticamente desdobrado (ou representado) tal como a ―dor que deveras [se] sente‖ (Pessoa). O patêmico, que nos corresponde, apresenta-se então nessa poética como o compartilhamento de uma tragicidade existencial por via do lírico: é dor que sentimos como aquele ―que deveras sente‖, porque este ―espetáculo‖ é apresentado ou até mesmo dado como espetáculo da ironia do vivido (do existencial), não do fingido. Agora, aqui, no território da dor partilhada no paixão re-velada de nossa própria condição, de onde, das conjurações dos demônios e das sombras resgatamos nossos próprios infinitos. REFERÊNCIAS ARISTÓTELES. Obras completas: Retórica. 2ed. Coord. António Pedro Mesquita. Lisboa (PT): Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 2005. (Biblioteca de autores clássicos) BRUNEL, Pierre (Org.) Dicionário de Mitos Literários. 4ed. Trad. Carlos Sussekind et al. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005. KOTHE, Flávio. O Herói. 2 ed. São Paulo: Ática, 1987. (Série Princípios) LEMAIRE, Henri. La poésie depuis Baudelaire. Paris : Librairie Arman Colin, 1982 MACHADO, Nauro. Trindade Dantesca (poema). São Luís: Ed. do Autor, 2008. MACHADO, Roberto. O nascimento do trágico: de Schiller a Nietzsche. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006 SZONDI, Peter. Ensaio sobre o trágico. Trad. Pedro Süssekind. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004. (Estéticas)


UNAMUNO, Miguel de. Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 1996. Referências web : MACHADO, Nauro : O Parto. Disponível em: http://www.revista.agulha.nom.br/nauro.html#parto. Acesso em: 27/01/2014 EDUCATERRA. Dante Alighieri como político. Disponível em: http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/2002/10/06/000.htm. Acesso em: 30.01.2014 KALLIOPE. Dante Alighieri – Inferno, Canto 1. http://www.kalliope.org/en/digt.pl?longdid=dante2005050101. Acesso em 27.01.2014

NOTAS 1 Disponível em http://www.revista.agulha.nom.br/nauro.html#parto 2 TD: Trindade Dantesca [MACHADO, 2008]. 3 A preferência por este termo deve-se à diferença nas conotações semânticas de dantiano e dantesco. Enquanto o primeiro predicado pode ser significado como ―de Dante‖, o segundo pode receber conotações como ―infernal‖ e semelhantes. 4 ―Nel mezzo del cammin di nostra vita, //mi ritrovai per una selva oscura// ché la diritta via era smarrita.// Ahi quanto a dir qual era è cosa dura,//esta selva selvaggia e aspra e forte// che nel pensier rinova la paura!// Tant'è amara che poco è più morte;// ma per trattar del ben ch'i' vi trovai, dirò de l'altre cose ch'i' v'ho scorte.‖ (Tradução Minha) Cf. [Dante Alighieri – Inferno, Canto 1] http://www.kalliope.org/en/digt.pl?longdid=dante2005050101 5 Cf. http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/2002/10/06/000.htm 6 « Car La poésie naît et se féconde des les régions – son domaine – où s‘établit le contact de l‘âme et du langage : elle est alors malédiction, mais tente aussi de retourner sa malediction, contre la société, contre la civilisation, contre les hommes, contre Dieu, contre le langage, parfois contre elle même. Les poètes maudits, selon la formule célèbre de Verlaine, deviennent parce qu‘ils son maudits, des poètes qui maudissent. » (LEMAITRE, 1982, p. 9)




ANA LUIZA ALMEIDA FERRO

Prefรกcio da obra do prof. Agostinho Ramalho.


BRUNO TOMÉ

PH REVISTA –O ESTADO DO MARANHÃO – 14/05/2018


O ESTADO MA 19/05/2018



OSMAR GOMES DOS SANTOS




2018 Ano de GRAÇA ARANHA

A Academia Ludovicense de Letras (ALL) abrindo o ano de comemoração dos 150 anos de nascimento do escritor Graça Aranha. Uma belíssima palestra do professor Flaviano Menezes da Costa e duas apresentações culturais Um belo e concorrido evento ocorrido às 19h30 na Livraria e espaço cultural AMEI AMEI, no Shopping São Luís. Todo segundo sábado de cada mês a ALL realizará na AMEI um evento cultural de valorização da história e da literatura do Maranhão.








GRAÇA ARANHA É O PATRONO DA FEIRA DO LIVRO DE SÃO LUÍS 2018 Por wilsonmarques • sábado, 16 de junho de 2018 às 17:21 https://www.blogsoestado.com/wilsonmarques/2018/06/16/graca-aranha-e-o-patrono-da-feira-do-livro-desao-luis-2018/

O maranhense Graça Aranha será o patrono da Feira do Livro de São Luís (Felis) deste ano. Outros nomes foram cogitados, incluindo autores vivos e em atividade, mas a escolha acabou recaindo sobre o prémodernista. Filho de Maria da Glória da Graça e Temístocles da Silva Maciel Aranha, Graça Aranha nasceu em São Luís a 21 de julho de 1868. Transferiu-se para o Recife, onde formou-se em Direito, iniciando sua carreira na magistratura, assumindo o cargo de juiz no Espírito Santo. Viajou por diversos países, publicando na França o drama ―Malazerte‖. Já como escritor renomado, Graça Aranha teve forte presença na Semana de Arte Moderna de 1922, quando criticou de forma dura as instituições que tentavam manter regras estéticas com as quais a nova onda pretendia romper. Durante o evento, proferiu a palestra ―A emoção estética na arte moderna‖. Membro fundador da Academia Brasileira de Letras, teve violentos embates com a instituição, chegando a declarar que a sua criação tinha sido um erro. O confronto culminou, em 18 de outubro de 1924, com o desligamento do autor de Canaã da ABL, da qual se despediu com palavras não muito lisonjeiras: ―A Academia Brasileira morreu para mim, como também não existe para o pensamento e para a vida atual do Brasil. Se fui incoerente aí entrando e permanecendo, separo-me da Academia pela coerência.‖ Naquele mesmo ano, o acadêmico Afonso Celso tentou promover o retorno de Graça Aranha, num esforço que se mostraria inútil. Agradecendo o convite, o maranhense reiterou sua posição declarando que sua separação da Academia era definitiva. Ressalvou, no entanto, que ―de todos os nossos colegas me afastei sem o menor ressentimento pessoal e a todos sou muito grato pelas generosas manifestações em que exprimiram o pesar da nossa separação‖. Graça Aranha faleceu no Rio de Janeiro, RJ, em 26 de janeiro de 1931.


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AS DORES DO CRESCIMENTO CERES COSTA FERNANDES PUBLICDO EM O ESTADO MA 07/08 ABRIL 2018 Cidades são como crianças. Para crescerem, precisam enfrentar as dores do crescimento. Se as infantis sentem-se nos ossos, as urbanas vêm no bojo do progresso em forma de descaraterização ou morte de espaços ideais. As mudanças na urbe nos estremecem as raízes e enfraquecem as referências de sermos parte de um lugar, reconhecer, no rosto da cidade, o nosso próprio rosto. Fazer o quê? Talvez, realizar a química do familiar dentro do novo: sem recusar o progresso, guardar a alegria dos espaços e momentos perfeitos. Assim, acaricio amorosamente as imagens e lembranças marcantes da minha infância. Dia desses, passando pela fachada de faz-de-conta das Lojas Americanas, na Rua Grande, destaquei do conjunto a casa rosa – bem no lugar onde era a Mercearia Neves – e, no burburinho da rua e em meio aos gritos dos camelôs, liguei a máquina do tempo. Vi-me, então, em frente à antiga mercearia: rua tranquila, calçadas limpas, pessoas bem arrumadas (à época, nem os muito pobres iam às compras de chinelos ou shorts). Uma menina de uns seis ou sete anos, pela mão da avó, entra no salão da loja. Lá dentro, entre curiosa e encantada, olha as altas paredes forradas de prateleiras de madeira cheias de mercadorias, algumas requintadas para a São Luís daqueles anos: queijo cuia, tâmaras, bolachas cream crackers em latas enormes, biscoitos recheados em latas coloridas – tudo sempre em latas ou vidros. As embalagens modernas não existiam. E lá vem o próprio dono atendê-las, todo gentilezas. É seu Borges, um homem louro e elegante, sempre vestido de branco, mais parecendo um médico. A menina ganha uma maçã. Desconfio que prefira um chocolate. Mas as uvas, peras e maçãs, frutas raras – devido à falta de estradas, nos chegavam de avião –, eram o requinte da mesa. Caras, eram coisa para doentes ou para compor a ceia natalina. A visita à mercearia deve ter sido para uma compra especial. As compras in loco eram raras, pois a Mercearia Neves tinha o mais perfeito serviço de atendimento e entrega que jamais vi. Todos os dias, de manhã cedo, vinha um empregado da loja trazer a caderneta em que eram escritos os pedidos de compra. No meio da manhã, chegavam as mercadorias. Vinham num tabuleiro de madeira, equilibrado em uma rodilha de pano na cabeça do entregador, se a casa fosse próxima, ou trazido de caminhonete, se a casa fosse mais distante. Um dado interessante é que se comprava diariamente. Havia a entrega, não importava o valor da compra, sem acréscimo de preço. E se, em meio a algum processo culinário, faltava um ingrediente, era só telefonar e pronto. As compras podiam ser pagas no fim do mês, sem cartão, pré-datados, juros, coisa alguma. Só na confiança do cliente. No Natal, meu avô e meu pai, ganhavam brindes; mas os brindes de meu avô eram sempre melhores. Por conta, acho, de ele ser um grande freguês: tinha apenas treze filhos. Naqueles dias, o uso de geladeira era raro, guardar comida, nem pensar. A alimentação era comprada diariamente. Muito da energia familiar gastava-se no planejamento e confecção das refeições. A compensação é que, além dos secos e molhados, todo o resto oferecia-se de porta em porta: frutas, verduras, peixes frescos, aves, doces. Gaba-se, hoje, a comodidade das compras pela Internet e as entregas a domicílio. Sei não, mas o mercado virtual ainda deve levar um bocado de tempo para equiparar-se àquele do centro de São Luís. Podia-se pegar a mercadoria, sentir o cheiro das frutas, provar, escolher, ao som dos pregões: Veeerdureiro! Chega na pamonha!... Peeeixe friêsco!. Camareu!.. Em meio ao regateio de preços e às novidades contadas pelos ―fregueses‖ no seu saboroso linguajar. Uma feira andante. Com o empurrão de um cavalheiro, dá-se o clique. Retorno ao burburinho da Rua Grande. Não que eu despreze o mundo de variedades dos supermercados modernos: a gente entra com uma lista de vinte itens e sai com uma compra de quarenta. Consumista que sou, adoro. Mas não vou perdendo assim só aquela menina que guardava, ainda inteira, a capacidade de maravilhar-se com as coisas mais simples e achava que as grandes cidades do mundo eram aquelas onde havia mercearias neves, e as frutas, balas de coco, sorvetes, pirulitos e derressol fossem oferecidos nas portas. Acho que concordo com ela.


AS CEM MIL VAQUINHAS CERES COSTA FERNANDES

Meu pai tinha especial predileção por uma anedota aparentemente tola, a das Cem Mil Vaquinhas. É necessário conhecê-la para o bom entendimento da nossa conversa: ―Um homem de aparência humilde, roupas modestas, chapéu de palha, após horas na sala de espera de um banqueiro, é introduzido no seu gabinete. Mas pouco lhe adianta essa promoção, porque o banqueiro, sentado à uma enorme mesa, escreve de cabeça baixa e sequer levanta a vista à entrada de nosso personagem que, constrangido, quase colado à porta, permanece de pé rodando o chapéu nas mãos. A cena persiste por mais de vinte minutos: o caboclo de pé, chapéu na mão, ignorado e o banqueiro, cabeça baixa, escrevendo. Finalmente, o visitante cria coragem, Doutor, eu vim aqui tratar das minhas cem mil vaquinhas, como o senhor está muito ocupado, venho outra hora. Opera-se uma súbita transformação no banqueiro. Ele ergue a vista e pergunta, como disse? Cem mil vaquinhas? Sim, da minha fazendinha, mas já vou indo, não quero incomodar. De um salto, o magnata levanta-se e oferece uma cadeira. Sente-se, meu senhor. O caboclo, nada ingênuo, olha a cadeira e diz: sentem-se minhas cem mil vaquinhas.‖ Vale quem tem. A propósito, conheci um homem rude e semianalfabeto que preconizava, do alto de sua sabedoria cumulada de vivências amargas: Se um homem tem somente uma cabra, ele vale uma cabra; se tem uma cabra e um boi, ele vale uma cabra e um boi. Se não tem nada, não vale nada. E eu complemento, se tem cem mil vaquinhas, vale cem mil vaquinhas. E aí você, meu amigo, tem certeza de que as coisas que lhe são oferecidas, as considerações que recebe, o apoio, a ajuda e até o amor são devidos à sua pessoa, e não às suas cem mil vaquinhas? Ah, não tem? Eu também não. Que fazer então? Tentar separar o joio do trigo. Não deve ser tão difícil saber distinguir o que é nosso, por mérito e amizade, do que é devido somente às vaquinhas. É só pôr o desconfiômetro em ação. Mas isso só funciona se você não for uma pessoa daquelas de ego superinflado - o alvo predileto dos aproveitadores e puxa-sacos, que eles têm faro –, nesse caso, o amigo está fadado a só descobrir a diferença quando perder o cargo, ficar pobre ou não ser mais o detentor daquilo que interessa ao bajulador. Vamos que você consiga fazer essa distinção. Parabéns. Mas não vale ser tolo, não se trata aqui de afastar os puxa, lambaio também tem sua utilidade, carregar pastas, abrir portas, fazer-lhe elogios rasgados – quem gosta de críticas? –, jamais retrucar, concordar incondicionalmente com suas ideias, ouvir com admiração aquele poema xaroposo que escrito na adolescência. E por aí vai. Aproveite. Na sua família e entre seus amigos, você não vai encontrar ninguém que se preste a isso. O perigo é se deixar envolver e abrir a guarda. La Fontaine, na sua fábula ―O Corvo e a Raposa‖, nos conta como a raposa, cobiçando o queijo que o corvo, pousado em uma árvore, mantinha preso ao bico, mercê de falsos elogios à sua voz, o faz abrir o bico para cantar, soltando, assim, o objeto de desejo do esperto animal. Na moral da história, o mestre fabulista, nos ensina: ―Apprenez que tout flatteur vit aux dépens de celui qui l‘écoute, cette leçon vaut bien un fromage, sans doute‖. (Aprendei que todo bajulador vive às custas daquele que o escuta, esta lição vale bem um queijo, sem dúvida). Aproveite o elogio, mas não solte o queijo. Lembro da clara percepção do meu pai a esse respeito, em diversas ocasiões. Uma delas: um amigo importante frequentava a nossa casa aos domingos. Às vezes, empregados dispensados, meu pai pedia um café à minha mãe. Ele se adiantava, Deixe comigo, e seguia para a cozinha. Mamãe, no fundo, gostava, não era chegada a um fogão, mas se horrorizava, Não é possível, Fulano a passar café na cozinha! E papai, irônico, Deixa, Nega, o café não é para mim, é para as minhas cem mil vaquinhas. Depois da morte de meu pai, este dedicado amigo nunca apareceu para saber se minha mãe e os filhos precisavam de alguma coisa. A filosofia das vaquinhas me poupou de surpresas ou mágoas maiores em histórias velhas e recentes. As raposas protagonistas não se assustem. Não as contarei. Só lhes digo: Meninos, eu vivi.


O DESCREDENCIAMENTO DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão Academia Ludovicense de Letras Dino (1996; 2014)143, ao comentar que teve inicio, em 1939, um processo de destruição lenta e gradual da velha Faculdade, pergunta-se: quando precisamente? Donde começou? Quem assumiu a responsabilidade do processo de cassação da Faculdade de Direito do Maranhão? Para ele, não se sabe... Ninguém quis ou quer assumir oficialmente tal responsabilidade... Esse processo vem de antes de 1939, creio eu. A análise dos fatos dá como causa principal as mudanças políticas em decorrência da instalação do Estado Novo, e, principalmente as irregularidades que vinham acometendo a administração da Faculdade. Seu inicio, pois, está em 1930, quando o Governo Provisório do Norte decretou o encerramento das aulas; também como causa os concursos para professores catedráticos, iniciados naquele ano, que se apresentaram, no decorrer do período, eivado de vícios. Começa com a cátedra de Direito Civil, e se estende à de Direito Romano. Também contribuiram as constantes mudanças na legislação de ensino, principalmente no que se refere ao ingresso de novos acadêmicos, com ginasianos fazendo curso de habilitação complementar, pudessem, já, ao concluir a quinta série, após a realização de dois anos de Curso Complementar, ingressar no ensino superior. Motivo de avisos de irregularidades na sua execução; além do não cumprimento dos prazos de ingresso, de matriculas, de realização de provas, e de encerramento do ano letivo, o que era motivo de avisos por parte da Divisão de Ensino Superior. A Reforma ―Francisco Campos‖144 previa o fechamento dos institutos superiores que não implantassem os Cursos Complementares, para ingresso nos mesmos. Essa reforma, de 1931, [...] foi marcada pela articulação junto aos ideários do governo autoritário de Getúlio Vargas e seu projeto político ideológico, implantado sob a ditadura conhecida como ―Estado Novo‖. Dentre algumas medidas da Reforma Francisco Campos, estava a criação do Conselho Nacional de Educação e organização do ensino secundário e comercial. Este último foi destinado à ―formação do homem para todos os grandes setores da atividade nacional‖, construindo no seu espírito todo um ―sistema de hábitos, atitudes e comportamentos.‖ Dessa forma, Francisco Campos havia dividido o curso secundário em dois ciclos de cinco e dois anos, respectivamente, o primeiro fundamental, e o segundo complementar, orientado para as diferentes opções de carreira universitária. A lei de 1931 previa, ainda, a criação de um sistema nacional de inspeção do ensino secundário, a ser feito por uma rede de inspetores regionais. (MENEZES, SANTOS, 2001) 145

Somente em 1936 os Cursos Complementares foram criados no âmbito da Faculdade de Direito, embora fosse obrigação do Estado a sua implementação. 143 144

DINO, Sálvio. A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO. São Luis: EDUFMA, 1996; 2014 (2ª Ed.)

Nome da primeira reforma educacional de caráter nacional, realizada no início da Era Vargas (1930-1945), sob o comando do ministro da educação e saúde Francisco Campos. 145 MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais Helena dos. Verbete Reforma Francisco Campos. Dicionário Interativo da Educação Brasileira - Educabrasil. São Paulo: Midiamix, 2001. Disponível em: <http://www.educabrasil.com.br/reforma-francisco-campos/>. Acesso em: 26 de dez. 2017.


Intensa troca de correspondência entre a Diretoria da Faculdade de Direito do Maranhão e os representantes estaduais na Câmara dos Deputados, solicitando interferência na regularização da Faculdade, haja vista terem implantado o Curso Complementar, o que motivava, por parte da Divisão de Ensino Superior o seu fechamento, por falta de cumprimento da Lei em vigor. Em 1938, em discurso, o Sr. Ministro da Educação, referindo-se aos cursos superiores anunciava que haveria intensa fiscalização nos institutos, em especial os particulares, para sanar as irregularidades constatadas através das inspeções escolares. Um fato relevante foi a nomeação de João Soares de Quadros para Inspetor da Faculdade de Direito do Maranhão, por indicação do Interventor Federal Paulo Ramos. Cabe lembrar que foi esse advogado que, por quase um ano, assacara contra a direção da Faculdade, dizendo-se prejudicado pela comissão examinadora, quando de sua tentativa de ingresso como professor de Direito Civil. O Interventor Federal, por diversas vezes, reúne-se com o Departamento Nacional de Ensino, solicitando providencias quanto às ameaças de fechamento da Faculdade, com a cassação de seu credenciamento, por conta das irregularidades constatadas pelo Inspetor Federal junto à Faculdade, o Sr. Soares de Quadros. Assume a direção o dr. Oliveira Roma, e, junto com o Interventor Federal, dirige-se ao Rio de Janeiro, para tentar sanar as irregularidades apontadas; o Inspetor, então, renuncia à sua função. Mas os estragos já estavam feitos, quanto à credibilidade da Faculdade junto a Divisão de Ensino Superior. O ato de descredenciamento já havia sido votado e aprovado... Telegrama publicado a 12 de setembro de 1939 comunicava que a Faculdade de Direito do Maranhão fora desiquiparada pelo Conselho Superior de Ensino: O CASO DA FACULDADE DE DIREITO Rio (19). Voltou a ser discutido, na ultima reunião do Conselho Nacional de Educação o parecer n. 200, da comissão de ensino superior, referente à cassação das regalias que gosa a Faculdade de Direito do Maranhão. Esse parecer conclue pella aplicação da penalidade. O Conselheiro José da Fonseca apresentou uma emenda que foi aprovada contra os votos dos conselheiros srs. Reynaldo Rocha, Cesario Andrade e Parreiras Horta, para que fique adiada a applicação da cassação de reconhecimento, até o fim do corrente anno, procedendo-se, então, a uma verificação, cujo resultado será enviado ao Conselho, para deliberação definitiva.(O IMPARCIAL, 20/09).

Após interferência do Interventor Federal, a pedido da diretoria da Faculdade de Direito, e de telegramas mandados pelo Diretório Acadêmico a diversas autoridades federais – Ministro da Educação, Presidente da República, e bancada maranhense, Paulo Ramos recebeu o seguinte telegrama: RIO, 3 – Off. Interventor Paulo Ramos. Recebi e li com apreço seu telegramma no. 214 sobre situação Faculdade de Direito do Maranhão. Creio que resolução final votada pelo Conselho Nacional de Educação e por mim homologada permitte encaminhamento satisfactorio assumpto, pois manda submeter Faculdade a fiscalização por funcionário idôneo, designado pelo Departamento Nacional Educação. Resultado dessa investigação manifestara governo a resolver em definitivo. [...]

Note-se, no telegrama, ―submeter à fiscalização por funcionário idôneo‖, designado pelo Departamento Nacional de Educação. Estava-se colocando sob suspeita o relatório do Fiscal Federal, dr. Soares de Quadros? Aquele que fora nomeado a pedido do próprio Interventor Federal? E que solicitara sua demissão, da função, poucos meses depois de nomeado – menos de seis meses – quando ‗estourou‘ o descredenciamento da faculdade, por irregularidades?


Mas não só a Faculdade de Direito; de acordo com Costa (2017) 146, a Faculdade de Farmácia e Odontologia também foi levada a encerrar suas atividades. As razões atribuídas pelo Departamento Nacional de Ensino para o fechamento de ambas foram as irregularidades administrativas. Há questionamentos quanto a tal versão, atribuindo essa ação a motivações políticas e não a problemas de caráter eminentemente técnico-administrativo. Dino (1996, p. 76-77)147 relata: A chamada História Oficial conta que as razões cassatórias foram de caráter eminentemente técnico-administrativo. [...] Um outra corrente de pensamento sustenta não se poder buscar as primas causas da cassação da velha Faculdade de Direito sem a análise histórica da presença ostensiva do Estado Novo nos setores cultural, econômico e educacional em terras maranhenses.

Ao se voltar o olhar para a conjuntura da década de 1930, Costa (2017)148 afirma que esse período inaugura outra etapa do ensino superior no país e, conseqüentemente, no Maranhão, decorrente das profundas mudanças no cenário político e educacional, resultante do governo Vargas (1930-1945). Surge, então, um aparelho de Estado centralizador no intento de estabelecer seu projeto nacionalista. Para Cunha (2017), o período de 1937 a 1945 assinalou a nova fase política e educacional do país, caracterizadas por um conjunto de reformas educativas, que ficaram conhecidas como Leis Orgânicas de Ensino ou Reforma Capanema (MARTINS, 2002)149: Em nome do princípio da autoridade e da disciplina, decisões são tomadas e a autonomia universitária é negada. Entre os objetivos explicitados por esta nova ordenação jurídica e administrativa (Estado Novo), [...] estavam as perspectivas de ordenamento da educação; a definição de competências entre os diferentes estratos de governo (municípios, estados e união); articulação entre os diferentes ramos de ensino e a implantação de uma rede de ensino profissionalizante. (CUNHA, 1980, p. 14)150.

Informa Rossi Corrêa (1993) No Maranhão, o estado novismo encontrou Paulo Ramos investido da primeira magistratura, e prontamente, o transformou em Interventor Federal. Foi o princípio de um processo de redefinição administrativa, carregado de peculiaridades, que, permanece necessitado de inteligências críticas e plásticas, capacitadas a decodificá-lo, com a disciplina dos preconceitos e dos comprometimentos. Qual foi a estratégia política de Paulo Ramos? Foi exatamente a de produção e consolidação de uma convincente autonomia administrativa, que promovesse o distanciamento gradativo dos tradicionais litigantes oligárquicos da máquina do Estado. As providências do elaborado taticismo resultaram no surgimento de uma consciência beligerante de combates: e os soldados, outros não foram, senão os intelectuais. Paulo Ramos promoveu uma reorganização administrativa, que compreendeu o funcionamento burocrático dos instrumentos do serviço público, sob o símbolo da austeridade vigilante do Interventor Federal. O moralismo de conteúdo simpático à pequena burguesia representou uma atividade legitimidade, dirigida para os agrupamentos cartoriais, procurando colocá-los em situação secundária, quanto ao instalado exercício particular do poder público. (CORRÊA, 1993, p. 207-208)151.

Até meados de agosto, tudo parecia estar ocorrendo conforme os acordos políticos e a intervenção do Interventor federal: 146

COSTA, Marcia Cordeiro. A GÊNESE DA EDUCAÇÃO EM NÍVEL SUPERIOR NO ESTADO DO MARANHÃO E POLÍTICA EDUCACIONAL: os embates travados pela sua efetivação e consolidação. VIII JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. São Luis, 22 a 25 de agosto de 2017, UFMA/Programa de Pósgraduação em Políticas Públicas 147 DINO, Sálvio. A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO (1918-1941). São Luis: EDUFMA, 1996; 2ª edição 2014. 148 COSTA, 2017, obra citada 149 MARTINS, A. C. P. Ensino superior no Brasil: da descoberta aos dias atuais. ACTA CIRÚRGICA BRASILEIRA, v. 17, São Paulo, 2002. Suplemento 3, citado por Cunha, 2017, obra citada 150 CUNHA, L. A. A universidade temporã: o ensino superior da colônia à era de Vargas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980, citado por COSTA, 2017.


NÃO SERÁ FECHADA A FACULDADE DE DIREITO RIO (21) Serviço especial.- o Dr. Oliveira Roma falando ao representante de O IMPARCIAL, declarou que a Faculdade de Direito do Maranhão não será fechada. Essa decisão foi garantida pelo Sr. Abguar Ransut, Diretor do Departamento Nacional de Educação. O dr. Oliveira Roma declarou, igualmente, que foram regularizados os casos dos cursos secundários superiores, do Maranhão, considerados defeituosos.(O IMPARCIAL, 20/08/1941)

No entanto, a 03/10, em nota, ―O Imparcial‖ se referia a insistentes noticias que chegavam, de que sairia parecer opinando pelo fechamento da Faculdade de Direito. Então, adveio o Decreto n. 8.085 de 21 de outubro de 1941, que cassou o reconhecimento da Faculdade de Direito... Em conseqüência, foi forçada a fechar definitivamente suas portas, [...] ―sendo seus arquivos recolhidos também ao Ministério e garantido, igualmente a seus alunos que se transferissem por escolas similares em outros estados.‖ (MEIRELLES, 1995, p. 67)152. Voltemos a Sálvio Dino (1996; 2014): [...] por que tanta ‗ingenuidade‘? Será que nossos os nossos doutos catedráticos nem ao menos desconfiavam de alguma trama contra o funcionamento da velha Academia? Não tinham um diálogo aberto, franco, sincero com o inspetor federal Soares Quadros, que fora nomeado por expressa recomendação do interventor Paulo Martins de Sousa Ramos? Não sentiram o menor cheiro de maquiavelismo na história da repentina cassação do reconhecimento da nossa Salamanca? (2014, p. 110).

Surgem, pois, as duas versões. A primeira, de caráter eminentemente técnico-administrativo – as irregularidades encontradas no cumprimento das leis, portarias, resoluções e avisos emanados do Ministério da Educação e seu Departamento Nacional de Educação, e da Divisão de Ensino Superior. Dino (1996; 2014) refere-se à entrevista que fez com Fernando Perdigão, que confirmou que a Faculdade teve o seu reconhecimento cassado em virtude de irregularidades administrativas detectadas pelo Ministério da Educação (p. 111). A segunda, consubstancia-se na conjunta do Estado-Novo e sua presença ostensiva nos setores cultural, econômico e educacional em terras maranhenses (p. 113). Dino baseia-se no entendimento da profa. Maria Regina Nina Rodrigues (1993)153, que afirma: [...] Vargas afirmava, num dos seus discursos, que o Estado deveria assumir a suprema direção da educação nacional, fixando os seus principais fundamentos e controlando a sua execução, de modo que todas as atividades educacionais do país, de caráter federal, estadual, municipal ou privado, fossem dirigidas pela mesma disciplina. No Código da Educação Nacional seriam estabelecidos os princípios gerais da organização e fundamento de todo o aparelho educativo do país. O centralismo e o autoritarismo expresso nessa fala do presidente já constara na própria Constituição de 1937, na qual dedicou um capitulo especifico sobre as questões da Educação. (p. 146, Dino, p. 113.

Barros (?) 154 considera ser importante destacar que, entre as décadas de 30 e 40, o fenômeno de aliciamento de poetas, romancistas e ensaístas foi um fenômeno nacional. Com Paulo Ramos, a máquina do Estado foi expandida. Houve um crescimento das instituições públicas. Surgiu um mercado de trabalho mais típico dos intelectuais. Estes, antes ―reclusos à existência vacilante da boemia, de mestre-escola e do jornalismo provinciano‖ passaram a ―compartilhar das responsabilidades administrativas do Estado‖ (CORRÊA, 1993): 151

CORRÊA, Rossini. Os acadêmicos da democracia autoritária, Victorino Freire, cidadão maranhense, e os de 45 na decolagem da utopia. In:____. FORMAÇÃO SOCIAL DO MARANHÃO: O PRESENTE DE UMA ARQUEOLOGIA. São Luís: SIOGE, 1993. cap. 5. 152 MEIRELLES, Mario M. DEZ ESTUDOS HISTÓRICOS. São Luís: Alumar, 1995. 153 RODRIGUES, Maria Regina Nina. MARANHÃO: DO EUROPEÍSMO AO NACIONALISMO: POLÍTICA E EDUCAÇÃO. São Luis: Plano Editorial SECMA, 1993. 154 BARROS, Antonio Evaldo Almeida. INVOCANDO DEUSES NO TEMPLO ATENIENSE: (Re) inventando tradições e identidades no Maranhão (1940-1960). Outros Tempos, www.outrostempos.uema.br, volume 03, p.156-181


Paulo Ramos foi encontrar os intelectuais do Maranhão na Academia Maranhense de Letras (AML), ―instituição concentradora da inteligência e dos mecanismos regulares e legitimados de um hipotético reconhecimento das qualidades literárias‖. No contexto estado-novista, vários foram os intelectuais maranhenses que se destacaram no exercício da atividade pública, entre os quais, Agnello Costa, Clodoaldo Cardoso, Ribamar Pinheiro, Astolfo Serra, Luso Torres, Oliveira Roma e Nascimento Moraes. Tais intelectuais justificavam o Estado Novo enumerando suas 155 conseqüências positivas (CORRÊA, 1993, p. 209-219) .

Rodrigues (1993)156 relaciona alguns intelectuais, ligados de alguma forma à Faculdade de Direito, que vieram ocupar cargos na administração estadual: Clodoaldo Cardoso (diretor da fazenda do Estado); Agnello Costa (diretor do Departamento Estadual de Imprensa e propaganda); Astolfo Serra (diretor da junta Comercial e orador do Sindicato Maranhense de Imprensa); Luso Torres (membro do Conselho Técnico de Economia e Finanças); Nascimento Morais (catedrático do Liceu Maranhense e presidente da Academia Maranhense de Letras); Oliveira Roma (diretor da Escola de Economia)... (p. 105, Dino, p. 117-118). Para Dino (1996; 2014), era: [...] por demais natural que o interventor procurasse um meio adequado a fim de fechar um estabelecimento de ensino que não possuía a menor afinidade ideológica com os princípios norteadores do chamado Estado Nacional. [...] considerava o comunismo maldito e sinistro, não haveria melhor caminho para a cassação da Faculdade de Direito do que se alegar, embora de maneira sub-reptícia, o envolvimento da ‗1doutrina satânica‘ na vida da velha escola da Rua do Sol. (2014, p. 120.).

Para Dino (1996; 2014), a vertente política consubstancia-se em depoimento que colheu de Ignácio de Mourão Rangel; quando, ainda jovem revolucionário, foi preso e encaminhado para as masmorras da ditadura Vargas, ao lado de Joaquim Mochel, Fernando Perdigão, Antonio Bona e Clarindo Santiago: ―a Faculdade de Direito fechou porque eu voltei para estudar direito, tinha preparado meu segundo, terceiro quarto ano...‖ (p. 122-121, 2014). O motivo: realizações de eleições para Rainha dos Estudantes, da qual o ilustre Rangel estava organizando. Creio não ser isso, pois desde o inicio da década de 1930, a Faculdade de Direito vinha participando dessas eleições de ‗rainha dos estudantes‘, inclusive com uma sua representante sendo eleita, através de voto (1936); a promoção era de um jornal local que publicava as ‗papeletas‘ para serem recortadas e colocadas em urna. Referindo-se ao conflito ‗esquerda‘ e ‗direita‘, que aparece destacado pela primeira vez no ano de 1936, com duas chapas, pela primeira vez concorrendo ao Diretório Acadêmico, acabou com um acordo entre as ‗facções‘, unindo-se as ‗diretorias‘, dividindo-se os cargos (A Pacotilha, 12 de agosto de 1936). Quanto à questão financeira, de há muito vinham os cortes – desde meados da década de 1920 – da subvenção à que a faculdade fazia jus, seja federal, seja estadual ou municipal; mas sempre, ao final do ano, alguma verba era-lhe destinada, e em nenhum tempo de sua existência deixou-se de pagar o salário dos professores e funcionários, assim como às suas dívidas. Praticamente vivia das doações, em especial do comércio, e da contribuição mensal de seus alunos – mensalidades -, e, muitas das vezes, diante dos apertos financeiros, os professores renunciavam aos seus salários, em benefício do funcionamento regular do instituto superior. Concordo com Dino de que esse não foi o motivo... Quanto às irregularidades, no tocante ao ingresso de professores, tenho minhas dúvidas, haja vista as constantes denúncias, e exames que se arrastavam por anos, como o foram os de Direito Civil, e Direito Romano... o ‗convite‘ através de contrato, para cumprir o ano letivo, e muitas das vezes recusado pelo 155

CORRÊA, Rossini. FORMAÇÃO SOCIAL DO MARANHÃO: O PRESENTE DE UMA ARQUEOLOGIA. São Luis: SIOGE, 1993. RODRIGUES, Maria Regina Nina. MARANHÃO: DO EUROPEÍSMO AO NACIONALISMO: POLÍTICA E EDUCAÇÃO. São Luis: Plano Editorial SECMA, 1993. 156


convidado, e a disciplina então distribuída para professor da casa, para não prejudicar os alunos, também não pode ser considerada motivo, mesmo com o relatório de Soares Quadros, parte interessada... No ingresso de alunos ao primeiro ano, também se coloca dúvida, ser este o motivo. Principalmente porque as normas de ingresso mudavam, até mesmo, algumas vezes, dentro do ano letivo por mais de uma vez, e, em virtude, os prazos nem sempre eram cumpridos, mas as normas diziam que poderiam ser as matriculas provisórias, comprovando-se sua regularidade após o inicio do ano letivo... Todas essas alegações eram falsas! No corpo do decreto não se encontram especificados quais os itens que foram violados pela tradicional Faculdade de Direito do Maranhão. Para Dino (1996; 2014) não houve violação de preceito legal. ―Houve, sim, uma manifesta vontade política de cassar a Salamanca maranhense‖ (p. 143, 2014). Assim, se encerrou a primeira fase do ensino jurídico no Maranhão...


A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO FRENTE À LEGISLAÇÃO DE ENSINO – 1918/1941

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão Academia Ludovicense de Letras

Em 2018 comemora-se o centenário da criação da ―Faculdade de Direito do Maranhão‖, fato ocorrido a 28 de abril de 1918. Depois de 23 anos de funcionamento, vem notícia de seu descredenciamento, causado por irregularidades, segundo as autoridades de ensino da época, porém nunca explicitadas, causando o encerramento de suas atividades. Dino (1996; 2014)157, comenta que teve inicio já em 1939 um processo de destruição lenta e gradual da velha Faculdade. Pergunta: quando precisamente? Donde começou? Quem assumiu a responsabilidade do processo de cassação da Faculdade de Direito do Maranhão? Para ele, não se sabe... Ninguém quis ou quer assumir oficialmente tal responsabilidade... Esse processo vem de antes de 1939, creio eu. A análise dos fatos dá como causa principal as mudanças políticas em decorrência da instalação do Estado Novo158, e, principalmente as irregularidades que vinham acometendo a administração. Seu inicio, pois, está em 1930, quando o Governo Provisório do Norte decretou o encerramento das aulas; também, como causas, os concursos para professores catedráticos, iniciados naquele ano, que se apresentaram, no decorrer do período, eivado de vícios. Como contribuiu as constantes mudanças na legislação de ensino, principalmente no que se refere ao ingresso de novos acadêmicos, com ginasianos fazendo curso de habilitação complementar ao concluir a quinta série, e após realização de dois anos de Cursos Complementares. Motivo de avisos de irregularidades na sua execução, além do não cumprimento dos prazos, de ingresso, de matriculas, de realização de provas, e de encerramento do ano letivo, constantemente descumpridos, o que era motivo de avisos por parte da Divisão de Ensino Superior. A Reforma ―Francisco Campos‖159 previa o fechamento dos institutos superiores que não implantassem os Cursos Complementares, para ingresso nos mesmos. Essa reforma, de 1931, [...] foi marcada pela articulação junto aos ideários do governo autoritário de Getúlio Vargas e seu projeto político ideológico, implantado sob a ditadura conhecida como ―Estado Novo‖. Dentre algumas medidas da Reforma Francisco Campos, estava a criação do Conselho Nacional 157

DINO, Sálvio. A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO (1918-1941). São Luis: EDUFMA, 1996; 2ª edição 2014. Ao se voltar o olhar para a conjuntura da década de 1930, Costa (2017) afirma que esse período inaugura outra etapa do ensino superior no país e, consequentemente, no Maranhão, decorrente das profundas mudanças no cenário político e educacional, resultante do governo Vargas (1930-1945). Surge, então, um aparelho de Estado centralizador no intento de estabelecer seu projeto nacionalista. COSTA, Marcia Cordeiro. A GÊNESE DA EDUCAÇÃO EM NÍVEL SUPERIOR NO ESTADO DO MARANHÃO E POLÍTICA EDUCACIONAL: os embates travados pela sua efetivação e consolidação. VIII JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. São Luis, 22 a 25 de agosto de 2017, UFMA/Programa de Pós-graduação em Políticas Públicas Para Cunha (2017), o período de 1937 a 1945 assinalou a nova fase política e educacional do país, caracterizadas por um conjunto de reformas educativas, que ficaram conhecidas como Leis Orgânicas de Ensino ou Reforma Capanema (MARTINS, 2002). CUNHA, L. A. A UNIVERSIDADE TEMPORÃ: O ENSINO SUPERIOR DA COLÔNIA À ERA DE VARGAS. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980; MARTINS, A. C. P. Ensino superior no Brasil: da descoberta aos dias atuais. ACTA CIRÚRGICA BRASILEIRA, v. 17, São Paulo, 2002. 159 Nome da primeira reforma educacional de caráter nacional, realizada no início da Era Vargas (1930-1945), sob o comando do ministro da educação e saúde Francisco Campos. 158


de Educação e organização do ensino secundário e comercial. Este último foi destinado à ―formação do homem para todos os grandes setores da atividade nacional‖, construindo no seu espírito todo um ―sistema de hábitos, atitudes e comportamentos.‖ Dessa forma, Francisco Campos havia dividido o curso secundário em dois ciclos de cinco e dois anos, respectivamente, o primeiro fundamental, e o segundo complementar, orientado para as diferentes opções de carreira universitária. A lei de 1931 previa, ainda, a criação de um sistema nacional de inspeção do ensino secundário, a ser feito por uma rede de inspetores regionais. (MENEZES, SANTOS, 2001) 160

Somente em 1936 os Cursos Complementares foram criados no âmbito da Faculdade de Direito, embora fosse obrigação do Estado a sua implementação. Houve intensa troca de correspondência entre a Diretoria da Faculdade de Direito do Maranhão e os representantes estaduais na Câmara dos Deputados, solicitando interferência na regularização da Faculdade, haja vista terem implantado o Curso Complementar. Em 1938, em discurso o Sr. Ministro da Educação, referindo-se aos cursos superiores, anunciava que haveria intensa fiscalização nos institutos, em especial os particulares, para sanar as irregularidades constatadas através das inspeções escolares, inclusive, se necessário, com o fechamento dos mesmos. O CASO DA FACULDADE DE DIREITO Rio (19). Voltou a ser discutido, na ultima reunião do Conselho Nacional de Educação o parecer n. 200, da comissão de ensino superior, referente à cassação das regalias que gosa a Faculdade de Direito do Maranhão. Esse parecer conclue pella aplicação da penalidade. [...](O IMPARCIAL, 20/09).

Após interferência do Interventor Federal, a pedido da diretoria da Faculdade de Direito, e de telegramas mandados pelo Diretório Acadêmico a diversas autoridades federais – Ministro da Educação, Presidente da República, e bancada maranhense, Paulo Ramos recebeu o seguinte telegrama: RIO, 3 – Off. Interventor Paulo Ramos. Recebi e li com apreço seu telegramma no. 214 sobre situação Faculdade de Direito do Maranhão. Creio que resolução final votada pelo Conselho Nacional de Educação e por mim homologada permitte encaminhamento satisfactorio assumpto, pois manda submeter Faculdade a fiscalização por funcionário idôneo, designado pelo Departamento Nacional Educação. Resultado dessa investigação manifestara governo a resolver em definitivo. [...]

Note-se, no telegrama, ―submeter à fiscalização por funcionário idôneo‖, designado pelo Departamento Nacional de Educação. Estava-se colocando sob suspeita o relatório do Fiscal Federal, dr. Soares de Quadros? Aquele que fora nomeado a pedido do próprio Interventor Federal? E que solicitara sua demissão, da função, poucos meses depois de nomeado, quando ‗estourou‘ o descredenciamento da Faculdade, por irregularidades? Na nomeação do Sr. Soares de Quadros o próprio Interventor Federal descumpriu a legislação em que se instituía a função de Inspetor Federal, e suas atribuições161·... 160

MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais Helena dos. Verbete Reforma Francisco Campos. Dicionário Interativo da Educação Brasileira - Educabrasil. São Paulo: Midiamix, 2001. Disponível em: <http://www.educabrasil.com.br/reforma-francisco-campos/>. Acesso em: 26 de dez. 2017. 161 O Decreto nº 11.530, de 18 de Março de 1915, que reorganizou o ensino secundário e o superior na Republica, em seu artigo 13 estabelece a figura do Inspetor de Ensino, com as seguintes atribuições: Art. 14. O inspector inquirirá, por todos os meios ao seu alcance, inclusive o exame de toda a escripta do instituto: a) se este funcciona regularmente ha mais de cinco annos; b) se ha moralidade nas distribuições de notas de exames; c) se os professores manteem cursos particulares frequentados pelos alumnos da academia; d) se as materias constantes dos programmas são suficientes para os cursos de Engenharia, Direito, Medicina ou Pharmacia;


Há questionamentos quanto a tal versão, atribuindo essa ação a motivações políticas e não a problemas de caráter eminentemente técnico-administrativo. Dino (1996, p. 76-77)162 relata: A chamada História Oficial conta que as razões cassatórias foram de caráter eminentemente técnico-administrativo. [...] Uma outra corrente de pensamento sustenta não se poder buscar as primas causas da cassação da velha Faculdade de Direito sem a análise histórica da presença ostensiva do Estado Novo nos setores cultural, econômico e educacional em terras maranhenses.

A LEGISLAÇÃO DE ENSINO SUPERIOR E OS CURSOS JURÍDICOS Em Maranhão, já se tentara a implantação de uma Universidade – a Nova Atenas, antes denominada Atlântida -, sonho de Sousândrade, já constante da Constituição de 1890, em seu artigo 84. Depois, não aprovada na nova carta estadual, em 1894 novas tentativas. Dentre os cursos propostos, o de Direito. Certamente Sousândrade estava atento ao disposto no DECRETO N. 1232 H - DE 2 DE JANEIRO DE 1891 - Approva o regulamento das Instituições de Ensino Jurídico, dependentes do Ministério da Instrucção Publica163: O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituído pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, resolve approvar, para as Instituições de Ensino Jurídico, dependentes do Ministerio da Instrucção Publica, o regulamento que a este acompanha, assignado pelo General de brigada Benjamin Constant Botelho de Magalhães, Ministro e Secretario de Estado dos Negócios da Instrucção Publica, Correios e Telegraphos, que assim o faça executar. REGULAMENTO PARA AS INSTITUIÇÕES DE ENSINO JURIDICO DEPENDENTES DO MINISTERIO DA INSTRUCÇÃO PUBLICA Art. 1º Para diffusão do ensino juridico manterá o Governo Federal as actuaes Faculdades de Direito e poderá fundar ou subvencionar outras que julgue necessarias.

e) se, pelo menos, tres quartas partes do programma de cada materia são effectivamente explicadas pelo respectivo professor; f) se ha exame vestibular e se é este rigoroso; g) se a academia possue os laboratorios indispensaveis e se estes são utilizados convenientemente; h) se o corpo docente é escolhido pelo processo de concurso de provas estabelecido na presente lei; i) se as rendas da academia são sufficientes para o custeio de um ensino integral, das materias do curso, ministrado por professores sufficientemente remunerados; j) se a quota de fiscalização é depositada na época legal Art. 15. O inspector apresentará relatorio circumstanciado sobre o que houver visto e colligido a respeito do instituto e, na falta de qualquer dos requisitos enumerados no artigo antecedente, concluirá por aconselhar que se não conceda a pretendida equiparação ás academias mantidas pelo Governo Federal. Art. 16. Não será inspector pessoa ligada por affinidade de qualquer natureza aos directores ou professores da academia, e, quando possivel, não residirá siquer no Estado em que o instituto funccionar. Art. 17. Considera-se terminada a inspecção com o julgamento do relatorio pelo Conselho Superior do Ensino. [...] Art. 19. A nomeação de inspector será annual, embora possa o Conselho designar o mesmo cidadão duas e mais vezes, para inspeccionar varios institutos. Neste ultimo caso receberá tantas quotas quantos forem os institutos inspeccionados. [...] Art. 22. Quando o relatorio do inspector condemnar um instituto, será cassado o direito á equiparação já concedida, não podendo ser de novo requerida dentro de seis annos, embora a academia mude de nome conservando mais de metade do antigo corpo docente. Art. 23. Quando a academia representar contra o inspector ao Conselho Superior e a este parecer que o relatorio foi injusto ou apaixonado, poderá aguardar nova inspecção para aconselhar ao Ministro a applicação da pena comminada pelo artigo antecedente. 162 DINO, Sálvio. A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO (1918-1941). São Luis: EDUFMA, 1996; 2ª edição 2014. 163 DECRETO N. 1232 H - DE 2 DE JANEIRO DE 1891 - Approva o regulamento das Instituições de Ensino Juridico, dependentes do Ministerio da Instrucção Publica


Em seu Art. 2º, diz que, em cada uma das Faculdades de Direito, poderia haver três cursos: ―[...] o de sciencias juridicas, o de sciencias sociaes, o de notariado‖: Art. 3º O curso de sciencias juridicas comprehenderá o ensino das seguintes matérias: Philosophia e historia do direito; Direito publico e constitucional; Direito romano; Direito criminal, incluindo o direito militar; Direito civil; Direito commercial, incluindo o direito marítimo; Medicina legal; Processo criminal, civil e commercial; Pratica forense; Historia do direito nacional; Noções de economia política e direito administrativo.

Pelo Decreto nº 11.530, de 18 de Março de 1915, é reorganizado o ensino secundário e o superior na Republica: Art. 1º O Governo Federal continuará a manter os seis institutos de instrucção secundaria e superior subordinados ao Ministerio da Justiça e Negocios Interiores, dando-Ihes autonomia didactica e administrativa de accôrdo com as disposições deste decreto.

[...] Art. 5º O Governo manterá uma faculdade official de Medicina no Estado da Bahia e outra no Districto Federal; uma faculdade de Direito em S. Paulo e outra em Pernambuco; uma Escola Polytechnica e um instituto de instrucção secundaria, com a denominação de Collegio Pedro II, na cidade do Rio de Janeiro. Art. 6º O Governo Federal, quando achar opportuno, reunirá em Universidade as Escolas Polytechnica e de Medicina do Rio de Janeiro, incorporando a ellas uma das Faculdades Livres de Direito dispensando-a da taxa de fiscalização e dando-Ihe gratuitamente edificio para funccionar. [...] Art. 26. Não podem ser equiparadas ás officiaes mais de duas academias de Direito, Engenharia ou Medicina em cada Estado, nem no Districto Federal; e, onde haja uma official, só uma particular póde ser a Ella equiparada

A constituição do corpo docente obedecerá o disposto no Decreto de 1915164, que reorganizou o ensino superior: ― CORPO DOCENTE - Art. 36. O corpo docente dos institutos compõe-se de professores cathedraticos, professores substitutos, professores honorarios, professores, simplesmente, e livres docentes. Quando da instituição da Faculdade de Direito do Maranhão a grade curricular ficou assim constituída, relacionando-se os respectivos professores, cuja indicação fora feita pela Associação mantenedora, e aceita pelos lentes catedráticos165: 164

Decreto nº 11.530, de 18 de Março de 1915, Reorganiza o ensino secundário e o superior na Republica De acordo com o DECRETO N. 1232 H - DE 2 DE JANEIRO DE 1891, os lentes (professores), eram dividios em :Art. 46. Os lentes distinguemse em cathedraticos e substitutos e serão distribuidos por secções; Art. 47. Os cathedraticos são obrigados a reger unicamente as cadeiras para que forem nomeados; Art. 48. Aos substitutos cabem as obrigações mencionadas nos arts. 11, 12 e 13. Art. 49. Os lentes cathedraticos e substitutos são tambem obrigados a tomar parte nos outros actos das respectivas Faculdades; conforme dispõe este regulamento. Os artigos mencionados se referem: Art. 11. Na falta ou impedimento do substituto de alguma secção, o director convidará para reger a cadeira um dos cathedraticos; si nenhum destes annuir ao convite, chamará um dos substitutos, e por ultimo um dos doutores ou bachareis que tiverem cursos particulares ou forem professores de Faculdades livres. Essa regencia interina dará direito a uma gratificação igual a dous terços dos vencimentos do cathedratico substituido. Quer na classe dos cathedraticos, quer na dos substitutos, deverão ser preferidos os 165


Fica, pois, assim constituída a Grade Curricular, com os respectivos professores:

1º ano Filosofia do Direito – Lopes da Cunha Direito Público e Constitucional – Godofredo Mendes Viana Direito Romano – Raul da Cunha Machado 2º ano Direito Internacional Público – Carlos Humberto Reis Economia Política e Ciência das Finanças – Raimundo Leôncio Rodrigues 2º, 3º e 4º anos Direito Civil – I Cadeira – João Vieira de Souza, filho Direito Civil – II Cadeira – Clodomir Cardoso Direito Civil – III Cadeira – Carlos Augusto de Araujo Costa 3º e 4º anos Direito Comercial – I Cadeira – Luis Carvalho Direito Comercial – II Cadeira – Manoel Jansen Ferreira 3º e 4º anos Direito penal – I Cadeira – Henrique José Couto Direito penal – II Cadeira – Alfredo de Assis Castro 4º ano Teoria do Processo Civil e Comercial – Artur Bezerra de Menezes 5º ano Prática de Processo Civil e Comercial – Aarão A. do Rego Brito Teoria e Prática do Processo Criminal – Alcides Jansen S. L. Pereira Direito Administrativo – João de Lemos Viana Direito Internacional Privado – Antonio Bona De acordo com o Art. 37. ―Compete ao professor cathedratico‖: a) a regencia effectiva da cadeira para a qual foi nomeado; b) a elaboração do programma do seu curso, afim de ser approvado pela Congregação 30 dias antes da abertura das aulas; c) fazer parte das mesas examinadoras, desde que não haja incompatibilidade legal; d) indicar os seus assistentes, preparadores e demais auxiliares; e) submetter a provas oraes ou escriptas os seus alumnos, na primeira quinzena de junho e na segunda de agosto, e conferir-lhes uma nota quando chamados aos trabalhos praticos, afim de deduzir a média annual, que influirá para a nota do exame final, conforme for determinado pelo Regimento Interno; f) ensinar toda a materia constante do programma por elle organizado.

Quanto aos lentes substitutos, que se refere a legislação, são nomeados: 1ª. Sessão – (Filosofia do Direito e Direito Romano) – João da Costa Gomes 2ª. Sessão – (Direito Público e Constitucional, Direito Internacional Público e Privado) – Raul Soares Pereira 3ª. Sessão – (Direito Civil) – Antonio José Pereira, Junior lentes da secção em que se der o impedimento. Nenhum substituto será obrigado a reger mais de uma cadeira. Pela regencia da que lhe competir perceberá uma gratificação igual á do substituído; Art. 12. Os substitutos, além da regencia das cadeiras a que são obrigados, no caso de falta ou impedimento dos lentes, farão cursos complementares sobre as materias que o director designar, ouvido o lente respectivo. Os lentes substitutos não deixarão de fazer taes cursos, ainda quando estejam na regencia de cadeira. Art. 13. Haverá um laboratorio para os exercicios praticos de medicina legal e hygiene publica.


4ª. Sessão – (Direito Penal, Teoria e prática do Processo Criminal) – Fabiano Vieira da Silva 5ª. Sessão – (Economia Política, Ciência da Finança, e Direito Administrativo) – Inácio Xavier de Carvalho 6ª. Sessão – (Direito Comercial) – Joaquim Pinto Franco de Sá 7ª. Sessão – (Teoria do Processo Civil e Comercial, Prática do Processo Civil e Comercial) – Raimundo Alexandre Vinhais 8ª. Sessão – (Medicina Pública) – Tarquínio Lopes Filho. Art. 38. Compete ao professor substituto: a) substituir, nos impedimentos temporarios, quaIquer dos cathedraticos da sua secção; b) reger os cursos que lhe forem designados pela Congregação, esgotando os programmas approvados; c) auxiliar, quando necessario, os cathedraticos durante as provas de junho e agosto.

Distribuídas as cadeiras e nomeados os professores, inclusive os substitutos, elegeu-se Diretor da Faculdade o dr. José Viana Vaz, juiz federal; vice-diretor Henrique Couto, Secretário de Interior e Instrução; Secretário, o Sr. Domingos Perdigão, Diretor da Biblioteca Pública. Para a indicação e nomeação dos lentes, é a seguinte a legislação estabelecida: DOS LENTES CATEDRATICOS Art. 87. As cadeiras serão divididas em secções, na fórma do art. 9º 166 Art. 88. Vagando alguma cadeira, será para ella nomeado o substituto da respectiva secção. Art. 89. Vagando uma cadeira em alguma secção, onde se ache tambem vago o logar de substituto e não se tenha ainda aberto o respectivo concurso, poderá o Governo, depois de ouvir a congregação, prover directamente a referida cadeira, nomeando ou contractando, sem concurso, pessoa que reuna os seguintes requisitos: 1º, haver se distinguido nos cursos da Faculdade que frequentou; 2º, ter exercido, com distincção e por mais de tres annos, o magisterio superior, ou ter feito sobre as materias da secção a que pertence a cadeira vaga, publicações importantes, ou ser indicado por dous terços dos membros da congregação; 3º, possuir as habilitações mencionadas nos arts. 96 e 97167. SECÇÃO 2ª - DOS LENTES SUBSTITUTOS Art. 90. As nomeações dos lentes substitutos se farão por meio de concurso. 166

Art. 9º As cadeiras dos differentes cursos serão distribuidas pelas secções seguintes, cada uma das quaes terá um substituto: 1ª SECÇÃO Philosophia e historia do direito; Direito publico e constitucional; Direito das gentes, diplomacia e historia dos tratados; Explicação succinta do direito patrio constitucional e administrativo. 2ª SECÇÃO Direito civil, duas cadeiras; Direito commercial, duas cadeiras; Explicação succinta do direito patrio civil, commercial e criminal. 3ª SECÇÃO Direito romano; Historia do direito nacional; Direito criminal; Noções de legislação omparada sobre o direito privado. 4ª SECÇÃO Economia politica; Sciencia das finanças e contabilidade do Estado; Sciencia da administração e direito administrativo; Noções de economia politica e direito administrativo. 5ª SECÇÃO Processo criminal, civil e commercial; Pratica forense; Explicação succinta do direito patrio processual. 6ª SECÇÃO Medicina legal; Hygiene publica. 167 Art. 96. Poderão ser admittidos a concurso os brazileiros que estiverem no gozo dos direitos civis e politicos e possuirem o gráo de doutor ou bacharel em sciencias sociaes e juridicas pelas Faculdades federaes ou a estas equiparadas; ou que, tendo esses gráos por academias estrangeiras, se houverem habilitado perante alguma daquellas Faculdades. Art. 97. Poderão tambem inscrever-se os estrangeiros que, possuindo alguns daquelles gráos, fallarem correctamente portuguez. No caso de serem graduados por academias estrangeiras ficam, porém, sujeitos á habilitação prévia, salvo si tiverem sido professores de Faculdades estrangeiras reconhecidas pelos respectivos Governos.


Art. 91. Poderá o Governo, independente de concurso, mas ouvindo a congregação, nomear ou contractar para os logares de substitutos pessoas que reunam os requisitos mencionados nos ns. 1, 2 e 3 do art. 89168.

A Faculdade de Direito do Maranhão foi uma iniciativa particular, acalentado de há muito: desde os princípios do Brasil como Reino Unido à Portugal e Algarves, pois com a presença da família Real no Rio de Janeiro, o Príncipe Regente D. João VI tomou uma série de medidas visando melhorar a situação do ensino no país, inclusive o ensino superior. O regente chegou a prometer uma faculdade ao Maranhão, pela carta régia de 29/12/1815 e ―que lamentavelmente não chegaria a se fazer realidade‖ (MEIRELES, 1995)169. Informa-nos Rossini Corrêa (2017, p. 148) 170: [...] quando da inauguração do ensino superior brasileiro, proibido pelo colonialismo português, e conquistado com a autonomia administrativa, o Maranhão procurou, com obstinação, ser o vencedor da carreira, abrigando, em São Luis, a primeira Faculdade de Direito do Brasil. Para o Autor, foi uma batalha perdida... DOS CURSOS E ESTABELECIMENTOS PARTICULARES Art. 419. E' permittido a qualquer individuo ou associação de particulares a fundação de cursos ou estabelecimentos, onde se ensinem as materias que constituem o programma de qualquer curso ou Faculdade federal, salva a inspecção necessaria para garantir as condições de moralidade e hygiene.

A Faculdade de Direito do Maranhão foi assim constituída, como Faculdade Livre de Direito, conforme o artigo seguinte: FACULDADES LIVRES Art. 420. Aos estabelecimentos particulares que funccionarem regularmente poderá o Governo, com audiencia do Conselho de Instrucção Superior, conceder o titulo de Faculdade livre, com todos os privilegios e garantias de que gozarem as Faculdades federaes. As Faculdades livres terão o direito de conferir aos seus alumnos os gráos academicos que concedem as Faculdades federaes, uma vez que elles tenham obtido as approvações exigidas pelos estatutos destas para a collação dos mesmos gráos. Art. 421. Os exames das Faculdades livres serão feitos de conformidade com as leis, decretos e instrucções que regularem os das Faculdades federaes e valerão para a matricula nos cursos destes. O Conselho de Instrucção Superior nomeará annualmente commissarios que assistam a esses exames e informem sobre a sua regularidade. Art. 422. Em cada Faculdade livre ensinar-se-hão pelo menos todas as materias que constituirem o programma da Faculdade federal. Art. 423. Cada Faculdade livre terá a sua congregação de lentes com as attribuições que lhe forem dadas pelo respectivo regimento. Art. 424. A infracção das disposições contidas neste titulo sujeita a congregação a uma censura particular ou publica do Governo, o qual, em caso de reincidencia, multará a associação em 500$ a 1:000$ e por ultimo poderá suspender a Faculdaade por tempo não execedente de dous annos, devendo sempre ouvir o Conselho de Instrucção Superior. Emquanto durar a suspensão, não poderá a Faculdade conferir gráos academicos, sob pena de nullidade dos mesmos. 168

Art. 89. Vagando uma cadeira [...]1º, haver se distinguido nos cursos da Faculdade que frequentou; 2º, ter exercido, com distincção e por mais de tres annos, o magisterio superior, ou ter feito sobre as materias da secção a que pertence a cadeira vaga, publicações importantes, 168 ou ser indicado por dous terços dos membros da congregação; 3º, possuir as habilitações mencionadas nos arts. 96 e 97 . 169 MEIRELES, Mário. O ensino superior no Maranhão: esboço histórico. In ____. DEZ ESTUDOS HISTÓRICOS. São Luís: ALUMAR, 1995, P. 45-94 170 CORRÊA, José Rossini Campos do Couto. FORMAÇÃO SOCIAL DO MARANHÃO – o presente de uma arqueologia. 2 ed. São Luis: Engenho, 2017. Biblioteca Básica Maranhense – volume II.


Art. 425. Constando a pratica de abusos nas Faculdades livres quanto á identidade dos individuos nos exames e na collação dos gráos, cabe ao Governo, ouvindo o Conselho de Instrucção Superior, o direito de mandar proceder a rigoroso inquerito para averiguação da verdade, e, si delle resultar a prova dos abusos arguidos, deverá immediatamente cassar á instituição o titulo Faculdade livre, com todas as prerogativas ao mesmo inherentes. Art. 426. A Faculdade livre que houver sido privada deste titulo não poderá recuperal-o sem provar que reconstituiu-se de maneira a offerecer inteira garantia de que os abusos commettidos não se reproduzirão.

A reforma de 1931171 estabelece a instituição de universidade, no Brasil, mas mantém as escolas isoladas: Art. 6º As universidades brasileiras poderão ser creadas e mantidas pela União, pelos Estados ou, sob a fórma de fundações ou de associações, por particulares, constituindo universidades federaes estaduaes e livres. Paragrapho unico. Os governos estaduaes poderão dotar as universidades por elles organizadas com patrimônio proprio, mas continuarão obrigados a fornecer-lhes os recursos financeiros que se tornarem necessarios a seu regular funccionamento. Art. 7º A organização administrativa e didactica de qualquer universidade será instituida em estatutos, approvados pelo Ministro da Educação e Saude Publica, e que só poderão ser modificados por proposta do Conselho Universitário ao mesmo ministro, devendo ser ouvido o Conselho Nacional de Educação. ( DECRETO Nº 19.851, DE 11 DE ABRIL DE 1931).

O Decreto 1915 estabelece o regime escolar: REGIMEN ESCOLAR - EXAMES Art. 73. O anno escolar começará a 1 de abril e terminará a 15 de novembro, comprehendendo cada curso 80 lições. Art. 74. Haverá duas épocas de exames, começando a primeira no dia 1 de dezembro e a segunda a 1 de março. Paragrapho unico. Em caso de grande affuencia de candidatos a Congregação, mediante proposta do director, permittirá que a 20 de novembro comecem os exames da primeira época. Art. 75. A matricula terá logar nos 15 dias que antecedem á abertura, dos cursos, e a inscripção para exames, 10 dias antes daquelle em que devem começar. Paragrapho unico. A data fixada para inicio dos exames, bem como a da abertura dos cursos, não póde ser transferida para mais tarde, senão em caso de calamidade publica reconhecida pela Congregação. Art. 76. Inscrever-se-ão para os exames da segunda época os candidatos que não forem alumnos da academia, os alumnos que não se apresentaram na primeira época por motivo de força maior devidamente comprovada, e os que tiverem sido reprovados ou deixado de ser examinados em uma só materia, na primeira época. Art. 77. Para requerer matricula nos institutos de ensino superior os candidatos deverão provar: a) edade minima de 16 annos; b) idoneidade moral; c) approvação no exame vestibular.

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DECRETO Nº 19.851, DE 11 DE ABRIL DE 1931 - Dispõe que o ensino superior no Brasil obedecerá, de preferencia, ao systema universitario, podendo ainda ser ministrado em institutos isolados, e que a organização technica e administrativa das universidades é instituida no presente Decreto, regendo-se os institutos isolados pelos respectivos regulamentos, observados os dispositivos do seguinte Estatuto das Universidades Brasileiras.


Paragrapho unico. Em caso de exame vestibular verdadeiramente brilhante poderá a Congregação permittir a matricula de candidatos que não hajam attingido a edade legal. Art. 78. O candidato a exame vestibular deve exhibir: a) certificado de approvação em todas as materias que constituem o curso gymnasial do Collegio Pedro II, conferido pelo mesmo collegio ou pelos institutos a elle equiparados, mantidos pelos governos dos Estados e inspeccionados pelo Conselho Superior do Ensino; b) recibo da taxa estipulada no Regimento Interno. Paragrapho unico. Nos Estados onde não houver gynmasio mantido pelo Governo, as Congregações dos institutos superiores equiparados aos officiaes podem organizar commissões de examinadores do curso gyinnasial, presidida por um professor da faculdade. Estes exames são validos sómente perante a academia que os instituiu. Art. 79. O candidato que tiver certificado de curso completo de gymnasio estrangeiro, authenticado pela mais alta autoridade consular brazileira da cidade onde o instituto funcciona., e acompanhado da prova official de que o titulo exhibido era acceito pelas academias do paiz, póde inscrever-se para o exame vestibular. Art. 80. O exame vestibular comprehenderá prova escripta e oral. A primeira consistirá na traducção de um trecho facil de um livro de litteratura franceza e de outro de autor classico allemão ou ingIez, sem auxilio de diccionario. Paragrapho unico. E' prohibida a inclusão do titulo dos livros que servirão para exame, no Regimento Interno ou nos programmas dos cursos. Art. 81. A prova oraI do exame vestibular versará sobre Elementos de Physica e Chimica e de Historia Natural, nas Escolas de Medicina; sobre Mathematica Elementar, na Escola Polytechnica, e sobre Historia Universal, Elementos de Psychologia e de Logica e Historia da Philosophia por meio da exposição das doutrinas das principaes escolas philosophicas, nas Faculdades de Direito. Art. 82. O exame vestibular será julgado por uma commissão de professores do Collegio Pedro II ou de instituto estadoal a elle equiparado ou de professores de incontestavel competencia, sob a presidencia de um professor da academia. Art. 83. O exame vestibular terá logar em janeiro.

Logo, em 1926, começam a se alterar a situação dos alunos matriculados: DECRETO Nº 5.121, DE 29 DE DEZEMBRO DE 1926, Antecipa a 1ª época de exames para os alunos das Escolas Jurídicas do Brasil que devam terminar o curso em 1927: Art. 1º Fica antecipada para a segunda quinzena de julho de 1927, a primeira época de exames para os alumnos das Escolas juridicas do Brasil que terminarem o curso naquelle anno, devendo a collação de gráo realizar-se solemnemente, em 11 de agosto. § 1º O inicio do anno lectivo para os mencionados alumnos será igualmente antecipado para 1 de janeiro de 1927. § 2º Os alumnos que prestarem, em segunda época, os exames do 4º anno actual, de accôrdo com as leis em vigor, poderão matricular-se, condicionalmente, no periodo da antecipação, que estabelece o § 1º, na classe immediatamente superior. Art. 2º Os estudantes que pretenderem seguir os cursos de ensino superior e que terminaram o curso gymnasial ou de preparatorios até o anno de 1925, poderão prestar exame vestibular na segunda quinzena de janeiro de 1927 para fazerem exame do primeiro anno, em segunda época, perante as Faculdades cuja lotação de alumnos não estiver completa. Paragrapho unico. A inscripção para exame vestibular será na primeira quinzena do referido mez de janeiro de 1927.


Art. 3º As pessoas que exhibirem diploma conferido por faculdade estrangeira, authenticado pelo consul do Brasil e valido para o exercicio da profissão, si quizerem obter a revalidação do diploma estrangeiro por academia, faculdade ou escola brasileira, deverão apresentar theses sobre tres das cadeiras de qualquer dos annos do curso correspondente, sustentando-as oralmente, além de um exame pratico, sempre que fôr possivel. Paragrapho unico. A revalidação do diploma de que trata este artigo, não terá logar si o candidato não lograr approvação na defesa das theses e na prova pratica quando exigida.

Conforme ―A Pacotilha‖ de 03 de janeiro de 1927, o dr. Furtado da Silva, inspetor federal junto à Faculdade de Direito do Maranhão, recebera do Departamento Nacional de Ensino cabograma para ‗cuja leitura chama a atenção dos bacharelandos‘: Inspector da Faculdade de Direito do Maranhão, RIO, 31 (Via Western) – Recomendo-vos providencieis no sentido de serem cumpridas as disposições contidas nos artigos 1º e 2º decreto legislativo numero 5.121, de 29 de dezembro do corrente anno, assim redigidos: artigo primeiro, fica antecipada para segunda quinzena de julho de 1927 a primeira época de exames para os alumnos das escolas jurídicas do Brasil que terminarem o curso naquelle anno, devendo a collação de grau realizer-se solenemente, a 11 de agosto. Paragrapho primeiro, o inicio do anno letivo para os mencionados alumnos será igualmente antecipado para primeiro de janeiro de 1927. Paragrapho segundo,os alumnos que prestarem na segunda época os exames do quarto anno actual, de acordo com as leis em vigor, poderão matricular-se condicionalmente, no período de antecipação que estabelece o paragrapho primeiro, na classe imediatamente superior. Artigo segundo, os estudantes que pretenderem seguir os cursos do ensino superior e que terminaram o curso gymnasial ou preparatórios até o anno de 1925, poderão prestar exame vestibular na segunda quinzena de 1927, para fazerem exame de primeiro anno em segunda época, perante as faculdades cuja lotação de alumnos não esteja completa. Paragrapho único, a inscrição de exame vestibular será na primeira quinzena do referido mez de janeiro de 1927. Saudações, Dr. Rocha Vaz.

―O Combate‖ de 25 de outubro de 1930 publica nota, informando sobre o encerramento das aulas da Faculdade de Direito, por determinação do Governo Provisório do Norte do Brasil172: 172

O Norte e o Governo Provisório: Juarez Távora e os revolucionários nortistas: Durante a campanha presidencial de 1929-1930, a Aliança Liberal recebe rápidas adesões no Norte, ao assumir como uma de suas bandeiras a luta contra a submissão política dos governos estaduais frente ao governo central. Os aliancistas conseguem unir, desta forma, setores sociais de interesses bem diversos e até mesmo contraditórios. É essa situação específica que dá ao movimento de 30 no Norte um caráter bastante amplo e popular, encontrando poucas resistências [...]PANDOLFI, Dulce. A trajetória do Norte: uma tentativa de ascensão político. In: GOMES, Angela de Castro (org.). Regionalismo e Centralização política: partidos e Constituinte nos anos 30. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1980, p. 342. Para Lopes (2011), com esse pequeno parágrafo, Dulce Pandolfi consegue resumir bem o que significou o movimento de outubro de 30 na região Norte do Brasil: um movimento amplo, marcado pelo apoio da população, onde os “revolucionários” quase não encontraram resistência por parte dos governistas. A vitória veio através de uma campanha militar que tomou as guarnições militares da região, com alguma participação de voluntários civis. [...] Entendo como Norte a área político-geográfica formada pelos estados que abrangem as atuais regiões Norte e Nordeste, além do Espírito Santo. O Norte, nesse sentido, era compreendido pelo território federal do Acre e por doze estados: Amazonas, Pará, Piauí, Maranhão, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Espírito Santo. In LOPES, Raimundo Helio. A Delegacia Militar do Norte e o Governo Provisório: disputas políticas e a nomeação dos interventores nortistas. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho 2011


Logo em seguida, saí Decreto173 em que os alunos são ‗aprovados‘, melhor, ‗promovidos‖: Art. 1º Ficam promovidos, independentemente de exames, á serie ou ano superior imediato, na presente época do atual ano letivo, os alunos matriculados nos cursos superiores oficiais, oficializados e equiparados, bem como nos institutos de ensino artístico superior subordinados ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores, desde que comprovem haver frequentado mais de metade das aulas dadas em cada cadeira. § 1º Para comprovar a frequência a aluno apresentará, conforme o regime escolar a que esteja sujeito, informação da Secretaria do respectivo instituto ou atestado firmado pelo professor ou docente que houver lecionado. § 2º Serão considerados habilitados, para os efeitos da conclusão do curso, os alunos matriculados no último ano de cada instituto, que satisfizerem a condição de frequência exigida neste artigo. Art. 2º Ficam igualmente promovidos ao ano superior imediato os alunos matriculados no Colégio Pedro II, nos institutos a ele equiparados ou em inspeção preliminar, e os alunos do curso seriado ou de preparatórios dos institutos particulares de ensino secundário, que já tenham requerido nomeação de juntas examinadoras, desde que reunam as seguintes condições: 1º, haver frequentado mais de metade das aulas dadas em cada matéria; 2º, haver obtido no mínimo a média anual de 3,50. § 1º No Colégio Pedro II a comprovação da frequência e da média exigidas será feita mediante informação da Secretaria ao diretor. § 2º Nos institutos equiparados ao Colégio Pedro II e nos em inspeção preliminar a comprovação será feita por informação escrita e motivada do diretor ao inspetor do instituto. § 3º Nos institutos particulares que já requereram juntas examinadoras para os seus alunos tanto do curso seriado, como de preparatórios e de admissão, a comprovação será feita por informação escrita e motivada do diretor ao inspetor, especialmente designado para esse fim. § 4º O inspetor designado na forma do parágrafo antecedente verificará nos livros do instituto a exatidão das informações prestadas pelo diretor com referência á frequência e média dos alunos, bem como da regularidade das respectivas matrículas, enviando ao Departamento Nacional do Ensino uma ata autentica, tambem assinada pelo diretor, que servirá de base para expedição, no Departamento, dos respectivos certificados de promoção e habilitação, 173

Decreto nº 19.404, de 14 de Novembro de 1930, Dispõe sobre a promoção escolar nos institutos de ensino subordinados ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores.


§ 5º As disposições do presente decreto relativas aos institutos particulares de ensino secundário que já tenham requerido juntas examinadoras só serão aplicaveis aos alunos cujos nomes constem das relações existentes e registadas no Departamento Nacional do Ensino. Art. 3º Para os efeitos de promoção e habilitação no último ano do curso das quais trata o presente decreto, os alunos requererão ao diretor do instituto a respectiva inscrição, mediante o pagamento das taxas legais de exame, revertendo essas taxas aos institutos de ensino superior integralmente para o respectivo patrimônio. Art. 4º No período de 3 de outubro a 14 de novembro serão, respectivamente, atribuidas a cada aluno a melhor média mensal e frequência integral.

Em conseqüência, o diretor da Faculdade baixa o seguinte aviso: O Sr. Dr. Director da Faculdade de Direito do Maranhão recebeu do Departamento Nacional de Ensino os seguintes telegramas: RIO, 20 – Communico-vos para os devidos fins que o governo expediu, a 14 do corrente mez, o decreto 19.404, regulando a promoção escolar nos institutos de ensino. De accordo com os parágrafos 1 e 2 do art. 1º desse decreto, são promovidos, independentemente de exame, á série ou anno superior immediatos, na presente época do actual anno lectivo, os alumnos matriculados que comprovem haver freqüentado mais da metade das aulas dadas em cada cadeira. Para comprovar a freqüência, o alumno apresentará, conforme o regimen escolar a que esteja sujeito, informação da Secretaria do respectivo instituto, ou attestado firmado pelo professor ou docente que houver leccionado. Serão considerados habilitados, para os effeitos da conclusão do curso, os alumnos matriculados no ultimo anno de cada instituto, que satisfizerem as condições de freqüência já especificada. No período de 3 de outubro a 14 de novembro será respectivamente attribuida a cada alumno a freqüência integral. Os alumnos requererão ao director do instituto a respectiva inscripção, mediante o pagamento das taxas legaes de exames, revertendo estas, integralmente, ao patrimônio do respectivo instituto. Saudações. (a) Aloysio de Castro. RIO, 18 – Comunico-vos para os devidos fins que, segundo aviso expedido a 14 do corrente, pelo Ministério da Justiça e Negócios Interiores, ficam sem effeito os actos referentes ás inscripções para concurso de livres docentes e professores cathedraticos dos institutos de ensino superior e secundário da República. Saudações. (a) Aloysio de Castro. Secretário Geral. Para deliberar sobre os assumptos de que tratam os telegrammas acima terá logar, ás 9 horas do dia 24 do corrente, uma reunião da congregação dos professores da nossa Faculdade de Direito.

A nova legislação, aprovada em 1931174, previa, para admissão nos cursos universitários Art. 81. A admissão inicial nos cursos universitarios obedecerá as condições geraes abaixo instituidas, além de outras que constituirão dispositivos regulamentares de cada um dos institutos universitarios; I - certificado do curso secundario fundamental de cinco annos e de um curso gymnasial superior, com a adaptação didactica, neste ultimo, aos cursos consecutivos; II - idade mínima de 17 annos; III - prova de identidade; IV - prova de sanidade; 174

DECRETO Nº 19.851, DE 11 DE ABRIL DE 1931 - Dispõe que o ensino superior no Brasil obedecerá, de preferencia, ao systema universitario, podendo ainda ser ministrado em institutos isolados, e que a organização technica e administrativa das universidades é instituida no presente Decreto, regendo-se os institutos isolados pelos respectivos regulamentos, observados os dispositivos do seguinte Estatuto das Universidades Brasileiras.


V - prova de idoneidade moral; VI - pagamento das taxas exigidas. Paragrapho unico. Ao alumno matriculado em qualquer dos institutos universitarios será fornecido um cartão de matricula devidamente authenticado, que provará a sua identidade, e uma caderneta individual na qual será registado o seu curriculum vitae de estudante, tudo de accôrdo com dispositivos de cada instituto universitario. Art. 82. Não será permitida a matricula semultanea do estudante em mais de um curso seriado, sendo, porém, permittido aos matriculados em qualquer curso seriado a frequencia de cursos avulsos, ou de aperfeiçoamento e especialização.

Já para a aprovação dos acadêmicos, são as seguintes as condições gerais: Art. 83. A verificação de habilitação nos cursos universitarios, seja para a expedição de certificados e diplomas, seja para a promoção aos períodos lectivos seguintes, será feita pelas provas de exame abaixo enumeradas e cujos processos de realização serão discriminados nos regulamentos dos institutos universitarios. a) provas parciaes; b)

provas finaes;

c)

médias de trabalhos praticos de quaesquer outros exercicios escolares.

Art. 84. As provas de exame referidas no artigo anterior serão julgadas por commissões examinadoras, das quaes farão parte, obrigatoriamente, os professores e docentes livres que houverem realizado os respectivos cursos. Art. 85. As taxas de exame serão fixadas em tabellas annexas aos regulamentos dos institutos universitarios, que ainda deverão discriminar a gratificação a ser concedida aos membros das commissões examinadoras. Art. 86. Os regulamentos de cada um dos institutos universitarios fixarão a época em que deverão ser prestadas as provas exigidas para expedição de diplomas, ou para a promoção dos estudantes.

Mas estas não foram as únicas intervenções; novas notas davam conta de alterações e instruções seguidas, na promoção de alunos, naquele ano atípico, de 1931, como se vê dessa nota de 3 de dezembro, do Inspetor Federal:


Nova nota, recebida pelo Inspetor Federal, de que havia sido deliberado pelo Sr. Ministro, que a freqüência para a remoção nos termos do decreto 20.735 de 30 de novembro ultimo175, ou para inscrição em exames, seria computada em metade, no mínimo, do numero de aulas efetivamente realizadas. Foi permitida ainda a inscrição em exames de segunda época, aos alunos que não tenham freqüência. Em 1936, nova alteração no sistema de ingresso, conforme nota publicada na imprensa local: O dr. Alcides Pereira, director da Faculdade de Direito, recebeu do Sr. Dr. Director Geral de Educação o seguinte telegrama: Somente poderão requerer inscripção para o exame vestibular em 1936 os alumnos que concluíram a 5ª série em 1934, na 1ª ou 2ª época, ou em annos anteriores, os alumnos que tenham completado preparatório em annos anteriores e aquelles que estão fazendo o curso secundário de acordo com o artigo 100 do decreto 21.241, de abril de 1932176 e concluíram a 5ª serie na segunda quinzena de janeiro de 1936. Também lembro que deixou de vigorar no anno lectivo de 1936 a disposição que permettia aos estudantes que tivessem seis ou mais preparatórios prestar os restantes nas escolas superiores. Saudações. – Paulo de Assis Ribeiro, Director Geral Interino.

Os secundaristas e ginasianos são convocados a comparecer na Faculdade, para tomarem conhecimento das novas normas de ingresso: FACULDADE DE DIREITO / CURSO COMPLEMENTAR / SECÇÃO JURÍDICA Os professores encarregados de organizar, pela Congregação da Faculdde de Direito do Estado, a Secção Jurídica do Curso Complementar, creado pelo decreto no. 21.241, de 4 de novembro de 175

Decreto 20.735, de 28 de Novembro de 1931 — Regula a dispensa de exame final ou prova oral, no corrente ano letivo, nos institutos de ensino superior. 176 DECRETO Nº 21.241, DE 4 DE ABRIL DE 1932 - Consolida as disposições sobre a organização do ensino secundário e dá outras providências: Art. 100. Enquanto não forem em número suficiente os cursos noturnos de ensino secundário sob o regime de inspeção, será facultado requerer e prestar exames de habilitação na 3ª série e, em épocas posteriores, sucesivamente, os de habilitação na 4ª e na 5ª séries do curso fundamental ao candidato que apresentar os seguintes documentos: I. Certidão, provando a idade mínima de 18 anos, para a inscrição nos exames da 3ª série. II. Recibo de pagamento das taxas de exame. III. E, para a inscrição nos exames da 4ª ou da 5ª séries, certificado de habilitação na série procedente, obtido nos termos deste artigo e de seus parágrafos. § 1º Os exames de que trata este artigo deverão ser requeridos na segunda quinzena de janeiro e serão prestados, em fevereiro, no Colégio edro II e em estabelecimentos de nsino secundário equiparados. § 2º Os exames versarão sobre toda a matéria constante dos programas expedidos para o ensino secundário e relativos às tres primeiras séries, para a habilitação na 3ª série, e às duas últimas, respectivamente, para a habilitação na 4ª série e na 5ª série do curso fundamental. § 3º Os exames constarão para cada disciplina, de prova escrita e prova oral ou prático-oral, conforme a natureza da disciplina, salvo o de Desenho, que constará de uma prova gráfica. § 4º Serão nulos os exames prestados pelo mesmo candidato, na mesma época, em mais de um estabelecimento de ensino, ficando ainda o infrator deste dispositivo sujeito à penalidade de não poder increverse em exames na época imediata. § 5º A constituição das bancas examinadoras, o arrolamento das provas escritas, o seu julgamento e o das provas orais ou prático-orais obedecerão, no que lhes for aplicavel, ao disposto nos artigos 38, 39 e 40 deste decreto. § 6º Na constituição das bancas examinadoras não poderão figurara professores que mantenham cursos ou estabelecimentos de ensino, lecionem particularmente ou exerçam atividade didática em estabelecimento de ensino não oficiais, sendo nulos em qualquer tempo os exames prestados com infração deste dispositivo. § 7º Será considerado aprovado o candidato que obtiver, alem da nota trinta, no mínimo, na prova gráfica de Desenho e como média aritmética das notas da prova escrita e da prova oral, ou prático-oral, em cada uma das demais disciplinas, média aritmética igual ou superior a cinquenta no conjunto das disciplinas. § 8º Ao candidato inhabilitado nos exames de qualquer série será permitido, na época seguinte, renovar mais uma vez incrição nos exames da série em que não lograra aprovação. § 9º Os candidatos aprovados na 5ª série, para a matrícula nos institutos de ensino superior, ficarão obrigados à frequência e às demais exigências estabelecidas para o curso complementar respectivo. Art. 101. Será, igualmente facultado requerer e prestar exames de habilitação, nos termos do artigo anterior e seus parágrafos, excluida, entretanto, a exigência da idade mínima, ao candidato que apresentar os seguintes documentos: I Certificado de conclusão do Curso Fundamental de Instituto ou Conservatório de Música, oficial ou oficialmente reconhecido, para a inscrição nos exames da 3ª série, ou certificado de habilitação na série anterior, obtido nos termos deste artigo, para a inscrição nos exames da 4ª ou da 5ª série. II. Recibo de pagamento das taxas de exames.


1932177, convidam os alumnos que terminaram, em 1935, a 5ª. Série do curso gynasial, a comparecer á sede da mesma Faculdade, ás 10 horas da próxima segunda-feira, 11 do corrente. RUBEN ALMEIDA / ANTONIO LOPES / GUSMÃO FILHO (PACOTILHA, 09 de maio de 1936)

Já começavam as tratativas para anulação da cassação do credenciamento da Faculdade pelo não cumprimento da Lei, que estabelecia o Curso Jurídico Complementar:

177

DECRETO Nº 21.241, DE 4 DE ABRIL DE 1932. Consolida as disposições sobre a organização do ensino secundário e dá outras providências


Em nota de José Virgilio Rocha, publicada em ―O Imparcial‖ (06/10), este protestava pela não-realização da segunda prova parcial que, por Lei, deveriam se realizar no mês de setembro, e conforme constava no regimento interno. Não havia justificativa para tal, A ausência do inspetor federal não era motivo para adiamento das mesmas, conforme o autor da nota. Diz ele que o Departamento de Ensino deveria ter nomeado fiscal substituto, ou mesmo, um representante ‗ad-doc‘; o que não podia, por essa falha, serem os alunos prejudicados.


A 07 de novembro, em ―A Pacotilha‖, sai a seguinte noticia, sobre a federalização da Faculdade de Direito do Maranhão: A FEDERALIZAÇÃO DA NOSSA FACULDDE DE DIREITO Tendo o exmo. Sr. Dr. Governador conhecimento do projecto que corre no Senado, em favor da Federalização das Faculdades de Direito dos Estados do Paraná e Pará, dirigiu-se s. Exc. aos senadores Clodomir Cardoso e Genésio Rego, no sentido de apresentarem uma emenda ao dito projecto, pleiteando a concessão de idêntica vantagem á nossa escola superior de Direito.[...]

Nota publicada em ―O Imparcial‖, de 04/11, informando que os dirigentes da Faculdade de Direito haviam encaminhado correspondência aos nossos representantes na Câmara Federal pedindo apoio para a oficialização da mesma, haja vista que se tornara indispensável para a formação técnico-profissional dos jovens pobres do Estado. Em resposta, o dep. Magalhães de Almeida respondeu que tudo fariam para que se com seguisse a autorização de funcionamento de nossa Faculdade de Direito. Logo no inicio de 1937, cheam comunicados de que havia nova alteração nas normas para ingresso nos cursos superiores; publicadas tanto n―O Imparcial‖ de 30 de janeiro, como na ―A Pacotilha‖ de 1º de fevereiro, com o títuloo de ‗ensino superior‘, o Inspetor Federal junto à Faculdade de Direito do Maranhão, dr. Manoel Francisco da Cunha Junior, informa ter recebido da Diretoria do Ensino telegrama que dava publicidade: Conforme o despacho minesterial de 15 do corrente (janeiro/37), relativo à decisão do Conselho Nacional de Educação sobre os alumnos cujo curso secundário se fez de acordo com o art. 100 do dec. 21.241, de abril de 1932, communico aos taes alumnos que poderão inscrever-se em exames vestibulares caso concluam a quinta série até fevereiro de 1937, inclusive. As suas inscripções poderão ser acceitas condicionalmente devendos elles apresentar o seu certificado de conclusão da quinta série até a véspera do encerramento das matriculas. Nas mesmas condições poderão ser aceitas as inscrições de candidatos dependentes da apreentação de segunda via de conclusão de curso ou de aprovação em qualquer exame.

Em julho, publicada novas regras para ingresso nos cursos superiores; em aviso do Fiscal Federal junto à Faculdade de Direito do Maranhão, era informado, através do telegrama n. 614.100 que estava à disposição dos interessados o Diário Oficial de 07 de junho, onde estava publicada a Circular 1.200, de 1º de junho, referente ao concurso de habilitação que substituiu o exame vestibular, para a matricula do ano de 1938. A 28 de janeiro, a ―Pacotilha‖ publica discurso do Ministro da Educação, Gustavo Capanema, durante o Centenário do Colégio Pedro II, apresentando um relatório das ações do Governo federal. Sobre o ensino superior:


O Ministro da Educação endereça telegrama ao Interventor Federal, dr. Paulo Ramos, de que fora nomeado, por indicação deste, o Sr. João Soares de Quadros para Inspetor da Faculdade de Direito do Maranhão. A 20/01 o novo Inspetor assume suas funções. (―O Imparcial‖ de 08/01/1939). Em março, (Pacotilha de 21/03) é publicado telegramas recebidos pelo Inspetor Federal junto à Faculdade de Direito: [...] Rio, 25 de fevereiro... Comunico-vos que a portaria 139, de 1 de dezembro de 1938, do Diretor Geral deste Departamento estabeleceu o seguinte: Os concursos de habilitação aos cursos superiores reger-se-ão no próximo anno, pelo disposto no artigo 47 do decreto 21.241, sem alterações provenientes da lei 9-A, prevalescendo, no entanto, para as inscripções, a media de 40 de conjunto nas disciplinas de 2ª serie Complementar,. Estatuída naquela lei. Assim sendo, só serão aprovados no referido concurso de habilitação alumnos que tenham média 30 cada disciplina e 50 conjunto. Rio, 3 março... n. 341 – Comunico-vos Ministro da Educação acaba de homologar o parecer do Conselho Nacional de Educação permitindo no presente anno sejam approvados no concurso de habilitação os alumnos que obtiverem 30 em cada disciplina e 40 em conjuncto, ficando assim sem efeito as circualres e actos anteriores fixando em 50 a referida media em conjucto. Rio, 14. N. 418 – Resposta vosso telegrama, communico-vos ser impossível iniciar o anno lectivo antes da terminação do concurso de habilitação conforme a circular 1200. Solicito tomeis urgentes providencias junto diretoria afim de ser terminado o referido concurso cuja approvação obedece a telegramma-circular 341 do corrente mês. Ruy Lima Silva – Director. J. SOARES DE QUADROS – Inspector.

Telegrama publicado a 12 de setembro de 1939 comunicava que a Faculdade de Direito do Maranhão fora desiquiparada pelo Conselho Superior de Ensino.


O corpo docente nomeou comissão composta dos catedráticos Luiz Carvalho Tarquinio Lopes Filho e Oliveira Roma para procurar o Chefe do Governo maranhense, a fim de que sua excelência defendesse junto às altas autoridades do País a causa da Faculdade. O corpo discente, por intermédio do Diretório Acadêmico, resolveu telegrafar ao Diretor do Departamento de Ensino, ao Ministro da Educação e ao Chefe da Nação, pleiteado que seja mantida a equiparação da Faculdade. O CASO DA FACULDADE DE DIREITO Rio (19). Voltou a ser discutido, na ultima reunião do Conselho Nacional de Educação o parecer n. 200, da comissão de ensino superior, referente à cassação das regalias que gosa a Faculdade de Direito do Maranhão. Esse parecer conclue pella aplicação da penalidade. O Conselheiro José da Fonseca apresentou uma emenda que foi aprovada contra os votos dos conselheiros srs. Reynaldo Rocha, Cesario Andrade e Parreiras Horta, para que fique adiada a applicação da cassação de reconhecimento, até o fim do corrente anno, procedendo-se, então, a uma verificação, cujo resultado será enviado ao Conselho, para deliberação definitiva.

Publicada a agenda do Interventor Federal, acusando o recebimento do seguinte telegrama, de parte do Ministro de Educação, Gustavo Capanema: Faculdade de Direito do Maranhão – em resposta de seu telegramma intercendo em favor de nossa Faculdade de Direito, o exmo. Sr. Interventor Federal recebeu o seguinte despacho telegraphico de sua ex. o Ministro da Educação e Saúde: RIO, 3 – Off. Interventor Paulo Ramos. Recebi e li com apreço seu telegramma no. 214 sobre situação Faculdade de Direito do Maranhão. Creio que resolução final votada pelo Conselho Nacional de Educação e por mim homologada permitte encaminhamento satisfactorio assumpto, pois manda submeter Faculdade a fiscalização por funcionário idôneo, designado pelo Departamento Nacional Educação. Resultado dessa investigação manifestara governo a resolver em definitivo. [...]

De acordo com Costa (2017) 178, em 1939, a Faculdade de Direito do Maranhão e a Faculdade de Farmácia e Odontologia foram levadas a encerrar suas atividades. As razões atribuídas pelo Departamento Nacional de Ensino para o fechamento de ambas foram as irregularidades administrativas. Entretanto, há questionamentos quanto a tal versão, atribuindo essa ação a motivações políticas e não a problemas de caráter eminentemente técnico-administrativo. Dino (1996, p. 76-77)179 relata: A chamada História Oficial conta que as razões cassatórias foram de caráter eminentemente técnico-administrativo. [...] No tocante ao arquivo da vetusta Escola Jurídica, ao que se sabe por informações oficiosas, o Dr. Soares de Quadros, então fiscal do ensino federal, quando do seu fechamento, houve por bem de empacotar toda a papelada burocrática e a remeter de navio para o Ministério da Educação no Rio de Janeiro. Na mudança do MEC para Brasília os pacotes e mais pacotes referentes à vida da velha Salamanca foram extraviados ou incinerados. O certo é que, no MEC, já em Brasília, apesar de incessantes tentativas, jamais conseguimos obter qualquer informação satisfatória a respeito. Uma outra corrente de pensamento sustenta não se poder buscar as primas causas da cassação da velha Faculdade de Direito sem a análise histórica da presença ostensiva do Estado Novo nos setores cultural, econômico e educacional em terras maranhenses.

178

COSTA, Marcia Cordeiro. A GÊNESE DA EDUCAÇÃO EM NÍVEL SUPERIOR NO ESTADO DO MARANHÃO E POLÍTICA EDUCACIONAL: os embates travados pela sua efetivação e consolidação. VIII JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. São Luis, 22 a 25 de agosto de 2017, UFMA/Programa de Pósgraduação em Políticas Públicas

179

DINO, Sálvio. A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO (1918-1941). São Luis: EDUFMA, 1996; 2ª edição 2014.


Ao se voltar o olhar para a conjuntura da década de 1930, Costa (2017)180 afirma que esse período inaugura outra etapa do ensino superior no país e, consequentemente, no Maranhão, decorrente das profundas mudanças no cenário político e educacional, resultante do governo Vargas (1930-1945). Surge, então, um aparelho de Estado centralizador no intento de estabelecer seu projeto nacionalista: [...] no Maranhão, [...] a presença de interventores é reflexo do centralismo adotado no governo Vargas que contribuiu imensamente para aguçar os conflitos e consequentemente a instabilidade política no estado. Só entre 1930 a 1937, governaram o Maranhão, sete interventores, cujos mandatos em geral, foram marcados por conflitos e instabilidades.‖ (BOTELHO, 2007, p. 178 181).

Para Cunha (2017), o período de 1937 a 1945 assinalou a nova fase política e educacional do país, caracterizadas por um conjunto de reformas educativas, que ficaram conhecidas como Leis Orgânicas de Ensino ou Reforma Capanema (MARTINS, 2002)182: Em nome do princípio da autoridade e da disciplina, decisões são tomadas e a autonomia universitária é negada. Entre os objetivos explicitados por esta nova ordenação jurídica e administrativa (Estado Novo), ―[...] estavam as perspectivas de ordenamento da educação; a definição de competências entre os diferentes estratos de governo (municípios, estados e união); articulação entre os diferentes ramos de ensino e a implantação de uma rede de ensino profissionalizante‖. (CUNHA, 1980, p. 14)183.

Manchete em ―O Imparcial‖ de 22 de agosto de 1941: NÃO SERÁ FECHADA A FACULDADE DE DIREITO RIO (21) Serviço especial.- o Dr. Oliveira Roma falando ao representante de O IMPARCIAL, declarou que a Faculdade de Direito do Maranhão não será fechada. Essa decisão foi garantida pelo Sr. Abguar Ransut, Diretor do Departamento Nacional de Educação. O dr. Oliveira Roma declarou, igualmente, que foram regularizados os casos dos cursos secundários superiores, do Maranhão, considerados defeituosos.

A 03/10, em nota, ―O Imparcial‖ se referia a insistentes noticias que chegavam, de que saira parecer opinando pelo fechamento da Faculdade de Direito. Até àquela hora, 6 da tarde, não havia sido confirmada a noticia que circulava pela cidade. Então, adveio o Decreto n. 8.085 de 21 de outubro de 1941, que cassou o reconhecimento da Faculdade de Direito. Em conseqüência, foi forçada a fechar definitivamente suas portas, [...] ―sendo seus arquivos recolhidos também ao Ministério e garantido, igualmente a seus alunos que se transferissem por escolas similares em outros estados.‖ (MEIRELLES, 1995, p. 67)184.

180

COSTA, 2017, obra citada BOTELHO, Joan. CONHECENDO E DEBATENDO A HISTÓRIA DO MARANHÃO. São Luís: Fort, 2007 182 MARTINS, A. C. P. Ensino superior no Brasil: da descoberta aos dias atuais. ACTA CIRÚRGICA BRASILEIRA, v. 17, São Paulo, 2002. Suplemento 3, citado por Cunha, 2017, obra citada 183 CUNHA, L. A. A UNIVERSIDADE TEMPORÃ: O ENSINO SUPERIOR DA COLÔNIA À ERA DE VARGAS. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980. citado por Cunha, 2017, obra citada. 184 MEIRELLES, Mario M. DEZ ESTUDOS HISTÓRICOS. São Luís: Alumar, 1995. 181


CARTAS AO MHARIO – ou O ENCALHE ou de Juazeiro a São Luis LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ

Cheguei hoje de Juazeiro do Norte. Foram dois dias de estrada, para percorrer os supostos 1001 km 12h52min segundo o Google Maps. Fui ate lá, seguindo o roteiro de menor caminho. SãoLuis-TeresinaJuazeiro... O que impressiona é o estado das rodovias no Piauí; boas, bem sinalizadas, o que não acontece com as do Maranhão, do Ceará e do Pernambuco, por ande passei tanto na ida, quanto na volta. Fui de São Luis a Picos, onde dormi; no dia seguinte Juazeiro. Na volta, até Teresina; parei para dormir e lá chegando minha filha Louise liga, perguntando onde estava... Teresina! acabara de chegar... E as noticias: - Estou em Bacabal, tentando chegar a São Luis... Como? Se estava em Santa Inês e não passa por Bacabal, são mais de 200 km de desvio... - Sim, Arari estava cortada; a única alternativa, vir por Bacabal... E não estava passando! O Rio já tomara a ponte... Peritoró também estava cortada, a chuva levara a ponte, sem possibilidade de passagem para São Luis. A única alternativa, ir por Parnaíba... No dia seguinte – segunda-feira - informações da PRF: São Luis estava isolada... Só mesmo por Parnaíba... Vi no mapa que poderia ir por Coelho Neto e de lá, Chapadinha... E seguir para São Luís Não, Coelho Neto estava com problemas, com um encalhe muitas carretas ficaram presas em um atoleiro na entrada da cidade; alguns carros pequenos conseguiam passar, mas só com tração, veiculo passeio não! Não arriscaria... Alternativa? Sim, poderia ir por União, de lá para Miguel Alves, pegaria uma balsa, para atravessar o Parnaíba ate Duque Bacelar, Buriti, Palestina, Chapadinha... Cortaria cerca de 300 km, da passagem por Parnaíba. A estrada estava boa, sem problemas (ou pelo menos, não tinham noticias...). Vamos tentar! Retorno a Teresina, pego a Avenida Kennedy em direção a cidade de União; mais ou menos uma hora, estrada boa, sem grandes problemas, paisagem bonita, muitas fazendas antigas, muita cana... União a Novo Lino, próximo à cidade, quase três km de buracos, menos de 10 km/h... Depois a estrada esta um pouco maltratada em alguns trechos, mas às 11 horas de ―la manãna‖ estou em Miguel Alves. Nova informação: a estrada para a balsa esta cortada, carro pequeno não passa... Apenas 7 km até o pontal... Menos de 30 metros intrafegáveis... As ruas de acesso, cobertas pela água... Uma rua bem calçada leva ate o pontal... Mas... Um trator trabalhando! Arrumando o trecho! O trator dá passagem! Sou o primeiro a passar... Mais 7 km, o pontal... Muita carreta em direção contraria, desviando o trajeto interrompido... Arari ainda sem passagem; Peritoró, só daqui a uma semana; Coelho Neto, talvez pela tarde... Vamos em frente... A balsa acabara de sair, o Parnaíba muito cheio, a balsa não atraca em frente, do outro lado do rio, mas tem que ir ate a cidade, rio abaixo - Duque Bacelar... O que se fazia em 15 minutos, faz-se em uma hora... E o rio, subindo... 13:15h a balsa esta de volta... Vamos atravessar o Parnaíba... Problemas do outro lado, no Maranhão... Muitos trechos com atoleiros... Próximo a Buriti, talvez não passe... Essa a informação de quem


vem do outro lado, desviando das chuvas, procurando alternativas para levar suas cargas... Boas informações da PRF... Um detalhe, eu não dirigo, nem tenho carteira, minha mulher, Del, ao volante... Gosta de estrada... Mas não tem o menor senso de direção, para virar a esquerda, tem que haver informação adicional: o braço do relógio... Mas esta indo bem, não precisei usar a pá, nem a corda uma única vez... Sempre trago no carro... Atravessamos o Parnaíba, ah João, João,que dor no coração... Seguindo a correnteza, não o trilho do trem, mas sem problemas, mais rápido, rio abaixo... Duque Bacelar... Vamos em frente, estrada sendo construída, boa, só com a base sem o asfalto, mas estão trabalhando... Informações de que a frente esta um pouco ruim, dois dias sem chuva, já, na região... A poucos quilômetros, enchente, estrada cortada, desabrigados, aqui, muito pó na estrada... Sorte!? Mas nuvens negras se formam... Vem chuva, logo... Seguimos... Um trecho muito ruim. Nos baixos, não há obra de engenharia! Não há arte! A água fica represada, e logo, logo, esse trecho virara lamaçal, e interrompida, antes mesmo de se colocar o asfalto... Quem é o Engenheiro? - melhor, o fiscal que não vê uma barbaridade dessas? Como se constrói uma estrada sem obras de arte? As pontes ainda em construção, mas sem os desvios, e passa-se dentro do rio... Bom que há dois dias não chove... Esse seria o problema... Seguimos, com o alerta que adiante haveria problemas... Chegou o lugar: duas carretas encalhadas, atravessadas na pista, sem condição de passagem, uma fila imensa de caminhões, nos dois sentidos da rodovia... Já dois dias... Estamos já pelo meio do dia... Quase uma hora da tarde... mas espere os carros da frente estão passando... Sim, estão passando! Carro pequeno passa por dentro do quintal das casas a beira de estrada... Não vamos ficar... Vamos em frente... Depois do lodaçal - e do desvio - volta-se a estrada, calçada! As pessoas estão reconstruindo a estrada... Colocando pedras para fazer uma base e tirar as carretas atravessadas... Mais um dia, para eles... Um pouco antes desse trecho, passamos por uma ponte, que esta sendo construída... Passa-se pelo leito do riacho... Pessoas ajudam e cobram pela "flanelagem" - sim, aqui no meio do nada encontramos flanelinhas cuidando da manobra dos carros..., mas há dois dias não chove... Sabe que fazem? Represam o rio! Para ter muita água e obrigar os motoristas de carros pequenos a pedir ajuda - cobram R$ 10,00 pela passagem... A travessia do Parnaíba custa R$ 8,00, e com a cheia e mudança do local de atracação, 30 minutos para baixo e hora e meia para cima... Um trecho de 10 metros? R$ 10,00 reais para ser empurrado... O carro da frente passou sem problemas, sem a 'ajuda', o de trás, desligou o motor e foi empurrado – ―deis toes‖, cinco homens empurrando e um flanelando... - o seguinte passou sem problemas... observei... vamos! Por aqui, marcha reduzida, não haverá problemas... passamos, sem ter que pagar... Mas o rio fora represado, para ter água e os 'atravessadores de carro' terem como cobrar, um palmo de água se transforma em 50 cm e nem esta chovendo, nesse trecho há dois dias... Passamos esse trecho, o do atoleiro pouco mais adiante, e chegamos ao asfalto... Até em casa, parando apenas para abastecer, almoçar em Chapadinha, milho assado, milho cozido, banana, tudo on que a estrada oferece aos viajantes, e temos direito! E em Itapecuru-Mirim, muita gente na ponte... O que esta acontecendo? O rio Itapecuru esta subindo! Mais um pouco e a água começa a passar por sobre as cabeceiras da ponte - a ponte é construída em arco! Mas as cabeceiras logo estarão com água... No sentido Sao Luis-Itapecuru, de vinda, antes da cidade, na Trizidela como se chama aqui o outro lado do rio, a rua que o margeia já esta tomada pelas águas, as pessoas já começam a sair de suas casas - por que sempre esperam o ultimo minuto? - com os pertences na cabeça, o rio está subindo!


Arari, o desvio não funcionou... Novas chuvas levaram o aterro (desvio) que estava sendo construído; Coelho Neto continua com os carros atolados, carro pequeno passa, mas tracionado e puxado por trator... Bacabal já deu passagem, pois desde ontem minha filha chegou a casa lá pelas 10 de noite... Esperou quase seis horas até o rio dar passagem; mesmo problema que esta afligindo Itapecuru-Mirim, as cabeceiras da ponte estão cobertas de água - ponte em arco... Peritoró ainda sem dar passagem, a chuva levou a ponte... Desvio, só por Parnaíba... Estou em casa, cheguei as 18:30h, sai de Juazeiro ontem, as seis da manhã... Fui levar meu neto, pois minha filha mais velha, Loreta, mudou para lá... Foi transferida de Fortaleza, para ficar mais perto de casa... Antes de Fortaleza, estava em Poços de Caldas... Para visitá-la, saída de manha, até Campinas, de lá ate Poços, mais três horas, de ônibus; saia no vôo das cinco da manha e três da tarde estava em Poços... Fortaleza, duas horas de vôo ou saída pela manhã e a noite estava lá, de carro... Agora, mais próxima, dois dias inteiros, de carro! Chegamos bem..., mas quanta miséria na estrada, especialmente no Maranhão... até quando?

Leopoldo Gil Dulcio Vaz Desde o Maranhão

ps. Roberto Drumont escreveu um conto magnífico, "O encalhe dos 300", quando a estrada entre Maringá e Campo Mourão estava sendo construída; eu estava lá! Eu estava nesse encalhe, vindo de Tuneiras para Maringá... Junto com o Roberto, e mais de 300 veículos, entre carros, ônibus e caminhões... Não sei por que lembrei desse encalhe, agora, depois que passei pelo de Duque Bacelar e soube do de Coelho Neto... Carros no atoleiro... Vale uma reprodução, Mhario... O encalhe dos 300...

PS. do ps. Mhario, ainda estamos ilhados. Verdadeiramente ilhados, na nossa querida Ilha do Maranhão...


OS JOVENS E AS SUAS HIPÓTESES BRUNO TOMÉ Há muito se observa no cenário político e cultural uma constante estratégia de substituição. Quer-se sempre tirar o antigo e substituí-lo por alguma coisa dita mais atualizada. De preferência, imediatamente. Trata-se de um modus operandi que existe desde que a Terra gira em torno do Sol. Por esse motivo, não pretendo adentrar no mérito desta estratégia de continuidade de poder. Os seus acertos e desacertos, se trata ou não da confirmação do método lampedusiano deque todo cambie para que todo quede igual (tudo muda para tudo seja igual), não serão objeto da presente abordagem. Muitos já ensaiaram a esse respeito. Não pretendo redundar em repetições. Quero me ater nesse artigo à apresentação daquilo que vem sendo apresentado como novo no campo cultural. Exemplos não faltam, basta ligar a televisão, o rádio e a internet. Nomes surgem todos os dias, sendo até muito difícil acompanhar. O caso mais emblemático da nossa cultura de massa sobre o que é novo que me vem à mente é o programa da TV Globo ―The Voice Kids‖. As regras de participação desse programa limitam a faixa etária para que subam ao palco apenas crianças ou pré-adolescentes. Segundo as regras, só podem se apresentam infantes entre 9 e 15 anos de idade. Seres em formação, no melhor sentido da palavra. Com todas as suas imperfeições, lacunas e ingenuidades, sem nenhum demérito. Aliás, com todos os méritos. Afinal, o encanto infantil reside exatamente nessa lacuna formativa, naquilo que ainda está em construção. Não é apenas poético, é real: sim, existe beleza naquilo que ainda não está pronto. Porém, algo preocupante me ocorre ao assistir o dito programa. Percebo cada vez mais que saltitam no palco postulantes que parecem fisicamente com adultos nas suas roupas, penteados e trejeitos. Tudo em nome de uma tal de ―atitude‖, um conceito indeterminado que criaram em algum lugar do mundo, não sei bem aonde. E digo mais, o estilo de apresentação de algumas destas ―crianças‖ me deixa perplexo. Não raros os candidatos que já cantam com um fraseado soul de música negra americana, com todos os falsetes, gingas e traquejos de um cantor adulto.Existem ainda aqueles pequenos candidatos que já querem ser os rockers calejados, com suas vozes guturais. Incrédulo, já cansei de perguntar para a minha esposa: ―Isso é ‗The Voice Kids‘ ou a versão adulta?‖ Não estou querendo pregar qualquer tipo de atitude pudica. A minha inquietação é com o conceito de levar uma criança já pronta e acabada para uma apresentação, sem falhas, apta a performar num grau de excelência de número internacional. Fica parecendo que a beleza da apresentação infantil reside no virtuosismo, no alcance das notas mais altas, a La Whitney Houston. Como se não existisse beleza em ver um pequeno calouro errar uma letra de uma música, no meio de um sorriso encabulado. Aliás, o simples fato de uma criança encarar tudo aquilo como uma brincadeira talvez seja onde reside a maior beleza de todas. Nélson Rodrigues e todoo seu modo de ver a vida como ela é, arrefecia esses ímpetos de juvenilização da cultura. Dizia ele que o jovem ainda é uma hipótese a ser confirmada pela vida. É uma incógnita, um projeto. Não deve ser cobrado para além disso, sob pena de ser taxado erradamente como ―o certo, o histórico, os sábio, os clarividente‖, usando suas próprias expressões. Quando proferiu esse ponto de vista, Nélson Rodrigues tinha os seus maduros 56 anos. Respondia às Páginas Amarelas da Revista Veja sobre o que achava do chamado ―Poder Jovem‖ (sim, grafado com letras maiúsculas), fórmula criada por diversos segmentos, da política à cultura. Ao contrário do que muitos podem pensar, não vejo em Nélson nenhuma atitude de despeito de um homem adulto ranzinza frente às ameaças do dito ―Poder‖. Pelo contrário, considero essa entrevista, datada de 04 junho de 1969, há quase 50 anos atrás, dotada de uma atualidade aguda. Tão atual a ponto de nos convidar cada vez para amar as nossas crianças e os nossos jovens exatamente como eles são. Como projetos de vida, com todas as suas imperfeições.


A GRAÇA PERDIDA E O ACHAMENTO DAS TRILHAS CERES COSTA FERNANDES

O mundo começou a perder a graça a partir de Cristóvão Colombo. A ideia fixa de alcançar as Índias navegando pelo Ocidente e provar que a Terra é redonda acabou com os temores do Mar Tenebroso e tirou a primazia dos raros e intemeratos viajantes, que detinham o saber geográfico e podiam mentir à vontade sobre as regiões desconhecidas. Com o desvelar do oculto, finou-se, devagarinho, o encanto do homem comum, aquele que rodeava os viajantes para ouvir dos mistérios das terras exóticas e dos mares nunca dantes navegados. Por séculos, embalaram o imaginário da humanidade as lendas de reinos inteiros de ouro e prata, de seres antropófagos com a boca na barriga, de sereias e seu canto mágico a chamar marinheiros enfeitiçados para o fundo do mar, de cidades de cristal em meio a florestas e das cidades submersas. De desencanto em desencanto, com a ajuda da ciência e da tecnologia, eis que o nosso planeta não está apenas conhecido, mas totalmente vasculhado. Assim, desembarcamos no sem-gracismo reinante neste início do Terceiro Milênio. Tempos tão insossos que nem o assaz anunciado fim do mundo aconteceu. A mídia mostra, sem cessar, tudo o que há nos quatro cantos da Terra. O fastio nos toma, quando vemos passar, na telinha, pela enésima vez, o Taj-Mahal, a esfinge de Gizeh ou como vive uma tribo dos Massais, na África. Os mistérios que compunham meu imaginário infantil: os dinossauros e seus fósseis, o dragão de Komodo, a vida no planeta Marte, acessíveis apenas aos iniciados, hoje são figurinhas fáceis, esnobadas: Lá vem o chato do dragão de Komodo, de novo, a comer carneiros e babar. Desliga isso, menino. Logo na hora do almoço. Que nojo! Ora, direis, e as descobertas espaciais? Nem essas. Do sistema solar, passado por varredura, sabe-se que, em nenhum dos seus planetas, há vida semelhante à nossa. Os discos voadores, os tais ÓVNIS, estão devidamente explicados e desmoralizados. Viagens espaciais tripuladas a outras galáxias? Só apelando para a ficção: os "portais intergalácticos" e outros que tais. Volto a afirmar: neste começo de milênio não há nenhum mistério a nos espicaçar a imaginação. . Mesmo em época de imaginação rala como caldo de galinha magra, como frear o desejo pelo desconhecido? E se o nunca dantes navegado, ao invés de longínquo, estiver próximo, ao alcance de umas horas de veículos bem tracionados? Deve ser esse o mote que impele uma categoria já bem numerosa aqui na província, a dos jipeiros. Montados nos seus 4X4, eles procuram o inesperado nas trilhas de areia fofa, em meio à vegetação rala dos cerrados, no enfrentamento de atoleiros e de horas e mais horas de canseiras e sacolejos. Descem às grotas cavadas nos barrancos, cruzam rios sem pontes, sobem dunas, no afã de descobrir os lugares, cada vez mais raros, em que as marcas da civilização só chegam em lombo de animais. Surpreender vegetações intocadas, águas cristalinas, animais no seu hábitat, é recompensa nem sempre conseguida. Por vezes, o desencanto acontece à visão de sinais, mostrando que as primícias da descoberta já foram colhidas. Mas o chegar talvez seja menos importante que o exercício do desejo de superação e enfrentamento inerente ao ser humano. Se vivo fosse (com mais de 500 anos!), enjoado deste mundo em que nada mais há para conquistar, seria Cristóvão Colombo jipeiro?


LAÇOS DE FAMÍLIA ANTÔNIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃO Membro da Academia Caxiense de Letras, da Associação Internacional de Escritores – IWA, em ToledoOhio, USA e da Comunidade ELOS. Fundador da Academia Ludovicense de Letras. Publicado em O IMPARCIAL, 22 de abril de 2018 Maria José Ribeiro Serra, Santa, Santinha para os íntimos, tia caçula e única remanescente de uma prole de quatro mulheres: Nadir Celeste (Lilita), minha querida e sempre lembrada mãe; Conceição de Maria (Neném) e Maria Rosa (Doninha), filhas de Augusto do Espírito Santo Ribeiro, maranhense, e de Maria Laura da Silva Ribeiro, portuguesa da região de Trás-os-Montes, vinda ainda bem criança para o Brasil. Tia Santa aproximava-se mais da realidade que encontrei ao nascer quinze anos depois dela. Assim não esquecemos nossas idades e permanecemos vivendo como jovens há mais tempo; quando a encontro, como fiz recentemente, em conversas quase intermináveis, aconchegos, fotos, é como se voltássemos àqueles velhos tempos. Lembro-me muito bem do dia do seu casamento. Na casinha porta e janela da rua do Pespontão, em um fim de tarde ao esconder do sol, os decoradores da época davam os retoques finais de azul no altar armado na sala, para o enlace com o Ézer Serra. Tia Santa e o Ézer foram felizes enquanto ele viveu; tiveram, também, uma prole de quatro mulheres, minhas queridíssimas primas Maria dos carinhosamente chamadas Remedinho, Teresa, Gracinha e Bibi. Em São Luís, tia Santa foi funcionária dos Correios e morou, de novo, numa porta e janela tradicional, na rua de Santana, com as filhas; tempos depois, ela preferiu deixar São Luís e foram todas para o Rio de Janeiro; daí em diante convivemos de perto por longos anos, quando eu era ainda solteiro e mesmo depois de casado, no apartamento do Jardim Botânico. Tia Santa sabe muitas histórias da numerosa família Ribeiro, certamente quem mais sabe. Através dela fiquei conhecendo a personalidade da minha avó Maria Laura, que era alegre, gostava de jóias e de dançar; da minha bisavó Maria Rosa, que se casou com o português Bernardino Ferreira da Silva, pai da minha avó; do primo Francisco de Assis Garrido, poeta e escritor, da Academia Maranhense de Letras. Esta crônica é em sua homenagem, estimada tia Santa. A senhora é a tia mais nova e eu o sobrinho mais velho; é por isso que é menor a diferença de idade que nos separa, para permitir essa identidade de propósitos, identificação de sentimentos e amizade duradoura. No ano que vem vamos contar essa diferença de idade num patamar já bastante elevado – seu centenário - dessa vida que temos tido e aproveitado, de muitas alegrias e de algumas tristezas. Fico pensando na sua trajetória, dos bons e maus momentos no seio da família Ribeiro; das suas lutas desde jovem e depois que ficou viúva, e preferiu guardar as gratas lembranças do Ézer; dos esforços para criar e educar suas quatro filhas, minhas primas. Sabe Deus o que isso lhe custou; merece, portanto, todo meu respeito e admiração. Dizem que a velhice nos dá sabedoria. É mesmo: uma coisa é teorizar, outra falar da experiência vivida. Passei quase trinta anos da minha vida tentando ensinar e educar universitários, assim como procurei fazer com meus filhos e, agora, com meus netos. Não tenho nenhuma dúvida de que minhas tias, como você, concorreram à formação da minha personalidade. Tia Santa completou 99 anos. Desejo-lhe saúde e paz, e vida longa.


O ABRIGO DE ORFEU – Livro de Paulo Rodrigues

DILERCY ADLER

A chave para o entendimento do mundo e do agir humano é a grande busca do cientista, do filósofo e do artista, que, através de profundos mergulhos para além do mais palpável, desejam trazer novas respostas por meio de vieses novos e caminhos inabituais. Vou me deter mais no fazer do artista e, dentre as artes, a poesia, por causa do motivo que nos reúne hoje aqui neste salão... Estamos, hoje, ao lado de muitos amantes da poesia e de um poeta que ousa amorosa e corajamente expor as suas dores, os seus amores, os seus delírios, os seus sonhos que não são só seus, mas de muita gente... de toda a humanidade introjetados e acalentados que necessitam sair de quando em vez.... Ele, inteligentemente, arrolou-os todos em um abrigo, fazendo um abrigo para os seus poemas, mas não quis ficar egoisticamente como único dono... Assim, generosamente, traz o abrigo para a luz, de onde saem todos os sentimentos que habitam o corpo humano e se manifestam clara ou metaforicamente no dia a dia, ano após anos de cada vida!... Mas não é qualquer abrigo o escolhido é o de Orfeu!!! E quem é Orfeu? Um poeta e músico, filho da musa Calíope e de Eagro, rei da Trácia. Era o músico mais talentoso e quando tocava sua lira que lhe fora presenteada por Apolo, os pássaros paravam de voar para escutar e os animais selvagens perdiam o medo. As árvores se curvavam para pegar os sons no vento. Até que um dia Orfeu se apaixonou por Eurídice e casou-se com ela. Enquanto Orfeu tocava feliz a sua lira, ela dançava e cantava no bosque, aguardando por sua noite de amor. Mas Eurídice era tão bonita que, em pouco tempo atraiu um apicultor chamado Aristeu e quando ela recusou suas atenções, ele a perseguiu e tentando escapar, ela tropeçou em uma serpente que a picou e a matou. A concretização do seu casamento não se realizou. Orfeu então, decidiu viajar para o Mundo dos Mortos para tentar trazê-la de volta. Como toda tragédia grega, Orfeu só consegue se unir à sua amada depois de enterrado no Monte Olimpo, e, desde então, os rouxinóis cantaram mais docemente que os outros, pois assim Orfeu, na morte, se uniu à sua amada Eurídice. Atemporais e eternos, os mitos estão presentes na vida de cada ser humano, não importa em que tempo ou local. Somos todos deuses e heróis de nossa própria história. A mitologia grega, repleta de histórias e contos sobre deuses, deusas, batalhas heroicas e jornadas no mundo subterrâneo, revelanos a mente humana e seus meandros multifacetados. Os mitos, entre outros benefícios, nos ajudam a entender as relações humanas. Paulo Rodrigues viaja por Abrigos, Terraços e Metáforas e homenageia uma matriarca familiar, a Vó Zabel, e nesse percurso vai falando, cantando, poematizando, versos que nos chegam aos ouvidos como suaves melodias dos rouxinóis de Orfeu. E então nos diz no seu livro: um andarinho esquartejado em pequenos pedaços entra no caminho... assim ele vai como Orfeu antes de ter os seus próprios pedaços reunidos e enterrados no monte Olimpo. ... e arranca as sandálias do esquecimento... em outro momento: busco o punhal saio do abrigo...as pernas pedras a língua inflamada subindo o morro da dor...


Nessa bela obra passa por promessas como: não amarei nunca/verbos domesticados/ repetindo velhos passos [...] eu retiro a palavra/do buraco da lama/ dou leite do peito para ela se limpar pág. 23. Vejo neste último verso a valorização da maternidade em que o leite, não é qualquer leite, é o leite do peito; aparece com a missão de pureza limpando a lama, parindo a palavra limpa. A solidão, muito cantada em versos pelos poetas, emerge em seus cantos quando diz na pág. 25: costumo deitar com palavras [...] a poesia me acorda/ com carícias da madrugada[...] eu respondo com cochilos/ roncos e silêncios... Vê assim na poesia uma companhia descompromissada com o retorno... E na pág. 26 assume: Eu sinto solidão, ou ainda: sozinho na areia [...] eu também sou um ser de silêncio, pág. 56. Vejo culpa, não só a própria, mas a de todos nós, quando diz na pág. 44: Só o antigo desejo/ de confessar meus pecados/ para o silêncio das águas. E ainda na pág. 28 coloca: [...] não sei andar/ sem tropeçar no passado/ palavras sangrando/ amarram o grau/ dos meus arrependimentos/ [...] mas sou de carregar a cruz/ e sorrir com satisfação... A angústia se revela de forma agigantada na pág. 64 em: [...] são gigantes as angústias de todas as auroras. Ambivalente, deixa clara a necessidade de contato, sem muita exigência, quando expressa na pág.71: gosto mesmo de gente/ que tem fases diferentes/ lua na carência/ sertão sem fim. [...] gosto mesmo de gente/ que não sufoca as palavras. [...]eu sou inquieto verbo/lagarto na areia quente. Não posso deixar de destacar o que Paulo fala da vó Isabel, o carinho, o costume da época está bem claro e quando diz na página 67: toda vez que minha vó Zabel/ me olhava pelos cantos/ sem palavras em minha boca/ dizia baixinho em meu ouvido:/ - te afasta do desconsol Fica claro que o poeta olha o mundo muito mais com o espírito e comunica um pouco do seu espírito para os demais. Desse modo, a linguagem poética transmutada é advinda do olhar do poeta que transcende a materialidade observável, e é isso que Paulo Rodrigues nos oferece neste livro. Daí se configurar como uma leitura imperdível!! Parabéns, Poeta! Continue plantando e colhendo poemas!

São Luís, 23 de fevereiro de 2018. Dilercy Adler


UM HOMEM DE VALOR ANTÔNIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃO

Antônio Brandão (1905-1980), meu pai, nasceu em Picos (atual Colinas), no dia 25 de abril, e faleceu em Caxias, no dia 25 de janeiro. Estava à frente de uma nova reforma de nossa casa, na antiga rua do Cisco, e eu mesmo fui busca-lo à sua última morada, em São Luís Escrevo, mais uma vez, sobre passagens de sua vida e das indeléveis lembranças que nos deixou. Ele viveu a infância e adolescência na sua terra natal; depois veio para São Luís e conseguiu emprego na tradicional firma Lima, Faria & Cia., do tradicional comércio da Praia Grande. Tinha, então, 20 anos. Em 1930, naturalmente levado pelos arroubos da juventude, engajou-se na tarefa de contestação ao regime vigente; em 1933, casou-se com Nadir, minha mãe, e foram viver em Caxias. Foi, sempre, um homem generoso com esposa e filhos, netos e bisnetos: presenteava no Natal e, quando viajava, não esquecia as lembranças. Lá pelos idos de 1938, lembro-me da primeira bicicleta ganha, que foi responsável pela maior sensação de liberdade experimentada no equilíbrio naquelas duas rodas. Em 1940, nossa família mudou-se para Picos, ele novamente nomeado Prefeito, assim como ocorrera em 1931; a viagem foi rio acima e durou vários dias, com o Itapecuru caudaloso e cheio de corredeiras traiçoeiras. No final de uma tarde chuvosa, embarcamos em um grande bote (batelão) rebocado por uma pequena lancha; papai, na sua inventividade, ajudara a transformar aquela embarcação em um verdadeiro apartamento, todo forrado, divisórias de palha e armadores de redes. Àquela altura já éramos cinco filhos. Ainda nesse ano de 1940 viemos para São Luís, onde vivemos dias inesquecíveis, bons e maus, estes em 1942, quando meu pai foi preso político do regime Vargas, em repressão às ideias integralistas; em 1944, retornamos a Caxias e ele voltava a estabelecer-se, desta vez por conta própria, até 1960, com a tradicional ―Casa Brandão‖, no comércio de fazendas, estivas, ferragens e miudezas em geral, atividade marcante em sua vida empresarial. Durante todo esse tempo colaborou intensamente com as classes produtoras de Caxias: liderou a criação da Cooperativa de Babaçu, fez parte da Associação Comercial e da Associação Rural; foi membro assíduo do Rotary Clube e confrade do Centro Cultural Gonçalves Dias. Era um homem de temperamento dócil, falava pouco e expressava seus sentimentos através dos atos que praticava. Raras vezes o vi com lágrimas nos olhos e uma delas foi quando parti ao trabalho e estudos, no Rio de Janeiro; ele nunca disse, mas desconfio que gostaria que eu tivesse ficado, para assumir os negócios na loja de tecidos, depois na moageira de café, na fábrica de guaraná, na indústria de óleo babaçu e nas plantações de caju. Na vida pública, além de prefeito de Picos, por duas vezes, foi: Vogal dos empregadores na Junta de Conciliação e Julgamento de São Luís, em 1935; diretor do Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda, em 1940; diretor-secretário do Banco do Estado do Maranhão, entre 1942/1944; foi ainda advogado provisionado e jornalista profissional. Meu pai foi um homem humilde, generoso, inventivo, empreendedor, amoroso, participativo, sensível. Que Deus o tenha em sua Glória! *Economista. Membro da Academia Caxiense de Letras, da Associação Internacional de Escritores – IWA, em Toledo-Ohio, USA, e da Comunidade ELOS. Fundador da Academia Ludovicense de Letras.


O SONHO DE RAFA CERES COSTA FERNANDES Conheci seu Rafa nos anos 70, tempo em que era comum e seguro flanar pelas ruas do Centro de São Luís. A Praça João Lisboa concentrava quase todas as bancas de jornal e de revistas da cidade, e eu, assídua freguesa, morava perto e ia a pé. A caminhada pelas ruas tranquilas de poucos carros, brisa fresca, equivalia a um passeio. Na praça, tipos populares a granel, Seu Rafa, um dos mais conhecidos, costumava ficar perto das bancas a observar a passagem das mulheres. Moreno claro, baixo, encorpado, barrigudo, de pernas cambotas, usava enormes bigodes revirados, à moda portuguesa, e tinha uma voz de taboca rachada com forte sotaque interiorano. Um chapéu de caubói e botas cambaias compunham um tipo estranho e atemorizante.. De seu posto de observação, jogava sempre algum gracejo, na maioria das vezes, bem pesado e chulo, para as mulheres passantes. E se a simpatia – dele - fosse maior, passava do gracejo ao encalço da escolhida. A preferência recaia, geralmente, nas mulheres fornidas e calipígias, por que não dizer logo, nas cheinhas e bundudas. Quando deparava uma, saía atrás dizendo coisas impublicáveis, às vezes desconexas, mas sempre engraçadas. Ao contrário do que seria de se esperar, não partia das palavras para ação. Seguia a vítima por algum tempo, sempre falando, e depois voltava ao seu ponto de observação, que variava conforme dia e hora. Eu tinha medo de seu Rafa, corria léguas e dobrava voltas para não passar perto dele. Logo, percebi que era inofensivo, não atacava ninguém, só gostava de falar e de se gabar. Na minha curiosidade por gente desaparafusada, passei a observá-lo de oitiva, tentando saber o que dizia às passantes, tarefa fácil, já que ele falava muito alto. Nos tempos inquisitoriais de hoje, talvez ele fosse preso por assédio ou atentado ao pudor, sei lá. Um dia, descobri que seu Rafa tinha amizades no Fórum. Estava eu lá, às voltas com um processo, quando ele entrou, sem pedir licença, muito à vontade. Foi efusivamente saudado pelos funcionários e dirigiu-se ao gabinete de um juiz, meteu a mão na maçaneta da porta e embarafustou sala adentro, lá permanecendo um bom tempo. Em outra ocasião, estava eu andando, devagar e tentando me equilibrar nas calçadas estreitas e quebradas da Praça Odorico Mendes, quando ouvi atrás de mim aquela voz alta e roufenha. Estremeci e apressei o passo em fuga. Se bem que eu não fosse exatamente do tipo preferido dele, mas nunca se sabe. Rafa, falando alto, logo me alcançou e passou por mim como em transe. Respirei. Conversava com um alguém imaginário, e dizia mais ou menos isso: ―Se eu ganhar na loteria, eu já avisei, volto pra Pinheiro e, chegando lá, mando fazer mingau de milho pra todo mundo. Ninguém vai ficar sem mingau. Vai ser uma fartura, siô. Vai ser mingau muito! Vou encher Pinheiro de mingau!‖.E seguiu caminho, falando e bracejando entusiasmado. Então, o maluco Rafa, o temido Rafa, o rejeitado Rafa, também tinha um sonho? O sonho de ganhar na Loteca. Nada de estranho, o sonho de ficar rico por meio de jogo é de muita gente. Mesmo sabendo que as possibilidades de ganhar o grande prêmio são menores que morrer de acidente aéreo, não abrimos mão desse sonho quase impossível. Aos sonhos lotéricos segue-se o que fazer com o dinheiro ganho, que esperamos ser de um montante bem alto. Ora, se é pra sonhar, vamos pensar em mixarias? Resta saber o que significa riqueza para cada um. Houve um caso – lembram? - em que uma mulher favelada ganhou sozinha na Mega Sena, perguntada sobre o que faria com o dinheiro, respondeu candidamente que iria usá-lo na reforma do seu barraco. Mas o maluco-beleza, que não sei se possuía teto, tinha o sonho de alimentar seus conterrâneos, e com o que ele achava ser o suprassumo da boa alimentação: mingau de milho (acho que concordo com ele). A partir desse dia, passei a admirar seu Rafa. Algum tempo depois, o vi na TV; ele chorava e esbravejava: um poder de infância qualquer havia tirado da sua convivência uma filha pequena – fora abandonada pela mãe – que ele criava num arremedo de casa. Mais uma surpresa, seu Rafa tinha uma filha e era um pai carinhoso! Depois disso, o perdi de vista. Há


muito não caminho pelo Centro e compro revistas nos shoppings. Talvez ele ainda esteja vivo, não sei. Se morreu, espero que se encontre em um lugar de jaçanãs e verdes campos, onde uma enormidade de mingau de milho, em imensas panelas cheirosas e fumegantes é distribuída a todos. A iguaria é servida por mulheres poderosas e bundudas em grandes canecas, quantas e quantas vezes os comensais desejarem. Ninguém mais passará fome. É isso aí, seu Rafa.


O CIRCO JARBAS NICOLAU CERES COSTA FERNANDES Hoje pela manhã, Dr. Ribamar, clínico do hospital municipal, teve esclarecido um mistério antigo. Depois de tantos anos, o enigma do peru que dança mambo desfez-se. A amena frustração, cultivada com papinhas e mel, desde a infância em Buriti, propiciadora de um incômodo gostoso como a coceirinha de um dartro no pé, foi-se. Tudo resultou de um encontro e uma conversa com o Padre Paulo Sampaio, sabedor de coisas que até Deus duvida e emérito conhecedor de circos mambembes. No ato, o sacerdote matou-lhe a charada. Enfim, o doutor teve a curiosidade satisfeita. Ribinha se impacienta, inda cinco e meia. Eita siô!. O tempo não andava, ter que esperar até as sete era um suplício. Tão dizendo que o Circo Jarbas Nicolau é bom demais. Famoso. O pessoal fala que ele já andou até pelas cidades de Caxias e Timon e, se duvidar, até por Teresina. De ruim é que não tem nenhum animal. Quer dizer, tem o famoso "peru que dança mambo", coisa que nunca vi, mas peru não é bem um animal, assim como um leão ou uma girafa, é mais parente de galinha. Já vira uns retratos desses bichos grandes, no álbum de figurinhas das balas Surpresa. Mas bem que queria ver um de verdade. Não tinha bicho, mas tinha palhaços e trapezista e o terrível "homem que come gente". Era mais que suficiente para provocar aquele friozinho na barriga. Ali, no Buriti, um circo não era coisa de todo dia. A mãe dissera: só vai se for com a Ritinha. Pra ver a função, além de Ribinha, iam também Maristela, Catulé e Bito. A Ritinha de dona Almerinda, mocinha compenetrada, com os peitinhos nascendo, cheia de juízo, é que ia tomando conta de todos. Seis e meia. Nada da Ritinha passar. Ô siô! E se perdessem a sessão? Eh, lá vem ela, acompanhada de um renque de meninos, todos com tamboretes nas cabeças. Pega também o seu e se integra ao cortejo. Têm que andar rápido para achar lugar para os seus bancos. No circo não há arquibancada nem cadeiras. O folheto dizia que cada um levasse seu assento. Já avistam o Circo Jarbas Nicolau. Riba o acha porreta e Catulé fala: soberbo! O que significa isso, Catulé? Sei, não. Mas ouvi seu Leutério falar e achei bonito. O toldo do circo é engraçado, feito de uma faixa sim outra não de lona crua, de modo que o circo só era coberto pela metade. O morim das laterais, meio transparente, dava até para ver os vultos que se moviam lá dentro. Aproveitando isso, o moleque Cebola, que não teve dinheiro pra comprar ingresso, sentado num barranco, esforçava a vista tentando, de fora, acompanhar a função. Vai começar. Entra o palhaço Farinha com um cabo de vassoura na mão, a cintura amarrada com uma mangueira velha, calçando tênis roídos. Atrás vêm dois homens, com cara pintada de alvaiade, e se põem a conversar. Farinha dirige-se para a dupla e pede a cada um que pegue em uma ponta do cabo de vassoura. Isso feito, pergunta: como é o nome deste circo? Jarbas Nicolau, respondem simultaneamente os dois homens. E Farinha: peguei dois bestas na ponta do pau! Risadaria enorme. Eita siô, é danado, esse Farinha. É a hora da trapezista. Dizem que ela é de Moscou. Onde é isso? Sei lá, mas deve um lugar longe e, quem sabe, uma cidade maior que Teresina. Entra uma moça baixinha, parda, gordinha, com um maiô de seda preta já desbotado, enfeitado de lantejoulas esparsas e meias de arrastão. Tem os cabelos longos e crespos e um ar de enfado. Desenrola um tapetinho no chão, em baixo do trapézio. Ué, o trapézio mais parece um balanço, tão baixinho, diz Maristela. Cale a boca, você não entende de circo, sua burra! Credo, Ribinha, não falei por mal. A moça faz umas pulitricas em cima do tapete, depois equilibra-se em uma tábua colocada sobre um rolo e finalmente, de um pulo, alça-se ao "trapézio". As crianças vibram. Deve ter vindo mesmo de Moscou, essa aí. A próxima atração, "o homem que come gente" não finalizou por falta de voluntários. Não cabe culpa à direção do espetáculo, como registrou devidamente o apresentador. Venham os fatos. Boy Canibal, o artista, um fortão ruivo sem tamanho, entrou em cena, batendo no peito, arreganhando os dentes e rugindo para a assistência enquanto, aos gritos no megafone, o locutor pedia que se apresentasse alguém da platéia para ser comido. As pessoas da primeira fila fingem desinteresse e discretamente vão arrastando os bancos para trás. Súbito, alguém atira um moleque magricelo no meio da arena. O bruto agarra o coitado e ferra-lhe uma


dentada na carapinha. O infeliz escapole e foge apavorado, aos gritos. Alguém mais? Ruge o trubufu, rodeando o picadeiro. Silêncio profundo. Boy Canibal retira-se fazendo aquele gesto vitorioso de ganhador de uma luta de boxe. Ufa! E agora, qual a próxima atração? Já se anuncia: é o peru que dança mambo. Começam a cair gotas de chuva. Poucas e finas, depois grossas e urgentes. O apresentador, pernas pra que te quero. O jeito é correr que a chuva é de trovoada. Bancos na cabeça, pernas ligeiras, no caminho de volta. A enxurrada vem vindo, não dá para prosseguir. Entram, de cambulhada, na bilharina do seu Jair. O pequeno salão já está cheio de outros refugiados da chuva. O calor é sufocante e o cheiro de urina arde nas narinas de Ribinha Na rua, a enxurrada desce encachoeirada, cavando o barro. E o peru que dança mambo? No dia seguinte, o circo foi embora levando para sempre o seu segredo. E agora, sem mais, não é que o Padre Paulo desvenda o enigma? O grande sucesso dos circos mambembes é um truque simples: pegam uma vasilha com brasas dormidas, põem em cima uma folha de zinco e amarram o peru para que não fuja. A pobre ave, para libertar-se do calor nos pés, levanta ora um pé ora outro, ao som de um caliente mambo. Eita mistério mais besta, siô.


A MATERNIDADE PELO REVERSO CERES COSTA FERNANDES

No Dia das Mães, invenção da classe média e do consumismo, deixemos de lado as mães doces, os filhos dedicados, as festas e presentes. Vamos falar no reverso de toda a conceituação da palavra mãe. Falar do que vemos, diariamente, na mídia: de filhos deixados em casa, acorrentados ao pé da cama ou ao botijão de gás; das crianças pequenas cuidando de outras menores ainda; das mães torturadoras queimando as mãos do filho que foi apanhado roubando, ou colocando ovo quente na boca dos mentirosos... A lista é longa e revoltante. Paremos por aqui. Horroriza-nos tudo isso. A tendência é condenar: merecem execração pública, cadeia, até linchamento. Algumas são criaturas que nunca deveriam ter tido filhos, megeras a desmerecer o nome de mães. Outras apenas vítimas da miséria e da cultura machista dos sem-classe-alguma, que estabeleceram ser apenas da mãe a responsabilidade de arcar com a criação e sustento dos filhos. É comum o abandono da mulher grávida pelo amante, com apenas um ―te vira‖, ―quem disse que o filho é meu?‖. Por pobres e ignorantes que as mães sejam, excluídas as degeneradas ou aquelas que, sob o descontrole do puerpério, cometem infanticídio, a esmagadora maioria assume a criação dos filhos solitariamente. Um correr de olhos sobre comadres, empregados domésticos e nossos prestadores de pequenos serviços nos diz quantas mães solteiras conhecemos assumindo a posição de mães-de-família. Muitas, não? E quantos pais assumindo, sozinhos, a criação dos filhos? Contam-se nos dedos de uma só mão. As mães que queimaram mãos e bocas dos filhos acreditam que assim estão ―educando‖ os filhos, evitando que se tornem ladrões e sem caráter, perpetuando os ensinamentos que receberam dos pais. Retribuem a violência sofrida na própria infância. A que acorrentou a filha de doze anos conta que sai de casa pela manhã para trabalhar e só volta à noite. Alega que a menina, se solta, sai para a boca-de-fumo próxima. Deixam as crianças sozinhas, trancadas por não ter como pagar alguém para cuidá-las, porque não há creches e nem escolas em tempo integral. Saem obrigatoriamente para trabalhar e, às vezes, para se divertir, que ninguém é de ferro, esquecer um pouco a miserável vida, e provavelmente acrescentar mais um rebento ao rol dos infelizes. Não estou defendendo, nem justificando tortura de crianças. Digo apenas, a maioria é fruto da ignorância e da miséria, duas faces da mesma ignominia. Em vez de ficarmos no horror, devíamos cobrar de nossos representantes a demonstração de como são aplicados os nossos impostos; não votar em quem ―rouba, mas faz‖, e muito menos em quem rouba e nem faz; observar os evidentes indícios de enriquecimento ilícito de políticos e expurgá-los nas próximas eleições, com o cuidado de não substituir uma raposa de bolso cheio por uma raposa esperando para encher o seu. Não nos deixemos levar por simpatias. Senhor Candidato, cadê o seu programa? Assim vão surgir melhores condições de vida. . Digo que o principal problema do Brasil é a falta de educação. Não confundir com instrução, apenas parte do processo educacional. Se exigirmos e obtivermos Educação, no seu sentido mais abrangente, desde o lar, todo o resto nos virá por acréscimo. Quem é educado, não polui, defende o meio-ambiente, cuida da higiene pessoal, conhece as noções básicas de saúde, não usa de violência e sim procura o diálogo, cobra de seus governantes os seus direitos, conhece e cumpre os seus deveres, respeita os direitos alheios, em suma: é cidadão. Talvez assim possamos voltar a falar de flores no Dia das Mães.


UM HOMEM ALÉM DO SEU TEMPO OSMAR GOMES DOS SANTOS Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís Membro das academias Ludovicense de Letras, Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências Artes e Letras

Buenos Aires, 21 de janeiro de 1913, em terras ―hermanas‖ o Brasil perdia um dos seus maiores expoentes na literatura: Aluísio Tancredo Gonçalves de Azevedo, membro da Academia Brasileira de Letras, titular da Cadeira n. 04, patroneada por Basílio da Gama. Natural de São Luís do Maranhão, Aluísio Azevedo foi fundador do movimento naturalista e tinha como marca a atenção aguçada para as problemáticas sociais que permeavam a sociedade brasileira na segunda metade do século XIX. Quando jovem, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde se dedicou ao desenho e fazia caricaturas e poesias na função de colaborador de jornais e revistas naquele estado. Inaugurou sua carreira literária com ―Uma lágrima de mulher, em 1880‖, sendo consagrado logo no ano seguinte com a obra ―O Mulato‖. O livro ensaiava uma característica que marcara sua carreira como escritor, intelectual e crítico. Dono de um peculiar domínio das letras, retirava delas toda a acidez necessária para retratar as mazelas de uma sociedade aristocrata na qual os pobres e negros não tinham vez. Com a coragem de um idealista, denunciou a situação do negro e das pessoas que viviam às margens da sociedade. Sua rica produção avança, abrindo espaço, também, para o inconformismo com os costumes e regras de conduta social. Como consequência de suas inquietudes, Aluísio Azevedo nos brindou a obra ―Casa de Pensão‖ e com aquela que se tornou uma joia da literatura brasileira: O Cortiço. Azevedo é daqueles escritores de vanguarda, que escreveram para a posteridade. Seus rabiscos não se perderam nos fundos de caixotes guardados sob a poeira de um porão qualquer. Forma ímpar com que discorrera sobre um capítulo social da nossa história fizera com que seus escritos se tornassem eternos. Nesta semana, mais precisamente no último 21 de janeiro, completou-se 105 anos de sua perda, ainda jovem, aos 55 anos. No entanto, a ordem natural da vida não nos permite lamentar diante de tão importante contribuição de quem viveu tão intensamente e deixou uma herança inestimável a todos que ousam se debruçar sobre suas ideias. Apesar da opção pelas letras, não se pode negar que Aluísio Azevedo foi um eterno pintor. Sua obra é tão rica e fidedigna à realidade que o cercara que parece projetar na mente do leitor imagens de tudo aquilo que é narrado detalhadamente. As páginas eram como telas, pinceladas graficamente com a essência social que passava a sua volta. Em uma repentina mudança de vida, praticamente abdicou da vida de escritor para se dedicar à diplomacia, campo em que também fora bem sucedido, representando sua nação em diversos países mundo afora. Morreu em Buenos Aires, Argentina, em sua última missão como diplomata. Embora tenha escolhido se recolher no anonimato literário desde então, suas a importância de suas obras já não cabiam em si. A essa altura, Aluísio Azevedo já havia deixado uma marca indelével, única, na literatura brasileira. Ele rompeu com preconceitos e ousou lutar contra o preconceito de cor, o adultério, os vícios e o povo humilde. Ao escrever sobre Aluísio Azevedo, regozijo-me por dois motivos: o primeiro é vejo parte de minha trajetória de vida se passar na obra ―O Cortiço‖; o segundo é o fato de o suceder na cadeira nº. 14 da Academia Ludovicense de Letras. Compor grupo tão seleto e sentar na cadeira inaugurada por um dos maiores expoentes da literatura brasileira é motivo de grande orgulho, mas também de grande responsabilidade.


Ao rememorar a data de sua morte, não se pretende reportar a um sentimento nostálgico com certo tom saudosista. Em uma sociedade ainda de grandes contrastes, sua obra permanece viva, pujante e indiscutivelmente atual. Falar de Aluísio Azevedo, portanto, em qualquer contexto, em qualquer tempo, é se lançar no árduo desafio de dialogar com o contexto social, político e econômico que nos cerca. Mas, sobretudo, é juntar forças e se despojar para agir sobre essa realidade conferindo-lhe a mudança necessária para uma sociedade mais justa.


PRISIONEIROS DA VIOLÊNCIA OSMAR GOMES DOS SANTOS Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís e membro das academias Ludovicense de Letras, Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências Artes e Letras

Ao refletir sobre a sucessão de acontecimentos cotidianos, percebo que já se foi aquela época em que podíamos sair, sentar à porta de casa, passear pelas ruas e até utilizar transporte público sem ter o que temer. Como era bom ver os vizinhos reunidos, compartilhando momentos da vida em sociedade, muitas vezes até altas horas, quando se recolhiam para dormir. Hábitos simples, de um passado não tão distante, mas que parece não voltar mais. A escalada da violência assistida nas duas últimas décadas, e mais notadamente nos estados do Nordeste nos últimos dez anos, vem transformando negativamente a vida das cidades brasileiras. Tráfico, roubos, furtos, agressões e assassinatos são alguns dos crimes já banalizados pela naturalidade e frequência com que ocorrem. Para citar apenas os assassinatos, nos últimos dois anos os diversos relatórios sobre mortes violentas no Brasil, com destaque para o Atlas da Violência, apontam um número de homicídios próximo dos 60 mil, cerca de 71% acontecem com arma de fogo. Para cada 1% a mais de armas nas ruas, aumenta-se em 2% o número de assassinatos. O custo disso tudo é alto! A violência contribui para uma grande perda econômica e social da nação. Setores como o Turismo, Indústria e Comércio Varejista são diretamente afetados pelo seu crescimento. O país chega a perder o equivalente a 6% do PIB, o que só no ano passado correspondeu a algo em torno de 389 bilhões de reais. E isso é apenas uma estimativa, naturalmente aquém da realidade. É praticamente impossível contabilizar em números absolutos o impacto da violência, mas é certo que ela afeta diretamente aquilo que, na minha opinião, é mais essencial para um país: a sociabilidade. Como "ser social", a capacidade que o ser humano tem de se relacionar e compartilhar práticas que possibilitam o avanço da nação fica prejudicada à medida que o cidadão de bem é posto em uma posição de refém dentro de seu próprio universo. Depois do direito à vida, há aqueles que defendem a liberdade como princípio maior no tocante à dignidade da pessoa humana. Tema de grande relevância, com inclinação para os debates sobre execução penal, não tem tido a mesma importância de análise quando o assunto é a nossa prisão enquanto cidadãos de bem como resultado direto da violência que nos cerca. Vivemos hoje atrás de grades, muros, cercas, inclusive psicológicas. Monitorados e monitorando o mundo a nossa volta. O contexto social que deveria contribuir para agregação atua no sentido inverso. Aprendemos a desconfiar de tudo e de todos, sem distinção de origem, cor, vestimenta. É o medo do outro sem qualquer base de justificação plausível, apenas pelo medo do desconhecido. Há um claro rompimento dos vínculos sociais e das práticas culturais inerentes às relações comunitárias. De seres sociais, estamos passando a seres com medo da vida em sociedade e nos isolando. Não restam dúvidas de que o maior prejuízo é, de fato, o social. A diminuição da autoestima compromete sonhos e projetos para o futuro, fazendo com que o cidadão brasileiro pague um alto preço em função da violência sofrida. Resultado direto desse fenômeno social para o Brasil é o seu lento desenvolvimento frente ao concorrido cenário mundial. Há quem tente relacionar o sucateamento do aparato de segurança pública com o aumento da criminalidade. No entanto, não pode, a meu ver, ser esta a principal causa do estado de violência que vivemos, como pretendem alguns analistas sociais. O problema é bem maior, mais amplo, e envolve um conjunto de fatores. Ou como se diz no dito popular: o buraco é mais abaixo.


Em minha trajetória profissional, acumulei, enquanto personagem e espectador, as experiências mais duras de uma sociedade opressora, de um sistema excludente. Como delegado de Polícia e, hoje, juiz criminal posso afirmar que as operações policiais não constituem o melhor caminho para a problemática ora instalada. Vide as tentativas fracassadas das UPPs nas comunidades do Rio de Janeiro. Da mesma forma, não será apenas com boa vontade, muitas vezes mascarada por discursos falaciosos, que se avançará no caminho das mudanças necessárias. Ações pontuais, sem efetividade, não contribuem para romper a enorme lacuna deixada ao longo de mais de um século pelo poder público brasileiro. O Brasil precisa retomar seu curso, o que significa enfrentar o problema da violência de frente. É necessário um projeto de país que não se debruce de forma pontual sobre os graves problemas da nação. A intervenção precisa ocorrer de forma profunda, estruturante, devolvendo-se ao cidadão o seu direito de ir e vir tranquilamente dentro do seu próprio espaço de convivência. O Estado precisa ocupar sim as comunidades, aqueles bairros pejorativamente chamados de periferia. Mas a ocupação não deve se dar com as armas. O ciclo de violência está diretamente ligado à pobreza e à ausência do Estado nessas localidades e, por isso, só pode ser rompido com uma séria intervenção social. Ações de saneamento, saúde, esporte, lazer, cultura, educação e geração de renda resgatam a autonomia e empoderam o cidadão com valores que resgatam os laços sociais perdidos em razão da criminalidade. O cidadão precisa também fazer sua parte, mas é dever do Estado libertar cada brasileiro das grades da violência.


A ETERNA SAUDADE OSMAR GOMES DOS SANTOS * Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís. Membros das Academias: Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências,Artes e Letras.

Neste espaço, já tive a oportunidade de trazer ao leitor a reflexão sobre o problema da violência em nosso país, da qual o cidadão de bem está refém. Essa violência está à espreita, de tocaia, e nos apanha de forma repentina em momentos em que estamos apenas tentando viver uma vida normal. Violência que assombra, martiriza e nos tira aqueles que mais amamos, restando a dor da saudade. Abruptamente – sem qualquer possibilidade de despedida, de um abraço, de um olhar – pessoas são arrancadas de nosso convívio sem qualquer motivo plausível, até porque nada justifica uma vida ceifada. Vítimas de bala perdida, briga de trânsito, bate-boca e ações criminosa continuam se multiplicando Brasil afora. Dentre as milhares de vítimas, pessoas como a vereadora Marielle Franco, e na última semana o delegado Davi Aragão, ao qual declino algumas palavras. Jovem prodígio, Davi conclui cedo a faculdade de Direito, tendo prestado bons serviços à população logo que se formou, como advogado da Caixa Econômica Federal. Mas seu ímpeto de fazer mais pelo próximo o fez buscar voos mais altos, galgando o posto de delegado da Polícia Federal, em seus tenros 23 anos. Sua atuação austera o levou à chefia da Delegacia de Repressão a Crimes Fazendários e seu profissionalismo conquistou a todos com quem conviveu. Mas Davi foi mais que um excelente profissional. Foi bom filho, pai exemplar, bom marido. Amigo querido e amado por todos a sua volta, como foi visto na justa homenagem que marcou sua despedida. Há de se louvar os três dias de luto como um tributo justo àquele que muito fez pelo Maranhão e pela nação. Mas a verdade é que para os familiares e amigos próximos esse luto será eterno, arrastado em um imenso vazio que não mais poderá ser preenchido, simplesmente acompanhado da eterna dor da saudade. Milhares de pessoas de bem são vítimas da violência todos os anos no Brasil, mas casos como o do delegado Davi, assim como foi o da Marielle, têm o efeito do chamado ―soco na boca do estômago‖, uma vez que desempenhavam funções públicas de destaque. São casos que reportam à sensação de permanente vulnerabilidade diante dessa problemática social. Fica a pergunta: até quando deixaremos que laços sejam rompidos, corações sejam despedaçados, famílias chorem a perda de entes queridos? Quantas datas importantes, que deveriam ser de alegria, deixaremos de comemorar por causa da eterna dor da saudade que ficou? Inquieto-me e chego a me questionar, ainda, se fracassamos enquanto nação. A concepção básica que construímos de sociedade como um espaço de agregação em torno de interesses comuns, tem deixado uma lacuna que cada vez mais nos afasta e nos torna repulsivos àqueles que deveriam compartilhar práticas sociais cotidianas conosco. Por vezes, ouço com preocupação a justificativa de que o Judiciário é grande culpado desse caos enfrentado, sob a retórica de que a Polícia prende e a Justiça solta. E não digo isso enquanto magistrado, mas como cidadão que entende que essa culpa não pode ser creditada a um poder. Tampouco pode ser creditada somente aos órgãos públicos. Segundo preceito constitucional, a segurança é dever do Estado, mas, também, é responsabilidade de todos. A tentativa de desqualificar o Judiciário em detrimento de todo um sistema que deve atuar de forma integrada não se sustenta e corrobora para o enfraquecimento do Estado democrático de Direito. O


Judiciário, bem como aqueles operadores do Direito que junto a este poder atuam, segue uma conduta orientada pelas normas estabelecidas. Não é permitido a qualquer deles – juízes, promotores, defensores e advogados – agir em dissonância com a lei. Na mesma linha de raciocínio, não se pode varrer a poeira para baixo do tapete. O fato de não se creditar toda a culpa sobre um ou outro órgão não quer dizer que os mesmo não tenham sua parcela de responsabilidade. Por isso, defendo que vivemos um momento crucial no rumo do país, no qual se faz imperiosa uma atuação integrada dos poderes constituídos, nas três esferas de representação. Cada um precisa assumir suas responsabilidades, não havendo espaço para apontar o dedo a este ou aquele. Nós, agentes públicos, existimos em função do cidadão, somos pagos pelo cidadão e temos que agir, incansavelmente, nesse sentido. E não falo apenas daqueles ditos ―autoridades‖, mas dos servidores públicos em qualquer grau de hierarquia. Chegamos a uma encruzilhada na qual precisamos decidir juntos, poder público e sociedade, qual caminho a trilhar agora. É necessário o nível do debate e demonstrar que amadurecemos enquanto nação no sentido de construir um projeto de Brasil com mais oportunidade para todos. Ou ficaremos à deriva, tal como diz uma famosa fábula: quando não se sabe onde se quer chegar, qualquer caminho serve. Não podemos deixar que o Brasil continue esse país das ―maravilhas‖. Quantas Marielles, quantos Davis e tantos outros cidadãos terão que ser sacrificados para que algo mude efetivamente? Quantos garis, taxistas, motoristas, domésticas, estudantes? Quantos mais teremos que perder para que de fato tomemos as rédeas de nossa nação? Marielle, Davi, Maria, José, João, Rita, Ricardo, Antonio, Carlos. Presentes! Ontem, hoje e sempre, assim como a eterna dor da saudade.


O DESAMOR CERES COSTA FERNANDES ―Maior que o Ódio‖. Um filme que vi quando menina. Não lembro o nome dos atores, nem do enredo do filme, mas o título me ficou. E também a moral da história: maior que o ódio era o sentimento do amor. De lá para cá, assisti a muitos filmes e li muitos romances perpassados pela mesma intencionalidade de provar que o amor é o mais forte sentimento. E que contra ele nada pode prevalecer. Isto está dito nos dicionários amorosos, na voz dos poetas, nos cancioneiros, nos livros religiosos ou, mais modernamente, nos compêndios de autoajuda. Sem contar com o valioso reforço dos ditados da sabedoria popular. Não há o que duvidar, pois. Mas, não sei não. Perdoem-me vocês e todas as fontes citadas. Mas acho que há um sentimento, ou melhor, um não-sentimento, contra o qual o amor não tem nenhum poder. È o desamor. Se o amor transforma e vence o ódio, o despeito, a raiva, a inveja, e todos os demais sentimentos de má catadura, é impotente frente ao frio desamor. O desamor não nasce da desfeita, do maltrato, da mágoa, ou da indiferença, muitas vezes, esses – curiosa natureza humana - até promovem o aumento do amor. Errada está, pois, a sabedoria popular quando reza: ingratidão tira a afeição. O que promoverá o desamor? Talvez o tempo, acompanhado do fastio, da desilusão, da rotina, da obrigação. Sei lá mais o quê. O desamor chega um dia, repentinamente, em qualquer lugar, sem aviso prévio. Pode acontecer no exato momento em que os olhos do desamorado se abrem, a modo de uma epifania às avessas – mas, como pude?!..- e ele enxerga a pessoa, antes namorada, exatamente como os outros a vêem, sem as fantasias e os enfeites que o amor emprestou à sua visão. O desamor não tem a impetuosidade dos sentimentos fortes. O desamorado não odeia, nem mesmo quer mal ao seu ex-amor, pode até cultivar certa ternura por quem foi dantes apaixonado.. Tarefa difícil é ferir o desamorado, simplesmente porque, após o desligamento do clique amoroso, ele passa a habitar em uma dimensão própria, onde as palavras e gestos do enamorado não mais o alcançam. Por um mecanismo não sabido da comunicação, as faixas de onda de ambos – enamorado e desamorado - operam em freqüências diversas. Não mais se cruzam. E é bem aí que acontece o drama: o triste embate, onde só um luta, ou se debate, tem como vencedor (?) aquele a quem a vitória não mais importa. Pareço pessimista, circunspeta, sorumbática, meditabunda, filosófica? Pode ser. Mas o fato é que, quando assuntava a falta de assunto para esta crônica, me veio à lembrança um amigo, hoje habitante de dimensão incorpórea, mais comumente chamada ―andar de cima‖, Dr. Doroteu Ribeiro. Esse grande causídico e jurista, a propósito de umas tantas questões outras que, certa vez, discutíamos, ele, como meu advogado e mestre, e eu, como sua cliente e discípula, proferiu, com o olhar distante estas palavras que se me gravaram vivamente e deram o mote desta crônica: ―Minha filha, a pior coisa deste mundo é o desamor!‖. . Será? Julguem vocês.


DUAS SENHORAS EM BUSCA DO PASSADO CERES COSTA FERNANDES

Meu avô paterno, jurista, literato e lírico, teve treze filhos. Após as homenagens de praxe aos antepassados, o restante ganhou nomes de divindades mitológicas. Duas dessas divindades, Yara e Íris, tias queridas, baixaram a esta Ilha para uma dupla visita, a São Luís e a mim, solitária representante da velha guarda em Upaon-Açu. Gonçalvinas exiladas em longes terras do Brasil imenso levaram, respectivamente, vinte e sete e trinta anos para uma segunda visita. A vinda sempre planejada e adiada não nos afastou esses anos todos. Sempre nos encontramos no Rio de Janeiro, onde se concentra a maior parte da família, ou em outros lugares do Brasil, por ocasião de comemoração grande ou perda na família. O regresso enterneceu-me o espírito. Afinal, grande parte do meu imaginário de infância foi preenchido pelas irmãs de meu pai. Eram, no fascínio dos meus oito anos, o modelo a seguir. Cantavam canções em castelhano (dizia-se assim), com as letras das músicas cuidadosamente anotadas em cadernos. Falavam de Agustín Lara, grande compositor, e de seu romance com a mais bela mulher do mundo, Maria Félix. Olhando seus álbuns de fotos de artistas, recortadas da Cena Muda, até que não achei Maria Félix tão bela assim. Mas, se elas diziam, então era. Aprendi a cantar comovidamente: ―acuerdate de Acapulco, daquelas noches, Maria Bonita, Maria del alma‖... E como eram prendadas! Elas confeccionavam os adereços de suas fantasias de carnaval e Léa, outra irmã, as costurava. Falavam de rapazes - às ocultas, que vovô era severo. Estudavam no Colégio São Luís, onde foram rainhas de calouros. Vi as suas fotos, de vestido de baile e luvas compridas! Maravilha! Algum dia eu seria assim? Volto à visita. Mais que passeio, é um retorno às origens, a necessidade de rever lembranças e lugares. Aonde levá-las? Como refazer um roteiro sentimental sem o impacto de um presente passível de roubar as belas reminiscências? A tentativa de reviver o que passou é sempre frustrante. Nem sempre é bom tentar. Chegam bem e dispostas, adorando os quitutes locais, sem nenhuma restrição. Saímos todos os dias, manhã e tarde, às vezes, noite. De olho arregalado para a ―cidade nova‖, que recordam, ainda nascente, nos anos pós-ponte José Sarney, dizem: Nunca imaginei! As praias desconhecidas nas suas juventudes, Calhau, Marcela, perdidas nas dunas, Araçagi (só se passava para lá com a maré seca e a pé) e a Litorânea, as encantam. Imagens novas, até aí, tudo bem. Rumo à cidade velha, andamos sempre ―por onde o padre passa‖, Pedro II, o Tribunal de Justiça, a Sé. Na Praça Benedito Leite, estranham a falta de árvores, mas a praça está bem cuidadinha, a visão do casario em volta agrada à vista; encantaram-se com a Rua do Giz e sua escadaria, casas refeitas, telhados pintados, uma que outra em ruim estado. No conjunto, tudo bem. Respiro. O Reviver, na Praia Grande, impressiona. É novidade, até porque moças de família não andavam por aqueles lados em priscas eras. Querem ver a Escola Normal, o Rosa Castro. Finjo que não as ouço. Vamos à Praça Gonçalves Dias, e não posso evitar que vejam as ruínas de algumas belas moradias na Rua Rio Branco. O Colégio São Luís é outro choque inevitável, o simpático prédio virou um pardieiro de estranha classificação arquitetônica.. A Praça do poeta refaz as emoções, está bela e limpa, mesmo sem flores no coreto e nos canteiros, e com as palmeiras novas, ainda pequenas. A Praça Maria Aragão é só surpresa: Olha só o que fizeram com o velho pátio de trens! Cadê os trens? Sumiram. E os bondes? Ah, os bondes e suas recordações: Era bem aqui que o Gonçalves Dias virava a lança. E os namoros? Só troca de olhares, as moças sentadas nos bancos, os rapazes de pé nos estribos. Não há como fugir da Deodoro, dos pedidos insistentes: Era lá que andávamos de bicicleta, todas as tardes. Capitulei. Foi como baixar em uma praça de guerra. A destruição de tudo que era bonito foi caprichada. Salvaram-se as duas casas da esquina da Rua do Passeio. A biblioteca, o grande bolo de noiva é o centro de um grande mercado persa. Vamos à Rua do Sol, onde morava a família. A velha morada inteira está bem conservada, embora ostente as grades da insegurança dos novos tempos. Em volta, o que não desabou está


em péssimo estado. Na casa que foi de Aluísio Azevedo, cresce capim no mirante onde ele escreveu O mulato. Rolaram duas lágrimas. A Rua da Paz, eu me recusei: Não vou lá nem na Rua Grande. Fiquem com as lembranças, é melhor para o coração. Foram embora, deixaram saudades e promessas de não levar outros trinta anos sem voltar. Abstraindo dos lugares que sofreram os bombardeios, acharam tudo lindo. E por falar em coração, as tias sobem e descem escadarias sem cansar, comem de tudo e estão sempre a postos para passear sem demonstrar cansaço. Continuam minhas ídolas. Quanto a mim, acho que vou marcar consulta no cardiologista.


SOMOS TODOS REAIS OSMAR GOMES DOS SANTOS Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís Membro das Academias Ludovicense de Letra, Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.

Mais velha que o noivo, estrangeira, filha de pai branco e mãe negra, fez carreira como atriz, dona de opiniões fortes, divorciada, uma vida pessoal com pitadas de polêmicas. Gostem ou não, essa é a mulher que mexeu o mundo nas últimas semanas, uma norte-americana de 36 anos que atende pelo nome de Rachel Meghan Merkle, que disse o ―sim‖ ao príncipe Harry no último dia 19. Por envolver tantas particularidades de pessoas com perfis e mundos tão distintos é que o casamento entre o príncipe e ―plebéias a‖ merece ser visto sob o prisma não apenas da moda, do requinte, dos tabloides de fofoca, dos ritos protocolares e cerimoniais. Mais que isso, ele merece uma análise sob a luz das mudanças sociais de nossa época. Se por um lado Meghan foge aos padrões já vistos, rompendo a imagem serena e discreta que nos acostumamos a ver nos membros da realeza, por outro, mostra-se uma mulher em sintonia com seu tempo. Feminista, envolve-se em causas sexistas pela independência e empoderamento da mulher, além de ser protagonista de outras ações humanitárias, como a luta pelo acesso à água potável, na África. Ela é embaixadora da ONG de ajuda humanitária World Vision e porta-voz das Nações Unidas para igualdade de direito das mulheres. Denuncia desigualdades e luta por pessoas comuns. Sobre os bastidoresi de sua vida, nada há porque atirar a primeira pedra. Tal como os outros seres ―humanos‖, ela teve seus problemas, viveu frustrações, trabalha, luta pelo que acredita, chora, sorri, como qualquer pessoa de carne e osso, de sangue vermelho. Meghan é notadamente uma afrodescendente, agora no seio da família real mais conservadora e tradicional do mundo. O fato de receber críticas é porque muitos hipócritas de plantão não aceitam tal ascensão de alguém com seu perfil. Afrodescendente? Sim, como todos nós! Afinal, não dizem respeitados estudiosos que todos nós temos um ―pezinho‖ na África. A duquesa de Sussex, título que acabou de herdar, vem para romper com o preconceito de classe, de cor, dos laços de sangue tradicionais que por séculos sufocaram amores e paixões promissoras. Que o diga o também inglês, poeta e dramaturgo, Shakespeare, ao reproduzir tão fascinante retrato de tantos amores proibidos encarnados nos personagens de Romeu e Julieta. Hoje, a noiva real nos permite um outro patamar de discussão sobre atitudes incoerentes de uma tradição hipócrita e machista, que, por vezes, ainda teimamos em carregar. Uma sociedade que subjuga os mais fracos, que pormenoriza o papel da mulher e que não fomenta o respeito entre seus comuns. Também é importante destacar que a forma como a Família Real abraçou a união é atitude a ser louvada. Um tapa na cara do cinismo e dos preconceitos que ainda insistem em emoldurar a conduta de alguns. Ao mesmo tempo sinaliza a abertura rumo a um mundo que evolui, que se amolda aos costumes trazidos pela modernidade e que aponta para a inserção do princípio global da igualdade entre as pessoas. Apesar das muitas polêmicas que cercaram e que ainda possam cercar, o episódio vem para fortalecer a máxima de que sob o céu não há melhor ou pior. Pretos, pardos, brancos, amarelos, somos todos uma única raça: a humana. Meghan não é a mulher que responde ao perfil que tempos atrás era o esperado para a noiva de um príncipe pertencente a uma das casas reais mais tradicionais do mundo. A chegada de Merkle à família real causa uma revolução não só na corte britânica, como também em um mundo de ilusões, estereótipos e preconceitos.


Será uma nova Lady Diana? O tempo dirá. Mas ao que parece não pretende mudar sua conduta, nem poderia. Um trabalho pela igualdade, pelo empoderamento da mulher e pelos necessitados não pode ser abandonado. Esse é, por sinal, o papel que se espera da mulher no século XXI: autêntica, idealizadora e que não foge à luta. Que toda submissão fique para trás, da mesma forma que viramos uma página, que tantas outras folhas em branco de otimismo possam ser escritas.


O BRASIL PAROU OSMAR GOMES DOS SANTOS Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras. Ao analisar profundamente nossa conjuntura social o cidadão certamente encontrará muitos motivos para protestar contra o modelo de gestão da coisa pública no país. No geral, tudo anda mal das pernas. Serviços sem qualidade, economia estagnada, desemprego em alta, falta de segurança, corrupção, cenário futuro sem boas perspectivas. Estes são alguns dos fatores que formaram o pano de fundo para a crise recente vivida no Brasil e que teve como estopim a escalada diária dos preços dos combustíveis. O Brasil, pela voz dos caminhoneiros, disse: chega! Um brado forte que ecoou aos quatro cantos do país. Ao todo cerca de 2 milhões de profissionais puxaram os freios de mão e cruzaram os braços em protesto. Foram onze dias, o país estagnou! Como em um efeito dominó, os efeitos do movimento se intensificaram. Cidades, campos, portos, aeroportos, o caos se alastrou e causou a maior crise de desabastecimento já vista, dos supérfluos aos essenciais. Fato é que as consequências foram negativas e o impacto sobre a população foi imediato, mas diga-se: eles tinham todo direito da paralisação, o que é assegurado por força de lei, sendo, portanto, legítima. Por isso, não cabe análise apressada a ponto de jogar no colo dos caminhoneiros essa conta. Cabem, por outro lado, algumas reflexões sobre os fatores que levaram a essa problemática. Além disso, é preciso que caminhos sejam apontados. Há décadas, estradas são verdadeiros desafios para esses profissionais. Falta asfalto, sobram buracos. Falta sinalização, sobra insegurança. Faltam incentivos aos que carregam o país sobre rodas, sobram altos encargos para a atividade. Situação essa que pelo menos desde 2014 vem sendo exposta por representantes da categoria, seja para o Governo Federal, seja para o Congresso. Portanto, um caos anunciado. O desfecho – acompanhado ao vivo por milhões de brasileiros – é resultado desse quadro, mas teve como ponto alto uma política de mercado da Petrobras que desde julho de 2017 atrelou o preço interno da commoditie ao praticado no mercado internacional. Noutra via, e de forma estranha, a petroleira reduziu a capacidade de refino do óleo bruto, fazendo com que subprodutos, como gasolina e diesel, tivessem que ser buscados em maior quantidade e a preços mais altos no exterior. Desde a adoção desse modelo as altas têm sido sucessivas e praticamente diárias, acumulando cerca de 230 reajustes, para maior, no período. Uma escalada astronômica que resultou em um aumento de praticamente 50% em apenas um ano, situação que ficou insustentável não só para caminhoneiros, mas para todos os cidadãos, uma vez que o combustível tem efeito direto nos preços de produtos e serviços ofertados à população. O governo federal, por sua vez, demonstrou total incapacidade de previsão e ação frente a um problema que vinha sendo anunciado há anos, é bom que se diga. Em uma atuação catastrófica, e até certo ponto arrogante, ignorou os sinais e deixou para se pronunciar tardiamente, subestimou o poder de articulação dos caminhoneiros, não ouviu a voz que vinha das estradas, anunciou medidas sem efeito prático. Isso só para citar alguns dos tropeços cometidos pelo poder central de Brasília. A falta de habilidade do ―capitão-mor‖, bem como da sua tropa de Governo na interlocução com os caminhoneiros, fez a crise se arrastar por quase duas semanas, deixando a população completamente à deriva, sem produtos e serviços essenciais. Esse lado da paralisação é um episódio que poderia ter sido evitado, inclusive pelos caminhoneiros, mas que certamente não tem como não creditar esse prejuízo social ao mandatário da república. Diante da inércia e falta de pulso do Governo Federal em agir, surgiram ―buchichos‖ de queda do mandatário e até de intervenção militar que, ao que parece não encontrou eco junto à sociedade. Oportunistas de momento? Talvez. Mas nossa democracia, embora ainda em formação, não encontra espaço para um governo que não seja legitimado nas urnas pelo povo. A prova disso está sendo vista nas ruas.


Quanto à paralisação, certamente há prejuízos que não serão recuperados, ainda que a página tenha sido virada. Mas o episódio deixa importante legado para os dirigentes da nação e para aqueles que este ano pretendem colocar seus nomes para aprovação popular nas urnas: é hora de mudar. O custo Brasil é alto! Embora outros países tenham carga tributária equivalente, aqui o retorno não chega para o cidadão como além-fronteiras. E o contribuinte, com seu suor, continua a fazer a pesada máquina pública funcionar. Fica, ainda, a lição de que precisamos evoluir em infraestrutura de transporte. Com a paralisação o Brasil expõe ao mundo mais um dos seus pontos fracos, que é a dependência do transporte rodoviário para a circulação de bens e serviços. Cerca 75% de nossa produção escoa pelas estradas, percentual que pode chegar aos 100% a depender do produto e da região. Um país que se pretende de ―primeiro mundo‖ precisa avançar nesse quesito e equilibrar o uso dos modais. As poucas ferrovias e hidrovias atendem basicamente finalidades específicas, não passando por essas modalidades a maior parte do que é produzido. A Ferrovia Norte-Sul precisa efetivamente passar a funcionar. Mas é importante que se diga que outros caminhos precisam ser desbravados pela locomotiva do desenvolvimento, como matas, mares e rios para buscar a plena eficiência dos transportes em nosso país.


LEMBRANÇAS DE UMA VIAGEM ANTÔNIO AUGUSTO RIBEIRO BRANDÃO *Economista. Membro da ACL, do IWA e da Comunidade ELOS. Fundador da ALL.

Vocês sabiam que podem acordar em São Luís e dormir em Nova York, tudo no mesmo dia? E chegando lá aproveitar o entardecer na Times Square? Todos voam direto de São Luís para São Paulo. Duas horas depois estão novamente a bordo num vôo direto que deve durar aproximadamente nove horas. E logo estarão num Airbus A330 a caminho da ―Big Apple‖, voando a mais de 12 mil metros; passam ao largo de Trinidad e Tobago e da República Dominicana, e entre as Bahamas e Miami, próximos a desembarcar no aeroporto JFK, depois de percorrerem quase oito mil km. Em Nova York, no começo de primavera, o clima está ameno. Assim, hospedados em Manhattan, saem para um reconhecimento das redondezas. Times Square está situada na junção da Broadway com a 7ª avenida e é um grande caminho largo composto por vários cruzamentos e esquinas; ficam por lá até bem tarde naquela profusão de luzes e de cores. Um CityTour pela Cidade, antecipadamente contratado, será uma excursão guiada através dos maiores símbolos do alto e baixo Manhattan; no Lincoln Center, um centro de arte composto de três edifícios que incluem a Ópera, o Ballet e a Filarmônica, e no Central Park, que existe há 150 anos, um verdadeiro oásis no meio da floresta de arranha-céus. Esse passeio permitirá perceberem a grandeza da grande metrópole e a diversidade de estilos das suas construções influenciadas por holandeses e ingleses; a excursão terminará em Wall Street, no distrito financeiro onde está o Charging Bull, um touro de bronze que pesa três toneladas e cuja escultura foi feita pelo artista italiano Arturo di Módica. Mais tarde atendem a um encontro com o New York City Ballet, no Lincoln Center. Será um espetáculo com coreografias de Balanchine, Robbins e Wheeldon, para músicas de Mozart, Bach e Shostakovich; ballet de estilo clássico, mas dançado de forma moderna onde o desempenho virtuoso dos bailarinos aflora à vista dos apreciadores dessa arte. Encerram a noite comendo alguma coisa na simpática hamburgueria PJ Clarke‘s, que fica bem perto. No dia seguinte, amanhecem na porta da Macy‘s, uma das maiores lojas de departamentos do mundo. Fundada em 1843 como pequeno varejo, desde 1902 encontra-se no atual endereço da Broadway. Lá tem de tudo que se possa imaginar. À noite vão assistir ao musical ―O Fantasma de Ópera‖, em cartaz desde 1988, no Majestic Theatre, na Broadway, onde o espetáculo já foi visto por mais de cem milhões de pessoas e já rendeu mais de cinco milhões de dólares. A história se passa no século XIX, na Ópera de Paris, onde um fantasma atormenta a vida dos seus artistas, e é inspirada no romance de Gaston Leroux. O Teatro é um dos maiores do ―caminho largo‖, tem uma arquitetura de época e foi inaugurado em 1920. Ainda há tempo para encerrar essa noite inesquecível e todos vão ao John‘s Pizzeria, quase em frente ao Teatro, um ótimo endereço de massas italianas. As compras recomeçam na Bloomingdale‘s, uma das mais famosas lojas de departamento de NYC, fundada em 1872; nos oito andares da tradicional loja trabalham cerca de duas mil pessoas. Depois seguem para o Century 21, em Manhattan, bem em frente ao Marco Zero onde antes pontificavam as Torres Gêmeas do World Trade Center.


DODÔ E AS ELEIÇÕES CERES COSTA FERNANDES A proximidade das eleições traz à baila lembranças da minha amiga Dodô (Doralina Gonçalves, quando residia aqui). Muitos me perguntam dela, querendo saber notícias da trêfega maranhense casada com o boa-praça, Olaf, um milionário sueco. Dodô acredita fielmente na instituição do matrimônio, tanto que já casou oito vezes. Encontro-a em uma ligeira viagem que fiz ao interior de São Paulo, Há dois anos, antes das eleições para prefeito. Foi em Campinas, ela fazia compras, acompanhada de um sujeito barbudo, chinelão de dedo, camiseta sem manga, tipo intelectual alternativo anos 60, um tanto diferente das amizades de Dodô. Dadas as beijocas de costume, ela me solta a grande novidade: era candidata a prefeita em uma cidadezinha do interior de Minas. Ué, desde quando te interessas por política? Ah, foi o Miguel que descobriu o meu carisma político e me fez ver as minhas qualidades de liderança. E me apresenta o cujo: Miguel, meu amigo, professor, escritor e intelectual. Dodô andando com intelectuais? Então mudou. Ela não é propriamente a ―loura burra‖, embora esteja louríssima e seu interesse por leitura não vá além de revistas sobre a alta sociedade. Prazer, digo, o senhor é professor, qual a sua área, tem obras publicadas? Ah não, amiga, Miguel é jornalista, faz resenhas de livros para jornal. Penso comigo, leitor de orelhas de livros, um pouco acima do cara que faz a seção de horóscopos, ou não. Corroborando sua cultura de almanaque, Miguel joga em cima de mim um monte de autores, traduções e editoras e eu me mostro devidamente impressionada – não posso decepcionar a minha amiga. Aliás, nem adianta levantar suspeitas sobre o seu novo guru. Dodô não entenderia. Além do mais, Miguel defende as minorias, sejam elas quais forem e acredita na vitória de Dodô. Reforça o ponto forte da plataforma da candidata, criação de marketing dele próprio: todos os habitantes, situados abaixo da linha de pobreza de Ipê Amarelinho, terão direito a um aparelho sanitário em seus casebres. Esqueci-me de dizer que uma das indústrias de Olaf, o maridão, é de louças sanitárias. O levantamento feito por Miguel chega a 180 mil ―residências‖ a serem atendidas, aquelas em que os moradores vão à casinha, no fundo do quintal, ou detrás da moita mesmo. Tento objetar, Mas Dodô, e o encanamento, fossa, água corrente, esses detalhes insignificantes? Ah, amiga, isso não é comigo. Dou o vaso e pronto. O incentivo à higiene está feito. Sinto comunicar que Dodô não ganhou a eleição, que foi decidida no primeiro turno com a vitória do outro candidato que prometia televisões e cursos de corte e costura gratuitos. Também não sei lhes informar que fim levou o intelectual Miguel após seu insucesso como marketeiro. Deve ter saído com alguns contos a mais. Dodô é muito rica. No entanto posso lhes garantir, firmada no conhecimento de longos anos de amizade, que Dodô realmente possui em carisma tanto quanto lhe falta em tino político. Fico imaginando o que fariam os favelados de Ipê Amarelinho com tantos vasos sanitários doados, sem água nem esgoto. Quem sabe serviriam para outros usos: com um pequeno tampo, uma mesa; dispensa para alimentos de cesta básica doada ou um gracioso canteiro de horta. É, não seriam de todo inúteis.


VAMOS BRINCAR CERES COSTA FERNANDES Nos idos da infância, eu estranhava o modo maranhense de chamar de brincadeira as manifestações folclóricas, em especial as das festas juninas. Ora, não é certo, como ficam, então, boca-de-forno, pegador, passa-anel... Decidi, não é brincadeira, não. Onde já se viu velho brincar? Brincadeira é coisa de criança. Hoje sei, tive a revelação, no São João de São Luís do Maranhão, adultos e velhos brincam, sim. Não se dança simplesmente bumba-meu-boi, cacuriá, tambor de crioula. Brinca-se. E o cantador-dançador dessas manifestações populares, como não poderia deixar de ser, é o brincante. E é brincante, também, aquele que participa de festas e de rituais religiosos de matriz africana ou indígena, nos diz Albani Ramos, autor das magníficas fotos que ensejaram o livro Brinquedos encantados, editado pelo Instituto GEIA, livro precioso para quem quer que deseje conhecer ou aprofundar-se nas nossas raízes culturais e suas manifestações, registradas na espontaneidade do seu acontecer. O dicionário, pai e amigo caridoso de todos os burros, concede que, além de ―divertir-se infantilmente‖, brincar pode ser ―tomar parte em folguedos‖, com a indicação de que são carnavalescos esses folguedos e, também - nada a estranhar, já que tudo é folguedo -, ―ter relações sexuais‖, entre outros significados de menor (?) importância. Existe coisa melhor no mundo que brincar?Acho que não. As crianças, seres intuitivos, sabem que o brinquedo as transporta a um mundo paralelo - diferente desse perigoso e tão sem graça em que vivemos um mundo repleto de entes extraordinários, onde tudo de maravilhoso pode acontecer, dependendo da força da imaginação. Por isso, seus olhos brilham à simples menção da palavra mágica, sinônimo de prazer, encanto e mistério. E, quanto a nós, adultos, seres de sensibilidade embotada, o brincar nos remete sempre à infância, quando detínhamos o poder de entrar e sair livremente do país do faz-de-conta, cujo rumo perdemos nos meandros do triste viver pragmático. E os nossos brincantes? Praticam o fazer infantil, brincar e abstrair o mundo exterior ao redor e mergulhar fundo no da fantasia. Eles, os brincantes, ao som cadenciado de suas matracas e pandeirões, transcendem este mundinho merreca, suas misérias, doenças e guerras, e brincam horas a fio, ultrapassando o dia e a noite, ignorando o cansaço, o calor ou a chuva, com uma resistência que nos espanta, inda mais se vinda de corpos mirrados e mal alimentados. As batidas das matracas e pandeirões, já ditas repetitivas e cadenciadas, a modo dos tambores de mina ou de crioula, têm um forte componente hipnótico a sugerir o transe; enquanto estes induzem ao recebimento de entidades, aqueles produzem a fenda por onde se tem acesso ao mundo perdido da brincadeira Não digo que umas doses de ―água de Lula‖ não deixem de contribuir para a transposição dos umbrais de outras dimensões, mas o que sustenta mesmo esses brincantes é a magia da transcendência, aliada à fé no santo que homenageiam, seja Antônio. João, Pedro ou Marçal, ou algum outro menos em voga, constante ou não das hagiologias da corte celeste oficial. Jesus, que sabia das coisas do céu e da terra, exaltou as crianças e advertiu-nos que de modo algum entraríamos no reino dos céus – que deve ser parecido com o reino maravilhoso do faz-de-conta – se não nos fizéssemos meninos. Não percamos mais tempo Aproveitemos, pois, a divina advertência. Entrou junho! Vamos todos brincar. ceresfernandes@superig.com.br


A TENTAÇÃO AUTORITÁRIA JOÃO BATISTA ERICEIRA Os quinze últimos dias de fúria vividos no país expuseram o quadro perigoso. A radicalização das posições políticas, a paralisação do sistema de abastecimento, com reais prejuízos para as pessoas, as empresas, e finalmente, o comprometimento de toda a vida social. A descrença nas soluções políticas, levou alguns movimentos sociais a clamarem pelo retorno a ditadura como saída para a crise generalizada. Situações parecidas historicamente se repetem, nelas, como sempre, os corifeus da força pregam a volta a regime autoritário, como panaceia para a resolução de todos os problemas. A aplicação de panaceias sempre se revelou inteiramente ineficaz, podendo até matar o paciente. Assemelhando este ao organismo do país. Sem falar de que se trata de filme já visto das mais diversas formas. O cineasta sueco Ingmar Bergman, em película de 1977, retratou a Alemanha de 1923, nos anos anteriores a ascensão de Adolfo Hitler e do Partido Nazista, que iria mergulhar a nação na maior tragédia do século passado, a Segunda Grande Guerra Mundial, destruindo a Europa, produzindo efeitos deletérios para toda a humanidade. O filme de Bergman reproduz Berlim, a capital do país, mergulhada na hiperinflação, na descrença aos políticos, na desorganização social, contendo todos os ingredientes do que intitulou ―O ovo da Serpente‖. Tomada esta como símbolo do totalitarismo que conduziria os alemães e o mundo inteiro para a carnificina entre 1939 e 1945 da centúria anterior. As sugestões percorreram as redes sociais, provocaram a justificada apreensão de todos os que viveram em regimes políticos cerceadores das liberdades, das individuais e das sociais. Manifestações de parte das autoridades militares, judiciais, de próceres do governo e da oposição, convergiram para a defesa da democracia, como valor supremo que deve unir a todos os brasileiros. A crise serviu para comprovar que há um valor capaz de unir a todos os brasileiros, um bem supremo a defender: a democracia como como forma de convivência política e social. Os elementos de desagregação social, constantes nos dias de paralização dos transportes, do fornecimento de combustíveis e de gêneros alimentícios, demonstrou que a anomia, ausência de normas, é má conselheira para o equacionamento dos inevitáveis conflitos sociais. Geram a procura de autoridade para gerir as pendências surgidas no curso dos litígios. A busca pela Law and Order, pela lei e pela ordem, que não é apenas o título de um seriado policial da televisão, é uma constante das sociedades, como assinala o sociólogo alemão Ralf Dahrendorf, para quem a lei é única a instância capaz de dirimir a violência inerente às relações sociais. Não há proposta de organização política que não contenha determinado modelo de ordem jurídica a partir da qual se poderá fazer a melhor Justiça, daí o apelo do nosso Ruy Barbosa para a soluções legais. Fora da lei, dizia, não há salvação. Assim pensam todos os democratas, à esquerda ou à direita. Fora disso é fascismo, a procura inútil de saídas pela força. Em 1930, em 1937, em 1964, os movimentos políticos da direita e da esquerda conspiravam contra a democracia e propunham soluções extralegais, que adotadas geraram enormes prejuízos para as gerações posteriores. Os brasileiros têm um penoso aprendizado das soluções fora da lei. Agora, principalmente, pois os modernos meios de comunicações lhes permitem a participação em todos os atos da vida em sociedade. A resposta da população, das lideranças institucionais, às insinuações autoritárias, foi contundente. Se é verdade que os partidos, os sindicatos e outras organizações intermediárias enfrentam a desconfiança e o descrédito de parte de grupos organizados, a confiança na democracia e no diálogo, como meios de enfrentamento dos problemas de pessoas e de categorias, perdura. Comprova o amadurecimento da sociedade brasileira ao longo dos anos desde a sua emancipação política. Tratou-se de maiúsculo e expressivo não à tentação autoritária. Quanto aos preços dos combustíveis, detonadores das paralizações, na prática, se verifica que não houve de parte das autoridades competentes, a devida atenção e o zelo necessário para administrá-los. O preço público


não obedece a mesma lógica do privado. Os brasileiros entendem que a Petrobras, a espinha dorsal da economia nacional, deve ser tratada como patrimônio do país. Não pode ficar à mercê de interesses de pequenos grupos de mercadores tanto interna quanto externamente. Em se tratando de mercado, deve haver o meio termo entre a inserção externa mercadológica e os interesses internos da sociedade brasileira.


O TEATRO, A MAIS ANTIGA MANIFESTAÇÃO ARTÍSTICA FERNANDO BRAGA, in “Toda Prosa”, Tomo III, do livro “Travessia” [Memórias de um aprendiz de poeta e outras mentiras], em fase de organização.

É o teatro a mais antiga manifestação artística da humanidade, consolidado na Grécia antiga em função das manifestações em homenagem a Dionísio deus do vinho que para os romanos é o nosso conhecidíssimo Baco. Essas manifestações se davam através de procissões que eram conhecidas como ―ditirambos‖, oportunidades em que as pessoas cantavam e dançavam em homenagem à nova safra da uva. Gil Vicente fundou o teatro em Portugal no século XVI, com a encenação ―Farsa dos Almocreves‖, em 1526, a qual fala do Brasil. Antônio Ferreira, considerado o discípulo mais famoso de Sá de Miranda, foi também dramaturgo, seguiu-se Almeida Garret com a peça ―Frei Luis de Sousa‖, Júlio Dantas, com a famosa ―Ceia dos Cardeais‖, e mais Raul Brandão, José Régio e outros tantos... No Brasil o teatro surgiu no século XVI também motivado pela fé religiosa. Destacou-se nessa fase o Padre José de Anchieta que escreveu alguns autos a visar a catequização dos índios, bem como a interação social entre portugueses, índios e espanhóis. Exemplo disso encontra-se no ―Auto de São Lourenço‖, escrito em tupi-guarani. Nos séculos XVII e XVIII o país esteve envolvido com seu processo de colonização e, por isso, em batalhas constantes em defesa do território colonial. Foi a transferência da Corte Portuguesa para o Rio de Janeiro, em 1808, que trouxe inegável progresso para o teatro, consolidado pela independência em 1822. O ator João Caetano, formou, em 1833, uma Companhia brasileira. Seu nome está vinculado a dois acontecimentos fundamentais da história da dramaturgia nacional: a estréia, em 13 de março de 1838, da peça ―Antônio José ou o Poeta e a Inquisição‖, de autoria de Gonçalves de Magalhães (o pai do romantismo brasileiro, em 1830, com ―Suspiros Poéticos e Saudades‖), peça aquela considerada a primeira tragédia escrita por um brasileiro e a única de assunto nacional: e, em 4 de outubro de 1838, a estréia da famosa peça ―O Juiz de Paz na Roça‖, de autoria de Martins Pena, chamado na época de o ―Moliére brasileiro‖, que abriu o filão da comédia de costumes, o gênero mais característico da tradição cênica brasileira. Gonçalves de Magalhães, o qual já me referi, ao voltar da Europa em 1867, introduziu no Brasil a influência romântica, que iria nortear escritores, poetas e dramaturgos. O nosso Gonçalves Dias é um dos mais representativos autores dessa época (romântica), e sua peça ―Leonor de Mendonça‖ teve altos méritos, sendo até hoje representada. Alguns romancistas como Machado de Assis, Joaquim Manuel de Macedo, José de Alencar, e poetas como Álvares de Azevedo e Castro Alves, também escreveram peças teatrais no século XIX. Loa se dê aqui ao nosso genial conterrâneo Artur Azevedo que foi poeta, contista, chargista, jornalista e, sobretudo, um dos maiores dramaturgos brasileiros de todos os tempos. Artur Azevedo foi durante muitos anos, diretor do Teatro João Caetano, do Rio de Janeiro, para onde migrou, egresso de São Luis, juntamente com seu irmão, o romancista Aluízio Azevedo. O século XX despontou com um sólido teatro de variedades, mescla do ―varieté‖ francês e das revistas portuguesas. As companhias estrangeiras continuavam a vir ao Brasil, com suas encenações trágicas e suas óperas bem ao gosto refinado da burguesia. O teatro ainda não tinha recebido as influências dos movimentos modernos que pululavam na Europa desde fins do século anterior. Comentam em São Luís do Maranhão que naquela época a Companhia tanto de teatro como de ópera se fosse aplaudida em São Luís, no antigo Teatro União, hoje Artur Azevedo, estaria com o sucesso garantido aonde chegasse. São Luís era roteiro obrigatório porque as companhias vindas da Europa desembarcavam em Belém indo ao Teatro Amazonas, em Manaus e de lá para São Luís, para depois, então, fazerem as outras praças. Os ecos da modernidade chegaram ao teatro brasileiro na obra de Oswald de Andrade, produzida toda na década de 1930 (ele era marido da grande pintora do Movimento Modernista Tarsila do Amaral) com destaque para ―O Rei da Vela‖, só encenada na década de 1960 por José Celso Martinez Corrêa. É a partir da encenação de ―Vestido de Noiva‖, de Nelson Rodrigues, que nasce o moderno teatro brasileiro, não somente do ponto-de-vista da dramaturgia, mas também da encenação. E prossegue com ―O Auto da Compadecida‖, de Ariano Suassuna; em São Luís, o escritor, médico e sacerdote João Mohana, estreava na


produção das artes cênicas com ―Abrahão e Sara‖; pari passu com a adaptação teatral para as novelas de televisão, com Dias Gomes e Janete Clair. Surgiram grupos e companhias estáveis de repertório. Os mais significativos, a partir da década de 1940, foram: Os Comediantes, o TBC, o Teatro Oficina, o Teatro de Arena, o Teatro dos Sete, a Companhia CeliAutram-Carrero, e o famoso Opinião, era o foco de atenções da classe intelectualizada do país na época em que o nosso queridíssimo João do Vale e Nara Leão [ambos mortos] desafiavam a decantada revolução com ―Carcará‖, dele, João do Vale e ―A Banda‖, de Chico Buarque de Holanda, respectivamente. Quando tudo parecia ir bem com o teatro brasileiro, como disse acima, a ditadura militar veio impor a censura prévia a autores e encenadores, levando o teatro a um retrocesso produtivo, mas não criativo, o que acontecia diferente com o cinema que naqueles tempos ―bravos‖ era totalmente revisto e remodelado por Glauber Rocha, que lutou até extinguir-se da vida e da ribalta, para reformular conceitos e princípios e fundar o novo cinema brasileiro, sob a égide de sua genialidade. Com o fim do regime militar, no início da década de 1980, o teatro tentou recobrar seus rumos e estabelecer novas diretrizes. Hoje o teatro brasileiro está em alta graças a Deus.


O DELICIOSO SÃO JOÃO INCORRETO CERES COSTA FERNANDES

Ah, poder ser tu, sendo eu! Ter a tua alegre inconsciência, / E a consciência disso!... ( Fernando Pessoa) É cada vez mais difícil ser feliz. Coisas antes inocentes, tais como empinar papagaio, tocar fogos de artifício, soltar balões, acender fogueiras nas ruas, transmudam-se em crimes hediondos. Linhas de papagaios provocam apagões, morte por eletrocussão e até por seccionamento de carótidas de motoqueiros! Belos e ―inocentes‖ fogos, brincadeira de crianças de antanho, são responsáveis pela mutilação de milhares de pessoas! Os balões, vilões maiores, artefatos do demo, incendeiam refinarias e plantações. A tristeza de ser consciente volta meu olhar para horizontes interiores buscando uma época e um lugar: a infância e os festejos de São João do Largo de Santiago. Criança, pude curtir nesse mundinho a alegre inconsciência de ser feliz nas festas juninas. A expectativa emocionada do por vir era parte da semana que antecedia a festa: os fogos que meu pai comprava - estrelinhas, chuveiros, vulcões coloridos – guardados para o grande dia, eram conferidos no armário, momento a momento, a ver se realmente lá estavam; o vestido caipira - lindo! -, criação de Maria Costa, era mais que um vestido, semelhava um ser vivo acariciado dentro do guarda-roupa ou abraçado diante do espelho. E o incomparável frio na barriga ao acompanhar a colocação das bandeirinhas coloridas na rua, liderada pelos dois quitandeiros que demarcavam nosso território, um em cada extremidade do Largo: Zezé Caveira e Seu Guilherme. Na casa de Seu Barbosa, a mágica oficina dos balões, acompanhava-se todas as etapas da sua construção, cada ano mais sofisticados e com um número maior de lanternas. No grande dia, o auê dos preparativos finais. Em todas as casas do Largo, as famílias providenciavam mingau-de-milho, manuê, cocadas, canjica. A contribuição infantil era a busca de paus para as fogueiras. Percorríamos todas as áreas vizinhas, até o proibido manguezal, atrás da Fábrica de Gelo, da antiga Fábrica Martins. Tudo pronto. É hora de vestir a roupa de xadrez, pintar a boca de batom ( ô, felicidade) e, no pequeno jardim, subir na mureta para soltar os ansiados fogos. É dando-se as mãos que se pula a fogueira e a escolha dos pares desperta ciúmes. Comadres e compadres, jurados ali ao pé da fogueira, são para toda a vida. As simpatias de amor aceleram o baticum do coração: uma faca virgem enterrada na bananeira do quintal escreverá o nome do futuro marido, à meia-noite. Diabo é quem tem coragem de ir ao fundo do quintal à meia-noite. Além do que nem bananeiras há na vizinhança. Simpatia mais fácil é escrever o nome do amado em pedacinho de papel e pendurar numa das lanternas do balão - Seu Barbosa deixa - e o recado vai direto para São João. Ai, meu Deus, não deixes cair o balão. È a Hora!. Atravessar a rua até a concentração do lançamento exige destreza: é preciso ir driblando os busca-pés. Há uma trégua para a subida do balão. Supremo êxtase! É em forma de dirigível. Um Zeppelin! Pendurada, vai uma cruz de lanternas levando os recados. O balão sobe até virar uma estrela. Depois desaparece. São João na certa o recolheu. Olho os anúncios coloridos dos jornais. Dança de bois, cacuriá, tambor-de-crioula, barracas de comidas celestiais, e decido: vou aproveitar a festa antes que declarem que a morte do boi é politicamente incorreta.


UM NOVO OLHAR SOBRE A BAIXADA MARANHENSE. OSMAR GOMES DOS SANTOS Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís, membro das Academias Ludovicense de Letras, Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras. São quase 18 mil km² de diversidade única, encravada no coração do Maranhão, na porção mais ao norte do Estado. Uma planície baixa, de onde provém sua denominação, que forma o mais rico bioma maranhense. Cultura, costumes, tradições, culinária, fauna, flora, clima e sua gente dão características peculiares a essa região que ficou conhecida como Baixada Maranhense. Dentre os seus 21 valorosos municípios está minha amada Cajari, terra onde pude deleitar de seus campos e lagos, seja na labuta da pesada rotina ou nas brincadeiras de criança, ficando registrada minha saudação. Mas peço licença ao meu torrão para dedicar minha fala a toda Baixada, com toda sua abundância e riqueza. Efeito direto do clima predominante na região norte do Maranhão, a Baixada é atingida por abundantes chuvas no período de janeiro a junho, o que garante água e fartura na mesa do baixadeiro. Peixes, aves e outros animais se multiplicam como em um milagre proposto pela generosa mãe natureza. Criam-se, assim, condições perfeitas para o plantio. Atravessada por rios e repleta de lagos, é tida como o maior conjunto de bacias lacustres do Nordeste, o que lhe conferiu o título de ―Pantanal Maranhense‖. Toda essa riqueza faz da região uma fonte de vida para os moradores, principalmente aqueles que dependem diretamente dos rios – como o Pindaré, Mearim, Pericumã e Maracu – e dos lagos – tais como Capivari, Formoso, Coqueiro, Cajari e Viana. Águas de acarás, traíra, bagrinhos, surubins, camurins, aracus, curimatás, jejus, pacus, cascudos, mandis, calambanjes e tantos outros peixes. Campos onde gorjeiam bacuraus, garças, gaviões, guarás, gueguéus, graúnas, jaburus, jaçanãs, japeçocas, juritis, maçaricos, pato-do-mato, siriquara, tetéu. Um espetáculo fascinante só visto em terras baixadeiras. A bacia, onde a natureza se encontra com ela mesma, forma um ecossistema perfeito para a exploração de atividades que, mesmo de forma modesta, movimentam a economia local, baseada na agricultura familiar, extrativismo, pesca e pecuária, esta última ancorada na cultura bubalina. Não se pode deixar de destacar a rica cultura da região. Aos poucos indígenas somam-se a remanescentes de quilombos, pescadores e agricultores familiares. Juntos, eles são responsáveis pela maior parte das manifestações culturais da região, muitas das quais abrilhantam festejos juninos em todo o Estado. Além disso, há a rica produção de artesanatos e técnicas culinárias só vistas na Baixada. Mas apesar de toda riqueza a ser explorada, a Baixada também tem uma face cruel, que se manifesta com mais veemência nos períodos de seca. A abundância no período da cheia, quase que restrita a atividades de subsistência, não garante alimento e renda para todo o ano, cenário comprovado pelo baixo PIB per capita, que gira na casa de R$ 3 mil, menos da metade da média estadual, em dados de 2014. Destaca-se que um grande percentual da população ainda depende de ações afirmativas desenvolvidas pelo poder público. Metade da população maranhense recebe, por exemplo, o bolsa-família, programa assistencial do Governo Federal, o que também é uma realidade na vida dos baixadeiros. Aliado a fatores econômicos, estão problemas que surgiram com o crescimento populacional dos municípios e que vêm gerando impactos negativos, principalmente quanto à sustentabilidade. Falta de tratamento de esgotos, criação descontrolada de búfalos, além do extrativismo, caça e pesca predatórios, que estão entre os principais problemas a serem enfrentados. Razões que já ameaçam de extinção várias espécies locais. Costumo dizer que a Baixada Maranhense é um diamante bruto e sua lapidação passa necessariamente por um plano de manejo eficiente integrado, capaz de aliar o desenvolvimento cultural, o aumento da produção agrícola e a exploração sustentável dos seus recursos. O seu grande potencial não pode ser subestimado e pode contribuir com o desenvolvimento do Maranhão, garantindo comida farta na mesa do maranhense.


Conjugar a geração de emprego e renda, valorização da cultura local e manutenção do meio ambiente equilibrado é um desafio a ser assumido por todos e um dever dos gestores públicos em promover ações de fomento a esse objetivo. Destaca-se, aqui, o valoroso trabalho desenvolvido pelo Fórum em Defesa da Baixada, entidade que vem chamando a atenção das autoridades para a necessidade de intervenções positivas na região. Ao longo das últimas décadas, foi possível observar várias iniciativas que comprovam que basta ir além do discurso para realizar projetos que garantam as condições de trabalho ao povo baixadeiro, a exemplo da simples construção de diques em vários municípios, o que garante a reserva de água para a lavoura no período de estiagem. Como se vê, a Baixada tem jeito, mas ainda é preciso avançar na aplicação de tecnologias e métodos mais modernos de produção. Não é sonhar alto esperar que a Baixada Maranhense desenvolva culturas que deem sustentação à produção maranhense, posto que a região foi destaque no século XIX, quando o algodão lá produzido abastecia o mercado internacional. Tempos áureos não são meros fenômenos da natureza, não se concretizam como em passo de mágica, mas pelas oportunidades construídas pelo homem. Com inteligência e investimento é possível fazer a Baixada Maranhense florescer novamente.


O PATRIOTISMO FUTEBOLÍSTICO JOÃO BATISTA ERICEIRA A sociologia brasileira faz esforço para compreender o fenômeno do futebol em nossa sociedade. Esporte incialmente desenvolvido pelos ingleses, aqui aportou no final do século 19, e logo conquistou a alma nacional. Transformou-se na mais importante competição esportiva, sobretudo a partir dos anos trinta do século passado com as copas do mundo. Os brasileiros são mais ligados ao futebol que os ingleses. No campo das ideias algo parecido ocorreu, por exemplo, com o positivismo filosófico, que em muito influenciou os fundadores da República, bastando dizer que o dístico da bandeira nacional, o ordem e progresso, é de sua inspiração. O mesmo se pode afirmar do kardecismo com milhões de adeptos. Ambos surgidos em solo francês não lograram igual expansão no país de origem. Há filósofos do futebol, como Nelson Rodrigues e Armando Nogueira, autores de textos inspirados, de elevado valor literário, criadores de figuras míticas, como Neném Prancha, massagista e pensador do Botafogo do Rio de Janeiro, a quem são atribuídas frases como: ―pênalti é tão importante que quem devia bater é o presidente do clube‖. ―Jogo é jogo, treino é treino‖. Vários nomes e expressões são originariamente inglesas como os beques para designar os jogadores da defesa, e o goalkeeper para nomear o goleiro, finalmente, o próprio nome do esporte football, aportuguesouse ao longo do tempo, adquirindo status na produção lideraria. O poeta Carlos Drummond de Andrade é autor da festejada crônica intitulada ―Quando é dia de futebol‖ em que homenageia o ―anjo de pernas tortas‖, o ponta-direita Garrincha, herói de duas copas, as de 58 e 62. Armando Nogueira celebrou Pelé, a maior figura do esporte, em crônicas reunidas ―Na Grande Área‖ relatando os feitos do insuperável rei. José Lins do Rego registra a sua devoção pelo clube do coração no livro ―Flamengo é Puro Amor‖, como também o torcedor do Fluminense, Nelson Rodrigues, o fez em ―À Sombra das Chuteiras Imortais‖. A paixão de Nelson era tamanha, expressada nesta frase: ―se os fatos provam o contrário, pior para os fatos‖. É seguido pelo compositor Chico Buarque de Holanda, também tricolor apaixonado, como eram João Saldanha e Sergio Porto pelo Botafogo, e Ari Barroso pelo Flamengo. Como fazia o poeta João Cabral do Melo Neto pelo América do Rio, no que era seguido pelo compositor Lamartine Babo, autor de quase todos os hinos dos clubes do Rio de Janeiro. A Academia Brasileira de Letras realizou simpósio coordenado por Arnaldo Niskier para concluir que o futebol não é apenas essencial para a literatura, como também o é para o entendimento da nossa cultura. O jogador Nilton Santos, lateral esquerdo do Botafogo e da seleção, muitas vezes campeão, considerado a ―enciclopédia‖, recebeu do poeta Paulo Mendes Campos, cronista de Minas Gerais e do Brasil, esta sentença: ― Nilton Santos confia na bola; a bola confia em Nilton Santos; Nilton Santos ama a bola; a bola ama Nilton Santos. Também nesse clima de devoção mútua não pode haver problema‖. Quem de nós quando menino não jogou uma pelada e não sonhou ser craque no futebol, depois, obviamente, transferiu o sonho para outras atividades profissionais. É fato, esse esporte entranhou-se por inteiro na alma da nacionalidade. É preciso procurar cuidadosamente como e porque se deu a amálgama. Em todas as copas do mundo repete-se o fenômeno do patriotismo futebolístico. Os símbolos nacionais são içados, e todos são tomados de amor e paixão pelo Brasil. Em 1958, conquistando a primeira Copa do Mundo, assegurava Nelson Rodrigues que o brasileiro perdia o complexo de vira-lata e recuperava a autoestima.


Era o presidente da República Juscelino Kubitscheck, tempo de euforia, de otimismo, da construção de Brasília, da industrialização e de crença no futuro. A segunda conquista, em 1962, deu-se em plena crise do governo João Goulart. A terceira ocorreu em 1970, governo Médici, no auge da ditadura e da repressão. Mesmo assim, os brasileiros esqueceram as agruras e uniram-se para torcer pelo Brasil. Os três exemplos do século passado indicam a existência de um Brasil peculiar, a ignorar o Estado. A sociedade une-se em torno do esporte que reúne elementos de individualismo, e ao mesmo tempo de conjunto, de equipe. No futebol, como no carnaval, cria-se o espaço público voluntário, onde as pessoas se nivelam. É também canal aberto de oportunidades para os filhos das camadas mais pobres da população ascenderem socialmente. Um menino humilde da favela pode se transformar em jogador milionário. É verdade, a globalização e o excesso de financeirização têm provocado anomalias no campo desse esporte. Não importa. O maior desafio da classe política, próxima a travar as eleições após a Copa, é levar os eleitores a estufarem os peitos, a desfraldarem as bandeiras, vistas de quatro em quatro anos, a favor das causas públicas. A sentirem pelas políticas públicas o mesmo sentimento que lhes desperta o futebol. Por ora, é torcer pelo Brasil.


O ANIVERSÁRIO DE ARARI. JOÃO FRANCISCO BATALHA batalha@elointerent.com.br A cidade de Arari comemorou com pompas, neste 27 de junho, o seu 154º aniversario de autonomia política-administrativa. Ainda no ano de 1957, os ararienses comemoravam o aniversário do seu município na data de 24 de maio, dia em que na verdade fora criada a freguesia de Nossa Senhora Graça do Arari, através da Lei 465 de 1858, até então, curato, filiado à freguesia de Nossa Senhora de Nazareth; e por conseguinte, na condição de segundo distrito da Vila do Mearim. Reportando-se a uma matéria divulgada na revista Hinterland, o jornal Cidade de Pinheiro, em sua edição do dia 16 de março de 1958, contestou a reportagem e esclareceu em manchete de primeira página: SOMENTE EM JUNHO DE 1964 ARARI ESTARÁ COMPLETANDO O SEU PRIMEIRO CENTENÁRIO. Assunto que esclarecia o evidente engano na projetada comemoração de sua Centúria para aquele ano, tendo recebido, como benefício maior do deputado Neiva Moreira, em homenagem ao seu centenário, a autorização do Ministério da Saúde, para implantação do serviço de abastecimento de água potável da cidade. Alvíssaras também difundida pelo jornal Notícias, como dádiva do aludido deputado ao povo arariense. E prosseguindo, reafirmava o jornal pinheirense que somente no dia 27 de junho de 1964, Arari poderia festejar o seu Centenário. E avança no tema esclarecendo a confusão criada por causa da Lei 465, de 24.05.1858, reiterando que em maio de 1958 Arari atingia o Centenário de freguesia, porém, nunca, o de município. A partir do esclarecimento feito pelo jornal Cidade de Pinheiro os ararienses trataram de comemorar a festa de aniversário de emancipação de Arari na data de 27 de junho, o status quo do município. Segundo Sabino Lopes Rosas, estudioso e pesquisador da história de Anajatuba, na década 1850, enquanto Joaquim José da Silva Rosas (Comendador Rosas) se movimentava na campanha para a emancipação de Santa Maria de Anajatuba, o Padre Inácio Mendes de Morais e Silva também trabalhava a emancipação do Arari. Vamos aos fatos: Novembro de 1862 Em 24 deste mês e ano, na vigência do governo do Conselheiro Antônio Manoel de Campos Melo, surge o primeiro movimento emancipatório de Arari que contava, na época, com uma população de 699 cativos e mais do dobro de pessoas livres. A apresentação do projeto nesse sentido, encontra, de logo, resistência por parte de Manoel Lourenço Bogéa, que foi presidente da Câmara Municipal da Vila do Mearim (administrador do município), em três oportunidades. Submetido a votação no plenário da Assembleia Provincial do Maranhão, diante da reação Manoel Lourenço, que era arariense de nascimento, e sob pressão do presidente, Campos Melo, de quem era correligionário o político mearinense, a Assembleia rejeita o pedido de emancipação política-administrativa de Arari. Mas o aniversário do município. Maio de 1864 município de Arari.

Assembleia Provincial do Maranhão recebe, pela segunda vez, projeto de criação do

Dia nove de maio

-

discute em primeira votação;

Dia vinte de maio

-

debate em segunda discussão;

Dia vinte e um de maio -

coloca na Ordem do Dia, e discussão em terceira votação;


Dia primeiro de junho de 1864, a Assembleia Provincial do Maranhão vota e aprova, sem debates, a criação do município de Arari, até então com a grafia Arary. Dia vinte e sete de junho do mesmo ano - o poder executivo assina Lei Provincial que eleva Arari à categoria de município, continuando sua sede com o título de vila, porém passando a ter autonomia política e administrativa, desmembrando-se de Vitória do Mearim. Aprovada a lei de criação do município, em primeiro de junho de 1864 pela Assembleia Provincial e sancionada em 27 do mesmo mês e ano, pelo desembargador Miguel Joaquim Aires do Nascimento, vice presidente da Província do Maranhão, no exercício da presidência, realiza-se no dia sete de setembro de 1864 a primeira eleição para dirigentes do município, presidida por João Joaquim Pereira, primeiro juiz de paz do recém-criado município. O resultado foi o seguinte: Vereadores eleitos: José Antônio Fernandes, Pedro Nunes Cutrim, João Joaquim Pereira, Lino José Tiago de Melo, Joaquim Duarte Fernandes, Raimundo Hermenegildo de Sena e José Nicolau Pereira. O mandato dos que se elegeram começaria dia primeiro de janeiro do ano seguinte, mas, mediante impasse criado para saber quem seria o instalador do município, e sugestão de José Antônio Fernandes, com anuência do presidente da Província, Ambrósio Leitão da Cunha, a instalação do município, e a posse dos eleitos, para um período de quatro anos, foram transferidos para dia a oito de janeiro de 1865. Nessa data, ocorre, de fato, a autonomia política-administrativa de Arari, através da instalação de sua Câmara Municipal e posse de seus vereadores, em um número de sete, com a emancipação do neo-município. Na condição de vereador mais votado tomou posse na presidência da Câmara, e concomitantemente administrador do município, José Antônio Fernandes, posse que lhe foi dada pelo presidente da Câmara Municipal de Vitória do Mearim, Joaquim Francisco Fernandes, instalador do novo município. A Câmara, administradora do município, foi instalada e passou a funcionar em uma sala residência do próprio presidente.

da

Pergunta-se: Qual data devemos comemorar a emancipação política-administrativa de Arari? Primeiro junho? Dia em que o município foi criado pela Assembleia Provincial do Maranhão? Vinte e sete de junho? Data em que o presidente da Província do Maranhão sancionou a Lei de primeiro de junho? ou Oito de janeiro? Data de efetiva autonomia do município? Colocamos o e-mail batalha@elointernet.com.br para receber o ponto de vista dos leitores.


JOSÉ DA CUNHA D´EÇA JOÃO FRANCISCO BATALHA batalha@eloinernet.com.br Jozeph da Cunha d´Eça não fundou o Arari. Arari não tem fundador. O primeiro cidadão a se estabelecer na localidade foi Francisco Vieira, através de concessão de terras por sesmaria, concedida por D. João V, o Magnânimo, rei de Portugal e Algarves, conforme apontamentos existentes no Arquivo Histórico Ultramarino – despachados por Bernardo Pereira de Berredo, em 22 de março de 1720. Antes de chegar ao Maranhão, Cunha d´Eça foi comerciante ambicioso no Pará e por sua voracidade comercial denunciado e acusado de contrabandista de madeira de lei. Já no Maranhão, proclamando-se fidalgo da Casa Real, foi capitão-mor da ribeira do Mearim, por volta de 1723. Mesmo casado, viúvo e pai de dois filhos do primeiro casamento, casou-se novamente e em seguida deixou o estado secular e abraçou o eclesiástico, após cumprir exigência que lhe fora imposta pela Igreja Católica para que lhe fosse conferida a ordem dos sacramentos. Provido de bens da fortuna, custeou a edificação de uma igreja no Mearim (talvez a de Nossa Senhora de Nazaré de Vitória do Mearim, que segundo afirmam ficava no Sítio Velho) dotando-a de sino e paramentas, além de um curral com meia légua de terras e algumas bestas em campos de pastagens naturais da margem direita do rio Mearim (no atual Curral da Igreja) para servir de patrimônio da freguesia da Ribeira do Mearim. Recursos destinados por intermédio do bispado do Maranhão. A partir de quando adquiriu poderes para exercer os mistérios sagrados que se referem ao culto divino, pregado pelo cristianismo, com incumbência de catequização dos indígenas que povoava, a ribeira do Mearim, mesmo assim, acusado de impiedoso com os nativos. É caretice chama-lo de Padre e uma grande tolice de fundador de Arari.


POESIAS & POETAS


AYMORÉ ALVIM CONSELHOS PARA CHEGAR LA. É bom ser velho. É um desafio. Mas acho chato se me chamam idoso. Que nome feio. Acho horroroso. Mas é melhor que me chamar de tio. Se vou ao banco Ver meu dinheirinho Que me restou da aposentadoria Vem logo o guarda, muito educado. Me convidando a ir para a tal fila. - Não, senhor guarda, aqui está muito bom. - Mas, meu senhor, naquela é mais depressa. Só que pro velho, Pouco isso interessa Pois cada um passa um tempão no caixa. Essas coisinhas Às vezes, nos irritam. Pensando bem, por que se estressar? Pois, nesta fase, a vida vai encurtando. Quanto mais tempo houver, Melhor será. Por isso, amigo, se você viver, E viver bem pra conseguir chegar, Há um bom preço que a vida cobra. E se chegar por lá, tem que pagar. Afaste-se do fumo e da bebida, Da carne gorda, do estresse e das frituras. Caminhe, se possível, todo dia E na dieta seja “linha dura”. Visite sempre que possível, O urologista Do cardiologista não se ausente. Ande devagar sem muita pressa Todo cuidado é pouco, para a gente. Para evitar o traumatologista Devido a osteoporose já presente. Não deve relaxar a saladinha. E comer peixe todas as semanas. Beba muita água e coma frutas


Muito mamão, melão, muita banana. Bastante suco e muita verdura Assim verá, vai se sentir melhor. Controle o açúcar e os triglicerídeos. E fique atento ao colesterol. Então, não sei por que tanta ganância. Em querer tudo apenas só pra si. Nada trouxemos. Nada levaremos. Só as boas ações vão nos seguir. Por fim, amigo, é só se preparar Pra derradeira hora tão temida, Quando um dia hão de nos lembrar Somente o que de bom fizemos nesta vida.

DIVAGANDO NO ZÊNITE.

Mostra-me, oh! Terra, Nessas tuas andanças zodiacais, Por que os dias e as noites se sucedem Nessa alternância monótona e infindável? Mostra-me os astros que vais encontrando, Nesse teu turismo solsticial e sem fim. Mostra-me as constelações que vão surgindo, Os cometas que cortam a tua orbital, As estrelas que vão abrindo caminho para ti, Nessa tua viagem de magia eterna. Faze os filhos que geraste entender o sentido da igualdade Quando a revelas, nos teus dias e noites equinociais. Faz-me entender como elaboras, nesse teu percurso, A estação das flores que alegra e dá vida; Do calor que abrasa e excita; Do cinzento período que entristece, mas tranquiliza. E do gostoso momento de frio que acalma. Pede que leiam as minhas mãos Quando passares pelas casas de Touro e de Câncer. Quero saber que recado há para mim. Pede que revelem o meu destino. Que fortaleçam em mim A expectativa de uma vida longa ao seu lado Ou que deixem fenecer a ilusão de alegrias no meu outono. Não permita que essa vã esperança me consuma, Na poeira dos séculos sem fim.


FOI ASSIM. Aymoré Alvim. Chamaram-me com tanto amor, No começo, eu hesitei. Insistiram, novamente; Então, eu aproveitei. Tarde fria, chuva fina Era assim que estava o tempo, No dia em que eu cheguei. Mil visitas de amigos, Uma alegria sem fim, Só pra ver o primogênito De dona Inez e Zé Alvim. Será que é bonitinho? E se parece com quem? Ele é bochechudinho Puxou ao pai, mais ninguém. Depois chegou a Moema, José Paulo veio mais tarde Aymoré já crescidinho Mandaram para ser padre Ele gosta muito disso Vamos fazer-lhe a vontade. Mas passados alguns anos, Do Seminário saiu. Procurou uma donzela Com quem núpcias contraiu. Um dia Deus a chamou, Todo o seu mundo ruiu. E pra não ficar sozinho Deixou-lhe do seu amor Três lindos filhos e partiu. Eles são minha alegria Que Deus a mim permitiu. Já me deram dois netinhos, A minha vida sorriu. Que mais eu posso querer? Tudo de bom já ganhei. Agora eu posso esperar Nascer de novo outra vez.


NUNCA. Aymoré Alvim, APLAC, ALL, AMM. Nunca lhe digas Que tu muito a amas. Por mais que jures Ela não acreditará. - Apenas demonstra e ela ficará satisfeita. Nunca reclames Se ela demorar. Pois, no outro dia, Chegará mais tarde. - Dispensa-lhe toda atenção; dá-lhe flores. Nunca perguntes se ela gostou. Caso faça aquele rizinho, Está zombando de ti. Se ficar séria, Ih! Pode acreditar, está te achando um tremendo idiota. Nunca a questiones se te ama. Ela sempre te dirá que sim. Mas, não te iludas. Na primeira que aprontares O amor desaparece E, então, verás do que uma mulher é capaz quando endoidece. Ah! Não as entendes? Por mais que te esforces nunca conseguirás. Ama-as, apenas e viverás em paz. Quem te falou que mulher é para ser entendida? Nunca!


O MÉDICO E O PACIENTE Já não te vejo Como o amigo de outrora. Em quem eu confiava E a quem tudo eu dizia. Com atenção, E paciência me ouvias, Por que somente em ti Acreditava. Já não me ouves mais Como me ouvias. Tampouco me dispensas O teu sorriso. Já não confio tanto No que dizes Por mais que eu queira, Sempre desconfio. O que nos separou? Diz-me. Foi o progresso. Que trouxe no seu bojo A tecnologia Se por um lado é bom, Eu te confesso. Por outro lado veio também O que eu temia. Antigamente, eu lembro, Como era diferente. Com compaixão e altruísmo Exercias O teu ofício Para o bem do paciente, Numa relação de amor, Franca e sadia. Hoje, eu te digo Que vejo com tristeza, Tudo isto transformado Em lembranças. Que Medicina, então, Que eu exerço, Se nossa arte É de amor e de esperança.


SACRAMENTUM HOC MAGNUM EST. Aymoré Alvim. AMM, ALL, APLAC. Este Sacramento é grande! É o maior de todos os Sacramentos Porque com Ele, em todos os momentos, Jesus estará sempre contigo. Não acreditas? Tudo bem, não importa, Porque se isto, amigo, te conforta, Ele jamais desistirá de ti. Isto é amor. É incomensurável, Inconcebível, Irracional, Inexorável, Que extrapola todos os sentidos. Somente Deus É capaz de amar tanto. Mesmo que o homem exagere, No entanto, Jamais vai conseguir amar assim. A Eucaristia É o testemunho do divino amor Que Deus instituiu e nos deixou, Na transubstanciação do pão e vinho


VIRIATO GASPAR

O SÓ SOBRADO Viriato Gaspar Se eu tivesse descido aquela rua, Naquela tarde antiga, já tão morta. Houvesse entrado, em vez de ao pé da porta, Tropeçar, engasgado pela lua. Se tivesse calado quando disse, Ou se tivesse dito o que engoli. Mandado a carta que nunca escrevi, Ouvido o meu menino e as suas tolices. Se tivesse sumido na manhã, Sem rumo ou mapa, para o mundo aberto, Seus ventos vastos, suas ilhas vãs, Trocado pelo largo o parco perto. Tivesse dito não, quando fui sim, Dito jamais, quando afirmei pra sempre. Mais coração e muito menos ventre, Menos areia e muito mais jardim. Mas só que agora, quando o sol se encarde, E a sombra sobra, já nem mais importa, Não ter descido lá naquela tarde Aquela rua antiga, hoje já morta. A RE-METIDA Viriato Gaspar Desembarcar nas praias de teu corpo, Não um conquistador, um penitente. Orar em cada entrância, e em cada nicho, Deixar a úmida prece de um lambeijo. Correr como um menino no recreio Por entre os corredores, ir às salas, Entrar em todas elas, bagunçá-las, Sem nenhuma deixar de estremecê-la. E quando já depois, pac-enfincado, Tendo pago a promessa do desejo, Orar o teu calor, Deus a meu lado, A quem pago o tributo de outro beijo.


A MÃO NA ESCURIDÃO Viriato Gaspar Quando intentei o sol, já era noite, Fazia muito frio, e ninguém vinha. Só eu passava ali, caçando acoite, Varando a vastidão do que não tinha. Talvez andar só fosse arfar abrigo, Empurrar meus pedraços pelo escuro. Nunca abarquei um grão do que procuro, Só arrastei a solidão comigo. Vou como todos, sou como os que vão, Um cego esbaforido entre outros cegos Que se empurram com pressa rumo ao chão. Há mais dor que fulgor no que carrego. Mas pela treva, em meio à escuridão, Alguém segura firme a minha mão.


JOÃO BATISTA DO LAGO

JARDINEIRO (Dedicado ao poeta José Ribamar Sousa dos Reis) Se me deres por sacrifício ao Útero sagrado desta terra que me fez Massa entre corpos vadios e universais Verás (talvez!) um dia que me tornara hóstia Consumida nos roseirais de Rosas negras entre as vermelhas E amarelas E brancas Serei então o verbo! Único verbo na carne já podre Onde residem almas calejadas de sofrimentos E trôpegas palavras soltas ao vento na Infinitude do universo solitário Onde se me terei como poeira de Todos os tempos E onde habitarei a casa da minha eternidade Lá, sim, cultivarei as flores e as rosas: Brumélias, camélias, Amarílis e anêmona, Antúrio, astromeias e alpineias, Bouvardias, celósias e cerejeiras… Terei tempo para conversar com “chuva de prata” Beber do “copo de leite” E, quando já cansado de toda jardinagem, Mansamente fazer da “boca do leão” meu leito sagrado


LAVRADOR DE OUTONOS © DE João Batista do Lago Chegado é o tempo da colheita! Há muitos frutos para se colherem Depois dum verão causticante (e) Antes que o inverno de águas torpes Carregue para o leito das correntes Toda beleza das rosas e das flores. Venho dos campos de terras tombadas Ardidas e calcinadas por mãos assassinas Onde se plantaram o fogo do madeiro Hoje a cruz de cinzas que volatiza a vida Transformando todos os frutos em carvão Enferrujando a lavoura e a água e o sal. Lavrei-me de todas essas rudezas (e) Diante do altar de todas as plantações Viscerálgico como carpideira solitária Fui carpindo uma a uma minhas dores Plantando em cada semente visionária A possibilidade de me ser toda floresta. Todo o fruto da terra que ainda me resta Colho-o com as mãos duma criança Para comê-lo com o sabor da esperança Visceral diante do altar da vida Como se fora a última hóstia dos mortais Para queimar o fogo dos dias finais. Talvez assim – quem sabe! – o fogo pagão Aprenda a arar a terra de todos os campos Salvar todas as nascentes de qualquer Jordão Capaz de banhar a vida com todos os encantos Gerados do ventre da terra… E ao final Cantar o terço numa oração de bem-aventurança.


4 POEMAS DE RICARDO LEÃO* Publicado em maio 12, 2018 por Carvalho Junior

Ricardo Leão (São Luís/MA, 2 de março de 1971) . Professor, ensaísta, crítico literário, poeta e ficcionista brasileiro. Autor de, entre outros títulos ficção, ensaio e crítica, Simetria do Parto (2000, Prêmio Xerox de Poesia), Primeira Lição de Física (2009, Prêmio Gonçalves Dias), No meio da tarde lenta (2012), A plumagem do silêncio (2015), Minimália ou o jardim das delícias (Editora Penalux, 2018).

NOCAUTE O eterno é oco À carne dos lábios. O eterno é louco Até para os sábios O eterno é pouco Nos vãos alfarrábios. O eterno é um soco Nos egos inchados. O eterno é o ouro De todos os tolos.

PARTIDA No abdômen das palavras O teu verso está grávido. Num alheio e mudo idioma, Ao fim de outro crepúsculo, Nossas duas línguas juntas Conversam sobre o adeus.

COSMOS a Antonio Carlos Secchin A crosta de silêncio Que envolve a palavra Está em toda galáxia. Lá no fim da Via Láctea, Onde talvez haja água, E o homem seja uma fábula.


SIGNO O mundo intangível, A palavra esquecida Nos lábios semoventes Da carne crua, ferida. A palavra, a coisa, Mordida em sílaba, Fonema impuro, De fome e preguiça. A palavra espúria, A infância perdida. Um murro no muro, Sob a pele e a escrita.


4 POEMAS DE DILERCY ADLER Publicado em maio 15, 2018 por Carvalho Junior

Dilercy Adler. Psicóloga, doutora em Ciências Pedagógicas, membro fundador e ex-presidente da Academia Ludovicense de Letras. Possui extensa bibliografia, sendo suas últimas publicações em torno da figura de Maria Firmina dos Reis, de quem é estudiosa. Tem participação em antologias nacionais e internacionais entre elas: Mil Poemas a Pablo Neruda: Un canto de amor e A Poesia Maranhense no Século XX. Os textos desta seleção foram extraídos das páginas Poesia dos Brasis, Textos Encantadores e Revista Literária Pós-moderna.

ESPAÇO FEMININO Espaço mulher mulher no espaço espaçonave espaço cósmico cômico espaço… inusitado das normas do corpo do sexo do leite materno que eterno sangra do peito a jorrar a boca a dentro do homem

COBRANÇA Cobro-te cobras-me cobra venenosa com veneno fatal cobro-te quando me cobres com teu corpo enroscado tipo cobra no meu corpo intumescido rígido sensual

NECESSIDADE DE TI Eu te preciso tanto que me dói a tua ausência eu te preciso tanto


que te queria sempre junto e a possibilidade de não ter-te me entristece me deprime me enlouquece! eu te preciso tanto e no entanto sinto que preciso não precisar assim de ti preciso sim – urgentemente para manter-me intacta e livre desvincular-me de ti! POESIA Eu te capto entre os espigões de concreto que se afogam no mar morto do asfalto eu te vejo mesmo na solidão do eco do salto alto nervoso apressado eu te acho no poço escuro sombrio do elevador lento e inabalável eu só me calo quando me falas eu sempre grito as tuas dores mas também digo os teus prazeres e ainda bendigo por me fazeres teu instrumento!


4 POEMAS DE FERNANDO BRAGA Publicado em maio 16, 2018 por Carvalho Junior Fernando Braga (São Luís/MA, 29 de maio de 1944). Poeta, ensaísta e pesquisador brasileiro, formado em Ciências Jurídicas e Sociais e pós-graduado em Ciência Política na Universidade de Brasília – UnB, com estágio em Direito Penal Comparado pelo Centre d’Etudes de Civilisation Française da Universidade de Paris-Sorbonne. Publicou dez livros de poemas, com participações em importantes antologias nacionais e internacionais. Seus livros mais recentes são Poemas do Tempo Comum, [Prêmio Gonçalves Dias, São Luís, 2009], O Puro Longe [Caldas Novas, GO, 2012] e Magma [Goiânia, 2014, lançado em Aveiro, Portugal]. MAGMA Esta é minha palavra, o meu conjunto confuso e inextrincável de elementos… É o poema que me busca e me trás para a superfície, para que eu possa dizer-me e ouvir-me tantas vezes, e expor-me a pensamentos aonde sou sujeito e objeto… Este é o magma do meu logos racional, do meu dever-ser mais- que- perfeito e natural, poético, crístico e complexo… COMPULSÃO Se vós não tendes sal-gema não entreis neste poema (Jorge de Lima) Esconde-me das mandíbulas famintas e calça-me as sandálias dos pescadores, para que eu me sobre em outras águas. Desprende-me das grades dessa tortura que me tão prende e tão não me liberta. Leva-me às sacanas canções de Aretino, enclausura-me naquele intemporal ofício e embarca-me entre rijas carnes e coxas, para que eu não escape ileso de tal fome, e dessa feroz sede que insaciavelmente se me faz implorar a outras samaritanas o doce cântaro divino e de barro santo. Sagra-me com o velho pecado original e traze-me aquele cálice de verde vinho


O POETA MAIS QUE CONCRETO [À memória de Déo Silva] Olhos e vozes. rostos e órbitas, atenção acesa: no espaço u’a maçã que não cai sobre a mesa e nem esbarra no antigo relógio parado na parede. Um poeta faz-se preceptor a contemplar o fruto que gravita diante de sua explicação. A maçã vagueia, incomum e concreta a fazer-se conceitual às lições do poeta. Lá fora apenas um ângulo noturno… MEUS VERSOS “Aprendi esta língua como se consegue o amor de uma mulher” Valéry Larbaud Meus versos surgem de repente, sem anúncios preconcebidos, e assim, a esmos e inconsúteis, se amesendam nas múltiplas intransitividades que na vida hei passado como poeta e bruxo. Há entre mim e eles, uma brancura bipartida em orgânica dualidade, simples e ressurgida, numa cumplicidade inconsciente e consentida, mas comedida, necessária, útil e dependente. Há entre nós uma parceria, como se heterônimos dalgum poeta fôssemos, onde eles, meus versos, sorrateiros nas paráfrases se permitem comigo logo no primeiro grito, sentir a dor que sinto, mas que nunca em tempo algum deveras finjo. Eles e eu somos um só Fernando, uma só Pessoa…


TRÊS POEMAS DE ANTONIO AÍLTON Postado: 17 Maio, 2018 Jean Narciso Bispo Moura

O TROCO (sensibilizado por um poema de Jandira Zanchi) encho o meu carrinho de alimentos perecíveis e livros virtuais que guardarei plastificados como posfácio lembro do Mesmo na casca semântica deste dia cinza não quero ser identificado pelas etiquetas mas aí está a minha cesta de escolhas escassas e poucas metáforas para o poema que devo dedicar à caixa do supermercado devo falar em linguagem simbólica ou cifrada para não ofendê-la ela vai rir como uma etiqueta, ela vai dar meu troco incerto e nada digo não posso deixar a vida ainda mais parca por questão de centavos não quero parecer o machão, o poeta ou o panaca consolo-me com a lembrança de um poema de Jandira Zanchi tiros na esquina mas continuo sem saber como reagir ao assalto sequer se devo reagir ou apenas seguir em frente preparo-me para fazer outra leitura dos tiros na esquina vou me deslocando sem estacionamentos com medo de perder sem dar o troco topo com um cara similar mas não sei se eu sou o produto verdadeiro um de nós deve restituir a vida do outro deve haver algum acordo, alguma coisa a ser simplesmente dita antes que entremos em pânico

II Entra ano, sai ano de farelo em farelo de bagana em bagana entre o chão


e dois metros do chão entre a borboleta e Bispo do Rosário Quem faz uma lenda urbana para o pardalzinho?

₰ Chegas do teu longo passeio de anos enquanto emagreço entre pedras e marés chocando o futuro da espera Mas um coração calejado é um coração pronto para quando o retorno acontece trazendo quem sabe alvoroço e iluminação Agora, asperge o gelo escorre teu cabelo e sobe

*[ANTONIO AÍLTON]: poeta, professor, pesquisador da poesia brasileira contemporânea. Livros publicados: Compulsão agridoce (Poesia, Paco Editorial, 2015); Os dias perambulados & outros tOrtos girassóis (2008, Prêmio “Cidade do Recife” – Categoria Poesia); As Habitações do Minotauro (2001, Prêmio Cidade de São Luís – Poesia) e Humanologia do eterno empenho: conflito e movimento trágicos em A Travessia do Ródano, de Nauro Machado (2003, Prêmio Cidade de São Luís, ensaio). Autor da tese MARTELO E FLOR: Horizontes da forma e da experiência na poesia brasileira contemporânea (Curso de Teoria Literária, Universidade Federal de Pernambuco).


4 POEMAS DE DANIEL BLUME Publicado em maio 19, 2018 por Carvalho Junior Daniel Blume (São Luís/MA). Poeta e cronista brasileiro. Advogado, Procurador do Estado do Maranhão, membro da Academia Ludovicense de Letras. Possui participações literárias em jornais, revistas, coletâneas e antologias nacionais. É o autor dos livros de poemas Inicial, Penal e Resposta ao terno. ROLETA Deus nunca joga os dados de Einstein, nem apresenta as senhas, as sanhas de Houdini. Real mente produz vencedores, ao largo de efêmeros ganhadores.

PAPEL DE PAREDE A vida é menos de escaladas do que de escapadas, a nos impor e sobrepor papéis. Finos papéis de parede a encobrir até vestígios de nossa tinta de origem.

SANGUE Sopra um vento de 1977, quando o tempo me toca. Um temporal espesso vira tudo do avesso faz tudo do anverso verso que exclama pelas esquinas. Viver é sangrar!


A PROCURA Por onde anda o carroceiro, o pregoeiro, a lusitana, a quitanda? Não vejo novos Fuscas, belinas, brasílias, kombis, monzas, opalas. Sumiram os discos, cassetes, ataris, nintendos, microsystems, walkmans. Busco a Geneve com pipoca ou o arroz de galinha quentinho nas festas. Não encontro a tábua de pirulitos na praia, nem o moço do papagaio ao lado do burro com os cofos de coco fresco. Não ouço mais histórias na rede ao lado do ranger da cadeira de balanço. Onde estão meus pais? Também não me encontro mais.


4 POEMAS DE JOSÉ MARIA NASCIMENTO Publicado em maio 20, 2018 por Carvalho Junior José Maria Nascimento (São Luís/MA, 18/09/1940). Poeta e fotógrafo brasileiro. Publicou, entre outros, Harmonia do Conflito (Poesia, AMANO, 1960), Silêncio em família (Prêmio Cidade de São Luís – FUNC), Graças & Danos ou Reflexos Noturnos do Recife (Prêmio Cidade do Recife, 1972), Semeadores de Ilusão, Os verdes anos da Juventude, Metáforas do Absurdo. Os poemas desta seleção foram extraídos da Antologia Poética (SEGRAF, 2010). Seleção do poeta colaborador da página Antonio Aílton. A PROCURA Pelos resíduos dos encardidos sonhos te procurei onde as águas dormem. Ausente estavas dos clamores noturnos. Nossas vidas, ávidas de afetos, se dispersaram com amigos embriagados. Pelas esquinas onde as juras são refeitas dormias tu: as transparentes vestes expunham aos passantes os teus seios. Pelos recantos da noite te busquei, tão só! E eram tantas as mulheres, todas iguais a ti. A PROSTITUTA Quem bebe do cálice dos teus lábios, logo é possuído pelo fogo da vida. Nos teus braços os homens desfrutam raríssimos momentos de fingido amor. Por dentro dos teus olhos está o gozo, que os viventes pagam por merecê-lo. Em tua companhia, tudo torna-se ilusório, e as dores, por instantes, se evaporam. O VALE Para Graciolita Correu de fino a tua imagem no vertical de minha mente. E lá vou eu sem nexo nem perplexo anexo ao dorso de um tigre todo de carne barro e vidro rumo ao vale do meu amanhecer. E acho graça da noite fria Que me despiu contra o rio do mundo – que pesar mais estúpido e belo não saber se estou limpo ou imundo assim caminhando sob o luar da vida.


VIDA COMUM Pegava o bonde às seis horas às sete namorava às oito se despedia às nove chegava no bar Bebia dois copos espumantes contava algumas piadas às vezes jogava porrinha às onze se retirava Tomava de volta o último bonde andava três quarteirões às doze estava em casa armava a rede e dormia Hoje chegando aos setenta anos às oito assiste ao Jornal às nove fica na porta às dez toma o seu chá


JOÃOZINHO RIBEIRO LATIFÚNDIO Que calo doído é esse Que espoca mas não se ajusta Ao desconforto dos pés E à exploração da labuta Na terra do latifúndio? - Compadre Nonato, é a luta! Que fruto amargo é esse Que tão caro assim nos custa O preço de adquiri-lo Por tabela tão injusta No cacho ingrato da vida? - Compadre Nonato, é a luta! Que bala assassina é esta Que no espaço se avulta Com a certeza da morte No tiro que a vida encurta Encharcando o chão de dores? - Compadre Nonato, é a luta! Que certeza será essa Que uma bala não oculta Que se agiganta na vida E com a morte não se assusta, Ainda que se demore? - Compadre Nonato, é a luta! Mas que luta será essa Ainda não definida Espalhada pelos campos Pela terra repartida Na esperança que aquece? - Compadre Nonato, é a vida!


4 POEMAS DE NATÉRCIA GARRIDO Publicado em maio 24, 2018 por Carvalho Junior Natércia Garrido (São Luís – MA/1979). Poeta e professora brasileira, atua no Departamento de Letras da UEMA (campus Caxias) e no Ensino Médio Técnico e Superior do IFMA-Caxias. Mestre em Literatura e Crítica Literária pela PUC-SP, começou a escrever desde cedo influenciada pelas leituras e conversas com seu avô, o poeta maranhense Nascimento Morais Filho. Mantém o Blog A Beletrista desde 2008 onde escreve resenhas críticas literárias e abre espaço para outros escritores. Desde 2017 se aventurou no YouTube com o canal de mesmo nome do blog, tornando-se a 1ª Booktuber do Maranhão.

I. aquela imagem no espelho olhos inchados mal dormidos puramente comidos para dentro incendiados ingenuamente esbugalhados para fora…

V. [por onde o tempo não passa] pois que não se é visto nem sentido por entre os ipês passa pelas flores deslizantes dos ipês o rumo é outro nem rosa, nem amarelo, nem passa aqui é o tempo em si…

VI. carreguei no colo a vida que eu quis. (a vida que me diz) o murmurar que cantei. os beijos que dei. o sexo que fiz.

VII. então ela a menina dos olhos verdes que tudo vê e crê no nada caiu como a folha que se desloca em nuvens roçando o ar…


4 POEMAS DE CELSO BORGES Publicado em junho 5, 2018 por Carvalho Junior Celso Borges (São Luís/MA). Poeta, jornalista e letrista brasileiro. Parceiro de Chico César, Fagner, Criolina, Gerson da Conceição, Assis Medeiros, Nosly e Zeca Baleiro, entre outros, tem 11 livros de poesia publicados, entre eles Pelo avesso (1985); Persona non grata (1990); NRA (1996), XXI (2000), Música (2006) e Belle Époque (2010), os três últimos no formato de livro-CD, com a participação de + de 50 artistas brasileiros. Desde 2005, desenvolve projetos de poesia no palco, o primeiro deles, Poesia Dub, com o DJ jornalista Otávio Rodrigues. Nos anos seguintes monta A Posição da Poesia é Oposição, com o guitarrista Christian Portela e o percussionista Luiz Claudio; A Palavra Voando e Sarau Cerol, com o DJ e compositor Beto Ehongue; e LETRALERTA, com o percussionista Isaías Alves. A voz dialoga com trilhas, guitarra, baixo e percussão, proporcionando ao poema estrutura sonora além da sua própria musicalidade. A ideia é valorizar a linguagem falada em diversas possibilidades. Borges tem poemas publicados em várias revistas de literatura, entre elas Coyote, Poesia Sempre, Oroboro e Acrobata. Foi curador da Feira do Livro de São Luís em 2013 e 2014. palavra com começo meio e fim não necessariamente nessa ordem: palavra pavrala vrapala lapavra vralapa lavrapa lavoura

álibi arredio inconformado às vezes meu poema que sente náuseas na Wall Street de Sousândrade e dá interferência na antena parabólica de Ezra Pound meu poema às vezes objeto não identificado nos móbiles de Augusto de Campos meu poema às sempre com seu vício coup de dés sem Mallarmé coração e linguagem às vezes um pra cada lado e eu sem nunca saber quem vence a batalha


miles davis um concerto moderno porque a vida não é um show de miles davis e que porque se ando nem sempre apresso mutilo mudo o gesso que molda o braço nu no braço sob o gesso incesto e veneno seguindo o trompete que sopra na boca do viciado miles davis j‘ai ais demais pra te suportar, mundo velho e não falo pela boca de um trompete o mundo novo ouve os aplausos para miles davis

testamento só sobrei minhas palavras só réstia em suma perdas certas partidas inacabadas cactos só sobraram cacos fundas em voo ácido parado palavras fado ou enfado carreguei nos neurônios na alma nos sonhos nuas as vi nascer em mim assim palavras inteiras eternas primeiras soçobrei só sobrou espanto breu brabo ás de baralho brilha cesária bombril palavra a puta que me pariu


4 POEMAS DE FRANCK SANTOS Publicado em junho 5, 2018 por Carvalho Junior Franck Santos (São Luís/MA). Escritor/poeta brasileiro. Libriano com ascendente em peixes, 50, escreve para tentar extravasar a solidão e a vontade de colocar uma mochila nas costas e conhecer o mundo. Tem quatro livros publicados nos gêneros poesia e romance.

Voos Não tentei Mas sei Nós, aves, morremos dos voos que não os demos. [a serena possibilidade do abismo]

Eles Eu queria diurno, ele noturno. Ele queria manhã, eu tarde. Eu queria café, ele chá. Ele queria inverno, eu outono. Eu queria abraço, ele beijo. Ele queria mel, eu agridoce. Eu queria blues, ele rock. Ele queria gim, eu vinho. Eu queria romance, ele ação. Ele queria montanha, eu praia. Eu queria inteiro, ele metade. Ele queria nada, eu tudo.

Café da tarde Quando ele atravessou a cidade e chegou na minha casa Fez-se ponto, estrela, buraco negro, Um absurdo ponto de interrogação. Busquei ouro Ele, monolítico. Pulsamos vida numa cozinha, numa casa qualquer, numa cidade qualquer no litoral do nordeste brasileiro. A cidade não nos existe No café que se perde servido na xícara, no queijo, nas duas taças de vinho, Numa dor sutil do lado esquerdo que nunca mais passou E impediu meu coração de ir mais longe Como os bichos que hibernam, os rios subterrâneos, algumas cigarras. Necessito tempestades e mar e sal para abrir frestas Ele, falésia. A tarde se vai imóvel, oca, parada, folhas caem, cães ladram, Livros, poemas, uma rede, uma música que não ouvimos. Naquele momento só queria o amargo café, o agridoce do vinho, Ou sua boca. Por me entender, me entendo triste, Um filete de água escorre na noite Tudo que não existia agora sou eu.

O que quero nesses dias (quase) mágicos e brancos?


Bússola. Olho de boi. Verão. Glamour de um filme antigo. Uma balada num vídeo-clip às cinco da tarde. Baby, você cheira goiaba e grama cortada e água de piscina. Helicóptero sobrevoando a manhã chuvosa. Coleções esquecidas no armário. Pratos de cerâmica. Mapa astral. Horóscopo no jornal. ‗Leões na praia de noite‘, Fitzgerald. Cinco camisetas coloridas penduradas no varal. Céu nublado. O asfalto da rua brilhando com a chuva da noite. Berinjelas no supermercado. Slow food. Escolher um livro. Uma cidade imaginária. Rota das emoções. Convalescença. Dias (quase) mágicos e brancos…


DILERCY ADLER SENTE O POEMA A Viriato Gaspar Sinto o poema poeta -sinto-o! em toda a sua dimensão e essência pura... sinto o poema - a sua tessitura o seu langor orgia e tortura-... o seu prazer eu sinto e pouco importa que eu goze ou não quando eu o tenha inteiro... em minhas mãos minh'alma ou na angústia eles estão a assombrar meus sonhos e os pesadelos afogados por soluços que são meus? às vezes me confundo se os versos teus me possuiram ou meus gemidos próprios e profanos num autofagismo insano me consome e eu consumo com voracidade toda a senteça que jaz na poesia! Sorvo o liquido sangue humano quente torturado e devolvo a seiva da beleza crua que a poesia engendra e encanta! Um poema nasce na alma dilacera o corpo e fica a flutuar na linha do horizonte num dia de sol quente e mente mente e mente... Ele - o poema - está na minha sala de visita e repousa na alcova onde regurgita


o prazer e a dor da alma aflita! Ele - o teu poema estรก em mim!


4 POEMAS DE FRANCISCO TRIBUZI Publicado em junho 20, 2018 por Carvalho Junior Francisco Tribuzi (São Luís/MA, 24 de janeiro de 1953). Poeta brasileiro. Autor do livro Verbo Verde (1978), também dos inéditos: Azulejado (poesia), Tempoema (poesia) e Sob a ponte (contos). Possui publicações em jornais, revistas e antologias, como Hora de Guarnicê, Poetas da Ponte, A Poesia Maranhense no Século XX (org. Assis Brasil) e Atual Poesia do Maranhão (org. Arlete Nogueira Machado). A produção literária de F.T. foi destacada em As Lâmpadas do Sol (ensaio de Carlos Cunha) e Um degrau (revista literária da UFMA). Filho do poeta Bandeira Tribuzi. Prepara uma publicação que reúne seus trabalhos inéditos. Domingo Existe um perfume de tristeza nas tardes de domingo. Um ar mórbido, Um silêncio de finados, O badalar dos sinos da igreja da São Pantaleão, acordando o segredo das coisas. Uma sensação de angústia, Um medo repentino, Como se a qualquer hora, por cima dos telhados, banhados pela chuva-lágrima(s) do tempo Uma rasga mortalha desaparecesse o dia.

Ausência Por esconderes tua boca Nos grilhões da noite, Quebrei meu beijo no mural de vidro E derramei paixão nas sarjetas do silêncio. Tu te mudaste ontem e já se vão mil luas… Que os lugares comuns parecem ruínas. Por esconderes tua boca Nos grilhões de vidro, Quebrei meu beijo no mural da noite.

o museu e a ponte Lá dentro guardam-se histórias… Aqui fora a ponte guarda em segredo os vultos que adentraram as glórias e as memórias dos gestos sem medo. De cada ângulo vista como que a jorrar passado


a ponte em si despista o conteúdo sonhado. E o que ela inspira: estética e formosura traduz o belo que delira em gesto e arquitetura.

Poema limitado para o poeta infinito (p/ Nauro Machado) A metamorfose da Praia-Grande transformada no que já era dilacera o cego vaga-lume luzindo a inexistente primavera Só ele vaga, soturno decifrando ruas, azulejos deglutindo indormidos desejos do delírio noturno Esta cidade que ele navega porto-verso-embriaguez malditamente o nega embora esteja no que o fez Parido poeta que rume auroras nascidas do vão poeta-profeta-perfume da flor solidão Amamos teu silêncio soluçante, digno: teu grito mudo teu verbo raro, brilhante teu poema é tudo o que nos resta de concreto para a festa do absoluto.


4 POEMAS DE BIOQUE MESITO Publicado em junho 23, 2018 por Carvalho Junior Bioque Mesito (São Luís/MA, 3 de fevereiro de 1972). Faz parte da Geração 90/transição da poesia maranhense, possuindo dois livros de poemas publicados: A inconstante órbita dos extremos (Editora Cone Sul-SP, 2001) e A anticópia dos placebos existenciais (Edfunc-MA, 2008). Prepara a publicação de A desordem das coisas naturais. Os poemas desta seleção foram extraídos do caderno/antologia Quibano: 15 poetas do Maranhão (org. Carvalho Junior e Antonio Aílton).

a doméstica casa das invenções particulares o tempo elege sempre uma vida para levar mas aprendi que não existe certeza antes corria dos trilhos incendiados para compreender a perda que imaginamos nem todo dia é para comemorarmos existe uma parada ela estava lá silenciosa há uma música que sempre ouço pela manhã faça chuva ou quando lembro de meu pai estão disfarçados os amantes que mandam flores sem meus valores não julgo ninguém meu filho acha engraçado eu dormir de pijama a vida é uma série de confusos movimentos escolhi o vazio dos lugares sem nomes para mutilar lembranças que nunca existiram

eternidade mínima estou cego e a coleção completa dos filmes de lars von trier ainda não assisti o gato que antes passeava pela minha imaginação agora só dorme no tapete entre todos estes combalidos anos não encontrei o lado b da vida que consiga me causar espantos ou a mulher de beijos estonteantes que me faça negar meus pedros estou cego e a felicidade é só mais um lúdico cartaz os fantasmas que nunca ousei encarar riem das minhas fotos de casamento


amigos me culpam pelo crasso silêncio mesmo a guerra não declarada do meu comportamento antissocial é capaz de compreender os carinhos extremos dos amantes da ponte neuf estou cego e cada vez mais os sorrisos recuam os amores não mais se reconhecem o absurdo sepulta em mim seu engano na incerteza cambaleante de continuar

violetas dançam no playground sete e meia da manhã um menino busca o pão a família o espera oito e vinte e cinco um carro o atropela doze e quinze a família fica sabendo dezesseis e trinta e sete o seu corpo é sepultado sete e meia da manhã do dia seguinte o pão aumenta uma família diminui

estuário poesia uma insatisfação pausa que pulsa por detrás do mundo lâmina de alta precisão contraventora de palavras fuga da minha imaginação destino que me alucina rupestre inscrição


incĂŞndio controlado em minhas mĂŁos


POR UMA ANTOLOGIA LUDOVICENSE Leopoldo Gil Dulcio Vaz (Organizador)


CAVALEIRO „SONETÁRIO DO QUIXOTE VENCEDOR‟, DE ROSSINI CORRÊA FERNANDO BRAGA

in Caderno Alternativo do Jornal O Estado do Maranhão, de 4 de novembro de 2015. Ilustração, a capa do livro ‘Sonetário do Quixote Vencedor’ e seu autor Rossini Corrêa.

Disse certa vez Dom Quixote a Sancho que contasse algum conto para entretê-lo, como teria prometido, ao que Sancho correspondeu que de boa vontade o fizera, se o modo do que estava ouvindo lho consentisse: - Mas enfim – disse ele – seja como for farei diligências para contar uma história. Dê-me Vossa Mercê toda atenção que já principio, a contar uma aventura sobre o próprio andante, mas como se fora ele, o leal escudeiro, Sancho Pança, que assim o via através de seus olhos de fiel servidor e acompanhante... Era uma vez... O que era; como atrás de tempos, tempos vêm... Era uma vez um cavaleiro poeta apaixonado não por Dulcinéia Del Toboso, mas por uma outra castelã, o que, não muito desigual ao da Triste Figura, assim começou, enamorado, um canto, a dizer ter perdido o destino: ―Vede: Sou um louco sonhador cretino, / a querer o mundo sem dor, mal e peste / - pobre Quixote que perdeu o destino...‖ E depois do caminho, distraído, perdeu Rocinante: ―E desenganado, sofre a dor angustiante / e vai trotando no vazio seco de um graveto / - pobre Quixote que perdeu Rocinante‖. Adiante, o poeta cavaleiro, perdeu o próprio caminho: ―Cruéis para mim foram os fados: / [tudo em mim foi dor ou desvario, / olhos postos na luz, e já vazados] / sempre morrer de calor dentro do frio‖. E desditoso, o cavaleiro poeta perdeu a fantasia: ―Sem uma gota de verdadeira poesia, /náufrago no pantanoso areal da Vida / - pobre Quixote que perdeu a fantasia...‖


E tempo há, dentro do tempo, que o cavaleiro poeta perde a amizade: ―Se querem saber: sou eu mesmo Sancho. / Ele é o outro de mim mesmo dispersado. / E, pela metade, eu agora me desmancho, / que um não pode ser o ser dilacerado.‖ Lá pelas páginas tantas, Sancho diz que o amigo perdeu o projeto / e sem planta baixa edificou a casa. / Mas, mesmo assim, arquitetou o teto / escondeu na alma um pedaço de asa.‖ Pobre Quixote – o herói de La Mancha, desta vez perde o melhor de seu, a vergonha: ―Mesmo que contra o homem tudo deponha, / inclusive, por ser este animal que bate, / tudo logo corrompe em que a mão ponha: / e infamando seu cão, cruel, ainda late...‖ Depois, agora, para melhor, ―Nobre Quixote perdeu a tristeza / e recuperou o horizonte da alegria. / Tirou o pombo da cartola da beleza /e na fileira do bem inventou o dia.‖ Neste momento, ele, Quixote, que também não é o andante da triste figura, mas o Cavaleiro poeta, da bela postura, apruma-se e canta uma Elegia dos Visionários: ―E Quixote, todo ancho, / colherá um verde lírio / e responderá: bom Sancho, / somos filhos do delírio.‖ E alguma musa, que não é Dulcineia e tampouco Aldonza, mas o pseudo amor dest‘outro Quixote, o poeta da bela figura, passa pelos moinhos de vento com o nome disfarçado de ―Mona Lisa... Infinita das minhas emoções‖, e a caminho, ―Infinita Mona Lisa das minhas quimeras...‖, e em serenata ―Infinita Mona Lisa da minha guitarra‖ [...] E os dois, cansados de tantas andanças, chegam à Santa Helena, onde Bonaparte amargou a sorte de grande soldado, para dizer, ele, o Quixote poeta e da bela alegria, não de La Mancha, mas de uma Ilha com o epíteto de ser ―dos amores‖, não aquela cantada por Camões e pintada por Malhoa, mas a de São Luís do Maranhão... Descobrimo-lo pelo coloquial do termo, que só naquela doce ilha é usado, e brada feliz: ―Como Bonaparte vão sonhando no caminho, / lambendo-se no cio à sombra de um vinho, / noivos chamando-se pequeno e pequena‖. Depois, o nosso herói que já se misturou com as histórias minha e de Sancho, chega à Ibéria, e canta sob o belo azul peninsular: ―Colorido dia de Espanha, / de Espanha e Portugal: / [este ouro que o azul apanha e transforma em mel e sal]‖. Este ouro não será o reflexo das areias do Tejo, visto pelos olhos de Sancho? Finalmente, o Quixote poeta e brilhante chega ao Quinto Encontro, ao lembrar-se talvez do Quinto Império, predito pelo Bandarra, sapateiro de tanto espanto: ―Nunca jamais se turvam/ mesmo a Lisboa do alto... Com uma vontade de salto, / Lisboa meu chão de nuvem‖. Por fim, lança esta sentença ao seu escudeiro: ―Hás de saber, Sancho amigo, que eu nasci por determinação do Céu nesta Idade de Ouro para ressuscitar bela a de ouro ou dourada. Eu sou aquele para os que estão dados os perigos, as grandes façanhas, os valorosos feitos...‖ E assim tem sido este cavaleiro, poeta e da brilhante figura, a transmitir bênçãos alegrias... E esperanças! *Nota de Rossini Corrêa: Este livro, ‗Sonetário do Quixote Vencedor‘, ―fora escrito entre o Cairo, no Egito e Valletta, em Malta. ―em nítida demonstração de que o verbo, o princípio, a energia, o espírito e a substância são universais, legando ao barro humano e ao bicho da terra destinos estrelares. Nascer é renascer a cada dia, sob o norte, a bússola e o signo prognóstico da reinvenção do humano a melhor, com um par de asas suplantando os pés de ferro, chumbo e concreto.‖]


AO MEU MESTRE SEBASTIÃO:

TAPERA-EVIRE NÃO!!! EUSSAUAP É O CORRETO!!!

Por Leopoldo Vaz • domingo, 05 de julho de 2015 às 17:35 http://cev.org.br/comunidade/maranhao/debate/ao-meu-mestre-sebastiao-tapera-evire-nao-eussauap-ocorreto/

Meu querido Mestre Sebastião, tenho em mãos, de Luiz F. F. Tavares o belissimo ―A ILHA E O TEMPO – séculos e vidas de São Luis do Maranhão 1612 – 2012―, premio IV Centenário de São Luis, do Instituto Geia. Publicado em 2012. Deparo-me, às páginas 35-36 com um erro do autor, que esperava não haver, dada a erudição e conhecimento da História do Maranhão da Comissão encarregada de avaliar as obras enviadas… Mas está lá: ―Mas nem tudo ocorrera perfeitamente bem. Na aldeia de Tapera-evire, um indio já centenário, Momboré-Uaçu, criaria um impasse aos franceses […]. Meu Mestre: esse episódio foi em Uçaguaba – antes, Miganville; depois Aldeia da Doutrina; e hoje conhecida como Vila de Vinhais, a Velha… VEJAMOS: Fundada a França Equinocial, a 8 de setembro de 1612, saíram a visitar a Ilha os lugares-tenentes de Daniel de La Touche, De Rasilly, o Barão de Sancy e os padres D‘ Abbeville e Arséne de Paris acompanhados de um antigo morador de Upaon-Açú, de nome David Migan. As aldeias do Maranhão tinha até quatro cabanas, medindo de 26 a 30 pés de largura por 200 a 500 pés de comprimento, segundo o número de pessoas que nelas habitavam. Algumas aldeias possuíam de 200 a 300 habitantes, outras de 500 a 600, e às vezes mais. As casas eram dispostas em forma de quadrado, havendo uma praça grande e bonita ao centro. Relata o padre Abbeville (1975): ―levaram-nos os índios, de canoa, até Eussauap, onde chegamos no sábado seguinte ao meio-dia. O Sr. de Pizieux e os franceses que com ele aí residiam receberam-nos com grande carinho‖. O Padre Claude D‘Abbeville foi quem primeiro escreveu sobre o Maranhão e seus habitantes. Pela sua descrição, a aldeia de índios localizada no hoje Vinhais foi o primeiro núcleo residencial dos brancos que se estabeleceram no Maranhão. No Forte – a hoje cidade de São Luís – ficava apenas uma guarnição de oito soldados, a vigiar. Os demais, habitavam as aldeias então existentes. A primeira a ser ocupada, foi Eussauap. Segundo Capistrano de ABREU , ―EUSSAUAP – nom do lieu, c‘est à dire le lieu ori on mange les Crabes‖. – Bettendorf leu em Laet Onça ou Cap, que supôs Onçaquaba ou Oçaguapi; mas tanto na edição francesa, como na latina daquele autor, o que se lê, é EUSS-OUAP. Na história da Companhia de Jesus na extinta Província do Maranhão e Pará, do Padre José de Morais, está Uçagoaba, que com melhor ortografia é Uçaguaba composto de uçá, nome genérico do caranguejo, e guaba, particípio de u comer: o que, ou ―onde se come caranguejos‖. (D‘ ABEVILLE, 1975). Das 27 aldeias existentes na Ilha, 14 tinham apenas um Principal; 10 possuíam dois; 1 possuía três. Eussauap possuía quatro, sendo uma das maiores aldeias da ilha e nela existiam quatro principais: Tatu-Açu;


Cora-Uaçu ou Sola-Uaçu, às vezes também Maari-Uaçu; Taiaçu e Tapire-Evire‖. – Junipar, a aldeia principal da ilha, contava com cinco principais. É em Eussauap que os franceses encontram uma certa resistência, por parte de um velho de mais de 180 anos e que tinha por nome Mamboré-Uaçu e que havia assistido ao estabelecimento dos portugueses em Pernambuco. Afirmava que, como os perós, os franceses chegavam para comerciar, não passando mais do que 4 a 6 luas, tempo suficiente para reunir as drogas que traficavam. Tomavam suas filhas para mulher e isto muito os alegrava. Mais tarde afirmavam que havia necessidade de construção de fortes, para defesa sua e dos índios, e então chegavam os Paí – padres – plantando cruzes, instruindo os índios e os batizando. Exigem que as índias sejam batizadas, para só então as tomarem como esposas. Aí, dizem precisar de escravos para os servirem. E tomam os índios como seus escravos. Convencido o velho guerreiro que os franceses eram diferentes dos perós, prosseguem De Rasilly, o Sr. de Sancy e D‘ Abbeville a sua visitação. Os moradores de Eussauap tinham esperança que um dos padre aí se fixasse. Por isso haviam edificado no meio da praça, localizada entre as cabanas, uma bonita capela com um altar bem arranjado. Além da capela construíram uma grande cruz. No domingo, dia 20 de outubro de 1612, foi a capela batizada e rezada a missa. A Eussauap de D‘ Abbeville (1612) é chamada de Uçagoaba pelos padres Manoel Gomes e Diogo Nunes (1615) e, a partir de 1622, recebe o nome de Aldeia da Doutrina dos padres Luís Figueira e Benedito Amodei. Em 1º. de agosto de 1757, a Aldeia da Doutrina, sob a invocação de São João dos Poções, foi elevada à categoria de vila com a denominação de Vinhais, sendo criada nesse mesmo dia a freguesia de São João Batista dos Vinhais, em virtude de Resolução Régia de 13 de junho de 1757. Mas vamos a outro trecho, de outro artigo que escrevi, sobre esse assunto – afinal tem anos que pesquiso a História do bairro onde moro, e venho publicando esses escritos, em vários meios, dedicados à História, especialmente na Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão: Vamos nos concentrar em Vinhais e em São Luis. É sabido que onde se localiza a hoje Vila Velha de Vinhais – ou Vinhais Velho, como queiram – havia um grande aldeamento indígena, quando da chegada dos franceses, Tupinambá. Era conhecida como Uçaguaba: ―EUSSAUAP – nom do lieu, c‘est à dire le lieu ori on mange les Crabes. – Bettendorf leu em Laet Onça ou Cap, que supôs Onçaquaba ou Oçaguapi; mas tanto na ediço francesa, como na latina daquele autor, o que se lê, é EUSS-OUAP. Na história da Companhia de Jesus na extinta Província do Maranhão e Pará, do Padre José de Morais, está Uçagoaba, que com melhor ortografia é Uçaguaba composto de uça, nome genérico do caranguejo, e guaba, participio de u comer: o que, ou onde se come caraguejos, conforme com a definição do texto …‖. ( apud D‘ ABEVILLE, 1975, p.107)[1].

Uçaguaba recebe a partir de 1594 o navegador Frances Jacques Riffault, estabalecendo ali uma feitoria: MiganVille. Jacques Riffault, personagem constante em nossa história, contava com o auxilio de seus compatriotas Charles D‘Estenou – Senhor de Des-Vaux, cavalheiro do Condado de Tomaine, e de Davi Migan, natural de Vienne, no Delfinado. Ambos haviam conquistado a amizade dos silvícolas, e tinham o domínio da língua nativa. Vamos encontrar Jacques Riffault na hoje Alcântara, cuja ocupação remonta a um primitivo aldeamento dos Tapuias, conquistado pelos Tupinambás e denominado ―Tapuitapera‖ (―casa dos Tapuias‖) à época de sua chegada. Estabelecidas relações amistosas entre os dois povos, esta aldeia teria fornecido de trezentos a quatrocentos trabalhadores para a fortificação do nascente núcleo colonial na ilha Grande, depois ilha de São Luís, após a chegada de Daniel de La Touche, senhor de La Ravardière (1612). Dentre outros franceses, frequentava a Ilha Grande o Capitão Guérard, que em 1596 armou dois navios, sendo um deles para o Maranhão – o Poste chegou ao Camocim – estabelecendo com regularidade as visitas à terra de corsários de Dieppe, de La Rochelle e de Saint Malo. É nesse ano que o Ministro Signeley toma como ponto de partida dos direitos da França nesta região, funcionando como uma linha regular de navegação entre Dieppe e a costa leste do Amazonas. Datado de 26 de julho de 1603 há um arresto do tenente do Almirantado em Dieppe relativo a mercadorias trazidas do Maranhão, ilha do Brasil, pelo Capitão


Guérard. Meireles (1982, p. 34) traz também Du Manoir em Jeviré; Millard e Moisset, também encontrados na Ilha Grande. Os comandados de Du Manoir e Guérard chegam a quatrocentos; dois religiosos da Companhia de Jesus haviam estado no Norte do Brasil. Henrique IV, de França, concede a René-Marie de Mont-Barrot, Carta Patente datada de 8 de maio de 1602, autorizando-o a arregimentar 400 homens e fundar uma colônia no norte do Brasil; se associa a Daniel de La Touche, transferindo-lhe a empreitada. O Senhor de la Ravardière com o navegador Jean Mocquet parte a 12 de janeiro de 1604 com dois navios, chegando as costas da Guiana (Oiapoque) a 8 de abril, retornando àquele porto a 15 de agosto. Ante a desistência de Mont-Barrot, o monarca francês, por Carta Patente de 6 de julho de 1605 nomeia La Ravardière seu Lugar-tenente e vice-almirante nas costas do Brasil. A primeira concessão a Daniel de La Touche, data do mês de julho: ―Luis, a todos os que virem a presente. Saúde.O defunto rei Henrique, o Grande, nosso muito honrado senhor e pai […] tendo por cartas patentes de julho de 1605 constituído e estabelecido o Sr. De Ravardiére de La Touche seu lugar-tenente na América, desde o rio do Amazonas até a ilha da Trindade. Segundo o sócio do IHGM Antonio Noberto, é confirma a presença de franceses pelo Padre Luis Figueira, em sua Relação do Maranhão (de 1608): ―Mandamos recado a outra aldea para sabermos se nos quirião la e q‘ viessem alguns a falar cõ nosco, e tãbem nos queriamos emformar dos q‘ tinhão vindo do maranhão q‘ la estavão principalmente acequa dos frãcesez que tinhamos por novas que estavão la de assento com duas fortalezas feitas em duas ilhas na boca do rio maranhão‖. Em 1607 – ou 1609 – Carlos Des-Vaux retorna à França cansado de esperar por Riffault, e é recebido por Henrique IV. Ainda em 1609, Daniel de LaTouche e Charles Des-Vaux visitam o Maranhão. De LaTouche certifica-se de que as informações sobre a terra eram verdadeiras e pede licença ao rei para explorá-la. Mas com o assassinato de Henrique IV, sucede-lhe ao trono Luis XIII, ainda menor, governando em seu nome Maria de Medicis. É esta quem concede licença à Daniel de La Touche, Senhor de La Ravardiére, de formar uma companhia para explorar as ―terras‖ de Riffault: ―[…] e havendo ele feito duas viagens às Índias para descobrir as enseadas e rios próprios para o desembarque e estabelecimento de colônias, no que seria bem sucedido, pois apenas chegou nesse país soube predispor os habitantes das ilhas do Maranhão e terra firme, os tupinambás e tabajaras, e outros, a procurarem nossa proteção e sujeitarem-se à nossa autoridade, tanto por seu generoso e prudente procedimento […] de lhe fazer expedir nossas cartas patentes de outubro de 1610 para regressar, como Chefe, ao dito país, continuar seus progressos, como teria feito e aí demorar-se-ia dois anos e meio com os portugueses.‖, em paz e 18 meses tanto em guerra como em tréguas‖. […]

O historiador Antonio Noberto continua: Segundo, tanto comércio fez com bretões e normandos se estabelecessem com feitorias na Ilha Grande, e um desses lugares era a aldeia de Uçaguaba/Miganville (atual Vinhais Velho), misto de aldeia e povoação europeia. Terceiro, o porto usado nessas atividades era o de Jeviré (Ponta d‘Areia)‖. Para Noberto, é quase inimaginável que todo esse aparato comercial existisse sem uma forte proteção das armas. Some-se que o chefe maior de tudo isso era David Mingan, o Minguão, o ―chefe dos negros‖ (daí o nome de Miganville), que tinha a seu dispor cerca de 20 mil índios e era ―parente do governador de Dieppe‖. Por fim, a localização da fortaleza está exatamente no lugar certo de proteção do Porto de Jeviré e da entrada do rio Maiove (Anil), que protegeria Miganville. Pianzola, em sua obra ―OS PAPAGAIOS AMERELOS – os franceses na conquista do Brasil (1968, p. 34) apresenta decalque de mapa datado de 1627, cujo original desapareceu, feito em torno de 1615 pelo português João Teixeira Albernaz, cosmógrafo de sua Magestade, certamente feito a partir daquele que LaRavardiére deu ao Sargento- Mor Diogo de Campos Moreno durante a trégua de 1614. O autor chama atenção para os nomes constantes dos mapas, entre os quais muitos de origem francesa, ‗traduzidos‘ para o português. Vê-se, na Grande Ilha dentre outros, Migao-Ville, propriedade do intérprete de Dieppe, David Migan, seguramente um pseudônimo, no entender de Pianzola: ―[…] No último quartel daquele século, o que era apenas um posto de comércio, sem maior raiz, tornouse morada definitiva dos corsários gauleses, vindos de Dieppe, Saint-Malo, Havre de Grace e Rouen, que


aqui deixavam seus trouchements (tradutores) que viviam simbioticamente com os tupinambá (escreve-se sem ―s‖ mesmo). Entre estes estava David Migan, o principal líder francês desta época. Ele era o ―chefe dos negros‖ (índios) e ―parente do governador de Dieppe‖. Tinha a seu dispor cerca de vinte mil guerreiros silvícolas e residia na poderosa aldeia de Uçaguaba (atual Vinhais Velho), apelidada de Miganville[…].(NOBERTO SILVA, 2011). Fonte: PIANZOLA, 1968, p. 34

Continuemos com Noberto Silva (2011): ―[…] Na virada do século, segundo o padre e cronista Luis Figueira, que escreveu sua penosa saga na Serra de Ibiapaba, os franceses no Maranhão contavam, inclusive, com ―duas fortalezas na boca de duas grandes ilhas‖. Uma destas fortificações, por certo, era o Forte do Sardinha, localizado no atual bairro Ilhinha, nos fundos do bairro Basa em São Luís. Esta, em mãos portuguesas, foi nomeada de Quartel de São Francisco, que deu nome ao bairro. Servia de proteção ao lugar, em especial, a Uçaguaba, reduto de Migan‖. Quando da implantação da França Equinocial esse complexo passou para mãos oficiais. Uçaguaba/Miganville passou a ser chamada pelos cronistas Claude Abbeville e Yves d‘Evreux de ―o sítio Pineau‖ em razão de Louis de Pèzieux, primo do Rei, ter adotado o local como moradia. Vejamos outro artigo, também publicado: […] O Vinhais Velho de hoje já recebeu diversas denominações: Uçaguaba, MiganVille, Sítio de ―Monsier Pineau‖; Aldeia da Doutrina, São João dos Poções, Vila Nova de Vinhais; já foi habitada por índios e por europeus; e sua História tem já mais de 400 anos: sua ocupação por europeus precede à fundação de São Luís. A ideia, da Comissão dos 400 anos da Igreja de São João Batista, é contar essa História em sete passos, informações relevantes sobre a constituição dessa Comunidade.

PASSO 1 – ESTA TERRA TINHA DONO: OS TREMEMBÉ E DEPOIS OS TUPINAMBÁ – OS PRIMITIVOS HABITANTES

O Maranhão é território de uma rica história de intercâmbio e conflítos entre os povos indígenas nativos e europeus – franceses, holandeses, ingleses, espanhóis e portugueses. No século XVII, a populaçõa indígena do Maranhão era formada por aproximadamente 250.000 pessoas, pertencente a cerca de 30 etnias, a maioria delas, hoje, não existindo mais. Antes dos Tupinambás, os Tremembé, havendo indícios de ocupação pelo menos de seis a nove mil anos. Os Tremembé, originalmente nômades, viviam num território que se estendia nas praias entre Fortaleza e São Luís do Maranhão. Com a invasão dos Tupis-Guaranis perderam a Ilha de São Luis e seus arredores. Foram aldeados pelos Jesuítas no século XVII nas missões de Tutoya. Os primitivos habitantes da Ilha Grande – Upaon-Açú – foram, primeiro, os TREMEMBÉ e depois os TUPINAMBÁ; esses habitavam a Aldeia de Uçaguaba.

PASSO 2 – UÇAGUABA Servimo-nos de Claude d´Abbeville para identificar UÇAGUABA. Diz aquele missionário capuchinho que aqui chegando a ‗missão‘ de LaRavardiére, os franceses atravessam o braço de mar, indo se fixar em um promontório onde, a 12 de agosto, uma sexta-feira, dia consagrado a Santa Clara, celebram o santo ofício da missa. A 8 de setembro, uma quarta-feira, dia consagrado à Santíssima e Imaculada Virgem Maria, é realizada a solenidade de fundação da Colonia.


Fundada a França Equinocial, sairam De Rasilly, o Barão de Sancy e os padres D‘ Abbeville e Arséne de Paris acompanhados de um antigo morador de Upapon-Açú, de nome David Migan, a visitar as aldeias da Ilha: ―(…) levaram-nos os índios, de canoa, até Eussauap, onde chegamos no sábado seguinte ao meio-dia. O sr. de Pizieux e os franceses que com ele aí residiam receberam-nos com grande carinho (…)‖. (D‘ABBEVILLE, 1975, p. 114) . (grifos nossos). Capistrano de ABREU esclarece que: ‖ EUSSAUAP – nom do lieu, c‘est à dire le lieu ori on mange les Crabes. – Bettendorf leu em Laet Onça ou Cap, que supôs Onçaquaba ou Oçaguapi; mas tanto na ediço francesa, como na latina daquele autor, o que se lê, é EUSS-OUAP. Na história da Companhia de Jesus na extinta Província do Maranhão e Pará, do Padre José de Morais, está Uçagoaba, que com melhor ortografia é Uçaguaba composto de uça, nome genérico do caranguejo, e guaba, participio de u comer: o que, ou onde se come caraguejos, conforme com a definição do texto …‖. ( apud D‘ ABEVILLE, 1975, p.107).

Das 27 aldeias existentes na Ilha, 14 tinham apenas um Principal; 10 possuiam dois; 1 possuia três. Eussauap possuia quatro – ―… é uma das maiores aldeias da ilha e nela existem quatro principais: Tatu-Açu; Cora-Uaçu ou SolaUaçu, às vezes também Maari-Uaçu; Taiacú e Tapire-Evire‖.

É em Eussauap que os franceses encontram uma certa resistência, por parte de um velho ―… de mais de 180 anos e que tinha por nome Mamboré-Uaçu …‖ e que havia assistido ao estabelecimento dos portugueses em Pernambuco, 80 anos antes (cerca de 1835). Mas Uçaguaba – como vimos significando como ―TERRA ONDE SE COME CARANGUEIJOS‘, segundo nossos primeiros cronistas – D´Abbeville e D´Evreux – desde a última década dos anos 1500 já fora ocupada por europeus, de viersos Estados, e por iniciativa de franceses. Estamos falando de MIGANVILLE

Passo 3 – DE MIGANVILLE A sítio Pineau – A CHEGADA DOS FRANCESES Miganville, de Davi Migan, natural de Vienne, no Delfinado. A Vila Velha de Vinhais é o núcleo habitacional mais antigo do Maranhão. Referimo-nos à ocupação por brancos, pois os Tupinambás ocupam aquele espaço há mais tempo, provavelmente desde 80 anos antes da chegada dos Franceses de La Ravardiére. Se estabeleceram aqui entre 1535 1560/70. Jacques Riffault, personagem constante em nossa história, desde 1594 se estabelecera em Upaon-açu (Ilha de São Luís) com uma feitoria, contando com o auxilio de seus compatriotas Charles D‘Estenou – Senhor de Des-Vaux, cavalheiro do Condado de Tomaine, e de Davi Migan, natural de Vienne, no Delfinado. Ambos haviam conquistado a amizade dos silvícolas, e tinham o domínio da língua nativa. Frequentava a Ilha Grande o Capitão Guérard, que em 1596 armou dois navios, sendo um deles para o Maranhão – Poste, chegou ao Camocim – estabelecendo com regularidade as visitas à terra de corsários de Dieppe, de La Rochelle e de Saint Malo, funcionando desde então uma linha regular de navegação entre Dieppe e a costa leste do Amazonas. Datado de 26 de julho de 1603 há um arresto do tenente do Almirantado em Dieppe relativo a mercadorias trazidas do Maranhão, ilha do Brasil, pelo Capitão Guérard. Meireles (1982, p. 34) traz também Du Manoir em Jeviré; Millard e Moisset, também encontrados na Ilha Grande. Os comandados de Du Manoir e Guérard chegam a quatrocentos; há esse tempo já dois religiosos da Companhia de Jesus haviam estado no Norte do Brasil. O historiador Antonio Noberto continua: tanto comércio fez com que bretões e normandos se estabelecessem com feitorias na Ilha Grande, e um desses lugares era a aldeia de Uçaguaba/Miganville


(atual Vinhais Velho), misto de aldeia e povoação europeia. Terceiro, o porto usado nessas atividades era o de Jeviré (Ponta d‘Areia). Some-se que o chefe maior de tudo isso era David Mingan, o Minguão, o ―chefe dos negros‖ (daí o nome de Miganville), que tinha a seu dispor cerca de 20 mil índios e era ―parente do governador de Dieppe‖. Por fim, a localização da fortaleza está exatamente no lugar certo de proteção do Porto de Jeviré e da entrada do rio Maiove (Anil), que protegeria Miganville. Pianzola, em sua obra ―OS PAPAGAIOS AMERELOS – os franceses na conquista do Brasil (1968, p. 34) chama atenção para os nomes constantes dos mapas, entre os quais muitos de origem francesa, ‗traduzidos‘ para o português. Vê-se, na Grande Ilha dentre outros, Migao-Ville, propriedade do intérprete de Dieppe, David Migan, seguramente um psudônimo, no entender de Pianzola: ―[…] No último quartel daquele século, o que era apenas um posto de comércio, sem maior raiz, tornouse morada definitiva dos corsários gauleses, vindos de Dieppe, Saint-Malo, Havre de Grace e Rouen, que aqui deixavam seus trouchements (tradutores) que viviam simbioticamente com os tupinambá (escreve-se sem ―s‖ mesmo). Entre estes estava David Migan, o principal líder francês desta época. Ele era o ―chefe dos negros‖ (índios) e ―parente do governador de Dieppe‖. Tinha a seu dispor cerca de vinte mil guerreiros silvícolas e residia na poderosa aldeia de Uçaguaba (atual Vinhais Velho), apelidada de Miganville […]‖. (NOBERTO SILVA, 2011).

Continuemos com Noberto Silva (2011): ―[…] Na virada do século, segundo o padre e cronista Luis Figueira, que escreveu sua penosa saga na Serra de Ibiapaba, os franceses no Maranhão contavam, inclusive, com ‗duas fortalezas na boca de duas grandes ilhas‘. Uma destas fortificações, por certo, era o Forte do Sardinha, localizado no atual bairro Ilhinha, nos fundos do bairro Basa em São Luís. Esta, em mãos portuguesas, foi nomeada de Quartel de São Francisco, que deu nome ao bairro. Servia de proteção ao lugar, em especial, a Uçaguaba, reduto de Migan‖.

Quando da implantação da França Equinocial esse complexo passou para mãos oficiais. Uçaguaba/Miganville passou a ser chamada pelos cronistas Claude Abbeville e Yves d‘Evreux de ―o sítio Pineau‖ em razão de Louis de Pèzieux, primo do Rei, ter adotado o local como moradia. Du Manoir, Riffault, Des-Vaux e os piratas de Dieppe, encontravam-se fundeados no porto, confirmam a presença continuada dos exploradores de todas as procedências nas costas do Maranhão, e do Norte em geral: uma companhia holandesa presidida pelo burgomestre de Flessingue, ingleses, holandeses e espanhóis negociando com os índios o pau-brasil; armadores de Honfleur e Dieppe; o Duque de Buckigham e o conde de Pembroke e mais 52 associados fundaram uma empresa para explorar o Brasil; espanhóis de Palos.

PASSO 4 – A ALDEIA DA DOUTRINA Os moradores de Eussauap tinham esperança que um dos padre aí se fixasse. Por isso ―haviam edificado no meio da praça, localizada entre as cabanas, uma bonita capela com um altar bem arranjado‖. Além da capela construiram uma grande cruz. No domingo, dia 20 de outubro de 1612, foi a capela batizada e rezada a missa. Vencidos os franceses em Guaxenduba (19/11/1614), os portugueses se estabelecem no Maranhão, vindo com Jeronimo de Albuquerque os padres Manuel Gomes e Diogo Nunes, aqui permanecendo estes até 1618 ou 1619: ―A primeira missão ou residência, que fundaram mais junto à cidade para comodidade dos moradores, foi a que deram o nome de Uçagoaba, onde com os da ilha aldearam os índios que haviam trazido de Pernambuco …‖. (MORAES, 1987, p.58).


A residência dos jesuitas em Uçagoaba é ocupada com a chegada da segunda turma de jesuitas ao Maranhão, os padres Luis de Figueira e Benedito Amodei. De acordo com CAVALCANTI FILHO (1990) a missão jesuitica no Maranhão inicia-se com a chegada dos padres Figueira e Amodei: ―… Ao que tudo indica, a aldeia de Uçaguaba, situada a margem esquerda do igarapé do mesmo nome, teria sido o ponto de partida dessa missão … desta primeira, denominada ‗Aldeia da Doutrina'‖.(p. 31).

MEIRELES (1964), conta-nos que o bem-aventurado Gabriel Malagrida – a quem César Marques chamou de ―o desgraçado apóstolo do Maranhão‖ – costumava logo pela manhã percorrer as ruas da pequenina cidade de não mais de uma meia dúzia de milhares de habitantes, a convocá-los, com a campainha que ia fazendo tilintar, para a Santa Missa e o exercício do catecismo. E lá voltava ele, cheio de alegre beatitude, acompanhado de um bando irriquieto de meninos que o seguia até o Colégio. Depois, o confessionário e a visita aos enfermos e aos presos, consumia-lhe o resto do dia, pela tarde afóra; À noite, retornava à aldeida da doutrina, como comumente então a povoação de São João dos Poções, antiga Uçagoiaba e hoje Vinhais, sede da primeira missão dos inacianos na Ilha-Grande fora conhecida… Cesar MARQUES (1970), em seu Dicionário Histórico-Geográfico da Província do Maranhão, publicado em 1870, informa sobre Vinhais – freguesia e ribeiro, que os jesuítas Manoel Gomes e Diogo Nunes, que vieram junto com a armada de Alexandre de Moura, principiaram a estabelecer residências – ou missões de índios -, sendo a primeira que fundaram: ―… foi a que deram o nome de Uçaguaba, onde com os da ilha da capital aldearam os índios, que tinham trazido de Permambuco, e como esta se houvesse de ser a norma das mais aldeias, diz o Padre José de Morais, nela estabelecessem todos os costumes , que pudessem servir de exemplo aos vizinhos e de edificações aos estranhos. Cremos que por êste fim especial foi chamada aldeia da Doutrina. ―Fundada pelos jesuítas, parece-nos haver depois passado ao poder do Senado da Câmara, porque ele tinha uma aldia ‗cujo sítio era bem perto da cidade‘. Compunha-se de 25 a 30 índios entre homens e mulheres ‗para poderem acudir às obras públicas pagando-se-lhes o seu jornal‘. ―Em 12 de maio de 1698 a Câmara pediu ao soberano um missionário para educá-los. Em 22 desse mesmo mês representou à Sua Majestade queixando-se por ter sido privada desta aldeia ‗por algumas informações más e apaixonadas‘. … foi no dia 1o. de agosto de 1757 elevada à categoria de vila com a denominação de Vinhais‖. (p. 632-633).

PASSO 5 – VILA DE VINHAIS COELHO (1990) em seu ―Política indigenista no Maranhão Provincial‖, ao analisar ―o lugar do índio na legislação: a questão da terra‖, afirma que ‖ a situação das terras dos indigenas é caracterizada por um acúmulo de esbulhos e usurpações‖ e o processo oficial do sequestro dessas terras se dá pela ação de Pombal, que prescreveu, em 1757, a ‖ elevação das aldeias indígenas, onde haviam missões, à categoria de vila ou lugar, de acordo com o número de habitantes‖. Cita, dentre outros exemplos, que ‖ a aldeia da Doutrina, em 1º de agosto de 1757, foi elevada à categoria de vila, com o nome de Vinhais‖. Pois bem, a antiga Aldeia da Doutrina é elevada à categoria de vila em 1o. de agosto de 1757 com a denominação de Vinhais – Vila Nova de Vinhais – a nossa hoje Vila Velha de Vinhais. Era comum darem-se nomes às vilas e cidades do Maranhão o mesmo nome de vilas e cidades existentes em Portugal. Vinhais é uma vila portuguesa, pertencente ao Distrito de Bragança, Região Norte e subregião do Alto Trás-os-Montes, limitado a norte e oeste pela Espanha, a leste pelo município de Bragança, a sul por Macedo de Cavaleiros e Mirandela e a oeste por Valpaços e Chaves. A ocupação humana deste território data de tempos ancestrais, tal como se pode verificar pelos inúmeros vestígios arqueológicos que se podem encontrar nesta região: inscrições rupestres, edificações de tipo dolménico e fortificações castrejas. O hoje bairro de São Luís, Vinhais Velho – ou Vila Velha de Vinhais como também é conhecido – já foi independente; isto é, se constituiu, no dizer de hoje, em município. Durante o consulado pombalino (1755-


1777), um ano depois da tentativa de regicídio a D. José, o Marques de Pombal expulsou os jesuítas da metrópole e das colónias (Setembro 1759), confiscando seus bens, sob a alegação de que a Companhia de Jesus agia como um poder autônomo dentro do Estado português e as suas ligações internacionais eram um entrave ao fortalecimento do poder régio. Em 1º de agosto de 1757, a Aldeia da Doutrina, sob a invocação de São João dos Poções, foi elevada à categoria de Vila com a denominação de Vinhais, sendo criada nesse mesmo dia a freguesia de São João Batista de Vinhais, em virtude de Resolução Régia de 13 de junho de 1757. No ano de 1779, a Vila de Vinhais contava 630 ‗almas‖; a cidade de São Luís, 13.000, a Vila do Paço do Lumiar 808, conforme regidstro na Biblioteca da Ajuda. Notícias de todos os governadores e populações das provincias do Brasil. Documento no. 2001 (54 – v. 12 no. 5). De acordo com BARBOSA DE GODOIS (1904), o colégio dos jesuítas no Maranhão, ―segundo os Annaes Litterarios, contava estas residências: Conceição da Virgem Maria, em Pinheiros; S. José, na aldeia de S. José de Riba-Mar; S. João Baptista, em Vinhais; S. Miguel, no Rosário. Buscamos uma vez mais em Cesar MARQUES (1970) outras informações, agora sobre a Igreja do Vinhais: ―Pertenceu então a outro donatário porque descobrimos termos da junta das missões de 13 de abril de 1757, que passou para o domínio dos frades da Ordem de Santo Antonio, sem podermos contudo dizer como se efetuou esta mudança, e então se chamou aldeia de São João dos Poções.[…] [1o. de agosto de 1757 em que a Aldeia da Doutrina foi elevada à categoria de vila com a denominação de Vinhais] foi criada a freguesia em virtude de Resolução Régia de 13 de junho de 1757, sendo o seu primeiro pároco encomendado o beneficiado Antôno Felipe Ribeiro‖. […] ―Em 5 de maio de 1829 a Câmara ‗pediu ao Presidente a construção de uma igreja, por ter desabado a que havia, de uma cadeia, que era um quarto por baixo da casa da Câmara, porque tendo caído o templo de que o quarto fazia parte, ficou ele arreuinadíssimo, e de uma casa da Câmara porque a existente estava com os sobrados despregados e com faltas‘. ―. (p. 632-633).

Ainda às págiasm 632 do referido Dicionário …, César Marques informa que no referido têrmo – ao passar a freguesia para a Ordem de Santo Antônio, com o nome de São João dos Poções, em 13 de abril de 1757 -, achavam-se em palácio, reunidos, o Governador da Capitania, Gonálo Pereira Lobato e Sousa, o Governador do Bispado, Dr. João Rodrigues Covete, e o Desembargador Ouvidor-Geral Diogo da Costa e Silva, o Desembargador Juiz-de-Fora Gaspar Gonçalves dos Reis, e os reverendos prelados das regiões, mandava o Governador ler o têrmo da junta, feito na cidade de Belém do Grão-Pará em 10 de fevereiro de 1757: ―Depois disso perguntou o governador do bispado o que respondiam suas paternidades ao proposto, determinado e resolvido no dito têrmo, devendo-se praticar neste bispado o que se praticou e resolveu no Grão-Pará‖. ―O padre provincial do Carmo, Frei Pedro da Natividade, e o padre comendador do Convento de N. S. das Mercês, Frei Bernardo Rodrigues Silva, não fizeram a menor objeçào, e declaram concordar com o que se tinha feito no Pará. ―O padre-mestre, Frei Matias de Santo Antônio, por impedimento do guardião do Convento de S. Antônio, que então era Frei Miguel do Nascimento, respondeu que não tinha dúvida que se observasse o mesmo, com a declaração porém que neste bispado não havia missões algumas para observância do sobredito, e que só o seu convento tinha uma doutrina do serviço dele, a qual estava situada em terras doadas ao mesmo convento, aceitas pelo Sindico dele por títulos onerosos de compra e venda, e obrigação de missas anuais, e por isso tinham entrado no seu domínio por muitas bulas, e especialemnete pelas do papa Nicolau IV, ficando assim excluída da ordem de Sua Magestade. ―No têrmo da junta de 18 de junho do mesmo ano (1757), declarou o dito governador, que havendo dado conta do ocorrido na sessão da Junta de 13 de abril ao capitão-General do Estado Francisco Xavier de Mendonça Furtado (irmão do Marques de Pombal) do requerimento do guardião do Convento de Santo Antônio a respeito da sua aldeia chamada da Doutrina, fora por ele julgada em oposição à devida observancia da ordem de Sua Majestade de 7 de junho de 1755, que com força de lei mandou publicar nesta cidade.


―Em virtude de tudo isto foi no dia 1 de agôsto de 1757 elevada à categoria de vila com a demonimação de Vinhais. ―Acharam-se presentes a este ato o Governador da Capitania, dr. Bernardo Bequimão por comissão do governador do Bispado, o diretor Alferes Manuel de Farias Ribeiro, os Sargentos Manuel José de Abreu e Carlos Luis Soares, o povo do dito lugar e mais aldeias. ―Fêz entrega das terras da vila, o que únicmente possuía esta aldeia, o Padre Frei Bento de Santa Rosa, religioso de Santo Antônio e aí missionário com a administração temporal.‖ (p. 632-633)

[1] ABBEVILLE, Claude d‘. HISTÓRIA DA MISSÃO DOS PADRES CAPUCHINHOS NA ILHA DO MARANHÃO E TERRAS CIRCUNVIZINHAS. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: USP, 1975


NOTAS SOBRE O TERNO [A poesia de Daniel Blume no livro Resposta ao Terno] ANTONIO AÍLTON Poeta, Doutor em Teoria da Literatura Cadeira 22 da ALL

Resposta ao Terno (Belas Artes, 2018) talvez seja, até agora, o livro mais ousado do poeta Daniel Blume. Seus livros anteriores, Inicial e Penal, não respondem a igual volume de referências, a explícitos campos da realidade que determinam a própria estrutura do livro (resposta ao tempo, resposta à cultura, resposta à história, reposta à política, resposta ao amor, resposta à poesia), e, de forma geral, expressam-se em uma forma mais epigramática, do poema-síntese, agudo e reflexivo. Em Resposta ao Terno, a despeito da forma concisa, incisiva, com a qual Daniel Blume apresenta sua poética, os poemas se distendem um pouco mais e desdobram em menor tensão o seu fenômeno – intensificando, por outro lado, uma ternura sobre a vida. Antes de ler o livro, a primeira expectativa que me ocorreu foi a de que se trataria de uma "resposta", uma contraposição poética à semântica que o terno – o vestir formal, burocrático e não raro legalista, impositivo – representa. Quanto mais que se trata do livro de um poeta que vem, profissionalmente, de altos cargos do mundo jurídico. Isto se tornaria o quase óbvio. Sendo a poesia uma condensação, potenciação e provocação de sentidos, dentro de um pacto com a palavra, a leitura e o título do livro não descartam aquela possibilidade suspeitada, por via de um discurso poético no qual a dureza e o formalismo do terno dão lugar às vivências, aos lugares e temporalidades pessoais, ao investimento existencial, aos acontecimentos e às coisas mínimas, mundanais, à efetividade e à memória, que de fato esboroam a imagem engomada. No entanto, o poeta aprofunda mais a questão no sentido de expandir o campo sensível da ternura, por meio da voz afetiva que, na verdade, não apenas sugere respostas, mas também interroga o mundo, em suas múltiplas dimensões. Assim, é verdade que busca propor uma resposta sobretudo ao mundo rígido e essencializante por meio da sensibilidade mundanal, da simplicidade, por vezes anódina, e do viver diário, da experiência, das afetividades humanas, das expectativas e desejos que se tornam poesia, como em Pará: Sei não mais estarmos na via Condotti, mas, se para Rubem Alves, “ler é fazer amor com as palavras”, preciso reler-te na Rua Pará. Ou na colheita como resposta ao tempo, por via da perspectiva/expectativa gerada e que gera (Perplexo): Tempo de colheita gera perspectiva, não perplexidade. Por outro lado, lança suas perguntas ao mundo sistemático, conforme este seja dado, estruturado ou construído em segmentos e interesses, enquadramentos. O primeiro poema, por exemplo (A Procura), tornase ainda mais significativo porque coloca suas bases em perguntas, e não em respostas ao tempo: "Por onde anda?... Não vejo... Sumiram... Busco... Não encontro...". E em outros poemas, temos ora a intuição, ora a


revelação de que a resposta encaminha-se para o provisório, não para o totalitário, como no próprio Perplexo, em que a perspectiva relativiza o paiol da satisfação. As respostas não podem, desse modo, ser retilíneas, calculadas, prontas, unívocas. É o que nos sugere, despretensiosamente, o poema Plural: Nem cartesiano nem geométrico, seu amor é curvilíneo obtuso ou mesmo amorfo. Com paradigma próprio, dista do ortodoxo, seu amor é plural. O salto maior do livro talvez seja essa sombra do Tempo íntimo, experiencial, que assombra o estagnado e o estabelecido, que dissolve, embolora ou escarifica tanto as perguntas quanto as respostas. Um tempo que ora é calendário, ora é obrigação histórica do existente, ora é rotina comezinha no dia a dia do homem – mas subordinando todas, perguntas e respostas, a essa presença que se move como consciência [fraturada] entre o terno e o eterno, tempos e nuances, experiências e expectativas, e que invade todas relações, principalmente a relação com a linguagem, que é a primeira relação da poesia. E esta parece tornar-se a busca e a última resposta de Daniel Blume, o terno, ao terno.


RESPOSTA AO TERNO - Livro de Daniel Blume DILERCY ADLER Presidente da Sociedade de Cultura Latina do Brasil -SCLB Membro Fundador da Academia Ludovicense de Letras - ALL Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão – IHGM Exatos 20 anos se passaram... Daniel Blume, aos 21 anos de idade, lá estava na I COLETÂNEA POÉTICA DA SOCIEDADE DE CULTURA LATINA DO ESTADO DO MARANHÃO, em 1998. Eu conhecia a sua mãe, a Poeta Professora Sônia Almeida. Eu, admiradora da sua lavra de poemas, verdadeiros diamantes em versos fiados com metais preciosos... a convidei para participar dessa Coletânea poética, trabalho muito importante para o Maranhão, no contexto do espaço latino. No meio dos seus poemas ela me entregou ESPELHO, que assim iniciava: Escrever inscrevendo./ Desafio./ Espelho./ Rompe a barreira do silêncio. Naquele momento, com aqueles versos Sônia me trazia Daniel Blume, pelas mãos da poesia, e eu me rendi ao encanto das palavras daquele jovem, naquele momento, quando ainda era estudante de Direito e não usava terno. A história às vezes se repete e 20 anos se passaram e, novamente, Daniel está participando da I COLETÂNEA POÉTICA DA SOCIEDADE DE CULTURA LATINA DO BRASIL, a primeira, também organizada por mim, e ele atendeu mais uma vez o meu convite feito, desta vez, diretamente a ele, meu confrade na Academia Ludovicense de Letras. Dois mil e dezoito, vinte anos depois, de terno, Daniel busca respostas, Respostas ao Terno! Eu sabia de antemão que seria uma leitura degustativa de fino gosto; li do início ao fim, sublinhando alguns versos que me tocavam mais de perto e constatei, ao terminar a leitura, que o livro estava colorido pelas muitas marcas que fiz... O jovem de antes, o do Espelho, é, hoje, um homem, um homem de família e com grandes reponsabilidades profissionais e significativo montante de publicações. O jovem/maduro advogado, Procurador do Estado do Maranhão, membro efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros e da Academia Ludovicense de Letras já brindou a sociedade maranhense com poemas, crônicas, revistas, coletâneas e antologias, livros de poemas e de natureza jurídica. Este livro que entrega agora ao seu público cativo, escravizado por meio da sedução que a beleza da sua obra inspira, traz como leitmotiv respostas... respostas que configuram buscas incessantes de homens e mulheres sensíveis que persistem/insistem no desvelamento do real, dos seus anseios e motivações da sua origem e destinos... e aí me vem a alegoria dos oráculos... O termo oráculo designa tanto a divindade consultada como o intermediário humano que transmite a resposta e ainda o lugar sagrado onde a resposta é dada. Eu diria então que o intermediário seria, neste caso, o ―terno‖, a divindade, a Poesia, e o lugar sagrado, o livro, configurando essa tríade mitológica singular. E Daniel pergunta e responde às vezes com outras perguntas que a poesia elucida de forma clara ou ensombrada, soturna, embaçada, fosca, embaciada... Tantos adjetivos traduzindo o mesmo significado propositadamente, por traçarem objetivos e destinos diferentes. E Daniel, como Teseu, traça um rumo nesse labirinto incerto de questionamentos para voltar dele a salvo e satisfeito com a sua jornada. No caso de Teseu, o herói grego ateniense, filho de Egeu e Etra toma para si a missão de livrar Atenas do pesado e doloroso tributo pago anualmente a Creta, que consistia em enviar jovens para serem colocados em um labirinto e serem devorados pelo Minotauro, monstro, que era um homem com a cabeça de touro. Para sua felicidade, Teseu conhece Ariadne, filha de Minos e Pasíafe, que se apaixona pelo herói e, como toda amante, teme a morte do amado; lhe ocorre dar a Teseu um novelo de fio para marcar o enredado caminho do labirinto para assim voltar sem se perder, após o combate com o monstro. E foi o que aconteceu. Teseu matou o monstro e voltou do labirinto a salvo.


Na resposta ao terno, o labirinto começa com as indagações/ resposta ao Tempo, à Cultura, à História, à Política, ao Amor e à própria Poesia: no espaço do tempo na sua A PROCURA diz: Por onde anda/ Sumiram/ Não encontro/ Não ouço/ Onde estão/meus pais? (pp. 23-24) ou como em UM TEMPO:[...] Não se pode calar/o tempo./O tempo vai, dissipa-se/como neblina./O tempo nos faz/e desfaz./ Nesta vida complexa,/frágil e curta,/Há tempo de/amar odiar/nascer morrer,/plantar arrancar/ edificar derrubar,/sorrir chorar,/dançar prantear,/falar calar,/avançar recuar./Há tempo/de guerra/e de paz. (pp. 27-28, grifo meu); em MOEMA: Pensavam ser ponto/contraponto,/côncavo e convexo,/verso e reverso./Findo o romance, (p.25) ou como diz veementemente em MARCAS: Nem machado/pode podar/o tronco passado/preso à verdade/com raiz de carvalho,/onde estou (p.30). Ou ainda em UM MINUTO: Somos um produto/de nosso tempo e lugar (p.32), embora tenhamos um espaço possível para contrariar essa determinação, mas um minuto também é implacável quando: Se se morre em segundos,/um minuto é uma toda vida/um instante/que repercute/para sempre (p.32). Essa máxima expressa uma sentença inquestionável. Mas na resposta ao Tempo tem também uma bela súplica Àquele que comanda o tempo: DEUS ME LIVRE: se o cotidiano me arrastar de Ti,/não me desabrace,/suplico./Deus me livre/do furor humano que confunde,/necessito do Seu exemplo/aos meus descendentes/ para enfim dizer/―Deu tudo certo./Deus, tudo certo‖ (p. 38) E ainda poeticamente se refere ao tempo na gente, no caso, em si mesmo, no seu PROTAGONISTA: Já sinto o tempo/não só no físico/à minha volta/cada dia com sua agonia. (p.41) e também na CONTRAMÃO: A vida é um sopro, no qual não se deve/voar no óbvio,/ na direção previsível,/ao encontro regular,/do intermediário/da monotonia.(p. 45). Na resposta à Cultura faz homenagem desde às coisas simples do dia a dia como à PADARIA e marcas da maranhensidade, com o seu MÃERANHENSE como a linda homenagem que faz a Maria Firmina dos Reis, essa ilustre maranhense que é hoje o nosso olho do ciclone, que objetiva consolidar a ressignificação da importância no panteon maranhense e brasileiro, da primeira romancista do Brasil, iniciada pelo também ilustre escritor maranhense, Nascimento Morais Filho, e Horácio de Almeida (paraibano), além do que o leitor é contemplado com outras preciosidades. Senão vejamos: PADARIA Lembre-se do pão quentinho do fim da tarde/rumo de casa. (p. 52), MÃERANHENSE: [...]Meu chamego,/não sou mulher quizilenta,/sou tua mãe! (p. 54), em HUMANIDADE diz: DesPlugados,/perdemos a capacidade/de observar algo além/dos smartphones./Legal,/mas letal.(p.55) ou como em CRUZAMENTOS: Todas estas ruas se cruzam./Perpassam-me./São veias onde corre o meu sangue./Compõem o organismo de uma história,/vias de uma existência. (p. 57). A homenagem a Maria Firmina, ÚRSULA: Descendente ainda cativa,/ludovicense libertária [...] Firmina fundadora/do texto/aboli dor,/do sujo porão/dos navios.[...] Primeira voz em tinta/ da trama do drama/ chamado/escravidão. (p.60-61). E finaliza essa parte com o seu PRESENTE A SÃO LUÍS: No aniversário da Ilha,/tenciono desbravar/não apenas a tua superfície/de mar moreno. (p. 62) Na RESPOSTA À HISTÓRIA no seu poema NO ESCURO diz: A noite encobre/as dúvidas do dia./ Em um mundo/ que não se vê. (p 69). Sabiamente nos remete à complexidade da multifacetada realidade e, ao mesmo tempo, a fragilidade e impotência humana à sua interpretação. Comovente e inquestionável homenagem a Schindler, herói de um período, que, dentre muitos outros, macula com sangue inocente a história da nossa dita civilização: SCHINDLER: Um bem absoluto/a lista é vida./Ao seu redor/o abismo é cáustico/caótico./Dito e feito/quem salva vidas/salva mundos. (p. 70, grifo meu). E traz saudades em forma de dores mais pulsantes, CHAGA: Saudade de uma saudade/como chaga que chega/a ser física.(p. 72) ou em FICO: Fico a cada morte/de um amigo/mais e mais/vazio. (p. 73) e tem vazios e vazios e um vazio por ele sentido, que muito me enternece está em CAMILA Lembro sempre/da menina,/antes da mulher./Cachinhos pouco ruivos/entre sorrisos permanentes/com pele morena de sol/do Rio de Janeiro, São Luís,/Peruíbe, Santos, São Paulo./Há tempos descolorida/de lutar com dores/pelas cores da vida/que se inclinou/para uma inevitável/não invencível/morte./Camila/foi um samurai,/Ciro, Ramsés,/Júlio Cesar, Carlos Magno,/Ricardo, Coração de Leão,/Alexandre, o Grande,/Gengis Khan, Rei David,/um cacique apache,/foi Pedro com espada na mão/contra o centurião. (p. 80) esse poema faz um belo composto/amalgamado de saudade com história, pois nele se vê a dorida saudade e personagens de leituras diversas que passam pelos heróis da história antiga, de povos diversos e culturas distintas, e pelos sábios exemplos bíblicos, e finaliza essa parte com a despedida maior da vida CREMATÓRIO: Ao fim da missão,/tem-se mais medo/da morte ou da dor? (p. 81). Esse é um exemplo de que Daniel volta do labirinto com uma reposta que configura uma nova pergunta. Aí, na minha compreensão, está a riqueza da sua


jornada, qual seja, de não se angustiar na impossibilidade de dominar os objetos inqueridos/analisados por ele e ter consciência da nossa limitada humanidade. Nas suas Respostas À POLÍTICA inicia dizendo em SANGUE (p.87): Viver é sangrar. Em O MISERÁVEL (pp. 88-89) denuncia: Falo de um verme/a se esgueirar bem debaixo/de sua timidez./Falo do gago fraco/a celebrar o mal/dos conchavos e traições/que lhe aprazem./[...] De terno e gravata,/medalha no peito,/livros não lidos nas mãos,/jamais se viu alguém tão vil. Ainda em seu TRIUNFO (p. 98) afirma: A franqueza deve fazer/da fraqueza a força,/não é a vida uma sucessão/de triunfos. Na RAPOSA (p. 111) enfatiza: I ―Vamos cooptar este verme, que pensa que é gente!‖/ ―Mesmo que a custa de bondades!‖/―Temos que chamar para perto!‖/―Seja para matar na faca!‖,/[...] ―Lembre!/Não somos os que morrem,/mas aqueles que matam./Nunca valentões,/somos valentes./Uns entram na história,/nós a fazemos‖. E a contradição política no mundo humano fica perfeitamente retratada no seu O MUNDO (p. 114): O mundo esquerdo/vive em/direita volver./O mundo quer ser/mudado? Ou seja, os ideais de esquerda sempre existiram, aliás, remonta aos povos primitivos. Mas dentro das próprias premissas de esquerda as suas objetivações mudam no decorrer da história, até mesmo pelas mudanças nas condições objetivas (histórico-sociais) de cada sociedade. Em TROIA (p.120): Uma simples falha/na complexa fala/motiva e ativa./A drástica bomba/armada no interior/do ursinho de pelúcia. Isso explica claramente os momentos cruciais de patologia coletiva que resultam no derramamento de muito sangue inocente, uma simples falha, via de regra retratada em mentira ardilosa e convincente explode as bombas (lembro tristemente (Hirochima, Nagazaki - Japão; Rio Centro-Brasil). Por isso acho pertinente o NÃO (p.124): não lhe compreendo,/nem suas pretensões;/não reconheço suas falas,/nem seus gestos;/não confio em muitos,/nem mesmo/em você. Inteligentemente e amorosamente Daniel busca RESPOSTAS AO POEMA (p.131): Quando o molhado é fogo,/quer-se cuidar dos passos/e preencher espaços./O cio arranha,/a pele sente/o que os pelos/insinuam./No aroma do hálito oposto,/há ânsia por outros/pelos dedos/umbigos quadris,/na busca por trilhas,/até a trança/de corpos/com suspiros gemidos soluços/da nua cheia/de um poema completo. Em MISTÉRIO: Para além de erótico,/nosso amor é exótico,/com seus tons,/posições, contorções,/gritos e sapatos altos./agitados ou calmos,/somos saliva olhos óleos/pelos peles dedos órgãos/e espaços preenchidos/por um desejo que habita/no mistério (p.144 -145 grifo meu). A mim agrada muito o salto alto como figura de erotismo feminino (apesar de Luís XV). O amor é entrecortado por saudades e em FACA essa condição sentimental é lembrada: A saudade cortante/sem ser faca ou navalha/quer somente saber/como vai você (p.156). E toda quimera humana resulta no desejo de ser FELIZES PARA SEMPRE: Apesar de jamais/tê-la tocado,/nunca tivera/um relacionamento/tão sério (p.170). E a última parte do Labirinto é dedicada à RESPOSTA À POESIA e na sua LUTA diz: Mente e dedos se negam a escrever/sobre a pressão que invade o tórax./Comprime a fenda do peito,/na abundância de oxigênio falta o ar./As pegadas do poema têm/vida vontade força/capazes de asfixiar/quem lhes oculta./Na luta do corpo/com o poema/vence sempre/a poesia (p.189- 190). E o livro que neste caso simboliza o lugar sagrado, não poderia deixar de me reportar ao seu MAIS UM LIVRO: No fim do ano,/trabalha-se menos./Pensa-se mais./Período de ócio destrutivo,/pensar angustia,/para não sucumbir,/inscrevo-me (p. 200). E depois de tudo fica um RECADO, que para mim, apesar de cruzado/metafórico é indubitavelmente verdadeiro! Um velho homem/ dizia sempre/ que saber doía./ Agora entendo/o recado cruzado,/ apenas/sabedoria (p. 97, grifos meus). Que essa sabedoria seja a grande resposta encontrada, que esteja incrustada em nosso verbo e em nosso fazer. Vejo aí a arte cumprindo o seu papel e os poetas cumprindo a sua missão de mostrar a realidade, de dar respostas por outros caminhos, menos áridos, mais suaves, mas nem por isso menos contundentes e verdadeiras. Essa assertiva me lembra a comparação entre o poeta (artista) e o louco feito por COOPER, citada por João Francisco Duarte no seu livro "Política da Loucura" que diz: ambos mergulham num mundo para além das palavras, dos símbolos, das verdades estabelecidas, num mundo dos sentimentos e das emoções. Contudo, o louco não consegue


voluntariamente retornar desse mergulho, o artista retorna através da sua obra, retorna concedendo ao mundo uma transcrição de sua viagem interior" (Duarte, 1987, p.70). Isso posto, deixo aqui registrada a minha exortação: Precisamos engrossar as fileiras de homens e mulheres lúcidas. Que tenham coragem de entrar em labirintos, mas que deles saiam com respostas, ou mesmo com novas perguntas, mas com material para análises que se aproximem mais do real, saindo assim ilesos e mais plenos desse enigmático labirinto que é o mundo traçado pela própria humanidade. Parabéns, Daniel!!! Estou feliz ao rever a sua trajetória permeada por sucesso e, nele, muita poesia!!!


UM POEMA PARA HOJE maio 13, 2018 / Antonio Ailton

Cada um tem sua mensagem particular para o dia das mães, a mensagem que tente traduzir todo o rebuliço que está por dentro, em relação à maior de todas as ações e de todos os amores, à simbólica maior da vida. Lá se vão completar oito anos que mamãe partiu, justamente no mês de maio. Hoje me aproprio mais de um poeminha de Murilo Mendes que só é lembrado quando se fala das escolares vanguardas europeias, como exemplar vivo do surrealismo. Mas não sabemos as circunstâncias íntimas de Murilo, se tudo era apenas brincadeira de vanguarda ou se algo fazia outros sentidos lá dentro:

Mamãe vestida de rendas Tocava piano no caos Uma noite abriu as asas Cansada de tanto som, Equilibrou-se no azul, De tonta não mais olhou Para mim, para ninguém! Cai no álbum de retratos (Pré-história. Murilo Mendes)


Quando minha mãe faleceu, sob circunstâncias dolorosas, foi rodeada pela maioria meus irmãos, os que puderam estar presentes, dos 15 vivos. Mãe, super-mãe, talvez tenha sido feliz em poucos dias de sua vida, mas nunca deixar de sorrir para seus filhos, de dividir amor até o último. Naqueles dias, eu estava em São Paulo, e não pude estar no funeral. Incrível que antes de saber de sua morte, fui ficando mal até culminar com dor de cabeça e mal-estar que me fez ficar na cama por dois dias. Foi nesse intervalo de tempo que eu soube, e aquele remorso de não estar presente para vê-la uma última vez ficou remoendo, ecoando. Foi quando explodiram algumas partes do meu poema Memória Mínima, às quais depois dei caráter menos íntimo, porque as mães são mães de muitos e se tornam universais, uma memória que, mínima em seu valor, se partilha com o íntimo de tantos. É assim, que, neste dia, tenho dolorosamente este poema a publicar. O diálogo com os mortos não deve ser interrompido até que eles entreguem o quanto de futuro foi enterrado com eles. Heiner Müller Toda pessoa deveria então falar de suas estradas, de suas encruzilhadas, de seus bancos. Toda pessoa deveria fazer o cadastro de seus campos perdidos. Gaston Bachelard

Volto a Comala Um mulo pasta nos pavilhões do silêncio Trago a criança que não está ali entre as salamandras Um saco nas costas Derramo os brinquedos entre as libélulas ―Mãe, olha o Lava-cu!‖ aponta o bêbado minha irmãzinha Meu pai deve ser o breve vaga-lume que guardei na caixinha Mamãe está morta Da missa de 7 dias só sobram os sinais wireless Recordação trazendo a fuligem vila dos confins


Puxada a embira da memória mínima solta os fiapos no entardecer

* Salpicando as portas com sua luz as casinhas onze-horas pontilhadas de sol um dia hei de começar a limpeza dos túmulos As onze-horas abrem-se como se voltassem hoje de novo ao meu clarão uma foto em monóculo nos deixa esquecidos somos lá dentro florzinhas tênues de carmim de amarelo de manchas brancas


Mamãe ultrapassa velha fotografia dorme quase em mim no terreno baldio ―Não podemos partir de olhos fechados‖

Quando vínhamos da casa de nossa bisavó, noite adentro, o vento vibrava forte, as lamparinas se apagaram e os vagalumes caíram nos baixios encharcados. Viramos lagartas-de-fogo no breu infinito Cipós-de-boi e embiras esfarrapadas ficamos pendurados balançando no ermo Vínhamos de algum festejo ou de algum enterro?

Nosso primo Lelê tinha dado derrame As lagartas-de-fogo, nos beirais das casas, embrenhadas na erva molhada na beira dos caminhos, costumam pontilhar de altares barrocos e anjinhos descaídos a escuridão da noite As lagartas-de-fogo assemelham-se aos vagalumes, mas são espinhentas e não voam perfazem a terra enevoada, no charco fervilhante dos tempos chuvosos e antigos, mas só aparecem quando o aguaceiro dá trégua aos bons dias, e o céu limpo pode dar as caras com suas faíscas olhudas e fantasmagóricas. Lagartasde-fogo são coriscos cintilantes resguardados como espectros para o extremo da solidão ………………………………………………………………………………………………………………… …………… Ao deitarmos, aguardávamos a queda


Os cães vendo as trevas cortadas por chicotes luminosos nos terríveis temporais embiocavam-se nos cantos resguardados da quase inexistência Não tossir de respingo

* Mamãe deixou para soluçar depois, mas estava feliz, porque o mundo ainda nos queria mais uma vez.

* Jumento arcaico na velha estrada atravessando menino no meio dos jacás Barreiras altas de toás e pedras choram raízes despencando arbustos ramas de batata-de-purga maracujá brabo melões de São Caetano

―Não volta de noite por essa estrada velha‖

* Mamãe se bandeava arrastando a gente pelo braço Mamãe mamãe levanta já não sei partir de olhos fechados * As mulheres amanheceram que já é domingo pelos varais Tem uma picape zinha de madeira sobre o formigueiro escorando o lapso tombado nos artefatos lembrar é do passado


o presente carrega armas alertas Ao tempo pertence todas as cangalhas quebradas de Comala Ouço a voz do mundo dos morros de Comala enfrento as carcaças

(Antonio Aílton. Compulsão Adridoce. Jundiaí: Paco Editorial, 2015.) *Imagem 1 (pintura mãe-filho-colo: https://www.ritaaleluia.com/educar-com-pnl-15-pressupostos-chave/ Imagem 2 – capturada de br.pinterest.com (13/05/2018) Imagem 3 – Pinacoteca-Ouro-Preto-1960-Alberto-da-Veiga-Guignard Imagem 4 – Capturada de br.pinterest.com (13/05/2018)


„A DANÇA DAS LETRAS‟ FERNANDO BRAGA Este livro de Franklin de Oliveira [São Luís, 12 de março de 1916 — Rio de Janeiro, 6 de junho de 2000] de há muito, o tenho. Foi uma lembrança do meu velho e querido amigo, escritor e jornalista Milton Coura, que mo deu num certa tarde em seu gabinete de trabalho no Ministério da Educação, em Brasília, já que alguns exemplares desta obra, patrocinada pela Biblioteca Nacional, em coedição com a Universidade de Mogi das Cruzes, no Estado de São Paulo, encontravam-se ali destinados à doação. ‗A dança das letras‘, na verdade, passou a ser meu livro de cabeceira pela importância filosófica e literária que ele encerra, um fascinante laboratório de arte exposto às consultas, já que em suas páginas convivemos com Thomas Mann, Hermann Hesse, Hermann Brock, Proust, Gorki, Van Gogh, Eça, Graça Aranha, Guimarães Rosa, Byron, Rilke, Drummond, Gullar... É preciso mais? Se for, ainda tem ‗O universo verbal de Os Sertões‘ e, para tirar o fôlego, ‗A morte da memória nacional‘, um dos melhores e mais completos ensaios que já se escreveu sobre a vida, a arte e o sofrimento de António Francisco Lisboa, o ‗Aleijadinho‘, a quem Franklin o chama carinhosamente de ‗O terceiro Profeta‘. A guisa de ilustração informativa, o escritor e jurista Rossini Corrêa, na contracapa de ‗Clarindo Santiago – o poeta maranhense desaparecido no rio Tocantins‘ livro do jornalista Sálvio Dino, é textual em dizer que ―Clarindo Santiago, poeta, jornalista e ensaísta, muito influenciou a juventude maranhense: foi quem aconselhou Franklin de Oliveira a ler tudo, até mesmo anúncio de jornal.‖ Talvez esteja aí a pluralidade do nosso grande crítico e ensaísta. Por essa e por outras, o autor de ‗A dança das letras‘ tem um domínio incrível sobre os clássicos ocidentais, tanto os de origem grega como os latinos, com um foco muito forte dirigido para a literatura alemã, como para as do Leste Europeu, sobretudo a húngara e a checa, a alargar essa cosmovisão às estepes invernais russas, para encontrar-se com sua magia delirante, sobretudo com as sombras vagueantes e dostoieveskianas da velha e romântica São Petersburgo. Creio que esse intimismo de Franklin de Oliveira com a literatura universal, não foi somente adquirida nas redações de jornais e revistas, oficinas onde o ilustre maranhense aprendeu desde os treze anos a trabalhar e a exercitar o pensamento, mas, com certeza, por conhecer a linguagem musical, vez que era um exímio violinista, por hereditariedade de uma família de músicos, o que deve tê-lo impelido, com força e clareza, a incursionar não só na essência da palavra em si, mas no ritmo de todo o contexto que tinha sob sua análise, a dissecá-lo com a maestria de uma incrível precisão cirúrgica. Nauro Machado, meu querido amigo e conterrâneo de São Luís, como também Franklin o era, a participar de um evento de intelectuais no Rio de Janeiro, onde estavam, dentre outros, Ferreira Gullar, Ivan Junqueira e José Guilherme Merquior, ouvira deste, a confissão de que Octávio Paz e Franklin de Oliveira eram sem dúvida nenhuma, os dois maiores críticos mundiais de arte. Sabemos nós que José Guilherme Merquior tinha cabedal para dizer isso. O autor desta ‗Dança das letras‘, trabalhou em quase todos os jornais do Rio de Janeiro, a deixar por onde passou sua marca de gênio na análise crítica, nos editoriais políticos e nos comentários literários... Esteve na revista ‗O Cruzeiro‘, onde ocupou por longo tempo a página de crítica ‗Sete dias‘ com raro brilhantismo, tendo sido demitido porque foi ferrenhamente contrário à candidatura de Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello, a uma cadeira no Senado Federal, pelo Maranhão, depois de ser articulada a renúncia do seu titular ‗legitimamente eleito‘, por simples capricho do velho chefe político, senador Vitorino Freire, que assim queria agradar o velho cacique paraibano, dono da maior rede de comunicações, ao tempo, da América Latina. Assis Chateaubriand ou ‗Chatô‘, era um jornalista, empresário, mecenas e político, que se destacou como um dos homens públicos mais influentes do Brasil nas décadas de 1940 a 1960, proprietário dos ‗Diários Associados‘, de cujo grupo empresarial, a revista ‗O Cruzeiro‘ pertencia. E assim foi. A pirraça do caudilho maranhense prevaleceu, Chatô foi empossado na ‗marra‘, como se diz e Franklin perdeu o emprego...


Sua bibliografia é esta: Ad Imortalitatem (1935); Sete dias (1948); A fantasia ata (1959); Rio Grande do Sul, um novo Nordeste (1962); Revolução e contra-revolução no Brasil (1963); Viola d‘amore (1965); Morte da memória nacional (1967); A tragédia da renovação brasileira (1971); Literatura e civilização (1978); Euclides: a espada e a letra (1983); A dança das letras (antologia crítica, 1991); A Semana da Arte Moderna na contramão da história e outros ensaios (1993). Para Franklin de Oliveira a crítica é a estética da literatura cuja visão destrói o mito do leitor comum, ―pois quem se debruça sobre um livro também o está escrevendo, embora sob perspectiva diferente da que assumiu o autor‖. Defendia Franklin que, ―se o crítico não for um escritor, isto é, se não possuir o domínio da arte da linguagem, não terá condições de penetrar o tecido mais íntimo da literatura, que é a suprema criação do dizer humano‖. Por fim, ‗A dança das letras‘ não é apenas uma antologia de ensaios, é antes de tudo a própria súmula do pensamento crítico e estético de Franklin de Oliveira. -------------------*Fernando Braga, in ‗Toda prosa‘, antologia de textos do autor.


O ROMANISTA ABELARDO SARAIVA DA CUNHA LOBO FERNANDO BRAGA in ‗Toda prosa‘, antologia de textos do autor. Ilustração: O livro comentado. Abelardo Saraiva da Cunha Lobo, autor de ‗Curso de Direito Romano‘, com certeza confirmou o elo entre o Maranhão e as ideias jurídicas no Brasil ao escrever a história interna do Direito Romano [...] vez que excedeu na exposição de seu direito público, chegando a pretender, do ponto de vista externo, realizar a evidenciação de sua influência universal em seu projeto interrompido pela sua morte em 1933‖ diz-nos o professor doutor Rossini Corrêa em seu belo livro ‗Formação Social do Maranhão: o presente de uma arqueologia‘, São Luís, 1993. Este livro é uma reedição do Centro de Estudos de Direito Romano e Sistemas Jurídicos da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. O projeto gráfico do Senado Federal é o de n° 78, com prefácio do Professor Doutor Francisco de Paula Lacerda de Almeida, Catedrático de Direito Civil da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e agora enriquecido pelas notas de Pierangelo Catalano, da Universidade de Roma, o que ―constitui motivo de grande alegria para os juristas brasileiros, indicando auspícios favoráveis ao desenvolvimento do Direito Brasileiro em consonância com as suas origens culturais‖, no entendimento do Professor da UnB, Ronaldo Rebello de Britto Poletti, Presidente da União dos Romanistas Brasileiros –URBS. Esse volume que na verdade reúnem três livros do mestre Abelardo sobre a matéria, enriquece e ilustra os estudos de Direito Romano, contendo, para tanto, o programa idealizado por seu autor, a partir dos primeiros conceitos de Leibnitz, Poponius e Gaius, passando pelas Ordenações (Lei das Sete Partidas), pelo Direito Civil Português, Canônico e Germânico, Ibero-Americano, até chegar ao Monumento Jurídico do nosso Clóvis Bevilácqua. Sobre o autor, valho-me das notas contidas às páginas 665-6, do volume em referência [Notas sobre o Autor], transcrevendo-as na íntegra, para o conhecimento de alguns maranhenses, que pouco ou nada sabem, pela escassa divulgação feita até aqui, sobre esse nosso ilustre conterrâneo: Abelardo [Saraiva da Cunha] Lobo nasceu em São Luís do Maranhão em 24 de janeiro de 1869 e faleceu no Rio de Janeiro em 12 de maio de 1933. Filho de Cândido Emílio Pereira Lobo Júnior e de Maria Benedita da Cunha Lobo. Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito do Recife, em 10 de novembro de 1888. Doutorou-se na mesma Faculdade, em 24 de dezembro de 1889. Nomeado em 24 de janeiro de 1890, aos 21 anos de idade, para o cargo de Juiz Municipal da Comarca de Barra do Corda [Maranhão]. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1891, sendo nomeado cônsul em Vera Cruz, no México, posto ao qual renunciou porque o Marechal Deodoro da Fonseca havia dissolvido o Congresso Nacional, e ele, Abelardo Lobo, fora contrário a esse golpe. Casou-se com Alzira Mesquita Bastos, em 18 de novembro de 1893, no Rio de Janeiro. Militou na advocacia. Foi o primeiro colocado no concurso público para Professor Substituto da 3ª seção da antiga Faculdade Livre de Direito do Rio de Janeiro, que compreendia a disciplina Direito Romano, Direito Internacional Privado e História Geral do Direito, sendo nomeado, incontinenti, professor de Direito Romano. Participou de vários congressos internacionais e pronunciou inúmeras conferências. Seu Curso de Direito Romano, em sete volumes, [sendo nesta edição que agora nos referimos somente reunidos os quatro primeiros tomos que abordam a parte histórica, muito divulgada nos meios jurídicos da Europa e América]. Com a República, foi eleito Constituinte pelo seu Estado natal. Nomeado pelo Governo Provisório membro da Subcomissão pelos seus pares, professores Filadelfo Azevedo e Pereira Braga, dando eficaz colaboração na ―Primeira Parte‖ do Código de Processo Civil. Doutor Honoris causa pela Universidade de Buenos Aires (Argentina), e de San Marcos, de Lima (Peru). Grande Oficial da Ordem do Sol (Peru). Abelardo Lobo tornar-se-ia um dos principais pioneiros dos estudos do Direito Romano entre nós. Participou ativamente da Escola do Recife, associando seu nome aos dos intelectuais de nomeada como Tobias Barreto, Sílvio Romero, Clóvis Beviláqua, Capistrano de Abreu, Graça Aranha, Urbano Santos, Artur Orlando, Araripe Júnior, Gumercindo Bessa, Martins Júnior...


O Curso de Direito Romano, de Abelardo Lobo, é um clássico, entre nós, escrito à intenção de seus alunos. O Curso reflete uma grande cultura e erudição, e é o segundo a ser escrito no Brasil, antecedido apenas pela História Interna do Direito Romano Privado, de outro maranhense, Luís Antônio Vieira da Silva, formado em Direito e Cânones pela Universidade de Heidelberg, na Alemanha. Neste livro encontra-se a seguinte dedicatória, o que externa o grande amor de Abelardo Saraiva da Cunha Lobo pelo seu torrão natal: ―Ao meu longínquo Maranhão‖. ―Quanto mais longe de mim te vejo no tempo e no espaço que nos separam, mais perto de ti sinto-me na irredutível singularidade de minha profunda e desinteressada afeição‖. Abelardo Lobo, Rio de Janeiro, 24 de janeiro de 1935.


SEMEANDO EM SOLO FÉRTIL LYGIA DE MOURA RASSI Poeta, Escritora de Literatura Infantil, Artista plástica, membro da Academia Goiana de Letras, União Brasileira de Escritores e da Academia Feminina de Letras e Artes de Goiás, entre outros. Ao terminar a leitura de Semeando...dez anos de poesia, encontro-me desvendando os meandros da escritora maranhense Dilercy Adler, iluminada em seus poéticos depoimentos de vida. Vida plena de sentimentos contraditórios e instigantes, sempre trabalhados com arte e ressonância. Nesta coletânea, Dilercy reapresenta-nos poemas dos seus livros: ―Crônicas & Poemas Róseos-Gris‖ (1991);‖ Poematizando o Cotidiano‖ (1997); ―Arte Despida‖ (1999); ―Gênesis-IV Livro‖ (2000 ) e ―Cinqüenta vezes Dois Mil Humana(s) Idade(s) (2000). Em seu cotidiano, a autora vem ―Plantando Poemas‖: por todos os cantos/ do planeta/ por todas as crateras/ do solo lunar/são tantos que não conto/ nem dou conta de guardar‖... Em sua preocupação de dimensionar e alargar o ―Espaço feminino‖: cômico espaço...inusitado/ das normas/ do corpo/ do sexo/ do leite materno que sangra/ do peito... neste complexo universo, Dilercy se expõe por inteiro, esgotando a temática do tempo e do amor: __ Amor entrega – ―O Amor no Tempo‖: Eu te amei apenas num momento/... num momento vivido com tamanha intensidade/ que teve seu espaço conquistado no tempo... __ Amor, sabor de cor – ―Teus olhos azuis‖: Os teus olhos/ argutos e felinos/ perscrutam meu eu/ meu interior/ e a translucidez/ dos teus olhos azuis/ profundamente se infiltra/ nos castanhos/ dos meus... __ Amor saudade- ―Saudade‖: Bateu hoje/ uma saudade forte/ de um paraíso... ou ainda no ―Doce Vazio‖: Acordo e olho/ pro lado da cama/ aonde ontem estavas/...hoje vazio.../sinto tua falta... __ Amor confiança – ―Cumplicidade‖: Amo estar contigo/ amo sentir-te amigo/ amo abrir-me sem receios/ ... __ Amor Voraz- ―Ao meu amor‖: Amo a doce voracidade/ que traduzes/ amo a loquacidade/ do que dizes/ amo a excitação/ dos afagos que me fazes/ amo a emoção/ de ter-te comigo!... __

Amor partida- ―Parto‖: O universo/ órfão de mim/ esparge estrelas...

E assim, Dilercy Adler parte de seus poemas-amores para suas inquietações. Desnudando-se e desfazendo-se de ídolos tenta recriar um passado distante: ―...aí não sei porque eu fico triste/ sinto uma vontade imensa de chorar/ talvez me comparando à chuva/ na sarjeta/ ou querendo ser/ o menino a brincar... Sentimentos expressivos, polissêmicos, mas sobretudo humanos, tingem os mergulhos de Dilercy em mares e praias desertas onde seus ―passos ressoam quebrados/ nas ondas/ ... minha queixa silenciosa/ espraia solidão/ afunda/ se perde afogada/ por trás da arrebentação!‖ Continuamente ligada ao tempo, vivenciamos um certo conformismo no sentir-profético da poeta em ―A Sempiterna Passagem do Tempo‖ mas que ainda em tempo manifesta um súbito arrependimento no seu ―Lamento à Omissão‖, culminando com um ímpeto de resistência e determinação, em ― Sobrevivendo‖. Voltando a desnudar-se, a poeta se autorretrata em ―Eu Sou Psicóloga‖. Em sendo psicóloga, Dilercy explora a poética do psiquismo humano. Participa de constantes fugas e retorna inteira ao Pôr- de- seu sol. Nunca se perde, nem descansa nas areias do sono. Em cada alvorada, novas imagens inundam seu ser. No bem-dizer comum à linguagem dos poetas, cuja arte consiste em deixar que aflorem as nuances expressivas, burilando dialéticas e esgotando possibilidades, deparamo-nos com o fruto da lavra de Dilercy Adler que, liberta, rompendo amarras do ser, estabelece elos de solidariedade poética e fraterna com todos que, porventura, venham a compartilhar das nuances e dos variados sabores de seu universo metafórico.


Depois destes dez anos de frutíferas colheitas, prossiga, cara poeta, semeando as dores e delícias do cotidiano nos estreitos, porém eternos, limites do papel. Goiânia, 18/11/2001 ESPAÇO FEMININO Espaço mulher mulher no espaço espaçonave espaço cósmico cômico espaço... inusitado das normas do corpo do sexo do leite materno que eterno sangra do peito a jorrar a boca a dentro do homem!

DAR-SE INTEIRO Terminar sem nada como tantos... que triste! por incapacidade de dar-se por inteiro que persiste em caracterizar o ser humano! não quero que seja assim comigo não permitas que aconteça isso comigo... ...por nós querido amigo!...

EXPIAÇÃO Preciso "descer o Gólgota" sair do meu calvário deixar a minha cruz ... basta de sacrifícios!... necessário é descaracterizar-me do papel de vítima urge aniquilar minha porção mulher condicionada


para sobreviver antes que morra de verdade minha porção gente indelevelmente... inata!

DELEITE Adoro sentir o arfar suave e compassado em meus ouvidos do teu pulmão comprimido pela sobrecarga de pressão e de paixão! adoro sentir o som ritmado no meu peito quando ainda em deleite descansas o teu corpo sobre o meu na cama desfeita! adoro ver-te relaxado e nu jogado entre os travesseiros como se tivesses escarpado íngreme encosta e satisfeito repousasses curtindo ainda a delícia da escalada excitante do meu corpo vibrante em movimento!

O AMOR NO TEMPO Eu te amei apenas num momento um momento infinito cheio de encantamento fecundo e singular! eu te amei apaixonadamente num momento alucinante de entrega total e prazer sem igual


eu te amei num momento vivido com tamanha intensidade que teve seu espaço conquistado no tempo não no tempo terrestre fugidio com idade mas num tempo etéreo metafísico de eternidade!

COBRANÇA Cobro-te cobras-me cobra venenosa com veneno fatal cobro-te quando me cobres com teu corpo enroscado tipo cobra no meu corpo intumescido rígido sensual

DESEJO Eu desejei aquele corpo sem rosto sem alma sem nome sem significado sem calma só corpo! eu desejei aquele corpo com ímpeto com o total furor e langor da minha libido desprovida de qualquer amor sem qualquer pudor só sexo! eu desejei aquele corpo só corpo só sexo sem rosto sem calma desejo sem nexo?! só sexo sexo e corpo sem alma e sem rosto


ah! como o desejei!

DOCE VAZIO Acordo e olho pro lado da cama onde ontem estavas ... hoje vazio ... sinto tua falta!... olho pro lado agora vazio frio e fico lembrando dos nossos momentos tão quentes tão loucos e revivo aos poucos sentindo na pele no corpo na alma teus toques precisos e incandescentes!

LEMBRANÇA DORIDA Dói saber que não te posso tocar abraçar amar a não ser na lembrança! dói saber que te tive tanto e tão junto tão dentro em mim tantas vezes e hoje não te tenho mais dói saber que fui tão feliz contigo e hoje o que tenho comigo são milhares de recordações... recordações que podem se apagar que podem não te trazer mais que podem me fazer te esquecer esquecer teu rosto... teu toque teu corpo... você!

DIFÍCIL VERDADE Haverá talvez verdades


que fiquem além da linguagem o que nos faz seres solitários! faço esforço sobre-humano para dizer o que sinto... ...e nem sempre consigo! faço esforço incrível para viver o que penso... ...nem sempre é possível! faço esforço tamanho para tornar-me clara e facilmente interpretada ...mas muitas vezes me flagro diferente na percepção do outro! são essas verdades além da palavra do gesto da expressão essas verdades não ditas que nos condenam a essa insólita solidão!

TEUS OLHOS AZUIS Os teus olhos argutos e felinos perscrutam meu eu meu interior e a translucidez dos teus olhos azuis profundamente se infiltra nos castanhos dos meus! e ao se fundirem caem minhas defesas e consegues penetrar-me inteira somente com teus olhos azuis!

PÔR-DO-SOL NO IATE CLUBE Por trás da ilha deslizas dolente sabendo do efeito que causas em mim às vezes preciso que demores um pouco


mas continuas incessante num declínio sem fim beleza tamanha dos teus raios viris que incidem prateados nas brumas do mar rodeando a ilha... ... penetrando em mim como um macho na fêmea... ...adoro te olhar!...

SAUDADE Bateu hoje uma saudade forte de um paraíso um companheirismo que já vai distante no tempo em ti e em mim também! bateu hoje saudade abrasadora dos nossos corpos quando colados entrelaçados tesão compartilhado num orgasmo cósmico! bateu hoje desditosa saudade do teu sorriso semblante esguio teu corpo nu tua mocidade tenacidade e voracidade que haviam em ti copuladas em mim!

CUMPLICIDADE Amo estar contigo amo sentir-me amigo amo abrir-me sem receios nesse jogo do discurso que quase sempre nos emaranha nas teias do medo engano e vergonha!


amo estar contigo compartilhando uma intimidade de fogosa cumplicidade de palavras gestos e atos que se soltam espontâneos e voláteis nos espaços esparsos... ... sem limites!...

NOSSO AMOR Adoro quando fazemos amor é lindo... divino! não há poesia ou tela que possa reproduzir quão bela é essa hora pra nós! adoro a hora após amor é infinitamente sublime! respirações ofegantes corpos entrelaçados entre lençóis amassados ...êxtase total em nós!

INCONTESTÁVEL LUCIDEZ Amei-te ontem com tamanha intensidade com paixão irreverente provocante... incandescente! amei-te ontem com loucura indomável força incontrolavel lucidez incontestável amei-te ontem foi tão lindo! queria tanto que esse momento fosse eterno... parasse no tempo: não retrocedesse nem avançasse simplesmente estacionasse e não tivesse mais


outro amanhã!

AO MEU AMOR Amo a doce voracidade que traduzes amo a loquacidade do que dizes amo a excitação dos afagos que me fazes amo a emoção de ter-te comigo!... amo-te em partes ... e por inteiro amo teu ego nem sempre em equilíbrio amo as incertezas com que me cerceias amo profana e santamente cada fração de segundo a dois que vivemos... ...compartilhando ...compactuando!

SOLIDÃO Um nó na garganta olhos lacrimejantes aperto no peito suores nas mãos que se espalham gélidos por todo o meu corpo! tua lembrança nossas lembranças me fazem divagar e devagar viajo! olhos nos olhos me dizes: "senti a tua ausência fica sempre pra sempre comigo!" nossos corpos carentes um do outro dizem e vivem colados aderentes os mesmos desejos adornados por todos os beijos não dados


por todo esse tempo! acordo... o mesmo nó engasgado na garganta as lágrimas serpenteiam rosto abaixo tacitamente o coração saqueado não te acho em nenhum canto do quarto num choro convulsivo me fecho!

AMARGA ROTINA A noite dormiu a manhã acordou como sempre acontece o dia rolou como outro qualquer em que a gente envelhece... envelhece a pele envelhecem os olhos a saudade e a alma... envelhece sem chama com uma calma velada que até aborrece aborrece a chama que brilhava na pele crepitava no sexo rolava na cama e agora adormece adormece calada doce calma na alma com os olhos cerrados e a boca entreaberta de quem não diz mais nada!

CORPO E PRISÃO Sinto-me presa em um corpo que impõe limites intransponíveis que me impõe papéis delineados que inspira amores que nem sempre quero


e me tira a possibilidade de outros que eu queria tanto! sinto-me presa neste corpo que nem sou capaz de ver sob todos os ângulos! sinto-me numa prisão neste corpo nunca perfeito e mortal quando o mais desejo é transcendência total!

VERDADE E MENTIRA Eu prefiro mesmo que doa ouvir a verdade amarga do que a doce mentira que depois fere e magoa... ... muito mais!

EUS MEUS Existe em mim uma diversidade de eus... eus diferentes! existe em mim um eu às vezes convincente paciente frágil amável que medita regurgita e de imediato se aquieta existe em mim um eu instável que grita se agita chora deplora por tudo e também por nada existe em mim um outro eu


que dorme envolve resolve e remove dificuldades e dor existe em mim um eu que ama que sofre que quer muito muito viver embora muitas vezes se sinta morrer!

TÉDIO Essa paz no coração essa tranqüilidade morna de quem não espera nada... nenhum sonho retorna todos mortos! emoção entorpecida sensações adormecidas embotadas pelo medo puro tédio! só o fogo da paixão na incerteza da espera dá vida aos sentidos dá todo sentido à vida vida trânsfuga inquieta de todo poeta vivo!

PAZ Não quero dizer belas palavras só por dizer não quero dizer simétricas palavras sem ressonância em mim e em você! não quero a forma excêntrica abstrata inteligente cujo mérito fique só aí não quero a dor atravessada na garganta quero gritá-la no ritmo descompassado dos meus dedos quero gritá-la


no branco-neve do papel por sobre a gélida mesa de cristal e no grito das palavras me desnudo implodo toda dor que me entorpece e o meu tormento nesse urro se desfaz como num passe de mágica e por fim soluços lágrimas Paz!!...

FALA DE POETA A palavra do homem habitat - corpo – transita na boca a boca que beija o beijo que trai a palavra do homem habitat - corpo – ferinamente fere a mão que se estende e não se fecha jamais fala poeta por ti e por nós a palavra de amor por sob os lençóis a palavra benigna que não fere jamais a palavra de vida que leva a ferida tantas chagas e dor Fala poeta palavras palavras em rimas de amor!

PÊNDULO VIVO Os meus sonhos no chão quem não sonhou mil dias? a minh´alma ensimesmada quem não sorveu saudades? meus projetos desfeitos desleixadamente estilhaçados minha vida fragilmente suspensa como um pêndulo oscila entre a doce magia da solitária espera


e a mágica orgia do reconstruir do nada!

RITUAL Ouço uivos de lobos – lamentos tristonhos – trazidos pelo vento frio do inverno colho orvalho – lágrimas do cosmos – na noite enlutada engulo luares – dos nostálgicos amantes – bucolicamente solitários rumino compulsivamente todas as saudades que me fazem atua ausência digiro tácita solidão num ritual sem trégua à tua espera!

SENTIDOS Me olha dessa maneira que só os amantes sabem fazer me enxerga fundo na alma na intimidade maior de mim me inala sentindo o cheiro de amor no cio ao amanhecer me sente voluptuosamente com mãos devassas qual a argamassa nas mãos do artista me sente inteiramente tua na fantasia da poesia que me inebria por vir de ti!

CARTÃO POSTAL A cidade grande me seduz a intimidade sua exuberância me encanta sua arrogância me amedronta pessoas engolidas inteiras como Jonas jazem nos arranha-céus digerem solidão a lua lambe “Torres de Babel” fascinação!

SOLIDÃO TOMO I


A solidão do cosmos a minha própria são intensamente doloridas mesmo com o frenesi de todos os orgasmos... ...resignadamente pasmo!

TOMO II A minha inaceitável solidão os meus insaciáveis desejos frenética e pacientemente te esperam... ...o tempo escoa implacável não importa!

CONJUNÇÃO DA TUA PRESENÇA No pretérito a inesquecível delícia da tua presença no presente enorme saudade!

MERGULHO Aquela sensação de perda já conhecida bate outra vez não abro mergulho!

MERGULHO DE AMOR O sol mergulha oceano adentro impetuoso tinge o céu de mar e o mar de amarelo forte o vermelho escandaloso penetra pelas ondas num ritmo sinuoso amoroso erótico exótico que só o ato de amar sabe expressar!

PRAIA DESERTA A praia linda como nunca deserta sombria nostálgica


como eu meus passos ressoam quebrados nas ondas minha queixa silenciosa espraia solidão afunda se perde afogada por trás da arrebentação!

TUA AUSÊNCIA I Caminho na areia molhada da praia deserta é cedo! o sol brilha distante entre nuvens solitárias como eu as ondas da maré vazante brincam com os meus pés descalços relaxo sinto-te junto... inteiro ao meu lado como antes! não entendo o teu silêncio nada me dizes desde que partiste sinto forte a tua ausência fico triste pela carta que não veio há muito só te tenho em pensamento!

TUA AUSÊNCIA II O sol nasceu mais cedo arde como sempre implacável no céu de puro inverno que pra contrariar aqui se posta tórrido queima a minha pele frágil me deixa o calor incômodo do inferno - que não aceito – no meu peito um frio intenso que me deixa a tua ausência arde!

O TEU ABRAÇO No teu abraço


eu caibo inteira me aconchego toda no infinito universo do teu corpo num sidéreo orgasmo deságuo sem censura todo erótico desejo que me inspiras e me curas da carência e solidão que me cerceiam quando em vez!

SAUDADE Saudade vazio imenso dor aguda no peito estômago entranhas! o prazer se esvai como um feto expelido do “nirvana” vazio imenso intenso tédio dor aziaga no peito! saudade... vontade forte desejo ávido de ter-te por perto outra vez!

NOSTALGIA Folhas soltas no chão... chuva fina... céu cinzento nostalgia... pinta de leve acre-doce solidão!

MEU CÁLICE O teu doce veneno em mim derramas fico cheia quanta orgia no meu cálice! o meu licor te ofereço ao teu gosto


te debruças insaciável a sorvê-lo no meu cálice!...

CHEIRO DE TERRA MOLHADA Este cheiro de terra molhada brejeiro cheiro que traz às minhas áridas narinas aquele límpido aroma inesquecível de paz! este cheiro de terra molhada me lembra outros cheiros milhares é o orgasmo profícuo da terra terra e água amantes eternos que ejaculam um universo infinito de cheiros de cores de amores incensos e incestos de vida!

SÔFREGA FALA DO DESEJO Eu te falo mansamente tantas coisas eu te ouço com os meus olhos fixos nos contornos dos teus lábios que se movem sensualmente e me hipnotizam sinto-me tocada inteira pela mucosa quente da tua boca que tórrida e calmamente me devassa pele e mente! eu te digo tanto e muito e não minto quando me digo mas omito sem certeza os desejos que me inspiras e te inspiro sôfrega e lentamente te infiltrando no meu corpo e me invades numa irrevogável sentença


de premente gozo inadiável de tua presença!

SÚPLICA Deixa os meus olhos Se derramarem sobre a tua nudez incólume e mordaz deixa a minha lágrima sem vez inerte no teu beijo de desejo calado e voraz deixa o meu tato trazer “à flor” toda tua sensualidade entalhada em teus detalhes deixa a minha voz vibrar mais quente e mais rouca deixa a minha solidão mais leve e mais solta deixa o meu coração cantar mais ritmado ao som do teu compasso!

RENDIÇÃO Vivi fugindo a minha vida inteira de tudo que inspirava incerteza vivi fugindo a minha vida inteira e hoje paro e me encaro lívida ao mesmo tempo me entrego ávida num desvario desvelado inconseqüente com a sofreguidão dos tímidos e desvalidos que se negaram sempre o tudo mesmo pequeno depois se dão além dos seus limites!...

INOLVIDÁVEL SAUDADE Entre o espaço e o tempo esparso momento de felicidade entre o espaço e o tempo teu corpo no meu inolvidável saudade! INQUIETAÇÃO Às vezes uma tristeza infinda invade a minh´alma às vezes sinto vontade imensa de chorar


às vezes sinto que algo se acaba em minha vida uma ilusão uma esperança de recomeçar em alguns dias nublados friorentos em que meu ser se sente triste e só sinto meu coração pequeno no meu peito querendo não sei o quê procura algo no ar que não encontra parece que não há a fria chuva cai pingo a pingo na janela num ritmo marcial vai de mansinho de fininho ao seu destino à sarjeta suja onde o menino põe o seu barquinho de papel aí não sei porque eu fico triste sinto vontade imensa de chorar talvez me comparando a chuva na sarjeta ou querendo ser o menino a brincar!

A SEMPITERNA PASSAGEM DO TEMPO O tempo passa sibilando em meus ouvidos fustigando a minha pele eu o sinto escoando entre as fotos e os fatos eu o sinto sempre e todo inexorável passando o tempo passa eu vejo muito em mim e nas pessoas que há tempos eu não via ele passa nos tocando eu o vejo sempre e todo e nos sulcos do meu rosto inexorável passando! o tempo passa


zombeteiro e onipotente é passado é futuro é presente deixa a nossa finitude e a sua sempiterna presença inquestionáveis eu o vejo sempre e todo eu o sinto sempre e todo inexorável passando e eu entre fotos e fatos entre perdas e ganhos paulatinamente ficando e o tempo inexorável passando!

LAMENTO A OMISSÃO (Geração/68) Todos estavam lá eu não como lamento hoje! como gostaria de ter estado lá ...” caminhando e cantando e seguindo a canção” ... com o medo sangrando com a história rasgando esperança e coração! outros tantos como eu não estavam também não estão ainda hoje! se estivéssemos lá unissonamente presentes talvez tivesse acontecido diferente!

UM CERTO AMANTE O verme necrófilo amante de um corpo que amo em vida me intimida

ele o verme


adormece... ...impávido jaz enquanto vibra em vida o meu corpo mas entra em atividade gastronomicamente corrosiva se morro!

O MEDO DA MORTE O medo da morte assolou-me toda corpo inteiro hoje à tarde! o medo da morte inesperado apavorante e forte bateu a minha porta à porta do avião em que eu voava quando este retornava em pane ao local da decolagem e eu em pânico ficava com medo do retorno desprogramado rumo ao nada ao nada indefinível e inaceitável de onde um dia chorando eu vim!

EU SOU PSICÓLOGA Eu sou psicóloga mas sou gente! também com direitos a inseguranças conflitos e fossas dessas menos densas ou quiçá colossais eu sou psicóloga estudo o comportamento humano o esforço sobre-humano que fazes e faço pra sobreviver! eu sou psicóloga explico explícita


e loquazmente os emaranhados da mente mas não significa que de quando vez não jogue pra fora de forma incoerente imprecisa e inconsistente minhas frustrações eu sou psicóloga mas um ser humano como outro qualquer jogado nessa teia de regras e normas e espezinhado por desigualdades mentiras e poder!

MISTURA DE PELE A pele escura a pele branca a pele a brancura a loucura se mistura na pele por séculos e séculos pela fresta da janela vejo a pele que reflete a luz do teu sol luz amarela na pele escura dourada sem igual sobre a minha brancura nua!

DOR – ESFINGE Meu peito - deserto de amor solidão doída cinge essa doida dor - esfinge com tua mão benigna!

MESCLA DE PIEL La piel oscura la piel blanca la piel la blancura la locura se mezcla en la piel por siglos ysiglos por la rendija de la ventana veo la piel que refleja la luz de tu sol luz amarilla enb la piel oscura dorada sin igual sobre mi blancura desnuda!


PARTO O universo órfão de mim esparge estrelas lágrimas incandescentes ungem-me a cabeça desperto! peito aberto boca seca luz forte me pare!

RE- MIRANDO A VIDA Amanheci com olhos diferentes olhos reluzentes de saudade plena olhos que vêem no “aqui agora” do presente beleza que até então não sei porque não via. Amanheci com olhos diferentes olhos que jorram amores incessantes que vêem no efêmero a eternização do tudo a infinitude do amor embora fugidio. Amanheci com olhos diferentes olhos que miram a vida numa festa só a festa de estar viva e de amar em tom maior a festa de adentrar-se na imensidão do mar de fecundar no cosmo o azul em profusão a festa de deixar a dor para amanhã uma manhã que pode ser nunca “agora” um amanhã deixado sempre pra depois num “devir” do eterno nada! Amanheci com olhos diferentes olhos de um hoje de leveza irreverente que veio mansa e impetuosamente de um ontem pobre em festa mas que faço agora ruidosamente!

DEVANE (ANDO)

DESVANE(ANDO)


Eu fujo eu corro eu vejo o arco-íris na íris do teu olho e sonho que morro na beira da estrada e triste recorro ao devaneio de poder reviver - e consigoem teus braços diáfanos aconchegada revivo!

Yo huyo yo corro yo veo el arco iris en la iris de tus ojos y sueño que muero en la orilla del camiño y trste recurro al devaneo de poder revivir -y consigoen tus brazos diáfanos Acurrucada revivo!

AO MEU TRISTÃO Quisera ser para ti Isolda a bela no que ela tem em si de mais divino... quisera ser também a outra Isolda que seu fio tece e se enternece ao satisfazer-te da exigência mais premente fescenina ao teu mais puro desejo de menino! e nós enfeitiçados atearíamos o fogo da paixão em nossas almas que embora para o humano inacessível pra nós possível e aceso inapagável!

DESEJO Quero extrair mais um poema das entranhas estranha arte de parir palavras!

PÔR – DO –SOL A tarde cai languidamente com um esplendor sem igual... raios vermelhos penetram o mar


sensual e firmemente num ardor sexual ...penso em nós!...

EXALTAÇÃO AO AMOR Entre os amores que já tive e guardo fica impossível dizer o mais belo amores lindos -nenhum eu negoe a todos eu amo porque me são caros todos fecundos singulares em essência só me fizeram bem fizeram-me mulher e os percalços que se impuseram também me impulsionaram a crescer amo a vida amo amar alguém é triste a dor de estar só por isso exalto a vida e o amor pois é o amor que nos faz maior!

LOUVOR AO BEIJO Eu canto e decanto o beijo enquanto desejo maior de todo ato de amor! eu louvo a todos os beijos do mar na boca da lua do sol na extensão do horizonte do bêbado no meio da rua do rio ao pé da ponte do orvalho no seio da terra ah! magia do beijo ritual de todo desejo! eu canto e decanto o beijo magia angelical comunhão dos nossos desejos em gozo sexual! eu canto a todos os beijos menos aquele que macula o beijo maior -o da criaçãoo fatídico beijo de Judas o beijo da traição!


eu canto e decanto o beijo enquanto desejo maior de todo ato de amor!

TELEGRAMA I O teu telegrama proclama saudades de beijos de cheiros de frio aquecido a doces deleites o teu telegrama cita intimidades obscenidades de puros desejos o teu telegrama relembra momentos de divinas loucuras vividas por nós por isso te amo e a esses momentos tão lindos fugazes que falam por nós! TELEGRAMA II Saudades dos beijos abraços profanos do cheiro que emana do teu corpo nu! saudades das músicas das poesias dos papos que dizem de ti e de mim! saudades da dança dos bifes queimados dos loucos momentos vividos a dois! saudade tamanha de cada pedaço do espaço do tempo teu corpo de ti!


CALENDÁRIO EXANGUE Em maio anêmicas cores pincelam o mundo! o mundo tela obscena obscura sem brilho! negro fevereiro nublado de sangue em meu calendário exangue!

VÔO PELO REPRIMIDO Aquela folha de papel inerte tão sem vida à minha espera fica em sua brancura imaculada e nobre como a mão da doce Isolda fia! ateio o fogo da paixão humana ensandecida à folha de papel à minha frente inerte ela treme ante o real e a fantasia e ante a dor-titã que me agonia e alçamos vôo pelo reprimido! ah! aquela folha de papel antes inerte agora arde em paixões incontinentes com a minha e tantas outras vidas juntas escala o céu trespassa horizontes!

ORGIAS Anonimamente em desmaios convulsivo -sigopingos de orvalhos desta madrugada insone me fazem companhia -prossigonessa procissão sem santos ou rezas me perco em orações -orgiaspo e si


as!!! SOBREVIVENDO Sobrevivo sobretudo vivo “sobre” tudo sempre sobriamente embora nada sobre nunca...nunca... só sementes! sobrevida vida breve anuncia o fim de tudo e um outro recomeço sempre...sempre eternamente!

EU Eu sou assim serenamente vivo correndo atrás do tempo... pausadamente giro o volante dobro à esquerda encontro gente desço com calma subo correndo... eu sou assim plainando sempre driblo palavras... sou boa amante tenho certeza!

SIEMPRE A TUS PIES “Siempre a tus pies” vou despir a minh’alma acercar-me com a calma de irrefreável desejo! “Siempre a tus pies” vou cobrir-te de estrelas aspirar teus suspiros um a um com meus beijos! “Siempre a tus pies”


derramarei sem pesar os meus dias os meus versos toda a minha saudade e o meu desejo de amar!

LA VIDA ES SOLO UM SUSPIRO AHOGADO a Hector Garcia “La vida es solo un suspiro ahogado” um monólogo eloqüente um projeto inacabado um atraso a propósito um torpe encontro embriagado! a vida se desnuda numa débil despedida renúncia equivocada... ...um suspiro sufocado... suspenso no infinito universo tresloucado tão fugaz quanto eterno! “La vida es solo un suspiro ahogado!”

CONTRASTES Pássaro branco na noite escura da cidade em transe voa... trânsito neurótico narcótico ilógico da ponte absurda navega nesse vôo paz entalhada em cada detalhe desse vôo noturno encobre o entulho da ponte e revela o aveludado vôo que se inicia! PALAVRAS INSONES – I A pena inquieta desliza


apenas se deita se deixa... ...agoniza mas goza o júbilo dos justos justeza apertada sofrida! a pena inquieta procura por sobre o papel se debruça insinua palavras insones que querem dormir o teu sonho mas que só me deixam acordada!

PALAVRAS INSONES - II Dorme poeta te aquieta quem sabe amanhã tu consigas falar tuas melhores palavras jogar toda essa mágoa pra fora gozar o teu mais longo gemido dorme poeta tranqüila dorme poeta dorme o teu sono nenhum sonho ruim terás com certeza sonha poeta o teu sonho de um mundo melhor nesta terra! deita poeta repousa e deixa as palavras quietas deita poeta não ouses mais do que já ousaste hoje! DESÉRTICO OÁSIS A minha alma é um oásis


fértil fértil a minha vida é um deserto árido árido a poesia é miragem da felicidade inatingível por minha vontade forte mesmo que frágil... minha sede nutre-se implacável gota a gota e espalha-se espalhando-se em outras vidas vidas secas de almas plenas e peregrinas neste planeta a minha alma é um oásis fértil fértil a minha vida é um deserto árido árido!!...

DIAGNÓSTICO Sentimentos difusos pulsações arrítmicas desejos obtusos por todos os lados se espalham palavras neuróticas maníaco- depressivas exoticamente travestidas em versos e versos... ah! essa louca mania de escrever poesia!

KÓRKÉP Homályos érzelmek szivdöbbenetek fátyolos vágyak folynak egyre szerte búskomor különc elcsúfitott neurótikus szavak


versben, versben... ah! mily emberien beteges szenvedés a verselés! Versão húngara por Lívia Paulini Presidente Emérita da Academia Feminina Mineira de Letras.

O “PÃO- NOSSO” DE CADA DIA Gás letal de todo- o - dia leva a nossa vida a nossa dignidade rega a nossa ferida rasga dilacerando a nossa dor aberta exposta impunemente à luz do sol o pão nosso de- cada- dia que dá vida de verdade dá- nos hoje! Amém!

PONTEIRO Bate em meu peito Um coração enfastiado fustigado pela ausência de desejos a minh’alma antes inquieta queda-se entediada estátua estrategicamente contra o ponteiro do relógio que marca o tempo dentro da minha agonia me tatua sem reservas e me deixa sem opções! PALMAS DO TEMPO O vento nas palmas do tempo eu gosto


o gosto de mel entre línguas e dentes eu gosto daquele perfume de violeta silvestre eu gosto da tua camisa branca de linho leve roçando o meu seio eu gosto eu gosto da tua boca do teu peito do teu corpo do teu jeito de fazer amor daquele tempo!

PALMES DU TEMPS J’ aime le vent dans les palmes du temps j’ aime la sapide du miel entre langues et dents j’ aime ce parfum de violette sylvestre j’ aime ta chemise blanche de lin léger frôlant mon sein j’ aime ta bouche la poitrine ton corps tafaçon d’aimer de ce temps! Trad: Jan-Paul Mestas Nantes/França

ARMÁRIO DE BRINQUEDO


Não tenho gatos nem em aquarela mas amo um beija-flor que sempre vem à minha janela não tenho pássaros em gaiola domesticados mas bebo o néctar dos deuses do teu beijo apaixonado não tenho um papagaio adestrado mas falo a palavra não decorada dependurada nos vieses do tempo em meu armário de brinquedo que se abre e escorre entre os meus dedos!

AMORES Amores senhores eu tive! amores com dores cicatrizes! amores intensos incensos inebriantes! amores fortuitos cometas reluzentes! amores prolongados ausentes tanto tempo! amores não correspondidos espremidos no peito! amores tão doces leves serenos! amores mais-que-perfeitos eternizados no imaginário!


amores senhores eu tive e tenho e quero muito muitos ter ainda!

ATROPELAMENTO As palavras fogem escorraçadas escorregam pelo canto da boca amordaçada trânsito engarrafado calor quarenta graus transpiro sangue vermelho forte engasgo rasgo o risco que me foge palavra atropelada morre no asfalto!

TARDE NUBLADA Tarde nublada chuva a cair água sangrando lava o meu pranto dentro de mim terra molhada no meu jardim flores brotando saudade... ...lembro de ti!...

LÁGRIMAS Lágrimas se perdem nos sulcos do tempo do rosto da rua do esgoto lágrimas se fundem na confluência do vento abismos brochuras e nichos lágrimas no tempo no templo no ventre


como chuva sobre a terra fertilizam sentimentos!

PLANTANDO POEMAS Espalham-se os poemas por todos os cantos do planeta por todas as crateras do solo lunar são tantos que não conto nem dou conta de guardar... espalham-se os poemas na beleza daquele colar de pérolas tão negras como o luto pesado de teu pranto que não consigo estancar... versos palavras sorrisos te ofereço por amor mas tuas lágrimas sentidas se espalham se espalham e não param de jorrar... e os meus poemas se espalham se espalham e não param de encantar!...

CONTRA CAPA Lavra na terra o sulco da vida lavra idéias lava a “culpa” e o “pecado do mundo” limpa com idéias revolve o sumo inominável com tuas idéias!

Dilercy Aragão Adler nasceu a 07 de julho de 1950 em São Vicente de Ferrer – MA. É poeta, psicóloga da Universidade Federal do Maranhão –UFMA (aposentada), Professora do Centro de Ensino Unificado do Maranhão – UNICEUMA, Presidente da Sociedade de Cultura Latina do Estado do Maranhão, Coordenadora Estadual no Maranhão do Proyecto Sur – Cuba. Odorico Mendes, o herói da Eneida *


ODORICO MENDES, O HERÓI DA ENEIDA FERNANDO BRAGA, in ‗Toda prosa‘, antologia de textos do autor O Doutor Antônio Henriques Leal no diz em seu ‗Pantheon Maranhense‘, Tomo I [ensaios biográficos de maranhenses ilustres já falecidos] que Odorico Mendes ―nasceu em São Luís, capital da província do Maranhão, na casa de seu avô materno, Manuel Correia de Faria, sita na Rua Grande, aos 24 de janeiro de 1799, vindo por seu pai, o capitão-mor Francisco Raimundo da Cunha, fazendeiro das margens do Itapicuru (sic), de Antônio Teixeira de Melo, ilustre restaurador do Maranhão do poder dos holandeses; e por sua mãe, Dona Maria Raimunda Correia de Faria, de Tomás Beckman, irmão do infeliz Manuel Beckman, ou Bequimão, como o apelidavam os coevos e naturais da capitania, e o escreveram os cronistas do seu tempo, manchando-lhe a memória, que foi em nossos dias reabilitada com muito talento e saber pelo distinto João Francisco Lisboa‖. Manuel Odorico Mendes faleceu dentro de um vagão de trem em Londres, em 17 de agosto de 1864, e o próprio doutor Antônio Henriques Leal, autor do livro acima referido, quando deputado provincial, foi autor de uma consignação no orçamento para que fosse translado da Inglaterra onde o humanista falecera, até São Luís, para ser enterrado na Capela-mor da Igreja de Nossa Senhora do Carmo, como se predissesse ―voar a alma serena e sem mácula do cristão intemerato aos pés do Criador, tal como o desejara no seu ‗Hino à tarde‘‖. E continua o Plutarco maranhense em suas preciosíssimas notas a nos dizer que, ―destinando-o seu pai adotivo para a carreira de medicina, e completadas as poucas disciplinas de humanidades que se liam por esse tempo na capital do Maranhão, embarcou-se para Lisboa com destino Coimbra, cuja universidade era, e foi até há pouco, quase que o único centro científico para onde convergiam as aspirações dos brasileiros com bens de fortuna que os habilitassem a frequentar estudos superiores. [...] Em Coimbra, depois de frequentar as de filosofia racional e de grego no colégio das artes, hoje enfeitado à grega com o apelido de liceu, matriculou-se no curso de filosofia como voluntário, prestando exame no cabo das matérias que constituíam os primeiros anos da faculdade médica e constituem em outras universidades da Europa matérias obrigatórias. [...] Aportou ao Maranhão em 1º de dezembro de 1824; mas só três dias depois pode desembarcar, por ter sido o navio, em que vinha, aprisionado por Lorde Cochrane‖, por causa dos espíritos agitados que se inflamavam na algaravia da emancipação do Maranhão, receosos que houvesse da metrópole alguma tentativa para impedir o festejado domínio‖. Odorico Mendes não se mostrou somente consumado latinista e distinto poeta: elevou-se avantajado arqueólogo pelo trabalho de anotações repleto de vastíssima erudição [...] que manifestam, não só a sua vasta instrução e o profundo conhecimento do idioma vernáculo, mas justificam o conceito que dele formam como o escritor mais conciso entre os seus atuais contemporâneos de Portugal e do Brasil‖, enfatiza Inocêncio Francisco da Silva, no seu ‗Dicionário Bibliográfico Português‘. Odorico Mendes quando Deputado provincial pelo Maranhão, por diversas legislaturas, foi autor da primeira lei de ―reforma eleitoral‖ e da lei da ―abolição dos morgados‖, nos informa discurso proferido por Pedro Braga Filho na homenagem prestada pela Câmara dos Deputados, pelo centenário de falecimento de Odorico Mendes, no dia 17 de agosto de 1964, enfeixado no livro ―Memorial de Pedro Braga Filho‖, contendo discursos literários e parlamentares, cuja edição dirigi, com introdução, seleção de textos e notas. Há tempos, quando estagiário em Direito Penal Comparado, na Universidade de Paris-Sorbonne, li na versão francesa o livro ―La Mort de Virgile‖, de Hermann Broch (uma brochura editada pela Imprensa Universitária), sobre o qual, com a ajuda da memória, farei pequeno comentário, necessário para a interligação que pretendi dar ao contexto destes apontamentos. O autor austríaco a romper deliberadamente com os padrões tradicionais do romance, neste reveste-se de reflexões moldadas de lirismo, mitos e símbolos, a estruturar o trabalho em forma de um monólogo interior,


quase que uma auto revelação, com laivos de sofrimentos análogos aos do poeta romano Virgílio, o qual sofreu intensamente em virtude de a arte, amor que se dedicou à vida inteira, tê-lo impedido de realizar-se como um ser humano e mortal. Muitos desses desejos reclamados foram vividos pelo emocional do herói troiano que também não foi contemplado com as trocas que desejava, segundo o contexto alegórico. O direito de viver para si, fora muitas vezes impedido, em virtude da obediência que cegamente devotava aos deuses. Exemplo disso é quando ouvia de Dido, a rainha cartaginesa, suas cobranças apaixonadas; tinha ele, o viajante mítico, de responder-lhe que era escravo do destino, sem nenhum direito ao seu próprio arbítrio... No livro, Broch descreve as últimas horas do poeta camponês, a lutar desesperadamente pela vida até o instante de sua morte, enfrentando-a como se fora um Profeta, cheio de delírios que o fizeram vaticinar um século antes do nascimento de Cristo, à maneira dos versículos bíblicos de Isaías, como o descrito na IV Écogla, fragmentos líricos, vindos da Sibila de Cumas com fatídicas previsões... A intertextualização que pretendi nestes apontamentos, entre o épico latino e o ensaio romanceado de Hermann Broch, foi para deixar como reflexão que, se restou ao autor austríaco assumir-se no final do trabalho, como alterego do poeta camponês, levado pelos sentimentos, sofrimentos e dons de vidência, fazme acreditar, pelo enfoque clássico, legitimar-se Odorico Mendes, por seus dotes naturais e pela utopia humanística existente em Enéias, carregada de sentimentos nobres e ritos grandiosos, ser ele, o gênio maranhense, o verdadeiro herói da Eneida. ____________________ Ilustração: ‗bico-de-pena do nosso humanista Manuel Odorico Mendes, assinado pelo artista apenas como Pedrozo, o mesmo que fez os de Gonçalves Dias e de Francisco Sotero dos Reis, também dispostos no ‗Pantheon Maranhense‘.


UM PASSEIO EM RECORTES SOBRE O LIVRO “ESCRITOS EM MIGALHAS” JOABE ROCHA

A mulher, ao longo dos séculos, procurou de todas as formas meios viabilizadores que pudessem servir como emancipação do olhar de inferioridade vinda por parte do sexo masculino. Não por acaso, mulheres maranhenses enxergaram as letras como uma corda viva que poderiam tirá-las desse jugo opressor da masculinidade. O problema era que quanto mais se materializava o sistema literário, mais as narrativas históricas, com um tom agressivo, enalteciam o homem na figura de herói, ―excluindo duplamente, quase que por completo, as mulheres enquanto personagens e produtoras da história‖, como ressalta Andréa GonçalvesemHistória & Gênero(2006, p. 48), tornando suas obras de realidade em ficção, repúdio, medo e inferioridade. Engrenadas nas sombras do poder institucional, as mulheres trabalhavam nos seus escritos a linguagem como jogo de signos, ou seja, ao invés de atacarem diretamente a política, economia, acultura, a educação com duras palavras, elas trocavam por sinônimos mais brandos ou com discursos poéticos, colocavam personagens nos romances e contos que pudessem representar de alguma maneira a situação dos negros, das crianças, do sexo feminino em relação ao ensino das primeiras letras, casamento, lar e a mulher como sujeito inferior ao homem. Por meio da escrita muitas mulheres excluídas da educação formal e das produções literárias, buscaram romper essa secessão sociocultural que marginalizava o sexo feminino. O livro ―ESCRITOS EM MIGALHAS‖:O sexo feminino em busca da educação formal e de espaços na literatura no maranhão oitocentista, publicado pela Editora Multifoco, Rio de Janeiro (2017),têm como objetivos analisar a trajetória de algumas escritoras oitocentista, frisando com maior rigor duas escritoras: Laura Rosa e Maria Firmina dos Reis, que serviram como símbolo da valorização do sexo feminino e reconhecimento social. Compreender, também, as formas e métodos de educação para o ―bello sexo‖ no Maranhão oitocentista. Nesse viés, ao fazermos uma radiografia historiográfica notaremos que o lugar social em que as mulheres se encontravam fez com que suas escritas ficassem a margem da valorização intelectual. Como diz Ana Colling em A Construção histórica do feminino e do masculino ―A história das mulheres é uma história recente, porque, [...] o seu lugar dependeu das representações dos homens, que foram, por muito tempo, os únicos historiadores‖ (2004, p. 13). Desde a persistência da antiga tradição intelectual, o sexo masculino é atrelado ao universo da cultura racional, da objetividade e ao público. Enquanto que o feminino relaciona-se à natureza emocional, subjetiva e privada. No capítulo ―MARIA FIRMINA DOS REIS: ‗UMA MARANHENSE‘ QUE SE TORNOU MULHER ATRAVÉS DA LITERATURA E DA EDUCAÇÃO!‖, abrimos espaços para trabalhar a figura de Maria Firmina dos Reis a partir da óptica de como ela enxergava a escravidão do negro e abolição do mesmo, nos quais foram dois elementos cruciais presentes em sua época e retratados de forma bastante incisiva em seu romance Úrsula e no conto AEscrava. Maria Firmina dos Reis nasceu em São Luís no dia11 de outubro de 1825, no bairro São Pantaleão, período efervescente dos jornais e do Primeiro Ciclo literário do Grupo Maranhense, formado apenas por aqueles considerados homens das letras. Prima por parte de mãe do escritor e professor Francisco Sotero dos Reis, morando com a vó, a mãe e algumas de suas primas em São Pantaleão, mudou-se aos cinco anos de idade para Guimarães (Vila de São José de Guimarães, município de Viamão em São Luís), onde começou a despertar o interesse pela leitura e escrita. Como não havia uma escola para o sexo feminino na província, visto que a primeira escola formal só chegou no Maranhão em 1844, criado por Dona Martinha de Abrantes, Firmina dos Reis aprendeu a ler e escrever sozinha, considerada uma autodidata. Seu autodidatismo era tão impressionante que lia e escrevia francês fluentemente. Por conta dessa desenvoltura, passou em primeirolugar no concurso público estadual em 1847, aos 22 anos, para exercer a profissão de professora primária, sendo a primeira mestra régia concursada de Guimarães. É considerada, por muitos, como a primeira escritora e educadora a publicar um romance, genuinamente brasileiro, em 1859, quando tinha 34 anos de idade, chamado o romance Úrsula com o


pseudônimo ―Uma Maranhense‖. A partir do romance Úrsula, sua primeira publicação literária em 1859, pela imprensa Typographia do Progresso, aos poucos começou a colaborar em jornais da época com textos poéticos em prosas e versos, charadas, enigmas e logogrifos escritos em formas de poesias assinando-as ―M. F. DOS REIS‖ ou somente com as siglas ―M. F. R.‖. O remédio mais ópio de Firmina dos Reis foi escrever e dar voz a cada escrita sua. É o caso do legado deixado por ela chamado de Álbum também intitulado de Recordações de Minha Vida. É uma das grandes realizações deixada por ela, não se tratando apenas de uma produção literária, mas também de uma autobiografia feito em textos na forma de diário, mesclado entre crônicas e poemas elegíacos de histórias verdadeiras, datados entre 9 de Janeiro de 1853, anos depois de ter ingressada como mestra e 1º de Abril de 1903, aos 78 anos de idade, quando já tinha visto e presenciado muitas coisas ao longo de sua vida. Maria Firmina, sem amparo do Estado, morreu cega e pobre aos 92 anos no ano de 1917, em Guimarães, cidade próxima a São Luís. Assim como foi Maria Firmina dos Reis, o Maranhão, já nos finais do século XIX, pode presenciar o nascimento daquela que iria se transformar numa das grandes educadora e escritora: Laura Rosa. No capítulo―“DA FOLHA MAIS FAMOSA DA RAMAGEM, DESCEU NAS ÁGUAS E RESTA DA VIAGEM O LABIRINTO CAPILAR DA TINTA”: LAURA ROSA ENTRE POESIAS E A ARTE DE EDUCAR OS CAXIENSES‖, há uma construção biográfica da vida desta educadora e escritora, bem como uma visão da emaranhada formação histórica da educação caxiense entre as primeiras décadas do século XIX para o XX. Mesmo com resquícios do século anterior, criando ainda barreiras para que a educação não se estendesse a todos, a persistência de Laura Rosa foi de suma importância para que as mulheres repensassem seu sexo como sujeito participador da sociedade. Segundo Laura Rosa em As Crianças ―é preciso estudar, estudar, investigar, descortinar sempre para que se vão acamando as ideias sobre os alicerces que me foram arraigados no espírito com as primeiras luzes. Por ora, ainda háuma certa confusão‖ (1909, p. 3). Segundo a mulher que cuidou de Laura Rosa até o dia de sua morte, professora Alzira ou tia Alzira, como é conhecida por todos, bem como na memória do professor Manoel de Páscoa Medeiros Teixeira (Professor Passinho), ressaltaram que Laura Rosa era muito calada e tinha o mundo dentro de si. Pouquíssimas vezes ela falava para alguém sobre fatos de sua vida passada. Nem mesmo a professora Filomena Machado Teixeira, a saudosa professora Filozinha (os mais próximos chamavam-na de ―Tia Filó‖), a mulher a quem muitos consideram como sua melhor amiga, sabia coisas do passado de Laura Rosa. Nos momentos finais de Laura Rosa, quase sem poder mais andar da sala para a varanda, Laura Rosa aos poucos foi abrindo o seu passado para a professora Alzira. Contou sobre sua mocidade e os obstáculos que enfrentou quando era jovem. Chegou a entregar alguns de seus pertences que ela escondia por muito tempo, como, por exemplo, um diário de anotações de suas aulas, poesias e recortes de textos que falam sobre a educação e comportamento das crianças, escritos literalmente com tinta de pena. Segundo a memória do poeta e escritor Wybson Carvalho em LAURA ROSA, a Violeta do Campo (2014), direcionavam-se todas as tardes jovens estudantes que faziam o ginásio, poetas e escritores caxienses como ―Cid Teixeira de Abreu, Déo Silva, João Vicente Leitão, Abreu Sobrinho, Vitor Gonçalves Neto, Jota Cardos‖, para discutir sobre as metodologias de ensino-aprendizagens e ouvir seus contos, poesias e sonetos. Também pessoas importantes e autoridades públicas visitavam Laura Rosa, como consta no Jornal Folha de Caxias de 1949, na qual ela se encontra ao lado do Prefeito de Caxias, Marcello Thadeu Assunção, e o jornalista Vitor Gonçalves Neto. Nascida no centro de São Luís, Rua das Crioulas, no dia 1º de Outubro de 1884, final do século XIX, período muito conturbado com a crise do Império, tentativas abolicionistas, criação de uma República, filha de Cecília da Conceição Rosa,mãe brasileira negra e pobre, cujo pai foi um português que desconhece sua existência, Laura Rosa foi educada e criada por seus padrinhos Dr. Antenor Coelho Souza e Dona Lucília Coelho Souza (casal rico da capital da província). Ainda em São Luís, Dr. Antenor pagou por completo o curso de formação em Normalista do Magistério na Escola Normal de São Luís, Liceu Maranhense, em 1905, quando tinha 20 anos de idade, concluindo em 1910 aos 25 anos. O motivo do retardamento de Laura Rosa à educação formal estava atrelado a fatores importantes que não podemos deixar passar despercebidos: primeiro porque muitas normas e costumes permaneceram no


Brasil pós século XIX, principalmente, no que se trata da educação ter como base uma formação elitizada e voltada mais para o sexo masculino. Segundo porque as únicas e poucas escolas formais que existiam para educar moças e rapazes eram em sua maioria particulares, dificultando a vida de muitas pessoas pobres. E por fim, mulheres bastardas, filhas de mães negras, eram mais ainda rotuladas como moças ilegítimas, fracas, sem capacidade intelectual, como aconteceu com Laura Rosa. A causa ou circunstância de sua vinda a Caxias, assim como a data da primeira vez que pisou na terragonçalvina, ainda é algo de questionamentos e de respostas que nos chegam fragmentadas. O que sabemos por certo é que ela chegou por volta de 1919 a 1920 e, na memória da professora Alzira,bem como na memória do professor Passinho, ela veio para Caxias porque as pessoas que cuidavam dela morreram, inclusive seus padrinhos, não restando ninguém que pudesse ficar com ela na capital. Caxias conseguiu avançar na educação na primeira década do século XX criando o Instituto João Lisboa, onde afirma Jacques Medeiros em A história da educação de Caxiasque este Instituto―foi o primeiro a ser fundando [...] criado em 1918 pelo governo do estado‖ (2006, p. 14). Localizando-se num sobrado perto da Praça Vespasiano Ramos, e com curta duração, fechou por ordem do governo do estado sem explicação, causando revolta aos caxienses que almejavam o conhecimento das letras, ―especialmente os estudantes, que, em uma formidável e incontida manifestação de desagrado, invadiram o prédio em que funcionava o aludido Instituto‖, explica ainda Jacques Medeiros (2006, p. 14).Foi nesse Grupo Escolar João Lisboa que Laura Rosa consegue seu primeiro emprego no magistério, onde depois de alguns anos de atuação nessa escola, passou a ser a diretora. PublicouAs Crianças, em 1909,pela Imprensa Official do Maranhão, e que nunca mais foi reeditado e lançado a público. Percebemos através da leitura deste livro que Laura Rosa era profundamente conhecedora da Pedagogia, dos conceitos teóricos e das doutrinas educativas dos grandes filósofos como Platão, Socrates, Quintiliano, Rousseu, Seneca, Comenio, Tratzendoff. Ela se debruça na educação da História Antiga, passando pelos costumes, normas e formação da educação e instrução das civilizações do Oriente e ocidente, como da China, Fenícios, Hindus, israelitas, Persa, Esparta, Atenas. Imenso foi seu conhecimento na educação e na literatura que Laura Rosa chegou ao patamar de ser a primeira mulher maranhense a ter acento a uma Cadeira na Academia Maranhense de Letras (Cadeira de Nº 26), cujo patrono era Antônio Francisco Leal Lobo, conhecido como Antônio Lobo: ―[...] eleita a 3.abr.1943; recebida pelo Acadêmico Nascimento Maraes, cujo Discurso de Saudação ainda não foi localizado; sessão no edifício da Assembléia Legislativa do Estado, então sede da Academia, a 17.abr.1943‖ (REVISTA DA ACADEMIA MARANHENSE DE LETRAS. Nº 80. 1998, p. 11). Laura Rosa recebeu enquanto viva o cognome de ―violeta do campo‖ como mérito e reconhecimento social de seu empenho na educação e pelos seus escritos. Infelizmente, morreu em situação de pobreza aos 92 anos de idade no ano de 1976 – mesma idade e situação de Firmina dos Reis –, deixando como herança apenas sua intelectualidade composta nas poesias, no livro As Crianças e nas escolas por onde atuou. O velório de Laura Rosa foi de grande repercussão. Vieram pessoas de vários lugares, e até alguns intelectuais da capital maranhense. Seu corpo se encontra sepultado no Cemitério de São Benedito em Caxias-MA. As mulheres, através da arte da escrita, expansionaram sua história para além dos muros da subjugação masculina. E quando não puderam mais avançar sobre o fazer cotidiano nos espaços públicos e privados, pré-estabelecido pelo mundo dos homens, buscaram outras ferramentas de poder possíveis como forma de mostrar que o chamado ‗Outro Sexo‘ ou também ‗Segundo Sexo‘, não podia viver mais excluído das construções sociais. Assistindo os movimentos revolucionários e modernos da sociedade brasileira, no século XIX, foram pouco a pouco aproveitando essas agitações para iniciar na literatura e na imprensa, a luta pelos direitos de sua cidadania social e política, reivindicar a universalidade no mundo público e privado.


DE NASCIMENTO MORAIS, O VELHO, A MANOEL CAETANO BANDEIRA DE MELO FERNANDO BRAGA in [Originalmente] ‗O Estado do Maranhão‘, São Luís, 14.12.08. Centenário de Manoel Caetano Bandeira de Melo Caxias – Maranhão, 30 de julho de 1918 – Rio de Janeiro, 8 de maio de 2008. Resolvi escrever estes apontamentos, pelo confinamento existente na prosa de Nascimento e na poética de Caetano, inspirado pela leitura do excelente livro ‗Esferas Lineares‘, desse visceral poeta, notável ensaísta e meu irmão em espírito Nauro Machado, o qual me norteou como valioso instrumental, para dizer que José Nascimento Morais, sem nenhum exagero, foi o maior polígrafo maranhense do século passado. A época de Nascimento Morais foi toda ela vivida no prumo do cientificismo de Darwin, e no historicismo de Spencer, o pai do Darwinismo Social, em contraponto ao pessimismo de Shopenhauer, filósofo da corrente irracionalista. Na esteira dessa epistemologia, Manoel Caetano Bandeira de Melo seguiu a trilha do evolucionismo, fortificado mais ainda pelo entusiasmo do velho mestre. Abro aqui um parêntese para dizer que talvez esteja nesta caminhada a chave misteriosa da poesia de Caetano, trabalhada com os dois opostos, ‗vida e morte‘, que o levaram à elaboração de imagens completamente desnudas ante o salvar-se e os estigmas em chamas, ante o bem e o mal, como resultados apurados do possível concreto na teoria do evolucionismo, por onde seguiu contrário ao princípio cristão do criacionismo. No seu livro ‗A Neurose do Medo‘, Nascimento nos revela a essência de uma consciência nascida da revolta de um homem tocado pela injustiça e ferido na sua sensibilidade pelos golpes do arbítrio, vez que tinha um caráter analítico de tendências dialéticas como se pode constatar no outro seu livro ‗Vencidos e Degenerados‘, onde se vislumbram aqueles personagens ‗dostoieviskianos‘, como os muitos encontrados em ‗Humilhados e Ofendidos‘, no ‗Idiota‘, no ‗Jogador ‗e em ‗Crime e Castigo‘. O cenário desse estudo romanceado de sociologia foi a nossa São Luís do passado, a Praça João Lisboa em particular, com cafés e boas livrarias, como se fosse uma cidade culta da Europa, onde Nascimento buscou o substrato social de seu tempo, para usá-lo em ‗Vencidos e Degenerados‘, o irmão topofísico, em síntese, de ‗O Mulato‘, de Aluízio Azevedo. Nascimento foi realmente ‗Um Lutador‘ como diz o epíteto traçado ao longo de sua história, cujo emblema estende-se a dois dos seus filhos: Nadir Adelaide, educadora emérita e Paulo Augusto, este, o autor imortal de ‗Aquarelas de Luz‘. Da eugenia professoral do velho ‗lutador‘ ainda restava às letras Nascimento Morais, o filho, este, ainda a carregar no seu bravo peito ‗a angústia dos mártires‘ na ressonância imortal do ‗Clamor da Hora Presente‘ que estremeceu a Geração de 45 com seu grito libertário. A viagem estava contida no húmus de Manoel Caetano. Ouçamo-lo: ―... As maiores viagens são as íntimas, / através dos países que imagino. / Das Cordilheiras d‘alma, ainda que ínfimas, as estradas das estrelas descortino‖. Falei no parental darwinista de Manoel Caetano com Nascimento Morais, no conteúdo epistemológico da evolução das espécies que os dois defendiam. Esse mesmo confinamento dá-se na expectativa laboral da criação artística. Se em ‗Vencidos e Degenerados‘, Nascimento traça à luz da sociologia seus personagens como se pinçados dos textos de Dostoievski, Manoel Caetano, no Soneto de ‗Díptico‘, revela a sedução dos sapos da morte com os dramáticos sortilégios de ‗O Corvo‘, de Edgard Allan Poe, tenebrosos, sombrios e incandescentes.


Têm o soneto de ‗Díptico‘, também, a cadência rítmica sentida na nódoa maldita e singular de Augusto dos Anjos, único entre nós nessa modalidade simbólica. No soneto de ‗Díptico‘, ainda, o poeta inscreve o nome de seu pai, o Magistrado Públio Bandeira de Melo naquela tábua primitiva com a intenção de fazer-lhe a oração final, já nos momentos em que a monja da morte lho rodeava. Estes versos têm um corte puramente modernista e são trabalhados em forma fixa, o que me faz dizer que no gênero estão entre os mais belos e perfeitos da Língua Portuguesa: ―São os sapos da morte que coaxam / Vieram buscar-me no alto do edifício / não sei como fugir ao malefício / dos sapos que me buscam e que me acham. / Para o salto mortal eles se agacham / os olhos saltam no gelado ofício / de paredes sem luz que não se racham / desabaremos pelo precipício / Percorrendo a torre natural / que rasga o horizonte invertido / navegando voltada para o fundo / aprisionado espaço pela mesma urna / me sentirei de novo protegido / contra esta sensação de ser imundo‖. Oswaldino Marques, professor de Teoria Literária da Universidade de Brasília, querido amigo, um dos maiores críticos brasileiros, colega dos bancos liceístas de Caetano, deixou-nos essa sentença sobre sua poética: ―Manoel Caetano faz uma empolgante exibição de sua mestria no domínio da traiçoeira forma fixa. Desde o mais rigoroso soneto canônico, sem desdenhar do molde inglês, até o que eu chamaria de soneto desintegrado, onde, como na música concreta, as palavras são mais unidades de uma montagem verbal do que condutos do fluxo discursivo, em que tudo confirma o acabado do mínimo formal do poeta‖. José Cândido de Carvalho disse: ―é um poeta de lindo poetar, um dos maiores deste país. Tão grande como o seu próprio nome: Manoel Caetano Bandeira de Mello‖. O nosso saudoso poeta e ensaísta Carlos Cunha, acende, num rasgo crítico dos mais luminosos, em seu livro ‗Lâmpadas do Sol‘, esse facho sobre a poética de Caetano, diz ele: ―Na poética de Manoel Caetano Bandeira de Mello, à maneira clássica, ele estabelece uma conexão visceral entre os dois maiores termos universais, cantados e decantados permanentemente. O sentimento do amor para o poeta tem algo de trágico, conflituoso. Ele não enxerga outra perspectiva que não sejam os conflitos que desencadeiam o amor. A partir de tal angústia que lhe é quase imanente, orgânica, o escritor atinge outras emoções graves e sinistras, percorrendo a mesma trilha que o conduz a apreender à vida‖. Por fim, Carlos Cunha, o fantástico declamador dos nossos saraus e madrigais, conclui: ―Manoel Caetano Bandeira de Mello, ao lado de indiscutíveis dotes intrínsecos, construiu uma cultura humanística, mais particularmente poética, nas fontes perenes dos escritores clássicos‖. Épica e romântica, metafísica e mística, a poesia de Manoel Caetano personifica-se por uma forma individualizada, com uma grande carga de signos e símbolos a conduzi-la para um subjetivismo dentro daquela estilística hermética de que ―a palavra sozinha inventa uma realidade‖, como defende o poeta e crítico francês Marlamé. Em ‗Tríptico‘, creio que, à maneira de um painel devocional, contém-se num poema-balada a vale-se do emprego da metalinguagem o que lhe dar força, melodia e, sobretudo, uma elegante e fina essência verbal, onde existe aquela síntese em que Carlos Drummond de Andrade diz que ―as palavras são puras, largas, autênticas, indevassáveis‖. Ouçamo-lo: ―O homem e sua essência / No corpo da mulher./ Como não amar, amada, / esta língua em que tu falas? /Palavra nossa que estás na terra, tanto buscada, quão pouco achada‖. Manoel Caetano, aqui, faz-me lembrar à moda de Thomas Mann que as coisas mais belas desta vida são ―os seios da mulher amada e o cérebro do pensador‖. O poeta americano T.S. Eliot, a exercer uma influência e um fascínio em todos nós, benditos pela poesia, ascendeu em Manoel Caetano, como não poderia ser diferente, seu ânimo, quer nas metáforas, nos paradoxos, nas antíteses, nas afirmações abstratas, quer na tensão rítmica, principalmente quando Caetano se apega a visões sombrias a respeito da vida e da morte, vereda já trilhada por Eliot, assim, considerada o reflexo poético do ‗Ulisses‘, de James Joyce. A isso discorremos, para dizer que, tanto o autor d‘Os homens ocos‘, quanto Caetano têm empatia intelectual pelas alegorias da ‗Divina Comédia‘, por Beatriz, principalmente. Nessa epopeia Caetano incursionou por toda sua poética. Sob o olhar dantesco, diz o crítico Haroldo Bruno: ―... Inquietante pela fusão de elementos sensualistas e de carga ideativa ou sublimadora do real, de paixões terrenas e apelos de evasão, ele quer constituir-se, nos limites de nosso tempo de nosso espaço cultural, numa espécie de reflexo da ‗divina comédia‘ do século. Projeto ambicioso, mas que representa a intencionalidade de todo poema que


procura traduzir o quadro objetivo, em função de um pensamento voltado para os signos permanentes da estada do homem no mundo‖. Caetano sabia como poucos que a poesia é a maior mágica da comunicabilidade entre palavras e ideias, entre valores sonoros representativos de amplitudes emotivas que transcendem as possibilidades dos meios de transverbalização, como também sabia que a poesia é a mais autêntica orgia do homem, e que está na razão de sua emoção exaltante, mesmo sendo transitório, como o sonho de uma doutrina, e uma criação divina. Foi por isso que Deus quis que Manoel Caetano viesse ao mundo no galope dessa ‗Humana Promessa‘, para que ele cumprisse com dignidade e competência o roteiro de sua ‗Viagem Humana‘.


A POEMÁTICA DE DANIEL BLUME FERNANDO BRAGA in ‘Toda prosa‘, antologia de textos do autor. I – Penal. Num espaço de poucos dias me chegaram às mãos ‗Penal‘ e ‗Reposta ao terno‘, dois livros de Daniel Blume, vindos de São Luís do Maranhão, minha terra e dele, aonde o poeta é procurador do Estado, de cujo labor jurídico remanejou para seu intimismo poético, as nuances práticas e imagísticas, a nos revelar, como se num tríptico, a misteriosa ciência plena e pânica do conde de Beccaria. Há de entender-se que ―seca até a pena, /os olhos não./ Molhados percebem / que pena apenas pune‖. O poeta, em seus quefazeres trabalha com o uso da pena, como um amplo substantivo, a usá-la, ainda, na mesma classe gramatical como sinônimo de castigo, comiseração, condenação, lástima, etc., e até às vezes, como advérbio, se é que a pena vale a pena; já no direito, Blume se vê às voltas com o ‗Penal‘, que tanto pode ser instrumentos substantivo ou adjetivo, a depender da sua finalidade, se reguladora ou se aplicativa da pena... E por aí o poeta segue a penar, apenando uns e apiedando-se d‘outros. Os poemas deste livro são curtos, como se fossem ‗hai-kais‘, mas extensos pelo foco semântico que irradiam, a guardarem em seus núcleos uma força explosiva muito forte como esse ―que se viva /sem mera união /em consciente unidade‖, ou ainda ―que se abra / no tórax / a porta do criador‖. Há quem diga lá pelas páginas tantas, que ―Daniel é poeta que provoca o sossego das palavras e sai com elas com o olhar alimentado pelo espaço em que transita [...] como desassossegar palavras é dado a quem vive a espreitar o mundo tendo como lente a poesia, Daniel provoca aqui o signo ‘Penal‘ ao mesmo tempo em que é provocado por ele...‖ E quem assim o diz, com todos os símbolos eugênicos que dispõe, nada mais é que Sônia Almeida, poetisa, escritora, professora da Universidade Federal do Maranhão, membro da Academia Maranhense de Letras ... e mãe do poeta! Enquanto isso, Blume transmuda-se para a ‗Infância‘ e ―de lá, o menino partiu, partiu-se. / De onde, a cada dia, afasta-se./ Cada dor, luta transpor. / Mas Ônix é uma pedra na gaveta‖. E o poeta como se visse o rosto em frente a um espelho trincado por uma bordoada ocasional, na carroceria daquele caminhão de mudança, do qual dos fala André Breton, em que transportavam em certa madrugada anônimos rostos que em coros cantavam e sofriam a poesia, abstrai-nos em dizendo que ―Ágora agora, diz e esconde, revela e cala. / Frio divã coletivo da diva. / A vida via internet: / a proximidade distante./ Da curiosidade instigada / à palavra corrida, / intriga-se com a própria língua‖. E o mais prudente, como paráfrase e sugestão, é de que o poeta desfaça-se do nó da gravata mais uma vez, na incessante busca de soltar também o da garganta, através da poesia... II – ‗Resposta ao terno‘ ―[...] O advogado veste-se de um terno olhar sobre a vida, suas memórias e as pessoas que fazem parte delas‖, e passa a responder ao terno [não ao terno da ternura aos verdes campos, mas ao terno em si, como conjunto de calças, colete e paletó]. Na profissão, Blume tem procuração de ofício do Estado para exercê-la, mas como poeta ―o procurador [aquele que procura alguma coisa] de terno [aqui o facto feito de lustro] é este poeta que vive a dor de procurar o terno [o aprazível].‖ Bem haja, diriam meus amigos de Portugal, a saber, que o poeta está lá a cumprir atividades como aluno ‗bolseiro‘ de mestrado em Direito, na Universidade Autônoma de Lisboa, e com esses méritos, pois, seria de bom siso imprimir a esse seu questionamento com o terno [lê-se fatiota], a evocar aqui excertos de um poema antigo, mas de um recorte extremamente moderno, chamado ‗Algibebe‘ [o que significa vendedor de roupas de tecido barato], do poeta português [de Ílhavo], romancista, médico e gravador Celestino Gomes, como se dissesse a Daniel Blume:


―[...] pobre terno sem pessoa, / o que ele queria / era braços / a encher-lhe as mangas vazias/ armadas só a enchumaços / que mo vestissem de gente, / de espasmos e de agonias / ser eu apenas diferente / de mim de todos os dias...‖ para concluir, em seguida ―mas veio o minuto exato, / e o facto feito de luto, / gasto a lustro e desbarato, / cansou-se de devoluto, / cabido de guarda-fato... / Afagos que afogam sangas, / quantos abraços perdidos, / por braços que eram só mangas, / meus braços, cinco sentidos!‖ Diante disso, só me resta clamar loas a esse belo poeta, a essa notável figura humana, autor ainda do livro de poemas ‗Inicial‘ e de ‗Natureza Jurídica das Decisões dos Tribunais de Contas‘, membro da Academia Ludovicense de Letras, onde ocupa a cadeira nº 15 patroneada pelo iluminado Raimundo Corrêa, de quem, talvez, tenha herdado, por atavismo anímico, o condão mágico de tão bem trabalhar as letras jurídicas e literárias. É este o poeta Daniel Blume que com terno ou sem terno, com nó na gravata ou sem nó na garganta, é sempre terno...


DIREITO & LITERATURA


CLODOALDO CARDOSO E JOSÉ MARIA RAMOS MARTINS, duas personalidades da Educação Superior do Estado do Maranhão. SERGIO VICTOR TAMER DISCURSO DE POSSE NA CADEIRA Nº 35 DA ACADEMIA MARANHENSE DE LETRAS JURÍDICAS

O honroso ingresso na Academia Maranhense de Letras Jurídicas nos leva, inevitavelmente, à evocação da memória dos pioneiros de um passado recente os quais, sob a liderança do advogado, jornalista e professor Wady Sauáia fundaram e deram vida a este sodalício. O ano era o de 1986, há 31 anos, portanto. A Academia alicerçou-se com a finalidade de fomentar o estudo do Direito em todos os seus ramos, aperfeiçoar e difundir as letras jurídicas e, sobretudo, cultivar a cultura histórica, jurídica e social do Maranhão. Daquele grupo fundante de 24 idealistas temos o privilégio de privar do convívio de Carlos Sebastião Silva Nina, Roque Pires Macatrão, Maria Teresa Cabral Costa de Oliveira, Milson Coutinho, Fernando Eurico Lopes Arruda, Luís Fernando Castelo Branco, Lourival de Jesus Serejo Sousa, Mário Lincoln Félix Santos, José Antônio Figueiredo de Almeida e Silva, Elimar Figueiredo de Almeida e Silva, Maria dos Remédios Figueiredo Serra, Henrique de Araújo Pereira, José Maria Alves da Silva... Mas dentre os seus fundadores, já nos deixaram Doroteu Soares Ribeiro, Carlos César de Berredo Martins, Leomar Barros Amorim de Sousa, José Jámenes Ribeiro Calado, José Antônio de Almeida e Silva, João Alexandre Júnior, José Santos, Fernando José Machado Castro, Eugênio Martins de Freitas e Wady Sauáia,... porém nos legaram um patrimônio cultural e jurídico indelével, exemplo para as atuais e futuras gerações do Direito. Sucederam Sauáia na presidência da Academia, a partir de 1995 e a impulsionaram admiravelmente, os ilustres juristas Lourival de Jesus Serejo, José Carlos Sousa Silva, Roque Pires Macatrão, Ana Luiza Almeida Ferro, Raimundo Ferreira Marques e o nosso atual presidente João Batista Ericeira. A mim me foi dada a distinção de ocupar a Cadeira nº 35, tendo como patrono Clodoaldo Cardoso e como meu antecessor e seu primeiro ocupante, José Maria Ramos Martins. Seguindo a tradição da Academia, inicio minhas considerações a respeito da fecunda trajetória de vida do patrono da cadeira que irei ocupar: I - O poeta, educador, jurista e político CLODOALDO CARDOSO Nascido em 1894 na cidade de Barra do Corda, Clodoaldo Cardoso foi poeta, advogado, funcionário da Fazenda Estadual, Coletor de Rendas, Diretor do Tesouro e Secretário de Finanças; foi igualmente assistente-técnico do Departamento Estadual de Estatística, Diretor do Departamento das Municipalidades e Prefeito de São Luís. A sua nomeação para prefeito se deu em agosto de 1937 e seu exercício no cargo findou em novembro daquele mesmo ano. O Interventor Paulo Ramos o nomeou após destituir o engenheiro Otacílio Sabóia Ribeiro, que pretendia derrubar os casarios coloniais e transformar o centro histórico em uma cidade, conforme anotou Mário Meireles, ―...de feição moderna, de retilíneas avenidas e ruas espaçosas e em que o encanto dos mirantes bisbilhoteiros cedesse lugar à dureza retilínea dos arranha-céus‖. Em reação a um forte movimento de resistência que já se esboçava, o jovem urbanista Sabóia Ribeiro, em sua mensagem à Câmara Municipal, proferiu insultos ―...contra toda a comunidade e, em especial, contra a Associação Comercal‖, fato que teria precipitado a sua destituição. Em meio a essa crise política, Clodoaldo Cardoso que era ligado ao grupo político de José Maria Magalhães de Almeida, assume a Prefeitura por aquele período de quatro meses. Presidente da nossa congênere a Academia Maranhense de Letras, Clodoaldo Cardoso promoveu o revigoramento daquela Entidade de forma significativa. Contando ele com a sensibilidade do governador Sebastião Archer da Silva, a Academia recebeu, por doação do Estado (Lei nº 320, de 3 de fevereiro de


1949), o prédio em que se acha instalada desde 29 de dezembro de 1950. É dessa fase a decisiva contribuição dada ao desenvolvimento e consolidação do ensino superior no Maranhão. Assim, o primeiro Conselho Diretor, a quem coube as providências preliminares da implantação da Universidade Federal do Maranhão, foi constituído tendo por presidente o Prof. Clodoaldo Cardoso, e como vicepresidente o Prof. Raymundo de Mattos Serrão. Integraram este Conselho Diretor os professores: Cônego José de Ribamar Carvalho, Prof. José Maria Cabral Marques, Dr. José Antonio Martins de Oliveira Itapary, Prof. Orlando Lopes Medeiros e suplentes Cônego Benedito Ewerton Costa e Prof. Joaquim Serra Costa. Membro fundador da Cadeira nº 23 da Academia Maranhense de Letras, sob o patrocínio de Graça Aranha, foi reeleito, sucessivas vezes na presidência daquela casa desde o ano de 1947. Clodoaldo Cardosofoi ainda sócio correspondente da Academia Fluminense de Letras. Bacharelando-se pela Faculdade de Direito do Piauí exerceu, como advogado, a consultoria jurídica da Associação Comercial do Maranhão e o cargo de assistente de Procurador Geral do Estado. Na docência universitária, foi catedrático da Faculdade de Direito. Registre-se, também, sua função como consultortécnico do Diretório Regional de Geografia do Maranhão e membro da Comissão de Cartografia do Conselho Nacional de Geografia. Por seus relevantes conhecimentos nessa área ingressou como sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Estado. Convidado por Jerônimo de Viveiros para escrever a nota introdutória dos três primeiros volumes da pujante ―História do Comércio do Maranhão‖, Clodoaldo Cardoso nos brinda com um texto magistral, de estilo escorreito e sinteticamente elaborado no qual contextualiza o trabalho quase sempre anônimo realizado ―pelos homens do comércio‖ – os verdadeiros produtores de riquezas – desde os tempos da dominação francesa até os nossos dias. E com o seu conhecido pendor literário escreve: ―O estudo da História conduz-nos, quase sempre, ao falso entendimento de que a prosperidade das nações resulta, diretamente, da ação dos governantes. Daí as coroas de louro com que, frequentemente, costumamos adornar a fronte de estadistas que, muitas vezes, apenas tiveram a sorte de achar-se à frente dos destinos dos seus povos, em períodos de fartura. É certo, no entanto, que civilização alguma jamais surgiu e floresceu, em qualquer tempo e em qualquer lugar, sem campos produtivos e comércio próspero.‖ ―O que acontece é que os homens da produção semeiam e os estadistas colhem. E como o que impressiona é a colheita, a História consagra o estadista e olvida o trabalho obscuro do semeador.‖

Mas também ali Clodoaldo Cardoso já registrava certa mudança no olhar dos historiadores, em especial para o elemento econômico que passava a integrar os valores sociais a serem estudados. Em arguta observação dizia: ―Verdade é que, em certa maneira, os velhos métodos históricos vêm sendo modificados.‖ ―Com efeito, a História não é mais uma simples e fatigante nomenclatura de reis, um prolixo registro de batalhas, um árido noticiário de intrigas movidas por interesses dinásticos. Nela, já se concede lugar ao povo e ao estudo das circunstâncias determinantes dos fenômenos sociais.‖

Clodoaldo Cardoso escreveu: ―Florões‖, livro de poesias, editado pela Tipogravura Teixeira, de São Luís, em 1926; ―Regulamento do Imposto de Vendas e Consignações‖, editado pela Imprensa Oficial, São Luís, 1938; e ―Pastos Bons‖, monografia, editado pelo Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística do Rio, em 1947. Seus méritos acadêmicos e literários tiveram grande repercussão dentro e fora do Estado. Na segunda edição de os SONETOS MARANHENSES, de 1923, da ―Távola do Bom Humor‖, livro que contém cento e sessenta sonetos de autores maranhenses consagrados e que, segundo os seus editores ―é dedicado como preito de desinteressada homenagem ao centenário da adhesão do nosso Estado, em 28 de julho de 1823, á independência política do Brazil‖, nele encontramos o seguinte soneto de Clodoaldo Cardoso: MAR TEMPESTUOSO Ergue-se a tempestade. O velho mar, gemendo, Contempla com furor a sombra do Infinito. De praia em praia bate. As vagas vão morrendo De encontro a penedia enorme de granito, Detraz da serrania, o sol vai-se escondendo.


Que tarde tormentosa! O furacão maldito, Perpassa pelo azul, e o velho mar gemendo, Agita-se chorando austero como um, mytho ! Oh ! velho mar gigante ! Oh ! velho mar infindo ! Das portas do Infinito, a noite vem sahindo ! Guiada pelo vento, assim, tam furibundo... A dor, que te persegue é grande como o mundo! Em ti, é grande a dor, oh ! mar que soffres tanto, O Infinito a povoar das bagas do teu pranto! Clodoaldo Cardoso era assim. Um jurista com a alma de poeta, homem de ação e de visão, que enobreceu a advocacia e engrandeceu o ensino jurídico do Estado. Cardoso faleceu aos 76 anos de idade, em São Luís, em 5 de março de 1970. A Academia Maranhense de Letras Jurídicas ao instituir a Cadeira nº 35 homenageou, dessa maneira, e por todos os seus méritos, Clodoaldo Cardoso como seu patrono e, em seguida, recepcionou, como seu primeiro ocupante, o notável professor José Maria Ramos Martins. II – O jurista, educador e filósofo JOSÉ MARIA RAMOS MARTINS Com vasta carreira docente e administrativa na Universidade Federal do Maranhão José Maria Ramos Martins foi professor assistente de Psicologia (1957); docente em Introdução à Ciência do Direito (1957); professor catedrático de Direito Penal (1958); professor titular de Filosofia Geral (1959); professor Honoris Causa de Ciências Humanas e Aplicadas da Faculdade de Filosofia de São Luís (2001); diretor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras e do Instituto de Filosofia da UFMA (1965/1972); vice-reitor da UFMA (1973) e reitor da Instituição (1975/1979), se tornando membro efetivo do Conselho Diretor da Universidade. No artigo intitulado ―JOSÉ MARIA RAMOS MARTINS, INESQUECÍVEL‖ João Batista Ericeira - que acompanhou de perto toda a transformação sofrida pela Universidade naquele período, escreveu: ―Reitor da noviça Universidade Federal, nela cumpriu o papel fundamental de implantar o processo de departamentalização, de separação das funções administrativas das acadêmicas; da institucionalização dos Centros; dos seus colegiados: de base, intermediários e superiores. A Reforma Universitária marchava, sua aptidão ao diálogo foi indispensável à sua realização pela instituição. ‖

Podemos afirmar que José Maria foi um democrata na mais ampla acepção da palavra. Reitor de uma Universidade Federal nos anos críticos do Regime Militar soube exercer com notável equilíbrio seu reitorado, atuando junto aos frequentes e ruidosos movimentos estudantis com a parcimônia daqueles que sabem exercer o múnus público: com extrema sabedoria e como só os grandes educadores são capazes de fazê-lo. Presenciei esse período como aluno da UFMA, quando aqui cheguei em 1975, transferido da Universidade Federal do Pará e permaneci como aluno do curso de Direito até o final da sua gestão. O professor José Maria Cabral Marques, que o sucedeu, e que não havia sido o seu candidato, destacou, em seu discurso de posse, a grandeza e o espírito republicano de seu antecessor que inclusive mandara pintar e restaurar por completo o prédio do Palácio Cristo Rei, sede da Reitoria, especialmente para acolher a nova gestão. José Maria Ramos Martins nasceu em Timon-MA, a 27 de março de 1920. Filho de Urbano de Souza Martins e Ana Otília Ramos Martins. Em 1939 iniciou o curso de Direito na Faculdade de Direito de Salvador, Bahia, continuando-o na Faculdade de Direito de São Luís após ter se transferido em 1944, a fim de prestar serviço militar como oficial da reserva do Exército. Tornou-se Bacharel em Ciência Jurídica e Social em 1946. Em seguida bacharelou-se e licenciou-se em Filosofia em 1956, pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Luís. Entre os seus cursos de extensão universitária, citam-se: ―Sobre Reforma Universitária‖, ―Didática do Ensino Superior‖, ―Metodologia da Ciência e Filosofia Contemporânea‖, todos em 1970, e ainda de ―Filosofia das Ciências‖, em 1974. Mas foi na Bahia, ainda na condição de estudante da Faculdade de Direito, que meu ilustre antecessor foi marcado por intensa atividade literária. Em seu discurso de posse na Cadeira nº 9 da Academia Maranhense


de Letras, em 2004, quando ele tinha já 84 anos de idade, relembrou aqueles tempos de forma emotiva e com grande apuro de memória: ―Acode-me ao espírito, neste momento, o período de 1939 a 1943, quando, estudante na Bahia, costumava frequentar, sempre que abertas ao público, as reuniões culturais havidas no Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, bem assim no Gabinete Português de Leitura. A esse tempo, Rui Barbosa na prosa e Castro Alves na poesia eram os ídolos baianos. Influenciado por meu saudoso e inesquecível amigo Josaphat Marinho, embrenhei-me no estudo das obras de ambos os autores, com ele comentando as passagens que me prendiam mais a atenção. Ao longo do tempo, destes me tornei um admirador incondicional, de tal modo que, hoje, mais de 60 anos decorridos, ainda me emociono na releitura de suas obras, que me fazem retornar ao tempo de minha mocidade.‖

Em outra passagem de seu discurso de posse, o emérito jurista e filósofo do Direito faz referências sentimentais aos seus primeiros anos de estudos em Salvador, fato que iria marcar toda a sua vida acadêmica. Lembra assim aquele período: ―Tal como afirma Souriau, a ciência é a estética da inteligência. Como a poesia, ambas nos fascinam, porque são belas. Aqui fica, pois, singelamente embora, minha homenagem e minha saudade da velha Bahia, de onde trouxe o gosto pelos estudos sérios, a princípio no campo das letras, depois, no das ciências sociais e, sobretudo, no da filosofia. A esse tempo, tornei-me seu súdito fiel, lendo A República, de Platão. No livro VII, apresenta-nos a alegoria da caverna, que Mello Mourão, numa síntese admirável, assim descreve: ―Todos conhecem o episódio da Caverna de Platão, exemplar para a distinção entre o que é e o que parece ser: uns homens viviam numa caverna, donde nunca saíam. Do mundo exterior conheciam apenas as sombras que se desenhavam no chão ou nas paredes da caverna, sempre que alguém passava diante de sua abertura, para a qual tinham voltadas as costas. Acreditavam, então, que todos os seres que viviam fora da gruta eram puras sombras. Um dia, um dos habitantes da caverna veio à superfície da terra e viu os homens de carne e osso que ali se moviam. Voltou à gruta e contou aos outros que as pessoas não eram aquelas sombras. Eram seres humanos perfeitos e acabados, e as sombras eram apenas a projeção de suas figuras. Não acreditaram. Denunciaram-no como mentiroso. Julgaram-no como impostor e o mataram, para que não continuasse a perturbar a paz da caverna, destruindo a verdade que sabiam. Foi – e será sempre uma temeridade – para o homem de todos os tempos, sair das cavernas em que o conhecimento se limita àquilo que parece ser e, pois, a um falso conhecimento.‖

A Filosofia do Direto iria, dessa forma, acompanhar para sempre aquele jovem estudante maranhense... Por sua função como presidente, durante vários anos, da Aliança Francesa no Maranhão, recebeu do governo francês as ―Palmes Académiques‖, cujas honrarias foram doadas ao Memorial Cristo Rei da Universidade Federal do Maranhão. Também foi membro do Instituto Histórico e Geográfico, e do Conselho Estadual de Educação. A cadeira de número 9 que ele ocupou na Academia Maranhense de Letras, teve como antecessor seu amigo e primo Mário Meireles e por patrono o festejado poeta Gonçalves Dias. Em sua carreira funcional foi fundador e primeiro delegado do SENAC e do SESC no Piauí (1947/1952), Diretor regional do SENAC e do SESC no Maranhão (1957/1959), Secretário da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Maranhão (1955/1957), Consultor Jurídico do Estado do Maranhão (1960), Procurador Geral do Estado do Maranhão (1961), Advogado da Petrobrás no Maranhão, Membro do Conselho Política Criminal e Penitenciária do Estado do Maranhão, Presidente da Escola Superior da Advocacia-ESA, Professor de Sociologia Jurídica da Escola Superior de Magistratura do Maranhão. De seus numerosos trabalhos citam-se: Da noção de espaço ao fenômeno jurídico (tese de concurso). São Luís: 1955; Ciência e crime (tese de concurso). São Luís: 1957; Direito Educacional (conferência). São Luís: 1983; Tendências filosóficas no Brasil. São Luís: UFMA, 1983; Discursos e conferências. São Luís: AAUFMA, 1997; Do direito natural ao direito alternativo (conferência), 1998; Um programa de sociologia jurídica. São Luís: Ediceuma, 1998 ( 2ª edição, 2007). Em Sistema de Ciencia Positiva do Direito o monumental Pontes de Miranda, que quase não citava autores nacionais, tras uma bibliografia que vai além de mil nomes, em sua maioria estrangeiros. Porém, dentre os pouco mais de dez brasileiros citados, figuram Miguel Reale e José Maria Ramos Martins.


Transitando sempre entre a filosofia e o ensino jurídico, José Maria Ramos Martins, em 1997, estava a dar mais uma contribuição de sua inteligência ao ensino jurídico do Maranhão: desta feita como Coordenador do Mestrado em Direito do Ceuma - um arrojado projeto acadêmico em parceria com a Universidade Federal de Pernambuco (1997/2001). Era notório o seu ânimo remoçado que bem demonstrava ao falar com entusiasmo daquele Programa de ensino. Fiz parte da primeira turma desse mestrado juntamente com José Caldas Gois Júnior, Jomar Moraes, Ney Bello e tantos outros, tendo defendido, no ano 2000, a dissertação intitulada “Fundamentos do Estado Democrático e a Hipertrofia do Executivo no Brasil”, editada em 2002 pela Editora Fabris. Em uma solenidade recente e muito prestigiada por diversas autoridades ligadas ao ensino jurídico maranhense – a OAB Maranhão e a Escola Superior da Advocacia (ESA) concederam, na noite do dia 25 de outubro, a “Medalha Professor José Maria Ramos Martins”, a 10 renomados professores das Universidades e Faculdades do ensino do Direito de São Luís. A medalha foi criada para agraciar advogados professores por serviços prestados a Educação Jurídica no Maranhão e preservar a memória de José Maria Ramos Martins, falecido em setembro de 2016 aos 96 anos de idade. O Diretor Geral da Escola Superior da Advocacia, João Batista Ericeira, disse na ocasião que a escolha do nome da medalha é um justo reconhecimento ao trabalho do professor José Maria: ―Essa comenda‖ – prosseguiu Ericeira – ―é a forma de mantermos viva a memória desse mestre da ciência do Direito que muito contribuiu para a formação jurídica de nossos profissionais e para a consolidação e aperfeiçoamento do ensino jurídico no Estado‖.

A OAB-MA, por seu presidente, Dr. Thiago Diaz, entregou uma Placa à família do professor José Maria que foi recebida por Iomara Martins, filha do homenageado, que representou a família naquele ato solene. José Maria Ramos Martins tinha a humildade dos homens sábios. O conheci assim. Afável e lhano no trato, mas com objetivos acadêmicos claramente definidos; era perspicaz e eficiente em suas diretivas; compreensivo, leal e franco em suas relações pessoais. Evoco, aqui, o poema ―Boca da Noite‖, um dos últimos de Odylo Costa, filho, talvez o seu penúltimo poema, onde dizia:‖Nem alegria ou dor, calor ou frio. No mundo ponho uns olhos bons de avô: foi a boca da noite que chegou‖. Pois foi com os ―olhos bons de avô‖ que José Maria Ramos Martins olhava o mundo e todos à sua volta. Por isso, acima de tudo, foi um homem bom, correto e cordato. Sua alargada e profícua carreira jurídica – como professor emérito e educador consagrado – ele a exerceu com raro fulgor e elevada dignidade. Tem ela marcas profundas em nossa cultura. Daí se dizer que ele jamais estará ausente do universo jurídico maranhense. Agradecimentos Ao encerrar minhas palavras, quero aqui expressar minha preocupação que entendo ser de todos os que militam - quer na magistratura quer na advocacia ou mesmo no ensino jurídico-, com os rumos da nossa incipiente democracia. As instituições nacionais estão em crise e os poderes políticos do Estado brasileiro em visível rota de colisão. Mas sob nenhum pretexto seria admissível a perda da independência ou da redução das funções políticas de qualquer dos poderes, ainda que as relações sigam conflituosas. Rui Barbosa dizia que ―a política é a atmosfera do Direito. É ela quem lhe determina os contornos‖. Porém hoje nessa quadra da nossa história não estamos discutindo somente a relação entre o juízo normativo e o juízo político, a relação entre o direito e a política. Para além disso, em última análise, o que está em causa é a preservação do Estado Democrático de Direito, dos princípios universais que o animam e que devem estar a salvo das mazelas da vida nacional. Devo agora encerrar agradecendo ao presidente da Academia Maranhense de Letras, professor João Batista Ericeira e aos ilustres acadêmicos que recepcionaram o meu nome, parabenizando, ainda, aos ilustres colegas que comigo tomam assento nesta casa na noite de hoje, os advogados Luis Augusto de Miranda Guterres e Carlos Eduardo de Oliveira Lula. Meus agradecimentos às autoridades, aos amigos e convidados, cujas presenças honram e abrilhantam esta solenidade e muito especialmente à minha mulher Silvânia.


A DEMOCRÁTICA ARTE DE JULGAR OSMAR GOMES DOS SANTOS Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras. Julgar! As nações evoluíram ao longo dos séculos e passaram da barbárie para um estado de equilíbrio social fundado nas normas que regem a conduta de cada cidadão. Na organização e divisão de poderes, restou ao Judiciário aplicar a lei a cada caso concreto. No mister dessa árdua missão de decidir, um episódio em especial deve ser destacado: a cerimônia, a ritualística, em torno da instituição do Tribunal do Júri. Desde as tratativas iniciais até a sentença o cerimonial segue uma mística peculiar, trabalhosa, porém democrática, no julgamento dos crimes dolosos contra a vida. Promotores e advogados, operadores do Direito que, respectivamente, sustentam suas teses de acusação e defesa seguem ritual que vão das vestimentas apropriadas até representações fáticas, com intuito de incorporar o espírito daquilo que defendem para convencer os jurados. O dom da oratória é percebido na retórica lógica e minimalista, que visa a narrar, a descrever, a desenhar os fatos. O encadeamento de ideias é exposto por ambos os lados. É um vale tudo, obviamente dentro dos limites legais, no propósito de tornar aceitável, acreditável, as teses que propõem aos jurados. Ao magistrado, cabe a parte essencial que é preparar o processo para que ele seja levado a júri popular obedecendo ao devido processo legal. Sobre esse ponto especial, convém rememorar o que preconiza a nossa Constituição Federal no que tange à instituição Tribunal do Júri. Defende a Carta Magna que ao júri será garantida a plenitude de defesa; o sigilo das votações proferidas pelos jurados; e a soberania dos veredictos, ou seja, a última palavra caberá ao Conselho de Sentença. Condenar ou absolver não é o ponto nevrálgico que se pretende analisar nestes breves escritos. A cada reunião do dito conselho, salvo desclassificação para crime da competência da justiça criminal comum, não há outro resultado além desses dois mencionados, não há empate, apenas culpado ou inocente. Todavia, o mais fascinante é que tal decisão cabe ao cidadão comum e não ao juiz natural do processo. No júri, cada um dos sete jurados é juiz de sua própria razão. Ouve, analisa, sentencia. Decisão esta que se fundamenta no conjunto de provas apresentado, às vezes exaustivamente, pela defesa ou pela acusação. É o momento em que a sublime arte de julgar está, por assim dizer, nas mãos da própria sociedade. Ser jurado é bem mais que uma obrigação. Poder exercer relevante papel dentro da estrutura de um poder constituído é uma função das mais nobres, que eleva aquele que a cumpre seguindo os preceitos éticos. Ao ser escolhido como jurado, o cidadão passa a fazer parte de um seleto grupo de indivíduos com comprovada idoneidade moral. A função é considerada pela lei um serviço público de relevância, assegurando ao jurado outros benefícios, como preferência quando da ocorrência de empate na disputa em concurso público. Vantagem também usufruída por aquele que já é servidor público, podendo a função de jurado ser garantia de desempate em casos de promoção ou remoção na carreira. Mas participar do júri é algo que transcende as questões colocadas. O escolhido tem a possibilidade de participar da mais verdadeira representação democrática encarnada no seio do processo judicial criminal, com todo seu embate teórico e as nuances psicológicas que dão contorno a um caso concreto da vida real. Sete cidadãos de cores, credos, classes, religiões, posições e papeis sociais diversos. Sete histórias distintas, todos iguais! Sim, no Conselho de Sentença, as diferenças se igualam, ainda que por um curto lapso temporal. Os jurados são protagonistas, ―donos das canetas‖, livres para deliberar seguindo apenas a própria consciência e convicção, sem influências externas ou mesmo entre os próprios jurados. Ganha o cidadão, ganha o Estado e ganha a nação enquanto ente constituído. O empoderamento dos indivíduos na busca de soluções práticas para os problemas cotidianos contribui para o fortalecimento da democracia e para o compartilhamento de responsabilidade entre as instituições e sociedade na missão consolidar a paz social.


O CENTENÁRIO DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO Assim, a antiga Faculdade de Direito do Maranhão, por um imperativo das novas nomenclaturas e organicidades acadêmicas passou a ser, a partir de 1966, simplesmente o Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão. E daquela data até hoje já se vão 52 anos! Sergio Tamer* *Discurso feito em 28 de abril de 2018, no auditório da Associação Comercial, por ocasião das celebrações do centenário de criação da Faculdade de Direito do Maranhão. http://cecgp.com.br/noticias/1962-o-centenario-da-faculdade-de-direito-do-maranhao-por-sergio-tamer

Tenho muito orgulho de integrar as solenidades comemorativas do Centenário da Faculdade de Direito do Maranhão, representando o Centro de Estudos Constitucionais e de Gestão Pública, o CECGP. A editora CECGP e eu particularmente, como ex-aluno do curso de Direito da UFMA, temos a satisfação de apresentar, neste evento, duas obras que vem se juntar a outras de significativa importância (como aquela organizada por Antonio Oneildo Ferreira e Rossini Corrêa e o livro de Ana Luiza Ferro). Essas obras são: ―Discursos Solenes‖ – de minha autoria, e ―Temas Constitucionais‖ que reúne uma plêiade de notáveis juristas do Maranhão e da Península Ibérica. Estas celebrações - deve-se sublinhar-, tocam diretamente a todas as instituições de ensino jurídico do Estado, herdeiras que são, também, juntamente com a Universidade Federal do Maranhão, daquele tronco central que surgiu com o nome de Faculdade de Direito do Maranhão e que se consolidou ao longo de sua existência, espargindo luzes sobre todo o universo jurídico maranhense o que possibilitou, mais recentemente, a sua ramificação por dezenas de outras faculdades de Direito. Assim, como forma de reconhecer a sua história a OAB-MA e a Escola Superior de Advocacia – ESA-MA, por meio do incansável trabalho do professor João Batista Ericeira, criaram ainda no mês de agosto de 2017, durante a VIII Conferência Estadual da Advocacia, a Comissão Organizadora do ―Centenário da Faculdade de Direito do Maranhão‖, da qual também fazem parte o Conselho Federal da OAB, a Academia Maranhense de Letras (AML), a Academia Maranhense de Letras Jurídicas (AMLJ), o Centro de Estudos Constitucionais e de Gestão Pública (CECGP), a Universidade Federal do Maranhão (UFMA), a Universidade Estadual do Maranhão (UFMA), a Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão (UNISULMA), o Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IEMA), o Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM), a Escola de Formação de Governantes (EFG) e o Centro Ignácio Rangel. O CECGP, dessa forma, como integrante da Comissão Organizadora do centenário não poderia deixar de lançar estas duas obras que hoje trazemos a este evento e que em boa medida enaltecem as letras jurídicas maranhenses. Mas se faz necessário, agora, lançar um breve olhar sobre os primórdios da nossa antiga Faculdade de Direito. Conforme os fatos registrados pelo jornal A Pacotilha, que deu um merecido destaque aquele momento histórico, em 29 de abril de 1918 era publicada a seguinte notícia: ―Como noticiamos realizou-se ontem, na Biblioteca Pública, uma numerosa e seleta reunião para se decidir se convinha fundar, nesta capital, uma faculdade livre de direito.‖ ―O senhor Domingos de Castro Perdigão, diretor daquele estabelecimento e autor da iniciativa, propôs que presidisse o Dr. Henrique José Couto, secretário do interior e da instrução, a quem ladearam os senhores Drs. Alfredo de Assis e Fran Paxeco.‖ (...)


Com a palavra, justificou assim Perdigão aquela iniciativa: ―Quando todos os outros estados da república levantam escolas superiores, que vão sendo equiparadas, pelo governo federal, aos institutos oficiais, a Atenas Brasileira não pode, nem deve conservar-se indiferente ao progresso intelectual do Brasil‖. A comissão organizadora era constituída, portanto, por Domingos de Castro Perdigão, Alfredo de Assis, Almeida Nunes, Antônio Lopes e Fran Paxeco. Coube a este ler o projeto de Estatuto da associação incorporadora da Faculdade de Direito do Maranhão, em cujo art. 1º está dito: ―Fica fundada uma associação, nesta capital, com o fim de organizar um instituto superior de estudos sociais, econômicos e jurídicos, que se denominará Faculdade de Direito do Maranhão.‖ E nos demais artigos, onde fica clara a natureza privada da recém criada instituição, lê-se: Art. 3º - Na primeira das suas reuniões, a mesma assembleia elegerá uma diretoria provisória da sociedade, que se comporá de um presidente, um vice-presidente, dois secretários, um tesoureiro. Art.4º - Competirá a essa diretoria fazer o estatuto da corporação, e o regulamento da faculdade, elaborando-os de acordo com as leis federais do ensino, em vigor. Assim que estejam prontos, submeté-los-á ao voto da assembleia geral, que elegerá a diretoria bienal e o corpo docente. Art. 5° - Os sócios fundadores contribuirão com a jóia que lhes aprouver e uma quota de vinte mil reis anuais, pagos por trimestre, ou duma única vez. Art. 6º- Os sócios referidos terão o desconto de 50%, em todas as despesas letivas da faculdade, para ele, os seus filhos ou tutelados. Art. 7º - Logo que a sociedade possua rendas bastantes, ou que a faculdade obtenha subvenção dos poderes públicos, a diretoria determinará os vencimentos do magistério, sujeitando o seu ato a assembleia geral. Art. 8º - Se os meios da faculdade lhe permitirem sustentar-se por si própria, ou viera ser mantida pelos cofres públicos, cessará a contribuição dos sócios. Essa iniciativa foi possível graças à primeira Constituição republicana, de 1891, que permitiu que governos estaduais e a iniciativa privada implantassem cursos no país. A Faculdade de Direito do Maranhão foi, dessa forma, a 11ª instituição de formação jurídica no Brasil. Antes dela registramos a de São Paulo e Olinda (1827); Bahia e Rio de Janeiro (1891); Minas Gerais e Rio Grande do Sul (1900); Pará (1902); Ceará (1903); Amazonas (1909) e Paraná (1912). E como vimos foi uma Associação, de natureza privada, que originalmente cuidou desse empreendimento educacional pioneiro, fornecendo-lhe os meios de manutenção e organização. Em 16 de fevereiro de 1924 fora a Faculdade de Direito do Maranhão equiparada aos estabelecimentos federais congêneres com a aprovação do seu projeto pelo Conselho de Ensino Superior - projeto esse encampado a partir daí pelo Governo do Estado. Mas após alguns percalços políticos e administrativos foi ela fechada em 1939 para ressurgir federalizada em 1945 por meio do Decreto nº 17.558 de 10 de janeiro. Seu reconhecimento acadêmico verificou-se pelo Decreto nº 24.135 de 28 de novembro de 1947.


Porém, somente em outubro de 1966, por força da Lei 5.152 que criou a Fundação Universidade do Maranhão, foi a nossa vetusta Faculdade de Direito acolhida e agasalhada na estrutura da nova instituição que se criara. Assim, a antiga Faculdade de Direito do Maranhão, por imperativo das novas nomenclaturas e organicidades acadêmicas passou a ser, a partir de 1966, simplesmente o Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão. E daquela data até hoje já se vão 52 anos! Dessa forma, sua trajetória pode ser assim resumida: da sua criação em 1918 até o ano de 1924 (seis anos), teve ela natureza privada mercê da iniciativa de seus fundadores, ilustres jurisconsultos e abnegados idealistas; a partir de 1924 até o ano de 1939 (15 anos) fora encampada (na expressão usada por João Batista Ericeira), pelo governo estadual; de 1939 até o ano de 1945 (por 6 anos) mante-se fechada; de 1945 até o ano de 1966 (durante 21 anos) existiu como faculdade federal isolada até integrar-se definitivamente, a partir de 1966, à estrutura da recém criada Fundação Universidade Federal do Maranhão. Portanto, as celebrações dos 100 anos de fundação da Faculdade de Direito do Maranhão devem ser compartilhadas, como de fato estão, entre a Universidade Federal do Maranhão e todas as demais instituições jurídicas do nosso Estado, já que elas, juntas, são herdeiras desse grandioso legado que nos foi transmitido por aquele punhado de homens de visão, a exemplo de Domingos Perdigão e de Fran Paxeco. Nossos efusivos cumprimentos a todos os que integram essa auspiciosa programação e que os cursos jurídicos de nosso Estado possam se fortalecer seguindo sempre o exemplo daqueles pioneiros que nos deram esse extraordinário exemplo de apreço à cultura jurídica e de elevada visão social e humanista.


A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO FRENTE À LEGISLAÇÃO DE ENSINO – 1918/1941

LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão Academia Ludovicense de Letras

Em 2018 comemora-se o centenário da criação da ―Faculdade de Direito do Maranhão‖, fato ocorrido a 28 de abril de 1918. Depois de 23 anos de funcionamento, vem notícia de seu descredenciamento, causado por irregularidades, segundo as autoridades de ensino da época, porém nunca explicitadas, causando o encerramento de suas atividades. Dino (1996; 2014)185, comenta que teve inicio já em 1939 um processo de destruição lenta e gradual da velha Faculdade. Pergunta: quando precisamente? Donde começou? Quem assumiu a responsabilidade do processo de cassação da Faculdade de Direito do Maranhão? Para ele, não se sabe... Ninguém quis ou quer assumir oficialmente tal responsabilidade... Esse processo vem de antes de 1939, creio eu. A análise dos fatos dá como causa principal as mudanças políticas em decorrência da instalação do Estado Novo186, e, principalmente as irregularidades que vinham acometendo a administração. Seu inicio, pois, está em 1930, quando o Governo Provisório do Norte decretou o encerramento das aulas; também, como causas, os concursos para professores catedráticos, iniciados naquele ano, que se apresentaram, no decorrer do período, eivado de vícios. Como contribuiu as constantes mudanças na legislação de ensino, principalmente no que se refere ao ingresso de novos acadêmicos, com ginasianos fazendo curso de habilitação complementar ao concluir a quinta série, e após realização de dois anos de Cursos Complementares. Motivo de avisos de irregularidades na sua execução, além do não cumprimento dos prazos, de ingresso, de matriculas, de realização de provas, e de encerramento do ano letivo, constantemente descumpridos, o que era motivo de avisos por parte da Divisão de Ensino Superior. A Reforma ―Francisco Campos‖187 previa o fechamento dos institutos superiores que não implantassem os Cursos Complementares, para ingresso nos mesmos. Essa reforma, de 1931, [...] foi marcada pela articulação junto aos ideários do governo autoritário de Getúlio Vargas e seu projeto político ideológico, implantado sob a ditadura conhecida como ―Estado Novo‖. Dentre algumas medidas da Reforma Francisco Campos, estava a criação do Conselho Nacional 185

DINO, Sálvio. A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO (1918-1941). São Luis: EDUFMA, 1996; 2ª edição 2014. Ao se voltar o olhar para a conjuntura da década de 1930, Costa (2017) afirma que esse período inaugura outra etapa do ensino superior no país e, consequentemente, no Maranhão, decorrente das profundas mudanças no cenário político e educacional, resultante do governo Vargas (1930-1945). Surge, então, um aparelho de Estado centralizador no intento de estabelecer seu projeto nacionalista. COSTA, Marcia Cordeiro. A GÊNESE DA EDUCAÇÃO EM NÍVEL SUPERIOR NO ESTADO DO MARANHÃO E POLÍTICA EDUCACIONAL: os embates travados pela sua efetivação e consolidação. VIII JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. São Luis, 22 a 25 de agosto de 2017, UFMA/Programa de Pós-graduação em Políticas Públicas Para Cunha (2017), o período de 1937 a 1945 assinalou a nova fase política e educacional do país, caracterizadas por um conjunto de reformas educativas, que ficaram conhecidas como Leis Orgânicas de Ensino ou Reforma Capanema (MARTINS, 2002). CUNHA, L. A. A UNIVERSIDADE TEMPORÃ: O ENSINO SUPERIOR DA COLÔNIA À ERA DE VARGAS. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980; MARTINS, A. C. P. Ensino superior no Brasil: da descoberta aos dias atuais. ACTA CIRÚRGICA BRASILEIRA, v. 17, São Paulo, 2002. 187 Nome da primeira reforma educacional de caráter nacional, realizada no início da Era Vargas (1930-1945), sob o comando do ministro da educação e saúde Francisco Campos. 186


de Educação e organização do ensino secundário e comercial. Este último foi destinado à ―formação do homem para todos os grandes setores da atividade nacional‖, construindo no seu espírito todo um ―sistema de hábitos, atitudes e comportamentos.‖ Dessa forma, Francisco Campos havia dividido o curso secundário em dois ciclos de cinco e dois anos, respectivamente, o primeiro fundamental, e o segundo complementar, orientado para as diferentes opções de carreira universitária. A lei de 1931 previa, ainda, a criação de um sistema nacional de inspeção do ensino secundário, a ser feito por uma rede de inspetores regionais. (MENEZES, SANTOS, 2001) 188

Somente em 1936 os Cursos Complementares foram criados no âmbito da Faculdade de Direito, embora fosse obrigação do Estado a sua implementação. Houve intensa troca de correspondência entre a Diretoria da Faculdade de Direito do Maranhão e os representantes estaduais na Câmara dos Deputados, solicitando interferência na regularização da Faculdade, haja vista terem implantado o Curso Complementar. Em 1938, em discurso o Sr. Ministro da Educação, referindo-se aos cursos superiores, anunciava que haveria intensa fiscalização nos institutos, em especial os particulares, para sanar as irregularidades constatadas através das inspeções escolares, inclusive, se necessário, com o fechamento dos mesmos.

O CASO DA FACULDADE DE DIREITO Rio (19). Voltou a ser discutido, na ultima reunião do Conselho Nacional de Educação o parecer n. 200, da comissão de ensino superior, referente à cassação das regalias que gosa a Faculdade de Direito do Maranhão. Esse parecer conclue pella aplicação da penalidade. [...](O IMPARCIAL, 20/09).

Após interferência do Interventor Federal, a pedido da diretoria da Faculdade de Direito, e de telegramas mandados pelo Diretório Acadêmico a diversas autoridades federais – Ministro da Educação, Presidente da República, e bancada maranhense, Paulo Ramos recebeu o seguinte telegrama:

RIO, 3 – Off. Interventor Paulo Ramos. Recebi e li com apreço seu telegramma no. 214 sobre situação Faculdade de Direito do Maranhão. Creio que resolução final votada pelo Conselho Nacional de Educação e por mim homologada permitte encaminhamento satisfactorio assumpto, pois manda submeter Faculdade a fiscalização por funcionário idôneo, designado pelo Departamento Nacional Educação. Resultado dessa investigação manifestara governo a resolver em definitivo. [...]

Note-se, no telegrama, ―submeter à fiscalização por funcionário idôneo‖, designado pelo Departamento Nacional de Educação. Estava-se colocando sob suspeita o relatório do Fiscal Federal, dr. Soares de Quadros? Aquele que fora nomeado a pedido do próprio Interventor Federal? E que solicitara sua demissão, da função, poucos meses depois de nomeado, quando ‗estourou‘ o descredenciamento da Faculdade, por irregularidades? 188

MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais Helena dos. Verbete Reforma Francisco Campos. Dicionário Interativo da Educação Brasileira - Educabrasil. São Paulo: Midiamix, 2001. Disponível em: <http://www.educabrasil.com.br/reforma-francisco-campos/>. Acesso em: 26 de dez. 2017.


Na nomeação do Sr. Soares de Quadros o próprio Interventor Federal descumpriu a legislação em que se instituía a função de Inspetor Federal, e suas atribuições189·... Há questionamentos quanto a tal versão, atribuindo essa ação a motivações políticas e não a problemas de caráter eminentemente técnico-administrativo. Dino (1996, p. 76-77)190 relata:

A chamada História Oficial conta que as razões cassatórias foram de caráter eminentemente técnico-administrativo. [...] Uma outra corrente de pensamento sustenta não se poder buscar as primas causas da cassação da velha Faculdade de Direito sem a análise histórica da presença ostensiva do Estado Novo nos setores cultural, econômico e educacional em terras maranhenses.

A LEGISLAÇÃO DE ENSINO SUPERIOR E OS CURSOS JURÍDICOS Em Maranhão, já se tentara a implantação de uma Universidade – a Nova Atenas, antes denominada Atlântida -, sonho de Sousândrade, já constante da Constituição de 1890, em seu artigo 84. Depois, não aprovada na nova carta estadual, em 1894 novas tentativas. Dentre os cursos propostos, o de Direito. Certamente Sousândrade estava atento ao disposto no DECRETO N. 1232 H - DE 2 DE JANEIRO DE 1891 - Approva o regulamento das Instituições de Ensino Jurídico, dependentes do Ministério da Instrucção Publica191:

189

O Decreto nº 11.530, de 18 de Março de 1915, que reorganizou o ensino secundário e o superior na Republica, em seu artigo 13 estabelece a figura do Inspetor de Ensino, com as seguintes atribuições: Art. 14. O inspector inquirirá, por todos os meios ao seu alcance, inclusive o exame de toda a escripta do instituto: a) se este funcciona regularmente ha mais de cinco annos; b) se ha moralidade nas distribuições de notas de exames; c) se os professores manteem cursos particulares frequentados pelos alumnos da academia; d) se as materias constantes dos programmas são suficientes para os cursos de Engenharia, Direito, Medicina ou Pharmacia; e) se, pelo menos, tres quartas partes do programma de cada materia são effectivamente explicadas pelo respectivo professor; f) se ha exame vestibular e se é este rigoroso; g) se a academia possue os laboratorios indispensaveis e se estes são utilizados convenientemente; h) se o corpo docente é escolhido pelo processo de concurso de provas estabelecido na presente lei; i) se as rendas da academia são sufficientes para o custeio de um ensino integral, das materias do curso, ministrado por professores sufficientemente remunerados; j) se a quota de fiscalização é depositada na época legal Art. 15. O inspector apresentará relatorio circumstanciado sobre o que houver visto e colligido a respeito do instituto e, na falta de qualquer dos requisitos enumerados no artigo antecedente, concluirá por aconselhar que se não conceda a pretendida equiparação ás academias mantidas pelo Governo Federal. Art. 16. Não será inspector pessoa ligada por affinidade de qualquer natureza aos directores ou professores da academia, e, quando possivel, não residirá siquer no Estado em que o instituto funccionar. Art. 17. Considera-se terminada a inspecção com o julgamento do relatorio pelo Conselho Superior do Ensino. [...] Art. 19. A nomeação de inspector será annual, embora possa o Conselho designar o mesmo cidadão duas e mais vezes, para inspeccionar varios institutos. Neste ultimo caso receberá tantas quotas quantos forem os institutos inspeccionados. [...] Art. 22. Quando o relatorio do inspector condemnar um instituto, será cassado o direito á equiparação já concedida, não podendo ser de novo requerida dentro de seis annos, embora a academia mude de nome conservando mais de metade do antigo corpo docente. Art. 23. Quando a academia representar contra o inspector ao Conselho Superior e a este parecer que o relatorio foi injusto ou apaixonado, poderá aguardar nova inspecção para aconselhar ao Ministro a applicação da pena comminada pelo artigo antecedente. 190 DINO, Sálvio. A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO (1918-1941). São Luis: EDUFMA, 1996; 2ª edição 2014. 191 DECRETO N. 1232 H - DE 2 DE JANEIRO DE 1891 - Approva o regulamento das Instituições de Ensino Juridico, dependentes do Ministerio da Instrucção Publica


O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituído pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, resolve approvar, para as Instituições de Ensino Jurídico, dependentes do Ministerio da Instrucção Publica, o regulamento que a este acompanha, assignado pelo General de brigada Benjamin Constant Botelho de Magalhães, Ministro e Secretario de Estado dos Negócios da Instrucção Publica, Correios e Telegraphos, que assim o faça executar.

REGULAMENTO PARA AS INSTITUIÇÕES DE ENSINO JURIDICO DEPENDENTES DO MINISTERIO DA INSTRUCÇÃO PUBLICA Art. 1º Para diffusão do ensino juridico manterá o Governo Federal as actuaes Faculdades de Direito e poderá fundar ou subvencionar outras que julgue necessarias.

Em seu Art. 2º, diz que, em cada uma das Faculdades de Direito, poderia haver três cursos: ―[...] o de sciencias juridicas, o de sciencias sociaes, o de notariado‖: Art. 3º O curso de sciencias juridicas comprehenderá o ensino das seguintes matérias: Philosophia e historia do direito; Direito publico e constitucional; Direito romano; Direito criminal, incluindo o direito militar; Direito civil; Direito commercial, incluindo o direito marítimo; Medicina legal; Processo criminal, civil e commercial; Pratica forense; Historia do direito nacional; Noções de economia política e direito administrativo.

Pelo Decreto nº 11.530, de 18 de Março de 1915, é reorganizado o ensino secundário e o superior na Republica: Art. 1º O Governo Federal continuará a manter os seis institutos de instrucção secundaria e superior subordinados ao Ministerio da Justiça e Negocios Interiores, dando-Ihes autonomia didactica e administrativa de accôrdo com as disposições deste decreto.

[...] Art. 5º O Governo manterá uma faculdade official de Medicina no Estado da Bahia e outra no Districto Federal; uma faculdade de Direito em S. Paulo e outra em Pernambuco; uma Escola Polytechnica e um instituto de instrucção secundaria, com a denominação de Collegio Pedro II, na cidade do Rio de Janeiro. Art. 6º O Governo Federal, quando achar opportuno, reunirá em Universidade as Escolas Polytechnica e de Medicina do Rio de Janeiro, incorporando a ellas uma das Faculdades Livres de Direito dispensando-a da taxa de fiscalização e dando-Ihe gratuitamente edificio para funccionar. [...] Art. 26. Não podem ser equiparadas ás officiaes mais de duas academias de Direito, Engenharia ou Medicina em cada Estado, nem no Districto Federal; e, onde haja uma official, só uma particular póde ser a Ella equiparada


A constituição do corpo docente obedecerá o disposto no Decreto de 1915192, que reorganizou o ensino superior: ― CORPO DOCENTE - Art. 36. O corpo docente dos institutos compõe-se de professores cathedraticos, professores substitutos, professores honorarios, professores, simplesmente, e livres docentes. Quando da instituição da Faculdade de Direito do Maranhão a grade curricular ficou assim constituída, relacionando-se os respectivos professores, cuja indicação fora feita pela Associação mantenedora, e aceita pelos lentes catedráticos193: Fica, pois, assim constituída a Grade Curricular, com os respectivos professores:

1º ano Filosofia do Direito – Lopes da Cunha Direito Público e Constitucional – Godofredo Mendes Viana Direito Romano – Raul da Cunha Machado 2º ano Direito Internacional Público – Carlos Humberto Reis Economia Política e Ciência das Finanças – Raimundo Leôncio Rodrigues 2º, 3º e 4º anos Direito Civil – I Cadeira – João Vieira de Souza, filho Direito Civil – II Cadeira – Clodomir Cardoso Direito Civil – III Cadeira – Carlos Augusto de Araujo Costa 3º e 4º anos Direito Comercial – I Cadeira – Luis Carvalho Direito Comercial – II Cadeira – Manoel Jansen Ferreira 3º e 4º anos Direito penal – I Cadeira – Henrique José Couto Direito penal – II Cadeira – Alfredo de Assis Castro 4º ano Teoria do Processo Civil e Comercial – Artur Bezerra de Menezes 5º ano Prática de Processo Civil e Comercial – Aarão A. do Rego Brito Teoria e Prática do Processo Criminal – Alcides Jansen S. L. Pereira Direito Administrativo – João de Lemos Viana Direito Internacional Privado – Antonio Bona De acordo com o Art. 37. ―Compete ao professor cathedratico‖:

192

Decreto nº 11.530, de 18 de Março de 1915, Reorganiza o ensino secundário e o superior na Republica De acordo com o DECRETO N. 1232 H - DE 2 DE JANEIRO DE 1891, os lentes (professores), eram dividios em :Art. 46. Os lentes distinguemse em cathedraticos e substitutos e serão distribuidos por secções; Art. 47. Os cathedraticos são obrigados a reger unicamente as cadeiras para que forem nomeados; Art. 48. Aos substitutos cabem as obrigações mencionadas nos arts. 11, 12 e 13. Art. 49. Os lentes cathedraticos e substitutos são tambem obrigados a tomar parte nos outros actos das respectivas Faculdades; conforme dispõe este regulamento. Os artigos mencionados se referem: Art. 11. Na falta ou impedimento do substituto de alguma secção, o director convidará para reger a cadeira um dos cathedraticos; si nenhum destes annuir ao convite, chamará um dos substitutos, e por ultimo um dos doutores ou bachareis que tiverem cursos particulares ou forem professores de Faculdades livres. Essa regencia interina dará direito a uma gratificação igual a dous terços dos vencimentos do cathedratico substituido. Quer na classe dos cathedraticos, quer na dos substitutos, deverão ser preferidos os lentes da secção em que se der o impedimento. Nenhum substituto será obrigado a reger mais de uma cadeira. Pela regencia da que lhe competir perceberá uma gratificação igual á do substituído; Art. 12. Os substitutos, além da regencia das cadeiras a que são obrigados, no caso de falta ou impedimento dos lentes, farão cursos complementares sobre as materias que o director designar, ouvido o lente respectivo. Os lentes substitutos não deixarão de fazer taes cursos, ainda quando estejam na regencia de cadeira. Art. 13. Haverá um laboratorio para os exercicios praticos de medicina legal e hygiene publica. 193


a) a regencia effectiva da cadeira para a qual foi nomeado; b) a elaboração do programma do seu curso, afim de ser approvado pela Congregação 30 dias antes da abertura das aulas; c) fazer parte das mesas examinadoras, desde que não haja incompatibilidade legal; d) indicar os seus assistentes, preparadores e demais auxiliares; e) submetter a provas oraes ou escriptas os seus alumnos, na primeira quinzena de junho e na segunda de agosto, e conferir-lhes uma nota quando chamados aos trabalhos praticos, afim de deduzir a média annual, que influirá para a nota do exame final, conforme for determinado pelo Regimento Interno; f) ensinar toda a materia constante do programma por elle organizado.

Quanto aos lentes substitutos, que se refere a legislação, são nomeados: 1ª. Sessão – (Filosofia do Direito e Direito Romano) – João da Costa Gomes 2ª. Sessão – (Direito Público e Constitucional, Direito Internacional Público e Privado) – Raul Soares Pereira 3ª. Sessão – (Direito Civil) – Antonio José Pereira, Junior 4ª. Sessão – (Direito Penal, Teoria e prática do Processo Criminal) – Fabiano Vieira da Silva 5ª. Sessão – (Economia Política, Ciência da Finança, e Direito Administrativo) – Inácio Xavier de Carvalho 6ª. Sessão – (Direito Comercial) – Joaquim Pinto Franco de Sá 7ª. Sessão – (Teoria do Processo Civil e Comercial, Prática do Processo Civil e Comercial) – Raimundo Alexandre Vinhais 8ª. Sessão – (Medicina Pública) – Tarquínio Lopes Filho.

Art. 38. Compete ao professor substituto: a) substituir, nos impedimentos temporarios, quaIquer dos cathedraticos da sua secção; b) reger os cursos que lhe forem designados pela Congregação, esgotando os programmas approvados; c) auxiliar, quando necessario, os cathedraticos durante as provas de junho e agosto.

Distribuídas as cadeiras e nomeados os professores, inclusive os substitutos, elegeu-se Diretor da Faculdade o dr. José Viana Vaz, juiz federal; vice-diretor Henrique Couto, Secretário de Interior e Instrução; Secretário, o Sr. Domingos Perdigão, Diretor da Biblioteca Pública. Para a indicação e nomeação dos lentes, é a seguinte a legislação estabelecida: DOS LENTES CATEDRATICOS Art. 87. As cadeiras serão divididas em secções, na fórma do art. 9º 194 194

Art. 9º As cadeiras dos differentes cursos serão distribuidas pelas secções seguintes, cada uma das quaes terá um substituto: 1ª SECÇÃO Philosophia e historia do direito; Direito publico e constitucional; Direito das gentes, diplomacia e historia dos tratados; Explicação succinta do direito patrio constitucional e administrativo. 2ª SECÇÃO Direito civil, duas cadeiras; Direito commercial, duas cadeiras; Explicação succinta do direito patrio civil, commercial e criminal. 3ª SECÇÃO Direito romano; Historia do direito nacional; Direito criminal; Noções de legislação omparada sobre o direito privado. 4ª SECÇÃO Economia politica; Sciencia das finanças e contabilidade do Estado; Sciencia da


Art. 88. Vagando alguma cadeira, será para ella nomeado o substituto da respectiva secção. Art. 89. Vagando uma cadeira em alguma secção, onde se ache tambem vago o logar de substituto e não se tenha ainda aberto o respectivo concurso, poderá o Governo, depois de ouvir a congregação, prover directamente a referida cadeira, nomeando ou contractando, sem concurso, pessoa que reuna os seguintes requisitos: 1º, haver se distinguido nos cursos da Faculdade que frequentou; 2º, ter exercido, com distincção e por mais de tres annos, o magisterio superior, ou ter feito sobre as materias da secção a que pertence a cadeira vaga, publicações importantes, ou ser indicado por dous terços dos membros da congregação; 3º, possuir as habilitações mencionadas nos arts. 96 e 97195. SECÇÃO 2ª - DOS LENTES SUBSTITUTOS Art. 90. As nomeações dos lentes substitutos se farão por meio de concurso. Art. 91. Poderá o Governo, independente de concurso, mas ouvindo a congregação, nomear ou contractar para os logares de substitutos pessoas que reunam os requisitos mencionados nos ns. 1, 2 e 3 do art. 89196.

A Faculdade de Direito do Maranhão foi uma iniciativa particular, acalentado de há muito: desde os princípios do Brasil como Reino Unido à Portugal e Algarves, pois com a presença da família Real no Rio de Janeiro, o Príncipe Regente D. João VI tomou uma série de medidas visando melhorar a situação do ensino no país, inclusive o ensino superior. O regente chegou a prometer uma faculdade ao Maranhão, pela carta régia de 29/12/1815 e ―que lamentavelmente não chegaria a se fazer realidade‖ (MEIRELES, 1995)197. Informa-nos Rossini Corrêa (2017, p. 148) 198: [...] quando da inauguração do ensino superior brasileiro, proibido pelo colonialismo português, e conquistado com a autonomia administrativa, o Maranhão procurou, com obstinação, ser o vencedor da carreira, abrigando, em São Luis, a primeira Faculdade de Direito do Brasil. Para o Autor, foi uma batalha perdida...

DOS CURSOS E ESTABELECIMENTOS PARTICULARES Art. 419. E' permittido a qualquer individuo ou associação de particulares a fundação de cursos ou estabelecimentos, onde se ensinem as materias que constituem o programma de qualquer curso ou Faculdade federal, salva a inspecção necessaria para garantir as condições de moralidade e hygiene.

A Faculdade de Direito do Maranhão foi assim constituída, como Faculdade Livre de Direito, conforme o artigo seguinte: FACULDADES LIVRES administração e direito administrativo; Noções de economia politica e direito administrativo. 5ª SECÇÃO Processo criminal, civil e commercial; Pratica forense; Explicação succinta do direito patrio processual. 6ª SECÇÃO Medicina legal; Hygiene publica. 195 Art. 96. Poderão ser admittidos a concurso os brazileiros que estiverem no gozo dos direitos civis e politicos e possuirem o gráo de doutor ou bacharel em sciencias sociaes e juridicas pelas Faculdades federaes ou a estas equiparadas; ou que, tendo esses gráos por academias estrangeiras, se houverem habilitado perante alguma daquellas Faculdades. Art. 97. Poderão tambem inscrever-se os estrangeiros que, possuindo alguns daquelles gráos, fallarem correctamente portuguez. No caso de serem graduados por academias estrangeiras ficam, porém, sujeitos á habilitação prévia, salvo si tiverem sido professores de Faculdades estrangeiras reconhecidas pelos respectivos Governos. 196 Art. 89. Vagando uma cadeira [...]1º, haver se distinguido nos cursos da Faculdade que frequentou; 2º, ter exercido, com distincção e por mais de tres annos, o magisterio superior, ou ter feito sobre as materias da secção a que pertence a cadeira vaga, publicações importantes, 196 ou ser indicado por dous terços dos membros da congregação; 3º, possuir as habilitações mencionadas nos arts. 96 e 97 . 197 MEIRELES, Mário. O ensino superior no Maranhão: esboço histórico. In ____. DEZ ESTUDOS HISTÓRICOS. São Luís: ALUMAR, 1995, P. 45-94 198 CORRÊA, José Rossini Campos do Couto. FORMAÇÃO SOCIAL DO MARANHÃO – o presente de uma arqueologia. 2 ed. São Luis: Engenho, 2017. Biblioteca Básica Maranhense – volume II.


Art. 420. Aos estabelecimentos particulares que funccionarem regularmente poderá o Governo, com audiencia do Conselho de Instrucção Superior, conceder o titulo de Faculdade livre, com todos os privilegios e garantias de que gozarem as Faculdades federaes. As Faculdades livres terão o direito de conferir aos seus alumnos os gráos academicos que concedem as Faculdades federaes, uma vez que elles tenham obtido as approvações exigidas pelos estatutos destas para a collação dos mesmos gráos. Art. 421. Os exames das Faculdades livres serão feitos de conformidade com as leis, decretos e instrucções que regularem os das Faculdades federaes e valerão para a matricula nos cursos destes. O Conselho de Instrucção Superior nomeará annualmente commissarios que assistam a esses exames e informem sobre a sua regularidade. Art. 422. Em cada Faculdade livre ensinar-se-hão pelo menos todas as materias que constituirem o programma da Faculdade federal. Art. 423. Cada Faculdade livre terá a sua congregação de lentes com as attribuições que lhe forem dadas pelo respectivo regimento. Art. 424. A infracção das disposições contidas neste titulo sujeita a congregação a uma censura particular ou publica do Governo, o qual, em caso de reincidencia, multará a associação em 500$ a 1:000$ e por ultimo poderá suspender a Faculdaade por tempo não execedente de dous annos, devendo sempre ouvir o Conselho de Instrucção Superior. Emquanto durar a suspensão, não poderá a Faculdade conferir gráos academicos, sob pena de nullidade dos mesmos. Art. 425. Constando a pratica de abusos nas Faculdades livres quanto á identidade dos individuos nos exames e na collação dos gráos, cabe ao Governo, ouvindo o Conselho de Instrucção Superior, o direito de mandar proceder a rigoroso inquerito para averiguação da verdade, e, si delle resultar a prova dos abusos arguidos, deverá immediatamente cassar á instituição o titulo Faculdade livre, com todas as prerogativas ao mesmo inherentes. Art. 426. A Faculdade livre que houver sido privada deste titulo não poderá recuperal-o sem provar que reconstituiu-se de maneira a offerecer inteira garantia de que os abusos commettidos não se reproduzirão.

A reforma de 1931199 estabelece a instituição de universidade, no Brasil, mas mantém as escolas isoladas: Art. 6º As universidades brasileiras poderão ser creadas e mantidas pela União, pelos Estados ou, sob a fórma de fundações ou de associações, por particulares, constituindo universidades federaes estaduaes e livres. Paragrapho unico. Os governos estaduaes poderão dotar as universidades por elles organizadas com patrimônio proprio, mas continuarão obrigados a fornecer-lhes os recursos financeiros que se tornarem necessarios a seu regular funccionamento. Art. 7º A organização administrativa e didactica de qualquer universidade será instituida em estatutos, approvados pelo Ministro da Educação e Saude Publica, e que só poderão ser modificados por proposta do Conselho Universitário ao mesmo ministro, devendo ser ouvido o Conselho Nacional de Educação. ( DECRETO Nº 19.851, DE 11 DE ABRIL DE 1931).

O Decreto 1915 estabelece o regime escolar: 199

DECRETO Nº 19.851, DE 11 DE ABRIL DE 1931 - Dispõe que o ensino superior no Brasil obedecerá, de preferencia, ao systema universitario, podendo ainda ser ministrado em institutos isolados, e que a organização technica e administrativa das universidades é instituida no


REGIMEN ESCOLAR - EXAMES Art. 73. O anno escolar começará a 1 de abril e terminará a 15 de novembro, comprehendendo cada curso 80 lições. Art. 74. Haverá duas épocas de exames, começando a primeira no dia 1 de dezembro e a segunda a 1 de março. Paragrapho unico. Em caso de grande affuencia de candidatos a Congregação, mediante proposta do director, permittirá que a 20 de novembro comecem os exames da primeira época. Art. 75. A matricula terá logar nos 15 dias que antecedem á abertura, dos cursos, e a inscripção para exames, 10 dias antes daquelle em que devem começar. Paragrapho unico. A data fixada para inicio dos exames, bem como a da abertura dos cursos, não póde ser transferida para mais tarde, senão em caso de calamidade publica reconhecida pela Congregação. Art. 76. Inscrever-se-ão para os exames da segunda época os candidatos que não forem alumnos da academia, os alumnos que não se apresentaram na primeira época por motivo de força maior devidamente comprovada, e os que tiverem sido reprovados ou deixado de ser examinados em uma só materia, na primeira época. Art. 77. Para requerer matricula nos institutos de ensino superior os candidatos deverão provar: a) edade minima de 16 annos; b) idoneidade moral; c) approvação no exame vestibular. Paragrapho unico. Em caso de exame vestibular verdadeiramente brilhante poderá a Congregação permittir a matricula de candidatos que não hajam attingido a edade legal. Art. 78. O candidato a exame vestibular deve exhibir: a) certificado de approvação em todas as materias que constituem o curso gymnasial do Collegio Pedro II, conferido pelo mesmo collegio ou pelos institutos a elle equiparados, mantidos pelos governos dos Estados e inspeccionados pelo Conselho Superior do Ensino; b) recibo da taxa estipulada no Regimento Interno. Paragrapho unico. Nos Estados onde não houver gynmasio mantido pelo Governo, as Congregações dos institutos superiores equiparados aos officiaes podem organizar commissões de examinadores do curso gyinnasial, presidida por um professor da faculdade. Estes exames são validos sómente perante a academia que os instituiu. Art. 79. O candidato que tiver certificado de curso completo de gymnasio estrangeiro, authenticado pela mais alta autoridade consular brazileira da cidade onde o instituto funcciona., e acompanhado da prova official de que o titulo exhibido era acceito pelas academias do paiz, póde inscrever-se para o exame vestibular. Art. 80. O exame vestibular comprehenderá prova escripta e oral. A primeira consistirá na traducção de um trecho facil de um livro de litteratura franceza e de outro de autor classico allemão ou ingIez, sem auxilio de diccionario. Paragrapho unico. E' prohibida a inclusão do titulo dos livros que servirão para exame, no Regimento Interno ou nos programmas dos cursos. Art. 81. A prova oraI do exame vestibular versará sobre Elementos de Physica e Chimica e de Historia Natural, nas Escolas de Medicina; sobre Mathematica Elementar, na Escola Polytechnica, e sobre Historia Universal, Elementos de Psychologia e de Logica e Historia da Philosophia por meio da exposição das doutrinas das principaes escolas philosophicas, nas Faculdades de Direito. presente Decreto, regendo-se os institutos isolados pelos respectivos regulamentos, observados os dispositivos do seguinte Estatuto das Universidades Brasileiras.


Art. 82. O exame vestibular será julgado por uma commissão de professores do Collegio Pedro II ou de instituto estadoal a elle equiparado ou de professores de incontestavel competencia, sob a presidencia de um professor da academia. Art. 83. O exame vestibular terá logar em janeiro.

Logo, em 1926, começam a se alterar a situação dos alunos matriculados: DECRETO Nº 5.121, DE 29 DE DEZEMBRO DE 1926, Antecipa a 1ª época de exames para os alunos das Escolas Jurídicas do Brasil que devam terminar o curso em 1927:

Art. 1º Fica antecipada para a segunda quinzena de julho de 1927, a primeira época de exames para os alumnos das Escolas juridicas do Brasil que terminarem o curso naquelle anno, devendo a collação de gráo realizar-se solemnemente, em 11 de agosto. § 1º O inicio do anno lectivo para os mencionados alumnos será igualmente antecipado para 1 de janeiro de 1927. § 2º Os alumnos que prestarem, em segunda época, os exames do 4º anno actual, de accôrdo com as leis em vigor, poderão matricular-se, condicionalmente, no periodo da antecipação, que estabelece o § 1º, na classe immediatamente superior. Art. 2º Os estudantes que pretenderem seguir os cursos de ensino superior e que terminaram o curso gymnasial ou de preparatorios até o anno de 1925, poderão prestar exame vestibular na segunda quinzena de janeiro de 1927 para fazerem exame do primeiro anno, em segunda época, perante as Faculdades cuja lotação de alumnos não estiver completa. Paragrapho unico. A inscripção para exame vestibular será na primeira quinzena do referido mez de janeiro de 1927. Art. 3º As pessoas que exhibirem diploma conferido por faculdade estrangeira, authenticado pelo consul do Brasil e valido para o exercicio da profissão, si quizerem obter a revalidação do diploma estrangeiro por academia, faculdade ou escola brasileira, deverão apresentar theses sobre tres das cadeiras de qualquer dos annos do curso correspondente, sustentando-as oralmente, além de um exame pratico, sempre que fôr possivel. Paragrapho unico. A revalidação do diploma de que trata este artigo, não terá logar si o candidato não lograr approvação na defesa das theses e na prova pratica quando exigida.

Conforme ―A Pacotilha‖ de 03 de janeiro de 1927, o dr. Furtado da Silva, inspetor federal junto à Faculdade de Direito do Maranhão, recebera do Departamento Nacional de Ensino cabograma para ‗cuja leitura chama a atenção dos bacharelandos‘:

Inspector da Faculdade de Direito do Maranhão, RIO, 31 (Via Western) – Recomendo-vos providencieis no sentido de serem cumpridas as disposições contidas nos artigos 1º e 2º decreto legislativo numero 5.121, de 29 de dezembro do corrente anno, assim redigidos: artigo primeiro, fica antecipada para segunda quinzena de julho de 1927 a primeira época de exames para os alumnos das escolas jurídicas do Brasil que terminarem o curso naquelle anno, devendo a collação de grau realizer-se solenemente, a 11 de agosto. Paragrapho primeiro, o


inicio do anno letivo para os mencionados alumnos será igualmente antecipado para primeiro de janeiro de 1927. Paragrapho segundo,os alumnos que prestarem na segunda época os exames do quarto anno actual, de acordo com as leis em vigor, poderão matricular-se condicionalmente, no período de antecipação que estabelece o paragrapho primeiro, na classe imediatamente superior. Artigo segundo, os estudantes que pretenderem seguir os cursos do ensino superior e que terminaram o curso gymnasial ou preparatórios até o anno de 1925, poderão prestar exame vestibular na segunda quinzena de 1927, para fazerem exame de primeiro anno em segunda época, perante as faculdades cuja lotação de alumnos não esteja completa. Paragrapho único, a inscrição de exame vestibular será na primeira quinzena do referido mez de janeiro de 1927. Saudações, Dr. Rocha Vaz.

―O Combate‖ de 25 de outubro de 1930 publica nota, informando sobre o encerramento das aulas da Faculdade de Direito, por determinação do Governo Provisório do Norte do Brasil200:

Logo em seguida, saí Decreto201 em que os alunos são ‗aprovados‘, melhor, ‗promovidos‖: Art. 1º Ficam promovidos, independentemente de exames, á serie ou ano superior imediato, na presente época do atual ano letivo, os alunos matriculados nos cursos superiores oficiais, oficializados e equiparados, bem como nos institutos de ensino artístico superior subordinados ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores, desde que comprovem haver frequentado mais de metade das aulas dadas em cada cadeira. § 1º Para comprovar a frequência a aluno apresentará, conforme o regime escolar a que esteja sujeito, informação da Secretaria do respectivo instituto ou atestado firmado pelo professor ou docente que houver lecionado. 200

O Norte e o Governo Provisório: Juarez Távora e os revolucionários nortistas: Durante a campanha presidencial de 1929-1930, a Aliança Liberal recebe rápidas adesões no Norte, ao assumir como uma de suas bandeiras a luta contra a submissão política dos governos estaduais frente ao governo central. Os aliancistas conseguem unir, desta forma, setores sociais de interesses bem diversos e até mesmo contraditórios. É essa situação específica que dá ao movimento de 30 no Norte um caráter bastante amplo e popular, encontrando poucas resistências [...]PANDOLFI, Dulce. A trajetória do Norte: uma tentativa de ascensão político. In: GOMES, Angela de Castro (org.). Regionalismo e Centralização política: partidos e Constituinte nos anos 30. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1980, p. 342. Para Lopes (2011), com esse pequeno parágrafo, Dulce Pandolfi consegue resumir bem o que significou o movimento de outubro de 30 na região Norte do Brasil: um movimento amplo, marcado pelo apoio da população, onde os “revolucionários” quase não encontraram resistência por parte dos governistas. A vitória veio através de uma campanha militar que tomou as guarnições militares da região, com alguma participação de voluntários civis. [...] Entendo como Norte a área político-geográfica formada pelos estados que abrangem as atuais regiões Norte e Nordeste, além do Espírito Santo. O Norte, nesse sentido, era compreendido pelo território federal do Acre e por doze estados: Amazonas, Pará, Piauí, Maranhão, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Espírito Santo. In LOPES, Raimundo Helio. A Delegacia Militar do Norte e o Governo Provisório: disputas políticas e a nomeação dos interventores nortistas. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História – ANPUH • São Paulo, julho 2011

201

Decreto nº 19.404, de 14 de Novembro de 1930, Dispõe sobre a promoção escolar nos institutos de ensino subordinados ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores.


§ 2º Serão considerados habilitados, para os efeitos da conclusão do curso, os alunos matriculados no último ano de cada instituto, que satisfizerem a condição de frequência exigida neste artigo. Art. 2º Ficam igualmente promovidos ao ano superior imediato os alunos matriculados no Colégio Pedro II, nos institutos a ele equiparados ou em inspeção preliminar, e os alunos do curso seriado ou de preparatórios dos institutos particulares de ensino secundário, que já tenham requerido nomeação de juntas examinadoras, desde que reunam as seguintes condições: 1º, haver frequentado mais de metade das aulas dadas em cada matéria; 2º, haver obtido no mínimo a média anual de 3,50. § 1º No Colégio Pedro II a comprovação da frequência e da média exigidas será feita mediante informação da Secretaria ao diretor. § 2º Nos institutos equiparados ao Colégio Pedro II e nos em inspeção preliminar a comprovação será feita por informação escrita e motivada do diretor ao inspetor do instituto. § 3º Nos institutos particulares que já requereram juntas examinadoras para os seus alunos tanto do curso seriado, como de preparatórios e de admissão, a comprovação será feita por informação escrita e motivada do diretor ao inspetor, especialmente designado para esse fim. § 4º O inspetor designado na forma do parágrafo antecedente verificará nos livros do instituto a exatidão das informações prestadas pelo diretor com referência á frequência e média dos alunos, bem como da regularidade das respectivas matrículas, enviando ao Departamento Nacional do Ensino uma ata autentica, tambem assinada pelo diretor, que servirá de base para expedição, no Departamento, dos respectivos certificados de promoção e habilitação, § 5º As disposições do presente decreto relativas aos institutos particulares de ensino secundário que já tenham requerido juntas examinadoras só serão aplicaveis aos alunos cujos nomes constem das relações existentes e registadas no Departamento Nacional do Ensino. Art. 3º Para os efeitos de promoção e habilitação no último ano do curso das quais trata o presente decreto, os alunos requererão ao diretor do instituto a respectiva inscrição, mediante o pagamento das taxas legais de exame, revertendo essas taxas aos institutos de ensino superior integralmente para o respectivo patrimônio. Art. 4º No período de 3 de outubro a 14 de novembro serão, respectivamente, atribuidas a cada aluno a melhor média mensal e frequência integral.

Em conseqüência, o diretor da Faculdade baixa o seguinte aviso:

O Sr. Dr. Director da Faculdade de Direito do Maranhão recebeu do Departamento Nacional de Ensino os seguintes telegramas: RIO, 20 – Communico-vos para os devidos fins que o governo expediu, a 14 do corrente mez, o decreto 19.404, regulando a promoção escolar nos institutos de ensino. De accordo com os parágrafos 1 e 2 do art. 1º desse decreto, são promovidos, independentemente de exame, á série ou anno superior immediatos, na presente época do actual anno lectivo, os alumnos matriculados que comprovem haver freqüentado mais da metade das aulas dadas em cada cadeira. Para comprovar a freqüência, o alumno apresentará, conforme o regimen escolar a que esteja sujeito, informação da Secretaria do respectivo instituto, ou attestado firmado pelo professor ou docente que houver leccionado. Serão considerados habilitados, para os effeitos da conclusão do curso, os alumnos matriculados no ultimo anno de cada instituto, que satisfizerem as condições de freqüência já especificada. No período de 3 de outubro a 14 de novembro será respectivamente attribuida a cada alumno a freqüência integral.


Os alumnos requererão ao director do instituto a respectiva inscripção, mediante o pagamento das taxas legaes de exames, revertendo estas, integralmente, ao patrimônio do respectivo instituto. Saudações. (a) Aloysio de Castro. RIO, 18 – Comunico-vos para os devidos fins que, segundo aviso expedido a 14 do corrente, pelo Ministério da Justiça e Negócios Interiores, ficam sem effeito os actos referentes ás inscripções para concurso de livres docentes e professores cathedraticos dos institutos de ensino superior e secundário da República. Saudações. (a) Aloysio de Castro. Secretário Geral. Para deliberar sobre os assumptos de que tratam os telegrammas acima terá logar, ás 9 horas do dia 24 do corrente, uma reunião da congregação dos professores da nossa Faculdade de Direito.

A nova legislação, aprovada em 1931202, previa, para admissão nos cursos universitários

Art. 81. A admissão inicial nos cursos universitarios obedecerá as condições geraes abaixo instituidas, além de outras que constituirão dispositivos regulamentares de cada um dos institutos universitarios; I - certificado do curso secundario fundamental de cinco annos e de um curso gymnasial superior, com a adaptação didactica, neste ultimo, aos cursos consecutivos; II - idade mínima de 17 annos; III - prova de identidade; IV - prova de sanidade; V - prova de idoneidade moral; VI - pagamento das taxas exigidas. Paragrapho unico. Ao alumno matriculado em qualquer dos institutos universitarios será fornecido um cartão de matricula devidamente authenticado, que provará a sua identidade, e uma caderneta individual na qual será registado o seu curriculum vitae de estudante, tudo de accôrdo com dispositivos de cada instituto universitario. Art. 82. Não será permitida a matricula semultanea do estudante em mais de um curso seriado, sendo, porém, permittido aos matriculados em qualquer curso seriado a frequencia de cursos avulsos, ou de aperfeiçoamento e especialização.

Já para a aprovação dos acadêmicos, são as seguintes as condições gerais: Art. 83. A verificação de habilitação nos cursos universitarios, seja para a expedição de certificados e diplomas, seja para a promoção aos períodos lectivos seguintes, será feita pelas provas de exame abaixo enumeradas e cujos processos de realização serão discriminados nos regulamentos dos institutos universitarios. a) provas parciaes; b)

provas finaes;

c)

médias de trabalhos praticos de quaesquer outros exercicios escolares.

Art. 84. As provas de exame referidas no artigo anterior serão julgadas por commissões examinadoras, das quaes farão parte, obrigatoriamente, os professores e docentes livres que houverem realizado os respectivos cursos. 202

DECRETO Nº 19.851, DE 11 DE ABRIL DE 1931 - Dispõe que o ensino superior no Brasil obedecerá, de preferencia, ao systema universitario, podendo ainda ser ministrado em institutos isolados, e que a organização technica e administrativa das universidades é instituida no presente Decreto, regendo-se os institutos isolados pelos respectivos regulamentos, observados os dispositivos do seguinte Estatuto das Universidades Brasileiras.


Art. 85. As taxas de exame serão fixadas em tabellas annexas aos regulamentos dos institutos universitarios, que ainda deverão discriminar a gratificação a ser concedida aos membros das commissões examinadoras. Art. 86. Os regulamentos de cada um dos institutos universitarios fixarão a época em que deverão ser prestadas as provas exigidas para expedição de diplomas, ou para a promoção dos estudantes.

Mas estas não foram as únicas intervenções; novas notas davam conta de alterações e instruções seguidas, na promoção de alunos, naquele ano atípico, de 1931, como se vê dessa nota de 3 de dezembro, do Inspetor Federal:

Nova nota, recebida pelo Inspetor Federal, de que havia sido deliberado pelo Sr. Ministro, que a freqüência para a remoção nos termos do decreto 20.735 de 30 de novembro ultimo203, ou para inscrição em exames, seria computada em metade, no mínimo, do numero de aulas efetivamente realizadas. Foi permitida ainda a inscrição em exames de segunda época, aos alunos que não tenham freqüência. Em 1936, nova alteração no sistema de ingresso, conforme nota publicada na imprensa local: O dr. Alcides Pereira, director da Faculdade de Direito, recebeu do Sr. Dr. Director Geral de Educação o seguinte telegrama: Somente poderão requerer inscripção para o exame vestibular em 1936 os alumnos que concluíram a 5ª série em 1934, na 1ª ou 2ª época, ou em annos anteriores, os alumnos que tenham completado preparatório em annos anteriores e aquelles que estão fazendo o curso secundário de acordo com o artigo 100 do decreto 21.241, de abril de 1932204 e concluíram a 5ª serie na segunda 203

Decreto 20.735, de 28 de Novembro de 1931 — Regula a dispensa de exame final ou prova oral, no corrente ano letivo, nos institutos de ensino superior.

204

DECRETO Nº 21.241, DE 4 DE ABRIL DE 1932 - Consolida as disposições sobre a organização do ensino secundário e dá outras providências:

Art. 100. Enquanto não forem em número suficiente os cursos noturnos de ensino secundário sob o regime de inspeção, será facultado requerer e prestar exames de habilitação na 3ª série e, em épocas posteriores, sucesivamente, os de habilitação na 4ª e na 5ª séries do curso fundamental ao candidato que apresentar os seguintes documentos: IV. Certidão, provando a idade mínima de 18 anos, para a inscrição nos exames da 3ª série.


quinzena de janeiro de 1936. Também lembro que deixou de vigorar no anno lectivo de 1936 a disposição que permettia aos estudantes que tivessem seis ou mais preparatórios prestar os restantes nas escolas superiores. Saudações. – Paulo de Assis Ribeiro, Director Geral Interino.

Os secundaristas e ginasianos são convocados a comparecer na Faculdade, para tomarem conhecimento das novas normas de ingresso:

FACULDADE DE DIREITO / CURSO COMPLEMENTAR / SECÇÃO JURÍDICA Os professores encarregados de organizar, pela Congregação da Faculdde de Direito do Estado, a Secção Jurídica do Curso Complementar, creado pelo decreto no. 21.241, de 4 de novembro de 1932205, convidam os alumnos que terminaram, em 1935, a 5ª. Série do curso gynasial, a comparecer á sede da mesma Faculdade, ás 10 horas da próxima segunda-feira, 11 do corrente. RUBEN ALMEIDA / ANTONIO LOPES / GUSMÃO FILHO (PACOTILHA, 09 de maio de 1936)

Já começavam as tratativas para anulação da cassação do credenciamento da Faculdade pelo não cumprimento da Lei, que estabelecia o Curso Jurídico Complementar: V. Recibo de pagamento das taxas de exame. VI. E, para a inscrição nos exames da 4ª ou da 5ª séries, certificado de habilitação na série procedente, obtido nos termos deste artigo e de seus parágrafos. § 1º Os exames de que trata este artigo deverão ser requeridos na segunda quinzena de janeiro e serão prestados, em fevereiro, no Colégio edro II e em estabelecimentos de nsino secundário equiparados. § 2º Os exames versarão sobre toda a matéria constante dos programas expedidos para o ensino secundário e relativos às tres primeiras séries, para a habilitação na 3ª série, e às duas últimas, respectivamente, para a habilitação na 4ª série e na 5ª série do curso fundamental. § 3º Os exames constarão para cada disciplina, de prova escrita e prova oral ou prático-oral, conforme a natureza da disciplina, salvo o de Desenho, que constará de uma prova gráfica. § 4º Serão nulos os exames prestados pelo mesmo candidato, na mesma época, em mais de um estabelecimento de ensino, ficando ainda o infrator deste dispositivo sujeito à penalidade de não poder increverse em exames na época imediata. § 5º A constituição das bancas examinadoras, o arrolamento das provas escritas, o seu julgamento e o das provas orais ou prático-orais obedecerão, no que lhes for aplicavel, ao disposto nos artigos 38, 39 e 40 deste decreto. § 6º Na constituição das bancas examinadoras não poderão figurara professores que mantenham cursos ou estabelecimentos de ensino, lecionem particularmente ou exerçam atividade didática em estabelecimento de ensino não oficiais, sendo nulos em qualquer tempo os exames prestados com infração deste dispositivo. § 7º Será considerado aprovado o candidato que obtiver, alem da nota trinta, no mínimo, na prova gráfica de Desenho e como média aritmética das notas da prova escrita e da prova oral, ou prático-oral, em cada uma das demais disciplinas, média aritmética igual ou superior a cinquenta no conjunto das disciplinas. § 8º Ao candidato inhabilitado nos exames de qualquer série será permitido, na época seguinte, renovar mais uma vez incrição nos exames da série em que não lograra aprovação. § 9º Os candidatos aprovados na 5ª série, para a matrícula nos institutos de ensino superior, ficarão obrigados à frequência e às demais exigências estabelecidas para o curso complementar respectivo. Art. 101. Será, igualmente facultado requerer e prestar exames de habilitação, nos termos do artigo anterior e seus parágrafos, excluida, entretanto, a exigência da idade mínima, ao candidato que apresentar os seguintes documentos: I Certificado de conclusão do Curso Fundamental de Instituto ou Conservatório de Música, oficial ou oficialmente reconhecido, para a inscrição nos exames da 3ª série, ou certificado de habilitação na série anterior, obtido nos termos deste artigo, para a inscrição nos exames da 4ª ou da 5ª série. II. Recibo de pagamento das taxas de exames. 205

DECRETO Nº 21.241, DE 4 DE ABRIL DE 1932. Consolida as disposições sobre a organização do ensino secundário e dá outras providências



Em nota de José Virgilio Rocha, publicada em ―O Imparcial‖ (06/10), este protestava pela nãorealização da segunda prova parcial que, por Lei, deveriam se realizar no mês de setembro, e conforme constava no regimento interno. Não havia justificativa para tal, A ausência do inspetor federal não era motivo para adiamento das mesmas, conforme o autor da nota. Diz ele que o Departamento de Ensino deveria ter nomeado fiscal substituto, ou mesmo, um representante ‗ad-doc‘; o que não podia, por essa falha, serem os alunos prejudicados. A 07 de novembro, em ―A Pacotilha‖, sai a seguinte noticia, sobre a federalização da Faculdade de Direito do Maranhão:

A FEDERALIZAÇÃO DA NOSSA FACULDDE DE DIREITO Tendo o exmo. Sr. Dr. Governador conhecimento do projecto que corre no Senado, em favor da Federalização das Faculdades de Direito dos Estados do Paraná e Pará, dirigiu-se s. Exc. aos senadores Clodomir Cardoso e Genésio Rego, no sentido de apresentarem uma emenda ao dito projecto, pleiteando a concessão de idêntica vantagem á nossa escola superior de Direito.[...]

Nota publicada em ―O Imparcial‖, de 04/11, informando que os dirigentes da Faculdade de Direito haviam encaminhado correspondência aos nossos representantes na Câmara Federal pedindo apoio para a oficialização da mesma, haja vista que se tornara indispensável para a formação técnico-profissional dos jovens pobres do Estado. Em resposta, o dep. Magalhães de Almeida respondeu que tudo fariam para que se com seguisse a autorização de funcionamento de nossa Faculdade de Direito. Logo no inicio de 1937, cheam comunicados de que havia nova alteração nas normas para ingresso nos cursos superiores; publicadas tanto n―O Imparcial‖ de 30 de janeiro, como na ―A Pacotilha‖ de 1º de fevereiro, com o títuloo de ‗ensino superior‘, o Inspetor Federal junto à Faculdade de Direito do Maranhão,


dr. Manoel Francisco da Cunha Junior, informa ter recebido da Diretoria do Ensino telegrama que dava publicidade: Conforme o despacho minesterial de 15 do corrente (janeiro/37), relativo à decisão do Conselho Nacional de Educação sobre os alumnos cujo curso secundário se fez de acordo com o art. 100 do dec. 21.241, de abril de 1932, communico aos taes alumnos que poderão inscrever-se em exames vestibulares caso concluam a quinta série até fevereiro de 1937, inclusive. As suas inscripções poderão ser acceitas condicionalmente devendos elles apresentar o seu certificado de conclusão da quinta série até a véspera do encerramento das matriculas. Nas mesmas condições poderão ser aceitas as inscrições de candidatos dependentes da apreentação de segunda via de conclusão de curso ou de aprovação em qualquer exame.

Em julho, publicada novas regras para ingresso nos cursos superiores; em aviso do Fiscal Federal junto à Faculdade de Direito do Maranhão, era informado, através do telegrama n. 614.100 que estava à disposição dos interessados o Diário Oficial de 07 de junho, onde estava publicada a Circular 1.200, de 1º de junho, referente ao concurso de habilitação que substituiu o exame vestibular, para a matricula do ano de 1938. A 28 de janeiro, a ―Pacotilha‖ publica discurso do Ministro da Educação, Gustavo Capanema, durante o Centenário do Colégio Pedro II, apresentando um relatório das ações do Governo federal. Sobre o ensino superior:

O Ministro da Educação endereça telegrama ao Interventor Federal, dr. Paulo Ramos, de que fora nomeado, por indicação deste, o Sr. João Soares de Quadros para Inspetor da Faculdade de Direito do Maranhão. A 20/01 o novo Inspetor assume suas funções. (―O Imparcial‖ de 08/01/1939). Em março, (Pacotilha de 21/03) é publicado telegramas recebidos pelo Inspetor Federal junto à Faculdade de Direito:


[...] Rio, 25 de fevereiro... Comunico-vos que a portaria 139, de 1 de dezembro de 1938, do Diretor Geral deste Departamento estabeleceu o seguinte: Os concursos de habilitação aos cursos superiores reger-se-ão no próximo anno, pelo disposto no artigo 47 do decreto 21.241, sem alterações provenientes da lei 9-A, prevalescendo, no entanto, para as inscripções, a media de 40 de conjunto nas disciplinas de 2ª serie Complementar,. Estatuída naquela lei. Assim sendo, só serão aprovados no referido concurso de habilitação alumnos que tenham média 30 cada disciplina e 50 conjunto.

Rio, 3 março... n. 341 – Comunico-vos Ministro da Educação acaba de homologar o parecer do Conselho Nacional de Educação permitindo no presente anno sejam approvados no concurso de habilitação os alumnos que obtiverem 30 em cada disciplina e 40 em conjuncto, ficando assim sem efeito as circualres e actos anteriores fixando em 50 a referida media em conjucto.

Rio, 14. N. 418 – Resposta vosso telegrama, communico-vos ser impossível iniciar o anno lectivo antes da terminação do concurso de habilitação conforme a circular 1200. Solicito tomeis urgentes providencias junto diretoria afim de ser terminado o referido concurso cuja approvação obedece a telegramma-circular 341 do corrente mês. Ruy Lima Silva – Director. J. SOARES DE QUADROS – Inspector.

Telegrama publicado a 12 de setembro de 1939 comunicava que a Faculdade de Direito do Maranhão fora desiquiparada pelo Conselho Superior de Ensino. O corpo docente nomeou comissão composta dos catedráticos Luiz Carvalho Tarquinio Lopes Filho e Oliveira Roma para procurar o Chefe do Governo maranhense, a fim de que sua excelência defendesse junto às altas autoridades do País a causa da Faculdade. O corpo discente, por intermédio do Diretório Acadêmico, resolveu telegrafar ao Diretor do Departamento de Ensino, ao Ministro da Educação e ao Chefe da Nação, pleiteado que seja mantida a equiparação da Faculdade.

O CASO DA FACULDADE DE DIREITO Rio (19). Voltou a ser discutido, na ultima reunião do Conselho Nacional de Educação o parecer n. 200, da comissão de ensino superior, referente à cassação das regalias que gosa a Faculdade de Direito do Maranhão. Esse parecer conclue pella aplicação da penalidade. O Conselheiro José da Fonseca apresentou uma emenda que foi aprovada contra os votos dos conselheiros srs. Reynaldo Rocha, Cesario Andrade e Parreiras Horta, para que fique adiada a applicação da cassação de reconhecimento, até o fim do corrente anno, procedendo-se, então, a uma verificação, cujo resultado será enviado ao Conselho, para deliberação definitiva.

Publicada a agenda do Interventor Federal, acusando o recebimento do seguinte telegrama, de parte do Ministro de Educação, Gustavo Capanema:


Faculdade de Direito do Maranhão – em resposta de seu telegramma intercendo em favor de nossa Faculdade de Direito, o exmo. Sr. Interventor Federal recebeu o seguinte despacho telegraphico de sua ex. o Ministro da Educação e Saúde: RIO, 3 – Off. Interventor Paulo Ramos. Recebi e li com apreço seu telegramma no. 214 sobre situação Faculdade de Direito do Maranhão. Creio que resolução final votada pelo Conselho Nacional de Educação e por mim homologada permitte encaminhamento satisfactorio assumpto, pois manda submeter Faculdade a fiscalização por funcionário idôneo, designado pelo Departamento Nacional Educação. Resultado dessa investigação manifestara governo a resolver em definitivo. [...]

De acordo com Costa (2017) 206, em 1939, a Faculdade de Direito do Maranhão e a Faculdade de Farmácia e Odontologia foram levadas a encerrar suas atividades. As razões atribuídas pelo Departamento Nacional de Ensino para o fechamento de ambas foram as irregularidades administrativas. Entretanto, há questionamentos quanto a tal versão, atribuindo essa ação a motivações políticas e não a problemas de caráter eminentemente técnico-administrativo. Dino (1996, p. 76-77)207 relata: A chamada História Oficial conta que as razões cassatórias foram de caráter eminentemente técnico-administrativo. [...] No tocante ao arquivo da vetusta Escola Jurídica, ao que se sabe por informações oficiosas, o Dr. Soares de Quadros, então fiscal do ensino federal, quando do seu fechamento, houve por bem de empacotar toda a papelada burocrática e a remeter de navio para o Ministério da Educação no Rio de Janeiro. Na mudança do MEC para Brasília os pacotes e mais pacotes referentes à vida da velha Salamanca foram extraviados ou incinerados. O certo é que, no MEC, já em Brasília, apesar de incessantes tentativas, jamais conseguimos obter qualquer informação satisfatória a respeito. Uma outra corrente de pensamento sustenta não se poder buscar as primas causas da cassação da velha Faculdade de Direito sem a análise histórica da presença ostensiva do Estado Novo nos setores cultural, econômico e educacional em terras maranhenses.

Ao se voltar o olhar para a conjuntura da década de 1930, Costa (2017) 208 afirma que esse período inaugura outra etapa do ensino superior no país e, consequentemente, no Maranhão, decorrente das profundas mudanças no cenário político e educacional, resultante do governo Vargas (1930-1945). Surge, então, um aparelho de Estado centralizador no intento de estabelecer seu projeto nacionalista: [...] no Maranhão, [...] a presença de interventores é reflexo do centralismo adotado no governo Vargas que contribuiu imensamente para aguçar os conflitos e consequentemente a instabilidade política no estado. Só entre 1930 a 1937, governaram o Maranhão, sete interventores, cujos mandatos em geral, foram marcados por conflitos e instabilidades.‖ (BOTELHO, 2007, p. 178 209).

Para Cunha (2017), o período de 1937 a 1945 assinalou a nova fase política e educacional do país, caracterizadas por um conjunto de reformas educativas, que ficaram conhecidas como Leis Orgânicas de Ensino ou Reforma Capanema (MARTINS, 2002)210: 206

COSTA, Marcia Cordeiro. A GÊNESE DA EDUCAÇÃO EM NÍVEL SUPERIOR NO ESTADO DO MARANHÃO E POLÍTICA EDUCACIONAL: os embates travados pela sua efetivação e consolidação. VIII JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. São Luis, 22 a 25 de agosto de 2017, UFMA/Programa de Pósgraduação em Políticas Públicas

207 208

DINO, Sálvio. A FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO (1918-1941). São Luis: EDUFMA, 1996; 2ª edição 2014.

COSTA, 2017, obra citada 209 BOTELHO, Joan. CONHECENDO E DEBATENDO A HISTÓRIA DO MARANHÃO. São Luís: Fort, 2007 210 MARTINS, A. C. P. Ensino superior no Brasil: da descoberta aos dias atuais. ACTA CIRÚRGICA BRASILEIRA, v. 17, São Paulo, 2002. Suplemento 3, citado por Cunha, 2017, obra citada


Em nome do princípio da autoridade e da disciplina, decisões são tomadas e a autonomia universitária é negada. Entre os objetivos explicitados por esta nova ordenação jurídica e administrativa (Estado Novo), ―[...] estavam as perspectivas de ordenamento da educação; a definição de competências entre os diferentes estratos de governo (municípios, estados e união); articulação entre os diferentes ramos de ensino e a implantação de uma rede de ensino profissionalizante‖. (CUNHA, 1980, p. 14)211.

Manchete em ―O Imparcial‖ de 22 de agosto de 1941:

NÃO SERÁ FECHADA A FACULDADE DE DIREITO RIO (21) Serviço especial.- o Dr. Oliveira Roma falando ao representante de O IMPARCIAL, declarou que a Faculdade de Direito do Maranhão não será fechada. Essa decisão foi garantida pelo Sr. Abguar Ransut, Diretor do Departamento Nacional de Educação. O dr. Oliveira Roma declarou, igualmente, que foram regularizados os casos dos cursos secundários superiores, do Maranhão, considerados defeituosos.

A 03/10, em nota, ―O Imparcial‖ se referia a insistentes noticias que chegavam, de que saira parecer opinando pelo fechamento da Faculdade de Direito. Até àquela hora, 6 da tarde, não havia sido confirmada a noticia que circulava pela cidade. Então, adveio o Decreto n. 8.085 de 21 de outubro de 1941, que cassou o reconhecimento da Faculdade de Direito. Em conseqüência, foi forçada a fechar definitivamente suas portas, [...] ―sendo seus arquivos recolhidos também ao Ministério e garantido, igualmente a seus alunos que se transferissem por escolas similares em outros estados.‖ (MEIRELLES, 1995, p. 67)212.

211

CUNHA, L. A. A UNIVERSIDADE TEMPORÃ: O ENSINO SUPERIOR DA COLÔNIA À ERA DE VARGAS. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980. citado por Cunha, 2017, obra citada. 212 MEIRELLES, Mario M. DEZ ESTUDOS HISTÓRICOS. São Luís: Alumar, 1995.


MEMÓRIA DA FACULDADE DE DIREITO DO MARANHÃO 1918-1941: OS INSPETORES FEDERAIS LEOPOLDO GIL DULCIO VAZ Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão Cadeira 40 – Patroneada por Dunshee de Abranches Academia Ludovicense de Letras Cadeira 21 – Patroneada por Fran Paxeco

Neste ano de 1918 comemora-se o Centenário de Fundação da Faculdade de Direito do Maranhão. Em sua primeira fase sobreviveu até 1941, quando teve seu credenciamento suspenso por determinação do Conselho de Ensino Superior, supostamente por irregularidades relatadas pelo Inspetor Federal, embora haja quem afirme que tal ato foi puramente político. Os cursos de Direito no Maranhão têm uma história que inicia no período colonial, com a instalação do Colégio Máximo do Maranhão213, dos Jesuítas214. São Luís foi a primeira cidade do Estado onde os jesuítas exerceram o ensino. O Colégio de Nossa Senhora da Luz, em curto espaço de tempo, tornou-se excepcional centro de estudos filosóficos e teológicos da ordem no Estado (universitate de artes liberais). Era o que melhores condições de estudos oferecia. Já em 1709, o Colégio do Maranhão era Colégio Máximo, nomenclatura usada pelos discípulos de Loyola para seus estabelecimentos normais de estudos superiores. Nesse colégio funcionavam as faculdades próprias dos antigos colégios da Companhia: Humanidades, Filosofia e Teologia, e, mais tarde, com graus acadêmicos, no chamado curso de Artes. Os estudos filosóficos compreendiam: no 1º ano, Lógica; no 2º, Física; no 3º, Matemática215. Paxeco (1922?) 216 traz relato baseado em Bettendorff (1990) 217, que fora nomeado vice-reitor o Padre Diogo da Costa; o padre-mestre José Ferreira lecionava Teologia Escolástica e Moral; Padre Tomaz Couto prosseguia as aulas de Latim; informa ainda que dera ordem de prosseguirem as aulas iniciadas de Filosofia e após, a de Teologia, a quem encarregou o Padre Inácio Ferreira. Descreve, ainda, os exames realizados, defendidas as teses com brilhantismo, dos cursos superiores ministrados: ―nem nas Universidades da Europa fazem os cursistas do primeiro ano mais do que fizeram os do Colégio de Santo Alexandre, no Gran-Pará‖, subordinado ao Colégio do Maranhão. Dentre os estabelecimentos de ensino dos jesuítas, as Escolas Gerais ocuparam um lugar de destaque, pelo fato de terem tornado o ensino popular ao alcance de todos. (CAVALCANTI FILHO, 1990, p. 36) 218. O Colégio Máximo do Maranhão outorgava graus de Bacharel, Licenciado, Mestre e Doutor, como se praticava em Portugal e na Sicília, segundo os privilégios de Pio IV e Gregório XIII. Já nos 1800, com a chegada da família imperial nova tentativa e, corrida perdida, embora a quarta capital em importância naquele período, foi preterida por Olinda e Salvador. o Príncipe Regente D. João VI 213

ALMEIDA, José Ricardo Pires de. HISTÓRIA DA INSTRUÇÃO PÚBLICA NO BRASIL (1500 - 1889). São Paulo: EDUC; Brasília: INEP/MEC, 1989, p. 25 - nota de pé-de-página). 214 VAZ, Leopoldo Gil Dulcio; e VAZ, Delzuite Dantas Brito. Vila do Vinhais: terceira ou Segunda povoação do Maranhão ?. in jornal "O ESTADO DO MARANHÃO", São Luís, 31 de julho de 1994, Domingo, Caderno Alternativo, p. 28. VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. Centro Federal de Educação Tecnológica do Maranhão: esboço histórico. In REVISTA “NOVA ATENAS DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA” v. 2, n. 1 – jul.-dez. 1998 –, disponível em www.cefet-ma.br/revista VAZ, Leopoldo Gil Dulcio. “Educação Tecnológica em Maranhão: um esboço histórico para alunos e professores do CEFET-MA. In REVISTA “NOVA ATENAS DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA”, v. 3, n. 2, jul.-dez. 2000, disponível em www.cefet-ma.br/revista. 215 SOUSA, José Coelho de. OS JESUÍTAS NO MARANHÃO. São Luís: Fundação Cultural do Maranhão, 1977. 216 PAXECO, Fran. O MARANHÃO. s.e. s.d.(1922) 217 BETTENDORFF, João Felipe. CRÔNICA DOS PADRES DA COMPANHIA DE JESUS NO ESTADO DO MARANHÃO. Belém: Fundação Cultural do Pará Tancredo neves; Secretaria de Estado da Cultura, 1990. 218 CAVALCANTI FILHO, Sebastião Barbosa. A QUESTÃO JESUÍTICA NO MARANHÃO COLONIAL – 1622 – 1759. São Luís: SIOGE, 1990, p. 20.


tomou uma série de medidas visando melhorar a situação do ensino no país, inclusive o ensino superior. O regente chegou a prometer uma faculdade ao Maranhão, pela carta régia de 29/12/1815 219 e ―que lamentavelmente não chegaria a se fazer realidade‖ (MEIRELES, 1995)220. Informa-nos Rossini Corrêa (2017, p. 148) 221: [...] quando da inauguração do ensino superior brasileiro, proibido pelo colonialismo português, e conquistado com a autonomia administrativa, o Maranhão procurou, com obstinação, ser o vencedor da carreira, abrigando, em São Luis, a primeira Faculdade de Direito do Brasil. Para o Autor, foi uma batalha perdida, pois as Academias Jurídicas ficaram sediadas em Olinda (Mosteiro de São Bento) e São Paulo (Largo do São Francisco). Posteriormente, florescendo Recife, a Academia Jurídica de Olinda foi transferida para a Cidade Maurícia, onde tem resistido ao tempo (p. 148). Tivesse São Luís conquistado a contemplação de uma Faculdade de Direito ser assentada no Maranhão, nos primórdios da atividade universitária brasileira, em hipótese, não existiria uma ‗Escola‘ do Recife. Desenvolvendo-se a suposição, ter-seia radicado uma ‗Escola‘ de São Luís, e, excluído o Recife, é de imaginar-se que o Maranhão seria cenário e auditório do que para muitos, nada mais é, senão a mediocridade tobiática filosofante, muitas vezes, contudo, sem razão na crítica desmerecedora de tudo quanto é plasmado em terras brasileiras, enquanto expressão ‗Brasil‘ alienado, que não suporta o Brasil real. (CORREA, 2017, p. 149).

Prossegue, afirmando que não chegando ao Maranhão a Academia Jurídica, estimulou o desembarque de maranhenses na Faculdade de Direito de Olinda, tanto quanto a de São Paulo: [...] Não havendo uma ‗Escola‘ de São Luís na Atenas Brasileira, desde o começo, os maranhenses chegaram a Pernambuco e, na primeira formatura de estudantes da Academia Jurídica de Olinda, bacharelou-se um – Joaquim Franco de Sá – que não foi merecedor dos comentários de Clóvis Bevilácqua, um dos historiadores da Faculdade de Direito de Olinda-Recife (p. 149).

Meireles (1995) 222 refere-se às diversas tentativas de implantação de cursos superiores, no Império, no Maranhão. Todas frustradas. Para esse Autor, a criação de escolas superiores, na terra, concorreria sem dúvida para ameaçar a situação privilegiada de que desfrutava nossas elites. A solução, ou compensação, foi mandar os moços maranhenses a estudarem fora, destinando-lhes bolsas e subsídios para tal. Assim, que, dentre outros, em 1856, Felipe da Mota de Azevedo Corrêa, lente de inglês do Liceu Maranhense, é autorizado a se afastar, por dois anos, com vencimentos, para concluir seu curso de Direito (Lei n. 77, de 24.07.1838, conforme MEIRELES, 1995, p. 60). Logo a seguir, em 1861, o subdiácono Luis Raimundo da Silva Brito era mandando a Roma para estudar Direito Canônico. Com a República, era desejo dos constituintes republicanos a criação de uma universidade em seus recentes Estados. Também no Maranhão, pois entre os republicanos estava Sousândrade, que também nutria 219

CARTA RÉGIA DE 29 DE DEZEMBRO DE 1815 - Crêa um curso completo de Cirurgia na Cidade da Bahia, e manda executar nella provisoriamente o plano dado para o curso desta Côrte. Disponível em

http://www2.camara.leg.br/legin/fed/carreg_sn/anterioresa1824/cartaregia-39555-29-dezembro-1815-569931-publicacaooriginal-93096pe.html 220

MEIRELES, Mário. O ensino superior no Maranhão: esboço histórico. In ____. DEZ ESTUDOS HISTÓRICOS. São Luís: ALUMAR, 1995, P. 45-94

221

CORRÊA, José Rossini Campos do Couto. FORMAÇÃO SOCIAL DO MARANHÃO – o presente de uma arqueologia. 2 ed. São Luis: Engenho, 2017. Biblioteca Básica Maranhense – volume II.

222

MEIRELES, Mário M. O ensino superior no Maranhão. 2 ed. Atualizada. In ___ DEZ ESTUDOS HISTÓRICOS. São Luis: ALUMAR, 1995, P. 45-94.


esse desejo, antes mesmo da adesão à República: a ―Atlântida‖. A Universidade Atlântida deveria iniciar com uma Faculdade de Direito, uma Academia de Minas e outra de Agricultura (SANTOS, 2012)223. Em 1890, quando elabora a primeira constituição republicana do Maranhão, insere em seu artigo 89 dispositivo sobre a criação de uma Universidade, que se chamaria "Atlântida". Vetado tal artigo, pretendeu levantar recursos, por meio de subscrição popular para levar adiante sua idéia, chegando a alugar o Palácio das Lágrimas para sua sede. Joaquim de Sousa Andrade – Sousândrade e Augusto O. Viveiro de Castro encaminharam, em 02 de julho de 1894, uma representação ao Senado requerendo a criação de um fundo universitário com os recursos provenientes do Canal do Arapapahy. Referem-se à inclusão já no primeiro projeto de Constituição do Estado (de 3 de dezembro de 1890): [...] Se para a Faculdade de Direito, a qual achará entre nós distintos professores de bom caráter, pouco dispenderá a Universidade, além do edifício e do contrato de um professor para a nova cadeira de Direito Índico, o qual pediremos ao Chile, país único na América que tem a ciência da educação dos Naturais [...]

Certamente Sousândrade estava atento ao disposto no DECRETO N. 1232 H - DE 2 DE JANEIRO DE 1891 - Approva o regulamento das Instituições de Ensino Jurídico, dependentes do Ministério da Instrucção Publica224. Em seu Art. 2º, diz que, em cada uma das Faculdades de Direito, poderia haver três cursos: ―[...] o de sciencias juridicas, o de sciencias sociaes, o de notariado.: Por essa mesma época, são publicados os Regulamentos da Instrução Pública do Maranhão (O FEDERALISTA, 02, 03 de agosto de 1894) e o da Escola Normal (O FEDERALISTA, 06/08/1894). Em 21 de fevereiro de 1895, publica um aviso intitulado "Nova Atenas", anunciando a nova universidade ("O Federalista", p. 2): São pela imprensa convidados os membros do Directorio da Universidade a se reunirem no Paço Municipal ao meio dia, em 24, comemoração da Constituição da República. Os 12 eleitos à Inauguração de 25 de Dezembro p.p. são o cidadão Sousândrade, o Governador do Estado, o Presidente do Congresso, o Presidente do Superior Tribunal de Justiça, o Bispo Diocesano, o Inspetor da Instrução Pública, o Senador Federal (o último eleito), o Cônsul do Chile, o Cônsul dos Estados Unidos, o Presidente da Associação Comercial, o Juiz seccional, o Diretor (Vigilante) da Escola Normal. O que não poder comparecer delegará seus poderes por escrito ou pelo telefone à horas dadas esprimindo a sua idéia e o seu voto. (O FEDERALISTA, 21-22/02/1895, p. 3).

É de se supor que da reunião de 24 de fevereiro, os membros do diretório da Universidade tenham deliberado sobre os cursos que seriam oferecidos e sobre o exame de admissão à Faculdade de Direito: De acordo com os regulamentos em vigor até 1896, serão exigidos os seguintes exames para admissão à matrícula: Nas faculdades de direito (art. 430 do decreto n. 1232F, de 2 de janeiro de 1891, cit.): português, Frances, inglês, ou alemão (à vontade do candidato); latim; matemática elementar; geografia, especialmente do Brasil; história universal, especialmente do Brasil; física e química geral, estudo concreto; história natural, estudo concreto: (Do Diário Oficial de 18 de março de 1893, no. 74). O Directório‖. (O FEDERALISTA, 03, 05, 06, 07, 09, 10/08/1895).

223

SANTOS, Sandra Regina Rodrigues dos. Cidade das letras: o ensino superior em São Luis, p. 239-259. in ABRANTES, Elizabeth Sousa; SANTOS, Sandra Regina Rodrigues dos (Org.) SÃO LUIS DO MARANHÃO; novos olhares sobre a cidade. São Luís: EDUEMA, 2012. 224 DECRETO N. 1232 H - DE 2 DE JANEIRO DE 1891 - Approva o regulamento das Instituições de Ensino Juridico, dependentes do Ministerio da Instrucção Publica


Em março, 4, outro aviso, intitulado "Nova Atenas", reproduzido nas edições de 05 e 06 de "O Federalista". A 18 desse mesmo mês recebe telegrama do Presidente Prudente de Moraes agradecendo-lhe a escolha para a presidência honorária da universidade. Em Abril volta a aparecer aviso ("Universidade", O Federalista, p. 2); em maio, 11, outro aviso intitulado "Universidade Nova Atenas"; em 31 de julho publica aviso sobre o currículo da "Universidade Nova Atenas". Consta que chegou a dar aulas, em sua Quinta da Vitória, transformada em sede de seu estabelecimento de ensino superior. Não se sabe até quando, e perdemos a oportunidade de termos um curso de Direito desde 1896... A primeira escola superior isolada foi, de fato, a Faculdade de Direito do Maranhão, que desde 1908 trabalhava nesse sentido Domingos de Castro Perdigão: [...] com só, de inicio, o incentivo do então deputado federal, e depois Senador, José Euzébio Carvalho de Oliveira; e as dissensões e intransigências da estreita e intolerante política partidária estadual, que talvez tenha concorrido a que não conseguisse o apoio, que pleiteou e não obteve, do Governador Herculano Nina Parga (1814/18) e do Presidente do Tribunal de Justiça, Desembargador Lourenço Valente de Figueiredo (1913/18), não o descoroçoaram de todo, até que conquistou um forte e decisivo aliado na pessoa do Cônsul de Portugal no Maranhão, o escritor Fran Paxeco. Então, a 28/4/1918 era criada a Associação Organizadora da Faculdade, integrada por eles dois e mais os bacharéis Alfredo de Assis Castro, José de Almeida Nunes e Antonio Lopes da Cunha; finalmente, a 1º de junho desse ano entrava a escola em funcionamento, sob a direção do Dr. José Viana Vaz, que cedo seria substituído pelo Dr. Henrique José Couto, o segundo diretor. De inicio, foi sediada no Beco da Sé, hoje Travessa D. Francisco; depois na Rua do Sol (nina Rodrigues), esquina da Travessa do Sineiro (Godofredo Viana), defronte, porta com porta, ao teatro Artur Azevedo, em prédio próprio. (MEIRELES, 1981) 225.

Mário Meireles (1981; 1995), em ―O Ensino Superior no Maranhão‖, (utilizamo-nos da 2ª edição atualizada) 226, afirma que as primeiras tentativas de instalação de cursos superiores no Maranhão surgiram pouco a pouco, a partir da adesão formal à República (18/11/1889), através de unidades isoladas, todas elas, de princípio, particulares, depois de desfazer-se o sonho, prematuro, do poeta Sousândrade. Joaquim Vieira da Luz (1957)227, em seu monumental ―Fran Paxeco e outras figuras maranhenses‖, ao traçar a biografia de Domingos de Castro Perdigão também se refere ao fato de ele acalentar por muito tempo a idéia de criar uma Faculdade de Direito no Maranhão; transcreve a História da Faculdade, relatada pelo próprio biografado (p. 42): A história desta instituição é ainda modesta simples: Em 1908, principiei a pugnar pela abertura de uma escola superior aqui. Neste sentido, troquei idéias com o ilustre dr. José Eusébio de Carvalho Oliveira, então nosso representante na Câmara Federal, que muito me incentivou, aconselhando-me a levar avante o empreendimento. As alterações políticas do Estado interromperam-me a ação. Em 1916, porém, fui de novo despertado pelo recebimento, na Biblioteca Pública, de exemplares dos regulamentos das faculdades do Pará, Ceará, e Universidade de Manaus. Reconvenci-me de que o Maranhão – a Atenas Brasileira, se deixava ficar em plano inferior. Voltei a ocupar-me de levantar a idéia de fundar, em São Luis, uma Faculdade de Direito. Foi um atrevimento que me tem custado muitos dissabores, mas também me tem trazido instantes de prazer,como este em que vos falo. Manifestei-me neste sentido ao dr. Antonio Lopes da Cunha, que aplaudiu a iniciativa, mostrando-se pronto a colaborar na sua execução. Chegamos mesmo a distribuir as cadeiras do curso pelos bacharéis aqui existentes. Mas ficou-se nisso e o dr. Antonio Lopes não mais me apareceu, para tratar desse assunto. 225

MEIRELES, Mário. O ENSINO SUPERIOR NO MARANHÃO. São Luis: UFMA, 1981 (Comemorativa do 15º aniversário de fundação da Universidade Federal do Maranhão). 226 MEIRELES, Mário. O ensino superior do Maranhão; esboço histórico. In DEZ ESTUDOS HISTÓRICOS. São Luis: ALUMAR, 1995, p.. 45-94 227 VIEIRA DA LUZ, Joaquim. FRAN PAXECO E AS FIGURAS MARANHENSES. Rio de Janeiro: Livros de Portugal; Edições dois Mundos, 1957.


Procurei o dr. Herculano Parga, então no governo do Estado, o qual achou a idéia pouco viável, sem, contudo, a hostilizar. Opinou que seria melhor cuidar-se de uma escola agrícola. Não esmoreci. Fui entender-me com o dr. Valente de Figueiredo, presidente, nesse tempo, do Superior Tribunal de Justiça. Recebeu-me afavelmente, porém julgou o empreendimento superior às minhas forças, não prometeu ajudar-me neste sentido, mas também não me desencorajou. Falei também ao dr. Alfredo de Assis Castro, que louvou a tentativa, embora a reputasse impraticável no nosso meio. Encontrava assim o desanimo por todos os lados. A esperança de melhores dias conservou no meu espírito essa idéia fixa, que só se tornou realizável com o regresso, em 1917, do ilustre cônsul de Portugal, Sr. Manoel Fran Paxeco. Ao despedir-se, um ano antes, perguntara-me em que parava o projeto da faculdade. Espírito iluminado e laborioso, decidido sempre a servir as causas úteis, trouxe a energia necessária para por em marcha este ideal. Não o procurei. Conhecedor do meu plano, interessou-se pelo mesmo e ali, na Biblioteca Pública, se assentaram, num dia, as bases da nova instituição. (VIEIRA DA LUZ, 1957, p.. 42-43)

Vieira da Luz (1957) diz que, como resultado de tão louvável persistência, na Biblioteca Pública, que então dirigia, sediada à Rua do Egito (atual Tarquínio Lopes), foi fundada, em memorável reunião a 28 de abril de 1918, a sonhada Faculdade de Direito do Maranhão (p. 43). A formalização de um instituto de ensino superior era determinado pelo decreto 1232 H - de 2 de janeiro de 1891 – ―Approva o regulamento das Instituições de Ensino Jurídico, dependentes do Ministério da Instrucção Publica‖, alterado pelo Decreto Decreto nº 11.530, de 18 de Março de 1915, que ―Reorganiza o ensino secundário e o superior na Republica‖. O ato, embasado na Constituição republicana de 1891, e, principalmente no Decreto de 1891 228, que permitiu governos estaduais e iniciativa privada implementassem cursos no país, rompendo o monopólio de Recife e São Paulo: Art. 420. Aos estabelecimentos particulares que funccionarem regularmente poderá o Governo, com audiencia do Conselho de Instrucção Superior, conceder o titulo de Faculdade livre, com todos os privilegios e garantias de que gozarem as Faculdades federaes.As Faculdades livres terão o direito de conferir aos seus alumnos os gráos academicos que concedem as Faculdades federaes, uma vez que elles tenham obtido as approvações exigidas pelos estatutos destas para a collação dos mesmos gráos. Art. 421. Os exames das Faculdades livres serão feitos de conformidade com as leis, decretos e instrucções que regularem os das Faculdades federaes e valerão para a matricula nos cursos destes.O Conselho de Instrucção Superior nomeará annualmente commissarios que assistam a esses exames e informem sobre a sua regularidade. Art. 422. Em cada Faculdade livre ensinar-se-hão pelo menos todas as materias que constituirem o programma da Faculdade federal. Art. 423. Cada Faculdade livre terá a sua congregação de lentes com as attribuições que lhe forem dadas pelo respectivo regimento. Art. 424. A infracção das disposições contidas neste titulo sujeita a congregação a uma censura particular ou publica do Governo, o qual, em caso de reincidencia, multará a associação em 500$ a 1:000$ e por ultimo poderá suspender a Faculdaade por tempo não execedente de dous annos, devendo sempre ouvir o Conselho de Instrucção Superior.Emquanto durar a suspensão, não poderá a Faculdade conferir gráos academicos, sob pena de nullidade dos mesmos. 228

DECRETO N. 1232 - DE 2 DE JANEIRO DE 1891 - Approva o regulamento das Instituições de Ensino Juridico, dependentes do Ministerio da Instrucção Publica. O Generalissimo Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação, resolve approvar, para as Instituições de Ensino Juridico, dependentes do Ministerio da Instrucção Publica, o regulamento que a este acompanha, assignado pelo General de brigada Benjamin Constant Botelho de Magalhães, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Instrucção Publica, Correios e Telegraphos, que assim o faça executar. Palacio do Governo Provisorio, 2 de janeiro de 1891, 3º da Republica. MANOEL DEODORO DA FONSECA. Benjamin Constant Botelho de Magalhães. REGULAMENTO PARA AS INSTITUIÇÕES DE ENSINO JURIDICO DEPENDENTES DO MINISTERIO DA INSTRUCÇÃO PUBLICA Art. 1º Para diffusão do ensino juridico manterá o Governo Federal as actuaes Faculdades de Direito e poderá fundar ou subvencionar outras que julgue necessarias.


Art. 425. Constando a pratica de abusos nas Faculdades livres quanto á identidade dos individuos nos exames e na collação dos gráos, cabe ao Governo, ouvindo o Conselho de Instrucção Superior, o direito de mandar proceder a rigoroso inquerito para averiguação da verdade, e, si delle resultar a prova dos abusos arguidos, deverá immediatamente cassar á instituição o titulo Faculdade livre, com todas as prerogativas ao mesmo inherentes. Art. 426. A Faculdade livre que houver sido privada deste titulo não poderá recuperal-o sem provar que reconstituiu-se de maneira a offerecer inteira garantia de que os abusos commettidos não se reproduzirão.

A Faculdade de Direito do Maranhão foi a 11ª instituição de formação jurídica no Brasil; precedeu-a São Paulo e Olinda (depois do Recife, 1827), Bahia e Rio de Janeiro (1891), Minas gerais e Rio Grande do Sul (1900), Pará (1902), Ceará (1903), Amazonas (1909) e Paraná (1912). Para que houve o reconhecimento e a equiparação, além do cumprimento da legislação de ensino vigente, havia necessidade de outros atos, que consolidassem a sua existência e funcionalidade. Assim, pela Lei n. 834, de 21 de março de 1919, a Faculdade de Direito do Maranhão é considerada de utilidade pública:

Logo a seguir, é apresentado Projeto junto ao Congresso Estadual propondo o reconhecimento, fiscalização e diplomas da Faculdade de Direito: Projeto n. 11 O Congresso do Estado do Maranhão decreta: Art. 1º São Considerados válidos, em todo o território do estado, os diplomas de bacharel em direito, expedidos pela Faculdade de Direito do Maranhão. Art. 2º O governo terá junto a esse estabelecimento um fiscal da sua livre escolha e cujos vencimentos serão marcados no ato da nomeação. Art. 3 A faculdade será subvencionada com a quantia de quinze contos de réis (15:000$000) anuais, paga em tres prestações iguais, por períodos vencidos de quatro meses.


# Único. O pagamento será requerido ao secretário do Interior, sendo a petição acompanhada de mapa comprobatório da matrícula e frequencia média, mensal, dos alunos às aulas do estabelecimento. Art. 4º Os diplomas serão expedidos em nome do governo do estado. Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário. Sala das sessões, em 17 de março de 1920. Romero de Gouvea No âmbito estadual, concedendo-se subvenção à qualquer ente particular – no caso, a Faculdade de Direito do Maranhão, mantida por uma associação particular, formada por diversas pessoas, na sua maioria advogados, magistrados, procuradores, promotores, de caráter de curso livre – há a necessidade de um fiscal nomeado pelo Estado, para verificar a correra aplicação do dinheiro. O art. 2º do projeto em questão, prevê a figura de um fiscal para a Faculdade de Direito. Assim, a 3 de setembro, em nota d´‖A Pacotilha‖, informa-se de reunião da congregação em que se deu conhecimento de um ofício do secretário do interior comunicando que o Governo do Estado nomeara Fiscal da Faculdade o dr. José Façanha de Sá, filho. Decidiu-se agradecer, inquirindo as atribuições. No âmbito federal, também é prevista a figura do Inspetor de Ensino, nos termos do Decreto nº 11.530, de 18 de Março de 1915, que reorganizou o ensino secundário e o superior na Republica. Em seu artigo 13 e seguintes, ao estabelecer a figura do Inspetor de Ensino, caracteriza suas atribuições: Art. 14. O inspector inquirirá, por todos os meios ao seu alcance, inclusive o exame de toda a escripta do instituto: a) se este funcciona regularmente ha mais de cinco annos; b) se ha moralidade nas distribuições de notas de exames; c) se os professores manteem cursos particulares frequentados pelos alumnos da academia; d) se as materias constantes dos programmas são suficientes para os cursos de Engenharia, Direito, Medicina ou Pharmacia; e) se, pelo menos, tres quartas partes do programma de cada materia são effectivamente explicadas pelo respectivo professor; f) se ha exame vestibular e se é este rigoroso; g) se a academia possue os laboratorios indispensaveis e se estes são utilizados convenientemente; h) se o corpo docente é escolhido pelo processo de concurso de provas estabelecido na presente lei; i) se as rendas da academia são sufficientes para o custeio de um ensino integral, das materias do curso, ministrado por professores sufficientemente remunerados; j) se a quota de fiscalização é depositada na época legal Art. 15. O inspector apresentará relatorio circumstanciado sobre o que houver visto e colligido a respeito do instituto e, na falta de qualquer dos requisitos enumerados no artigo antecedente, concluirá por aconselhar que se não conceda a pretendida equiparação ás academias mantidas pelo Governo Federal. Art. 16. Não será inspector pessoa ligada por affinidade de qualquer natureza aos directores ou professores da academia, e, quando possivel, não residirá siquer no Estado em que o instituto funccionar.


Art. 17. Considera-se terminada a inspecção com o julgamento do relatorio pelo Conselho Superior do Ensino. [...] Art. 19. A nomeação de inspector será annual, embora possa o Conselho designar o mesmo cidadão duas e mais vezes, para inspeccionar varios institutos. Neste ultimo caso receberá tantas quotas quantos forem os institutos inspeccionados. [...] Art. 22. Quando o relatorio do inspector condemnar um instituto, será cassado o direito á equiparação já concedida, não podendo ser de novo requerida dentro de seis annos, embora a academia mude de nome conservando mais de metade do antigo corpo docente. Art. 23. Quando a academia representar contra o inspector ao Conselho Superior e a este parecer que o relatorio foi injusto ou apaixonado, poderá aguardar nova inspecção para aconselhar ao Ministro a applicação da pena comminada pelo artigo antecedente. Em ―A Pacotilha‖, edição de 4 de novembro de 1922, com o título de ―O Fiscal da Faculdade de Direito do Maranhão‖, sai a seguinte nota: Verdadeiro jogo de disparate é o artigo do Sr. Freitas Carvalho, publicado ontem no ‗Diário de S. Luiz‘, com o título – ‗Inadaptáveis‘. Só teve a única serventia de trazer à evidencia um então desconhecido artista e patriota que lutando – ‗com a monotonia e o atraso do nosso estado (tal como ele disse e escreveu) adaptou-se integralmente a nossa terra com o intento de por ela trabalhar. Ó marnes dos imortais, - que fortuna, que glórias não vos advirão da ‗adaptação‘ de tão forte braço e de tão equilibrado cérebro! Basta notar-se que o exímio artista e crítico compreende como lei de adaptação a do engrossamento brusco e inoportuno aos que detém o cofre das graças. Esta é singular!Conta que, como cego, veio guiado, do Rio, pelo braço do desembargador Cunha Machado; e, depois de confessar mais a sua gratidão ao dr. Raul Machado por o haver nomeado Delegado geral e Fiscal da Faculdade de Direito do Maranhão, conclui por estes termos: - ―em qualquer emergência estarei ao lado do governo do Sr. Dr. Raul Machado. Não me ‗adapto‘ a outra solução. E na mesma moxinifácia (sic), sem pé nem cabeça, o patriota, - Fiscal da faculdade de Direito do Maranhão, disparata com a herança do avô, com os examinados do ―Curso Profissional‖ e coma tese de um dos concorrentes, à cadeira de finanças, assombrado com algumas passagens ali editadas para amenização do assunto que é árido. Agora vejo que bem razoáveis foram as troças do Nascimento de Morais a esse filólogo quixotesco!


Mas, afinal de contas, é o caso de perguntar - que ligação pode ter a tese ou as calças do concurrente com a adaptação do Fiscal da Faculdade de Direito do Maranhão ao governo do dr. Raul Machado? Daí bem se colige que o Fiscal da faculdade pode, cantando ou chorando, já ter-se adaptado nesta terra, no céu ou no inferno, mas nunca ao cargo de Fiscal da Faculdade, cargo próprio a quem tem calma, imparcialidade e, nos momentos de ‗spleen‘, não deixa conturbar-se lhe a razão. O humilde concorrente não faz agora outra coisa senão virar os alfinetes enferrujados, de pontas tintas na inveja ou no despeito, contra o adaptado engrossador, a quem o concorrentes nunca ferira por palavra nem ações. João N. de Sousa Machado Buscamos no ―Diário de S. Luiz‖ o motivo de tão virulento ataque; assim, já em 6 de novembro é publicada o seguinte comentário, sobre os exames para complementar o quadro docente: Á VONTADINHA Há dias, conversando eu com distinto colega, incidentalmente, falamos nas teses apresentadas à Congregação da Faculdade de Direito. Declarei, logo, que ainda não me haviam chegado às mãos; por isso me limitei a ouvil-o Desfechei homérica gargalhada, e abalei rumo de casa quando me disse que um dos candidatos (não precisou nomes) terminara a tese com este período áureo: ―Qual o meu fim não sei; sei que cantando vim, cantando vou‖. Nunca, absolutamente, nunca supus que um individuo, que se propõe a entrar para o corpo docente de uma escola superior, fosse capaz de escrever coisa tão ridícula, parvoíce tamanha. Ao dia seguinte, a propósito de uma declaração que fiz no ―Diário de São Luis‖, declaração insípida, citei a boutade (cuidei que o fosse) de meu amigo. Fi-lo seguro de não melindrar os ilustres concorrentes à cadeira de economia política, pois nenhum, cria eu, seria capaz de escrever dislates daquele calibre. Tal não sucedeu. João Nepomuceno de Souza Machado veio dizer, coram populo, que é o autor daquela incomensurável sandice, ‗necessária, acrescenta, para amenizar a aridez do assunto sobre que escrevera‘. Aridez, na realidade, é o que se não encontra na tese do Napomuceno, peça, eminentemente jocosa, a ser verdade o que por ai propala. Ainda não li a tese em questão. O colega, a que acima aludi,encontrando-se, hoje, comigo, disse-me: - Então, não queria acreditar?! O Nepomuceno escreveu, ou não escreveu? E tomando-me no braço: - Ouve lá: queres saber quantas milhas desenvolvia, por hora, a arca de Noé? - ?! - Lê a tese do Nepomuceno e ficarás informado. - ?! - Sofres de calos? - ?! - Lá está um capitulo – Método infalível de extrair os calos, sem dor. Não houvesse o dr. João Machado confessado ser o autor do cantando vim, cantando me vou e eu teria rompido com o meu querido informador, por isso


que me tomava para seu divertimento; mas, diante do artigo de sábado, na Pacotilha, tenho cá minhas duvidas. Quem sabe lá? E se o Nepomuceno... Queixando-me a alguém do ataque injusto de que fui vitima, e perguntando que tala a tese do dr., obtive como resposta: É mais um volume da ―Biblioteca Internacional de Obras Celebres‖, tal a miscelânea. Não sabes, dizia-me o dr. XXX, que este Nepomuceno ilustrou, com citações do decrépito Michelet, uma sentença de divorcio amigável onde fala de Helena, de castor e Polux, Menelau e a guerra de Tróia? - Que?! - Ora,... Há dias estávamos eu e outros a conversar. Eis que chega Nepomuceno. Surpreendeu, o maçante; e logo: de que se trata? De citação, disse-lhe, hesitante. E Nepomuceno: como os senhores sabem, há citação por mandato, a citação pó edital, a citação por precatória, ... Como diz Ramalho. Todos fugiram. Eu fiquei esperando um Bond salvador. E o Nepomuceno zás, zás. (Entre o juiz da 3ª vara e o Bond prefiro este, claro está). - ?! - Digo-te mais: a toda a gente o Achiles respondeu quando do caso das professoras;mas ao hilariante juiz, chiça! Isto foi o que ouvi. Agora, o que digo: Para não me tornar digno emulo do Nepomuceno – para me não tornar maçante -, direi, apenas, que aos insultos do juiz da 3ª vara eu poderia contrapor outras tantas diatribes. Tal não falarei. Insultar? É o recurso de todos os Nepomuceno. E não teria graça nenhuma. Ele de lá: bajulador, sabujo, ingrato, cachaceiro, doido...; e eu daqui: desfrutável, velho libidinoso, que te vi, ontem, na gandaia, juiz das partilhas lesivas, doido és tu, que eu nunca tive congestão que me afetasse o cérebro, etc, etc, etc. Caso o dr. Queira uma polemica nestas condições, ali, assim, é a praia do caju. Para qualquer outra espécie de polemica remeto-o a Juvenal Galeno, cuja gramática sesquipedal corre parelhas com... Tem paciência, Nepomuceno. Não discutirei contigo. Toda a gente me diz que ninguém lê leva a sério. Então, eu é que vou dar esse desfrute? Insulta, Nepomuceno. À vontadinha. Freitas Carvalho - 6/11/922

A 4 de junho de 1923 seguiu pelo vapor os papéis da Faculdade de Direito ao presidente do Conselho Superior do Ensino. Certamente solicitando a equiparação, pois prestes a formar a sua primeira turma... Assim, já em agosto, o Conselho Superior de Ensino havia dado parecer favorável à inspeção preliminar da Faculdade de Direito do Maranhão. E a 25 de setembro, em nota sobre os atos do governo, confirmada a dispensa do cargo de fiscal do estado, junto a Faculdade de Direito, o bacharel Alfredo de Freitas Carvalho por ter sido nomeado fiscal federal junto à mesma o bacharel Raimundo Furtado da Silva. Note-se que os editais publicados já se referem à legislação federal de ensino superior, e não mais ao Regimento Interno da Faculdade, agora sob inspeção federal Editorial, de ―A Pacotilha‖, de 13 de dezembro de 1923, com o título: UM INSTITUTO DE ENSINO SUPERIOR A Faculdade de Direito do Maranhão foi uma dessas tentativas que bem poucos acreditavam, a princípio, vingasse, no nosso meios, ainda impregnado daquele sagrado horror ao novo que todos os esforços úteis asfixiavam no ambiente da


indiferença geral, naqueles tempos em que alguns espíritos ousados lançaram a idéia da fundação dum curso jurídico nesta capital. Pouco a pouco a novel escola veio vencendo, sem desânimos, o primeiro trecho do seu caminho, acidentado começo de subida que, olhando agora através do tempo, se nos afigura tão íngreme como o Vira-Mundo, e tão distante... Hoje a estrada se lhe complana dilatada, a perder de vista. Em vez dos pedrouços por onde tropeçou, palmilha um leito de caminho. Numa palavra, a Faculdade de Direito triunfou e é hoje uma das mais fagueiras conquistas da inteligência maranhense, de cujo porvir se faz a mais poderosa alavanca. Tem uma subvenção estadual, outra federal, um prédio próprio, dinheiro para adquirir um mobiliário excelente. Trabalha e floresce. Está sob o regime de fiscalização federal, para o efeito de aquiparação aos estabelecimentos oficiais congêneres. E dentro em pouco, com certeza, estará equiparada. Não tenhamos dúvidas em asseverar, também, que, a todas as crises que a saltearem, oporá tenazmente, a sua já experimentada resistência, com o apoio decidido do governo, do comércio, dos municípios, do povo, tal como aconteceu nos seus primeiros dias, mas com uma confiança na vitoria, incomparavelmente maior. Agora, que acaba de sair dos seus cursos a primeira turma de bacharéis, resta chamar a atenção da mocidade, para que o entusiasmo desta pelos estudos superiores não esmoreça. Para estudar direito, nenhum maranhense precisa mais de sair da sua terra, com grandes dispêndios, e ir cursar academia lá fora. A nossa escola jurídica é tão boa como as melhores e está definitivamente organizada sobre bases sérias. Os estudantes piauienses são os que mais precisam de saber disto que os nossos já sabem. O Maranhão, a dois dias de viagem, em trem de ferro, da capital do vizinho estado, é com a sua e brilhante escola o centro naturalmente indicado para fazerem aqueles os seus estudos superiores, com vantagens econômicas incontestáveis sobre quaisquer outros do país. São Luis, cidade onde a caça ao prazer ainda não estonteia, como em alguns grandes centros, o espírito dos moços, vivendo-os a viver estranhos ao meio escolar, alheios aos cursos, entrando todos os anos em exames com o mesmo venturoso fatalismo de quem, ignorante das leis náuticas, fosse empreender o raid marítimo do piloto Vilar numa canoa de boca aberta, tem todas as condições para aproveitar as grandes tradições do seu passado intelectual na formação dum interessante centro universitário. E, compreendendo isso, entrou a concentrar o que resta da sua cultura, do seu amor acrisolado às lides do espírito, criando escolas superiores. A Faculdade de Direito desta capital é a coordenadora naturalmente indicada dos esforços da mentalidade nos dois estados da mentalidade nos dois estados que as condições geográficas, físicas e humanas, isolaram numa região à parte entre o extremo norte e o nordeste do país, como uma zona de transição, das mais ricas, das mais futurosas do Brasil. A congregação desse florescente instituto de ensino já é um expoente da cultura jurídica dos dois estados, pois já têm assento, ao lado dos maranhenses, irmanados na mesma obra de cultura, ilustres filhos do Piauí. Esperemos o concurso dos estudantes piauienses à nossa escola superior, na certeza de que ele virá sem demora. (Grifos nossos).

Logo no inicio de 1924, em nota publicada a 14 de janeiro, informava-se de que a Faculdade de Direito do Maranhão requerera junto ao Conselho Superior de Ensino a sua equiparação; acompanhou o requerimento Relatório do Fiscal Federal junto à Faculdade. A 16 de fevereiro, é dado conhecimento, através


da imprensa, de que o Conselho de Ensino Superior havia se manifestado favoravelmente à equiparação da Faculdade de Direito do Maranhão. Era o tão esperado reconhecimento... A notícia fora comunicada ao Presidente do Estado pelos senadores Cunha Machado e José Euzébio, através de telegrama. O Diário de S. Luiz também anuncia o reconhecimento. Para que se procedesse à equiparação, a Faculdade de Direito teve que ser submetida à inspeção do Conselho Superior de Ensino, conforme preconizava a legislação vigente. Era nomeado um Inspetor e apresentação de relatório àquele Conselho, que então decidiria pela equiparação: Art. 11. As academias que pretenderem que os diplomas por ellas conferidos sejam registados nas repartições federaes, afim de produzirem os fins previstos em leis vigentes requererão ao Conselho Superior do Ensino o deposito da quota de fiscalização na Delegacia Fiscal do Estado em que funccionarem. Art. 12. O Conselho Superior poderá indeferir logo o requerimento, se tiver informações seguras de falta de idoneidade dos derectores ou professores do instituto. Art. 13. Deferida a petição, será pelo presidente do Conselho proposto ao Ministro da Justiça e Negocios Interiores o nome de um brazileiro familiarizado com as questões do ensino, o qual será nomeado em commissão para inspeccionar a academia. [...] Art. 15. O inspector apresentará relatorio circumstanciado sobre o que houver visto e colligido a respeito do instituto e, na falta de qualquer dos requisitos enumerados no artigo antecedente, concluirá por aconselhar que se não conceda a pretendida equiparação ás academias mantidas pelo Governo Federal. Art. 16. Não será inspector pessoa ligada por affinidade de qualquer natureza aos directores ou professores da academia, e, quando possivel, não residirá siquer no Estado em que o instituto funccionar. Art. 17. Considera-se terminada a inspecção com o julgamento do relatorio pelo Conselho Superior do Ensino.

Logo, a 26 de fevereiro, a Diretoria da Faculdade é notificada de que o Ministro João Luis Alves havia assinado o ato de equiparação da mesma. Em nota de ―A Pacotilha‖, de 02 de outubro de 1924, anuncia-se a nomeação do Sr. Raimundo Furtado da Silva para inspecionar a Faculdade de Direito do Maranhão. A partir de 1925, inúmeras alterações das leis em vigor, e normas sobre o funcionamento das faculdades, começam a ser editadas e comunicadas aos Inspetores federais, a fim de que sejam cumpridas, como esta, publicada em nota a 8 de setembro de 1925, em ―A Pacotilha‖, sobre a reforma do ensino e a matricula para o ano de 1926:

O dr. Furtado da Silva, fiscal da Faculdade de Direito do Maranhão, recebeu do director do Departamento Nacional do Ensino o seguinte telegrama: Sr. Inspector da Faculdade de Direito do Maranhão ―Tendo o governo, por dec. n.17.016 de 24 do mês p. findo, publicado no ‗Diário Oficial‘ do dia 19 que tinha ficado resolvido que, para os alunos matriculados no ano corrente nos institutos de ensino superior, a seriação das cadeiras, o regimen de freqüência e o processo de exame sejam regulados pelo decreto no. 11.530 de 18 de março de 1915, recomendo-vos


que providencieis, com urgência, no sentido de ser restabelecido, imediatamente, no instituto de vossa fiscalisação, o regimen estabelecido no aludido decreto. Saudações, Rocha Vaz‖.

Em 1926, começam a se alterar a situação dos alunos matriculados: DECRETO Nº 5.121, DE 29 DE DEZEMBRO DE 1926, Antecipa a 1ª época de exames para os alumnos das Escolas Juridicas do Brasil que devam terminar o curso em 1927. Conforme ―A Pacotilha‖ de 03 de janeiro de 1927, o dr. Furtado da Silva, inspetor federal junto à Faculdade de Direito do Maranhão, recebera do Departamento Nacional de Ensino cabograma para ‗cuja leitura chama a atenção dos bacharelandos‘:

Inspector da Faculdade de Direito do Maranhão, RIO, 31 (Via Western) – Recomendo-vos providencieis no sentido de serem cumpridas as disposições contidas nos artigos 1º e 2º decreto legislativo numero 5.121, de 29 de dezembro do corrente anno, assim redigidos: artigo primeiro, fica antecipada para segunda quinzena de julho de 1927 a primeira época de exames para os alumnos das escolas jurídicas do Brasil que terminarem o curso naquelle anno, devendo a collação de grau realizer-se solenemente, a 11 de agosto. Paragrapho primeiro, o inicio do anno letivo para os mencionados alumnos será igualmente antecipado para primeiro de janeiro de 1927. Paragrapho segundo,os alumnos que prestarem na segunda época os exames do quarto anno actual, de acordo com as leis em vigor, poderão matricular-se condicionalmente, no período de antecipação que estabelece o paragrapho primeiro, na classe imediatamente superior. Artigo segundo, os estudantes que pretenderem seguir os cursos do ensino superior e que terminaram o curso gymnasial ou preparatórios até o anno de 1925, poderão prestar exame vestibular na segunda quinzena de 1927, para fazerem exame de primeiro anno em segunda época, perante as faculdades cuja lotação de alumnos não esteja completa. Paragrapho único, a inscrição de exame vestibular será na primeira quinzena do referido mez de janeiro de 1927. Saudações, Dr. Rocha Vaz.

―A Pacotilha‖ – edição de 28 de janeiro de 1927 - publica o parecer do dr. Paranhos da Silva sobre os institutos equiparados, de sua visita feita em julho do ano anterior: O ENSINO SECUNDÁRIO E SUPERIOR NO MARANHÃO Do relatório apresentado ao Diretor Geral do Departamento Nacional de Ensino, em 10 de setembro do anno passado, pelo dr. Paranhos da Silva, director da secção de expediente e contabilidade sobre os Institutos de ensino do norte da República, extrahiamos a parte relativa ao nosso Estado e que é a seguinte: No Estado do Maranhão funcionam dois Institutos equiparados aos congêneres federaes: a Faculdade de Direito e o Lyceu Maranhense. Faculdade de Direito Está instalada num edifício antigo, em optimo estado de conservação e de asseio, bem adaptado aos seus fins. O seu material escolar é novo e bom. A sua escripturação está em perfeita ordem. A sua matrícula é restricta, porque o instituto serve apenas aos discentes dos Estados do Maranhão e do Piauhy. Fiz a vizita em período legal de férias (26 de julho), não podendo por isso assistir às aulas. De quando vi e examinei, tive a impressão de ser a Faculdade criteriosamente dirigida pelo professor cathedrático Dezembargador Couto, que escrupulisa em dar exacto cumprimento á lei e ás instrucções do Departamento.


[... segue-se a análise do Lyceu Maranhense...]

Henrique Costa Fernandes (2003)229 ao trazer relatório da administração Magalhães de Almeida, matéria sobre Instrução Pública, em sua mensagem de 1927, às páginas 16 a 17, assim se expressa: FACULDADE DE DIREITO Dentro dos limites dos seus recursos, o Estado vai procurando desenvolver a instrução, com que despende perto de 15% das suas rendas. Na instrução superior, destaca-se a Faculdade de Direito, que, criada em 1918 e equiparada às oficiais em 1924, se tem mantido na altura da sua missão, merecendo as melhores referências dos poderes públicos, como as que tive a satisfação de ouvir, por ocasião da passagem do sr. Dr. Paranhos da Silva nesta capital. Secretário do Departamento Nacional do Ensino, o ilustre visitante foi encarregado, por este, de inspecionar, nos estados, os estabelecimentos de instrução superior e secundária oficiais e equiparados. Visitando a nossa Faculdade e desempenhando-se da sua importante comissão, teve palavras de francos elogios à referida escola, que considerou bem instalada, com escrituração bem feita, boa direção, mobiliário adequado, enfim, com todos os elementos exigidos por estabelecimentos dessa natureza. A matrícula em 1926, foi de 34 alunos, assim distribuidos: 10, no 1º ano; 8, no 2º; 9, no 3º, 1 e 1 ouvinte, no 4º, 6 no 5º. Parece pequena; mas, se atendermos a que existem escolas congeneres nos Estados do Pará e do ceará, chegaremos à conclusão de que a nossa só poderá sere frequentada, em regra, por estudantes mdeste Estado e do Piauí. (p. 269).

A 17 de novembro noticia-se o falecimento do dr. Raimundo Furtado da Silva, nascido em Brejo a 20 de fevereiro de 1892. Aluno do curso de humanidades do Lyceu Maranhense, bacharelando-se em ciências e letras. Aluno da Faculdade de Direito da Bahia, transferindo-se para a do Ceará, onde recebeu o grau de bacharel em ciências jurídicas e sociais em 1917. Regressando ao Maranhão, exerceu as funções de 1º delegado auxiliar, diretor da Biblioteca Publica e fiscal federal junto à Faculdade de Direito do Maranhão. Como causídico, teve renhidos embates na arena forense. Membro do diretório do Partido Republicano e deputado ao Congresso do Estado, onde exercia as funções de líder da maioria. A 8 de fevereiro de 1928, ―A Pacotilha‖ publica a mensagem do Governador do Estado ao Congresso do Estado, enviada a 5 de fevereiro. Sobre a Instrução, consta que a Faculdade de Direito e a de Farmácia e Odontologia continuavam a oferecer ensino superior, e a receber subvenções orçamentárias do Estado. E que, por falecimento do dr. Raimundo Furtado da Silva, fora nomeado Inspetor Federal da Faculdade de Direito o dr. Constancio Clovis de Carvalho.

229

FERNANDES, Henrique Costa. ADMINISTRAÇÕES MARANHENSES: 1822-1929. São Luis: GEIA, 2003.


Telegrama chegado, e publicado em 03 de abril, de que o Inspetor Federal junto à Faculdade de Direito recebera, dando instruções para as matrículas: RIO, 28 – Communico-vos para os fins convenientes, que, segundo determinação do Sr. Ministro da Justiça e Negocios Interiores, de 22 de setrembro de 1927, nos editaes de Inscripção para os próximos concursos deve ser declarado, de modo expresso, que, só ficam isentos da exigencia da idade inferior a 40 annos, os candidatos que se acharem nas condições das alíneas A e B do artigo 151 do decreto n. 16782, de 13 de janeiro de 1925230. Cordiaes saudações – ALOYSIO DE CASTRO, director geral do Departamento Nacional de Ensino.

A 3 de agosto, noticiada novas alterações para o ingresso nas Faculdades de Direito, conforme segue: EXAMES O dr. Constancio Carvalho, inspector da Faculdade de Direito deste estado, pede-nos a publicação do seguinte telegrama: RIO, 30 – Para os devidos fins, transmito-vos, na integra, o aviso n. 165, de 13 do corrente, do exmo. Sr. Ministro da Justiça e negócios Interiores: Declara-vos, para os fins convenientes, na conformidade do disposto no artigo 280, do decreto n. 16.782, de 13 de janeiro de 1925 que, em 15 de janeiro do corrente anno, os bacharéis em sciencias e letras pelo collegio Pedro II, com approvação nos cursos complementares do 6. Anno, terão preferência para o ingresso nas escolas superiores, isento das provas do exame vestibular de que trata o artigo 206 do citado decreto 16.782, de 1925. – saudações. – Manoel Cicero, director geral. 230

Art. 151. Poderão inscrever-se no concurso: a) os docentes-livres da cadeira vaga; b) os professores cathedraticos e substitutos de outras cadeiras; c) os docentes-livres, professores cathedraticos e substitutos de outras escolar officiaes ou equiparadas; d) o profissional diplomado que justifique com titulos ou trabalhos de valor, a sua inscripção no concurso, a juizo da Congregação.



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