Depress達o e melancolia
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Editor João Baptista Pinto
Revisão Rita Luppi
Projeto Gráfico e capa Rian Narcizo Mariano
Imagem: Louis-Jean-François Lagrenée
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
C433d Charam, Isaac, 1934Depressão e melancolia : equimoses espontâneas somente em mulheres : frases de pacientes deprimidos : 193 sintomas sexuais da depressão : prevenção do suicídio / Isaac Charam. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Letra Capital, 2016. 102 p. ; 23 cm. ISBN 9788577854325 1. Depressão mental. 2. Melancolia - Aspectos psicológicos e biológicos. 3. Suicídio. 4. Prevenção do suicídio. I. Título. 16-31183 CDD: 616.8527 CDU: 616.895.4
Letra Capital Editora Tel: (21) 2224-7071 / 2215-3781 vendas@letracapital.com.br
Isaac Charam Professor de Psiquiatria da Universidade Federal Fluminense
Depressão e melancolia Equimoses espontâneas somente em mulheres Frases de pacientes deprimidos 179 Sintomas sexuais da depressão Prevenção do suicídio
Sumário Dedicatória......................................................................................... 7 Agradecimentos................................................................................. 9 Instrodução........................................................................................ 11 Aos leitores......................................................................................... 13 Epígrafes............................................................................................. 18 1 Histórico da melancolia ou depressão do humor na Grécia Antiga.......................................................................... 19 2 Introdução à depressão do humor............................................. 23 3 Demografia da depressão descrita no Rio de Janeiro pelo autor, publicada nos Estados Unidos................................. 25 4 Da melancolia para a depressão conforme Adolph Meyer............................................................................... 27 5
Conceito de depressão atual na CID-10 Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, décima revisão, 1993, da Organização Mundial de Saúde............................................ 28
6 Caso clínico de depressão de humor......................................... 29 7
Lista das 389 frases de pacientes do autor com depressão e melancolia nos casos graves, homens e mulheres, englobando sintomas psíquicos e somáticos, em ambulatórios do serviço público..................... 31
8 Lista de 169 sintomas corporais na depressão do humor encontradas pelo autor em homens e mulheres....................... 45 9 Lista dos 179 sintomas da sexualidade na mulher e no homem na depressão do humor encontrados pelo autor..................................................................................... 51
10 Estudo sobre um sintoma somático único, novo, cutâneo, na depressão do humor, só em mulheres, “equimoses melancólicas” ou “manchas roxas de melancolia” descrito pelo autor, publicado na Espanha................................ 59 11 Opiniões de outros psiquiatras sobre o trabalho do autor sobre Equimoses na Depressão do Humor, em livros e artigos, na Espanha.................................................. 65 12 Depressão do humor moderada associada com equimoses espontâneas e indolores, exclusivo de mulheres. Sintoma transcultural depressivo unissexual? Relato de seis casos. “Sinal roxo de alerta”, nome sugerido pelo autor..................... 67 13 Síndrome de Marie-Robinson: associação de melancolia, insônia e impotência sexual. Levulose com adoçante.............. 73 14 Prevenção do suicídio: “Sinal Roxo de Alerta”, segundo o autor........................................................................... 73 15 Regras de saúde mental em 1497 em poesia de Portugal......... 81 16 Descrição da melancolia pelo padre Antônio Vieira, na Bahia em 1650........................................................................ 83 17 Lista de nomes de 118 suicidas famosos, na vida real, na Bíblia e nos romances, coligidos pelo autor......................... 86 18 “Tristeza” bovina e canina, babesiose ou anaplasmose, no Brasil e na Argentina “doida” do gado lanígero. Importância em medicina translacional?.................................. 89 19 Florilégio de Depressão do Humor ou Melancolia................... 91 Sobre o autor...................................................................................... 94 Referências bibliográficas................................................................. 97
Dedicat贸ria Para Maria Christina, minha amada mulher.
Agradecimentos Aos meus professores, chefes, amigos, clientes e alunos. Aos professores Antonio Geraldo da Silva (ABP) Fátima Vasconcelos. (APERJ) Araújo Leitão (Academia Brasileira de Medicina de Reabilitação) Lopez Ibor e Lopez Ibor Filho – Espanha José Leme Lopez Deolindo Couto Neves Manta Pacheco e Silva Lauro Solero Adolpho Hoirisch Osvaldo de Moraes Andrade Cincinato de Magalhães Freitas (IPUB) Wassili Chuc (Primeiro professor da enfermaria do IPUB) Isaías Paim Walderedo Ismael de Oliveira (Orientador do mestrado na UFRJ) Ullisses Viana Filho João Carlos Teixeira Brandão (Hospital Gustavo Riedel, Niterói) Jurandir Manfredini À Organização Mundial de Saúde e à Organização Pan-Americana de Saúde. À Universidade Federal Fluminense (UFF) À Faculdade IBMR Ao Conselho Federal de Medicina, que autorizou a Sexologia como Especialidade Médica.
Introdução
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este livro a palavra “depressão” é sempre do humor, porque há outras depressões fora da Psiquiatria como, por exemplo, depressão do campo visual, do centro respiratório, do nariz, e do crânio e, portanto, esta palavra completa é importante, porém para psiquiatras basta “depressão”. Sobre “melancolia”, de acordo com a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), 10ª edição, volume 1, da Organização Pan-Americana de Saúde e Organização Mundial de Saúde, de 1993, editado pela EDUSP, atualmente as formas mais graves de transtornos depressivos recorrentes, sem e com sintomas psicóticos (F32.2 e F32.3), apresentam numerosos pontos comuns com os conceitos anteriores de psicose maníaco-depressiva, depressão endógena e depressão vital. Depressão recorrente significa a que ressurge após haver aparecido. Neste livro não estudamos a mania, que é o oposto da depressão do humor. Na CID-10, os colchetes – [ ] – são usados para incluir sinônimos, palavras alternativas. A página 10 da revisão da CID-10 tem um código de categorias diagnósticas de três caracteres, com um código alfanumérico, com uma letra na primeira posição e um número na segunda, terceira ou quarta posições. Os parênteses – ( ) – são usados para incluir o código de três caracteres listados. A depressão e a melancolia também são provocadas por doenças somáticas e medicamentos, inclusive outras doenças psiquiátricas e medicamentos psicotrópicos. Em outras palavras a depressão recorrente grave é chamada de melancolia, que antes era usada para todos os graus de depressão. A melancolia, pela etimologia, vem do grego “melo” significando negro e “cole”, ou bílis, mas nunca existiu essa bílis negra e, portanto, melancolia é um nome incorreto, na opinião do autor, mas consagrado pela tradição médica, cultural e popular. “Melancolia” entrou para a linguagem culta e poesias (ver Camões), na música brasileira e também nos fados de Portugal, nos nossos sambas e nos blues americanos. Depressão e melancolia 11
Depressão vem do latim “deprimere”, sendo “de” significando “debaixo de” e “premere” indicando apertar, sendo palavra de origem dúbia. “Deprimere” significa abaixar. Não é palavra incorreta etimologicamente, como a melancolia. “Depressão”, mais recentemente, entrou para linguem culta popular e canções. A ansiedade pode acompanhar a depressão ou não. Entre os Transtornos do Humor [Afetivos] (F30-F39) temos a depressão, essa alteração do afeto acompanhada de modificações do nível de atividade, havendo outros sintomas psíquicos e somáticos. Temos Transtorno Afetivo Bipolar (F31), Episódios Depressivos (F32) e Transtorno Depressivo Recorrente (F33), Ciclotimia com Depressão (F34.0) e Distimia (F34.1). “Triste” vem do latim “tristis”. Na língua inglesa blues são canções melancólicas e tristes, inicialmente nas pessoas de origem africana. O livro tem 738 frases e sintomas observados pelo autor.
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Aos leitores
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este livro tratamos da depressão do humor ou simplesmente depressão ou transtorno depressivo. Foi idealizado como uma coleção de frases de pacientes com depressão do humor ou melancolia, conforme a expressão popular no Brasil. Segundo o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (CREMERJ), “o atendimento de pacientes ambulatoriais farse-á na proporção de 16 pacientes para cada médico, numa jornada de quatro horas de trabalho, sem prejuízo de esse limite vir a ser ultrapassado por decisão exclusiva do respectivo médico, numa média de 04 (quatro) pacientes por hora” (segundo parecer CREMERJ N. 10/1991). Frases em tão curto período de tempo podem sugerir um diagnóstico precoce de depressão ou mesmo de ideias de suicídio, podendo orientar internações psiquiátricas mais brevemente e reduzir o tempo de permanência no hospital e alertar a família. Dedica-se o livro a médicos, psiquiatras, psicólogos, advogados, assistentes sociais, psicoterapeutas, enfermeiros, religiosos que trabalham com psiquiatria pastoral, jornalistas, antropólogos, sociólogos, professores, alunos e também para esposos. O livro contém: a) 389 frases de pacientes do autor com depressão do humor, com sintomas psicopatológicos e somáticos (ou corporais) no homem e na mulher; b) 169 sintomas somáticos na depressão do humor, no homem e na mulher; c) 179 sintomas sexuais na depressão, no homem e na mulher; d) um sintoma somático cutâneo na depressão, só em mulheres – equimoses; e) num total de 738 frases e sintomas referentes à depressão do humor. A Classificação Internacional de Doenças 10ª Revisão (CID-10), da Organização Mundial de Saúde (OMS) apresenta 38 sintomas do episódio depressivo, mas ela é estatística e só informa os sintomas mais frequentes, e neste livro colocamos todos os sintomas ouvidos dos pacientes. A depressão do humor está na CID-10 entre os Transtornos Mentais e Comportamentais, ou da Psiquiatria (F00-F99). Depressão e melancolia 13
A frase mais importante e frequente das pacientes com depressão do humor é “tenho manchas roxas de melancolia” e “tenho manchas pretas de sangue pisado de melancolia”. Perguntar sempre, neste curto período de tempo de atendimento ao paciente, se as mulheres costumam ter manchas roxas ou pretas e se têm casos na família. Desta forma poderemos ter o diagnóstico rápido e preventivo da depressão pela fraseologia aplicada à psiquiatria de pacientes de ambulatório, em consulta muito rápida. A saúde mental interessa e afeta a todos de forma direta e indireta e o livro será útil também para os que sentem interesse em conhecer mais de perto os complicados mecanismos que chamamos de mente humana. Serve de introdução à Clínica Psiquiátrica da depressão. As frases levam à suspeita de que há depressão do humor. Encontramos um sintoma novo, cutâneo, que não consta dos livros didáticos de Psiquiatria do Brasil nem de outros países: equimoses só em mulheres de qualquer idade, associadas à depressão do humor. As equimoses são espontâneas, indolores e não salientes. Isto implicará na necessidade de um estudo multidisciplinar. A etimologia da palavra “equimose” é “eq” que significa “para fora” e “chymos” que significa “suco”. “Achava que o corpo (do homem) já tinha sido totalmente mapeado, mas foi descoberta agora a conexão do cérebro com o sistema linfático em agosto de 2015”, declarou Jonathan Kipnis, diretor do Centro para Imunologia de Cérebro e Glia da Universidade da Virgínia, EUA. No Brasil numerosas mulheres conhecem as palavras “manchas roxas de melancolia” ou “manchas de sangue pisado de melancolia” já há muitas décadas. Em geral encontramos 28% de equimoses em todas as mulheres deprimidas, de qualquer intensidade de depressão. Encontramos uma nova palavra pouco conhecida no Brasil e em Portugal: malinconia e malenconia, que são manchas roxas ou pretas com melancolia, e esta sinonímia comprova a vulgarização da palavra. Temos também o verbo erudito manenconizar e melancolizar.
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Encontramos uma síndrome pouco conhecida, a de Marie-Robinson, com melancolia, impotência sexual e insônia. Encontramos uma doença em animais chamada de “doença da tristeza” que é a babíase, com alterações no sangue, também chamada de piroplasmose e a “doida”, em gado lanígero (ou “douda”). Há também outra doença, a hemartrose, em que há sangue extravasado em uma articulação ou em sua cavidade sinovial, e que é episódica, em mulheres e de causa desconhecida. Ao final da leitura das frases, julgamos que será possível aos profissionais e universitários realizar com rapidez o diagnóstico da depressão do humor e os advogados compreenderão melhor o assunto. É importante conhecer as pesquisas primitivas e os aspectos literários clássicos para verificar que os antigos médicos, romancistas e poetas anteciparam muitos aspectos psicopatológicos. Optamos pela apresentação de numerosas listas. Desta forma, o autor inicia a Campanha de Combate à Depressão do Humor pelo Diagnóstico Precoce e Prevenção do Suicídio, capacitando os universitários e profissionais para o seu reconhecimento apenas com frases de pacientes, ainda antes do exame clínico especializado, e alertando o governo federal e estadual. Os distúrbios depressivos são hoje uma importante ameaça para a saúde pública em todo o mundo. Embora tenha havido redução significativa da mortalidade e morbidade por doenças físicas, nos últimos anos a prevalência de distúrbios mentais, em especial a de distúrbios depressivos, aumentou. Isto é um fato desencorajador, embora não seja um fracasso como parecia inicialmente. Mais de 70% dos que cometeram suicídio havia visitado um médico de cuidados primários de saúde 30 dias antes. É necessário ter médicos mais alertas e mais úteis para conversar sobre o estado de ânimo e o humor dos pacientes, para realmente perguntar se estão deprimidos e sem esperança. O prazo de 20 minutos dado para a consulta psiquiátrica pelo CRM é claramente insuficiente e necessita de mudança rápida. De cada pessoa que vier a ler este livro, 8-9% poderão estar claramente deprimidas em algum ponto de suas vidas e outras 2-4%
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terão formas mais sutis de depressão segundo alguns. Mais de 10% da população, 200 milhões no Brasil, são vulneráveis à depressão do humor, segundo outros autores. Por razão desconhecida, mais pessoas estão se tornando deprimidas do que anteriormente e isto está ocorrendo em uma idade mais precoce. Cerca de um quarto desses milhões que se tornam deprimidas não recebem nenhum tratamento, e uma das razões é que muitas pessoas acreditam ser uma fraqueza ou uma tarefa humilhante pedir ajuda, e preferem sofrer sozinhas. Neste livro não tratamos de causas nem de tratamento da depressão do humor, que serão objetos de outro volume. Por razões de espaço, demos prioridade a livros clássicos de Psiquiatria nas referências bibliográficas, resgatando a sua memória. É dada ênfase aos aspectos históricos. Como dizia Claude Bernard, “eu estou persuadido que virá um dia onde o fisiologista, o poeta e o filósofo falarão a mesma linguagem”. Há 74% de mulheres, a idade de 18 a 66 anos, média de 47 anos. As páginas deste livro podem ajudar o médico de qualquer especialidade a mudar a vida de seus pacientes e podem até salvar vidas, inclusive com providências de parentes e amigos. O curto tempo de consulta também existia, de 5 a 15 minutos, já em 1966, e culpavam a lei da Inglaterra, do National Health Service no livro de Enid Balint e J.S. Norel – 6 minutos para o paciente. Mulheres com manchas roxas no corpo devem ser examinadas com cuidado, podendo ser portadoras de depressão. As informações sobre depressão do humor (“melancolia” na linguagem popular de todo o Brasil) devem ser difundidas entre médicos, clínicos, cirurgiões, enfermeiros, todos os agentes de saúde e é preciso informar pacientes, governos e empresas. Os casos de equimoses deveriam ser notificados e formar um banco de dados. As frases e sintomas ouvidas pelo autor são 738. Agradecemos ao leitor comentários, críticas e sugestões, enviadas para: Dr. Isaac Charam - E-mail icharam@terra.com.br
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Epígrafes “Estou sempre com manchas roxas de melancolia e na minha família também tem.” (Várias pacientes) “Regozijai-vos!” Epístola de Paulo aos Filipenses 4- 4,6. “A ansiedade no coração do homem o abate, mas a boa palavra o alegra”. Provérbios 12.25. “As palavras são os médicos da mente doente”. Ésquilo, As suplicantes. “O povo em matéria de linguagem é um excelente mestre”. (Platão) “Só existe um problema filosófico verdadeiramente sério, que é o suicídio”. (Albert Camus) CRICHTON, na Inglaterra em 1798, escreveu que “as paixões atuavam nos nervos por meio dos vasos sangüíneos e a melancolia derivava da inibição da atividade vascular no sistema nervoso”. “Achava que o corpo [do homem] já tinha sido totalmente mapeado, mas foi descoberta agora a conexão do cérebro com o sistema linfático em agosto de 2015” declarou Jonathan Kipnis, diretor do Centro para Imunologia de Cérebro e Glia da Universidade da Virgínia, EUA. “Tenho manchas roxas ou pretas de sangue pisado de melancolia”. (Várias pacientes)
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Histórico da melancolia ou depressão do humor na Grécia Antiga
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ipócrates, o Pai da Medicina, nascido na ilha de CÓS (no mar Egeu, capital Rodes), 460-377 a.C., descreveu um temperamento especial e constituição corporal que levavam à melancolia. A bílis negra e a fleugma, ou fleuma, alteravam o cérebro em seu aquecimento e umidade, assim escurecendo o espírito e provocando melancolia. Os quatro temperamentos foram musicados por Strauss. É possível sugerir que os primeiros gregos, especialmente os dramaturgos, muito antes mostraram rudimentos de conhecimentos psicanalíticos, enquanto que os médicos ortodoxos tratavam o fígado como um órgão endócrino e a bílis negra como um hormônio. Os gregos eram sutis analisadores e não realizavam sínteses puras como os romanos. Segundo Hipócrates, havia seis formas de melancolia: 1) melancolia com ânimo triste e amência; 2) melancolia com vida contente intermitente, com esforço para a autoquiria (suicídio); 3) melancolia histérica; 4) melancolia demoníaca; 5) melancolia pânica; 6) melancolia com ideia fixa. Aristóteles, o Estagirita, (de Estagiria, cidade da antiga Macedônia, a noroeste da Grécia) no século 4a.C., no início de um capítulo perguntava: “Como pode ser explicado que grandes filósofos, entre os quais Empédocles, Sócrates e Platão, homens de estado, poetas e artistas, tenham sido melancólicos?”. A depressão do humor parece estar associada ao talento e à criatividade. Aristóteles continuava dizendo que “os que se tornaram eminentes em filosofia, política, poesia e nas artes, tiveram todos tendência para a melancolia”. Aristóteles citava entre os melancólicos Alexandre, O Grande, rei da Macedônia, que chegou a conquistar a Ásia. É de grande significado que as mudanças do humor, da alegria para a tristeza, foram mencionadas por Hipócrates, Platão, Ascle-
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píades, Areteu, Celso, Galeno e Alexandre de Trales (cidade da Índia, região da Ásia Menor), nascido no século VI a.C., praticou em Roma e escreveu uma dezena de livros de Medicina. Além de Hipócrates, encontramos em Aristóteles observações de grande interesse, julgando que as fronteiras entre os fenômenos normais e patológicos não se podiam estabelecer de forma absoluta. Asclepíades de Bitinia, na Ásia Menor, 100 anos a.C., tratava melancólicos e outros doentes mentais deitando-os em uma rede de dormir e balançando-os suave e constantemente ; dizia que a “harmonia musical e um concerto de vozes eram de um grande valor”. Alegria e tristeza, elação do ânimo, ou sua elevação e depressão são mudanças do humor que já eram relatadas na Antiguidade. Pertencem à formulação fundamental da lei dos opostos de Heráclito, filósofo pessimista, chamado de “Filósofo Lacrimoso” (século 6-5 a.C.). Constituem o material dos poetas e é incomparável na obra de Équilo (525-456 a.C.) autor da trilogia Oresteia: Agamenon, Coeforas e Eumênides. O exagero desses estados de ânimo receberam os termos de “mania” e “melancolia”. Vejamos agora, em especial, Areteu da Capadócia (uma antiga cidade da Ásia Menor a oeste da Armênia, que tinha como cidade principal Mazaca, depois chamada de Cesareia): 80 anos a.C. ele descrevia a melancolia como “uma afeção sem febre em que o espírito ficava fixado sempre sobre uma mesma idéia e se aderia a ela fortemente”. Em seu ensaio De Causis et Signis Diuture Morb ele deu uma descrição da melancolia e mania. Definia a melancolia como uma tristeza da mente em que o paciente meditava sobre certo assunto e sem febre. Ocorria quando a bílis negra elevava-se até o estômago e diafragma. A palavra bílis designava raiva, e a bílis negra significava raiva apaixonada. A melancolia era geralmente o começo da mania. Na melancolia ocorria às vezes o medo de envenenamento, misantropia e superstições religiosas, além de inclinação para o suicídio. Se a bílis era retida na região precordial e diafragma poderia ser mais fácil livrar-se dela. Mas se a cabeça era atraída ao mesmo tempo,
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tornava-se comum haver raiva e fúria. A doença era mais frequente entre homens do que em mulheres, mas entre estas era mais violenta. Era peculiar à idade média de vida, ocorria especialmente no verão e inverno e em geral desaparecia na primavera. Os pacientes estavam quietos ou tristes, abatidos, aborrecidos sem nenhuma razão. A melancolia ocorria quando era impossível encontrar uma causa. Os sonhos eram assustadores, claros e semelhantes à verdade; eram mutáveis. Os pacientes odiavam e evitavam a sociedade, queixavam-se das coisas mais triviais. Sua cor era semelhante ao negro com verde, quando a bílis, ao invés de descer, se difundia por todo o corpo, misturada com a massa do sangue. Seu ventre pouco se movimentava, mas tudo que era eliminado era redondo e seco. A urina era em pequena quantidade, ácida e misturada com bílis. Eram incomodados com flatulência no precórdio e eructações fétidas. Havia sensação de frio. A unidade das fases circulares de melancolia e mania foi atribuída a Areteu que deu a melhor descrição, provavelmente tendo visto casos de pessoas irritáveis, raivosas e alegres em um dia e que se tornavam silenciosas e tristonhas em outros. Areteu da Capadócia (na Ásia Menor) deu outra descrição da melancolia grave: “Se a bílis negra tende a fluir para cima, no estômago e o diafragma, produz a melancolia, porque a flatulência e eructações de natureza fétida e com cheiro de peixe, e os flatos retumbando para baixo perturbam o entendimento. Por esta causa, em épocas anteriores, estas pessoas eram chamadas melancólicas e flatulentas. A melancolia é o começo e parte da mania. Apodera-se dos pacientes um medo irracional quando seus sonhos têm muita realidade, são terríveis e claros”. Conforme Areteu, a melancolia e a mania estão localizadas no hipocôndrio. Ele descreveu a personalidade pré-psicótica do futuro maníaco, e das pessoas predispostas à melancolia dizendo que as pessoas que padeciam de mania ou furor são “naturalmente irritáveis, violentas, facilmente dadas à alegria, têm um espírito inclinado para as brincadeiras ou as coisas infantis”. Portanto, é o primeiro indício de que certas enfermidades mentais não eram mais do que uma extensão psicológica dos chamados traços anormais da personalidade.
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Na melancolia descrita por Areteu os pacientes eram tristes, desanimados e insones. Queixavam-se de mil sutilezas e desejavam a morte. O grego Galeno (século 2 d.C.) nasceu em Pérgamo, e era chamado o “Príncipe de médicos” e o “Pergamita”. Herdou o temperamento irritável da mãe. Chamam-se preparações farmacêuticas galênicas aquelas contendo 120 vegetais e minerais de origem natural, por ele preparadas, por oposição aos medicamentos químicos, ou medicamentos espagíricos, ou sistema alquimístico. Acreditava que a melancolia era uma superfluidez da bílis negra e da própria substância do cérebro. O humor melancólico era uma condição do sangue, espesso e como a bílis negra, exalado pelo cérebro. Galeno repetia as palavras de Hipócrates: “Os homens devem saber que do cérebro surgem os prazeres, as alegrias, o riso e as brincadeiras, assim como nossas aflições, dores e lágrimas”. A melancolia parece ter sido confundida por Hipócrates com a epilepsia, conforme prova a passagem seguinte: “Os melancólicos se tornam comumente epilépticos e os epilépticos melancólicos; nestes dois estados o que determina a preferência é a direção que toma a bílis negra: se ela se coloca sobre o corpo é a epilepsia que sobrevém; se ela atinge a inteligência é a melancolia”. Galeno mostrava-se de acordo com Hipócrates quanto à relação entre a epilepsia e a melancolia e declarava que “Hipócrates sustentava que a ausência do derramamento do sêmen podia determinar a melancolia. Eu mesmo já vi um indivíduo que depois da dor que lhe causou a morte de sua mulher se absteve de relações sexuais, que realizava antes com frequência. Tinha perdido o espírito e não digeria o pouco que comia. Todas as desordens desapareceram depois que retomou seus antigos costumes”. Galeno estabeleceu relações entre a melancolia e a hipocondria e entre o estômago e o cérebro na patogenia. “Com efeito, o estômago transmite suas enfermidades à cabeça, e esta transmite as suas ao estômago, devido à longitude dos nervos que, do encéfalo, chegam ao orifício do estômago e que dão a esta parte do corpo uma sensibilidade superior a todas as outras partes”.
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