Ver maior Educadores e educandos - 47 anos de história

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SÉRIE @prendersempre.com Dom Robson Medeiros Alves, OSB (ORGANIZADOR)

Ana Maria Siniscalco Gasparini Dom Lourenço Russo, OSB Natália Andreazzi Finelli Roseli Elena Andreazzi Finelli Valéria Gargano

educadores e educandos 47 anos de história do educadores e educandos

47 anos São de história do Colégio Colégio João Gualberto São João Gualberto


Copyright© Dom Robson Medeiros Alves, OSB (organizador), 2013 Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem a autorização prévia por escrito da Editora, poderá ser reproduzida ou transmitida, sejam quais forem os meios empregados.

A publicação desta obra foi possível graças ao patrocinio do Instituto Educacional São João Gualberto - São Paulo, SP Editor João Baptista Pinto Revisão Elizete Santos Gomes e Natália Andreazzi Finelli P. Ari Ribeiro Renato da Cunha Oliveira Projeto Gráfico e capa Rian Narcizo Mariano CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

E26 Educadores e educando : 47 anos de história do Colégio São João Gualberto / organização Dom Robson Medeiros Alves. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Letra Capital, 2013. 140 p. : il. ; 23 cm. Inclui bibliografia ISBN 9788577852338 1. Colégio São João Gualberto (São Paulo). 2. Educação. I. Alves, Dom Robson Medeiros. 13-06493 CDD: 370.981 CDU: 37(81)

Letra Capital Editora Telefax: (21) 2224-7071 / 2215-3781 letracapital@letracapital.com.br


Dom Robson Medeiros Alves, OSB (organizador) Ana Maria Siniscalco Gasparini Dom Lourenço Russo, OSB Natália Andreazzi Finelli Roseli Elena Andreazzi Finelli Valéria Gargano

educadores e educandos 47 anos de história do Colégio São João Gualberto


CONSELHO EDITORIAL Ana Maria Saul - PUC/SP Andre Ary Leonel - UDESC Antonio Chizzotti - PUC/SP Fernando Albuquerque Costa - ULisboa George França dos Santos - UFT José Armando Valente - UNICAMP Maria Altina Silva Ramos - UMinho Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida - PUC/SP Robson Medeiros Alves - FSB/RJ Rose Cerny - UFSC Sérgio Paulino Abranches - UFPE Silvana Lemos - PUC/SP Tânia Maria Hetkowski - UNEB


Sumário Prefácio.................................................................................007 Apresentação........................................................................011 Colégio São João Gualberto: sua história e seus objetivos.....................................................................016 Dom Lourenço Russo, OSB Nossa ação pedagógica: na didática do ontem ao amanhã, a presença operante das tecnologias para construir aprendizagens.............................................026 Dom Robson Medeiros Alves, OSB A noção de tempo e as crianças.........................................069 Natália Andreazzi Finelli Aprendendo sobre aprendizagem: um olhar psicopedagógico..................................................086 Roseli Elena Andreazzi Finelli Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM): instrumento avaliativo do aluno, não da unidade escolar......................110 Valéria Gargano A escola de meus pais, a minha escola, a de meus filhos e de meus netos…................................................................128 Ana Maria Siniscalco Gasparini Conclusão.............................................................................137



Prefácio São histórias que a história Qualquer dia contará De obscuros personagens As passagens, as coragens São sementes espalhadas nesse chão (...) Gonzaguinha, Pequena memória para um tempo sem memória.

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ste livro escrito a várias mãos traz a memória de 50 anos do Colégio São João Gualberto, história construída por um grande contingente de pessoas, que se dedicaram por dias e dias a lançar com suas calejadas mãos as sementes da fé na vida, em Deus, no futuro e na educação. As sementes se espalharam pelo chão do Bairro de Pirituba, e seus frutos entrelaçaram a evolução do Colégio com a história do bairro, fazendo que ambos se desenvolvessem em um processo de transformações e mútuas interferências. Desde suas origens o Colégio se fez como um espaço sociocultural e educacional de referência para a comunidade de Pirituba, em especial, para todos aqueles de distintas gerações que o frequentam, ou já o frequentaram. Diretores, supervisores, coordenadores pedagógicos, professores, alunos, pais e outros participantes dos eventos sociais do Colégio são os protagonistas dessa história, que têm os professores como um dos principais construtores das relações entre conhecimentos, valores, espaços e tempos de realizações sobre o passado, transformações no presente e esperança para o futuro. 7


Prefácio

Inspirado pelos ideais da formação humanista cristã, o Colégio soube questionar o tempo e o espaço do ensino e da aprendizagem em busca de reafirmar o seu papel no seio da sociedade tecnológica, e de expandir o seu fazer e pensar a educação a partir da experiência das novas gerações com linguagens e instrumentos culturais, que fazem parte de seu cotidiano. O presente se faz com a midiatização das tecnologias digitais de informação e comunicação – TDIC, que adentram todos os setores de atividades, reestruturam a dinâmica da vida, alteram os modos de pensar, agir, comunicar e estabelecer relações, e provocam a escola no sentido de rever o seu papel e assumir-se como organização que articula, produz e dissemina conhecimentos, representados em distintas linguagens e com o uso de diferentes dispositivos, que podem ser empregados tanto para a dominação do homem como para sua emancipação. Na perspectiva da presença humana, da participação e da emancipação, o Colégio articula o tempo histórico, que lhe é inerente, com os novos espaços, tempos e contextos redimensionados pelas interações propiciadas pelas TDIC, incorporando-as nas práticas em que se aprende à medida que se ensina. Assim, o Colégio procura criar condições para proporcionar aos aprendizes o desenvolvimento da capacidade de uso educativo e cultural das TDIC como instrumentos para expressar o pensamento por meio de múltiplas linguagens, selecionar, organizar e compartilhar informações e, sobretudo, para propiciar modos mais abertos, flexíveis e dinâmicos de tratamento da informação, desenvolvimento do currículo, aprendizagem, produção e disseminação de conhecimento, valorização da vida, solidariedade, respeito às diferenças e construção de identidades individuais e coletivas. Desse modo, este livro representa a culminância de um árduo trabalho de pessoas que se dedicaram a retratar as 8


Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida

passagens e as coragens empreendidas para promover a educação e a formação humana, voltadas à compreensão da realidade, à transformação social, à produção de significados científicos, culturais e sobre à própria existência, renovando os processos de semeadura ao oferecer aos leitores uma pequena memória para novos tempos, lugares e contextos! Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida1 Pontifícia Universidade Católica de São Paulo São Paulo, outubro de 2013

1 Professora associada da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, coordenadora e docente no Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, linha de pesquisa Novas Tecnologias em Educação, da Faculdade de Educação da PUC/SP. Líder do grupo de pesquisa Formação de Educadores com suporte em meio digital, certificado desde 2003, com bolsa produtividade em pesquisa do CNPq. Realizou pós doutorado na Universidade do Minho (2008), doutorado em Educação (Currículo) pela PUC/SP (2000), Mestrado em Educação (Currículo) pela PUC/SP (1996) e graduação (Licenciatura e Bacharelado em Matemática pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1973). Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Tecnologia e Formação de Educadores, atuando principalmente nos seguintes temas: integração de tecnologias ao currículo, tecnologias na escola, educação a distância, tecnologia e formação de educadores, inclusão digital, gestão escolar e tecnologias.

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Apresentação

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m livro que pretende marcar quase meio século de presença histórica de um Colégio fundado num bairro que hoje tem 128 anos é uma tarefa muito significativa, afinal o cotidiano deste Colégio acompanhou o crescimento do bairro. Aliás, este livro tem além de contribuições acadêmicas, muitas significações simbólicas que dizem respeito ao modo como o saber local foi se construindo, além do que como livro ele pretende marcar uma espécie de comemoração anual neste período de três anos que antecedem o jubileu de ouro do Colégio São João Gualberto. Significa relatar que a vida social do bairro foi acontecendo com a participação deste Colégio e que muitos dos seus moradores estudaram, visitaram e frequentaram o espaço desta escola, que não só ministrava aulas como também servia à sociedade local de formas diversas: catequeses religiosas católicas, campanhas de saúde, apurações de eleições, apresentações culturais, encontros com autoridades civis e eclesiásticas, pleitos eleitorais, etc. Significa compreender que este Colégio foi muito mais do que apenas um lugar de transmissão de conhecimento, mas um lugar onde a evolução intelectual aconteceu em parceria com a vida da sociedade local e daí se expandiu para além-fronteiras. Significa que as lições ensinadas foram também aprendidas com todas as pessoas que matriculavam seus filhos, que lá estudaram, ensinaram, trabalhavam ou apenas frequentavam os eventos abertos à comunidade como um todo, e que hoje navegam pela internet, adentrando virtualmente na escola, deixando comentários, fazendo elogios, colaborando com nosso aperfeiçoamento, etc. 11


Apresentação

A missão de educar, como contribuição para o crescimento do saber local é fato que qualifica a significação de pertença a uma comunidade, constituindo-se parte fundamental para o pleno entendimento do que é essa missão. Nesse sentido, as lições se cruzam expandindo o aprendizado do saber científico, emocional e social, isto é, abrange todas as esferas existenciais. Isso revela a importância de cada ser humano ao longo da história da vida da espécie e de suas instituições. A necessidade deste reconhecimento, muito mais do que apenas tratar de questão social de acesso à educação, é também de expressão que a educação tem certo cunho fisiológico, pois a educação faz evoluir a alma do ser humano, à medida que aumenta o saber, que abre perspectivas e que atribui sentido de pertença social à comunidade dos que comungam o ideal de transformação da sociedade a partir da revolução do saber. Muitas são os condicionamentos nos quais o processo de aprendizado vai acontecendo dentro de uma unidade de ensino, e essas, às vezes, são resultantes de processos históricos pelas quais uma comunidade faz experiência. Isto manifesta que a educação é uma realidade dinâmica que favorece a interação do homem com a vida, e de uma maneira espetacular, sempre repleta de novas realidades a gerarem novos desafios. Duas questões categóricas para a filosofia estão ligadas profundamente à educação: o tempo e o espaço. Ambas refletem um composê de atuação do educador que, no seu tempo e lugar de educar, se realiza como pessoa. Ele, como um ser que age num momento histórico, com seus desafios, dificuldades e contribuições, experimenta uma positiva condicionante existencial, de ter que esforçar-se para não se afastar de seu tempo histórico, mas atuando no tempo do outro, tendo que desenvolver habilidades de tramitar entre o seu ontem e as perspectivas do amanhã, seu e de seus alunos, 12


Dom Robson Medeiros Alves, OSB

de modo a interagir no hoje, convivendo com tempos históricos que não deixam de ser dele, mas que são perspectivas temporais que refletem muito mais as características de gerações vindouras. Assim é que o educador traz consigo sua experiência de educando, sua admiração por seus educadores, tal como se envolve com a força e energia daqueles que sê-lhes apresentam como diamantes a serem lapidados. Por isso, o tempo do seu aluno é a continuação do seu tempo. Outra questão é a do espaço. Espaço que reflete um lugar, com suas formas e estruturas a serem exploradas como recursos capazes de favorecer a interação entre o físico e o estar nele. Trata-se de uma questão de interatividade que tem um poder de dar vitalidade à escola, de trazer presença humana, que transforma e constrói o lugar da interioridade humana, que estimula a cognitividade das pessoas, e que realiza o sonho de iniciar a construção da esperança do amanhã melhor. Desta forma, pode-se entender que o espaço da escola é o espaço da realização, e a esperança do futuro dos seus envolvidos. No contexto histórico e espacial do Colégio São João Gualberto, podemos destacar que as relações interpessoais foram se estruturando à medida que as gerações dos alunos foram frequentando esta escola, e que se pode prognosticar que é um contexto em continua expansão. Toda escola aprende sempre com seus frequentadores. É um lugar que ensina, aprende e comunica saberes que se estendem na e por toda a vida. De modo tal que sua memória se consagra na história de vida de pessoas, instituições, tempos e lugares. Uma escola, então, se mistura com a existência dos que por ela passam, devido à sua característica primordial de ser presença para aprendizagem, sobretudo através da dinâmica de inter-relacionamentos. Quanto à história do “como” foram se construindo as aprendizagens no Colégio São João Gualberto, este livro aborda alguns tópicos, e admite que tantos outros não estão 13


Apresentação

contidos nas letras que se seguem, e que mesmo tendo sido escritas por diversas mãos e contribuições, não dão conta de resumir uma história que temporalmente tem quase cinco décadas, mas que espacialmente, se colecionadas todas as informações, experiências, acontecimentos e relatos, escreveriam uma grande enciclopédia. Todavia, podemos resumir os capítulos, introduzindo cada um deles, de modo a, sucintamente, lançar um convite à continuidade dos mesmos. No primeiro capítulo temos um relato histórico, contado pelo próprio fundador do Colégio, que hoje com seus 77 anos descreve o processo de erguimento da escola como realização de um ideal, profundamente ligado à vocação beneditina, de ser esta um lugar onde mora a sabedoria que ajuda a viver melhor. No segundo capítulo, temos a descrição de um processo evolutivo da educação no Colégio São João Gualberto como um todo, focando na evolução do uso das tecnologias como contribuições para o agir dos educadores, e que de certo modo podemos ver costurando grande parte do livro, por se tratar de recurso didático, sempre utilizado na ação pedagógica. O terceiro capítulo, ao abordar o tempo do educar para a criança, mostra-nos as correlações necessárias entre ação didática objetiva, e a sua correlação com aspectos da subjetividade e temporalidade da criança. No quarto capítulo, podemos perceber o quanto novas áreas do saber pedagógico vão se aprimorando, para o qual destacamos o campo da psicopedagogia, que tem contribuído em muito como o agir pedagógico deste e de tantos outros Colégios. No último capítulo, mostrar-se-ão aspectos da orientação educacional, que em nosso Colégio reforça as vinculações entre família e escola, aprimora orientações para o progresso do aluno em sua relação com o aprendizado e relata 14


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a história de continuidade e “hereditariedade escolar” que cresce à medida que as gerações, por terem vivenciado experiências positivas na sua história, estendem-nas a seus filhos e netos, matriculando-os na mesma escola, que passa a ser para a família um ponto de referência em educação. Assim, para finalizar o texto, faço o convite à sua leitura, para que nossa história se perpetue, textualmente, como história da educação, seja onde estamos, tal como onde estejam os que pelo Colégio São João Gualberto passaram, e nele deixaram suas marcas que jamais se apagarão, porque são parte de nossa memória, que é nosso patrimônio espiritual. Dom Robson Medeiros Alves, OSB

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Colégio São João Gualberto: sua história e seus objetivos Dom Lourenço Russo, OSB2

Quando o então Abade Geral de Valombrosana, D. Alfonso Salvini OSB, me enviou, juntamente com o irmão D. Martino Palumbo, à nossa Comunidade de Pirituba, entre outras coisas, me disse que os Padres tinham um projeto de criar no Jardim da Felicidade uma Escola. Era o mês de outubro de 1964. Não me lembro de qual importância lhe dei, mas enquanto apreendia a língua portuguesa, que o Prof. Antonio Brambilla nos ensinava, se continuava a falar desta ideia e amadurecia o projeto: o lugar, o edifício, as finalidades, as necessidades do meio ambiente, como combinar com as outras prioridades da nossa missão (o mosteiro e a vida monástica, as vocações) e não, por último, o problema dos recursos econômicos. No entanto, começamos a trabalhar na comunidade, ajudando na formação da mesma e na pastoral paroquial. D. Martino, especificamente, ficou na pastoral vocacional e depois também vigário paroquial enquanto o D. Lourenzo responsabilizou-se pela ajuda ao Prior D. Rodolfo em várias tarefas, por exemplo, na pastoral vocacional, na construção do mosteiro e na condução da comunidade. Depois de aproximadamente um ano, se começou a pensar seriamente na possibilidade de iniciar o Colégio S. João Filósofo, Teólogo, Pedagogo e licenciado em Sagrada Escritura. Foi o fundador do Colégio e Abade Geral, por mais de 30 anos, da Congregação Beneditina Valombrosana. 2

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Dom Lourenço Russo, OSB

Gualberto, e D. Lourenço ficou encarregado de verificar a possibilidade concreta de se abrir a escola, consultando o Diretor do Colégio S. Bento e também as autoridades escolares do Estado de São Paulo, ajudado nesta pesquisa pelo prof. Antonio Brambilla. A situação do povo era bastante precária, como em todos os inícios: os moradores iam crescendo nas várias vilas (Chácara Inglesa, Jardim da Felicidade, Jardim Líbano e outras), mas com a falta de muitos recursos básicos como asfalto, iluminação, telefone... Inclusive a falta de escolas: havia somente um galpão ou edifício de madeira que funcionava como escola primaria na Chácara Inglesa e outra próxima à estação de trem de Pirituba. Abrimos então uma escolinha de pré-primário, com uma professora, numa salinha atrás da Igreja N. Sra. Assunção. Havíamos terminado os trabalhos de cobertura sobre o terraço da ala principal (a única naquele tempo) do Mosteiro, que então o D. Rodolfo chamava de Seminário S. João Gualberto, quando decidimos abrir a escola “Ginásio S. João Gualberto”, e iniciar as aulas em duas salas do mosteiro, enquanto ainda não havia seminaristas. A solicitação oficial ao Secretário da Educação do Estado de São Paulo foi feita em agosto de 1966 e a aprovação foi dada com o ato n. 205 de dezembro do mesmo ano. Em de março de 1967 nomeamos o primeiro diretor e formamos o primeiro corpo docente e uma secretaria, com assessoria e a vigilância de D. Lorenzo. Foram dias e meses de grande alegria e esperanças para o futuro do desenvolvimento da mesma escola, havia também o apoio e o entusiasmo do povo, das autoridades e da Igreja. Com os poucos recursos que possuíamos e a ajuda da nossa Congregação da Itália, tínhamos comprado o terreno ao lado do Mosteiro e colocados os alicerces do prédio do atual Colégio S. João Gualberto, com o projeto do engenheiro Pierino Massenzi, que sempre acompanhou os padres nas 17


Colégio São João Gualberto: sua história e seus objetivos

várias obras, sobretudo na construção da igreja deles. Precisava deveras ter muita coragem, não só o D. Rodolfo, o Superior dos padres, que era um verdadeiro “empreendedor”, e nunca desaminava e tinha coragem para vender, mas também os outros padres e mesmo o povo, porque as condições ambientais eram verdadeiramente desfavoráveis. Lembro-me, entre outras coisas, que a energia elétrica, quando não faltava, era tão fraca que as quermesses deviam terminar cedo e com a ajuda das velas. Naquele tempo se falava de Pirituba como um lugar bem afastado, “o cafundó do Judas” ou “onde Judas perdeu as botas”; e de fato, num dia de grandes chuvas e de barro, D. Martino perdeu um sapato no barro no começo da rua, que hoje tem o nome de Lorde Clemente Atlee, saindo da Estrada Raimundo Pereira de Magalhães, onde agora está o Posto de gasolina. Vendo tantas necessidades do povo, que crescia rapidamente em Pirituba, surgiu em mim também o propósito de fazer uma escola de caráter profissionalizante e gratuita, inclusive sonhei com o plano de S. João Bosco de acolher os meninos das famílias mais pobres, muitas vezes vindas do interior com a ilusão de encontrar condições melhores de trabalho e de vida na grande cidade, ficando na maior parte das vezes nas favelas da redondeza. Mas, infelizmente, os recursos econômicos eram poucos, e eu não tinha a coragem e a santidade de D. Bosco, que começou a sua obra em Turim na Itália, no século XIX, com grandes dificuldades e dedicou a sua atenção pedagógica na formação dos jovens mais necessitados, fundando depois a Sociedade Religiosa, a Congregação dos Padres Salesianos, deixando para eles uma mensagem e uma regra de ensino muito importante e sempre válida: o método preventivo da educação e o uso do amor para com todos os alunos. Uma coisa que hoje todos conhecemos. Porém esta metodologia marcou a atividade escolar e pastoral da minha missão. Lembro que durante o meu serviço de Diretor do Colégio procurei dar muitas 18


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bolsas de estudo aos mais necessitados, e outras vezes deixava que não pagassem as mensalidades aqueles que não podiam. E assim quase levei o Colégio à beira da falência. Mas graças a Deus isso não aconteceu. Com certeza, o que ajudou mesmo e de maneira vencedora a fundação do Colégio foi o grande ideal da promoção cultural e social do povo, sobretudo dos jovens, que são, em toda parte o futuro das nações, junto à evangelização e à formação religiosa, que animava todos os padres de então. No ano seguinte, 1968, as aulas foram transferidas para o novo prédio, embora ainda não completamente acabado. Tendo em vista as necessidades escolares do bairro de Pirituba, a Secretaria da Educação do Estado, considerando também as nossas dificuldades, teve muita compreensão e paciência conosco, pedindo e exigindo a documentação necessária, porém nos dando prazos e tempos longos, que ás vezes eram prorrogados. Enquanto o Colégio progredia, os padres não deixavam de lado as obras sociais, que começaram juntas ou até um pouquinho antes: em 29 de junho de 1966 foi criado o “Instituto de Educação e Assistência São João Gualberto da Congregação Beneditina Valombrosana”, com a finalidade de levar o conforto e a assistência a famílias necessitadas do bairro. Com esse espírito eles instituíram não só o Ginásio-Colégio São João Gualberto, mas também o Posto de Saúde na Chácara Inglesa (que depois se tornou a atual “Creche Valombrosana”) e a creche “Recanto Infantil” na paróquia de São Luiz Gonzaga da Vila Barreto, em abril de 1970. Não vamos esquecer também a assistência às famílias e aos pobres que os padres valombrosanos praticavam desde o começo nas próprias paróquias (ainda quando os edifícios estavam em construção), tudo isso é inspirado e movido pela “caridade” que os animava e que os levava não somente à evangelização e à elevação do espírito e da alma, mas também às socorrer as necessidades materiais. 19


Colégio São João Gualberto: sua história e seus objetivos

Penso que esta ação social, cultural e religiosa dos Padres foi uma das várias causas que estimularam as autoridades públicas a atuar em muitas obras públicas, nas várias vilas de Pirituba, entre elas o Colégio “Ermano Marchetti”, no mesmo Jardim da Felicidade, dois ou três anos depois. E com isso, veio também o asfalto e a iluminação de muitas ruas. Dizia pouco antes que o ideal da promoção humana, no sentido mais amplo, levou os padres a enfrentar e superar muitas dificuldades para conseguir resultados positivos em muitos setores da educação pastoral, social e religiosa. Ao contar a história destes anos, hoje até parece que foi muito simples e leve o empenho e o esforço deles. Mas não foi assim. Devemos pensar, sobretudo, na ação pastoral deles para formar comunidades nas verdades cristãs e criar tradições fundadas nas raízes evangélicas, onde prevalece o valor da pessoa humana com todos os seus direitos e deveres, do amor fraterno, da justiça e da paz: para dar continuidade no tempo e em toda a sociedade. O trabalho cultural e social, também foi o mais importante na fundação do Colégio São João Gualberto, havia problemas não somente burocráticos e sociais, mas na mesma Igreja Católica, houve uma grande discussão sobre a validade e utilidade das escolas particulares, sobretudo dos religiosos e das religiosas: vivíamos os tempos do pós Concílio Vaticano II e da Declaração na América Latina de Puebla que definia “A Igreja dos pobres”, e a “ Opção para os pobres”, e muitos institutos religiosos fechavam as próprias escolas para assumir a pastoral dos pobres, nas favelas e nos bairros mais abandonados. Obra verdadeiramente muito meritória! Mas embora fosse muito urgente, era a única. Semelhantes problemas eram discutidos em outros países, sobretudo na Europa, depois da Revolução Cultural de 1968. Em minha opinião, acho que prevaleceu a linha da continuidade dos Colégios particulares católicos. Lembro-me 20


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de que um padre, que participou do Concílio do Vaticano II como observador, admoestava os responsáveis da Igreja pela educação das consequências negativas que ia provocar o abandono do ensino católico na sociedade daí a não muitos anos. Ao mesmo tempo havia outra discussão, sobre a definição do “social”: havia quem, e não eram poucos, assimilava o social com o estadual por várias razões, entre as quais o fato de que o dever do Estado seria organizar e providenciar o bem-estar sociocultural do povo enquanto todos trabalham e contribuem com as taxas e impostos para o bem de todos. Porém, isto não tira o risco do paternalismo e do estatismo, e não tem em conta a responsabilidade e a liberdade das pessoas, nem a mesma essência do conceito “social” que visa o bem dos outros, promovido por quem quer que seja, bem se concilia com a liberdade de associações, e tira o bem das formas alternativas que estimula a competição e a emulação para o melhoramento da atividade, no nosso caso, do ensino. Por isso, a Igreja não exerce uma função “supletiva”, mas sim “alternativa” à do Estado em várias atividades, como no ensino. Sob este aspecto devemos ressaltar que o dever, primeiro e fundamental, da educação pertence à família. E esta tem o direito de escolha de quem irá ajudar a cumprir esta tarefa e a escolher as escolas que, segundo as próprias convicções culturais e religiosas, melhor podem fazer a educação dos próprios filhos. O Estado tem o dever de assegurar a todas as famílias a igualdade do direito de escolha, pagando os custos do ensino às mesmas famílias, controlando com leis próprias, escolares e fiscais, toda a estrutura e o programa do ensino para que todas as escolas as observem, sejam estaduais ou particulares. Por quanto era de meu conhecimento, e talvez não em maneira plena, esta forma era praticada nos Estados Unidos, na Inglaterra em outros países da Europa. Convencidos sobre a utilidade e a importância da cultura cristã e católica, que lhe vem da luz do mesmo Evangelho 21


Colégio São João Gualberto: sua história e seus objetivos

de Cristo, que ilumina e eleva a vida humana, procurei também ter uma preparação profissional do ensino e da cultura brasileira, fazendo os cursos de Filosofia na Universidade de Mogi das Cruzes e de Pedagogia nas Faculdades Anchieta de São Paulo, obtendo a Licença nas duas disciplinas. Ambas possibilitaram-me um verdadeiro enriquecimento intelectual, espiritual e pastoral; e também me permitiram uma grande abertura na visão da realidade sociocultural e política do Brasil, sendo para mim, de grande ajuda no trabalho escolar e no progresso e organização do nosso Colégio. A minha convicção sobre a necessidade de ensino católico em escolas católicas não é no sentido de poder dar aulas de catecismo – estas são feitas nas paróquias – mas porque estas têm o próprio método e a própria orientação, que visa a formação integral do homem, com todos os seus valores morais, éticos, científicos, sociais e religiosos. Uma verdade, que muitas vezes é pouco reconhecida, é de que o homem foi elevado a própria dignidade pelas verdades e valores fundamentais da religião cristã, e que tantos valores que hoje são considerados humanos, na nossa cultura ocidental, sobretudo, são frutos da evangelização cristã. Assim, os mesmos conceitos de justiça, de paz, de direitos e deveres, de ética e de ciência, de amor e equidade, de natureza e ambiente... alcançam pleno sentido de explicação se fundados na verdade cristã. Entre eles quero lembrar: a existência de Deus e a criação do nada, do universo pelo mesmo Deus; todos os valores humanos revelados por Cristo, entre eles a verdade que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus; e mais ainda, a revelação do mesmo Deus por parte de Jesus Cristo. A história de 2000 anos se bem lida e interpretada, está lá para confirmar tudo isso. Tem muitas objeções este discurso, mas muitas delas foram e podem ser resolvidas. Não esqueçamos que há também muitos mistérios na vida do mundo e dos homens, como por exemplo, o mistério do mal, em todos os sentidos. Outro aspecto que queria colocar, para explicar minha 22


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posição na linha da formação humana, é a formação monástica beneditina, que também é o nosso patrimônio cristão. São Bento, na sua Regra, define os mosteiros como “uma escola do serviço de Deus” e dá todas as normas para que os monges vivam uma vida sadia séria e equilibrada, segundo o esquema de oração, trabalho e estudo: “ora et labora”. Nesta simples frase, gerações de monges e monjas espalhados pelo mundo todo, nos seus mosteiros, viveram e consolidaram de maneira prática segundo os tempos, os lugares, os valores e as verdades do Evangelho, e deixaram ao mundo todas as mensagens: da vida comum no amor fraterno, da hospitalidade que faz receber o peregrino como Cristo mesmo; da paz e da operosidade; das artes e da civilização; do sentido verdadeiro do trabalho como criativo e de colaboração com o Criador, e daí o respeito pela natureza e pelo meio ambiente, no respeito das leis de Deus. E isto pode ser realizado porque o monge é a pessoa que se propõe, na sua vida, buscar só a Deus, trabalhar com todas as suas forças para construir já aqui na terra o seu reino e a sua justiça, naturalmente numa vida de fé viva em Cristo Jesus. Como pode influir tudo isso na formação de nossos alunos? Não é simples nem fácil. Uma vez falando com um grupo de professores de várias disciplinas, discuti este problema e procurei despertar neles interesses e sugestões. É minha convicção que se pode dar uma orientação dos valores cristãos a todas as disciplinas, também aquelas menos compatíveis, como matemática e ciências, tomando, no caso, além dos conceitos fundamentais, alguns exemplos explicativos da doutrina cristã e da vida cotidiana vivida segundo o evangelho. Houve uma boa discussão, pacífica, e também uma boa adesão: marcamos alguns encontros com os professores, divididos segundo as disciplinas, para termos algumas linhas orientadoras comuns e definir métodos práticos. Não me lembro de quais resultados tivemos, dependia muito do empenho de cada professor, mas coloco novamente aqui esta mensagem para lembrar os 23


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propósitos iniciais do colégio e, quem sabe alguém poderá reassumir o empenho desta forma de ensino, também com métodos novos para a formação integral do homem, da qual o mundo hoje tanto precisa, e trazer a todos, principalmente as famílias, um pouquinho mais de paz, amor, consciência reta e honesta, e respeito entre os irmãos? Depois de alguns anos de atividade escolares e o progresso, o Colégio, em 1970, já tinha cursos de ginásio, colegial, secretariado e contabilidade, à tarde e à noite. Mas devido ao aumento das atividades internas da comunidade monástica, seja no campo vocacional e de formação religiosa, como no âmbito pastoral das paroquias e das construções, eu não tinha mais tempo para ficar à frente, sozinho, na direção do Colégio. Pensei, então, de constituir uma sociedade sem fins lucrativos de professores para levar a frente à organização do mesmo. Esta seguiu por alguns anos e depois foi transformada em sociedade por ações pertencentes a diversas pessoas. Desta maneira, o Colégio cresceu sempre mais, em números de alunos e qualidade de ensino, encontrando estima e apreço no povo e nas autoridades escolares. Não faltaram dificuldades, seja na direção como na organização dos cursos, mas também pelas mudanças ocorridas na mesma população; sobretudo, no período da noite, por vários motivos, no ano de 1986 os cursos foram cancelados. Entretanto, também o prédio teve várias transformações e melhoramentos como o acréscimo de salas e de espaços para recreio e esportes: a quadra de esportes, num terreno perto do Colégio, como também as salas do prédio da Rua Lorde Clemente Atlee, para as crianças do pré, a atual educação infantil. Convém fazer alguns destaques de pessoas, seja entre os diretores, professores como o pessoal de serviço, que merecem destaque nos vários anos de trabalho, se pensem também o desenvolvimento da biblioteca. 24


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Houve também alguns acontecimentos importantes, como trabalhos de alunos, esportes, artes, projetos, métodos de ensino, entre outros. O mesmo diga-se das mudanças dos superiores da comunidade monástica, que sempre cuidaram do andamento do Colégio, porque a estrutura sempre ficou de propriedade da Congregação Valombrosana.

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Nossa ação pedagógica: na didática do ontem ao amanhã, a presença operante das tecnologias para construir aprendizagens Dom Robson Medeiros Alves, OSB 3

1. A escola como um lugar onde se ensina e se aprende A História da Educação acompanha a história da sociedade que apresenta uma grande velocidade e diversificação na sucessão dos fatos, o que gera, na ação pedagógica, experiências inéditas, de modo que se pode afirmar que a escola é sempre um lugar de novidade, e isso é determinante para se entender como a história e a sociedade incidem sobre a vida escolar. Assim, o real e o cotidiano constroem a instituição “escola” que servirá como base objetiva em que o ser humano terá ação efetiva na sociedade com uma perspectiva de intuição4 filosófica que sugere constantemente um emPós-Doutor em Educação. Currículo: Doutor em Ciências SociaisAntropologia, Mestre em Ciências da Religião, Licenciado em Filosofia e Pedagogia e Bacharel em Teologia. É o reitor do Colégio São João Gualberto (desde 2003) e o presidente dos Institutos Social e Educacional São João Gualberto. Professor da Faculdade São Bento do Rio de Janeiro. Membro dos Comitês de Ética em Pesquisa do Hospital Santa Catarina e da PUC/ SP assim como da Comissão de Bioética do Hospital Santa Catarina/SP. 3

4 Aqui o conceito filosófico de intuição não será abordado como no uso popular, de uma interpretação metafísica, como se fosse decorrente de um poder particular, do tipo uma dotação de condição sobrenatural de prever algo, sentindo-lhe por antecipação. Isso em educação é muito “mágico”, uma vez que essa lida com o inédito constantemente. O pensar é fato inédi-

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penho muito criativo de adaptação do agir pedagógico, no intuito de responder aos novos desafios que se apresentam à ação educadora, como resposta e contribuição para a melhoria da instituição escola. Por isso é dinâmico perguntar ao presente como será o amanhã, sem entender isso como um determinismo, mas como perspectivas que as tendências de nosso tempo nos apresentam como marcas culturais. Esta dinamicidade afirma um modo de ser, um perfil a ser assumido como característica de uma ação educadora, que une gerações em torno da aprendizagem, e isto orienta uma postura que o professor deve assumir, isto é, como educador ter que ser eterno aprendiz na arte de ensinar, de modo tal que não basta apenas admitir a novidade das tecnologias digitais (cujo uso é o tema principal deste texto), como se a novidade tecnológica viesse em detrimento da ação do professor, mas pelo contrário, ela cumpre um papel de auxiliar didaticamente para enriquecimento da ação pedagógica. Na verdade, é necessário dar um salto qualitativo em favor de nossa auto-afirmação e formação, no sentido de ter sempre como motivação o “para quem” e “com quem” se quer construir o diálogo da educação com o tempo presente da realidade objetiva da cultura do tempo de nossos alunos. O nosso presente é cheio de máquinas, de tecnologias, que chegaram às escolas nas mochilas, nos bolsos, sobretudo to que se instrumentaliza através de uma estimulação à inteligência a fim de que resulte em cognição, em aprendizagem que lidará com o concreto do agir. Intuição no sentido que o filósofo francês Henri Bergson (1859-1941) quis expressar como uma intuição filosófica, refere-se ao contato objetivo do sujeito com a realidade, interagindo de modo a transformar-lhe em uma perspectiva de vida e sociedade que sirva à vida prática no sentido de melhorá-la, ou seja, de humanizá-la, uma vez que entende ser esse um caminho de espiritualização da sociedade, em que à medida que cada indivíduo comunique seu eu interior como energia criativa ao eu exterior que é a vida da sociedade, refletindo o espírito humano, pressupostamente vocacionado para o sentido do bem comum. Assim, a educação é a intuição do um nós, expressão que nos aponta para o homem social que elabora suas instituições como expressões dos sentidos para sua vida como presença cultural. 27


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na dinâmica do pensamento de nossos alunos, como processo inteligente de interação com as coisas. Isso nos demonstra quem devemos educar e nos dá pistas do como devemos educar, para aprimorarmos cada vez mais nossa missão educadora. Ampliando cada vez mais a cognição através das múltiplas aprendizagens, por meio das diversificadas habilidades e competências, sobretudo as tecnológicas, uma vez que o futuro da tecnologia aponta para os recursos da programação como os organizadores da vida social, o que hoje antecipamos com nossa experiência cotidiana de sistemas operacionais para tudo: bancos, mercados, transporte, consultas médicas, etc. Assim nos aproximamos cada vez mais afetivamente das máquinas, e por isso temos que aprender, cada vez mais e melhor, a manuseá-las. Será esse um modo de afirmação do professor como um dos personagens centrais na ação educadora, junto ao educando, aprendendo ao ensiná-lo. Afinal, considerando que o educado está mais imerso no universo e linguagens das tecnologias. Isso equivale a afirmar que mesmo a ação do professor tendo prioridade frente à atividade que a máquina exerce para ajudá-lo didaticamente, a tecnologia é aliada e está a serviço da ação pedagógica. O pedagogo Paulo Freire, tão influente não só na pedagogia no Brasil e mundialmente considerado, premiado e traduzido, nos conclama quando ao expressar-se sobre os “Saberes necessários à prática educativa”, quando ao versar sobre a “Pedagogia da autonomia”, descreve a gênese social do ato de ensinar: Foi assim, socialmente aprendendo, que ao longo dos tempos mulheres e homens perceberam que era possível – depois, preciso – trabalhar maneiras, caminhos, métodos de ensinar. Aprender precedeu ensinar ou, em outras palavras, ensinar se diluía na experiência realmente fundante de aprender. (2011, p. 26).

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O que expresso em contexto prático significa uma necessidade de constante e ininterrupta revitalização da formação, valorizando cada momento e contextualização que surgem no ambiente de uma aula, como perspectivas para a aprendizagem. Freire (2011, p. 24), então, mostra um saber indispensável ao formador, “desde o princípio mesmo de sua experiência formadora, assumindo-se como sujeito também da produção do saber, se convença definitivamente de que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção”. Nosso pedagogo aponta para uma relação de intercâmbio e preservação da autonomia de cada papel, tanto do professor quanto do aluno, como reflexos de novos paradigmas relacionais, para manifestar o quanto a educação pode efetivar-se como realidade qualitativa para os relacionamentos humanos. Por isso, ele partilha: “Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto um do outro” (Freire, 2011, p. 25). Trata-se de uma síntese dialética belíssima que abre as portas do crescimento conjunto como manifestação antropológica de uma educação humanizada, em que o ser humano toma como sentido pleno da educação o crescer com o outro. Paulo Freire considera como uma missão educadora a troca de saberes, o intercâmbio cultural e a complementação das riquezas práticas da inteligência. Assim, o fato do professor estar sempre à frente aos desafios do ter que lidar cotidianamente com um aluno cheio de “iluminação”, ao contrário da tradução literal da etimologia latina da palavra aluno, que é resultado de a-sem + luno (lumem)-luz. Nesse texto contemplamos o contrário, onde o aluno comunica toda a sua iluminação tecnológica para a aula. Outro pedagogo, ainda muito atuante em palestras e conferências sobre educação, o professor e psiquiatra Içami Tiba, apresentando os desafios do relacionamento professor-aluno 29


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em tempos de internet, lança um mot aos novos paradigmas na educação, ao focar no medo do professor de perder a autoridade sobre o aluno, naquilo que tange ao uso das tecnologias, mostrando assim como ensinar aprendendo: Não seria uma excelente oportunidade para esses professores, se eles pudessem aprender com os próprios alunos a mexer no “maldito” teclado e, assim, usufruir a “santa” telinha? Com esse gesto, poderiam ensinar que, por mais que se saiba uma matéria, sempre há algo a aprender sobre outra. E mostrariam que não ignoram a importância de seus alunos. (Içami Tiba, 2006, p. 28-29).

Por isso, pode-se inferir filosoficamente que a vida é um aprendizado e pedagogicamente que cada aula, dado ao contato enriquecedor entre educador e educando é fonte de aprendizagens que perpetua no tempo do aprender um lugar de resgate na história da humanidade: eterna “aprendente” e eterna “ensinante” no ontem, no hoje e no amanhã. Eis o lugar filosófico da escola, ou seja, marcar a escrita do tempo na vida pela experiência da ação educadora, de modo tal que não só nos lembremos de nossos (as) professores (as) como memória e recordações, mas resgatemos parte do saber deles como transmissão para as gerações que nos sucederão. Isso é a perenidade da ação educadora como marca e presença de uma ação que começa com um e termina com os outros. Sob a luz inspiradora de Paulo Freire nessa perspectiva, pode-se inferir que movimento de estar no tempo, o nosso presente em que as coisas acontecem, convida-nos a sermos protagonistas da história que nos compete escrever. Assim, quanto ao ato de educar, cada educador escreve um pouco no livro da História da Educação, sendo que uma marca fica registrada como característica primordial do ato de educar: a de que nossa missão de educar tem que passar pela necessidade de aprender. Esse é o sentido 30


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pleno de complementariedade da cultura educacional. Eis um enfoque antropológico da educação, que manifesta nas relações sociais pedagógicas um sentido de caminho histórico rumo ao destino futuro. Por isso Freire (2011) atribui à educação um cunho todo antropocêntrico, ou seja, a partir de seus agentes naturais que são o educador e o educando, um papel de vanguarda na história das sociedades, ressaltando que “era possível – depois, preciso – trabalhar maneiras, caminhos, métodos de ensinar. Aprender precedeu ensinar ou, em outras palavras, ensinar se diluía na experiência realmente fundante de aprender”. Através dessa instrução de cunho profundamente ligado à filosofia da educação, Freire lança bases para percebermos o quanto a prática educativa é fruto do “fazer história”, uma vez que em todos os tempos, com todas as culturas e por meio de todas as pessoas, sempre se aprende algo e se ensina algo, portanto, isso nos reforça o quanto as gerações se completam, e mais se “precisam”. Eis um enfoque antropológico para a Educação, enfoque esse capaz dar sentido especial a toda pessoa humana, porque é portadora de um ensinamento a transmitir e uma lição a aprender. Somos seres históricos que se complementam! E é isso que lança bases a partir da pedagogia da autonomia, ou seja, a minha autonomia de pensar, comunicar e existir, que me são dados exclusivos, portanto sou portador de valores, sentidos e algo a doar a outrem: eis o destino do assumir-se educador. No que diz respeito aos desafios da educação com o uso das novas tecnologias digitais, seja nas ações pedagógicas na escola, como nas que os alunos fazem em casa, ou até em disciplinas que possam ser desenvolvidas on-line ou off-line, trata-se de desafios com respostas em construção, tornando-nos, em todos os lugares, constantes aprendizes, ou seja, “aprender a ensinar, integrando ambientes presenciais e virtuais, é um dos desafios que estamos enfrentando atualmente na educação no mundo inteiro” (Moran, 2007, p. 118). 31


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2. Educar é a ação humana em que o eu interior se expande num eu exterior. A amplitude dos saberes necessários à prática educativa como relacionamento de complementariedade até aqui exposta no pensamento de Freire, estendem contato muito intenso com o pensamento de Edgar Morin, quando traz no bojo de seus escritos a questão da complexidade da vida humana. Aproximando-a da ação educadora, nos faz compreender o quanto essa é uma ação de intercomunicação histórica institucional ao longo da história da vida e da vida cultural da espécie humana. Nesse sentido, Morin acentua: Por isso, a educação deveria mostrar e ilustrar o Destino multifacetado do humano: o destino da espécie humana, o destino individual, o destino social, o destino histórico, todos entrelaçados e inseparáveis. Assim, uma das vocações essenciais da educação do futuro será o exame e o estudo da complexidade humana. Conduziria à tomada de conhecimento, por conseguinte, de consciência, da condição comum a todos os humanos e da muito rica e necessária diversidade dos indivíduos, dos povos, das culturas, sobre nosso enraizamento como cidadãos da Terra... (2004, p. 61).

A partir da realidade de complementação e aproveitamento de todas as contribuições que os métodos educacionais até aqui nos legaram como marcas de um tempo como percurso histórico da educação, podemos compreender que chegar até um tempo de avançadas tecnologias digitais na ação pedagógica do hoje passou pela evolução de todas as técnicas didáticas até então usadas, isto é, do giz ao mouse, do quadro negro até a lousa digital, do caderno ao notebook, do livro em brochura ao e-book, da aula presencial à EAD, etc.

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A complexidade apresenta-se como uma linha-mestra a nos conduzir como um paidagós5, a fim de aprendermos a abstrair de todas as ações e intervenções um conteúdo capaz de manifestar sentido complementar para o agir humano e, assim, a educação assume lições fundantes dentro de sua própria experiência de conhecimento, que nada mais é do que esforço de colocar para fora de si não só a cognição, mas também emoção e captação de todos os fatos e experiências que da vida emanam. Isso significa educar dentro da perspectiva de ressignificação dos saberes que a escola comunica. Podemos compreender que ao educador estão pressupostos saberes fundamentais de autoconhecimento e conhecimento do outro como fontes para o seu crescimento, e também dele. Eis a via que o bom pedagogo precisa percorrer, para que sua missão educadora possibilite a transformação da sociedade como primeiro passo da transformação da humanidade, afinal, como frisou Morin, somos todos cidadãos da Terra, entregando-nos assim o legado da responsabilidade pelo Destino, que dentre tantas cooperações, temos na educação do futuro, não apenas no sentido do amanhã, mas também da evolução tecnológica que no hoje ela está emersa, um foco de especial atenção. Morin contempla uma humanidade nova, capaz de lidar com a tecnologia, abstraindo-lhe os efeitos do progresso do saber científico em benefício da vida, como um valor absoluto. Dá-se assim, à tecnologia uma valoração relativa, Para os gregos o paidagós era aquele que assumia a função de conduzir a criança pelo mundo do aprendizado, não somente das letras e das ciências, mas do saber como um todo. Ele conduzia pela mão a criança de modo a prepará-la para a vida, aprendendo a enfrentar todos os seus desafios, como num preparo para uma luta cotidiana contra a estagnação da condição humana. Era um personagem de grande importância social, plenamente reconhecido tanto pela família quanto pela sociedade, e que deixava marcas profundas na alma e no intelecto dos seus aprendizes. Derivou desta ação de conduzir no aprendizado para a vida o termo “Pedagogo”. 5

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isto é, a máquina foi feita pelo homem e para seu usufruto. A máquina jamais pode ter um senhorio sobre o humano. O humano tem afeto, sentimentos, relações calorosas, ao passo que a máquina tem programação, ou seja, pode ser mecanicamente artificializado naquilo que tange a existência. Todavia, ela como fruto da inteligência e do empenho humano, não é outra coisa senão complemento autorizado à interação com a vida, o que no início desse texto foi delegado como papel social da escola e como força de sua ação. Então, a máquina também pode ajudar a fazer emergir conhecimento, aprimorá-lo, aplicá-lo como ação prática no cotidiano, enfim, a máquina foi criada para criar. É um instrumento nas mãos humanas, que foi fruto de uma específica aprendizagem de uma área do saber, e que agora pode contribuir com a aprendizagem em tantas outras áreas do saber, afinal a máquina precisa de alguém para funcionar, o que torna o operador superior a ela. A máquina não tira dela mesma o conteúdo em essência, ela apenas o desenvolve segundo uma programação que lhe é construída. Diversamente, o ser humano não, ele originalmente tira de seu interior conteúdos. A propósito, o filósofo grego Sócrates, nos ilustra muito didaticamente esse movimento anteriormente mencionado dos conteúdos do “eu” interior que se expandem no “eu” exterior. Ao fazer uma reminiscência da atividade profissional de sua mãe, que era uma parteira (e que, portanto ajudava as parturientes a por para fora, do seu interior, seus filhos), quando ensinava aos seus discípulos, desenvolveu uma metodologia pedagógica que contemplava a riqueza trazida por cada pessoa como uma interioridade de conhecimentos e contribuições que, ao serem externadas, poderiam adquirir forma objetiva do saber a ser compartilhado. O filósofo desenvolveu aquilo que a história da filosofia chamou posteriormente de “maiêutica socrática”, com a qual concordamos, sobretudo no sentido de contemplar a 34


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riqueza que cada indivíduo porta em seu interior, tanto cognitiva como afetiva, e que sempre podem ganhar através de uma comunicação sensorial aspectos no campo das aprendizagens. Assim, podemos inferir que trazemos todos em nosso interior, como numa gravidez simbólica, uma imensa fertilidade de pensamentos e ideias, e que ora precisamos de uma parteira, ora devemos assumir essa função para ajudar outras pessoas. Assim, vemos que a educação, sob a ótica desta metodologia é uma relação de complementariedade, que no expressar das ciências sociais é uma atividade excentricamente humana, e comunica uma realidade relacional de transmissão de cultura e conhecimento em nossa espécie homo sapiens. Até aqui foi ressaltando o papel social e pedagógico de um modo geral na educação. A partir daqui o foco do texto assumira sua centralidade no agir pedagógico do Colégio São João Gualberto, que em 14 de agosto de 2013 completou seus 47 anos, e agora percorre seu caminho histórico-existencial rumo ao meio século de existência. Um marco local, sobretudo para esta fração do bairro de Pirituba (sub-bairro jardim da Felicidade/Chácara Inglesa) que cresceu junto com ele. Aliás, relatam os monges beneditinos que o fundaram, tal como os mais antigos moradores do seu entorno, que no início não passavam de 15 casas próximas, e que apenas havia um pequeno núcleo educacional na região, o mais próximo, vizinho à estação de trem. Isso, então, concedeu ao Colégio dos “padres”, como era identificado, o status de primeira instituição de ensino privado na região, aliada ao seu núcleo de ação social e educativa, uma “Creche”. Assim, pode-se afirmar que a história do Colégio integra a história da vida educacional e social do lugar e que em sua memória há uma grande diversidade de educadores, educandos, familiares, amigos e tantas outras pessoas, que contribuíram com suas vivências e relacionamentos, para esta instituição de ensino ter o que na linguagem teológica se pode 35


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designar como um “patrimônio espiritual” a serviço da “Terra de todos”, pois por esse Colégio passaram mais de 20.000 alunos, muitos deles profissionais atuando em diversas áreas e regiões do planeta Terra. Muitas foram as contribuições que fluiram no tempo, cada vez inovando e acrescentando algo à ação educadora, ou seja, toda essa fruição no tempo foi escrevendo a história, através de contribuições múltiplas e variadas, o que ainda agora continua sendo escrito com os desafios do tempo presente como a aula do agora a ser dada para os presentes. Isso pode parecer apenas uma elaboração filosófica para encorpar o texto, mas no fundo traduz muito bem o que se quer entender como a realidade dinâmica que a educação lança ao educador, no intuito de cumprir seu papel histórico, de modo que o seu tempo de ação aconteça na transformação da vida. Aliás, que sentido tem educar, senão para preparar cidadãos críticos, que melhorem a sociedade?

3. O papel histórico de uma unidade escolar, marcando a história de muitos indivíduos. A ética é uma virtude que a filosofia contempla como virtude que se abstrai do próprio contexto existencial. Assim, a ética diz respeito aos costumes que a vida social desenvolveu como sua marca de estar no mundo e que devem balizar os comportamentos das pessoas, sobretudo dos educadores. Num sentido prático, a ligação entre a presença ética do educador com sua ação pedagógica está relacionada como sua capacidade de interação com o seu tempo a fim de responder às questões e desafios que no contato objetivo do educar, lhe lançam desafios de ter que agir com empenho, respeito, diálogo e abertura ao novo. Com isso, sua atuação profissional tem um poder de ser marca histórica, sua, de seus alunos e de sua instituição, que

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abrange desde os primeiros movimentos rumo ao traçado das primeiras letras até o diploma do ensino superior, se constituindo como um “DNA educacional” que forma seus alunos para reforçar-lhes aspectos de uma ética existencial e uma humanidade profissional, ou seja, o formando assimila do formador o sentido ético, assimilação também abstraída da família. Neste sentido, frente a tal responsabilidade em ser educador junto com a família, percebe-se que a condição para vencer as dificuldades é a coragem de ser ético, de ter convicções morais e defendê-las como lições cotidianas a serem ensinadas e vividas. É o que podemos verificar nos resultados observados nas gerações que se formaram no Colégio São João Gualberto, onde brotaram professores, médicos, advogados, padres, enfermeiros, engenheiros, filósofos, teólogos, nutricionistas, administradores, técnicos da informação, etc. Sempre profissionais com um perfil ético e humano, muito sobressalentes. São esses frutos do Colégio que demonstram o resultado do empenho ético de uma instituição escolar em formar profissionais com sólida formação acadêmica e moral. Daí sua marca histórica, com seu sentido ético.

4. As tecnologias como recursos didáticos ontem, hoje e sempre. O agir formativo, na história do Colégio São João Gualberto, contou sempre com a tecnologia como presença marcante no ato de educar, que se deve descrever, é toda recursividade tecnológica e criativa que um educador utiliza para transmitir conhecimentos. Neste sentido, a transição do giz ao mouse, não significa o decreto de morte do primeiro para estabelecer a única possibilidade de uso para o segundo. Todavia, nos últimos tempos

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tem-se destacado a introdução de recursos digitais, que são a linguagem do tempo e que a direção do Colégio assume como uma vocação especial de ser vanguarda tecnológica local. Assim, dando continuidade a essa política pedagógica de utilização de estratégias tecnológicas, o Colégio conta com uma equipe especializada para dar suporte e atendimento quando necessário, da Educação Infantil ao Ensino Médio. No intuito de descrever a experiência educacional das ações pedagógicas, buscando valorizar os momentos e as técnicas utilizadas, esse texto passará a abordar enfoques práticos dessas, buscando construir um relato histórico-pedagógico que consiga mostrar as ações pedagógicas com seus ganhos. O uso do quadro negro, que quase sempre era verde, com o giz branco aos poucos foi acrescido de um colorido, que há 46 anos antes era produto raro e caro, e por isso pouco utilizado. Porém, com o tempo, o giz colorido foi se tornando acessível, e os ganhos técnicos da estratégia didática se ampliaram pois, à medida que foram se tornando marcadores de texto, contribuíram visualmente para trazer a atenção dos alunos mais distraídos, que hoje a psicopedagogia identifica como uma situação de déficit de atenção, e para os quais se devem aplicar recursos didáticos especiais para reconduzi-los à aula. Pode parecer algo simples e óbvio, entretanto reflete um marco importantíssimo que foi capaz de trazer vitalidade à lousa, até então fria e pesada com a utilização de apenas uma cor na escrita. O colorido das novas pedras de giz realizava um poder mágico de fazer a lição saltar da lousa para a mente com um elemento auxiliador, através do uso do sentido da visão que se conjugava com o da audição da fala explicativa do tato para fixar os conteúdos. No intuito de fazer com que o aluno aprenda cada vez mais, além de levar consigo as lições que copiou da lousa e as tarefas que anotou em seu caderno para serem desenvolvidas em casa, outros recursos se somaram, como as folhas rodadas 38


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em um mimeógrafo (do grego mímesis e grafia, isto é, imitação e escrita) que era sistema de multiplicação das imagens, que reproduzia textos e imagens ainda que um pouco distorcidas, anuviadas e com falhas em pontos específicos, mas que, todavia, representavam um avanço tecnológico enorme, capaz de dar na mão do aluno apontamentos a mais, tal como exercícios em quantidade específica e pontilhados que ajudavam a aprimorar a coordenação motora fina. Tratava-se de folhas rodadas numa máquina manual, operada pelo movimento de uma manivela, utilizando uma matriz em papel estêncil (carbonado) que reproduziam à base de tinta e álcool, multiplicando as folhas que o próprio professor contava especificamente para seus alunos, sendo que a matriz poderia ser utilizada outras vezes, sabendo o professor que teria que suportar ele mesmo, o forte odor de álcool. Por meio deste recurso técnico o professor ganhava um grande tempo na atividade em classe, muito embora tivesse que despender sem ganho extra muito do seu tempo pessoal mimeografando as atividades. Todavia, uma vez que não tinha que transcrever a mesma coisa na lousa para ser copiada, logo o tempo ganho por não ter que copiar era revertido em tempo de mais explanação do conteúdo. Este processo, a primeira versão das futuras apostilas, foi substituído com o advento da tecnologia das fotocópias em massa, que foram batizadas com o nome da fabricante: Xerox. Assim, com mais perfeição técnica, melhor aprimoramento estético, e sem “embebecer o professor com o forte odor de álcool”, as fotocopiadoras foram automatizando as instituições de ensino naquilo que tange ao processo de reprodução de textos e imagens, de modo a aperfeiçoar o uso e as futuras reproduções, que agora poderiam partir de uma matriz em mãos ou gravada na memória da máquina. A partir daí, as produções textuais, em formato de apostilas, foram aumentando, efetivando uma massificação das produções dos professores, saltando de uma produção dirigida 39


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para uma classe específica para impressões que seriam distribuídas a outros alunos que não os seus. Junto com as apostilas, os livros didáticos foram sendo cada vez mais introduzidos na lista de material didático, contribuindo também para facilitar as aprendizagens, inclusive estendendo-se esses para um uso de outras pessoas, que mesmo sem estarem naquela série ou escola, mas buscando aumentar seus conhecimentos, os utilizavam e os guardavam como um tesouro precioso de sabedoria, num lugar de destaque da casa: a estante da sala. Assim, apostilas e livros rodavam de mão em mão, como um bem coletivo. O uso de tecnologias no ensino na área de matemática se dava entre tantas recursividades e criatividade de um professor, com a utilização dos clássicos ábacos, material dourado, esquadros e compassos de madeira, que traçavam circunferências precisas na lousa, dando um charme à prática do uso, em que desde a sala dos professores de onde comumente estavam guardados até a entrada na sala de aula, chamavam a atenção pelo tamanho e formato, que manifestavam o ar de precisão e imponência por se tratar de equipamentos relacionados à área das ciências exatas que projetavam sobre os professores uma imagem identificada com a do clássico cientista. Com o tempo e a evolução da tecnologia, além das calculadoras que ajudavam a resolver as fórmulas de física e matemática, foram aparecendo softwares que, sobretudo nos laboratórios de informática, permitiam aos alunos visualizar e realizar cálculos com figuras e desenhos geométricos, inclusive podendo manipulá-los, ainda que virtualmente. Todavia, um maior avanço se observa com determinados aplicativos, utilizados em lousas digitais, que são apresentados aos alunos como recurso visual, lhes permitindo a interação, agora acrescida da angularidade tridimensional. Trata-se de outra perspectiva visual que se assemelha à experiência na vida social de assistir um filme nos cinemas ou em casa, em 3D. 40


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Se abordamos, por exemplo, a área das ciências exatas, observar-se-á o quanto esta recursividade tem um poder de gerar maior interesse e estímulo aos conteúdos programáticos, a considerar o movimento visual das projeções virtuais das telas para o exercício prático de efetuarem tais projeções físicas em seus cadernos. Infelizmente, essa realidade prática da lousa digital, com toda a sua contribuição pedagógica, toca a questão da quantidade disponível das mesmas, sendo muitas vezes um produto dos sonhos. Entretanto, para facilitar tal aproveitamento pedagógico, considerando que as lousas digitais pelo tamanho e preço estejam circunscritas dentro dos muros da escola, fora dos mesmos, em meio a uma condição de mobilidade (seu notebook, tablet ou celular) o aluno poderá portar tal aplicativo, e continuar seu envolvimento com este aprendizado. Tal como a terra gira, também nas aulas de geografia e história os mapas giravam dos lugares onde estavam guardados, geralmente encapados e numerados para facilitar a identificação, uma vez que eram tantos. E giravam de um lugar onde eram pendurados nas salas de aula, até carteiras onde grupos de alunos os exploravam e os reproduziam como atividades para aprendizagem e conhecimento de geografia física, por exemplo. Somavam-se a isso os atlas, ou os mapas que eram mimeografados, xerocados, ou faziam parte das ilustrações dos livros didáticos e apostilas, com o intuito de aproximar o aluno daquele lugar ou contexto histórico. Os avanços tecnológicos trouxeram para a didática das aulas de geografia e história a utilização de projetores data show, que realizava em projeções diretas, vídeos ou slides, aulas previamente elaboradas, dentro de programas atrativos que, além de despertarem a curiosidade e a criatividade tanto de professores como alunos, os envolviam, favorecendo uma interação maior na aula. Esse movimento dava perspectiva de continuidade nas 41


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pesquisas, não só no laboratório de informática como em seus próprios equipamentos, ou de lan houses. Com isso, a geografia vai se aproximando cada vez mais fisicamente dos alunos, com o requinte de estar cada vez mais atualizada, quando, por exemplo, o professor utiliza o aplicativo Google Earth, onde os recursos de movimentos de localização e aproximação de um determinado lugar se tornavam altamente envolventes a ponto de trazerem imagens muito recentes, inéditas e peculiares, inclusive de suas próprias casas ou lugares conhecidos, ou que desejam de conhecer, daí podem mergulhar numa viagem virtual com efeitos e sonorização que reproduzem uma presença. Mas é claro que os equipamentos tecnológicos de sonorização e computação precisam fazer parte do layout, design e equipamentos desse ambiente de estudos. Um resultado muito positivo dessa estratégia didática foi observado na ação pedagógica de algumas atividades do 2º ano do Ensino Fundamental, quando os alunos para aprenderem a se localizar no espaço geográfico, receberam instruções acerca das divisões físico-política da organização de uma cidade. Após aprenderem o que é uma rua, uma quadra, o que são casas, apartamentos, condomínios etc., os alunos construíram maquetes onde criaram espaços, ruas, praças e casas como reprodução de sua cidade. Em continuidade com a atividade pedagógica, depois desta exercitação que também trabalhou transversalmente habilidades manuais e artes, enriqueceram seu aprendizado com um passeio pelo Google Earth, localizando até mesmo suas residências, voltando para as maquetes e dando retoques nos detalhes e preenchimento de elementos que foram esquecidos, sendo que a partir dessa atividade que a professora conduziu, os alunos aprenderam a buscar aperfeiçoamento neste tipo de tecnologia, o que representou muito mais do que aperfeiçoamento da técnica de construção de maquetes, 42


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mas, sobretudo, a atividade conseguiu ensinar caminhos de busca que se realizam pela autonomia para aprender mais caminhos de pesquisa e estudo: a internet. Resultou daí um aprofundamento do conteúdo e da ampliação da aprendizagem de geografia. Eis aí uma contribuição que demonstra muito bem o conceito de webcurrículo6. Nas áreas de filosofia e sociologia, instrumentalizar as discussões e debates, inicialmente acontecia em sala de aula com a utilização do uso da fala, seja do professor que lançava os argumentos, como dos alunos que continuavam o processo. Em seguida, eram os textos, colecionados na sua grande maioria em fragmentos do pensamento de filósofos e sociólogos, ou de correntes filosóficas e sociológicas. A utilização de vídeos era, inicialmente, uma realidade não tão utilizada em função de não haverem muitos equipamentos, fato que foi melhorando à medida que mais televisores e videocassetes foram sendo adquiridos. Todavia, o grande boom facilitador da prática pedagógica com tais recursos (aqui faço uma ressalva particular como professor de ambas as disciplinas) foi a exploração dos recursos on-line, especificamente do YouTube que fornece uma grande variedade de opções de vídeos, longas-metragens, Segundo Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida, webcurrículo é o currículo que se desenvolve por meio das tecnologias digitais de informação e comunicação, especialmente mediado pela internet. Uma forma de trabalhá-lo é informatizar o ensino ao colocar o material didático na rede. Mas o webcurrículo vai além disso: ele implica a incorporação das principais características desse meio digital no desenvolvimento do currículo. Isto é, implica apropriar-se dessas tecnologias em prol da interação, do trabalho colaborativo e do protagonismo entre todas as pessoas para o desenvolvimento do currículo. É uma integração entre o que está no documento prescrito e previsto com uma intencionalidade de propiciar o aprendizado de conhecimentos científicos com base naquilo que o estudante já traz de sua experiência. O webcurrículo está a favor do projeto pedagógico. Não se trata mais do uso eventual da tecnologia, mas de uma forma integrada com as atividades em sala de aula. Disponível em http://educarparacrescer.abril.com.br/gestao-escolar/tecnologia-na-escola-618016.shtml#, consultado em 30/08/2013. 6

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filmes e produções independentes, permitindo não apenas utilizar tais recursos postados como também postar vídeos para que outros compartilhem e critiquem. Inclusive, em tempos variados. Isso gera um movimento espontâneo de uso interativo com a produção postada que, pela utilização mais massificada se prestava a crítica e elogios, além de dar base e fomentar uma discussão na classe e fora dela, uma vez que tal vídeo poderia ser utilizado pelo aluno tanto em casa como em qualquer outra circunstância que desejasse. Na disciplina de língua portuguesa, em todas as suas ramificações (gramática, literatura e redação), o uso das tecnologias seguiu e segue um padrão semelhante, naquilo que tange ao uso comum, isto é, textos mimeografados, fotocopiados, livros didáticos e apostilas. Um grande salto pode ser observado quando os trabalhos escolares mudaram de datilografados para digitados e impressos, ou seja, através dos programas editores de texto, por meio do uso do “pacote” Office da Microsoft7 não só se ganhou em estética da apresentação do trabalho, como também pelo reforço na fixação de regras gramaticais, quando um erro na digitação, que quase sempre expressa 7 O Microsoft Office é um pacote de aplicativos da Microsoft, muito úteis tanto para iniciantes quanto para profissionais que tem uma licença paga. Os programas mais usados do pacote Office são: Access: usado para criar pequenos bancos de dados. Excel: programa para criar planilhas, armazenar dados, fazer operações matemáticas, criar tabelas de clientes e tabelas para bancos de dados. Outlook: programa para gerenciar emails. PowerPoint: cria apresentações de slides, com animações, imagens, vídeos e muitas outras funções. Muito usado para apresentações de trabalhos escolares e projetos de empresas. Sua funcionalidade permite a pessoas sem nenhum conhecimento aprender a usar facilmente. Word: O Word é o mais usado entre os programas do pacote Office. É um programa de produção de texto, contendo corretor ortográfico, várias fontes, tamanhos de letras, e diversas outras funções. Publisher: usado para diagramação eletrônica, como elaboração de layouts e páginas da web com texto, gráficos, fotografias e outros elementos. (http://www.infoescola.com/informatica/microsoft-office/).

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uma falha de assimilação de conteúdo, é sinalizado pelo programa, destacando a forma correta ou sugerida para consertar o erro. É verdade que às vezes também o programa comete falhas, todavia sempre que demonstra a falha, rememorava ao digitador aquilo que aprendera outrora. Além disso, outros aplicativos se somavam para fazer da máquina um coadjutor do professor de língua portuguesa (e de todas as outras disciplinas). Assim, as motivações para a redação de jornais na escola ganham aparato de edição “quase profissional”, lançando elementos de discernimento vocacional para futuros jornalistas, escritores, etc., tal como personalizando e sociabilizando suas experiências em classe, através da construção de blogs onde os alunos passam a registrar textos com notícias e informações, abrindo espaços para comentários que vão ampliando a experiência da escrita. Também pode ser observado com a participação dos alunos em chats e fóruns de pesquisa, que exercem um fascínio e ganham grande instrumentalização para os jovens, um imenso ganho para o exercício da escrita. O recurso tecnológico nesta área também ganhou grande impulso com a utilização de novos canais de comunicação como as redes sociais e os blogs, onde o exercício da escrita tem se tornado cada vez mais recorrente. Ainda que escrevam períodos mais curtos, há de se ressaltar que escrevem em grande quantidade. Uma vez que se trata de um dado cultural das gerações atuais, de estarem sempre conectadas à internet, tal como uma grande necessidade de manter seus contatos (típico de adolescentes, por exemplo), como pode a educação que se desenvolve para eles não utilizar os recursos de acesso a eles, como sujeitos culturais? Entretanto, podemos mencionar que as muitas abreviações de palavras ferem a polidez da língua, porém se trata de uma questão que percorre as mesmas vias que 45


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a linguagem percorreu, ou seja, a convencionalidade; tal como tantos dos erros de acentuação em palavras que aparecem nos textos, que não tem ligação imediata com a escrita em si, mas com a devida e plena utilização dos recursos que o aplicativo oferece. Por exemplo, a acentuação num texto digitado num iPhone, nem sempre acontece automaticamente. Tantas vezes é preciso pressionar a tecla e escorrer o cursor na barra com opções da letra acentuada, para registrar essa opção. Ao que se vê, a máquina obedece ainda aos nossos comandos quando a linguagem está sob a égide da nossa convenção. Ainda outro dado muito interessante para esta área do currículo escolar, e que pode oferecer uma enorme contribuição como caminho e acesso para o webcurrículo, são as bibliotecas virtuais, que por não exigirem os padrões e regras presenciais tão rígidas como as fixadas em quadros de avisos na biblioteca e dos funcionários que ali trabalham, também com a incumbência de manter a disciplina no uso coletivo daquele espaço, se apresentam como os lugares virtuais dos livros digitais. É fato que a questão do perfil cada vez mais dinâmico em movimentos e de agitação comportamental dos jovens de hoje, motivos pelos quais muitos aplicam o apelido de “geração ritalina”, demostra um afastamento de nossos alunos das bibliotecas e dos livros, consequentemente do hábito de ler, uma vez que a disciplina e postura exigidas para se usar coletivamente o ambiente da biblioteca geram normas comportamentais que desistimulam a frequência dos mais “agitados”. Muito embora se deva também mencionar não ser só este o fator que leva a tal situação, mas também a própria cultura e a dinâmica da vida familiar, que habitualmente não compra livros e os coleciona em estantes. Na verdade o layout das moradias mudou e onde havia uma estante de livros, como um “sacrário de cultura”, agora existe uma televisão tela plana full HD com um home theater. Trata-se de imagens que se associam ao fato das crianças não 46


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mais verem seus pais lendo, daí diminuírem sua motivação, devendo a escola assumir também este papel e função social. O acesso a este acervo virtual, seja ele colecionado em textos organizados em estantes virtuais ou dentro de pastas e ou documentos compartilhados, tornam-os cada vez mais acessível à leitura, inclusive permitindo o acesso a textos e documentos não só de língua portuguesa e literatura mas também documentos históricos e inéditos, podendo sobretudo, muitos serem “baixados” gratuitamente, e com a tecnologia icloud8 sincronizados em diversos lugares e dispositivos, usando as nuvens como meio de transporte, para serem utilizados em qualquer lugar. Nas aulas da disciplina de Artes, o que deve continuar sendo desenvolvido como aperfeiçoamento de habilidades manuais e desenhos de faixas decorativas, desenvolve-se hoje para além de práticas manuais em direção utilizações virtuais de pesquisas, visitas on-line e exercício de criatividade em web design, de modo que a sala de artes e a sala de informática se revezem como espaços de ensino-aprendizagem, através de visitas e pesquisas pela internet, inclusive trazendo espaços distantes e, em muitos casos, impossíveis de acesso físico dos alunos e professores, à medida que “podem integrar os espaços significativos da cidade: museus, centros culturais, cinemas, teatros, parques, praças, ateliês, centros esportivos, comerciais, produtivos, entre outros” (Moran, 2007, p. 99-100). Propositadamente, deixou-se para o fim deste subcapítulo o caminho do uso tecnológico nas aulas de ciências, quíiCloud (sucessor do MobileMe) é um sistema de armazenamento em nuvem desenvolvido pela Apple Inc. O iCloud foi anunciado em 6 de junho de 2011 no evento Apple Worldwide Developers Conference (WWDC). O sistema permite que os usuários compartilhem seu emails, contatos, marcações no calendário, documentos iWork e localizar o seus dispositivo iOSou MacBook. Disponível em http:// 8

pt.wikipedia.org/wiki/Icloud.

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mica e biologia, que geravam um grande fascínio científico no aluno em função do estar num laboratório (lugar onde a ideia de fazer ciência encontrava eco na imagem que se faz do cientista, como aquele que mistura e produz “porções mágicas”, como “pedras filosofais” das ficções produzidas nos filmes) e também a “paramentação” exigida em tal lugar, assim, usar um jaleco significa simbolicamente era se revestir de uma roupagem que é figurino de um cenário científico. Isso, como simbologia tem demonstrado um sentimento explícito de nossos alunos, de satisfação e elaboração simbólica como se fossem verdadeiros cientistas. Se numa fase inicial os experimentos eram muito básicos, com microscópios e lâminas de vidro contendo pedaços de material a ser analisado, ou então, usando tubos de ensaio com soluções coloridas, agora a tridimensionalidade vem contribuir com o avanço tecnológico para o estudo destas áreas. Todavia, e aqui se apresenta a justificativa para estas linhas serem deixadas no fim do subcapítulo, isto é, ao que parece o estar in loco, paramentado com o avental e com a mão na massa (por exemplo, abrindo um peixe para estudar-lhe a anatomia, ou então fazendo uma mistura in vitro) atribui uma espécie de “alma” para o estudo e participação nestas disciplinas, muito embora as aprendizagens sejam grandemente desenvolvidas com o uso das tecnologias digitais. A observação na prática pedagógica tem mostrado que na sala de aula, os recursos tecnológicos, seja com apresentação de slides em Power Point, vídeos ou softwares, realizavam uma interação didática muito eficaz, mas, quando se vai ao laboratório, observa-se uma reação muito mais emocionada por parte dos alunos. Destarte, como exemplos do agir educacional, ilustrando cada tempo histórico, se percorrem como ação pedagógica e relação didática transformadora, desde os trabalhos escolares manuscritos, datilografados até os digitalizados; as feiras de ciências e culturais com as bancadas contendo materiais 48


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físicos expostos, tendo as explicações dadas pelos alunos, ou as demonstrações em vídeos e Power Point; as faixas geométricas nas aulas de arte do ontem ao recurso do web design na tela digital; as estimulações de movimentos físicos de uma mecânica bem rústica à precisão dos movimentos tridimensionais; a coleta de medidas corporais de peso e altura nas aulas de educação e física para uma utilização de balanças digitais com sensores de detecção de altura digitais, ou ainda nesta mesma disciplina, a passagem da utilização de uma prancheta para anotações de posições em jogos para simulações de estratégias e posicionamentos e quadra, etc. Enfim, é possível constatar um processo evolutivo do tempo de educar, em que cada tempo fez seu aproveitamento didático para efetivar a relação ensino-aprendizagem, cabendo a cada educador realizar o gerenciamento e a construção do conhecimento a ser desenvolvido com o aluno, como sua missão maior. Em tempos da internet, a educação precisa avançar cada vez mais do que apenas compartilhar uma realidade virtual transcendendo a uma ação pedagógica que ensine o aluno a se relacionar com ela como construtora de conhecimento. É como acentua Moran (2007, p. 96): “Ensinar a pesquisar na web ajuda muitos os alunos na realização de atividades virtuais depois, pois se sentirão seguros na pesquisa individual e grupal”. Tudo isso seguia um tom dominante nas disciplinas ao qual educadores e educandos desenvolviam as grades (ou expressão mais simpática, matrizes curriculares, para dar uma ideia menos prisional e consequente interpretação da escola como lugar da punição e do desprazer) curriculares9, 9 A designação de grade curricular é a designação técnica que distingue o elenco das matérias a serem ministradas ao longo de um curso, entretanto quero ressaltar sua forte conotação ideológica que comunica uma ideia de fechamento, de prisão da ação educadora. Por mais que se possa levar a questão para uma esfera de interpretação semântica, é mais producente,

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e tudo isso tem desenvolvido uma perspectiva de cultura de uso que traz no seu bojo o fato de um currículo que se desenvolve de acordo com aquele da unidade escolar, e que tem demonstrado uma realidade prática de uma utilização de conteúdos e recursividade que na web encontramos. Eis o que se pensa ser a contribuição da cultura digital como a tecnologia de nosso tempo.

5. Do abc ao @ _ www: o salto do click que conecta um ponto com em todo lugar. Como descrito inicialmente, a história da ação pedagógica é dinâmica, de movimento e transformação, permitindo a evolução da história de uma unidade escolar, que se constrói em meio a um tempo que não para, e que continua após cada um de nós, fazendo do aprendizado uma marca existencial, como passos de uma caminhada, deixando rastros físicos, emocionais, literários e virtuais. A aparência muda, porém a essência fica sempre a mesma, ou seja, na ação educadora a presença tecnológica vai do giz ao mouse, ou melhor, com giz e com mouse, considerando que tudo é tecné, tudo é empenho do fazer humano no intuito de aprimorar suas formas e atividades como seu método de ação no tempo, ou seja, para educar, os professores sempre se serviram de conhecimentos técnicos, e de ferramentas através de materiais criados. A isso devemos tributar um grande valor, pois à medida que se sucedem métodos e tendências da ação do tempo, a humanidade conquista outros patamares de conhecimento e aperfeiçoamentos, que cumprirão sua função histórico-filosófica de ressignificar a educação a favor da vida. quando se pensa em âmbito de interdisciplinaridade, transdiciplinaridade, interatividade, etc., que o termo assuma outra palavra como sinônima, que pode ser matriz curricular, aliás, já em uso corrente. 50


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O uso da técnica como expressão antropológica do pensamento e da inteligência do homo sapiens, para saltar da condição de mecânica instintiva e virar aprendizagem continuada, desenvolveu-se na tecnologia como fruto da ação inteligente, que realiza comunicação e transmissão do saber inter generationis. Então, podemos pensar, no curso da história da humanidade, mais especificamente da História da educação, em uma ousada subclassificação de nossa espécie, a qual chamaríamos de “digital homo sapiens”, uma vez que podemos observar não só a gênese da geração digital, também como o aperfeiçoamento e presença das tecnologias na vida. Dentro da “esteira rolante” dos movimentos e tendências da vida moderna, dentre tantos exemplos, e para o qual propositadamente queremos orientar nosso foco de projeções para o futuro da educação, considerando a tendência tão crescente e valorizada que é a questão da mobilidade. Podemos trazer à baila um fato da vida cada vez mais cotidiana, ou seja, hoje podemos verificar preços de um produto e o lugar onde comprá-lo mais barato pelo nosso telefone celular, através de um aplicativo que lê códigos de barra ou QR-Codes10, impressos no produto, ou se não o temos conosco, através de uma consulta a um aplicativo que informa onde estes produtos existem, pelas vias de uma busca rápida. Isso tudo é parte da vida moderna, na qual estamos inserindo a leitura de um destino cruzado com o da educação. Na prática pedagógica, este tipo de utilização como recurso didático se baseia na elaboração dos próprios QR Codes, como habilidades tecnológicas que o aluno pode desenvolver através do manuseio de construções cognitivas Quick Response Codes (QR Codes) fazem parte de uma linguagem comunicativa virtual que condensa num pequeno código impresso fisicamente num produto ou numa propaganda imprensa, uma capacidade de expansão de informações e links pelas vias de uma recursividade dinâmica e interativa, inclusive respeitando a decisão do leitor de acessar ou não esta informação que está on-line.

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que colecionam conhecimentos nessas expressões codificadas, desdobrando-se depois em produções que podem ser compartilhadas orientações codificadas de leitura e armazenamento de dados, recurso e coleção de conteúdos programáticos, etc, ou então, servirem para uma atividade lúdica de um caça-palavras como realização de uma aprendizagem compartilhada em que os alunos mais avançados elaborem esses QR Codes e os espalhem por diversos lugares na escola, a fim de que os menores brinquem aprendendo a localizar e juntar as frases com seus sentidos. Todavia, esta utilização pedagógica nos lança uma questão que é a tendência para a educação futura, a da portabilidade, ou seja, mobilidade e portabilidade estarão a serviço da ação educadora, através do uso de celulares com acesso à internet e tais aplicativos. Trata-se de uma realidade social que é fato social hoje, carecendo apenas de urgência nas políticas de gestão tecnológicas governamentais. Entretanto, o cruzamento da tecnologia com a educação, que é da prerrogativa da ação pedagógica e do desenvolvimento didático, já encontra na intencionalidade da educação seu lugar de acesso. A que se refere especificamente esse cruzamento? Destaca-se dentre tantas formas e expressões, questões correlacionadas com os desafios da portabilidade e da mobilidade, que atribuem cada vez mais autonomia de uso a quem tem um notebook ou celular com acesso à internet. Sem dúvida estas condições de uso podem contribuir muito na vida prática e para o aprendizado. Entretanto, eles lançarão à vida social muitas questões que dizem respeito à cultura do uso, isto é, da necessidade de novos comportamentos éticos nos inter-relacionamentos humanos, dentro e fora das escolas. Nos ambientes externos à escola as questões de massificação do uso trarão problematizações na esfera da legalidade e vida moral, uma vez que problemas de programação serão cada vez mais recorrentes, ou seja, o uso da tecnologia conduz ao seu domínio tecnológico pelo usuário, e daí ele 52


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poder manipulá-la a seu favor, como por exemplo, alterando uma mensagem ou um valor. Nesse sentido, a resposta da sociedade será mais objetiva e direta, apelando para a aplicação de seus códigos legais. Entretanto, o mesmo tipo de autonomia no uso e domínio tecnológico será observado na utilização acadêmica, para o qual podemos lançar a pergunta: como ficará a escola depois que as novas tecnologias digitais de informação e comunicação se intensificarem como realidade pedagógico-didática? Sobretudo, quando há o vício no controle social e acadêmico do aluno, a partir de nossas relações do olhar e do conferir fisicamente aquilo que está presente, acontecendo. Ora, não estamos acostumados ao virtual e então, como continuaremos a orientar nosso aluno, que agora navega on-line por onde quer, rompendo o nosso controle disciplinar e visual, podendo estar tão longe de nossas aulas e recursos didáticos? Ou então, como os educadores se comportarão quando os alunos, não pelas vias de acesso que a escola lhe disponibiliza que podem estar cerceadas por algum tipo de filtro controlador, mas quando usar seu próprio acesso de tecnologia 3G, por exemplo, transformando sua participação em aula numa atitude de “bate e rebate” através de buscas rápidas e amplas em sites de busca tipo Google, Wikipedia, etc. Este é um grande desafio ao educador que, muitas vezes se depara com uma realidade tecnológica a qual não teve acesso anterior. É um caminho novo e longo a percorrer com vários objetivos, sendo um deles transformar os 50 minutos de aula em constantes momentos de atenção, diálogo e interesse em meio à interação com esses recursos tecnológicos. Isso sinaliza cada vez mais para a uma transformação do tempo de aula, que a educação on-line demonstra ter que ser cronometrada diferentemente. Pode-se constatar que a educação não é um processo mecânico fechado, e ao mesmo tempo, há certa crítica negativa quando tantas vezes acontece uma manutenção de modelos 53


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curriculares, ou que não dialogam mais com o tempo presente, ou apresentam forte tendência de fechar os canais de diálogo com a realidade que estamos vivendo. Por isso, há a necessidade de cada vez mais se buscar na web contribuições que enriqueçam o currículo para que ele sempre se mantenha renovado e atenda às necessidades educacionais do presente. Os currículos têm sempre que orientar a forma de educar, de acordo com as modificações que se sucedem de acordo com as novas culturas e desafios que se surgem no dia a dia. Isso não significa que no decurso do tempo uma realidade cultural nova se suplantará a antecedente, mas que elas vão se interpenetrando, e se transformando em novas formas de se responder aos apelos do hoje, mirando o amanhã. Atualmente, a complexidade de nossa vida social, com suas muitas atividades, está sobrecarregando a escola com tantas informações, que precisamos saber canalizar e direcionar a pesquisa dos alunos para que estas se revertam como fontes de conhecimento, e não depósitos de informações. O currículo da web tem que se transformar em aprendizado, e isso realizado num tempo novo, uma nova cronometria do aprender. Se pegarmos como exemplo um paralelo histórico do uso da biblioteca e de como as pesquisas que eram feitas naquele lugar, com o tempo que se cronometrava nessa atividade, constatar-se-á que a mudança nas referências de tempo e lugar estão modificando física e virtualmente os comportamentos estudantis, fato que merece estudos mais amplos. O tempo de pesquisa se consumia entre o ir à biblioteca, pegar na estante um volume de uma enciclopédia do tipo “Barsa” e folheá-la até encontrar um verbete que explique o objeto de nossa pesquisa. Agora isso é coisa do passado. Tudo se tornou muito rápido e quase instantâneo, “salvo se a conexão não cair”. Basta uma consulta a uma biblioteca virtual que tem de concentrar milhares de títulos de livros, inclusive com formatos mais atraentes e interativos, ou acesso a um site de busca e, prontamente, o aluno e o professor têm acesso às 54


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informações que desejarem, podendo inclusive expandir suas conexões a outras informações complementares e mesmo inéditas, em real time. Isso dá um poder funcional à internet de estar a serviço da educação, ao menos no lugar em que ela for acessível. Eis aqui o seu lado frágil, a questão da acessibilidade, que apenas quando for universal, poder-se-á dizer plenamente eficiente. Todavia, um papel social da escola é de tornar o acesso à internet disponível a todos os seus alunos e, saindo da esfera local, lutar para que este acesso se torne disponível em todas as escolas, privadas e públicas. Esse movimento tão rápido, com a qual a informação chega à ação educadora, não só contribui para estabelecermos mais links em busca do aprimoramento do saber, como repetidamente escrevemos para frisar a importância e destino esperado para o fato, lançam novos paradigmas para a educação, do inter-relacionamento entre professor-computador-ação pedagógica. Isso nos causa encantamento e prazer, como também nos angustia, uma vez que não temos prática em lidar com o novo, nem fomos muito preparados para isso. Existe a necessidade de administrar a velocidade com que os fatos vão se sucedendo, considerando que muitos dos professores em atuação hoje foram formados dentro de uma influência do modelo de produção taylorista-fordista, onde a produção era uma atividade mecânica para produzir e gerar ganho imediato, como se o professor fosse o operador de uma máquina de aprender e ensinar mecanicamente, orientado para uma produtividade determinada. Eis um foco de angústia existencial para esse pedagogo! Assim, com as novas expressões culturais, que são as acima mencionadas como novas culturas digitais, que há muito fazem parte de nossa vida prática, apontamos para uma dimensão cultural adentrando nas escolas: a cultura do uso digital. Entretanto, a formação que não foi oferecida, encontra tantas vezes no professorado e na gestão institucional, 55


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hoje se manifesta como foco da resistência didática, medo e desistência da docência para os mais antigos, que aproveitam para apressar a aposentadoria, ou quando já aposentados, mas em atividade docente, para terminarem definitivamente a carreira. Nesse sentido, tantas vezes a escola perde muitos dos seus “bons vinhos”, que pelo tempo ganharam grande e notória relevância do bom e rico sabor do saber. É importante sinalizar, cada vez mais, a necessidade do desenvolvimento na cultura digital da atividade docente, que terá que ser estimulada e facilitada por uma gestão que almeje sucesso e diálogo com o futuro através do presente da cultura do estudante de hoje: nosso “nativo digital”. Por isso se faz, cada vez mais necessário, aprender a ensinar com as novas tecnologias digitais de informação e comunicação, como meio de efetivar, de fato e promissoramente uma comunicação pedagógica e uma ação didática com o aluno. Ou seja, a vida profissional convida a todos a dar um salto de uma condição analógica para uma digital, como um dia ao aprendermos as primeiras letras e nos empolgamos com isso. Hoje se torna imprescindível nos conectar nesta “moderna” forma de educar ajudados, é claro, por cursos introdutórios, preparatórios e de aperfeiçoamento constante. Ao darmos este salto qualitativo como educadores, a partir da essência na condição necessária do saber, à luz de Paulo Freire mencionado no início deste texto, mergulharemos na essência do ser conduzido, quando aprenderemos ensinando, sem renunciar, e nem mesmo enfraquecermos nossa postura de educadores, que mesmo analógicos, têm a missão de ensinar além de conteúdos programáticos, relações humanas e éticas do uso responsável desta nova riqueza potencial instrumentalizada nos dedos. É preciso que o dedo (em latim digitus), emoção e razão conduzam a conexão! Afinal, ao que podemos, pretenciosa e ilustrativamente reforçar a subclassificação digital homo sapiens, que ilustramos e podemos associar à descrição do 56


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homo faber, ou seja, o homem que realiza a ação pedagógica digital, como sua perspectiva de, na sua prática pedagógica, estar no tempo e no espaço do virtual, categorias de nossa época e “marca registrada” da cultura de nossos alunos, ou seja, ele se faz o educador no tempo dos alunos, fazendo deste também o seu tempo. Saber lidar com situações novas oriundas desse processo inovador das tecnologias digitais de informação e comunicação é uma necessidade de adaptação do educador, a fim de estimular o aluno para a aula. Ademais, sem este tipo de uso e adaptação ao novo meio pedagógico que a cultura do mundo digital lança à escola e à sociedade, o aluno cada vez mais se distanciará da escola, até que esta não lhe signifique quase nada. Há muito que a informatização e as máquinas fazem parte de nosso cotidiano: máquinas de calcular do supermercado aos bancos escolares, dos bilhetes eletrônicos do metrô e ônibus, dos cartões de crédito e caixas eletrônicos, das ultrassonografias simples à tomografia computadorizada que expande a visão em milhares de pixels para que possamos não só aumentar o campo focado, como também qualificar sua imagem. Neste salto de um estágio a outro do avanço tecnológico podemos traçar o caminho que a educação deve percorrer. Ao escrever A educação que desejamos. Novos desafios e como chegar lá, José Manuel Moran nos antecipa os prognósticos do futuro da educação a partir das novas tecnologias digitais de informação e comunicação, mostrando que se trata de um processo de uma sociedade em contínua transformação. Assim escreve: Estamos caminhando rapidamente para uma sociedade muito diferente, que em parte vislumbramos, mas que ainda nos reserva inúmeras surpresas. Será uma sociedade conectada, com possibilidades de comunicação, interação e aprendizagem inimagináveis hoje. Os 57


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processos de educação serão profundamente diferentes dos atuais. (2007, p.145).

Em se tratando do homem como um ser social, com seu modus vivendi, todas as suas instituições seguem o traçado de organização orientado pelo seu modus operandi, assim, a escola, como um desses lugares sociais, realiza forte expressividade na vida do aluno, que lá passa horas do seu dia vivenciando inúmeras e inéditas experiências: o primeiro local de experiência de sociabilização em maior escala na pré-escola, inclusive de vírus e bactérias como fato biologicamente importante para o desenvolvimento e aumento de anticorpos; o aprendizado das letras, dos números; para muitos a realização de experiências do primeiro namoro; etc. A escola é uma das portas de entrada da inserção tecnológica, com grande potencialidade e expressividade de conectar família com educação, na dimensão de uma profunda parceria, frente à condição inata de que as crianças chegam com seus primeiros estímulos da visualização tecnológica a partir dos seus pais que usam celulares, mexem em controles remotos, assistem a DVDs em televisores de tela plana, digitam e mandam mensagens em computadores e celulares, tiram fotografias com câmeras digitais ou celulares, etc. Ainda sobre a inserção das novas tecnologias na educação como um todo, precisamos dar uma especial atenção ao segmento Educação Infantil, considerando o fato de ser baixa a produção de estudos acadêmicos sobre dessa presença pedagógica nesta fase da educação, tal como serem reduzidos os produtos editoriais, considerando também que os procedimentos da maioria das editoras quando têm esta linha editorial (talvez porque o uso do livro didático ou digital neste segmento não gera grande vendagem) não fazem mais do que apenas transformar o livro impresso em digital, acrescentando-lhes alguns recursos tecnológicos que não passam de simples introdução ao uso que se pretende dentro da perspectiva do webcurrículo. 58


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Na Educação Infantil o livro didático não é a base para ação didática, por conta de muitos fatores como formato e tamanho de folhas, necessidade de mais espaços em branco para traçados livres, o que anularia a presença do livro e poderia ser desenvolvido em folhas tamanho A3. Todavia com o uso do livro digital, muitas outras dimensões podem ser exploradas, tais como visualizações com mais brilho e cor mais acentuada, movimentos, sonorização etc, tal como muitas dessas também possam estar no livro impresso. Pensemos em uma ação pedagógica alicerçada em princípios pedagógicos de psicomotricidade em que o desenvolvimento da coordenação motora ampla com o trabalho de exercitação dos músculos maiores possa ajudar a preparar a musculatura menor que na atividade didática, se concentrará nas mãos, que cada vez mais como uma pinça aprenderá a segurar o lápis para começar o exercício motor de coordenar o movimento do traçado dos riscos até lhes aprimorar as formas, depois de bom tempo de prática, desenvolvendo-se assim a coordenação motora fina que se prolongará pela vida. As exercitações e os traçados podem ser muito bem explorados com a recursividade digital, em computador de mesa, notebook, tablet, celular, ou no que preferimos por sociabilizar mais a aprendizagem, uma lousa interativa multimídia, do tipo dual touch screen, em função de que nestas a interatividade acontece de um modo muito parecido com o clássico e permitindo às crianças estarem juntas na lousa, privilegiando a índole social dos relacionamentos de amizade, pois já que nestas faixas etárias abrangidas pela Educação Infantil, acontecem naturalmente. Estas são proposições de uma maior e mais profunda integração ao universo cultural das crianças mais novas com esse universo cultural que lhes faz parte como história real. Nesta faixa etária, as crianças revelam fazer parte de uma geração que nasce emersa no universo das novas tecnologias da informação e comunicação. São os nativos desta “era educacional”, como se fossem “downloads de uma época 59


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e história futura”, que se potencializam através de uma sensibilidade e estrutura cognitiva em construção, favorecendo inclusive ao tempo de aprendizagem e aperfeiçoamento do professor, que tem um nível básico de uso dos equipamentos digitais buscando aumentar sua aprendizagem, ou seja, não subestimando a cognição das crianças da Educação Infantil, mas para efeito de acompanhar o crescimento da presença das novas tecnologias digitais na educação, elas são uma porta de acesso que mais desenvolve a concepção da gradatividade, que pouco a pouco vai penetrando nas formas, nos métodos e na prática natural do uso didático. Assim, ao mesmo tempo em que o professor da Educação Infantil inicia o processo de alfabetização-letramento do aluno (movidos pelas funcionalidades automáticas das exigências relacionadas a esta ação docente, isto é, de ter que brincar muito, ser muito lúdico, de ter que se abaixar bastante para favorecer o nível de comunicação visual da criança, etc), ele também inicia ou desenvolve seu letramento digital, ou seja, seu aluno de perfil digital touch, naturalmente lhe ensina a desejar usar tecnologia. E qual professor não aprende e se deixa conduzir pelos apelos de aprendizagem e cultura de seus alunos?! Ainda nesta faixa etária a ação pedagógica pode explorar muito os estímulos sensoriais, em especial os visuais e auditivos, quando as crianças respondem rapidamente às estimulações que lhes são feitas. Trata-se de uma fase em que a criança está desenvolvendo os sentidos gradativamente, atribuindo um valor fisiológico às cores e aos sons, e respondendo com uma atenção particular aos detalhes destes. Eis um caminho para se investir didaticamente, tal como observamos no sucesso ao se contar estórias com seus cenários e músicas, desenhos livres, festas com fantasias, máscaras e brinquedos levados da escola para casa, da casa para a escola, etc. A propósito, o Colégio São João Gualberto, implantou um novo laboratório de informática da Educação Infantil, maior, com 23 computadores mais data show e equipamen60


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tos de som, porém se preocupando em torná-lo um lugar com “cara de criança”, ou seja, explorando as cores diversificadas e vibrantes, os computadores são menores e com um design mais infantil, com teclados coloridos e mouses em formato de carrinhos, animais e personagens de estórias com leds coloridos, além de um cenário no lugar que identifica a um teatro mirim, em função de desenvolver ali uma atividade lúdica de uso de material da web para projetar imagens (castelos, parques, animais, etc.) que sirvam de fundo para interações teatrais com cenários digitais. Ao ser apresentada a sala ambiente, preparada para o uso, decidiu-se fazer uma experiência onde o primeiro contato, após admirarem o seu novo laboratório, foi pedido que elas observassem tudo, desenhassem, registrando o que viram. As produções artísticas resultantes foram muito detalhadas, no que diz respeito à descrição de objetos e à organização dos mesmos, inclusive elementos como o colorido dos armários e dos teclados estavam presentes em quase todos os desenhos, tal como os computadores, as pequenas antenas de captação da rede Wi-Fi11, as mesas, as cadeiras, as lâmpadas, e até mesmo um funcionário no alto da escada dando os últimos retoques da instalação do datashow. O resultado dessa atividade pedagógica, preparatória para uso do novo laboratório, foi a constatação dessa sensibilidade da criança frente às imagens que sua mente coleciona Apesar de o termo Wi-Fi ser uma marca registrada pela Wi-Fi Alliance, a expressão hoje se tornou um sinônimo para a tecnologia IEEE 802.11, que permite a conexão entre diversos dispositivos sem fio. A expressão Wi-Fi surgiu como uma alusão à expressão High Fidelity (Hi-Fi), utilizada pela indústria fonográfica na década de 50. Assim, a o termo Wi-Fi nada mais é do que a contração das palavras Wireless Fidelity. As redes Wi-Fi funcionam por meio de ondas de rádio. Elas são transmitidas por meio de um adaptador, o chamado “roteador”, que recebe os sinais, decodifica e os emite a partir de uma antena. Para que um computador ou dispositivo tenha acesso a esses sinais, é preciso que ele esteja dentro um determinado raio de ação, conhecido como hotspot. Adaptado de http://www.tecmundo.com.br/wi-fi/197-o-que-e-wi-fi-.htm#ixzz2dSMytKrV.

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quando faz sua experiência de contato. As cores, os detalhes e a descrição dos equipamentos são, para aquela faixa etária que atendemos naquele laboratório (dos 3 aos 6 anos) uma captação cognitiva que auxilia na sua aprendizagem. Softwares não tão complexos serão utilizados de forma mais ilustrativa e lúdica como porta de entrada no uso escolar do computador, iniciando a experiência escolar dos “nativos digitais” que no futuro serão os desenvolvedores de programas que incidirão sobre a dinâmica prática da vida social como um todo. Como foi mencionado, a ação pedagógica do professor dá seguimento à estimulação sensorial começada em casa, onde as crianças observadoras, fornecem ao educador um caminho de acesso para um encantamento e conquista da atenção do aluno, fatores muito importantes para avanço qualitativo da ação pedagógica. Considerando os efeitos da abertura de uma tela do monitor de computador em que as cores, os sons e os movimentos superam a tela específica da utilização da televisão na sala de aula (o que foi um significativo passo na introdução tecnológica neste segmento da educação, porém com reduzida abertura à interação, servindo muitas vezes como uso para entretenimento e distração para o aluno), para dar lugar a um novo ambiente educacional em que a magia da produção dos próprios riscos segue na sequência como uma mágica na tela. Com a impressão na tela e, posteriormente, no papel o aluno demonstra grande entusiasmo sem entender a mecânica do fato, mas isso se assemelha ao que se pode observar com a alegria que manifesta quando leva para casa um trabalho feito em classe, que pode ser uma máscara, um brinquedo, um enfeite, etc, como aqueles que normalmente são levados às sextas-feiras. O produzir e aparecer na tela faz com que elas se encantem primeiramente e, depois, normalmente mostram aos amiguinhos ao lado, e a seguir à professora. Eis a magia do click e da tela. Aliás, interações múltiplas é o que a inteligência, princi62


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palmente das crianças da Educação Infantil, precisam para construírem o maior número de sinapses neuronais que auxiliam na aprendizagem. A perspectiva didática da tela do computador é um encaixe sócio-existencial muito ligado à pedagogia de um novo tempo, por conta de um crescente perfil histórico que teve a sua gênese na utilização da televisão com a função de ocupação do tempo (e em certos casos de exagerado aprisionamento da criança a uma programação televisiva a fim de entretê -la, ou melhor, aquietá-la, para o cumprimento dos afazeres domésticos, e nisso quem é mãe ou pai sabe como ajuda em muito, ainda que as espiadas ao silêncio sejam constantes). Outro momento histórico se demarcou com a presença dos brinquedos eletrônicos, em especial nos moldes dos video games que deslocavam os bonecos e personagens, em geral, das mãos das crianças e os colocavam nas telas, reduzindo a possibilidade de uma interação física com os movimentos a serem manipulados pelos mesmos, para uma produção de movimentos virtuais em que o grau de intimidade e confiabilidade no resultado que a máquina apresentava eram regra sine qua non para se manter no jogo. Nisto se pode observar uma relação psicológica de confiança da criança na máquina, que em tese poderia não estar realizando o movimentos desejado, fato esse que sedimenta uma estrutura psicológica que prepara ao momento seguinte que será o da informatização no processo de educação a partir das dinâmicas psíquicas das sinapses neuronais que até os 8 anos avançam de forma mais plena.

6. Conclusões A presença da tecnologia como marca característica do esforço humano na execução de suas tarefas e empenhos é uma caracterização natural do seu comportamento prático. Sempre foi sendo aperfeiçoado ao longo de sua história, de 63


Nossa ação pedagógica: na didática do ontem ao amanhã...

modo a deixar sempre acessível suas próprias invenções e aperfeiçoamentos, e com isso tirar o maior proveito do que sua inteligência produziu. Podemos pensar na ação pedagógica com suas atividades didáticas, como algo essencialmente tecnológico, indo do uso do giz e quadro negro das lousas verdes quadriculadas ou brancas que utilizam pincéis para escrever, até um mouse, tablet ou celular. Como se vê o tempo não tem limites, tal como a inventividade da inteligência humana é profundamente criativa, sem romper com o seu patrimônio cultural, ou seja, vemos em comum quadro negro e lousa digital, caderno e notebook, diário escrito com caneta e blog, etc. Por isso, podemos considerar que se mudam as formas aparentes, porém a essência da ação educativa continua a mesma. Assim, o formato da tela do computador, num primeiro momento partilhada nos laboratórios de informática, que podiam ser utilizados em grupos ou individualmente, dependendo da estrutura do laboratório de informática da escola, agora abre espaço aos monitores dos computadores pessoais, os laptops, ou mesmo os tablets que começam a adentrar os portões da escola, para abri-la ao mundo externo e continuado no ambiente que o aluno quiser e estiver. Sem dúvida, esta possibilidade de utilização pedagógica é uma utopia, sobretudo nesta fase da vida em que a autonomia da criança ainda é bastante limitada, mas..., tal como nos surpreendemos com as perguntas, indagações, conclusões, ousadias e atitudes em geral, que outrora significavam descompasso comportamental, ou seja, quem com mais de 30 anos de idade hoje, não tomou uma repreensão por parte de uma destas crianças? Todavia, hoje isso é considerado muito interessante, inclusive caracterizamos como sinal de inteligência de uma criança. Isso nos demonstra o quanto o processo evolutivo facilitado pelas novas tecnologias tem realizado, surtindo diminuição na repressão cognitiva, ainda que correndo o risco da diminuição dos limites, que inclusive pode ser 64


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marca temporal da nossa moral, a propósito, nós, perante a formação de nossos avós e pais, já éramos muito “ousadinhos”. A questão é que é difícil de entender como a dinâmica da vida acontece como ação transformadora, alterando e incomodando nossa zona de conforto e controle social. Cabe-nos abrir a formação da transformação. A formação da mudança de tempos apresenta como a nova forma de se viver. Cabe-nos aplicar o nosso conhecimento pedagógico a fim de aprendermos e reaprendermos, com o passar do tempo, novas funções, novos parâmetros e novas perspectivas existenciais. A escola ensina o aluno, e o aluno ensina a escola, logo, alunos, instituição e educadores estão sempre em constante processo de construção de conhecimento para facilitar as aprendizagens, de modo a sempre aprender com o inédito, em que cada momento novo revela uma lição de vida, e por isso deve ser razão de empenho a sensibilização, ou seja, para qual lição o presente se apresenta como porta para o futuro. Aliás, a dúvida dos educadores é como iremos formar os alunos para viverem num mundo em que o universo digital desenvolve-se cada vez mais e para o qual eles é que terão a missão de serem protagonistas do mundo que virá para eles e seus descendentes. O educador tem que assumir na educação, hoje, a corresponsabilidade pelo cidadão do amanhã, e como mencionado, no mundo que se constrói, eles serão os programadores que desenvolverão condições melhores de vida através dos avanços tecnológicos que eles desvendarão como as respostas para as questões práticas e funcionais. Eis o apelo final da nossa filosofia educacional: como transmitirmos valores morais e éticos à geração dos futuros programadores do mundo digital (o futuro da tecnologia) que incidirá cada vez mais sobre nossa vida cultural? Eis a cultura digital no qual a partir da escola a sociedade vai se organizando. Como desafios pedagógicos tem-se que estabelecer uma relação ensino-aprendizagem com o auxilio das novas tecnologias 65


Nossa ação pedagógica: na didática do ontem ao amanhã...

digitais. É preciso fazer com que os alunos, ao buscarem conteúdos na internet, não sejam apenas consumidores de informações, mas as organizem e as transformem em conhecimento. Então, temos um profundo trabalho de depuração e de condução do aluno que se auto-afirma a constante missão do educador, como paidagógos, uma vez que como escreve Moran, “a internet está se tornando uma mídia fundamental para a pesquisa. O acesso instantâneo a portais de busca, a disponibilização de artigos ordenados por palavras-chaves facilitam muito o acesso às informações desejadas” (Moran, 2007, p. 103). Tudo isso serve para nos enunciar uma globalização da ação educacional, o que pode ser positivo ou negativo. Todavia, não podemos nos perder, por medo do futuro. Com suas consequências, que em nosso presente podem ser atenuadas, o homem programa a máquina a serviço da boa educação, e nós agora que somos os formadores dos futuros agentes transformadores da sociedade, que assumirão a continuidade de nosso agir pedagógico hoje, somos responsáveis pelo futuro da história que decorre como relação de complementariedade entre as gerações.

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A noção de tempo e as crianças Natália Andreazzi Finelli12

Será que as crianças das séries iniciais são capazes de abstrair e compreender um conceito tão complexo como a noção de tempo? A noção de tempo, para quem se dedica a ensinar história nas escolas de 1º e 2º grau, é uma das questões mais complexas e problemáticas. As diversas propostas curriculares do ensino de história de várias secretarias da educação apresentam o problema da noção de tempo com ênfase, indicando por este tema a articulação com a concepção de história que se pretende veicular nas escolas. (...) Repensar a história como disciplina escolar requer dos professores um momento de reflexão que envolve considerações que vão além dos conteúdos, metodologias de ensino e recursos didáticos. Trata-se de refletir sobre a existência da disciplina histórica e seu sentido político e social. Daí a concepção da noção de tempo torna-se fundamental. É possível, para um aluno de 1º e 2º graus, a compreensão do tempo histórico? A faixa etária é determinante neste processo? (NADAI; BITTENCOURT, 2004, p. 73-74).

Pedagoga, Historiadora, Especialista em Comunicação Assistiva-Braille/libras e em Formação de Professores para o contexto Digital. Professora de Educação Infantil do Instituto Educacional São João Gualberto desde 2008.

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A noção de tempo e as crianças

De fato, o tempo é um conceito difícil de ser compreendido, sendo necessário um longo processo para sua formação. É comum encontrarmos afirmações que se referem à impossibilidade das crianças, na faixa etária dos 6 aos 8 anos, não compreenderem a noção de tempo devido ao estágio de desenvolvimento que se encontram13. Porém, esta afirmação não é verdadeira, o tempo é um conceito complexo e que necessita da utilização de diferentes recursos e estratégias ao longo de um processo para ser compreendido. Vamos entender um pouco sobre o que é o tempo. O tempo é abstrato, pessoal e relativo. Apresenta variadas representações, está a nossa volta e já se incorporou a nossa vida: A linguagem do homem comum parece fazer do tempo o depositário de todos os sentimentos que as experiências vividas já despertaram nele: “tempos bons aqueles!”, diz, com saudade do que já acabou; “Anos difíceis”, suspira, com um misto de alívio e de dor; “O tempo passou tão rápido!”, lamenta, pensando na fugacidade da felicidade; “Tempo perdido!”, sussurra, com ar de decepção pelo sonho que não se realizou; “As horas não passam!”, repete ansioso, à espera do que de ruim ou de bom deverá acontecer; “Não tenho tempo!”, diz, para acalmar sua ansiedade, ou para justificar sua omissão. (PINO, 2003, p. 50).

Mas afinal como se define tempo? Há uma grande dificuldade em se definir tempo que vem desde a antiguidade. No século V, Santo Agostinho se questionava sobre a definição de tempo: “Enquanto não me

Segundo Piaget os indivíduos passam por estágios ao longo do seu desenvolvimento. Para maiores explicações desta teoria, verificar p. 5.

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Natália Andreazzi Finelli

perguntam, eu sei; se me perguntam e quero explicar, não sei”14. Hoje, segundo o dicionário, tem-se o tempo como uma sucessão dos anos, dos dias, das horas, etc, que envolve, para o homem, a noção de presente, passado e futuro15. Trata-se de um tempo cronológico, marcado por horas, minutos, segundos. Esta definição de tempo é resultante de um longo processo que está inteiramente relacionada com a vivência do homem. O homem tem o tempo como forma de se orientar, e essa função do tempo foi sendo construída através das experiências e está em constante evolução e transformação. Esta definição só foi possível com o desenvolvimento de unidades de medição do tempo. Quando faltam estes instrumentos, essa experiência do tempo também fica ausente. (ELIAS, 1998, p. 36). Foi através destes instrumentos de medidas que a percepção do tempo viciou o desenvolvimento da humanidade a uma dependência deste tempo com suas marcações. Assim, o tempo orienta toda e qualquer ação que o homem realiza. Hora de entrada, hora de saída, hora/aula, hora do trabalho, hora do lazer, etc. Este “tão complicado” tempo é personagem presente em vários cenários, mas é na História que encontra seu palco principal. O tempo, um dos principais conceitos, e deve ser assimilados para se entender a História, e é também muito abstrato para as crianças compreenderem. Como os fatos aconteceram ao longo da vida? Como perceber mudanças e perspectivas, como concretizar algo que não é palpável? O tempo histórico é um conjunto de várias concepções de tempo. Dentro destas concepções podemos citar o tempo vivido (no qual o indivíduo tem a percepção da passagem do BRAICK, Patricia Ramos; MOTA, Myriam Becho. História das Cavernas ao terceiro Milênio. Vol. Único. 2 ed. São Paulo: Moderna, 2002, p. 10.

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FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova fronteira. Obra em 19 fascículos semanais encartados na Folha de São Paulo, de outubro de 1994 a fevereiro de 1995.

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A noção de tempo e as crianças

tempo segundo suas ações e emoções, a duração do tempo vai variar de acordo com o que está vivenciando), o tempo cronológico e astronômico (sucessão de dias e noites, meses e anos, fases do dia, presente-passado-futuro, permitindo referências e organização social de maneira comum), tempo biológico (crescimento, envelhecimento), tempo social (percepção de que o tempo vivido é marcado por compromissos e regras determinados socialmente), tempo psicológico interno dos indivíduos (ideias de sucessão, de permanências e rupturas). Sendo assim, o tempo histórico é produto das ações, relações e formas de pensar dos homens e essas ações variam ao longo do tempo cronológico (SIMAN, 2003, p. 111). O tempo histórico é construído ao longo da vivência e do desenvolvimento do indivíduo. Porém, muitas vezes, resumese o tempo histórico apenas à divisão temporal e à fixação de datas. O tempo histórico utiliza o tempo cronológico, mas também o transforma à sua maneira. Isto é, utiliza o calendário, que possibilita especificar o lugar dos momentos históricos na sucessão do tempo, mas procura trabalhar também com a ideia de diferentes níveis e ritmos de durações temporais. Os níveis das durações estão relacionados à percepção das mudanças ou das permanências nas vivências humanas. As mudanças podem ser identificadas, por exemplo, apenas nos acontecimentos pontuais, como no caso da queda de um governo, da implantação de uma lei, do início de uma revolta popular. Podem ser identificadas, por outro lado, a partir de acontecimentos que possuem durações mais longas, como nas permanências e nas transformações econômicas regidas por governos ou partidos políticos, na permanência de crises financeiras ou na duração de uma lei ou costume. Podem, ainda, ser identificadas em acontecimentos de longuíssimo tempo, como os comportamentos coletivos mais enraizados, os valores e as crenças que permane72


Natália Andreazzi Finelli

cem por gerações, as relações de trabalho que atravessam séculos. Os ritmos da duração, por sua vez, possibilitam identificar a velocidade com que as mudanças ocorrem. Assim, podem ser identificados três tempos: o tempo do acontecimento breve, o da conjuntura e o da estrutura. O tempo do acontecimento breve é aquele que representa a duração de um fato de dimensão breve, correspondendo a um momento preciso, marcado por uma data. Pode ser, no caso, um nascimento, a assinatura de um acordo, uma greve, a independência política de um país, a exposição de uma coleção artística, a fundação de uma cidade, o início ou o fim de uma guerra. O tempo da conjuntura é aquele que se prolonga e pode ser apreendido durante uma vida, como o período de uma crise econômica, a duração de uma guerra, a permanência de um regime político, o desenrolar de um movimento cultural, os efeitos de uma epidemia ou a validade de uma lei. (PCN, 2000).

Percebe-se assim, que o tempo histórico é um conceito complexo, que reúne diferentes situações, visões e abordagens, logo é construído ao longo da vivência e do desenvolvimento do indivíduo. Desde o momento em que a criança vem ao mundo passa adquirir noções diversas da realidade na qual se insere, são diferentes informações que ao longo do seu desenvolvimento são descobertas, assimiladas e acomodadas no organismo em diferentes níveis de intensidade. A formação da noção de tempo (principalmente cronológico) faz parte desse processo. Adultos com pensamentos formados compreendem facilmente a noção de tempo, e a relacionam com sua vida cotidiana. Entretanto, para que haja essa compreensão, o pensamento deste adulto passou por um longo e complexo processo de assimilação e acomodação16. 16

Por assimilação se resume a relação fundamental entre sujeito assimi73


A noção de tempo e as crianças

Para compreender esta dificuldade e a formação deste pensamento podem-se tomar por base dois teóricos em frentes temáticas, que apesar de diferentes, se completam. São eles Vygotsky e Piaget. Segundo o teórico Lev Semionovitch Vygotsky, o processo de desenvolvimento de conceitos está dividido em estágios nos quais, o primeiro estágio é caracterizado por formações de conjuntos com base em fatores subjetivos e perceptuais. O segundo estágio é chamado por Vygotsky de “pensamento por complexos” onde objetos são agrupados em complexos a partir da experiência direta do indivíduo apoiando-se em fatos concretos. O complexo é diferente do conceito, é a formação anterior, pois qualquer experiência pode levar a inclusão de um elemento a um complexo. No último estágio, o indivíduo, partindo de um atributo identificado agrupa os objetos conseguindo considerar isoladamente um ou mais elementos de um todo, isto é, separa mentalmente para tomar em consideração uma propriedade que não pode ter existência fora de uma experiência concreta. E isto o levará a formação real dos conceitos. Sendo assim, resume-se este processo: (...) o indivíduo humano, dotado de um aparato biológico que estabelece limites e possibilidades para seu funcionamento psicológico, interage simultaneamente com o mundo real em que vive e com as formas de organização desse real dadas pela cultura. Essas formas culturalmente dadas serão, ao longo de um processo de desenvolvimento, internalizadas pelo indivíduo e se constituirão no lador e o objeto assimilado, na qual um organismo utiliza-se de alguma coisa e de seu ambiente e a incorpora a si. Complementar ao processo de assimilação, acomodação é um processo de modificar esquemas para resolver problemas que resultam de experiências novas no ambiente que se manifesta como exploração, indagação, tentativa e erro, realização de experiências ou reflexão (MINICUCCI, s. d, p. 5 - 6). 74


Natália Andreazzi Finelli

material simbólico que fará a mediação entre o sujeito e o objeto de conhecimento. (OLIVEIRA, 1992, p. 30).

A cognição se amplia à medida que são feitas interconexões culturais das experiências do indivíduo com as informações a quem do seu mundo que chegam a ele, no ambiente escolar, por meio do professor. Vygotsky afirma que não apenas os fatores biológicos atuam nesse desenvolvimento do indivíduo e, por consequência, na formação de conceitos17, mas também os fatores sociais: Os conceitos são construções culturais, internalizadas pelos indivíduos ao longo de seu processo de desenvolvimento. Os atributos necessários e suficientes para definir um conceito são estabelecidos por características dos elementos encontrados no mundo real, selecionados como relevantes pelos diversos grupos culturais. É o grupo cultural onde o indivíduo se desenvolve que vai lhe fornecer, pois, o universo de significados que ordena o real em categorias (conceitos), nomeados por palavras da língua deste grupo18.

Assim, a noção de tempo que a criança irá se desenvolver ao longo deste processo será pautada por características específicas do meio social ao qual está inserida, pois cada meio apresenta uma maneira diferente de compreender, relevar e marcar o tempo. A palavra conceito tem um forte peso e enquanto tal ele remete sua compreensão a um tempo futuro, de cientistas, dificilmente tendemos a admiti-los enquanto processo criativo de crianças, porém assim se dá o desenvolvimento cognitivo.

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Processo de formação de conceitos de Vygotsky, explicada por Martha Kohl de Oliveira em OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vygotsky e o Processo de Formação de Conceitos. In: DANTAS, Heloysa; OLIVEIRA, Marta Kohl de; TAILLE, Yves de La. Piaget, Vygotsky, Wallon: Teorias Psicogenéticas em discussão. 15 ed. São Paulo: Summus, 1992. 18

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A noção de tempo e as crianças

Diferentemente de Vygotsky, o teórico Jean Piaget enfatiza o desenvolvimento biológico dos indivíduos, como um processo que se dá em estágios que apresentam características marcantes e evoluem conforme a maturidade do indivíduo, sendo que cada estágio depende das estruturas adquiridas no estágio anterior. Estes estágios foram classificados em: Estágio sensório-motor (até 2 anos) - Segundo Piaget, nessa fase do desenvolvimento, o campo da inteligência da criança aplica-se a situações e ações concretas. Trata-se do período em que há o desenvolvimento inicial das coordenações e relações de ordem entre ações. É também o período da diferenciação entre os objetos e o próprio corpo. Estágio pré-operatório (dos 2 aos 6/7 anos) - É a fase em que as crianças reproduzem imagens mentais. Elas usam um pensamento intuitivo que se expressa numa linguagem comunicativa - mas egocêntrica -, porque o pensamento delas está centrado nelas mesmas. Estágio operatório concreto (dos 6/7 aos 11/12 anos) Nessa fase as crianças são capazes de aceitar o ponto de vista do outro, levando em conta mais de uma perspectiva. Podem representar transformações, assim como situações estáticas. Têm capacidade de classificação, agrupamento, reversibilidade e conseguem realizar atividades concretas, que não exigem abstração. Estágio das operações formais (dos 11/12 até a vida adulta) - É a fase de transição para o modo adulto de pensar. É durante essa fase que se forma a capacidade de raciocinar sobre hipóteses e ideias abstratas. Nesse momento, a linguagem tem um papel fundamental, porque serve de suporte conceitual19. AZEVEDO, Guila Eitelberg. Estágios do desenvolvimento segundo Piaget. Disponível em http://www.aticaeducacional.com.br/htdocs/pcn/pcns. aspx?cod=54. Consultado em 03/06/2007.

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A construção da noção tempo do indivíduo vai se formando a partir do desenvolvimento destes estágios. De acordo com Piaget, desde cedo o bebê mostra-se capaz de elaborar duas operações que nos remetem a noção de tempo da criança. A primeira diz respeito à coordenação de movimentos (abre a boca para depois chupar o dedo) e a segunda coordena a percepção do tempo (sabe voltar a cabeça quando ouve um som). Entretanto, a criança não se percebe nesta sucessão de atitudes. Ao longo de seu desenvolvimento a criança começa a se perceber num espaço de uma realidade e a sucessão de atitudes passa a ser intencional. Entretanto esta intenção ainda não está relacionada a repetição de fatos do passado, pois a criança não possui uma memória voltada a esta percepção do tempo. Com a evolução de seu desenvolvimento a criança passa a agir sobre as coisas e se utiliza das relações entre elas. Mesmo assim, essa noção de tempo na criança ainda depende de sua própria ação, ainda mantém a característica egocêntrica, e classifica a duração de tempo de acordo com seus sentimentos e vontades. Com a sucessão dos estágios a criança vai passar a compreender e relacionar os acontecimentos exteriores a ela, e não mais somente suas próprias ações. Piaget resume este processo: Quanto ao tempo, a cujo respeito tentamos descrever, no plano puramente prático dos dois primeiros anos, a transformação das ‘séries subjetivas’ em ‘séries objetivas’, não é preciso insistir para que se compreenda o paralelismo dessa evolução com a que, no plano do pensamento, é caracterizada pela passagem da duração interior, concebida como único modelo temporal, ao tempo físico, constituído pelas relações quantitativas entre os pontos de referência espaciais e os eventos exteriores. Durante as primeiras fases do pensamento representativo, com efei77


A noção de tempo e as crianças

to, a criança não consegue avaliar as durações concretas nem mesmo as velocidades se não referindo-se ao simples tempo psicológico. Depois, pelo contrário, ela constitui em pensamento e já não apenas em ação as séries objetivas que ligam a duração interna ao tempo físico e à história do próprio universo exterior. (Piaget, 1970, p. 353).

Estas características descritas por Piaget na fase de transição do estágio pré-operatório para o estágio operatórioconcreto podem ser visualizadas nas falas dos alunos de uma escola em Londrina (Paraná - BR) a partir de uma pesquisa feita pela pesquisadora Sandra Oliveira20. Pode-se usar como exemplo a característica egocêntrica que as crianças apresentam: CAR 7;0821 A história de Tiradentes é estudada apenas pelas crianças brasileiras, ou é estudada por crianças de todo o mundo? Criança da minha idade? Então é. Porque criança pequena, do pré, não sabe ler. Porque a história de TiraSandra Regina Ferreira de Oliveira é Mestre em Educação pela UNESP, doutoranda da Faculdade de Educação da UNICAMP, professora de Teoria e Prática das séries iniciais de ensino fundamental da UNIOSTE, Campus de Cascavel Paraná e pesquisadora do grupo GEPEMEMO e do grupo História e Historiografia. Pesquisa a concepção de tempo entre os alunos de ensino básico. Suas publicações estão centradas no tema de sua pesquisa. Sandra, em 1999 entrevistou 41 crianças de uma escola de Londrina (Paraná), utilizando-se do método clínico piagetiano, procurou mostrar o desenvolvimento da construção da noção de tempo, da relação entre passado e presente de crianças de 7 a 10 anos, embasando sua análise principalmente na teoria de Jean Piaget sobre a construção da noção de tempo, mas também em outros educadores, diferenciando e explicando características particulares nos diferentes estágios de aprendizagem que existem entre estas faixas etárias. O desenvolvimento e resultados de sua pesquisa são encontrados em OLIVEIRA, S. R. F. O tempo, a criança e o ensino de história. In: ZAMBONI, Ernesta (org). Quanto tempo o tempo tem! Campinas: Alínea, 2003. 20

Por questões éticas, os nomes das crianças, foram registrados apenas como siglas representativas dos mesmos (CAR/REN).

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dentes é estudada por todas as crianças de sua idade, no mundo? Porque todo mundo sabe e estuda e porque dia vinte e um é feriado nacional. (OLIVEIRA, 2003 p. 165). REN 10;03 A história de Tiradentes é estudada apenas pelas crianças brasileiras, ou é estudada por crianças de todo o mundo? Só as crianças do Brasil, que estão na escola, estudam essa história. Por quê? Porque Tiradentes é uma pessoa que não era conhecida pelo mundo todo, é, eu acho que o limite é até Portugal, porque Portugal teve muito contato com o Brasil, e o Tiradentes foi um brasileiro, mas o outro mundo, o Tiradentes não foi muito importante, mas pode ser que para outras pessoas ele não foi, então, não foi crescendo a divulgação desse assunto. (OLIVEIRA, 2003 p. 166).

CAR (de 7 anos e 8 meses) ainda não consegue perceber uma realidade fora ao universo em que está inserido, já REN (10 anos e 3 meses) percebe que outras pessoas que não fazem parte de sua realidade podem ter experiências diferentes. Outra característica que pode ser vista é a ausência de um pensamento operatório formado: CAR 7;08 Você conhece a história de Tiradentes? Conheço. Conta pra mim o que você conhece. É que Tiradentes e os outros estavam fazendo uma reunião. Era secreto porque era contra a lei do rei e quem desobedecesse o rei seria eliminado. Uns dos guardas que estava lá com Tiradentes foi lá e contou para o outro guarda sobre tudo da reunião e o guarda contou para o rei. O rei falou que era para trazer a pessoa mais importante de lá, que estava dando ideias, muitas ideias para saber o que eles estavam planejando. Tiradentes foi enforcado e distribuído em várias partes mostrando que quem desobedecesse a lei do rei ia ser eliminado também. Então você 79


A noção de tempo e as crianças

sabe quando aconteceu a história de Tiradentes? Não. Foi antes ou depois do descobrimento do Brasil? Foi depois. Por quê? Ah, porque dia, no dia 22 nós comemoramos o descobrimento do Brasil, e minha professora falou que dia 21 de abril era dia de Tiradentes e que ia ser feriado porque é uma história nacional. Aí no próximo dia seria o dia do descobrimento então eu acho que foi antes. (...) (OLIVEIRA, 2003 p. 156).

CAR não consegue utilizar sucessão e duração dos fatos para construir seu raciocínio, ele ainda não consegue perceber que os fatos do descobrimento e da história de Tiradentes aconteceram em momentos diferentes, porém já percebe uma sucessão de datas 21 e 22 de abril. Uma última característica a ser citada é em relação à visão das coisas no passado. Assim como Piaget, Sandra constatou que a análise das crianças parte do presente. Tudo o que elas conhecem sempre existiu no passado, só que de forma diferente. A “diferença” caracteriza a divisão temporal. (Oliveira, 2003, p. 164). RAF, 7;08 Existia relógio na época do descobrimento do Brasil? Naquela época não. Existiam livros? Existia. E como eles eram? Eles eram com folhas sujas e com capa dura. Existiam carros? Carros não. Ah... tinha... mas eram bem velhos e pequenos. E ônibus? Ônibus também não. Avião? Avião não. E o que existia naquela época? Naquela época existia é castelo, rei, rainha, não tinha esse negócio de computadores, automóveis, casa. Como as pessoas viajavam? Viajavam, elas viajavam é, de aviões feitos de madeira, não assim, como tem hoje. As crianças iam à escola na época de Tiradentes? Iam. E como eram as escolas? Só tinha uma escola e ela era muito velha. (OLIVEIRA, 2003, p. 163) 22. 22

As expressões grifadas nas citações são destaques pessoais para visuali-

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Para RAF, assim como outras crianças, o passado nada mais era do que uma imagem do presente, só que velha e antiquada, as tecnologias não existiam e o passado apresentava-se como algo imaginário, como as histórias dos contos de fadas. A partir destas informações podemos perceber que as crianças nas séries iniciais conseguem abstrair, de acordo com seu estágio de desenvolvimento e do meio no qual estão inseridas, algumas características da noção de tempo, e que são capazes de assimilarem o tempo cronológico que faz parte da cultura a qual estão inseridas, e a partir da sua realidade, conhecer e compreender também outras culturas. E mesmo que não haja compreensão total, parcialmente há o entendimento do tempo histórico, pois as crianças percebem as durações, a simultaneidade, a sucessão, permanências e rupturas, mesmo não sabendo com exatidão defini-las no tempo cronológico23. Assim se já atinge os objetivos propostos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais de História, dentre os quais temos que “comparar acontecimentos no tempo, tendo como referência anterioridade, posterioridade e simultaneidade; estabelecer relações entre o presente e o passado”. Ao estimular a criança a desenvolver a noção de tempo é necessário que levemos em conta suas necessidades abordando esta temática de forma concreta e sempre atrelada a realidade a qual a criança está inserida. Muitas vezes o professorado até teve essa formação teórica específica para compreender o processo de elaboração do conceito de tempo pela criança, mas acaba pulando estágios, zação das características abordadas no texto. Dados referentes a pesquisa realizada no curso de prática de ensino de história na FEUSP, descrita por Elza Nadai e Circe Bittencourt em BITTENCOURT, Circe; Maria Fernandes NADAI, Elza. Repensando a noção de tempo histórico no ensino. In: PINSKY, Jaime (org.). O ensino de História e a criação do fato. São Paulo: Contexto, 2004.

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transformando a atividade concreta numa ânsia de cumprimento do objetivo anual, do conteúdo e de uma necessidade social de regulamentação de tempo, pois eles vivenciarão em sociedade o domínio que o tempo exerce no cotidiano e precisam, portanto, serem condicionados para tal futuro, iniciando na vida escolar, mais do que conteúdos como calendários e datas comemorativas, e sim situações do cotidiano como hora de lição, hora de ir ao banheiro, 50 minutos para realizar uma atividade, 20 minutos para comerem seu lanche. Magda Madalena Tuma verifica esta situação ao analisar como sujeitos-históricos-sociais seis professores da rede pública, que atuam nas séries iniciais do ensino fundamental, questionados quanto ao tempo disciplinar escolar. Segundo sua pesquisa, uma professora de 26 anos (que ela denomina por P1) aplica na primeira semana de aula uma atividade com calendário, distribui calendários, pede que os alunos o completem conforme ela vai colocando na lousa, repete o nome do mês, no caso era fevereiro, e estimula as crianças a descobrirem datas importantes deste mês, apesar de várias sugestões do cotidiano das crianças serem citadas, ela continua indagando até que a resposta esperada (carnaval – que muitas vezes não é a realidade e nem do conhecimento de muitas crianças) seja dada. P1[...] quando a gente trabalha com as crianças o calendário, né? A gente está trabalhando o tempo com eles. [...] o tempo tem que ser concreto para eles, no caso, então é o dia, o que aconteceu naquele dia, quais os fatos que aconteceram neste dia [...] para trabalhar o tempo tem que estar associado ao espaço e aos fatos que estão acontecendo, vão acontecer ou que já aconteceram. P1 (26 anos) entende que a criança precisa estabelecer relações temporais entre o presente e o passado, buscando elementos concretos na história vivida [...] (TUMA, 2003, p. 218) 82


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Mesmo a professora apresentando o conhecimento teórico de que para a noção de tempo ser desenvolvida é necessário partir do universo da criança, fazendo relações e aproveitando experiências concretas, na prática, ainda aplica atividades que cronometram o tempo e o constrói a partir de uma lógica social imposta, mesmo quando questionada, na mesma pesquisa, a professora afirma que disciplinar quanto ao tempo é necessário “porque tudo quanto é coisa que você vai fazer tem regras, tem normas, têm horários”. Chega-se à conclusão de que é possível sim estimular as crianças das séries iniciais a desenvolver a noção de tempo, desde que o percurso para se chegar à formação deste conceito seja mediado de maneira a atender as necessidades da criança. Segundo Renato Ortiz (Ortiz, 1991) nossa atual concepção de tempo é tributária da modernidade capitalista, que instaurou uma cultura no qual o tempo passou a ser o grande organizador da vida das pessoas [...] A construção da ideia de temporalidade segundo regras cultural e historicamente dadas é algo que não se explica, no entanto, por si só, a construção da ideia de tempo no indivíduo, o que implica uma construção cognitiva subjetiva [...] na mesma medida em que os conceitos sociais adquiridos previamente pelo indivíduo provocam a construção de novos significados no processo de aquisição dos conceitos históricos, a compreensão do tempo histórico envolve dificuldades importantes para a compreensão do aluno que depende não só do seu desenvolvimento cognitivo, mas também da qualidade do ensino recebido. (MIRANDA, 2003, p.183).

E a qualidade do ensino recebido vai depender da criatividade do professor para que de maneira concreta e lúdica, estimule o indivíduo a compreender e relacionar o tempo no 83


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meio em que vive, assimilar e acomodar estes novos conhecimentos, para transformar estes complexos de informações em conceito, e para tal ele conta com inúmeras estratégias e recursos, que cada vez mais tecnológicos trazem interatividade, ludicidade, cor e vida, para as diferentes vivências.

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Natália Andreazzi Finelli

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Aprendendo sobre aprendizagem: um olhar psicopedagógico Roseli Elena Andreazzi Finelli24

Toda prática pedagógica tem como principal objetivo a aprendizagem. Contudo, a restrição do conceito de aprendizagem a fenômenos específicos do ambiente escolar acaba por torná-la tarefa funcional da escola conferindo a esta, erroneamente, uma ação pedagógica conteudista. Conteúdo este, comumente visto como trampolim para a aprovação nos exames vestibulares e concursos específicos. Entretanto, o termo aprendizagem possui sentido muito mais amplo e significativo. Assim sendo a compreensão do aprender ou mesmo do não aprender, é fundamental para que se consigam práticas pedagógicas transformadoras e melhorias no desenvolvimento do processo educativo, na escola ou na vida, porque o educando não é mero expectador, tampouco receptor passivo de conteúdos descontextualizados, mas sim célula viva e ativa de um conjunto de sistemas relacionais que configuram a aprendizagem. Na verdade, a aprendizagem ocorre por meio de um processo pessoal, individual, intransferível, de fundo genético e com diversas variáveis, entre as quais se encontram os esquemas de desenvolvimento maturacional, psicológico, funcioEspecialista em Psicopedagogia pela FICS - Faculdades Integradas Campos Salles (2004). Graduada em Pedagogia pela Faculdade de Educação Campos Salles (1983). Atualmente é Psicopedagoga do Instituto Educacional São João Gualberto. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Psicopedagogia.

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nal, social e cultural que estão permeados pelo esforço, interesse, motivação, afetividade e grau de envolvimento de cada sujeito dessa aprendizagem. Sendo assim, o aprendizado não se dá de maneira estanque, engessada num conteúdo, mas sim de forma dinâmica, em ebulição, como água sob o calor do fogo, que evapora, e transforma a si mesma e o ambiente, dando início a algo novo. Certo é que eventos internos e externos ao sujeito (biopsicossocial) ocorrem desde a sua concepção e fomentam a elaboração da aprendizagem. “O homem nasce com o cérebro inacabado e imaturo que não é rico senão de possibilidades: estas possibilidades, o homem aprende a desenvolvê-las copiando o seu ambiente” (Chauchard apud Gesell, 1979). Nesse sentido, pode-se pensar aprendizagem como argila na mesa de um artesão. A argila é o que é: argila em si, ao mesmo tempo em que também pode ser o que a criatividade do artesão impuser às suas mãos que atreladas ao movimento giratório de sua mesa de trabalho o permite transformá -la em vaso, cuia, objeto de decoração. Enfim, com a função que a cultura lhe atribuir porque o saber não é estático e pode se transformar de acordo com cada cultura, sociedade ou grupo em que ele é elaborado. Tampouco é suficiente, porque a busca pelo saber é infinita e permeada pelas relações que se estabelecem entre o sujeito e suas percepções sobre si, sobre o outro e sobre a realidade objetiva a qual pertence. Fato é que muitos são os fatores que compõem o desenvolvimento do ser humano e quando se fala de aprendizagem, também se está falando de hereditariedade, ambiente e maturação. Segundo Wajnsztejn, a hereditariedade diz respeito a tudo que se recebe como características da espécie humana, em particular, das características individuais que passam de pais para filhos, de gerações para gerações. Já o ambiente influencia os indivíduos desde a sua concepção, e é tido como a soma total de estímulos que atinge um organismo vivo, de modo a traduzir o código genético deter87


Aprendendo sobre aprendizagem: um olhar psicopedagógico

minado no momento da concepção, podendo ser intracelular, intercelular, intrauterino e pós-uterino25. A maturação, por sua vez, refere-se ao “desenvolvimento das estruturas corporais neurofisiológicas, determinado pelas potencialidades inatas, independentemente de experiências prévias” e que podem ou não limitar o desenvolvimento comportamental dos indivíduos. Enfim, diversas são as teorias sobre como se dá a aprendizagem. A concepção inatista pressupõe que o ambiente pouco interfere nesse processo. São os fatores endógenos26 que têm maior relevância. A concepção empirista enfatiza a experiência sensorial como fonte do conhecimento, isto é, o conhecimento situa-se fora do sujeito, e o ambiente passa a ser fator fundamental para o desenvolvimento humano. Os interacionistas consideram tanto os fatores endógenos, como os exógenos, e veem o homem como um organismo vivo, cujo conhecimento e funções psicológicas vão sendo elaboradas, gradativamente na interação com o meio ambiente. Na contemporaneidade, com a chamada era digital, vive-se grande mudança de paradigmas provocada pelo ritmo acelerado de informações sobre diversas áreas do conhecimento, inclusive sobre o cérebro humano e sua correlação com o processo de ensino e aprendizagem. Estudos recentes das neurociências que possibilitam a observação do cérebro em funcionamento, através do PET27, têm creditado à concepção interacionista maior dimensionalidade e trazem à luz especificidades do processo de aprendizagem visto pela ótiIntracelular (interior à célula), intercelular (existente entre as várias células orgânicas), intrauterino (antes do nascimento) e pós-uterino (depois do nascimento).

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Endógeno: originado no interior do organismo, ou por fatores internos ao indivíduo.

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27 PET: aparelho que mostra, em cores, na tela co computador que áreas do cérebro são ativadas quando o indivíduo está realizando algum tipo de atividade, é possível localizar processos cerebrais quando uma pessoa está pensando, lendo, escrevendo etc. (Lima, 1997).

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ca do funcionamento cerebral, inclusive lançando-se como forma de aprendizado e conhecimento do ser humano. Essa nova perspectiva possibilita conceber o aprendizado como um processo dinâmico capaz de transformar a química e a estrutura cerebral dos indivíduos modificando seu comportamento em consequência da experiência vivida. Nessa perspectiva, pode-se pensar o aprendizado como um processo que envolve aspectos biológicos, psíquicos, sociais e culturais do ser humano. Dessa forma, o processo de aprendizagem pode ocorrer dentro e fora da escola, sob a forma de “conhecimentos, ações, habilidades, procedimentos, operações, estratégias, costumes, regras, valores, técnicas, ideais, atitudes, crenças, sentimentos, teorias, princípios, interesses, preferências, aversões, gestos, etc”. Diferentes aprendizados se dão em diferentes locais, mas também são consolidados em diferentes épocas, configurando verdadeiras “ janelas maturacionais”. Além disso, os aprendizados não são uniformes ou “puros” em seu conteúdo, que em suma pode ter componentes oriundos de diferentes áreas. (Riesgo, 2007, p. 40).

Ainda sob a ótica das neurociências, sabe-se que o cérebro humano é um emaranhado de cem bilhões de neurônios e outros tantos gliócitos28 que se ligam por milhares de sinapses29 com diferentes funções e capacidades específicas, inclusive a de “aprender”. Essas células nervosas formam uma extensa rede de comunicação com conexões Neurônios e gliócitos: tipos de células nervosas que correspondem às duas unidades estruturais e funcionais do sistema nervoso e que participam dos mecanismos celulares do aprendizado. (ROTTA, N. T.; OHLWEILER,L.; RIESGO, R. S. 2007).

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Sinapse: espaço que existe entre dois neurônios com a finalidade de transitar dados entre eles. Podem ser elétricas ou químicas. (METRING, 2011).

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específicas a cada indivíduo de acordo com suas experiências adquiridas, sejam elas “motoras, sensitivo-sensoriais ou de linguagem”. Pode-se exemplificar as aprendizagens motoras, ou práxicas, com os atos de aprender a engatinhar, caminhar, correr, ou dançar; as aprendizagens gnósticas, pelo desenvolvimento de áreas corticais que a elas se relacionam, como identificar as diferentes variações da mesma sensação, ter noção adequada do esquema corporal para sua idade, reconhecer imagens, reconhecer sons; e as aprendizagens da função linguagem, tanto oral, como escrita ou gestual. (Rotta, 2007, p. 465).

E quando se fala de experiência adquirida, não se pode deixar de falar da função mental superior que é a memória. A memória segundo Izquierdo apud Riesgo é um evento divisível em três fases: aquisição, consolidação e evocação das informações. A fase de aquisição da memória segundo este autor pode também ser chamada de aprendizado, ou seja, só fica gravado aquilo que foi aprendido. Por outro lado, a memória também está relacionada com a motivação e a atenção. É certo que sem o foco atencional a aprendizagem pode ser dificultada e sem motivação não se consegue a atenção devida. Para Riesgo fecha-se aí um círculo vicioso: Não tendo motivação, não tem atenção, não tem boa aquisição de novas informações, não tem formação de memórias, e pode não ter um bom aprendizado. As funções mentais são organizadas a partir da ação de diversos elementos que atuam de forma articulada, cada um desempenhando um papel na organização funcional do cérebro, e segundo Metring [...] ao acessarmos ou criarmos um modelo neuropsicológico para entender a aprendizagem ou suas dificuldades, estamos falando da análise das funções mentais, 90


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particularmente as superiores (linguagem, atenção, memória, planejamento, julgamento etc) [...] condição “sine qua non” para que a aprendizagem simbólica (formação de conceitos, escrita leitura etc) se realize. (2011, p. 34).

A neurociência é uma área de estudos que tem apresentado relevante desenvolvimento nas últimas décadas e a prática tem revelado que todo o conhecimento produzido nesta área tem- se mostrado de fundamental importância para a educação. O que a neurociência tem revelado é que desde a primeira molécula, só sobrevivemos graças à aprendizagem, e esta implica em desenvolvimento de conexões neurais e aquisição de novos modos de ver o mundo e a si mesmo. A aprendizagem se dá em vários níveis, tornando possível transformar comportamentos e descobrir novas formas de relacionamentos entre os indivíduos que mediados pela realidade objetiva e cultural das sociedades constroem sua identidade pessoal.

Questões da não aprendizagem Desde o ventre materno, quando se inicia o processo de desenvolvimento dos indivíduos, também se dá o início do processo de desenvolvimento que garante a sobrevivência humana: a aprendizagem. Na verdade, a assimilação e a acomodação30 das aprendizagens permeadas pelas relações sociais e dialéticas31 que se constrói a partir da família, escola e sociedade ocorrem continuamente, assim como, também, são constantes as dificuldades e os percalços desse processo que parecem ganhar notoriedade quando a 30 Assimilação e acomodação: Conceitos utilizados pelo epistemólogo suíço Jean Piaget para elucidar como um novo elemento é incorporado e assimilado a um sistema já pronto. E como esse processo de modificação de estruturas antigas com vistas à solução de um novo problema de ajustamento, a uma nova situação acomoda-se. 31

Dialética: arte de raciocinar. 91


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criança entra na fase escolar. Nessa fase vê-se configurar um quadro de “sintomatologia na área da aprendizagem da leitura, da escrita”, dos algoritmos matemáticos e dos processos de construção do conhecimento. “Aprender é um processo complexo e multifacetado que apresenta bloqueios e inibições em todos os seres humanos”. Os termos que nomeiam esses entraves no processo de desenvolvimento das pessoas, de suas aprendizagens e escolarização são vários: dificuldades, distúrbios, transtornos, síndromes, deficiências, sintomas etc. No Brasil, o termo “distúrbio” foi substituído a princípio por “síndrome” e, posteriormente, por “transtorno”, termo pelo qual é classificado no Código Internacional de Doenças, chamado de CID 10 e no Manual de Diagnóstico e de Estatística das Perturbações Mentais (DSM IV). O termo “transtorno” é usado por toda a classificação, de forma a evitar problemas maiores inerentes ao uso de termos tais como “doença” ou “enfermidade”. “Transtorno” não é um termo exato, porém é usado para indicar a existência de um conjunto de sintomas ou comportamentos clinicamente reconhecível associado, na maioria dos casos, a sofrimento e interferência com funções pessoais.” (CID-10, 1992 : 5, apud Nutti).

No CID-10 os transtornos mentais e de comportamento estão classificados dentro dos Transtornos específicos do desenvolvimento das habilidades escolares (F81), e este por sua vez, situa-se na categoria de Transtornos do desenvolvimento psicológico (F80-89), sendo que fazem parte do F81 as seguintes subcategorias: Transtorno específico de leitura; de soletrar; de habilidades aritméticas; transtorno misto das habilidades escolares e transtornos do desenvolvimento das habilidades escolares, não especificado. Esses transtornos se manifestam em três níveis 92


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de gravidade: leve, moderado e severo. Um transtorno severo bastante discutido é a dislexia, que acompanha o indivíduo por toda a vida. Síntese dos critérios diagnósticos para transtorno de aprendizagem segundo o CID-10: Grau clinicamente significativo de comprometimento da habilidade escolar específica, medido por testes padronizados, apropriados à cultura e ao sistema educacional. • Nível de realização substancialmente abaixo do esperado para uma criança com a mesma idade, nível mental e escolarização. • Comprometimento de desenvolvimento: presença do transtorno nos primeiros anos de escolaridade, e não mais tarde, no processo educacional. Muitas vezes, somente após um ou dois anos de escolaridade esses transtornos são passíveis de diagnóstico. • Persistência e não evolução dos problemas na criança, apesar de um trabalho pedagógico individualizado. • Não vencimento de etapas evolutivas anteriores (particularmente, a aquisição e o desenvolvimento da fala e da linguagem). • Entendimento dos transtornos não como consequência de uma falta de oportunidade de aprender, de descontinuidades educacionais resultantes de mudanças de/na escola, ou de qualquer forma de traumatismo; de doença cerebral adquirida ou de comprometimentos na inteligência global. • Não entendimento dos transtornos como decorrência de comprometimentos visuais ou auditivos não corrigidos. • Condições substancialmente mais comuns em meninos do que em meninas. • Presença, em muitos casos, de traços desses transtornos através da adolescência e da idade adulta. • Fatores etiológicos originados de “anormalidades no processo cognitivo, que derivam em grande parte de al93


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gum tipo de disfunção biológica.” (Rotta, 2007, p. 106). Na prática pedagógica observa-se que esses termos (distúrbios, transtornos, dificuldades...) são utilizados de forma aleatória como referência diagnóstica, fato este que parece também ocorrer, segundo a fonoaudióloga Sonia Moojen, na literatura especializada, e na prática clínica. Dessa forma, torna-se inviável discorrer sobre todas as possíveis abordagens dessa temática, contudo, objetiva-se a seguir oportunizar alguns diferentes pontos de vista. A pedagoga Maria Cristina Bromberg entende que aprender é um processo natural que envolve complexa atividade mental em que também estão envolvidos outros processos como: atenção, percepção, memória, motricidade, emoção, entre outros. Bromberg, em entrevista à Revista Aprendizagem, chama de dificuldade de aprendizagem os entraves em quaisquer desses processos e considera, ainda que: Dificuldades são problemas que acontecem no processo de aprendizagem decorrente da proposta pedagógica, da capacitação do professor, de problemas familiares ou de déficits cognitivos. Os distúrbios ou transtornos são dificuldades específicas no aprendizado decorrente de uma alteração de origem neurológica. Deficiências é o termo usado para definir ausência ou disfunção de uma estrutura psíquica, fisiológica ou anatômica; diz respeito à biologia da pessoa. Amplamente usado para exprimir ‘falta de’ ou ‘defasado em’. (Bromberg, 2008).

Sara Paín, doutora em psicologia e filosofia, considera o problema de aprendizagem como um sintoma, no sentido de que o não aprender não configura um quadro permanente, mas sim entra numa variedade peculiar de comportamentos nos quais se destaca como sinal de descompensação. Afirma a psicóloga que:

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Nenhum fator é determinante do seu surgimento e ele aparece da fratura contemporânea de uma série de concomitantes. O sintoma deve ser entendido como um estado particular de um sistema que, para equilibrarse, precisou adotar esse tipo de comportamento que mereceria um nome positivo, mas que caracterizamos como não aprendizagem. Assim, pois, a não aprendizagem não constitui o contrário de aprender, já que como sintoma está cumprindo uma função positiva tão integradora como a primeira, porém, com outra disposição dos fatores que intervêm. (Paín, 1985).

A mesma visão encontra-se em Alícia Fernández, psicóloga e psicopedagoga argentina para quem a não aprendizagem é como uma fratura no aprender, onde estão em jogo o organismo, o corpo, a inteligência e o desejo. Fernández considera a dificuldade de aprendizagem um bloqueio às possibilidades do indivíduo, como se estivesse aprisionado sem perspectiva de liberdade, como se sua inteligência estivesse “atrapada” 32. Para dar conta das fraturas no aprender, necessitamos atender aos processos (à dinâmica, ao movimento, às tendências) e não aos resultados ou rendimentos (sejam escolares ou psicométricos). Se observarmos a criança que não aprende somente como uma consequência, poderemos nos dar conta da enfermidade em caráter de sinal, enquanto que ao observá-la como sintoma, aparece o significado. (Fernández, 1991).

Na perspectiva da educação inclusiva, a política educacional nacional, com base na Convenção sobre os Direitos das Crianças com Deficiência, reconhece que a deficiência La inteligência atrapada: Título do livro de Alícia Fernandéz que na língua portuguesa significa: A inteligência aprisionada.

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é um conceito em evolução que resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao ambiente que podem restringir a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em iguais oportunidades com as demais. Aqui se adentra numa esfera desafiante para a educação que é a de atender às expectativas da inclusão, estendendo-se a todos indistintamente. Art. 1º Para a implementação do Decreto Nº 6.571/2008, os sistemas de ensino devem matricular os alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas classes comuns do ensino regular e no Atendimento Educacional Especializado (AEE), ofertado em salas de recursos multifuncionais ou em centros de Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou de instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos. Art. 4º - Para fins destas Diretrizes considera-se público-alvo do AEE: I - Alunos com deficiência: aqueles que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual, mental ou sensorial. II - Alunos com transtornos globais do desenvolvimento: aqueles que apresentam um quadro de alterações no desenvolvimento neuropsicomotor, comprometimento nas relações sociais, na comunicação ou estereotipias motoras. Incluem-se nessa definição alunos com autismo clássico, síndrome de Asperger, síndrome de REN, transtorno desintegrativo da infância (psicoses) e transtornos invasivos sem outra especificação. III - Alunos com altas habilidades/superdotação: aqueles que apresentam um potencial elevado e grande envolvimento com as áreas do conhecimento humano, isoladas ou combinadas: intelectual, liderança, psicomotora, artes e criatividade. (MEC, 2010). 96


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A partir dos pontos de vista destacados, considerar-se-á: Dificuldade de aprendizagem “qualquer insucesso na construção de um conhecimento, tanto de conceitos como de procedimentos, hábitos ou atitudes”; Distúrbios, síndromes e transtornos como um conjunto de sinais e sintomas que caracterizam determinada condição ou situação; e Deficiências como um termo usado para definir a ausência ou a disfunção de uma estrutura psíquica, fisiológica ou anatômica. Contudo, não se pode abordar apenas a problemática da criança que não aprende sem a análise de todo o sistema que envolve a família, a escola, os profissionais que atuam com essa criança e o contexto social na qual está inserida. As dificuldades de aprendizagem podem ocorrer por problemas físicos gerais, psicológicos, neurológicos e socioeconômicos. Entre as causas psicológicas podem-se citar a timidez, a insegurança, a ansiedade, a baixa estima, a falta de motivação, a depressão, os transtornos do humor e de conduta. Entre os problemas neurológicos encontramos a deficiência mental, a paralisia cerebral e a epilepsia, além de outros transtornos de aprendizagem. As questões socioeconômicas originam-se no meio social e econômico e incidem sobre o aprendizado. Destacam-se entre os problemas físicos gerais as dificuldades sensoriais que podem ser hereditárias, congênitas ou adquiridas: otites, amigdalites, sinusites, miopias, astigmatismos, hipermetropias, hipotireoidismos, verminoses, parasitoses, enfim patologias e doenças imunoalérgicas que podem prejudicar a aprendizagem por deixarem o indivíduo debilitado e consequentemente desestimulado para o aprendizado. Entre as dificuldades sensoriais as habilidades perceptivas básicas devem merecer especial atenção porque é por meio dos sentidos que se percebe e se conhece todo o ambiente que nos cerca. Os órgãos dos sentidos, conforme descreve Drouet, recebem estímulos do meio exterior através das percepções auditiva, gustativa, olfativa e tátil e os conduzem aos centros nervosos que, por sua vez, estão 97


Aprendendo sobre aprendizagem: um olhar psicopedagógico

relacionados com centros motores, com os centros da memória e os da aprendizagem. Portanto, um entrave em um desses centros nervosos ou nos próprios órgãos dos sentidos poderá resultar em uma deficiência sensorial e se constituir em um problema de aprendizagem. A visão é considerada como habilidade perceptiva básica e o seu desenvolvimento nos indivíduos acontece, em grande parte, noventa por cento dele, no decorrer dos primeiros anos de vida. Os outros dez por cento são atingidos por volta dos nove anos de idade. O desenvolvimento motor da criança nesta fase, também está relacionado com a sua capacidade visual e segundo a Sociedade Brasileira de Oftalmologia Pediátrica o primeiro exame oftalmológico deve ser realizado ainda no berçário, pelo pediatra (Teste do Olhinho), sendo também indicado um exame ocular completo a cada seis meses nos primeiros anos de vida, a após, anualmente, até os nove anos de idade, época em que termina o desenvolvimento da visão. A primeira etapa para o domínio das relações espaciais refere-se ao conhecimento e manejo do esquema corporal. Esse conhecimento leva à noção de lateralidade e direção. A discriminação visual permite à criança desenvolver atividades que a relacionam com o mundo ao seu redor, levando-a ao descobrimento das relações espaciais entre os objetos. Aplicando-se essas noções em figuras e desenhos, chega-se à figura-fundo que é uma atividade preparatória para os alunos alcançarem a capacidade de distinguir e analisar um objeto, uma forma, um símbolo, dentro de um contexto, e concentrar sua atenção sobre ele. Nesse sentido, a percepção visual é de extrema importância para o bom desenvolvimento das aprendizagens e aquisição do conhecimento pelos indivíduos no decorrer de sua vida escolar. Portanto, as consultas ao oftalmologista (anualmente) para a avaliação da capacidade visual do educando podem não só colaborar e muito com o processo de ensino e aprendizagem, como também, prevenir possíveis 98


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doenças do globo ocular. A observação e o reconhecimento de alguns sintomas na dificuldade visual podem levar a medidas profiláticas que evitarão complicações posteriores. Vejamos cada item de observação: Aparência – A criança com deficiência visual apresenta: olhos avermelhados, pálpebras inchadas ou frequente terçol; olhos inflamados, lacrimejantes ou estrábicos; Reclamações das Crianças: dor de cabeça, tontura ou náusea; incapacidade de enxergar o que está escrito nos livros ou na lousa; ardume ou coceira nos olhos; visão nublada; tontura, quando andam de carro; Comportamento: fecha ou cobre um olho; projeta a cabeça para frente para escrever; tenta eliminar uma mancha do olho; esfrega constantemente os olhos; pisca excessivamente; contorce o rosto ao ler; chora frequentemente; é irritável e se mostra preguiçosa ou nervosa; mostra-se desatenta, especialmente nos trabalhos de curta distância, como ler bordar etc; tropeça frequentemente; é desajeitada nos movimentos do corpo; tem pouca coordenação visomotora; mantém o material de leitura muito próximo ou distante dos olhos; escreve com o rosto colado no caderno; tem dificuldade em ler; pula linhas ou relê linhas; não consegue lembrar o que leu. (Drouet, 2003, p. 111).

Outra percepção considerada básica é a auditiva, que é a capacidade de compreender e organizar os estímulos sonoros. Esses estímulos são recebidos pelo ouvido que os conduz ao cérebro onde se realiza sua organização e compreensão. Para que se possam distinguir os sons, é necessário, antes, identificá-los isoladamente, e essa capacidade de isolar os sons é chamada de discriminação auditiva. Para que uma pessoa possa escutar normalmente, é necessário que as partes que compõem o ouvido estejam em bom funcionamento. 99


Aprendendo sobre aprendizagem: um olhar psicopedagógico

Caso isso não aconteça, a audição pode de alguma forma ficar prejudicada. O Censo Populacional de 2000 (IBGE) identificou que, no Brasil, 24,5 milhões de pessoas (14,5% da população), têm algum tipo de deficiência, e entre essas 17% com deficiência auditiva. A deficiência auditiva pode se apresentar de três formas distintas: Perda Auditiva Condutiva: Ocorrem quando as ondas sonoras são bloqueadas no ouvido externo ou médio e não conseguem chegar ao ouvido interno. Pessoas afetadas por este tipo de perda experimentam uma redução geral do volume dos sons e têm dificuldade em ouvir sons de baixa intensidade. A maioria das perdas condutivas não é permanente. Estas podem ser tratadas com medicamentos ou por cirurgias, mas, se não forem tratadas, podem ocasionar uma perda permanente. Neurossensorial: Apresentam-se quando as vibrações sonoras atingem o ouvido interno, mas não são enviadas como impulsos para o cérebro. Esse tipo de perda resulta em danos no nervo auditivo. Mistas Verificam-se quando há perda condutiva e neurossensorial numa mesma pessoa. (Seno, 2010).

É de extrema importância que a deficiência auditiva seja detectada o mais precocemente possível. Por isso alguns comportamentos devem ser observados desde o nascimento, como: reação do bebê aos sons; percepção de ruídos; reação à voz da mãe; repetição dos próprios sons; reação e procura da origem de barulhos, como o toque do telefone, campainha, panelas caindo; demora em falar as primeiras palavras; fala muito infantilizada; tempo que demora em responder quando é chamado; uso excessivo de gestos para se comunicar; intensidade vocal muito alta ou muito baixa; ouvir televisão ou rádio com volume aumentado; olhar voltado para os lábios de quem fala e não para os olhos; atraso na aprendizagem; 100


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vias aéreas constantemente congestionadas; trocas fonêmicas surdos sonoras etc. Perdas auditivas leves ou moderadas normalmente passam despercebidas e somente as importantes ou mais acentuadas são facilmente detectadas. O maior distúrbio da audição é a surdez que pode ser congênita ou adquirida (por traumas, infecções etc). Quanto mais cedo a alteração for diagnosticada, melhor será para sua correção. É importante lembrar que a preocupação com a audição não deve cessar ao nascimento porque o indivíduo pode desenvolver perda auditiva progressiva ao longo da vida. Recomendase, portanto que toda criança se submeta à audiometria ao menos uma vez, devendo esta ser repetida conforme orientação médica. A consulta ao audiologista ou otorrinolaringologista é antes de tudo, aconselhada em caráter preventivo. Cabe esclarecer, no entanto, que muitas vezes o que se aponta como dificuldade de aprendizagem pode, na verdade, tratar-se de uma dificuldade de ensino, ou ainda, de dificuldades inerentes às questões familiares, ou quem sabe, das questões sociais, relacionais ou até mesmo decorrentes de herança cultural. De tal forma que “não se pode localizar no aluno e somente nele, a responsabilidade pelo fracasso escolar”, como explica a doutora em educação Rosita Carvalho. A dificuldade de aprendizagem ocorre quando o “aprender” do aluno não se desenvolve conforme o esperado. E as causas estão em diferentes aspectos, como, por exemplo, o educacional, o social, psicológico, orgânico. Isto significa que tais dificuldades podem estar relacionadas a patologias, déficits, desempenho abaixo ou acima do esperado, questões de adequação social, dificuldades em realizar transformações e lidar com o novo. No entanto, o importante é que haja a identificação do suposto problema e o envolvimento da criança, pais, professores, orientadores e profissionais especialistas no assunto. (Melo, 2008). 101


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Não se pode reduzir a uma causa única a questão da não aprendizagem, pois esta reflete uma multiplicidade de fatores. Por vezes, a dificuldade aparece devido a procedimentos metodológicos e didáticos, que são ainda a base de formação dos professorados e que os levam a acreditar que estão cumprindo sua função quando cumprem determinações curriculares (assim a maioria deles foi formada: curricularmente). De tal forma que há dúvidas com relação a melhor metodologia, estratégia ou recursos a serem utilizados em sala de aula que contemplem os alunos com reais dificuldades. Por isso, quando o educando não corresponde às expectativas, a frustração acaba por manter “o professor aprisionado à lógica do ensino e o educando à sua incapacidade”. Nessa perspectiva, ao professorado cabe então um olhar atento, para além do óbvio. Faz-se necessário um registro cuidadoso de dados observados para que não se percam com o tempo; a utilização de estratégias diversas na explanação de conteúdos; o estudo constante para o aprimoramento de suas funções e a contextualização de sua ação pedagógica. E cabe principalmente ao professor fazer a mediação entre o aprendente e o seu norte educativo, criando vínculos e promovendo a afetividade e o favorecimento de sua autoestima. É claro que o professor também passa por entraves no seu dia-a-dia, sendo ele também aprendente quando ensinante, sujeito também às dificuldades de aprendizagem. Os problemas emocionais, sociais e econômicos do professor também interferem no resultado de seu trabalho e consequentemente na relação com o aluno. Assim, O processo de ensino-aprendizagem coloca frente a frente o ensinante e o aprendente; entre ambos permeia um conjunto fortíssimo de inter-relações que estimulam ou contaminam o sucesso da ação. O mais importante é manter o seu entusiasmo intrínseco que se torna conta102


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giante junto aos alunos. O mais eficiente professor não é aquele que melhor domina o conteúdo, mas sim aquele que incute mais motivação no aluno. O discípulo motivado ficará mordido pela alegria do aprender e certamente chegará mais longe ainda que o próprio professor. Afinal a ciência sempre progride porque o discípulo sobrepuja o mestre. (Romanelli, 2008).

Assim, como não podemos colocar no indivíduo e só nele a responsabilidade pelo fracasso escolar, da mesma forma também não se pode colocar no professor toda a responsabilidade pela não aprendizagem do aluno. Interferem nesse processo, ainda, as condições físicas da sala de aula, que precisa ser bem arejada, ter boa iluminação, limpeza adequada, acessibilidade, enfim um ambiente seguro e agradável; as condições pedagógicas que possibilitam o uso de material didático adequado, a interação família-escola, e entre outras variáveis, também o acesso às novas tecnologias, tão imprescindíveis na atualidade. A acomodação de práticas educacionais às exigências da contemporaneidade requer, de toda a comunidade escolar, mobilizações comprometidas com a tarefa de ensinar. Esse comprometimento acontece junto com a tomada de consciência da necessidade de novas leituras, tanto sociais quanto teóricas e, concomitantemente, novas formas de ser professor. A escola precisa organizar-se a partir dessa compreensão. O professor necessita promover formas diferentes de apropriação do conhecimento. (Parolin, 2007). Podemos dizer que, assim como a escola traz aos alunos inúmeros benefícios, tanto do ponto de vista intelectual, quanto emocional e social, ela também pode ser muito prejudicial a eles, através de seu ambiente físico, de seu grupo social, de seus professores e dos próprios 103


Aprendendo sobre aprendizagem: um olhar psicopedagógico

alunos, que trazem dos respectivos lares educações diferentes, modos diversos de encarar a escola e a vida, crenças costumes e ideais muito variados. Todos esses fatores interferem no processo de ensino e aprendizagem, dificultando-o ou mesmo prejudicando-o e podendo inclusive transformar-se em problema de aprendizagem. (Drouet, 2003, p. 220).

Nesse processo de ensino-aprendizagem à família também cabe papel de fundamental importância. Cabe à família exercer sua tarefa educativa auxiliando seus filhos na convivência das normas sociais e éticas viabilizando relações pautadas na afetividade, na construção de valores, no respeito às regras e limites e no adequado desempenho de papéis. A família também deve oferecer condições adequadas para que o processo de aprendizagem se realize com sucesso. O papel da família é insubstituível na construção pessoal de cada sujeito. O hábito da leitura na família, sem dúvida, constitui um diferencial na estimulação pedagógica escolar. Nesse contexto, as condições socioeconômicas, na maioria das vezes com renda familiar insuficiente, são relevantes e com frequência estão implicadas no fracasso escolar. História familiar de alcoolismo, drogadição, pais desempregados ou comportamento antissocial costuma fazer parte de uma anamnese33 completa e, não raras vezes, constitui a única etiologia ou um reforço para o insucesso da criança na escola. Fatores importantes na desagregação familiar, como pais separados ou em constantes litígios, também podem influenciar negativamente o desempenho escolar da criança. É importante que os pais estejam atentos às rotinas de estudo, Anamnese: Entrevista para coleta de dados do paciente e seus antecedentes.

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de alimentação, de lazer e de sono da criança, de tal forma que as atividades escolares sejam vistas dentro de um contexto usual e não como um castigo. (Rotta, 2007, p. 118).

Dentro do convívio diário, através do diálogo, do exemplo e da parceria, a família constrói com o educando uma relação de aprendizagem significativa. Resilientes nas dificuldades, nas “desabilidades”, mas também promovendo a autonomia, a força e a esperança de possíveis progressos. A família precisa organizar-se “para entender que sem pais educadores para dar o modelo, não há o que reelaborar, não existe terreno profícuo para a aprendizagem”. O estabelecimento de regras no convívio familiar precisa vir acompanhado de um clima afetivo e da compreensão dessas normas sociais. Só dessa forma a criança poderá construir seu próprio código de conduta e sua forma de pensar. É inadequado o limite autoritário e repressor tanto quanto é indesejável o limite que humilha e ameaça o afeto de que a criança necessita. (Parolin, 2007, p. 55).

Encontra-se na literatura extensa bibliografia sobre o que pode prejudicar o desenvolvimento do processo de aprendizagem dos indivíduos, e não há receitas simplistas que possam dar conta de compreender e possibilitar um prognóstico eficaz dos distúrbios ou das dificuldades de aprendizagem. A complementação de um diagnóstico, assim como as ações dele decorrentes, requer um trabalho multidisciplinar que possibilite a formulação de um diagnóstico mais preciso e possíveis intervenções terapêuticas apropriadas.

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Aprendendo sobre aprendizagem: um olhar psicopedagógico

Lapierre e Aucouturier, em 1974, mostram que os problemas psicomotores, perceptivos, gnósicos, práxicos, psicoafetivos e sócioafetivos constituem dificuldades a serem vencidas por todas as crianças e não só pelas que apresentam dificuldades escolares, sendo para estas, no entanto, mais difícil superá-los. (Rotta, 2007, p. 115).

O desafio maior enfrentado pela escola, professores, família e profissionais que convivem com crianças com dificuldades de aprendizagem, distúrbios ou deficiências, é o de ajudá-las a vencer as barreiras do preconceito, a elevar sua autoestima, a fazê-las acreditar em suas capacidades, competências e habilidades. As pessoas têm estilos de aprendizagem diferentes umas das outras, isto é, aprendem de maneiras diferentes e precisam aprender a canalizar suas energias para encontrar estratégias que facilitem o processo de construção do conhecimento, e as façam assumir riscos, e se permitam errar para, a partir do erro, evoluírem. As crianças aprendem a esconder suas dificuldades com condutas como ser o palhaço da sala, manter-se calada, adoecer, fugir das responsabilidades, demonstrar desinteresse ou muitas vezes com mau comportamento. Frequentemente isolam-se, escondem-se ou evitam fazer algumas coisas, pois assim ninguém pode magoá-las. Estas máscaras protetoras que utilizam para não serem chamadas de incapazes, lentas ou intratáveis isolam-se socialmente. É importante ajudar essas crianças a conhecerem seus pontos fortes, a compreenderem que suas dificuldades não existem por falta de capacidade; a descobrir estratégias que sejam úteis para sua aprendizagem. Em certo sentido a criança aprende da imagem de si que recebe do outro, assim quanto mais integradora for a imagem que proporcionam a ela seus 106


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pais, e depois seus professores, maiores as possibilidades para reconhecer suas potencialidades e carências. (Rotta, 2007)

É preciso que se tenha um olhar diferenciado sobre as questões da aprendizagem que permeiam o desenvolvimento dos indivíduos, de tal forma que se possa contribuir com uma aprendizagem significativa; refletir sobre a ação educativa e fomentar as interações interpessoais, mediando saberes e promovendo a autonomia dos aprendizes. Todo indivíduo, a priori e em condições habituais, tem possibilidades de aprendizagem, a maneira como se dá esse processo é uma variável que sofre influências da escola, que necessita ressignificar seus instrumentos de trabalho pedagógico; da família cuja estrutura hoje se constitui de pessoas que convivem no dia-a-dia e do meio que bombardeado pela tecnologia da informação determina mudanças de paradigmas. As tecnologias analógicas serviram como próteses: expandiram os poderes mecânicos e sensoriais do ser humano, sua percepção e memória. Mas as tecnologias digitais servem para expandir seus poderes cognitivos. Elas podem ser usadas para empoderar percepções e memórias, mas também para libertar seus pensamentos no uso e na construção da criatividade, do virtual, na ampliação e no desenvolvimento do juízo lógico e da consciência. Podem ser próteses cognitivas. Os estudos e as pesquisas que temos realizado nos últimos 20 anos sobre a interação das crianças e dos jovens com as tecnologias digitais nos permitem comprovar que uma nova inteligência está se desenvolvendo nas novas gerações que crescem incluídas na cultura digital. (Fagundes, 2010).

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Aprendendo sobre aprendizagem: um olhar psicopedagógico

Construir sentidos com base na informação e no conhecimento poderá ser a tarefa mais nobre da escola nessa sociedade de informações. À família caberá o resgate de valores, a intervenção solidária na realidade e a promoção da afetividade entre seus membros. Ao educando caberá seguir em frente, ultrapassar barreiras, construir saberes e se tornar um cidadão consciente. “Somos os únicos seres que, social e historicamente, nos tornamos capazes de aprender. Por isso, somos os únicos em quem aprender é uma aventura criadora, algo, por isso mesmo, muito mais rico do que meramente repetir a lição dada.” (Paulo Freire)

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Roseli Elena Andreazzi Finelli

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Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM): instrumento avaliativo do aluno, não da unidade escolar. Valéria Gargano34

1. História do Enem: breve abordagem O Exame Nacional do Ensino Médio, popularmente conhecido como Enem, foi a primeira iniciativa de avaliação geral do sistema de ensino do Brasil, criado em 1998 pelo Ministério da Educação do Brasil, durante o mandato do então Ministro da Educação Paulo Renato Souza, com o objetivo de avaliar anualmente o desempenho e qualidade dos estudantes voluntários de todo o país ao final do Ensino Médio. Basicamente, é usado pelos alunos que pretendem conseguir uma bolsa de estudo através do Programa Universidade para Todos, o ProUni. Todavia se tornou uma referência do desempenho dos alunos, e muitas outras universidades passaram a utilizar o resultado do Enem como critério de seleção para novos alunos, seja para dar uma cota ou para substituir o tradicional vestibular. É também utilizado pelo Sistema de Seleção Unificada, o SISU, para conseguir bolsas em universidades federais. Possui graduação em Estudos Sociais pelo Instituto de Educação Teresa Martin (1995) e graduação em Pedagogia pela Universidade Iguaçu (2001). Atualmente é Coordenadora Pedagógica e Orientadora Educacional - Ensino Médio, do Instituto Educacional São João Gualberto desde 2003 e Coordenadora Pedagógica e Orientadora Educacional - EJA - Colégio ECO.

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Valéria Gargano

Pode participar do exame qualquer aluno que tenha concluído o Ensino Médio, seja no ano do exame ou em anos anteriores, com isso número de inscritos é muito alto, se tornando o maior exame do Brasil com mais de 4,5 milhões de inscritos em 2010 divididos em 1.698 cidades do pais. O primeiro modelo de prova utilizado entre 1998 e 2008, tinha 63 questões interdisciplinares (envolvendo conceitos de diversas áreas) aplicadas em um único dia de prova, para que o estudante tivesse um bom desempenho ele deveria ser capaz de ler e interpretar textos, dominar a norma culta, raciocínio lógico, gráficos, tabelas e mapas a fim de que essas aptidões demonstrem o seu índice de aproveitamento escolar. O Enem nem sempre foi tão valorizado por ser facultativo aos estudantes. A adesão em 1998 foi modesta, contudo conforme seus resultados bem divulgados, ano após ano a confiança foi aumentando, assim como as adesões. O exame nacional do Ensino Médio (Enem) caminhou para transformar se no mais importante instrumento de avaliação de desempenho na educação, capaz de medir a qualidade do sistema e de impulsionar sua qualificação passando a ganhar um papel estratégico para a administração do ensino. A análise da tabela estatística abaixo demonstra a crescente evolução do número de inscritos de 1998 a 2010 validando o quanto ele é um exame sério e de alta confiabilidade. Porém, em 2009, houve um vazamento do gabarito dias antes da avaliação, a prova foi cancelada, sendo então remarcado. Esse fato gerou um sentimento de desconfiança. Após o ocorrido, muitos candidatos não compareceram aos novos dias de exame. Outro fato prejudicial foi que o atraso na divulgação dos resultados, vários estudantes foram prejudicados, pois muitas universidades não utilizaram os resultados alegando ser tarde demais.

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Exame Nacional Do Ensino Médio (ENEM)...

Ano

Número de inscritos

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2020 2012

157.221 346.953 390.180 1.624.131 1.829.170 1.882.393 1.552.316 3.004.491 3.742.827 3.568.592 4.018.070 4.576.126 4.611.441 6.000.000

Fonte: http://g1.globo.com/Noticias/Vestibular/0,,MUL733676-5604,00-ENEM+TEM+NUMERO+ RECORDE+DE+INSCRITOS.html

No mesmo ano houve uma reformulação do Enem, que incluiu a Certificação de Conclusão do Ensino Médio em cursos de Educação de Jovens e Adultos, o EJA e antigo supletivo, que substitui o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos, o ENCCEJA, para alunos que tenham a idade mínima de 18 anos na data da prova. O novo Enem, implantado pelo Ministro da Educação Fernando Haddad tem como principais objetivos democratizar as oportunidades de acesso às redes federais de Ensino Superior e possibilitar a mobilidade acadêmica. As universidades podem optar entre quatro métodos como processo seletivo:  Como fase única, com o SiSU, informatizado e on-line;  Como primeira fase;  Combinado com o vestibular da instituição;  Como fase única para as vagas remanescentes do vestibular.

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Valéria Gargano

O MEC argumenta que o vestibular tradicional desfavorece os alunos que pretendem estudar em outra cidade ou estado, pelo fato de não terem condições de se locomoverem e que as Universidades Federais ficam limitadas aos alunos daquela região. De acordo com a PNAD de 2007 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), a mobilidade entre estudantes nas diferentes unidades do país e muito baixa, com 0,04%, comparativamente nos Estados Unidos, 19,2% dos alunos mudam de estado para estudarem. A proposta e que haja verbas extras para ajudar esses alunos a se manterem longe de casa, fator esse, que inclusive contribuiria para a melhor distribuição acadêmica. O novo exame agora conta com 180 questões divididas em dois dias de prova mais uma redação e foi adotado a Teoria da Resposta ao Item (TRI), que permite que as notas obtidas em edições diferentes do exame sejam comparadas e até mesmo utilizadas pelas instituições. No ano de 2011, O edital do Enem 2011, publicado no Diário Oficial da União, previa que o candidato deveria, “antes de iniciar a prova, verificar se seu caderno de questões contém algum defeito gráfico que impossibilite a resposta às questões”. Azar de quem não notar uma eventual falha: vai perder pontos na correção da prova. Por si só, o trecho já é explícito o suficiente sobre sua intenção. Esta informação não fazia parte do edital do Enem 2010. Ou seja, o acréscimo foi claramente motivado pelo problema ocorrido na última edição do exame e pretendia garantir ao Inep uma espécie de “permissão para errar”, uma salvaguarda ao instituto que, responsável pela elaboração da avaliação, deveria garantir sua qualidade – o que inclui entregar ao aluno um exame digno de confiança. Em 2012, os problemas não foram tão graves, mas sim pontuais, principalmente em relação às inscrições realizadas via internet. Segundo o Governo Federal, a culpa foi do navegador da internet, por problemas de conexão que até o Ministério da Educação enfrentou. O problema também 113


Exame Nacional Do Ensino Médio (ENEM)...

aconteceu durante a entrevista para apresentar o balanço das inscrições do Enem35.

2. Principais Objetivos O modelo adotado foi desenvolvido com ênfase no aprendizado das estruturas mentais e não apenas na memória, que tem sim importância fundamental, mas que não pode ser usada como elemento único de compreensão do mundo. O exame é interdisciplinar e contextualizado, permite que o aluno fique diante de situações-problemas e que precisa saber não apenas os concertos, como também as suas aplicações. O objetivo do Enem não é de medir a capacidade do candidato de assimilar informações, e sim de aprender a pensar, a refletir, e o mais importante, “saber como fazer”, com isso, valoriza a autonomia do jovem na hora de fazer escolhas e tomar decisões. Como o objetivo do exame é verificar como anda o ensino no país, o MEC decidiu optar pela isenção da taxa de matrícula para alunos que estudaram em escolas públicas, com isso, o número de inscritos cresceu muito, o que garante acesso ao nível superior. As universidades públicas são as mais almejadas hoje, e já são mais de 600 Instituições de Ensino Superior (IES) inscritas para utilizar a nota do Enem, a tendência é que cada vez mais instituições passem a utilizar, sendo assim o Enem passa a representar um fator decisivo e modernizador. O Governo utiliza a prova como ferramenta para avaliar a qualidade geral do Ensino Médio no país. Assim, os dados mostram uma realidade impressionante: a distância entre Disponível em <http://g1.globo.com/jornal-hoje/noticia/2012/06/ estudantes-encontram-dificuldades-para-se-inscrever-em-provas-do-enem. html>; Acesso em 02 set. 2013.

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Valéria Gargano

o nível público e particular é enorme. Em uma prova que avalia habilidades e competências, a diferença de notas e muito grande. Os principais fatores que desencadeiam a discrepância entre o ensino público e o privado são: a falta de planejamento administrativo, pedagógico e financeiro nas escolas públicas em que faltam professores o ano inteiro em algumas disciplinas, faltam materiais de consumo, pedagógico, além das instalações serem precárias. Realidade completamente diferente do cotidiano de uma escola privada que oferece um currículo adequado à vida do aluno, possui estrutura física e acesso ao que há de mais novo em conceito de ensino, além de salas de aula com turmas reduzidas, para maior aproveitamento, e, sobretudo, equipe pedagógica para apoiar o professor.

3. Enem 2010 Seguindo o rumo de escândalos de 2009, o Enem 2010 também apresentou falhas. Primeiramente foi o vazamento de dados sigilosos e dos alunos inscritos no exame através da Internet. Depois, o cancelamento de todas as provas de cor amarela, devido a uma série de erros de uma das maiores gráficas do mundo, a RR Donneley. Diante dessa situação, o estado do Ceará teve o maior número de prejudicados. O Ministério da Educação ofereceu nova oportunidade aos alunos que quisessem fazer nova avaliação, porém alguns estudantes alegaram que a segunda prova os prejudicaria, e não refizeram o exame... Como aconteceu em 2009, muitas instituições não quiserem usar o Enem como uma fase de classificação. A gráfica admitiu o erro, mas disse que o número está dentro da margem de erro admitida para esse tipo de processo industrial. Dos 33 mil cedemos com erro, 21 mil foram entregues aos alunos. 115


Exame Nacional Do Ensino Médio (ENEM)...

4. O exame O Enem é um exame diferente dos vestibulares tradicionais aplicados pelas próprias instituições de ensino, pois visa a transdisciplinaridade, ou seja, para responder a uma questão o aluno precisa usar conceitos de mais de uma disciplina para obter a resposta correta. Todas as questões têm cinco opções de respostas, sendo que apenas uma das questões é a correta. Para evitar que uma questão seja mais difícil que a outra, todas as provas contém as mesmas questões e textos, a diferença está na ordem dessas questões e textos. E para evitar a “cola”, existem quatro cadernos diferentes, denominados por quatro cores: amarelo, branco, azul e rosa. Como o Enem visa a transdisciplinaridade, ele não é separado por disciplinas ou matérias, e sim segue uma ordem sem qualquer tipo de agrupamento, com questões de todos os tipos e não há um indicador da competência a ser avaliada. A interdisciplinaridade (ou ao menos a multidisciplinaridade) entra em cena. A necessidade de ir “além dos muros da escola” (titulo de uma excelente produção do cinema francês sobre educação, premiado em Cannes) com viagens, leituras, filmes, exposições, músicas, poesia, artes plásticas, navegação por sites com conteúdo inteligente e desafiador, entre outras ações, se torna premente e permanente. Ir além da concepção vigente e entender que os saberes não são dissociados são outro desafio. Reunir os conhecimentos em grupos como Ciências Humanas, Matemática e Ciências da Natureza, Códigos e Linguagens (entre os quais se incluem as artes e a educação física) é mudança importante, que traz qualidade à educação. Será uma tarefa das mais árduas. Para que o Enem seja uma fórmula de sucesso, ainda é necessário um trabalho de adequação tanto da rede pública, quanto da rede privada, já conscientes da necessidade

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de mudança e em movimento quanta a isso, estão tentando acertar, mas continuam a cometer alguns erros de percurso. Para se obter um bom resultado no exame a regra é básica: bons professores, boa estrutura e muita disciplina e essa tríade deve refletir na vida do aluno não somente para um bom resultado no Enem, mas sim como fórmula para tudo que for fazer no futuro, afinal, fazer o Enem ou um vestibular não significa o fim de nada. É sempre o reinício de mais uma etapa. O Enem tem duração de dois dias, com 4 horas e 30 minutos no primeiro dia e 5 horas e 30 minutos no segundo. São 180 questões de múltipla escolha mais uma redação. As disciplinas são: Ciências da Natureza e suas Tecnologias, Linguagens, Códigos e suas Tecnologias, e Matemática e suas Tecnologias. 4.1. O exemplo do SAT O Enem segue o modelo SAT (Scholastic Aptitude Test), elaborado em 1926 nos Estados Unidos, para o ingresso nas universidades americanas. O SAT é apenas parte desse processo de avaliação, além dele, são considerados também o históricos escolar dos alunos, envolvimento em atividades voluntárias e cartas de referências de professores. Em comum com o Enem, o exame utiliza a Teoria de Resposta ao Item (TRI), método que permite que provas diferentes, com o mesmo grau de dificuldade, sejam aplicadas em datas distintas, sem prejuízo ou benefício aos candidatos.

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5. Competências e habilidades Segundo site do Inep: Competências são as modalidades estruturais da inteligência, ou melhor, ações e operações que utilizamos para estabelecer relações com e entre objetos, situações, fenômenos e pessoas que desejamos conhecer. As habilidades decorrem das competências adquiridas e referem-se ao plano imediato do “saber fazer”. Por meio das ações e operações, as habilidades aperfeiçoam-se e articulam-se, possibilitando nova reorganização das competências.

É importante enfatizar a preocupação em proporcionar uma educação completa ao estudante, que englobe mais do que uma simples preparação para vestibular. Acreditase que um contato maior do estudante com conhecimentos e atividades que desenvolvam suas habilidades pode trazer excelentes resultados. Assim, a escola passa a viver o Exame Nacional de Ensino Médio e preparar educando também para aquilo que vem depois do vestibular: a vida real e a universidade, que requer pesquisadores e leitores de verdade. A forma de preparação desses alunos para esse exame suscita a revisão de um modo de pensar, agir e realizar um ensino que tem décadas de existência. Conforme afirma José Luís Almeida Machado, em um artigo para o Jornal Tribuna do Norte: O novo ENEM cria, por certo, demandas que não existiam. Obriga as escolas a repensar suas bases. Exige dos professores uma série de posturas que antes não lhes eram comuns, peculiares. Estipula a necessidade de leitura e atualização constante por parte dos estudantes. Propõe, através de suas questões, o desenvolvimento do raciocínio, da capacidade de se relacionar, da possibi118


Valéria Gargano

lidade de ir além da mera memorização de fórmulas e dados36. ( 2 out. 2009)

5.1. Opinião de educadores O professor da Associação Beneficente Sargento Cordeiro (ABSC), Cristiano Fretta, aprova o exame. É uma prova que estimula o raciocínio lógico e evita que os estudantes se utilizem do famoso decoreba para as provas. Além de serem questões interdisciplinares, que acabam com a separação das áreas, principalmente português e literatura […] o ensino brasileiro não aplica o conteúdo de forma interdisciplinar como esta previsto nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Então, quando o aluno chega ao Enem, estranha 37.

Fretta fala ainda sobre os erros que ocorreram em 2009 e 2010. “Os erros que ocorreram nestes dois últimos anos não podem ser motivo para questionar o Exame em si. Aqui na Ulbra (Universidade Luterana do Brasil), por exemplo, por meio do Enem, 700 alunos estudam ou se formaram com o ProUNI”. Para o Secretario de Educação de Canoas, Paulo Ritter, a metodologia interdisciplinar é um desafio mundial da educação. “E preciso unir os conteúdos as diversas áreas do conhecimento, tirando do professor o trabalho segmentado”38. Observa-se também que: “Há mais de dois anos trabalhamos com o MEC para buscar a democratização Vide anexo da lista das cinco competências e vinte e uma habilidades pressupostas pelos organizadores do Enem.

36

Disponível em: http://g1.globo.com/jornal-hoje/noticia/2012/06/ estudantes-encontram-dificuldades-para-se-inscrever-em-provas-do-enem. html.

37

Disponível em: http://sul21.com.br/jornal/2010/11/educadores-defendem-enem-e-importante-para-o-futuro-do-ensino-brasileiro/.

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do “Ensino Médio e Ensino Superior”. Nestas discussões surgiu a reformulação do Enem, que entendemos como uma ferramenta importante, especialmente para a entrada na universidade”, comenta a presidente Yvelise Freitas do Conselho Nacional de Secretários de Educação. “Por isso, apoiamos que se tenha uma avaliação. Precisamos saber o que de fato estamos ensinando aos nossos alunos”39. Um lado positivo da reformulação do Enem e que ele prevê a substituição dos vestibulares nas universidades federais pela avaliação, como citado no Jornal Folha de São Paulo em 25-08-2011: “Para o ministério, a unificação do vestibular das universidades federais também vai beneficiar os candidatos que não precisarão se deslocar para diferentes lugares para realizar a prova. Segundo dados da Pesquisa Nacional par Amostra de Domicílios 2007 (Pnad/IBGE), de todos os estudantes matriculados no primeiro ano do ensino superior, apenas 0,04% residem no Estado onde estudam há menos de um ano. De acordo com a MEC, a objetivo das mudanças é reestruturar o conteúdo aplicado para ensino médio”.

5.2. A posição do professor Deve haver um movimento de adaptação para que as professores possam estar preparados para ensinarem de forma mais ágil e ampla, pois as conteúdos excessivos impedem que os professores se aprofundem nas matérias o que provoca lacunas no aprendizado dos alunos, outro fator negativo, são as salas de aula com superlotação, o que faz cair de forma drástica o rendimento dos alunos. Disponível em: http://sul21.com.br/jornal/2010/11/educadores-defendem-enem-e-importante-para-o-futuro-do-ensino-brasileiro/

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Além disso, é muito importante proporcionar cursos de qualificação profissional, isso aumenta autoestima do professor que automaticamente transmite confiança ao aluno. Segundo nota em artigo da Folha de São Paulo: “Qualificação e envolvimento dos professores, atividades extracurriculares infraestrutura e a busca de informação humanizada são os segredos para que colégios particulares de São Paulo atinjam as melhores notas no Enem” (Alexandre Rodrigues. et e al. Folha de São Paulo) Ranking das escolas Em 2008 as melhores médias por capitais foram:  Vitória - 57,20  Florian6polis - 56,63  Brasília - 52,67  Natal- 51,38  Belém - 48,95 Em 2009, as dez escolas mais bem colocadas, eram todas particulares, exceto o Colégio de Aplicação da UFV, que ficou em 8° que é Federal. E a pior escola que conseguiu media foi Escola Estadual Indígena Dom Pedro I, que ficou em 18792°. 5.3. A função do ranking Segundo Rosely Sayão: “É preciso lembrar, em primeiro lugar, que o Enem é feito para avaliar o ALUNO, e não a escola que ele frequenta, e isso faz toda diferença quando analisamos os resultados comparativos colocados em forma de classificação”40. O aluno é o sujeito da avaliação e não a entidade escolar em que está inserido, portanto se pressionado poderá Disponível em fj1309200921.htm.

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:

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/especial/

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cursar o ensino médio com um sentimento de derrota antecipada, o que não é bom, sob nenhuma circunstância, pais pressionando os filhos em busca de resultados só faz bem ao ego da própria instituição que vive em busca de rótulos e não se preocupa em preparar os alunos para enfrentarem a vida como de fato ela é. A autora ressalta também que a boa escola e aquela que ensina com rigor desde os primeiros anos escolares, que conduz os alunos a adquirirem uma rotina de estudos frequentes, para que tenham compromisso e, sobretudo, prazer em aprender, se tudo isso for respeitado desde os anos iniciais, os alunos ao chegarem ao ensino médio não terão dificuldade alguma para prestarem não somente o exame do Enem ou o vestibular, mas levarão esses ensinamentos para toda vida. Esta sim é a função primordial de uma boa escola. O Enem foi pensado para avaliar os alunos, e não as escolas. Interpretar as notas dos alunos como se fossem das escolas pode causar algumas distorções. Um dos problemas é que o Enem é um exame facultativo, apesar de muitos estudantes prestarem o exame, normalmente são aqueles interessados em adentrarem em boas universidades, ou seja, os bons alunos. Isso oferece uma informação deturpada, porque aqueles alunos que não são tão aplicados, não se candidatarão, para o Enem, tampouco para alguma universidade, logo essa amostragem não serve como parâmetro.

Conclusão É fundamental avaliar a educação no Brasil, seja para averiguar o aumento dos gastos crescentes na educação dos filhos dentro das escolas particulares e garantir que Ihes seja passado o conhecimento de forma correta, ou seja, para aferir as carências no ensino publico.

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Podemos aceitar as críticas ao Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), apontar as falhas constantes do exame, além de insistir que as escolas melhor avaliadas também possuem problemas, pois a amostragem de alunos que fazem o Enem não segue padrão algum. O importante e ressaltar que devemos insistir em ter um bom ensino público e privado para que todos os jovens possam ter as mesmas oportunidades. Contudo, o Enem representa uma louvável iniciativa do MEC de fazer evoluir e melhorar o quadro da educação de nosso país. Percebemos que o Enem ainda apresenta muitas falhas, porém, por ser um sistema de avaliação novo, acreditamos que o mesmo vem passando por um constante processo de aperfeiçoamento. Processo este que deverá rever vários fatores, entre eles, a avaliação do aluno em si sem usar este artifício como avaliação da instituição escolar, pois desta forma, sempre prevalecerão os alunos da escola privada. Outro fato relevante a ser aperfeiçoado é a impressão dos cadernos que merece mais atenção das gráficas e ainda com muita importância, deve-se melhorar os meios de comunicação entre o candidato e organizadores com o intuito das informações chegarem com clareza e a tempo de todos se programarem para a realização do exame.

Referências PACHOAL, Ana Beatriz. Agora São Paulo. 30 de novembro de 2006. SAYAO, Rosely. Escolha a escola. Folha de São Paulo: 13 de setembro de 2009. VIVES, Fernando. Revista Carta Capital: Edição 656. 10 de setembro de 2010. São Paulo: Ed. Confiança. FRANCESCHINI, Marina. Estudantes encontram dificuldades para se inscrever em provas do Enem. Jornal Hoje – Edição de 01 jun. 2012. Disponível em <http://g1.globo.com/jornal-hoje/noti123


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cia/2012/06/estudantes-encontram-dificuldades-para-se-inscrever-em-provas-do-enem.html> Acesso em 02 set. 2013. DUARTE, Rachel. Educadores defendem: Enem é importante para o futuro do ensino brasileiro. Sul21 de 11 nov. 2010. Disponível em <http://www.sul21.com.br/jornal/destaques/educadores-defendem-enem-e-importante-para-o-futuro-do-ensino-brasileiro/> Acesso em mar. 2012. MACHADO, João Luis de Almeida. O novo Enem é uma revolução? Tribuna do Norte de 02 out. 2009. Disponível em < http://tribunadonorte.com.br/noticia/o-novo-enem-e-uma-revolucao/126996> Acesso em jul. 2012 OKADA , Ana. Conheça as competências e habilidades cobradas no Enem. UOL Educação de 22 ago. 2008. Disponível em <http:// educacao.uol.com.br/ultnot/ 2008/08/22/ult1811u232.jhtm> Acesso em jul. 2012. Consulte o ranking de escolas do Enem 2009. Disponível em <http://uliosegundo.ig. com.br/educacao/consulte+o+ranking+de+escolas+do+enem+2009/n1237722683898.html?gclid=CMjjpZCsI6cCFYxL2god9mvFdw> Acesso em jul. 2011. <http://www.universitario.com.br/noticias/noticiasnoticia.php?idnoticia=7915> Acesso em jul. 2012. < http://www.enem.inep.gov.br/> Acesso em jul. 2012. <www.planetaeducacao.com.br>acesso em 24 jul. 2012. <www.artigonal.com/ensino-superior-artigos/enem-i> Acesso em jul. 2012. <www.literatuseducacional.com.br/site/artigo.> Acesso em jul. 2012.

ANEXO  Competências I. Dominar a norma culta da língua portuguesa e fazer uso da linguagem matemática, artística e científica. II. Construir e aplicar conceitos das várias áreas do conhecimento para a compreensão de fenômenos naturais, de processos histórico-geográficos, da produção tecnológica e das manifestações artísticas. 124


Valéria Gargano

III. Selecionar, organizar, relacionar, interpretar dados e informações representados de diferentes formas, para tomar decisões e enfrentar situações problema. IV. Relacionar informações, representadas em diferentes formas, e conhecimentos disponíveis em situações concretas, para construir argumentação consistente. V. Recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na escola para elaboração de propostas de intervenção solidária na realidade, respeitando os direitos e considerando a diversidade sociocultural.  Habilidades 1. Dada a descrição discursiva ou por ilustração de um experimento ou fenômeno, de natureza científica, tecnológica ou social, identificar variáveis e selecionar os instrumentos necessários para sua realização ou interpretação. 2. Em um gráfico cartesiano de variável socioeconômica ou técnico-científica, identificar e analisar valores das variáveis, intervalos de crescimento ou decréscimo e taxas de variação. 3. Dada uma distribuição estatística de variável social, econômica, física, biológica, traduzir e interpretar as informações disponíveis ou reorganizá-las, objetivando interpolações ou extrapolações. 4. Dada uma situação-problema, apresentada em uma linguagem de determinada área de conhecimento, relacioná-la com sua formulação em outras linguagens e viceversa. 5. A partir da leitura de textos literários consagrados e de informações sobre concepções artísticas, estabelecer relações entre eles e seu contexto histórico, político ou cultural, inferindo as escolhas dos temas, gêneros discursivos e recursos expressivos dos autores. 6. Com base em um texto, analisar as funções da linguagem, identificar marcas de variantes linguísticas de natureza 125


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sociocultural, regional de registro ou de estilo e explorar as relações entre as linguagens coloquial e formal. 7. Identificar e caracterizar a conservação e as transformações de energia em diferentes processos de sua geração e uso social e comparar diferentes recursos e opções energéticas. 8. Analisar criticamente, de forma qualitativa ou quantitativa, as implicações ambientais, sociais e econômicas dos processos de utilização dos recursos naturais, materiais ou energéticos. 9. Compreender o significado e a importância da água e de seu cicIo para a manutenção da vida, em sua relação com condições socioambientais, sabendo quantificar variações de temperatura e mudanças de fase em processos naturais e de intervenção humana. 10. Utilizar e interpretar diferentes escalas de tempo para situar e descrever transformações na atmosfera, biosfera, hidrosfera e litosfera, origem e evolução da vida, variações populacionais e modificações no espaço geográfico. 11. Diante da diversidade da vida, analisar, do ponto de vista biológico, físico ou químico, padrões comuns nas estruturas e nos processos que garantem a continuidade e a evolução dos seres vivos. 12. Analisar fatores socioeconômicos e ambientais associados ao desenvolvimento, as condições de vida e saúde de populações humanas, por meio da interpretação de diferentes indicadores. 13. Compreender o caráter sistêmico do planeta e reconhecer a importância da biodiversidade para preservação da vida, relacionando condições do meio e intervenção humana. 14. Diante da diversidade de formas geométricas planas e espaciais, presentes na natureza ou imaginadas, caracterizá-las por meio de propriedades, relacionar seus elementos, calcular comprimentos, áreas ou volumes e 126


Valéria Gargano

utilizar o conhecimento geométrico para leitura, compreensão e ação sobre a realidade. 15. Reconhecer o caráter aleatório de fenômenos naturais ou não e utilizar em situações-problema processos de contagem, representação de frequência relativa, construção de espaços amostrais, distribuição e cálculo de probabilidades. 16. Analisar, de forma qualitativa ou quantitativa, situações-problema referentes a perturbações ambientais, identificando fonte, transporte e destino dos poluentes, reconhecendo suas transformações, prever efeitos nos ecossistemas e sistema produtivo e propor formas de intervenção para reduzir e controlar os efeitos da poluição ambiental. 17. Na obtenção e produção de materiais e insumos energéticos, identificar etapas, calcular rendimentos, taxas e índices e analisar implicações sociais, econômicas e ambientais. 18. Valorizar a diversidade dos patrimônios etnoculturais e artísticos, identificando-a em suas manifestações e representações em diferentes sociedades, épocas e lugares. 19. Confrontar interpretações diversas de situações ou fatos de natureza hist6rico geográfica, técnico-científica, artístico-cultural ou do cotidiano; comparando diferentes pontos de vista, identificando os pressupostos de cada interpretação e analisando a validade dos argumentos utilizados. 20. Comparar processos de formação socioeconômica, relacionando-os com seu contexto histórico e geográfico. 21. Dado um conjunto de informações sobre uma realidade histórico-geográfica, contextualizar e ordenar os eventos registrados, compreendendo a importância dos fatores sociais, econômicos, políticos ou culturais.

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A escola de meus pais, a minha escola, a de meus filhos e de meus netos… Ana Maria Siniscalco Gasparini41 “A boa educação é como uma moeda de ouro: tem valor em toda parte”. Padre Antonio Vieira

1. Introdução Em 1981, dei início a minha carreira no Colégio São João Gualberto, primeiramente como docente e após cinco anos de casa, fui convidada para assumir o setor de Orientação Educacional. Devo afirmar que essa carreira ocupou minha vida, pessoal e profissionalmente, aperfeiçoando a minha vocação de educadora. Tive a sorte de encontrar profissionais extraordinários, com muita experiência que contribuíram e nortearam toda minha caminhada até os dias de hoje. Trinta e dois anos se passaram e, desde então, pude crescer e enriquecer meus conhecimentos sobre o que o setor de Orientação deve oferecer aos estudantes desde a primeira infância até a adolescência, tal como às suas famílias, daí sua importância fundamental dentro da Instituição. O Orientador Educacional é o elo entre aluno/profesPossui magistério e graduação em Pedagogia pelo Centro Universitário Claretiano de Batatais (2008). Atualmente é Orientadora Educacional do Instituto Educacional São João Gualberto (desde 1981). Tem experiência em Educação, com ênfase em Orientação Educacional.

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sor, aluno/direção, e a retaguarda para o professor, favorecendo o seu trabalho na sala de aula, cuja meta é proporcionar a construção do processo de ensino e aprendizagem do aluno, mediador na formação e no desenvolvimento biopsicossocial e afetivo, educando-o para a vida. Acredito que explanar um pouco a cerca das competências do Orientador Educacional dentro da instituição se faz necessário, pois para a maioria das pessoas é o setor que deve apenas “punir” os alunos, o que se deve contestar veementemente, o quanto é errônea esta afirmação. Não podemos só cobrar e punir; devemos ouvir, orientar e oferecer afetividade, para que surja a responsabilidade e, assim, se oriente educacionalmente.

2. Esse é o profissional que se preocupa com a formação pessoal de cada estudante. Na instituição escolar, segundo Heloisa Luch, o Orientador Educacional é um dos profissionais da equipe de gestão. Ele trabalha diretamente com os alunos, ajudando-os em seu desenvolvimento pessoal; em parceria com os professores, para compreender o comportamento dos estudantes e agir de maneira adequada em relação a eles; na escola, na organização e realização da proposta pedagógica; e com a comunidade, orientando, ouvindo e dialogando com pais e responsáveis. Seu compromisso é com a formação permanente no que diz respeito a valores, atitudes, emoções e sentimentos, sempre discutindo e analisando com critério. O Orientador Educacional lida mais com assuntos que dizem respeito a escolhas, relacionamento com colegas e vivências familiares, auxiliando sempre a coordenação pedagógica42. Hoje vivemos num mundo globalizado, muito diferente Função dentro do staf diretivo de uma escola, que organiza os conteúdos a serem ministrados.

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A escola de meus pais, a minha escola, a de meus filhos e de meus netos…

de três décadas atrás, quando assumi a parceria para atuar nesta conceituada Instituição e, diga-se de passagem, que o Colégio São João Gualberto sempre preocupado em atender sua clientela com qualidade, foi um dos pioneiros em contratar o profissional destinado ao Setor de Orientação Educacional, associando-o ao que na prática comum da vida escolar, apenas dava espaço à função da coordenação pedagógica. Ora, isso é dado qualitativo, uma vez que além de agregar mais um profissional ao complexo ato de educar, dá também tom diferenciado à missão de educar, isto é, compreendendo a ação educadora como mais do que organização da transmissão de conteúdos, o que é fundamental, como também a formação humana como um todo, como afirmado anteriormente. Observei durante esta trajetória, que os pais faziam a escolha da escola de seus filhos desde o momento em que a mãe dava início à gestação, e geralmente a escola escolhida era a mesma que os pais frequentaram e, portanto, recebemos a segunda e terceira geração destes alunos que continuam fiéis a instituição. Motivo de orgulho para todos nós, pois se tornou tradição que se passa de pai para filhos e netos.

3. Dando início a escolarização de nossos filhos Somos conhecedores que crianças crescem melhor junto com outras crianças, é quando se dá início ao processo de sociabilização mais amplo para além dos pais, parentes e amigos, elas vão para a escola cada vez mais cedo. Assim, inspirando-me nos pensamentos de James P. Lenfestey, o quanto antes ensinarmos as crianças com amor, dispensando-lhes tempo com a sua educação pode-se confiar que caminharão com tranquilidade, e serão um orgulho.

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É também uma ocasião em que eles pelos muitos contatos, desenvolvem anticorpos, que lhes dá uma enorme contribuição fisiológica, isto é, com o contato com outras crianças e ambientes novos, acontece o processo descrito como teoria da higiene, que inclusive serve como fator imunizador. Todo começo é especial, e não seria diferente com a escolha da escola de nossos filhos. Aos poucos as escolhas vão exigindo mais reflexão de nossa parte e o resultado delas vai ficando mais sério, afinal somos responsáveis pelas escolhas simples até as mais complexas; hoje nos deparamos com imenso repertório de modelos de interação social. Aconselhamos sempre que as expectativas da família devem ser coerentes com a proposta da escola. Segundo Mirian Grinspun, os pais, bons conhecedores do perfil de seu filho, definem suas prioridades para a sua formação, todavia contribui em muito para ajudar na escolha o serviço de orientação educacional. Devemos considerar que na 1ª infância a criança tem sua vida ligada às pessoas com as quais têm vínculos afetivos, com espaço de sua casa e com a segurança necessária. As tranquilidades que vivenciam no seu dia a dia transformamse em uma estranha separação de seus pais e o afastamento de sua casa e, portanto, frente a um grande processo de adaptação, a escola deve colocar em seus espaços a presença de adultos preparados, em que os pais possam confiar: e em que possam contar. Cada criança chega à nossa Escola com uma bagagem e vínculos afetivos que desenvolveram com a família, e hoje, mais do que anteriormente, os pais estão delegando o poder de representá-los, e almejam que seus filhos sejam felizes. A escola representa uma grande inovação em suas vidas, ou seja, os pais cada vez mais estão estabelecendo parcerias e desenvolvendo relações de confiança na Escola escolhida para seus filhos. 131


A escola de meus pais, a minha escola, a de meus filhos e de meus netos…

4. Como é a escolha da escola na atualidade Para escolher bem a escola de seu filho, os pais precisam sentir-se seguros com a decisão desta escolha, não gerando sofrimento às crianças. Todavia nesse processo de escolha é interessante ressaltar que grande quantidade de visitas faz com que os pais fiquem perdidos na hora de escolher em que escola matricular os filhos. Aliás, é comum quando assim procedem, eles pretendem montar um quebra-cabeça com as peças selecionadas de cada escola visitada. O processo de escolha é complexo e envolve uma série de variáveis; sendo que os pais precisam prestar atenção aos aspectos físicos da escola, ao projeto pedagógico, ao conteúdo, aos recursos humanos, à formação dos professores, ao como a escola trata as crianças, e como é o trabalho com os colegas. Assim frente ao mundo globalizado e à concorrência no mercado de trabalho, os pais devem observar se a escola prepara o aluno somente para a vida ou se também o prepara para o mercado de trabalho. Existem diferentes formas de educar, mas o principal é desenvolver a potencialidade de cada criança, e formar pessoas respeitosas, honestas, competentes e confiantes na sua capacidade de enfrentar os desafios da vida. Consequentemente, todos nós nos preparamos para receber esta nova geração de estudantes. A escola também deve incentivar a solidariedade, a ética, entre outros conceitos que formam o ser humano de caráter honroso, e essa deve ser uma preocupação constante de uma instituição séria. Para tanto se deve observar todos os projetos que tramitam durante os anos de permanência dos nossos alunos, desde a educação infantil até o ensino médio.

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5. Momento atual Uma forma particular de escolha da escola é através da internet, onde o site da escola fornece não só informações técnicas e pedagógicas, como também permite aos pais acompanharem a rotina da dinâmica escolar. Navegando pela internet nossas famílias podem conhecer antecipadamente a escola online, todas as dependências e espaços diferenciados de que nossos filhos são privilegiados; assim, como conhecer o currículo de nossos educadores, das bases curriculares como a Plataforma Lattes do Ministério da Educação e Cultura. Esse é mais um dos diferenciais de nossa Instituição, a transparência. Há décadas os pais não consideravam a importância da infraestrutura da escola, da orientação para a alimentação, dos passeios extracurriculares, do transporte escolar, das avaliações, dos encontros de pais e mestres, da lição de casa, do mobiliário, do material escolar, da qualificação do corpo docente. Havia apenas a preocupação com a mensalidade escolar, da escolha de uma boa escola particular. Também no século XXI os adolescentes devem opinar na escolha da nova escola, os pais precisam considerar o perfil de seus filhos, verificamos que aos poucos, a história se transforma e cria mais oportunidades para todos os cidadãos. Sabemos que a vida moderna dos pais de família, que envolve trabalho e carreira, tem atrapalhado o bom relacionamento com os filhos, delegando às escolas poderes educativos e disciplinares, o que significa uma terceirização das suas responsabilidades, que devem começar desde cedo e é uma qualidade que deve ser desenvolvida entre pais e filhos. Por isso é bom que se frise: família e escola educam juntas. Então nós, como escola, nos vemos obrigados a inovar sempre, para que crianças e adolescentes estejam sempre motivados, porque acreditamos que é com amor e afetividade que tudo fica mais fácil e mais salutar. É essa a filosofia da história da vida escolar. 133


A escola de meus pais, a minha escola, a de meus filhos e de meus netos…

Não poderia deixar de ressaltar também que na Agenda do Século XXI, o Colégio São João Gualberto colocou as tecnologias como aliados dos profissionais da educação, para que pudessem utilizar os recursos das TICs (Tecnologias de Informação e Comunicação) na prática pedagógica, facilitando o trabalho de nossos docentes em seu dia-a-dia. Sabemos que as TICs em nosso cotidiano se tornaram um desafio à inclusão digital indispensável em nossa vida escolar, econômica e cultural. Nossa preocupação está voltada em preparar cidadãos digitais para um novo mercado de trabalho. Discentes conectados com e-mails, celulares, palms, chats, buscadores de informações, sites de notícias, comunidades online, sms, messenger, VoIP e outras ferramentas que até pouco tempo não faziam parte de nossa rotina, e que sabemos que ela se reinventa a passos largos. Procuramos informá-los de como usá-las no sentido cultural, científico e tecnológico, de modo que nossos alunos adquiram condições para enfrentar os problemas e buscar soluções para viver no mundo contemporâneo. “Tenha em mente que tudo que você aprende na escola é trabalho de muitas gerações. Receba essa herança, honre-a, acrescente a ela e, um dia, fielmente, deposite-a nas mãos de seus filhos”. Albert Einstein

7. Conclusão Nesta oportunidade gostaria de registrar, como Orientadora Educacional, que há trinta e dois anos vive dentro da Escola, que gosto do que faço, tenho clareza do que faço e do por que faço. No entanto devo frisar que se trata de um exercício contínuo de aprendizado da função, uma vez que 134


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cada situação e cada aluno vêm com uma carga emocional, afetiva, e aprendizagens diferentes. A função de Orientador Educacional exige uma dinâmica diferenciada para cada problema, é pertinente que sejamos perspicazes, cautelosos, para que não haja melindres, pois, segundo Jamar Monteiro, é justamente nos momentos de crise que desenvolvemos nosso grau de resolução de problemas, portanto trabalhar em sintonia com a família é fundamental, criar laços afetivos favorece o dia-a-dia com as crianças e adolescentes. As relações se estreitam quando há comprometimento, cumplicidade para o que se deseja realizar. Deve haver respeito mútuo entre o Orientador Educacional, alunos, pais, mestres e funcionários. Dificuldades existem, e só serão superadas se houver paciência com o compromisso e com as consequências assumidas.

Agradecimento especial O meu agradecimento eterno a todos os mestres que com amor e carinho conduziram todos os passos da escolaridade de meus filhos Alessandra e Giancarlo, desde a educação infantil até o ensino médio. Meus filhos tornaram-se seres humanos de infinitas qualidades, que valorizam a Deus e às suas famílias, são adultos responsáveis e bem sucedidos em suas carreiras. Fizemos uma excelente parceria, eu também acertei em minha escolha! E quem sabe, já antecipando minha expectativa do mesmo sucesso para com meu netinho João Pedro, que daqui há alguns anos poderá também ser aluno desta conceituada família Gualberto.

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A escola de meus pais, a minha escola, a de meus filhos e de meus netos…

Referências CHALITA, Gabriel. <http://www.chalita.com.br/>; Acesso em dez. 2012. CORTELLA, Mario Sérgio. <http://cbn.globoradio.globo.com/ comentaristas/mario-sergio-cortella/MARIO-SERGIO-CORTELLA.htm>; Acesso em dez. 2012. GRINSPUN, Mírian Paura S. Zippin. Conflitos de Paradigmas e Alternativas para a Escola. São Paulo: Cortez, 2006. LEIBIG, Suzan. <http://www.neuroeducacao.com.br/susanleibig/index.htm>; Acesso em dez. 2012. LUCK, Heloísa. Ação Integrada-Administração, Supervisão e Orientação Educacional. Petrópoles: Vozes, 2003. MONTEIRO, Jamar. Coletâneas. São Paulo: Intersubjetiva, 2008. NOVA ESCOLA. Orientador Educacional. São Paulo: Abril, 2003. RAMOS, Luiz Felippe Mata. Organizadores. Filhos: O que fazer com eles? Sugestões para acertar sempre! Vários Autores. São Paulo: All Print, 2007. SAYÃO, Rosely. <http://blogdaroselysayao.blog.uol.com.br/>; Acesso em dez. 2012. ZAGURI, Tânia. <http://www.taniazagury.com.br/>; Acesso em dez. 2012.

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Conclusão Concluir um livro, que tem como objetivo fazer uma homenagem a uma instituição de ensino com quase meio século de existência significa trazer à tona uma história de vida marcada pela ação educadora, assinalado no tempo suas ações pedagógicas e os seus recursos didáticos que se lhe servem para escrever sua história de serviço à educação. Se os textos aqui expostos foram escritos por poucas mãos, as palavras neles contidas refletem muitas experiências e conteúdos existenciais e pedagógicos de uma imensa quantidade de professores, alunos e funcionários e ecoam vozes do passado e do presente, como marcas de passos percorridos em nossa escola. Os textos são mais que frutos de cognição e registros físicos dos autores, são indicadores de portas abertas para fazer parte livro da história da educação e revelam a continuidade no tempo e no espaço da ação educadora, que marca a presença da vida escolar do bairro, como parte constitutiva de sua história. É claro que o conteúdo do livro compartilha saberes que contribuem e mostram a importância da escola na sociedade, na medida em que descrevem conteúdos que demonstram o “como” formar cidadãos para as ciências e relações mais humanizadas, capazes de interagir na história do seu dia-a-dia, todavia, ele também pretende ser uma contribuição acadêmica da Pedagogia. Assim sendo, as palavras de conclusão deste livro são também palavras de agradecimentos a todas as pessoas que passaram por nossa Escola, bem como manifestar nossos 137


Conclusão

agradecimentos àqueles que hoje atuam profissionalmente como professores, antropólogos, sacerdotes, médicos, advogados, dentistas, enfermeiros, historiadores, filósofos, teólogos, sociólogos, engenheiros, veterinários, contadores, psicólogos, arquitetos, técnicos de informática, web designers, etc., e que passaram por nossa escola, atuando profissionalmente com um pouco de nossa essência, no intuito de ajudarem na construção de uma sociedade melhor e mais humanizada. Enfim, com um “muito obrigado” pela confiança em nossa escola, registramos a certeza de que as portas continuam abertas para que a educação esteja cada vez mais próxima dos contextos atuais, das tecnologias digitais, que desde agora, acenam para o futuro da educação de mãos dadas e voltada para comunicar-se de fato com a realidade de uma geração de crianças e adolescentes que são oriundas de uma cultura digital. Assim, acreditamos num toque, num clique, se faz uma escola se conectar ao universo cultural de seus educandos, e com isso continuar incidindo sobre a vida das gerações que se nos apresentam, com plena esperança e confiança de que por elas podemos fazer algo, isto é, “.com”, onde um grande lema se constrói como um ideal de “@prendersempre.com: educadores e educandos”. Dom Robson Medeiros Alves, OSB

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