Bruno Fontes Dias Coelho
´ ´ MuSICA SiMBOLO E PODER
Ensaio para uma introdução simbólica a estudos do arranjo produtivo da música
Copyright © Bruno Fontes Dias Coelho, 2015 Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei nº 9.610, de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou transmitida, sejam quais forem os meios empregados, sem a autorização prévia e expressa do autor.
Editor: João Baptista Pinto Capa: Luiz Guimarães Projeto Gráfico e Editoração: Luiz Guimarães Revisão: Gloria Nogueira
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
C614m Coelho, Bruno Fontes Dias Música, símbolo e poder: ensaio para uma introdução simbólica a estudos do arranjo produtivo da música / Bruno Fontes Dias Coelho. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Letra Capital, 2015. 194 p. : il. ; 15,5x23 cm. Inclui bibliografia anexos ISBN 978-85-7785-401-1 1. Música - Aspectos sociais. 2. Musica e antropologia. 3. Cultura. I. Título.
15-25381 CDD: 306.4 CDU: 316.72 06/08/2015
06/08/2015
Letra Capital Editora Telefax: (21) 3553-2236/2215-3781 letracapital@letracapital.com.br
Agradecimentos Agradeço a todos que de alguma forma me ajudaram nessa caminhada em busca de respostas, uma busca recheada de alegrias pelas descobertas, e de um misto de decepção e estímulo pelo que ainda é preciso desvendar. Agradeço ao meu orientador prof. Dr. Gilmar Rocha que, sempre muito atencioso, não se importava em ler e comentar textos que por vezes pareciam rascunhos. Agradeço ao meu pai, prof. Dr. Franklin Dias Coelho que também me orientou, não apenas durante esse trabalho, mas ao longo da vida, me ensinando desde sempre a existência de outros valores mais importantes que os financeiros, bem como a importância de colocar em prática o conhecimento adquirido. Ao prof. Dr. Leandro Mendonça que coordenou o Diagnóstico da Cadeia Produtiva da Cultura na Região da Baixada Litorânea, confiando em minha capacidade para abordar o setor da música: sem a sua coordenação, não seria possível a realização deste trabalho. Aos demais participantes do projeto – Marcelo, Carlos Henrique e Mônica que contribuíram, com empenho e esforço, na realização de algo que ainda carece de marco conceitual. Ao prof. Dr. Luiz Manoel Silva de Figueiredo que, mesmo coordenando tantos projetos, dedicou seu tempo para também me auxiliar. Aos meus amigos de república, Richard, Dani e Cintia com os quais convivi nesses anos de faculdade que sempre nos proporcionaram calorosas discussões sobre questões e textos abordados em sala. Aos meus amigos Jeff, Dinho, Daniel, Thomaz, Guilherme e Vitor, da banda Coletivo 22, e Ricardo, com os quais tive a oportunidade de compor, tocar, fazer apresentações e emocionar pessoas, ainda que por vezes essas pessoas fôssemos nós mesmos. Aos demais integrantes desse coletivo que não só se apresentou musicalmente, mas com trabalhos performáticos. A todos os produtores do Lá-Tá-Rolando com os quais trabalhei e aos que continuam esse lindo projeto que mostra a verdadeira cara artística de Rio das Ostras, fomentando a cultura através de sua perspectiva mais pura e generosa. À Laís dos Passos Lara, que com suas conversas e paciência muito me inspirou e me deu forças para chegar ao final. A todos os professores que passaram por minha vida e que muito me acrescentaram como ser humano. À turma 2009.1 e a todos com quem convivi durante a graduação, mas que não citei devido ao curto espaço: tenham a certeza de minha gratidão, pois todos me ensinaram algo. Aos meus irmãos Diogo e Tatiana, minha mãe Ângela Maria Mesquita Fontes e minha família.
Cultura como tudo aquilo que, no uso de qualquer coisa, se manifesta para além do mero valor de uso. Cultura como aquilo que, em cada objeto que produzimos, transcende o meramente técnico. Cultura como usina de símbolos de um povo. Cultura como conjunto de signos de cada comunidade e de toda a nação. Cultura como o sentido de nossos atos, a soma de nossos gestos, o senso de nossos jeitos. (GILBERTO GIL, 2003, discurso de posse no Ministério da Cultura).
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Sumário Nota do Autor........................................................................................ 11 Prefácio.................................................................................................. 13 Introdução............................................................................................. 15 1 – Estudos de Cadeia Produtiva........................................................ 25
1.1Estudos Anteriores de Cadeia Produtiva da Música............... 33
2 – Diagnóstico do Arranjo Produtivo da Música de Rio das Ostras................................................................................ 47
2.1 Metodologia............................................................................. 48
2.1.1 Metodologia de Análise Quantitativa........................... 52
2.2 Análises dos Elos..................................................................... 55
2.2.1 Estúdios........................................................................... 55
2.2.2 Rádios.............................................................................. 58
2.2.3 Artistas............................................................................ 60
2.2.4 Estabelecimento (Rio das Ostras)................................. 68
2.3 Conclusão.................................................................................. 78
3 – Introdução Simbólica para Estudos do Arranjo Produtivo da Música...................................................................... 81
3.1 Marco conceitual, visão sistêmica........................................... 82
3.2 Fractal, como visão sistêmica.................................................. 84
3.3 Cultura como Teia de Signos e Significados......................... 91
3.3.1 Limites, Ressalvas e Considerações............................. 100
3.3.2 O Caso Zeca Pagodinho............................................... 102
3.4 Ritual...................................................................................... 108
3.4.1 O Caso Sergio Ricardo................................................ 120
3.5 Dádiva..................................................................................... 123
3.5.1 O Caso Jimi Hendrix.................................................... 137 Música Símbolo e Poder
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4 – Apontamentos para Possíveis Estudos e Debates..................... 140 4.1 Símbolos Referenciados – Potencial Modelo de Negócio (formação de cadeias produtivas).................... 140
4.2 Poder do Símbolo Referenciado........................................... 142
4.3 Cultura como Fator de Desenvolvimento Econômico........ 145
4.4 Disputa por Referência e o Gargalo Simbólico................... 149
5 – Conclusão...................................................................................... 154 Referências........................................................................................... 161 Anexos do I ao IX Diagramas de Cadeias Produtivas...................... 165 Anexos do X ao XIV Formulários de Pesquisa.................................. 175 Anexos do XV ao XVIII Visão sistêmica, Fractal e Mapa da Dádiva................................................................................... 189
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Anexos I – Fluxograma da Cadeia Produtiva da Madeira no Estado do Paraná1 II – Diagrama do Fluxo Físico do Segmento da Madeira Serrada no Paraná1 III – Configuração Básica da Cadeia Produtiva Têxtil e de Confecções2 IV – Representação Esquemática de uma Cadeia Produtiva de Produto de Origem Vegetal, Segundo Metodologia da Embrapa3
V – Cadeia Produtiva da Economia da Música4
VI – Rede da Economia da Música4 VII – Cadeias de Prestação de Serviços/Produção de Música para Programas da TV Globo / Projac4 VIII – Cadeia Produtiva do Turismo Musical de Conservatória4 IX – Cadeia Produtiva do Rock in Rio4
X – Formulário de Pesquisa; Elo Estúdio5
XI – Formulário de Pesquisa; Elo Rádio5 XII – Formulário de Pesquisa; Elo Artistas5 XII – Formulário de Pesquisa; Elo Estabelecimentos5 1 BORELLI, Willian Polzl; SANTOS, Anadalvo Juazeiro dos; TIMOFEICZYK, Romano Jr.; POLZL, Priscilla Klingelfus. Cadeia Produtiva do Processamento Mecânico da Madeira - Segmento da Madeira Serrada no Estado do Paraná; Revista Floresta 33(2), p. 127-134, 2003. 2 ANTERO, Samuel A. Articulação de políticas públicas a partir dos fóruns de competitividade setoriais: a experiência recente da cadeia produtiva têxtil e de confecções. RAP, Rio de Janeiro, p.40 (1):57-80, Jan./Fev. 2006 3 SILVA, Luís César da. Cadeia Produtiva de Produtos Agrícolas. Departamento de Engenharia Rural, Universidade Federal do Espírito Santo, Boletim Técnico: MS: 01/05, 2005. 4 ALKMIM, Antônio Carlos; PRESTES FILHO, L. C.; FILGUEIRAS, Liesel M; RODRIGUES, Pedro Argemiro; ARAUJO, Moacyr de Oliveira; REZENDE, Sérgio Cidade de; SANCHES, Sydney. Cadeia Produtiva da Economia da Música, 2005. Respectivamente p. 30; 16; 109; 112; 138; 152. 5 Formulário proposto para o setor musical, durante a aplicação do projeto, Diagnóstico da Cadeia Produtiva da Cultura na Região da Baixada Litorânea, contemplado pelo edital Proext-2010.
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XIV – Formulário de Pesquisa; Elo Público5 XV – Conceito de Hierarquia de Sistemas6 XVI – Aplicação do Enfoque Sistêmico à Análise Prospectiva6 XVII – Cadeia Produtiva Linear – fig. 14 XVIII – Mapa Cultural do Pacífico7
6 CASTRO, A.M.G. de; LIMA, S.M.V.; CRISTO, C. M. P. N.; Cadeia Produtiva: Marco Conceitual para Apoiar a Prospecção Tecnológica. XXII Simpósio de Gestão da Inovação Tecnológica, 2002. Respectivamente p.5; 10. 7 http://en.wikipedia.org/wiki/File: Pacific_Culture_Areas.jpg
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Nota do Autor
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aros leitores, é com imenso prazer que escrevo esta nota para recepcionar vocês, se me permitem, queria fazer como fez Roberto Damata em “A Casa e a Rua”, dizer para vocês ficarem a vontade, acharem um cantinho bem confortável, não repararem na bagunça e irem entrando sem cerimónia, ao ler este livro quero que vocês sintam-se em casa, mas em uma casa contemporânea. Pois aqui, o que venho lhes mostrar é um dialogo entre ideias de diversas ciências, duas mais especificamente, a economia e a antropologia. E como todo bom papo no Brasil, o ideal era que fosse acompanhado de cerveja e petiscos, contudo enquanto trabalho cientifico, deve ser respaldado em fatos, pesquisas e métodos. Para os estudiosos do tema e amantes das ciências espero que todo o livro seja um prato cheio, um almoço farto e servido com a melhor das intenções. Aos músicos e players deste mercado que estão lendo esse livro em busca de ideias e ações objetivas, sugiro dispensar os pés de paginas e o primeiro capítulo onde são discutidos aspectos ligados aos estudos da cadeia produtiva, questões importantes, porém mais relevantes aos que desejam se aprofundar cientificamente no tema. E que fiquem atento aos casos do capitulo três, pois são neles que são demonstrado na prática a importância do que queremos dizer com a teoria. Não podia deixar de comentar que o livro todo é uma busca incessante por entender como as questões simbólicas, tão relevantes para a cultura, se inserem economicamente em um mercado onde o principal diferencial é a própria cultura. O titulo do livro é uma inteira homenagem ao livro do André Midani, esse grande homem de negócios e da cultura, um génio perspicaz que ao longo de sua vida na “indústria do disco”(como ele mesmo gosta de chamar) produziu músicas não só de artistas, mas de movimentos artísticos, passando por três gerações da música brasileira, que vão desde a “turma” da bossa nova, Gil e Caetano na tropicália, até os Rock and Roll do Barão Vermelho nos anos 80, podendo colocar nessa “sacola” o samba rock de Jorge Ben. Sem pessoas como ele, com entendimento de relações simbólicas e econômicas, gerindo modelos de Música Símbolo e Poder
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negócios e grandes estruturas de distribuição oferecidas pelas Majors à esses artistas, provavelmente não teriam sucesso naquele momento, ou então levariam muito mais tempo para difundirem suas músicas perante ao grande público. Coisas que aconteceram com o primeiro álbum independente do Tim Maia e também com o grande álbum Sinceramente de Sergio Sampaio. Fazendo uso das palavras de André Midani, buscamos a todo o momento “manter o equilíbrio entre o sagrado (a música) e o profano (o lucro).” Em seu livro “Música, Ídolos e Poder – do vinil ao download” Midani conta a sua incrível história, mas também nos deixa muitas pistas e nos faz crer que ao buscarmos o entendimento entre o “sagrado e o profano”, estamos na verdade nos munindo de ferramentas que podem nos ajudar a melhorar o desempenho de sistemas sociais e econômicos. Fazer com que o mercado funcione da melhor maneira para maximizarmos os retornos em termos de benefícios sociais e econômicos de forma coletiva para todos os envolvidos deste arranjo produtivo. O que inclui você leitor, mesmo que nunca tenha produzido ou vendido música, é um consumidor ávido por aquilo que ela pode nos proporcionar de melhor, sentimentos e emoções; e compartilha isso. Contudo, para se chegar a este ponto a questão que temos que encarar de fato é; como gerar mais recursos e distribuí-los melhor para o setor como um todo? Como disse Tolila “Pensar a economia do setor cultural é uma arma para a cultura”. Quem esta lendo este livro em busca de respostas definitivas para essas perguntas eu aconselho parar no capitulo 4, ou por aqui mesmo. Pois, o que faremos a seguir não é definir respostas de forma impositiva, mas sim abrir caminho em um campo pouco explorado academicamente, e como tal, que sirva ao recrutamento e estimulo de novos exploradores, e que estes sejam insaciáveis pela busca das respostas, mas também adeptos da luta por uma produção cultural em que os valores do sagrado e do profano se unam para promover a cultura, por essência um bem público, pertencentes a todos os indivíduos que dela participam e que por isso merece que seja tratada com honestidade e respeito. Bom, sem mais delongas: Sirvam-se, o almoço esta na mesa!
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Prefácio
U
ma das maiores alegrias que um autor vivencia é o comentário de um leitor. Como pai e como professor é com muita satisfação que dou esta alegria ao autor. O trabalho de Bruno Coelho é instigante pelo próprio tema na medida que são raros os estudos acadêmicos que se propõem a dialogar sobre economia e cultura. O olhar econômico sobre a indústria cultural quando muito reconhece a ausência de dados para uma análise com maior profundidade. Mas não se trata apenas de dados mais de um marco conceitual que consiga dar conta desta relação entre economia e cultura. A esta tarefa gigante, o autor se propõe a navegar sem determinar um porto seguro, mas deixando algumas pistas que devem ser seguidas. A primeira delas a dimensão simbólica e a lógica econômica de estruturação das cadeias produtivas. O debate sobre cadeias produtivas têm seguido uma lógica linear e industrial, integrando fases de processamento e montagem com o processo de comercialização. É instigante a hipótese de que este encadeamento produtivo da indústria cultural não segue esta lógica linear. O estudo envereda por caminho exploratório de repensar o desenho do arranjo produtivo da música a partir da articulação dos agentes econômicos com uma visão sistêmica, interdependente e com uma estrutura fractal em processo contínuo de adaptação e aprendizagem. A dimensão fractal reafirma uma não linearidade, um caminho dinâmico de realimentações, de integração entre histórias herdadas e imagens futuras que sugere caminhos de pesquisa dos agentes econômicos dentro deste novo design da produção cultural. Deste modo, a cultura aproxima a economia da natureza e da vida cotidiana. Não o traçado linear das maioria das cadeias produtivas, mas trata-se de absorver as linhas irregulares, as reentrâncias, as saliências, as formas irregulares que são objeto dos fractais. Estruturas que não se enquadram nas dimensões espaciais e temporais da teoria econômica. E este caminho exploratório se torna mais desafiador quando o Música Símbolo e Poder
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autor introduz a dimensão simbólica, procurando identificar os signos que realimentam as estruturas fractais. Surge o espaço de cultura multiforme, desenhando esta teia de signos e significados que se reestruturam e se realimentam a partir da dimensão simbólica. Não tanto uma estrutura caótica, nem mesmo geométrica, mas aleatória em função de atos gestos e ações que a resignificam e reconstroem seus fragmentos, determinando hierarquias e fluxos de um ethos cultural . Como que navegando na busca dos olhares que estruturam e reestruturam fragmentos do arranjo fractal produtivo da música, somos levados aos caminhos antropológicos dos ritos e de suas dimensões simbólicas. O palco ganha um espaço de ressignificação do sentido de nossos atos, a soma de nossos gestos, o senso de nossos jeitos. E estas são as primeiras palavras do estudo de Bruno, citando Gilberto Gil em seu discurso de posse como Ministro da Cultura que transforma o texto num caminho inexorável na busca de um novo paradigma para a construção de um marco conceitual que integre economia, cultura e antropologia. Franklin Dias Coelho Professor Doutor da Universidade Federal Fluminense
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Introdução
O
presente trabalho busca trazer à luz de uma perspectiva simbólica um estudo que ao longo de anos foi tratado apenas com visão economicista. Este livro representa um esforço de demonstrar a relevância de uma perspectiva simbólica da cultura no mercado da música, perante a ferramenta de análise econômica, a Cadeia Produtiva. Um ferramental econômico que ainda exige adequações para o entendimento das variáveis adicionais que a cultura apresenta ao setor. Os estudos sobre Cadeia Produtiva visam uma otimização da produção. Tal otimização foi revista por alguns autores como Porter (1989), Shank & Govindarajan (1993) como sendo necessária uma perspectiva mais ampla, baseada em uma concepção de valor para toda a cadeia, não somente de lucro para determinado agente.8 Essas análises sempre foram largamente utilizadas em diversos setores da economia, como o varejista, automobilístico, agroindustrial, entre outros. Mas só a partir da última década alguns autores vêm tentando trazê-las para o mercado cultural. De acordo com a metodologia proposta por Castro et. al.(2002),9 os estudos de cadeia produtiva devem ser “enfocados em termos de desempenhos de sistemas sociais e econômicos onde a tecnologia vai operar, o que implica a necessidade de se adotar a visão holística”. Para possibilitar essa visão holística, Castro propõe a adoção da visão sistêmica, e afirma que o “conceito de cadeia produtiva é uma derivação dessa base conceitual” (p.5). A visão sistêmica consiste em uma tentativa de trabalhar diversas áreas do conhecimento buscando a formulação de limites, hierarquia e modelos que tentariam explicar a forma pela qual essas ciências interagem. Existiriam modelos dentro de sistemas e deveriam ser elencadas forças propulsoras e restritivas, fatores de produção, cenário externo e interno entre outras questões capazes de influenciar o desempenho final do setor em termos sociais e econômicos (Anexo XVI). Tal modelo pode ser considerado um marco conceitual, já que determina uma forma que relativiza o 8 ROCHA, Welington; BORINELLI, Márcio Luiz. Análise Estratégica de Cadeia de Valor: Um Estudo Exploratório do Segmento Indústria-Varejo (2007). 9 Criou um marco conceitual para apoiar estudos relacionados a cadeias produtivas legitimado pelo XXII Simpósio de Gestão da Inovação Tecnológica, de 2002, no qual nos basearemos para tentar introduzir uma conceituação de cultura aos estudos.
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modelo de cadeia produtiva, possibilitando a adoção do mesmo para diversos setores, onde existe a influência vertical de outras disciplinas. Como exemplo, temos o setor agrário, que sofre influências do meio ambiente, geográficas e biológicas; o setor energético, que depende de questões físicas e muitas vezes também de questões ambientais e geográficas; ou outros setores como o da madeira, que recebem mais forças restritivas em termos legislativos. Sendo assim, os estudos de cadeia produtiva da música já haviam sinalizado a necessidade de um modelo mais adequado às características do setor. Prestes (2005), que escreveu o primeiro livro traçando o primeiro panorama de cadeia produtiva da música no Brasil declara: Sem entender todas as especificidades de cada detalhe das cadeias produtivas da economia da cultura, não poderemos interferir nas mesmas para democratizar e harmonizar a produção cultural. (p.11,2005)
Apesar de importante, esse primeiro estudo não buscou entender as especificidades simbólicas do setor, pois segundo o próprio estudo, era mais importante traçar um primeiro panorama, um modelo estático, do que seria a cadeia produtiva da música e quais atores se articulam nessa cadeia. No entanto, para alguns estudiosos e pesquisadores da cadeia produtiva da música tal panorama pareceu ser muito próprio da cadeia produtiva do fonograma, e não da música como colocou o Diagnóstico da Cadeia Produtiva da Música em Belo Horizonte: Enquanto o trabalho referente ao Rio de Janeiro focalizava as gravadoras e os CDs, o presente diagnóstico busca entender, sobretudo, as peculiaridades da cadeia produtiva da música de Belo Horizonte. (p.53, 2010).
Este diagnóstico elencou o artista como principal foco de suas pesquisas, porém também não adentrou as questões simbólicas sob uma perspectiva antropológica: Embora a dimensão antropológica seja considerada a “mais nobre”, em função da amplitude do próprio conceito, não se traduz 16
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em política cultural, em virtude, principalmente, da imensa dificuldade de definição de mecanismos que viabilizem sua prática. (p.10,2010)
Entretanto, para desfrutarmos de tal ferramenta é necessário que sejam feitas adequações com o intuito de se encontrar visões mais coerentes com as especificidades simbólicas da cultura. Diante da forte percepção da existência de importantes relações que não são reproduzidas pelas ferramentas da economia tradicional é que desenvolvo esse trabalho, na tentativa de criar um ferramental capaz de propor tais adequações. Apesar do déficit por parte das ferramentas da economia tradicional, Keynes em 1928, segundo Tolila (2007), numa “intuição de gênio”, já pressentia o que está para acontecer neste século XXI: Suponhamos para fins de argumentação que daqui a cem anos estaremos todos, em média, em condições de vida, economicamente falando, oito vezes superiores às que conhecemos hoje. Não há nisso, seguramente, nada que deva nos surpreender. Ora, é verdade que as necessidades dos seres humanos podem parecer insaciáveis. Mas elas entram em duas categorias: as necessidades que têm um caráter absoluto, nesse sentido em que nós as sentimos, seja qual for a situação de nossos semelhantes, e as que têm um caráter relativo, porque nós só as sentimos se a sua satisfação nos alçar acima de nossos semelhantes, nos der o sentimento de lhes sermos superiores. As necessidades que entram na segunda categoria, as que respondem ao desejo de superioridade, podem, com efeito, ser insaciáveis; porque quanto mais se eleva o nível geral, mas elas continuam a crescer. (Keynes, 1928, apud Tolila, p.27,2007). [Grifo do autor]10
Os produtos culturais se inserem dentro desta segunda categoria. Apesar desta conferência, durante os séculos de estudos econômicos o autor declara que houve um desinteresse mútuo entres os agentes da economia convencional e do setor cultural sobre as discussões frias da economia. Em períodos de forte desenvolvimento, tudo vai bem, TOLILA, Paul. Conferência pronunciada em 1928 e intitulada Perspectivas econômicas para nossos netos. p.26. 2007.
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