Sobre ocultismo

Page 1



D. Estêvão Bettencourt, O.S.B.

Sobre o Ocultismo Mater Ecclesiae


Copyright © Arquidiocese do Rio de Janeiro, 2016 Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da Escola Mater Ecclesiae, poderá ser reproduzida ou transmitida, sejam quais forem os meios empregados.

Editor João Baptista Pinto

Capa e Editoração Luiz Guimarães

Revisão Luiz Cláudio Moraes Correia

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.

B466s Bettencourt, Estêvão, 1919-2008 Sobre o ocultismo Mater Ecclesiae / Estêvão Bettencourt. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Letra Capital, 2016. 584 p. : il. ; 15,5x23 cm. Inclui bibliografia e índice ISBN 978-85-7785-463-9 1. Deus - Doutrina bíblica. 2. Espírito Santo - Doutrina bíblica. 3. Jesus Cristo. 4. Santíssima Trindade. I. Título. 16-33316 CDD: 231 CDU: 27-14 24/05/2016

25/05/2016

Escola Mater Ecclesiae Edifício João Paulo II Rua Benjamin Constant, 23 - sala 311 - Glória CEP 20241-150 – Rio de Janeiro - RJ Tefefax: (21) 2242-4552

Letra Capital Editora

Telefax: (21) 3553-2236/2215-3781 letracapital@letracapital.com.br


Apresentação

Caro(a) amigo(a), O curso sobre ocultismo passou por uma revisão geral, feita de modo generoso e magistral pelo experiente professor, o Sr. Luiz Cláudio Moraes Correia. Nesta revisão foram suprimidos alguns capítulos cujos temas hoje não mais se mostram tão relevantes e, por outro lado, outros foram acrescentados, como por exemplo, os capítulos básicos de definição de Parapsicologia e Esoterismo; bem como outros com temas relevantes e atuais, como por exemplo, sobre a festa de Halloween e sobre Exercícios corporais e respiratórios e Mantras... O cursista perceberá que muitos exemplos dados ao longo do curso são muito antigos, até do século passado. Contudo, cabe esclarecer que tais exemplos já foram devidamente estudados pela Parapsicologia, especialmente referentes à parte I de nosso curso, Fenômenos Mediúnicos, o que faz com que tais exemplos sejam considerados clássicos para os fenômenos aí estudados. Por isso, a necessidade de os mantermos na exemplificação. Esperamos que os cursistas e demais leitores cresçam espiritualmente com a leitura destas páginas e possam ajudar também aos fieis mais incautos, para que estes não andem, como diz São Paulo, “ao sabor das ondas” e “arrastados por qualquer vento de doutrina” (cf. Ef 4,14). Pe. Fabio da Silveira Siqueira Vice-diretor Escolas de Fé e Catequese Mater Ecclesiae e Luz e Vida Maio/2016

Sobre o Ocultimo Mater Eccleciae 3



Apresentação do Revisor

Caro(a) amigo(a), Foi para mim uma grande alegria receber o convite da direção desta Escola para revisar tão magnífica obra de um dos maiores teólogos do Brasil, quiçá do mundo, o “gigante” D. Estêvão Bettencourt, OSB, com quem pude colaborar durante vários anos, não só auxiliando na correção de vários de seus cursos por correspondência, como também, fazendo parceria com o douto e sábio mestre nos programas diários Pergunte e Responderemos da rádio Catedral (FM 106,7 MHz), emissora de nossa Arquidiocese. Quantos artigos aí apresentados não foram esclarecedores a mim e ao público que nos escutava! Assim o fiz por alguns anos, até os últimos programas gravados em abril/2008, uma semana antes de ele partir para a casa do Pai. Conhecendo o mestre bem de perto, pude perceber seu carinho, dedicação e grande sabedoria em procurar esclarecer as dúvidas dos ouvintes e cursistas que lhe chegavam por e-mail, telefone ou correspondência, sempre muito bem fundamentado na doutrina da Igreja, nos ensinamentos do Magistério e na Sagrada Escritura. Tal aprendizado foi fundamental para que, agora, neste trabalho de revisão/atualização deste curso, eu pudesse me esforçar para procurar manter o seu jeito de esclarecer o povo de Deus, sempre muito eficaz, no qual amava aqueles que têm dúvidas, mas odiava o erro e o pecado. Assim, pude me servir de seus valiosos artigos sobre assuntos relacionados ao Ocultismo, publicados na, então, Revista Pergunte e Responderemos após o lançamento deste curso por correspondência, ocorrido ainda em fins do século passado, para que pudessem passar a compor grande parte desta revisão, mantendo-se assim, a originalidade e a genialidade de seu autor.

Sobre o Ocultimo Mater Eccleciae 5


Por fim, faço votos que esta nova versão do Curso sobre Ocultismo possa contribuir para esclarecer as dúvidas dos irmãos que buscam se orientar sobre as coisas fantasiosas que o mundo apresenta, aprofundando cada vez mais a sua fé católica em Cristo, único Salvador, e na Sua Igreja! Bons estudos e que o Espírito Santo o(a) ilumine nesta caminhada! Abraços,

Luiz Cláudio Moraes Correia Maio/2016

6 Sobre o Ocultimo Mater Ecclesiae


Apresentação Original de D. Estêvão Bettencourt, OSB

Caro(a) cursista, Iniciamos um Curso sobre Ocultismo, isto é, sobre fenômenos estranhos, para os quais não se tem uma explicação visual e que, por isto, são atribuídos a causas ocultas e misteriosas. Há uma tendência espontânea, em muitos, a admitir um mundo invisível que intervenha em nosso mundo, seja para o bem, seja para o mal. O cristão sabe que, de fato, Deus e, por permissão de Deus, os anjos e os Santos podem atuar maravilhosamente no curso natural das coisas; sem dúvida, ocorrem milagres. Mas a fé afirma que não se devem admitir intervenções do além sem que haja credenciais para tanto. Antes de crer, devo perguntar: por que crer? Por que aceitar esta ou aquela proposição (aparição de uma entidade superior, cura milagrosa, mensagem profética...)? Na base de que dados ou de que testemunhos eu acreditaria? No setor da religião, os sentimentos e as emoções tendem a se antecipar ao raciocínio; o senso religioso férvido inspira, muitas vezes, a imaginação e a fantasia sem o acompanhamento da lógica. Especialmente em nossos dias isto se verifica: os tempos são ingratos, os problemas socioeconômicos se multiplicam e não se vê, de pronto, uma solução racional ou científica para os mesmos. A consequência é que o homem abatido ou desesperado se deixa facilmente seduzir pela proposta de soluções mágicas e portentosas, mas irracionais e, não raro, perniciosas. Já o livro dos Atos dos Apóstolos registra um acontecimento típico em que as emoções religiosas comandaram irracionalmente a conduta dos homens. Com efeito, a população de Éfeso, cultora da deusa Diana, julgava que esta era ofendida pela pregação de São Paulo. Em consequência, a multidão se aglomerou no teatro da cidade totalmente confusa; Sobre o Ocultimo Mater Eccleciae 7


a maior parte nem sabia por que estavam reunidos... gritaram por quase duas horas: É grande a Diana dos efésios! Interveio, então, o escrivão da cidade, incitando a população à calma e ao raciocínio (cf. At 19,23-40). Ora, a fim de ajudar o público a se orientar diante dos fenômenos portentosos que tanto impressionam, segue-se, à guisa de modesto subsídio, uma série de capítulos distribuídos em seis segmentos, como se pode ver no verso desta folha. Possam ser úteis à reflexão dos usuários! Caro cursista, desejamos-lhe bons estudos, sob as luzes de Deus, ao mesmo tempo que nos colocamos à sua disposição para os possíveis esclarecimentos.

Pe. Estêvão Tavares Bettencourt, O.S.B.

8 Sobre o Ocultimo Mater Ecclesiae


Índice Geral Introdução Capítulo 1: Esoterismo.......................................................... 17 Capítulo 2: Parapsicologia....................................................27 SÉRIE I: Fenômenos Mediúnicos...................................................39 Capítulo 3: Noções Básicas. Origens do Espiritismo.......... 41 Capítulo 4: Sugestão.............................................................. 49 Capítulo 5: Sugestão e Transe.............................................. 57 Capítulo 6: O Arquivo do Inconsciente. A Pantomnésia e a Xenoglossia........................ 67 Capítulo 7: Curas Maravilhosas (I)...................................... 77 Capítulo 8: Curas Maravilhosas (II).....................................85 Capítulo 9: Os Despachos. Telepatia....................................93 Capítulo 10: Faquirismo, Visão Dermoótica, Pintura Mediúnica. Mau Olhar.................................... 101 Capítulo 11: Telecinésia. Evocação dos Mortos. Quiromancia.................................................... 111 Capítulo 12: Casas Mal-Assombradas.................................. 121 Capítulo 13: Psicografia. Percepção Extra-Sensorial. Precognição...................................................... 129 Capítulo 14: A Psicofonia (Vozes do Além). Chico Xavier..................................................... 137 Capítulo 15: Incorporação dos Espíritos (I)........................ 145 Capítulo 16: Incorporação dos Espíritos (II)....................... 153 Capítulo 17: Experiências Fora do Corpo (EFC)................ 161 Capítulo 18: Universo em Desencanto................................. 169 Capítulo 19: O Racionalismo Cristão.................................. 177

Sobre o Ocultimo Mater Eccleciae 9


Capítulo 20: A Reencarnação............................................... 187 Capítulo 21: São Cipriano Mago.......................................... 199 Capítulo 22: Superstição.......................................................207 Capítulo 23: A Festa de Halloween...................................... 219 Série II: O Maravilhoso no Cristianismo Capítulo 24: O Milagre.........................................................227 Capítulo 25: A Existência do Demônio...............................239 Capítulo 26: Possessão Diabólica......................................... 249 Capítulo 27: O Satanismo Hoje............................................ 259 Capítulo 28: Os Porcos precipitados no Mar (Mc 5, 1-20)......269 Série III: Sabedoria Oriental Capítulo 29: Jesus dos 12 aos 30 anos (I)............................. 281 Capítulo 30: Jesus dos 12 aos 30 anos (II)...........................293 Capítulo 31: Jesus viveu na Índia?........................................ 301 Capítulo 32: Os Manuscritos do Mar Morto....................... 315 Capítulo 33: A Teosofia......................................................... 327 Capítulo 34: Antroposofia e Panteísmo...............................335 Capítulo 35: Exercícios Corporais e Respiratórios e os Mantras.....................................................343 Série IV: Profecias e Terapias Capítulo 36: O Terceiro Segredo de Fátima........................ 355 Capítulo 37: A Profecia de S. Malaquias.............................363 Capítulo 38: Nostradamus (I)............................................... 373 Capítulo 39: Nostradamus (II).............................................. 381 Capítulo 40: Tarô e Numerologia........................................ 391 Capítulo 41: A Cabala...........................................................399 Capítulo 42: O “I Ching”......................................................409 10 Sobre o Ocultimo Mater Ecclesiae


Capítulo 43: O Horóscopo.................................................... 419 Capítulo 44: A Logosofia......................................................429 Capítulo 45: As Pirâmides.................................................... 441 Série V: Sociedades Secretas Capítulo 46: A Maçonaria (I)................................................ 451 Capítulo 47: A Maçonaria (II)..............................................459 Capítulo 48: A Rosa-Cruz..................................................... 467 Capítulo 49: A Ordem Renovada do Templo......................483 Série VI: Mistérios Cósmicos Capítulo 50: A Atlântida (I)..................................................493 Capítulo 51: A Atlântida (II)................................................. 501 Capítulo 52: O Triângulo das Bermudas (I).......................509 Capítulo 53: O Triângulo das Bermudas (II) “Eram os Deuses Astronautas?”..................... 517 Capítulo 54: Erich Von Däniken. Habitantes em outros Planetas? (I)................ 527 Capítulo 55: Erich Von Däniken. Habitantes em outros Planetas? (II)............... 535 Capítulo 56: Os Discos Voadores.........................................543 Capítulo 57: A Ilha de Páscoa............................................... 555 Capítulo 58: A Nova Era (New Age). O Holismo................565 Capítulo 59: A Eubiose.......................................................... 575

Sobre o Ocultimo Mater Eccleciae 11


Bibliografia AQUINO, Felipe (org.). A Nova Era. Documento do Vaticano. Jesus Cristo, portador da água viva. 6ª ed. Editora Cléofas, Lorena-SP. 2008. ________. Falsas doutrinas, seitas e religiões, 17ª ed. Editora Cléofas, Lorena-SP. 2015. ________. O cristão diante da morte, 7ª ed. Editora Cléofas, Lorena-SP. 2010. ________. O que são as indulgências?, 7ª ed. Editora Cléofas, LorenaSP. 2010. ________. O Purgatório. O que a Igreja ensina, 7ª ed. Editora Cléofas, Lorena-SP. 2010. ________. Os Anjos. Com as 7 catequeses do Papa João Paulo II, 6ª ed. Editora Cléofas, Lorena-SP. 2010. BALDUCCI, Corrado. O diabo, vivo e atuante no mundo. 2 ª ed. Editora Mir. São Paulo-SP. 2005. BARBET, Pierre. Paixão de Cristo segundo o cirurgião. 12ª ed. Editora Cléofas e Edições Loyola, Lorena-SP, São Paulo-SP. 2014. BELLINATO, Guilherme. Paulo: Cartas e mensagens. Edições Loyola, São Paulo-SP. 1979. BETTENCOURT, Estevão T. Crenças, religiões e seitas: quem são? 8ª ed. Editora Mensageiro de Sto. Antonio. Santo André-SP. 2012. ________. Curso de Diálogo Ecumênico por correspondência. Mater Ecclesiae. Rio de Janeiro-RJ. ________. Curso de História da Igreja por correspondência. Editora Letra Capital. Rio de Janeiro-RJ. 2012. ________. Curso de Iniciação Teológica por correspondência. Editora Letra Capital. Rio de Janeiro-RJ. 2013. ________. Hinduísmo e yoga: sim ou não? Opúsculo. Mater Ecclesiae. Rio de Janeiro-RJ. ________. Homeopatia e Espiritismo, Florais de Bach e Nova Era. Opúsculo. Mater Ecclesiae. Rio de Janeiro-RJ. ________. O Budismo. Opúsculo. Mater Ecclesiae. Rio de Janeiro-RJ.

12 Sobre o Ocultimo Mater Ecclesiae


________. Por que não sou maçom? Opúsculo. Mater Ecclesiae. Rio de Janeiro-RJ. ________. Por que não sou rosa-cruz? Opúsculo. Mater Ecclesiae. Rio de Janeiro-RJ. ________. Por que não sou espírita? Opúsculo. Mater Ecclesiae. Rio de Janeiro-RJ. ________. Reencarnação: prós e contras. Opúsculo. Mater Ecclesiae. Rio de Janeiro-RJ. ________. Os sonhos que significam? Opúsculo. Mater Ecclesiae. Rio de Janeiro-RJ. CATECISMO da Igreja Católica, Edição Típica Vaticana, Edições Loyola, São Paulo-SP. 2000. DANIN, Avinoan. Flores e Plantas do Santo Sudário: a história das imagens das flores no Santo Sudário de Turim. Editora Cléofas. Lorena-SP. 2014. DENZINGER, Heinrich, HÜNERMANN, Peter. Compêndio dos Símbolos, definições e declarações de fé e moral. 40ª ed. Edições Paulinas e Edições Loyola. São Paulo-SP. 2007. DREYFUSS, François. Jesus sabia que era Deus? Edições Loyola, São Paulo-SP, 1987. FABO, José A. U. O segredo da Maçonaria desvendado. Editora Diel. Lisboa, Portugal. 2009. FANTONI, Bruno A. L. Magia e Parapsicologia. Edições Loyola, São Paulo-SP. 1977. FRIDERICHS, Edvino A. Onde os espíritos baixam, Edições Loyola, São Paulo-SP. 1979. ________. Casas mal-assombradas. Edições Loyola, São Paulo-SP. 1980. ________. Panorama da Parapsicologia ao alcance de todos. 6ª ed. Edições Loyola, São Paulo-SP. 2004. GOMES, Cirilo F. Riquezas da Mensagem Cristã. Edições Lumen Christi. Rio de Janeiro-RJ. 1981. HUBER, Georges. O diabo, hoje. Editora Quadrante, São Paulo-SP. 1999. KLOPPENBURG, Boaventura. Espiritismo. Orientação para os católicos. 8ª ed. Edições Loyola, São Paulo-SP. 2005.

Sobre o Ocultimo Mater Eccleciae 13


________. Espiritismo e fé. Editora Quadrante, São Paulo-SP. 1988. ________. A Umbanda no Brasil. Editora Vozes, Petrópolis-RJ. LABURU, José A. Jesus Cristo é Deus? Editora Cléofas e Edições Loyola, Lorena-SP, São Paulo-SP. 2013. LAPPLE, Alfred. A mensagem dos Evangelhos hoje. Edições Paulinas, São Paulo-SP. 1971. LATOURELLE, René. Jesus existiu? Editora Santuário, Aparecida-SP, 1989. MACINTYRE, Archibald J. Os Anjos. Uma realidade admirável. 3ª ed. Edições Louva a Deus. Rio de Janeiro-RJ. 1991. QUEVEDO, Oscar G. A face oculta da mente, 19ª ed. Edições Loyola, São Paulo-SP. 2003. ________. As forças físicas da mente, Tomos 1 e 2, 11ª ed. Edições Loyola, São Paulo-SP. 2003. ________. Curandeirismo, um mal ou um bem? Edições Loyola, São Paulo-SP. 1976. ________. O que é Parapsicologia. 36ª ed. Edições Loyola, São PauloSP. 2009. SOLIMEO, Gustavo A. SOLIMEO, Luiz S. Anjos e Demônios. A luta contra o poder das trevas. 4ª ed. Editora ArtPress. São Paulo-SP. 2006. TERRA, João E. M. Maçonaria e Igreja Católica. 9ª ed. Editora Santuário. Aparecida-SP. 2007.

14 Sobre o Ocultimo Mater Ecclesiae


Introdução



Capítulo 1:

Esoterismo

CAPÍTUlo 1: Esoterismo 17


Antes de estudarmos os fenômenos paranormais, ditos aqui “mediúnicos”, iniciamos nosso estudo, percorrendo algumas noções gerais nesta ampla temática que nos ajudarão a melhor entender as lições seguintes.

Lição 1 Que se entende por Esoterismo1? 1.1. Esoterismo? Esoterismo é a denominação dada ao sistema que reserva suas doutrinas e práticas “aos de dentro” (esóteroi, em grego), ou seja, a iniciados ou adeptos rigorosamente selecionados. Consequentemente, o esoterismo também é conhecido por ocultismo, termo proposto e defendido por Papus († 1922). Na verdade, o Esoterismo ou Ocultismo abrange hoje em dia diversas modalidades ou escolas (a Cabala, a Gnose, a Astrologia, a Teosofia, a Rosa-Cruz, correntes espíritas e maçônicas...), as quais professam um fundo comum de doutrinas secretas. Essas doutrinas, conforme os esotéricos, se devem a “revelações sobrenaturais” e destinam-se (à semelhança de uma dinamite) a produzir efeitos maravilhosos, dando ao homem o poder sobre si mesmo, sobre a natureza e sobre os acontecimentos futuros. Ora, justamente porque uma pessoa comum seria capaz de fazer mau uso de tão valiosos conhecimentos, os esotéricos dizem só os manifestar a pessoas rigorosamente provadas, recorrendo, além disso, a fórmulas simbólicas e obscuras. Mais precisamente, os esotéricos alegam que as ciências propriamente ditas estudam os fenômenos visíveis e experimentais, enquanto eles pretendem analisar o conjunto de energias invisíveis da natureza, de Deus e do homem, adquirindo um conhecimento muito mais profundo de tudo o que nos cerca. Consequentemente, os ocultistas julgam possuir em plenitude a verdade que as ciências, e também as religiões, só em parte atingem.

1

PR nº 19, 1959, pp. 278-286.

18 Introdução


1.2. Breve histórico do Esoterismo Pode-se dizer que o esoterismo, como tendência do homem a cultivar doutrinas e práticas secretas, sempre existiu. As civilizações mais antigas (da Índia, da Mesopotâmia, do Egito...) apresentam seus documentos de caráter ocultista. No decorrer dos séculos, crenças e ritos desse gênero se foram avolumando em consequência de combinações com teses da filosofia grega assim como na literatura judaica e cristã (ou seja, com a Bíblia Sagrada). Durante a Idade Média, o ocultismo tomou um aspecto bem marcante na chamada Cabala; embora, no ambiente da Europa cristã, fosse geralmente repudiado por parecer um conchavo com o demônio. Do séc. XV em diante, com o surgimento do Humanismo, o esoterismo tomou nova importância. A tendência dos Renascentistas a cultivar os valores antigos fez que mais e mais apreciassem as proposições secretas do ocultismo, tidas como ensinamentos de veneráveis civilizações orientais. Desde fins da Idade Média, apareceram no cenário dos eruditos alguns que procuravam combinar entre si Ciência e Religião (ou mística) a fim de dar a explicação mais completa possível aos mistérios do mundo. Por exemplo, pode-se citar: Cornélio Agripa (1486-1541), autor da “Filosofia oculta”, o qual reatou a tradição de Pitágoras e Platão, instruídos pelos “adivinhos de Mênfis”; Paracelso (1493-1541), que, junto com a fama de “saber tudo”, obteve a glória de haver descoberto o “segredo da vida” (por isto, seu nome originário Filipe Teofrastes Bombart foi mudado para Auréolo Paracelso, o divino personagem); o sapateiro Jacob Boehme (1575-1625), o marquês Cláudio de S. Martinho (1743-1803), o conde de S. Germano, José Balsamo, também chamado Cagliostro, no séc. XVIII; particularmente famoso tornou-se Fabre d’Olivet (1767-1825), que na sua obra “La langue hébraique restitueé” pretendeu reconstituir as origens da linguagem, reconstruir o edifício do idioma hebraico primitivo e, mediante códices encontrados nos santuários do Egito, penetrar o sentido profundo da cosmogonia de Moisés (Gênesis 1). Finalmente é tido como pai do Ocultismo contemporâneo um certo Eliphas Lévi, cujo verdadeiro nome era Alphonse-Louis Constant (1810-1875), sacerdote apóstata. Merecem ainda especial menção Estanislau de Guaita (1860-1899), historiador do esoterismo, e CAPÍTUlo 1: Esoterismo 19


Gérard Encausse († 1922), dito “Papus”, que procurou exprimir os ensinamentos do ocultismo em linguagem científica moderna. Atualmente, no Brasil o ocultismo existe em múltiplas entidades “científico-religiosas” de caráter secreto ou semi-secreto (instituições espíritas, maçônicas, teosóficas, cabalistas, etc.).

1.3. Principais ensinamentos do Ocultismo O ocultismo, sob as variadas tonalidades que tomou no decorrer da sua história, apresenta estrutura doutrinária bem característica, a qual pretende fornecer a chave de todos os problemas. No esoterismo, dizem seus adeptos, unem-se as teses e antíteses de todos os sistemas filosóficos e religiosos, dando uma síntese tecnicamente chamada “mátese”. Podemos agrupar sob três grandes títulos as principais proposições ocultistas: 1.3.1. Monismo ou unidade fundamental Dizia Eliphas Lévi que “o que existe, existe na unidade considerada como princípio, e volta à unidade considerada como fim. Um está em um, isto é, tudo está em tudo”. Isso significa que todos os seres visíveis e invisíveis constituem uma única realidade, que se esmiúça e fragmenta no mundo, tomando múltiplos aspectos parciais. Ora, daí decorre imediatamente que não existe um Deus distinto do mundo. O Deus de que fala o esoterismo, é o eterno “vir a ser”, substância a qual tudo procede por emanação e à qual tudo volta. Ainda outro aspecto do Monismo é que a matéria sensível, revestindo diversas aparências, pode ser convertida de uma modalidade para outra. Daí, entre os ocultistas, há o cultivo da antiga Alquimia ou da arte que tenta transformar os diversos metais em ouro, metal perfeito. Os metais, aliás, são seres vivos, ensinam os esotéricos; os metais inferiores se acham numa fase de desenvolvimento incompleto, que pode ser finalizado, bastando, para isso, encontrar um fermento adequado ou “a pedra filosofal”, que leve a natureza dos corpos à amadurecer. Vários ocultistas, dentre eles, Paracelso, visavam dominar o organismo e curar-lhe as doenças mediante influência sobre o pensamento do enfermo, pois, afirmam, 20 Introdução


o pensamento humano condensa em si tudo que há de divino e de humano no mundo. 1.3.2. O homem, miniatura do Universo O homem é considerado no ocultismo como o compêndio, pois tem um lugar especial no conjunto dos seres visíveis. É como o microcosmos dentro do macrocosmos, daí havendo uma correlação entre cada elemento do homem e o seu análogo no Universo. Ou melhor, o homem contém em si todas as energias dos seres inferiores. Reciprocamente, cada animal irracional não é senão a materialização de uma energia latente no homem. Conforme os ocultistas, o homem se compõe de três partes essenciais: o espírito (elemento espiritual), o corpo (elemento material) e o mediador ou corpo astral, períspirito, por vezes também, chamado de alma (elemento fluídico). Desses três elementos, o que mais interessa ao esotérico é o terceiro, o corpo astral, que desempenha funções da máxima importância. É composto de luz, em parte fixa, e em parte volátil (fluido magnético). Consequentemente, o corpo astral emite irradiações que criam em torno do indivíduo uma atmosfera própria chamada de “aura astral”, que pode ser percebida de forma colorida por alguém que goze de sentidos mais apurados. Segundo os ocultistas, é pelo corpo astral que eles podem tomar conhecimento de coisas passadas e futuras, experimentar sentimentos e pressentimentos alheios, interpretar sonhos, passar por um êxtase profético, etc. Afirmam mesmo que o espaço está povoado de uma multidão de seres, pois todos os nossos pensamentos e desejos emitem uma imagem de si que passa a vaguear pelos ares. Caso algum desses seres errantes venha a pousar no cérebro de alguém, diz-se que esta pessoa recebeu uma sugestão, uma inspiração boa ou má... e que tal ideia “está no ar”, sendo capaz de afetar simultaneamente vários cérebros...! 1.3.3. O visível, manifestação do invisível Ainda como consequência de que só há uma substância, o ocultista ensina que todos os seres materiais são representações dos imateriais. Isto não significa que as coisas visíveis sejam meros sinais das invisíveis, mas sim, que a realidade visível é a própria realidade invisível contemplada sobre outro aspecto; essa única realidade é CAPÍTUlo 1: Esoterismo 21


matéria para os sentidos físicos e é espírito para os sentidos astrais. Logo, tudo que se vê, há de ser considerado como símbolo do que não se vê e, na escola esotérica, todo conhecimento profundo se obterá por via do simbolismo. Tais premissas explicam o apreço que o esoterismo consagra às imagens: comumente se vê estranhas figuras nos ambientes ocultistas, em que silhueta de um homem (ou membros humanos) aparece enquadrada dentro de triângulos e círculos, serpentes, cruzes, espadas, flechas, caracteres hebraicos, números, etc. Tais símbolos são tidos como princípios de malefícios ou benefícios ao sujeito que os usa. Para o ocultismo, por exemplo, os símbolos dos quatro evangelistas (o homem, o touro, o leão e a águia) são identificados com as quatro características da esfinge, ou seja, com o ocultismo egípcio: a esfinge tem quatro flancos, um de touro, outro de garras de leão, de asas de águia e de cabeça de homem. Em resumo, dizem os esotéricos, que as atitudes desses quatro animais (calar-se, ousar, querer e saber) são as quatro características básicas do Ocultismo, assim como, os quatro Evangelhos são os livros fundamentais do Cristianismo.

Lição 2 O que dizer sobre o Esoterismo? 2.1. Monismo ou panteísmo O Esoterismo é essencialmente monista ou panteísta. Ora, tal posição filosófica se opõe totalmente à sã razão, vindo a ser simplesmente absurda ou ilógica. Isto é o que desacredita radicalmente o esoterismo perante a inteligência humana.

2.2. O corpo astral Ora, um elemento particular que não seja propriamente nem corpo nem espírito, mas participe da natureza de ambos, é inconcebível, pois o corpo ou a matéria (ainda que fluida) é algo de quantitativo, tendo suas partes justapostas, seu peso e suas características sensíveis; ao passo que o espírito vem a ser justamente a contradi22 Introdução


ção (não somente o contrário) dessas características. Ora, entre dois termos contraditórios (constar de partes, peso,... e não constar de partes, não ter peso...) não há meio-termo, segundo nos ensina a Lógica. Assim, todo ser é simplesmente ou corpo (matéria) ou espírito. O ser humano é composto por dois componentes: o corpo material e a alma espiritual; e, não, de corpo, alma e espírito ou períspirito... A alma humana é criada diretamente por Deus no momento da fecundação do óvulo pelo espermatozoide, gerando o ovo ou zigoto da espécie humana, ou seja, novo ser humano. Portanto, a alma humana é o seu espírito, imagem e semelhança de Deus; logo, por ser espiritual, a alma humana é também imortal, pois que é criada por Deus uma vez para todo o sempre, sem fim. Além dessas considerações, o progresso das ciências atuais leva os estudiosos a explorar os fenômenos chamados de “psi-gama” e “psi-kapa”, fenômenos que supõem na alma humana faculdades de conhecer objetos à distância, independentemente do tempo e do espaço. As novas pesquisas levam a admitir na mesma alma que é sede dos sentidos externos e internos até hoje conhecidos, a existência de uma nova faculdade de conhecimento, cujo funcionamento ainda não é todo claro, mas que nada tem a ver com alguma duplicata do espírito ou períspirito. Aliás, a Parapsicologia, ciência que estuda tais fenômenos para além da normalidade, dispensa por completo o postulado ilógico do períspirito.

2.3. Visível e invisível O ocultismo simplesmente afirma suas proposições sem apresentar os respectivos argumentos; baseia-se, antes, sobre a analogia que deve unir todos os elementos, visíveis e invisíveis, entre si. Ora, é necessário que se reconheça que comparação não é razão, analogia não é lógica; semelhança extrínseca não pode ser tomada como sinal de afinidade extrínseca. No tocante aos símbolos dos quatro evangelistas, de modo nenhum a Sagrada Escritura nos propõe tais símbolos. Tal comparação se deve exclusivamente à exegese que de Ez 1 e Ap 4,6-8 os escritores cristãos fizeram nos primeiros séculos. Seria vão, por conseguinte, na base de uma interpretação periférica querer deduzir alguma afinidade entre os Evangelhos e a esfinge esotérica do Egito. CAPÍTUlo 1: Esoterismo 23


Percebe-se que, para dar às suas doutrinas a autoridade que o raciocínio não lhes confere, os esotéricos apelam para fontes de saber antiquíssimas, como seriam os arquivos dos sacerdotes ou dos sábios da China, da Índia, do Egito, etc. Porém, o fazem em vão, pois a ninguém é dado abordar essas pretensas fontes, a fim de averiguar o seu valor histórico.

Uma palavra final Após reflexão serena, o estudioso parece obrigado a afirmar que o gigantesco edifício do ocultismo não se deriva de algum manancial objetivo de sabedoria, mas constitui uma das mais espontâneas projeções da fantasia humana. Na verdade, todo homem tem consciência de ignorar, e ignorar muita coisa. Porém, possui uma grande sede de saber ou de devassar os mistérios da natureza que o cercam. Não podendo penetrar nesses desígnios unicamente pela força do raciocínio, o homem se sente naturalmente tentado a forjar a chave que lhe abra os segredos do mundo; daí, dá livres asas à imaginação e, mediante esta, concebe uma mistura de teorias incapazes de resistir a sério exame da razão; na falta de lógica, é a analogia que o guia. Tal atitude pseudofilosófica poderá ser inspirada pela megalomania que afeta o homem ambicioso. Colocado diante dos seus textos sagrados, o esotérico os folheia e disseca, conta as respectivas letras e as soma, observa e compara as formas dos caracteres, etc, esperando que dessa trituração do texto jorre a grande luz que ilumine as trevas onde está submerso o mundo. Tal arte ou “febre”, depois de certo tempo, o deixa “embriagado”, não aceitando em absoluto o controle da razão que um amigo lhe venha a oferecer; muitos chegam, por vezes, às raias da loucura e, até do isolamento e do suicídio. É assim que se desmoronam os mais imponentes edifícios fundados sobre os sonhos da megalomania humana. Sem dúvida, existem profundos mistérios na natureza. Seja, porém, o homem sóbrio em relação a eles e não pretenda afirmar a respeito, aquilo que o Autor da natureza, Deus, não lhe tenha revelado!

24 Introdução


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.