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NUNES

CAPÍTULO 4

OS ARGUMENTOS E PROPOSTAS DE PAULO DA SILVA NUNES

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Neste capítulo, analisaremos o cerne da documentação redigida por Paulo da Silva Nunes em sua campanha antijesuítica realizada durante sua presença na Corte, desde 1724, e, paralelo a isso, sua correspondência com o antigo governador do estado do Maranhão e Grão-Pará, Alexandre de Souza Freire (1728 e 1732). Propomo-nos a evidenciar os elementos discursivos fundamentais do procurador e de seu principal aliado, na época à frente do governo do Maranhão. Nesses documentos e cartas, encontramos desde “remédios” para tirar a colônia da suposta situação de “ruína” em que se encontrava, até denúncias conta as ações “despóticas” dos jesuítas.

Debruçar-nos-emos sobre a estrutura discursiva da documentação e as repetições dos argumentos, que se desdobraram em diversos libelos, representações, cartas e ofícios. Destacamos que todos os documentos têm uma estrutura semelhante. A maioria inicia-se com o procurador informando acerca do tempo que já se encontra na Corte empreendendo sua campanha. Logo depois, apresenta o Maranhão e Grão-Pará como uma terra rica e promissora e, a seguir, elucida as razões pelas quais as potencialidades da região não se desenvolviam. Como nesse contexto ruína é uma palavra muito utilizada na documentação, com o sentido de uma crise ou um declínio contínuo, acreditamos ser necessário pesquisar seu significado em um dicionário contemporâneo aos textos. Dessa feita, buscamos a elucidação do termo segundo o dicionário Rafael Bluteau, de 1728. Na obra lexicográfica consta:

Ruína. Definição. A ruína de um edifício. Ruina, a. Fem. Cic. Calas màs [sic], & que ameação [sic] ruína. AEdes malè materiala, e ruinosa, arum. Plur. Fem. Cic.

As ruínas de hum edifício, as pedras, o madeyramento, & outros materiais, cahidos no chão. Parietine, arum. Fem. Plur. Cic. Dizem, que naquelle tempo, a casa, em que Scopas dava o banquete, cahio, & elle com a sua gente morreo debaixo das ruínas. Hoc interium Spatio ferunt conclave illud, ubi epularetur Scopas, concidisse, e a ruina ipsum oppressum com suis, interiisse Cic. Ficarão os outros debayxo das ruínas da casa. Ruina camer a oppressit ceteros Phed. A ruína de pessoas particulares de hua Cidade, Província, República, & c. Ruina, pernicies, ei. Fem. Exitium, ii. Neut. Cic. Fabricar a sua fortuna sobre as ruínas alheyas. Ex afflictâ alicujus fortunâ suam fortunam excitare, ou amplificare. Ex incommodis aliorum sua comparare cômoda. Tiveste tu atrevimento para procurar juntamente com Gabinio a minha ruína? Tu ne ausus es cum Gabinio consociare consilia pestis mea? Cic. Conhecerás que trato com muyto mayor cuydado do bem da Republica, que tu da ruína della. ntelliges, me multo vigilare acriùs ad salutem, quàm te ad perniciem Reipublica. Cic. Ser causa da ruína de alguém. Esse exitio alicui, ou exitium. Virgil465 .

O conceito de ruína alicerçava-se em três aportes principais constituídos como ameaça: a ruína material, a de pessoas e a de lugares (Cidade, Província, República), causadas por intempéries ou por má intenção de terceiros. Nos documentos de Paulo da Silva Nunes e Alexandre de Souza Freire, esses três elementos aparecem imbricados, pois, para eles, a riqueza das igrejas, dos colégios e dos aldeamentos jesuíticos contrastava com a pobreza das cidades de São Luís e de Belém, refletida nas condições dos moradores impossibilitados de produzir o suficiente para pagar os dízimos à fazenda real e desenvolver as potencialidades do Estado.

Essa percepção da realidade possuída pelo procurador e pelo governador não estavam direcionados somente contra a Companhia de Jesus, mas também contra a legislação da época, avaliada por uma considerável parcela de oficiais régios, camaristas e colonos como demasiadamente favorecedora da Ordem inaciana. Como já afirmamos anteriormente, o cerne das críticas foi o Regimento das Missões, uma lei concebida especificamente para a Amazônia

465 BLUTEAU. Vocabulário portuguez e latino, vol. 7, p. 397.

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