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Imagem 8. Baluarte segundo o Tratado Methodo Lusitanico
Imagem 8. Baluarte segundo o Tratado Methodo Lusitanico.
A figura trata o exemplo do desenho dos ângulos e baluartes de uma fortaleza presente no Methodo Lusitanico. Na imagem, pode-se verificar a preocupação geométrica do traçado presente na medida dos ângulos. Conforme explica Serrão Pimentel, uma das principais máximas da construção era que possibilitasse, mesmo na fortificação irregular, a regularidade sempre que possível dos seus ângulos. Condição que segundo ele, teria conseguido no método apresentado “com tanto extremo que, em todas as figuras por mais irregulares que sejam, fortificadas dos lados dos polígonos exteriores para dentro, fica cada um dos lados fortificados regularmente”. Circunstância que em “nenhuma figura irregular fortificada nos livros e métodos dos autores pude descobrir”.366 A façanha teórica nem sempre foi possível na prática. Fortificações que “englobavam povoações, cidades e vilas nunca foram perfeitamente regulares de ‘tratado’, adaptando-se às pré-existências e, por isso, não se podendo desenvolver como os engenheiros desejariam”.367 Pedro Dias explica que se pode verificar a característica regular em pontos estratégicos de grande importância
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366 PIMENTEL, Luís Serrão. Methodo Lusitanico de Fortificar as Praças Regulares e Irregulares, p. 14. 367 DIAS, Pedro. História da Arte luso-brasileira. Urbanização e fortificação, p.108.
para o império, como por exemplo, “Goa, Macau, Cochim, Moçambique, Luanda, Rio de Janeiro, Pernambuco e Salvador”.368 Luís Serrão Pimentel previa núcleos de povoamento dentro das praças. Todavia, em locais onde já se estabelecia uma povoação, a irregularidade da construção era inevitável, conforme veremos adiante.
O conhecimento sobre a arte de fortificar as praças tornou-se em Portugal uma política institucionalizada a partir das aulas de arquitetura e engenharia militar e, principalmente, da formação de engenheiros nacionais. O Methodo Lusitânico é uma expressão da tentativa em consolidar e marcar a fronteira desse conhecimento. Trata-se de uma ação que integrava uma série de medidas que, no século XVII, tornaram-se centrais para a restauração do trono português.
Outro grande representante dessa fase de transformações foi Manuel de Azevedo Fortes, professor de matemática na Aula de Fortificação e Arquitetura Militar em Lisboa, de 1695 até 1701. Em 1702, foi nomeado capitão de infantaria com o posto de engenheiro. No reinado de D. João V, em 1719, foi nomeado engenheiro-mor do reino. Era português nascido em Lisboa, em 1660.
Na obra Engenheiro Português, Azevedo Fortes explica que a importância do conhecimento sobre arquitetura e engenharia era central para o Estado português. Chama a atenção para os poucos exemplares do Methodo Lusitanico, que compusera Luís Serrão Pimentel, em um momento em que, segundo ele, “lograva grande crédito, e reputação o Methodo de Fortificar as Praças à holandesa de Dogen, Golgdman, Freitag, Marolois, e outros autores de cujos métodos já hoje não se usa nas mais nações da Europa”.369
A referência a teóricos da arquitetura e engenharia militar expressa a influência estrangeira em Portugal – das escolas italiana, francesa, holandesa e alemã –, para a construção de um conhecimento de engenheiros nacionais. Felipe Eduardo Moreau explica que a escola italiana com a invenção do sistema abaluartado foi a base para os demais tratadistas. Todavia, holandeses e franceses elaboraram formas mais sofisticadas, que incluíam complexo
368 Idem, p. 109. 369 FORTES, Manoel de Azevedo. O engenheiro portuguez: dividido em dous tratados. Obra moderna, de grande utilidade para os engenheiros, e mais officiaes militares. Tomo I. Lisboa Ocidental: na
Officiana de Manoel Fernandes da Costa, Impressor do Santo Officio, 1728-1729. Biblioteca
Nacional de Portugal. Disponível em: http://purl.pt/14547
conhecimento sobre matemática, geometria e trigonometria. A escola holandesa, por exemplo, aprimorou alguns elementos da fortaleza, ampliou o uso do fosso aquático, o sistema de muralhas, baseado em cortinas pequenas e flancos perpendiculares. Observa-se essa perspectiva em tratados de fortificação de Adam Fritrach e Matthias Dogen.370
Ainda no prólogo do Tomo I de O Engenheiro Portuguez (1728), Azevedo Fortes refere-se ao livro Fortificação moderna afirmando que se tratava não de um método, mas de “uma compilação de vários métodos, que podem mais servir para notícia histórica do que para dar abertura de entendimento e facilidade aos principiantes”.371
Em sua obra são citados métodos dos que ele chama de célebres autores: Antonio de Ville, o Conde de Pagan e o marechal Vauban. Esses elementos são indícios da circularidade do conhecimento no campo da arquitetura e engenharia militar na Europa moderna. Além disso, indica que Portugal estava inserido nesse processo não como mero receptor de informações, mas também como aquele que interpreta e constitui tratados nacionais.
A influência e conhecimento dos tratados europeus pelos lusos é ainda destacado por Frei Bernardo do Desterro, na análise de censura da obra de Azevedo Fortes. Destaca o religioso que “se verá então praticada uma nova ordem de Arquitetura Militar à portuguesa, além dos que conhecemos até agora à italiana, à francesa e à holandesa”372 Nas estampas 3 e 7 do tratado o Engenheiro Portuguez de Azevedo Fortes é possível observar a influência de Vauban nos traçados.373
370 MOREAU, Filipe Eduardo. Arquitetura Militar em Salvador da Bahia, séculos XVI a XVIII. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação da FAU-USP, São Paulo, 2011. p. 45. 371 FORTES, Manoel de Azevedo. O engenheiro portuguez, Tomo I. 372 Idem. 373 FORTES, Manoel de Azevedo. O engenheiro portuguez: dividido em dous tratados. Obra moderna, de grande utilidade para os engenheiros, e mais officiaes militares. Tomo II. Lisboa Ocidental: na
Officiana de Manoel Fernandes da Costa, Impressor do Santo Officio, 1728-1729. Biblioteca
Nacional de Portugal. Disponível em: http://purl.pt/14547