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Maus-tratos Infantis e Saúde: Consequências das Experiências Adversas na Infância
Teresa Magalhães e Maria João Vidal-Alves
Introdução A infância constitui um período crítico do desenvolvimento individual. Durante este período, mas sobretudo nos primeiros três anos de vida, o cérebro encontra-se em rápido desenvolvimento, tanto a nível das funções menos complexas, como a nível das mais específicas, incluindo as que se relacionam com os ciclos de sono, ansiedade, regulação de emoções e processamento de informação. A evolução das estruturas cerebrais influencia, de forma sequencial e previsível, o desenvolvimento mental e o seu estudo permite avaliar o impacto do meio neste mesmo processo (Semrud-Clikerman & Teeter Ellison, 2009). Assim, a perspetiva neurodesenvolvimental é fundamental para a compreensão do impacto do trauma na saúde. Tal como as patologias do desenvolvimento, a vivência do stress, sobretudo se traumático, em idades precoces, tem um potencial disruptivo cujas consequências podem variar de acordo com uma multiplicidade de fatores e com a interação entre estes (Doyle & Cicchetti, 2017; Frick, Barry, Christopher, & Kamphaus, 2010). Por isso, o impacto do stress em crianças e jovens (C/J) nos primeiros anos de vida, enquanto causa direta de disfunção do desenvolvimento, constitui uma área de atuação prioritária, estando demonstrado que o stress está na origem de um maior risco de morbilidade na idade adulta e de menor esperança média de vida (Shonkoff, 2016; Shonkoff & Garner, 2012).
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Podem distinguir-se diferentes tipos de resposta ao stress, tendo em conta o seu efeito sobre o organismo humano e, muito particularmente, sobre crianças mais novas (Shonkoff, 2010; Shonkoff, Boyce, & McEwen, 2009): ■
Positivo,
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Tolerável;
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Tóxico.
O primeiro é inerente ao funcionamento normal e saudável, podendo ser desencadeado por estímulos como a aplicação de uma vacina. O segundo é mais ativador e, pela sua maior intensidade, dura mais tempo, mas pode ser atenuado por uma relação responsiva e positiva com adultos significativos (Semrud-Clikerman & Teeter Ellison, 2009; Shonkoff, 2017), pois esse efeito apaziguador permitirá ao sistema nervoso regressar ao seu estado normal sem haver um resultado negativo desse stress; pode acontecer quando a C/J se magoa ou perde alguém que lhe é querido. O último tipo de resposta ocorre quando há uma vivência adversa de stress prolongada, como no caso dos maus-tratos, exposição à violência ou à privação do suprimento de necessidades 41