Economia e Política no Turismo

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Índice Geral Prefácio........................................................................................................................

XI

Prólogo à 1.ª Edição.................................................................................................... XIII Prólogo à Versão de 2006............................................................................................ XVII Sobre o Autor............................................................................................................... XVIII

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Lista de Siglas Utilizadas............................................................................................ XIX Capítulo 1 – Introdução.............................................................................................. 1.1 Turismo: Problemas de Definição....................................................................... 1.1.1 Conceitos de Lazer, Recreio e Turismo.................................................... 1.1.2 Definição de Turista................................................................................. 1.2 Questões Epistemológicas................................................................................... 1.3 Âmbito da Economia do Turismo........................................................................

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Capítulo 2 – O Turismo no Mundo............................................................................ 2.1 Evolução do Turismo e Suas Características....................................................... 2.1.1 Idade Clássica ou Primitiva...................................................................... 2.1.2 Idade Moderna.......................................................................................... 2.1.3 Idade Contemporânea............................................................................... 2.1.3.1 Características da Evolução do Turismo na Idade Contemporânea.......................................................................... 2.2 Perspetivas de Evolução do Turismo................................................................... 2.3 O Turismo na Economia Mundial....................................................................... 2.4 O Turismo em Portugal........................................................................................ 2.4.1 Etapas de Desenvolvimento do Turismo Português................................. 2.4.1.1 Primeira Etapa: 1900 a 1950. Infância....................................... 2.4.1.2 Segunda Etapa: 1950 a 1963. Adolescência.............................. 2.4.1.3 Terceira Etapa: 1963 a 1973. Maioridade.................................. 2.4.1.4 Quarta Etapa: 1974 a 2000. Maturidade.................................... 2.4.2 Evolução Recente..................................................................................... 2.4.3 Distribuição Espacial do Turismo Português........................................... 2.4.4 Posição do Turismo Português no Turismo Mundial...............................

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Capítulo 3 – Motivações Turísticas............................................................................ 3.1 Conceito de Motivação........................................................................................ 3.2 Teorias das Motivações........................................................................................ 3.2.1 Teorias do Conteúdo.................................................................................

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Economia e Política do Turismo

3.3 Importância do Estudo das Motivações............................................................... 3.4 Teorias das Motivações Turísticas: Métodos de Avaliação................................. 3.4.1 Dicotomia Evasão/Descoberta................................................................. 3.4.2 Modelo das Necessidades de Viagens...................................................... 3.4.3 Modelo dos Fatores push e pull de Crompton.......................................... 3.4.4 Abordagem Funcional.............................................................................. 3.4.5 Aplicações da Teoria de Herzberg............................................................ 3.5 Perfis Psicográficos.............................................................................................. 3.6 Consequências do Estudo das Motivações para os Destinos..................................... Anexo I. Estudo de Caso: As Motivações dos Turistas que Visitam Portugal.............

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Capítulo 4 – A Procura Turística............................................................................... 4.1 Noção e Formação da Procura Turística.............................................................. 4.2 Utilidade Turística............................................................................................... 4.3 Elasticidades da Procura Turística....................................................................... 4.4 Consumo Turístico............................................................................................... 4.4.1 Classificação do Consumo Turístico em Função da Origem dos Visitantes.................................................................................................. 4.4.2 Função do Consumo Turístico.................................................................. 4.5 Determinantes da Procura Global (macrodeterminantes)....................................... 4.5.1 Determinantes Estruturais........................................................................ 4.5.2 Determinantes Conjunturais..................................................................... 4.5.3 Fatores Psicossociológicos.......................................................................

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Capítulo 5 – A Oferta Turística.................................................................................. 5.1 Noção, Características e Classificação................................................................ 5.2 Destinos Turísticos.............................................................................................. 5.3 Produtos Turísticos.............................................................................................. 5.3.1 Principais Produtos Turísticos.................................................................. 5.3.1.1 Sol e Mar.................................................................................... 5.3.1.2 Golfe.......................................................................................... 5.3.1.3 Turismo de Saúde e Bem-estar.................................................. 5.3.1.4 Turismo de Natureza: Ecoturismo............................................. 5.3.1.5 Turismo Desportivo................................................................... 5.3.1.6 Turismo no Espaço Rural........................................................... 5.3.1.7 Turismo de Negócios................................................................. 5.3.1.8 Turismo Religioso...................................................................... 5.3.1.9 Turismo Cultural........................................................................ 5.3.1.10 Turismo Residencial..................................................................

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Índice Geral

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5.3.2 Estratégia de Desenvolvimento Baseada em Produtos Turísticos............ 229 5.4 Função da Produção Turística.............................................................................. 232 5.5 Elasticidade da Oferta Turística........................................................................... 235 Capítulo 6 – O Mercado Turístico............................................................................. 6.1 Conceito e Caracterização do Mercado Turístico................................................ 6.2 Elementos Básicos do Mercado Turístico........................................................... 6.3 Desequilíbrios do Mercado.................................................................................. 6.3.1 Fatores Estruturais de Desequilíbrio........................................................ 6.3.2 Fatores Conjunturais de Desequilíbrio..................................................... 6.4 A Questão dos Preços em Turismo...................................................................... 6.4.1 Determinação dos Preços......................................................................... 6.5 Efeitos do Lançamento de um Imposto...............................................................

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Capítulo 7 – Teorias Justificativas e Competitividade do Turismo Internacional... 7.1 Introdução............................................................................................................ 7.2 Vantagens Comparativas...................................................................................... 7.3 Teoria das Dotações Fatoriais.............................................................................. 7.4 Teoria das Vantagens Competitivas..................................................................... 7.4.1 Aplicação ao Turismo............................................................................... 7.5 Procura Interna.................................................................................................... 7.6 Utilidade das Diferentes Teorias.......................................................................... 7.7 Competitividade dos Destinos Turísticos............................................................

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Capítulo 8 – Efeitos Económicos do Turismo........................................................... 8.1 Delimitação do Turismo como Fenómeno Económico....................................... 8.1.1 Identificação das Atividades Turísticas.................................................... 8.1.2 Enquadramento do Turismo na Atividade Económica............................. 8.2 Integração do Turismo na Política Económica Global........................................ 8.3 Classificação e Identificação dos Efeitos Económicos do Turismo..................... 8.4 Efeitos Sobre a Estratégia do Desenvolvimento.................................................. 8.5 Efeitos Sobre a Produção..................................................................................... 8.5.1 Multiplicador Turístico............................................................................. 8.5.2 Quadro das Relações Intersetoriais: A Análise Input-Output.................. 8.5.3 Análise Estrutural..................................................................................... 8.5.4 Análise do Custo-Benefício..................................................................... 8.6 Efeitos Resultantes dos Investimentos Turísticos................................................ 8.7 Efeitos Sobre o Emprego..................................................................................... 8.8 Efeitos Sobre a Balança de Pagamentos.............................................................. 8.9 Efeitos Sobre os Preços.......................................................................................

301 301 301 306 309 314 321 327 334 341 349 352 353 355 363 375 IX


Economia e Política do Turismo

8.10 Efeitos Sobre as Receitas Fiscais......................................................................... 8.11 Efeitos Sobre o Desenvolvimento Regional........................................................ 8.12 Efeitos Sobre o Consumo e Sobre os Comportamentos Sociais.......................... 8.13 Efeitos Sobre a Pobreza....................................................................................... 8.14 Efeitos Económicos Externos.............................................................................. Anexo 1......................................................................................................................... Anexo 2.........................................................................................................................

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Capítulo 9 – Turismo Sustentável: Avaliação Económica dos Recursos Turísticos. 9.1 Turismo Sustentável............................................................................................ 9.2 Necessidade de Avaliação dos Recursos Turísticos............................................. 9.3 Técnicas de Avaliação Económica....................................................................... 9.3.1 Método do Custo do Trajeto..................................................................... 9.3.2 Método dos Preços Hedonísticos............................................................. 9.3.3 Método da Avaliação Contingente........................................................... 9.4 Análise das Preferências dos Utilizadores...........................................................

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Capítulo 10 – Conta Satélite do Turismo.................................................................. 10.1 Antecedentes........................................................................................................ 10.2 Objetivos e Princípios Básicos............................................................................ 10.3 Procedimentos para a Obtenção da CST............................................................. 10.3.1 Abordagem da Procura............................................................................. 10.3.2 Abordagem da Oferta............................................................................... 10.3.3 Principais Agregados................................................................................ 10.4 Utilização da CST................................................................................................ 10.5 Conta Satélite do Turismo do Mundo..................................................................

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Referências Bibliográficas.......................................................................................... 437 Cronologia das Grandes Migrações, Viagens e Realizações com Influência no Turismo........................................................................................................................ 451 Índice Remissivo......................................................................................................... 457

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Prefácio O turismo é, em Portugal, e em vários outros países, um dos mais relevantes setores da atividade económica. A sua contribuição para a criação de riqueza e melhoria do bem-estar dos cidadãos faz-se sentir de múltiplas formas. Pela produção e emprego que cria, pelo investimento e inovação que promove, pelo desenvolvimento de infraestruturas coletivas que estimula, pela preservação do ambiente e recuperação do património histórico e cultural que favorece, pelas oportunidades de desenvolvimento regional que representa, pelas necessidades dos indivíduos que satisfaz. Poucos outros setores de atividade penetram e interagem em domínios tão diversos da sociedade. Em Portugal, o setor conheceu um forte crescimento nas duas últimas décadas e a produção a ele associada coloca-o entre os mais importantes da economia nacional. No entanto, o turismo surge ainda como uma atividade subalterna, mal conhecida e mal interpretada e objeto de pouca atenção política. Para uns, o setor parece resumir-se às receitas e despesas turísticas da balança de pagamentos ou ao número de dormidas na hotelaria. Para outros, o setor é associado, acima de tudo, a desordenamento urbanístico, a agressões ao meio ambiente, a sobrelotação de algumas estradas no verão ou a má qualidade do saneamento básico em certas localidades. A verdadeira importância do turismo na produção nacional e o seu contributo para o nível e qualidade de vida das populações parece merecer pouca atenção. Por outro lado, o turismo não tem suscitado muito interesse da parte dos investigadores das ciências sociais, predominando as análises superficiais e meramente descritivas. As medidas de política surgem pouco fundamentadas e muitas são incoerentes entre si e desinseridas de uma estratégia global de desenvolvimento. Os ensinamentos da teoria económica são geralmente ignorados, quer por analistas quer por decisores políticos. Daí o interesse e a oportunidade deste livro sobre Economia e Política do Turismo. O seu autor tem não só uma experiência única no setor, em particular na área das políticas, tendo desempenhado o cargo de Secretário de Estado do Turismo durante vários anos, como é também um estudioso profundo das questões económicas do turismo. Movido pela preocupação de rigor analítico, tem desenvolvido um esforço meritório para fundamentar as suas conclusões, recorrendo aos ensinamentos da teoria económica. Empenhado em criar uma consciência coletiva favorável ao turismo, o Dr. Licínio Cunha chama a atenção para a necessidade de encará-lo como uma atividade económica com identidade própria e não apenas como uma dimensão de outros setores que produzem bens e serviços que podem ser qualificados de turísticos. O livro cobre as questões essenciais da economia e política do turismo e é um auxiliar precioso para o leitor interessado na matéria precisar conceitos e indicadores, conhecer o XI


Economia e Política do Turismo

desenvolvimento do turismo português, debruçar-se sobre a procura e a oferta turística e os seus determinantes, estudar o funcionamento do mercado turístico, abordar a questão dos efeitos económicos do turismo e, ainda, familiarizar-se com algumas técnicas de avaliação dos recursos turísticos e obter uma perspetiva internacional de política de turismo. A publicação de um livro como este, que oferece uma base séria para o estudo das questões relevantes, é mais um contributo do Dr. Licínio Cunha para o desenvolvimento do turismo nacional. Com o seu estudo serão menores os riscos de se cometerem erros graves na abordagem dos problemas que o turismo português enfrenta, como a sazonalidade, a queda da receita por turista, os desvios da procura, ou a inadequação da oferta, e serão maiores as possibilidades de se pensar corretamente o futuro do setor. Aníbal Cavaco Silva

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Prólogo à 1.ª Edição

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«Pouco importa conhecer o grau de erro das nossas atuais teorias se formos honestos e cuidadosos nas nossas observações.» Lord Beveridge (citado por Lipsey em Introdução à Economia Positiva) Apesar de o turismo se ter transformado, neste final de século, numa das atividades económicas mais pujantes da nossa época e se ter estendido a todos os cantos do mundo, continua a ser encarado com grande displicência por parte de largos setores de opinião e a não merecer dos poderes políticos a atenção e os cuidados que a sua importância e a sua dimensão exigem. Não só é raro encontrar nas políticas económicas referências explícitas ao turismo, mesmo quando se justificaria que por elas fosse eleito como fator estratégico de desenvolvimento, como também são escassas as manifestações de real interesse nos debates ou nas tomadas de posição política, mesmo quando a atividade atravessa períodos de maior dificuldade. Não é de estranhar, por isso, que uma das grandes preocupações daqueles que dedicam maior atenção às questões que lhe respeitam, por razões profissionais ou por simples interesse intelectual ou afetivo, seja a de lutar pelo reconhecimento político do setor por considerarem que, nesta questão, reside uma das suas maiores fraquezas, constituindo, ao mesmo tempo, um forte constrangimento ao seu desenvolvimento. Ainda não há muitos anos, o secretário-geral da Organização Mundial de Turismo, defrontado com as dificuldades resultantes desta falta de reconhecimento, lançava a patética interrogação: «que outra atividade, em vias de se tornar a indústria mais importante do mundo, é tomada menos a sério a nível político e privado, nacional e internacional, como é o turismo?», o que traduz a perplexidade geralmente sentida perante a quase indiferença do poder político. Mais recentemente, o Parlamento Europeu e o Comité Económico e Social das Comunidades Europeias têm vindo a reclamar, insistente e sistematicamente, o expresso reconhecimento político do setor como condição para o seu desenvolvimento equilibrado e consonante com as respostas que tem de dar aos anseios do homem, mas sem resultados satisfatórios. A importância atribuída ao turismo, em muitos casos, é mera consequência da abordagem horizontal que parte do princípio que, dadas as inter-relações e interdependências que estabelece com uma vasta gama de setores da atividade, é em relação a eles que se justificam ações concretas para garantir o desenvolvimento do turismo. Segundo esta abordagem, o sucesso do turismo garante-se através da atribuição de uma dimensão turística aos transportes, ao desenvolvimento regional, às infraestruturas, ao ambiente ou à cultura. XIII


Economia e Política do Turismo

Não é dada ênfase particular ao turismo mas sim às atividades que lhe servem de suporte em virtude de não ser considerado como um setor de atividade: deste ponto de vista, o turismo não existe como atividade económica autónoma; o que existem são atividades que produzem bens e serviços consumidos pelos turistas. O excessivo recurso à abordagem horizontal no tratamento das questões do turismo e a ênfase que lhe é atribuída nas políticas que visam o desenvolvimento turístico, originam a sua subalternização e aumentam a dificuldade em consagrar uma perspetiva do turismo como atividade com identidade própria que não se limita à produção de bens e serviços mas, antes, a dar resposta às necessidades do homem na sua total integralidade. A abordagem horizontal permite reforçar a dimensão turística das atividades com que o turismo se relaciona mas limita o reconhecimento das suas verdadeiras dimensões, quer elas sejam económicas, sociais, políticas ou culturais. As razões explicativas do tratamento político que tem sido dado ao turismo radicam, principalmente, na juventude do seu desenvolvimento e no desconhecimento dos seus efeitos económicos e sociais. Para muitos, o turismo ainda tem o significado que a indústria tinha para os fisiocratas do século xviii, provavelmente por razões idênticas. De facto, o turismo, como atividade económica estruturada, é posterior à Segunda Guerra Mundial e só alcançou dimensão universal a partir da década de 60 e, ainda assim, na perspetiva apenas do turismo internacional em virtude das expetativas que criou como gerador de divisas. O efeito a que se atribuiu maior importância foi o da sua contribuição para atenuar os défices da balança comercial dos países com dificuldades na respetiva balança de pagamentos e, ainda hoje, o indicador mais utilizado para avaliar a sua importância económica resulta da comparação entre as receitas externas que gera e o produto interno bruto. A sua juventude é também razão do seu desconhecimento, não só no que respeita à sua importância, mas também no que respeita aos seus múltiplos e variados efeitos. Na maior parte dos países desconhece-se a sua participação na formação do produto interno, não se sabe quantas pessoas emprega e não se determinam os investimentos que nele são realizados. Mesmo a nível comunitário, as instituições da União Europeia afirmam, há dez anos consecutivos, que o turismo representa 5,5% do respetivo PIB, quando o número de países-. -membros se alterou, entretanto, e como se fosse possível que uma atividade mantivesse, sem alteração, o mesmo peso económico durante dez anos! As avaliações no domínio do turismo não são fáceis nem pacíficas em virtude, por um lado, da inexistência de uma metodologia própria e, por outro, de não ser possível delimitar o turismo como um setor produtivo da atividade económica já que é o ato de consumo que define uma produção como turística. Também a determinação dos seus efeitos se defronta com inúmeras dificuldades por se estenderem a domínios muito vastos e obrigarem ao recurso a uma multiplicidade de disciplinas: história, sociologia, economia, antropologia, etnografia, psicologia e geografia, entre outras. XIV


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Prólogo à 1.ª Edição

Às dificuldades de análise inerentes ao turismo junta-se, também, a inexistência de investigação sistemática, salvo louváveis e, felizmente, muito significativas exceções, que começam a dar os seus frutos e de cujos resultados nos socorremos como se dá conta ao longo deste livro. A preocupação de análise aprofundada do turismo só existe em poucos países e são raras as instituições que lhe dedicam uma atenção permanente. As próprias escolas, que constituem a fonte de irradiação do conhecimento, limitam-se, na generalidade dos casos, à mera divulgação de conceitos sem procederem à investigação. Neste contexto, a publicação deste livro visa contribuir para uma maior divulgação da importância do turismo e dos instrumentos de análise mais apropriados ao seu conhecimento. É o produto de uma longa vivência com os problemas e da pesquisa efetuada por puro prazer. A vivência com os problemas do turismo e o exercício de responsabilidades em várias áreas que lhe respeitam, principalmente a política, deixaram-me a convicção de que sem a criação de uma consciência coletiva, assente no conhecimento aprofundado e com bases científicas, favorável ao turismo, este terá sempre sérias dificuldades em se impor como atividade de corpo inteiro. O turismo é, quase sempre, olhado como uma atividade de mero prazer, de festa, de divertimento onde não há lugar para o suor, para o sacrifício e para o trabalho e esta perspetiva faz relegá-lo para plano secundário, quando não, desprezível. Foi a preocupação em contribuir para a criação dessa consciência coletiva que me instigou a escrever este livro. Os temas tratados refletem a preocupação em evidenciar alguns dos aspetos menos divulgados, mas necessários ao cabal conhecimento do turismo, ou em relação aos quais se continuam a fazer interpretações erróneas e segundo uma perspetiva que acaba por lhe ser nefasta. São exemplos deste caso o próprio conceito de «turismo» e a evidência dada à qualidade que, insistentemente, continua a ser encarada na ótica da participação nas viagens das classes mais abastadas, em contraponto ao turismo de massas, esquecendo-se que uma coisa é a massificação da oferta e outra, bem diferente, o turismo de massas que resulta da (desejável) democratização das viagens. Incluem-se, no primeiro caso, temas como os efeitos económicos do turismo e a avaliação económica dos recursos turísticos que, contudo, não se aprofundam. Tratando-se de um livro que se pretende que possa servir de base de estudo, mas também de divulgação, o aprofundamento destas questões torná-lo-ia de difícil leitura, sobretudo, para aqueles que não dominam as questões económicas. Muitos esperariam que fizesse uma análise crítica do turismo português e dos problemas com que se defronta mas tal escaparia ao âmbito deste trabalho. Espero poder fazê-lo noutra oportunidade. XV


Economia e Política do Turismo

Tenho consciência das limitações e insuficiências do texto e hesitei muito em publicá-lo, mas optei por aproveitar uma oportunidade que não sei se voltaria a repetir-se. Faço-o em nome do muito que devo ao turismo, que me proporcionou uma forma rica de realização pessoal, e em nome do muito que gostaria de contribuir para o seu desenvolvimento em plenitude.

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Prólogo à Versão de 2006 Após a redação da primeira versão deste livro, há dez anos, não só o turismo sofreu grandes transformações como também o seu conhecimento se aprofundou e alargou significativamente. Nos últimos dez anos alteraram-se as conceções de desenvolvimento turístico que passaram a ter como referência e valores fundamentais a sustentabilidade, a qualidade, a diferenciação e a diversificação; assistiu-se a uma vasta emergência de novos destinos em todas as regiões do planeta que introduzem novas condições de concorrência; criaram-se novas modalidades de oferta com base em recursos artificiais; assistiu-se a um amplo movimento de reorganização empresarial dando origem a grandes grupos empresariais com intervenção simultânea na produção e na organização dos mercados; surgiram novas formas de exploração do transporte aéreo (baixo custo) que deram origem a novas clientelas e a novos destinos; os consumidores turísticos passaram a dispor de mais e melhor informação, tornando-se mais experientes e mais exigentes (Cunha, 2003). Todo este vasto conjunto de fatores de mudança deu origem a novas relações económicas e empresariais, expandiram o turismo e alargaram a sua base económica: as fronteiras da economia turística passaram a abranger novos territórios, novas atividades, novas profissões e novos atores. Por sua vez, o aumento da investigação, a introdução generalizada do ensino turístico nas universidades, o tratamento científico do turismo no âmbito mais vasto de outras áreas do saber e as preocupações das organizações internacionais e dos governos relativos à recolha e tratamento de dados mais rigorosos, proporcionam e garantem um melhor estudo e conhecimento do turismo. O «estado da arte» do turismo é hoje muito mais amplo e aprofundado do que há dez anos e sê-lo-á mais ainda nos próximos anos. O turismo transformou-se numa preocupação do saber em todo o mundo e emergem centros de investigação, com grande e valiosa produção científica, em países que só recentemente passaram a ser destinos turísticos relevantes. Por todas estas razões, o texto publicado há dez anos perdeu a atualidade e já não está adaptado às novas realidades nem aos novos conhecimentos e daí que tenha optado por uma revisão mais vasta em vez de apenas uma segunda edição. Com efeito, a atual versão altera significativamente o texto anterior e introduz novas matérias à luz da evolução dos conhecimentos, entretanto ocorrida. Embora o texto não contemple particularmente o turismo português mas pretenda, pelo contrário, aplicar-se ao turismo em geral, independentemente das coordenadas geográficas, é natural que incida em muitos aspetos sobre o caso português, sobretudo, quando é necessário recorrer a certos exemplos. XVII


Economia e Política do Turismo

De qualquer modo tive sempre presente a evolução do turismo em Portugal, em especial, nos aspetos da qualidade, sustentabilidade e competitividade para que não se repita que «na região do Algarve, em Portugal, o desenvolvimento contido do turismo foi por água abaixo quando todas as aldeias ao longo dessa deliciosa costa reivindicaram a chegada de tratores para soterrar sobre a areia as casas existentes e substituí-las por cidades feitas de betão» (Swinglehurst, Turismo Global, 2001) que, aliás, constitui uma apreciação benigna. É um caso que deveria servir de exemplo a outros destinos portugueses, ou não.

Sobre o Autor Licínio Cunha é Economista e Professor Catedrático Convidado da Universidade Lusófona, onde dirige o Departamento de Turismo, que criou. Apesar de ter desenvolvido a maior parte da sua atividade profissional no setor bancário, tendo sido administrador de dois dos maiores bancos portugueses da época, há muito que se interessou pelo turismo, atividade a que dedicou uma parte importante da sua vida desde o início da década de 60 do século xx, altura em que ingressou nos quadros da então Direção de Serviços de Turismo (depois Direção-Geral do Turismo). Assim, desempenhou vários cargos na área do turismo, tendo sido, a nível político, Secretário de Estado do Turismo nos IV, V, X e XI Governos Constitucionais. A nível internacional, foi Presidente da Comissão Económica da Federação Internacional de Termalismo e Climatismo e membro do Comité Económico e Social das Comunidades Europeias e, a nível empresarial, foi administrador de várias empresas turísticas: ENATUR (de que foi fundador), Lusotur, Marinoteis, principalmente.

Outras obras do autor Introdução ao Turismo – 5ª edição. Lidel (no prelo) O Turismo em Portugal: Sucessos e Insucessos. Edições Universitárias Lusófonas, 2012 Perspectivas e Tendências do Turismo. Edições Universitárias Lusófonas, 2003 O Turismo na Economia Contemporânea, in Portugal Contemporâneo. INA, 1990 Dicionário Comercial e Bancário. Banco Pinto & Sotto Mayor, 1973 O Banco ao Alcance de Todos. Editorial O Século, 1972

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1 Introdução

Entre as condições humanas é comum a de gostar-se de movimentos e de mudança. Viajar parece-me útil porque o espírito terá nisso um contínuo exercício ao encontrar coisas novas e desconhecidas. Montaigne (Journal)

1.1 Turismo: Problemas de Definição

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1.1.1 Conceitos de Lazer, Recreio e Turismo Quando falamos de turismo é preciso saber do que falamos, a que realidade nos referimos, o que e quem queremos identificar. Apesar da extraordinária dimensão que alcançou e de fazer parte integrante do modo de vida das sociedades contemporâneas, e apesar de toda a gente usar a expressão correntemente, nem sempre as pessoas a utilizam com o mesmo significado e nem todas as que a ouvem a percebem da mesma maneira. Para uns o turismo é uma coisa muito séria porque lhes proporciona emprego e rendimento e dele dependem as suas vidas; para outros, é sinónimo de diversão para ricos e ociosos. Para quem viaja é uma forma de alcançar satisfação e realização pessoal, mas para quem tem responsabilidades políticas é um meio para alcançar bem-estar social. Para alguns é um meio de invasão das suas vidas e de destruição de valores que fazem parte da sua identidade mas, para muitos, é uma forma de libertação. Umas vezes, abrangem-se na designação de turismo só aquelas situações e atividades que proporcionam prazer e diversão a quem vem de fora mas, outras vezes, incluem-se nela uma vastidão de situações muito diversificadas mas ligadas entre si por elementos comuns. Por vezes, em função das perspetivas de cada um, adotam-se designações na tentativa, quantas vezes falha de rigor, de «marcar terreno» ou «marcar posição» mas vazias de sentido (por exemplo, «turismo residencial»), e até, repugnantes («turismo sexual»), que contribuem mais para o descrédito do que para o engrandecimento de uma atividade que nasceu estreitamente ligada ao enriquecimento e valorização da pessoa humana. 1


Economia e Política do Turismo

Originalmente, a realização das viagens de que nasceu a palavra «turismo» ocorria por puro prazer, por distração, para aprender e aumentar os conhecimentos ou por mera curiosidade, recusando-se a inclusão no turismo de viagens com outros fins: as viagens turísticas eram aquelas que se enquadravam nas noções de tempo livre e de ociosidade com recusa de outras. «O turismo rigorosamente consiste nas viagens por mero prazer, que se fazem com fim exclusivo de gozar os encantos dos países que se visitam», dizia-se (Ataíde, 1934/1936). O turismo deriva da noção de tempo livre que «é o tempo não consagrado ao trabalho e que é um fenómeno socioeconómico historicamente diferenciado tendo uma relação direta com os lazeres» (ONU, 1988). Coloca-se, contudo, a necessidade de formular um conceito de lazer já que este, embora tenha relação direta com o tempo livre, não tem a mesma amplitude. Chic (1998) identifica três maneiras de conceptualização do lazer: uma, segundo a qual, o lazer é encarado como tempo livre ou não obrigatório; na segunda, o lazer como atividade à parte das obrigações tais como o trabalho ou a família, e, a terceira, segundo a qual o lazer é considerado com um uso subjetivo, um estado mental ou uma condição definida pelos indivíduos como lazer. As diferenças entre estas conceções, mais do que esclarecer, dificultam a compreensão do âmbito do lazer e impossibilitam o seu uso para fins úteis tal como encontrar formas para responder às necessidades pessoais derivadas do lazer. Por isso, parece mais adequada a definição de Dumazedier (1988) para quem o lazer «é a atividade à qual as pessoas se entregam livremente, fora das suas necessidades e obrigações profissionais, familiares e sociais, para se descontrair, divertir, aumentar os seus conhecimentos e a sua espontânea participação social, livre exercício e capacidade criativa». Segundo esta definição, o lazer comporta três dimensões: a descontração (descanso), ou seja, a procura de repouso, libertação das preocupações e constrangimentos; a diversão com o fim de esquecer, por momentos, a vida quotidiana, entregar-se a atividades que impliquem uma rotura com o quadro de vida habitual; desenvolvimento (aumentar os conhecimentos), consistindo no exercício de atividades que permitam ao indivíduo afirmar-se, expressar talentos ou exprimir-se: pintar, desportos, jardinagem, visitar monumentos, ouvir música (Amirou, 2007). Deste modo, o lazer é o tempo de que cada pessoa dispõe após o seu trabalho e estudo, dormir e a realização de outras necessidades básicas como a alimentação, as compras, os cuidados com os membros da família, a higiene e a realização dos trabalhos caseiros, que constituem as suas obrigações profissionais, familiares e sociais. Todas as atividades que impliquem uma obrigação ou resultem de uma razão de caráter compulsivo, qualquer que seja a sua natureza, não fazem parte do lazer. O tempo de lazer não significa inação e, em regra, é um tempo de ocupação com atividades de livre escolha dos indivíduos, «tendo por objetivo restaurar o bem-estar físico e psicológico, favorecer o desenvolvimento pessoal e enriquecer o potencial intelectual» 2


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Introdução

(ONU, 1988). No entanto, Rojek (2005) distingue duas formas distintas de lazer: uma, o lazer sério, que envolve benefícios duradouros tais como autoenriquecimento, melhoria da autoimagem e intensificação da solidariedade e, outra, o lazer superficial, focalizando-se no hedonismo, no estímulo sensorial como fontes intrínsecas de satisfação («matar o tempo», olhar as montras, beber, jogos de sorte). O tempo de lazer é, geralmente, um tempo ocupado como forma de distração, evasão, divertimento ou do desenvolvimento e realização pessoal e, nessa medida, é um tempo de recreio. O recreio é tomado, então, no sentido da variedade de atividades realizadas durante o tempo de lazer e define-se como sendo o conjunto de ações e atividades que as pessoas desenvolvem livremente de forma positiva e agradável durante o lazer, incluindo as participações ativas e passivas em desporto, cultura, educação informal, entretenimento, diversões, visitas e viagens. Neste sentido, o recreio cobre quaisquer ocupações durante o lazer que não envolvam um compromisso e nele se incluem as viagens turísticas. Nestes termos o turismo é uma forma de lazer, mais concretamente de recreio, mas difere dele em múltiplos aspetos. Em primeiro lugar, o recreio pode ser baseado na residência ou nas suas proximidades enquanto o turismo pressupõe sempre uma deslocação para fora da residência: no turismo há sempre uma deslocação, o que as restantes formas de recreio não exigem. Em segundo lugar, muitas das viagens que integram o turismo implicam responsabilidades e envolvem obrigações que estão ausentes do conceito de lazer: obrigações sociais, políticas, profissionais e familiares. No diagrama do «lazer, recreio e turismo» (Figura 1.1), sugerido por Boniface et al. (1982), as viagens de negócios surgem separadas do tempo de lazer mas, além destas, há outras que também o devem ser, tais como: estudantes que participam em programas comunitários, participação em obrigações familiares e sociais, tratamentos ou recuperação física (v. g., termalismo). É por esta razão que faz sentido falar em «turismo de lazer» como atividade à qual as pessoas se entregam livremente à parte as suas obrigações, ou seja, livres de compromissos. Em terceiro lugar, as viagens turísticas implicam uma permanência em locais fora da residência habitual por períodos de tempos variáveis mas que podem ultrapassar semanas ou mesmo meses, o que dá lugar a tempos livres que são ocupados por atividades de recreio: as deslocações e permanências turísticas geram recreio para satisfação do qual desenvolvem atividades produtivas idênticas àquelas que são criadas para satisfação do recreio na área da residência. O turismo é uma forma de recreio que, por sua vez, gera recreio. Por último, todos os equipamentos necessários ao recreio servem o turismo mas este exige equipamentos e profissões adicionais (meios de alojamento, equipamentos necessários ao turismo de negócios, operadores turísticos).

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Economia e Política do Turismo

Tempo de lazer Tempo disponível para um indivíduo depois que o trabalho, o sono e outras necessidades básicas tenham sido atendidas.

Tempo de trabalho

Recreio «Ocupação»: atividades desenvolvidas durante o tempo de lazer.

Fluxo contínuo da atividade de recreio Recreio residencial: leitura, jardinagem, televisão, convivência social.

Lazer quotidiano: teatro, cinema, restaurantes, desportos.

Viagens de um dia: visitas a atrações, etc.

Turismo: movimento temporário para fora da residência habitual.

Viagens de negócios

Limites geográficos Casa

Local

Regional

Nacional

Internacional

Figura 1.1 – Lazer, recreio e turismo Fonte: Boniface et al., 1982.

Nestes termos, o turismo é, em parte, tempo de lazer (recreio) e tempo ocupado no exercício de responsabilidades e obrigações tal como se mostra na Figura 1.2.

Tempo livre

Recreio

Turismo

Figura 1.2 – Relação entre o tempo livre e o turismo 4


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Cronologia das Grandes Migrações,Viagens e Realizações com Influência no Turismo Há 350 000 anos

O primeiro homo sapiens aparece na África, Europa e Ásia.

Há 50 000-30 000 anos

O moderno homo sapiens expande-se na Austrália, vindo do sul da Ásia.

Há 15 000 anos

No Paleolítico o homem desloca-se para o continente americano a partir da Ásia.

4000 a. C.

Os sumérios inventam a moeda, a escrita cuneiforme e a roda.

2800 a. C.

Começa a construção das pirâmides do Egito que hoje são uma das grandes atrações turísticas do mundo.

2250 a. C.

Os esquis surgem na Suécia.

2000 a. C.

Primeira carta geográfica na China. Estabelecem-se os caravanserai no Próximo Oriente.

2000-332 a. C.

Os fenícios viajam por todo o Mediterrâneo, possivelmente para as ilhas britânicas, costa oeste de África, Açores e Portugal continental.

1680 a. C.

Os hicsos introduzem o carro puxado a cavalos.

1500-1481 a. C.

A rainha Hatshepsut realiza uma viagem no Egito.

777 a. C.

Início dos Jogos Olímpicos na Grécia.

753 a. C.

Fundação de Roma.

500 a. C.

Viagens de Heródoto.

450 a. C.

Apogeu da civilização grega.

447 a. C.

Construção do Partenon.

430 a. C.

Construção da Acrópole.

336-323 a. C.

Alexandre, o Grande, conduz o seu exército para a Ásia, atravessando as montanhas de Indo Kush.

65 a. C.

Horácio escreve os seus poemas sobre viagens e canta os lazeres (otium).

25 a. C.

Primeiras termas.

79

Em Roma, o Coliseu recebe os seus primeiros visitantes.

100

Apogeu do Império Romano.

Século ii

Pausânias escreve a Descrição da Grécia (guia para uso de estrangeiros).

Século iv

Primeiras casas de refúgio para os visitantes e asilos.

333

Um autor desconhecido escreve O Itinerário de Bordéus a Jerusalém.

349-407

João Crisóstomo defende a causa da hospitalidade.

500

Os polinésios viajam das ilhas da Sociedade para o Hawai.

Século vii

Início do islamismo.

500-1450

Surgem os harbinger, que se encarregam de descobrir os melhores caminhos, alojamento e alimentação, para depois servirem como guias.

800-1110

Os vikings exploram a Islândia, Gronelândia e a costa norte da América.

1020

Construção do Domus hospitalis em Jerusalém.

1075

Construção da Catedral de Santiago de Compostela, centro de peregrinação.

1095

Primeira cruzada a Jerusalém.

451


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