Psiquiatria - Perguntas e Respostas

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PSIQUIATRIA perguntas e respostas Coordenação

Cláudio Laureano Sofia Fonseca Vera Domingues


Psiquiatria Perguntas e Respostas Coordenação Cláudio Laureano Sofia Fonseca Vera Domingues

Lidel – Edições Técnicas, Lda.

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Edição e Distribuição Lidel – Edições Técnicas, Lda Rua D. Estefânia, 183, r/c Dto – 1049-057 Lisboa Tel: +351 213 511 448 lidel@lidel.pt Projetos de edição: editoriais@lidel.pt www.lidel.pt Livraria Av. Praia da Vitória, 14 A – 1000-247 Lisboa Tel: +351 213 511 448 livraria@lidel.pt Copyright © 2020, Lidel – Edições Técnicas, Lda. ISBN edição impressa: 978-989-752-415-8 1.ª edição impressa: julho de 2020 Data de comercialização: setembro de 2020 Paginação: Mónica Gonçalves Impressão e acabamento: Tipografia Lousanense, Lda. Dep. Legal: n.º 471382/20 Capa: José Manuel Reis Imagem da capa: © Ink Drop Todos os nossos livros passam por um rigoroso controlo de qualidade, no entanto aconselhamos a consulta periódica do nosso site (www.lidel.pt) para fazer o download de eventuais correções. Não nos responsabilizamos por desatualizações das hiperligações presentes nesta obra, que foram verificadas à data de publicação da mesma. Os nomes comerciais referenciados neste livro têm patente registada. Reservados todos os direitos. Esta publicação não pode ser reproduzida, nem transmitida, no todo ou em parte, por qualquer processo eletrónico, mecânico, fotocópia, digitalização, gravação, sistema de armazenamento e disponibilização de informação, sítio Web, blogue ou outros, sem prévia autorização escrita da Editora, exceto o permitido pelo CDADC, em termos de cópia privada pela AGECOP – Associação para a Gestão da Cópia Privada, através do pagamento das respetivas taxas.


Índice

Prefácio.................................................................................................... VII José Luís Pio Abreu

Autores.............................................................................................................. IX Siglas e Abreviaturas............................................................................................. XI 1. Psicopatologia .................................................................................................. 1 Luís Silva, Margarida Duarte, Cláudio Laureano

2. Perturbações Afetivas......................................................................................... 27 Ana Poças, Ana Fonseca, Mário Simões

3. Perturbações de Ansiedade................................................................................... 45 Rafael Araújo, Joana Melim, Sofia Fonseca

4. Esquizofrenia e Outras Psicoses............................................................................ 71 Ana Batista, Ana Carvalheiro, Joana Melim

5. Perturbações de Personalidade............................................................................. 95 Filipe Malheiro, Joana Miranda, Andreia Tarelho

6. Psiquiatria Geriátrica......................................................................................... 115 Sérgio Martinho, Mário Simões, Vera Domingues

7. Comportamentos Aditivos.................................................................................... 141 Mafalda Barbosa, Ana Fonseca, Cláudio Laureano © LIDEL – Edições Técnicas

8. Psicofarmacologia............................................................................................. 167 Filipe Malheiro, Ana Carvalheiro, Vera Domingues

9. Psicoterapias.................................................................................................... 189 Ana Batista, Joana Miranda, Joana Correia, Joana Maia

Índice Remissivo.................................................................................................... 211


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pREFÁCIO

Começo por declarar que, numa leitura divertida, tal como se fosse um jogo, aprendi muita coisa com este livro. A rápida evolução dos conhecimentos em Psiquiatria, como em toda a Medicina, é incontornável. E tem o pequeno problema de se desenvolver em diversas ramificações especializadas que só os investigadores e seus grupos parecem acompanhar. Quem faz a clínica, porém, são os psiquiatras gerais que se veem gregos para se atualizarem em todos os caminhos. Como fazê-lo? Uma das possibilidades é ler este livro, em boa hora realizado pela equipa do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar de Leiria. Em cada capítulo do livro, um grupo de autores, psiquiatras, internos de Psiquiatria e uma psicóloga, dedicaram-se a transportar para um conjunto de perguntas e suas respostas os conhecimentos mais atualizados sobre a evidência médica. No tempo em que o fazem, publicada que foi a muito criticada classificação “pluralista” da DSM-5 e perante o explosivo desenvolvimento das Neurociências e da Neuropsicologia, a tarefa não é fácil, mas parece-me conseguida. Os capítulos cobrem a psicopatologia, as perturbações afetivas, as perturbações de ansiedade, a esquizofrenia e outras psicoses, as perturbações da personalidade, a psiquiatria geriátrica, os comportamentos aditivos, a psicofarmacologia e as psicoterapias. Todas as questões clínicas, incluindo os novos desafios, acabam por ser contempladas. Estamos num tempo em que o trabalho médico deve ser orientado pela “evidência científica”, o que o distingue de todas as medicinas alternativas e enganadoras que se perfilam no horizonte. Mas a Medicina não é uma ciência, é antes uma arte transmitida ombro a ombro. Mesmo dentro das margens científicas, existe algo muito pessoal e criativo em cada intervenção perante cada pessoa doente. Por isso, o médico é individualmente responsável pelas suas decisões e terá de as justificar se isso lhe for pedido. Os médicos experientes costumam opôr à “medicina pela evidência” a “medicina pela experiência”. O desafio, ao ler este livro, consiste em saber até que ponto a “medicina pela experiência” corresponde à “medicina pela evidência” exposta em muitas das respostas às perguntas. E é interessante perceber que, mesmo desconhecendo as guide-lines que atirariam a decisão clínica para os computadores, essa intuição alimentada na experiência que ajuda os médicos a decidir, corresponde, na maior parte das vezes, à evidência científica. Este livro é, pois, útil para os psiquiatras experientes. Também o é para os psiquiatras menos experientes, e consiste num treino para a recertificação médica que, exigida pela União Europeia, mais tarde ou mais cedo se aplicará em Portugal. Mas é sobretudo útil para os internos de Psiquiatria ou médicos interessados (os médicos de família), que perceberão como as decisões clínicas gerais são às vezes tomadas com pouca informação, que se aprofundará em


VIII  Psiquiatria – Perguntas e Respostas

consultas seguintes. O importante é não errar por falta de conhecimentos. Resta saber se é útil para os outros profissionais da saúde ou mesmo doentes. Num tempo em que os doentes se apresentam no consultório munidos de todas as informações, falsas ou verdadeiras, apanhadas na Internet, mais valeria que as colhessem aqui. Os diversos capítulos do livro, feitos por equipas diferentes, são diferentes nos estilos das respostas e na organização das perguntas, por vezes cheias de “rasteiras”. Não penso que isso seja um mal num primeiro livro deste tipo. Ele está escrito para todos os gostos, algumas questões podem ser controversas, mas assim é o estado de coisas na Psiquiatria contemporânea. Podemos mesmo tentar perceber qual seria o melhor estilo. E quando existem as perguntas com “rasteiras”, ao menos treinamos a nossa capacidade de atenção. Uma das maiores fontes de aprendizagem é o erro. Mais vale percebermos os nossos erros à medida que lemos este livro, do que através dos sempre possíveis erros praticados na clínica.

José Luís Pio Abreu

Médico Psiquiatra Professor da Universidade de Coimbra Membro do Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa


aUTORES

Coordenadores/Autores Cláudio Laureano

Médico, Assistente Hospitalar Graduado de Psiquiatria, Diretor do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar de Leiria Sofia Fonseca

Médica, Assistente Hospitalar de Psiquiatria, Coordenadora do Hospital de Dia do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar de Leiria Vera Domingues

Médica, Assistente Hospitalar Graduada de Psiquiatria, Coordenadora da Unidade de Internamento de Agudos do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar de Leiria

Autores Ana Batista

Médica, Assistente Hospitalar de Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Ana Poças

Médica, Assistente Hospitalar de Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Ana Carvalheiro

Médica Interna de Formação Específica em Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Ana Fonseca

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Médica, Assistente Hospitalar de Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Andreia Tarelho

Médica, Assistente Hospitalar de Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Joana Correia

Psicóloga Clínica e da Saúde – Centro Hospitalar de Leiria


X  Psiquiatria – Perguntas e Respostas

Joana Maia

Médica, Assistente Hospitalar de Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Joana Melim

Médica, Assistente Hospitalar de Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Joana Miranda

Médica Interna de Formação Específica em Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Filipe Malheiro

Médico, Assistente Hospitalar de Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Luís Silva

Médico Interno de Formação Específica em Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Mafalda Barbosa

Médica Interna de Formação Específica em Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Margarida Duarte

Médica, Assistente Hospitalar de Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Mário Simões

Médico, Assistente Hospitalar de Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Rafael Araújo

Médico Interno de Formação Específica em Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria Sérgio Martinho

Médico Interno de Formação Específica em Psiquiatria – Centro Hospitalar de Leiria


Siglas E Abreviaturas

5-HT serotonina

A AChe acetilcolinesterase ADT antidepressivo tricíclico AINE anti-inflamatórios não esteroides APA American Psychiatric Association APS sintomas psicóticos atenuados (do inglês, attenuated psychotic symptoms) ARO antagonistas dos recetores da orexina AVC acidente vascular cerebral

B BLIPS sintomas psicóticos breves, limitados e intermitentes (do inglês, brief limited intermittent psychotic symptoms)

C CID-10 Classificação Internacional de Doenças, 10.ª edição CK creatina quinase CYP citocromo (do inglês, cytochrome)

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D DA DAT DBT DCL DFT DNA DSM-5 DSM-IV

dopamina transportador de dopamina (do inglês, dopamine active transporter) terapia dialética-comportamental (do inglês, dialectical behavior therapy) demência de corpos de Lewy demência frontotemporal ácido desoxirribonucleico (do inglês, deoxyribonucleic acid) Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais, 5.ª Edição Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais, 4.ª Edição

E e.v. endovenoso ECG eletrocardiograma


XII  Psiquiatria – Perguntas e Respostas

ECT eletroconvulsivoterapia EEG eletroencefalograma

F FTA-ABS fluorescent treponemal antibody absorption test

G GABA GSK-3

ácido gama-aminobutírico (do inglês, gamma-aminobutyric acid) glicogénio sintase quinase

I i.d. por dia (do latim, in die) IECA inibidores da enzima de conversão da angiotensina IL-6 interleucina-6 IMAO inibidores da monoamino-oxidase ISRN inibidor seletivo de recaptação da noradrenalina ISRS inibidores seletivos de recaptação da serotonina ISRSN inibidores seletivos de recaptação da serotonina e da noradrenalina

L LSD

dietilamida do ácido lisérgico (do alemão, Lysergsäurediäthylamid)

M MAO monoamina oxidase MDMA metilenodioximetanfetamina MMPI minnesota multiphasic personality inventory MMSE mini mental state examination

N NAM NaSSA NET

modulador alostérico negativo (do inglês, negative allosteric modulator) noradrenergic and specific serotonergic antidepressant transportador de norepinefrina (do inglês, norepinephrine transporter)

O OEDT OMS

Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência Organização Mundial da Saúde

P PAB PAD PAG PAM PAS PAT PDC

perturbação afetiva bipolar perturbação de ansiedade de doença perturbação de ansiedade generalizada modulador alostérico positivo (do inglês, positive allosteric modulator) perturbação de ansiedade social psicose aguda e transitória perturbação delirante crónica


Siglas a Abreviaturas  XIII

PEP PET POC PP PSPT

primeiro episódio psicótico tomografia por emissão de positrões (do inglês, positron emission tomography) perturbação obsessivo-compulsiva perturbação de personalidade perturbação de stress pós-traumático

R RM RM-CE RNA RPR

ressonância magnética ressonância magnética cranioencefálica ácido ribonucleico (do inglês, ribonucleic acid) rapid plasm regain

S SAOS SARI SNC SNP SOE SPECT SU

síndrome de apneia obstrutiva do sono serotonin antagonist and reuptake inhibitor sistema nervoso central sistema nervoso periférico strength of evidence single photon emission computed tomography serviço de urgência

T TAC tomografia axial computadorizada TAC-CE TAC cranioencefálica TC tomografia computadorizada TCA antidepressivos tricíclicos (do inglês, tricyclic antidepressant) TC-CE tomografia computadorizada cranioencefálica TCE traumatismo cranioencefálico TNF-α fator de necrose tumoral-α (do inglês, tumor necrosis factor) TSH hormona estimulante da tiroide (do inglês, thyroid stimulating hormone)

U UHR

risco ultraelevado (do inglês, ultra high risk)

V

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VDRL VIH

venereal disease research laboratory vírus da imunodeficiência humana


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Psicopatologia Luís Silva, Margarida Duarte, Cláudio Laureano

Perguntas 1 – A psicopatologia estuda a doença mental. Qual das seguintes afirmações é incorreta? a)  Foi Jeremy Bentham quem introduziu o termo psicopatologia em 1817. b)  A psicopatologia tem a sua origem na psicologia. c)  De acordo com Jaspers, só os fenómenos psíquicos patológicos são objeto da psi­copa­ tologia. d)  Em psicopatologia, os sintomas são subjetivos mas passíveis de avaliação nas queixas­ do doente. e)  Segundo Sims (2008) é a empatia que permite ao médico entender as experiências do doente. 2 – Considerando que a psicopatologia está relacionada com diversas abordagens e orienta‑ ções teóricas, qual a afirmação correta? a)  A psicopatologia compreensiva tem como objetivo esclarecer a etiologia das perturba­ ções mentais. b)  A psicopatologia fenomenológica foca­‑se nas vivências subjetivas e inconscientes dos doentes. c)  A classificação psicopatológica desenvolvida por Frank Fish, no século xx, é ainda hoje uma das grandes referências nesta matéria. d)  Apenas as afirmações a) e c) estão corretas. e)  Todas as afirmações estão corretas.

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3 – Karl Jaspers foi responsável pela introdução de diversos conceitos psicopatológicos ainda hoje considerados fundamentais. Qual das seguintes afirmações é a mais correta? a)  O conceito de desenvolvimento corresponde a uma manifestação psicopatológica que é compreensível se considerarmos toda a história e estrutura do doente. b)  Karl Jaspers desenvolveu o método fenomenológico na avaliação psiquiátrica, defen­ dendo que a psicopatologia representa uma descrição compreensiva. c)  A explicação genética compreende o fenómeno psíquico como uma cadeia de aconte­ cimentos em conexão. d)  O conceito de processo implica uma interrupção abrupta do curso de vida normal, como ocorre num primeiro episódio psicótico de uma perturbação esquizofrénica.


2  Psiquiatria – Perguntas e Respostas

e)  Todas as afirmações anteriores estão corretas. 4 – Sobre a fenomenologia, qual das seguintes afirmações é incorreta? a)  É um movimento filosófico introduzido por Husserl. b)  O método fenomenológico de Jaspers envolve a empatia como instrumento fundamen­ tal para apreensão dos fenómenos psíquicos subjetivos. c)  É sinónimo de psicopatologia. d)  Jaspers, de forma geral, associa a fenomenologia ao “estudo das manifestações subjeti­ vas da vida psíquica perturbada”. e)  Nenhuma está incorreta. 5 – Uma jovem de 26 anos de idade, durante a consulta com o seu psiquiatra, apresenta uma postura querelante e de fácil irritabilidade, criticando­‑o relativamente à última terapêu‑ tica instituída. O médico começa, progressivamente, a sentir­‑se impaciente com a postura da doente e sente vontade de não a continuar a acompanhar. Como se denomina este tipo de sentimento do psiquiatra para com a paciente? a) Empatia. b)  Transferência positiva. c)  Contratransferência positiva. d)  Todas as anteriores. e)  Nenhuma das anteriores. 6 – As doenças mentais alteram a visão do meio envolvente e a capacidade do indivíduo em lidar com as circunstâncias. Relativamente ao insight, qual das seguintes afirmações é falsa? a)  A avaliação do insight assume uma maior importância nos casos de psicose, onde a incongruência entre a visão do doente e dos outros perante a sua doença muitas vezes conduz a dificuldades no tratamento. b)  David (1990) identificou três dimensões distintas: o reconhecimento de uma altera­ção psicológica, a compreensão de que essa alteração deriva de uma doença mental e o reconhecimento da necessidade de adesão ao tratamento. c)  A avaliação do insight deve ser independente dos fatores socioculturais e do meio em que o doente se insere. d)  A maioria do trabalho de investigação em torno dos correlativos clínicos do insight tem sido desenvolvida em doentes com o diagnóstico de esquizofrenia. e)  Jaspers (1964) definiu insight como uma estimativa objetivamente correta da gravidade da doença e julgamento objetivamente correto do seu tipo particular. 7 – Com o objetivo de ter alta, um doente internado numa enfermaria psiquiátrica tenta mani­ fes­tamente ocultar um sintoma, na verdade, presente. Qual a designação mais correta para esta atitude do doente? a) Pueril. b) Negativista. c) Simuladora.


Psicopatologia 3

d) Evasiva. e)  Nenhuma das anteriores. 8 – No âmbito das alterações da consciência, qual das seguintes afirmações não é verdadeira? a) Nos sonhos ocorre uma alteração qualitativa fisiológica da consciência, estando presen­ te uma consciência parcial. b) Na literatura científica anglo­‑saxónica, os conceitos de consciência psicológica e de consciência moral são equivalentes. c) O termo vigilância, criado por Head (1923), corresponde a um estado de consciência, no sentido neurofisiológico. d) No delirium existe uma obnubilação ou turvação do nível de consciência muito oscilante ao longo do dia, agravando­‑se habitualmente à noite. e) O sono profundo é uma alteração quantitativa fisiológica da consciência, em que a mesma está abolida. 9 – Na avaliação psicopatológica da consciência, qual a afirmação mais correta? a) O seu défice é a alteração primária nas reações orgânicas agudas. b) O conceito de turvação da consciência representa os graus menores de défice da cons­ ciência. c) A chamada flutuação da consciência pode ser observada em várias situações patológi­ cas, mas também em estados de saúde normais, no sono e na fadiga. d) As afirmações a) e c) estão corretas. e) Todas as afirmações anteriores estão corretas. 10 – Sobre o estado crepuscular, que se pode definir como uma interrupção da continuidade da consciência, qual a afirmação mais correta? a) Tem um início e fim abruptos. b) A sua duração é variável, desde algumas horas a várias semanas. c) Podem ocorrer atos violentos ou crises emocionais inesperadas num contexto de um comportamento, em outros aspetos, calmo e normal. d) É raro estar relacionado com uma condição orgânica. e) As afirmações a), b) e c) estão corretas.

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11 – Em relação às alterações psicopatológicas da atenção, qual das seguintes afirmações é incorreta? a) A hipoprosexia e a aprosexia são alterações quantitativas da atenção. b) A atenção é o processo que nos permite ter a consciência orientada para um determi­ nado estímulo externo ou interno. c) A distratibilidade é uma alteração qualitativa da atenção que pode ocorrer nos episó­dios maníacos e no traumatismo craniano. d) A hipoprosexia consiste numa abolição da atenção, como ocorre no coma. e) Em indivíduos sem patologia associada, ocorrem habitualmente episódios de apro­ sexia.­


Psicopatologia 15

63 – Ao avaliar um indivíduo que se apresenta com elevados níveis de ansiedade, sensibilida‑ de sensorial aumentada e intensa alerta para potenciais ameaças, conclui­‑se pela presença de qual dos seguintes estados ou sintomas? a) Pânico. b) Hipervigilância. c) Ideias de referência. d) Todas as anteriores. e) Nenhuma das anteriores.

respostas 1 – b) A psicopatologia não é um ramo da psicologia, mas sim uma disciplina científica autóno­ma que nasce associada à clínica psiquiátrica, enquanto a psicologia tem a sua raiz na filosofia. A psiquiatria é um ramo da medicina, tal como a cirurgia geral e a medicina interna, cuja essência é a psicopatologia. Jaspers defendia que “a psicopatologia investiga muitos factos cujos equiva­ lentes ‘normais’ ainda não foram estabelecidos pela psicologia… é muitas vezes a visão do anormal que ensina a explicar o normal”. A generalidade dos autores, incluindo Sims, defen­ dem a importância da empatia como uma ferramenta crucial “para avaliar o estado subjeti­vo interno de outra pessoa…”. São exemplos de sinto­mas psicopatológicos, o sentimento de tristeza e a atividade alucinatória descritos pelo doente. Já os sinais são objetivos, isto é, direta­ mente observáveis, como o fácies triste ou os solilóquios. 2 – c) A psicopatologia compreensiva consiste na descrição e na categorização de experiên­ cias. Por outro lado, a psicopatologia descritiva consiste na descrição e na categorização de experiências patológicas, observáveis no comportamento do doente e descritas pelo próprio. Entre as psicopatologias descritivas está a psicopatologia fenomenológica, desen­ volvida por Karl Jaspers, cujo foco é as vivências subjetivas (conscientes) descritas pelos próprios doentes, não tendo por objeto o inconsciente nem explicações teóricas para as perturbações.

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3 – e) Karl Jaspers (1883­‑1969), psiquiatra e filósofo alemão, desenvolveu a aplicação do método fenomenológico na investigação psiquiátrica, a partir de 1913, quando publica a sua Psicopatologia Geral. Entre outros aspetos determinantes ainda hoje na psicopatologia, defendeu que o desen­ volvimento corresponde a uma manifestação psicopatológica compreensível com o historial do indivíduo. Já o processo, Jaspers defende que implica uma interrupção súbita do curso de vida do doente. A compreensão genética, em contraposição à estática, implica conexões causais. 4 – c) A psicopatologia, termo de origem grega resultante de três palavras – psykhé (alma), pathos (sofrimento) e logos (conhecimento) – corresponde ao estudo sistemático das vivências,­


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pensamentos­e comportamentos resultantes de alterações mentais. Essa disciplina pode ser es­ quematicamente dividida numa vertente explicativa (incluindo explicações com base em cons­ tructos teóricos) ou descritiva (referindo­‑se apenas à descrição e categorização das manifesta­ ções objetivas ou subjetivas). Para Jaspers, e de acordo com as alíneas b) e d), as manifestações psicopatológicas subjetivas têm de ser avaliadas através do método fenomenológico. 5 – e) O tipo de sentimento descrito é de uma contratransferência negativa, um conceito psicodi­ nâmico fundamental na técnica psicanalítica. Entende­‑se por contratransferência as emoções e sentimentos que o terapeuta experimenta no decorrer de uma análise, em rela­ção ao paciente. Foi Freud o primeiro a identificar e a descrever o fenómeno da contra­transferência. 6 – c) Uma avaliação válida e confiável do insight na prática clínica deve ter em atenção que este con­ ceito é complexo e multidimensional, podendo o nível de insight variar entre as muitas manifes­ tações da doença mental, sendo fundamental que os fatores socioculturais sejam tidos em conta. 7 – e) O doente apresenta uma atitude dissimuladora, já que tenta ocultar um sintoma existente com um evidente objetivo. Na atitude pueril, o doente apresenta habitualmente um comportamento infantilizado. En­ quanto na atitude negativista, o doente não colabora ou recusa mesmo participar na entrevista. Na atitude evasiva, o doente não se recusa a colaborar, mas evita responder a certas questões. Já na atitude simuladora, o paciente tenta apresentar um sintoma que não tem. Qualquer uma destas atitudes é uma situação diferente da apresentada na pergunta formulada. 8 – b) A palavra consciência deriva do latim, conscientia, tradução do termo grego syneidesis. Nas línguas derivadas do latim, o termo consciência engloba os conceitos de consciência moral e psicológica. Contudo, inicialmente, nas línguas anglo­‑saxónicas a palavra tinha o significado de consciência moral, surgindo mais tarde o termo de consciência psicológica, conceito mais amplo e que engloba a consciência moral. 9 – e) Acerca da psicopatologia da consciência, as afirmações a), b) e c) estão corretas. Sobre o conceito de turvação da consciência, podemos acrescentar que numa escala de diminuição da consciência, a seguir se situa a sonolência, o estupor e o coma. 10 – e) O estado crepuscular, cujas características foram enunciadas nas alíneas a) a c), em regra refere­‑se a uma condição orgânica (epilepsia ou mania à potu, por exemplo), embora possa tam­ bém ocorrer em estados dissociativos. Podem estar associados a este quadro estados oniroides, delírios ou alucinações.


Psicopatologia 17

11 – d) A hipoprosexia consiste numa diminuição global da atividade da atenção, podendo ocorrer como uma alteração fisiológica (nos estados de fadiga ou sonolência) ou num contexto pato­ lógico (como na depressão, esquizofrenia ou na demência). A aprosexia consiste numa abolição da atenção e ocorre, mesmo em indivíduos saudáveis, durante o sono. Ocorrendo, igualmente, em estádios avançados da demência, em certos casos de estupor na esquizofrenia e nos quadros de coma. 12 – d) A desorientação autopsíquica consiste numa diminuição ou perda da consciência do Eu. Num quadro de desorientação autopsíquica parcial, o paciente pode lembrar­‑se da sua idade mas não se recordar do seu nome, por exemplo. Podendo estas situações ocorrer na amnésia psicogénica, no atraso mental, na demência e no delirium. 13 – c) A orientação alopsíquica, mais concretamente a orientação temporal, é o tipo de orienta­ ção mais precocemente alterado na maioria das patologias. 14 – d) A palilalia e a ecolalia são alterações qualitativas da linguagem. A ecolalia consiste numa repetição, como um eco, da última palavra (ou últimas) proferida pelo interlocutor e pode ocorrer na esquizofrenia catatónica, na demência e no autismo. A palilalia consiste na repetição involuntária da última palavra (ou últimas) proferida pelo doente, ocorrendo na demência. A logorreia e a hiperprosódia são alterações quantitativas da linguagem, podendo ocorrer nos episódios maníacos. A logorreia ou verborreia refere­‑se a uma expressão verbal aumenta­ da, em que é difícil interromper o doente. A hiperprosódia consiste numa fala enfática, com uma acentuação da inflexão verbal. 15 – b) Em todas as restantes alíneas há alteração do significado da linguagem. Pelo contrário, a afasia constitui uma alteração da linguagem, habitualmente de causa neurológica, na qual está alterada a compreensão e a expressão da linguagem causada por lesões de determinadas regiões cerebrais. Incluem, por exemplo, os subtipos de afasia motora ou de Broca, sensorial ou de Wernicke, mista, transcortical.

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16 – e) O mutismo caracteriza­‑se pela perda completa do discurso na ausência de alterações do estado de consciência. 17 – a) As síndromes de Capgras e de Fregoli são os principais exemplos de delírios de identifi­ cação. Na síndrome de Capgras, o doente julga que um familiar foi substituído por um sósia.


PSIQUIATRIA

perguntas e respostas Este livro pretende ser um instrumento de autoavaliação, potencialmente útil numa fase prévia a processos de avaliação, mas também de revisão de conhecimentos teóricos e práticos na área da psiquiatria e saúde mental. Procurando alcançar o maior rigor científico possível, tem igualmente o objetivo de fomentar uma discussão reflexiva. Os nove capítulos, subordinados às temáticas das principais áreas da psiquiatria e saúde mental, abordam temas essenciais como a psicopatologia, perturbações do humor e da ansiedade, psicoses, perturbações de personalidade, psiquiatria geriátrica, patologia aditiva, psicofarmacologia e psicoterapia. Cada capítulo apresenta, pelo menos, 50 perguntas de escolha múltipla com resposta única. No final de cada capítulo, são apresentadas as respetivas soluções, acompanhadas de um parágrafo explicativo, com a análise das hipóteses alternativas, de modo a contribuir para uma crescente consolidação dos conhecimentos. Conscientes de que existirão poucos conceitos absolutos em medicina, menos ainda em psiquiatria, por vezes os autores apresentam, não a resposta certa, mas a melhor resposta possível. Psiquiatria: Perguntas e Respostas tem, fundamentalmente, interesse pedagógico, podendo contribuir de uma forma estimulante para a aquisição de conhecimentos, tendo como principal público-alvo estudantes de medicina, internos de psiquiatria, psiquiatras e outros médicos ou profissionais de saúde com interesse nesta área. Cláudio Laureano

Médico, Assistente Hospitalar Graduado de Psiquiatria, Diretor do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar de Leiria Sofia Fonseca

Médica, Assistente Hospitalar de Psiquiatria, Coordenadora do Hospital de Dia do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar de Leiria Vera Domingues

ISBN 978-989-752-415-8

9 789897 524158

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Médica, Assistente Hospitalar Graduada de Psiquiatria, Coordenadora da Unidade de Internamento de Agudos do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar de Leiria


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