Sexologia Médica

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SEXOLOGIA ´ MEDICA

Coordenação

Nuno Monteiro Pereira



Índice

Autores................................................................................................................. Prefácio ................................................................................................................ Siglas ...................................................................................................................

I BIologIa

do

Xi Xv Xvii

desenvolvImento

1. A Revolução Biológica .................................................................................. Clara Pinto Correia

3

2. Gametogénese, Fecundação e Desenvolvimento Embrionário Pré-implantação Mário Sousa, Rosália Sá, Cláudia Alves, Alberto Barros

13

3. Clonagem Reprodutiva ................................................................................. Rosália Sá, Alberto Barros, Mário Sousa

31

4. Haploidização ............................................................................................... Rosália Sá, Nieves Cremades, Cláudia Alves, Alberto Barros, Mário Sousa

45

5. Células Estaminais ........................................................................................ Rosália Sá, Alberto Barros, Mário Sousa

57

II emBrIologIa sexual 6. Determinação e Diferenciação Sexual ........................................................ Nuno Monteiro Pereira, Ricardo Ramires

79

7. Estados Intersexuais ..................................................................................... Nuno Monteiro Pereira, Ricardo Ramires

99

8. Malformações Genitais Congénitas ............................................................. Ricardo Ramires, Nuno Monteiro Pereira,

119

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III IdentIdade

de

género

9. Identidade de Sexo e Identidade de Género ............................................. Nuno Monteiro Pereira

133

10. Reflexões Sobre a Sexualidade Infantil ...................................................... Emílio Salgueiro

137

11. Disforia de Género....................................................................................... Nuno Monteiro Pereira

145

12. Atribuição e Reatribuição de Sexo na Disforia de Género ........................ Nuno Monteiro Pereira

153


sexologia Médica

Iv BIologIa

da

sexualIdade

13. Neurobiologia da Sexualidade ................................................................... António Santinho Martins

159

14. Determinantes Biológicas da Orientação Sexual ....................................... Francisco Allen Gomes, Tiago Reis Marques

177

v sexualIdade masculIna 15. Anatomia do Pénis ....................................................................................... Nuno Monteiro Pereira

221

16. Fisiologia da Resposta Sexual Masculina ................................................... Nuno Monteiro Pereira

235

17. Neurofisiologia da Ereção ........................................................................... José LaFuente Carvalho

249

18. Endotélio Vascular e Função Erétil .............................................................. Carla Costa

261

19. Disfunção Eerétil........................................................................................... Nuno Monteiro Pereira

277

20. Disfunção Ejaculatória ................................................................................. Nuno Monteiro Pereira, Maria do Rosário Gomes

303

21. Doença de La Peyronie ................................................................................ Nuno Monteiro Pereira

313

22. Epidemiologia das Disfunções Sexuais Masculinas em Portugal .............. Pedro Vendeira, Nuno Monteiro Pereira, Nuno Tomada, José LaFuente Carvalho

339

vI sexualIdade FemInIna

viii

23. Anatomia e Fisiologia da Resposta Sexual Feminina ................................ Fátima Serrano

351

24. Menopausa e Envelhecimento Feminino .................................................... Rui Marques de Carvalho, Maria do Céu Santo

363

25. Disfunções Sexuais Femininas ..................................................................... Ana Isabel Machado

375

26. Contracetivos Orais e Sexualidade Feminina ............................................. Lisa Ferreira Vicente

387

27. A Sexualidade na Mulher com Diabetes Mellitus ....................................... Lisa Ferreira Vicente

395

28. Mutilação Genital Feminina ........................................................................ Lisa Ferreira Vicente

405

29. Epidemiologia das Disfunções Sexuais Femininas ..................................... Pedro Vendeira, Nuno Monteiro Pereira, Fátima Serrano, Ana Alexandra Carvalheira

413


Índice

vII PsIcologIa

da

sexualIdade

30. Terapia Sexual nas Disfunções Sexuais Femininas .................................... Ana Alexandra Carvalheira

425

31. Terapia Sexual nas Disfunções Sexuais Masculinas ................................... Ana Alexandra Carvalheira, Nuno Monteiro Pereira,

433

32. Terapia de Casal e Sexualidade .................................................................. Ana Paula Relvas

439

33. Doença, Imagem Corporal e Sexualidade .................................................. Jorge Cardoso

453

vIII doenças

genItaIs e de transmIssão sexual

34. Doenças, Sexualmente Transmissíveis ........................................................ Luiz Leite 35. Lesões dos Genitais Externos e da Área Perigenital ................................. Luiz Leite

485

497 501

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Extratexto ............................................................................................................. Índice Remissivo ...................................................................................................

473

iX


autores

COORDENADOR/AUTOR Nuno Monteiro Pereira Urologista. Mestre em Sexologia. Doutorado em Cirurgia/Urologia pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa. Professor Associado da Universidade Lusófona, onde é Diretor do Mestrado Transdisciplinar de Sexologia. Diretor da iSEX Associação para o Estudo Avançado da Sexualidade Humana. Diretor da Clínica do Homem e da Mulher, em Lisboa. Antigo Presidente da Sociedade Portuguesa de Andrologia.

AUTORES alberto Barros Especialista em Genética Médica. Doutorado em Medicina/Patologia pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, onde é Diretor do Departamento de Genética e Professor Catedrático de Genética Médica. Diretor do Centro de Genética da Reprodução Prof. Alberto Barros. Pioneiro em Portugal de várias técnicas de Procriação Medicamente Assistida.

ana alexandra Carvalheira Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta. Doutorada em Psicologia da Sexualidade pela Universidade de Salamanca. Professora Auxiliar do ISPA – Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Instituto Universitário, onde realiza trabalho de investigação com uma Gulbenkian Professorship. Antiga Presidente da Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica.

ana isabel Machado Ginecologista e Obstetra. Mestre em Sexologia, área de Medicina Sexual pela Universidade Lusófona. Assistente Hospitalar da Maternidade Dr. Alfredo da Costa. Assistente Convidada de Ginecologia-Obstetrícia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa.

ana Paula relvas Psicóloga Clínica e Terapeuta Familiar. Doutorada em Psicologia Clínica pela Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (FPCEUC), onde é Professora Catedrática de Psicologia Clínica/Psicologia da Família. Coordenadora do GAIF – Grupo de Investigação em Avaliação e Intervenção Familiar da FPCEUC.

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antónio santinho Martins Endocrinologista. Docente Convidado do Mestrado Transdisciplinar de Sexologia da Universidade Lusófona. Antigo Assistente Graduado de Endocrinologia do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa. Antigo Presidente da Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica.

Carla Costa Bióloga. Doutorada em Biologia Humana pela Universidade de Medicina da Universidade do Porto, onde é Investigadora Principal e Professora de Biologia Celular e Molecular. Editora da secção de Investigação Básica do Journal of Sexual Medicine. Antigo membro da Comissão Executiva da ESSM – European Society for Sexual Medicine.


sexologia Médica

Clara Pinto Correia Bióloga. Doutorada em Biologia Humana pelo Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto. Investigadora Sénior do Centro de Estudos de História das Ciências Naturais e da Saúde do Instituto de Investigação Cientíica Bento da Rocha Cabral.

Cláudia alves Bióloga. Licenciada pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Responsável pelo Departamento de Citogenética do GDPN – Centro de Genética Médica e Diagnóstico Pré-natal Professor Doutor Sérgio Castedo, Porto.

emílio salgueiro Psiquiatra, Pedopsiquiatra e Psicanalista. Doutorado em Psiquiatria pela Universidade de Lisboa. Professor Catedrático Jubilado do ISPA – Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Instituto Universitário.

Fátima serrano Ginecologista e Obstetra. Mestre em Sexologia. Doutorada em Ginecologia/Obstetrícia pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, onde é Professora Auxiliar Convidada e regente da cadeira de Ginecologia/Obstetrícia. Assistente Graduada da Maternidade Alfredo da Costa.

Francisco allen Gomes Psiquiatra. Antigo Chefe do Serviço de Psiquiatria dos Hospitais da Universidade de Coimbra, onde foi responsável pela consulta de Sexologia. Responsável durante 10 anos pelo Curso de Introdução à Sexologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Autor de vários livros sobre sexualidade. Antigo Presidente da Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica.

Jorge Cardoso Psicólogo Clínico e Terapeuta Sexual. Doutorado pelo Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto. Docente Convidado do Mestrado Transdisciplinar de Sexologia da Universidade Lusófona. Professor Associado do Instituto Superior de Ciências da Saúde Egas Moniz. Membro da Unidade de Investigação em Psicologia e Saúde do ISPA – Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Instituto Universitário.

José laFuente Carvalho Urologista. Doutorado pelo Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto, onde é Professor Catedrático Convidado de Urologia. Chefe de Serviço de Urologia do Centro Hospitalar do Porto. Antigo Presidente da Sociedade Portuguesa de Andrologia.

lisa Ferreira vicente Ginecologista e Obstetra. Pós-graduada em Medicina Sexual pela Universidade Lusófona. Responsável pela consulta de Saúde Reprodutiva da APDP – Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal. Chefe de Divisão de Saúde Sexual, Reprodutiva, Infantil e Juvenil da Direção-Geral da Saúde.

luiz leite Dermatologista. Docente Convidado do Mestrado Transdisciplinar de Sexologia da Universidade Lusófona. Antigo Chefe de Serviço de Dermatologista do Hospital do Desterro. Diretor Clínico da Clínica Laser de Belém, em Lisboa.

Maria do Céu santo Ginecologista e Obstetra. Pós-graduada em Medicina Sexual pela Universidade Lusófona. Assistente Hospitalar Graduada do Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE. Membro do Corpo Clínico da Clínica do Homem e da Mulher, em Lisboa.

Xii


autores

Maria do rosário Gomes Psicóloga Clínica e Terapeuta Sexual. Mestre em Sexologia pela Universidade Lusófona. Membro do Corpo Clínico da Clínica do Homem e da Mulher, em Lisboa.

Mário sousa Especialista em Medicina da Reprodução. Mestre em Biologia Celular. Doutorado em Biologia Celular e Molecular da Reprodução Animal no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto, onde é Diretor do Laboratório de Biologia Celular e Professor Catedrático de Biologia Celular do ICBAS-UP. Diretor Cientíico do Centro de Genética da Reprodução Prof. Alberto Barros, Porto.

Nieves Cremades Bióloga. Embriologista Clínica Sénior da ESHRE – European Society of Reproduction and Embriology. Embriologista da Unidade de Reprodução do Hospital General Universitário de Alicante.

Nuno Tomada Urologista. Doutorado em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Assistente Hospitalar de Urologia do Hospital de S. João, Porto. Professor Auxiliar Convidado da Faculdade de Medicina do Porto, onde também é investigador do Departamento de Biologia Experimental do Instituto de Biologia Celular e Molecular.

Pedro vendeira Urologista. Doutorado em Medicina pela Faculdade de Medicina do Porto, onde foi investigador do Departamento de Biologia Experimental do Instituto de Biologia Celular e Molecular. Membro da iSEX Associação para o Estudo Avançado da Sexualidade Humana. Antigo membro do Conselho Executivo da ESSM – European Society for Sexual Medicine. Vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Andrologia.

ricardo ramires Urologista. Pós-graduado em Medicina Sexual pela Universidade Lusófona. Antigo responsável da Unidade de Urologia Pediátrica do Centro Hospitalar do Porto. Atual Diretor do Serviço de Urologia do Centro Hospitalar do Alto Minho, EPE.

rosália sá Bióloga. Doutorada em Ciências Biomédicas pelo Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto, onde exerce funções de Professora Auxiliar do Laboratório de Biologia Celular do Departamento de Microscopia e funções de Investigadora na UMIB – Unidade Multidisciplinar em Investigação Biomédica.

rui Marques de Carvalho Ginecologista e Obstetra. Pós-graduado em Medicina Sexual pela Universidade Lusófona. Assistente Hospitalar de Obstetrícia-Ginecologia do Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar de Lisboa Norte, EPE. Assistente Convidado da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.

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Tiago reis Marques Psiquiatra. Formação académica na Universidade de Coimbra. É investigador do Instituto de Psiquiatria do King’s College, em Londres, onde fez o seu doutoramento.

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Prefácio

Em 2001, a Organização Mundial de Saúde editou o documento Promotion of Sexual Health: Recommendations for Action, em que a sexualidade humana era caracterizada como a dimensão do ser humano que incluía sexo, identidade sexual, género, identidade de género, orientação sexual, eroticismo, amor, ligação física e reprodução. Deinia-a também como o resultado da interação de fatores biológicos, psicológicos, socioeconómicos, culturais, éticos e religiosos. Mostrava-a ainda como possível de ser vivenciada ou expressa por pensamentos, fantasias, desejos, crenças, atitudes, valores, práticas, papéis e relacionamentos. E concluía que era urgente criar as estruturas basilares para a sua investigação e ensino. Sem dúvida que os primeiros estudos empíricos sobre comportamento sexual, educação sexual, ética sexual e política sexual se devem aos pensadores clássicos: Platão, Hipócrates e Aristóteles. Mas não podemos esquecer a importância dos poemas ao amor e à arte da sedução de Ovídio, nem a visão objetiva da sexualidade de Galeno. Ou a importância que tiveram, no Renascimento, os estudos anatómicos genitais de André Vesálio e Leonardo da Vinci. Ou ainda a classiicação das espécies baseada nas suas características sexuais, de Carl Lineu. Ou a primeira classiicação do comportamento sexual humano, em 1926, por Wilhelm Humboldt. Ou a decisiva teoria evolucionista de Charles Darwin, logo reforçada pela deinição dos fundamentos da genética e das leis da hereditariedade de Gregor Mendel. Contudo, os primeiros estudos racionais e sistemáticos do comportamento sexual apenas surgiram nos inais de século XIX, com von Baer, Kaan, Charcot, von Krafft-Ebing, Mantegazza, Westermarck e outros. Foi nessa época que icou lançado o conceito de “sexualidade humana” e criadas as fundações para a sua investigação em termos biológicos e médicos. A Medicina do século XIX interessou-se sobretudo pelo bizarro e pelos aspetos supostamente doentios do sexo. Só no princípio do século XX os trabalhos pioneiros do dermatologista alemão Iwan Block vieram determinar uma nova conceptualização do estudo cientíico da sexualidade. Homem de enorme erudição, Block apercebeu-se que a perspetiva médica tradicional tinha de ser suportada não só pela investigação biológica e médica, como também pela investigação antropológica e histórica. Para deinir esse entendimento cientíico da sexualidade humana, Block utilizou o termo Sexualwissenschaft, inicialmente traduzido para as línguas latinas e anglófonas como “ciência sexual”. A denominação foi rapidamente contestada pelo próprio Block, que argumentou que a palavra alemã wissenschaft deinia um conceito mais amplo, compreendendo as ciências naturais e as humanidades. Foi então proposto a adoção do termo “sexologia”, baseado no termo grego logos, habitualmente utilizado para deinir as áreas do conhecimento sujeitas a estudo racional. O termo híbrido latino-grego “sexologia” passou então, consensualmente, a deinir o estudo teórico do sexo, ou da scientia sexualis, icando desde logo distinguido do termo “erotologia” que deinia o estudo do amor, ou da ars amatoria. Seguidores das ideias de Iwan Block, Albert Moll, Wilhelm Reich e Sigmund Freud estabeleceram deinitivamente a investigação alargada dos problemas sexuais como um legítimo objetivo cientíico. Em Portugal, em 1902, o livro de Egas Moniz A vida sexual foi também um marco importante, precursor dessa nova visão da sexualidade. Em 1905, nos seus três ensaios sobre a teoria do sexo, Freud descreve o desenvolvimento “normal” da sexualidade humana e das suas “perversões”. Albert Moll, em 1909, escreve A vida sexual da criança onde contesta as teorias


sexologia Médica

freudianas, considerando-as pouco cientíicas. Em 1919, Magnus Hirschfeld cria o Institut für Sexualwissenschaft, em Berlim, reforçando a inluência europeia e alemã na investigação da sexualidade, que só foi brutalmente interrompida com a ascensão dos ideais nazis, no inal dos anos 1930, e com o advento da II Guerra Mundial. O conhecimento cientíico migrou para os Estados Unidos, tendo o estudo da Sexologia adquirido aí uma nova concretização nos anos 1940, como os trabalhos do zoólogo Alfred Kinsey, que funda, em 1947, em Indiana, o Institute of Sex Research. Nos anos 1960 e 1970, várias instituições de investigação são criadas nos Estados Unidos, em França, em Inglaterra e na Escandinávia. Os aspetos psicológicos e socioculturais dominavam o entendimento da sexualidade humana. Em 1976, em São Francisco, Wardell Pomeroy, um colaborador de Kinsey, funda o Institute for Advanced Study of Human Sexuality, a primeira instituição mundial autorizada a atribuir graus de Mestre e Doutor em Sexologia. Nos anos 1970, surge uma corrente de clínicos norte-americanos que reconheciam que os componentes biológicos e médicos da sexualidade estavam a icar subvalorizados em relação aos componentes psicológicos e socioculturais. O marco mais signiicativo desse foi a publicação do livro Textbook of Sexual Medicine (Kolodny R, Masters W, Johnson V, Ed. Little Brown & Co., 1979) e, mais tarde, do Biological Foundations of Human Sexuality (Masters W, Johnson V, Kolodny R, Ed. Addison-Wesley Pub. Co., 1993). A visão médica – mais pragmática – da sexualidade humana foi lentamente incutindo-se como um empolgante ramo de ação. Nos primeiros anos do século XXI, a denominação “Medicina Sexual” ou “Sexologia Médica” passou a ser adotada por várias prestigiadas sociedades internacionais, a aparecer nos títulos de livros e revistas cientíicas, a surgir como tema de reuniões e congressos. Ficou claro o conceito de uma área do conhecimento cientíico que abrange os aspetos médicos dos assuntos sexológicos e os aspetos sexológicos dos assuntos médicos. A Sexologia Médica, assim entendida, é um campo de ação transdisciplinar, um verdadeiro meeting point de uma ampla variedade de especializações, cada uma com o seu papel. Inclui andrologistas, ginecologistas, endocrinologistas, pediatras, psiquiatras, mas também não prescinde dos biólogos, geneticistas, psicólogos e sociólogos – todos a contribuir para um mesmo objetivo. Só essa abordagem transdisciplinar permite uma alargada investigação cientíica e a construção de armas diagnósticas e soluções terapêuticas à medida das necessidades das pessoas. Nuno Monteiro Pereira

Xvi


siglas

a

DSF – disfunção sexual feminina

α-SMA – alfa-actina muscular ACh – acetilcolina ACTH – hormona adrenocorticotrópica ADAM – deiciência androgénica do envelhecimento masculino (androgen decline in the aging male) AGE – produtos de glicação avançada AMH – hormona antimülleriana AMPc – adenosina monofosfato cíclico Ang – angiotensina ATP – adenosina trifosfato

e

B BT – testosterona biodisponível

C CAIS – síndrome de sensibilidade androgénica completa CDC – células de explantes cardíacos CE – células endoteliais cEPC – células progenitoras endoteliais CF – células foliculares CGRP – peptídeo relacionado com o gene da calcitonina (calcitonin gene-related peptide) COC – complexo cumulus-ovócito CUMS – cistouretrograia miccional

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d DAG – diacilglicerol DC – doença coronária DCV – doença cardiovascular DE – disfunção erétil DEnd – disfunção endotelial DES – dietilestilbestrol DHEA – di-hidroepiandrosterona DHEA-S – di-hidroepiandrosterona sulfato DHT – di-hidrotestosterona DM – diabetes mellitus DMSO – dimetilsulfóxido DNA – ácido desoxirribonucleico DP – doença de La Peyronie DSD – perturbações do desenvolvimento sexual (disorder of sex development)

EDHF – fatores hiperpolarizadores derivados do endotélio EDTA – ácido etilenodiaminotetracético ENC – estímulo não condicionado eNOS – NO-sintetase endotelial e-NOS – NO-sintase endotelial EOA – emissões otoacústicas EOAE – emissões otoacústicas espontâneas EOAEC – emissões otoacústicas evocadas por clique EPC – células progenitoras endoteliais ESC – células estaminais embrionárias (embryonic stem cells) ET-1 – endotelina-1

F FACS – luorescenc-activated cell sorting FDA – Food and Drug Administration FHDE – fator hiperpolarizante derivado do endotélio FISH – hibridização luorescente in situ (luorescence in situ hybridization) FIV – fertilização in vitro FRV – fatores de risco vascular FSFI – Índice da Função Sexual Feminina (Female Sexual Function Index) FSH – hormona folículo-estimulante

G GABA – ácido gama-aminobutírico GCs – enzima guanilil ciclase solúvel GMPc – guanosina monofosfato cíclico GnRH – hormona libertadora de gonadotroina GTP – guanosina trifosfato

H HAM – hormona antimülleriana HCG – hormona coriónica gonadotróica HCSR – hiperplasia congénita da glândula suprarrenal hESC – células estaminais embrionárias humanas


Cap. 2

Gametogénese, Fecundação e desenvolvimento embrionário Pré-implantação Mário sousa, rosália sá, Cláudia alves, alberto Barros

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GaMeTOGÉNese Na espécie humana, a gónada feminina (ovário) produz os gâmetas femininos (ou ovócitos) e a gónada masculina (testículo) produz os gâmetas masculinos (ou espermatozoides). Entre os gâmetas e as restantes células do organismo (ou células somáticas) existem duas grandes diferenças, no número de cromossomas e na informação genética. As células somáticas são diploides (46 cromossomas: 46,XX na mulher e 46,XY no homem) (Figura 2.1), enquanto os gâmetas são haploides (23 cromossomas: 23,X nos ovócitos; 23,X ou 23,Y nos espermatozoides). O processo de redução a metade do número de cromossomas denomina-se meiose, a qual consiste em duas divisões celulares sequenciais. O espermatozoide é uma célula totalmente haploide, e só se diferencia quando as células progenitoras terminam as duas divisões meióticas (Figura 2.2). Pelo contrário, o ovócito é ovulado antes de concluir a segunda divisão da meiose, terminando esta apenas se for fecundado ou ativado artiicialmente (Figura 2.3). O processo que confere aos gâmetas uma informação genética distinta do organismo denomina-se recombinação homóloga. Ocorre antes da primeira divisão meiótica e deve-se à troca de segmentos entre os cromossomas homólogos (Figura 2.4).

2

1

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x

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Figura 2.1 • Conjunto dos 46 cromossomas de um indivíduo do sexo masculino (cariótipo). existem 23 pares de cromossomas homólogos. Os homólogos numerados de 1 a 22 denominam-se autossomas. O 23.º par é formado pelos cromossomas sexuais (gonossomas), XY, neste caso. Cariótipo derivado de culturas celulares de linfócitos do sangue venoso periférico. imagens obtidas num cariotipador automático no serviço de Genética da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP).

FeCUNdaÇÃO A razão de ser da formação dos gâmetas é a fecundação, processo que culmina na formação de um embrião diploide por junção dos 23 cromossomas maternos e dos 23 cromossomas paternos. Um embrião é diferente dos progenitores não só porque resulta da combinação de duas células oriundas de dois


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Figura 2.13 • Alguns exemplos de anomalias estruturais de embriões pré-implantação antes da fase de blastocisto. ZP, primeiro (1GP) e segundo (2GP) glóbulos polares, pronúcleos feminino (PN♀) e masculino (PN♂). (A) Zigoto normal. (B) Zigoto com um só PN (seta). (C) Zigoto com múltiplos PN (seta) e sem extrusão do 2GP. (D) embrião de duas células, com blastómero multinucleado (seta). (E-H) Classificação da qualidade morfológica embrionária ao terceiro dia: (E) Grau A: sem fragmentos, blastómeros de superfície regular e de igual tamanho. (F) Grau B: < 25% de fragmentos (seta), blastómeros irregulares e de dimensão diferente. (G) Grau C: 25% a 50% de fragmentos (setas), blastómeros irregulares e de dimensão diferente; (H) Grau D: > 50% de fragmentos (setas), blastómeros irregulares e de dimensão diferente. Os embriões de classe aB são passíveis de transferência intrauterina e de criopreservação. Os embriões de classe C apresentam aneuploidias em 85% a 90% dos casos. só se transferem na ausência de embriões AB e não se criopreservam. A sua taxa de gravidez normal de termo é < 10%. Os embriões de classe d são todos aneuploides e não se transferem nem criopreservam. imagens de microscopia invertida Hoffman (CGr).

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atingir a fase de blastocisto e de se implantar não confere ainda ao embrião a capacidade de originar um ser humano, uma vez que, até às 12 semanas (três meses) de gestação, a taxa de abortamento espontâneo por malformações embrionárias e da placenta é de cerca de 20%. O conceito de pré-embrião tem sido aplicado ao embrião pré-implantação para não haver confusões com a fase de desenvolvimento embrionário pós-implantação, a fase em que os órgãos não estão ainda formados (pré-fetal). No presente texto utilizamos os termos embrião pré-implantação, embrião pós-implantação e feto. Não faz sentido deinir o início da vida ou do ser humano em relação a qualquer das etapas do desenvolvimento embrionário pré-implantação: fusão entre as membranas dos dois gâmetas (fecundação); formação dos pronúcleos (zigoto); mistura dos

cromossomas paternos e maternos (embrião de uma célula); fase de quatro a oito células, em que se inicia a expressão comum dos genes maternos e paternos; primeira diferenciação celular (blastocisto); implantação (sétimo dia); formação do tubo neural (início do sistema nervoso: 14.º dia); formação dos esboços dos orgãos (oito a 10 semanas); formação da rede neuronal (24 semanas). Porém, não existe acordo sobre o conceito de início de vida. Vida existe sempre, mesmo em qualquer célula, como os gâmetas ou as células somáticas. No entanto, uma vez que a partir da fecundação a célula resultante é diferente dos gâmetas, deve considerar-se o início da nova vida a partir dessa etapa. Esta nova vida não é ainda um ser humano. Também não existe consenso na deinição do início de um ser humano. Existem várias teorias neste referente, como a que airma que um ser humano é aquele que apresenta autoconsciência ou a


determinação e diferenciação sexual

diFereNCiaÇÃO dOs GeNiTais iNTerNOs diferenCiação da gónada masCulina

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No indivíduo XY, deinidas as estruturas mesonefróticas indiferenciadas, vão começar a diferenciar-se estruturas reconhecidamente masculinas, a começar pela própria gónada. A diferenciação da gónada no sentido masculino é um fenómeno rápido, que contrasta com o lento desenvolvimento no sentido feminino. Reconhece-se tecido testicular a partir da sétima semana de gestação, quando o embrião tem cerca de 18 mm a 20 mm (Jirasek, 1977). A crista genital destaca-se em relação à parede lombar e surge a albugínea, uma camada relativamente espessa de mesênquima que vai rodear o tecido testicular e separá-lo do resto do mesonefros e do epitélio celómico (Figura 6.6). Para dentro da albugínea, as células germinativas dos cordões sexuais, as espermatogónias, dividem-se ativamente, mas nunca entram em meiose. Quando surgem as células de Sertoli, no princípio da oitava semana fetal, estas começam a rodear as espermatogónias, iniciando a formação dos futuros tubos seminíferos.

Figura 6.6 • Diferenciação testicular. O mesonefro individualiza-se em relação à parede lombar. O testículo torna-se esférico e fica quase inteiramente envolvido pela albugínea (sétima semana de vida embrionária).

Uma membrana basal isola os tubos do tecido mesenquimatoso que os rodeia. As espermatogónias, a partir do momento em que são envolvidas pelas células de Sertoli, icam inibidas no seu desenvolvimento. Essa inibição permanece até à puberdade, quando inalmente podem começar a entrar em prófase meiótica e a desenvolver a espermatogénese (Jost, 1972). A determinada altura, todos os tubos seminíferos convergem para uma única região. A partir dessa região crescem as primeiras conexões urogenitais, com o aparecimento dos tubos de Mihalcovics, que ligam os tubos seminíferos a tubos mesonefróticos. O mesonefro ica cada vez mais individualizado em relação à parede lombar do embrião. A zona testicular torna-se quase esférica e está quase inteiramente envolvida pela albugínea. O canal de Müller continua presente e está igualmente localizado numa zona bem individualizada. A individualização dos tubos seminíferos precede a diferenciação das células de Leydig. Essas células surgem pela nona semana, quando o feto tem 30 mm a 40 mm, começando desde logo a produzir testosterona, embora a máxima concentração só seja atingida entre a 14.ª e 16.ª semanas de gestação. Os níveis então segregados são semelhantes aos observados num homem adulto. Depois da 20.ª semana, as células de Leydig involuem e os níveis de testosterona circulante diminuem progressivamente, igualando os níveis veriicáveis no feto feminino (Forest et al., 1974). A testosterona e uma outra substância produzida pelo testículo, a hormona antimülleriana (AMH), são indispensáveis para o desenvolvimento no sentido masculino. A testosterona vai determinar o desenvolvimento dos genitais internos, a partir do desenvolvimento dos canais de Wolff. A AMH é a responsável pela regressão dos canais de Müller. Contudo, estes canais só são sensíveis à AMH durante um período limitado de cerca de oito semanas. Vimos que a embriogénese testicular se inicia na vizinhança dos rins. Mas, pela 12.ª semana de gestação, os testículos começam a descer, cada um do seu lado, em direção ao

cap.

6

85


sexologia Médica

Tabela 7.3 • Proposta de classificação dos estados intersexuais usando a nomenclatura DSD (adaptado de Hughes ia [2006] Consensus statement on management of intersex disorders. Arch Dis Child; 91: 554-562). DSD ligada 46,XY DSD aos cromossomas sexuais (A) 45,X (A) Alterações do desenvol(síndrome de turner e suas vimento gonádico (testicular) variantes) 1. disgenesia gonadal completa (síndrome de Swyer) (B) 47,XXY 2. disgenesia gonadal parcial (síndrome de Klinfelter e suas 3. regressão gonádica variantes) 4. Ovotesticular DSD (C) 45,X/46, XY (B) Alterações na síntese ou (disgenesia gonadal mista, ação dos androgénios ovotesticular DSD) 1. Perturbação na biossíntese dos androgénios (por exemplo, dé(D) 46,xx/46,XY fice de hidroxiesteroide desidro(quimera, ovotesticular DSD) genase, défice de 5α-redutase, mutações StAr) 2. Défice na ação dos androgénios (por exemplo, CAiS, PAiS) 3. Perturbação no recetor LH (por exemplo, hipo ou aplasia das células de Leydig) 3. Perturbação na HAM ou no seu recetor (síndrome da persistência dos canais de Müller

46,XX DSD (A) Alterações do desenvolvimento gonádico (ovárico) 1. Ovotesticular DSD 2. DSD testicular (por exemplo, SrY+, dup SOX9) 3. Disgenesia gonadal (B) Excesso de androgénios 1. F etais (por exemplo, défice em 21-hidroxilase ou 11-hidroxilase) 2. F etoplacentar (défice em aromatase, POr) 3. Maternal (luteoma, exogenia, etc.) (C)Outros (por exemplo, extrofia cloacal, atresia vaginal, MUrCS, outras síndromes)

(C) Outros (por exemplo, hipospadias severas, extrofia cloacal) Embora o cariótipo seja útil para a classiicação, referências desnecessárias sobre ele devem ser omitidas, idealmente a classiicação deve ser baseada em termos descritivos (por exemplo, síndrome de insensibilidade androgénica), sempre que possível. HAM – hormona antimülleriana, CAIS – síndrome de insensibilidade androgénica completa; PAIS – síndrome de insensibilidade androgénica incompleta; DSD – perturbação do desenvolvimento sexual; MURCS – anomalias dos somitos müllerianos, renais e cervicotorácicas; POR – citocromo P450 oxidorreductase.

OvOTesTiCUlar dsd (HErMAFrODitiSMO verdadeirO)

104

No hermafroditismo verdadeiro encontramos tanto tecidos ováricos como testiculares revestindo-se de uma causa rara de ambiguidade sexual. A aparência dos genitais varia muito, embora a tendência seja para a masculinização. São casos extremamente raros, com uma frequência avaliada em um caso para um milhão de nados-vivos, não ultrapassando 8% de todos os casos de intersexo. Poderão

existir quaisquer combinações de ovário, testículo ou ovotestis. Em cerca de 70% dos casos, encontra-se ovotestis, um terço dos quais bilateral. Quando presente, o testículo encontra-se com mais frequência à direita (57,4%), enquanto o ovário é mais frequente à esquerda (62%). Em 61% dos doentes, consegue palpar-se uma gónada a qual é, em 60% dos casos, um ovotestis. Em 80% dos doentes com ovotestis, os tecidos testicular e ovárico encontram-se alinhados longitudinalmente e em 20% o tecido testicular encontra-se na região hilar da gónada. Estes factos enfatizam a necessidade de se proceder


Cap. 14

determinantes Biológicas da Orientação sexual Francisco allen Gomes, Tiago reis Marques

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iNTrOdUÇÃO A procura de fatores biológicos responsáveis pela orientação sexual humana tem determinado um apreciável volume de investigação científica nos últimos 30 anos. Esta investigação tem gerado grandes controvérsias (Bancroft, 1994; Rahman, 2005a) e uma diversidade de paradigmas explicativos: genética, androgenização pré-natal, ordem fraterna de nascimento, instabilidade desenvolvimental e arquitetura neuronal (Rahman, 2005b). Isto não significa que estes paradigmas sejam mutuamente exclusivos. Em termos especulativos, podemos considerar que o facto de ter vários irmãos mais velhos pode aumentar a ação dos genes que influenciam a orientação sexual, determinando mudanças da atividade hormonal no cérebro (Mustanski, Chivers e Bailey, 2002a). As controvérsias têm a sua origem, segundo Bancroft (1994), no facto de uma possível base biológica da homossexualidade remeter para uma dicotomia moral e política que, historicamente, tem acompanhado a homossexualidade: “pecado ou doença”. A existência de uma base biológica seria como que uma “desculpabilização” com efeitos positivos na sua não descriminação. Simon LeVay, um investigador particularmente atento, acentua este aspeto ao afirmar que, apesar de as teorias biológicas terem uma longa história, a sua

reemergência nos anos 80 e 90 do século XX acompanha, de forma paralela, um aumento de tolerância e aceitação dos homossexuais em muitas sociedades ocidentais. “Este paralelismo reflete uma interação em dois sentidos: o aumento da aceitação das (e familiaridade com) pessoas gays encoraja a crença nas teorias biológicas e vice-versa” (LeVay, 2006). Podemos compreender estas considerações à luz da imutabilidade da orientação sexual (para uma discussão das implicações morais e sociolegais, consultar Greenberg e Bailey, 1993). Só que a eventualidade da descoberta de um claro mecanismo causal (por exemplo, in utero) pode acarretar a utilização de estratégias preventivas por parte de pais que não queiram assumir um futuro filho gay, recorrendo a um aborto seletivo para o evitar (Greenberg e Bailey, 2001). Por outro lado, as terapias de reorientação sexual que pareciam definitivamente afastadas estão de novo a reaparecer (Spitzer, 2003), embora liminarmente rejeitadas pela maioria dos investigadores e terapeutas (peer commentaries, em Spitzer, 2003). A biologia da orientação sexual é uma área onde a objetividade científica tem poucas hipóteses de sobrevivência (Bancroft, 1994). Uma análise crítica da biologia da orientação sexual é uma tarefa eriçada de obstáculos. As indispensáveis replicações às investigações mais significativas têm produzido, na maioria das vezes, resultados contraditórios. Só que,


Cap. 15

anatomia do Pénis Nuno Monteiro Pereira

iNTrOdUÇÃO Do ponto de vista puramente anatómico, o pénis possui dois corpos cavernosos e um corpo esponjoso, que rodeia a uretra. Os três funcionam em conjunto, como se fossem um único corpo erétil. O pénis, quando passa do estado de flacidez para o de ereção, aumenta em comprimento e diâmetro, aumentando cerca de três vezes o seu volume. É esse órgão surpreendente que vamos tentar descrever quanto ao modo como se organiza e dispõe. No essencial, vamos considerá-lo dividido em duas partes: a haste peniana e a raiz peniana (Figura 15.1).

erótica, o corpo do pénis pode apresentar-se de tamanho e aspeto bem diferentes, passando do estado flácido para o estado erétil. Nessas ocasiões, o pénis pode aumentar, em poucos segundos, para o triplo do volume inicial, atingindo um comprimento de mais de 15 cm e um perímetro de cerca de 12 cm.

pele

peniana e fásCias subCutâneas

A pele que recobre o pénis é desprovida de pelos na maior parte da sua porção livre, ao

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HasTe PeNiaNa A haste peniana, por vezes também chamada corpo peniano, é a porção do órgão sexual masculino que está em evidência. É o pénis visível, o pénis pendente, o órgão copulador do macho da espécie humana. Tem a forma de um cilindro ligeiramente achatado, com cerca de 10 cm de comprimento e nove 9 cm de perímetro, recoberto por pele muito móvel, que retrai facilmente para expor uma extremidade distal formada por mucosa, na qual se observa o orifício por onde se faz a emissão de esperma e de urina. Em certas circunstâncias, geralmente relacionadas com mecanismos de excitação

Figura 15.1 • Corte sagital do pénis e da pelve. Em estado de flacidez, a raiz do pénis encontra-se fixada ao diafragma urogenital e ao osso ilía co, enquanto o corpo do pénis se apresenta livre e de aspeto pendente (Fonte: Pereira NM, 2007).


Cap. 34

doenças sexualmente Transmissíveis luiz leite

iNTrOdUÇÃO Num mundo cada vez mais “global”, as doenças sexualmente transmissíveis (DST) (Quadro 34.1) continuam a aumentar, apesar de todas as campanhas desenvolvidas por grandes organizações, como a Organização Mundial da Saúde (OMS), até aos simples clínicos como nós que, na prática diária, não só

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Quadro 34.1 • Doenças sexualmente transmissíveis mais comuns. Bacterianas • sífilis • Úlcera mole venérea • linfogranuloma venéreo (doença de Nicolas-Favre) • donovanose (granuloma inguinal) • Uretrite – por gonococo – por clamídia trachomatis – por Ureaplasma urealyticum • vaginose Virais • Herpes simples • Molusco contagioso • verrugas venéreas (condilomas acuminados) • sida Outras infeções • Candidíase genital • Tinha cruris • escabiose • Pediculose • Tricomoníase

as tratamos, como nos esforçamos por difundir conceitos de prevenção. No entanto, e ao que tudo indica (os números não enganam na sua frieza), todo esse esforço continua a ser pouco eficaz com centenas de milhões de novos casos de DST, anualmente, a nível mundial. E a SIDA, esse flagelo surgido no final do século XX, insiste em fazer vítimas já em pleno século XXI, apesar dos milhões investidos na investigação. São os dermatovenereologistas os profissionais que observam os pacientes com DST, já que a sua especialidade abrange, como o próprio nome indica, essa área da medicina; mas não só, porque na prática clínica também os internistas, os clínicos gerais, os especialistas de doenças infetocontagiosas proctologistas, os urologistas e os ginecologistas observam este tipo de patologia. No entanto, outros especialistas, como psicólogos ou psiquiatras, podem ter uma atuação importante no apoio aos doentes com DST. Assim, é a todos os colegas que se interessam por esta área que este trabalho se destina, esperando o autor que ele possa ser de alguma utilidade no importante combate que todos como médicos e como cidadãos devemos travar contra as DST. Este texto não tem pretensões de “tratado médico”, mas de, resumidamente, abordar as DST mais frequentes, alertando os colegas para situações particulares, ajudando-os numa consulta rápida. Para informações mais


Extratexto

Y

13

X 18 13

16

1PB

18 18

18 13

18

X

18

X

16 X

MII

Figura 2.11 • Anomalias da segregação meiótica em ovócitos. A análise foi efetuada por citogenética molecular num ovócito na fase de metafase II (MII). O DNA está corado de azul e detetou-se a presença do cromossoma sexual (X: verde) e de dois cromossomas autossómicos (16: vermelho; 18: amarelo). O MII e o primeiro glóbulo polar (1GP) deveriam ter uma constituição 16,18,X. Na imagem observa-se a metafase do ovócito com separação prematura dos cromatídeos (16,16/18,18/X,X). Imagens de microscopia de fluorescência (FMUP).

Yr

X

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13

Figura 2.12 • Aneuploidias originadas na meiose masculina resultantes de erros de segregação cromossómica meiótica. A análise foi efetuada por citogenética molecular em espermatídeos redondos, as primeiras células haploides. O DNA está corado de azul e detetou-se a presença dos dois cromossomas sexuais (X: lilás; Y: vermelho) e de dois cromossomas autossómicos (13: amarelo; 18: rosa claro). Uma célula haploide normal deveria ter uma constituição 13,18,X ou 13,18,Y. Na imagem (da esquerda para a direita) observam-se cinco células, quatro aneuploides e apenas uma euploide: 13,18,18,Y (dissomia 18); 13,X (nulissomia 18); 18 (nulissomia do 13 e de um cromossoma sexual); 13,18,X (euploide); 13,X (nulissomia 18). Imagens de microscopia de fluorescência (FMUP).

16r X

16r A

X

18r

B

C

D

E

F

G

Figura 2.15 • Exemplo de aneuploidias embrionárias. Análise citogenética molecular para estudo da constituição cromossómica de embriões. (A) Embrião de nove células (blastómeros) de elevada qualidade morfológica (grau A). (B) Análise genética do embrião (do sexo masculino). O DNA de cada blastómero foi marcado a azul, e em cada blastómero estudou-se a presença dos dois cromossomas sexuais, X (amarelo) e Y (vermelho), e de dois cromossomas autossómicos, o 16 (laranja) e o 18 (rosa). Se cada blastómero fosse normal (diploide), deveria apresentar um sinal vermelho (cromossoma Y), um sinal amarelo (cromossoma X), dois sinais laranja (dois cromossomas 16) e dois sinais rosa (dois cromossomas 18). Porém, no caso presente, todos os blastómeros são aneuploides. (B) 16,16,XY (faltam dois cromossomas 18); X,18 (faltam o Y, dois 16 e um 18). (C) 16; 16,18,X; 18,X. (D) 16,18,X. (E) 16,18,X. (F) 16,18,X. (G) 16,18,18,XX. Sempre que dois sinais se encontrem juntos, corresponde a um só cromossoma replicado (r: com dois cromatídeos). (A) Imagem de microscopia invertida Hoffman (CGR). (B-G) Imagens de microscopia de fluorescência (FMUP).


SEXOLOGIA ´ MEDICA

A sexologia médica é, hoje, um verdadeiro meeting point de uma ampla variedade de especialidades. Inclui andrologistas, ginecologistas, endocrinologistas, pediatras e psiquiatras, mas também não prescinde dos biólogos, dos geneticistas, dos psicólogos e dos sociólogos – cooperando para alcançar uma ação transdisciplinar que permita uma adequada investigação científica e a construção de armas diagnósticas e soluções terapêuticas à medida da necessidade humana. Depois de anos em que a sexualidade foi sobretudo reconhecida nos seus componentes psicológicos e socioculturais, a partir dos anos 1970 a visão médica da sexualidade, mais pragmática, foi-se lentamente afirmando como um empolgante ramo de ação. Contudo, o ensino universitário tem, sucessivamente, adiado medidas reformadoras nesta área, continuando a não existir disciplinas curriculares que abordem a sexualidade humana de um modo estruturado e desenvolvido. É através de uma visão pluralista e abrangente que Sexologia Médica vem colmatar estas lacunas, englobando diversas áreas, como a biologia do desenvolvimento e da sexualidade, a embriologia sexual, a identidade de género, a sexualidade masculina e a feminina – incluindo as suas disfunções –, a psicologia da sexualidade e as doenças genitais e de transmissão sexual. Sexologia Médica vem, então, satisfazer a avidez de conhecimentos que muitos médicos e estudantes de Medicina sempre demonstraram face a esta área universal da realidade humana.

Nuno Monteiro Pereira

ISBN 978-972-757-607-4

9 789727 576074

www.lidel.pt

Urologista. Mestre em Sexologia. Doutorado em Cirurgia/Urologia pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa. Professor Associado da Universidade Lusófona, onde é Diretor do Mestrado Transdisciplinar de Sexologia. Diretor da iSEX – Associação para o Estudo Avançado da Sexualidade Humana. Diretor da Clínica do Homem e da Mulher, em Lisboa. Antigo Presidente da Sociedade Portuguesa de Andrologia.


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