Terapia de Bem-Estar

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15,5cm x 23.5cm

A Terapia de Bem-Estar (TBE) é uma estratégia psicoterapêutica inovadora, de curta duração, desenvolvida por Giovanni A. Fava, psiquiatra mundialmente reconhecido, que enfatiza a auto-observação e recorre à interação entre paciente e terapeuta, procurando promover o bem-estar psicológico e a resiliência de pacientes com depressão e ansiedade. O foco da TBE em seis domínios de funcionamento pessoal (controlo ambiental, crescimento pessoal, propósito de vida, autonomia, autoaceitação e relações positivas com os outros) dá-lhe uma profundidade que não se alcança com as terapias cognitivo-comportamentais tradicionais.

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Apesar de ter sido originalmente desenvolvida com o intuito de evitar recaídas na fase residual da depressão, esta terapia tem revelado resultados positivos com outro tipo de patologias, como perturbação de ansiedade generalizada, mudanças de humor, agorafobia, pânico e perturbação de stress pós-traumático, o que muito tem contribuído para o aumento da sua popularidade em todo o mundo.

12.5 mm

GIOVANNI A. FAVA

é Professor de Psicologia Clínica na Universidade de Bolonha e Professor Clínico de Psiquiatria na Universidade Estadual de Nova Iorque em Buffalo. Autor de mais de 500 artigos científicos, realizou investigações inovadoras em vários campos. É editor-chefe da prestigiada revista Psychotherapy and Psychosomatics.

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Destinado aos profissionais de Psicologia, Psiquiatria e de outros campos da Medicina (como, por exemplo, Medicina Familiar, Pediatria e Reabilitação), este livro foi escrito num estilo descontraído, claro e acessível, através do qual o Professor Fava salpica a sua narrativa com episódios da sua carreira médica, tornando-o igualmente interessante para conselheiros, educadores, familiares e amigos/cuidadores dos doentes, assim como para os próprios doentes. Publicada em 5 idiomas, a presente obra fica agora disponível também em língua portuguesa. Com revisão técnica de António Barbosa (Professor Catedrático de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e coordenador do Núcleo de Psiquiatria de Ligação do Serviço de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE.)

ISBN 978-989-693-068-4

9 789896 930684

“A publicação deste primeiro livro sobre Terapia de Bem-Estar (TBE) é um marco histórico.” Jesse H. Wright, In Posfácio “Espero que a TBE possa ser uma ferramenta valiosa na gestão psicossocial de pacientes médicos e psiquiátricos em Portugal e nos restantes países de língua portuguesa.” Giovanni A. Fava, In Prefácio

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PACTOR – Edições de Ciências Sociais, Forenses e da Educação Av. Praia da Vitória, 14 A – 1000-247 LISBOA Tel: +351 213 511 448 pactor@pactor.pt www.pactor.pt

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Índice Prefácio........................................................................................................

IX

Parte I – Desenvolvimento...................................................................... 1 1. História............................................................................................. 3 Experiência de Rochester................................................................. 4 Tratamento da Depressão................................................................ 5 Conceito de Recuperação................................................................. 6 Bem-Estar Psicológico...................................................................... 7 Referências....................................................................................... 9 2. O Estudante de Filosofia e a Procura de Estratégias para Aumentar/Melhorar o Bem-Estar.................................................... 11 Sessão 2........................................................................................... 14 Sessão 3........................................................................................... 15 Sessão 4........................................................................................... 16 Sessões 5–7...................................................................................... 17 Oitava e Última Sessão..................................................................... 19 Reflexões Pós-Terapia....................................................................... 20 Referências....................................................................................... 20 3. Processo de Validação da TBE.......................................................... 23 O Grande Desafio............................................................................. 25 Compreender a Especificidade da TBE............................................. 28 © Pactor

Trabalhar a Perturbação Ciclotímica................................................ 28 Qual o Papel da TBE?....................................................................... 29 Referências....................................................................................... 30 Índice

III


Parte II – Programa de 8 Sessões de Terapia de Bem-Estar.................... 33 4. Avaliação Inicial................................................................................ 35 Referências....................................................................................... 39 5. Sessão 1........................................................................................... 41 Referências....................................................................................... 43 6. Sessão 2........................................................................................... 45 Referências....................................................................................... 49 7. Sessão 3........................................................................................... 51 Referências....................................................................................... 55 8. Sessão 4........................................................................................... 57 Controlo Ambiental (Tabela 8.1) ..................................................... 58 Crescimento Pessoal (Tabela 8.2)..................................................... 60 Referências....................................................................................... 63 9. Sessão 5........................................................................................... 65 Propósito de Vida (Tabela 9.1)......................................................... 66 Autonomia (Tabela 9.2).................................................................... 68 Referências....................................................................................... 70 10. Sessão 6........................................................................................... 71 Autoaceitação (Tabela 10.1)............................................................. 72 Relações Positivas com os Outros (Tabela 10.2)............................... 73 Referências....................................................................................... 75 11. Sessão 7........................................................................................... 77 Referências....................................................................................... 81 12. Sessão 8........................................................................................... 83 Referências....................................................................................... 86 13. Programa de 4 Sessões.................................................................... 89 Sessão 1........................................................................................... 89 Sessão 2........................................................................................... 90 IV

Terapia de Bem-Estar


Sessão 3........................................................................................... 91 Sessão 4........................................................................................... 92 Referências....................................................................................... 93

Parte III – Aplicações.............................................................................. 95 14. Depressão........................................................................................ 97 Avaliação e Tratamento de Um Episódio Agudo.............................. 98 Tratamento de Segunda Linha.......................................................... 102 Sessão 1....................................................................................... 102 Sessões 2–6 ................................................................................. 104 Sessões 7–10................................................................................ 105 Diminuição da Medicação e Descontinuação.................................. 107 Eficácia do Tratamento Sequencial .................................................. 108 Perda do Efeito Clínico durante Tratamentos de Longo Prazo com Medicação Antidepressiva............................................................... 111 Um Olhar Positivo para a Depressão................................................ 112 Referências....................................................................................... 112 15. Mudanças de Humor........................................................................ 117 Avaliação.......................................................................................... 119 Primeiras Duas Sessões................................................................ 119 Sessões 3–6.................................................................................. 121 Sessões 7–10 ............................................................................... 121 Implicações Clínicas......................................................................... 122 Referências....................................................................................... 123 16. Perturbação de Ansiedade Generalizada......................................... 125 Sessão 1........................................................................................... 126 Sessão 2........................................................................................... 127 © Pactor

Sessão 3........................................................................................... 128 Sessão 4........................................................................................... 129 Sessões 5–8 ..................................................................................... 131 Índice

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Implicações Clínicas da Abordagem TBE para a Perturbação de Ansiedade Generalizada................................................................... 132 Referências....................................................................................... 133 17. Pânico e Agorafobia......................................................................... 135 Tratamento da Perturbação de Pânico e da Agorafobia................... 139 Sessão 1....................................................................................... 139 Sessão 2....................................................................................... 140 Sessões 3–7.................................................................................. 143 Sessão 8....................................................................................... 145 Sessão 9....................................................................................... 146 Sessão 10..................................................................................... 146 Sessão 11..................................................................................... 147 Sessão 12..................................................................................... 148 Descontinuação da Medicação Psicotrópica.................................... 149 Referências....................................................................................... 150 18. Perturbação de Stress Pós-Traumático............................................. 153 Caso 1............................................................................................... 154 Caso 2............................................................................................... 155 Ultrapassar o Trauma....................................................................... 156 Referências....................................................................................... 157 19. Crianças e Adolescentes................................................................... 159 Avaliação Inicial................................................................................ 159 Sessão 1........................................................................................... 160 Sessão 2........................................................................................... 161 Sessão 3 ........................................................................................... 161 Sessão 4........................................................................................... 162 Sessão 5........................................................................................... 162 Sessão 6........................................................................................... 162 Sessão 7........................................................................................... 162 Sessão 8........................................................................................... 163 Contextos Educacionais.................................................................... 163 VI

Terapia de Bem-Estar


Referências....................................................................................... 164 20. Novas Direções................................................................................. 167 Modalidades da Prática.................................................................... 167 Novos Campos de Aplicação............................................................ 169 Doença Médica............................................................................ 169 Doenças do Comportamento Alimentar...................................... 170 Perturbação Obsessivo-Compulsiva............................................. 170 Perturbações Psicóticas............................................................... 171 Envelhecimento........................................................................... 171 Referências....................................................................................... 171 21. O Futuro........................................................................................... 175 Posfácio........................................................................................................ 177 Índice Remissivo.......................................................................................... 183

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Siglas e Acrónimos....................................................................................... 189

Índice

VII



capítulo

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História

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Quando decidi estudar Medicina, não estava bem convicto da minha escolha. Os primeiros anos foram difíceis: não gostava dos assuntos que estava a estudar na Universidade de Medicina em Pádua, Itália. Por outro lado, tinha consciência de que me poderia considerar um privilegiado, com um futuro promissor, mas sempre me questionei sobre se era a escolha certa – até algo ter acontecido. Nessa altura (no início do anos setenta), os estudantes de Medicina submetiam-se a rastreios pulmonares de raios X anualmente. Depois de ter realizado um desses exames, passados uns dias recebi uma carta a dizer que algo não estava bem, e que seria necessário fazer mais exames nos próximos dias. O meu primeiro pensamento foi: “Tenho tuberculose!” Quando recebi a carta, estava a ler A Montanha Mágica, de Thomas Mann, e concluí que isto não podia ser uma mera coincidência: “Não me ando a sentir bem, recentemente”, pensei para mim, “Estou mais cansado do que costumo estar”. Imaginei-me num sanatório, longe da minha família, dos meus amigos e colegas. Quando acabei por ir à clínica para fazer o novo rastreio, estava péssimo. Mas na clínica disseram-me que devia ter ocorrido um erro e que o meu tórax estava bom. Numa questão de segundos, senti-me bem e, quando saí de lá, o céu estava azul e bonito e não podia existir um aluno de Medicina mais feliz do que eu. Nesse momento, percebi que recuperar a saúde é uma experiência incrível; no entanto, nunca estive realmente doente clinicamente falando. Passei então a interessar-me pela Medicina Psicossomática, um quadro conceptual abrangente sobre qual o papel dos fatores psicossociais no desenvolvimento, curso e resultado (outcome) das doenças[1]. No entanto, este interesse não era partilhado por outros colegas em Pádua ou noutras universidades italianas. Por circunstâncias favoráveis, em 1975 passei um verão em Rochester, Nova Iorque, estudando com um dos mais proeminentes pensadores na área da Psicossomática: George Engel. História

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Experiência de Rochester George Engel era professor de Medicina e de Psiquiatria da University of Rochester School of Medicine and Dentistry. Depois do internato em Medicina Interna, Engel criticou a conceção tradicional da doença, ao restringir aquilo que se pode compreender ou reconhecer por um médico[2]. Noutras palavras, só o médico pode decidir o que é doença e se um paciente é um doente. Engel elaborou um conceito unificador de saúde e doença[2]: não existe apenas saúde e doença, mas, sim, um equilíbrio dinâmico entre saúde e doença. Esta visão, nos anos sessenta, foi subsequentemente elaborada no modelo biopsicossocial[3]. Os fatores psicossociais são uma classe de fatores etiológicos em qualquer tipo de doença, mas o seu peso relativo pode variar de uma doença para outra, de um doente para outro, e até de um episódio para outro na mesma doença e no mesmo doente[4]. Não é que certas doenças, definidas como “funcionais”, careçam de explicação; a nossa avaliação é que é desadequada na maior parte dos encontros clínicos[5]. Passei esse verão na sua unidade médico-psiquiátrica, e essa experiência foi uma fonte constante de conhecimento e inspiração. Num dia, foi pedida uma consulta psicossomática de um departamento médico. Aceitei o desafio juntamente com outro aluno de Medicina, chamado Sam. A doente tinha cerca de 50 anos e queixava-se do que lhe parecia ser uma dor abdominal insuportável. A avaliação dos médicos não permitia estabelecer uma causa potencial. A sua situação clínica parecia agravar-se, pelo que planearam uma cirurgia exploratória nos dias seguintes (em 1975 não existiam os procedimentos menos invasivos hoje disponíveis). A nossa missão era entrevistar a senhora e obter uma história preliminar. Mais tarde viria o Dr. Engel. Assim, começámos a fazer algumas perguntas, mas a senhora queixava-se de dores intensas. Desta forma, eu e o Sam concordámos que não seria a altura indicada e que deveríamos voltar mais tarde, com o Dr. Engel. Quando voltámos, ele conseguiu captar rapidamente a sua atenção e colaboração. Num dado momento, durante a entrevista médica, o Dr. Engel mostrou-se interessado numa cicatriz que a doente tinha. A senhora inesperadamente descreveu de forma vivaz a operação cirúrgica. Depois foi questionada se tinha sido submetida a outras operações. Mostrou outras cicatrizes e descreveu detalhadamente cada cirurgia. De repente, parece que se esqueceu 4

Terapia de Bem-Estar


capítulo

8

Sessão 4 Enquanto até aqui a atenção foi focada em monitorizar o bem-estar e identificar os pensamentos e/ou comportamentos que levavam à sua interrupção prematura, nesta sessão vamos procurar modificar atitudes em relação ao bem-estar. Como anteriormente, primeiro o terapeuta pergunta como correram as duas semanas passadas e se houve dificuldades em completar os trabalhos de casa. Enfatiza que se podem alcançar mudanças, mas que estas requerem conhecimento específico do que tem de ser mudado, logo monitorização cuidadosa. Nesta altura do tratamento é esperado que o doente seja capaz de identificar facilmente momentos de bem-estar (independentemente da duração), de estar consciente da interrupção de bem-estar (pensamentos e/ou comportamentos) e começar a ponderar se é possível algum pensamento ou comportamento alternativo. Tendo por base a relativamente pouca informação nesta altura, o doente geralmente tem dificuldades em modificar pensamentos automáticos e em desenvolver interpretações alternativas (coluna do observador).

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Este é o momento em que o terapeuta tem um papel mais ativo e acrescenta material para reflexão ao diário de bem-estar. Após rever o que o doente acrescentou no diário, o terapeuta começa a trabalhar em dois caminhos convergentes, embora distintos. Um caminho prende-se com o trabalho da terapia cognitivo-comportamental (TCC) que examina evidência a favor e contra os pensamentos automáticos e a definição de erros de pensamentos[1]: pensamentos de tudo ou nada (todos bons ou todos maus), tirar conclusões precipitadas (pensar nas piores interpretações possíveis da situação), ignorar evidência (fazer julgamentos sem olhar para toda a informação), aumento ou minimização (aumentar defeitos ou dificuldades e minimizar virtudes e oportunidades), generalização (dar demasiado Sessão 4

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significado a uma falha que afeta tudo) e personalização (colocar-se no centro da culpa e como a causa das falhas). O segundo caminho prende-se com a tentativa de explicar a interrupção prematura do bem-estar recorrendo às dimensões desenvolvidas por Marie Jahoda[2] e elaboradas por Carol Ryff[3]. Estas dimensões são introduzidas quando se justifica e não como uma descrição predeterminada. Mesmo quando o material possa permitir a discussão de todas as dimensões, deve ser prudente e não sobrecarregar o doente com demasiada informação. Além disso, não devem ser discutidas mais de duas dimensões numa só sessão. Para simplificar, vou descrever neste capítulo duas dimensões que aparecem frequentemente. Isto não significa que estas devem ser as primeiras dimensões a ser discutidas. Nos Capítulos 9 e 10, irei discutir as outras dimensões, mas isto não representa a ordem pela qual devem ser introduzidas ao doente – essa ordem deve ser baseada no material que é apresentado por este.

Controlo Ambiental (Tabela 8.1) Tabela 8.1 Controlo ambiental Nível diminuído

Nível equilibrado

¡¡ Sente dificuldades em ¡¡ Sente-se competente gerir atividades diárias; em gerir o seu ¡¡ Sente-se incapaz de ambiente; melhorar as coisas; ¡¡ Faz bom uso das ¡¡ Não está consciente das oportunidades à sua oportunidades. volta; ¡¡ É capaz de escolher o que é mais correto para as suas necessidades pessoais.

Nível excessivo ¡¡ Anseia por situações complicadas de resolver; ¡¡ É incapaz de saborear emoções positivas e tempos de lazer; ¡¡ Está demasiado envolvido em tarefas laborais ou atividades familiares.

Esta é a dificuldade que surge mais frequentemente. É expressa por Alex da seguinte forma: “Eu tenho um filtro que anula qualquer conquista positiva (tive apenas sorte) e amplifica qualquer resultado negativo, não importa quão expectável era (mais uma vez confirma o fracasso que sou)” e “Eu esqueço-me imediatamente dos clientes que fizeram uma encomenda, na minha mente há apenas aqueles que não fizeram”. Esta falta de sentimento de controlo leva o 58

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capítulo

17

Pânico e Agorafobia A agorafobia é a perturbação fóbica mais comum e angustiante. Desde a descrição de Westphal em 1871, tem sido consistentemente reportada na literatura[1]. “A ansiedade é mais intensa em espaços fechados tais como lojas, veículos de transporte, cinemas, teatros ou igrejas, particularmente quando o doente se encontra rodeado por uma multidão de pessoas. Começa a sentir-se quente, afrontado, trémulo, atrapalhado e em pânico. Esperar no meio de uma multidão ou no metropolitano tende a causar uma crescente ansiedade que leva o doente a fugir com medo e vergonha. Quando questionados sobre estas experiências, alguns doentes descrevem medo de desenvolver um ataque de pânico ou mostrar ansiedade na presença de outros, de desmaiar ou de serem vistos num estado desamparado ou descontrolado que eles consideram como extremamente humilhante e embaraçoso. Quando ocorre uma síncope, as fobias são quase invariavelmente intensificadas e alguns doentes ficam completamente incapacitados de fazer compras ou mesmo de andar sozinhos nas ruas […]. Apesar de a ansiedade ficar mais intensa, se o doente estiver num espaço fechado com muita gente, algum grau de tensão persiste a todo o momento […] [[2], p. 93].”

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Esta é a descrição de agorafobia que continua no inestimável tratado de Psiquiatria, que foi o resultado do extraordinário encontro, amizade e colaboração científica de William Mayer-Gross, Eliot Slater e Martin Roth[2]. O desenvolvimento fenomenológico da agorafobia pode ser categorizado de acordo com estádios[1, 3, 4]. A Tabela 17.1 descreve esse desenvolvimento. O primeiro estádio do desenvolvimento inclui a presença de fatores de predisposição, tais como vulnerabilidades genéticas, personalidade pré-mórbida (em particular, dependência e evitamento de danos), sensitividade ansiosa e medos e crenças hipocondríacas[1]. O peso relativo destes fatores pode variar de doente para doente e levar a padrões subtis de evitamento e, por fim, à agorafobia (estádio 2). Pânico e Agorafobia

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Tabela 17.1 Estádios da agorafobia (adaptado de Fava et al.[1]) Estádio 1

Pré-agorafobia: presença de ansiedade (incluindo ansiedade com a saúde e sensitividade ansiosa) e/ou medos isolados e/ou fatores de personalidade, tais como dependência e evitamento de danos e/ou bem-estar psicológico debilitado.

Estádio 2

Agorafobia: medo de estar em sítios ou situações das quais escapar pode ser difícil, com severidade ligeira (algum evitamento ou resistência com mal-estar, mas estilo de vida relativamente normal) ou moderada (modo de vida restrito) de acordo com os critérios do DSM-5.

Estádio 3

Perturbação de pânico (fase aguda): presença de ataques de pânico e desenvolvimento de perturbação de pânico (DSM-5); agravamento da agorafobia e da ansiedade; ansiedade com a saúde pode tornar­ ‑se hipocondria/ou fobia de doenças e/ou medo de morrer; pode ocorrer desmoralização e/ou depressão major.

Estádio 4

Perturbação de pânico (fase crónica): a agorafobia pode tornar-se severa (os resultados do evitamento são quase ou completamente confinados) de acordo com o DSM-5, e medos e crenças hipocondríacas podem acentuar-se quando a perturbação de pânico excede os seis meses; aumenta a probabilidade de depressão major.

Em alguns doentes, a agorafobia pode ficar confinada a uma intensidade ligeira ou moderada (Tabela 17.1), enquanto noutros doentes estes evitamentos encurralam “o indivíduo num canto em que não são sustentáveis mais evitamentos ou em que a situação de vida não lhes permite mais, e então surge o pânico”[5]. Dois estudos independentes[6, 7] descobriram que a maioria dos 40 doentes com perturbação de pânico com agorafobia experienciaram sintomas prodrómicos (agorafobia, hipocondria, ansiedade generalizada) antes do primeiro ataque de pânico. Os dados foram obtidos com consideráveis precauções metodológicas: início dos sintomas cuidadosamente datado, rigorosa definição dos sintomas por um teste confiável e validado para sintomas prodrómicos e subclínicos, e um adiamento da entrevista até que a perturbação aguda passasse (para minimizar distorções de recordação). Não é de espantar que estas descobertas tenham sido confirmadas por estudos posteriores, e estão revistas em detalhe noutra publicação[1]. O evitamento prodrómico pode assim estimular neurónios noradrenérgicos centrais no locus coeruleus, também em conjunto com acontecimentos de vida 136

Terapia de Bem-Estar


stressantes. Os ataques de pânico podem causar um considerável agravamento da sintomatologia prodrómica: a ansiedade generalizada pode adquirir uma forte conotação antecipatória, a agorafobia pode piorar consideravelmente e a ansiedade com a saúde não específica pode tornar-se uma severa hipocondria e tanatofobia (medo de morrer: estádio 3). A duração da perturbação de pânico com agorafobia pode ser um fator de predisposição para o desenvolvimento de outras complicações psiquiátricas, especialmente a depressão (estádio 4). Os acontecimentos de vida stressantes – juntamente com outros fatores – podem desempenhar um papel no desenvolvimento de pânico ou depressão secundária.

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Este modelo de quatro estádios tem muitas limitações. Pode não ser aplicado a todos os doentes com agorafobia (e. g., os doentes podem desenvolver depressão antes ou ao mesmo tempo da perturbação de pânico). Contudo, tem valor heurístico. Pode igualmente ser útil para os casos em que a agorafobia sem ataques de pânico são mais frequentes do que a perturbação de pânico com agorafobia[1]. Pode explicar por que os medos e crenças hipocondríacas bem como a sensitividade ansiosa melhoram sob tratamento comportamental ou farmacológico de agorafobia com ataques de pânico, e, ainda assim, foram reportados como sintomas prodrómicos ou traços residuais/pré-mórbidos em doentes recuperados[1]. Acima de tudo, pode ter valor na avaliação e compreensão das mudanças induzidas pelo tratamento psiquiátrico da perturbação de pânico com agorafobia. A exposição in vivo pelos exercícios de trabalhos de casa é o tratamento de eleição para a agorafobia associada com perturbação de pânico[8]. Intervenções com base na exposição são muitas vezes associadas a outras estratégias cognitivas, apesar de não haver evidência de que componentes adicionais (e. g., restruturação cognitiva, treino de respiração) melhorem os resultados, comparativamente com a exposição sozinha[8]. Os antidepressivos e as benzodiazepinas mostraram também ser eficazes na agorafobia e em ataques de pânico. A principal diferença está na duração dos efeitos clínicos: trabalhos de casa de exposição produzem melhorias mais duradouras[9], enquanto os efeitos das drogas psicotrópicas diminuem após a sua descontinuação[10]. Tal como mencionei no Capítulo 16, as benzodiazepinas são significativamente mais eficazes quando comparadas Pânico e Agorafobia

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