Com a terra construímos a nossa história

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Luciene Patax贸

Com a terra

constru铆mos a nossa hist贸ria


Luciene Patax贸

Com a terra

constru铆mos a nossa hist贸ria


Presidência da República Ministério da Educação Secretaria Executiva Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão Diretoria de Políticas para Educação do Campo, Indígena e para as Relações Étnico-Raciais Universidade Federal de Minas Gerais Reitor: Clélio Campolina Diniz Vice-Reitora: Rocksane de Carvalho Norton Faculdade de Letras Diretor: Luiz Francisco Dias Vice-Diretora: Sandra Maria Gualberto Braga Bianchet Núcleo Transdisciplinar de Pesquisas Literaterras Coordenadora: Maria Inês de Almeida

Luciene Pataxó

Com a terra construímos a nossa história

Ficha catalográfica elaborada pelos Bibliotecários da Biblioteca FALE/UFMG L937c

Luciene, Pataxó. Com a terra construímos a nossa história / Luciene Pataxó. _ Belo Horizonte : Literaterras : FALE/UFMG,2012. 176 p. : il.,color.

1a edição

ISBN: 978-857758-191-7

1. Índios Pataxó _ Minas Gerais. 2. Índios da América do _ Sul Brasil. 3. Índios _ Cultura. 4. Índios - Educação 5 - Literatura Indígena - Minas. I.Luciene, Pataxo. II. Título.

CDD: 980. 41

Literaterras - FALE/UFMG Belo Horizonte 2012


Com a terra

construímos a nossa história

Apresentação 11 Conversando sobre

Curso “Formação Intercultural para Educadores Indígenas” - FIEI/UFMG Eixo de Conhecimento Socioambiental Coordenação Ana Maria Rabelo Gomes Marcos Vinícius Bortolus Coordenação de Materiais Didáticos Márcia Spyer Autora Luciene Pataxó Ilustrações Luciene Pataxó Revisão Priscila Luiza Mara Vanessa Fonseca Dutra Guilherme Antunes Abjaudi Projeto Gráfico e Diagramação Lila Vasconcelos Coordenação Editorial Maria Inês de Almeida

Este livro foi produzido pelos professores e alunos Pataxó da aldeia Muã Mimatxi, durante as oficinas de produção de conhecimento e laboratórios interculturais realizado no Curso de Formação Intercultural para Educadores Indígenas FIEI/UFMG, no Eixo de Conhecimento Socioambiental.

A natureza nunca acaba 17 Os velhos e suas moradas 18 Quem é vivo não para 19 Os horários da natureza 20 Tudo que é embaraçado não é errado 21 O que lembramos nos cantos dos pássaros 22 O fortalecimento da terra 23 A natureza não vive sozinha 24 A pintura é irmã da geografia 25 Exemplo de texto conjunto 26 Tudo na terra tem serventia 27 A terra está se alimentando 28 A natureza registra o que faz 29 As frutas, a gente e a história 30 A lua e a vida na terra 31 A alegria e liberdade do índio com a natureza 32 As moradas entre a aldeia e a mata 33 Exemplo de texto conjunto 34 Cores, imagens e movimento em nossa terra 35 A roça velha não deixa a gente voltar com as mãos vazias para casa 36 A natureza é uma vida contínua 37 Exemplo de texto conjunto 38 A natureza se constrói aos poucos 39 O frio na terra 40 Os bichos sabem esperar 41 De onde vêm a força e o alimento da terra 42 Cada lugar da natureza tem o seu segredo e o seu encanto 43

SUMÁRIO


Exemplo de texto conjunto 44 Como os velhos tiravam a preguiça do corpo 45 A mata sempre deixa um pouco para a gente voltar nela 46 A natureza ensina a ouvir e sentir 47 Exemplo de texto conjunto 48 A água em nossa vida 49 Exemplo de texto conjunto 50 Quando o tempo se renova, tudo vai mudando 51 Exemplo de texto conjunto 52 A vida e os segredos dos campos 53 Exemplo de texto conjunto 54 A floração e o amadurecimento das frutas 55

Pesquisando sobre O frio, as plantas e a gente 57 Exemplo de texto conjunto 58 A mata grossa tem seus encantos 59 Cada lugar na mata tem o que precisamos 60 Como ficam o campo e a mata quando ficam florados 61 Os caminhos dentro da terra 62 Cada planta tem seu tempo 63 Exemplo de texto conjunto 64 Tudo está ligado a tudo 65 O que a gente tem conhecimento da natureza 66 A caminhada no território da aldeia 67 Tudo na terra trabalha e se prepara 68 As imagens da terra 69 O conhecimento dos antigos com a natureza 70 O nosso espaço é marcado e demarcado pela nossa cultura 71 Nossas práticas tradicionais nas nossas vidas de hoje 72 As novas e antigas descobertas entre velhos, jovens e crianças pela nossa cultura 73 Exemplo de texto conjunto 74 O tempo velho 75

A história do nosso modo de vida em nossa terra antiga 76 Exemplo de texto conjunto 77 As casas das famílias que são mais movimentadas 78 Exemplo de texto conjunto 79 Como as plantas se espalham na terra 80 Quando a gente trabalha junto, a aldeia fica alegre e se movimenta 81 Exemplo de texto conjunto 82 As tardes da aldeia 83 A noite descansa o dia 84 A maneira de ensinar e aprender, de antigamente 85 Os dias e as noites 86 O que a mãe e o pai ensinam aos filhos 87 Quando voltava de caçar, pescar e da roça, os parentes iam visitar 88 As grandes caminhadas 89 Como o índio conhecia o lugar de andar na mata iam visitar 90 Quem não sabe olhar na mata tudo fica invisível 91 Na natureza a gente tem que saber olhar para achar 92 O olhar 93 Cada um tem o seu lugar de importância na aldeia 94 O aprendizado do jovem antigamente 95 Exemplo de texto conjunto 96 Herança Cultural 97 Onde a nossa vida está mais relacionada 98 A vida hoje na velha aldeia 99 A leitura da vida e da cultura 100

Trabalho com a Terra A força e a beleza da natureza 102 As famílias seguem as roças 103 Capina da mandioca 104 Construção do nosso espaço de fazer ritual 105 Capina do milho 106 A divisão da batata 107


A plantação do feijão 108 A terra dá, mas precisa se alimentar 109 O nosso modo tradicional de trabalhar na terra 110 Os viveiros naturais da floresta 111 Exemplo de texto conjunto 112 Como era o lugar que os índios escolhiam para fazer uma roça 113 Os lugares que as mulheres sempre andam 114 Em se jogando também se planta 115 Exemplo de texto conjunto 116 Como a natureza se prepara para esperar os tempos da chuva 117 De olho no que se planta 118 Cultura Corporal 119 A mão e o chão 120 As plantas e os insetos vivem como uma grande família 121 Como alimentamos as plantas 122 O tempo da plantação e da colheita 123 Exemplo de texto conjunto 124 A natureza se constrói com o trabalho coletivo 125 O trabalho da mulher ajuda o trabalho do homem 126 Na terra tudo começa com o cultivo 127 Quando o homem tirava tudo da terra sem destruir o ambiente 128 Como se escolhe e como se faz um bom lugar para morar 129 Exemplo de texto conjunto 130 Tudo tem o seu tempo para trabalhar e descansar 131 O trabalho e a espera da natureza 132 O tempo faz a história 133 Exemplo de texto conjunto 134 A preservação da vida do nosso povo 135

Oficina de produção

O nosso novo jeito de alimentação 137 Confecção do artesanato 138 A Cultura 139

Como a natureza faz o seu trabalho 140 Os lugares da mata que são mais movimentados 141 Exemplo de texto conjunto 142 A matemática é o trabalho de vida na comunidade 143 A nossa vida e a vida das plantas 144 O jeito de sobreviver antigamente 145 Convivência Coletiva 146 O nosso jeito de agradar para viver junto 147 Primeiro a gente aprende a ganhar, depois a gente dá, para ensinar 148 O tempo que nossa gente vivia mais livre 149 A morada é algo que a gente não esquece 150 Quando a gente canta e dança é para buscar saúde e força da natureza para o nosso corpo 151 Produção e vivência coletiva 152 Cuidar e saber colher 153 As plantinhas pequenas 154 Onde se trabalhava, estavam todos 155 Modo de Vida 156 Exemplo de texto conjunto 157 O sentido do lugar da aldeia, sua origem e característica 158 Exemplo de texto conjunto 159 Terra tradicional: nosso lugar de referência e de vida individual e coletiva 160 Exemplo de texto conjunto 151 Da derrubada de um roçado se forma uma morada 162 O nosso jeito de alimentar 163 Exemplo de texto conjunto 164 A saudade dos alimentos em nosso corpo 165 A comunidade e os recursos naturais 166 Como o nosso povo representa a natureza com o nosso conhecimento? 167 Quem é vivo sempre troca de lugar 168 O jeito de trabalhar dos antigos e de hoje 169 Práticas de produção coletiva 170 A gente vai fazendo uma nova cultura com as coisas que tiramos da natureza 171 O nosso conhecimento tradicional 172


APRESETAÇÃO


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O livro divide-se em quatro capítulos de acordo com as diferentes formas de ensino dos Pataxó Muã Mimatxi. Para cada um destes capítulos, segue-se uma pequena apresentação sobre a metodologia, o jeito nosso Pataxó Muã Mimatxi de trabalhar o conhecimento da terra, da cultura e do mundo. Conversando Sobre É um tipo de aula em que o professor escolhe um tema e leva para sala de aula e lá faz uma conversa dentro deste tema. O instrumento didático mais importante para começar o tema é o desenho. A partir do desenho, o professor pensa várias perguntas para serem debatidas e vai respondendo com os meninos. O professor orienta aquela conversa. Não tem texto para o professor apresentar; tem o desenho e as perguntas. O aluno faz um texto da aula. Pode ser também uma conversa coletiva do professor e do aluno. O aluno traz idéias e conhecimento e vai completando o ensino do professor. É um ensinamento que conversa sobre um conhecimento. De acordo com o Conversando Sobre o aluno produz um mapa, um texto, um desenho, músicas e vários formas de registrar. O Conversando Sobre pode gerar também uma pesquisa, dentro de algum ponto que não tem resposta. Pesquisando Sobre Pesquisando Sobre é tudo que envolve um tipo de aula que a pessoa busca uma fonte de conhecimento, por meio da observação do professor e do aluno. Primeiro o professor sai para o campo dialogando com os meninos sobre o tema e conversando sobre aquela pesquisa. Escolhe o tema e os pontos importantes para ir completando. Pode ser feito no ambiente, nas famílias, no espaço, em vários campos de conhecimento. A pesquisa é pelo olhar e pela fala. A pesquisa vem desde os tempos dos velhos. Tudo o que a gente faz na vida e que vai melhorando é uma vida de pesquisa. Pesquisa o lugar de morar, lenha boa, bom pesqueiro. Qual é o barro que pode ser usado para construir a casa? Tudo que está ligado na vida e na cultura da gente é pesquisando. A pesquisa é uma vida contínua que liga um tempo ao outro, é uma forma de viver no mundo, viver no espaço. Em cada tempo a gente faz um tipo de pesquisa no nosso território e na nossa tradição para viver melhor. É um tipo de pesquisa para o ensinamento: lugar de fazer cacimba, lugar que dá água e água boa. Uma planta, os lugares que tem vários tipos de sementes, os insetos. Para saber sobre o preá, tem que ir no lugar

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onde tem preá. Pesquisamos o Sol, a Lua, os movimentos do Sol em Muã Mimatxi. Tudo é pesquisa, o saber da vida da gente. Hoje a nossa vida está ainda mais focada na pesquisa, tudo no espaço escolar envolve isso, buscando o conhecimento tradicional dos mais velhos para ser aplicado no conhecimento escolar. Não só neste ambiente, mas também em outros: mitológico, outras terras, universos, mundo dos animais, vegetais e das estrelas. O Pesquisando Sobre é um conhecimento que viaja por todas as áreas e todos os temas. Trabalho com a Terra São trabalhos que são realizados na prática. A gente vivencia práticas tradicionais que envolvem a terra: como cultivar um tipo de planta, como guardar as sementes, combater insetos, limpar os espaços coletivos da escola, que hora pegar folha para remédio, pegar tempero, capinar a horta, como fazer adubo, como faz adubo sem jogar remédio.. Trabalho que envolve o chão. Ele é feito na prática e a gente vai conversando. A vida do índio Pataxó envolve a terra. A ciência da terra. Dá aquele olhar para a terra, aquele carinho para a terra. Aquele tempo de trabalhar na terra, entender como ela precisa da alimentação dela mesma. Os velhos trabalham muito diferente: o que tirava dela, deixava para ir fortalecendo ela. Trabalha também os conflitos ambientais. A gente tenta ver os conflitos que a terra tem, as dores que a terra tem. Por exemplo: o lixo, as queimadas, fazer replantio de urucum e jenipapo. Para a gente olhar e dar algum apoio para a terra. Trabalhamos no ritual os cantos para a Terra. Trabalho de força na terra. Vai passando os ensinamentos do que é bom e ruim, o que faz a saúde e a doença para a terra. Boi traz conflito para a terra. As ferramentas e o trator fazem mal para a Terra. Olhamos esse lado para ir melhorando a vida da terra. Nesse trabalho aprendemos que a gente é parte da terra, aprendemos a afinar o nosso olhar e audição e fortalecer nosso coração e nossa vida com a terra. Nós recebemos uma terra sofrida e queremos entregar ela com mais saúde para nossos filhos e netos. Eles têm que estar com os olhos e ouvidos afinados. Saber conversar com ela e ajudá-la no que ela sabe criar e também nos dar. Aprender sua linguagem. Tudo que plantamos e tiramos é na conversa com a terra. Oficina de Produção São os trabalhos que a gente faz, tudo que a gente produz. É de uma forma coletiva, que envolve toda a


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comunidade ou só os alunos e professores. Por exemplo: fazer ritual, tirar folha para fazer tempero. Tudo que envolve conhecimento de fazer é Oficina de Produção. Homem ensina a fazer machado, construir. Na oficina de artesanato, faz a roda na comunidade para ensinar tipo de artesanato, as quantidades de sementes, os tecidos. Oficina de Produção é tudo que é coletivo, é um dia em que o que se produz, todo mundo traz para dividir. A escola fica mais movimentada, pois ela é que puxa a Oficina de Produção. Precisa muito do conjunto para fazer beiju, farinha, produzir roupa, tinta, furar fruta. Oficina de Produção traz muita criatividade, idéias, misturam-se as atividades de criação e trabalho. É um ensinamento muito bom para as crianças se divertirem. É um espaço que envolve lazer e arte. É uma aula leve, para estimular o raciocínio da pessoa. É produção conjunta do conhecimento, do aprendizado. Oficina de Produção trabalha com a fartura, os sabores, os cheiros das coisas. Tudo isso é trabalhado nela, afinando o olfato, o paladar. A gente sente também a vida antiga, como por exemplo quando a gente faz o cauim, as crianças ficam alegres, animadas. É um trabalho que traz alegria, animação. Oficina de Produção incentiva as trocas, a interação nos materiais, nos ensinamentos. Acompanha os alunos, trabalha nos jogos, vai pegar lenha em mutirão. Oficina de Produção viaja pela tradição que a gente vivencia em todos os momentos da nossa vida. Por exemplo: oficina de plantas medicinais: lambedor, chás, banhos. Viaja nos tempos. Essa oficina, por exemplo, é no tempo do frio. Em outro tempo, é a oficina de comer mais cozinhado, comer a comida do outro - o tempo de cada família. Constrói também a oficina de plantio, de tudo que a gente produz, a colheita do milho, fazer mingau, pamonha. Vivencia aquela produção. Ensina as crianças a partilharem, interagirem um com o outro. Trabalha também a produção da arte na escola. Produz música, brincadeira, desenho, traz coisas novas, sempre se renova, é inovadora com a Escola. Produz dentro e fora da escola. É o aprendizado na prática, no que é vivido no momento, pelo olhar e pela escuta. Texto Conjunto É outra forma de ensino Pataxó Muã Mimatxi. O texto conjunto não constitui um capitulo, pois ele está presente em todas as formas de ensino. Ele é o registro do conhecimento do aluno sobre o conhecimento que o professor trouxe. Leitura do conhecimento do professor que é completada com o texto do aluno. Viaja por todos os capítulos do livro. O texto é do aluno. É a fala e o pensamento dele. A gente vê como está o pensamento e fala do aluno.

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Porque quando produz o texto, o aluno sempre lê para a gente ver como está o pensamento dele. É o conhecimento que está vivendo ali. Dá para ver a didática, o pensamento com outros professores que estão no trabalho conjunto, sentir o trabalho do professor, como os outros companheiros estão desenvolvendo suas atividades. Dessa forma, ensinamos na Muã Mimatxi.


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A natureza nunca acaba

A natureza se renova para nรฃo acabar tudo o que tem nela. A natureza se renova para ficar bonita.

Conversando sobre As รกrvores, os cipoeiros, os pรกssaros, as caรงas.

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Quem é vivo não para

A morada dos velhos é onde estão suas histórias de vida.

A morada dos velhos é um lugar onde eles guardam suas lembranças e deixam suas marcas. Na terra, suas memórias ficam guardadas por toda vida. A morada dos velhos é onde estão suas histórias de vida. Suas moradas são feitas em lugares bonitos, perto de rios, matas. Ali vão interagindo com o meio em que vivem.

Os velhos e suas moradas 20

Como a natureza, as matas, os rios, a terra é viva e não para de trabalhar.


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Tudo que é embaraçado não é errado

Os velhos conheciam a hora pelas sombras.

Os velhos conheciam a hora pelas sombras. Conheciam a hora pelos cantos dos pássaros. As imagens que o sol faz na terra com as sombras da natureza: isso é uma arte da própria natureza.

Os horários da natureza 22

A natureza vive entrelaçada para viver. Tudo na natureza vive entrelaçado uns aos outros, esse é o jeito certo de viver. A natureza não vive separada, todos criam, se reproduzem e morrem juntos. É por isso que os velhos plantam como a natureza, várias plantas numa roça.

A natureza vive entrelaçada para viver


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O fortalecimento da terra Quando a terra está fortalecida com a natureza, a gente se sente fortalecida também. A terra se fortalece com a chuva que molha ela, com as folhas que caem nela, com a planta que nasce, com o vento que bate nela, quando não se joga lixo nela. O território é o lugar que marca a nossa cultura, porque é nele que produzimos tudo o que faz parte da nossa cultura. O nosso território é como um retrato que mostra tudo o que tem na nossa cultura. Antigamente as nossas terras não tinham divisão de cerca. As divisas, era a natureza que fazia, como o rio, a mata, onde se colhiam os frutos. É por isso que os velhos plantam como a natureza, várias plantas numa roça.

Quando ouvimos os cantos dos pássaros, lembramos de algum lugar ou de alguma pessoa.

O que lembramos nos cantos dos pássaros 24

Quando a terra está fortalecida com a natureza, a gente se sente fortalecida também.


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A pintura é irmã da geografia O que é geografia? É tudo o que tem na terra. As matas, os bichos, o vento, as plantas, as roças e as outras coisas. A geografia desenha e colore a terra. Tudo que tem na terra tem uma cor que é representada pela geografia. Qual é a geografia da aldeia? A geografia da aldeia é a vida da comunidade, são as casas, é o céu da aldeia, o dia e a noite, é tudo o que as pessoas fazem na aldeia.

A natureza não se cria sozinha. A planta precisa da água e da terra para nascer. Os bichos precisam das plantas.

A natureza não vive sozinha 26

A pintura faz parte da geografia.


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Exemplo de texto conjunto Geografia é tudo que tem na terra, são as matas, as pedras, os rios, as montanhas, os galhos, as aldeias, os pássaros, os animais etc. Na mata existem várias cores. A pintura embeleza a terra. A pintura desenha a terra, a geografia e a pintura fazem os desenhos da terra. O vento é uma geografia. Uma planta também dá a beleza da terra pelas folhas, flores, frutas. Tudo que tem na terra possui uma cor. Com a gente, a terra fica colorida, os tipos de casa colorem a terra. Tudo que existe na terra faz parte dela. Onde nós moramos, as matas, o céu, as casas, as pedras, as pinturas e o nascer do sol. De noite, de dia, nós acompanhamos o sol e a lua. O terreiro da aldeia tem grande beleza. Isso tudo pinta e colore a terra. Os tempos também colorem a terra. Quando nós estamos nos rituais, é também uma pintura. As coisas da natureza desenham e colorem. Todas as vezes que vêm os tempos, eles mudam a terra.

Tudo na terra tem serventia Na terra nada se perde. Cada coisa serve para alguma coisa. Tem coisas que servem para nós. Tem coisas que servem para os animais. Tem coisas que servem para a própria terra. Tudo vai servindo aos outros para ajudar a vida na terra.

Tudo o que a natureza produz tem serventia para alguma coisa. 28


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A natureza registra o que faz

Tudo na natureza bebeu muita água!

A terra registra tudo que tem dentro dela. A terra é sustento de todas as coisas que vivem nela. As árvores nascem pequenas e crescem, dão galhos, folhas, flores e frutos. A terra registra os rios e os rios registram o que tem neles: os peixes, as pedras, e as areias. A mata registra nela as cores das árvores e dos bichos.

A natureza cria, nasce e registra. Agora está acabando o tempo das águas e tudo na terra está se alimentado. A natureza deu seus frutos e tudo dentro dela se renovou. Os rios aumentaram as águas, os peixes desovaram. Tudo na natureza bebeu muita água!

A terra está se alimentando 30


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A lua e a vida na terra

As frutas fazem a história do lugar.

Cada povo tem as frutas que gosta de comer. As frutas que eles gostam mais são as mais gostosas porque são cheirosas, docinhas. No pé da fruta que o povo mais gosta, aonde junta mais gente para pegar as frutas, tem fruta que fica grande e tem fruta que fica pequena. Tem frutas que os velhos e as crianças gostam. No tempo das frutas o povo se desperta e se alegra a aldeia, crianças, jovens e velhos. As frutas fazem a história do lugar.

As frutas, a gente e a história 32

Ela bebe a água do coco e vai comendo o coco devagar. Ela faz bichar as frutas e mufina os pés de planta na lua clara. Quando tem eclipse da lua os velhos enfiam um facão na roça para as plantas não ficarem doentes. A lua também faz os mariscos ficarem magros ou engordarem. Na lua crescente, ela dá muito siri gordo no mangue.

Como a lua faz para pegar as frutas?


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As moradas entre a aldeia e a mata

Por que a grande história de vida do índio está na natureza?

Na natureza o índio busca suas forças, proteção e sabedoria. Da natureza tiramos o nosso sustento. O índio nunca perdeu a alegria e a liberdade. Aonde o índio vai ou o índio anda, a natureza está. A natureza é como a mãe que não deixa seu filho. A natureza ensina.

A alegria e liberdade do índio com a natureza 34

Sempre tem as moradas da aldeia, mas também as moradas dos que vivem mais distantes, perto das matas e dos rios. As famílias sempre procuram um lugar bonito, onde tem mata, rio, bichos, onde fazem suas roças. As famílias das matas sempre fazem trocas com as famílias que moram na aldeia: farinha, quissare, batata, mel, embira e outras coisas da roça e da mata. As tardes e as manhãs nas moradas perto da mata são muito movimentadas pelos barulhos dos bichos, papagaios e outros.

As famílias das matas sempre fazem trocas com as famílias que moram na aldeia


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Exemplo de texto conjunto Todas as aldeias têm algumas moradas distantes. Tem índios que escolhem a beira da mata para fazer suas moradas. Eram os mais velhos que moravam mais longe. As moradas dos velhos na mata tinham alimentos diferentes dos alimentos das pessoas da beira da praia. Para o centro da aldeia eles vinham trocar farinha, beiju, caça e outros com as pessoas da beira da praia. Os velhos sempre gostavam de morar longe, hoje ainda tem velhos que moram longe da aldeia. Esses velhos têm várias plantações. Eles olhavam os lugares, se era bom, alegre, bonito, aberto, se tinha rio, fruteira e outros. Esses lugares vão se transformando em uma pequena aldeia. Nas aldeias tem lugares bonitos, tristes, alegres, feios e os velhos escolhiam os lugares bonitos.

Cores, imagens e movimento em nossa terra Tudo na natureza tem uma cor e se movimenta. Através desses movimentos, os seres da natureza vão criando imagens. Através desse movimento da natureza ela se renova, vai dando cores às coisas. A natureza vive um movimento sem fim e nada dura para sempre.

Tudo na natureza tem uma cor e se movimenta.

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A natureza é uma vida contínua

Às vezes a gente pensa que não tem mais nada, mas ela sempre guarda um pouquinho. Quando a gente deixa um espaço de uma roça descansar, ali ela vai descansando e vão nascendo algumas plantas como mamão, maracujá, pimenta, mandioca, cana e outras. A roça velha vira um viveiro de passarinho e às vezes a gente vai lá e não volta com as mãos vazias, porque a gente colhe muitas frutas que vão nascendo lá. A roça velha é um lugar que serve também para matar a fome quando a gente vem da mata ou de um outro lugar.

A roça velha não deixa a gente voltar com as mãos vazias para a casa 38

Tudo o que vem, vai para a terra para poder se renovar. Essa vida na terra vai continuar, mas vai depender do que a gente fizer por ela. A vida na terra está enfraquecendo, tudo na terra está mudando, os homens estão acabando com as matas, os rios e os animais. O índio vive como a natureza, de tempo em tempo faz uma nova morada, uma nova roça, uma nova canoa, um novo artesanato. O índio descansa e trabalha junto com a natureza. Ele trabalha em um pedaço de terra e depois deixa aquele pedaço de terra descansar. A terra, as matas, as plantas, os pássaros, são nossos parentes. O que cada um de vocês vai fazer para ajudar a vida na terra?

A natureza sempre nasce, cresce e envelhece.


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Exemplo de texto conjunto

A natureza se constrói aos poucos

Tudo na natureza nasce, cresce, envelhece e reproduz. Vai e vem para se renovar. Na natureza uma planta, por exemplo, como um pé de manga, o caroço vai crescendo até que ele fica grande e depois nasce a flor, e da flor nasce a fruta e os bichos vêm e comem. A gente trabalha com a natureza. A gente planta uma coisa e depois a gente pega e vai plantar em outra terra.

Às vezes tem uma grotinha de mata ali, ela vai aumentando devagar. Já nasce um pé de fruta, já chega um passarinho, um bichinho, já faz uma morada e assim começa a construir uma mata. Aquela mata vai crescendo devagar. Dentro de alguns anos já tem vários bichos morando ali dentro. Depois, naquela mata, o índio já pega lenha, tira alguma madeirinha e faz outras coisas.

A natureza sempre se constrói devagar.

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Os bichos sabem esperar

À noite o céu fica azul chamando frio.

Como fica a terra pela manhã, no tempo do frio: as sombras das árvores trazem o frio, as pessoas procuram o sol para esquentar, a água fica fria, a terra fica seca, tem muita poeira. A gente trabalha mais, o corpo da gente quase não esquenta, precisa de muita lenha para esquentar água, para tomar banho. À noite o céu fica azul chamando frio.

O frio na terra 42

Os bichos vivem se movimentando pela terra, olhando onde tem frutas. Eles acompanham as frutas. Os bichos não comem uma fruta verde, eles esperam ela amadurecer, pois eles têm paciência para acompanhar e esperar a fruta.

Os bichos não comem uma fruta verde, eles esperam ela amadurecer


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Cada lugar da natureza tem o seu segredo e o seu encanto

O alimento da terra vem dela mesma.

Os bichos dão força e o alimento na terra. A força e o alimento da terra vêm do vento, do sol e da lua. Vêm também dos cuidados da gente com a terra.

De onde vêm a força e o alimento da terra 44

No pé do Monte Pascoal tem muitos segredos. Lá nasce a água fria, a gente sente a força que vem da pedra através da brisa que vem dela. O canto dos pássaros vem com mais força, é a morada de todos os bichos e lugar de se esconder e descansar. Lá tem que andar com respeito porque tem o dono e protetor da pedra. Em cima do Monte é o lugar de liberdade, de sentir o vento que vem das alturas e as nuvens que passam por cima. O Monte guarda muitos encantos e segredos. A cachoeira é o lugar do encanto forte das águas. É o lugar das águas se movimentarem com as pedras. É a morada do arco-íris e das piabas grandes coloridas. As fruteiras é o lugar onde todos os bichos se encontram. É o lugar de todos os bichos se fartarem, cantarem, gritarem. É o lugar de muitas alegrias. É o lugar de dividir o que a natureza oferece. O mangue guarda muitos segredos, os bichos que moram debaixo da lama e outros. As pedras do mar guardam a força das águas do mar e os bichos que moram debaixo delas. A floresta inteira guarda muitos segredos. As frutas, os cipós, as árvores, os insetos, os bichos que metem medo e outros que ajudam.

A natureza tem muitos segredos e encantos.


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Exemplo de texto conjunto Cada lugar da terra guarda um segredo, o encanto e o ensinamento. Lá no pé do Monte Pascoal nascem muitos segredos, nascem as águas frias e a gente sente a força que vem das pedras através da brisa que vem do mar. Lá no pé do Monte tem também os cantos dos pássaros que vêm com força e as moradas de todos os bichos. Lá tem todos os bichos, tem muitas locas de pedra. Tem também o dono das pedras, tem o dono de cima do Monte Pascoal, tem o dono das nascentes. Também tem a cachoeira, que é o lugar do som forte das águas. Também é o lugar das águas se movimentarem como as pedras e o lugar do arco-íris beber água.

Como os velhos tiravam a preguiça do corpo Acordavam bem cedinho. Iam para a roça, as pedras e o mangue. Não esquentavam fogo até o sol nascer, assim não ficava mufino. Tomavam banho no rio bem cedinho. Movimentavam-se com o corpo, bem cedinho. Não trabalhava no sol porque dava quebrante no corpo e ficava doente.

Acordavam bem cedinho.

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A natureza ensina a ouvir e sentir

Na mata nunca falta o que a gente precisa, a gente tira o que ela tem e pensa que não tem mais. Quando a gente vai à mata pegar lenha, colher fruta ou pegar outra coisa, ela sempre esconde um pouco para pegarmos depois. Quando a gente volta lá depois, tem novamente pra pegar. A mata tem o coração grande e bondoso, sempre tem as coisas para dar para todos. A mata não olha pra quem ela vai dar, todos são iguais para ela. Quem precisa dela, ela está sempre lá para ajudar.

Na mata nunca falta o que a gente precisa

A mata sempre deixa um pouco para a gente voltar nela 48

A natureza ensina e ajuda a ouvir e sentir. O que tem nela e o que é dela são os fenômenos da natureza: o frio, o calor e o vento. A gente sente o cheiro da natureza, das flores, das frutas e da terra. A natureza ensina a folha, o que tem nela, as belezas, as cores das folhas, flores e as frutas nas matas.

A natureza nos ensina a alegria.


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Exemplo de texto conjunto

A água em nossa vida

A natureza tem seus sentidos. Nós aprendemos com a natureza. Nós sentimos quando a natureza está alegre, a gente ouve o barulho da chuva, das folhas, do vento, das trovoadas. A natureza é um ensinamento de vida. Quando o tempo muda, a gente sente o calor, o frio e o cheiro da natureza. A natureza nos ensina a trabalhar. Em cada tempo ela está com um sentido diferente. Nós sentimos os cheiros diferentes, ouvimos os cantos dos passarinhos. Em cada tempo a natureza vive diferente, em cada tempo ela se expressa de um jeito. Nós ouvimos as zoadas das cachoeiras, nós paramos para sentir e ouvir. Quando entramos na mata, ouvimos e sentimos ela. Tudo da natureza nos ensina.

Se a gente vai no rio, abrimos um diálogo com a água do rio através das brincadeiras que só brincamos na água. Quando a gente vai no rio, brinca com sua água e as brincadeiras dos peixes. O rio é um lugar de liberdade e alegria. O rio é um lugar de pular, gritar, mergulhar, se abraçar e se agarrar, fazer amizade, de se divertir. O rio é um lugar onde todos se encontram e se divertem: velhos, mulheres, jovens e crianças. Cada um faz o seu trabalho no rio. O homem pesca e coloca armadilhas, as mulheres lavam roupas e pratos e crianças e jovens aprendem a nadar, remar e brincar no rio. Quando a gente vai no mar, já abrimos um outro diálogo com as grandes ondas, com o sol quente, com outros jeitos de pescar, com o mauí, o bicheiro, o machado para quebrar as pedras, para tirar os ouriços, com o jeito de andar nas pedras e outros conhecimentos. Com as águas do mangue a gente já abre um diálogo diferente. No rio do mangue a gente pesca, tira concha, lava os mariscos que vêm da lama e toma banho. A água do rio do mangue é salobra e salgada. A gente tem que ter muito cuidado com o mangue.

Nós nos relacionamos de várias maneiras com a água. 50


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Exemplo de texto conjunto

Quando o tempo se renova, tudo vai mudando

A gente tem vários jeitos de se relacionar com a água. A água é a vida. Nós tempos o nosso relacionamento profundo com a água, a água sempre está presente nos momentos de nossa vida. O rio é igual a terra: a gente faz amizades no rio, a água traz brincadeiras e alegria. No rio a gente mergulha, brinca, lá tem alegria. O rio é um lugar alegre e é um lugar de se aprender. É um lugar de todos. As crianças vão brincar no rio. Muitas coisas a gente não aprende na terra, a gente aprende no rio. O rio traz grandes valores para a gente. Temos que aprender a viver com a água, com cada água. A gente tem que aprender a se relacionar com a água, cada lugar traz um diálogo de vida. Na água do mar a gente tem que ter cuidado, quase não é de brincadeira. Na água do mangue, serve para pescar. Cada água tem um diálogo de conhecimento.

Tempo para as plantas renovarem as cascas, os galhos, as folhas e os frutos. Tempo dos temporais, tempo dos pássaros e das caças renovarem a produção e seus ninhos. Tempo das águas e das secas. Tempo das ressocas das plantas. Tempo dos rios renovarem as águas e produzirem os peixes.

Para tudo tem seu tempo na natureza.

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Exemplo de texto conjunto Existem vários tempos e o tempo marca o ciclo da vida na terra. Tem o tempo das águas, das flores, da seca, do frio e de outros tempos. No tempo das águas a gente quase não sai de casa. Nós bebemos coisas mais quentes. Nesse tempo as sementes nascem, a floresta fica nova, tudo nesse tempo se renova, até a água. No tempo das flores a mata fica cheia de flores. Com a vida na terra, o tempo muda, o tempo se renova, cada tempo renova uma coisa. O tempo muda a nossa vida. Cada tempo é diferente. O tempo não espera por ninguém, ele é dono de si mesmo.

A vida e os segredos dos campos Os pássaros vivem em bandos, os periquitos e os pombos. Eles saúdam sempre as manhãs quando estão nas fruteiras. As perdizes vivem olhando pelo meio dos capins. Debaixo do capim tem muitas coroas de cardo, se a pessoa pisa em uma é perigoso. Tem o gravatá-da-pedra, onde os sapos e pererecas se criam. As tartarugas vivem, e muitas delas guardam segredos. As mangabeiras vivem espalhadas pelos campos. Nas lagoas vivem a passanã, o quero-quero, o martinho-pescador, o sabacu, o catando piabas e outros bichinhos.

Os campos guardam muitas vidas e segredos.

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Exemplo de texto conjunto

A floração e o amadurecimento das frutas

Os campos guardam muitos segredos e também vidas que vivem dentro dele. Tem a vida dos pássaros, que vivem em bando, como os bandos de maritaca e de pombo. Os pássaros do campo saúdam a manhã, saúdam a tarde. Os pássaros também dão bom dia para nós com os seus cantos, porque sempre quando a gente acorda, as maritacas cantam na manhã. Eles também saúdam as alegrias na fruteira. As perdizes também fazem parte do campo, elas gostam de ficar debaixo do capim do campo. Tem também coroinhas de capim, de barro, coroinha de casa de cupim e coroinha de espinho de cardo, que são segredos do campo.

As flores atraem vários insetos através do cheiro e das cores. Os insetos também já sabem o tempo da mata e do campo florir. O campo e a mata têm um ambiente. Os bichos, as plantas, são diferentes. Quando florescem, tem um tipo de bicho, de inseto. Quando as frutas amadurecem, tem outros tipos de bicho. Quando não tem flores, frutas e as folhas estão caindo e se renovando, a mata e o campo ficam quietos, quase não tem som.

Como ficam as matas e os campos quando as plantas ficam floradas? 56


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O frio, as plantas e a gente As plantas são como nós, sentem os fenômenos que acontecem na natureza. As plantas sentem o frio na pele, como a gente também sente. As frutas nascem pequenas, engriguenhadas, e os brotos custam a nascer.

Pesquisando sobre As plantas são como nós

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A mata grossa tem seus encantos Temos que saber entrar na mata. Quando os velhos vão na mata caçar, tirar embira, cipó para fazer caçuá e jequiá, palha para fazer casa, colher frutas, fazer canoa ou tirar alguma coisa da mata, primeiro eles têm que pedir licença para a mata. Quando a gente entra na mata tudo vai esfriando, porque lá o clima é fresco. Quando a gente está dentro da mata, anda quase sem fazer barulho, olha e escuta tudo, porque a gente não sabe quem está por perto. A mata grossa tem muitos encantos. Os cantos dos passarinhos atraem a gente, o cipoeiro, as fruteiras e os ribeiros que tem na mata. Às vezes vem um canto de passarinho, a gente vai atrás e não é passarinho, é o encanto. A fruteira atrai a gente pra ficar comendo fruta e pode chegar outros bichos.

Exemplo de texto conjunto As plantas são como a gente. As plantas também sentem os fenômenos da natureza como o frio, o calor e outros. As plantas se enfraquecem com o frio, caem as folhas, as frutas que nascem no frio ficam murchas. As plantas também se protegem do frio. As plantas se fortalecem quando vem a chuva. O frio resseca as plantas, e na terra, nesse tempo, ninguém faz plantação. Se nós não nos protegermos do frio, ficamos iguais às plantas. Tem plantas que não se protegem, elas secam, morrem. O frio não desenvolve as plantas. Nesse tempo, tudo da natureza sente frio. A chuva ajuda as plantas, já o frio insanga as plantas.

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A gente quando anda na mata grossa vai marcando o lugar por onde passa, porque senão pode ficar perdido por muito tempo na mata.


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Na mata encontramos as plantas e raízes que servem para fazer os nossos remédios e banhos.

Quando a gente vai à mata, encontra o que ela tem. No caminho das roças encontramos tipos de folhas e cipós.Nos campos já tem outros tipos de plantas, que são diferentes, como a batata-de-pulga. Os campos são muito floridos e tem muitos insetos e outros tipos de passarinhos, como sabiá do campo, periquitos, araçá e outros. Na beira da praia já tem outros tipos de plantas que servem para pescar, como o mauí, que a gente bate na água para pegar peixe; e plantas para fazer artesanato, como a salsa, a semente do mauí, o ovo de gato e outros.

Cada lugar na mata tem o que precisamos 62

Como ficam o campo e a mata quando ficam florados O campo e a mata quando estão com frutas amadurecidas também atraem os pássaros e as caças. Ficam vários tipos de cheiros das flores, das plantas e quando as plantas têm frutas amadurecidas, também possuem vários tipos de cheiros das frutas.

O campo e a mata quando ficam florados é para dar os frutos e também atrair os insetos


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Cada planta tem seu tempo

Pra que serve um caminho?

Caminho serve como referência para as pessoas andarem na mata e em lugares onde não conhecem. Os caminhos são cheios de referências geográficas. Sempre perto dos caminhos tem fruteiras, cipoeiros, brejos, córregos, árvores tombadas e pessoas que vão marcando essas referências. Os caminhos sempre são tortos para livrar de espinheiros, árvores tombadas e para ir de um pé de fruta a outro. O caminho cria outros caminhos. Às vezes, um caminho pára em um pé de fruta, mas daquele pé de fruta pode ser criado outro caminho para um córrego onde as caças bebem água e assim segue. Tem caminhos mais movimentados do que outros. Quais caminhos são mais movimentados?

Os caminhos dentro da terra 64

Tem tempo para florar, quando ela atrai os pequenos insetos, como abelhas, e atrai o beija-flor. Esse é um tempo que o ar fica perfumado. Depois da floração vem o nascimento das frutinhas. As frutas passam por dois momentos: de vez e madura. No tempo que elas estão de vez, os bichos não comem elas. Depois que elas amadurecem os bichos se movimentam para comer elas. Tem tempo que caem as folhas das plantas para se renovar. É um tempo que a planta trabalha junto com o vento e a chuva.

Todas as plantas que existem na natureza têm o seu tempo certo de se manifestar.


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Tudo está ligado a tudo As plantas, as marés e a vida na Terra dependem da lua. A lua ajuda a equilibrar a vida na Terra. Todos nós dependemos do movimento de todo o universo. O ar está ligado às plantas, elas trabalham para nós. O sol ajuda também a manter a vida na Terra. O mar está ligado com o centro da Terra pelo céu e pelas águas. A lua também mexe com as plantas e faz com que elas cresçam.

Exemplo de texto conjunto Cada planta tem o tempo certo de se manifestar, de dar folhas, dar frutos maduros, de dar flor. Quando as plantas estão com flores elas atraem os insetos, como abelhas, maribondos, beija-flor e outros. No tempo que as plantas estão floridas, o ar fica perfumado; depois da floração, vem o nascimento das frutas. As frutas nascem, crescem, enverdecem e maduram. Quando as frutas estão maduras elas atraem muitas caças. As folhas caem das plantas e nascem outras novas. Para as plantas se renovarem e envelhecerem elas precisam da chuva e do vento. Eles trabalham juntos, porque o vento ajudou as plantas para caírem as folhas, agora a chuva vai ajudar as plantas para nascerem as folhas novas.

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O céu e todos os astros, o sol e a lua, estão ligados com a Terra.


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A caminhada no território da aldeia

O índio e a natureza são parceiros de vida.

A natureza tem vários tipos de conhecimentos. Tem conhecimento que a terra dá às plantas, aos rios, ao mar, às pedras, às cachoeiras e aos bichos. O conhecimento da natureza é muito importante para nós. Quando a gente tem conhecimento da natureza, a gente tem o ensinamento para ensinar.

O que a gente tem conhecimento da natureza 68

Fizemos uma caminhada para conhecermos as plantas do território da aldeia. Os nomes das plantas são: João-Duro serve para sarar dor na coluna; Vassourinha, serve para furúnculo; Costela-de-vaca serve para tirar dor do corpo; Beque serve para saída de dente, gripe e febre de criança; Nega-mina serve para mau olhado e dor na cabeça; Assapeixe serve para pneumonia, é cicatrizante e serve também para rezar cobreiro; Cipó amessica e cipó cabloco servem para banhar o corpo de mau olhado; Mulura serve para fazer banho para mulher ganhar neném; Erva-da-terra serve para banhar mulher de resguardo; Arruda-do-mato é bom para sarar pano no corpo; Santa-Maria é bom para febre e pra pereba; Bosmo é bom para machucado; Gerbão é bom para barriga inchada e vento preso; Alecrim-da-roça é bom para relaxar o corpo; O carapixe da folha comprida e o carapixe da folha larga são bons para dor de escaseira; Garobinha é bom para curar pereba; Imbaúba é bom para fazer emplasto; A desinchadeira é boa pra estrocadura; O cambará é bom para fazer xarope para gripe; picão é bom para tirisa.

Fruta-de-lobo é bom para bronquite; Arrozinho é bom para escorrimento do útero.


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As imagens da terra

Como a terra se prepara e trabalha?

A terra se prepara para receber a chuva. A terra trabalha depois que ela toma chuva. O rio também trabalha para receber as farturas que a chuva traz para ele. A mata, o bicho, o inseto e o pássaro trabalham. Tudo trabalha, na terra.

Tudo na terra trabalha e se prepara 70

O sol faz sua arte, fazendo seus desenhos com as sombras das árvores na terra. Todas as coisas que tem na terra fazem a sua arte. Os ninhos e as cantorias dos passarinhos. Os galhos, cascas, flores das árvores, também tem a sua arte, o seu desenho. Vamos andar e olhar os desenhos que o sol faz com a terra?

Tudo que tem na terra, brinca, cria, dança e trabalha com ela.


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O nosso espaço é marcado e demarcado pela nossa cultura

Eles também deixavam sinais em árvores, como uma forma de marcar o lugar.

O contar das histórias e dos conhecimentos dos índios antigos é porque eles tinham grande história com as grutas, as cavernas, as árvores grossas da mata virgem, as nascentes e as montanhas, que era onde eles buscavam as suas forças para proteger seu povo. Eles deixavam suas lembranças, o que tinham passado por ali e que aquele lugar lhes pertencia. Eles também deixavam sinais em árvores, como uma forma de marcar o lugar.

O conhecimento dos antigos com a natureza 72

O nosso espaço em que vivemos, sempre vamos marcando e demarcando com a nossa cultura. A gente também vai demarcando os lugares que são bons para plantar, fazer moradias. O lugar que deve ser preservado porque tem mais passarinhos e outros bichos. Ali é um lugar que todos ajudam a cuidar, porque todos precisam daquele lugar para viver.

A gente vai marcando os lugares onde tiramos as coisas da mata.


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O que praticamos hoje das nossas práticas tradicionais:

Cuidamos e conversamos com as plantas, quando vamos plantar, colher e fazer remédios. Trabalhamos juntos, fazemos trocas e moramos uns perto dos outros. Fazemos casamento e batizamos nossas crianças em nossa cultura. Cantamos, dançamos e rezamos para os pássaros, as pedras, as plantas, a lua, a água e o nosso Deus Niamissum. Às vezes nos alimentamos com alguns alimentos tradicionais como peixe, farinha, carne munquinhada e outros alimentos. (ou: Nos alimentamos com peixe, farinha....) Os velhos se reúnem para conversar sobr os trabalhos e outros assuntos da aldeia. Os mais velhos têm devoção com as matas, a lua, o sol, as estrelas e a água. O que não praticamos mais e por quê? O que estamos fortalecendo?

Nossas práticas tradicionais nas nossas vidas de hoje 74

As novas e antigas descobertas entre velhos, jovens e crianças pela nossa cultura Eles iam descobrindo a natureza, novos pesqueiros, novas fruteiras, novos severos de caças, novas moitas de cipós, novo lugar de pegar lenha. Quais são as descobertas dos velhos, hoje? Os velhos vão descobrindo novas formas de ir fazendo a comida pataxó com os ingredientes comprados na cidade. Vão misturando os materiais de fora com os da natureza e fazendo os artesanatos. Vão procurando uma maneira de vestir, calçar e enfeitar o corpo sem perder a cultura antiga de cuidar do corpo. Vão descobrindo novos instrumentos de trabalho.

As descobertas antigas dos velhos, jovens e crianças:


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O tempo velho

Exemplo de texto conjunto Os velhos tinham os seus jeitos de descobrir as coisas da natureza. Eles descobriam a beleza para seu corpo, descobriam na natureza o que era bom para se alimentar, como as frutas e as fruteiras. Cada tempo os velhos descobriam várias coisas na natureza, quando os velhos andavam na natureza eles olhavam, experimentavam e pesquisavam as coisas da natureza. O índio vivia só da natureza. Os velhos descobriram o barro para fazer uma panela, a folha da patioba para cozinhar. Eles testavam tudo. Eles só caçavam coisas da natureza que serviam à eles. Eles sabiam quais eram as folhas, as madeiras que faziam casa. As folhas eram a piaçava, ouricama e marimbú. Os velhos descobriram os cipós para fazer um samburá. Antigamente, as pedras eram as facas, facão e outros. Antes, nós não usávamos remédio de fora, era só da natureza. Antes as crianças iam assistir os velhos contarem histórias, ensinar os conhecimentos. Os velhos não tinham preguiça de andar. Antigamente os índios andavam todos pintados, os índios pegavam da natureza só o que eles precisavam. As comidas de antes eram só da natureza, hoje nós buscamos o alimento de fora. Hoje estamos mudados, hoje nós descobrimos as coisas de fora, como carne de boi, arroz, feijão, óleo e outros. Hoje a gente mistura as coisas de fora com as da aldeia. Hoje tudo está mudado, não é mais igual antigamente.

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O tempo velho é aquele tempo que os velhos viveram. A gente sempre se lembra do tempo velho porque é com a vida daquele tempo que a gente vive hoje. No tempo velho a terra era mais cheia de fartura, as famílias comiam tudo natural, peixe, carne, frutas e farinha de puba. Os velhos ficavam velhinhos e não tinham quase um dente furado. Eles eram mais fortes e quase não ficavam doentes, viviam mais tempo. A terra também não era doente porque não tinha lixo, mas depois os brancos foram derrubando as matas, fazendo cidades, fazendo queimadas, os rios foram secando. A terra também foi ficando seca e pobre de matas, frutas e animais. Os bichos foram embora pra longe e os índios foram ficando sem a sua alimentação.

Qual é o tempo velho?


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Para cada espaço da terra os velhos iam dando um nome. Exemplo de texto conjunto

A aldeia era formada próxima da beira do mar. Dentro da aldeia tinha família que era de pescador, de caçador e outras trabalhavam na roça. Naquele tempo tudo o que se plantava dava, a roça era cheia de várias plantas. Os insetos não atacavam muito as plantas. As águas eram limpas, não tinham poluição. Os bichos viviam mais perto da aldeia. Tinha muitas fruteiras, que eram os viveiros dos bichos. As plantas das roças eram: batata, inhame, fava, mandioca, abóbora e outras. Nos tempos de festa todos se reuniam na aldeia e tinham muita fartura.

A história do nosso modo de vida em nossa terra antiga 78

Na nossa terra antiga tinha muita fartura. As pessoas plantavam banana, abóbora, mandioca e outras. Naquele tempo a terra era boa, tudo que plantava dava, a mata de lá não era destruída. As águas eram limpas. Antigamente não tinha esse desenvolvimento que tem hoje. Antes nas águas tinham muitos peixes. Esses lugares que tinham fartura,tinham muitos bichos, muitos pés de frutas que serviam de viveiros para os bichos. Nas roças tinham batata, inhame, abóbora, mandioca, banana, fava e outros. Os bichos eram os que plantavam a natureza, nesse tempo de fartura. Os mais velhos faziam muitas festas e para cada pedaço de terra os velhos davam um nome.


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Quais são as casas que são mais movimentadas na aldeia?

As casas dos pescadores que pescam no mar e no rio. A casa do pescador que pesca no rio é movimentada pela parte da manhã, quando ele vai olhar as armadilhas. Muita gente leva coisas para poder fazer trocas. Na casa do pescador do mar é movimentada mais pela parte da tarde, quando ele vem do mar. Na casa da família que tem muitas frutas vai muita criança. Na casa da família que mora na roça, vai muita gente fazer troca com peixe e outros produtos. Na casa que sempre tem fogueira no terreiro, as crianças vão brincar durante a noite.

As casas das famílias que são mais movimentadas 80

Exemplo de texto conjunto Na aldeia as casas que são mais movimentadas são as dos pescadores dos rios e do mar. Também tem os horários de movimento, quando eles colocam as armadilhas para pegar os peixes. Na casa de um pescador do rio é a parte da manhã, e a do pescador do mar é a parte da tarde, são esses os horários que tem movimentos. Numa casa que tem um pé de fruta, as crianças ficam nessas casas e aí fazem os movimentos. Os velhos sempre plantavam pés de fruta para as crianças, jovens e velhos. Quando uma casa tem um pé de fruta, de fazer colar, as mulheres vão colher. Quando um parente tinha roça, a casa dele era bem movimentada, muitas pessoas iam fazer troca, nunca faltava movimento. Na casa das pessoas que iam no mangue, a casa deles era bem movimentada, as pessoas iam trocar. As pessoas também gostavam de fazerem farinha à meia, na aldeia. Tinha também as casas que não ia ninguém porque uns eram izurentos e quase não conversavam. Mas também tinham as casas que eram bem movimentadas, tinha pessoas que gostavam de fazer a fogueira de noite. As famílias do mar vinham trocar peixes e mariscos com as famílias da roça, que trocavam beiju, farinha e outros.


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Vamos sair para pesquisar pela roça e pelo espaço da aldeia, para mostrar as plantas que estão nascendo?

Tem planta que se espalha por baixo, através da raiz. As sementes e as raízes se espalham pela terra quando é no tempo da chuva, elas nascem. Por isso que em uma roça velha sempre tem alguma planta. Porque elas vão se espalhando. As plantas que se espalham pelas raízes: batata, pariri, capim doutor e outros. As plantas que semeiam pelo vento, pelas sementes: mata-passo e tiririquiu.

Como as plantas se espalham na terra 82

Quando a gente trabalha junto, a aldeia fica alegre e se movimenta Tem festa e os jovens namoram. Os homens pegam lenha e fazem fogueira no terreiro, cantam, dançam e contam histórias. As mulheres fazem muita comida e a cozinha fica muito movimentada.

Quando trabalhamos juntos tem muita fartura.


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As tardes da aldeia A tarde na aldeia é o momento em que as mulheres sentam nas sombras do terreiro da aldeia para fazer artesanato, bater papo e sentir a brisa que vem do mar. A tarde da aldeia é o momento das mulheres ensinarem suas filhas a fazerem os trabalhos que são das mulheres. Durante as tardes, as mulheres também planejam suas atividades do dia, fazem suas trocas e descansam.

Exemplo de texto conjunto Quando a gente trabalha junto tem mais fartura, a aldeia se sente alegre, movimentada, as crianças gritam, brincam. Quando tem festa na aldeia, ela fica movimentada, os homens pegam lenha para fazer fogueira, dançar auê. No trabalho é igual uma festa. Quando os bichos festejam e trabalham eles ficam alegres, tem a fartura do trabalho. Se a gente trabalhar sozinho, a gente fica triste, mas quando tem muita gente é um trabalho alegre. O trabalho junto é a mesma coisa de dar uma festa para a aldeia, porque tem muita fartura.

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A tarde é a hora das meninas se reunirem com todas as mulheres.


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A maneira de ensinar e aprender, de antigamente

A natureza também descansa durante a noite.

A noite descansa o dia porque tudo que movimenta no dia, descansa à noite. O homem e a mulher que trabalham, quando é noite vão descansar, ouvindo histórias, conversando com seus filhos, visitando a casa dos outros parentes.

A noite descansa o dia 86

Os velhos sempre diziam para os mais jovens que é fazendo, errando e consertando que se aprende. Às vezes o pai ensinava o filho a fazer um artesanato, depois ele teria que tentar fazer sozinho, se ele errasse tornava a desmanchar e assim ele ia fazendo até fazer sozinho. A mãe ensinava a sua filha a temperar uma carne e o peixe e colocar uma panela no fogo e assim ela ia aprendendo a fazer o tempo da família. Os velhos também diziam assim: Ninguém nunca nasce sabendo e nunca aprende tudo de uma vez, a gente vai aprendendo aos poucos e nunca para de aprender na vida. A vida na aldeia sempre foi assim, uns vão ajudando aos outros e assim nunca para de ensinar e aprender. A gente aprende com os outros e os outros, com a gente.

Cada dia que passa em nossa vida aprendemos uma coisa nova.


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Agora é tempo que os dias vão ficando menores e as noites longas.

As pessoas saem bem cedo para as matas e roças para voltarem mais cedo. Também é tempo de ficar até mais tarde no terreiro e passear na casa dos vizinhos, porque as noites ficam fresquinhas. Agora é tempo que o nhãnhãbabau, os corujões, o quero-quero e o bacurau cantam alegrando as noites e chamando o frio, e guardando os campos e as matas de estranhos. É tempo que as pacas e os tatus saem à noite. É tempo que as pessoas saem mais à noite para pescar.

Os dias e as noites

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O que a mãe e o pai ensinam aos filhos Tem ensinamento que é somente da mulher e de menino. Vida de mulher só quem aprende é mulher. Os jovens têm que respeitar essas regras de convivência, senão são considerados uns desrespeitadores. Os jovens aprendem a preparar, cuidar e respeitar o corpo. Quando eles aprendem todas as regras de convivência aí eles estão preparados para arrumar uma família.

Os pais ensinam um rapaz a respeitar uma moça. Saber conversar com ela, não invadir o lugar onde é só delas, não olhar as moças escondido.


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Quando os homens voltavam da caçada, da pescaria, ou da roça, sempre tinha alguém da comunidade à espera. Naquele momento as pessoas iam conversar, trocar peixe com farinha, beiju e ouvir histórias. Também sempre as famílias da mata trocavam com as famílias da praia. As famílias do centro traziam coisas da mata, sempre vinham carregados e voltavam carregados. Mas tinha tempo que o povo do mato ficava sem fazer troca por causa do vento que não deixava pescar e da chuva que não deixava sair de casa.

Quando voltava de caçar, pescar e da roça, os parentes iam visitar 90

As grandes caminhadas Tem tempo que o índio viaja muito. Antigamente o índio fazia grandes viagens, coletando, pescando e fazendo morada. Viajava atrás de alegria e libertava nosso espírito. Em sua viagem eles visitavam outros parentes. Onde tem parente, vai parente. Os índios quando foram ficando sem fazer suas caminhadas, foram se entristecendo, porque foram ficando sem liberdade. Hoje o índio anda mais, durante esse tempo, tirando tucum, coletando fruta para fazer artesanato e indo conversar com os funcionários do órgão do governo.

Por que o índio gosta tanto de viagem?


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Quem não sabe olhar na mata tudo fica invisível

Como os índios conheciam o lugar de andar na mata?

Eles seguiam as marcas da natureza. Eles guardavam os pontos de referência, como: cipoeiro, grandes árvores, grandes raízes, córregos, ladeiras e outras marcas que eles deixavam registradas. Às vezes o índio marcava o lugar onde tinha cipó para fazer peneira, onde tirava embira, marcava um bom pesqueiro, tudo através das marcas da própria natureza.

Como o índio conhecia o lugar de andar na mata iam visitar 92

Quando o índio vai à mata ele olha, para ver as coisas que a mata guarda para ele. A mata guarda as plantas, os passarinhos, as caças e madeiras para fazer os artesanatos, as sementes e o pau de lenha para fazer o fogo.fazer artesanato e indo conversar com os funcionários do órgão do governo.

Quem não sabe olhar na mata não vê nada, porque a mata guarda as coisas.


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O olhar

A natureza guarda muito segredos.

Para a gente descobrir os seus segredos, tem que olhar e viver sempre com ela. No mangue tem muitos segredos, a mucutura que vive debaixo da areia, acanha, o siri que se enterra na lama e outros segredos. No mar tem a maramaça e a arraia que se enterram na areia e outros segredos das pedras. No rio tem os segredos dos peixes. Uns fazem seus ninhos, outros se escondem nas ribanceiras. Na mata também tem muitos segredos, tem cobra que parece cipó, outra já é verde, tem grilo que parece um galho, e tem vários jeitos de viver. Cada lugar guarda um segredo.

Na natureza a gente tem que saber olhar para achar 94

A natureza nos ensina a sentir as coisas. Saber olhar, ouvir e sentir o cheiro é muito importante. O índio prepara essas três coisas para ser um bom caçador, um bom pescador e um bom guerreiro: o olhar, o sentir e o cheirar. O olhar tem uma grande força porque ele também se torna um espelho para a gente olhar nas coisas que acontecem em nosso meio.

O olhar ajuda a gente. A gente aprende olhando.


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O aprendizado do jovem antigamente

Na aldeia cada pessoa tem o seu lugar de importância.

Vocês já pensaram qual é o lugar de importância de vocês? Cada um de nós faz algum trabalho ou qualquer outra atividade que pode ajudar de alguma maneira a nossa família e a nossa comunidade. Que atividade cada um faz que ajuda a sua família e a comunidade? Na aldeia cada pessoa lembra-se de outro e vai na sua casa bater papo sobre alguma coisa, comida para fazer, alguma coisa pescaria ou outro trabalho na aldeia. Cada um pode se lembrar de alguma atividade para ajudar o outro. Quando um ajuda o outro ele quer ser reconhecido pelo outro. Quer fazer parte da vida do outro.

Cada um tem o seu lugar de importância na aldeia 96

Aprendiam muita coisa da mata com os velhos. Aprendiam a andar na mata, a fazer armadilha, a olhar; aprendiam os conhecimentos, os segredos da mata. Cada jovem gostava de coisas específicas. Se (o jovem) fizer as coisas (que precisa fazer), nada falta na aldeia.

O que os jovens faziam antigamente?


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Herança Cultural Herança cultural é o que os nossos velhos nos ensinaram e deixaram para nós. Tudo o que nos identifica é do nosso povo. As nossas festas, jeito de trabalhar, brincadeiras e outras coisas.

Exemplo de texto conjunto Os jovens de antes aprendiam muitas coisas com os velhos. Eles aprendiam muitas coisas sobre a mata, como era a trilha de uma caça, aprendiam os segredos da mata, aprendiam trabalhar, caçar, pescar. Os jovens aprendiam isso porque eles acompanhavam os velhos, cada coisa era um aprendizado, os jovens acompanhavam, aprendiam e depois faziam. Eles conheciam os aprendizados, sabiam como eram os espíritos da natureza. Cada jovem gostava da coisa que fazia, cada jovem aprendia o que gostava. Os jovens de antigamente tinham grandes aprendizados. Hoje os jovens não têm esses aprendizados, porque não tem mais o lugar de antes, o aprendizado de antes era diferente.

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A nossa cultura vai mudando com o tempo.


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As coisas que estão relacionadas na nossa vida são a terra, as plantas, a água e os bichos. Tem plantas que delas fazemos remédios e tiramos a resina para tomar o cheiro e para purificar o corpo e o nosso espírito. Tem plantas que delas fazemos os nossos artesanatos, tem planta que colocamos na comida para purificar e fortalecer o nosso espírito. Os bichos que fazem parte da nossa vida são cachorro, gato, papagaios, periquito e maritaca.

Onde a nossa vida está mais relacionada 100

A vida hoje na velha aldeia Fazemos leitura de várias maneiras. Através das imagens que vemos, do que escutamos, do que sentimos e do que pensamos. Através dessas leituras podemos enxergar as coisas que fazem parte da nossa vida e ir melhorando a nossa forma de viver. Através dessas leituras planejamos a nossa vida e o nosso futuro. Essas leituras também servem para ir melhorando o ambiente que nos rodeia, a cultura, as pessoas e o cuidado com as plantas e os animais.

Em nossa vida vivemos fazendo leitura das coisas que vemos, pensamos ou de fatos que passaram em nossa vida.


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No tempo de antigamente o jeito de viver na velha aldeia era diferente.

Trabalho com a terra

O ambiente da terra era diferente. A terra tinha muitas florestas, passarinhos, ĂĄgua e outros bichos. Toda tarde os papagaios iam para os manguezais, pela manhĂŁ eles voltavam para o centro das matas. Naquele tempo os velhos quase nĂŁo conheciam dinheiro e nem coisas de fora, como roupas, alimentos e outras coisas. Tudo o que se usava era tirado da natureza.

A leitura da vida e da cultura 102


105

A natureza está fortalecida pela força que recebeu no tempo das águas.

Quando a natureza está alimentada, ela também nos dá o alimento que plantamos. Para a gente receber o alimento e a força da natureza tem que saber invocar e pedir à natureza. Pedir para a água, para o vento, a terra, as plantas, o sol e a lua. Quando a natureza recebe o carinho da gente ela mostra a sua beleza, ela fica alegre. Ela fica florida e dá frutos para oferecer pra gente.

A força e a beleza da natureza 104

As famílias seguem as roças Quando uma família faz uma roça, ela começa a ficar o dia todo por lá cuidando das plantas, por causa de insetos e outros bichos. Quando é à tardinha a família vai embora. Em pouco tempo a família faz uma barraquinha de palha e aí já vem os seus filhos, traz alguns bichinhos de estimação e fica o dia todo por lá. Depois, com mais tempo, quando a roça já estiver dando os frutos, a família cresce a sua casa e aí já vem outra família daquela outra família, e aí vai formando uma morada. Aí começam a fazer mais roça, mais casa, criar alguns bichos e em pouco tempo uma aldeia de parentes está formada.

Em pouco tempo já vai formando uma aldeia.


107

Construção do nosso espaço de fazer ritual

Como se deve tratar os insetos que cortam os pés de mandioca?

Qual é o nome que vamos dar para esse lugar?

Quais são mandiocas de fazer cauim? Qual é a terra boa de plantar mandioca? Como a gente cuida das plantas? Que tempo a gente arranca a mandioca e como deve arrancar?

Capina da mandioca 106

Como é o lugar? Quais as plantas, quais os bichos que tem nesse lugar? Para o que vai servir esse lugar? Como se deve manter esse lugar?


109

A divisão da batata Como se faz uma divisão? Quando trabalhamos juntos, todos têm a mesma quantidade.

Quando se capina o milho? A importância do trabalho coletivo e a divisão entre os parentes. Qual é o espaço de um pé de milho para o outro? Como chega a terra no pé de milho?

Capina do milho 108


111

A terra dá, mas precisa se alimentar Como que a terra precisa se alimentar?

Como é a capina do feijão?

Como que a terra dá?

Qual é o espaço de uma cova para outra para não atrapalhar a capina? Como chega a terra no pé de feijão? Quando a gente capina a roça de feijão?

A plantação do feijão 110


113

A escolha de um lugar para fazer uma roça era com uma conversa com a natureza, pedia licença dela. Depois que sentisse que a natureza dava o lugar para fazer a roça, a pessoa começava a roçar o lugar. Depois que o lugar estava limpo, as pessoas tinham que pedir força da chuva, da lua, do ar e de toda a natureza para plantar as sementes e as mudas. Quando ia plantar tinha que trabalhar todo mundo alegre, gritando e cantando para as sementes e toda a natureza. Não podia plantar zangado e nem xingando. As plantas eram plantadas todas misturadas dentro da roça. Sempre quando plantava tinha que plantar algumas frutas para servir às caças e aos passarinhos. As favas e o feijão de corda eram plantados nas galhas e nos grandes troncos das árvores. Quando na roça tinha abacaxi, mamão e outras frutas, as pessoas iam fazendo viveiro ao redor da roça, engordando as caças.

O nosso modo tradicional de trabalhar na terra 112

Os viveiros naturais da floresta O grande viveiro natural, onde tem muitas espécies de pássaros, plantas, cipós, animais, frutas e outros. No viveiro de frutas, fazemos nossas caçadas. No viveiro de frutas, engordam os bichos. O viveiro de pássaros tem todas as espécies de cantos e de cores. Suiá, araponga, tururim, xanã, jiru, e outros. Cada espécie de passarinho tem uma cor diferente. O viveiro de animais tem muita fartura e a mata fica muito movimentada. O viveiro de plantas é onde se encontram várias espécies de plantas e flores, folhas e cascas diferentes. No viveiro de plantas, vivem também muitos bichos e insetos.

A floresta faz seu próprio viveiro.


115

Como era o lugar que os índios escolhiam para fazer uma roça Eles olhavam o lugar para fazer a roça; olhavam o jeito da terra, se era preta, porque se a terra fosse preta, era terra boa. Tudo que plantava dava. Eles olhavam se tinham algum córrego perto. O lugar era marcado e feito em um pedaço de mata ou capoeira. Na roça eles faziam plantação de tudo que comiam.

Exemplo de texto conjunto A floresta faz o seu próprio viveiro. Aonde tem muito pássaro, planta, animais, é onde tem grandes viveiros naturais. Os grandes viveiros da floresta têm vários tipos de plantas, frutas, cipó, árvores, pássaros, caças. Nos viveiros da mata, a gente faz as caçadas sempre. Os viveiros da floresta que têm fruteiras engordam os bichos. Nos viveiros dos pássaros, têm várias cores, vários tipos de pássaros. No viveiro dos animais tem muita fartura, tem vários tipos de coisas. Todos os viveiros têm fartura, têm alegria e são movimentados. No viveiro das plantas a gente vê vários tipos de plantas, cada uma é diferente das outras. Os viveiros dos pássaros são nas fruteiras. No viveiro das plantas vivem vários tipos de caças, insetos e pássaros.

114

Como os índios escolhiam o lugar para eles fazerem uma roça de mandioca?


117

Em se jogando também se planta

Hoje, quais são os trabalhos das mulheres? Fazer artesanato, cuidar da casa.

As mulheres sempre andam no paxarizeiro, no mauizeiro, no lugar de tirar concha, de pegar moréia, siri, aratu. Vão na roça pegar batata, mamão e cuidar de outras plantinhas. Hoje está diferente o trabalho da mulher.

Os lugares que as mulheres sempre andam 116

Os velhos, quando andam pelas matas e comem frutas, jogam as sementes em certos lugares e ali elas nascem e crescem. Quando eles tornam voltar ali, eles olham nelas e vão acompanhando aquela plantinha. Assim também são os animais.


119

Como a natureza se prepara para esperar os tempos da chuva O trabalho da natureza. Qual é o trabalho da natureza? Os brotos, as folhas, as cascas, as nuvens, o vento e nós.

Exemplo de texto conjunto Quando os velhos comiam uma fruta na mata, eles escolhiam um lugar para jogar a semente ou o caroço. Antes eles caminhavam e plantavam. Os pássaros também plantam. As frutas do quintal nascem na mata pelos velhos ou pelos pássaros e bichos. As águas dos rios também levam os caroços e naquele lugar a planta nascia sempre. Os velhos sempre tinham seu jeito de plantar. Eles plantavam na mata e tinha vez que eles marcavam o lugar que plantaram. Eles também escolhiam o lugar para plantar. As sementes de fazer artesanato também são plantadas. Antes eles faziam os monturos de folhas, sementes, galhos e outros, depois de um tempo as sementes que iam no meio estavam todas nascidas. Esse é o jeito que constrói as plantações.

118


121

Quando os velhos plantavam, eles tinham todo o carinho de olhar as plantas.

Quando os velhos plantavam, eles tinham todo o carinho de olhar as plantas. O velho, quando planta uma roça, caminha todos os dias para ver as plantas, ver como elas estão.

De olho no que se planta 120

Cultura Corporal É tudo o que o nosso corpo cria e pratica para viver alegre, forte e com saúde. As músicas, danças e brincadeiras. A cultura corporal serve para expressar a beleza, a força e o pensamento do corpo. Todas as pessoas têm o seu jeito de educar, zelar e alegrar o seu corpo. Tudo isso está ligado à cultura corporal.

O que é cultura corporal?


123

As plantas e os insetos vivem como uma grande família Como conhecemos as plantas quando estão doentes e sadias? Por que as plantas adoecem? Por que a terra fica fraca quando não tem matéria orgânica? Para as plantas não adoecerem, devemos alimentá-las bem. O que é o alimento da planta? Matéria orgânica: folhas e outras coisas que tem na mata. Para uma planta ser bem sadia, devemos primeiro alimentar a terra. Vamos na hortinha ver a cebola e o pé de hortelã? Como estão sadios! Como os velhos estão alimentando a terra? Na roça os velhos faziam assim também com as cinzas dos galhos que queimavam, as folhas velhas.

Mão e chão é o nosso jeito de trabalhar com todo o nosso sentimento, nosso espírito, nossa cabeça, nosso corpo.

A mão e o chão 122

As plantas têm doenças e saúde.


125

Em cada lugar na terra vivem os insetos e as plantas.

Vivem na mata, no campo e no brejo. Todos vivem no mesmo espaço. Os insetos e as plantas trabalham e coletam juntos para ajudar um ao outro. Os insetos vivem das plantas e das sementes, eles trabalham para todos, como a formiga trabalha para a abelha e o marimbondo. A abelha e o marimbondo trabalham para o grilo e outros. Os insetos também trabalham pra gente e para os bichos. Os trabalhos das plantas e dos insetos são muito bonitos.

Como alimentamos as plantas 124

O tempo da plantação e da colheita No tempo da plantação, as mulheres, os homens e as crianças ajuntam as sementes para plantar. É um tempo de muita animação, de muita conversa com terra, com os grãos e as mudas, para dar muita fartura. É tempo de ensinar as crianças, contar para plantar, ver a distância de cada cova e como plantar as mudas de cana, banana e outras. É tempo de pedir muita força da natureza e de trabalhar com muita alegria. No tempo da colheita, toda a natureza se alimenta. Os bichos, os insetos, as formigas, carregam algumas coisas para suas casas, Os bichos ficam com o couro liso e gordo. É tempo de replantação na floresta, pelos bichos. É tempo de fazer muitas trocas. As famílias ficam mais nas casas das roças colhendo e fazendo farinha. Os bichos fazem mais trilhas e as caças chegam mais pra perto da aldeia.

É tempo de agradecer as plantas e a terra.


127

A natureza se constrói com o trabalho coletivo A natureza vive no coletivo. As coisas que existem na terra vivem se construindo com o trabalho coletivo dos outros. A natureza que existe no céu vive e se constrói com o trabalho coletivo, com a terra, as árvores, as plantas, os rios, o mar, as pedras, as chuvas, o sol, a lua, os bichos e os insetos. O trabalho da natureza é coletivo.

Exemplo de texto conjunto No tempo da plantação as mulheres, as crianças e os homens ajuntam as sementes para plantar. É um tempo animado, as pessoas conversam com a terra, com as sementes, com as plantas, com os grãos e com as mudas. Nesse tempo de plantação, as crianças aprendem a contar, a conversar com as plantas e a terra. O tempo da plantação é quando se faz o ensinamento da matemática. Nesse tempo, a gente pede muitas forças para a natureza. Quando vamos plantar a gente trabalha alegre, nós conversamos, brincamos e rimos. No tempo da colheita todos da natureza se alimentam. O tempo da colheita e da plantação são os tempos da fartura. No tempo da colheita nós agradecemos, os bichos ficam gordos, nas matas tem mais trilhas de bichos, aparecem muitos bichos nas roças. No tempo da colheita, as pessoas fazem muitas trocas. Quem planta mandioca, no tempo da colheita faz muita farinha. Os bichos constroem sua plantação e sua colheita.

126

Como que a natureza se constrói com o trabalho coletivo?


129

O homem sempre precisa do trabalho da mulher e a mulher precisa do trabalho do homem.

Nos trabalhos pequenos, as mulheres são ligeiras e também têm mais prática de fazer, como preparar carne, peixe, fazer tempero e cuidar da panela. Pegar no machado a mulher já não sabe fazer. Capinar, fazer farinha, tudo isso a mulher faz. Pegar lenha grossa para festa, é o homem.

O trabalho da mulher ajuda o trabalho do homem 128

Na terra tudo começa com o cultivo Quando a gente vai formar uma aldeia, começa com o cultivo. Tudo que fazemos na terra tem que começar com a planta. Quando a gente faz um lavador de pratos no rio ou lugar para tomar banhos, ali é cheio de planta, como banana e outras.

Quando a gente vai fazer uma nova morada, começa com o cultivo de planta.


131

Desde muito antigamente o homem usava a natureza com respeito e equilíbrio.

O homem vivia em cavernas, fazia o fogo esfregando o pau em outro pau, coletava as frutas, matava os animais com armas feitas de madeiras e pontas de pedras, vivia livre com os animais. Antigamente o homem fazia e usava machado, faca e facão de pedra. Tudo o que precisava tirava da natureza, mas não a destruía. Hoje o homem perdeu o respeito pela natureza, destrói a natureza, como as matas, os animais, as águas. Existem algumas comunidades indígenas que lutam para preservar a natureza. Mas tem comunidade indígena que se misturou com outros povos e vai destruindo a Terra.

Quando o homem tirava tudo da terra sem destruir o ambiente 130

Como se escolhe e como se faz um bom lugar para morar Os velhos escolhem um lugar para fazer a sua morada olhando se tem uma boa vista, se é alegre, se tem rio, caça e fruta. Eles olham o caminho do sol e da lua pelo céu e se a terra é boa para plantar.

Também eles conversam com a natureza e pedem licença para fazer a sua moradia.


133

Tudo tem o seu tempo para trabalhar e descansar O tempo para o índio caminhar sem ter pressa com a natureza. Quando o tempo não ajuda, a natureza fica sem trabalhar. Tudo na natureza trabalha lentamente. Na natureza tem o tempo de cair as folhas e vir as folhas novas, depois vem as flores, e depois as frutinhas. Depois vem a chuva para fazer as frutas crescerem, depois o sol, e a brisa para amadurecer. Os bichos sem pressa esperam e ajudam a natureza a trabalhar. O trabalho da natureza é sem pressa, sem ganância e sem usura. Na natureza todos trabalham para todos. Também na natureza tudo trabalha e tudo descansa.

Exemplo de texto conjunto Os velhos quando escolhiam o lugar de sua morada, olhavam para ver se o lugar era alegre, tinha mata, tinha rio e outros. Eles olhavam se o lugar tinha boa vista. Tem lugar que é triste, e em um lugar tem que ter a alegria. Quando os velhos moram em um lugar que eles não gostam eles só ficam trocando de lugar. Antes os velhos moravam nas beiras dos rios. Os velhos também escolhem o lugar que tem o céu aberto. Os velhos gostavam de um lugar que dava para ver o sol e o céu.

132

Na terra tudo tem o seu tempo para trabalhar.


135

Como a natureza faz o seu trabalho?

As plantas florescem, depois vêm os botões e por último vem o fruto. Os bichos esperam o fruto amadurecer, não comem antes da hora. Eles nos ensinam que não podemos comer as frutas antes da hora. Os nossos velhos também são como os passarinhos, plantam e esperam as plantas ficarem boas para colher, para nós comermos.

O trabalho e a espera da natureza 134

O tempo faz a história Onde moramos, na aldeia, o tempo faz a história da terra. O tempo e a história dos nossos velhos que tinham muitas farturas na mata e nos rios. Na mata tinha muitas frutas, muitas caças e muitos passarinhos. No rio e córrego tinham muitos peixes. Tempo é a história da natureza, produz e renova os bichos, os pássaros, outros tempos e a história da fartura das plantações da roça.

O tempo faz a história da vida da gente e do lugar.


137

A preservação da vida do nosso povo Sempre tinha uma pessoa mais velha para conversar com as famílias. Conversar com os jovens e as crianças de que precisam participar da comunidade, dos costumes da cultura do seu povo, para ter a vivência boa. Eles preservariam a vivência do povo e a preservação da natureza, da terra, das matas e dos rios. Como trabalhar na terra com carinho, como plantar um pé de planta.

Exemplo de texto conjunto O tempo faz a história da nossa vida. O tempo acompanha a nossa vida. Cada tempo tem uma história para contar. A história da natureza também é pelo tempo, o tempo faz a historia da terra. Onde passamos, nós fazemos uma história. O tempo é muito importante, o tempo vai passando e tudo vai mudando, igual aos velhos, eles se alimentavam e viviam de outro jeito. Hoje nós não temos mais as farturas dos velhos. O tempo é um livro que é sempre lembrado. Tem tempo que constrói muitas farturas. Os tempos são ensinados, o tempo traz tudo. Os velhos construíram suas histórias com o tempo, isso tudo fica no pensamento. Nós fazemos o nosso tempo aqui na terra. A natureza sempre está aqui, a natureza teve seu tempo. O sol, a lua, as estrelas, tudo tem os seus tempos de ir e vir. A história está na nossa vida.

136

O ensinamento de como nossos velhos faziam para preservar a vivência das famílias, do seu povo:


139

O nosso novo jeito de alimentação Como fazemos uma carne de boi e galinha ter quase o gosto da carne de caça? Como fazemos para melhorar o gosto? Quais as plantas que colocamos? O que alimenta bem o nosso corpo é o caldo do final. Os velhos diziam que a gente tinha que encher a barriga, mas tinha que deixar um lugarzinho para beber o caldo.

Oficina de produção

Como a gente faz com o peixe que é também comprado na cidade?


141

A Cultura

O que representa cada tipo de artesanato?

Tudo que fazemos para viver é cultura.

Como tecemos as sementes? Como fazemos para as sementes não estragarem? Como fazemos as cordas? Como fazemos os desenhos com as sementes?

Confecção do artesanato 140

A cultura nos faz ser diferente de outro povo. A cultura tem a nossa marca. A cultura está ligada à nossa terra, à mata, ao nosso jeito de alimentar, às festas, à nossa religião e outras coisas A nossa cultura nos faz ser gente.


143

As plantas florescem, depois vêm os botões e por último vem o fruto.

Os bichos esperam o fruto amadurecer, não comem antes da hora. Eles nos ensinam que não podemos comer as frutas antes da hora. Os nossos velhos também são como os passarinhos, plantam e esperam as plantas ficarem boas para colher, para nós comermos.

Como a natureza faz o seu trabalho 142

Os lugares da mata que são mais movimentados Os lugares que são movimentados: As fruteiras; os córregos e suas cabeceiras, porque os bichos vão beber água; as roças, onde andam gente e caças; os poleiros dos pássaros; onde tem raízes que alguns bichos comem; os grandes cipoeiros, moradas dos macacos; onde é mais movimentado, fica adubado.

Tem lugares menos movimentados, onde os bichos só passam de passagem, como os campos.


145

Exemplo de texto conjunto Os lugares da mata que são mais movimentados são as fruteiras. Na mata tem os movimentos dos bichos, dos pássaros. A cabeceira dos córregos é também um lugar movimentado, porque os bichos vão beber água. Os bichos vão para comer na roça. Tem os poleiros onde os pássaros dormem, tem raízes de pau onde os pássaros dormem. Tem raízes de pau que os bichos gostam de comer, os cipoeiros onde os macacos dormem. Na cidade tem movimentos, só que não é um movimento calmo, igual o da mata. Quando é hora de dormir eles na cidade ficam em movimento. Os bichos e os pássaros têm sua hora de comer, dormir e acordar. Quando o sol está quente eles vão para a sombra e ficam descansando. Quando a mata está em movimento eles estão em festa. Tem vez que os bichos viajam. Tem lugares que eles só passam de passagem. Em uma mata que tem muita fartura, tem muito movimento de pássaros e bichos. Os animais vão à procura dos seus alimentos em uma fruteira. Esses são os lugares movimentados.

144

A matemática é o trabalho de vida na comunidade A matemática é a vida da comunidade. A matemática traz a alegria e a união entre as pessoas. A matemática faz trabalhar, dividir e pensar juntos.


147

O jeito de sobreviver antigamente

As plantas também têm a sua história.

Os velhos quando fazem o seu plantio também cuidam da vida delas. Então as plantas passam a ser parte da sua família. Os velhos fazem um trabalho de amor e carinho. Através do seu trabalho, o velho divide a sua energia com as plantas. Tudo que é cuidado com muito carinho, a natureza dá com mais fartura. Para isso acontecer, tem que conversar com os insetos, as plantas e o vento.

A nossa vida e a vida das plantas 146

Quando ia caçar, passava dias na mata muquinhando carne. Fazia barraca na mata. Quando chegava à aldeia dividia a carne com os parentes. No tempo que não tinha sal muquinhava as coisas para não perder.

Fazia canoa para pescar, fazia balaio e samburá.


149

O nosso jeito de agradar para viver junto

Convivência coletiva é tudo que fazemos juntos.

Tudo que dividimos, o que trocamos. É a vida das famílias de parentes dentro da comunidade. É a torrada de farinha, é uma plantação, é festejar junto, reunir, beber café junto, é participar da vida do outro parente. É tratar peixe junto quando dá bamburro de peixe na praia, é dividir o caranguejo quando eles andam. Hoje, como é a convivência coletiva na nossa comunidade? É como antigamente ou está mudando?

Convivência Coletiva 148

Quando a gente dá alguma coisa para uma pessoa, é porque quer essa pessoa perto da gente. Quando a gente convida uma pessoa para ir à casa da gente e que oferece um almoço, também é para viver perto da gente. Essa é a maneira que os nossos velhos sempre fazem para viver junto. Sempre que a gente puder, a gente tem que oferecer um agrado para um parente, porque sempre vai ficar perto da gente.

Quando a gente faz festa junto, a gente está fazendo um laço de parente e de família.


151

O pai e a mãe ensinam os filhos a ganharem e trabalharem para depois dar para seus filhos.

Quando o filho está na casa da família, ele aprende a ganhar. Depois, quando casa, ele dá, para ensinar. O pai pega peixe, fruta, caça, faz roça e tudo o que ele faz ele dá para o filho. O pai ensina o filho a caçar, pescar, fazer artesanato, cuidar e trabalhar na terra, fazer ritual, conhecer os segredos da mata, para quando crescer ele mesmo seguir fazendo o seu trabalho. Quando o filho cresce e casa, tudo o que o pai tem é do filho dele e assim ele vai dando e ensinando o seu filho a ganhar para depois dar para seu filho. A mãe ensina a sua filha a cozinhar, dividir os alimentos, cuidar da família e fazer outros trabalhos que são das mulheres.

Primeiro a gente aprende a ganhar, depois a gente dá, para ensinar. 150

O tempo que nossa gente vivia mais livre Nesse tempo a nossa gente morava em casas de palhas, dormia em esteiras, comia somente carne de caça, peixe, farinha de puba e coisas que tirava da roça. Ninguém tinha luxo com nada, porque todo mundo vivia de um jeito só. Todas as mulheres andavam juntas para coletar, pescar, ir à roça. Ninguém trabalhava sozinho. Nossa gente vivia mais livre porque não tinha lugar marcado para morar. A riqueza que eles tinham era a terra, suas plantações e as matas. -Nesse tempo as famílias dormiam e acordavam bem cedinho, sempre tinha um fogo dentro de casa, onde todos se reuniam. Os velhos cantavam muitas histórias e as crianças gostavam muito de apreciar. Naquele tempo só se ouvia o som da natureza. As pessoas conheciam os horários dos bichos e acompanhavam todas as mudanças da natureza. O divertimento das pessoas naquele tempo era nas águas dos rios, as conversas e histórias da beira do fogo, as pescarias e as caçadas. Naquele tempo todo mundo olhava e observava mais as coisas da natureza.

E hoje, como é a vida de nossa gente? O que mudou em nosso jeito de viver?


153

Nas moradas que a gente faz, sempre deixamos nossas marcas.

As nossas marcas são plantações, moradias, batizado da terra através dos contos, danças e festas. A gente pode fazer outras moradas, mas não esquece as antigas. A gente guarda as lembranças vividas nas antigas moradas. Cada lugar novo que a gente vai fazendo pra morar, a gente vai fazendo ele ficar com a nossa imagem. Quando a gente vai embora para longe, a gente guarda as lembranças das nossas moradas. As lembranças e as saudades alimentam o nosso espírito, para continuar fazendo nossas moradas do nosso jeito antigo e cuidando da nossa terra.

A morada é algo que a gente não esquece 152

Quando a gente canta e dança é para buscar saúde e força da natureza para o nosso corpo Cada canto e dança tem um movimento da natureza que a gente faz para pedir força e deixar o nosso corpo com ligeireza e sem preguiça. A gente canta e dança para a terra quando vamos plantar, quando as plantas dão muitas frutas e aí a gente agradece. A gente canta e dança para a mata e para as árvores nos darem a sua força, a alegria e a voz dos pássaros. A gente canta e dança para pedir a força do céu, da lua, do sol e das estrelas para proteger nossa aldeia, nossa família e todos os nossos parentes. A gente canta para a força do fogo, das pedras e das águas, para proteger e defender a nossa aldeia de todos os perigos. Por isso, a gente respeita a chuva quando chove, a trovoada quando ronca, os raios que vêm do céu e toda a natureza.

O que mudou em nosso jeito de viver?


155

O que a aldeia produz, faz parte do coletivo:

Os conhecimentos sobre a forma de fazer uma comida, a ciência e o segredo de uma planta, a criação de um artesanato, a forma de cantar, a forma de conviver na aldeia. Tudo o que as pessoas criam de acordo com a sua cultura faz parte de uma produção coletiva, porque vai servir para todos desfrutarem e vivenciarem aquele conhecimento.

Produção e vivência coletiva 154

Cuidar e saber colher Para tirar uma planta da mata para remédio tem que tirar de manhã ou à tarde, pedir licença da planta, conversar com ela e também com o sol. Quando a gente planta, tem que ir conversando com a terra e com a plantinha e dando carinho para ela. Também a gente tem que plantar de acordo com a lua, na noite escura, aí ela vai dar força para a planta. Quando a gente vai colher uma fruta ou outro alimento da terra, a gente tem que agradecer.

Tudo o que tem na terra tem que saber colher.


157

As plantinhas pequenas ao redor da casa são sempre de cuidado das mulheres.

As plantinhas pequenas são das mulheres porque é com elas que as mulheres fazem os temperos, os chás, os remédios para a sua família e para outras pessoas. Cada tipo de comida tem uma plantinha para o tempero: a carne da mata, o peixe, a carne do terreiro. Em cada pedacinho de terra ao redor da casa, a mulher forma uma pontinha de plantinha de várias espécies.

As plantinhas pequenas 156

Onde se trabalhava, estavam todos Quando a comunidade se preparava para fazer trabalho, festa ou outras atividades da vida, todos estavam presentes. As pessoas se dividiam em equipes. O momento que todos se reuniam era durante a noite. Os parentes também vinham de longe.

O ambiente também ficava em festa.


159

Nós temos respeito pelo modo de vida e pela cultura do nosso povo.

O modo de vida da cultura é o jeito de vida que nós temos com a natureza, o relacionamento com as plantas, a terra, os rios, as matas, as pedras, as montanhas, a chuva, a lua, o sol e as estrelas. Nosso jeito de fazer o ritual do casamento, o nascer da criança e as festas do ritual da chegada das águas.

Modo de Vida 158

Exemplo de texto conjunto Somos nós que fazemos a cultura, a cultura é viva, a cultura faz uma boa vivência e faz o nosso espírito livre. Nós vivemos o modo de vida da cultura, cada povo tem o modo de vida da cultura. Nós temos as pinturas, o modo de festejar as farturas, o jeito do casamento, o jeito de cozinhar, de dormir. A cultura faz a gente ser de um modo, a cultura faz o nosso respeito, os nossos direitos. Nós temos o jeito de viver com o modo de vida da cultura. O branco não tem uma cultura viva. Na nossa vida está ligada toda a natureza. A vida na cultura é que nos faz sermos nós. Se não tiver esses modos, nós não somos a pessoa indígena. É a cultura que faz a gente vivo. As plantas são os ensinamentos. A gente sempre está cheio de vida com a cultura. A cultura somos nós mesmos.


161

Cada lugar tem a sua origem e sua própria característica e identidade.

Tem lugar que produz uma boa farinha, um bom beiju. Tem família que tem saberes de como se faz um bom artesanato, uma boa comida, e só aquela família ou aquele povo faz daquele jeito. Cada lugar ou região tem sua própria identidade no seu jeito de produzir suas coisas, comida, artesanato e outros produtos.

O sentido do lugar da aldeia, sua origem e característica 160

Exemplo de texto conjunto Cada lugar tem sua origem e sua identidade. O índio tem sua identidade, já a origem do branco é diferente da do índio. O índio tem o seu jeito de produzir. A nossa origem são as coisas dos velhos, a nossa identidade, os costumes, a cultura, os jeitos de cozinhar. A identidade dos brancos é o papel. Nossa origem é uma farinha. Na nossa origem tem o frango munquinhado, o cauim, a farinha, o beiju de puba e outros. A origem da gente é isso, a nossa identidade, a nossa característica. O pirão da água é uma origem da gente. Cada região tem sua identidade.


163

A terra tradicional, guarda a nossa história.

A terra tradicional, onde a gente nasceu e onde o nosso povo sempre viveu, guarda a nossa história, a memória dos nossos velhos, as raízes culturais que fortalecem a nossa vida. Terra tradicional é mãe da gente porque foi ela que criou todas as pessoas. Tudo que tem na terra é uma referência de vida individual e coletiva e tem um sentido, como as plantas, os rios, os animais e toda a natureza. Os velhos sempre têm um grande amor pelas terras em que eles nasceram. Em nossa terra desenvolvemos nossas relações familiares, planejando nosso futuro e o do nosso povo.

Terra tradicional: nosso lugar de referência e de vida individual e coletiva 162

Exemplo de texto conjunto Nós temos o nosso lugar de referência. A memória dos velhos, as histórias, estão na Bahia. A nossa terra tradicional é onde está nossa raiz cultural, é onde nascemos e onde os velhos viviam. A terra é nossa mãe porque foi ela que nos criou. Nós nunca perdemos os nossos lugares. A terra tradicional criou todos os pataxós. Tudo que tem na terra é referência de vida. As raízes são os nossos velhos, que nos fortalecem. Tudo tem sentido e na terra tem coisa individual e coletiva. As coisas individuais são: casas, plantas, e outras. As coisas coletivas são: o mar, o mangue, a mata, o campo e outros. Na terra tradicional, os velhos têm um grande carinho com a terra, eles não perdem o carinho com a terra.


165

O nosso jeito de alimentar Os assados: a gente assa ouriço, camarão, rita-pedra. Do mangue, a gente assa: ostra, caranguejos, aratu, concha e outros, mas a gente também come cozido. Somente o baiacu que a gente não come assado. As moquecas a gente faz com piabas e peixes maiores.

Quando os velhos faziam derrubadas para fazer os seus roçados, eles pensavam em fazer uma casinha para cuidarem das plantas que plantavam na roça. A derrubada que eles faziam era perto de um rio, córrego ou nascente. Para fazer a derrubada eles olhavam se tinha caça e pássaro. Primeiro, quando o velho vai fazer uma derrubada, ele anda muitos dias procurando um lugar ideal. Quando ele encontra o lugar ele vai arrumar comida, como peixe, caça ou cria (porco). Depois ele convida a comunidade e faz uma grande festa para fazer o trabalho com muita fartura. Os velhos faziam suas derrubadas, mas não destruíam, porque eles tornavam a fazer uma mata de fruta. Se naquele lugar que o velho faz a derrubada não tem bichos, com o tempo tudo vai chegando para perto dele.

Da derrubada de um roçado se forma uma morada 164

Os catados, dependendo de como se faz, o sabor é diferente.


167

Exemplo de texto conjunto Nós temos o jeito de assar e cozinhar. As coisas assadas têm vários sabores. Às vezes o assado é mais gostoso do que o cozido. Nós comemos várias coisas assadas, peixes, caranguejo, concha, ostra, brijigão assado e cozido. Cada jeito de alimentar tem seu sabor. Temos o nosso jeito de cozinhar, temos os catados, as moquecas, os assados e os cozidos. Nós fazemos a moqueca e também o catado de mariscos do mar. Muitas coisas nós não comemos assado, só cozido, como o baiacu - não podemos comer ele assado e tem que cozinhar bem.

A saudade dos alimentos em nosso corpo É quando mudamos para um lugar que não tem os alimentos que comemos, para alimentar e fortalecer o nosso espírito e dar força em nosso corpo.

Como é sentir a saudade dos alimentos em nosso corpo? 166


169

Como o nosso povo representa a natureza com o nosso conhecimento?

Os recursos da natureza são um bem coletivo.

Toda comunidade tem direito de tirar e usar os recursos da natureza sem ganância e usura. Os velhos sabiam tirar os recursos da natureza sem agredir o meio ambiente. Todos usavam e tiravam coletivamente, ninguém era dono das fruteiras, das caças, dos peixes, das plantas e dos rios. Cada pessoa tirava somente o suficiente, o que estava precisando.

A comunidade e os recursos naturais 168

Se a gente tira uma planta, com ela a gente faz o remédio. Se a gente pega uma caça, aproveita o seu dente para fazer um colar. Se a gente pega um passarinho, aproveita a sua pena para fazer cocar, colar e outros enfeites. Se a gente tira um pau já faz um arco, um bichinho de madeira, uma gamela, um pilão, um banquinho. Se a gente tira uma palha, já faz um trançado, cobre uma casa. Se a gente tira uma casca já faz uma tinta para tingir a embira. A gente também representa a natureza com nossos cantos. Cantamos para agradecer a força das plantas, das águas, das pedras e tudo que tem na natureza.

Tudo o que a gente vê e tira da natureza a gente representa com alguma coisa.


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A nossa vida é uma troca constante com o ambiente em que nós vivemos.

A gente troca uma muda, uma semente, uma roça, um pesqueiro, um lugar de pegar fruta e com tudo isso vai fazendo uma história. Nós e os animais trocamos as coisas que a gente tem afeto, para viver junto da gente. Tem bicho que tem afeto por uma fruta, uma raiz para roer. Aí ele transporta, guarda e espalha ela na terra para junto de si.

Quem é vivo sempre troca de lugar 170

O jeito de trabalhar dos antigos e de hoje Os pataxós antigos tinham várias atividades durante o dia. Suas atividades eram ligadas aos tempos que a natureza oferecia. O tempo de tirar mel da abelha; o tempo de tirar cipó para fazer balaios e peneiras; o tempo de caçar, pescar e coletar; o tempo de fazer pequenas roças; o tempo de esperar a natureza produzir. Suas atividades não geravam dinheiro, por isso eles não se preocupavam com as coisas de fora, eles se preocupavam apenas em manter a natureza viva para dar seu sustento. Hoje a nossa vida está diferente, a gente está precisando de tudo o que vem de fora.

O nosso trabalho hoje mudou porque não vivemos mais somente da natureza.


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Tem trabalho que realizamos juntos e tem trabalho que é somente das famílias.

Quais são as práticas que realizamos juntos? Farinhadas; pegar caranguejos na andada; pegar praça na praia quando dá bamburro nas redes; pegar frutas no campo quando é tempo delas, caju, mangabas e outras; armar camboa no mangue; faxiar e pegar ouriço e outros mariscos quando a maré do mar estiver boa.

Práticas de produção coletiva 172

A gente vai fazendo uma nova cultura com as coisas que tiramos da natureza Com tudo o que a gente tira da natureza vamos fazendo a cultura da terra e a cultura da gente. Qual é a cultura da terra? E qual é a cultura da gente? Tudo o que falta na terra a gente vai completando e fazendo um novo lugar. Às vezes em um lugar falta um tipo de planta como: batata, cana, manga ou outras frutas da mata. A gente vai conseguindo algumas mudas e sementes e fazendo um novo lugar e uma nova história. Cada tempo que passa a gente vai tirando mais e completando e mudando o lugar. Por meio desse trabalho a gente vai criando uma nova cultura no jeito de se alimentar, trabalhar, fazer trocas com os parentes, fazer roças e moradias.


O conhecimento dos nossos velhos está relacionado com todas as coisas da natureza.

Pela observação dos tempos, eles iam descobrindo como trabalhar e cuidar da terra. Cada tempo a natureza trabalha de um jeito. Por esse movimento dos tempos os velhos sabiam o tempo certo de plantar, de viajar pelas matas, de coletar, de fazer remédio, de caçar e outras práticas de sobrevivência na terra. Tinha tempo que os velhos iam coletando e espalhando as frutas pela terra. O tempo das frutas era quando as caças estavam gordas e se faziam as grandes caçadas. De acordo com o trabalho da natureza, os velhos iam ensinando os jovens e as crianças a cuidarem da sua vida. Para fazer um remédio tinha que conhecer e saber tirar a plantinha. Para isso tinha sempre um velho que sabia fazer esse trabalho com as plantas.

O nosso conhecimento tradicional 174




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