/revista_146

Page 1

Publicação mensal dos Sinepes, Anaceu, Consed, ABMES, Abrafi, ABM, IMDC, Fundação Universa e Sieeesp

Educação, ciência e tecnologia Sem educação contínua, não há desenvolvimento científico e tecnológico

Gestão pública

Uma nova forma de gerenciar o ensino

Entrevista

A formação humana em primeiro lugar

Carta de Florianópolis Propostas serão levadas ao Congresso Nacional

ANO 13 - MAIO 2010

Álvaro Albuquerque, diretor executivo da Ritla

9 772176 441000

EDIÇÃO 146

ISSN 2176- 4417

00 1 46

R$10,00


capa

Educação, ciência e tecnologia Diretor executivo da Ritla, Álvaro Albuquerque se diz otimista sobre o desenvolvimento científico e tecnológico no Brasil. Para ele, não há avanços sem educação contínua

R

Albuquerque vivencia os avanços da ciência e da tecnologia desde a infância, quando acompanhava o pai, médico e cientista, em sua indústria farmacêutica e, depois, trabalhando na Embratel, quando o Brasil iniciou as comunicações via satélite. Hoje, além de estar à frente da direção da Ritla – um organismo internacional de cooperação técnica que reúne os países latino-americanos integrantes do Sistema Econômico Latino-Americano (Sela) –, também chefia o gabinete do presidente do Conselho do Sebrae/RJ, empresa na qual, até março deste ano, dirigiu a área de Relações Internacionais.

12

Revista Linha Direta

André Telles

ecente divulgação do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) demonstra que a inclusão digital no Brasil é um processo mais caro, mais lento, mais desigual. Mesmo assim, o diretor executivo da Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana (Ritla), Álvaro Albuquerque, se diz otimista em relação ao desenvolvimento científico e tecnológico no país. Mas ressalta: “A educação precisa ser o esteio para o desenvolvimento da economia, da ciência, da tecnologia, da inovação e, consequentemente, do bem-estar social”.

Álvaro Albuquerque, diretor executivo da Ritla


Graduado em Direito e mestre em Direito Comparado pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, já foi consultor jurídico da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) – empresa que apoia o desenvolvimento científico e tecnológico no país, incentivando projetos de pesquisa – e secretário de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia da cidade do Rio de Janeiro. Este mês, Albuquerque estará em Nova Iorque para ajudar a escolher, entre sete candidatas, a cidade que mais se destacou em políticas e ações a favor da inclusão digital. Vai participar, também, de um painel sobre a experiência brasileira e o que se pode prognosticar para o nosso país com o uso das novas tecnologias. Acompanhe entrevista concedida, com exclusividade, à Linha Direta. Que relação o senhor estabelece entre ciência, tecnologia e educação? No passado, os formadores de opinião e os encarregados da formulação de políticas voltadas para o desenvolvimento (sobretudo nas economias dos países emergentes) não tinham uma percepção muito clara (como acredito que hoje tenhamos) de que o desenvolvimento científico e tecnológico constitui fator determinante para a melhoria das condições de vida de suas populações. A iniciativa do ex-secretário-geral da ONU, Koffi Anan – ele mesmo originário de um país em desenvolvimento (Gana) –, de instituir o projeto Millenium, há cinco anos, reuniu quase três dezenas de cientistas de todo o mundo, e mostra, muito claramente, no relatório intitulado Inovação: Aplicando

Conhecimento ao Desenvolvimento, que temas complexos como o da redução da pobreza, da fome, do analfabetismo, da degradação do meio ambiente, dentre outros, passam por uma abordagem mais séria da educação, do desenvolvimento científico e da inovação tecnológica. Em resumo: não há desenvolvimento econômico sustentável sem esses três pilares. A educação precisa ser o esteio para o desenvolvimento da economia, da ciência, da tecnologia, da inovação e, consequentemente, do bem-estar social. Como o senhor avalia o cenário de CT&I no Brasil? Eu tive o privilégio de, ao entrar para a Finep, em 1975, contribuir para a execução do Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PBDCT), que era o capítulo de ciência e tecnologia do chamado II Plano Nacional de Desenvolvimento, formulado ainda no regime militar. Lembrome de que, nas primeiras semanas de trabalho no setor jurídico da Finep, foi-me dada a incumbência de negociar e elaborar o contrato de duas pessoas que até então eu não conhecia: os professores José Israel Vargas e Maria da Conceição Tavares, dos quais eu não tive o privilégio de ter sido aluno, mas que, de outra maneira, me considero um discípulo. Foi naquela época, também, que conheci um professor carioca, que estava pleiteando nosso apoio para construir o Instituto de Física da Universidade Federal de Pernambuco, uma das instituições de pesquisa mais renomadas do nosso país. Era ele o

atual ministro de Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende. Na mesma época, começamos a pensar na instituição de um mecanismo para apoio aos pequenos negócios, que acabou resultando na formação do Cebrae (com “C” mesmo), Centro Brasileiro de Assistência Gerencial à Pequena Empresa, hoje uma referência mundial. Acho que melhoramos muito daquela época para cá: os avanços que o país tem alcançado nas diversas áreas, como biotecnologia, biofísica, tecnologias de telecomunicação e informática, o domínio incontestável nos setores da agroindústria, da aeronáutica e, sobretudo, do setor de petróleo e gás (dentre outros) nada mais são do que o resultado de intensos investimentos que foram feitos em pesquisa e desenvolvimento ao longo de três décadas. Mais recentemente, a instituição dos fundos setoriais administrados pela Finep e a preocupação do atual governo em dar uma atenção especial para o desenvolvimento em ciência e tecnologia – orientado para o desenvolvimento social – me tornam cada vez mais otimista em relação ao desenvolvimento do Brasil. Como é o trabalho da Ritla para o desenvolvimento do setor tecnológico no Brasil? Como agência intergovernamental regional, ajudamos a construir as chamadas “pontes” de aproximação entre demandas e ofertas de tecnologia; facilitamos o acesso a consultores qualificados, a capacitação de recursos gerenciais e humanos, em geral, para os governos e, eventualmente, Revista Linha Direta

13


para entidades da sociedade civil, cooperando, também, no acesso a créditos para desenvolver tais atividades. Como um organismo de cooperação multilateral, como se dá o intercâmbio de informações entre os países que integram a Ritla? Hoje são membros plenos a Argentina, o Brasil, a Nicarágua, o México, o Panamá e a Venezuela. Todos os demais países da América Latina e Caribe (AL&C) são considerados observadores. Fizemos uma reunião, em março passado, no Itamaraty, e a maioria dos países representados manifestou sua intenção de passar desta categoria para membros plenos. O processo de adesão é, geralmente, demorado, devido às instâncias que eles têm que percorrer em cada país. Nossos “pontos focais” são os Conselhos Nacionais de Ciência e Tecnologia e, eventualmente, o Ministério de Ciência e Tecnologia. Fizemos uma convacação para que o plano de ação seja feito em conjunto, com a colaboração de todos. Temos um site que cada um pode acessar para contribuir com suas propostas. Vamos compilálas, sistematizá-las e elaborar uma matriz com convergência de ideias, para então formatar o Plano de Ação 2010/2012. Podemos considerar a inclusão digital como o principal foco de atuação da Ritla? Sem dúvida. Esse é um dos nossos mais importantes focos. Recorro mais uma vez à ONU, que, nos idos de 2003, reuniu praticamente todos os países do seu sistema em Genebra, na Cúpula Mundial da Sociedade da Informa-

14

Revista Linha Direta

ção (CMSI), cuja segunda rodada aconteceu em Túnis, em 2005. Da primeira reunião saíram dois importantes documentos: a Declaração de Princípios e o Plano de Ação, tendo a Ritla atuado (por convocação da União Internacional de Telecomunicações – UIT) no processo de movimentação e estímulo aos países da região da AL&C para participarem ativamente dos dois eventos. Organizamos uma das preparatórias no Rio de Janeiro, em 2003, e inserimos o tema da “exclusão digital” das pequenas e médias empresas em outra preparatória realizada anteriormente na República Dominicana. Em Genebra, fizemos a introdução do projeto Piraí Digital no circuito internacional, o qual tem sido apoiado pela Ritla desde seu início. Qual a finalidade desse projeto? Democratizar o acesso aos meios mais modernos de informação e

social sem passar pelo desenvolvimento da educação, da ciência, da tecnologia e da inovação. Eu considero que estamos muito aquém do que deveríamos. Entretanto, ao observarmos, em todas as classes sociais, este fenômeno espantoso da rápida absorção, por exemplo, dos telefones celulares, do acesso à internet, da multiplicação das Lan Houses por todo o país, da discussão sobre a acessibilidade barata ou grátis em banda larga, torno-me bastante otimista quanto ao futuro. Como funciona a parceria da Ritla com o Sebrae para essa capacitação? Além do trabalho que fizemos em 2003, no evento da Cúpula Mundial da Sociedade da Informação (CMSI), foi iniciativa nossa a aproximação do Sebrae com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a Rede Internacional

A educação precisa ser o esteio para o desenvolvimento da economia, da ciência, da tecnologia, da inovação... comunicação, gerando oportunidades de desenvolvimento econômico e social da população e ampliando os horizontes da cidade, inclusive atraindo novos negócios para a mesma. O acesso às novas tecnologias tem crescido no Brasil. Na sua opinião, como fica a qualificação das pessoas para o uso? Voltamos ao tema do início. Não há desenvolvimento econômico e

para as Pequenas e Médias Empresas (INSME). Tenho conversado com a Área Internacional do Sebrae, que também tem estado muito ativa aqui, no nosso continente, para avaliarmos propostas de ações de interesse comum com os países vizinhos. Decidimos convidar os países-membros e não membros da Ritla para participarem da construção do nosso Plano de Ação e consideramos que o Sebrae poderá contribuir muito para o aperfeiçoamento do Plano. ¢


gestão pública

Uma nova forma de gerenciar o ensino Secretária de Educação defende Programa de Gestão Educacional como estratégia para o desenvolvimento da educação “De 2005 para 2010, saímos de 3,3 para 3,7 no Ideb. É um resultado significativo”. O programa também propicia melhor desempenho dos alunos, maior integração entre escola, família e comunidade, maior comprometimento dos profissionais, inovações no processo de ensino-aprendizagem e eficiência nos processos de trabalho.

Norma Assis, secretária de educação

A

linhar os esforços de escolas, professores, pais e comunidade a fim de garantir uma aprendizagem significativa e uma educação de qualidade é o objetivo do Programa de Gestão Educacional (PGE). Já adotado por vários municípios brasileiros, esse modelo de gestão é uma iniciativa do Projecta – Melhor Escola. Em Santo Antônio de Jesus, na Bahia, o programa vem gerando bons resultados. A secretária de Educação do município, Norma Lúcia de Almeida Assis, credita o aumento da média do município no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) ao PGE.

42

Revista Linha Direta

Saiba mais sobre o assunto em entrevista com a secretária de Educação, que é licenciada em Matemática e pós-graduada em Gestão Educacional, trabalhou em sala de aula por 22 anos e já foi coordenadora e vice-diretora de escola. Por que implantar um programa de gestão educacional em Santo Antônio de Jesus? Quando cheguei à Secretaria de Educação, em 2005, a implantação de um programa de gestão integrada já fazia parte do meu planejamento estratégico. Os sistemas pedagógico e administrativo das escolas não podem se separar, precisávamos de um alinhamento. Com a aprovação do prefeito, busquei as ferramentas em Belo Horizonte, com o pessoal do Projecta. Começamos o trabalho, em 2006, com sete instituições que serviram

de modelo para traçarmos um diagnóstico e percebermos quais seriam as dificuldades para alinharmos as diretrizes da Secretaria com as escolas. Deu certo e, hoje, o PGE está em toda a rede. Falo que é como se fosse uma orquestra, pois há sintonia na educação como um todo. Diretor e coordenador são capacitados para serem os multiplicadores na escola. É preciso pensar grande e andar rápido. Se pensar pequeno, a educação não anda. Ela é o carro-chefe que leva o país pra frente. Para a senhora, o que falta à educação? Não podemos generalizar a situa­ ção no país. Mas precisamos de uma reforma universitária. Volto à universidade hoje e vejo a mesma linha de trabalho que vivenciei há muitos anos. Precisamos também de uma legislação menos burocrática na área pública, de um plano municipal de educação, de professores que sejam educadores, que se envolvam mais, que sejam mais comprometidos. Como o PGE mudou o cenário da educação no município? Com o sistema de gestão, percebemos as crianças vibrando, os profes-


sores mais estimulados com as ferramentas que foram chegando às mãos deles e os pais envolvidos. Isso porque há alinhamento das ações e integração entre a Secretaria, as escolas, os professores, os pais, os alunos e a comunidade. Antes, muitas crianças não frequentavam a escola. Agora, esse quadro mudou. Há monitoramento, tanto por parte dos professores como por parte dos alunos, que foram se conscientizando da importância da presença. Que tipo de ferramentas são essas? O monitoramento da frequência, as pesquisas de satisfação, o acompanhamento das metas pela Secretaria de Educação, entre outras para alinhar os sistemas administrativo e pedagógico das escolas. Os pais, por exemplo, começaram a se sentir acolhidos, perceberam a organização, o planejamento, estão participando das atividades, dando sugestões, questionando, criticando e sempre têm retorno da instituição. As reuniões de pais agora não são apenas para falar de notas, de avaliação, de disciplina. É para informar e formar os pais para pensarem na educação como um todo. Outra ferramenta é o reconhecimento ao aluno, ao professor, ao diretor, à merendeira, ao porteiro, à comunidade, aos pais. Temos dado muito enfoque à capacitação de todos os profissionais da educação. São 560 horas/ano de capacitação em todas as áreas. Qual a influência do programa de gestão? O programa de gestão possibilita disciplina, planejamento e a oportunidade de acolher bem alunos, famílias e comunidade. Hoje, a escola trabalha com fatos e dados. As notas têm significados. Existe um

painel de desempenho dos alunos e os pais podem acompanhar. O PGE atinge todos, do porteiro ao diretor. Muda a postura das pessoas. Toda escola deveria adotar, pois ele tem ferramentas fáceis de aplicar e não é necessário um investimento alto para implementar. O município também buscou avaliação externa, como o Paerp e a Prova Brasil. Com isso, foi traçado o cenário de cada escola, e elas puderam elaborar um plano de melhoramento, trabalhando em cima daquilo que precisa ser melhorado.

tecnologias de informação). Queremos um aluno que consiga ler, escrever, compreender o que acontece no mundo contemporâneo e ser crítico. Queremos uma educação com mais objetivos e menos filosofia. Mas depende muito do professor. Por isso, investimos tanto em capacitação. Hoje, temos 523 professores em 45 escolas municipais. Desses, 450 são graduados. Mas sabemos que a graduação não basta. Não é ela que vai mudar a escola.

E o que precisa ser melhorado?

Para melhorar o ensino e a aprendizagem, é preciso um professor bem preparado, que saiba articular teoria e prática, pois é isso que gera resultados. E levamos isso pra sala de aula através das metas estabelecidas pelo PGE. É preciso que o professor sinta o interesse do aluno e planeje para agir de forma responsável. Mais uma vez falo de compromisso. Falta comprometimento ao ensino brasileiro. Não há salário que modifique a educação no Brasil. É preciso fazer com que meu aluno tenha interesse pela aula. Toda entrevista que dou, falo de uma professora, a Zuleika, pois foi com ela que aprendi a gostar de matemática. Houve um laço afetivo. O afastamento do professor causa baixo rendimento dos alunos.

A leitura, a escrita, a compreensão. O PGE nos dá condições de fazer isso, porque há disciplina, há metas a serem cumpridas. É preciso buscar resultados com significado, porque, caso contrário, não adianta nenhuma avaliação. Quais são os resultados do município no Ideb? Os resultados são muito bons. De 2005 para 2010, saímos de 3,3 para 3,7 no Ideb. É um resultado significativo. Superamos a média do estado, de 2,6, e da região Nordeste, que ficou com 3,5. Isso foi possível graças às metas que estabelecemos a partir do PGE. Quais são essas metas? A leitura, a escrita, a compreensão de textos, os cálculos e a resolução de problemas, que não são apenas os matemáticos, são os das situações da vida. Como o foco é aprendizagem, das 15 metas existentes, estamos priorizando as sete primeiras, que são as de aprendizagem (ler, escrever, expressar-se oralmente, calcular, resolver problemas, agir proativamente, usar as

O que é preciso?

Bom, eu defendo o PGE. Acredito nele e tenho resultados para mostrar. Nada está pronto na educação. Estamos aprendendo. Mas já vêm acontecendo muitas mudanças. É preciso consolidá-las. Esperamos avançar cada vez mais, não só em números, mas que as pessoas pensem a educação de forma diferente. É preciso ter humildade, curiosidade, para buscar o saber. ¢ www.projecta.edu.br Revista Linha Direta

43


contexto

A formação humana em primeiro lugar Para Amábile Pacios, presidente do Sinepe/DF, há perspectivas promissoras para a educação

M

Arquivo pessoal

otivada por poder contribuir com a formação humana e profissional das pessoas, Amábile Pacios, hoje presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Distrito Federal (Sinepe/ DF), fala, em entrevista à Linha Direta, sobre o desafio de ampliar e aprimorar o ensino privado em Brasília. O Sindicato, como representante legal das escolas particulares que atendem da Educação Infantil ao Ensino Médio, luta pela excelência da educação.

Amábile Pacios, presidente do Sinepe/DF

46

Revista Linha Direta

Há anos se dedicando à área, a professora Amábile, que está em sua segunda gestão no Sindicato, é graduada em Física, com licenciatura pela Universidade de São Paulo, e em Matemática, com bacharelado e licenciatura pela Faculdade Paulista de Ciências e Letras. É, também, mestre em Física pela PUC-SP e doutora em Gestão na Era do Conhecimento pela Universidade Latino-Americana e do Caribe. Atualmente, além da presidência

do Sinepe/DF, dirige a Dromos Educação e Cultura. Como começou sua trajetória como educadora? Comecei em sala de aula, a melhor forma de se começar a trabalhar com educação. Mas fiz um caminho inverso. Comecei primeiro no Ensino Superior, a partir de um concurso que fiz na PUC de São Paulo. Depois, tive contato com o Ensino Básico e lecionei em todos os segmentos. Também atuei como coordenadora e diretora para, depois, tornar-me empresária. Qual o maior aprendizado nesse tempo de sala de aula? Que a construção da pessoa é o projeto mais apaixonante que se pode ter na vida. Há quanto tempo a senhora está à frente do Sindicato? Estou há sete anos colaborando com o desenvolvimento do setor em Brasília.


E qual tem sido o foco do trabalho desenvolvido? Com o caminhar, mudamos o foco. Iniciamos com o objetivo de organizar o Sinepe frente aos novos desafios do setor. Hoje, trabalhamos duro para prestar o melhor serviço aos filiados, seja na capacitação dos gestores ou de seu quadro de profissionais, seja na participação junto aos demais setores econômicos em defesa do ensino particular. Quais desafios o Sindicato tem pela frente? O maior desafio é fazer a categoria crescer, no que diz respeito

tam o acompanhamento por parte do gestor, dando a ele mais tempo para se dedicar ao cotidiano do processo escolar. Quais diferenciais a escola dos novos tempos deve apresentar? O diferencial, hoje, está voltado para o lado humanístico, para a introdução de conceitos como Responsabilidade Socioambiental, por exemplo. Houve época em que os diferenciais estavam voltados para o acesso à tecnologia e para os equipamentos que as escolas podiam oferecer. Vencido esse tempo e incorporadas essas tecnologias no processo educacional, podemos nos

Na sua opinião, quais são as perspectivas da educação particular no Brasil? Acredito no setor porque invisto tempo e dinheiro. Avançamos na proposta de nação que necessariamente terá que educar e qualificar sua população para manter-se em crescimento. Observamos o aparecimento da nova classe média, cujo maior sonho é manter seus filhos estudando no setor particular. Logo, as perspectivas são promissoras para aqueles que souberem fazer a leitura dos tempos. ¢ www.sinepe-df.org

... as perspectivas são promissoras para aqueles que souberem fazer a leitura dos tempos. à capacitação dos gestores. Em Brasília, temos investido em relação às novas tecnologias aplicadas à gestão. Há dois anos, o Sindicato tem um convênio com o Sebrae para essa capacitação. Com isso, pretendemos unir a categoria e dar a Brasília um ensino particular mais amplo e de melhor qualidade. Como a senhora avalia a importância da gestão para o sucesso das escolas? Quando o gestor está presente, ele coloca a sua forma, o seu jeito, e isso é muito importante. Eu sempre digo que escola é como leite: se você não olha, ferve e derrama. Porém, podemos contar com instrumentos que facili-

dedicar ao projeto de formação da pessoa de forma individual. A sociedade nos pede esse tratamento, por exemplo, quando necessita de uma escola inclusiva. Como a senhora avalia o cenário da educação no Distrito Federal? Brasília é uma cidade moderna, jovem e em crescimento. O governo local tem a possibilidade de investir no setor público, e o setor privado tem a sua participação de forma efetiva em todos os segmentos. Com alguns acertos na interface com o governo, considero muito promissor o cenário para investimentos. No tocante ao processo educacional, temos vários desafios a vencer para tornar a cidade um referencial. Revista Linha Direta

47


pró-texto

Entre o sim e o não, existe um vão! Educação Superior Particular em debate no III Congresso Brasileiro da Educação Maria Carmem Tavares Christóvam*

O

panorama do III Congresso Brasileiro da Educação Superior Particular parecia-me diferente dos anteriores desde o momento em que li a programação. Realizado no período de 15 a 17 de abril, em Florianópolis, o tema central do evento foi discutir a participação do setor privado na construção do Plano Nacional de Educação 2011/2020. Como nos congressos anteriores, o local abrigava muitos mantenedores, diretores, políticos e pesquisadores da área. Havia uma inquietação, uma determinação interna em cada um de nós para que saíssemos do encontro com ações palpáveis para os enfrentamentos necessários, diante da insatisfação generalizada com as atuais políticas públicas propostas pelo Ministério da Educação. Ao longo do evento, percebi que os presentes teriam uma visão privile-

68

Revista Linha Direta

giada dos problemas de regulação, supervisão e avaliação do Ensino Superior particular, pois bebiam de muitas fontes e, assim, valorizavam a manifestação do discurso de cada um dos presentes. Nesses espaços de reflexão, é preciso lançar novos pontos de vista, que vão além do senso comum, o que fizeram, brilhantemente, vários dos palestrantes. Os discursos nos remetiam sempre à ideia de sermos realmente protagonis­ tas na elaboração das reflexões contemporâneas sobre as políticas que impactam diretamente a trajetória de cada uma das IES privadas. E assim foi. Ganha­mos força nesse cenário. Voltamos para as nossas institui­ções mais confiantes no fato de que precisamos ser ouvidos, pois representamos, no cenário da educação brasileira, 75% do mercado educacional. Não há como negar a importância do setor privado.

Ao chegar a São Paulo, o Dr. Gabriel Mario Rodrigues, presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (ABMES), escreveu a todos os participantes do Congresso, dizendo: “Pela experiência de participação em incontáveis congressos, sei que, passados aqueles momentos de atenção e de envolvimento com os temas ouvidos e discutidos, todos, ao voltarem para as suas bases, retornam às infindáveis tarefas do dia a dia, e o urgente ganha lugar ao que foi imaginado. Penso que deveríamos refletir sobre as propostas da Carta de Florianópolis [veja páginas 70 e 71] e ver quais os pontos que deveriam ser focados para direcionamento de um Plano de Trabalho para o Fórum realizar”. Imediatamente, sugeri a criação de um espaço interativo no qual os participantes e interessados


Fotos: Arquivo Totvs

pudessem discutir as questões e determinar ações que contribuíssem com os nossos inte­ resses. Há uma revolução silenciosa nas redes sociais, e esses meios estão aí, disponíveis a todos nós. Parafraseando o professor Celso Bodsteim, doutor em Comunicação e Mídias Digitais pela Unicamp e coordenador do Núcleo de Artes e Áudio Visual da Panamericana – Faculdade de Arte e Design –, Entre o sim e o não, existe um vão (refrão de sua música preferida). Ou seja, saímos do SIM, onde éramos agentes passivos, passamos pelo VÃO e nos apropriamos do NÃO, negando o modelo de regulação, supervisão e avaliação a nós imposto pelo MEC. Não foi necessário mais de um dia para que a ABMES criasse o Fórum Acadêmico Educação Superior Particular – III Congresso Brasileiro e obtivesse a adesão de centenas de mantenedores, diretores e interessados. Um canal para reflexão, denúncias, descontentamentos e reflexões que servirá de base para nossas ações. No dia 30 de abril, lancei uma pergunta: Quais pontos devem ser focados para direcionamento de um plano de trabalho para o Fórum realizar? Recebemos diversas sugestões e tentarei aqui compilar todas as ideias. Quero ressaltar a participação ativa de Thiago Francisco,

coordenador da Comissão Própria de Avaliação (CPA) da Facierc, Faculdade de Ciências Econômicas da Região Carbonífera, em Santa Catarina. Sua contribuição objetivou proporcionar informações que construam uma rede de rela­cionamentos ativos no âmbito das associações representativas, mantidas, mantenedoras e educadores, fazendo com que as IES possam interagir não apenas na busca por solução de seus pro­ blemas, mas sim, de modo ativo, na construção de uma identidade participativa nesse contexto.

nos próximos dez anos, especificamente em relação à possibilidade das agências reguladoras para o Ensino Superior privado por meio do novo Plano Nacional de Educação. Desse modo, as instituições representativas do Ensino Superior poderão construir um modelo que sirva de orientação às demais agências reguladoras que poderiam surgir a partir desta nova perspectiva.

• Perseverar na busca de mecanismos de financiamento estudantil, bem como no financiamento para a IES que se encontra em dificuldade financeira.

• Pesquisa e desenvolvimento de uma sugestão de “Roteiro de Autoavaliação Institucional”, considerando as solicitações do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes). Em função da abrangência do documento, as instituições representativas poderiam construir documentos orientadores de acordo com a identidade de cada IES (faculdades isoladas, centros universitários, universidades), levantando indicadores e meto­ dologias alicerçadas nas dimensões do Sinaes. Ao mesmo tempo, buscar uma posição dialógica junto à Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes), no sentido de conscientizar que os documentos e práticas de avaliação devem respeitar a identidade das IES.

• Estudar, em conjunto com as IES associadas, as perspectivas para o Ensino Superior privado

• Desenvolvimento de novos instrumentos do Conceito Preliminar de Curso (CPC) e, conse-

Em linhas gerais, além de todas as definições já relatadas na Carta de Florianópolis, o que as insti­ tuições representativas pode­riam criar junto às IES associadas? • Aprimorar a busca constante por uma posição dialógica entre os órgãos competentes/ MEC e as IES. • Contribuir com as políticas de avaliação, conscientizando os órgãos competentes das diferenças entre as IES e o tratamento devido a cada uma delas.

Revista Linha Direta

69


quentemente, do Índice Gera­l de Cursos (IGC) das IES a serem propostos ao MEC, que corres­ pondam à realidade da educação particular. A partir daí, ela­borar ações práticas orientadoras que promovam a capacitação das IES para utilização des­ses instrumentos. Nesse caso, haveria a possibilidade de estudar o perfil das associadas e traba­ lhar de modo a oferecer meto­ dologias únicas à identidade das IES, auxiliando seus gestores na compreensão dos indicadores necessários ao desenvolvi­mento desses aspectos. • Promover a construção de uma reflexão permanente sobre o Exame Nacional de Desempe­ nho de Estudantes (Enade), com o auxílio de professores, em posição dialógica com o Inep. A partir daí, promover ações

FÓRUM

de preparação das IES, com coordenadores de comissões de avaliação, dirigentes e docentes, antecipando os indicadores necessários à melhoria e o pleno desempenho dessas IES. • Criar uma comissão que atue no âmbito das pesquisas peda­ gógicas, auxiliando os coordenadores pedagógicos das IES na busca por indicadores de capa­ citação e qualificação pedagógica das instituições e dos cursos de graduação e especialização. • Estudo dos principais indicadores do Censo no âmbito de cada IES, levantando os pontos específicos e relevantes a todas as associadas. • Colocar, à disposição das associadas, núcleos de pesquisa e desenvolvimento que auxi­

Vive‐se ainda um Brasil de dualidade na educação: de um lado, há uma parcela da sociedade brasileira que já ingressou na chamada Sociedade do Conhecimento e, de outro, persistem diferenciais de acesso à educação, que estão a indicar a urgente necessidade de inclusão social neste campo. Nesse contexto, a educação superior particular se consoRevista Linha Direta

Sinto que precisamos elaborar um pouco mais nossas reflexões para entender o momento ímpar que vivemos. Na academia, procuramos analisar os fatos, perseguir as soluções através de métodos cientificamente comprovados. Mas acredito na força de um grupo e no avatar de Barack Obama: Yes, We Can! Participe do Fórum Acadêmico: http://groups.google.com/group/ forum-academico/ ¢ *Professora, administradora do Fórum Acadêmico, consultora da Linha Direta para o Ensino Superior e diretora da Gênesis Consultoria Educacional www.genesisedu.com.br

Carta de Florianópolis

O III Congresso Brasileiro da Educação Superior Particular – O Setor Privado como Ator e Parceiro na Construção do Plano Nacional de Educação (PNE) 2011‐2020 – foi uma excelente oportunidade para uma reflexão sobre a importância e o papel que o setor exerce em todo o território nacional, os desafios enfrentados e as alternativas a seguir para a sua consolidação.

70

liem no desenvolvimento das atividades internas das IES.

lida, cada vez mais, como força viva e atuante e com um papel de relevo na geração e difusão do conhecimento. O Congresso encerrou‐se com a decisão de transformar seus resultados na denominada Carta de Florianópolis, tendo como foco oferecer à sociedade (governo e Congresso Nacional) subsídios para a elaboração do Plano Nacional de Educação (PNE) 2011/2020. Assim, os dirigentes do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular, considerando as reflexões, debates e conclusões do Congresso, expressam os seguintes compromissos e expectativas:


• Lutar pelos direitos assegurados pela Constituição Federal, especialmente os identificados com a livre iniciativa na oferta do ensino, com o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas e com a coexistência de instituições de ensino públicas e privadas. • Assumir o compromisso de trabalhar intensamente na construção e na execução do Plano Nacional de Educação (PNE) 2011‐2020. • Apoiar e diligenciar para se alcançar, no perío­do 2011‐2020, a meta de inclusão de 50% dos jovens, com idade entre 18 e 24 anos, em cursos superiores. Isso significa colocar mais de 12 milhões de estudantes oriundos desta faixa populacional no Ensino Superior. • Desenvolver, em parceria com o governo federal, por meio de incentivos integrados e conjuntos, um Programa de Apoio aos Jovens oriundos das classes de renda “C”, “D” e “E”, que apresentem condições de frequentar o Ensino Superior. • Sugerir uma política de formação superior capaz de integrar a academia, o governo e as empresas, com a participação do Ministério da Educação (MEC), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Ministério da Justiça (MJ), Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), dentre outros. • Propor a criação de um sólido programa para melhor inserção de tecnólogos nas diferentes atividades produtivas, visando eliminar os preconceitos e as barreiras culturais, ampliando o mercado de trabalho e fortalecendo o desenvolvimento nacional. • Reafirmar a incompatibilidade de um modelo único de instituição de Ensino Superior com a pluralidade, a heterogeneidade e as dimensões continentais do sistema educacional brasileiro. • Insistir na reestruturação dos critérios de acesso às linhas de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, para que, efetivamente, possam ser utilizadas pelas instituições com maior necessidade.

• Enfatizar o direito do Poder Público de desenvolver processos de regulação e de avaliação que respeitem a diversidade e a heterogeneidade do sistema educacional brasileiro, com base nos princípios previstos no artigo 37 da Constituição Federal, na Lei n.º 9.784/99 e na Lei do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes). • Ampliar o acesso ao Fundo de Apoio ao Estudante de Ensino Superior (Fies) mediante a participação do segmento particular de Ensino Superior na criação, com o governo federal, do fundo garantidor de financiamentos concedidos. • Colaborar para a discussão e difusão de novos métodos de educação, baseados na flexibilidade e na utilização de modernos meios de ensino-aprendizagem, compatíveis com os avanços tecnológicos já obtidos no mundo contemporâneo, buscando agilidade e ousadia para incorporar novos modelos acadêmicos. • Criar, na mídia, um amplo programa de divulgação da importância e do papel do Ensino Superior particular no desenvolvimento da educação no Brasil. Os dirigentes do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular selam este pacto, assinando o presente documento, que será enviado a todas as autoridades governamentais e aos representantes constituídos da sociedade brasileira. Florianópolis, 17 de abril de 2010. Abib Salim Cury Presidente da Anup Paulo Antonio Gomes Cardim Presidente da Anaceu Gabriel Mario Rodrigues Presidente da Abmes Hermes Ferreira Figueiredo Presidente do Semesp José Janguiê Bezerra Diniz Presidente da Abrafi Revista Linha Direta

71


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.