LONA - Edição nº 994

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Laboratório da Notícia - issuu.com/lonaup

Crédito: Damon Cazares (Wired Magazine)

Ano XV > Edição 994 > Curitiba, 24 de novembro de 2016

O segredo dos campeões de memória O que faz algumas pessoas conquistarem resultados recordes de memorização em competições do mundo inteiro

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COLUNISTAS

EDITORIAL “O que acontece é que por mais que o Brasil afirme aceitar todas as religiões, aquelas que não fazem parte da maioria, leia-se católica ou evangélica, passam por discriminação e velada, ou seja, há no imaginário popular que aqui tudo se aceita e tudo se respeita.”

Foto: André Luiz Moraes

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À espera de obras, viaduto do Orleans enfrenta trânsito caótico

A ligação entre os bairros São Bráz e Campo Comprido aguarda providências a partir de um projeto de revitalização feito pelo IPPUC p. 3

CRIAÇÃO COM APEGO “Para falar de Criação com Apego é necessário falar de empatia, e, ouso tentar defini-la como um método que atende às necessidades da criança de confiança, empatia e afeição.” p. 6

Rodrigo Silva “Greca teve 53,25% dos votos, contra 46,75% do atual deputado estadual Ney Leprevost (PSD). Durante todo o segundo turno, as pesquisas colocaram o candidato do PMN numericamente atrás de Leprevost, mas sempre em empate técnico.” p. 7 Elizabet Letielas e Thaynara Oliveira “Para criar e consolidar de vez uma cultura de moda em Curitiba, são necessárias diversas pequenas ações, que vão muito além do comprar e vender, mas sim de valorizar aquilo que ninp. 7 guém pode nos roubar.”


LONA > Edição 994 > Curitiba, 24 de novembro de 2016

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EDITORIAL

COMPORTAMENTO

O laiscismo teórico

Casos que mostram que o preconceito continua marcante

O Brasil abriga mais de 30 religiões hoje, fora as seitas e as religiões não declaradas no Censo de 2010. Há uma variedade de crenças, fés, cultos, orações e venerações que chega a ser impossível contar devido à grande quantidade de formatos para expressar a ideologia religiosa (ou a falta dela). O Brasil é um Estado laico, mas toda e qualquer religião é bem-vinda. Pelo menos na teoria, todas as religiões são acolhidas e respeitas.

Ana Beatriz e Paulo Sauandaj

O Enem 2016 surpreendeu ao tocar em um assunto um tanto quanto progressista: “Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil”. Então, se o Brasil respeita e aceita todas as religiões e o Exame Nacional do Ensino Médio busca uma proposta de intervenção para combater a intolerância religiosa, o que há de errado? O que acontece é que por mais que o Brasil afirme aceitar todas as religiões, aquelas que não fazem parte da maioria, leia-se católica ou evangélica, passam por discriminação velada. Há no imaginário popular que aqui tudo se aceita e tudo se respeita. Apesar de convivermos com pessoas de descendência e, consequentemente, crenças diferentes, religiões como, por exemplo, a Umbanda e o Candomblé, com raízes africanas, ainda passam por preconceito forte e muitas vezes não percebido por parte daqueles que não pertencem a esse grupo social. As situações são as mais diversas, como estereotipar roupas e falas, ligar pessoas que frequentam tais espaços como “do mal” ou “do capeta” ou ignorar datas importantes para os fiéis dessas crenças, privilegiando os fiéis das religiões “de maiorias”.

Religião, sexo, classe social, etnia, idade, deficiência; inúmeras são as condições. Apesar da discriminação ser um tema tão discutido, os dados não mentem. Um exemplo vem da questão de gênero: no Brasil, o nível de ocupação das mulheres no mercado de trabalho é inferior ao dos homens, com 45,4% no ano de 2014 – o percentual é de 62,6% para o sexo masculino. A própria palavra explica: um préconceito, sem fundamentos reais, é apenas uma primeira impressão. De cada cinco pessoas entrevistadas pela reportagem no dia 25 de maio deste ano, no centro de Curitiba, quatro afirmaram ter sofrido algum tipo de preconceito. Lucas Breno, 20 anos, membro da organização Greenpeace, compartilhou sua triste experiência: foi agredido fisicamente pelo tio ao vê-lo com o namorado, deixando uma cicatriz em sua perna. Lucas afirma já ter sofrido, também, discriminação racial. Vaishanavi Vrinda Devi Dasi, de 19 anos, é adepta à religião e filo-

sofia Hare Krishna. Ela conta que, uma vez, foi perseguida por uma mulher, que lhe dizia “Vocês são do diabo, você vai para o inferno!”. Vaishanavi diz que, de uma forma geral, sofre mais preconceito dos cristãos. O depoimento de Giovani Santos de Paula, de 19 anos, também sensibiliza. Ele afirma ter sido vítima de preconceito muitas vezes. Portador de deficiência física e cadeirante, Giovani já precisou ser carregado por seus amigos em um shopping porque o uso do elevador não lhe foi permitido. A carteirinha que atesta sua deficiência, inclusive, deve estar sempre com ele, pois muitas pessoas desconfiam de sua condição: “Acham que eu estou fingindo”, comenta.

Raízes do preconceito A socióloga e psicóloga Mayla Pires afirma que o preconceito é, na maioria das vezes, resultado de atitudes coletivas de discriminação. “Estão jogando ricos contra pobres, brancos contra negros,

homossexuais contra heterossexuais. Isso tudo por guerras políticas, e quem acaba pagando é a sociedade, sem se dar conta”, diz Mayla. Ela acredita que o preconceito está atrelado à política, já que esta pode mobilizar as pessoas contra o que é diferente de seus preceitos. Para a psicóloga, sempre haverá discriminação, pois é natural do ser humano: “Até para um relacionamento as pessoas escolhem, geralmente, aquele que pode lhe gerar melhor prole, com as melhores características, ou seja, não escolhem o mais feio ou gordo”, enumera, utilizando como referência a teoria do Darwinismo Social – corrente inspirada nos estudos do naturalista inglês Charles Darwin, que determina a superioridade evolutiva de algumas espécies. “O preconceito só deixará de existir quando as pessoas se derem conta de que inferioridade e superioridade não existem; existem as diferenças”, observa Mayla. “O mínimo a se fazer é respeitar o outro”.

Ainda não chegamos ao Estado laico de fato, e continuaremos retrocedendo enquanto houver uma bancada religiosa que não representa todas as vertentes e todos os segmentos de pensamentos em relação ao tema, pois apenas uma religião/um segmento será priorizado porque, afinal, apenas aquele ponto de vista estará sendo defendido.

Crédito: Désirée Fawn - Unsplash

EXPEDIENTE

Em tempos de conservadorismo crescente e dominante, devemos acreditar que a prova de redação do Enem foi uma forma de dar voz aos estudantes de Ensino Médio – esses que serão o futuro do Brasil –, poderá estar no simples fato de que todas as vozes dissidentes ou não deverão ter espaço e esse espaço só se conquista quando o Estado aplica na prática aquilo que a teoria já defende há tempos.

Reitor José Pio Martins Vice-Reitor e Pró-Reitor de Administração Arno Gnoatto Diretor da Escola de Comunicação e Negócios Rogério Mainardes

Pró-Reitora Acadêmica Carlos Longo Coordenadora do Curso de Jornalismo Maria Zaclis Veiga Ferreira Professora-orientadora Katia Brembatti

Projeto Gráfico Gabrielle Hartmann Grimm Diagramação Fernanda Umlauf Edição Ana Clara Faria


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INFRAESTRUTURA

Ainda não há data prevista para obras no viaduto do Orleans Mesmo após estudo de melhorias apresentado na Câmara Municipal pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba, o Ippuc, a situação em um dos pontos mais movimentados da cidade continua a mesma: trânsito pesado e descaso André Luiz Moraes e Guilherme Coimbra

começou a trabalhar no local, colisões também são frequentes no viaduto: “Acidentes sempre acontecem por aqui. É complicado, pois não há semáforos para pedestres e as faixas para travessia estão mal pintadas. Outro dia, aconteceu um atropelamento com um ciclista. Fiscalização quase não há, e nenhuma medida foi tomada até hoje para melhorar”, afirma o comerciante. Dhioni Eber, morador da região, vende bombons no semáforo do viaduto há um mês. Segundo ele, o problema está também nas vias estreitas. “Muitas vezes veículos de grande porte, como ônibus e caminhões, param no meio da rua e isso complica ainda mais”, conta.

A comunidade dá alternativa

Vista do viaduto do Orleans congestionado em horário de pico - Crédito: André Luiz Moraes

O viaduto do Orleans, que leva o nome do bairro localizado na região noroeste da capital paranaense, liga dois dos principais bairros de Curitiba: São Braz e Campo Comprido. Com 81 metros de comprimento, o viaduto é a continuação da Avenida Vereador Toaldo Túlio, cruza a Rodovia Curitiba-Ponta Grossa e segue como Rua Professor João Falarz. O local convive com engarrafamentos quilométricos diariamente. Na tentativa de resolver a situação, o presidente do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), Sérgio Póvoa Pires, apresentou em março à Câmara Municipal de Curitiba três estudos com possíveis melhorias para o trânsito no viaduto. O vereador Mauro Ignácio (PSB), um dos representantes do projeto na Câmara, afirma ter insistido com o Ippucpara que fizessem estudos de melhoria para o viaduto. Após anos de espera, o instituto apresentou três cenários: o primeiro é uma duplica-

ção, ou seja, a implantação de mais uma pista no viaduto, com a despesa aproximada de R$ 3 milhões. O segundo cenário implica a implantação de mais três pistas, com um custo que gira em torno de R$ 13 milhões. E o terceiro cenário, considerado ideal pelo IPPUC, no valor de R$ 23 milhões – mas que ainda exige, segundo Ignácio, a elaboração de um projeto para alocar os recursos e, assim, dar início às obras. O atraso na obra, segundo vereador, deve-se à crise financeira. O valor orçado somente para fazer o projeto tem estimativa de R$ 300 mil. “Estamos tentando uma articulação com o governo do estado para conseguir verba para o projeto e, então, para execução da obra. Essa é situação em que estamos agora”, diz Ignácio. Além de ser a principal ligação entre esses três bairros – que totalizam aproximadamente 60 mil habitantes –, existe um forte comércio na região

“A proposta da Conseg, que seria reforçar os pavimentos das ruas laterais que são subutilizadas para passagens de veículos mais pesados, custaria aproximadamente R$ 1,6 milhão” do viaduto. No bairro Orleans há 145 indústrias, 414 comércios e 289 prestadores de serviços. No São Braz, esses números dobram para 276 indústrias, 990 comércios e 730 prestadores de serviços. Segundo o comerciante da região Edson Santos, que há três anos vende espetinhos em frente ao cruzamento da Avenida Toaldo Túlio com a BR-277, as enormes filas de congestionamento são diárias e pioram em dias de chuva. Santos diz que, desde que

Fernando Linhares, membro do Conselho Comunitário de Segurança do São Braz (CONSEG), fez um projeto para melhorar o tráfego no viaduto do Orleans. O estudo considera as condições financeiras pelo qual o país atravessa e adota uma solução menos duradoura, mas eficaz até que uma medida mais complexa seja tomada. “A solução proposta para o Ippuc de construir um novo viaduto, duplicado e com alças de acesso, teria um custo aproximado de R$ 30 milhões, pois, além disso, implicaria também a compra e desapropriação de terrenos ao redor”, comenta Linhares. “A proposta da Conseg, que seria reforçar os pavimentos das ruas laterais que são subutilizadas para passagens de veículos mais pesados, custaria aproximadamente R$ 1,6 milhão”. A melhoria teria duração de sete anos, o que poderia dar mais tempo para a prefeitura conseguir verba para a construção do projeto definitivo ao longo desse período”, observa Linhares.


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NEUROCIÊNCIA

Quando o treinamento da memória leva ao topo do pódio Ana Clara Faria

Campeões em memorização revelam seus segredos para alcançar resultados extraordinários

mórias notáveis colocadas à prova nos últimos anos – afirmam que essa habilidade é, apenas, uma questão de prática.

Nossa memória falha. Muitas vezes, mal nos lembramos do que comemos em nossa última refeição. Por vezes precisamos aprender, também, a lidar com os famosos “brancos” que aparecem – injustamente – nos momentos mais cruciais. Para algumas pessoas, no entanto, esses desafios cotidianos são mínimos se comparados com o que são capazes: elas memorizam, em poucos segundos, a ordem de 52 cartas de um baralho, ou centenas de números, nomes e rostos. Apesar dos resultados aparentemente inalcançáveis para pessoas de memória mediana, dois entrevistados – de me-

Dos estudos para os torneios O estudante norte-americano Alex Mullen, de 24 anos, tem vários recordes para guardar na memória (com trocadilho). Com um primeiro lugar conquistado no campeonato nacional dos Estados Unidos – 2016 USA Memory Championship –, do qual participou em maio deste ano, Mullen é, também, o primeiro estadunidense a vencer o Campeonato Mundial de Memória – World Memory Championship –, em 2015. Antes dele, o mais alto posto conquistado por um norte-americano no ranking mundial pertencia a Nelson Dellis. Além disso, o nome de Mullen está, at u a l m e nte, registrado no Guinness World Records por sua capacidade de memorizar a maior quantidade de números em uma hora: 3029 dígitos. Juntamente com o mundial, o estudante coleciona mais oito recordes nacionais, que envolvem memorização de cartas do baralho, números, imagens, nomes e rostos.

Alex Mullen segura o troféu de campeão mundial no World Memory Championship - Crédito: Brad Zupp

Apesar dos resultados extraordinários, Mullen começou seu treinamento em memorização há não muito

tempo: em 2013, aos 21 anos, ele assistiu a um vídeo na internet de uma palestra ministrada por Joshua Foer, campeão do USA Memory Championship de 2005. Interessando-se pelo assunto, Mullen começou a pesquisar sobre as técnicas mnemônicas usualmente utilizadas em campeonatos desse gênero. Os resultados, segundo ele, vieram rápido: “Do ponto de vista de um competidor, eu estive apto para conseguir bons resultados no primeiro ano [de treinamento]. Como um utilizador geral das técnicas, percebi uma incrível melhoria quase que imediatamente”, conta. Mullen conquistou seu primeiro título em março de 2014, quando alcançou o segundo lugar no USA Memory Championship. Graduado em Engenharia Biomédica e Matemática e Estatística Aplicada, Mullen atualmente cursa Medicina na Universidade de Mississippi, em Oxford. As técnicas de memorização, além de lhe renderem conquistas notáveis em torneios, também o auxiliam nos estudos – graças aos métodos, Mullen pode memorizar facilmente conteúdos acadêmicos, discursos, nomes de pessoas que conhece, entre outras habilidades. Ele afirma que ter uma memória extraordinária não tem contraindicações: “Eu realmente não vejo quaisquer d e s va nt a g e n s ou responsabilidades extras, além de sentir que você não consegue nunca esquecer um nome ou rosto”, conta Mullen.

Memory Championship. Também consultor, palestrante, ativista e alpinista. O norte-americano Nelson Dellis, de 32 anos, tinha uma memória mediana até que um acontecimento pessoal o motivou a treinar suas habilidades mnemônicas: após a morte de sua avó por Alzheimer, em 2009, ele buscou aprofundamento nessa área para garantir sua saúde mental a longo prazo. Dellis destaca que esses métodos de memorização, bem como a capacidade de expansão da memória, são acessíveis a qualquer pessoa: “As técnicas são, na verdade, coisas que todos nós podemos fazer. Uma memória poderosa é algo que é latente dentro de todos nós; você apenas precisa aprender de que maneira ela funciona melhor e as técnicas para expandi-la”, diz. Hoje, Dellis dá palestras sobre memória com enfoque em ambientes corporativos e realiza, também, trabalhos sociais. A ONG Climb for Memory, fundada por ele, tem o objetivo de levantar fundos para o desenvolvimento de pesquisas sobre a Doença

Escalada até o topo Quatro vezes campeão do USA

Os competidores Nelson Dellis (esquerda) e Alex Mullen (direita) se cumprimentam durante o “USA Memory Cham


Curitiba, 24 de novembro de 2016 > Edição 994 > LONA

de Alzheimer organizando escaladas em montanhas pelo mundo. Dellis, inclusive, é alpinista – quando concedeu a entrevista, ele havia acabado de voltar de uma viagem ao Nepal. “Eu recentemente tenho colocado toda minha energia na escalada do monte Everest”, ele conta, lembrando, porém, que continua participando dos campeonatos de memorização. “Organizei uma competição em San Diego, chamada Torneio Extremo de Memória (Extreme Memory Tournament)”, comenta.

Técnicas Uma das técnicas de memorização utilizadas por Mullen e Dellis – e por outros recordistas internacionais – tem suas origens na Grécia Antiga: o “palácio mental” (em inglês, “memory palace”) tem sido uma ferramenta eficaz ao longo da história, e consiste no estabelecimento de relações entre números, nomes ou palavras com memórias visuais de locais conhecidos – como cômodos de uma casa. “A ideia básica é usar o que você está memorizando – como uma lista de compras, por exemplo –, transformar cada item em uma imagem memorável em sua mente e então colocá-los ao longo de um caminho através de um palácio mental – pode ser qualquer lugar que você conheça bem: sua casa, apartamento, escritório, parque favorito etc.”, expli-

mpionship” de 2014 - Crédito: Divulgação/USA Memory Championship

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ca Dellis. “É a mais poderosa [técnica] porque ela se apropria de duas coisas em que nossos cérebros são surpreendentes: visualização e informação espacial”, analisa. Derivado do “palácio mental”, o major system (“sistema principal”, em tradução livre) é um método que, através da relação entre códigos e imagens, é adequado em memorizações mais complexas. É através da aplicação dessas técnicas em conjunto que Dellis consegue, por exemplo, memorizar mais de 250 palavras em quinze minutos, da mesma forma que Mullen memoriza a ordem de todas as cartas de um baralho em apenas 18,65 segundos – feito que garantiu seu último recorde nacional.

Segundo a ciência De acordo com os estudos neurológicos sobre o funcionamento cerebral, a memória de curto e longo prazo envolve diferentes partes do cérebro: a primeira está relacionada ao lobo frontal e parietal, responsáveis, dentre outras funções, pelo armazenamento temporário de informações; já a memória de longo prazo envolve, especialmente, a atividade do hipocampo – cuja finalidade é transformar as informações temporárias em registros permanentes. “A memória de curto prazo é vista como um registro que é, então, solidificado através de conexões com o hipocampo e áreas relacionadas a ele”, explica o professor de Psiquiatria, Neurologia e Psicologia Bruno Giordani, do Departamento de Psiquiatria da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos. “No hipocampo, as memórias essencialmente se movem em direção ao córtex na medida em que se tornam ‘fixas’”. Ainda do ponto de vista científico, Giordani afirma que uma memória surpreendente, mais do que um resultado de treinamento intensivo, envolve uma combinação de fatores: “É uma

Infográfico: Ana Clara Faria

espécie de característica genética/ambiental”, diz o professor. “Algumas pessoas apresentam habilidades mais desenvolvidas para áreas específicas. Há muita discussão sobre o quanto você pode desenvolver o seu cérebro, mas eu acho que algumas pessoas são, simplesmente, melhores em fazer as conexões [cerebrais]”, pondera Giordani.

çar”, conta. “É tudo uma questão de prática consciente”. Mullen treina, em média, de 30 minutos a uma hora por dia. Dellis diz que, quando está treinando para uma competição, chega a praticar até 5 horas por dia. “Para mim, é como um esporte. Eu treino como um atleta tanto física como mentalmente”, afirma.

Dicas de vencedor

Para ambos os campeões internacionais, dedicação, perseverança e autoconfiança são essenciais para vencer torneios que envolvem milhares de competidores de diferentes partes do mundo. “Você consegue! Simplesmente coloque, literalmente, sua mente nisso!”, encoraja Dellis. “Como Arnold Schwarzenegger uma vez disse, ‘você não pode escalar a ladeira com as mãos em seus bolsos’”.

Aos que desejam desenvolver suas capacidades de memorização – em um nível competitivo ou não –, Alex Mullen afirma que uma das principais atitudes é não impor limites a si mesmo. “Esses limites são, quase sempre, apenas psicológicos. Eu tenho sido capaz de alcançar pontuações que eu nunca pensei que poderia alcan-


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Criação com apego Dieneffer Santos

A base para uma vida repleta de relacionamentos saudáveis Educar crianças para serem completamente alegres, inteligentes, responsáveis, educadas, tolerantes, amáveis e com boa autoestima não é das tarefas mais fáceis. Tampouco criar uma criança com esses preceitos de empatia, confiança e afeição que são base para um adulto feliz. A tarefa é árdua e o caminho percorrido para chegar ao mais próximo possível disso é cheio de objeções e os famosos “pitacos”, muitas vezes figurados de conselhos dos mais experientes. Porém, por melhor que seja a intenção de quem aconselha, muitas vezes isso serve apenas para deixar quem está buscando a melhor forma de criação, ou adeptos da criação com apego, confusos e desanimados. A lição que fica aqui é que deve se ter empatia, em todas as relações. Para falar de Criação com Apego é necessário falar de empatia, e, ouso tentar defini-la como um método que atende às necessidades da criança de confiança, empatia e afeição, o que provém a base para uma vida repleta de relacionamentos saudáveis durante toda a vida. Infelizmente (e eu digo infelizmente porque se existisse seria extremamente mais fácil) não existe uma “fórmula” que ensine o jeito certo de criar uma criança ou que defina o jeito certo de como educá-la, qual a melhor atitude a ser tomada em determinadas situações e que garanta que ela será uma criança e, posteriormente, um adulto com caráter admirável e, sobretudo, uma pessoa feliz. Não existe essa fórmula, mas existem métodos. Estudado por pesquisadores de psicologia e desenvolvimento infantil, e, mais

recentemente, por pesquisadores estudando o cérebro, a Criação com Apego atende às necessidades da criança e cria vínculos emocionais fortes e saudáveis entre pais e filhos. Que certamente não irão tornar o trabalho mais fácil, mas muito mais prazeroso. Esses estudos são capazes de compreender um pouco o que se passa com o bebê, desde seu nascimento. Entender o que acontece com ele é fundamental para aplicar qualquer que seja o método de criação que serão eficazes em auxiliar crianças a desenvolver ligações seguras com os pais e (respeitando a diversidade das estruturas familiares), com todas as pessoas na vida da criança que a estimularem a ter um relacionamento com apego. É fundamental entender melhor o desenvolvimento normal das crianças, sem aquela ideia de comparação, sem pensar que as mudanças de comportamentos (como saltos ou picos no desenvolvimento), são birras ou manhas, o que não têm fundamento científico algum, mas que representam emoções reais e devem ser levadas em conta, mesmo que, para nós, os motivos pareçam inocentes. Por isso é tão importante que identifiquemos as necessidades de nossos filhos e também que possamos aprender a responder às crianças com respeito e empatia, para que elas aprendam isso. Pois quando a criança se sente segura em seus relacionamentos com apego, ela está mais apta a

explorar o mundo ao seu redor e a desenvolver laços fortes e saudáveis com outras pessoas. A Criação com Apego desassocia a falsa impressão que se tem de que é preciso seguir todos os princípios da teoria para se criar com apego, pois nesse método você avalia cada um dos princípios e escolhe os que melhor se adequam à sua necessidade. Deixando claro que o objetivo é criar vínculos, sejam eles através do atendimento consistente e amoroso das necessidades do bebê, sejam com as valiosas lições para toda a vida, como empatia e compaixão. A atuação dos responsáveis torna-se indispensável nos episódios em que a criança irá enfrentar um problema, ajudando a estabelecer uma maneira de lidar com as situações de estresse que aparecerem ao longo de sua vida. Em outras palavras, com apoio dos pais, com afeto, com empatia, colo, compaixão, ou com a própria Criação com Apego, as crianças reagem melhor ao estresse e tornam-se adultos que lidam melhor com os problemas. Porque se para um adulto é difícil lidar com os problemas e obstáculos do dia a dia, imagina para uma criança que está aprendendo a lidar com suas próprias emoções, suas primeiras frustrações, mas ainda não tem maturidade para tal feito.

É impossível privar nossos filhos de passar por dificuldades. Se possível fosse estaríamos até prejudicando-os, pois é necessário que eles aprendam, desde pequenos, a lidar com o estresse, que em certa medida é benéfico a eles mesmos. Mas há o estresse tóxico, por exemplo, que tem efeito prolongado no organismo e é associado à falta de suporte que a criança recebe, ou o contrário, a superproteção dos pais que não a deixam enfrentar seus próprios problemas. Assim, o estresse tóxico torna-se prejudicial e, segundo especialistas, pode transformar as crianças em adultos com propensão a doenças coronarianas e diabetes, ou ao uso de drogas e até a depressão. O importante é estudar e explorar as diferentes filosofias de criação. Pode ser que para os pais agir sempre com uma certa disponibilidade emocional seja difícil, mas para os bebês isso é uma questão de sobrevivência: eles têm uma necessidade real de vínculo, para se orientarem e crescerem bem. É encantador que temos consciência disso agora e podemos assim criar pessoas melhores no futuro. Agir com respeito aos sentimentos da criança e entender suas necessidades por trás de seus comportamentos, demonstrando interesse em tudo o que ela nos mostrar interessadas, compreendendo seus sentimentos, é aí que está a chave da Criação com Apego.

Crédito: PublicDomainPictures/Pixabay

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Curitiba, 24 de novembro de 2016 > Edição 994 > LONA

Política cidadã Rodrigo Silva

O retorno de Rafael Greca O engenheiro civil Rafael Greca (PMN) foi novamente eleito prefeito de Curitiba, já tendo administrado a cidade de 19931996. Greca agora governará a capital paranaense a partir de 1º de janeiro de 2017 e o mandato seguirá até 31 de dezembro de 2020. Greca teve 53,25% dos votos, contra 46,75% do atual deputado estadual Ney Leprevost (PSD). O povo curitibano chegou às eleições mais indeciso do que nunca: durante todo o segundo turno as pesquisas apontavam um empate técnico. Algumas questões ainda precisam ser respondidas, como o apoio do governador Beto Richa, influenciou na eleição do candidato do PMN? Como o alto número de não votantes nas eleições pode atrapalhar a governabilidade do novo prefeito? Pois bem, o governador enfrenta uma crise em sua popularidade e alta rejeição por parte povo paranaense, devido a ajustes fiscais e aos confrontos entre policiais e professores que têm caracterizado o seu segundo mandato. Greca vinha de quatro derrotas consecutivas nas urnas e foi muito contestado por ter obtido o apoio de Richa. Mas essa aliança lhe beneficiou politicamente, avigorou a sua campanha. O governador se fortaleceu com a eleição de Greca para a prefeitura, pois não só ganha em adesões políticas, mas como seu ex-assessor Eduardo Pimentel é agora vice-prefeito de Curitiba. As abstenções, brancos e nulos somaram um índice de 33% do eleitorado curitiba-

no. Segundo Rafael Greca, é dever dos políticos reencantar as pessoas com a política. O que vem aumentando é a descrença da população em suas lideranças e isso não é um fenômeno apenas da cidade de Curitiba. Um índice tão alto de “não votos” pode ter diferentes significados. Por exemplo, apesar da promessa de campanha limpa entre os candidatos, o segundo turno das eleições municipais foi caracterizado por muitos ataques e agressões. Anteriormente às eleições, cerca de 147 escolas estaduais haviam sido ocupadas por estudantes e professores em protesto à PEC 241 e à MP 746 de autoria do governo federal. Mais de 700 mil eleitores tiveram seus locais de votação remanejados pelo TRE e isso pode ter influenciado no número de abstenções. O recado foi dado nas urnas, o povo de Curitiba embora mantenha uma tradição de seis décadas de conservadorismo eleitoral ao eleger Rafael Greca, mostra por meio do número de abstenções, que algo precisa mudar, ou esse índice de não votantes vai aumentar a cada eleição. O novo prefeito afirma que fará uma gestão “amorosa e preocupada com as pessoas”, tendo como modelo o Papa Francisco. Em seu retorno à prefeitura, Greca terá à sua disposição um orçamento de aproximadamente R$ 9 bilhões. Estamos em um momento de crise, e o novo prefeito deve identificar quais as principais necessidades da população e administrar o orçamento corretamente, pois acima de tudo, a confiança do povo curitibano em seus políticos deve ser prioritariamente reestabelecida.

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Na ponta da agulha

Elizabet Letielas e Thaynara Oliveira

LAB Moda: o orgulho da produção local Promover a moda, a arte e o design é o lema da sétima edição do Lab Moda, projeto que reúne em um só espaço marcas curitibanas, que acontece até 24 de dezembro, véspera de natal, em show-room montado no shopping Pátio Batel. Gratuito e aberto para a visitação, o evento é uma forma de fomentar e dar visibilidade às iniciativas locais. Tendo em vista o exigente público curitibano, colocar as marcas locais dentro do shopping surgiu na tentativa de estimular a formação de potenciais clientes, uma vez que, devido à falta de cultura de moda em Curitiba, dificilmente o público que não pertence a esse nicho entraria no ateliê de rua de algum dos trinta designers em exposição. A mostra exibe de roupas a utensílios de decoração e acessórios, tudo tanto masculino quanto feminino. Além de promover o contato com o cliente, o Lab Moda acaba unindo os próprios designers locais e cria uma relação direta do próprio shopping com as marcas. Tal relacionamento já rendeu frutos. A última edição do evento, realizada no mesmo período do ano passado, resultou na estreia da marca Novo Louvre em uma loja própria dentro do shopping Pátio Batel. A grife antes tinha apenas uma sede, no centro histórico da cidade. Seguindo esta linha, o shopping Pátio Batel continua dando espaço para os empreendedores locais, mesmo na época em que o Lab Moda não acontece, a loja Das Coisas Feitas Por Aí (voltada à venda de roupas), alimentada por diversas marcas locais que fazem um rodízio de seis em seis meses. Mas, como em qualquer relacionamento, nem tudo são flores. Surgem

alguns problemas pontuais nesse processo. Um deles, por exemplo, é que por ser desenvolvido, pelo menos nas duas últimas edições, dentro de um shopping, todas as marcas que têm interesse em se candidatar e expor seus produtos precisam passar por uma espécie de triagem e devem se adequar aos padrões de marketing e comunicação já desenvolvidos pelo shopping. E é nessa transição que as iniciativas acabam perdendo sua identidade e o grande diferencial frente aos outros varejistas: o caráter autoral. Todos são colocados em pequenos stands, com a mesma decoração, a mesma iluminação. O stand da Noiga, marca que produz acessórios mais modernos, impressos em 3D, tem a mesma madeira clara e a mesma luz colorida que ilumina o stand do Feito a Mãe, marca de roupas infantis, com um toque todo delicado e mais romântico, que está também nos mesmos moldes do espaço de venda da Ellen Piragine, designer de joias feitas de madeiras. Essa mesmice quadrada reforça o formato batido que vem sendo desenvolvido e replicado Curitiba afora ao longo dos anos. Entretanto, são iniciativas como esta que continuam dando força e valorizando o trabalho desses empreendedores, na busca por conseguir espaço frente ao público curitibano, que mesmo relutando, já tem apresentado alguns avanços positivos. Para criar e consolidar de vez uma cultura de moda em Curitiba são necessárias diversas ações, que vão muito além do comprar e vender, mas sim de valorizar aquilo que ninguém pode nos roubar, o sentimento de pertencimento local, algo que é cumprido na proposta do LAB e das marcas que conseguem participar do evento.


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