LONA - Edição nº 996

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Edição 996 - Curitiba, 06 de dezembro de 2016

A vida e a luta de Nyltow Rafael, que conviveu com uma doença pulmonar rara e de difícil tratamento

Crédito: Leandro Schugan

As lições de um artista de apenas 12 anos p.4

COLUNISTAS

Crédito: Rodrigo Botura

EDITORIAL Tragédia com a equipe da Chapecoense foi capaz de unir torcidas rivais.

TECNOLOGIA

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Aplicativo de beleza desenvolvido em Curitiba se destaca pela praticidade e rapidez no agendamento dos serviços.

CONTO

O circo enfrenta preconceito A família Zanchettini, que realiza espetáculos há gerações, conta sobre a rotina e as dificuldades da vida no picadeiro

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“Ela pensava em gritar, mas não parecia seguro. Um frio na barriga se transformou em um tremor por todo o seu corpo e, de repente, ela era apenas uma menina.” p.10

Camilla de Oliveira “(...) o Brasil tem, sim, obras de grande qualidade. E é por isso que digo sempre: vale muito se aventurar pelas brasilidades do nosso cinema.” p. 8 Eduardo Vernizi “A retomada de antigos títulos famosos se tornou frequente na indústria cinematográfica, não só com remakes, mas também com sequências”

CRÔNICA

p. 8

Marina Ortiz conta como é passar um dia sem WhatsApp. p. 9


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Humanidade futebolística Quem diria que um time alvinegro como o Corinthians pintaria o seu site de verde na mesma semana em que o seu principal rival se consagrou campeão brasileiro? Quem diria que a Arena da Baixada, famosa por repudiar o verde, teria uma iluminação homenageando as cores que também são de outro time da capital? Quem ousaria dizer que, em seu sonho mais delirante, imaginou as torcidas organizadas dos quatro gigantes de São Paulo em um mesmo coro e sintonia? A tragédia na Colômbia que vitimou 71 pessoas é, sem dúvidas, o pior acontecimento no mundo do futebol em muito tempo – e houve quem dissesse que nada poderia superar, para os brasileiros, o 7 a 1. Pois é. Mas, o sonho da Chapecoense, que há dez anos nem imaginaria estar na Série A, muito menos na final da Sul-Americana, hoje é o sonho de todos as torcidas, de todos os times, de todas as cores. Há dez anos Caio Jr. levou o Paraná à vaga inesperada da Libertadores e hoje ele leva a Chape ao título de Campeão da Sul-Americana e também a uma inédita vaga na Libertadores. Mas não foi do jeito que todos esperavam. Há um mês Danilo se alçava ao sucesso e figurava como um dos goleiros mais queridos do Brasil, hoje ele está entre os mais queridos do mundo – e jamais será esquecido. Há duas semana, a torcida da Chapecoense lamentava não poder realizar a final da Sul-Americana em casa, na Arena Condá, hoje lamenta nunca mais ver o mesmo time em casa. Não há como argumentar – não há nenhum lado bom na tragédia em Medellín. Nada suprirá a perda tão lamentável de um time que tinha tudo para conquistar as Américas, claro, devido ao seu próprio planejamento. A condição e o contexto são ainda piores, afinal, estamos falando da Chapecoense, com um carisma gigante e que conquistou outras 19 torcidas no Brasileirão. Mas, se temos que concordar em alguma coisa, certamente é que nunca o futebol foi tão humano, nunca houve tanto carinho e amor em um mesmo esporte, nunca houve tanto respeito e empatia pela dor dos outros, que na verdade virou uma dor compartilhada. O futebol nunca foi só futebol e, agora mais do que nunca, será muito mais do que isso. #ForçaChape

TECNOLOGIA

Praticidade e beleza em um app que rende milhões O aplicativo móvel Beauty Date permite o agendamento, em poucos toques, de serviços em salões Patricia Sankari

Quando Alexandre Kleis, Giovanni Bonetti e Fabrizzio Zampieri perceberam que agendar horário em salão de beleza envolvia contratempos e desentendidos eles decidiram criar uma solução que facilitasse a vida de profissionais e clientes. Nascia também um projeto milionário. O aplicativo Beauty Date, desenvolvido em Curitiba (PR), foi o único da América Latina a ser selecionado por um dos mais renomados programas de investimento do Vale do Silício. A Valor Capital Group aportou R$ 28 milhões na startup no início deste ano. Os primeiros resultados já surgiram: 150 mil pessoas baixaram o app. Velocidade no agendamento Na casa dos 30 anos, os idealizadores do projeto buscaram soluções para agilizar o agendamento de horários em salões, além de oferecer dicas de profissionais e de promoções. O principal desafio para o desenvolvimento do aplicativo foi encontrar um modelo que fosse atraente tanto para os salões quanto para os clientes. “De um lado, há a tranquilidade de fazer tudo em tempo menor e contando com uma qualidade até então rara no mercado. Já o salão pode contar com o sistema

EXPEDIENTE

EDITORIAL

Reitor José Pio Martins Vice-Reitor e Pró-Reitor de Administração Arno Gnoatto Diretor da Escola de Comunicação e Negócios Rogério Mainardes

Com design funcional, o aplicativo ganhou reconhecimento de investidores do Vale do Silício. Crédito: divulgação

de pagamentos Paypal, que diminui o número de cancelamentos e atrasos no horário agendado”, afirma Alexandre. A ferramenta online chegou a 25 estados brasileiros e conta com mais de 2500 salões conveniados. “A comanda eletrônica e o agendamento pelo aplicativo foi o que fez o salão aderir ao sistema”, conta Rosângela Oliveira, funcionária do Beauty Center em Boa Vista (RR). Pró-Reitora Acadêmica Carlos Longo Coordenadora do Curso de Jornalismo Maria Zaclis Veiga Ferreira Professora-orientadora Katia Brembatti

Já Diego Aguiar do Amaral, dono do Salão Beauty Capelli, em Porto Alegre (RS), comenta que estava em busca de uma ferramen-

“De um lado, há a tranquilidade de fazer tudo em tempo menor e contando com uma qualidade até então rara no mercado.”

Projeto Gráfico Gabrielle Hartmann Grimm Edição e Diagramação Ana Clara Faria Revisão Katia Brembatti


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TECNOLOGIA

Para usuários, a agilidade no agendamento dos serviços é um dos diferenciais do aplicativo. Crédito: divulgação

ta de agendamento online e chegou ao Beauty Date. “Agiliza demais. O cliente pode olhar todos os horários disponíveis e ver qual funciona melhor para ele”, relata o empresário. Interação virtual Daniel Garbi, estudante de 19 anos, usa o sistema por um motivo a mais que a facilidade. “Eu achei o aplicativo na internet e, além de ser bem prático, me ajudou muito. Sou muito tímido e não ter que ligar e ficar perguntando os horários disponíveis no salão facilitou demais esse processo”, conta Garbi.

Expansão O aplicativo, que está disponível para Androids e IOS, foi adicionado na lista do App Store como aplicativo que “facilita a vida das pessoas” dentro de várias capitais brasileiras. Hoje a startup conta com 80 funcionários, 13 sócios e projeta ter, até o fim do segundo semestre de 2016, 5000 salões conveniados. Para saber mais sobre o aplicativo, acesse a página www.beautydate.com.br, ou www.facebook.com/ beautydate Ao abrir o aplicativo, o usuário seleciona a opção desejada e tem acesso aos salões disponíveis para agendamento. Crédito: divulgação


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LIÇÃO DE VIDA

Artista de 12 anos realizou sonhos e superou limitações Nyltow Rafael enfrentou uma rara doença no pulmão. A pintura, música e a família estiveram muito presentes durante esse tempo Gabriela Rodrigues, Jéssica Mariani e Nathalie Oda

Nyltow Rafael tinha apenas 2 anos quando foi diagnosticado com Fibrose Pulmonar Idiopática (FPI), uma doença muito rara que afeta os pulmões por causas desconhecidas. Na época, o menino teve uma pneumonia com complicações. Nyltow passou a apresentar os mesmos sintomas que uma tia que já tinha sido diagnosticada com a doença, o que fez a família procurar um médico. No mesmo ano ele começou a fazer tratamento, e foi encaminhado para o Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba. A família, que mora em Porto Amazonas e constantemente tinha que se deslocar para a capital, precisava lidar com a situação. “Foi um pouco difícil, mas a gente sempre teve fé e esperança que ele ia melhorar”, comenta Nelson dos Santos, pai de Nyltow. Durante toda sua infância, o menino conviveu muito bem com a doença. Sempre foi uma criança muito alegre, carinhosa e raramente reclamava, apesar das dificuldades vividas pela família. Era um menino bastante sonhador e muito ligado ao ramo artístico. Aos 7 anos, ele entrou em uma aula de música e aprendeu a tocar flauta doce. Como passou a dominar bem as escalas musicais, Nyltow descobriu por conta própria como tocar outros seis instrumentos, chegando a fazer uma apresentação na Orquestra Sinfônica. Além da música, Nyltow também tinha dom para o desenho. Com 8 anos ele passou a pintar quadros. Nyltow tinha um livro dos sonhos, e um deles era expor suas obras no Museu do Louvre, na França. Através de um amigo da família que é escultor, o menino conseguiu atingir a meta. Em outubro de 2015 seus quadros voaram mais longe e foram para Paris. Infelizmente, ele não pôde ver suas obras expostas. Um voo de avião provoca muita mudança na pressão do ar e isso afetaria ainda mais seus pulmões que já eram bem fracos. Também aos 8 anos, ele começou a

Nyltow recebeu tratamento do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba. Na foto acima, ele está acompanhado dos pais e da enfermeira. Crédito: Arquivo pessoal

usar um botijão de oxigênio para ajudar os pulmões a trabalharem melhor. Nessa época foi descoberto que ele também sofria de hipertensão pulmonar e que Nyltow era cardiopata, o que foi um agravante para a saúde do menino. A relação com a arte sempre ajudou bastante em seu tratamento. Segundo o pai, pintar, tocar instrumentos e viajar eram as três coisas que ele mais gostava. “Teve uma época que fomos viajar e ficamos 48 dias fora. Ele ficou 18 dias sem o oxigênio. A gente sempre fazia um esforço para levar ele para viajar”, comenta Nelson. Durante grande parte da vida, quem passava os dias no hospital com o menino era a mãe, Rosângela Pacheco dos Santos. Mas como Nyltow era muito apegado a Nelson, nos últimos anos passou a pedir que o pai passasse as noites com ele, o que fez com que Nelson largasse o emprego de frentis-

ta para se dedicar ao filho em tempo integral. “No último internamento eu tive que sair para ir ao dentista e a mãe ficou com ele. Na metade do caminho deu uma crise nele e eu tive que voltar”, conta Nelson. Segundo o pai, Nyltow sempre foi muito bem tratado durante suas internações. Uma das formas de tentar curar a doença era através de um transplante de partes de um pulmão. O pai seria o doador, pois com o tempo foi constatado que a mãe também sofria de fibrose pulmonar, mas o menino não aceitou fazer a cirurgia. Além disso, a chance de sair do centro cirúrgico com vida era praticamente nula. O que é a FPI? Nyltow Rafael sofria de Fibrose Pulmonar Idiopática, doença que não é comum em crianças, mas o fator hereditário é algo que influencia muito. O fato de o garoto ter familiares com essa

doença foi determinante para que Nyltow portasse a enfermidade. “FPI é uma doença crônica, progressiva que danifica os alvéolos pulmonares, causando cicatrizes nos pulmões”, afirma Washington Luiz Bittencourt, pediatra particular e do Hospital de Clínicas da UFPR. Bittencourt também diz que esse problema torna difícil a respiração, levando a pessoa a ter tosse e falta de ar. Segundo o artigo “Fibrose pulmonar idiopática: uma década de progressos”, produzido por médicos do Programa de Doença Pulmonar Intersticial, a FPI é uma doença rara: 14 a 43 pessoas em cada 100.000 habitantes sofrem com isso no mundo, e cerca de 13 mil brasileiros convivem com a FPI. Essa patologia ainda tem a causa desconhecida pela medicina. Por esse motivo se chama “Idiopática”. De acordo com o pediatra, ela ocorre geralmente em pessoas maiores de 40


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LIÇÃO DE VIDA anos, com exceção dos pacientes que têm histórico familiar e que acabam apresentando a doença mais cedo. Bittencourt diz que o gênero e o uso de cigarro também afetam quando se trata desse problema. “Homens parecem ser afetados com mais frequência do que as mulheres, e a maioria dos pacientes têm uma história de consumo de cigarros”, afirma o médico. Em relação aos sintomas, eles podem surgir de forma lenta e, às vezes, não se manifestam no início da doença. De acordo com o médico pediatra, os sinais podem incluir falta de ar durante exercício físico, tosse, resfriados e infecções pulmonares mais frequentes, falta de apetite e perda de peso. Fadiga, febre, mialgias (dores musculares) e artralgias (dor nas articulações) raramente são relatadas. Nyltow Rafael tinha o funcionamento do pulmão diferente: ao invés do oxigênio e do dióxido de carbono se moverem entre os vasos sanguíneos e os alvéolos dos pulmões de maneira normal, ou seja, tendo que percorrer uma pequena distância para que o oxigênio entre no corpo e o dióxido de carbono saia de maneira rápida, os pulmões de Nyltow não se expandiam tão bem. De acordo com o artigo, o pulmão com FPI tem um tecido pulmonar endurecido,

como se fosse um couro, fazendo com que o processo de entrada e saída de ar seja dificultado e, consequentemente, o paciente tenha complicações para respirar. Segundo o especialista, não existe um tratamento específico para a doença, mas sim a intervenção em alguns sintomas: “Parar de fumar; as vacinas contra a gripe e a pneumonia, pois essas infecções podem aumentar as lesões dos pulmões; oxigênio, visto que com a evolução da doença algumas pessoas precisam respirar com ajuda de oxigênio suplementar; medicamentos, utilizados para retardar danos nos pulmões, mas eles não curam a doença; transplante de pulmão e outros procedimentos”. Nyltow usava, na maioria do tempo, oxigênio suplementar e fazia quimioterapia. O transplante foi evitado porque o menino era cardiopata, ou seja, apresentava anormalidades na estrutura e funcionamento do coração. Além disso, segundo o pediatra do Hospital de Clínicas da UFPR cerca de 50% dos pacientes transplantados, abaixo dos 60 anos com a doença, sobrevivem por 5 anos, e em torno de 20% por 10 anos ou mais após o transplante.

A mãe de Nyltow, Rosângela dos Santos, também foi diagnosticada com a doença pulmonar. Crédito: Arquivo pessoal.

Nyltow passava grande parte do tempo no hospital por causa dos tratamentos, mas morava em Campo Largo com seu pai, sua mãe e sua irmã. No entanto, a casa era feita de madeira e em visita à família, a médica do menino constatou que a moradia não era adequada, uma vez que o material aloja muitos fungos e bactérias que poderiam prejudicar a saúde do paciente. Então, a própria médica realizou um pedido à Prefeitura de Curitiba para que fosse oferecida à família uma casa com estrutura segura para alguém com FPI. A Prefeitura aceitou o pedido e informou que forneceria uma casa de alvenaria, com espaço amplo, que assegurasse as necessidades de Nyltow, que na época estava com 10 anos. Os órgãos responsáveis entraram em contato com a Prefeitura de Campo Largo e pediram para que a casa da família fosse demolida com urgência, pois o mesmo terreno seria aplanado e abrigaria a nova construção. Assim feito, a casa de madeira foi ao chão, mas a promessa da nova construção nunca foi cumprida. A família passou a morar provisoriamente na casa da avó de Nyltow. Mais de um ano depois, a Prefeitura apresentou o projeto de uma casa de 36 m2. Os aparelhos, como os botijões de oxigênio, eram imprescindíveis no tratamento do garoto. Além do fato de Nyltow não poder dormir sozinho, devido à doença, seria fisicamente impossível a adaptação da família (composta por quatro pessoas) à casa. “Se eles tivessem apresentado o projeto no começo, eu não teria aceitado. Confiei neles, achei que como eu estaria no hospital todo o tempo, eles fariam a casa e eu não precisaria correr atrás”, afirma o pai. Nelson tentou conversar, negociar, adaptar, mas não teve acordo. A família não receberia a casa que precisavam. E agora também não tinham onde morar. Mudaram-se para a cidade de Porto Amazonas e passaram a morar em uma residência que tinha o aluguel pago com a ajuda de amigos da igreja que frequentavam. Durante esse período, o caso de Nyltow teve complicações e ele precisou ficar três meses ininterruptos inter-

A pintura era um dos hobbies favoritos de Nyltow. Os quadros acima são de sua autoria. (Crédito: Arquivo pessoal)

nado. Mas ele não se deixava abalar e mesmo assim fazia oficinas com várias outras crianças para ensinar pintura e como tocar instrumentos musicais. Compartilhava tudo o que sabia. Porém, não aguentou os tratamentos e faleceu no dia 23 de maio de 2016. O sofrimento do artista de 12 anos cessou, mas o da família, não. A moradia prometida nunca foi construída. “Passamos a sonhar com a casa, mas no fim o sonho virou pesadelo”, lamenta Nelson. Nenhuma Prefeitura assumiu a responsabilidade e o terreno continuou vazio. “Eles viraram as costas. Um joga na mão do outro, mas nada acontece. Caiu no esquecimento”, acrescenta. A irmã de Nyltow, que hoje tem 14 anos, deu continuidade às oficinas do irmão, ensinando as crianças como ele costumava fazer. O pai, que saiu do emprego para se dedicar ao filho, não conseguiu trabalho em Porto Amazonas e pensa em achar algum em Curitiba, já que a mãe do menino tem FPI e logo terá que começar os tratamentos. “Vamos ter que marcar consulta para ela logo, porque ela tem que fazer tratamento, que nem o Nyltow fazia”, conta Nelson.


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ARTE CIRCENSE

O preconceito não cala os aplausos Família circense tradicional conta como é a rotina para manter viva a tradição e obter sucesso em meio às adversidades dos tempos modernos Otávio Lucca e Rodrigo Botura

O Circo Zanchettini é um dos mais antigos do Brasil e também um dos mais tradicionais, contando com um elenco de 40 pessoas envolvidas diretamente com todo o trabalho. O detalhe é que todos parentes: avós, mães, pais, filhos, tios e primos, uma verdadeira corrente familiar que se dedica a levar aos quatro cantos do Brasil a arte circense. Uma família que mora em casas sobre rodas e, de tempos em tempos, arruma todo seu material e vai respirar novos ares, se mudando para um novo local. Novas cidades, novas pessoas e um verdadeiro desafio para aqueles que enfrentam as dificuldades do dia a dia em busca do aplauso do público. O circo conta com onze carretas, quatro trailers e dois ônibus para o transporte dos materiais e das pessoas que viajam com a companhia. Após 14 anos fora de Curitiba, a família, que ficou conhecida na cidade, retornou para ficar por uma longa temporada na capital. O motivo da vinda foi o convite recebido para que o circo montasse sua estrutura na Praça Santos Andrade, para o evento do Circo da Democracia que reuniu diversas palestras e debates sobre a democracia em nosso país. A ex-presidente Dilma Rousseff esteve no evento e no picadeiro do circo, onde conversou sobre a importância do respeito à democracia. A saudade e os pedidos foram enormes e a companhia, que se preparava para uma estreia em Toledo, resolveu voltar às terras curitibanas. A perseguição de uma classe Erimeide Zanchettini é a gerente e porta-voz do circo e está à frente da companhia, que apesar de ser familiar, todos têm um papel importante para o funcionamento da empresa. Ela conta que o circo no Brasil enfrenta algu-

Erimeide, atual gerente do Circo Zanchettini, faz parte de uma família de artistas que mantém a companhia há gerações. Crédito: Rodrigo Botura

mas dificuldades por forte oposição e perseguição das ONGs protetoras de animais e por parte de prefeitos, que muitas vezes não deixam o circo entrar na cidade “por acharem que são donos” das cidades e não quererem que se instalem no local. Segundo Erimeide, “a ignorância cega as pessoas”, e para ela os prefeitos que embargam a entrada do circo estão tirando a oportunidade das pessoas de terem acesso à cultura e à arte. Engajada na causa circense, Emireide conta que a família Zanchettini é sempre requisitada quando tem alguma lei ou processo jurídico que envolve os artistas. Ela destaca que as leis de proibição de uso de animais no circo,

monitoradas por ONGs de proteção de animais, causam grande prejuízo aos circos nacionais.

Para a gerente, um dos documentos sobre a proibição da utilização de animais, assinado por uma ex-candidata à presidência Marina Silva, tem o objetivo de desvalorizar e minar os circos tradicionais brasileiros, para valorizar e implementar no país os estrangeiros, como o Cirque Du Soleil.

Muitos animais faleceram devido ao afastamento de seus proprietários, e alguns estão sendo devolvidos por não poderem ser abrigados em zoológicos ou santuários. Segundo ela, um dos documentos sobre a proibição da utilização desses animais, assinado por uma ex-candidata à presidência, Marina Silva, tem o objetivo de desvalorizar e minar os circos tradicionais brasileiros para valorizar e implementar no país os estrangeiros, como o Cirque Du Soleil. O que existe no Brasil é um projeto de lei para regulamentar o uso dos animais. Entretanto, alguns municípios e estados brasileiros efetivaram a lei da proibição. Essa discussão se arrasta por


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ARTE CIRCENSE anos, e algum tempo atrás teve grande visibilidade na mídia. Um dos casos mais famosos foi a do circo francês Le Cirque, que teve seus animais apreendidos em uma operação do Ibama e da Polícia Ambiental de Brasília, quando estava instalado na capital do país. O Le Cirque foi alvo dos holofotes devido à forte pressão de ONGs protetoras de um lado e, do outro, funcionários do circo que se mobilizaram para impedir a apreensão. O resultado, alguns anos depois, foi a morte de animais por depressão, e o fórum de Brasília determinou a devolução dos animais ao Le Cirque alegando não haver provas de maus tratos. A decisão, entretanto, ainda não foi cumprida. Erimeide e toda a família Zanchettini sempre são acionados para defende-

rem a causa e mobilizam toda a classe para participar das decisões em favor dos circenses. Ela lamenta que em Curitiba tenha sido aprovada a lei que proíbe os animais. “Foi a gente virar as costas, e aprovaram a lei, nós estávamos em Minas Gerais e infelizmente não podemos defender todos os estados”. Contando com uma assessoria jurídica, o Circo Zanchettini é uma das companhias de maior expressividade na luta, com algumas vitórias, como um caso que ocorreu na cidade Os materiais do espetáculo são transportados em quatro trailers, onze carretas e dois ônibus. Crédito: Rodrigo Botura de Vera Cruz-SP, em que o circo precisou entrar na cidade com um lhar. Ainda assim, no dia da estreia, tanto, com a equipe de advogados, mandado de segurança para trabafoi embargado pelo prefeito. Entreconseguiram a liminar para o funcionamento, mas a situação é recorrente. Discriminação nas escolas O preconceito com a classe vem também de instituições públicas de ensino, em que por lei todas as crianças de circo têm o direito a uma vaga na escola durante a temporada de permanência no município. Erimeide destaca que, muitas vezes, professoras e diretoras desdenham das crianças circenses, além de diversos momentos em que é preciso acionar o conselho tutelar para que as crianças possam ter acesso à educação.

Um dos equipamentos de destaque utilizados no espetáculo é o “globo da morte”. Crédito: Rodrigo Botura

Apesar das dificuldades, “o circo é como uma grande família, todos se ajudam”, enfatiza Erimeide. Todos os circos têm um código de ética de acolhimento de um artista ou de alguém que passa por dificuldades: é comum que alguns artistas desempregados peçam abrigo a uma companhia e até que consigam um novo contrato. “O circo tem suas coisas boas. Apesar das dificuldades, no nosso sangue corre o pó de serra”, conclui Erimeide.


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COLUNISTAS

Valorize o que é nosso

J

á perdi as contas de quantas vezes escutei que cinema nacional é ruim, que os filmes daqui não prestam e que os brasileiros só gostam de comédias toscas e superficiais. Confesso: até meus quatorze anos compartilhava desse pensamento generalista. Acostumada a ver filmes comerciais do estilo “mais do mesmo”, nutria certo preconceito pelo cinema das terras tupiniquins. Porém, conforme meu interesse pela sétima arte aumentou, percebi que o Brasil tem, sim, obras de grande qualidade. E é por isso que digo sempre: vale muito se aventurar pelas brasilidades do nosso cinema. Assim, selecionei três filmes que me apre-

sentaram à “outra face” da produção nacional. Sem dúvidas, minha maior surpresa foi “Estômago”, de Marcos Jorge. Mistura de drama e comédia, o longa tem sacadas geniais. A história gira em torno de Raimundo Nonato (João Miguel), migrante nordestino e cozinheiro de mão cheia, e Iria (Fabíula Nascimento), prostituta apaixonada por comida. Além do final completamente surpreendente, o filme tem uma trilha sonora memorável e fotografia marcante. Outra obra de impacto é “Baixio das bestas”, de Cláudio Assis. Nela, o diretor aborda temas pesados, como prostituição infantil e violência. O drama

GEEKOLOGIA Eduardo Vernizi

Os Recicladores

R

emakes. Essa é uma das palavras que mais têm sido usadas no cinema mundial nos últimos anos. A retomada de antigos títulos famosos se tornou frequente na indústria cinematográfica, não só com remakes, mas também com sequências, mesmo com uns 40 anos de diferença. Star Wars, Blade Runner, Vingador do Futuro, Star Trek, Tron, Indiana Jones estão entre os títulos que tiveram essa retomada recentemente. Porém, não foram apenas os filmes de ficção

cientifica, ou da cultura nerd que foram refilmados: também aconteceu com filmes clássicos como Ben-Hur, Bravura Indômita, Sete Homens e Um Destino, e a lista continua... Refilmaram Ben Hur, gente! O filme ganhou onze Oscars, ONZE OSCARS, onze; a relfimagem teria que ganhar uns doze Oscars, no mínimo, mas acredito que não será o caso. Uma obra de ficção sempre é livre para criar o seu próprio universo, criar suas

CINEMATIZANDO Camilla de Oliveira

expõe feridas de um Brasil oculto e gera reflexões acerca das injustiças sociais. Não é fácil de ser digerido; é desconfortável e até repugnante. Porém, integra a lista daqueles filmes cuja sensação final se assemelha a um soco no estômago. Cláudio Assis, inclusive, é autor de mais um título de destaque: “Amarelo manga”. Assim como os demais filmes do diretor, o longa retrata a animalidade humana. É essa obra que apresenta uma das frases mais emblemáticas do cinema brasileiro:

leis, regras e deveres; nas obras de ficção cientifica ou de fantasia essa liberdade criativa, e os limites para o seu universo, são ainda maiores. As obras de George Lucas e Ridley Scott, por exemplo, transcendem a imaginação e são títulos que marcam gerações após gerações; recriá-las, de longe, parece uma ideia terrível, porém dar continuidade a elas já não parece ser uma ideia tão ruim. Ou será que é? Sou fã dos dois universos, então adoro a ideia de ter mais conteúdo cinematográfico sobre as histórias, mas anseio por novas histórias, novas aventuras, novos personagens, novos universos. Para mim esse é o problema dessa reciclagem, dos remakes e das continuações tardias. A cada novo filme de uma velha história. E uma nova produção, com um roteiro inédito, deixa de ser criado. Novos heróis nunca serão amados, novos vilões jamais serão

“O ser humano é estômago e sexo”. Além desses, muitos outros títulos merecem ser vistos, incluindo documentários. No entanto, devido à falta de recursos, é comum que grandes obras cinematográficas fiquem restritas a cinemas alternativos e a um público escasso. Por isso, apreciar a produção nacional é importante: além de valorizar os artistas do país, estimula-se um ambiente cultural mais diverso e elaborado. Sendo assim, valorize o que é nosso! Livre-se de preconceitos e delicie-se com o cinema brasileiro.

odiados, ou amados talvez, novas batalhas épicas do bem contra o mal nunca serão travadas, e novos mundos, com novas regras, leis e deveres, nem sairão do papel. Parece que existe um medo do novo, um medo de arriscar e tentar algo diferente, um medo de surpreender o espectador. O que me parece é que os estúdios perceberam que essa é a fórmula para conseguir uma grande bilheteria: refazer um grande sucesso, por essa ótica fica bem claro que não se cria nada novo porque se tem medo do fracasso. As grandes bilheterias cegaram a criatividade no cinema. Não há mais espaço para ideias novas, deleites para os olhos, não há um novo mundo que possa nos surpreender; parece que os visionários se foram, e agora entraram em cena “Os Recicladores”, ou seja, aqueles que enxergam brilho naquilo que já foi usado. Wachowski’s, agora é com vocês!


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CRÔNICA

PRESA NO PORÃO

Crédito: Pixabay

Marina Ortiz

O tempo que passa no Facebook já é maior do que o normal e você até compartilha uns vídeos por lá, mas desiste quando sua tia-avó comenta todos. Apela para o Messenger, mas não é a mesma coisa, não mesmo. Acha que está na pior quando vê um SMS chegando em seu celular. Tenta lembrar quando foi a última vez que recebeu uma mensagem de texto que não fosse da sua operadora. Não consegue.

Um dia sem WhatsApp

V

ocê acorda com o seu despertador, e não com notificações de “bom dia” de milhares de grupos. Olha a tela do celular e até sente um alívio por não ter nada para responder, e o dia vai seguir normal provavelmente até a próxima meia hora. Quando você vê algo sensacional (que provavelmente é sensacional só para você) e precisa compartilhar no grupo do Whats, mas lembra que não pode e volta a dirigir com as duas mãos. Na hora do almoço parece que a comida não sustenta. Afinal, comer sem mostrar seu prato não é a mesma coisa. O dia passa mais sem graça do que o normal e às 5 da tarde você incrivelmente já acabou tudo o que tinha para fazer… na vida. Tem convite para sair? Tem convite para sair, mas o que você vai fazer preso em uma mesa de bar com seus amigos? Quando te chamam, a primeira coisa que vem a sua mente é: será que tem wi-fi? Mas você lembra que não importa muito nesse momento, e prefere ir para casa.

Abre até com certa expectativa, mas é só uma corrente daquele chato do Whats que não pode esperar 48 horas para ser chato. Quando parece que o jeito é ir dormir mais cedo, comentários sobre um aplicativo que desbloqueia o WhatsApp aparecem em sua timeline (incrível como nessas horas todo mundo vira hacker). Será que funciona? O jeito é instalar. E não é que deu certo? Uma lágrima quase cai dos seus olhos quando o WhatsApp carrega normalmente.

Seu primeiro impulso é enviar milhares de piadas (sem graça, obviamente) para todos os grupos sobre o bloqueio do Whats. Mas, quando ninguém responde, nem visualiza, você percebe que está sozinho nesse lugar chamado WhatsApp. Você deita e adormece olhando para aquele ícone verdinho e repetindo, só mais 24 horas, só mais 24 horas.


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CONTO

CONFISSÕES Sarah Graçano

A saia

O

s olhos dele estavam fixos nela. Em sua silhueta jovem e desprotegida. Ela sentia, sentia o calor da respiração do homem sobre o seu pescoço e sentia o cheiro da boca dele chegando perto da dela. Era estranha essa sensação no primeiro momento. Ela tinha medo, tremia toda por dentro, enquanto ele beijava seu pescoço e descia sua boca em direção à blusa que ela estava usando. Ela pensava em gritar, mas não parecia seguro. Um frio na barriga se transformou em um tremor por todo o seu corpo e, de repente, ela era apenas uma menina. Tornou-se a mais inocente das meninas, não era mais forte, não se sentia protegida, não era ainda uma mulher, mas ele disse que ia fazê-la mulher, mesmo que ela não quisesse. E tremia, rígida e amedrontada, enquanto aquele homem sujo e nojento segurava o seu cabelo e a beijava devagar, como quem mata uma presa aos poucos, como quem prolonga o sofrimento de alguém. Naquele dia ela havia acordado cedo. Tinha vários afazeres e só queria que o dia passasse depressa. Queria ir para casa no final do dia e se encontrar com sua cama de novo. Estava calor quando ela levantou e, por isso, colocou uma saia azul que tinha comprado no começo do verão. Olhou no espelho, estava bonita. Saiu de casa para o trabalho e, logo na primeira curva, ouviu um assovio. Droga, pensou, eu não devia ter saído de casa com essa saia. Pensou em voltar para casa, mas

que ridículo seria isso. Não era nada demais. Ela já havia usado a saia tantas vezes, era apenas um assovio. Assim que chegou no trabalho, o chefe comentou que ela estava bonita naquele dia. Gentileza sua, ela sorriu envergonhada. Mal sabia o que ele faria depois daquele comentário. Então o homem começou a passar a mão na perna da menina. Aquela mão pesada que ela sentia esfregando toda a sua sujeira sobre o corpo dela. Adoro quando vocês saem de casa assim, tenho menos trabalho, ele sussurrou no ouvido dela. Subiu aquela mão nojenta até chegar em sua calcinha. Pegou na bunda dela como se fosse uma criança desbravando um brinquedo novo. Ele queria brincar, ela era apenas uma coisa para que ele pudesse brincar. Ele empurrou a garota para o chão e ficou parado olhando para ela. Adorei a sua saia. Foi o que ele disse antes de puxar a peça de roupa e deixá-la com as pernas completamente nuas. Ele cheirou a saia. Adoro quando vocês mostram as suas pernas e me instigam a conquistá-las. Depois de um dia corrido e cansativo no trabalho seguiu de ônibus para a faculdade. Ela sentiu-se completamente desconfortável com aquela saia no ônibus. Sentia os homens passando com as mãos propositalmente esbarrando em suas coxas. Sentia os olhares direcionados para as suas pernas que estavam à mostra. Nunca mais sairia de saia, decidiu. Que pensamen-

to ridículo, é só uma olhada, só passaram mão sem querer. Não é nada demais, isso não significa nada. Ele deitou o seu corpo sobre o dela. Tirou a sua blusa devagar e a menina sentiu uma lágrima de pânico descer pelo seu rosto. A sua garganta parecia presa e ela sentia que em algum momento pararia de respirar. Então ele se ajoelhou e olhou para o corpo dela praticamente despido. Ela se sentia uma criança que precisava do colo de um pai. Queria tanto chorar, gritar, correr daquele lugar, mas não era seguro. Ajoelhado, ele tirou o sutiã dela e

começou a acariciar os seus seios. Com força e com violência ele se aventurava pelas curvas do corpo dela. Mordeu com força cada parte que estava amostra do seu corpo. Lambeu, chupou, machucou e marcou eternamente o corpo dela. Tirou sua calcinha e, quanto ela estava completamente nua pediu que ela se ajoelhasse. Então, ele se levantou, tirou sua faca do bolso e começou a desabotoar a calça. Ao sair da faculdade, depois da aula, ela teve a impressão de que estava sendo seguida. O caminho da faculdade até o ponto onde pegava o ônibus era bastante movimentado,


Curitiba, 06 de dezembro de 2016 > Edição 996 > LONA

11

CONTO

Ela morava longe do ponto final do único ônibus que chegava até a sua região. Motorista, o senhor não poderia me deixar mais perto. Hoje não, tenho que deixar o ônibus na garagem cedo. Ela se sentou em um banco vazio, encostou sua cabeça na janela e pensou que faltava pouco para se deitar na sua cama e poder descansar, era sexta-feira, não teria que acordar cedo no outro dia. Então se convenceu de que não havia nada demais em andar algumas quadras até chegar em casa. Apesar de as ruas serem escuras, conhecia a vizinhança e chegaria segura. Quando o ônibus che-

gou ao seu último ponto, só havia ela e um homem que usava um chapéu na cabeça e um casaco até o joelho. Ele segurou forte o cabelo dela. Você tem cara de quem já sabe como se brinca. Ela abaixou a cabeça e sentiu o seu cabelo sendo puxado com força. Ele virou a cabeça da menina na direção dos seus olhos e fez com que olhasse para a cara dele. Eu vou te ensinar as minhas regras. Ela sentia o choro vindo sem controle em seu rosto. Você vai chupar e eu vou gozar na sua cara. Depois de dizer isso, ele inclinou a cabeça dela na direção da-

quele ato nojento. Ela sentia nojo enquanto ele mexia a sua cabeça no ritmo que o agradava. A menina chorava compulsivamente, mas sentia que não havia nada que ela pudesse fazer. Naquele momento, só queria sair daquele lugar com vida. Ela chupou até que ele terminasse. Então, ele cumpriu a promessa. Ela sentiu o gozo daquele homem asqueroso em sua boca e depois em seus olhos, seu nariz, seus cabelos. Ela estava suja, sentia nojo de si mesma de uma forma tão grande, que quase não havia mais lugar para o medo. O homem estranho desceu na última porta do ônibus. Por precaução ela desceu na primeira. Você não deveria julgá-lo dessa maneira. Ele pode ser apenas um pai de família. Ela seguiu andando em direção à rua onde morava. Sentia que ele vinha logo atrás dela, em passos apressados. Continuou como se nada estivesse acontecendo. Segurava com uma mão a sua bolsa e com a outra, tentava fazer com que a saia parecesse mais segura do que ela realmente era. Agora, ela sentia frio. Começou a apressar os passos enquanto se aproximava de sua casa, quando sentiu a mão daquele homem encostando em seu braço direito. Então ele mandou que ela se deitasse novamente. Nua, sentia o vento daquela noite entrar por uma pequena abertura na janela. Não conseguia ver exatamente onde estava, mas a janela estava aberta e ela sentia frio. Ele tirou a camiseta e se deitou por cima dela.

Crédito: Unsplash / Pixabay

ninguém a estava seguindo.

Beijou-a em todos os lugares. Do seu pescoço foi para os seus peitos e sua barriga. Foi no seu ouvido. Amo meninas como você, tão perfeitas. Ela tentava engolir o choro, mas era uma tentativa em vão. Ele disse que iria possui-la. Pode ser que doa um pouquinho, gostosa.

Ela ia gritar quando sentiu uma mão sobre a sua boca e uma faca encostada no seu pescoço. Ela sentia um pânico tão grande que começou a chorar no mesmo instante. Eu vou te levar para um lugar mais reservado. Não chore, menina, você vai apenas ser a minha mulher agora. Eu te aconselho a não fazer escândalo, não é seguro. Ele arrastou a jovem até um lugar escuro, frio e assustador, fechou uma porta com cadeado por trás dele e colocou uma arma sobre a mesa. Eu se fosse você, cooperava para poder sair daqui viva. Aquele homem penetrou o corpo da menina com violência. Ela sentia nojo em cada movimento que ele fazia. Ele gritava em seu ouvido e pedia para que ela gemesse. Eu quero mulher que faça barulho para mim, sua vagabunda. Ela só conseguia pensar em chorar, não conseguia ter outra reação tomada por tamanho medo. Enquanto ele se divertia. Batia no seu corpo, mordia os seus seios e arranhava a sua barriga, ele era violento e ela tinha asco daquele ato. Sua garganta estava trancada, seu corpo estava rígido e os seus olhos estavam cheios de lágrimas. Ela sentiu o gozo daquele homem em seu corpo, sentiu o calor do fim daquele sofrimento, mas não estava aliviada. Ele se levantou. Não levante. Ela ficou deitada com os olhos fechados e com medo do que iria acontecer naquele momento. Ele pegou a arma que estava sobre a mesa e com um tiro na cabeça acabou com a vida da única testemunha daquele crime. Ele se vestiu e saiu. O corpo da menina ficou gelado no chão. A saia que ela tanto gostava ao seu lado e a hipocrisia de toda uma sociedade machista olhando com desdém para sua morte. Quem sai de casa com saia curta já sabe, está pedindo para ser estuprada.


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