LONA POR DENTRO DE CURITIBA

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Laboratório da Notícia - issuu.com/lonaup

Edição 1014 - Especial Curitiba

POR DENTRO DE CURITIBA


Editorial O que conhecemos de Curitiba? Aos que vão e que ficam, quem aqui sempre morou, “Curitiba não nos poupa, ontem tomei sorvete, hoje tomo sopa”. Como disse o artista Álvario Posselt, que traduz como é viver em uma cidade que não poupa seus habitantes, seja do frio rigoroso ou das mudanças climáticas inesperadas, levando sempre um guardachuva na bolsa ou uma segunda

peça de roupa. Uma cidade que foi palco de questões políticas, muito charmosa e reconhecida mundialmente por ser modelo de sustentabilidade e urbanismo. Curitiba já é muito conhecida pelos seus pontos turísticos que rendem fotografias famosas, mas pouco se sabe o que acontece nas suas ruas. E por mais que sua cultura seja algo evidente, ainda há lugares, programas

Expediente Reitoria José Pio Martins Pró-reitoria Acadêmica Roberto Di Benedetto Coordenadoria de integração da Escola de Comunicação e Design Marcelo Catto Gallina Coordenadoria do Curso de Jornalismo Maria Zaclis Veiga Ferreira

Professores-orientadores Felipe Harmata Marinho Katia Brembatti

inexplorados, histórias que ainda não foram contadas e que estão em toda parte, só é preciso olhar por entre suas camadas. Em busca de mostrar uma cidade diferente do que estamos acostumados a ver, em debruço as diversas perspectivas que podemos encontrar aqui, basta querer enxergar o que acontece, pois Curitiba se faz mostrar para quem quer ver.

O jornal O lona é o jornal-laboratório do curso de Jornalismo da Universidade Positivo. O veículo integra a Rede Teia de Jornalismo.

Editores-chefes Angeline Julie Frankner Júnior

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Equipe de reportagem Angeline Julie, Bruno de Sá, Débora Reusing, Frankner Júnior, Mahara Gaio, João Vitor, Juliana

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Imã nas ruas da cidade; alguns moradores de rua preferem não ser acolhidos e continuar em situação vulnerável A Fundação de Ação Social realizou neste ano 8.900 abordagens e 6.400 encaminhamentos. Mahara Gaio Curitiba é uma cidade que dá a chance para os moradores de rua escolherem ficar na situação em que se encontram ou serem acolhidos e levados para as casas de abrigo. Muitos não aceitam ajuda. De acordo com a assessora de comunicação da Fundação de Ação Social (FAS), Adriana Ribeiro, em 2020 foram realizadas 42.579 abordagens sociais, que resultaram em 26.301 encaminhamentos para serviços socioassistenciais e de outras políticas públicas, como saúde, ou seja, 38,2% não quiseram o encaminhamento. Quando essas pessoas não acei-

tam acolhimento ou atendimento, elas podem fazer o uso do Programa Mesa Solidária que oferece almoço e janta gratuitamente, e são servidos nos Restaurantes Populares Capanema e Rui Barbosa e na Praça Solidariedade. O programa teve início em 2019, e já foram servidas mais de 325.000 refeições. Sentado no chão em frente à Catedral Basílica, na Praça Tiradentes, ao lado seu carrinho de cor azul claro, José, de 54 anos diz que seu carrinho da cor do céu é a casa dele. José vive na rua desde que nasceu, a mãe era usuária de drogas, foi estuprada, e ele foi abandonado em

(Foto: Mahara Gaio)

(Foto: Mahara Gaio/ José, 54 anos)

uma lata de lixo, ‘’cresci na mão dos outros, aprendi a andar sozinho e ando só até hoje’’. José disse que estava a dois dias sem comer, mas que talvez mais tarde conseguiria se alimentar das sopas que são distribuídas. Com as mãos cortadas e ressecadas, José recorta latinhas para passar o tempo, com uma tesoura pequena, preta e sem ponta, pois pegaram o alicate que ele utilizava para fazer o artesanato. José conta que já o roubaram, pegaram sua casa, sua tesoura e documentos. ‘‘Eu não roubo ninguém, corto minhas latinhas, dou de presente e ajudo os outros quando posso’’. Seu José diz que chegou usar uma vez as casas de abrigos, mas não se sentiu confortável, ‘’cheguei um dia 09:00 pra tomar banho, era 15:00 e eu ainda não tinha conseguido’’. Essa é só uma de tantas outras vidas que vagam dia e noite pelas ruas da cidade. A cuidadora social da FAS, Rosana Hempel, diz que muitos moradores de rua que aceitam ser acolhidos acabam pedindo o desligamento e voltando para as ruas para ter mais liberdade e assim fazer o uso das drogas, o

que nas casas onde recebem atendimento não é permitido. Hempel trabalha em uma casa de acolhimento onde existe vaga para 80 pessoas e apenas 40 quiseram ser acolhidos. Ela explica ainda que, o que essas pessoas mais pedem são roupas e alimentos. De acordo com a assessoria da FAS, são oferecidas 1.601 vagas para acolhimento com ocupação diária de 90%. Neste ano, foram realizadas 8.900 abordagens e 6.400 encaminhamentos. José conta que espera ainda o dia em que possa mudar de vida, ele tem vontade de trabalhar e continuar recortando suas latinhas. Uma das vontades é que tivesse uma cooperativa que oferecesse aulas de artesanato para as pessoas nessa situação, pois, segundo José, ‘’tem muita gente inteligente na rua’’. E além dele, quem são essas pessoas que vivem nas ruas? São pais, mães, irmãos, tios, primos. Em torno de 90% são pessoas do sexo masculino, adultos, com idade entre 25 e 59 anos, que acabam nesta situação muitas vezes por falta de orientação familiar, como foi o caso de José.


Curitiba dedica-se a ajudar o próximo com a criação do Mesa Solidária Com o Programa Mesa Solidária, que tem como objetivo o atendimento à população em situação de vulnerabilidade e risco social, a cidade se torna melhor que outras capitais quando doa um pouco de si para ajudar a população em situação de rua. Angeline Julie e João Vitor Em um ano e meio de existência, desde seu lançamento no mês de dezembro de 2019, a Mesa Solidária já conseguiu servir mais de 300 mil refeições pelos locais onde o projeto funciona em Curitiba, ajudando moradores de rua e desempregados em situações vulneráveis como por exemplo na Praça Plínio Tourinho e no Restaurante Popular do Capanema. Um dos frequentadores é Fabiano Moreira Capela, que tem 30 anos de idade. Um imigrante brasileiro, que costumava morar no Paraguai. Voltou para o Brasil para achar um emprego fixo, e relata que está em Curitiba já faz um mês. Também menciona que está em um hotel social, chamado “Hotel Social Império”. Fabiano almoça e janta de vez em quando na Mesa Solidária, quando perguntado sobre o projeto, comentou: “Funciona, ajuda bastante, pra quem não tem onde comer”. Declara que está nessa situação porque ficou 2 anos desempregado e seu seguro-desemprego foi acabando, e hoje se encontra em uma situação difícil, mas segue fazendo o possível para ajudar sua família e ele próprio. Já trabalhou com carteira assinada por 6 anos, como também trabalhou na Argentina, Espanha, além do Paraguai. Atualmente, trabalha ocasionalmente como garçom, às vezes de carteira assinada e às vezes não, pois segundo ele, não tem sido fácil conseguir um emprego assegurado, por isso também vende bala de goma. A sua família é toda brasileira, vive na área rural do Paraguai há 23 anos. O pai tem 54 anos e a mãe 51. O pai já foi construtor e já trabalhou na roça. A mãe dele

(Foto: Luiz Costa /SMCS/Atendimento pelo Mesa Solidária. Na imagem, João Batista dos Santos) tem um negócio. Com as situações apertadas para a família no Paraguai, o negócio da mãe parou de funcionar. Ele tem uma irmã e um irmão. Os dois fazem faculdade, um na área da medicina e a irmã cursando na área administrativa. O Fabiano largou cedo os estudos e começou a trabalhar logo em seguida, pois preferiu ajudar a família a ter uma renda extra. Quando veio para o Brasil, trabalhava e mandava quase todo o seu dinheiro para a família, e ainda mantém essa atitude, especialmente no momento de pandemia, ficando somente com a quantia necessária para sobreviver. Sobre a Mesa Solidária, ele observou que vê muitos viajantes usando o local, “porque às vezes acaba o dinheiro dessas pessoas e elas param no local para comer e juntar um dinheiro para viajar para outro local ou voltar para a sua terra natal” relata. Ele comenta “se

eu pudesse, eu ajudaria também”, criada por Rafael Greca, considera isso porque percebe como tam- que muitas instituições não goverbém tem pessoas que precisam de namentais podem não estar admimuita ajuda. Também relata que nistrando de forma correta a disnunca achou local algum no Brasil tribuição de alimentos, e muitas como projeto Mesa Solidária, dan- vezes, realizado de forma exagedo exemplo de São Paulo, sendo rada. Bem como os locais que são difícil achar um local para comer feitas a distribuições de alimentos para os moradores de rua, são reagratuitamente por lá. A ONG Rango de Rua, que tem lizadas no mesmo espaço onde ele como objetivo fazer a diferença na vive, podendo gerar transtornos vida das pessoas em situação de na área como desperdícios de corua em Curitiba, diz que reconhe- mida, além de contratempos com ce a importância da Mesa Solidária, vetores e pragas que surgem no pois coloca em pauta pública a local. Neste caso, o projeto Mesa Sonecessidade de olhar para os moradores de rua, e mesmo outras lidária tem como função realizar famílias que sofrem com falta de uma ordem de logística na distrirecursos devido às crises geradas buição, propondo a descentralipela pandemia. Em contrapartida, zação e diminuindo os possíveis a ONG também destaca o fato de prejuízos a serem causados em que o projeto pode prejudicar e Curitiba. Criando um espaço mais limitar o trabalho feito por eles e arejado e com benefícios para os por outras ONGs com o mesmo moradores de rua se alimentarem. objetivo. A Rango de Rua anda por várias A justificativa do projeto de lei regiões de Curitiba, vai diretamen-


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te a quem precisa. E acreditam que ao estabelecer um ponto fixo, os moradores de rua precisam se deslocar, o que pode implicar em distância, na perda de seus pertences, da sua própria moradia, e outras particularidades. É utilizado como argumento que as doações realizadas pelas ONGs acarretam desperdício de comida, por conta de exageros que podem ocorrer. A resposta do Rango de Rua para essa justificativa é: “Quem nunca foi a um restaurante e deixou comida no prato? Sempre pode ocorrer de alguém não comer toda a refeição doada, como também vai ter aquela pessoa que acaba comendo duas,” e ainda creem que o projeto não vai erradicar de vez o desperdício de comida nas ruas. Ainda declaram que não irão se vincular ao programa, e assumem correr o risco de terem que interromper as atividades que realizam e consideram tão necessárias. Isso por não verem um bom motivo para a lei entrar em vigor, e acreditam que a Mesa Solidária precisa ser reformulada, como dar mais liberdade ao permitir a escolha de se cadastrar ou não, e sobretudo, não marginalizar outros projetos que realizam esse trabalho, mas

que optam por não se vincularem. A Prefeitura de Curitiba diz que a Mesa Solidária se trata de um conjunto de ações desenvolvidas pelo município nos últimos anos que se transforma, pelo projeto de lei, num programa formal da cidade. Visando melhorar a segurança alimentar da população vulnerável, contribuindo para o direito humano à alimentação adequada. A Prefeitura ainda garante que a participação da sociedade civil organizada é assegurada, entretanto precisa ser regulamentada e precisa seguir práticas de segurança alimentar para evitar riscos biológicos, químicos e físicos a um grupo populacional já exposto a agravos de saúde, que são as pessoas em situação de rua. Ainda segundo a Prefeitura de Curitiba, o projeto propõe coordenar as ações, mapeando e cadastrando entidades não governamentais que integram o ecossistema social de segurança alimentar de Curitiba. Para se cadastrar, é feito o pedido de identificação de instituições, CNPJ, experiência de um ano de existência, e de quanto tempo já faz a prática de distribuição de alimentos. Ao aderir ao programa, a entidade poderá usar a infraestrutura

(Foto: ONG Rango de Rua/ Os participantes do projeto)

(Foto: Luiz Costa /SMCS/Atendimento pelo Mesa Solidária)

(Foto: ONG Rango de Rua/ Cerca de 250 marmitas preparadas)

atual e futura do Mesa Solidária, bem como os restaurantes do Capanema, Matriz e o Centro POP Plínio Tourinho em Rebouças. Além de ter acesso ao Banco de Alimentos de Curitiba administrado pela Secretaria Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional (SMSAN), que também fica responsável em estabelecer datas, horários e locais. Segundo a SMSAN, são selecionados locais que possam oferecer boas condições de higiene, limpos e confortáveis. “O alimento servido em um local estruturado, que permita que pessoas socialmente vulneráveis possam sentar à mesa e comer com as mãos limpas, não apenas traz dignidade a essas pessoas, mas como também evita que haja acúmulo de resíduos orgânicos e rejeitos nas vias públicas, o que evita que traga riscos à saúde da população em situação de rua”,

relatou a entidade. Quando perguntado se o modo organizacional que formaliza uma nova estrutura logística de distribuição de alimentos por Curitiba não prejudicaria ONGs e o número de doações anônimas pela capital e região metropolitana, a SMSAN comentou: “O projeto de lei deixa claro, no artigo 14, que a lei não se aplica a ação executada individualmente que não vise ao atendimento coletivo. Ou seja, não proíbe a doação de refeições por nenhum cidadão. O marco regulatório tem como objetivo reduzir o desperdício ou a carência de alimentos decorrente das ações realizadas pelas entidades. A adesão ao Mesa Solidária é voluntária e o projeto de lei não prevê criminalização ou multas”, relatou o órgão responsável pela infraestrutura do projeto Mesa Solidária.


Restaurantes curitibanos moldam as cozinhas para enfrentar a pandemia no ano de 2021 Culinária curitibana produz releitura para chegar até o consumidor. João Vitor

Acredito que o “boom” do delivery é algo temporário, restaurantes são lugares para celebrar e restaurar. Enquanto estamos no meio da pandemia é uma tendência. Passando tudo isso creio que a ferramenta delivery volta a ter uma função de praticidade”, relata o chefe Igor Marquesini, que trabalha na cozinha desde 2011. Além de um ano tão fora da rotina de pessoas se alimentarem nas ruas pelo Brasil, os restaurantes tradicionais de Curitiba e região metropolitana estão se reinventando para servir seus pratos ao consumidor que está mais conectado do que nunca na internet. De acordo com dados da empresa alemã especializada em dados de mercado e consumidores o Statista, divulgou que o Brasil teve grande destaque no segmento de serviços de delivery, chegan-

do a 48,77% em 2020 na América Latina, as previsões apontam que o setor poderá movimentar aproximadamente US$ 6,3 trilhões de dólares no mundo. Por consequência essa marca chama atenção de restaurantes que mudam os processos de venda de seus pratos pela cidade. Em compensação conversando com o chefe de cozinha Giuliano Daroit Secco, que trabalha com a culinária a 13 anos, relata como os restaurantes curitibanos vem modificando suas estruturas de atender seus clientes, além de realizar as entregas de delivery e takeaway, Giuliano apresentou mais pontos que vêm sendo produzidos na hora de levar o almoço ou a janta para o cliente que encomenda comida hoje pela internet, quando perguntado sobre o cenário, o cozinheiro comenta “Com detalhes na apresentação mesmo

(Foto: cedida pelo próprio entrevistado/ Igor Marquesini)

(Foto: cedida pelo próprio entrevistado) comenta o chefe de cozinha de em caixinhas e pacotes. Detalhes Curitiba. nas embalagens, frases, cartões, A gastronomia de Curitiba seflores, comida sempre quentinha gue com a sua reforma na culináe sempre tudo com aspecto boni- ria, constantemente, mas possui to. Queremos que o cliente se sinta destaque imensurável na cozinha acolhido pelos detalhes.” Relata o italiana e japonesa, além dos fachefe de cozinha. mosos pratos como a tradicional Curitiba a cidade modelo que carne de onça que não pode falvisa em trabalhar o arquétipo do tar em grande parte dos restautradicionalismo e misturar com rantes pela capital, durante anos o moderno urbano, procura essa recebendo diversas releituras na mesma missão na culinária curiti- cozinha, mas é claro, hoje a gasbana, não só trazendo o regional, tronomia de Curitiba, tem uma mas indo além de tudo que pode- façanha enorme de agradar todos mos ver no Brasil. Hoje essa culiná- os curitibanos que desejam comer ria é cercada por comidas que em- além do tradicionalismo brasileiro preendem um estado de gourmet ou europeu, Giuliano Daroit come não gourmet, traz pratos como a plementa que tem notado outras gastronomia molecular, simples e visibilidades surgindo por Curitiba, diversificada, com arranjos da culi- discorre “As que me chamam atennária argentina, do uruguaia, ita- ção tem sido na parte de alimenliana, francesa, libanesa e chinesa. tação saudável, panificação arteQuando questionado também sanal e cozinhas autorais, temos sobre se reinventar na pandemia alguns bons destaques surgindo.” a partir do momento que a culi- Descreve Daroit. nária curitibana passa pela etapa Já Igor Marquesini chefe prode entrega de comidas até o clien- prietário a 4 anos revela que na te, indo direto para o consumidor, pandemia a forma de se destacar Giuliano ressalta “Passamos as fa- contra a concorrência está sendo ses, delivery, encomendas, retira- impressionante “Estamos sempre das no balcão. Aprendemos muito tentando inovar, por exemplo no e as lições são valorizar a qualida- serviço, na comida, no ambiente. de de entrega, seja nas embala- Durante os lockdowns tivemos 2 gens, inovação de produto, formas operações diferente do que fazede pagamento. Tudo que facilite a mos, uma foi pratos para finalizar venda e ajude a controlar custos em casa e outra foi um delivery de sem prejudicar a comida/bebida”, sanduíches”, comenta Marquesini.


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Antiga casa de artista curitibano é reformada, se transforma em complexo cultural e recebe sua primeira exposição Localizado na Rua São Francisco 179 o conjunto foi totalmente revitalizado, com novo estilo e proposta, atrai não somente pessoas mas também investidores. Franker Júnior e Bruno de Sá

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ntiga residência e ateliê do escultor curitibano Ricardo Tod, famoso pela Fonte da Memória no largo da ordem, popularmente conhecida como “Cavalo Babão”, é restaurada por iniciativa de empresários, que transformaram o local em multiespaço. Localizado na Rua São Francisco 179, o espaço traz uma variedade de opções para quem passa por lá, como o café Royalty Coffee, o restaurante Tijolo CWB, a loja de impressão de camisetas NØS TEE Factory e a Soma Galeria, que agora atende em novo endereço. Fui a São João da Guanabara e lembrei de você”, é o nome da exposição do artista João Fasolino, que está em exibição na galeria Soma até o dia 22/05. Essa é a primeira exposição que a galeria recebe desde ter deixado seu antigo endereço, e marca uma longa parceria entre artista e galerista. A principal proposta do trabalho é criar um estado fictício que mistura uma intersecção entre arquitetura, floresta e pessoas. João é carioca e mudou-se para São Paulo para estudar artes, quando começou a pintar era frequentemente perguntado: Qual lugar você prefere pintar, Rio ou Sampa? Então João decidiu começar um projeto que houvesse uma quebra nesses preceitos, fazendo uma mistura entre conceitos para que se possa abrir espaço para possibilidades. O nome “Fui a São João da Guanabara e lembrei de você”, vêm São, de São Paulo; João porque é meu nome; Guanabara ao antigo estado da Guanabara (Rio de Janeiro) e lembrei de você, pelo visitante ter vindo e visto a exposição, é por isso, explica ele. A partir do momento que pessoas vem ver, “turistar” e experienciaras pinturas,

esse estado deixa de ser fictício e se torna real, pois esse lugar existe, está aqui e agora, enfatiza João. A exposição conta com diversas telas, algumas esculturas, diversos ornamentos dispostos ao longo da sala e um vídeo, a entrada é gratuita. A galeria fica aberta das dez horas da manhã às sete da noite, todos os dias exceto domingos, para entrar o visitante deve pres-

sionar o interfone que fica ao lado preservando em alguns espaços da entrada, em um portão laranja. a lembrança da antiga casa do esO espaço em meio ao cen- cultor, como o restaurante Tijolo tro histórico de Curitiba, busca CWB, que fica localizado dentro proporcionar para seus clientes do antigo forno da ferraria, com a sensações e experiências únicas. decoração que remete uma fornaDo início ao fim, você encontrará lha e tem até um desenho do próempreendimentos que conversam prio Ricardo Tod, o famoso Cavalo entre si e que fazem o lugar contar Babão. uma história. A restauração trouCom um atendimento que acoxe mudanças significativas, mas lhe as pessoas, os profissionais que formam o time da casa, fazem um papel de extrema soma na hora de falar sobre o seu local de trabalho, comenta Franciana Fatima, umas das atendentes do salão,“nesses espaços, tem várias coisas acontecendo em um só lugar, essa é a ideia,ter um funcionamento integrativo”. Além de propor uma experiência visual muito atrativa, os seus colaboradores acreditam e vendem produtos que são de iniciativas locais, como a cerveja Swamp, fazendo um papel de extrema importância para o crescimento econômico e que agrega muito valor ao conjunto que é exposto ao público. “A cidade precisa da gente” comenta Mário Nicolau, um dos sócios do espaço, expondo sobre as mudanças significativas que o centro urbano vem trazendo para a região curitibana. Arte, café, moda e oxigenação para a localidade onde se encontra, respeitando a comunidade e a história que cada lugar conta e pode contar para todos que ali transitarem, mantendo viva as memórias que ali nasceram. Com um olhar futurista, a ideia é terminar de preencher os espaços vazios e desenvolver um projeto arquitetônico, englobando até a regeneração da rua, com uma escala de outros empreendedores que estão por vir ou que já se encontram aos arredores. (Foto: Frankner Júnior/ Fachada do complexo.)


Festival de cinema em película super 8 é resistência em tempos de pandemia e receberá edição inédita em 2021 A data ainda não está definida, mas deve ser na primeira quinzena de novembro, diz Antônio Carlos Domingues, produtor cultural e Coordenador Geral do Festival Curta 8 em Curitiba. Bruno de Sá e Frankner Júnior Idealizado por Leandro Bossy Schip, que infelizmente nos deixou em 2016, o Curta 8 surgiu em 2005, inicialmente como Mostra de Curtas em Super 8 de Curitiba. Em 2008,com o patrocínio da Caixa Cultural, o evento passou a denominar-se “CURTA 8 - Festival Internacional de Cinema em Super 8 de Curitiba”. Em 2021 o CURTA 8 chega na sua 17ª edição, como o mais antigo festival em atividade de Curitiba, um dos principais da América Latina dedicados exclusivamente ao culto desta bitola, e sendo o evento de cinemaSuper 8 mais longevo realizado ininterruptamente no mundo. Um festival de filmes em super 8 representa uma forma diferenciada de expressão cultural além de ser uma opção diferente de entretenimento. Isto porque o público dificilmente tem acesso a este tipo de filme, pois, diferente das mídias digitais, um filme super 8 originalmente possui sua imagem gravada em uma película fotográfica, com uma única cópia, e esta carece de um projetor específico para que o filme possa ser exibido. Desta forma, o Festival é a maior, se não a única, ponte de acesso do público a estes filmes.

Outro ponto importante é a relevância histórica que o super 8 carrega como primeira forma de democratização do cinema em todo o mundo. Fazer cinema sempre foi uma expressão artística restrita em virtude de dificuldades técnicas como estrutura de produção, material fotográfico de difícil manipulação e custos elevados. A produção de filmes em super 8 no Brasil teve uma grande importância durante toda a década de 1970. Ocorreram diversos núcleos regionais de produção, que foram marcados por uma grande gama de gêneros cinematográficos, dos mais tradicionais aos mais experimentais. O Paraná, junto a Bahia, Pernambuco, São Paulo e Rio Grande do Sul, figurou entre os grandes produtores de filmes em super 8, naquele período. E Curitiba catalisou o grosso da realização superoitista do estado. Importante ressaltar que grande parte dos realizadores que começaram a fazer seus filmes utilizando-se dessa nova tecnologia, tornaram-se profissionais e construíram sólida carreira no audiovisual paranaense e brasileiro. Havia crescente efervescência em torno das

(Foto: Giuliano Andresso)

produções realizadas em super 8. Consequentemente, os superoitistas aglutinaram-se em torno de circuitos que exibissem seus filmes, criando redes alternativas ou se utilizando de espaços em mostras consagradas ao cinema 35 mm e 16 mm. Os festivais tiveram um papel fundamental para que a movimentação em torno do super 8 se desenvolvesse, reunindo centenas de realizadores, com uma certa regularidade durante toda a década de 1970. Bella Souza é produtora cultural e participa da equipe de produção do festival Curta 8, conta mais detalhes sobre o evento na entrevista: O que é feito no festival? Existe uma época do ano,

que abrimos inscrições para pessoas que tenham um roteiro de filme (curta metragem), com três minutos e quinze segundos, que é a duração máxima do rolo da película de super 8. É feito uma curadoria desses roteiros, que é realizada pelo Fabio Allon, Ivan Cordeiro e Flávio Rocha. É selecionada algumas pessoas, em média de 10 a 15 filmes para a produção desse material, o festival oferece oficinas para os selecionados aprenderem a captar essas imagens no super 8, é disponibilizado todo o material necessário para o desenvolvimento dos curtas, além de todo conhecimento de usabilidade e de como produzir nesse formato. Como são equipamentos an-


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O festival recebe investiproduzidas em super 8, tendo várias coisas que saíram mos? No início do festival, o indessa proposta e tomaram vestimento era feito pelos proporções inimagináveis. Por ser um festival inter- criadores da ideia, sem ajunacional, acaba que temos da financeira externa. Com contato com pessoas do expressivo crescimento e nemundo inteiro, tendo uma cessidade de expansão, foi troca não só de conhecimen- enviado o projeto para um tos global, mas uma conver- edital de incentivo para culsão de material, que a gente tura, que foi aceito e durante não encontra mais no Bra- muitos anos a Caixa cultu(Foto: divulgação Curta 8) tigos, e acaba sendo muito dos curtas assistem as suas sil, inclusive, durante muito ral começou a patrocinar o difícil a compra das câmeras produções, gerando uma tempo a revelação dos filmes, evento. Incentivo esse, que e cartuchos para a realiza- emoção enorme, porque eram feitas no exterior, por foi extinto, por conta das ção do evento, a maioria dos eles não sabem se ficou bom, falta de lugares que forne- transformações que aconaparelhos são emprestadas se conseguiram capturar as cem esse serviço, agregando teceram, subsequentes ao por parceiros e produtores imagens que queriam ou se ainda mais a pluralidade que atual governo que está no poder, não só vetando o fesdo festival, é uma coisa ana- de fato foi gravado alguma conseguimos alcançar. tival super 8, mas sim para a “A galera trazia na bagalógica, então é de fato para coisa. quem gosta. “Já tivemos casos que na gem projetor, câmera e rolo área artística no geral. Como foi produzir uma Como é trabalhar com um hora de projetar o filme, só de super 8, fazia escambo, equipamento analógico? tinha uma tela preta e não troca, conserto de equipa- edição na pandemia? O corona vírus, trouxe Como é analógico, e não apareceu nada, porque na mento, então tinha uma tromuitas mudanças na socieca bem gostosa no final das tem o visor da câmera para hora de gravar, a pessoa não dade, e o festival não passou saber o que está sendo fil- conseguiu imprimir a ima- contas” ileso por esse momento de mado, a hora que começa a gem na pelicula da câmera” pandemia, a décima sexta gravar, não temos ideia neQual a contribuição do edição foi feita totalmente nhuma do que está sendo festival como produtor de no on-line. Não é a mesma capturado, então não sabe- oficinas? coisa, porque o curta 8, tem mos se o enquadramento Tem uma coisa que aconum intuito de ser um festival está bom, se a iluminação tece, que acabou crescendo muito presente, estamos faestá legal, isso acaba sendo com o festival, foi a produção lando de um projetor de cia magia do super 8. Duran- de filmes em super 8, então nema, uma coisa muito tante o festival, temos a oficina a gente acabou construindo gível, é você ouvir o “tec-tec” de tomada única, que pode um acervo de um material, (barulhinho que o projetor ser produzida em sequencia em um suporte que é muito faz). Mas que trouxe suas ou capturas separadas, mas raro e muito difícil de se ter. peculiaridades, por trazer filcom o intuito de edição na Apesar de ser um produto mes que foram produzidos hora da gravação, por inter- analógico e complicado de em película e colocados em médio da própria câmera. ser encontrado, acaba tenuma plataforma totalmente O mais empolgante, é que do essa ideia de que é algo digital. todo esse material produ- antigo e é correlacionado “Fazer um festival super 8, zido nas oficinas, é enviado a filme “velho”, mas a gente de uma forma totalmente para revelação e só é ex- tem uma galera que produz on-line, foi o encontro do veposto nos dias que o festi- conteúdos de extrema qualho com o novo, da vanguarval acontece para o público, lidade. Já tivemos de filmes que é quando os criadores experimentais a animações (Foto: Frame do Filme Jamaica Jamaica/ 14º edição) da com a modernidade.”


Curitiba revive o Paranismo com a inauguração do Memorial João Turim no Parque São Lourenço João Turim, Romário Martins e outros artistas e intelectuais da década de 20 lideraram o Paranismo, numa tentativa de criar um senso de identidade e orgulho paranaense através de obras que contemplaram a história e os símbolos da cultura do estado. Juliana Mattos Bueno

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rincipal artista do movimento Paranista, João Turim - que dá nome ao memorial paranista inaugurado em Curitiba em maio de 2021, era filho de imigrantes italianos, nascido em Morretes em 1878, aos pés do Marumbi como ele mesmo dizia - por isso tanto apreço pela natureza em suas obras. Mudou-se para Curitiba para estudar na faculdade de belas artes, onde recebeu uma bolsa para estudar em Bruxelas. Foi ferreiro e entalhador de madeira, o que o direcionou também para as esculturas. Retornou para Curitiba onde confeccionou uma das mais importantes obras do seu legado: o monumento ao Índio Guairacá, uma representação, segundo Turim, do dono da terra. Faleceu em Curitiba em 1949 e deixou diversas obras de cunho paranista que podem ser conferidas no novo Memorial Paranista João Turim. De acordo com Felipe Tkac, Coordenador de Ação Educativa do Memorial Paranista, Investigar a

(Foto: Juliana Mattos/ Obra Marumbi de João Turim) vida e obra de artistas como João sino da arte no estado. Muitos ex- garimpeiros foram levados até Turin, Langue de Morretes ou de in- poentes do movimento, por exem- a praça Tiradentes pelo cacique telectuais como Romário Martins é plo, se envolveram na criação da Tindiquera da tribo Tingüi - natitarefa indispensável para entender Escola de Música e Belas Artes do va da região, e que chegando lá o como nasceu uma percepção dis- Paraná, além de terem deixado im- cacique fincou sua lança na terra e tinta de identidade regional e uma presso na topografia urbana seus disse: Curi-Tiba, que na língua Tupi produção cultural até então inédi- simbolismos como as calçadas de quer dizer muito pinhão. Não há ta na capital e no estado do Paraná, petit-pavé estilizadas ou escultu- um registro exato da data, mas o estabeleceu uma “tradição” de en- ras nos logradouros públicos nos pelourinho foi erguido no marco quais aparecem diversos elemen- zero de Curitiba bem antes da data tos sobre o passado local. oficial da fundação da cidade em A descoberta da capital foi fru- 29 de março de 1693, esta data reto de uma expedição de Ébano fere-se na realidade à fundação da Pereira, que partiu de Paranaguá Câmara Municipal, que era ainda serra acima em busca de mais vinculada à província de São Paulo. ouro até as margens do Rio Atuba, De acordo com o historiador onde hoje é o Bairro Alto, forman- Gehad Hajar, até a emancipação do a chamada Vilinha - atualmente em 1853, o Paraná não existia, há no local um monumento em Curitiba era uma comarca de São homenagem a essa passagem da Paulo, e por isso, perdemos muito história. Permaneceram ali nas da nossa identidade local, perdemargens do Atuba até que o ga- mos nossos nomes, todos os nosrimpo se tornou insatisfatório e o sos grandes expoentes iam à São local muito encharcado, dificultou Paulo para estudar ou fazer polítio cultivo de alimentos, por isso, ca, e nesse interim, perdemos domudaram-se para o marco zero cumentos importantes e grandes da capital, onde hoje é a praça Ti- intérpretes da nossa história. Além (Foto: Juliana Mattos./ Calçadas de Curitiba com pinhões e pinheiros.) radentes. Reza a lenda que esses disso, em 1870, a vinda de imigran-


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tes europeus ao Paraná contribuiu para que a identidade local fosse ofuscada também pelas culturas europeias que aqui se instalaram definitivamente. Neste contexto, o movimento Paranista é criado para demonstrar que o Paraná era um estado novo, independente, progressista que não dependia de São Paulo para prosperar, uma forma de reafirmação do paranaense. Nascido em 1874, o historiador, jornalista e político curitibano Alfredo Romário Martins, entusiasta de sua terra natal, foi incumbido de preservar a memória do Paraná, assim como a denominação paulista, chamou o movimento de Paranista, apropriando-se do mesmo sufixo. Precursor no registro da história paranaense, sua obra História do Paraná de 1899, foi considerada a história oficial do estado pelo seu reconhecimento científico, exercendo grande influência na construção da identidade parana-

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ense. Em 1905, foi ele quem idealizou o brasão de Curitiba com o pinheiro araucária ao centro, usado até hoje, fundou ainda o Instituto Histórico e Geográfico do Paraná e dirigiu o Museu Paranaense por 23 anos. De acordo com o historiador Geraldo Leão, professor da UFPR e pesquisador do Paranismo, Romário Martins cria junto com Lange de Morretes, João Turim, Alfredo Andersen, Theodoro de Bona, Erbo Stenzel, Arthur Nízio, entre outros artistas paranaenses da década de 20 e 30, uma espécie de mitologia paranaense, uma noção de Paraná tradicional, retratando um Paraná típico e característico que até então não existia. Passaram a reproduzir em pinturas, esculturas e na arquitetura símbolos paranaenses estilizados como pinheiros, pinhas, pinhões, indígenas, a erva mate, entre outros. Sendo as décadas de 20 e 30 de grande efervescência

(Foto: Juliana Mattos/ Obras de Ida Hannemann, Rogério Dias e Poty Lazarotto)

(Foto: Juliana Mattos/ Ilustração Paranaense, Homem Pinheiro de João Turim)

cultural, Romário Martins fazia o ção da obra Homem Pinheiro de intermédio entre os artistas, arte- João Turim. De acordo com o professor Gesãos e pintores que eram oriundos de famílias de imigrantes mais po- raldo Leão, a obra Homem Pinheibres, com a população mais abas- ro associava o homem paranaense tada, grande parte provenientes aos pinheiros fortes, poderosos dos engenhos de erva mate, uma e grandiosos, um outro exemplo elite paranaense que encontraria dessa associação segundo o proagora a sua própria identidade nas fessor, é a estátua da Praça 19 de Dezembro conhecida como Praobras de arte locais. Outro meio de difusão das ça do Homem Nú, encomendada ideias e obras paranistas era a re- pelo governador Bento Munhoz da vista Ilustração Paranaense, criada Rocha Neto ao artista Erbo Stenzel em conjunto com os intelectuais em 1953 para simbolizar o homem e artistas da época, foi editada e paranaense grandioso, dando um dirigida pelo fotografo e cineasta passo à frente dos outros estados, João Baptista Groff, com a primei- olhando para o futuro. Em Curitiba, encontram-se em ra edição publicada em 1927. Nela é possível verificar uma excelente obras mais contemporâneas, ouqualidade gráfica para a época, tros simbolismos do nosso estado, com tipografias e ilustrações sofis- artistas que influenciados pelo Paticadas dos símbolos do estado, a ranismo, atualizam numa mesma (Foto: Juliana Mattos/Marco zero de Curitiba, Catedral na Praça Tiradentes) revista trazia em sua capa a ilustra- temática a identidade paranaense.


10 coisas que te farão entender a cultura musical curitibana Conheça o gosto musical do curitibano que vai do clássico ao rock. Débora Reusing e Mahara Gaio

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cidade de Curitiba já foi palco de grandes apresentações internacionais como Paul McCartney, Iron Maiden e The Killers, através dos festivais: ‘TIM festival’ e o extinto ‘Curitiba Rock Festival’. .A origem dessa Cultura musical curitibana tem traços baianos. A primeira escola musical instalada na cidade foi regida pelo baiano Ricardo Pereira do Nascimento Jacarandá e teve sua fundação em 1856. O músico curitibano, Nilceu Oliveira explica que se surpreende com a receptividade do público curitibano com a música instrumental “acredito que isso se deu com a entrada de novos músicos no jazz e na música instrumental, assim como um novo público que está realizando esse movimento artístico na cidade. Isso é muito bacana, ver a música instrumental sendo bem aceita em Curitiba”. Ele revela também que o momento mais marcante em sua carreira foi a participação no ‘Curitiba Jazz

Festival’, em 2018, “tocar nesse festival foi uma das minhas maiores realizações”. Mas atualmente, o setor musical tem sofrido com a chegada da pandemia. O professor da Escola de Música e Belas Artes do Paraná (Embap), Marco Aurélio Koentopp acredita que a pandemia gerou muito impacto negativo ao setor, pois muitos eventos foram cancelados. O músico Nilceu Oliveira conta um pouco do que está vivendo “está complicado se manter como músico em meio a pandemia, em 2018 estávamos em um auge do movimento da música instrumental, ela vinha se propagando de forma crescente em locais alternativos, não só nos bares, tentamos nos manter com lives e meios online, mas não foi o suficiente”. Os festivais e shows tiveram que se adaptar a uma nova realidade online, o Curitiba Jazz Festival, que era realizado de forma presencial, em 2021 inovou usando a ver-

(Foto: Mahara Gaio/ Músico Nilceu Oliveira e Reinaldo Soares)

(Foto: Mahara Gaio/ Músico Nilceu Oliveira e Reinaldo Soares)

são do evento em live pocket, que que mais da metade dos músicos foi realizado do dia 5 de maio ao não conseguem se enquadrar na dia 8 de maio e do dia 13 ao dia 15 parte burocrática dos editais” comde maio. Contemplou ao todo 10 pleta o músico Nilceu. O compositor e cantor Paulo atrações curitibanas e gerou mais de 1800 visualizações em todo o Hilário homenageou a grande Curitiba através da música de sua evento. A cidade conta com um órgão autoria ‘Curitiba é bonita de mais’, especifico destinado à cultura, a o grupo Tesão Piá, também presFundação Cultural de Curitiba, tou homenagem através da músique possui um setor administrati- ca ‘Curitiba minha linda’ e seguinvo da área musical, o Instituto de do a mesma linha o artista Diogo Curitiba de Arte e Cultura (ICAC), Portugal com a paródia I Love sendo ele o promotor de diversos Curitiba. Para finalizar o texto em granincentivos a esse segmento cultural: Camerata Antiqua de Curitiba de estilo segue uma última curiosi(coro e orquestra), Conservatório dade. A cantora Carol Conka, com de MPB, Orquestra à Base de So- estilo próprio a artista usa em suas pro, à de Corda, Vocal Brasileirão e composições o racismo, machisCoral Brasileirinho, além da Escola mo e acontecimentos pessoais, a de Música e Belas Artes do Paraná finalista do programa The Voice e a Orquestra Sinfônica do Paraná Kids Rafa Gomes, shows por todo que são mantidas pelo governo o Brasil, ao lado de grandes artisdo estado e a Filarmônica da UFPR tas como Carlinhos Brown, Thiago Iorc, Ivete Sangalo, Premantida pela universidade. O professor Marco Aurélio acre- ta Gil e no final de 2016 participou dita também que por mais que a em um dueto com Roberto Carlos cidade tenha bastante cultura mu- em seu especial e o vocalista da sical ainda falta um pouco de pa- banda Capital Inicial, Dinho Ouro trocínio. “existem editais de apoio, Preto são curitibanos. Aposto que mas é muito burocrático, acredito essa você não sabia.


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Saiba os motivos dos curitibanos serem conhecidos mundo afora Venha conhecer a Grande Curitiba, seus charmes e peculiaridades. Débora Reusing

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uritiba também é conhecida como a capital Ecológica e Cidade Modelo, pelo grande uso de transportes coletivos, alta taxa de área verde e pelo, na época, inovador projeto do lixo que não é lixo. Desde a década de 70 é lembrada internacionalmente como um lugar onde se tem uma boa qualidade de vida, preocupada com a sustentabilidade e riquíssima de belas paisagens. O povo daqui não tem (Foto: Vera Martins) sotaque, mas falamos ‘leitE quentE’, nem se fala das gírias: piá, guria, não é mesmo? O mais famoso é o de influência diretamente nessa vina, japona, penal, trincheira, lar- Jardim Botânico e o Parque Barigui, questão, Curitiba é uma cidade reguei os bets, djanho, entre muitas muito lembrado pelas suas masco- lativamente alta, além da latitude que favorece o clima subtropical outras. Além dos vícios linguísti- tes, as capivaras que vivem por lá. “Aqui temos as quatro estações úmido”. cos, daí e tipo. Também somos a Prêmios permitem os Curitibacapital do cachorro quente, são do ano em um dia só”, explicou a Amanda quando questionada sonos falarem de boca cheia que momais de 500 carrinhos licenciados, bre o clima da cidade, uma frase ram na melhor cidade do país, esse mas lembrando, aqui usa-se vina e bem popular entre os moradores. mérito foi dado pela revista Istoè, não salsicha. O especialista Engenheiro Hidróloem 2015 e um prêmio da Agência A moradora do bairro Santa Fego Arlan Scortegagna, do Simepar, Austin Ratings, além do prêmio de licidade, Amanda Reynaud, acreexplica porque isso ocorre “esse cidade mais verde, pelo relatório dita que a melhor parte da cidade ditado circula, porque o clima, nada Siemens, também em 2015. são os parques, “todos maravilhoturalmente, tem uma variabilidade Em Curitiba não há metrô e sos, se eu pudesse passaria o dia alta ao longo de um mesmo dia. As mesmo assim sua mobilidade urali. Eles nos permitem ter contato temperaturas podem baixar muito, bana é uma forte característica. Na com a natureza de um jeito incrível”. São 33 parques espalhados chover, e fazer sol no mesmo dia. década de 70, foi desenvolvido um pela capital, totalizando 19,25 Coisa que não ocorre em regiões sistema de transporte inovador, km², o que corresponde a 4,42% de clima tropical típico”. Entre utilizando vias expressas exclusida área total. O primeiro parque os turistas o dizer que circula é vas para a passagem de ônibus em surgiu em 1886, o Passeio Público, que a capital é fria, o especialista suas principais ruas. Em seguida localizado no Alto da XV. Mas não do Simepar explica o motivo das na década de 80 foi criado o sisteé o mais conhecido, contraditório temperaturas amenas “a altitu- ma de tubo que estão localizados no lugar dos pontos, mas na altura das portas dos ônibus, onde os passageiros compram suas passagens antes de entrar no transporte. Os BRTs (transporte rápido por ônibus, sigla em inglês) também se tornaram ícones, tendo em vista que grandes cidades como São Paulo sofrem diariamente com o transporte, mas para os Curitibanos são conhecidos como Ligeirinhos. Atualmente, aproximadamente 300 cidades usam esse sistema criado aqui na capital. Além de toda essa parte natural e de mobilidade Curitiba possui (Foto: Vera Martins)

(Foto: Vera Martins)

muitos outros encantos. São 75 bairros, cada um com seu charme. Santa felicidade centro da gastronomia Italiana, o bairro Água Verde, carrega um grande tradicionalismo histórico, o Batel, com sofisticada arquitetura, restaurante e bares, bairro Cristo Rei, onde está localizado o Jardim Botânico, ponto turístico da cidade e o bairro São Francisco e Centro, com a tradicional feirinha do Largo da Ordem. O morador da cidade gosta de ‘inventar moda’ o bairro Champagnat que na verdade é um apelido bonito do bairro Bigorrilho, Ecoville, mas um apelido, o bairro é Mossunguê. Avenida das Torres também não existe, seu nome é Avenida Comendador Franco, o terminal do Pinheirinho fica no Capão Raso e o do Capão Raso no Novo Mundo, além de muitas outras invenções curitibanas. Uma das mais atuais notícias que circularam mundo a fora que estava vinculada a Curitiba foram as reportagens da Lava a Jato, que foi sediada em Curitiba, com o Juiz Sérgio Moro. Operação contra a corrupção e lavagem de dinheiro que teve início em 2014.


Todos os rios de Curitiba estão poluídos, segundo levantamento da ONG SOS Mata Atlântica Apesar do título de capital ecológica recebido em 1990 pela ONU, a captação de água pela Sanepar para abastecimento da capital paranaense vem massivamente da região metropolitana. Juliana Mattos Bueno

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sistema hidrográfico de oxigênio (DBO), coliformes fecais, Curitiba é formado por temperatura, pH, nitrogênio total, 6 das 30 sub-bacias do fósforo total, sólidos totais e turAlto Iguaçú (sentido nascente-foz): bidez. Desta avaliação classifica-se bacia do rio Atuba, bacia do rio Ba- a água numa escala entre Ótima / rigui, bacia do rio Belém, bacia do Boa / Regular / Ruim / Péssima. rio Ribeirão dos Padilha, bacia do A ONG SOS Mata Atlântica corio Passaúna e a bacia do próprio letou amostras em 102 cidades em rio Iguaçú. 17 estados brasileiros, o relatório De acordo com o Departamen- apontou que todas as bacias hito de Recursos Hídricos e Sanea- drográficas dentro do município mento da Secretaria Municipal do de Curitiba foram avaliadas como Meio Ambiente, o IQA - índice de ruins ou péssimas, sendo o Rio Bequalidade da água, avalia a qua- lém o mais poluído. Desta forma, lidade da água bruta visando seu nenhum dos rios da cidade atenuso para o abastecimento público, de os requisitos para o consumo após tratamento. O principal fator da população, mesmo após trataconsiderado no cálculo do IQA mento. é a contaminação causada pelo De acordo com o plano munilançamento de esgotos domésti- cipal, o SIAC – Sistema Integrado cos, mais precisamente avalia-se de Abastecimento de Curitiba – da os níveis de oxigênio dissolvido onde é captada a água para con(OD), demanda bioquímica de sumo, é massivamente composto

(Foto: Campanha programa da prefeitura de Curitiba)

por rios e poços situados na região metropolitana e limítrofes: O crescimento desordenado da capital paranaense impede que seja realizado o devido planejamento de saneamento básico, o correto seria que todas as edificações fossem ligadas corretamente à rede coletora de esgoto, para que

(Foto: Franklin de Freitas / Diego Saldanha)

este fosse tratado e somente após o tratamento, voltasse aos rios. No entanto, segundo observações de moradores, isso não acontece pelo seguinte: Ligações irregulares de esgoto: edificações despejam esgoto diretamente no solo ou nos rios – isso ocorre por não ter infraestrutura de rede coletora de esgoto na região, ou porque os responsáveis não querem ou não tem condições de pagar a taxa de esgoto à Sanepar, tendo ainda que arcar com a infraestrutura para a ligação do esgoto da residência à rede coletora. Ocorre também quando o esgoto é, por imperícia, ligado à rede pluvial (captação de água da chuva que vai direto para o rio) ao invés de ser ligado à rede coletora de esgoto. Acúmulo de lixo – Todo lixo jogado no chão acaba nos rios, lixos domésticos são descartados no leito do rio ao invés de serem entregues à coleta de lixo municipal - isso pode ocorrer por descaso e falta de consciência ambiental, ou porque ainda há localidades onde a coleta de lixo não chega. Ainda há casos de pessoas que depositam clandestinamente caliças de obras nas margens e dentro dos rios, o que gera acúmulo de mate-


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riais e metais pesados no fundo do curso d’agua. Ainda há a poluição difusa, quando a água da chuva traz para os rios resíduos do asfalto como óleos, fuligem e também outros resíduos químicos como industriais, material de limpeza e óleo de cozinha – este também por falta da instalação de caixas de gordura. Segundo o professor do curso de Engenharia de Recursos Hídricos e Ambiental da UFPR, Cristóvão Fernandes, a urbanização e o mau uso do solo estão diretamente ligados à qualidade da água, estamos no limite entre a oferta e a demanda. O tratamento de esgoto não é suficiente para a demanda gerada e assim acontece a degradação, pois o esgoto é lançado nos rios. O Amigo dos Rios é um amplo programa que surgiu com o Plano Municipal de Saneamento Básico, em dezembro de 2017, e o novo contrato de saneamento de Curitiba, firmado em junho de 2018 com a Sanepar. O novo contrato garante investimentos de R$ 3,5 bilhões em 30 anos, além de repasses para

o Fundo Municipal de Saneamento Básico, que financia ações como a limpeza dos rios, drenagens e desassoreamentos, canalizações, fiscalização, ações de educação ambiental, visitas técnicas, sensibilização dos moradores e criação de comitês locais, Revitalização do Rio Belém, revitalização de redes coletoras de esgoto, obras de readequação ou substituição das redes antigas – priorizando regiões que sofrem com enchentes. A Secretaria Municipal de Meio ambiente destacou, através de nota, que o contrato do programa também propicia mudança de conceito porque não visa apenas ampliar o atendimento com rede coletora, mas garantir o uso efetivo do sistema de esgotamento sanitário para que de fato os rios urbanos sejam conservados. Enquanto não chega a vez do rio Atuba, Diego Saldanha, morador da divisa de Curitiba com Colombo, faz o que pode para salvar o rio que passa aos fundos da sua casa onde nadava quando criança. Dentre as diversas ações que tomou por conta própria, estão a instalação de eco barreiras que fazem

(Foto: Diego Saldanha/ Museu do lixo retirado do Rio Atuba)

(Foto: Google Maps - Rio Bacacheri, bairro Tarumã)

a contenção de todo o lixo que vem boiando pelo curso do rio. Quando acumula uma certa quantidade de lixo, Diego faz a retirada com uma cesta de cabo longo. Ele ressalta que não é só montar a barreira, tem que fazer a manutenção, limpar e destinar o lixo de forma correta. Diego mantem na sua garagem o que denominou de Museu do Lixo, onde guarda os objetos mais inusitados que retirou do rio Atuba como microondas, tv, capacetes e até um celular. Recebe grupos de alunos que, após conhecerem as eco barreiras, visitam o museu que visa a conscientização ambiental. Com ajuda da família e vizinhos, Diego promove mutirões para plantar mudas de árvores frutíferas nas margens do rio para revitalizar a mata ciliar. Mais recentemente, iniciou a retirada de metais pesados: Um imã potente amarrado a uma corda é arremessado ao fundo do rio atraindo peças de metais - que por serem mais pesadas ficam depositadas ao fundo. Com a chamada pesca magnética, Diego vem retirando não só o lixo da superfície, mas também os metais que ficam submersos. Diego tem ajudado a vizinhança na construção de eco fossas com bananeiras – forma de tratar

esgoto na permacultura, e também outros tipos de fossas ecológicas através de doações solicitadas pelas redes sociais. Com as eco barreiras Diego já tirou 5 toneladas de lixo do rio Atuba e desabafa: “Existe uma grande diferença entre as pessoas que questionam e aquelas que efetivamente se manifestam para mudar uma situação. Um pouquinho que seja talvez, se todo mundo fizer, pode se tornar uma grande ação, tem muita coisa que a gente pode fazer a diferença no lugar onde a gente mora” Com as mudanças climáticas e as recentes estiagens na região de Curitiba, sendo necessário rodízios de abastecimento de água por longos períodos, não podemos desperdiçar. Cidades muito mais antigas e tão populosas quanto Curitiba já despoluíram os rios como o Rio Sena em Paris, o rio Tamsa em Londres – que são mais conhecidos, mas aqui no Brasil também já tivemos sucesso na despoluição do rio Jundiaí por exemplo, basta uma ação coordenada do poder público aliada a comunidade. A terra lhe dá a água que sacia a sua sede, e você, o que dá em retribuição? Água doce, de qualidade, é um recurso finito, seja você também um amigo dos rios, faça a sua parte, cobre e dissemine essa ideia.


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