Ofensiva Socialista n°22 - setembro 2014

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Jornal da LSR

Seção brasileira do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT)

Tendência do PSOL

N° 22 • setembro 2014

Votar PSOL 50 e retomar as ruas na luta por:

Marina não é alternativa pág. 03

Nacionalizar a luta contra as demissões na indústria pág. 05

Pelo direito à educação, saúde, ✔✔transporte e moradia

✔✔Taxação das grandes fortunas Auditoria e suspensão do ✔✔pagamento da dívida pública para os grandes capitalistas

Reforma agrária contra o ✔✔latifúndio e o agronegócio à criminalização das lutas ✔✔eNão dos movimentos sociais - pelo

direito de lutar por mais direitos

PRESIDENTA

Luciana Genro 50

GOVERNADOR-RN

Prof. Robério Paulino 50

Não às privatizações! Reestatização ✔✔das empresas privatizadas! Estatizar os bancos e o ✔✔sistema financeiro sob

controle dos trabalhadores

Contra todo o tipo de opressões: ✔✔machismo, racismo e homofobia da jornada de trabalho ✔✔eRedução aumento dos salários! Representantes de trabalhadores ✔✔com salário de trabalhadores, contra a corrupção e privilégios

Proibir empresas de fazer ✔✔doações eleitorais

1989: Quando “Lula lá” significava outra coisa pág. 06-07

“Vamos ganhar de volta o Sintaema para os trabalhadores” pág. 08

DEPUTADO FEDERAL-RJ

Paulo Eduardo Gomes 5001

✔✔

DEPUTADO ESTADUAL-RJ

Renatinho 50001

Por uma sociedade onde a produção esteja a serviço das necessidades do povo trabalhador e em harmonia com o meio ambiente. Por um socialismo democrático!

Erupção contra o racismo nos EUA pág. 09

Como parar a chacina em Gaza? pág. 10

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2 • editorial

A

morte trágica do candidato presidencial Eduardo Campos alterou radicalmente o cenário eleitoral brasileiro. Ninguém sairá ileso e não é exagero dizer que o processo eleitoral recomeça quase do zero. Campos buscava credenciar-se como terceira via diante da polarização entre PT e PSDB. Tentaria mostrar-se como oposição a Dilma, mas ainda vinculado ao que houve “de bom” com Lula, diferenciando-se dessa forma de Aécio. Provavelmente não teria tempo e estrutura suficiente para crescer nas intenções de voto e ameaçar seus adversários de maior peso. Ainda assim, ficaria como opção burguesa de médio ou longo prazo. Com Marina Silva no lugar de Campos, o cenário é outro. Antes impedida de assumir papel protagonista por ser apenas inquilina na legenda de propriedade de Campos, Mari-

Ofensiva Socialista n°22 setembro 2014

Desmascarar Marina e denunciar Dilma e Aécio

caráter reacionário presente na candidatura de Marina, em particular seu compromisso com as políticas neoliberais

Por uma alternativa de esquerda construída nas ruas na não podia utilizar plenamente o cacife eleitoral construído desde 2010 quando obteve quase 20% dos votos. Como candidata presidencial no lugar de Campos, ainda mais em meio à comoção criada por sua morte trágica, o potencial de crescimento de sua suposta terceira via é muito maior como já demonstram as pesquisas.

●● Pelo direito à cidade para os trabalhadores e o povo! Tarifa zero nos transportes públicos! Estatização do sistema de transporte com controle democrático dos trabalhadores e usuários! Pelo direito à moradia garantido a todos e todas! Nenhum corte nos gastos e investimentos sociais! Mais investimentos na qualidade do transporte e serviços públicos! ●● Dinheiro público para saúde e educação e não para os estádios e obras da Copa! 10% do PIB para a educação pública já! 10% do PIB para a saúde pública já! ●● Reforma agrária controlada pelos trabalhadores com fim do latifúndio! Não à usina de Belo Monte! Em defesa do meio ambiente e do direito à terra para as comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas! Fim do massacre dos sem-terra e indígenas! ●● Aumentos salariais de acordo com a inflação! Congelamento dos preços dos alimentos e tarifas públicas! Redução da jornada de trabalho sem redução de salários! Fim do fator previdenciário e anulação da reforma da previdência. Não às

é uma publicação da Liberdade, Socialismo e Revolução

M

arina é hoje uma ameaça real tanto a Dilma como Aécio e já começa ser uma opção seriamente avaliada pelo grande capital nacional e estrangeiro. A candidata do PSB/Rede tem a imagem de algo novo que permite o diálogo com as camadas profundamente insatisfeitas com o sistema político. Ao mesmo tempo, su-

as posições conservadoras em relação aos direitos das mulheres, população LGBT, etc, junto com seus vínculos com setores evangélicos reacionários abrem caminhos no campo oposto a esse. Essa ambiguidade pode ser vantajosa eleitoralmente apenas se não for desmascarada. É tarefa da esquerda socialista arrancar a máscara e mostrar o

O que a LSR defende:

terceirizações e precarização das relações de trabalho!

●● Contra o estatuto do nascituro em tramitação no Congresso! Pela legalização do aborto! Pelo fim da violência contra a mulher! Contra as propostas de reforma trabalhista e da previdência que visam retirar direitos da mulher trabalhadora! Salário igual para trabalho igual! Por mais verbas para a implementação da Lei Maria da Penha! Contra toda forma de opressão às comunidades LGBTT! ●● Pelo direito democrático de manifestação! Não à criminalização dos movimentos sociais e à repressão! Liberdade e fim dos processos sobre os manifestantes! ●● Basta de violência policial racista nas periferias! Desmilitarização e controle popular sobre a polícia! Combater o racismo nos locais de ensino, de trabalho e na sociedade. ●● Não pagamento das dívidas interna e externa aos grandes capitalistas para garantir os recursos ne-

cessários para os serviços públicos e o desenvolvimento econômico com igualdade social! Auditoria das dívidas controlada pelas organizações dos trabalhadores! ●● Reestatização das empresas privatizadas por FHC, Lula e Dilma com controle democrático dos trabalhadores! Estatização do sistema financeiro e grandes empresas que controlam a economia sob controle dos trabalhadores! ●● Pela reconstrução das ferramentas de luta da classe trabalhadora, independentes dos governos petistas e da direita tradicional. ●● Construir a CSP-Conlutas como central sindical e popular, democrática, classista e de luta, que sirva como base para a construção de uma nova Central unitária de todos os setores combativos e independentes de patrões e governos. ●● Construção pela base de espaços democráticos amplos para unificar as lutas. Por um Encontro Nacional dos Movimentos em Luta!

Telefone: (11) 3104-1152 E-mail: lsr@lsr-cit.org Sítio: www.lsr-cit.org Facebook: www.facebook.com/lsr.cit Correio: CP 668 - CEP 01031970 - SP Assinatura: 10 edições: R$ 25 reais

O PSOL deve dizer em alto e bom som que não há nova política possível com Marina aliando-se a políticos tucanos e petistas e mantendo a mesma política econômica. Denunciar Marina e seu papel de segunda via do PSDB, porém, não deve servir para fomentar qualquer ilusão em um voto no mal menor supostamente representado por Dilma.

O

caminho é aprofundar os vínculos da campanha do PSOL com as lutas e os movimentos sociais e acumular forças para a resistência necessária diante dos ataques que se aprofundarão ganhe quem ganhe, no campo da burguesia, as eleições desse ano.

●● Pela construção de novas relações entre aqueles que lutam, baseadas na solidariedade de classe, democracia e respeito às divergências. ●● Por um PSOL afinado com as ruas: de luta, socialista e radicalmente democrático. Por candidaturas do PSOL a serviço das lutas e com um programa socialista. Qualquer representante público do PSOL deve viver com salário de trabalhador. Pela construção da Frente de Esquerda nas eleições e nas lutas. ●● Por um governo dos trabalhadores baseado na democracia das ruas, na mobilização de massas dos trabalhadores e da juventude e com um programa socialista! ●● Por uma economia democraticamente planificada, onde a produção e os serviços, preservando o meio ambiente, estejam voltados aos interesses de toda a população e não uma pequena elite privilegiada. ●● Por uma Federação Socialista da América Latina e um mundo socialista.

Colaboraram nessa edição: André Ferrari, Cacá Melo, Carla Queiroz, Cristina Fernandes, Dimitri Silveira, Eljeer Hawkins, José Afonso da Silva, Marcus Kollbrunner, Miguel Leme, Nayara Del Santo, Niall Mulholland, Rômulo Abreu, Silas Barboza


eleições • 3

Ofensiva Socialista n°22 setembro 2014

Marina não é alternativa Por uma alternativa anticapitalista e socialista nesta eleição

IBGE, na qual Dilma demitiu 189 trabalhadores. Do lado dos tucanos não foi diferente. Em São Paulo e Minas Gerais a truculência foi utilizada para impor a política do PSDB. No caso paulista vale lembrar a forte repressão aos metroviários promovida por Alckmin e que culminou com a demissão de 42 trabalhadores. As prisões forjadas de Fábio Hideki e Rafael Lusvarghi também marcaram o governo tucano. Merece destaque ainda a histórica crise de abastecimento hídrico, que está deixando milhões de pessoas, em sua grande maioria pobres, sem água em algumas regiões paulistas. O que é pior, não há solução a curto prazo para esse grave problema; pelo contrário, ele tende a se agravar no próximo período. Ainda que os trabalhadores e jovens não tenham passado por uma experiência sob um governo de Marina Silva, há motivos de sobra para ter certeza que ela governará assim como tucanos e petistas.

A entrada de Marina Silva na corrida presidencial embaralhou a disputa eleitoral, trazendo incertezas sobre quem estará à frente do governo a partir de 2015. De acordo com recente pesquisa realizada pelo Ibope, o nome de Marina aparece com 29% de intenção de votos, 10 pontos a frente de Aécio Neves (19%). Dilma segue em primeiro lugar com 34%. No segundo turno, a mesma pesquisa aponta que Marina venceria as eleições com 45% contra 36% de Dilma. Dimitri Silveira candidato a deputado federal pelo PSOL-SP Quando foi candidata a presidente em 2010, Marina Silva teve mais de 19 milhões de votos (19,4% da porcentagem total), ficando em terceiro lugar nas eleições daquele ano. Marina sabe como explorar as aspirações dos descontentes com a política, e tem usado isso a seu favor. Surfando na onda do sentimento anti-partido e aproveitando-se dos temas ambientais, a ex-petista está tentando fundar a Rede Sustentabilidade, um partido que tem medo de dizer que é partido. Em seu discurso, Marina diz representar a “nova política”, mas seu projeto está longe de ser algo novo.

Marina não é alternativa Para concorrer às eleições deste ano Marina Silva filiou-se ao PSB, um partido da direita tradicional que abriga em seu interior usineiros, figuras reacionárias como Paulo Bornhausen e também oligarquias familiares. A equipe que está assessorando Marina em seu programa econômico conta com Eduardo Giannetti, um neoliberal que já afirmou que existe uma forte convergência entre o PSB e o PSDB e propõe manter o famigerado tripé econômico baseado em metas de inflação, câmbio flutuante, ajuste fiscal e, além disso, a autonomia do Banco Central, uma exigência dos banqueiros e especuladores financeiros. Não é à toa que setores do mercado financeiro começam a ver com bons olhos a candidatura de Marina, pois estão se convencendo que ela “beija a cruz do mercado”. O compromisso da candidata do PSB com o sagrado mercado trará sérias consequências aos trabalhadores e jovens na medida em que cortes nas áreas sociais como saúde e educação serão realizados para garantir o lucro dos banqueiros e grandes empresários, assim como faz Dilma atualmente. Segundo Giannetti, é necessário fazer “ajustes duros”. O resultado disso será a precarização ainda maior dos serviços públicos e a piora da qualidade de vida para a maioria da população. O vice de Marina é Beto Albu-

O PSOL como alternativa anticapitalista e socialista Marina é incapaz de dar cara nova à velha política querque, um homem com laços no agronegócio e que recebeu a missão de minimizar o perfil ambientalista de Marina, que, aliás, já se comprometeu em implementar o novo Código Florestal da bancada ruralista, criticado por ambientalistas e movimentos do campo por significar um tremendo retrocesso nas leis ambientais brasileiras. Em 2004 Albuquerque esteve envolvido na aprovação do cultivo de soja transgênica no Brasil. Marina Silva, que era contra os transgênicos, passou a defendê-los a partir de 2008, cedendo à pressão dos ruralistas. De acordo com Marina e Beto Albuquerque, o pacto com o agronegócio está selado.

Marina rifou o meio ambiente Quando ainda era ministra do Meio Ambiente Marina Silva fechou os olhos (e a boca) em relação à política antiambiental do então governo Lula. A transposição do rio São Francisco, antes criticada por Marina, passou a ser defendida em público pela ministra, contrariando as reivindicações das comunidades ribeirinhas e movimentos sociais, que defendiam a revitalização do São Francisco ao invés da transposição. Ainda como ministra, Marina fez vista grossa sobre as usinas de Jirau e Santo Antônio, levadas adiante por Lula e que trarão prejuízos ecológicos e humanos na região da bacia do rio Madeira. Em relação aos direitos democráticos, Marina representa o retrocesso. É contra o casamento igualitá-

rio e contra a legalização do aborto. Ligada à igreja evangélica, a atual candidata saiu em defesa de Marco Feliciano (PSC), notório deputado federal homofóbico e racista que presidiu a comissão de direitos humanos da câmara dos deputados, dizendo que Feliciano foi duramente atacado por ser evangélico e não pelas ideias que defende. Ao defender Feliciano, Marina tenta deslegitimar a pauta de reivindicações do movimento feminista, negro e LGBTT, criando a falsa ideia que o objetivo seria atacar os evangélicos. Marco Feliciano não foi criticado por ser evangélico, mas por defender, entre outras coisas, a “cura gay” e afirmar que “os negros são amaldiçoados”.

Dilma, Aécio e Marina são mais do mesmo Embora Dilma e Aécio sejam os candidatos mais confiáveis da classe dominante brasileira, ambos representam projetos que já se mostram esgotados. Desde as manifestações de junho do ano passado Dilma não conseguiu recuperar sua popularidade e figura como a candidata com maior índice de rejeição, 34%, seguida por Aécio Neves, com 18%. O governo petista foi marcado por privatizações, isenção de impostos para grandes empresas, sucateamento dos serviços públicos, estagnação e inflação na área econômica, forte repressão às manifestações contra os crimes da copa, criminalização dos movimentos sociais e ataque ao direito de greve, como foi o caso da greve do

Os problemas econômicos e sociais do país não terão solução sob a lógica e os interesses dos grandes capitalistas. Para garantir lucros bilionários dos bancos e construtoras os governos de plantão retiram verbas dos serviços públicos, contribuindo para o sucateamento de escolas, hospitais, centros de assistência social, etc. Não é a toa que grandes empresas são as maiores financiadoras das campanhas do PT, PSDB, PSB, PMDB etc. A verdadeira alternativa, portanto, pressupõe que a prioridade de um governo seja com os trabalhadores e jovens, não com empresas. Por este motivo o PSOL defende a auditoria e suspensão do pagamento da dívida pública, para que a riqueza produzida pelo país seja destinada à maioria da população. Acrescentamos que os setores chaves da economia deveriam passar para o controle público e a economia deveria ser democraticamente planificada para que se possa decidir onde investir e o quanto investir. Para sediar a copa do mundo, por exemplo, quem decidiu tudo foram os empresários e os governos, garantindo enormes lucros às empresas ligadas ao evento, mas nenhum benefício para a população. Numa situação de estagnação econômica e alta da inflação pela qual está passando o Brasil neste momento, o controle democrático sobre a economia torna-se ainda mais necessário, pois as medidas adotadas até agora pelos governos e grandes empresários estão agravando o problema ao invés de superá-lo. Vote nos candidatos do PSOL e venha construir conosco a luta pelo socialismo.

05 de outubro

vote 50! Conheça nossos candidatos: Rio Grande do Norte GOVERNADOR

Professor Robério Paulino 50 site: roberio50.com.br facebook.com/RoberioPaulinoPSOL DEPUTADA ESTADUAL

Sônia Godeiro

50555

facebook.com/soniagodeiropsol Rio de Janeiro DEPUTADO FEDERAL

Paulo Eduardo Gomes 5001

site: pauloeduardo.org facebook.com/pauloeduardogomes.psol DEPUTADO ESTADUAL

Renatinho 50001 site: renatinhopsol50001.com facebook.com/renatinhopsol DEPUTADA FEDERAL

Mariana Cristina

5090

site: maricris5090.wordpress.com facebook.com/maricris5090 DEPUTADO ESTADUAL

Professor Luciano

50072

professorluciano50072.wordpress.com facebook.com/professorlucianopsol São Paulo DEPUTADO FEDERAL

Professor Dimitri

5068

facebook.com/ProfessorDimitri5068 DEPUTADO ESTADUAL

Marzeni 50060 facebook.com/Marzeni50060 DEPUTADA ESTADUAL

Raquel Guzzo

50600

facebook.com/raquelslguzzo Paraná DEPUTADO FEDERAL

Vinicius Prado

5000

facebook.com/viniciuspradopsol www.viniciuspradopsol.com.br Minas Gerais DEPUTADO ESTADUAL

Jorge Metalúrgico

50050

facebook.com/Jorge-Metalúrgico Sergipe DEPUTADO FEDERAL

Odair 5001


4 • educação

Ofensiva Socialista n°22 setembro 2014

Avançar na unificação das lutas pela educação Entre os dias 8 e 10 de agosto, ocorreu o Encontro Nacional de Educação (ENE) na cidade do Rio de Janeiro. O ENE contou com a participação de mais de três mil ativistas de todo o país. Impulsionado pela CSP-Conlutas, pelo ANDES-SN e pelo Sinasefe, o encontro contou ainda com a participação de entidades como a Oposição de Esquerda da UNE, SEPE-RJ, Cpers, Anel, Coletivo Construção, Fenet, entre outras. Dimitri Silveira Educadores Socialistas na Luta Apesar dos problemas organizativos, o ENE foi um passo adiante para construir a luta em defesa da escola pública.

Contra a privatização da educação O ENE ocorreu num ano marcado por um forte ataque contra a educação pública brasileira, que veio na forma do Plano Nacional da Educação (PNE), aprovado recentemente pelo congresso e sancionado por Dilma. Trata-se de um aprofundamento da privatização do ensino no Brasil. Quem ganha com o PNE de Dilma são os empresários, que enxergam a educação como uma mercadoria capaz de gerar enormes lucros às custas dos cofres públicos. Exemplo disso foi o nascimento

da companhia brasileira Kroton, maior empresa de educação privada do mundo, com 1,5 milhão de alunos e 125 unidades. Considerada a mais nova integrante do grupo das vinte maiores empresas brasileiras, ao lado da Petrobras, da mineradora Vale, da cervejaria Ambev e dos grandes bancos, a Kroton é uma gigante que depende do dinheiro público para se manter. No total, 35% da receita da Kroton depende diretamente de financiamentos do governo federal, como o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). O PNE, ao não especificar que os 10% do PIB aprovados para educação deveriam ser investidos exclusivamente na educação pública, demonstra seu caráter privatista. Dessa forma, vai garantir mais dinheiro aos empresários da educação, ao mesmo tempo em que as escolas públicas carecem de investimento e tornam-se cada vez mais sucateadas.

Em defesa do ensino público de qualidade Foi para combater a privatização da educação e reivindicar o ensino público de qualidade que milhares de pessoas se reuniram no Encontro Nacional de Educação, defendendo 10% do PIB para a Educação Pública, Já! O encontro foi dividido em sete eixos temáticos que discutiram o financiamento da educação, passe livre e transporte público, demo-

Três mil ativistas se reuniram no Rio de Janeiro para discutir a defesa de uma educação pública de qualidade para todos cratização da educação, avaliação e meritocracia, privatização e mercantilização da educação, precarização das condições de trabalho e acesso e permanência. Ao final do encontro, aprovou-se a Carta do Rio de Janeiro, um manifesto que sistematiza os sete eixos temáticos e indica a constituição de comitês estaduais em defesa da escola pública. A carta também convoca a realização, nos estados, de um dia de luta em defe-

sa da educação pública na segunda quinzena de outubro e, por fim, propõe a realização do II Encontro Nacional de Educação em 2016, precedido de encontros estaduais.

ENE poderia avançar mais Muitas lutas pela educação pública no Brasil ocorreram nos últimos anos em diversos estados. Destacam-se a greve no ensino pú-

blico superior federal de 2012, as ocupações da reitoria da USP e as greves da educação básica em São Paulo e Rio de Janeiro, além de outras cidades e estados, onde os trabalhadores em educação protagonizaram greves históricas em 2013 e 2014. Entretanto, essas lutas foram realizadas de forma fragmentada. Por este motivo, em muitas delas, não foi possível derrotar os ataques dos governos e garantir conquistas. Em vista disso, a organização em nível nacional dessas lutas se faz necessária e urgente, sobretudo a partir de 2015, quando os governos atacarão duramente os serviços públicos como saúde e educação com novas contrarreformas neoliberais. Diante desses ataques que certamente virão, um novo encontro de educação deveria ocorrer já em 2015, com a participação de mais entidades, ligadas ou não à educação, que fosse melhor organizado e contasse com mais tempo de discussão e elaboração de propostas. Dessa forma, seria possível construir uma poderosa luta nacional unificada para barrar os ataques dos governos e conquistar direitos. Esta luta unificada deveria exigir, por exemplo, que os diversos governos cumpram de forma imediata a Lei do Piso do magistério, garantia de autonomia e democracia nas instituições de ensino, fim das avaliações externas, 10% do PIB exclusivamente para a educação pública a partir de já, direito de greve, entre outras reivindicações.

Luta e repressão na DASAN/UFF A adesão da UFF ao REUNI fez com que a graduação em Sociologia fosse desmembrada do curso de Ciências Sociais no Instituto de Ciências Humanas e Filosofia (ICHF). Silas Barboza e Rômulo Abreu diretores do DASAN e militantes do Coletivo Construção Tal projeto de expansão não garante real estrutura para os novos cursos e novos estudantes. Problemas como falta de professores, de salas de aula, de bolsas de assistência estudantil, são corriqueiros na UFF, o que faz com que a chamada “democratização da educação superior” seja um projeto de precarização e sucateamento das instituições de ensino públicas. Prova desse sucateamento é o que está sendo vivido pelos estudantes, técnicos e professores do Instituto de Biologia da UFF, que se encontram paralisados: o prédio onde funciona o curso está interditado, com risco de desabamento! O prédio apresen-

mento de ocupação. No dia 17 de maio foi realizada a reintegração de posse da sala. O processo não só finalizava a ocupação, como também tornava réu o estudante e membro do Coletivo Construção, Rômulo Abreu! O militante, que é negro e LGBT, foi o único a ser processado, a pedido da direção do ICHF.

ta, desde 2009, problemas como rachaduras. A previsão de entrega do novo bloco era em 2011 e até hoje a obra não está finalizada.

Estudantes expulsos da moradia A Reitoria não encontrou saída para a situação. Recentemente negou que uma reportagem sobre o caso fosse filmada no campus. Os estudantes da Biologia não são os únicos indignados. Os moradores da Moradia Estudantil travam uma luta por qualidade na unidade, que enfrenta falta de água e alimentação. A própria permanência na Moradia está em cheque: treze estudantes estão prestes a ser expulsos por não terem atingido um desempenho acadêmico considerado satisfatório. Isso mostra que o acesso à assistência estudantil, além de limitado, também está condicionado à meritocracia. O Coletivo Construção defende um projeto de expansão das universidades construído por fóruns amplos de educadores e estudan-

Atividade na DASAN ocupada tes e que preze pela manutenção da qualidade do ensino, pesquisa e extensão, mantendo seu caráter público e gratuito, assim como políticas de permanência, por meio de assistência estudantil, para todos que necessitem.

#OcupaDASAN O curso de Sociologia se depara com diversos dos problemas citados acima. Dentre eles, está a falta de espaço físico para o diretório acadêmico. Após diversos requerimentos a resposta sempre era a de esperar. Porém, os estudantes de Sociolo-

gia, depois de dois anos e meio na espera da inauguração de um bloco, decidiram pelo ato político legítimo de ocupar uma pequena sala para sediar o Diretório Acadêmico de Sociologia Abdias do Nascimento – DASAN. A ocupação proporcionou aos estudantes um espaço para se organizarem com qualidade. A ocupação promoveu atividades com professores apoiadores do movimento, cine-debates e diversas reuniões e assembleias sobre o curso e sobre a UFF. O que os estudantes de Sociologia não esperavam era que a direção do ICHF fosse judicializar o movi-

Estudante sendo criminalizado Rômulo responde a tal processo na Justiça Federal e também a um processo de sindicância interno da UFF, onde pode perder a matrícula. Repudiamos tal ato de perseguição política promovido pela direção do ICHF e pela Reitoria da UFF! O Governo Federal e a Reitoria não têm compromisso com a qualidade da educação e visam somente figurar bem em escalas meramente quantitativas. Mas a comunidade acadêmica diz não a esse projeto! Os estudantes combativos, oposição ao DCE atrelado à UNE e à Reitoria, veem cada vez mais a necessidade de se organizarem e lutar pela UFF.


nacional • 5

Ofensiva Socialista n°22 setembro 2014

Nacionalizar a luta contra as demissões na indústria balhadores. Entendemos que a recusa do sindicato em aceitar a suspensão temporária do contrato de trabalho foi correta. Caso contrário, seria repetir um dos erros da luta que foi travada em 2012.

A economia está freando rapidamente e podemos ter um ano com crescimento abaixo de 1%. Apesar da taxa de desemprego ainda estar baixa no país, já vemos a indústria começar a demitir. Isso coloca a necessidade de combater essa ofensiva e construir uma alternativa às demissões, que irão atingir fortemente as famílias de trabalhadores – muitas das quais já estão endividadas.

Nacionalizar a luta contra as demissões da GM

Miguel Leme Executiva nacional da CSP-Conlutas Uma explicação para o índice de desemprego já não ter começado a crescer é a desistência de uma parte da população desempregada em procurar trabalho. Segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) do governo federal, foram criados apenas 11.796 postos de trabalho em julho. É o pior resultado dos últimos 15 anos. No caso do setor automotivo, ao invés da criação de empregos, houve a demissão de 7,3 mil trabalhadores nos últimos sete meses. Destes, 750 são da região de Itajubá-MG: 500 da Mahle e 250 da Delphi. Além destas empresas, a PKC Group comunicou aos seus 500 funcionários que fechará a fábrica de Itajubá em dezembro deste ano. As justificativas das montadoras e das empresas de autopeças para as férias coletivas, demissões, suspensão temporária do trabalho (lay-off) e até o fechamento de fábricas tem sido a redução das vendas de carros neste último ano e sua repercussão no lucro das empresas. Entretanto, esta última justificativa não é verdadeira.

Menos carros, mais lucros As vendas de veículos tiveram uma redução de 7,3% entre janeiro e junho deste ano. Entretanto, o preço do carro zero subiu no mesmo período, apesar da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). De acordo com um levantamento feito pela consultoria Oikonomia, o preço médio dos automóveis aumentou 6% no primeiro semestre deste ano, para R$ 47,8 mil. Um ano antes, o valor médio estava em R$ 45,1 mil. A maior discrepância entre vendas e faturamento, de acordo com a consultoria Oikonomia é da Ford. A receita da montadora foi de R$ 7 bilhões em seis meses, uma elevação de 5,4%, sendo que houve uma redução de 7,5% em suas vendas. Em 2013, a Oikonomia já havia registrado o mesmo movimento de

É preciso intensificar a luta contra as demissões e fechamento de fábricas alta no faturamento mesmo com queda nos emplacamentos de novos veículos. Nas contas da consultoria, a receita das montadoras no Brasil cresceu R$ 3,3 bilhões em 2013, indo para R$ 161,3 bilhões, mesmo com o recuo de 1,6% nas vendas durante o ano.

Redução do IPI não gera emprego Segundo levantamento do jornal O Estado de São Paulo, desde o início da crise econômica internacional em 2008 até janeiro de 2014, o Governo Federal transferiu R$ 12,3 bilhões para as montadoras através da redução do IPI. A maior desoneração ocorreu em 2013: R$ 4,5 bilhões. Entretanto, um estudo de dois

Segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) do governo federal, foram criados apenas 11.796 postos de trabalho em julho. É o pior resultado dos últimos 15 anos.

economistas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Alexandre Porsse e Felipe Madruga, comprovou que estas reduções só serviram para retirar recursos dos setores sociais, como saúde e educação e garantir o lucro das montadoras. De acordo com o estudo, as reduções tiveram um impacto muito pequeno sobre o produto interno bruto (PIB) e sobre o emprego na economia brasileira entre 2010 e 2013. Segundo os pesquisadores, entre 2010 e 2013, a contribuição da desoneração do IPI dos automóveis para o PIB e o emprego foi praticamente nula: 0,02% e 0,04% ao ano, respectivamente.

GM planeja demissões em São José dos Campos Em 2012, o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e os trabalhadores da GM travaram uma luta contra as demissões da montadora. Entretanto, essa luta não foi vitoriosa: no final de 2013, 687 trabalhadores foram demitidos. Essas demissões ocorreram mesmo depois do sindicato ter aceitado a suspensão temporária do trabalho e assinado um acordo muito ruim em janeiro de 2013, que reduziu o piso salarial e autorizou a implementação de uma jornada de trabalho flexível. Na época, nós da LSR, colocamos que a única possibilidade de barrar tal ataque seria através de uma política de nacionalizar a luta contra as demissões da GM. Isso se daria através da construção de um Fórum Nacional de Lutas mais amplo a partir das lutas que estavam sendo rea-

lizadas, como a greve histórica dos servidores federais e das entidades que, na época, faziam parte do Espaço Unidade de Ação. Entretanto, os companheiros que dirigem o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e que também são direção majoritária da CSP-Conlutas foram contrários a esta política, da mesma forma que se opõem hoje à realização de um Encontro Nacional dos Movimentos Sociais em Luta. Este Encontro teria as condições de apoiar as lutas que, neste momento, estão sendo realizadas de forma isolada, como é o caso da greve dos trabalhadores e estudantes das universidades paulistas, bem como coordenar e unificar as lutas que serão realizadas ainda este ano e em 2015. Neste momento, a GM ameaça novamente demitir centenas de tra-

Defendemos:

Entretanto, só isto não basta. É necessário impulsionar o que não foi feito em 2012: partir deste ataque contra os trabalhadores da GM e nacionalizar a luta contra todas as demissões que estão ocorrendo no setor industrial e, em particular, no setor automotivo. Para isso, é fundamental a construção de um espaço amplo que coordene e unifique as lutas contra as demissões, bem como contra outros ataques que estão previstos para o próximo período. Precisamos também construir um programa que mostre uma alternativa à logica capitalista em que só há emprego se houver lucro para empresários. A queda de venda de automóveis não se dá pela falta de necessidade, mas sim da possibilidade de fazer lucro. A questão do transporte é um dos temas centrais que atormentam a vida dos trabalhadores. Para nós, é urgente construir a transição de uma sociedade baseada no transporte individual e combustíveis fósseis. Isso significa investir na indústria de transporte e nos empregos, mas também desafiar a lógica do lucro para uma pequena minoria. Essa mudança de política pode começar pelas empresas que demitem e fecham fábricas, mesmo recebendo bilhões em subsídios e isenções de impostos, resgatando assim os empregos e a competência dos trabalhadores. As indústrias devem ser estatizadas sobre controle dos trabalhadores e readaptadas para construir carros elétricos, ônibus e outros veículos não poluentes, priorizando meios de transporte coletivo.

●● Redução da jornada de trabalho para 36 horas semanais, sem redução de salário. ●● Estab ilidade no emprego e proibição de demissões imotivadas (Convenção 158 da OIT). ●● Contra a redução de IPI ou qualquer outro benefício fiscal para as empresas. ●● Proibição de demissão para as empresas que receberam dinheiro público. ●● Estatização das empresas que demitirem em massa, sob controle dos trabalhadores. ●● Pela elaboração de um plano público para construção de meios de transportes de massa e não poluentes. Mais trens, metrôs e ônibus movidos com energia renovável e não fóssil.


6 • especial

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25 anos da campanha presidencial de 1989

Quando “Lula lá” significava outra co Há 25 anos aconteceram as primeiras eleições diretas para presidente da república realizadas no Brasil depois do golpe de 1964. Naquele momento, a campanha presidencial do PT e da Frente Brasil Popular, encabeçada por Lula, foi o ponto alto de um ascenso das lutas sociais e da esquerda que marcou toda a década de 1980. Hoje, diante da mudança de lado do próprio PT, ainda há lições a tirar para a esquerda que não quer seguir o mesmo caminho. André Ferrari As eleições de 1989 no Brasil aconteceram em um contexto de profunda crise econômica, social e política. O novo regime político que começava a ser construído a partir da Constituição aprovada em 1988, ainda estava marcado pelo continuísmo. O aparato repressivo, a política econômica subserviente ao FMI e os ataques aos trabalhadores herdados da ditadura se mantinham. À frente do governo, José Sarney batia recordes de impopularidade. O primeiro presidente civil desde 1964 só havia chegado ao poder em consequência da morte de Tancredo Neves, que havia sido escolhido indiretamente pelo Colégio Eleitoral. A chapa Tancredo/Sarney refletia o grande acordão entre a oposição burguesa moderada ao regime militar (PMDB) e setores oriundos do próprio regime. O acordo de amplos setores da burguesia em torno da escolha de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral representava a busca de uma transição segura, sem sobressaltos e sem mudanças radicais. Esses setores temiam o crescimento de um movimento pela base, protagonizado pelos trabalhadores, contra o regime burguês-militar.

Um ascenso operário e popular A partir do final dos anos 1970, a crise do modelo econômico da ditadura, em meio a uma crise generalizada do capitalismo, abriu um período de estagnação e altíssima inflação. Já nos anos 1980, a crise das dívidas colocou o país em total sub-

serviência aos ditames do FMI. Arrocho nos salários, cortes nos gastos públicos, desemprego e repressão. Essa era a resposta do general Figueiredo e continuou sendo a mesma de Sarney. Do ponto de vista dos que realmente carregavam nas costas o peso da crise, a resposta veio com as greves, mobilizações e a organização sindical de uma nova geração de trabalhadores nascida do intenso processo de industrialização e urbanização dos anos anteriores. No ABC paulista a fermentação da base metalúrgica encontrou uma direção sindical que, apesar de atuar sob uma estrutura sindical a serviço do peleguismo, acabou por encabeçar o processo de lutas. Na capital paulista e em outras regiões, foram os setores de Oposição Sindical que, em grande parte, jogaram um papel protagonista nas greves operárias. Nas periferias de São Paulo e outras grandes cidades, antes mesmo das greves do ABC, foram as mulheres da classe trabalhadora que foram à luta contra a alta do custo de vida e por serviços públicos como saúde, educação e transporte. Da mesma forma o movimento estudantil se reerguia, retomando as mobilizações já em 1977 apesar da repressão ainda existente. Desse processo de mobilização nasceram ou renasceram as grandes entidades dos movimentos sociais que dirigiram as principais lutas da década de 1980, como a CUT (1983), o MST (1984/85) e a UNE (reconstruída em 1979). Foi desse processo que também nasceu o Par-

tido dos Trabalhadores (PT), fundado oficialmente em 1980. A luta por salário, melhores condições de trabalho, redução da jornada, também por postos de saúde, escolas, linhas de ônibus, contra a carestia, ligava-se diretamente à luta por democracia, pela anistia aos presos políticos, por eleições diretas, por uma Assembleia Constituinte exclusiva e pelo fim do regime militar. Depois da onda de greves em todo o país a partir de 1978, que resultou na convocação da primeira greve geral pela Comissão Nacional pró-CUT em julho de 1983, o PT convoca em novembro do mesmo ano o primeiro comício por eleições diretas para presidente em frente ao estádio do Pacaembu (SP). No ano seguinte, já com a adesão da oposição burguesa ao regime militar, incluindo governadores de estado, a campanha das ‘Diretas Já’ assume dimensões multitudinárias. Milhões tomaram as ruas em todo o país.

Uma velha “Nova República” Antes mesmo da não aprovação no Congresso Nacional da emenda Dante de Oliveira, que estabelecia eleições diretas, a oposição burguesa encabeçada pelo PMDB em aliança com uma dissidência

do partido governista, a Frente Liberal (futuro PFL, depois DEM), já negociava uma saída controlada do regime militar através do Colégio Eleitoral. Nesse contexto, o PT não apenas recusou-se a participar do Colégio Eleitoral, denunciando a manobra da oposição burguesa, como ainda expulsou três deputados federais que se negaram a aceitar a linha do partido e votaram em Tancredo e Sarney. Com a morte de Tancredo antes mesmo da posse e a ascensão de José Sarney, o governo da chamada Nova República recusa-se a convocar eleições para uma Assembleia Constituinte exclusiva e acaba por transformar o Congresso eleito em 1986 em Congresso com poderes constituintes. Mesmo assim, a força dos movimentos sociais conseguiu fazer aprovar na nova Constituição promulgada em 1988 uma série de direitos sociais que os governos seguintes, até os dias de hoje, iriam incessantemente buscar revogar ou neutralizar. Baseado nas esperanças e ilusões diante do primeiro governo civil em mais de 20 anos e nas medidas heterodoxas na economia representadas pelo Plano Cruzado (congelamento de preços e salários, mudança da moeda e controle do câmbio), o PMDB de Sarney e Ulysses Gui-

marães obteve uma estrondosa vitória eleitoral em 1986, elegendo 22 governadores em 23 estados. Esse partido já havia conseguido um excelente resultado nas eleições municipais um ano antes. Mas, esse apoio foi efêmero. Depois do estelionato eleitoral de 1986, quando poucos dias depois da eleição o governo descongela os preços e a economia entra em colapso, o governo Sarney se afunda em uma profunda crise. A moratória da dívida externa que se seguiu não foi um ato soberano contra a banca internacional, mas uma atitude desesperada.

Crise do PMDB e avanço da esquerda Nas eleições municipais de 1988, o PT obtém uma importante vitória com Luiza Erundina em São Paulo, então uma candidata apoiada pelos setores mais à esquerda do partido, em meio à comoção causada pelo assassinato de três operários da CSN em Volta Redonda depois que o Exército foi enviado para reprimir a ocupação da siderúrgica em greve. Além da capital paulista, o PT venceu em outras duas capitais, Porto Alegre (RS) e Vitória (ES). O PMDB, por sua vez, perde 15 das 19 capitais conquistadas nas eleições de 1985. As eleições de 1989 acontecem

A Globo assumiu claramente o lado de Collor


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coisa nesse contexto radicalizado. O PT crescia e canalizava cada vez mais as esperanças de mudança.

Collor como o anti-Lula Diante da ameaça de Lula, mas também até certo ponto de Brizola, a burguesia passou a apostar suas fichas num aventureiro populista de direita construído artificialmente pelos meios de comunicação da classe dominante. Fernando Collor de Melo passou a ser o anti-Lula e, com a imagem de “caçador de marajás” forjada pela mídia, ganhou base social entre os setores mais desorganizados e pauperizados, além do apoio das classes médias mais conservadoras e da grande burguesia nacional e estrangeira. Lula superou Brizola no primeiro turno por uma pequena margem de votos e credenciou-se para disputar o segundo turno com Collor. Foram 16,08% para o candidato do PT e da Frente Brasil Popular (que incluía PCdoB e PSB) e 15,45% para o candidato do PDT. Uma diferença de menos de 500 mil votos. A base social do PT era fundamentalmente os setores mais conscientes e organizados da classe trabalhadora, amplos setores da juventude e parcelas mais radicalizadas das classes médias. A nova geração de trabalhadores formada com a industrialização recente e o crescimento do setor público não mantinha os mesmo vínculos políticos com o velho trabalhismo que permanecia residual em alguns estados (RJ e RS principalmente) e se expressava no Brizolismo.

Uma campanha de esquerda com contradições O ano de 1989 começou com uma grande greve geral de 48 horas convocada pela CUT para os dias 14 e 15 de março e que mobilizou 35 milhões de trabalhadores por todo o país. A greve foi contra as medidas do chamado Plano Verão do governo Sarney e sua política de arrocho salarial, desemprego, recessão e cortes. A campanha da Frente Brasil Popular (PT, PCdoB e PSB) foi mar-

cada pela denúncia do governo Sarney e das alternativas eleitorais da burguesia, apoio às lutas dos trabalhadores e a defesa de um programa então denominado de “democrático e popular”. Esse programa incluía importantes reformas no capitalismo (não pagamento da dívida externa, reforma agrária, desenvolvimento sobre novas bases de sentido anti-imperialista e antimonopolista) e reivindicava, ao menos em palavras, a construção de uma hegemonia dos trabalhadores que permitisse o avanço em direção ao socialismo. No contexto da queda das mobilizações antistalinistas no Leste Europeu e das reformas de Gorbatchev na antiga União Soviética, o PT era insistentemente identificado na mídia e nas campanhas da direita como representante do “atraso socialista” enquanto o mundo girava para o lado do mercado. Apesar de reiterar sua defesa de um socialismo democrático, de fato o PT não tinha uma resposta categórica e clara sobre os processos no Leste stalinista. A própria concepção de socialismo do PT era limitada e pouco conclusiva não armando a militância com uma clara estratégia de luta pelo socialismo. Pra completar, nos anos anteriores houve uma aproximação de setores dirigentes do PT com os partidos stalinistas daqueles e de outros países. A estratégia do programa e do governo “democrático e popular” também refletia uma visão essencialmente reformista da estratégia do PT. As reformas defendidas não estavam ligadas de forma clara a medidas de ruptura com caráter anticapitalista e socialista. O não pagamento da dívida presente no programa, por exemplo, não implicava necessariamente na estatização dos bancos e do sistema financeiro com controle dos trabalhadores.

Uma estratégia essencialmente eleitoral Além disso, apesar da grande ênfase na importância das lutas populares, a estratégia de poder do PT era essencialmente eleitoral. Tratava-se de eleger Lula e começar as transformações gradativamente am-

Uma campanha baseada na mobilização de rua e na luta da classe trabalhadora parando-se no apoio ativo dos trabalhadores. Porém, em um contexto internacional que já começava a ser mais difícil com o colapso da União Soviética e a ofensiva neoliberal, um governo de esquerda só poderia avançar em um país como o Brasil se apontasse para um caminho de ruptura e, dessa forma, ajudasse a compor uma relação de forças internacional mais favorável à esquerda. Caso contrário retrocederia e acabaria por se adaptar à lógica de administração do estado burguês. Elementos dessa situação ficaram claros nas administrações do PT em nível municipal. Desde as vitórias em Diadema (SP) e Fortaleza (CE) em 1985, passando pelas capitais São Paulo, Porto Alegre e Vitória em 1988, o PT enfrentou a contradição de administrar uma parcela do estado burguês e ao mesmo tempo questioná-lo. Mesmo com conquistas importantes em alguns casos, acabou prevalecendo a adaptação.

Pressão burocrática e parlamentar Além de um setor da burocracia sindical que foi radicalizada pela conjuntura e que existiu desde a fundação do partido, na medida em que o PT conquistava mandatos parlamentares e até do Executivo, crescia também no interior do partido uma camada burocrática vinculada diretamente ao Estado burguês. Cada vez mais prevalecia a vontade dos setores ligados aos mandatos e decrescia o peso dos núcleos de base e da militância ativa nos movimentos sociais. Esse processo foi qualitativamente agravado quando se iniciou um período de refluxo das lutas sociais, principalmente nos anos 1990. O refluxo refletia o cansaço da década anterior de intensas lutas e poucas vitórias e também a avassaladora ofensiva ideológica burguesa mundial com o colapso do mal chamado “socialismo real”. Além disso, um fator central foi a transformação na base material

da classe trabalhadora. A desindustrialização, a adoção de novas formas de gerenciamento da produção, a precarização das relações de trabalho, todos esses foram fatores que dificultaram a ação e a consciência classista. O PT foi incapaz de enfrentar essa situação mais complexa da classe e acabou por gradativamente abandonar a visão classista que marcou suas origens. Nesse contexto, o peso dos aparatos burocráticos e parlamentares tornaram-se absolutamente hegemônicos.

Derrota de Lula e giro à direita No final das contas, a derrota de Lula em 1989 se deu por uma margem incrivelmente pequena. No segundo turno, Lula obteve 31 milhões de votos (47%) enquanto Collor chegou aos 35 milhões (53%). Para a vitória de Collor foi fundamental o verdadeiro terrorismo midiático que se criou contra Lula e o PT. A conclusão que o setor majoritário do PT tirou da derrota de 1989, em um contexto de forte ofensiva ideológica neoliberal, é que o partido deveria moderar sua linha. O I Congresso do PT realizado em 1990 foi marcado por um importante giro à direita na linha política do partido. A ala esquerda do partido resistiu e posteriormente alguns desses setores chegaram até a ganhar posições internamente, dirigindo parcialmente a campanha eleitoral de 1994. Mas, na prática o giro à direita continuou até o salto de qualidade nessa mesma direção dado de 2002. Nesse momento, apesar das aspirações populares serem outras, o PT se credenciava como instrumento de manutenção da ordem capitalista. Chegar ao governo federal representou a pá de cal sobre aquele velho PT fundado nas lutas na década de 1980. Um novo PT, ou ex-PT como preferem alguns, nasceu como ferramenta política de uma fra-

ção da burguesia brasileira. Sua relação eleitoral com os trabalhadores nada tem a ver com os anos 1980.

O PSOL e o velho PT das origens Sobrou muito pouco hoje daquele PT que disputou as eleições presidenciais de 1989. Desse pouco que resta, é possível dizer que quase nada está no próprio PT. Os parlamentares “radicais” expulsos do partido em 2003 só sofreram essa perseguição porque insistiram em manter posições políticas defendidas pelo conjunto do partido em 1989. É no PSOL que encontramos, para o bem ou para o mal, muito daquele projeto político predominante no PT das origens. O PT dos anos 1980 representou um grande passo adiante para a classe trabalhadora. Quando comparado com o PT de hoje chega a parecer tão melhor que quase ficamos satisfeitos com ele. Mas, não podemos nos contentar com isso. Aqueles que querem reconstruir uma ferramenta de luta dos trabalhadores não podem simplesmente tentar reconstruir o velho PT das origens. É preciso aprender com os erros e limites daquele PT. É preciso superar aquele PT e não tentar repetir seus momentos áureos. Uma nova esquerda que supere o PT deve buscar resgatar aquilo que o partido tinha de mais positivo: o enraizamento nas lutas populares. Mas, deve rejeitar a estratégia eleitoral como centro, mesmo reconhecendo que a disputa eleitoral é parte importante da política do partido. Deve rejeitar a concepção reformista e etapista do programa democrático e popular e reconstruir um programa e uma estratégia anticapitalista e socialista. Sua atuação deve se dar sobre a base do internacionalismo da classe trabalhadora. Deve ainda adotar um funcionamento interno de caráter militante e radicalmente democrático. O controle da base sobre a direção é o único mecanismo capaz de conter as pressões degenerativas.


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MTST sob ataque A luta por moradia tem sido uma das principais frentes de ação após as mobilizações de junho de 2013. O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) tem jogado um papel central nisso e conseguido importantes vitórias. Por isso, o movimento tem sido alvo de ataques no último período, como parte da contraofensiva dos governos e patrões para tentar conter as lutas. José Afonso da Silva responsável pela secretaria do MTST Ainda no final de 2013, o MTST iniciou a luta para incluir no Plano Diretor de São Paulo os terrenos ocupados pelo movimento como zonas destinadas a construção de moradias populares. Foram dezenas de mobilizações que possibilitaram essa vitória do movimento e uma importante derrota para o mercado imobiliário. O MTST lançou também a campanha “Copa Sem Povo, Tô na Rua de Novo!”, encampada em conjunto com a Resistência Urbana, uma frente de movimentos de luta pela moradia. Foram quatro grandes manifestações, algumas delas contaram com a participação de mais de 25 mil pessoas. Com medo de mobilizações deste porte durante a abertura da copa do mundo, governos federal, estadual e municipal se dobraram às reivindicações do MTST. O que significou uma grande vitória

para os movimentos de moradia de todo país, já que o acordo incluía mudanças no programa Minha Casa Minha Vida (MCMV) na modalidade “Entidades”, favorecendo os movimentos de moradia. A vitória das mobilizações do MTST foi vista pelos setores mais raivosos e reacionários da mídia como uma afronta, levando-os a aumentarem o tom das críticas ao movimento ao mesmo tempo que buscavam criminaliza-lo. O Ministério Público (MP), seguindo os interesses da grande imprensa, dos empresários e do mercado imobiliário, instaurou recentemente três inquéritos que visam cancelar pela via da judicialização as conquistas do movimento.

MTST “fura fila”? O promotor Maurício Antônio Ribeiro, vanguarda nessa linha da promotoria, afirma que o MTST fura a fila, passando a frente das famílias cadastradas nos programas de moradia da prefeitura. Diz ainda que a concessão às reivindicações do MTST, estimula as “invasões” de terrenos na cidade. Ao contrário do que diz o promotor, boa parte das famílias que estão em ocupações do MTST já são cadastradas há dez, vinte, trinta anos e nada. Se hoje estão morando numa ocupação é justamente pelo fato de que a fila de moradia é uma piada, pois não anda. Por outro lado, esse mesmo cadastro de moradia tem servido somente a propósitos eleitorais, ou

seja, prefeitos e vereadores entregam as moradias para aqueles que se comprometem a fazer suas campanhas e votar neles. A verdade é que as ações do MTST, ao contrário do que dizem os promotores, tem feito sim a fila andar, pois a pressão sobre vereadores e prefeitos tem garantido a criação de ZEIS (Zona Especial de Interesse Social), desapropriações de terrenos antes destinados à especulação imobiliária, assim como o financiamento para os projetos de moradia. Outra lorota dos promotores sobre a fila refere-se ao fato de que pelo programa MCMV-Entidades quem estabelece a demanda são os movimentos sociais, não os governos. Essa modalidade representa 2% do total das verbas destinadas ao programa, sendo que o restante, 98% do previsto financeiramente, fica para o MCMV-Empreiteiras. No entanto, os promotores e a grande imprensa só estão preocupados com os 2% destinados aos movimentos sociais. Os promotores também entram em contradição, pois se recusam a investigar as irregularidades nos projetos do MCMV-Empreiteiras ou mesmo se fazem de cegos quando empresas privadas, bancos e clubes de luxo invadem terrenos públicos. O promotor Maurício Ribeiro Lopes aplicou uma multa de 300 milhões ao sindicato do metrô após a greve deste ano, mas o interessante é que este mesmo promotor pediu perdão de multa no valor de mais de 10 milhões de re-

O MTST está sob ataque por conseguir vitórias contra o poderoso setor imobiliário. ais por contribuição ilegal à cam- SP onde foram protocoladas seis panha eleitoral de Kassab do sin- denúncias sobre atraso de pagamentos de funcionários por empreidicato das empreiteiras. Mas isso não intimidou o MTST teiras com contratos pelo MCMV, que, ao invés de dar um passo atrás, incêndios criminosos em favelas, adotou a política de ampliar sua relações incestuosas entre empreipauta para além da moradia, abor- teiras e políticos, etc. Todas denúndando questões como telefonia, cias feitas com base em publicaviolência policial e a crise da saúde. ções da Veja, Estadão e Folha de São Paulo. Já que o critério do MP se baseia no que sai na imprensa Solidariedade para criminalizar os movimentos Isso ficou claro no ato-debate em sociais, que se use o mesmo critésolidariedade ao MTST, realizado rio para as empreiteiras. dia 20 de agosto, quando inúmeras Outra ação importante foi o ato personalidades do campo jurídico, contra o racionamento da saúde, acadêmico e político se solidariza- quando seis secretarias de saúde ram com a luta do MTST e contra a foram ocupadas simultaneamente. criminalização da luta por moradia. Para muitos o ciclo de lutas que Após o ato-debate, cerca de 12 se abriu com as jornadas de junho mil pessoas marcharam até a sede se fechou, porém o MTST está do Ministério Público Estadual de mostrando o contrário.

“Vamos ganhar de volta o Sintaema para os trabalhadores” Nos dias 23 a 24 de setembro haverá eleições para o Sintaema, o Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo. É um sindicato importante que abrange empresas como Sabesp, CETESB, Fundação Florestal, a antiga SANED, etc. O Ofensiva Socialista falou com Abdon e Marzeni da chapa da Oposição Unificada. Qual é a importância dessa eleição? – O PCdoB (CTB) dirige o sindicato há três décadas e no último período perdemos muitos direitos, como o Adicional por Tempo de Serviço, as privatizações avançaram e os terceirizados são maioria dos trabalhadores da Sabesp e o sindicato nada faz para defender os interesses desses trabalhadores. – Nos últimos anos a Sabesp demitiu mais de cinco mil trabalhadores. Apesar dos últimos concursos o número de trabalhadores caiu de

cerca de 18 mil para 14 mil, sem oposição do sindicato. – E essas perdas acontecem mesmo com uma categoria organizada e com tradição de luta. O problema é a direção atual do sindicato, que aceita passivamente o que o governo e patrões impõe. A direção é cada vez mais parceira da empresa. – Isso ficou claro na última campanha salarial em que a diretoria não mobilizou a categoria e isso resultou num reajuste de míseros 5,2% na Sabesp. Os trabalhadores na Cetesb se mobilizaram e garantiram 6,28%. Compare isso com os metroviários que conseguiram 8,7%, os ferroviários 7,5% e os rodoviários 10%. – O Sintaema é o maior sindicato de trabalhadores ligado ao meio ambiente na América Latina, mas o sindicato é passivo diante a crise de abastecimento de água que vivemos. – Não fizeram nada para denunciar a falta de investimento no sistema hídrico por parte do governo Alckmin, nem contra o fato que o governo obriga Cetesb a fazer vista

grossa com empreendimentos que danificam o meio-ambiente. – É urgente retomar o sindicato como ferramenta dos trabalhadores, para defender seus direitos e unificar as lutas. – O Sintaema é um sindicato importante. A vitória da esquerda nos metroviários foi muito importante para ajudar a impulsionar lutas gerais, mas eles também sofrem os ataques do governo Alckmin. Ainda não conseguiram reverter as 40 demissões da última greve. A vitória da esquerda no Sintaema irá fortalecer a frente contra esse governo truculento e privatista. Qual é o quadro comparado com a eleição anterior e quais dificuldades a Oposição enfrenta? – O quadro nessa eleição é bem mais favorável. Na eleição 2008, a Oposição Alternativa perdeu com uma diferença de apenas 14 votos! Na verdade ganhamos a votação. Foi só por via de fraude que a atual direção conseguiu se manter. Na

eleição 2011 dois grupos romperam com a diretoria, a ASS e a CUT. Mas infelizmente a oposição saiu dividia em quatro chapas diferentes. – Nesta eleição a oposição está unificada e temos uma grande chance de ganhar. A chapa é composta por nós da CSP-Conlutas que é a maior força, a Intersindcal-ASS, o setor da CUT que se recusou a seguir a orientação da direção da central de fechar com a CTB, além do MLC e independentes. Foi feito um processo democrático em que os cargos foram divididos proporcionalmente de acordo com a votação nas últimas eleições. – Por outro lado, a atual gestão já mostrou que está disposta a fazer tudo para manter o controle do sindicato. No último Congresso, cheio de irregularidades, aprovaram várias mu-

danças no estatuto, algo que na verdade caberia a uma assembleia geral e não ao Congresso. Fizeram mudanças para dificultar para a Oposição. Por exemplo, diminuíram de 15 para 5 dias o prazo de inscrição de chapa. Também prolongaram o mandato de três para quatro anos. Quais são das principais bandeiras da Oposição? – Defendemos a democratização do sindicato, diretoria colegiada. É necessário unificar a categoria, lutando também pelos terceirizados. – Defendemos a estatização da Sabesp. Queremos PLR igualitária e acabar com o salário regional imediatamente. Queremos também de volta o ATS (Adicional por Tempo de Serviço).


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Erupção contra o racismo nos EUA

A dupla opressão sobre a mulher negra

“Até que a morte de homens negros, filhos de mães negras, torne-se tão importante para o resto do país como a morte de um filho de mãe branca, nós que acreditamos na liberdade não poderemos descansar.” Ella Baker, 1964

Foram mais de três séculos de escravidão que deixaram grandes marcas na história do povo negro. Marcas que se expressam hoje em condições precárias de vida e trabalho, histórias de miséria e violência que ainda não tiveram seu fim. É esse o peso que também cai sobre as mulheres negras!

Eljeer Hawkins Alternativa Socialista, CIT EUA No dia 9 de agosto, em Ferguson, Missouri, o jovem Michael Brown Jr., de 18 anos, morreu após ter sido atingido por seis tiros de um policial, sem qualquer motivo. Quantos mais? Quantos mais devem morrer nas mãos da polícia ou da violência extrajudicial? Michael Brown se junta à longa lista de pobres e trabalhadores, especialmente negros, latinos e indígenas jovens, cujas vidas foram violentamente levadas nesta sociedade capitalista racista, que tornou a vida dos negros descartável e ausente de respeito e dignidade. Como podemos por fim a esta crise que se aprofunda, com nossos jovens enfrentando a pobreza sistêmica, violência policial, racismo brutal e encarceramento em massa? O único “crime” de Michael Brown foi ser negro e pobre, enquanto caminhava para a casa de sua avó em Ferguson, na região metropolitana de St. Louis. Com 21 mil habitantes, a população de Ferguson é 70% negra, com uma força policial predominantemente branca. Um quarto dos habitantes da cidade vive abaixo da linha da pobreza. Em algumas das áreas da periferia, a pobreza chega a 40%. Desemprego e trabalho com baixos salários predominam. A renda familiar média na região próxima à cena do crime é de apenas 14,4 mil dólares ao ano, muito baixo para o custo de vida americano.

Pobreza crescente Um relatório da organização “Missouri para Acabar com a Pobreza”, lançado no início deste ano, mostra que a pobreza em St. Louis aumentou de 27,2% em 2011 para 29,3% em 2014. Cerca de um milhão de habitantes do estado de Missouri são pobres, de uma população total de pouco mais de seis milhões. Em Ferguson e muitas outras cidades dos EUA, os trabalhadores e as pessoas negras, latinas e indígenas enxergam a polícia como um exército de ocupação, não muito diferente do que no Iraque ou na Faixa de Gaza. Durante anos, as tensões raciais foram fervendo. Um relatório de 2013 feito pelo governo do Missouri descobriu que a polícia de Ferguson tinha parado e detido motoristas negros quase duas vezes mais que motoristas brancos,

Nayara Del Santo estudante de psicologia na UFMT

“Eles não se preocupam com jovens negros”, “Parem de nos matar”. apesar de serem menos propensos incluindo o oficial responsável pea encontrar contrabando entre os lo tiro em um manifestante no dia motoristas negros. 20 de agosto. A morte de Michael Brown deDado o fracasso do governo em sencadeou uma série de protestos resolver esses problemas, a única em Ferguson. A resposta da polí- maneira de realizar uma verdadeiro cia foi violenta: gás lacrimogêneo, investigação independente e tambalas de borracha e ataques contra bém para abordar sistematicamenmanifestantes e jornalistas.. te as raízes da violência policial e A Alternativa Socialista exige a da desigualdade racial e econômiretirada imediata da polícia. Tam- ca profunda, é espalhar os protesbém exigimos uma investigação tos e manifestações para todo o pacompleta e exaustiva por parte de ís. Isso exigirá a união de organizaforças independentes, incluindo re- ções comunitárias e de trabalhadopresentantes de organizações afro- res em novas organizações de base -americanas, sindicatos e a comuni- para construir e coordenar o movidade em geral, para expor as condi- mento de protesto contra a violênções deste brutal assassinato, bem cia policial racista. como investigar a repressão aos “Um sistema não pode falhar protestos. com aqueles que nunca teve a A força policial inteira deve ser intenção de proteger”. colocada sob investigação pública, Dr. W. E. B. Du Bois

Marcha nacional contra o genocídio da juventude negra Foi no contexto recente do caso da morte de Michael Brown em Ferguson, mas também em resposta ao assassinato de Cláudia, Amarildo, Douglas, DG, do genocídio e o encarceramento em massa do povo preto, periférico e pobre que marcharam no último dia 22 de agosto militantes do movimento negro de 18 estados no Brasil. A luta do povo negro contra o racismo institucional tem que entrar cada vez mais na pauta do

dia, e essa luta que ressurge se mostra intrinsecamente ligada a necessidade de se destruir o capitalismo e construir uma sociedade na base de um governo socialista e dos trabalhadores! Que avancemos na construção de comitês de luta contra o genocídio do povo preto nas periferias e na direção de espaço organizativo negro unificado - de fato que coordene novamente ações nas frentes sindicais, populares, estudantis em conjunto com a luta antirracista! Porque Ferguson também é aqui!

Estas são as mulheres marcadas não só pela opressão racial, mas também pela opressão de gênero, submetidas a esse sistema patriarcal que as colocam como seres inferiores, incapazes e indignas. São essas mulheres que continuam em último lugar na escala social, as que mais carregam as desvantagens do sistema injusto e racista do país. Saíram do trabalho escravo nos campos para serem forçadas ao trabalho doméstico nos casarões. E, ainda hoje, as mulheres negras são a maioria nesse setor. Segundo estudo do IBGE de 2008, de cada 100 negras trabalhadoras no Brasil, 22 são empregadas domésticas. Quando falamos de emprego formal, o salário médio da mulher negra é menos da metade do salário de um homem branco. Mas é no trabalho informal (ou não regularizado) que se encontram muitas trabalhadoras negras. São estas que tem a menor escolaridade, também. E, se não se encaixam aos padrões de beleza, quando não são “mulata tipo exportação”, as chances no mercado de trabalho são ainda menores.

Hipersexualização Nas mulheres negras, ainda há a marca da hipersexualização. Desde o tempo das senzalas, quando eram violentadas sexualmente pelos senhores de escravos, se construiu um imaginário de que essas mulheres são mais ‘fogosas’ e que estão sempre dispostas ao sexo. A mulata a serviço do desejo do patrão branco é fetichizada pelas mídias e novelas. Imagem que é perpetuada até hoje. Enquanto a mulher branca é tomada como sinônimo de ascensão social pelos homens, a negra aprende a não se sentir amada, a não gostar de seus cabelos, a achar defeitos no tamanho da sua boca e de seu nariz, acarretando assim em sequelas cruéis na vida das mesmas. Em meio a um histórico de sofrimento, esta encontrou na Lei Áurea apenas a libertação dita nos livros e acabou por desencantar-se ao perceber que o mundo que a cerca só a quer como mão-de-obra barata, como objeto de prazer.

A hipersexualização e a objetificação fazem dessas mulheres também a maioria nos dados de violência sexual e doméstica. O Mapa da Violência mostra que, em 2010, morreram 48% mais mulheres negras do que brancas vítimas de homicídio. No genocídio do povo negro, os homens negros morrem mais nas ruas e as mulheres negras morrem em casa. Em 2009, 92,2% dos casos de agressão física das mulheres negras aconteceram em sua própria residência.

Atingida por todos os lados A mulher negra é atingida por todos os lados: é ela que está sempre presente com os maiores índices de violência doméstica, com os menores salários, entre outros tipos de opressões. No entanto, mesmo com a presença desses dados alarmantes, não vemos projetos de políticas públicas com recortes que atendam às carências das negras, que tem suas necessidades suprimidas em meio a uma sociedade desigual. Esse mundo de fantasia reforça ainda mais o mito da democracia racial, inexistente para a população negra e muito menos para as mulheres negras que, além de sofrer com o racismo velado que é negado por todos e simultaneamente vivenciado por todos, tem que conviver com opressões de gênero, com o machismo advindo de brancos e negros. São várias as desigualdades existentes e elas nos mostram o tamanho da luta que temos. Só avançaremos se nos organizarmos coletivamente e nas ruas! Por igualdade de gênero e racial! Defendemos políticas públicas com um olhar mais atento às necessidades da mulher negra, cotas raciais nas universidades, acesso a creches gratuitas no período integral, eficácia e manutenção das delegacias de proteção à mulher!


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Ofensiva Socialista n°22 setembro 2014

Como parar a chacina em Gaza? Mesmo após uma série de tentativas de cessar-fogo durante todo o mês de agosto, os ataques israelenses contra a Faixa de Gaza continuam. Uma chuva de morte cai sobre o território palestino desde o início da ofensiva de Israel, em 8 de julho. Niall Mulholland, CIT Segundo a ONU, o número de civis palestinos mortos já ultrapassou 2,1 mil. A grande maioria são civis, incluindo mais de 500 crianças. Segundo dados do Ministério da Saúde de Gaza, já são mais de 10 mil feridos. Nessa guerra unilateral morreram 64 soldados e três civis israelenses. Dos cerca de 1,8 milhão de habitantes de Gaza, mais de 520 mil foram obrigados a deixar suas casas por conta dos ataques assassinos das forças israelenses. Muitos são forçados a viver em abrigos improvisados e superlotados, ou na casa de parentes. Os ataques aéreos contra as escolas mantidas pela ONU, que servem de abrigo para milhares de refugiados, mostram que não há lugar seguro contra os bombardeios de Israel. Os ataques destruíram boa parte da infraestrutura de Gaza, o que leva à falta de água potável e de saneamento. Isso cria o sério risco de um surto de doenças como cólera. A maior parte do território tem menos de duas horas de eletricidade por dia. Um terço dos hospitais e dezenas de ambulâncias foram destruídas.

Solidariedade ao redor do mundo Em todo o mundo, ocorreram manifestações contra a ofensiva em Gaza e em solidariedade ao povo palestino. Na cidade israelense de Tel Aviv, houve um protesto de 10 mil pessoas, a grande maioria judeus, no dia 16 de agosto. Apesar da cobertura completamente parcial da maior parte da grande mídia, que opta por ignorar que Israel está ocupando ter-

ras palestinas, construindo assentamentos ilegais e mantendo Gaza sob bloqueio, a opinião pública está agora do lado dos palestinos oprimidos. A maioria dos jovens nos Estados Unidos, por exemplo, agora se opõe ao ataque israelense. À medida que o número de mortos crescia em Gaza, as potências ocidentais enviavam mensagens de condolências vazias e pediam um “cessar fogo”. A Casa Branca, timidamente, chamou os ataques das forças israelenses às escolas da ONU de “vergonhosos”, mas sem culpar Israel abertamente. Ao mesmo tempo, o Senado dos EUA votou por unanimidade enviar 225 milhões de dólares para o sistema de defesa antimísseis de Israel e para reabastecer o arsenal israelense.

O papel do imperialismo O moderno Estado de Israel foi criado na década de 1940, quando muitos judeus fugiram da perseguição antissemita e do holocausto nazista para uma “nova pátria” no que era então o território britânico da Palestina. Com o fim da ocupação britânica e a eclosão da primeira guerra árabe-israelense, em 1948, os líderes israelenses de direita expulsaram centenas de milhares de palestinos, utilizando métodos brutais paramilitares e de terror. A nova classe dirigente prometeu prosperidade para o seu povo, mas apenas entregou décadas de crises e guerras e, nos últimos anos, uma divisão crescente entre seus ricos e pobres. Uma das principais razões para Israel ter sido capaz de sobreviver por tanto tempo é a enorme ajuda econômica e militar do imperialismo norte-americano, que considera Israel como um aliado na região. Os EUA fornecem armas e financiamento que totalizam três bilhões de dólares por ano, criando o quarto exército mais poderoso do mundo. Apesar disso, os interesses e objetivos de Israel e de seus aliados imperialistas ocidentais nem sempre estão em sintonia. As potências ocidentais gostariam de ver um acordo de longo prazo entre os líderes palestinos e israelenses que

Milhares de vidas e lares destruídos pelo terrorismo de Estado de Israel levaria a, nas palavras do Secretário de Estados dos EUA, John Kerry, “dois Estados para dois povos”. Sob a influência do imperialismo, isso não significaria libertação para os palestinos, mas um “Estado” palestino minúsculo e com uma elite dominante submissa. As potências ocidentais esperam que isso leve a uma maior estabilidade na região e à manutenção dos seus interesses. As elites dirigentes corruptas e despóticas nos países árabes, apesar de seu apoio falso aos direitos dos palestinos, também temem o estabelecimento de uma Palestina independente, pois isso poderia iniciar um processo radicalizado que levaria à queda de seus governos. Depois de União Europeia e Estados Unidos indicarem que estariam preparados para negociar com um novo regime de coalizão entre Hamas e Fatah, o primeiro-ministro israelense, Benyamin Netanyahu, sob pressão de seus ministros de extrema-direita e do poderoso movimento dos colonos dos assentamentos na Cisjordânia, optou pela saída militar. O desaparecimento, em 12 de junho, de três estudantes israelenses na Cisjordânia foi usado como justificativa para iniciar os ataques contra Gaza. Mas o principal objetivo do regime de Israel era aterrorizar a população de Gaza e quebrar a resistência palestina.

Hamas

Protesto em Londres em solidariedade ao povo palestino

Os ataques contra a Faixa de Gaza em 2008-09 e 2012 tinham a intenção de enfraquecer o Hamas e fortalecer o poder de Israel. O atual massacre tem também a intenção de destruir as tentativas de um “acordo de reconciliação” entre Hamas e Fatah. Nos últimos meses, o Hamas havia entrado em negociações com

Mahmoud Abbas, do Fatah, presidente da Autoridade Palestina. O Hamas, enfraquecido, tinha perdido o apoio da Síria e do Irã, após se recusar a dar apoio ao regime de Assad, que enfrenta uma rebelião armada. O movimento também enfrenta a hostilidade do regime egípcio, que derrubou o governo da Irmandade Muçulmana, um aliado próximo do Hamas. Isso resultou no fim do comércio feito pelos túneis entre o Egito e Gaza. Com isso, o Hamas tem sido incapaz de pagar os salários dos funcionários públicos. Estes acontecimentos, agravados pelo regime autoritário do Hamas e por sua incapacidade de mostrar um caminho para sair da pobreza e da opressão nacional para as massas palestinas, levaram a uma queda acentuada de seu apoio em Gaza. As críticas ao Hamas, compreensivelmente, se silenciaram com o início dos ataques de Israel. A agressão militar fortaleceu o movimento – considerado como a única linha de resistência contra a carnificina do exército israelense, mesmo por muitos dos seus críticos mais severos em Gaza. O povo de Gaza, é claro, tem o direito de defender-se. Mas os disparos de mísseis não impedem em nada o ataque israelense com a sua esmagadora superioridade militar. Além disso, ataques indiscriminados com mísseis contra civis israelenses, realizados por grupos que não estão sob o controle democrático das massas, são contraproducentes. Eles causam medo generalizado entre as comunidades em Israel, o que é brutalmente explorado pelo governo de extrema-direita israelense para implantar ainda mais a repressão contra os palestinos. Os demais países na região também estão em crise. A Síria e o Ira-

que, tomados pela guerra civil. Jordânia e Líbano, instáveis. Egito, sob o domínio de uma ditadura militar. A Líbia, dilacerada pelos conflitos entre grupos armados. Assim, Israel também ganha ao mostrar e impor o seu poder militar. Mesmo que Israel conseguisse eliminar o Hamas, outros grupos armados palestinos apareceriam. Possivelmente, surgiriam inimigos mais ferozes, como o Estado Islâmico, que tomou o poder em boa parte do Iraque e da Síria. Netanyahu diz que o conflito atual confirma o seu argumento de que o “controle de segurança” é necessário sobre a Cisjordânia. Isso implica na consolidação da ocupação e na extinção de qualquer esperança palestina em uma solução de dois Estados. Mas essa política só vai aprofundar divisões e preparar conflitos ainda maiores. A população palestina está crescendo em Israel e nos territórios palestinos e ameaça tornar-se a maioria na região. Com o relógio demográfico em desvantagem, a elite poderá enfrentar revoltas tanto na Cisjordânia quanto no próprio território israelense. A extrema-direita de Israel vai tentar reverter este processo, aumentando a remoção forçada dos palestinos ou retirando ainda mais os direitos daqueles que vivem em Israel. Em algum momento, depois de muito derramamento de sangue, virá um cessar-fogo definitivo. Entretanto, essa paz virá em condições de extrema pobreza, exploração e opressão, em que nada de fundamental será resolvido para os palestinos.

Saída socialista Nós, socialistas, apoiamos o direito de autodeterminação para os palestinos e defendemos a expulsão do imperialismo da região. Apenas as ideias socialistas podem acabar com o sistema que gera guerra, terror e pobreza para os palestinos e afastar os trabalhadores israelenses de seus líderes de direita, que têm mostrado que não podem garantir a paz duradoura enquanto oprimem os palestinos. Novas lutas de massas contra o estado opressor de Israel e contra as condições sociais desesperadoras verão o povo pobre e trabalhador da Palestina batalhando para construir a sua própria voz política independente. Apenas a construção de movimentos e partidos de massas dos trabalhadores independentes em toda a região pode desafiar a agenda da direita e dos capitalistas, em todos os partidos governantes atuais, além de construir as bases para as ideias socialistas. Uma Palestina socialista e Israel socialista, como parte de uma confederação socialista do Oriente Médio, que estabelecerá as bases para um futuro livre de guerra, terror e pobreza: esse é o programa pelo qual batalha o Movimento Luta Socialista, organização-irmã da LSR em Israel e Palestina.


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Ofensiva Socialista n°22 setembro 2014

Salário mínimo de $15 em Seattle! O aumento do salário mínimo em 61% em Seattle, nos Estados Unidos, foi uma importante vitória na luta dos trabalhadores contra a ditadura dos “1%”. Foi resultado de uma combinação da luta sindical junto com o terremoto político que levou à eleição de Kshama Sawant e mostra a possibilidade de construir uma verdadeira alternativa política dos trabalhadores no coração do imperialismo.

Marcus Kollbrunner Apesar da propaganda de que a economia dos EUA está se “recuperando”, isso é realidade apenas para uma pequena minoria. Um estudo da Universidade da Califórnia mostra que 95% do aumento de renda entre 2009 e 2012 foi para 1% da população. Enquanto isso, a renda das famílias trabalhadoras está mais baixa do que no ano 2000! Existe uma grande frustração e raiva na sociedade estadunidense. Isso ficou claro recentemente com a explosão de protestos após a morte com seis tiros de um jovem negro e desarmado pela polícia racista na cidade de Ferguson, no Missouri.

Construindo uma alternativa Existe também uma busca por uma alternativa ao sistema econômico atual e aos seus dois partidos, os Democratas e os Republicanos. Entre jovens de 18-29 anos e afro-americanos, uma maioria se diz agora preferir o “socialismo” ao invés do “capitalismo”. O movimento “Ocupe” 2011-12 foi uma pode-

do salário mínimo, ainda que a longo prazo e com muitas exceções. Em SeaTac, uma pequena cidade vizinha de Seattle, foi aprovado o salário mínimo de 15 dólares através de um plebiscito. Em seguida, foi lançada a campanha “15 Now” (15 Agora) para travar a luta junto com os sindicatos. No começo de junho, a câmara de Seattle votou o aumento do salário mínimo de 9,32 para 15 dólares. Para efeito de comparação, o salário mínimo nacional é de 7,25 dólares por hora. Apesar da lei ter várias exceções e prazos estendidos, ela representa uma grande vitória. Cerca de 100 mil pessoas vão sair da pobreza com o aumento do salário e calcula-se que as empresas vão pagar 9,8 bilhões de reais a mais de salário aos trabalhadores na próxima década!

rosa revolta contra a sociedade dos “1%” de super-ricos. Mas, para transformar esse sentimento em uma força política e evitar que demagogos da direita ou populistas dos Democratas desviem a indignação, é necessário ter iniciativas audaciosas. A Alternativa Socialista (CIT EUA), lançou Kshama Sawant, ativista do movimento Ocupe, nas eleições estaduais de 2012. Kshama enfrentou o líder da assembleia do estado de Washington, o democrata Frank Chopp e conseguiu 29% dos votos. A Alternativa Socialista argumentou na época que, se o movimento Ocupe tivesse lançado 200 candidatos ao redor do país, isso ajudaria a lançar a construção de uma forte alternativa aos dois partidos do grande negócio. Infelizmente, muitos dos sindicatos ainda mantêm a política de apoio aos Democratas como “mal menor”, enquanto vários militantes do movimento Ocupe ainda subestimam a necessidade e o potencial de uma alternativa política.

Levantando a demanda de $15 nas eleições Com o tremendo resultado de 2012, Kshama foi lançada como candidata à câmara de vereadores de Seattle em 2013, levantando a bandeira das greves dos trabalhadores de fast food e dos supermercados por um salário mínimo de 15 dólares por hora. Sua candidatura levantou também a necessidade de um controle social sobre os alugueis e a taxação das grandes fortunas para financiar o transporte público e a educação. A sua campanha teve apoio de seis sindicatos, organizações de

A luta continua

Jess Spear e Kshama Sawant em atividade pelo aumento do salário mínimo. imigrantes e movimentos sociais. Contou com 450 voluntários e conseguiu levantar 320 mil reais com 1,4 mil doadores. Isso contrariou a ideia de que é impossível fazer uma campanha sem dinheiro de empresas. Kshama Sawant conseguiu derrotar o candidato democrata, obtendo 93,682 votos. Foi a primeira vereadora socialista eleita na cidade desde 1877! Para mostrar que somos uma alternativa dos trabalhadores e não nos deixamos comprar por privilégios, Kshama

não aceita o salário integral de vereador de Seattle, que está entre os maiores do país. Ela recebe só um terço do salário, o equivalente ao salário médio de um trabalhador, enquanto o resto é usado para construir as lutas sociais. A primeira tarefa de seu mandato foi jogar todo o peso na luta pelo salário mínimo de 15 dólares por hora. O impacto da campanha de Kshama fez com que os candidatos a prefeito dos grandes partidos se declarassem a favor do aumento

A luta pelo salário mínimo continua agora em nível nacional, mas também continua a construção de uma alternativa socialista. Jess Spear, organizadora do 15 Now e militante da Alternativa Socialista, está concorrendo à vaga de deputada estadual contra Frank Chopp nas eleições em novembro. A vitória de Kshama mostrou que é possível construir uma alternativa política, sem vínculo com as grandes empresas e colocando a candidatura a serviço das lutas. A vitória do salário mínimo mostra que é possível arrancar concessões e obter vitórias através da luta coletiva. Unificando essas vitórias, é possível começar a construir uma alternativa socialista, no coração do imperialismo, que possa desafiar o sistema injusto que é o capitalismo.

Argentina: os “fundos abutres” e a dívida Dezesseis anos depois da grande recessão de 19982002, a economia Argentina está à beira de uma nova crise. E, novamente, tentarão fazer com que os trabalhadores paguem pelos erros do governo e pela ganância dos capitalistas. Cacá Melo Em 1998-2002, a Argentina enfrentou uma crise econômica, levando à desvalorização de sua moeda e ao calote da enorme dívida externa do país. A recessão causou alto desemprego, hiperinflação e protestos que culminaram com a queda do governo do presidente Fernando de la Rúa, em dezembro de 2001. Diante da impossibilidade de pagar a dívida, o governo anunciou a moratória (não-pagamento) da dívida pública, no total de 132 bilhões de dólares. O PIB caiu 20% nesses anos e a economia só começou a se recuperar em 2003, quando a desvalorização do peso fez com que o país conseguisse tirar proveito do crescimento mundial,

garantia de pagamento da dívida. Paul Singer e seu grupo já foram chamados de “fundos abutres” pela imprensa, por utilizar a mesma estratégia contra outros países da América Latina e África. O governo da presidente Cristina Kirchner recusou-se a cumprir a decisão da corte americana. A grande preocupação é que isso gere um efeito dominó sob os demais títulos não-renegociados. Caso os outros credores entrem na justiça, o governo argentino poderá ser intimado a pagar um total de 15 bilhões de dólares.

aumentando suas exportações de commodities. Em janeiro de 2005, o governo argentino iniciou um processo de reestruturação da dívida. Num primeiro momento, 76% dos títulos públicos foram renegociados com os credores e trocados por outros, mais baratos. Uma segunda rodada de negociação, em 2010, deu fim em 93% do total devido. Esse processo de reestruturação, junto com novo período de crescimento, deu a ilusão de que o problema tinha sido superado.

Os abutres entram em cena Entretanto, no último período, os títulos não-renegociados se tornaram um motivo de tensão. Uma decisão de um juiz nos EUA defendeu os interesses de um grupo de credores liderado pelo bilionário Paul Singer, que havia comprado os títulos daquela pequena parcela que não tinha aceito o acordo. Esse grupo exige que o governo argentino lhe pague um total de 1,4 bilhão de dólares, ao invés do va-

O abutre chefe: Paul Singer lor menor proposto durante a reestruturação da dívida. Essa não é a primeira investida de Paul Singer contra o governo Kirchner. Ele, que foi um dos principais financiadores das campanhas de George W. Bush, já tentou utilizar o judiciário americano para tomar bens do governo argentino, como reservas em bancos de Nova York, o avião presidencial ou até mesmo navios de guerra, como

Inflação de 40% A economia da Argentina já se encontra numa situação fraca. O crescimento do PIB diminuiu, a inflação chega a 40% por ano e os salários não acompanham. Cerca de 25% de população se encontra abaixo da linha de pobreza. O que os “fundos abutres” querem é que os países se submetam às suas exigências para pagar as dívidas. Para fazer isso, os governos precisam pegar mais dinheiro em-

prestado e adotar medidas de austeridade, como corte de gastos públicos, fim de investimentos em saúde e educação e aumento das privatizações. E quem paga por isso são os trabalhadores, com inflação, desemprego e queda da qualidade de vida.

Ir além do não-pagamento Isso mostra que o não-pagamento da dívida em si não resolve os problemas, se não for acompanhado pela nacionalização dos bancos e do sistema financeiro, junto com a implementação do controle do fluxo de capital. Do contrário, qualquer governo permanecerá refém do mercado financeiro. Vemos o começo do fim da era Kirchner, que sofre com a crise mundial e não tem uma política de romper com o sistema capitalista. Por isso, é fundamental o avanço da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores, a aliança de esquerda que conseguiu 1,2 milhão de votos na última eleição, como um passo importante para começar a construir uma alternativa socialista no país.


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N° 22 • setembro 2014

Todo apoio à greve das universidades paulistas A greve das universidades paulistas está em curso há mais de três meses. No caso da Universidade de São Paulo, além de não negociar, o reitor teve a audácia de apresentar mais propostas que visam precarizar e privatizar a universidade. Carla Queiroz estudante de Psicologia na USP Há algumas semanas o movimento grevista teve acesso a um e-mail da reitoria da USP que mostrava propostas para minimizar a suposta crise financeira da universidade. As propostas apresentadas são as seguintes: plano de demissão voluntária (PDV), possibilidade de funcionários e professores reduzirem a jornada de trabalho com redução salarial e a transferência do Hospital Universitário (HU) e do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC) de Bauru para Secretaria Estadual de Saúde. Ou seja, durante uma greve onde uma das pautas é a contratação de mais funcionários o reitor quer dar mais passos atrás propondo demitir quase 20% dos funcionários até o meio do ano que vem.

Precarizando os hospitais universitários Tão grave quanto, são as propostas de repasse do HU e do HRAC para a Secretaria de Saúde, pois sabemos que isso significa precarizar ainda mais o atendimento e piorar a formação dos estudantes da saúde, já que esses são espaços importantes para a formação dessa área. O repasse do HU significaria o seu repasse para a Fundação Faculdade de Medicina, que hoje gere o Hospital das Clínicas. No final das contas, a população atendida é quem pagará por esses descuidos. Se hoje o HU é um hospital de referência da região oeste, onde grande parte da comunidade pode ter acesso à saúde de qualidade, passar para as mãos dessa Fundação significa criar pelo menos mais uma porta de entrada para o hospital, onde quem pagar mais cortará a fila dos outros usuários.

Após três meses de greve, ao invés de negociar, a direção das universidades lança mão de novos ataques.

O HRAC por sua vez corre o risco de ser transformado num hospital geral de Bauru, se distanciando do desenvolvimento das tecnologias que o fizeram ser referência internacional em suas especificidades. O Conselho Universitário da USP já encaminhou a transferência do HRAC, mas remeteu a transferência do Hospital Universitário a uma comissão que terá 30 dias para avaliar o plano, provavelmente esperando que até lá os protestos diminuam. Todavia, precisamos ter clareza de que essa reitoria não apresenta essas e outras propostas por acaso. A universidade vem passando por um processo cada vez mais claro de precarização e de privatização onde cada uma dessas propostas está intimamente relacionada a um projeto maior de educação, saúde e de sociedade, onde o lucro de alguns é colocado como mais importante do que o atendimento às necessidades e interesses da população. A grande justificativa que o reitor hoje dá para a maioria de suas propostas é a de que há um inchaço de funcionários que compromete o orçamento da Univer-

sidade. Entretanto, esta justificativa é mentirosa. O professor Vladimir Safatle, em sua coluna no jornal Folha de São Paulo de 19/08 apresentou números que desmentem esta justificativa. Segundo Safatle, a USP em 1989 tinha 31.987 alunos de graduação, 8.486 mestrandos e 4.428 doutorandos. Já em 2012, havia 58.303 alunos na graduação (aumento de 83%), 13.836 mestrandos (aumento de 63%) e 14.662 doutorandos (aumento de 231%).

Mais alunos e menos funcionários Apesar deste aumento estrondoso do número de alunos, o número de professores cresceu apenas 4%, passando de 5.626 a 5.860, ou seja, praticamente nada. Mas o mais impressionante é que número o número de funcionários simplesmente caiu (sim, caiu) 5%, passando por sua vez de 17.735 a 16.839. Ao mesmo tempo, sabemos que as universidades estaduais tem se expandido e também lutamos para que o ensino superior público contemple a todos, o que demanda um maior investimento nessa área. No

caso da USP, só entre 1995 a 2012, a universidade passou de 132 cursos oferecidos a 249, contabilizando um aumento de 88,6%, com toda a necessidade de investimento em infraestrutura para tais cursos novos. Nesse período, a universidade incorporou ou criou campi como os de Lorena, Santos e a USP Zona Leste. Mas essa expansão tem que estar atrelada fundamentalmente aos interesses da população. Por isso é importante também colocar a necessidade de que as contas da USP sejam abertas e a discussão sobre o plano econômico seja feita com a comunidade universitária. Se há crise, é por conta dessa forma de gestão antidemocrática que possibilita que a universidade seja cada vez mais só para alguns (privatizada e elitizada). Também é claro que tanto o antigo reitor (Grandino Rodas) quanto o atual têm uma relação muito próxima com o governo do estado dirigido há mais de 20 anos pelo PSDB. Num processo onde pouquíssimas pessoas têm voz e voto, o governador do estado é a ultima palavra na decisão de quem terá o cargo máximo da USP. E essa deci-

são é feita levando em conta o que esse partido tem como perspectiva para a educação. Porém, principalmente nesse momento de eleições, não podemos ter ilusão de que o PT faria muito diferente. Hoje as universidades federais passam por um caos tão complexo quanto a USP. A expansão de vagas foi feita em vários campi sem o devido financiamento através do Reuni. Diversas universidades não tem sequer prédio próprio para funcionamento, muitas não tem funcionários e docentes suficientes e os projetos de permanência não dão conta da demanda dos alunos, o que leva a uma grande evasão escolar. As universidades federais também têm sido pressionadas para que tenham seus hospitais universitários desvinculados através de uma privatização não tão clara, que é o projeto da EBSERH (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares), onde a universidade cede os bens (trabalhadores, prédios, laboratórios…) do hospital para uma empresa de direito privado.

Apontar para um novo projeto Os projetos de universidade estão colocados na mesa. De um lado temos o PSDB, com propostas conservadoras e que são apresentadas de uma forma clássica, se utilizando da falta de democracia descaradamente. Ao lado, o projeto do PT, que se utiliza de formatos diferentes e de fato tem uma história diferente e tenta se diferenciar, mas que no fim das contas serve aos mesmos interesses. A questão agora não é escolher entre um e outro, mas apontar para um projeto de educação e de sociedade que tenha mais investimento e que seja controlado de forma democrática pela população. Neste momento em que as universidades paulistas são duramente atacadas, e em particular a USP, é fundamental que a juventude e os trabalhadores da cidade e do campo, através de suas entidades, cerquem de solidariedade esta greve para que esses e outros ataques à educação pública sejam derrotados.


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