Ofensiva Socialista n°34 - maio-junho 2017

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Jornal da LSR

Seção brasileira do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT)

N°34 • maio-junho 2017

Tendência do PSOL

Derrubar Temer não basta

BARRAR AS REFORMAS ELEIÇÕES DIRETAS E GERAIS, JÁ! Construir uma greve geral de 48 horas

Um mundo de crise e polarização

pág. 06-08

PSOL como uma alternativa socialista pág. 04

Contra o congelamento e cortes na cultura de Doria pág. 09

Um ano perdido para os LGBTs com Temer no poder pág. 09

Venezuela: rumo ao socialismo ou reforçando o capitalismo? pág. 10-11

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editorial

M

ichel Temer e a quadrilha que ocupa o Palácio do Planalto estão por um fio! O presidente ilegítimo foi flagrado promovendo pessoalmente, diante do empresário Joesley Batista, dono da JBS, o pagamento de suborno para que o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, hoje preso em Curitiba, mantivesse a boca fechada em relação aos seus negócios escusos. A delação e gravações feitas pelo empresário não apenas comprovam a responsabilidade criminal de Temer, como ainda ferem de morte o senador Aécio Neves, até poucos dias atrás presidente do PSDB. Aécio também foi flagrado pedindo 2 milhões de reais para a JBS com o objetivo de custear sua defesa diante das acusações de corrupção. O presidente golpista insiste em dizer que não irá renunciar. Mas Temer e sua gangue estão à beira do precipício. Nosso papel é dar o empurrão final, derrubar esse governo e tudo o que ele representa. É preciso tomar as ruas aos milhões até que o governo caia definitivamente! As mobilizações que estão acontecendo em várias cidades devem confluir para grandes manifestações no próximo domingo, 21 de maio, em todo o Brasil. A marcha sobre Brasília no dia 24 de maio deve ser reforçada e transformar-se em uma grande mobilização de massas contra Temer e suas contrarreformas. E o mais importante: é preciso que as Centrais Sindicais marquem a data de uma nova Greve Geral, dessa vez de 48 horas, para enterrar de vez esse governo e as contrarreformas trabalhista e da previdência! Mas, atenção! Foi a classe dominante - os banqueiros e grandes empresários - que nos enfiaram Temer goela abaixo através de uma manobra golpista. Seu objetivo era, no contexto do agravamento da crise capitalista, conseguir aprovar suas contrarreformas e ataques aos trabalhadores.

●● Não à PEC 55, PLP 257 e outras medidas que impõe uma política de severa austeridade, que tem como objetivo cortar os serviços públicos, transferindo recursos para os ricos e o setor privado! ●● Não à reforma da previdência que estabelece 65 anos como idade mínima para se aposentar, aumenta o tempo de contribuição e iguala o tempo de contribuição entre homens e mulheres. Pelo fim do fator previdenciário. ●● Não à reforma trabalhista que abre para retirada de direitos conquistados através do negociado prevalecendo sobre o legislado. Não às terceirizações e precarização das relações de trabalho! ●● Não pagamento das dívidas interna e externa aos grandes capitalistas para garantir os recursos necessários para os serviços públicos e o desenvolvimento econômico com igualdade social! Auditoria das dívidas controlada pelas organizações dos trabalhadores! ●● Pela taxação das grandes fortunas, dos ricos e dos lucros das grandes empresas! ●● Por um programa de emergência para combater a crise e gerar emprego baseado em investimentos públicos em infraestrutura, moradia, transporte, saúde e educação. 10%

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Derrubar as contrarreformas e Temer juntos! Eleições diretas e gerais já! Tomar as ruas e construir uma greve geral de 48 horas! Se agora eles se veem obrigados a aceitar a queda de seu governo, isso não significa que nossa vitória já esteja completa. Tentarão entregar os anéis para manter os dedos! Seu objetivo principal nunca foi manter Temer a qualquer preço, mas sim garantir a aprovação das contrarreformas em tramitação no Congresso.

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e Temer de fato cair, buscarão promover mais uma manobra institucional para que um novo presidente seja indicado indiretamente pelo próprio Congresso Nacional com o objetivo de manter a tramitação dos projetos de contrarreformas. Tentarão dar um ar de legitimidade a esse novo presidente buscando uma figura que aparente ser de fora do cenário político, alguém do judiciário ou um economista. Seria uma personalidade supostamente neutra, movida por razões técnicas e não “ideológicas” e que refletisse um esforço de “unidade nacional”, blá, blá, blá.

Balela! Continuarão tentando nos fazer engolir as contrarreformas através desse discurso mentiroso de que elas são necessárias e de que não há outra saída. Eles sabem que não podem submeter à consulta popular as atrocidades que querem aprovar no Congresso e implementar contra os trabalhadores e o povo brasileiro. É preciso dizer em alto e bom som que não aceitaremos isso! Nem a indicação indireta de um presidente por esse Congresso corrupto e sem moral, nem a continuação da tramitação das contrarreformas da previdência e trabalhista no Congresso!

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ossa alternativa é que o povo deve decidir! Exigimos eleições diretas já para presidente e para o Congresso! Eleições organizadas a partir de regras efetivamente democráticas. Quem quiser pleitear a presidência da república terá que assumir publicamente uma posição sobre as medidas de ataque e con-

O que a LSR defende:

do PIB para a educação pública já! Não à reforma do ensino médio de Temer! 10% do PIB para a saúde pública já! ●● Pelo direito à cidade para os trabalhadores e o povo! Tarifa zero nos transportes públicos! Estatização do sistema de transporte com controle democrático dos trabalhadores e usuários! Pelo direito à moradia garantido a todos e todas! Nenhum corte nos gastos e investimentos sociais! Mais investimentos na qualidade do transporte e serviços públicos! ●● Reforma agrária controlada pelos trabalhadores com fim do latifúndio! Não à usina de Belo Monte! Em defesa do meio ambiente e do direito à terra para as comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas! Fim do massacre dos sem-terra e indígenas! ●● Aumentos salariais de acordo com a inflação! Congelamento dos preços dos alimentos e tarifas públicas! Redução da jornada de trabalho sem redução de salários! ●● Contra o estatuto do nascituro em tramitação no Congresso! Pela legalização do aborto! Pelo fim da violência contra a mulher! Contra as propostas de reforma trabalhista e da previdência que visam retirar direitos

Telefone:

da mulher trabalhadora! Salário igual para trabalho igual! Por mais verbas para a implementação da Lei Maria da Penha! Contra toda forma de opressão às comunidades LGBT! ●● Pelo direito democrático de manifestação! Não à criminalização dos movimentos sociais e à repressão! Liberdade e fim dos processos sobre os manifestantes! ●● Basta de violência policial racista nas periferias! Desmilitarização e controle popular sobre a polícia! Combater o racismo nos locais de ensino, de trabalho e na sociedade. ●● Reestatização das empresas privatizadas por FHC, Lula, Dilma e Temer com controle democrático dos trabalhadores! Estatização do sistema financeiro e grandes empresas que controlam a economia sob controle dos trabalhadores! ●● Pela reconstrução das ferramentas de luta da classe trabalhadora, independentes dos governos petistas e da direita tradicional. ●● Construir a CSP-Conlutas como central sindical e popular, democrática, classista e de luta, que sirva como base para a constru-

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trarreformas de Temer. Terá que enfrentar uma opinião pública amplamente contrária a essas medidas. O mesmo vale para o Congresso Nacional. A maioria dos deputados e senadores foi financiada em suas campanhas por um pequeno grupo de grandes empresas que são donas de seus mandatos e promovem os vergonhosos esquemas corruptos. A defesa de eleições diretas e gerais já, reivindicando a soberania popular, representa um obstáculo à aprovação das contrarreformas! Mas nossa luta tem que ir além. Precisamos oferecer uma alternativa da classe trabalhadora diante da mais grave crise da história do país em muitas décadas. É preciso denunciar todo esse sistema político falido, um sistema baseado no controle das instituições políticas por um punhado de grandes empresas e bancos. Queremos uma reforma política radical, democrática, popular e anticapitalista!

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luta por uma democracia real em nosso país é também a luta pelo direito ao trabalho, moradia, saúde, educação. É a luta por outro sistema econômico. Devemos começar suspendendo o pagamento da dívida pública aos grandes tubarões capitalistas e avançar na direção do controle dos trabalhadores sobre os setores chave da economia. Nesse cenário, devemos também construir, nas lutas dos trabalhadores e do povo, uma alternativa política unificada da esquerda socialista, uma alternativa que responda aos planos de ataques da direita neoliberal, mas que também rejeite a política de conciliação de classes do PT e do Lulismo. Uma nova etapa intensa e dura da luta dos trabalhadores se inicia. Vamos até a vitória! Declaração da corrente LSR Liberdade, Socialismo e Revolução 18/05/2017 ção de uma nova Central unitária de todos os setores combativos e independentes de patrões e governos. ●● Construção pela base de espaços democráticos amplos para unificar as lutas. Por um Encontro Nacional dos Movimentos em Luta! ●● Pela construção de novas relações entre aqueles que lutam, baseadas na solidariedade de classe, democracia e respeito às divergências. ●● Por um PSOL afinado com as ruas: de luta, socialista e radicalmente democrático. Por candidaturas do PSOL a serviço das lutas e com um programa socialista. Qualquer representante público do PSOL deve viver com salário de trabalhador. Pela construção da Frente de Esquerda nas eleições e nas lutas. ●● Por um governo dos trabalhadores baseado na democracia das ruas, na mobilização de massas dos trabalhadores e da juventude e com um programa socialista! ●● Por uma economia democraticamente planificada, onde a produção e os serviços, preservando o meio ambiente, estejam voltados aos interesses de toda a população e não uma pequena elite privilegiada. ●● Por uma Federação Socialista da América Latina e um mundo socialista.

Colaboraram nessa edição: André Ferrari, Aretha Melo, Cacá Melo, Diego Siqueira, Eduardo Padoan, Isabel Keppler, Jane Barros, José Afonso Silva, Marcus Kollbrunner, Maria Clara Ferreira, Miguel Leme e Pedro Meade


nacional/lutas

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Convocar já uma Greve Geral de 48 horas! Para avançar na luta contra Temer e as reformas O governo Temer está cambaleando e com uma forte mobilização nas ruas e escalada das lutas podemos garantir que o governo caia. Já na primeira noite após a delação dos donos da JBS, dezenas de milhares de pessoas foram às ruas em várias cidades do Brasil. A queda de Temer representaria uma vitória importante, mas nossa luta não acaba aí. A classe dominante vai apostar em uma saída através de uma eleição indireta para voltar rapidamente à “normalidade”, para que possam retomar as

A data da Marcha à Brasília foi definida pelas centrais sindicais após a forte Greve Geral realizada no dia 28 de abril. Este dia foi o resultado do processo de luta que já vinha ocorrendo e que se expressou nas paralisações, atos e travamento de rodovias realizados nos dias 08, 15 e 31 de março. O dia 28 de abril deixou mais evidente que a juventude e os trabalhadores têm condições de derrotar as contrarreformas do governo Temer. Milhões de trabalhadores paralisaram a produção e a circulação de mercadorias e pessoas.

Mobilização ampla garantiu a greve geral A tentativa do governo em desqualificar este dia foi patética. Osmar Serraglio, Ministro da Justiça, disse que a Greve Geral não foi significativa. Entretanto, as pesso-

contrarreformas trabalhista e da previdência. A Marcha Nacional Contra as Reformas da Previdência, Trabalhista e a Terceirização em Brasília, no dia 24 de abril, precisa também levantar a bandeira de Diretas Já e Eleições Gerais. As centrais sindicais precisam já marcar a data para uma nova Greve Geral de 48 horas para garantir que as contrarreformas não voltem pela porta de trás. Miguel Leme Membro da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas

as sabiam que esta fala não correspondia à realidade. Muitos trabalhadores não conseguiram chegar ao seu local de trabalho devido às greves do setor de transporte. Outros aderiram de forma consciente à Greve Geral. A força deste dia se explica pela unidade das centrais sindicais e um processo de construção bastante progressivo e que extrapolou as burocracias sindicais através da formação de diversos comitês de lutas contra as reformas. Após a Greve Geral de 28 de abril, houve uma grande expectativa de que as centrais sindicais marcassem a data de uma nova Greve Geral e de que ela fosse de 48 horas. Isto não ocorreu. A aprovação da Marcha à Brasília no dia 24 de maio foi correta, mesmo porque há uma possibilidade bastante concreta de que o projeto de reforma da previdência seja votado neste dia.

Não podemos deixar a peteca cair: a preparação de uma nova Greve Geral tem que começar já. Em todos os estados devem ser realizados atos, para mobilizar também aqueles que não poderão ir até Brasília.

Próximo passo já deveria estar engatilhado Entretanto, esta Marcha deveria ser parte da construção de uma Greve Geral de 48 horas que já deveria ter sido definida pelas centrais sindicais no mesmo momento em que esta ação em Brasília foi aprovada. Esta foi a defesa realizada pela CSP-Conlutas e pela Intersindical. Infelizmente, este não foi o en-

Os movimentos populares tem jogado um papel fundamental nos protestos e bloqueios de estradas.

tendimento das centrais sindicais que dirigem o maior número de sindicatos no país, como é o caso da CUT e da Força Sindical. A CUT se recusou a defender a data de uma nova Greve Geral pois seus dirigentes estavam mais preocupados em acompanhar o depoimento de Lula ao juiz Sérgio Moro, em Curitiba, no dia 10 de maio. Para além da questão democrática, a defesa de Lula por parte da CUT faz parte da política da Frente Brasil Popular que tem como estratégia a eleição de Lula em 2018 para que o PT implemente novamente, sem qualquer autocrítica, a sua política de conciliação de classes. Este filme nós sabemos muito bem como começa e termina. Já o deputado Paulinho, presidente da Força Sindical, não quer que haja uma radicalização do processo de mobilização, jogando um jogo duplo, pois apoia o governo Temer e quer, tão somente, realizar pequenas alterações nos projetos. No caso da reforma trabalhista, o único objetivo dele é evitar o fim do imposto sindical. No caso da previdência, as mudanças propostas são cosméticas, como reduzir um pouco a idade mínima para o trabalhador poder se aposentar. Num cenário como este, é imprescindível uma pressão pela base para que as centrais sindicais convoquem já um Greve Geral de 48 horas, para dar continuidade às lutas e garantir que as reformas trabalhista e previdenciária sejam enterradas, mas também para que os

ataques já votados, como a PEC 55, a liberação das terceirizações, etc. – projetos votados com votos comprados e por um governo e congresso corruptos – sejam anulados. Neste processo de pressão, é fundamental fazer aprovar nas assembleias das categorias a exigência de que as centrais sindicais definam já as datas para realização de uma Greve Geral de 48 horas no país. Neste marco, é bastante progressiva a deliberação da Reunião do Conselho de Entidades da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), realizada nos dias 11 e 12 de maio. Esta reunião aprovou, em indicativo, a realização de uma nova Greve Geral, de um ou dois dias, na semana de 1 a 9 de junho.

É possível derrotar os ataques Os projetos de ataques de Temer são centrais para a classe dominante. Qualquer governo eleito indiretamente só será aceito por ela se for para cumprir a agenda de contrarreformas. Mas nesse momento de profunda crise política, onde os principais quadros dos grandes partidos estão sendo investigados por corrupção, é possível arrancar vitórias. Para isso, é necessário manter as mobilizações através de um processo crescente de radicalização da luta. Neste momento, este processo de radicalização passa pela realização de uma Greve Geral de 48 horas construída pela base.


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PSOL

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PSOL como uma alternativa socialista: uma resposta política à crise do capital Às vésperas do VI Congresso do PSOL, em meio a uma das maiores crises política e econômica já vividas no Brasil, um grande desafio é lançado: construir o PSOL como uma real alternativa socialista, capaz de dar voz às demandas e necessidades da grande maioria da população - o povo pobre, trabalhadores (as) e juventude. Jane Barros Derrotar a direita e superar o lulismo significa construir a unidade de todos e todas que lutam pelo Fora Temer, além de levar até as últimas consequências as lutas contra as contrarreformas e pela revogação das medidas já aprovadas. Isso também significa superar na prática as direções sindicais burocratizadas, pela base, pelo movimento real. É necessário também forjar nas lutas um programa capaz de denunciar a podridão deste sistema e apontar uma alternativa real, através de um programa transicional, onde o socialismo não seja mobilizado apenas como agitação, em dias de festa. Esta deverá ser a linha condutora do VI Congresso do PSOL. O tema do Lulismo e da Lava Jato certamente mobilizarão debates, propostas e encaminhamentos nas etapas regionais e no congresso do PSOL - sobretudo após a delação premiada do JBS e o evidente envolvimento de Temer nos esquemas de corrupção. Estes são os temas políticos que mobilizam opiniões e divisões no interior da esquerda e que acabam por revelar diferenças de fundo quanto aos caminhos da luta da classe trabalhadora.

Superar o Lulismo Para nós da LSR, a superação do lulopetismo é uma tarefa fundamental do PSOL. Nosso partido foi construído numa conjuntura adversa para a formação de uma ferramenta da classe trabalhadora - algo tão necessário e importante quanto as dificuldades de se opor ao PT naquele momento em 2003. Sem dúvida, nos opor ao projeto petista naquela época era muito mais difícil do que agora, uma vez que as alianças, a continuidade da aplicação das políticas neoliberais, a completa capitulação ao jogo “democrático” burguês através dos esquemas de corrupção, compra de votos e troca de favores foi revelada de maneira mais aguda a partir do naufrágio do projeto de conciliação de classes com o golpe parlamentar contra Dilma. A apatia dos trabalhadores ao im­

É necessário criar uma relação orgânica entre a atuação dos representantes eleitos do PSOL e a luta nas ruas e dos movimentos, o principal motor para verdadeiras mudanças. peachment da presidenta Dilma era um indício de que a grande massa não sairia às ruas em defesa do projeto petista. Aos que foram às ruas, coube defender os elementos progressistas da democracia e se opor ao golpe institucional. A Greve Geral de 28 de abril mostrou que é possível derrotar Temer e suas contrarreformas. Com os recentes escândalos, fica insustentável a manutenção deste governo. O PSOL acerta no chamado das Diretas Já, uma vez que o risco das eleições indiretas está em cena. Mas, se não vincularmos esse chamado à necessidade de eleições gerais para todo o parlamento, esta palavra de ordem se torna insuficiente para a atual conjuntura. Devemos avançar no debate de uma constituinte específica organizada pela base, como forma de construir uma Reforma Política radical. Lula surge nas pesquisas de opinião como uma alternativa. Até mesmo os representantes do capital não descartam a possiblidade de apoiá-lo caso a direita clássica não apresente um nome à altura. Tudo em nome do jogo burguês e da governabilidade. Cabe ao PSOL mostrar, ao mesmo tempo que defendemos unidade de luta para derrotar Temer e seus ataques, que o projeto de conciliação de classes do lulismo nos levará à derrota. Nosso projeto político não pode se confundir com esse. Afinal, a solução apresentada por Lula não defende o programa necessário: suspensão do pagamento da dívida pública, reestatização das empresas privatizadas, revogação das contrarrefomas, punição aos crimes ambientais, con-

tra a Lei de Responsabilidade Fiscal, pela ampliação de verbas para as políticas sociais, taxação das grandes fortunas, cobrança das dívidas das grandes empresas, seguradoras e bancos.

Lava Jato não é a saída Por sua vez, as ações seletivas da Lava Jato mostram que não representam uma saída para impor “justiça” no sistema burguês corrupto. Se é verdade que, em função da própria pressão popular, a classe dominante perdeu controle do processo – visto que a operação chegou a grandes empresários e, agora, figuras centrais como Aécio e Temer - a visibilidade e centralidade dada aos que se entendem como “a velha esquerda” é absurdamente desproporcional e os abusos abrem brechas para uma caça à verdadeira esquerda brasileira, ativistas e movimentos sociais. O PSOL deve ser favorável à punição de todos os envolvidos, assim como deve se colocar contrário a essas saídas e soluções de fortalecimento de um judiciário totalmente comprometido com o grande capital e, portanto, com a elite deste país.

Retomar o debate sobre concepção de partido O centro do congresso do PSOL deve ser o debate sobre grandes temas políticos, para formar novos quadros que possam intervir na luta, armados por um programa em torno de um novo projeto de sociedade. Isso passa centralmente por superar os modelos de partidos tradicionais, assim como identificar

os erros já cometidos pelo petismo, berço de origem de uma geração importante de militantes e ativistas do PSOL. A relação entre partido e movimento deve ser debatido. Os parlamentes tem tido importantes atuações, nas comissões e na Câmara, ao denunciar o impeachment e as contrarreformas. Todavia, o epicentro das lutas se dá fora da institucionalidade. O PSOL acertou na conjuntura, mas ainda não está suficientemente ligado às lutas, não tem uma base social mais sólida. Nesse sentido, os parlamentares devem usar a tribuna como catapulta para as lutas contra este sistema. A independência de classe e a autonomia financeira não revelam o “tradicionalismo ortodoxo” dos revolucionários do PSOL, mas sim a precondição para a construção de um partido classista, independente dos interesses das grandes empresas e capaz de contribuir para a construção das lutas sociais, nas ruas e nas urnas. As alianças com partidos que objetivam “viabilizar” a vitória eleitoral foi um dos caminhos para o fracasso do PT. Este tema volta ao centro do debate diante da real ameaça da contrarreforma eleitoral. A pressão institucional tende a aumentar com a ameaça colocada pela cláusula de desempenho de 2%. A única saída é construir o PSOL como ferramenta da luta, com perfil radical e de esquerda. Também não devemos cair no erro de aplicar filiações em massa despolitizadas como arma para disputas internas, que colocam em risco o caráter do partido e nos fragilizam para o combate.

Parte deste processo entende-se a luta pelo combate as opressões. É inegável o papel das mulheres e das lutas identitárias neste período de crise no Brasil e no mundo. Este muitas vezes é o primeiro degrau da luta, mas é insuficiente para a superação das opressões. É tarefa da vanguarda socialista fazer a disputa sob os rumos do movimento feminista, de modo consequente e anticapitalista. Essa é uma tarefa para o conjunto do PSOL e das mulheres organizadas em torno de políticas para o movimento e conjunto da sociedade. Por fim, este momento histórico será um teste para o PSOL. A necessidade de uma alternativa política socialista e de esquerda está posta na ordem do dia e dependerá da capacidade do partido de ampliar suas instâncias democráticas, de chamar a base à construção do seu programa e das lutas, como possibilidade de construção de um real enraizamento social. Para tanto, nós da LSR acreditamos ser necessária a construção de um polo de esquerda, marxista e revolucionário no PSOL, capaz de fazer a disputa política fraterna e necessária em torno de um programa que expresse a necessidade de construção do novo.

A superação do discurso do “partido viável” A tarefa deste Congresso do PSOL é avançar em torno do debate do programa e partido “viável”. A crise atual mostra o que é inviável: tentar melhorar a situação dos trabalhadores dentro dos marcos de um sistema inviável. A “viabilidade” institucional burguesa não serve à maioria da população e ao povo pobre, às mulheres, negros e negras da classe trabalhadora. Opor-nos à direita e superar o lulismo é nossa tarefa histórica, ainda mais urgente na atual conjuntura de crise orgânica. E essa oposição não se constrói apenas pelo balanço do passado, do erro das políticas neoliberais implementadas, mas, sobretudo, por um programa que aponte o que queremos, que dialogue com a classe trabalhadora na sua diversidade e complexidade, mas que indique, antes de mais nada, que a solução para nossos problemas passa por empoderar a nossa classe. Neste sentido, o nome do PSOL para disputar a presidência em 2018 deve ser construído com base no programa - este vem primeiro. Mas deve ser forjado na luta, reconhecido pela classe e deve ser capaz de representá-la à altura dos desafios.


nacional

Ofensiva Socialista n°34 maio-junho 2017 A cantilena do “Feliz 2018” – em que a volta de Lula ao governo acabaria com nossos pesadelos – representa um enorme perigo para as lutas em curso contra a tempestade de ataques de Temer. Além de apostar na normalidade institucional e deixar de lado qualquer balanço crítico da experiência Lulista no poder, também impede o debate sobre qual o programa capaz de tirar o país da crise do ponto de vista dos trabalhadores. A esquerda socialista precisa apresentar seu próprio projeto nas lutas e na disputa política geral.

Feliz 2018?

O caminho é outro: apostar na luta de massas e construir uma alternativa de esquerda e socialista

André Ferrari A Greve Geral de 28 de abril foi um fator determinante na situação política do país. Ela mostrou que é possível derrotar Temer e suas contrarreformas. Ainda não alcançamos plenamente nosso objetivo, mas está claro que o único caminho é a rua, é a luta, a mobilização de massas da classe trabalhadora com seus métodos de luta. O impacto das gravações da JBS envolvendo Temer foi potencializado pela retomada das lutas populares refletida no 28 de abril. Em um cenário frio, de calmaria, a classe dominante e o governo teriam melhores chances de contornar o escândalo e se recompor. Poderiam inclusive descartar Temer, recompor-se com um novo governo ilegítimo e continuar investindo tudo na tramitação das reformas no Congresso. Afinal, Temer é só um meio, o fim mesmo são as contrarreformas.

Só com luta impedimos os ataques Só a luta direta dos trabalhadores pode impedir isso. Nenhuma negociação de cúpula feita através dos espaços institucionais tradicionais poderá levar a uma vitória dos trabalhadores contra as reformas. A única linguagem que governo, Congresso e a classe dominante entendem é a linguagem da paralisação da produção e da circulação de mercadorias, dos piquetes e bloqueios de avenidas e estradas, da

Uma alternativa de esquerda deve ser forjada a quente nas lutas contra os ataques de Temer. ocupação massiva das ruas e praças públicas. Com a iminente queda de Temer, será preciso reafirmar isso com ainda mais força. Um novo governo ilegítimo indicado indiretamente pelo Congresso apelaria para uma retórica de “união nacional”, sem deixar de lado a repressão, para normalizar a situação e enfiar as reformas goela abaixo do povo. O pior erro para quem esteve na luta contra Temer e as reformas seria aceitar essa situação e esperar 2018 para dar o troco. Quem joga todas as fichas nas próximas eleições como forma de reverter a situação dramática do país e os retrocessos em curso acaba, conscientemente ou não, apostando na normalização da situação que dará sobrevida a esse sistema político falido.

Exigir saídas fora da normalidade

Lula 2018 seria uma repetição da mesma tática que deu errado – num cenário pior.

Por outro lado, se nós tomarmos as ruas de forma ininterrupta e contundente, poderemos derrotar os ataques aos direitos dos trabalhadores e ainda exigir saídas políticas fora da normalidade. Será possível conquistarmos a convocação de eleições gerais sobre bases realmente democráticas impostas pelas luta. De qualquer forma, a manutenção da normalidade institucional se mostra um cenário cada vez menos factível. Apostar nessa normalidade em nome da eleição de Lula num clima de paz e estabilidade só serve para desarmar os movimentos de massas e preparar novas derrotas para os trabalhadores e o povo. Para sermos claros: apostar na

normalidade institucional e ficar esperando as eleições de 2018 é fazer o jogo da recomposição da burguesia em meio à grave crise de seu próprio sistema. Não cumpriremos esse papel.

Lulismo e conciliação de classes A experiência do Lulismo no governo deveria fazer com que o conjunto da nossa classe tirasse lições decisivas. A mais importante delas é que a estratégia de conciliação de classes e manutenção da ordem promovida pelo PT levou necessariamente à derrota das forças populares e abriu caminho para a ofensiva da classe dominante. As poucas concessões oferecidas à parcela mais pobre da população pelos governos do PT viraram pó assim que as crises econômica e política se aprofundaram. Lula e Dilma não promoveram nenhuma mudança estrutural que atingisse a raiz da escandalosa desigualdade social do capitalismo periférico, dependente e atrasado do Brasil. Por um período, o Lulismo foi útil a uma burguesia que mantinha todos os seus privilégios fundamentais em um contexto de maior paz social e estabilidade. Mas isso mudou quando a classe dominante, diante da crise mundial do capitalismo, precisou apertar o torniquete sobre os trabalhadores e os interesses do povo brasileiro. Nesse momento, a desprestigiada Dilma já não servia mais e foi descartada. Mesmo nesse contexto, a busca da conciliação com a direita e a classe dominante prevaleceu no PT. Negando seu próprio discurso na campanha eleitoral de 2014, Dil-

ma tentou desesperadamente promover ainda mais políticas que fossem do gosto do grande capital, como um duro ajuste fiscal e o início de contrarreformas. Apesar disso, fracassou em convencer a burguesia de que deveria ficar. Por sua vez, a estratégia de Lula nas mobilizações contra a manobra golpista do impeachment em 2016 – gritada em alto e bom som na Avenida Paulista diante de mais de cem mil pessoas – resumia-se a tornar-se ministro de Dilma e, nessa condição, renegociar com o PMDB no Congresso. O resultado já conhecemos. O que falta para aprendermos que a conciliação com a classe dominante e a direita sempre vai nos levar a derrotas? Vamos trilhar o mesmo caminho novamente olhando para 2018? Não. Esse não é o caminho. No combate a Temer e suas reformas, somos plenamente a favor da unidade de ação com todos aqueles que se engajem nessa luta. Essa unidade é fundamental para mobilizar ao máximo a classe trabalhadora e o povo. Mas, para construir um novo caminho, não pautado pelas ilusões na conciliação de classes, é preciso construir uma nova alternativa política da esquerda e dos trabalhadores, uma alternativa que supere a experiência do PT e de Lula e que aprenda com os erros e traições destes.

Alternativa de esquerda e socialista O caminho para a construção de uma alternativa política de esquerda e socialista passa, antes de tudo, por vencer a batalha das ruas

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em 2017. Não será na estabilidade e normalidade que essa alternativa será formada. O caminho da luta direta dos trabalhadores é a forma de forjarmos à quente a força social organizada e mobilizada capaz de enfrentar a direita e a classe dominante. Essa alternativa também terá que se apresentar com um programa consequente como alternativa à crise do país, às políticas da direita e ao projeto de pacto social Lulista. Em seu discurso na manifestação de 15 de março, na Avenida Paulista, Lula disse qual seria sua alternativa à reforma da previdência de Temer. Limitou-se a defender que promoveria crescimento econômico e, dessa forma, aumento da arrecadação. Como se isso fosse possível no atual contexto de crise do capitalismo. Um suposto novo governo Lula não iria acontecer nas mesmas condições excepcionais que encontrou no passado. O boom das commo­ dities e do crédito não se repetirá. Precisamos de um programa para enfrentar a crise e atender todas as demandas dos trabalhadores e do povo por trabalho, salário, moradia, educação, saúde, transporte, por mais direitos sociais, igualdade, contra todo tipo de opressão e em defesa do meio ambiente. Os recursos necessários para isso terão que vir da parcela de magnatas, do 1% mais rico da população brasileira. Será preciso auditar e suspender o pagamento da dívida pública aos grandes capitalistas. Precisaremos vincular as demandas populares com políticas de caráter anticapitalista e socialista, baseadas no controle democrático dos trabalhadores sobre os setores-chave da economia brasileira.

Além da lógica dos limites do capital Nosso programa não será um programa “viável” dentro da lógica do capital. Nosso programa tem que ser a expressão da vontade popular organizada nos diversos movimentos sociais costurada a partir de um projeto anticapitalista e socialista. Somente com base na luta e num programa socialista, o PSOL e outros setores da esquerda socialista e dos movimentos combativos poderão enfrentar as ilusões no retorno de Lula ou o argumento do mal menor. A decisão da Executiva Nacional do PSOL de que o partido terá candidato próprio é uma decisão correta. Ela indica, espera-se, que o partido não sucumbirá diante das ilusões no papel de Lula. Mas, essa decisão precisa ser completada com uma clara prioridade para a luta de massas dos trabalhadores e a construção de um programa socialista. Além disso, deve apontar a necessidade de uma Frente de Esquerda Socialista envolvendo partidos da classe trabalhadora (como PCB, PSTU) e organizações e movimentos combativos (como o MTST, CSP-Conlutas, etc.). A definição de um nome que represente esse projeto deverá ser consequência dessas definições anteriores.


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especial

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Um mundo de cri

Crescente ameaça da direita e novas op

Assim como no Brasil, a crise mundial do capitalismo que eclodiu em 200708 abriu um período marcado por crise política e grande volatilidade. Eventos como a vitória de Trump nos EUA e a votação pela saída da Grã-Bretanha da União Europeia são exemplos disso. Há uma leitura presente na esquerda de que esses acontecimentos, e outros, confirmam um cenário de uma “onda conservadora” pelo mundo, que também explica a situação atual no Brasil. Porém, essa é uma leitura unilateral do cenário.

A queda do stalinismo em 198991 abriu o caminho para uma ofensiva neoliberal avassaladora, fortalecida pela guinada à direita dos antigos partidos de trabalhadores, que passaram de tímidos defensores de melhorias por dentro do sistema a campeões das contrarreformas neoliberais. Os ataques aos direitos dos trabalhadores, junto ao processo migratório de grande parte da produção industrial para China e o sudeste asiático, enfraqueceram os sindicatos e a resistência dos trabalhadores. Nesse cenário, a onda de propaganda da classe dominante pelo mundo sobre a “morte do socialismo” teve efeito e levou a um retrocesso na consciência sobre a possibilidade de existir uma alternativa ao sistema capitalista atual. O ponto alto do neoliberalismo passou rapidamente, já que se mostrou incapaz de trazer qualquer melhoria para a maioria da população.

Para quem está engajado na luta pela construção de uma alternativa socialista, é fundamental ter uma leitura equilibrada da situação, levando em conta também uma crescente radicalização das lutas no mundo – lutas que incluem a classe trabalhadora voltando a usar ferramentas históricas como a greve geral e a busca por alternativas, que abrem espaço para uma nova esquerda. Os exemplos e lições desse processo ao redor do mundo trazem elementos importantes para fazer uma leitura mais aprofundada sobre a situação brasileira. Marcus Kollbrunner Já no final dos anos 1990, vimos uma crescente resistência, como o movimento “antiglobalização”, os Fóruns Sociais Mundiais e, aqui na América Latina, o surgimento dos governos “bolivarianos” na Venezuela, Bolívia e Equador, ou mesmo a eleição de Lula em 2002.

Retomada da consciência socialista Porém, o processo de retomada de uma consciência socialista, que não só reage às injustiças, mas que também acredita em uma alternativa ao sistema, tem sido mais lenta. O recuo da esquerda revolucionária, onde mesmo a esquerda anti-stalinista foi afetada pelo retrocesso na consciência e a fragilidade das novas alternativas de esquerda têm contribuído para essa lentidão.

Porém, a crise de 2007-08 marcou um novo ponto de inflexão importante, que ajudou a acelerar esse processo, mesmo que continue cheio de contradições. Não foi simplesmente uma nova crise cíclica, conjuntural, mas uma das mais profundas crises da história do capitalismo, que aprofundou também uma tendência de crise política.

Crise no sistema político Em vários países vemos exemplos do desmoronamento do antigo sistema político. Nos EUA, as pesquisas apontam para mais de 60% da população dizendo que é necessário um terceiro partido. Na Bélgica, o país ficou por 589 dias sem conseguir formar governo em 2010-11. Na Espanha, após as eleições de 2015, o bipartidarismo, que reinava desde os anos 1970, deu lugar a dois novos partidos (Podemos, de esquerda, e Cidadãos, de direita) e foi necessária uma nova eleição e golpe interno no PSOE (socialdemocrata), antes de ser possível formar um novo governo. Na Grécia, o PASOK (socialdemocrata) quase desapareceu e deu lugar ao Syriza. Existe uma crescente raiva contra o establishment e revolta contra os antigos partidos do poder. Nessa situação, surgem novas alternativas, nos marcos de uma crescente polarização social. Muitas vezes se aposta em figuras novas, que aparentam vir de fora do sistema: a catástrofe ambulante Trump, nos EUA; o comediante Beppe Grillo, na Itália; ou agora Macron, na França. Dória, eleito prefeito em São Paulo no primeiro turno, usou a mesma imagem. Aonde há alternativas claras de esquerda, uma saída radical vem também ganhando apoio. Porém, onde ainda não surgiu uma alternativa de esquerda que consiga canalizar essa ira, uma direita racista vem crescendo também. Em boa parte dos países da Europa, observamos partidos racistas, de extrema direita e reacionários entre os três maiores partidos. Algumas vezes até saindo em primeiro lugar nas eleições, como na Suíça, ou até mesmo formando governos, como na Hungria.

Onda racista na Europa?

Esse é o representante da maior potência imperialista do mundo.

Mas, existe mesmo uma “onda racista” na Europa? Tirar essa conclusão hoje seria um exagero. Mesmo assim, não podemos baixar a guarda diante da ameaça que existe, sim, da extrema direita.

Não só avanço da direita: 150 milhões participaram na maior greve g contra um novo pacote de cortes, agora do governo Syriza. Torced Os partidos racistas têm crescido, principalmente, por conta da política onde os principais partidos, incluindo a “esquerda” socialdemocrata, pregam “solidariedade”, mas aplicam ataques aos trabalhadores, além de tornar cada vez mais difícil para refugiados entrarem na Europa, o que facilita aos racistas transformarem imigrantes em bodes expiatórios. Em geral, é uma minoria que tem opiniões racistas. A maioria que vota nesses partidos o faz como uma maneira de protestar. Por isso, o apoio a esses partidos é volátil. O partido racista UKIP, por exemplo, caiu de 22% para 5% nas últimas eleições municipais na Grã-Bretanha. Uma grande parte dos eleitores do partido Aurora Dourada, abertamente nazista, na Grécia, dizem ter o Syriza como segunda opção. Vários desses partidos racistas, mesmo os que têm raízes em movimentos fascistas, tentam adotar uma postura mais moderada, para conseguir atrair votos. Marine Le Pen chegou a expulsar o próprio pai, Jean-Marie Le Pen, fundador de sua Frente Nacional, para amenizar o perfil do partido e

mesclou retórica racista com defesa dos “direitos sociais” do “povo” (francês, é claro), contra o neoliberalismo. A grande onda de refugiados para a Europa em 2015 levou a uma enorme mobilização de solidariedade com os refugiados em vários países. Dezenas de milhares de voluntários abriram suas casas, organizaram doações de alimentos e abrigos para os recém chegados, mostrando que o racismo tem ainda uma fraca base. Isso não significa que não é possível o crescimento de um sentimento xenofóbico mais profundo, se essa solidariedade não vier acompanhada de argumentos contra a política anti-imigrantes implementada por quase todos os governos da Europa, em diferentes graus.

Brexit – uma revolta contra a elite A vitória do Brexit na Grã-Bretanha tem sido vista por muitos como uma confirmação dessa onda conservadora, e até nacionalista. Há sim uma direita nacionalista que é contra a União Europeia (UE), com ar-


especial

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ise e polarização

portunidades para uma esquerda radical Mas a derrota do Labour nas eleições municipais e a grande vantagem de Theresa May nas pesquisas para as eleições gerais em junho não mostram o avanço conservador? Novamente, a situação é bem mais complexa que isso.

Toda a elite contra Corbyn

geral da história na Índia no ano passado. Nova greve geral na Grécia dores alemães com faixa dizendo “os refugiados são bem vindos”. gumentos de direita. Porém, a UE não tem nada de um projeto “internacionalista”, “pela paz”, etc. Desde o início, tem sido um projeto da classe dominante europeia se juntar para não sucumbir à concorrência dos EUA e Ásia (primeiro Japão e, agora, China). A UE tem sido uma ferramenta poderosa para impor uma política neoliberal e atacar os direitos dos trabalhadores em todo o continente. Isso ficou ainda mais evidente com a última crise e os pacotes de ataques brutais impostos pela UE sobre a Grécia. O debate antes do plebiscito sobre o Brexit ficou distorcido pelo fato de que a principal figura da esquerda, Jeremy Corbyn, em tentativa de chegar a uma trégua com a direita do partido trabalhista Labour, abandonou sua posição histórica de oposição à UE e fez uma tímida campanha pela permanência na União. Assim, a direção “oficial” da campanha pelo Brexit ficou nas mãos de figuras como o líder do partido racista UKIP. Mesmo assim, muitos sindicatos e ativistas da esquerda fizeram uma campanha por uma saída à esquerda da UE, por uma alternativa

realmente internacionalista, mesmo entendendo que muitos iriam votar a favor da permanência por medo do nacionalismo. Uma análise mais profunda do resultado mostra que a votação não foi vitória de um nacionalismo propriamente dito. Mesmo se uma minoria racista tenha se sentido fortalecida e tenha havido um certo aumento de ataques xenófobos, a votação expressou principalmente uma revolta contra a elite no país. O efeito político não foi de fortalecimento da direita. O UKIP não cresceu e seu líder renunciou. Cameron, líder do partido conservador Tories, também renunciou e quem assumiu não foi o “Trump britânico”, Boris Johnson, mas a Theresa May. E dentro do Labour, vimos a enorme mobilização para defender Jeremy Corbyn da tentativa de golpe por parte da direita partidária. O influxo de mais de 200 mil novos filiados atraídos pelo discurso radical de Corbyn, que tornou o Labour o maior partido da Europa Ocidental, mostra também que a vitória do Brexit não foi uma avalanche reacionária.

A classe dominante e a imprensa britânica têm lançado uma gigante campanha contra Corbyn desde que ele inesperadamente foi eleito líder do Labour em 2015, temendo que ele ganhasse as eleições. Nisso tiveram ávido apoio da direita do Labour. O ex-premier Tony Blair chegou a defender que as pessoas deveriam votar nos liberais ou Tories na próxima eleição, contra o próprio partido. Essa direita do partido representa o processo de aburguesamento da socialdemocracia - Tony Blair foi o principal aliado de Bush na guerra no Iraque. Seu governo não revogou nenhuma legislação que retira direito dos sindicatos, nenhuma privatização ou qualquer outro ataque implementado pelos governos conservadores. E ainda hoje a direita do Labour, que tem a maioria dos vereadores do partido nos municípios, aplica todos os cortes nos serviços públicos exigidos pelo governo conservador. De fato, desde que Corbyn foi eleito à liderança do partido, há uma guerra civil dentro do Labour. Mas a postura do Corbyn é de não travar uma luta para derrotar essa direita. Suas concessões e tentativas de acordo só enfraquecem suas posições e dão argumento para a campanha na mídia que o coloca como líder “fraco” e inapto a governar. Theresa May chamou eleições antecipadas para tirar proveito dessa situação e é possível que ela ganhe. Mas, com uma campanha radical e com mobilização de massas, é possível que Corbyn reverta o quadro. Com a primeira semana de campanha e a publicação de um manifesto eleitoral com posições bem à esquerda, Corbyn já diminuiu a grande vantagem dos Tories.

lhões, com comícios que juntavam dezenas de milhares, com uma mensagem radical de “revolução política contra a classe de bilionários”. Entre os jovens ele teve grande apoio e muitos concordam com a ideia de que ele conseguiria derrotar Trump, diferente de Clinton, algo confirmado pelas pesquisas. Infelizmente Sanders não foi consequente em sua “revolução política” e não rompeu com os democratas, um dos dois partidos do poder das grandes empresas. Da mesma forma que tais alternativas de esquerda podem canalizar as insatisfações e levar a luta dos trabalhadores a um salto qualitativo, os vacilos da esquerda, pelo sectarismo ou pelo oportunismo, também podem implicar em um fortalecimento da direita. Na França pudemos observar isso recentemente.

Mélonchon poderia ter ido ao segundo turno A eleição na França ocorrida em maio deste ano é outro exemplo de que o cenário de revolta contra a elite não necessariamente tende à direita. Novamente há aqueles que veem um exemplo do avanço conservador, com um segundo turno entre o bancário Macron e a racista Le Pen. Primeiro, é sim uma confirmação da revolta contra a antiga elite. Pela primeira vez desde os tempos de Charles de Gaulle, nenhum candidato da direita tradicional (“republicanos”) ou da “esquerda” tradicional (Partido Socialista) conseguiu

chegar ao segundo turno. Porém, a grande surpresa da campanha eleitoral não foi Le Pen, que chegou e tem apoio maior nas pesquisas, mas o avanço do Mélonchon que, com um programa radical, de aumentar impostos para os ricos, sair da OTAN, investir em energia 100% renovável, reduzir a jornada de trabalho e aumentar o salário mínimo, etc. conseguiu mobilizar grandes multidões aos seus comícios. Entre os jovens, Mélonchon foi o mais votado, com 30%. E ele poderia ter ido ao segundo turno. Os resultados finais oficiais mostram que com os votos das duas outras candidaturas de esquerda, NPA e LO, Mélonchon teria superado Le Pen por 8 mil votos! Infelizmente, esses dois grupos mantiveram suas candidaturas para marcar posição, mesmo com uma minúscula expressão (1,1% e 0,6% dos votos). Imaginem um cenário no Brasil onde um candidato do PSOL tem a possibilidade de superar Bolsonaro e ir para o segundo turno contra Dória ou Marina. A diferença para o cenário político é como o dia e a noite. A luta vai retornar rapidamente na França. Macron se diz “nem esquerda, nem direita”, mas seu programa é claramente de ataques aos trabalhadores. Ele fez parte do governo do ex-presidente Hollande e foi o arquiteto por trás da contrarreforma trabalhista. Ele é bancário e trabalhou para o histórico banco Rothschild, defende grandes cortes no setor público, incluindo demissão de continua na pág. 08

De esquerda, radical e de massas E é essa a grande lição das campanhas do Syriza, Podemos, Sanders e Mélonchon. É possível ganhar apoio para uma alternativa de esquerda, mas só quando uma campanha é vista como algo realmente radical, e com mobilização de massas. A campanha de Sanders atraiu mi-

A campanha de Mélonchon conseguiu um amplo apoio com um programa radical e mobilização de massas.


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especial/nacional

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Um mundo de crise e polarização continuação da pág. 07 120 mil funcionários públicos, retirada da jornada de 35 horas e novos ataques ao direitos trabalhistas.

Unir a luta com uma alternativa política O grande desafio e a grande lição de todos esses exemplos é a necessidade de construir um movimento que esteja enraizado nas lutas, mas também uma alternativa política em forma de um partido armado com um programa socialista e preparado pra ir até as últimas consequências. Até agora não vimos nenhum exemplo que em grande escala consiga juntar os dois. Bernie Sanders poderia ter utilizado sua campanha para lançar um novo partido de trabalhadores e romper com os Democratas, o “cemitério dos movimentos sociais”, como é chamado, mas não o fez. Na França, vimos várias ondas de lutas, como em 2002 e 2006, mas sem uma alternativa política surgindo baseado nesses movimentos. O movimento “França Insubmissa” de Mélonchon buscou força da resistência contra aos ataques aos direitos trabalhistas do ano passado para ter potencial para avançar, mas ainda falta uma base forte nos sindicatos. Na Grécia, a luta contra os ataques do governo, a partir da política de austeridade imposta pela União

Europeia, começou como uma luta sindical. Chegaram a ser realizadas mais de 30 greves gerais, mas a direção burocratizada dos sindicatos não tinha uma estratégia para derrubar o governo. Primeiro, quando era “seu” governo, do PASOK, mas que o mercado financeiro derrubou. Mas mesmo com o governo de direita as greves gerais convocadas tinham muito mais o caráter de válvula de escape e protestos simbólicos.

grupos de esquerda agora tem 6 deputados e chegando a 10% nas pesquisas, o dobro do Labour irlandês.

Classe dominante em crise

Tragédia grega No começo, o Syriza mantinha os 5% de apoio nas pesquisas, e sem base nos sindicatos. Esgotada a luta sindical, os trabalhadores voltaram para a via política e conseguiram eleger o governo do Syriza. Mas a versão moderna da tragédia grega foi que o governo liderado por Tsipras recuou diante da pressão da União Europeia e continuou com a implementação das medidas de austeridade, mesmo após a grande vitória do “Oxi” (não) ao pacote de cortes. Não foi só na Grécia, mas também na Espanha, Portugal, Bélgica, Nigéria e na Índia, vimos como trabalhadores realizaram poderosas greves gerais, marcando o retorno da classe trabalhadora como fator fundamental no cenário de lutas, mesmo que ainda com uma li-

Luta e construção de alternativa em simbiose: eleição da Kshama Sawant e vitória na luta pelo aumento do salário mínimo. mitada expressão política. Porém, todos esses exemplos já dados mostram que há um espaço importante para a esquerda e isso requer que ela aprenda com os acertos e erros. O Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores tem conseguido, mesmo que ainda em pequena escala, mostrar a possibilidade de construir essa alternativa socialista baseada na luta da base. Nos EUA, elegemos a primeira vereadora socialista em Seattle, Kshama Sawant, em 100 anos. Foi uma simbiose da luta por 15 dólares por hora de salário mínimo, e tem continuado junto com o movimento ganhando vi-

tórias importantes, na luta por moradia e outros temas. Na Irlanda, o Socialist Party, sessão do CIT, tomou a iniciativa de uma campanha de boicote a tentativa de implementar uma taxa d’água, que conseguiu impedir esse ataque, com uma grande maioria da população se recusando a pagar. Baseado nessa luta crescemos de 1 para 3 deputados e fomos “premiados” por isso pela elite com a tentativa de criminalizar essa luta e nossos representantes com o julgamento de Jobstown, que ocorre nesse momento. Mas o fato é que a aliança de esquerda do Socialist Party com outros

Lenin, que liderou a Revolução Russa que completa 100 anos, colocava que a primeira condição para que se abra uma crise revolucionária é uma crise da própria classe dominante, que se encontra incapaz de governar como antes. Essa crise já está presente hoje. A votação pela saída da Grã-Bretanha da União Europeia é uma derrota para o principal projeto da classe dominante no continente. O governo de Trump é um fator para desestabilizar o mundo inteiro, causando crises dentro da classe dominante. A demissão do chefe do FBI, James Comey, e a entrega de informações de inteligência para o governo russo abriu uma nova crise. Já se discute a possibilidade de um impeach­ ment de Trump. Vivemos um mundo marcado pela instabilidade e crise, com mudanças bruscas. Uma leitura equivocada da conjuntura, falta de flexibilidade tática, junto à falta de ousadia programática por parte da esquerda pode levar a perda de oportunidades. Há grandes riscos na situação, mas também grandes oportunidades, um período de corrida entre a revolução e a contrarrevolução.

Temer e o empresariado querem destruir a CLT e os sindicatos! A Reforma Trabalhista é mais um dos danosos ataques do Governo Temer à classe trabalhadora. Ela irá alterar a CLT em mais de 100 pontos, irá limitar direitos e precarizar as condições de trabalho. A Reforma Trabalhista foi articulada junto ao empresariado para aumentar a sua lucratividade, destruir os sindicatos e ampliar a exploração. Felipe Tavares Isso será possível porque o eixo dessa reforma é o da prevalência do negociado sobre o legislado – ou seja, a lei que protege os trabalhadores será inferior à negociação com o patrão. Ela permite também novas formas precárias de contrato trabalhista, flexibiliza o acesso a direitos como o salário mínimo, seguro-desemprego e FGTS, limita o acesso à Justiça do Trabalho, tolera as diferenças salariais para funções iguais, limita a representatividade sindical nos ambientes de trabalho, dentre outros. Se for aprovada, essa “reforma”

será um mecanismo que permitirá as empresas aumentarem a exploração sobre as trabalhadoras e trabalhadores com total segurança jurídica. A precarização das condições de trabalho, as causas de adoecimento, o trabalho insalubre, a baixa remuneração - tudo isso, que mesmo com a legislação atual já existe, terá agora uma lei em que se respaldar.

Retirada de direitos A proteção ao trabalhador, portanto, será fragilizada, como a possibilidade de grávidas trabalharem em ambientes insalubres, permitir indiscriminadamente que haja jornadas de 12h de trabalho, aumentar o contrato de trabalho em tempo parcial de 25h para 30h horas semanais, permitir a terceirização de atividade fim, facilitar as demissões em massa sem necessidade de acordo coletivo com o sindicato, forçar o trabalhador a assinar acordos com a empresa em que renuncia a obrigações trabalhistas não cumpridas, exigir que o trabalhador custeie o ônus dos proces-

sos na Justiça do Trabalho contra a empresas, etc. O Governo Temer pretende também permitir novas formas de contrato de trabalho precarizado, como o trabalho intermitente, em que o trabalhador ganha por hora. Ao fim do mês ele pode não ganhar sequer um salário mínimo. Há também a proposta do teletrabalho, em que será possível desenvolver as funções em casa, mas possibilita que o indivíduo custeie os equipamentos necessários e a empresa não ficará responsável sequer por acidentes ou doenças causadas pelo tipo de atividade.

Enfraquecer os sindicatos A Reforma Trabalhista do Governo Temer prevê também que serão formadas comissões nos ambientes de trabalho para representar as trabalhadoras e trabalhadores daquele estabelecimento. Na proposta, indica-se comissão de três funcionários em uma empresa com 200 a 3 mil funcionários. Isso deverá acontecer sem a

A liberação total das terceirizações é uma das medidas para enfraquecer os trabalhadores diante da ofensiva dos patrões. participação dos sindicatos e sem esses representantes terem proteção legal, como têm no sindicato, para exercer tal função. Dessa mesma forma, poderão ser feitos acordos entre patrão e empregado sem a necessária anuência das entidades sindicais. Tudo isso visa enfraquecer a representatividade sindical e fragilizar os trabalhadores. O relator dessa medida é o deputado Rogério Marinho, do PSDB/ RN. Ele é investigado por fraudes com empresas terceirizadas em que os trabalhadores eram forçados a devolver 40% do FGTS após demissão para poderem continuar em outra empresa terceirizada. Is-

so sem mencionar as denúncias de que a Preservice, com a qual ele teria envolvimento, obrigava os empregados a assinarem a demissão com data retroativa para burlar o pagamento de aviso prévio. Diante de mais esse ataque, a classe trabalhadora precisa lutar! É urgente também que os trabalhadores e a juventude organizados em seus sindicatos, DCEs, movimentos sociais, comitês, pautem a necessidade das centrais sindicais convocarem uma nova Greve Geral de 48h para barrar esses ataques! Já houve um recuo no Congresso, suspendendo a Reforma, mas temos que ficar atentos até derrubar a Reforma Trabalhista!


cultura/opressões

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Descongela já! Contra o congelamento e cortes na cultura de Doria Em São Paulo, movimentos de trabalhadores da cultura, que incluem coletivos e artistas de teatro, dança, música e outros, estão se juntando contra o desmonte e pelo descongelamento das verbas da Secretaria Municipal de Cultura. Pedro Meade João Doria Júnior (PSDB) marcou seus primeiros meses como o novo prefeito “não político” de São Paulo embarcando em uma série de ataques brutais contra os trabalhadores e serviços públicos, tomando como modelo padrões neoliberais já vistos neste país e pelo mundo. Ele e seu time usam a desculpa da necessidade da austeridade para implementar cortes em serviços públicos e iniciar um grande projeto de privatizações que pretende vender metade de São Paulo para investidores e empresas estrangeiras.

“Limpeza” cultural Umas das áreas que está sofrendo ataques particularmente graves é a Cultura. Começando com a política de “cidade limpa”, Doria pintou de cinza os grafites da avenida 23 de Maio. Foram várias obras pintadas por grafiteiros internacionais, considerado um dos destaques do grafite na cidade. Esse gesto e as ame-

aças à festas de rua, como o Carnaval e a Virada Cultural, apontam qual caminho terão as políticas culturais em sua gestão.

Congelou 43,7% da verba Logo depois de assumir, Doria impôs um congelamento de 43,7% da verba da Secretaria Municipal de Cultura (SMC), o equivalente a 197,4 milhões de reais. Isso precariza vários projetos e iniciativas culturais ainda mais e, em alguns casos que já vimos, acaba com eles totalmente. Em nota, a SMC atribuiu o congelamento de 82 milhões de reais a um “equívoco” cometido pela equipe do ex-prefeito Haddad por ter enviado os programas em andamento com uma rubrica de “projetos”. E, por se tratar de um novo gestor, os recursos denominados de projetos foram congelados a espera de uma avaliação do time de Doria. Ao mesmo tempo do congelamento, trabalhadores e educadores estão sendo demitidos em massa, como foi o caso nos Centros Educacionais Unificados (CEUs), que tiveram dois dos seus projetos, o Programa de Iniciação Artística (PIA) e Vocacional cortados. Esses projetos ofereciam oficinas de dança, teatro, artes plásticas, entre outros, para crianças e adolescentes das periferias. Os cortes atingiram 4 mil alunos e fi-

zeram com que 336 professores e educadores fossem mandados embora. Também suspendeu um edital importante de Fomento à Dança, que já estava com todos os projetos prontos para análise da comissão julgadora. Três dias depois de cortar o edital, a Secretaria de Cultura apresentou outro edital que reduziu o orçamento de R$ 700 mil para R$ 250 mil, e retirou a proposta de pesquisa, desfazendo um trabalho de mais de 10 anos sem diálogo com artistas ou trabalhadores de cultura.

Tudo sob ataque Mas os ataques não param por aí. Outros projetos que foram atingidos pelo congelamento incluem aqueles das áreas de literatura, como o projeto Veia e Ventania - Literatura Periférica nas Bibliotecas de São Paulo, que foi encerrado. Também foi o caso com o Clube do Choro, que teve sua verba totalmente cortada e foram expulsos do Teatro Arthur Azevedo, onde tinham sua sede. O secretário de Cultura, André Sturm, falou em entrevista que não há possibilidade de continuar com o Clube do Choro por falta de verbas e que “o Clube do Choro não é meta. [Foi extinto porque] não tinha uma história”. Todos esses ataques, incluindo planos de ter o Centro Cultural de São Paulo e mais 54 bibliotecas

A Frente Única da Cultura já realizou vários atos contra os cortes. sendo administrados por Organizações Sociais e tirados das mãos do município, além de fazer mudanças na administração das Casas de Cultura da cidade, estão sendo feitos em nome da austeridade, junto a outros em todos os setores públicos como educação, saúde e transporte. É fato que o orçamento total da cultura da cidade, antes menos de 0,8%, mostra que os ataques não são econômicos como dizem, mas sim ideológicos.

Frente Única da Cultura É por isso que grupos de artistas, educadores e trabalhadores culturais se juntaram para criar a Frente Única da Cultura (FUCSP), que une vários setores como dança, teatro, musica, bibliotecas e outros, contra o congelamento e o desmon-

te da cultura. Já foram realizados vários atos e intervenções, tanto na Câmara de vereadores como em frente à Prefeitura e mais atos estão sendo planejados. É de grande importância que esses ataques e privatizações sejam barrados e que a cultura permaneça em mãos públicas para que os direitos conquistados sejam mantidos. Mas também é necessário lutar pela melhoria das condições e acesso à cultura para todos, incluindo o total descongelamento e um aumento para 3% do orçamento para a cultura, com metade para a periferia. É fundamental que nós unifiquemos as lutas e a resistência contra esses ataques, sabendo que são todos parte de um projeto nacional de promover retrocessos e piorar as condições de vida dos trabalhadores no Brasil.

Temer no poder – um ano perdido para os LGBTs O primeiro ano recém-completado do governo ilegítimo de Michel Temer não passou sem resistência da comunidade LGBT, especialmente afetada pelas contrarreformas trabalhista e da previdência, além da PEC 55, que congela os gastos públicos. Eduardo Padoan e Aretha Melo O Brasil é o país que mais mata pessoas transexuais no mundo, segundo a ONG Transgender Europe (TGEU). O caso de Luana Barbosa dos Reis, de Ribeirão Preto-SP, é um exemplo trágico dessa violência – ela foi vítima de racismo e lesbofobia pela própria polícia e violentada até a morte. Outro caso ocorreu no início de maio deste ano, com uma travesti de 29 anos assassinada a tiros dentro de uma repartição pública no interior do Ceará. Num país com uma mortalidade tão grande de pessoas LGBT,

é difícil imaginar que muitas conseguirão se aposentar após a “reforma” da previdência. Já a “reforma” trabalhista, caso aprovada, deve tornar ainda mais precária a vida de milhares de pessoas que só são aceitas no mercado de trabalho em postos já bastante precarizados, como o telemarketing – um trabalho com longas horas sem paradas sequer para o banheiro, baixos salários do regime terceirizado e assédio moral constante nos call-centers. Se aprovada a possibilidade de jornadas ainda mais longas ou a terceirização das atividades-fim, lá se vão algumas das poucas proteções que essas categorias têm hoje na lei. Outros ataques foram mais diretos: para cortar gastos, o governo Dilma extinguiu as secretarias de Políticas para Mulheres, Direitos Humanos e Igualdade Racial e aglomerou todas as pastas em apenas um ministério. Temer, ainda como presidente interino, no começo do aprofundamento do ajus-

te fiscal, foi além e extinguiu esse ministério. Qualquer ameaça à garantia de fundos para os poucos programas públicos para pessoas LGBT – que podem vir a ser considerados “secundários” no contexto da PEC 55 – é uma afronta.

Participação LGBT na luta A Greve Geral do dia 28 de abril foi uma demonstração de força da classe trabalhadora como um todo e contou com grandes atos demonstrando a possibilidade de união entre centrais sindicais, movimentos populares e a população trabalhadora em geral - que esteve presente em grande número, mesmo com a paralisação dos transportes. Em alguns lugares, como na capital paulista, as manifestações contaram com um Bloco LGBT. Iniciativas como essa mostram o caminho: só a organização da classe trabalhadora, em todas as suas

Pessoas LGBT só perderam com o governo Temer. cores e diversidades, pode vencer as políticas neoliberais violentas e construir um novo modelo de sociedade. Agora é preciso pensar nos próximos passos. A iniciativa de ocupar Brasília no dia 24/05 deve contar com um Bloco LGBT, mas só isso não basta. Para derrotar o governo Temer, precisamos aumentar a aposta e preparar uma Greve Geral de 48 horas pela base, sem esperar a boa vontade das direções sindicais burocratizadas e acomodadas. Precisamos tocar no assunto sempre que pudermos com quem ainda não falamos nas nos-

sas comunidades, locais de trabalho e estudo! Não podemos colocar nenhuma esperança numa volta messiânica de Lula em 2018, pois nada nos diz que ele e o PT aprenderam algo no último período ou que eles estariam dispostos a governar sem a direita e o capital. Muito menos podemos contar com esse congresso conservador e reacionário! Precisamos construir uma alternativa de esquerda para a luta e representação das LGBTs. A oportunidade para este salto pode estar na mobilização para uma nova Greve Geral!


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internacional

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A política do governo Maduro: Rumo ao socialismo ou reforçando o capitalismo? Declaração conjunta do Izquierda Revolucionaria e Socialismo Revolucionario – Venezuela Em 30 de março, o Tribunal Superior de Justiça da Venezuela (TSJ) decidiu assumir as funções da Assembleia Nacional (AN). Esta última, eleita em 6 de dezembro de 2015, está dominada pelos partidos de direita, membros da coalizão Mesa de Unidade Democrática (MUD). Depois disso, os acontecimentos se sucederam de maneira surpreendente. Na sexta-feira, 31 de março, a procuradora-geral Luisa Ortegas Díaz declarou que a sentença do TSJ soA decisão temporária de suspender as funções da Assembleia Nacional venezuelana tem sido aproveitada por todos os reacionários do mundo para lançar uma ampla campanha de propaganda. Em nome dos “valores” da democracia, figuras da direita e outros porta-vozes da burguesia e do imperialismo têm derramado lágrimas de crocodilo falando de um “golpe de Estado”. Eles e os meios de comunicação capitalistas que tanto se indignam hoje são os mesmos que apoiaram, na própria Venezuela, ações brutalmente repressivas - como no “caracazo”, manifestação de 29 de fevereiro de 1989 na qual um governo de direita (os mesmos que hoje controlam a AN) ordenou ao exército disparar contra centenas de milhares de pessoas que protestavam contra o plano de austeridade do FMI. Num só dia, foram assassinadas mais de 3 mil pessoas. Estes mesmos personagens também apoiaram o golpe de abril de 2002, que prendeu o presidente Hugo Chávez e suspendeu as garan-

“Não é nenhum segredo que a AN atual é utilizada pela burguesia e pelo imperialismo como instrumento para preparar seu assalto ao poder e acabar com as aspirações revolucionárias do povo venezuelano.”

bre a Assembleia Nacional violava a Constituição. No sábado, 1 de abril, o presidente Nicolás Maduro se reuniu com o Conselho de Segurança (integrado pelos presidentes da AN e do TSJ, chefe de Estado, vice-presidente, ministros da Defesa, Interior e Exterior) e solicitou a revisão da decisão do TSJ a respeito da Assembleia Nacional. Para desconcerto de todos, o presidente Maduro afirmou desconhecer a decisão e devolveu os poderes à Assembleia. tias constitucionais na Venezuela. Só a reação do povo venezuelano, mobilizando-se massivamente, impediu que esse golpe de Estado inspirado por Washington, pela federação patronal Fedecámaras e por partidos políticos espanhóis terminasse em um banho de sangue. Mais recentemente, a OEA fechou seus olhos ante os casos de golpe de Estado em Honduras, em 2009, e Paraguai, em 2012, e mais recentemente ante o golpe institucional no Brasil, mostrando que é um organismo servil aos interesses do imperialismo norte-americano.

Para combater a contrarrevolução, aplicar medidas socialistas, não bonapartistas Não é nenhum segredo que a AN atual é utilizada pela burguesia e pelo imperialismo como instrumento para preparar seu assalto ao poder e acabar com as aspirações revolucionárias do povo venezuelano. Contam para isso com seus agentes diretos da MUD. Pois bem, qual é o caminho para derrotar a reação? Como salvar a revolução bolivariana da contrarrevolução capitalista? De um ponto de vista marxista e revolucionário, a decisão de dissolver a AN para concentrar o poder em mãos do TSJ tem muito pouco a ver com uma medida de caráter socialista que fomente o controle e a participação democrática das massas trabalhadoras no processo revolucionário. Muito menos é uma medida que sirva para transformar um Estado, que continua sendo burguês, em socialista. E, em todo caso, tem servido à re-

A falta de produtos é resultado da sabotagem dos patrões e da política burocrática do Estado. ação mundial para elevar o tom de sua propaganda contrarrevolucionária, camuflando-a com a “defesa da democracia”. Fazendo referência à história das revoluções, os bolcheviques dissolveram a “Assembleia Constituinte” em janeiro de 1918, um “parlamento” convertido em aríete da contrarrevolução burguesa contra o poder dos trabalhadores. A decisão de por fim a este “parlamento” foi tomada quando o poder real estava nas mãos dos sovietes de operários, camponeses e soldados, que representavam o poder democrático e legítimo da imensa maioria da sociedade. Além disso, naquele momento existia um governo revolucionário que liquidava o Estado capitalista adotando medidas socialistas reais, como a nacionalização dos bancos e monopólios e a entrega da terra aos camponeses. Frente a um parlamento burguês contrarrevolucionário, um governo eleito pelos órgãos de poder dos oprimidos tinha todo o direito de se afirmar. Ninguém, exceto os imperialistas, latifundiários e políticos burgueses, protestou para defender a “Assembleia Constituinte”. Depois da vitória da direita contrarrevolucionária nas eleições da AN, nós marxistas defendemos que a única alternativa era a mobilização e organização das bases revolucionárias desde baixo para acabar com o poder dos capitalistas e formar um autêntico parlamento da re-

volução. Como fazer isso? Estabelecendo uma Assembleia Revolucionária de delegados eleitos e revogáveis, nas fábricas, no campo e nos quartéis e adotando um programa socialista de luta contra os capitalistas e a burocracia reformista, aliada da burguesia em seu afã de minar e destruir as conquistas da revolução venezuelana, além de compartilhar privilégios e negócios multimilionários às custas do povo. Nos dias posteriores à derrota eleitoral, milhares de ativistas revolucionários reuniram-se de forma espontânea em assembleias de bairros, escolas e centros de trabalho. A sensação majoritária era de que a derrota tinha um culpado: a burocracia que se faz passar por “revolucionária”, mas que se enriqueceu e se fundiu com a burguesia. Neste momento, setores do governo e da direção do PSUV responderam com o chamado à formação do Congresso da Pátria e do Parlamento Comunal. Uma parte da militância chavista acreditou na promessa de que estas medidas iriam desenvolver o poder popular e dar uma guinada à esquerda contra o burocratismo, de que Chávez já havia reclamado pouco antes de sua morte. A realidade foi muito diferente: repetiram-se os discursos a favor do “socialismo”, mas as decisões práticas tomadas iam em outro sentido. O governo e a direção do PSUV decidiram dar uma guinada não à es-

querda, mas à direita. Subidas de preços e perda constante do poder aquisitivo dos trabalhadores, atuação anti-operária das inspetorias e ministério do trabalho, cortes massivos de emprego em empresas públicas e privadas...

Nenhum retrocesso aos direitos dos trabalhadores e do povo! Unidade dos revolucionários contra os capitalistas e burocratas! Estas políticas capitalistas, não socialistas, também têm se concretizado no pagamento pontual da dívida externa aos bancos e multinacionais, enquanto se afirma que não há dinheiro para garantir a distribuição de alimentos a preços acessíveis a todos os que precisam. Ou no Arco mineiro, que concede às multinacionais imperialistas condições para explorar os recursos minerais de uma superfície equivalente a 12% do território venezuelano. Entre as empresas com as quais se tem firmado acordos, há muitas conhecidas por seus danos ao meio ambiente e exploração brutal dos trabalhadores e povos indígenas, como a Gold Reserve, expulsa por Chávez da Venezuela. A política econômica também tem sido motivo de luta entre o governo e a direita, concretamente sobre os planos para obter dólares e melhorar a crise econômica mediante


internacional

Ofensiva Socialista n°34 maio-junho 2017

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Avança a unificação entre o CIT e a Izquierda Revolucionaria O processo de unificação entre o Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores – do qual a LSR é a seção brasileira – com a Izquierda Revolucionaria (IR), presente no Estado Espanhol, México e Venezuela, deu passos importantes no último período. Os congressos da IR no México e no Estado Espanhol votaram por unanimidade a fusão com a CIT. Em julho ocorrerá uma grande escola de quadros conjunta em Barcelona. Marcus Kollbrunner A IR tem raízes conjuntas com o CIT, mas seguiram caminhos separados desde o início dos anos 1990, baseado numa visão divergente sobre a abordagem a adotar diante do giro à direita dos antigos partidos dos trabalhadores. Em luz dos processos desde então e, especialmente, os novos fenômenos como Sanders nos EUA e Corbyn na Grã-Bretanha, houve uma reaproximação. Discussões no ano passado levaram a uma declaração conjunta apontando para um processo de unificação. Desde então houve trocas de experiências, incluindo participação de representantes da IR na 9ª Escola Latino-americana do CIT no Brasil no início do ano.

As medidas de Maduro atingem também a esquerda independente. a criação de empresas mistas, planos que a Assembleia Nacional tem estorvado. Todas as medidas anteriormente assinaladas não representam erros ou desvios isolados. A política que o governo está aplicando rompe com o que Chávez propôs e não têm pontos em comum com uma verdadeira política socialista. Vai na direção oposta do que as massas precisam. Seu objetivo é selar uma aliança com a burguesia (ou ao menos com um setor dela) e mostrar aos capitalistas e imperialistas que podem gerir a crise do capitalismo igual ou melhor que a MUD. Este caminho leva ao confronto com

O congresso da Izquierda Revolucionaria espanhola votou por unanimidade a fusão com o CIT. Nos dias 11 e 12 de março ocorreu o congresso da IR do México, com participação de André Ferrari da LSR do Brasil e um camarada do Alternativa Socialista dos EUA.

México Apesar de ser um grupo menor, composto principalmente por militantes jovens, possuem uma importante experiência política. São camaradas que iniciaram sua militância muito jovens e, nos marcos as próprias bases revolucionárias. Cada vez mais, ativistas operários e populares chavistas se mostram críticos a estas políticas e começam a compreender que só poderão ser mudadas com a organização e mobilização das próprias bases. Como revolucionários, rechaçamos a demagogia da MUD e dos capitalistas e suas pretensões contrarrevolucionárias. Ao mesmo tempo, pôr as funções da AN nas mãos do TSJ não avança no sentido das ações revolucionárias das quais a Venezuela precisa hoje. Medidas que reforçam o caráter bonapartista do Estado, um Estado burguês que, apesar de todas as tentativas dos trabalhadores e do povo, não foi substituído nem desmantelado, não são nenhuma solução para os trabalhadores, e sim uma ameaça. No último ano e meio foram implementadas diversas ações por parte do governo às quais a burguesia e a direita internacional não fazem referência porque convém à sua estratégia. Tem-se reforçado o caráter bonapartista do Estado, não para combater a MUD, mas para minar as conquistas da revolução e golpear os setores combativos do movimento. Paralisaram-se as eleições aos conselhos comunais e de diferentes sindicatos: FUTPV (PDVSA), SUTISS (SIDOR) e outros. Os CLAP (organismos criados para organizar a distribuição de alimen-

da intensa luta de classes no México, passaram por processos políticos dramáticos, incluindo a prisão de nove militantes em meio às lutas de massas de 2006. O foco principal do trabalho da IR é organizar a luta direta dos trabalhadores contra as políticas do governo de direita de Peña Nieto, mas há um debate importante sobre as táticas da esquerda para as próximas eleições presidenciais, que, como aqui no Brasil, estão marcadas para 2018.

O congresso votou unanimemente pela fusão com o CIT. Junto a unificação das organizações na Venezuela (veja a declaração conjunta sobre Venezuela na página ao lado), será um passo importante para o CIT na América Latina.

to nos bairros a preços mais acessíveis) não foram criados baseando-se em assembleias operárias e populares, mediante a elegibilidade e revogabilidade dos cargos, mas de cima para baixo e com cargos escolhidos a dedo. Isto tem provocado denúncias de corrupção, arbitrariedades e exclusão de setores necessitados da população. A estas medidas pontuais se unem normas como a colocada para a re-legalização dos partidos políticos, mais restritiva e que poderia deixar de fora do registro legal o Partido Comunista e outras forças do chavismo críticas das políticas do governo. No geral, tem-se intensificado a tendência a desprestigiar e reprimir a quem mostrar críticas e diferenças pela esquerda.

de 700%, 3.000% no caso dos alimentos – obriga amplas camadas da população a colocar a luta pela sobrevivência na frente de tudo o mais. Isto, que dificulta sobretudo a organização e mobilização da esquerda, também afeta a base da direita. Mas esta situação não durará eternamente. Vendo que não havia garantias claras de êxito para um assalto ao poder este ano por parte da MUD, os imperialistas optaram, no momento, em deixar que o governo siga reduzindo sua base social de apoio. Utilizam o porrete e a cenoura: enquanto alentam “negociações” utilizando para isso seus agentes da socialdemocracia espanhola e internacional, instigam ao mesmo tempo a sabotagem e o boicote. Por seu lado, Maduro e seus colaboradores seguem falando de revolução e socialismo, mas no concreto desmantelam muitos dos avanços alcançados sob os governos de Chávez. Isso facilita o objetivo dos imperialistas de desprestigiar a revolução e as ideias do socialismo e criar um cenário cada vez mais perigoso. Para evitar uma derrota trágica da revolução, seja nas mãos da burguesia tradicional e do imperialismo, ou da burocracia que se diz socialista, mas que está cada vez mais fundida com a classe dominante, só há um caminho: a unidade dos revolucionários para lutar

A revolução só pode ser salva se todo o poder passar às mãos da classe trabalhadora! A mobilização opositora contra a dissolução da AN foi extremamente débil. Muitas das centenas de milhares de pessoas que se manifestavam há meses exigindo o referendo revogatório estão céticos. A MUD, por enquanto, aceitou a estratégia do imperialismo de desgastar o governo de Maduro e evitar uma estratégia “insurrecional”. Também é certo que o colapso da economia – inflação de mais

Espanha O congresso da IR do Estado Espanhol, que aconteceu entre os dias 13 e 16 de abril, foi um grande sucesso. Cerca de 200 trabalha-

dores e jovens ativistas de mais de 30 cidades do país participaram. Além de camaradas do IR de Venezuela e México, estiveram presentes representantes do CIT da Bélgica, Escócia, Portugal e do Secretariado Internacional do CIT. As discussões cobriram temas como perspectivas internacionais e para o Estado Espanhol, o marxismo e a emancipação das mulheres, a unificação com o CIT e táticas e estratégias para a construção partidária. Foi debatida a nova aliança que permitiu o novo governo de direita, entre PP, PSOE e Ciudadanos; perspectivas para o Podemos; a questão nacional. O sucesso do trabalho de juventude a partir do Sindicato de Estudantes, que derrotou a contrarreforma do ensino médio, levou ao lançamento também do “Livres e Combativas”, um movimento que defende um feminismo anti-capitalista e socialista. O congresso votou por unanimidade a unificação e os militantes do CIT na Espanha já estão construindo a IR conjuntamente. Um próximo passo importante para a unificação do CIT e a IR será a realização de uma grande escola de quadros com participação do mundo inteiro em Barcelona no mês de julho. No final da escola será realizado um congresso de unificação.

“Medidas que reforçam o caráter bonapartista do Estado, um Estado burguês que, apesar de todas as tentativas dos trabalhadores e do povo, não foi substituído nem desmantelado, não são nenhuma solução para os trabalhadores, e sim uma ameaça.” por um verdadeiro programa socialista que unifique todas as reivindicações e lutas operárias e populares, mobilizando-se nas ruas contra qualquer retrocesso nas condições de vida (salários, direitos etc.). Devemos arrancar o poder econômico e político das mãos dos capitalistas e burocratas e colocá-lo de verdade nas mãos dos trabalhadores e do povo. 14 de abril de 2017 Essa declaração conjunta foi es­ crita antes da recente escalada de protestos violentos por parte da di­ reita venezuelana, que deixou vá­ rios mortos, mas que não altera a avaliação das tarefas para a es­ querda revolucionária.


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N° 34 • maio-junho 2017

Resgatar o histórico de luta do movimento estudantil 55° CONUNE: construir a Oposição de Esquerda Às vésperas do 55º Congresso da União Nacional dos Estudantes, o CONUNE – que ocorre ano sim, ano não – o país está longe de ser o mesmo de dois anos atrás. A nova conjuntura terá repercussão direta no congresso e na entidade – que há muitos anos está estagnada nas lutas e burocratizada enquanto representante dos estudantes. Maria Clara Ferreira A UNE que, desde de sua refundação, é dirigida pela juventude do PCdoB, teve importante papel nas lutas históricas. A campanha do Petróleo é Nosso é exemplo disso, assim como, no período de democratização, o “Diretas Já” e, principalmente, a juventude do “Caras Pintadas” são exemplos reivindicados por todos os campos políticos que compõem a entidade. Mas este marco histórico é insuficiente, pois muitas lutas se seguiram após isso – e o papel de uma entidade que representa a juventude não pode parar na exaltação do passado.

Adaptação ao governo do PT No período do PT no poder, a entidade esteve bem afinada com as políticas nacionais do governo, como PROUNI e REUNI – planos de ensino que garantiram o crescimento das maiores empresas da educação privada do mundo e uma expansão precária nas universidades públicas. Se é verdade que naquele momento a confusão entre a máscara progressista do governo e a realidade da tentativa de conciliação de classes levou a própria esquerda a muitas fragmentações, também é real que a mesma não conseguiu dar respostas suficientes a estes projetos. As mobilizações da juventude desde então aconteceram por fora da UNE. Em 2007, sob o governo do PT, a luta estudantil contra a expansão precarizada não passou pela entidade. Em 2012, uma importante greve com quase todas as universidades federais do país denunciou os resultados da expansão

do REUNI. Naquela mobilização, a criação do Comando Nacional de Greve dos Estudantes (CNGE), que negociou diretamente com o governo (mesmo com entraves colocados pelo Ministério da Educação e pela própria UNE), reafirmou a falta de legitimidade da UNE diante do Movimento Estudantil.

Caras pintadas 1992, jornadas de junho 2013 e onda de ocupações de escolas 2015-2016. A juventude joga um papel central em muitas lutas, mas quem representa a juventude hoje?

Junho 2013 Junho de 2013 trouxe importantes lições para a esquerda – mas não somente a ela. Muitos grupos ligados ao governo também modificaram sua atuação e linha. Entretanto, essa mudança está longe de ser programática, como vimos durante as ocupações das escolas contra a Reforma do Ensino Médio, em 2015-2016. Naquele momento, toda uma nova camada de jovens se mobilizou, mas a entidade nacional dos secundaristas, a UBES, dirigida pelo mesmo grupo da UNE, esteve muito distante da linha de frente dessa luta. Em muitas ocasiões, a UBES efetivamente atropelou o movimento, como no caso do Paraná, quando a entidade negociou por cima o fim das ocupações, sem consultar os estudantes. O impeachment de Dilma e o empurrão que esse setor recebeu para ocupar as ruas serão elementos presentes.

Juventude sob ataque A realidade da juventude piora com a crise econômica, já que o principal objetivo da classe dominante é a retirada de direitos. Hoje, os jovens são a maior parcela de desempregados, chegando a 25% dos trabalhadores parados. Os jovens também se concentram nos empregos precários e estão entre os mais atingidos pela reforma trabalhista. São estes jovens que também não acessam a universidade ou não conseguem concluir seus cursos por ausência de políticas de permanência. Com a PEC 55, que congela os investimentos públicos por 20 anos, não há perspectiva de melhora. Além disso, a reforma da previdência nos atingirá duramente, pois retira de nós a expectativa de conseguir aposentadoria.

Estamos falando de um CONUNE com cerca de sete mil estudantes levados sob a bandeira de oposição ao governo de Temer e suas reformas. Essa é a campanha central da direção da entidade e também da Oposição de Esquerda. Apesar do formato do CONUNE ser feito de modo despolitizado, com ênfase nas atividades culturais e festas que acabam esvaziando muitos debates, a conjuntu-

ra desse ano vai criar uma procura por respostas políticas. Não está descartado que exista uma agitação em defesa de Lula 2018, mas também não está descartado que possa ser um dos congressos mais politizados dos últimos anos. A Oposição de Esquerda deverá ir além da unidade em torno da crítica à direção da UNE. É preciso que ela tenha espaços internos orgânicos que superem reuni-

ões das direções de seus coletivos, mas que permitam à base dos estudantes encontrar uma ferramenta alternativa de luta. A reorganização da esquerda é um processo vivo na juventude que coloca à prova a necessidade de unidade nessa construção. Que consiga ser uma alternativa para juventude de Junho e das Ocupações, apontando uma entidade sem burocracia, democrática e combativa!


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