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Jornal da LSR
Seção brasileira do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT)
Tendência do PSOL
N° 24 • março 2015
Unir as lutas
para derrotar o ajuste de Dilma e dos tucanos!
Não queremos flores, exigimos direitos!
pág. 06-07
Greve geral no Paraná pág. 05
A crise da Dilma e o papel da esquerda pág. 08
á mete reve no Paran Exemplo da ogvernantes de todo o país medo nos g
Greve da Volks em São Bernardo ob rig patrões a recuou ar
Grécia: Syriza recua sob ameaças da Troika pág. 11
Água, sim. Lucro, não! pág. 12
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editorial
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ministro da Fazenda, Joaquim Levy, admite que o PIB do Brasil deve ter encolhido o ano passado. Mas a política de austeridade do governo, junto com a crise da Petrobras e as crises hídrica e elétrica, pode levar a um 2015 bem pior. Quem sem dúvida sairá perdendo, se não montarmos uma forte resistência, serão os trabalhadores e jovens. O governo fez de tudo para maquiar os dados até o fim das eleições para, logo depois, soltar um pacote de maldades. Dilma fez uma campanha alertando sobre as medidas que Aécio ou Marina implementariam se ganhassem as eleições, enquanto sua equipe já se preparava para pôr em prática as mesmas medidas após as eleições. Até setembro do ano passado, a meta oficial do governo ainda era que o ano fecharia com um superávit primário de mais de R$ 80,8 bilhões. O ano fechou com o primeiro déficit primário desde 1997, de R$ 32,5 bilhões, um “erro” de cálculo de R$ 113 bilhões! O rombo seria maior ainda, se o governo não tivesse atrasado repasses para esse ano. São R$ 17,9 bilhões nas áreas de saúde, trabalho, educação e assistência social, atrasando também o repasse para estados e municípios. Só na educação, o adiamento de despesas foi de R$ 6,6 bilhões. Já três dias após o segundo turno, o Banco Central aumentou a taxa Selic, que já acumula três altas e chegou a 12,25%. Logo seguiu a indicação a ministro da Fazenda de Joaquim Levy, ex-diretor do Bradesco e um economista da escola neoliberal da Universidade de Chicago.
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o final de dezembro, ainda com Guido Mantega no cargo de ministro da Fazenda, Dilma decretou por medida provisória cortes no seguro-desemprego, abono salarial, pensão por morte, auxílio-doença e auxílio reclusão. O governo está disposto a aprofundar a crise econômica esse ano, com aumento de juros e cortes nos gastos públicos e no poder de compra dos trabalhadores, esperan-
● Pelo direito à cidade para os trabalhadores e o povo! Tarifa zero nos transportes públicos! Estatização do sistema de transporte com controle democrático dos trabalhadores e usuários! Pelo direito à moradia garantido a todos e todas! Nenhum corte nos gastos e investimentos sociais! Mais investimentos na qualidade do transporte e serviços públicos! ● Dinheiro público para saúde e educação e não para os estádios e obras da Copa! 10% do PIB para a educação pública já! 10% do PIB para a saúde pública já! ● Reforma agrária controlada pelos trabalhadores com fim do latifúndio! Não à usina de Belo Monte! Em defesa do meio ambiente e do direito à terra para as comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas! Fim do massacre dos sem-terra e indígenas! ● Aumentos salariais de acordo com a inflação! Congelamento dos preços dos alimentos e tarifas públicas! Redução da jornada de trabalho sem redução de salários! Fim do fator previdenciário e anulação da reforma da previdência. Não às terceirizações e precarização das relações de trabalho! ● Contra o estatuto do nascituro em
é uma publicação da Liberdade, Socialismo e Revolução
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2015: crises, ataques e lutas do que isso leve a uma retomada do crescimento antes das eleições em 2018. Essas medidas são só o começo. O que vivenciamos é o esgotamento do modelo de crescimento anterior. Os governos Lula e Dilma apostaram no crescimento baseado, em um lado, nas exportações de commodities da agroindústria e minérios e, no outro lado, em um crescimento do consumo interno baseado em aumento do crédito e certas medidas de redistribuição de renda (aumento do salário mínimo, bolsa família, etc.), junto com projetos de obras de infraestrutura (PAC).
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enhum desses pilares consegue mais sustentar a economia. A desaceleração da China derrubou o preço das commodities. O consumo interno parou de crescer com a alta da inflação e endividamento das famílias. A inflação deu um novo salto em janeiro. Segundo o IBGE, ela chegou a 1,24% naquele mês, a taxa mais elevada desde fevereiro de 2003, acumulando uma alta de 7,14% nos últimos 12 meses. Essa alta reflete o aumento das taxas, como tarifas dos transportes, aumento do preço da gasolina e também a alta do dólar, que encarece os produtos importados. A crise energética deve ainda elevar a conta de luz esse ano em até 46%. As taxas de juros ao consumidor subiram novamente. A taxa média dos juros do cheque especial chegou a 200,6% ao ano em dezembro de 2014. As dívidas no rotativo do cartão de crédito alcançaram o valor inédito de R$ 29,8 bilhões, com uma taxa média de juros de 258% ao ano.
As obras do PAC, superfaturadas e atrasadas, também não conseguiram dinamizar a economia. As medidas “contracíclicas” de desoneração de impostos para estimular o consumo, implementadas a partir da crise mundial que estourou em 2008, já não funcionam mais e deixaram um buraco nas contas públicas.
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indústria automobilística foi quem mais se beneficiou com essas medidas, com anos de IPI rebaixado. Mas hoje sofre uma grande crise e foi o setor que mais reduziu a produção no ano passado, com uma queda de 16,8%, enquanto a indústria como um todo sofreu uma queda de 3,2% na produção. O mercado de trabalho brasileiro teve em 2014 o pior ano de criação de vagas formais dos anos de Lula e Dilma no poder. As contratações de trabalhadores com carteira assinada superaram as demissões em 396,9 mil vagas. O desemprego só não aumentou no ano passado por que uma parte da população ativa saiu do mercado de trabalho, alguns indo para o setor informal. Esse ano o desemprego deve crescer. As indústrias no sudeste continuam a demitir trabalhadores, o que já gerou confrontos, como a vitoriosa greve na Volkswagen em São Bernardo do Campo e agora a paralização dos trabalhadores da GM em São José dos Campos. A crise da Petrobras ameaça dezenas de milhares de empregos, com corte nos investimentos e acúmulo de dívidas. As construtoras investigadas pela operação Lava-Jato estão com dificuldades. A OAS, por exem-
O que a LSR defende: tramitação no Congresso! Pela legalização do aborto! Pelo fim da violência contra a mulher! Contra as propostas de reforma trabalhista e da previdência que visam retirar direitos da mulher trabalhadora! Salário igual para trabalho igual! Por mais verbas para a implementação da Lei Maria da Penha! Contra toda forma de opressão às comunidades LGBTT!
com igualdade social! Auditoria das dívidas controlada pelas organizações dos trabalhadores!
● Pelo direito democrático de manifestação! Não à criminalização dos movimentos sociais e à repressão! Liberdade e fim dos processos sobre os manifestantes!
● Pela reconstrução das ferramentas de luta da classe trabalhadora, independentes dos governos petistas e da direita tradicional.
● Basta de violência policial racista nas periferias! Desmilitarização e controle popular sobre a polícia! Combater o racismo nos locais de ensino, de trabalho e na sociedade. ● Não pagamento das dívidas interna e externa aos grandes capitalistas para garantir os recursos necessários para os serviços públicos e o desenvolvimento econômico
Telefone: E-mail: Sítio: Facebook: Correio: Assinatura:
● Reestatização das empresas privatizadas por FHC, Lula e Dilma com controle democrático dos trabalhadores! Estatização do sistema financeiro e grandes empresas que controlam a economia sob controle dos trabalhadores!
● Construir a CSP-Conlutas como central sindical e popular, democrática, classista e de luta, que sirva como base para a construção de uma nova Central unitária de todos os setores combativos e independentes de patrões e governos. ● Construção pela base de espaços democráticos amplos para unificar as lutas. Por
(11) 3104-1152 lsr@lsr-cit.org www.lsr-cit.org www.facebook.com/lsr.cit CP 668 - CEP 01031970 - SP 10 edições: R$ 25 reais
plo, sofre com a restrição ao crédito devido à corrupção e tem dívidas de R$ 1,4 bilhões a pagar em curto prazo. A construção pesada em São Paulo demitiu 6% da força de trabalho no ano passado. Muitos municípios e estados passam por uma crise econômica e sofrem imediatamente quando o governo federal atrasa os repasses. No ano passado, os governos estaduais tiveram um déficit de R$ 13,2 bilhões e 17 de 27 estados fecharam as contas no vermelho, um fato inédito desde a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, em 2000. A luta contra o pacote de cortes no Paraná, que incluiu uma greve de servidores públicos, deve se repetir em outros estados. Os governos do PT não são os primeiros a tentar vender a ilusão de que possuem uma fórmula mágica que consegue elevar o nível de vida dos mais pobres de forma sustentável, sem tocar nas grandes fortunas e garantindo os lucros das grandes empresas. Quando as contradições do próprio sistema capitalista levam a uma crise, esses governos, que se elegem com centenas de milhões de reais de “doações” de grandes empresas, acabam transformando suas magras e parcas reformas em contrarreformas. 2015 vai ser um ano de ataques e de lutas. O desafio da esquerda é participar na resistência contra esses ataques e, ao mesmo tempo, construir uma força política socialista coerente que pode dar uma alternativa a esse sistema capitalista baseado em exploração e opressão.
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emos que construir um programa que parta da luta atual – contra os cortes, privatizações, demissões, alta de juros, dos preços e das tarifas – e enfrente a lógica do sistema apontando para uma ruptura: taxação das grandes fortunas, rendas e empresas, suspensão do pagamento e auditoria da dívida pública, reestatização das empresas privatizadas, abertura da contabilidade e estatização de empresas que implementam demissões em massa, controle de câmbio, e outras medidas. um Encontro Nacional dos Movimentos em Luta! ● Pela construção de novas relações entre aqueles que lutam, baseadas na solidariedade de classe, democracia e respeito às divergências. ● Por um PSOL afinado com as ruas: de luta, socialista e radicalmente democrático. Por candidaturas do PSOL a serviço das lutas e com um programa socialista. Qualquer representante público do PSOL deve viver com salário de trabalhador. Pela construção da Frente de Esquerda nas eleições e nas lutas. ● Por um governo dos trabalhadores baseado na democracia das ruas, na mobilização de massas dos trabalhadores e da juventude e com um programa socialista! ● Por uma economia democraticamente planificada, onde a produção e os serviços, preservando o meio ambiente, estejam voltados aos interesses de toda a população e não uma pequena elite privilegiada. ● Por uma Federação Socialista da América Latina e um mundo socialista.
Colaboraram nessa edição: Alexandre, André Ferrari, Cacá Melo, Carlos Alberto, Cristina Naiara Fernandes, Felipe Alencar, Flávia de Mendonça Ribeiro, Isabel Keppler, Jane Barros, Jean Henrique, Juliana Meato, Marcus Kollbrunner, Maria Clara Ferreira, Miguel Leme, Rafaela Bardini, Raquel Guzzo, Rosiléia, Rubens, Pastor, Silvio Motoboy, Vinicius Prado
movimento
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Construir a unidade pela base
Derrotar os patrões e os ajustes do governo Dilma, dos governadores e prefeitos A presidenta Dilma Rousseff começou o seu segundo mandato tomando as mesmas medidas que, segundo ela, seriam implementadas por Aécio Neves e Marina Silva, caso estes tivessem sido eleitos. Miguel Leme Ferreira Executiva Nacional da CSP-Conlutas Apesar de ter anunciado em sua posse que uma das marcas do seu segundo mandato seria a educação, expresso pelo bordão “pátria educadora”, Dilma não teve vergonha em anunciar, na semana seguinte, o corte de 7 bilhões de reais do setor. Este corte vem a somar com outros para atender à demanda do chamado superávit primário de 1,2% do PIB. Para atingir essa meta, Dilma Rousseff não teve piedade dos trabalhadores e baixou duas medidas provisórias, as MPs 664 e 665, que representaram um dos maiores ataques aos benefícios trabalhistas e previdenciários nos últimos anos. Essas medidas provisórias reduzem direitos dos trabalhadores no seguro-desemprego, auxílio doença, abono salarial, pensão por morte e auxílio reclusão. Além disso, o governo aumentou a taxa de juros, reajustou o preço da gasolina e a tarifa da energia elétrica e vetou a correção do imposto de renda pela inflação. Todas essas medidas ocorrem em um momento de agravamento da crise econômica do país. É provável que a economia tenha encolhido no ano passado e a previsão da maioria dos economistas para 2015 é de um PIB negativo. Um dos setores mais atingidos pela crise econômica tem sido a indústria. Para manter a suas taxas de lucro, o setor industrial tem demitido milhares de trabalhadores.
Resistência da juventude e dos trabalhadores Entretanto, essas demissões não têm sido aceitas de forma passiva pelos trabalhadores. Em janeiro, tivemos uma greve histórica dos trabalhadores da Volkswagen de São Bernardo do Campo (SP) que conseguiu barrar as 800 demissões da empresa. No momento em que fechávamos esta edição, os trabalhadores da GM de São José dos Campos (SP) continuavam em greve por tempo indeterminado contra a tentativa da empresa em demitir também 800 trabalhadores. Desde o começo do ano, a juventude e os trabalhadores têm se mobilizado contra os ataques dos governos e dos patrões. Tivemos manifestações na maioria das capitais do país contra o aumento nas tarifas de ônibus, trens e metrô. Temos ainda a luta dos trabalhadores do Comperj (RJ) para que os seus salários e benefícios trabalhistas atrasados sejam pagos.
Outra luta importante e vitoriosa foi a dos trabalhadores estaduais do Paraná e, em particular, dos professores, que conseguiram barrar de forma provisória o pacote de maldades do governador Beto Richa. A chave para esta vitória foi a unidade do funcionalismo estadual paranaense e utilização de métodos de lutas radicalizados, como a greve, acampamento em frente a sede do governo estadual e a ocupação da Assembleia Legislativa do Paraná. Além disso, há uma crise hídrica atingindo estados com peso grande na economia, como é caso de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Esta crise tem provocado diversas manifestações contra a falta de água.
tidades e movimentos sociais que dele participam representam uma parte minoritária, mas importante da nossa classe, como é o caso, por exemplo, dos servidores públicos federais. Além disso, o espaço apresenta, de uma forma mais clara, uma plataforma e oposição de esquerda ao governo Dilma. Entretanto, em sua última reunião, não foi aprovado um calendário unificado de luta. Uma das grandes dificuldades de ampliação deste espaço está na percepção que algumas entidades e movimentos sociais tem de que ele é hegemonizado pelo PSTU e está a serviço, tão somente, para a construção da CSP-Conlutas.
Mais lutas no próximo período
Construção de uma unidade mais ampla
Diante deste quadro, a perspectiva que está colocada para o próximo período é de aumento e intensificação das lutas. Já estão programadas jornadas de luta do MST e do MTST para os próximos meses. No estado de São Paulo, os professores tem um indicativo de greve para o dia 13 de março e outras categorias se preparam para a luta, como os metroviários, trabalhadores das universidades paulistas, saúde estadual e da Sabesp. Mesmo as categorias que representam os batalhões pesados da classe trabalhadora brasileira, como é o caso de metalúrgicos, petroleiros, químicos, bancários, mesmo tendo as suas datas-base no segundo semestre, serão obrigadas a antecipar essas lutas em virtudes dos ataques dos patrões. Isso já vem ocorrendo com os metalúrgicos e os trabalhadores petroleiros. É provável que 2015 supere 2014 do ponto de vista de lutas.
A construção da Unidade e a Frente pelas Reformas Populares Entretanto, a grande debilidade dos últimos anos não tem sido a quantidade de lutas mas, sim, a sua fragmentação. Para tanto, é necessário a construção de espaços amplos que permitam unificar estas lutas. Neste momento, há dois espaços nacionais importantes de articulação da unidade: a Frente pelas Reformas Populares e o Espaço Unidade de Ação. A proposta de formação de uma Frente pelas Reformas Populares foi impulsionada pelo MTST, reúne entidades e movimentos sociais que dirigem uma parte importante da classe trabalhadora brasileira. A participação de entidades governistas, como é o caso da CUT e do MST, reflete de um lado as contradições profundas em suas bases em virtude dos duríssimos ataques implementados pelo governo Dilma. Mas, também se explica pela intenção de setores petistas/lulistas de recuperar certa capacidade
A luta por reformas populares e contra a direita é também uma luta contra o governo Dilma de mobilização popular diante das das pautas da direita na sociedade, ameaças da direita tradicional ao no Congresso, no Judiciário e nos governo federal. Governos; contra os ataques aos diAté esse momento, tanto a CUT reitos trabalhistas, previdenciários como o MST foram obrigados a e investimentos sociais e por fim, assinar a declaração da Frente que contra a repressão às lutas sociais coloca de forma textual a necessi- e o genocídio da juventude negra dade de “enfrentamento da política e pobre e periférica”. de ajuste fiscal do Governo FedeEntretanto, esse fórum se vê ral, dos Governos Estaduais e Pre- ameaçado pela pressão por parte feituras” e “a imediata revogação das entidades governistas para que das MPs 664 e 665/14, que repre- assuma um caráter de defesa do gosentam ataques ao seguro-desem- verno Dilma. Se essa for a postuprego e pensões”. ra da Frente ela perderá compleA declaração coloca também a tamente seu sentido. Para que is“necessidade de enfrentar o aumen- to não ocorra, é necessário que as to de tarifas de serviços e conces- entidades e movimentos sociais da sões públicas, como o transporte esquerda combativa, como é caso urbano, a energia elétrica e a água” da CSP-Conlutas, participem desta e que não aceitará “que os trabalha- Frente para que ele assuma um padores paguem pela crise”. pel de oposição de esquerda às poA nota aponta que a Frente se or- líticas do governo Dilma. ganizará em torno de quatro granO Espaço Unidade de Ação pode des eixos, que nós consideramos e deve contribuir para a construção bastante progressivos: “a luta pelas de uma unidade mais ampla para a reformas populares, enfrentamento luta da classe trabalhadora. As en-
Para que estas entidades e movimentos sociais não tenham mais esta percepção, é necessário que o Espaço Unidade de Ação tenha um funcionamento mais democrático, com reuniões regulares e uma coordenação composta por todas as entidades que nele atuam. Dentro desta perspectiva, seria bastante progressivo que todas as entidades e movimentos sociais que nele atuam, como é o caso da CSP-Conlutas, participassem do Seminário Nacional da Frente das Reformas Populares no dia 07 de março. Esta participação faria parte de um esforço em construir uma plataforma e um calendário de luta unificados. Entretanto, a construção da unidade das lutas do próximo período não pode ser realizada tão somente por reuniões de cúpula, mas sim pela base das entidades e movimentos sociais. Para nós da LSR, esta unidade mais ampla e construída pela base pode ser concretizada pela realização de um Encontro Nacional dos Movimentos Sociais em Luta ainda neste primeiro semestre.
II Congresso Nacional da CSP-Conlutas O II Congresso Nacional da CSP-Conlutas será realizado no período de 04 a 07 de junho em Sumaré, São Paulo. Será realizado numa conjuntura de aprofundamento da crise econômica no país, ataques do governo Dilma e outros governos, mas também resistência dos trabalhadores contra esses ataques.
Diante deste contexto, uma tarefa fundamental da Central é o de contribuir para a unificação das lutas. Para isso, é necessário que a Central não só construa o Espaço Unidade de Ação, mas que dispute também os rumos do Movimento pelas Reformas Populares, para que este assuma um perfil de oposição de esquerda ao governo Dilma. Além disso, para que a Central seja um polo de atração para ou-
tros movimentos sociais, é imprescindível radicalizar em sua democracia interna e combater o hegemonismo de qualquer corrente ou partido político. Para tanto, nós da LSR defendemos que nenhuma corrente ou partido tenha mais de 40% dos membros da Secretaria Executiva da CSP-Conlutas.
Calendário do II Congresso 2 DE MARÇO – Data inicial para recebimento das contribuições e propostas de resoluções elaboradas pelas entidades e movimentos filiados à Central. 9 DE MARÇO – Abertura do processo congressual com publicação das contribuições e propostas de resoluções em meio eletrônico e abertura do cadastro para inscrição das entidades. 23 DE MARÇO – Data final pa-
ra recebimento das contribuições e propostas de resoluções (essa data será avaliada na próxima reunião da Coordenação Nacional). 23 DE MARÇO A 8 DE MAIO – Período de realização das assembleias das entidades sindicais e movimentos populares (a assembleia deve ser comunicada à Secretaria com pelo menos cinco dias de antecedência). 15 DE MAIO – Data limite para inscrição dos participantes das entidades sindicais e movimentos populares, assim como pagamento das taxas desses setores. 16 A 30 DE MAIO – Eleição dos representantes dos movimentos de luta contra a opressão e juventude (5% conforme o Estatuto). 1º DE JUNHO – Data limite para pagamento das taxas dos movimentos de luta contra a opressão e juventude 4 A 7 DE JUNHO – Congresso.
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nacional/sindical
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Saúde mental do Rio de Janeiro
Privatização e retrocesso na reforma antipsiquiátrica! O movimento da luta antimanicomial conquistou uma reforma antipsiquiátrica que apresentava importantes avanços na desinstitucionalização da loucura. No entanto, vivemos retrocessos significativos com a ofensiva de privatização da saúde. Setorial de Saúde da LSR-RJ Está ocorrendo um desmonte da rede de saúde mental, intensificado com a entrada das OSs (Organizações Sociais), que terceirizam a gestão dos serviços, através de uma lógica mercadológica. A reforma psiquiátrica mudou o modelo de Atenção à Saúde Mental, transferindo o foco do tratamento que se concentrava na instituição hospitalar, para uma Rede de Atenção Psicossocial, estruturada em unidades de serviços comunitários e abertos, como os CAPSs (Centro de atenção psicossocial) e as RTs (Residências Terapêuticas). Tais mecanismos substitutivos visam reinserir na sociedade pessoas que ficaram anos internadas em manicômios, muitos por mais de 50 anos. Essa desinstitucionalização é muito singular, de pessoa para pessoa, pois os efeitos da institucionalização são muito perversos, já que as pessoas criam uma série de mecanismos de defesa para suportar a
vida em manicômios. No entanto, a lógica das OSs prioriza a produtividade dos serviços e não as conquistas singulares, impondo as mesmas metas para todos. Além de que incentiva a competitividade entre os serviços e profissionais, pois oferece bônus para aqueles que apresentam “melhor desempenho”. Esse modelo de privatização dos serviços públicos tem se expandido por todos os segmentos da saúde.
Sucateamento da rede para justificar as OS Na saúde mental do Rio de Janeiro está se implementando o modelo clássico da privatização, sucateando o público para justificar a entrada da iniciativa privada. A superintendência de saúde metal não renovou o convênio com a Associação que hoje gerencia as RTs e, por mais de um ano, não repassou verbas para a gestão destes mecanismos de saúde. A situação chegou ao ponto de o salário dos trabalhadores atrasar em dezembro e fevereiro, meses de festas e, pior, não ter nenhum dinheiro para o pagamento das contas públicas das Residências Terapêuticas, como contas de água, luz, telefone, aluguel e alimentação. Devido a essa situação, não pode haver contratação de profissionais. Assim, territórios chegam a ter se-
te profissionais a menos, o que gera uma enorme sobrecarga de trabalho para a equipe e, inevitavelmente, desassistência aos usuários. Promessas de que tudo será muito melhor com a entrada da OSs, salários mais altos e bônus por produtividade tentam seduzir os trabalhadores que já não aceitam mais esse descaso.
Desmonte e retrocesso Esse modelo de privatização da saúde, como foi dito, visa uma melhora em índices e indicadores de saúde, mas que não se concretizam em um atendimento de qualidade, mas somente quantidade.
Eleição do Sindicato dos Metalúrgicos de Itajubá-MG
Por uma Convenção realmente democrática da CSP-Conlutas A direção majoritária do Sindicato dos Metalúrgicos de Itajubá e Paraisópolis e Região-MG, hegemonizada pela Corrente Sindical Socialista (CSS)/PSTU, marcou sem qualquer tipo de consulta a nós do Bloco de Resistência Socialista (BRS), para o dia 03 de março, uma Convenção para definir a Chapa, supostamente da CSP-Conlutas, para as eleições do Sindicato.
Alexandre, Silvio Motoboy, Pastor, Rubens e Rosiléia Diretores do Sindicato dos Metalúrgicos de Itajubá e Região Apesar de construirmos a CSP-Conlutas, nenhuma das nossas reivindicações para a realização desta Convenção foi atendida. Propusemos que ela fosse realizada em apenas uma Assembleia. Esta medida permitiria uma maior fiscalização e evitaria fraudes. A CSS/PSTU foi contra e aprovou quatro assembleias.
Exigimos que no credenciamento e na coordenação da Convenção houvesse paridade, ou seja, um membro do CSS/PSTU e um outro do Bloco. A CSS/PSTU foi contra. Ou seja, a CSS/PSTU sozinha vai controlar tanto o credenciamento quanto a coordenação da Convenção. A CSS/PSTU também rejeitou a proposta apresentada por nós do Bloco de que a Convenção fosse acompanhada por um membro da Executiva Nacional da CSP-Conlutas, sem vínculo com a CSS/PSTU ou com o Bloco.
Limite de corte de 20% Não bastasse isso, a CSS/PSTU também foi contra a nossa proposta de proporcionalidade direta na Convenção. Eles aprovaram a linha de corte de 20% que é implementada nos sindicatos dirigidos pelos pelegos da CUT. Ou seja, só vão ter representação na Chapa da CSP-Conlutas os coletivos de trabalhadores metalúrgicos que tive-
rem mais de 20% dos delegados presentes na Convenção. Isto não é democrático. Exigimos que todo coletivo de metalúrgicos que reivindique a CSP-Conlutas possa compor a Chapa de forma proporcional. Diante de todos estes fatos, fica claro que estamos mais para uma Convenção da CSS/PSTU do que da CSP-Conlutas. Caso a CSS/PSTU não recue, não está descartado que tenhamos duas chapas no campo da CSP-Conlutas. Se isto vier a ocorrer, a responsabilidade será exclusiva da CSS/PSTU. Este apego da CSS/PSTU ao aparato sindical faz com que esta corrente política coloque os seus interesses acima do trabalhador metalúrgico. Quem ganha com esta política desastrosa são os patrões e os pelegos da CUT. A partir desta gravíssima situação, exigimos que a CSS/PSTU reveja o seu posicionamento para que tenhamos, realmente, uma Convenção Democrática e Unificada da CSP-Conlutas.
Um exemplo disso é a inclusão das internações psiquiátricas no SISREG - Sistema Nacional de Regulação. Este se trata de um sistema de “busca” de vagas em instituições e serviços de saúde de forma burocratizada, através de uma fila eletrônica, online. Aonde o sistema indicar que existe uma vaga livre, o usuário é encaminhado, independente se ele reside a quilômetros de distância. No lugar de ampliar a rede do SUS, a lógica é otimizar vagas disponíveis, acabando com o princípio da territorialização. Este modelo é péssimo para a saúde mental. Primeiramente, entendemos que a internação em instituições psiquiátricas não deve ser a primeira possibilidade, mas sim o encaminhamento para mecanismos substitutivos, como hospitais dia e CAPSs. Segundo, manter a referencia no território, estar em uma instituição de saúde em um local conhecido, permite a manutenção do vínculo com a sociedade. Ser encaminhada para um local em que a pessoa não tem nenhuma referência fortalece a lógica da exclusão social, manicomial. Terceiro, na maioria dos casos, as famílias não conseguem manter visitas regulares, devido às dificuldades de deslocamento pela cidade, esfacelando a rede de vínculos da pessoa.
Nesta lógica de “mostrar serviço”, mas sem qualidade, novas vagas são abertas em instituições psiquiátricas, retorno ao manicômio. Mais de 40 vagas serão abertas no Instituto Nise da Silveira, para receber os internos do Instituto Dr. Francisco Spinola, que será fechado. Ora, por que não ampliar a rede substitutiva? Porque trocar seis por meia dúzia é mais barato.
Retomada do movimento A prefeitura abre licitações para as OSs e cobra o pacote de serviços, mas não existe um real controle, nem da superintendência, tampouco dos trabalhadores. Assim, cada serviço passa a ter “leis e regras” próprios, ferindo os princípios do SUS. Porém, os trabalhadores da saúde mental não estão assistindo a tudo isso calados. No dia 06/02 foi realizado um ato em frente à prefeitura do Rio de Janeiro, denunciando todo esse desmonte da rede. A exemplo de Niterói, foi criado o Fórum de Trabalhadores da Saúde Mental do Rio de Janeiro. O Fórum está organizando para dia 14/03 o Seminário “Privatizações, desmonte da rede de Saúde Mental e retrocesso na Reforma Psiquiátrica: Como nos organizamos para resistir?”. A luta está só começando!
Mandato do PEG apoia a luta no Comperj NITERÓI Só o ex-diretor de abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, foi descoberto com cerca de 58 milhões de reais em contas na Suíça e aceitou “de boa” o compromisso de devolver 70 milhões ao Estado. Em meio a toda essa picaretagem, a corda segue arrebentando do lado mais fraco: os 3 mil trabalhadores do Comperj já estão há três meses sem salários, passando fome, sede e vivendo em condições sub-humanas, como sem-teto, na cidade de Itaboraí, interior do Rio de Janeiro. No entanto, mesmo diante de todo o apelo popular e de toda a luta dos trabalhadores, que já atravessaram a pé a Ponte Rio-Niterói e armaram acampamento em frente ao Palácio do Planalto em Brasília, a Petrobras foge da sua responsabilidade. A empresa se recusa a pagar os salários atrasados e briga na justiça contra os trabalhadores. Em uma audiência com o Mi-
nistério Público do Trabalho, a Petrobras havia se comprometido em pagar os 3 mil trabalhadores caso houvesse uma intimação. A empresa foi intimada, após uma decisão judicial, mas recorreu da decisão e não cumpriu o combinado. Independente da punição aos empresários e aos políticos envolvidos (que todos nós esperamos ansiosamente que ocorra e que seja a mais dura possível), é necessário que o sofrimento desses trabalhadores tenha fim. Eles agora esperam ser recebidos pela presidenta Dilma em Brasília, para cobrar seus direitos trabalhistas e ter sua dignidade restabelecida. A campanha que todos os trabalhadores do Comperj nos convidam a participar no momento é de pressionar a presidenta para que ela atenda seus justos pedidos. Nosso mandato, em apoio à sobrevivência imediata destes trabalhadores, está recolhendo doações em nosso gabinete de número 72 da Câmara Municipal de Niterói. Mandato do Paulo Eduardo Gomes, PSOL Niterói
sindical
Ofensiva Socialista n°24 março 2015
Greve geral no Paraná
Construir a greve unitária em SP No dia 29 de janeiro, milhares de professores reunidos em frente à Secretaria Estadual de Educação de São Paulo aprovaram o indicativo de greve da categoria para 13 de março.
Unificação da luta e radicalização das ações são as lições Assim como o governo federal de Dilma (PT) logo após as eleições intensificou a implementação das políticas de austeridade, Beto Richa (PSDB), governador do Paraná, também ampliou seus ataques. Vinicius Prado Historiador, Agente Educacional II, APP de Luta e Pela Base / CSP–Conlutas Ainda em 2014, Richa, enviou à Assembleia Legislativa do Paraná (ALEP) um pacote de austeridade fiscal, aumentando IPVA e o ICMS de produtos da cesta básica, além de outros impostos. Novamente, no início de 2015, o governo do estado enviou um novo pacote de medidas de austeridade financeira, composto pelos projetos de lei 06/2015 e 60/2015: o chamado “Pacotaço”. Desta vez, o foco era reduzir gastos através do corte de direitos dos servidores públicos, como quinquênios, licenças e auxílio transporte, além do aumento da receita, acabando com o fundo previdenciário e transferindo os seus mais de R$ 8 bilhões para o caixa do estado, criando um teto para a aposentadoria e um fundo privado de previdência complementar. Richa, que até aquele momento contava com 48 dos 54 deputados a seu favor, requisitou, através de seu líder na casa, Luíz Cláudio Romanelli (PMDB), o recurso de Comissão Geral, prática conhecida como “tratoraço”, que permite que um projeto de lei seja votado imediatamente na sua apresentação, dispensando o debate nas comissões da casa. Toda essa falta de disposição para o debate democrático por parte do governo, além de sua ânsia em atacar os direitos dos trabalhadores, se somou às precárias condições de trabalho dos servidores, onde faltam recursos básicos para o funcionamento dos órgãos públicos e atendimento à população.
Caos na educação: estopim da greve geral O governo Richa promoveu, entre o fim de 2014 e inicio de 2015, sistemáticas alterações na estrutura de funcionamento da rede estadual de educação, retirando as mínimas condições de funcionamento. Entre os ataques promovidos pelo governo tucano, estão a diminuição de funcionários (merendeiras, zeladores, técnicos administrativos, de laboratório e biblioteca)
por escola; demissão de mais de 10 mil servidores temporários (PSS); fechamento de mais de 2 mil turmas, lotando salas de aula, que em alguns lugares chegam a 50 alunos; fim de programas e projetos como “sala de apoio”, “mais educação”, “contra-turno”, cursos de idiomas, serviço de atendimento a estudantes em hospitais (SAREH); deixou de contratar 1.463 educadores(as) já nomeados em concurso público. Além das questões financeiras, Richa deixou de pagar a rescisão de contrato de 29 mil educadores PSS e o 1/3 de férias de todo o conjunto dos servidores do Paraná, além de não repassar o Fundo Rotativo (verba que cada escola recebe para despesas diárias, como higiene, limpeza e pequenos reparos) desde outubro de 2014. Todos estes ataques fizeram com que os educadores iniciassem a greve. Mesmo antes da deliberação em assembleia da greve, a base da categoria, de maneira espontânea e em todas as regiões do estado, se recusou a cumprir as atividades da semana pedagógica e foram às ruas por conta própria, sem articulação do sindicato, demonstrando que não iriam aceitar passivamente os ataques do governo. Assim, a assembleia do dia 07 de fevereiro, que reuniu mais de 10 mil trabalhadores da educação em Guarapuava, só serviu para oficializar uma greve que começara dias antes.
Uma semana histórica A semana do dia 9 de fevereiro já começou mostrando que seria histórica. Já na segunda-feira, várias categorias do serviço público começavam suas greves, com destaque para a educação e saúde, engrossando as mobilizações na praça entre o Palácio Iguaçu, sede do governo e a ALEP, em Curitiba. Na terça-feira, cerca de 30 mil servidores lotaram a frente da ALEP. Quando os deputados aprovaram a instalação da Comissão Geral que aprovaria o “Pacotaço”, não restou outra alternativa aos servidores que não fosse a ocupação do prédio da Assembleia. Os servidores que assistiam à seção das galerias pularam para a plenária e, simultaneamente, aqueles que se encontravam do lado de fora do prédio derrubaram as grades e engrossaram a ocupação. Foram três dias de ocupação, enfrentando ataques judiciais e ameaças físicas, marcados por muita resistência da categoria. Até que na quinta-feira feira, dia 12, os deputados marcaram uma sessão para o
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Miguel Leme Coordenador da Subsede da Apeoesp de Taboão da Serra
Paraná mostrou o caminho para todo o país restaurante em prédio anexo à ALEP para votarem o projeto. Os servidores trancaram todas as entradas da Assembleia, para impedir a votação. Porém, os deputados da base do governo Richa chegaram em um camburão do batalhão de choque da Polícia Militar, que serrou a grade dos fundos da assembleia para que os deputados entrassem. A partir daí, o confronto foi inevitável: os cerca de 20 mil servidores presentes enfrentaram o batalhão de Choque e sua bombas, balas de borracha, cassetetes e spray de pimenta, obrigando o Choque a recuar e conseguindo cercar o prédio onde se encontravam os deputados. Imediatamente, a sessão foi suspensa e os deputados tentaram negociar sua saída do prédio. Mas, aos gritos de “É SÓ O COMEÇO!’’ e “RETIRA OU NÃO SAI!”, os trabalhadores deram o tom da negociação. A saída só foi liberada após o chefe da casa civil enviar mensagem ao presidente da casa retirando os projetos que o governo havia apresentado.
Unificar a greve e radicalizar a luta é o caminho A vitória do dia 12 foi apenas a primeira batalha. O governo se comprometeu a não mais impor a Comissão Geral, mas estuda alternativas para reapresentar os projetos do “Pacotaço” de maneira “fatiada”. Porém, esta vitória foi de uma importância histórica sem precedentes para os trabalhadores do Paraná e do Brasil, pois mostrou que só a unificação das lutas e a radicalização das ações permitem aos trabalhadores imporem derrotas substanciais aos governos e patrões. O Governo Richa continua intransigente e só abriu mesa de negociação após o décimo dia de greve e as ocupações da ALEP, quando seu autoritarismo não funcionou. Os tucanos insistem na tese de
que o estado está quebrado e que a conta da crise deve ser paga pelos trabalhadores, mesmo com o DIEESE tendo apresentado estudo comprovando que, nos quatro anos da primeira gestão do PSDB, a receita aumentou em 56%. Os secretários da Fazenda, Mauro Ricardo e da Casa Civil, Eduardo Sciarra, que coordenam as negociações, deixaram claro que o governo não abrirá mão de acabar com o fundo previdenciário e sacar os 8 bilhões, questão central que coloca em risco as aposentadorias atuais e futuras de todos os servidores públicos. Os servidores do Paraná já descobriram o caminho. Resta agora seguir fortalecendo a unificação da greve e as ações radicalizadas como as que já ocorreram, como as tomadas de pedágio, fechamento de pontes e estradas e a ocupação da ALEP, afim de impor ao governo uma derrota definitiva. Esta greve tem uma pauta que não visa avanços, mas sim permanência de direitos. Por isso, não deve ser encerrada até que toda a pauta seja atendida, pois Richa e o PSDB já deixaram claro que não podemos confiar em suas palavras.
Beto Richa foi derrotado pela força dos trabalhadores
Motivos não faltam para esta greve. No orçamento do Estado para este ano, não há qualquer previsão de reajuste no salário dos professores. Houve também corte de verbas para a manutenção das escolas, demissão de parte dos coordenadores pedagógicos, fechamento de milhares de salas de aula, provocando desemprego e superlotação de outras salas. Na escola Veridiana Camacho de Carvalho, na zona norte de São Paulo, há sala de aula com 85 alunos, conforme foi noticiado pelo jornal Estado de São Paulo na edição de 11/02/2015.
Professores sem reajuste Os professores que passaram na prova de mérito não receberam até agora o seu reajuste. As nossas condições de trabalho pioraram nos últimos anos em virtude da precarização dos contratos dos professores categoria “O”, da superlotação das aulas, da falta de materiais didáticos pedagógicos e da intensificação do assédio moral dos gestores, como consequência da meritocracia que tem sido implementada na rede estadual de ensino. Além disso, o governador Geraldo Alckmin não cumpre a Lei do Piso Nacional do Magistério, que determina que 1/3 da jornada de trabalho seja destinada para as atividades extra-classe. Como miséria pouca é bobagem, não está descartado que as aulas sejam interrompidas no primeiro semestre em virtude da falta de água.
Construir unidade com outras categorias Entretanto, para que esta greve seja vitoriosa, é necessário que ela seja construída em todas as escolas, dialogando com pais e alunos. É tarefa da Diretoria do Sindicato construir a unidade com as outras categorias do Estado que estarão em luta neste primeiro semestre, como é o caso dos trabalhadores da saúde, das universidades públicas paulistas, da Sabesp e dos metroviários. Em relação ao eixo da nossa campanha, entendemos que ele deve expressar a hierarquia da nossa luta que, ao nosso ver, passa pela defesa do salário, emprego, melhores condições de trabalho e água para todos; e, em particular, para todas as escolas.
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especial: 8 de março
Ofensiva Socialista n°24 março 2015
Não queremos flores, exigimos direitos! A luta das mulheres é a luta da classe trabalhadora! Atualmente, vivemos uma crise mundial. Em diversos lugares do planeta, vemos como o sistema capitalista tem explorado ainda mais a classe trabalhadora a partir das medidas de austeridade. Nós mulheres somos as primeiras a sofrer com os cortes de investimento nas políticas públicas, temos os piores salários e estamos no topo da lista das descartadas do mercado de trabalho, com o desemprego. Flávia de Mendonça Ribeiro psicóloga, militante do MML e setorial de mulheres da LSR Juliana Meato militante do setorial de mulheres da LSR Infelizmente, esses ataques sofridos pelas mulheres acontecem em diferentes lugares do mundo. Nos Estados Unidos, o centro do capitalismo, segundo a Alternativa Socialista - sessão estadunidense do CIT - entre 2007 e 2011, 765 mil trabalhadores foram demitidos no setor público por conta da crise. E 70,5% destes eram mulheres. Além disso, com os cortes orçamentários na educação, muitas crianças pobres, negras, não conseguiram acesso às escolas do país, fazendo com que recaia sobre as mãe e mulheres a obrigação de ficar em casa cuidando de seus filhos.
Política de austeridade atinge as mulheres Na Europa, as políticas de austeridade foram implementadas de forma mais agressiva proporcionalmente à crise no continente. No Reino Unido, em consequência ao corte de verbas, o setor público foi obrigado a cancelar os exames de pré-natal, programas de apoio a ama-
mentação e houve fechamentos de creches. Na Grécia, com a crise econômica, houve um aumento de 30% de mulheres desempregadas no país e, consequentemente, aumentou o número de denúncias de violência doméstica, pois elas passaram a ficar mais tempo em casa, também aumentando a dupla jornada de trabalho com trabalhos informais. Exemplos como estes evidenciam como os setores mais vulneráveis são os primeiros a serem atingidos na crise. Contudo, os ataques aos direitos fundamentais das mulheres também acontecem no nosso país. No Brasil, no último 8 de março, milhares de feministas foram às ruas de todo o país denunciar a contradição entre os bilhões gastos pelo governo Dilma para a realização da Copa do Mundo e nenhum centavo direcionado para melhoria da vida das mulheres brasileiras. Uma Copa vergonhosa, menos pelo placar do jogo e mais pelo resultado final, Copa que custou a vida de operários, a remoção de milhares de famílias, o aumento absurdo dos aluguéis e do custo de vida em geral, o estímulo ao turismo e à exploração sexual de mulheres, tão denunciados pelas feministas ao longo do ano.
Promessas vazias do governo Dilma Durante a campanha presidencial, a estratégia de marketing que construiu a figura de Dilma como uma mulher forte, ex-guerrilheira e imbuída na luta contra as injustiças sociais, em nada se assemelha com a sua prática política diária. Os anos anteriores do seu governo já nos deram provas suficientes sobre o desinteresse em extinguir a desigualdade e para qual lugar de importância a política para mulheres é relegada. Não basta eleger Dilma, mesmo ela sendo uma mulher, já que nós mulheres trabalhadoras estamos cansadas de promessas vazias e já não temos mais nenhuma ilusão nessa presidenta. Temos de reconhecer que Dilma não nos representa, assim como o Partido dos Trabalhadores não é mais digno de carregar esse nome. Tal contradição tem se tornado cada vez mais evidente com as primeiras medidas do seu novo mandato, como, por exemplo, ao presentear o ministério da Fazenda para Joaquim Levy com a opção pelo ajuste fiscal e retirada de direitos, bem como o ministério da Agricultura para Kátia Abreu, inimiga conhecida dos movimentos sociais e pertencente à ala da bancada ruralista, a qual afirmou recentemente não haver latifúndio no Brasil.
Organizar e unificar a esquerda feminista para enfrentar os próximos ataques... Neste 8 de março, não há muito o ta lançou o decreto nº 8389, apreque ser apresentado pela presidenta, sentando quais os setores que não a não ser um pacote de ajustes ou sofreriam cortes orçamentários até de malvadezas. O anúncio do corte a reestruturação do governo no mês das pensões por morte e do aumen- de março de 2015. Nesse decreto, to do tempo de trabalho para que se Dilma apresenta que a secretaria de tenha o direito ao seguro desem- políticas para as mulheres receberá prego nos atinge de cheio. Muitas apenas o valor de 4 milhões de remulheres viúvas, pensionistas, são ais, porém, não se divulga os valoas que garantem o sustento de toda res necessários para o investimenfamília - essas pensões serão cor- to e a manutenção para os progratadas ou reduzidas à metade, dei- mas desenvolvidos por essa secrexando de ser vitalícias. O aumen- taria, como o disque 180, ou as deto do tempo de trabalho para aces- legacias das mulheres em todo o sar o direito ao seguro desemprego, país que, minimamente, colocam de seis meses para um ano e meio, a Lei Maria da Penha em prática, na prática inviabiliza a solicitação ainda que com muitos problemas. dos benefícios para os setores mais Vale apontar que, mesmo não esvulneráveis, já que dados compro- tando claro se esse valor será para vam um desemprego maior entre todo o ano de 2015, ele é ínfimo se as mulheres. Segundo dados do ul- comparado com outros anos. Em timo PNAD, somos 56,9% do total 2012, mais de 750 bilhões foram utilizados para pagar a divida púde desempregados. blica e 265 milhões foi o que o governo se comprometeu a investir 1% do PIB para no Programa Brasil sem Violência combater a violência! (2013-2014), e isso não aconteceu. A violência continua sendo assus- Assim, não vemos melhorias para tadora: vivenciamos hoje uma rea- as mulheres como as Casas-Abrilidade de feminicídio. A cada duas go, Delegacias Especializadas, ashoras, uma mulher é morta; a cada sistência médica às mulheres agredez segundos, uma mulher é estu- didas física e sexualmente, Centros prada. Somente 10% dos municí- de Referência, ou Casas de Ressopios brasileiros possuem Delegacias cialização aos agressores, como foi Especiais da Mulher (DEAMs). No apresentado pelo governo federal. dia 7 de janeiro de 2015, a presidenAlém disso, também foram corta-
dos investimentos na saúde, fazendo com que muitas mulheres não consigam mais acesso ao acompanhamento do pré-natal, por exemplo. No ano de 2014, 33 mulheres foram presas por abortos clandestinos, com essas prisões se concentrando no Sudeste (RJ – 15 presas, SP - 12, e MG, uma). Um dado indignante, visto que essas mulheres foram enquadradas no artigo 124 do Código Penal, criado em 1940. É evidente que as mulheres que mais sofrem com a criminalização do aborto são jovens, negras, com pouca escolaridade e baixa renda, visto que esse é o perfil das rés. Precisamos urgentemente descriminalizar o aborto em nosso país, para garantir a vida e segurança de todas nossas mulheres De forma escancarada, as novas medidas demonstram a opção pelo acirramento das politicas neoliberais, uma saída que favorece aos banqueiros, empreiteiros e ruralistas e gera ataques à classe trabalhadora abandonada à sua própria sorte e sufocada cada vez mais ao ter de pagar pela crise via austeridade. Contra estes ataques, queremos 1% do PIB investido em políticas públicas para as mulheres, contrapondo a privilégio potencializado aos bancos neste ano de crise.
Mulheres na luta por uma sociedade socialista Nesse 8 de março, precisamos lembrar que temos uma mulher no poder que não representa as mulheres trabalhadoras. É a mulher dos ajustes, amiga dos bancos, protetora dos latifúndios. O pacote de ajuste fiscal, o corte orçamentário em várias áreas sociais, se contrapõem aos números e dados que constatam a situação de violência, precarização e vulnerabilidade em que vivem a grande maioria das mulheres trabalhadoras e jovens deste país. Por isso, queremos impulsionar a luta das mulheres e construir saídas para romper com a opressão e este sistema capitalista, nosso papel é: • Nos organizar e unificar a esquerda feminista para enfrentar os próximos ataques e fortalecer nossa luta; • Construir a campanha por 1% do PIB para o combate à violência contra a mulher impulsionada pelo Movimento Mulheres em Luta; • Lutar conjuntamente com outros setores e com a Frente pelas Reformas Populares, contra os ajustes e as contrarreformas; • Pela legalização do aborto; • Contra a lesbofobia, transfobia e machismo.
especial: 8 de março
Ofensiva Socialista n°24 março 2015
A “supremacia médica” e a violência nas universidades paulistas A violência e a opressão estão presentes em todas as relações desiguais de poder, sobretudo em uma sociedade capitalista, que se sustenta na desigualdade social, de gênero e raça, na exploração da classe trabalhadora e na manutenção a todo custo da dominação por aqueles que detém o poder econômico e os meios de produção.
Têm sido inúmeras as situações onde podem ser constatadas, sob diferentes formas, as condições violentas dentro de uma hierarquia de poder e os mecanismos de controle e opressão que se fundam no estabelecimento do terror, do silêncio imposto aos mais fracos e das formas de exploração e dominação disseminadas em todas as dimensões da vida social. Dentre todas essas formas de violência já conhecidas, uma tem chamado a atenção pois escancara uma contradição enraizada no sistema como um todo – a violência nas universidades propagada pelos tradicionais trotes, sobretudo dentro dos cursos de Medicina.
Trotes violentos Caracterizada como uma profissão de acesso difícil, com uma permanência longa e critérios exigentes de formação, além de reduto da classe dominante, os cursos de Medicina das universidades paulistas têm sido sacudidos por episódios inconcebíveis de violência aplicados por veteranos aos ingressantes a cada ano, tendo como consequência: violência física, psicológica, extorsão, abusos, estupros, tortura, a morte. Humilhações que não se restringem ao início de cada ano pelo ingresso no vestibular, mas que permanecem nos anos seguintes de graduação, pós-graduação e até mesmo no exercício profissional posterior. Esse esquema de uma dominação absoluta de um grupo sobre outros do mesmo curso e da mesma profissão, mantido há décadas em nome da “tradição”, acaba por se revelar como uma supremacia desprovida de valores éticos, morais e humanos dentro de uma área de conhecimento e profissão que deveria primar pela solidariedade e respeito irrestrito à dignidade e aos direitos humanos. Com a coragem de quem assume para si a luta por um outro tipo de sociedade, estudantes de Medicina de várias instituições universitárias do Estado de São Paulo se organi-
Mirian França, vítima do Poder Judiciário classista, machista e racista A italiana Gaia Molinari e a doutoranda da UFRJ Miriam França de Melo são vítimas da sociedade capitalista, patriarcal, machista e no caso de Miriam, de racismo institucional. No dia 26 de dezembro, Gaia foi encontrada morta em Jijoca, praia de Jericoacoara, um dos 50 municípios brasileiros que mais registraram casos de violência contra mulher.
Raquel Guzzo psicóloga, docente da PUC-Campinas
Carlos Alberto LSR Ceará
Trotes violentos, machistas e rasistas são comuns no ambiente elitizado das universidades zaram para denunciar o que acontece nos bastidores da “mais respeitada profissão” - a Medicina. Os relatos já publicizados na mídia contam verdadeiras histórias de terror. Um processo de tortura acontecendo às barbas de todos, sem que ninguém, nem mesmo aqueles que são responsáveis pela formação, assumam posições de repúdio e desenvolvam políticas de repressão contra a naturalização desses atos violentos. É inconcebível que estudantes sejam forçados a estudar e se formar em meio a um ambiente de opressão mantido no interior das universidades, justificados por rituais hostis “de tradição”! É exatamente contra essa tradição violenta, exploradora e opressora que queremos lutar.
Não deixaremos a violência impune Em pleno 8 de março, é necessário apontar a coragem daquelas estudantes que, com todos os riscos, denunciaram casos de estupro e violência sexual que aconteciam nos trotes e no interior da universidade. Se é verdade que o peso do tradicionalismo elitista e hierárquico atinge um setor grande, são as mulheres que, além de submeter a este poder, acabam tendo os seus corpos violados por aqueles que acreditam ter o poder de controle sobre os outros. Esta violência bárbara não passará impune e devemos lutar até o fim para que os responsáveis sejam condenados. Sabemos que as “tradições” não se apagam facilmente e, também, que elas se mantêm, em muitas das
vezes, pela instauração do medo, que silencia e impede as vítimas de denunciarem, se organizarem e lutarem. Vale lembrar que as universidades, sobretudo as de Medicina, são espaços de exclusão da classe trabalhadora e de seus filhos. E, justamente por envolverem sujeitos de alto padrão socioeconômico, são necessários mais esforços para garantir a correta apuração e punição dos envolvidos, pois a possibilidade dos alunos serem blindados existe, visto os contatos pessoais e políticos. Por isso, é preciso apoio e proteção aos estudantes que desejam combater a violência e essa realidade, bem como organizar a comunidade universitária para que fatos semelhantes não se repitam e que os envolvidos passem pelas devidas punições. Participe conosco das ações que estamos construindo para esse enfrentamento. • Apuração dos casos e punição efetiva a todos os veteranos envolvidos nos trotes violentos das universidades. • Contra todo tipo de opressão e violência, lutamos por uma sociedade livre da dominação de uns poucos sobre outros. • Contra a supremacia médica que impõe aos demais profissionais da Saúde uma dominação exclusiva e desrespeitosa, lutamos por um trabalho inter e multidisciplinar com respeito aos distintos profissionais da Saúde. • Contra o perfil elitista dos profissionais da saúde e a favor de um programa de formação de profissionais da Saúde voltados à Saúde Pública e Coletiva.
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Miriam França, farmacêutica doutoranda pela UFRJ que passava férias no Ceará nesse período, foi presa de forma ilegal, sem seus direitos garantidos – como prisão especial e contato com advogados e família – em 29 de dezembro, como suspeita de ter assassinado a empresária Gaia, sem nenhum indício claro de seu envolvimento com o crime.. Em declaração à imprensa, sua mãe decifra bem o ocorrido: “Fica fácil culpar a ‘neguinha’”. A justiça necessitava responder de forma “ágil”, por se tratar de uma turista de outro país e, para isso, revelou o racismo muito presente.
O “paraíso” cearense é uma fraude O paraíso vendido pelas agências publicitárias nas praias do Ceará é uma fraude, pois o Estado ocupou o 25º lugar em denúncias de violência contra a mulher em 2012, com 14.274 casos, o que corresponde a 329,65 casos por grupo de 100.000 mulheres. Segundo o Conselho Comunitário de Jijoca, casos de estupros vêm sendo denunciados desde 2008. A violência no Ceará registrou mais homicídios por ano que soldados mortos no Iraque. De janeiro de 2007 a março de 2014, foram registrados 20.740 homicídios no Estado (sendo 2.860 por ano). O número de soldados mortos durante os oito anos e nove meses de guerra no Iraque foi de 21.428 (sendo 2.448 por ano). Portanto, Gaia foi vítima da violência que serve para gerar lucros exacerbados para grandes capitalistas, a exemplo do senador pelo Ceará, Eunício de Oliveira (PMDB), empresário do ramo de segurança armada e privada. A violência tem sido também um bom negócio na política, pois elege “bancadas da bala” nas câmaras municipais, Assembleia Legislativa e no Congresso Nacional. Enquanto o estado prende Mi-
riam, mulher, negra e pobre por ser suspeita do assassinato de Gaia Molinari, mulher, branca e rica, os outros 14 suspeitos ficaram em liberdade. Inclusive alguns desses são homens conhecidos na região por assediarem e atacarem mulheres. Não há evidências da participação de Miriam no homicídio. Mesmo que, de alguma forma, ela estivesse envolvida ou tivesse sido indiciada, pela condição de ter bons antecedentes, endereço fixo e profissão, poderia, como qualquer outro, responder em liberdade.
Mirian só foi solta após muita pressão No dia 13 de janeiro, Mirian saiu da prisão depois de muita pressão dos movimentos sociais e parlamentares do PSOL do Ceará e do Rio de Janeiro. Porém, com atuação desorientada, vexatória, preconceituosa e abuso de poder, a delegada Patrícia Bezerra usou a tática de estressar e intimidar para confundir o depoimento da Mirian, no dia 30 de janeiro, por mais de 7 horas de atuação teatral e tortura psicológica disfarçada de depoimento. O vereador de Fortaleza, João Alfredo (PSOL), que também é advogado, além da advogada Luanna Marley da RENAP (Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares), foram impedidos de acompanhar o depoimento sob pretexto de sigilo. No entanto, na sala havia a presença de diversos policiais armados, como forma de intimidar. No dia 10 de fevereiro, a Perícia Forense do Ceará provou que os resultados dos exames de DNA deram negativo e Mirian conseguiu voltar ao Rio de Janeiro em 14 de fevereiro.
Justiça a Gaia e Mirian! A LSR defende justiça para Gaia e Mirian. Reivindicamos o afastamento da delegada Patrícia Bezerra, da Delegacia de Proteção ao Turista (Deprotur), como presidente do inquérito policial do caso. Que a delegada Patrícia Bezerra, que convocou a imprensa para apresentar Mirian como acusada, reconvoque a mesma para retratamento em público. Repudiamos a sociedade capitalista que visa o lucro em primeiro lugar, em detrimento ao direito à vida digna. Essa tragédia prova que há um viés racista e elitista no poder judiciário na sociedade vigente. Por isso, construir uma sociedade anticapitalista, socialista, sem racismo, homofobia e machismo é urgente e necessário.
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Ofensiva Socialista n°24 março 2015
Envelhecimento precoce de Dilma e o papel da esquerda O envelhecimento precoce do segundo mandato de Dilma Rousseff é flagrante. Poucos meses depois da reeleição, o novo governo já atinge índices de popularidade ainda mais baixos que aqueles observados nas jornadas de junho de 2013. André Ferrari A avaliação ótima/boa do governo federal despencou de 42% em dezembro para 23% em fevereiro, segundo o Datafolha. Os índices de ruim/péssimo subiram de 24% para 44% no mesmo período. Trata-se do pior resultado já visto para Dilma e a avaliação mais baixa de um governo federal desde o início do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso em 1999. A comparação do segundo mandato de Dilma com o segundo de FHC faz todo sentido. Ambos refletem o fim de um ciclo. Em ambos, também, a crise econômica, política e social se aprofunda e a resposta governamental é a de jogar nas costas dos trabalhadores o peso dessa crise.
Dilma 2 mais à esquerda? Houve quem acreditasse que Dilma faria um segundo mandato mais à esquerda que o primeiro. Mas o clima de entusiasmo que atingiu alguns setores de esquerda no segundo turno transformou-se em profunda decepção. Poucas horas depois do anuncio da vitória em 2014, a prioridade do governo foi acalmar os “mercados”. O anuncio da nova equipe econômica, encabeçada pelo neoliberal ortodoxo Joaquim Levy, já antecipava o martírio que estava sendo tramado contra o povo e os trabalhadores. O conjunto do novo ministério, com Katia Abreu na agricultura e Kassab nas cidades, entre outros declarados inimigos dos trabalhadores, é o retrato fiel de um governo que gira ainda mais à direita. Dilma enfrenta a crise requentando a velha receita neoliberal: cortes, congelamento de salários, alta
Levy é a grande ameaça da direita hoje
dos juros, tarifaço, retirada de direitos trabalhistas e previdenciários. Mantém a linha privatista, anunciando a intenção de abrir o capital da Caixa para o setor privado e vai aprofundar as Parcerias Público Privadas no setor de infraestrutura. Está jogando o país na recessão, que pode agravar-se ainda mais com a iminência de uma crise energética e da crise hídrica. Essa política só provoca mais crise, demissões e arrocho, enquanto o ajuste da ordem de 80 bilhões de reais anunciado por Levy garante o pagamento pontual da dívida pública para o punhado de especuladores que comanda a economia nacional.
Com Lula é diferente? Diante da queima do “cartucho” Dilma e já pensando em 2018, alguns setores do PT tentam cinicamente nos convencer que com Lula seria diferente. Ao contrário de Dilma, Lula teria mais vínculos com o movimento sindical e jamais aceitaria os ataques que estão sendo promovidos. Esquecem que Lula está sendo parte fundamental da ofensiva governista no sentido de reaproximação com a bancada do PMDB e outros partidos de direita no Congresso, depois da derrota sofrida por Dilma com a eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para a presidência da Câmara. O objetivo é garantir a aprovação da política de ataques no Congresso Nacional. O papel do PT no governo e no Congresso a favor dos ataques é tão nefasto que um senador petista chegou a manifestar seu desconforto em off para o jornal Valor Econômico (24/02): “Estamos agora com o PT defendendo a tese do patrão e os tucanos, a manutenção dos direitos trabalhistas”. É evidente que os tucanos são plenamente favoráveis à retirada dos direitos e ao ajuste neoliberal. Mas a postura do PT hoje só abre caminho para que o PSDB apareça como uma alternativa que de fato não é.
Corrupção e impeachment Ao contrário do que aconteceu na época do “mensalão”, dessa vez a gravíssima situação econômica faz com que os escândalos de corrupção tendo como epicentro a Petrobras ganhem mais repercussão. Os riscos da situação escapar ao controle são enormes para o governo. O governo aposta a maior parte de suas fichas no fato de que uma investigação séria da corrupção na Petrobras e envolvendo as empreiteiras acabaria atingindo praticamente todos os setores políticos, incluindo a oposição de direita. Isso serviria para que parte da sujeira seja jogada pra debaixo do tapete. Para os tucanos e sua laia, tra-
ta-se de sangrar ao máximo o governo do PT tentando não se sujar muito e, dessa forma, acumular forças para vitórias eleitorais futuras. A discussão sobre o impeachment por parte dos tucanos reflete a mesma política. Mesmo se não vingar, serve para desgastar o governo ao máximo e polarizar ainda mais o cenário evitando que o espaço de oposição seja ocupado por outros setores.
Reaproximação dos movimentos sociais? Se, por um lado, Lula encabeça os esforços para aprovar os ataques aos trabalhadores no Congresso, de outro também assumiu a tarefa de promover o que chamam de uma reaproximação com os movimentos sociais. Lula quer usar sua autoridade junto a setores dos movimentos sociais para defender o governo das acusações de corrupção na Petrobras e da ladainha sobre o impeachment de Dilma. Com a extrema burocratização e cooptação da CUT e outras entidades pelo governo, esses setores perderam poder de mobilização real e autêntica. Não é a toa que, desde junho de 2013, o espaço das ruas tem sido ocupado por outros movimentos sociais com características muito mais combativas e de base. Lula e o PT querem agora reestabelecer sua autoridade diante das ruas. Querem poder usar os movimentos sociais nos momentos em que for conveniente e poder controla-los nos momentos de crise mais aguda e luta mais radicalizada. A esquerda socialista e os movimentos sociais combativos devem atuar em unidade de ação com qualquer setor do movimento social disposto a lutar contra o ajuste e a política de austeridade do governo. Deve, inclusive, ter políticas para empurrar setores do movimento para uma postura mais combativa e de luta. Mas deve ter clareza sobre o real significado da movimentação da direção do PT e os limites das direções sindicais governistas.
Direita tucana não é alternativa A direita tradicional encabeçada pelo PSDB tenta aproveitar-se ao máximo da situação de crise do governo Dilma. Isso se dá mesmo que a sua situação também não seja tão favorável. A queda na popularidade de Dilma foi acompanhada pelo mesmo fenômeno em relação aos principais governos estaduais do PSDB. Beto Richa do Paraná, por exemplo, não precisou esperar que se completassem dois meses de seu segundo mandato para enfrentar uma avassaladora greve do funcionalismo estadual que impôs ao
Dilma fez por merecer seu inferno astral governo uma enorme derrota soNosso centro nesse momento é a bre seu projeto de cortes e ataques. defesa de nossos direitos que estão Geraldo Alckmin, que foi reelei- sendo atacados de todos os lados. to governador de São Paulo no priMas, na luta defensiva contra os meiro turno, perdeu 10 pontos per- ataques de Dilma e dos tucanos, centuais desde outubro do ano pas- precisamos também assumir uma sado e hoje tem a mesma populari- postura ofensiva na defesa de um dade (38%) que tinha no auge das programa da classe trabalhadora jornadas de junho de 2013. que defenda transformações estruCom o agravamento da crise hí- turais em nosso país. drica em São Paulo, os já anunciaPrecisamos de um programa que dos cortes da ordem de dois bilhões defenda a reforma urbana e agráde reais nos gastos do governo e a ria radicais, uma reforma tributária resposta organizada dos trabalha- que penalize os ricos e as grandes dores e movimento sindical e po- fortunas. Que levante também a depular, a tendência é que o apoio a fesa de uma auditoria e a suspenAlckmin despenque ainda mais. são do pagamento da dívida públiA única crítica que o PSDB pode ca aos grandes capitalistas, assim fazer aos governos do PT é que lhe como a reestatização das empreroubaram as políticas neoliberais sas privatizadas sob controle dos e aprofundaram seus esquemas de trabalhadores. Como parte da luta, esse progracorrupção. Ambos são gestores do mesmo sistema político apodreci- ma também deve defender a necesdo e do mesmo modelo econômico. sidade de mudanças radicais no sistema político, começando pelo fim do financiamento das candidatuO papel da esquerda ras pelas empresas, mas indo muiA ação oportunista da direita tu- to além. Deve também defender o cana não significa que a insatisfa- controle público e democrático dos ção popular em relação ao gover- meios de comunicação e a garanno Dilma seja injustificada. Dilma tia do direito de greve, manifestafez por merecer e o papel da es- ção e organização sindical e popuquerda não é defendê-la, mas sim lar, com o fim da criminalização construir uma alternativa conse- dos movimentos sociais. quente pela esquerda que impeça Com base nessa luta estaremos a velha direita de fortalecer-se no criando as condições para que a ocaso do PT. classe trabalhadora construa sua Nosso papel é o de derrotar nas alternativa de poder. Contra Dilruas, nas lutas e nas greves as po- ma, os tucanos e as falsas terceilíticas do governo de Dilma e Jo- ras vias, queremos um verdadeiro aquim Levy, assim como dos go- governo de esquerda que adote um vernos estaduais e municipais de programa anticapitalista e socialistucanos e assemelhados, seguindo ta. Isso só será possível se derrotaro exemplo do Paraná. mos as políticas de ajuste, barrarPorém, é preciso que fiquemos mos a velha direita e unificarmos atentos. O discurso do impeach- a esquerda socialista. ment de Dilma nesse momento só O papel do PSOL é defender esserve para que setores da oposição sa política e credenciar-se, a partir de direita desviem o caminho da lu- das lutas dos trabalhadores e de sua ta direta dos trabalhadores contra alternativa programática, como feros planos de ajuste que tanto o PT ramenta a serviço de uma alternaticomo o PSDB defendem. va política de esquerda para o país.
juventude
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A tarefa da juventude é ocupar as ruas por mais direitos Cortes nas verbas destinadas à educação, escolas com salas de aula superlotadas e outras atrasando o período letivo por causa da crise da água, crescimento do ensino privado nos cursinhos e universidades, precarização das condições de infraestrutura e de assistência estudantil nas universidades públicas, anúncio de mais e mais demissões, aumento da criminalização e genocídio dos jovens da periferia... Qual o papel da juventude nesse cenário de ajustes fiscais e recessão econômica em 2015? Felipe Alencar e Jean Henrique 29,6 % de jovens com idade entre 18 e 24 anos não trabalham e não procuram emprego (dados do IBGE-PNAD de 2013). Houve uma queda de 5,9% na participação de jovens no mercado de trabalho desde 2012 (dados do IPEA). O quadro do desemprego já é uma realidade da juventude nessa crise econômica. Embora uma parcela maior da juventude agora está dentro de uma universidade, há um processo de precarização dessas instituições. Essa tendência se intensificou desde quando o Governo Lula criou programas como o Reuni (Plano de reestruturação e expansão das universidades federais), o Prouni (Programa universidade para todos) e o novo Fies (Programa de financiamento estudantil). Ao invés de melhorar a qualidade do ensino, esses programas promovem uma privatização e precarização da educação pública. Muitas universidades não têm políticas de assistência estudantil que garantam moradia, restaurantes, creches, além de infraestrutura mínima, como prédios para salas de aula, bibliotecas e laboratórios. O estudante que entra nessas instituições não consegue permanecer e se formar, ou aquele que ainda consegue o diploma, que não significa garantia de emprego, fica por anos endividado graças ao Fies.
Cortes e lucros O ano mal começou e o Governo Dilma faz um grande corte de R$ 7 bilhões de reais na educação. Ao mesmo tempo, o maior conglomerado de educação privada do mundo, a brasileira Kroton, totalizou cerca de 1 milhão de alunos em 2013 e tem um valor de mercado de R$ 20 bilhões. Enquanto o ensino privado lucra bilhões e a educação pública sofre um corte de milhões, centenas de milhares de estudantes que não foram aprovados nos concorridos e seletivos vestibulares elitistas voltam para as salas lotadas dos cursinhos. Na Universidade Federal de Ala-
goas (Ufal) estudantes protestaram no início de fevereiro para exigir o pagamento das bolsas de cerca de 1,3 mil alunos, que estavam atrasadas desde o mês de janeiro. Já na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), as bolsas dos estudantes têm atraso de dois meses os estudantes ocuparam a reitoria. Na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), os atrasos já ocorrem desde novembro de 2014. As medidas de corte no orçamento acontecem também nas estaduais, como a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que teve que antecipar o recesso do ano de 2014 por dificuldades financeiras e começou 2015 com greve de funcionários da limpeza por não pagamento de salários.
Universidade à beira de colapso A Universidade Estadual de Londrina (UEL) está à beira de colapso, com dívidas de energia elétrica e de água de mais de R$ 2 milhões. As sete universidades estaduais do Paraná calculam que precisam de R$ 124 milhões, mas o governo Richa (PSDB) está disponibilizando míseros R$ 9 milhões. Na Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN) já é habitual a falta de todo tipo de material de expediente e de limpeza no último trimestre de cada ano. Agora, o novo governador Robinson Faria quer implementar uma contrarreforma administrativa com o objetivo de diminuir a folha de pagamento dos trabalhadores. A crise da água em São Paulo já afetou dezenas de escolas que, durante o período mais forte da seca, dispensaram os alunos por conta da falta d’água. Muitos diretores de escolas estaduais e municipais já pautam a necessidade de começarem o recesso de julho mais cedo, pois muitas escolas não receberam investimento suficiente para manutenção e para compra de caixas d’água. Além disso, a merenda tem sido trocada por bolachas e bolinhos industrializados, para fazer racionamento da água utilizada na cozinha das escolas.
Criminalização da juventude pobre e negra A juventude das periferias no Brasil é um dos setores mais oprimidos. Sobrevive com subempregos e convive cotidianamente com a expressão mais violenta do Estado, que a mídia propagandeia como política de segurança. O Sítio Cercado, um bairro da zona sul de Curitiba-PR, é um dos mais violentos da cidade, com 54 mortes violentas registradas em 2013. Em contrapartida, bairros de classe média, como o Alto da XV e Juvevê, não tiveram registro
de mortes violentas (Fonte: Programa 190 e Crimes Curitiba). A situação também é grave no Rio de Janeiro, onde o complexo da Maré está ocupado pelo Exército e pela polícia “pacificadora” (UPPs) do Governo Pezão, gerando cotidianamente muito mais constrangimentos e convivência com tiroteios e enfrentamentos diretos com os trabalhadores. Enquanto isso, na região da zona sul carioca ou até mesmo em bairros mais populares como a Lapa, a ordem do dia é a higienização social e as agressões que se baseiam em critérios racistas e da mais perversa podridão preconceituosa. Uma grande parte da população das periferias apostava que, com os governos do PT, seria o momento de mudanças estruturais no Brasil. Mas ainda hoje a juventude da periferia é que morre e vira estatística da violência urbana a qual vários trabalhadores são submetidos. A juventude sobre também com a criminalização dos movimentos populares, como vimos durante a Copa da Fifa em 2014 e nos protestos contra o aumento das passagens.
Construindo alternativas de luta Esses elementos que constroem o cenário mostram algumas bases para situar politicamente a luta contra a criminalização da juventude trabalhadora. É necessário que a esquerda canalize a insatisfação desse setor que é a maioria dos jovens do país, construindo alternativas de luta pela base. Uma experiência importante tem sido cultivada em Curitiba-PR, onde temos o trabalho da Juventude da LSR em unidade com o Coletivo Construção, nos inserindo nas escolas para a construção de grêmios, em batalhas de rap para dialogar com uma parte do movimento negro e com atividades sobre machismo, racismo e homofobia, que são debates pouco feitos por grupos organizados da esquerda nos bairros periféricos. Nova geração tomando as ruas Desde junho de 2013, vemos no Brasil uma polarização social, refletindo um desgaste do modelo lulista. Uma nova camada de militantes e ativistas saiu às ruas e trouxe uma nova qualidade aos movimentos que surgiram desde então. Temos que disputar essa juventude e aproximá-la a uma alternativa socialista. O caminho para isso é atuar em unidade com os trabalhadores e construir espaços amplos de articulação e de perspectivas para massificação e enraizamento das lutas. É necessário concretizar a palavra de ordem SÓ A LUTA MUDA A VIDA, contra os ataques dos governos e dos patrões, e que junho só foi o começo de uma jornada com mais lutas e conquistas.
Estudantes da UFPB ocupam a reitoria contra os atrasos no pagamento de bolsas
Muito além de uma reprovação no ve$tibular Junto com o bolso dos empresários do ramo da educação, as salas de cursinho vão ficando cada vez mais cheias. Rafaela Bardini Milhares de jovens se esgotam e competem entre si, baseando-se em um pensamento meritocrático que é alimentado diariamente dentro e fora dessas salas. “O vestibular incluirá vocês nas melhores universidades”, “quem estuda passa” e outros discursos como esses são usados para iludir milhares de estudantes e fazê-los acreditar que a culpa por não estarem na faculdade é deles e é individual.
Todos passariam? No ano passado a USP oferecia cerca de 11 mil vagas e recebeu mais de 160 mil inscritos em seu vestibular. Será que os 150 mil que não passaram não estudaram o suficiente? Todos eles passariam se tivessem estudado? O fato é que o acesso ao ensino superior hoje é totalmente restrito e visa o lucro. Empresas crescem cada vez mais em cima da ideologia da meritocracia e da exclusão que o vestibular realiza. Com valor de mercado de R$ 20 bilhões e com o título de maior empresa de educação do mundo, a brasileira Kroton representa bem as consequências disso e de se ter um governo que prioriza o capital. Iniciativas públicas dão cada
vez mais autonomia e facilidades à mercantilização da educação e, com programas como Fies e Prouni, pra se ter uma noção, o Estado já é responsável direto por 35% da receita dessa empresa. Enquanto empresários lucram e jovens brancos e ricos usufruem das, cada vez mais sucateadas, universidades “públicas”, os jovens de periferia se vêem fora até mesmo dos caros cursos pré-vestibular. Com os programas citados, que alugam vagas ociosas para garantir o lucro das faculdades privadas, eles se endividam e o número de evasões só aumenta. Ano após ano o adolescente pobre vê seus objetivos serem barrados e seus sonhos interrompidos por uma prova de 90 questões e repressões sociais do decorrer da vida. Já passou da hora disso acabar.
Por um ensino público, gratuito e de qualidade Março costuma ser o mês em que as aulas começam definitivamente. Milhares de jovens se preparam para encarar uma nova rotina. Alguns deles na universidade, a maioria fora dela. A ampliação, com qualidade, de vagas nas universidades e o consequente fim do vestibular são indispensáveis para a cidadania e dignidade do jovem. A realidade é que fazê-los em um sistema que tem a exclusão e o lucro sobre ela intrínsecos é impossível. Lutar contra o vestibular é lutar contra o capitalismo.
10 internacional 8º Escola Latino-Americana CIT
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Preparando as forças para uma nova etapa de lutas Nos dias 3 e 8 de fevereiro, realizamos a 8º Escola Latino-Americana do Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores – CIT, na Universidade Federal Fluminense em Niterói (RJ). Esta Escola aconteceu num momento especial da conjuntura mundial e latino-americana. Com turbulências no mundo todo, não há estabilidade e tampouco saída pacífica da crise para a burguesia. Em oposição, lutas, manifestações e vitórias importantes de partidos de esquerda. Jane Barros Esta crise prolongada do capitalismo produziu elementos revolucionários e contrarrevolucionários em todo o mundo. Lutas de trabalhadores foram derrotadas na Europa por erros da burocracia sindical e a debilidade de partidos de esquerda. As novas inciativas, como Die Link ou Novo Partido na França, ainda não se mostraram à altura dos desafios, gerando confusão, frustação. Do outro lado, o Syriza triunfou nas últimas eleições gregas, representando uma vitória para os trabalhadores em todo o mundo, pois indica que existe saída para a crise que não o acirramento da austeridade. Manifestações gigantes ocorreram em Madri contra a austeridade e o Podemos, um novo partido, aparece como resposta, inclusive para aqueles que em 2011 gritavam contra esta ferramenta de luta. Na América Latina, os impactos da crise também estão sendo mais fortemente percebidos. O modelo presente na ultima década começa a ruir, com a crise das commodities. No Brasil, Argentina, Venezuela, Bolívia, os governos são obrigados, enquanto não rompem com a lógica do capitalismo, a fazer mais pacotes de austeridade, não podendo mais garantir as políticas sociais de antes.
Trata-se de um novo ciclo e é necessário que socialistas e revolucionários se debrucem sobre a nova conjuntura e organizem a intervenção da classe trabalhadora e da juventude para enfrentar os ataques e barrar o projeto neoliberal. Nós do CIT, como parte deste processo, organizamos esta 8º Escola de formação internacional para juntos pensarmos e planejarmos os próximos passos da luta.
Kshama Sawant no ato público O ato de abertura, que contou com a participação da vereadora socialista Kshama Sawant, dos EUA, foi o maior Ato Público já organizado nas Escolas Latino-Americanas. O ato lotou no Salão Nobre do IFCS da UFRJ-RJ e contou com a presença de mais de 250 pessoas. Luciana Genro, Tarcísio Motta, Paulo Eduardo Gomes (PEG), Robério Paulino, expressaram candidaturas do PSOL, claramente socialistas, capazes de enfrentar a velha direita, o lulismo e a falsa alternativa na face de Marina Silva. Nós da LSR construímos e colaboramos com estas campanhas, sendo estas a prova de como é possível crescer eleitoralmente sem capitular. O camarada Vitor Chokito, do MTST, representou a luta urbana por moradia. O MTST é um dos principais movimentos sociais hoje na conjuntura e tem conseguido vitórias importantes e mobilizado milhares de trabalhadores. Vitor entregou uma bandeira do MTST para a camarada Kshama Sawant, um presente capaz de simbolizar a concentração entre as lutas sociais contra a sociedade capitalista, que nos retira direitos, trabalho e moradia. Tony Saunois, do Secretariado Internacional do CIT, chamou atenção para o exemplo do Syriza, assim como as lutas dos trabalhadores na Europa e Irlanda contra a austeridade e a taxa da água especificamente. Apesar da vitória na
Na Escola LatinoAmericana do CIT ocorreu o lançamento do livro de Luciano Barboza, “A identidade do Movimento por Urbanização e Legalização do Pantanal da Zona Leste”, sobre a luta urbana na periferia de São Paulo. O livro pode ser adquirido via a LSR, por 20 reais + frete, ou nas nossas banquinha.
Kshama Sawant recebe bandeira do MTST de Vitor Chokito Durante esta uma semana, disGrécia, Tony colocou os limites do rio mínimo de 15 dólares por hora governo Syriza, que serão supera- no coração do imperialismo. A lu- cutimos as Relações Mundiais e dos unicamente com a luta dos tra- ta foi vitoriosa na cidade de Seat- o impacto da crise, América Latibalhadores organizados, pressio- tle e vai transferir 3 bilhões de dó- na, o trabalho de mulheres no CIT, nando-o mais à esquerda. Indicou lares dos patrões a 100 mil traba- formação de novos partidos, detaque a construção de uma interna- lhadores nos próximos anos. Esta lhamos nossa intervenção nos pacional dos trabalhadores, de uma luta hoje se expandiu para o res- íses da América Latina, assim como debatemos em grupos de disluta coordenada, é condição para to do país. Não é exagero dizer que Ksha- cussão temas como a crise hídriuma real vitória contra o capital. ma pautou o socialismo no coração ca; o fenômeno Syriza, a luta nos do império. Sawant é um exemplo EUA; a atualidade da teoria marUnidade na luta da possiblidade de enfrentar o ca- xista e a crise; a luta sindical e os O camarada Luciano Barboza, da pitalismo e construir no dia a dia partidos, o Oriente Médio e Cuba. LSR, sessão brasileira do CIT, con- uma oposição a este sistema, danUma semana intensa de muita textualizou o momento que a Es- do voz e força à classe trabalhado- discussão e trabalho, mas extremacola estava acontecendo, de acir- ra e a juventude organizada. Rela- mente renovadora. ramento das politicas e ajustes ne- tou sobre o grave problema racial e oliberais da Dilma e outros gover- a morte de jovens negros nos EUA, Perspectivas nos e reais possiblidades de reces- o que nos mostra que não basta ter são. Precisamos resistir aos ata- um presidente negro. Obama, no A 8º Escola Latino Americana do ques. Este não é um ano de fracio- seu discurso anual, sequer tocou CIT constatou a nova etapa da luta nismo e sim de unidade da esquer- na questão do racismo e da ação de classes que se abre no mundo e da para enfrentar o projeto neolibe- dos policiais. na América Latina. Nesta conjunral. Essa unidade é a única saída patura, a palavra de ordem é unidara enfrentar a falta d’água, aumende na luta para enfrentar os ataques Os debates na Escola to no transporte, desemprego e falde austeridade e construção de insta de moradia. A Escola aconteceu em duas fa- trumentos e ferramentas autônomas Demais sessões do CIT saudaram ses. A primeira, de 3 a 6 de feve- da classe trabalhadora para este eno ato e a Escola: o camarada Johan reiro, em um número menor de ca- frentamento, junto com a construda Venezuela, Pedro Pablo do Chile maradas. Atentamo-nos à tarefa de ção de uma alternativa socialista. e o companheiro Carlos da Bolívia formação de quadros na perspecEm contraposição aos ataques, os reforçaram a importância da Esco- tiva de ampliação do trabalho do trabalhadores e a juventude estão la e da atual conjuntura econômi- CIT na América Latina e no Bra- tomando as ruas. Como no Brasil, sil. Contamos com as contribuições em que greves, manifestações, moca para organizar as nossas lutas. A companheira Kshama Sawant, da camarada Toya dos EUA, assim bilizações, tem sido a tônica do inívereadora eleita na cidade de Seat- como Tony Saunois, do nosso Se- cio de 2015 e isso tende a aumentar. tle, nos brindou com uma fala ins- cretariado Internacional e as dele- É tarefa dos socialistas impulsionar piradora. Relatou a luta que esta- gações de Chile, Venezuela, Bolí- estas lutas e contribuir na construmos construindo nos EUA através via e Brasil, este com delegações ção de novos partidos de trabalhada Alternativa Socialista, organi- de 10 estados. Ao final de semana, dores e da juventude, organizando zação irmã da LSR, tendo como a Escola se ampliou e contamos a luta contra o capitalismo. centro a reivindicação de um salá- com cerca de 160 pessoas.
internacional
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Grécia: Syriza recua sob ameaças da Troika O clima popular é contra a austeridade No dia 20 de fevereiro, negociadores gregos concordaram em uma extensão por mais quatro meses do atual programa de resgate com seus credores (a “Troika” - UE, FMI e Banco Central Europeu). Foi relatado que a delegação grega foi sujeita à chantagem aberta do eurogrupo (ministros de finanças da zona do euro) – o governo do Syriza foi informado que seria forçado a implementar controles de capital dentro de dias caso não concordassem. Nikos Anastasiades Xekinima (CIT Grécia) 24/02/2015 Os elementos chave desse acordo são que a Grécia passa a aceitar os fundamentos do “memorando” (acordo de austeridade) para os próximos quatro meses: o país terá o próximo pagamento de resgate cumprido apenas se for avaliada “positivamente” pela Troika, a Grécia precisa pagar toda sua dívida a tempo e está comprometida em usar a maior parte do dinheiro arrecado pelo programa de austeridade para pagar a dívida e não tomará qualquer “ação unilateral”. Está claro que o acordo significa um grande recuo para o governo grego. O acordo de quatro meses pode ter impedido que a Grécia saia imediatamente do euro, mas vem com um preço muito alto. Apesar da avaliação positiva do Primeiro Ministro Tsipras, Atenas fez grandes concessões, incluindo renegar os pedidos de redução das enormes dívidas da Grécia. O Syriza alega que conseguiu o “melhor” dos maus acordos em oferta sob pressão de fuga de ca-
pital dos bancos gregos e a ameaça de uma corrida caótica aos bancos. “Nós ganhamos tempo”, alegam eles. Mas, tempo para que? O acordo viu Atenas tendo que propor reformas aceitáveis para seus credores. As propostas do Syriza precisam ser aprovadas pelo eurogrupo e pela Troika, com abril estipulado como prazo final. A menos que o Syriza aceite essas determinações, o governo não irá receber o empréstimo que precisa para evitar uma moratória da sua dívida de €320 bilhões (cerca de R$ 1 trilhão).
Está tudo perdido? Isso significa que “tudo está perdido”? Isso depende do clima de luta entre as massas trabalhadoras gregas. Os movimentos dos trabalhadores e sociais lutarão para estender sua vitória eleitoral sobre o establishment ao plano sindical, enquanto a Troika tentará conter o Syriza dentro da estrutura capitalista da União Europeia. O governo será fortemente espremido entre essas duas pressões. Onde esse cabo de guerra vai terminar é algo que não podemos prever, porque é uma batalha de forças vivas. O Syriza deveria falar a verdade ao povo grego. Se o governo fez concessões a fim de ganhar tempo para implementar um plano estratégico para derrotar a austeridade, o povo entenderia e se integraria à batalha. Mas falhando nisso irão, infelizmente, mostrar que o caminho que o governo grego está tomando é de conciliação de classes com a União Europeia e a elite local, aceitando sua agenda. O Syriza não apresenta um programa geral socialista. Seus líderes prometem ficar dentro da eurozona capitalista, não importa co-
Christine Lagarde do FMI e o ministro grego de finanças Yanis Varufakis
mo. Isso significa aprisionar os trabalhadores gregos dentro da camisa de força dos patrões capitalistas da União Europeia e aceitar a lógica do “mercado único” e as ordens da Troika. O ministro de finanças grego Varoufakis alegou que o acordo permite à Grécia variar a sua meta fiscal esse ano, para que ele possa executar um baixo superávit e que há uma “ambiguidade criativa” dos superávits primários gregos requeridos para além de 2015. O governo grego disse que isso permitirá realizar algumas “políticas humanitárias”. É verdade que alguns poucos bilhões de euros poderiam aliviar as terríveis tensões naqueles setores da população grega que foram fortemente atingidos. Isso pode ser visto como um progresso para os trabalhadores, no momento, pelo menos comparado ao péssimo desempenho do último governo.
Os riscos não poderiam ser maiores Mas isso não será suficiente para pagar pela série de reformas para a classe trabalhadora e para o tipo de investimento público massivo desesperadamente necessário. As partes principais do “Programa de Salonica” do Syriza, que por si só é um recuo diante dos programas anteriores do partido, serão adiadas, talvez indefinitivamente. Não irá chegar nem perto de desfazer o dano da perda de 25% do PIB dos últimos cinco anos. E, se o governo do Syriza acordar com os termos draconianos e condições demandadas pelo capitalismo alemão, isso será visto pelos trabalhadores gregos, cedo ou tarde, como uma mudança de rumo e capitulação do Syriza. Líderes do Syriza já estão publicamente oscilando sobre algumas promessas políticas, como no restabelecimento da emissora estatal ERT. O governo já cedeu e aceitou manter as privatizações “em curso” e discutir a possibilidade de envolvimento de empresas privadas para “desenvolvimento” de novas instalações. Ainda assim, há um suporte público para um programa radical anti-austeridade. Mais de 100 mil pessoas estiveram no centro de Atenas no dia 15 de fevereiro, em apoio às posições iniciais de negociação do Syriza. O clima foi combativo. O fascista Aurora Dourada e o nacionalismo reacionário foram empurrados para o escanteio por causa do novo clima anti-Troika e anti-imperialista. Sessenta por
“Nenhum passo atrás” na luta contra a austeridade cento dos eleitores do Aurora Dourada disseram concordar com a posição do governo Syriza. Isso mostra um grande apoio ativo que pode ganhar em uma luta corajosa contra a Troika em um claro programa anti-cortes e socialista, incluindo o repúdio da dívida, fim de toda austeridade, controle de capitais, monopólio estatal do comércio exterior e da propriedade pública democrática das grandes empresas e bancos, ao encontro das necessidades da maioria e não de poucos – junto com um apelo classista internacionalista aos trabalhadores do resto da Europa. Mesmo se o Syriza apenas travar corajosamente seu Programa de Salonica, os trabalhadores e os pobres na Grécia iriam entusiasticamente mobilizar-se em apoio da sua implementação, com suporte ativo dos trabalhadores por toda a Europa, desafiando seus próprios governos que também implementam cortes e austeridade. Se a esquerda falhar em apre-
sentar uma saída e a classe média e grandes setores da classe trabalhadora caírem em frustração e desmoralização, isso abrirá caminho para a Nova Democracia e outros partidos pró-austeridade para o poder, ou mesmo um renovado crescimento do Aurora Dourada. Os riscos não poderiam ser mais altos para a classe trabalhadora grega e europeia.
“O Syriza deveria falar a verdade ao povo grego. Se o governo fez concessões a fim de ganhar tempo para implementar um plano estratégico para derrotar austeridade, o povo entenderia e se integrariam à batalha.”
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N° 24 • março 2015
Água, sim. Lucro, não! A crise da água se agrava – é preciso responder com luta! A grave crise hídrica dos últimos meses não é um fenômeno que atinge apenas o estado de São Paulo. Suas vítimas já chegam a um quinto da população brasileira. São 45,8 milhões os brasileiros que vivem em regiões com reservatórios abaixo do normal e chuvas abaixo da média histórica. Para boa parte dessa população isso já tem significado racionamento e outras medidas emergenciais. André Ferrari Na grande maioria dos casos a situação foi agravada pela falta de planejamento prévio e investimentos por parte das autoridades para prevenir os problemas e também pelo conflito entre o interesse público e os interesses privados relacionados ao abastecimento de água. Durante o ano de 2014, a crise hídrica fez com que 1.265 municípios de 13 estados das regiões nordeste e sudeste decretassem situação de emergência. Os últimos dados do Ministério de Integração Nacional apontam que hoje 936 cidades estão nessa situação. Muitos outros municípios vivem situações até mais críticas, embora não tenham adotado o estado de emergência. Esse é o caso principalmente no estado de São Paulo onde apenas três estão nessa situação. No município de Itu, por exemplo, onde o abastecimento de água colapsou completamente, provocando protestos radicalizados contra as autoridades locais, a situação de emergência nunca foi decretada. A adoção dessa medida obrigaria as autoridades a intervir sobre a empresa privada que monopoliza o serviço de abastecimento de água, além de priorizar o consumo humano afetando interesses econômicos.
Seca no nordeste No Ceará, por outro lado, 176 dos 184 municípios do estado decretaram situação de emergência. São mais de 5,5 milhões os atingidos pela seca. A Paraíba também vive situação muito crítica. Em Pernambuco, o nível de água acumulada nos reservatórios está em 13%, o mais baixo entre os estados nordestinos. Mais de 40% da população do Recife é afetada pelo racionamento no fornecimento de água.
O nordeste como um todo entra em seu quarto ano seguido de seca. Mesmo assim, os investimentos necessários para contornar a situação não foram feitos e por razões eleitorais o problema é minimizado. Nas áreas rurais, o programa Bolsa Família serviu para amenizar o caráter de calamidade pública do problema e desviar o foco de atenção. Mas, o problema socioambiental permanece.
mente eliminados para o abastecimento da população. Com relação ao governo federal, é fato que o desmatamento da Amazônia e o conjunto do modelo primário-exportador adotado no país fomenta a devastação da natureza e afeta os recursos hídricos. Mas, esse modelo o governo Dilma compartilha com os tucanos. Nesse aspecto, estão todos no mesmo barco e devem ser responsabilizados duramente.
Situação crítica no sudeste Na sudeste, as três maiores regiões metropolitanas do país estão na iminência do desabastecimento. Em Belo Horizonte, o sistema Paraopeba pode zerar em três meses segundo a COPASA (Companhia de Saneamento do estado de Minas Gerais), afetando uma população de 2,5 milhões de pessoas. Já na região de Governador Valadares, a vazão do Rio Doce está dez vezes mais baixa do que o esperado para essa época do ano. O mesmo acontece quando o rio atravessa o estado do Espírito Santo. No Rio de Janeiro, o volume morto do reservatório de Paraibuna, o maior da bacia do Paraíba do Sul responsável pelo abastecimento na região metropolitana, está sendo utilizado pela primeira vez na história. Apesar disso, o governo do estado continua a negar a possibilidade de racionamento.
São Paulo à beira de um colapso Em São Paulo, a situação continua extremamente crítica apesar do que diz o governo de Geraldo Alckmin. O governo, com ajuda da grande imprensa, adotou a estratégia de anunciar grandes obras faraônicas (que serão feitas sem licitação), ao mesmo tempo em que enfatiza que as chuvas de fevereiro foram acima da média histórica. Além disso, passou a acusar o governo federal pela crise hídrica, buscando desviar a atenção de sua própria responsabilidade. A imprensa anuncia que, com as chuvas de fevereiro, o sistema Cantareira, o maior do estado e em situação mais crítica, teria alcançado um patamar pouco superior a 10% de sua capacidade. O que a imprensa nem sempre explica é que esse nível ainda se mantém no volume
Organizar a luta de massas e pela base
morto. Para sair da primeira cota do volume morto, os níveis do Cantareira teriam que estar em pelo menos 18,5%, exatamente em um momento em que as chuvas tenderão a diminuir. No ritmo atual de chuvas e utilização de água, segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), o sistema Cantareira deve secar em julho desse ano. Como a situação do Alto Tietê também é extremamente crítica, deveremos ter uma situação calamitosa envolvendo 16,5 milhões de pessoas abastecidas por esses dois sistemas. Mesmo tendo recuado, o anúncio da possibilidade de um rodízio de cinco dias sem água para dois com água na região metropolitana de São Paulo, feito pelo diretor metropolitano da Sabesp, ainda se coloca como horizonte no curto prazo para tentar evitar o colapso generalizado. Mas, mesmo sem o rodízio ado-
tado de forma oficial, o que temos hoje já é um racionamento não declarado e que afeta principalmente a população mais pobre. Enquanto muitos moradores das periferias da grande São Paulo permanecem sem água por 3, 4, 5 ou mais dias, há uma parcela de marajás da água em São Paulo que gastam muito e pagam pouco. São os contratos de “demanda firme”, como são denominados pela Sabesp, onde cerca de 500 empresas têm garantia de fornecimento ininterrupto e pagam uma tarifa diferenciada, muito mais baixa que o comum dos mortais. As obras anunciadas por Alckmin visando a utilização das águas extremamente poluídas da represa Billings, além de não resolverem o problema, têm provocado grande apreensão. Não há nenhuma garantia de que os resíduos industriais depositados no fundo da Billings e o esgoto proveniente dos rios Tietê e Pinheiros possam ser devida-
A tarefa agora é de organizar a luta pelo direito à água pela base. A formação de Comitês de Luta nos bairros e comunidades é o caminho para conquistar uma solução coletiva para o problema. São os trabalhadores e a população organizados que poderão exigir o controle sobre o que se faz em termos de medidas emergenciais diante da crise e garantir que as regiões mais pobres não sejam mais afetadas que os bairros ricos e suas empresas e negócios. É preciso que se construa uma poderosa e representativa Assembleia Popular Estadual da Água em São Paulo, reunindo todos os movimentos, coletivos e comitês de luta. O mesmo caminho precisa ser seguido nos demais estados. Para defender uma linha classista, anticapitalista e combativa para a luta em defesa do direito à água, um grupo de trabalhadores da Sabesp, da Oposição Alternativa no Sintaema, incluindo o companheiro Marzeni Pereira, junto com militantes do movimento popular e trabalhadores de outros setores, além de ativistas da juventude de várias partes do país, decidiram formar um coletivo nacional de luta pela água. O coletivo travará a luta pelo direito à água junto com a luta pela reforma urbana, agrária, contra as privatizações e em defesa do meio ambiente, a partir de uma ótica anticapitalista e socialista. Trabalhará também com uma perspectiva internacionalista, coordenando-se com ativistas que hoje lutam pelo direito à água em várias partes do mundo, de Cochabamba na Bolívia, onde ocorreu a guerra da água contra as privatizações, até a Irlanda onde há um forte movimento contra as taxas cobradas para a água.